from iiatbr.org

Transcrição

from iiatbr.org
Available online at www.bjta.iiatbr.org
Braz. J. Therm. Anal. Vol. 4 No. 4 (2015) 62 – 69
DOI: 10.18362/bjta.v4.i4.231
Caracterização em estado sólido de medicamentos genérico, similar e
referência do cloridrato de propranolol
Juliana Alves Pereira Sato e Fabio Furlan Ferreira
Centro de Ciências Naturais e Humanas, Universidade Federal do ABC, Av. dos Estados, 5001, Santo André-SP, 09210-580
Received data 02/10/2015; accepted data 12/11/2015
Available online data 31/12/2015
Abstract
Propranolol hydrochloride is the first non-selective β-antagonist of first generation (antagonizes both the β1-adrenergic as well as β2adrenergic receptors) commercially available. Antagonists of adrenergic receptor are class II-antiarrhythmic agents, also known as β-blockers.
The activation of β-adrenergic receptors in heart tissues causes the heart to increase its heart rate and contractile force. The polymorphic Form
II of Propranolol hydrochloride (pharmaceutically active), which has a monoclinic crystal system and space group P21, was found in samples of
both compounding pharmacies as well as in pills purchased in drugstores (generic, similar and reference). Spectroscopic (FTIR) and thermal
analysis (DSC and TG) techniques were used in conjunction with X-ray powder diffraction data used with the Rietveld method of refinement of
crystal structures to carry out a full study on the solid state of Propranolol hydrochloride.
Keywords: propranolol hydrochloride, thermal analysis, Rietveld method
Resumo
O Cloridrato de Propranolol é o primeiro antagonista β de primeira geração não seletivo (antagoniza tanto os receptores β 1-adrenérgico
como β2-adrenérgico) disponível comercialmente. Os antagonistas dos receptores adrenérgicos são agentes antiarrítmicos da classe II, também
conhecidos como betabloqueadores. A ativação de receptores β-adrenérgicos no tecido cardíaco faz com que o coração aumente a frequência
cardíaca e a força contrátil. A Forma polimórfica II (farmaceuticamente ativa), que possui sistema cristalino monoclínico e grupo espacial P21
do Cloridrato de Propranolol, foi encontrada tanto nas amostras provenientes de farmácias de manipulação como nos medicamentos adquiridos
em drogarias (medicamento genérico, similar e referência). Foram utilizadas técnicas espectroscópicas (FTIR) e de análise térmica (DSC e TG)
aliadas a dados de difração de raios X por policristais, usados em conjunto com o método de Rietveld de refinamento de estruturas cristalinas,
para realizar um estudo completo em estado sólido do Cloridrato de Propranolol.
Palavras-chave: cloridrato de propranolol, análise térmica, método de Rietveld
1.
Introdução
A Organização Mundial de Saúde (OMS) está
desenvolvendo um plano de ação global para os anos de
2013 até 2020, fornecendo um roteiro de ação conduzida por
cada país para a prevenção e controle de doenças não
transmissíveis. Uma das metas é reduzir substancialmente o
número de pessoas com pressão arterial elevada. Doenças
cardiovasculares ocasionam aproximadamente 17 milhões
de mortes a cada ano. Destas, 9,4 milhões são devidas à
hipertensão. A hipertensão arterial é responsável por, pelo
menos, 45% de mortes por doenças cardíacas e 51% dos
óbitos por acidente vascular cerebral (AVC) [1].
Neste contexto, foi selecionado o Cloridrato de
Propranolol, medicamento anti-hipertensivo que é
distribuído gratuitamente pelo Programa do Governo Federal
“Aqui tem farmácia popular” tanto em unidades básicas de
saúde (UBS) como em drogarias. O Cloridrato de
Propranolol, cuja fórmula química é C16H22NO2Cl e massa
molecular de 295,80 g mol-1, existe em três formas
cristalinas diferentes, denominadas Formas I, II e III, de
acordo com a diminuição do ponto de fusão [2]. As
* Corresponding author: Tel.: +55
E-mail address: [email protected] (Juliana Alves Pereira Sato)
© 2015 Published by IIAT – Instituto Internacional de Análise Térmica
diferentes formas cristalinas do fármaco apresentam
propriedades físicas e espectroscópicas únicas e foram
reportadas por Bartolomei [2,3], sendo a Forma II
encontrada em amostras comerciais. A capacidade de uma
molécula existir em mais de uma estrutura cristalina é um
fenômeno conhecido como polimorfismo, e diferenciar as
diferentes formas cristalinas de um fármaco é muito
importante para a indústria farmacêutica, pois diferentes
polimorfos podem apresentar diferentes propriedades físicoquímicas, como solubilidade, taxa de dissolução, reatividade
ou ponto de fusão e, portanto, diferentes atividades
farmacológicas [4,5]. De acordo com Bernstein [6] - que
avaliou a evolução do conceito de polimorfismo, sugerido há
mais de um século – a definição mais adequada de um
polimorfo é aquela dada por McCrone, em 1965: "A fase
sólida cristalina de um dado composto resultante da
possibilidade de pelo menos duas disposições diferentes das
moléculas daquele composto no estado sólido". Existem
diversas formas farmacêuticas que apresentam o fenômeno
de polimorfismo, e sabendo que este pode influenciar na
eficácia do medicamento, faz-se necessário caracterizar e
estudar os fármacos que apresentam polimorfismo, não
apenas nas fases de desenvolvimento de uma nova droga ou
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
no processo de fabricação, mas no controle após este estar
disponível para o consumidor.
O Cloridrato de Propranolol também é encontrado na
forma de mistura racêmica. Shanks [7] verificou que os
enantiômeros individuais deste betabloqueador diferem em
suas atividades farmacológicas. O isômero (S)- do
Cloridrato de Propranolol funciona como o eutômero
(enantiômero que causa os efeitos desejados) do
betabloqueador, e o eutômero (R)- é o distômero que
estimula a musculatura lisa do útero [8]. O distômero é
farmacologicamente inativo e responsável pelos efeitos
colaterais [7, 9, 10]. O Cloridrato de Propranolol é um
antagonista beta-adrenérgico não seletivo e interage com os
receptores β1 e β2, sendo utilizado principalmente no
tratamento sistêmico da hipertensão, enxaqueca, arritmias e
de cardiopatia isquêmica [9]. Normalmente é comercializado
em formas sólidas de 10, 40 ou 80 mg de Cloridrato de
Propranolol por comprimido ou pode ser adquirido em
outras concentrações por meio de farmácias de manipulação
ou soluções injetáveis. Depois de administrado, é
rapidamente absorvido pelo trato intestinal. Dentre os vários
efeitos colaterais, destacam-se: bronco constrição, depressão
cardíaca, hipoglicemia (devido à liberação de glicose em
resposta à adrenalina), entre outros [11].
Neste trabalho será apresentada a caracterização em
estado sólido do medicamento Cloridrato de Propranolol
(genérico, similar e referência) adquirido em drogarias
comerciais e duas amostras provenientes de farmácias de
manipulação da região do ABC paulista (somente o
princípio ativo).
2.
Fazem parte deste estudo amostras de Cloridrato de
Propranolol adquiridas em duas farmácias de manipulação
na cidade de Santo André-SP que serão denominadas de F e
V de modo a manter o sigilo.
Para todas as análises realizadas neste trabalho, os
comprimidos adquiridos das farmácias comerciais bem
como o insumo farmacêutico ativo (IFA) na forma de pó,
adquirido em farmácias de manipulação, foram previamente
triturados em um almofariz de ágata com pistilo para
obtenção de um pó homogêneo.
2.1. Difração de raios X por policristais
O difratômetro de raios X por policristais utilizado
foi o modelo STADI-P, da Stoe®, operando em modo
de transmissão (com as amostras acondicionadas entre duas
folhas de acetato-celulose, com espessura de 0,014 mm
e densidade de 1,3 g cm-3), utilizando radiação CuKα1
(λ = 1,54056 Å), selecionada por um monocromador curvo
de Ge (111). Foi utilizada uma tensão de 40 kV e corrente de
40 mA. Os fótons de raios X foram detectados por um
detector linear (microstrip) de estado sólido (Mythen 1K) da
Dectris®, proporcionando alta resolução instrumental e
tempos de coleta bastante reduzidos (da ordem de alguns
minutos). As varreduras para as amostras dos fármacos e
medicamentos foram realizadas na faixa angular de 2° a 60°
(2θ), utilizando um passo de 1,05° e tempo de integração de
60 segundos por passo. O porta-amostras ficou mantido sobrotação durante a aquisição dos dados de modo a provar um
maior número de cristalitos. As análises foram realizadas no
Laboratório de Cristalografia e Caracterização Estrutural de
Materiais (LCCEM) da UFABC.
Experimental
2.2. Análise térmica
Neste trabalho foi utilizada a composição de 40 mg.
O medicamento referência é o Inderal®, comercializado pela
indústria farmacêutica AstraZeneca. Foram adquiridos
também os medicamos similar, que é comercializado como
PROPRAMED®, do laboratório GRUPO CIMED, e o
genérico, da Teuto. Na Tabela 1 estão apresentados os
medicamentos analisados: referência (R), genérico (G) e
similar (S), na forma de comprimidos, com a informação dos
excipientes que constam em suas bulas.
Tabela 1: Excipientes dos medicamentos referência (R),
genérico (G) e similar (S) do medicamento Cloridrato de
Propranolol com composição de 40 mg de princípio ativo.
Excipientes
povidona
estearato de magnésio
croscarmelose sódica
lactose monoidratada
lactose
gelatina
amido de milho
amido
manitol
celulose microcristalina
dióxido de silício coloidal
talco
álcool etílico
Cloridrato de Propanolol
R
G
S
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Para as medidas de análise térmica foi utilizado um
calorímetro exploratório diferencial 7020 Exstar SII – Seiko
e um TG-DTA:7200 Exstar SII – Seiko, ambos localizados
no Laboratório de Desenvolvimento e Inovação
Farmacotécnica (DEINFAR), da Faculdade de Ciências
Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP).
2.3. Espectroscopia
As medidas de espectroscopia no infravermelho com
transformada de Fourier (FTIR) foram realizadas em um
espectrofotômetro PerkinElmer® Frontier 100 FT-IR, no
modo de refletância total atenuada (ATR), utilizando um
cristal de ZnSe na faixa de 4000 a 650 cm-1 e com resolução
de 4 cm-1. O equipamento está localizado no Laboratório de
Espectroscopias Eletrônica e Óptica na Universidade Federal
do ABC (UFABC).
3.
Resultados e Discussão
3.1. Difração de raios X
Refinamento de Rietveld
por
policristais
e
São reportados no banco de dados do Cambridge
Structural Database (CSD) [12], distribuído pelo
Cambridge Crystallographic Data Centre (CCDC), quatro
diferentes arquivos CIFs (Crystallographic Information
Framework) para o fármaco Cloridrato de Propranolol:
Page | 63
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
FIDGAB [7] (grupo espacial P21), PROPDD [13] (grupo
espacial P21), PROPDL01 [13] (grupo espacial P21/c) e
PROPDL10 [14] (grupo espacial P21/n). Para os
refinamentos pelo método de Rietveld [15,16] foram
testados todos os arquivos CIFs, sendo que os arquivos
FIDGAB e PROPDL10 foram os que resultaram num
melhor acordo com os dados experimentais. Foi escolhido o
arquivo FIDGAB pois, visualmente, além dos parâmetros
estatísticos que indicam um bom refinamento [17], (como o
Rwp, Rexp, χ2 e o RBragg) este arquivo apresentou uma ótima
sobreposição entre os difratogramas calculado e observado.
Na Tabela 2 são indicadas as informações cristalográficas como parâmetros de rede, volume, grupo espacial e sistema
cristalino para os arquivos CIFs referente ao Cloridrato de Propranolol.
Tabela 2: Informações cristalográficas do Cloridrato de Propranolol (CIF)
Arquivo CIF
FIDGAB
PROPDD
PROPDL01
PROPDL10
a (Å)
13,979(7)
12,430(60)
13,931
14,017(2)
b (Å)
8,279(9)
9,740(60)
8,327
8,285(1)
c (Å)
14,020(8)
6,880(90)
18,240
14,005(1)
α (°)
90
90
90
90
β (°)
98,86(5)
94
130,81
98,76(2)
90
90
90
90
Volume (Å )
1603,20
830,92
1601,49
1607,44
Sistema Cristalino
Monoclínico
Monoclínico
Monoclínico
Monoclínico
Grupo Espacial
P21
P21
P21/c
P21/n
γ (°)
3
A Figura 1 apresenta o gráfico de Rietveld para o
medicamento Cloridrato de Propranolol referência. Foram
utilizados como arquivos de entrada para o refinamento de
Rietveld os arquivos CIF referentes tanto ao princípio ativo
do Cloridrato de Propranolol (FIDGAB) quanto o do
excipiente lactose (LACTOS10). Tanto visualmente como
pelos índices estatísticos é possível notar que houve um
ajuste adequado entre os difratogramas observado e
calculado. A análise quantitativa de fases cristalinas indicou
que a fase majoritária é referente ao excipiente lactose com
~(82,150,44)%,
seguida
do
princípio
ativo
~(17,850,44)%. Ao final do refinamento foram obtidos os
seguintes índices de qualidade: Rwp = 5,107%; Rexp =
1,880%; RBragg-FIDGAB = 2,086% RBragg-LACTOS10 = 2,123% e
χ2 = 2,716.
O refinamento de Rieteveld para a amostra de
Cloridrato de Propranolol genérico é apresentado na Figura
2.
Figura 2: Gráfico de Rietveld do medicamento Cloridrato
de Propranolol genérico da Teuto: o padrão calculado está
representado pela linha laranja, o padrão observado pelos
círculos em preto, a diferença entre os padrões observado e
calculado pela linha azul e as posições dos picos de Bragg
pelas barras verticais: cloridrato de propranolol (rosa),
manitol (azul) e talco (laranja).
Figura 1: Gráfico de Rietveld do medicamento Cloridrato
de Propranolol referência da AstraZeneca (Inderal ®): o
padrão calculado (linha verde), o padrão observado (círculos
em preto), a diferença entre os padrões observado e
calculado (linha azul) e as posições dos picos de Bragg pelas
barras verticais: lactose (rosa) e cloridrato de propranolol
(azul).
Para este medicamento foram utilizados como
arquivos de entrada o CIF referente ao princípio ativo
Cloridrato de Propranolol (FIDGAB) e os CIFs referente aos
excipientes manitol (DMANTL) e talco (TALC1A). Por
meio da quantificação de fases cristalinas, percebe-se que a
fase que apresenta maior quantidade é referente ao manitol
~(73,6 3,1)% seguida pelo princípio ativo, que representa
~(20,73,3)%. Embora em menor fração, foi necessário
considerar o talco ~(5,73,0)% para que alguns picos se
ajustassem de forma satisfatória. Ao final do refinamento
Page | 64
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
foram obtidos os seguintes índices de qualidade: Rwp =
3,305%; Rexp = 1,845%; RBragg-FIDGAB = 1,354%; RBragg2
DMANTL = 1,988%; RBragg-TALC1A = 2,976% e χ = 1,791.
A Figura 3 mostra o gráfico de Rietveld para a
amostra de Cloridrato de Propranolol similar. Para esta
amostra, os arquivos de entrada utilizados para o
refinamento de Rietveld foram o dióxido de silício
(Tridymite), o princípio ativo do Cloridrato de Propranolol
(FIDGAB) e lactose (LACTOS10). A fase cristalina
prevalecente é referente à lactose, com ~(48,62,6)%,
seguida do dióxido de silício, com ~(34,0 2,1)% e o IFA
com ~(17,43,5)%. Ao final do refinamento foram obtidos
os seguintes índices de qualidade: Rwp = 4,092%; Rexp =
1,799% ; RBragg-FIDGAB = 1,622%; RBragg-Tridymite = 0,495%;
RBragg-LACTOS10 = 1,033% e χ2 = 2,275.
Figura 5: Gráfico de Rietveld do fármaco Cloridrato de
Propranolol (V), o padrão calculado (linha vermelha), o
padrão observado pelos círculos em preto, a diferença entre
os padrões observado e calculado pela linha azul e as
posições dos picos de Bragg pelas barras verticais rosa.
Ao final do refinamento de Rietveld foram
encontrados os seguintes valores para a amostra da farmácia
F: Rwp = 7,966%; Rexp = 3,097%; RBragg = 3,583%; χ2 =
2,572. Já para as amostras da farmácia V, foram
encontrados: Rwp = 5,807%; Rexp = 3,322%; RBragg = 1,759%;
χ2 = 1,748. Para ambas farmácias de manipulação houve um
bom ajuste entre o modelo teórico e o experimental.
3.2. Espectroscopia
no
transformada de Fourier
Figura 3: Gráfico de Rietveld do medicamento Cloridrato
de Propranolol Similar (PROPRAMED®) da CIMED®: o
padrão calculado (linha lilás), o padrão observado pelos
círculos em preto, a diferença entre os padrões observado e
calculado pela linha azul e as posições dos picos de Bragg
pelas barras verticais: cloridrato de propranolol (rosa),
dióxido de silício (azul) e lactose (laranja).
Nas Figuras 4 e 5 são apresentados os gráficos de
Rietveld para as amostras de Cloridrato de Propranolol
adquiridos em duas farmácias de manipulação, que serão
denominadas de amostras F e V.
infravermelho
com
O Cloridrato de Propranolol apresenta alguns grupos
funcionais presentes em sua estrutura como amina
secundária, éter, álcool secundário e naftaleno, por exemplo.
Em 3280 cm-1 ocorre a vibração de estiramento da
hidroxila. A vibração em 1590 cm-1 é atribuída à deformação
angular simétrica no plano de N-H. As aminas alifáticas
secundárias apresentam bandas de absorção da ligação C-N
não conjugada em 1235 cm-1 e 1030 cm-1.
Estas bandas são originárias da deformação axial do
grupo C-N e estão acopladas com a deformação axial das
ligações adjacentes da molécula. A banda correspondente à
deformação angular simétrica no plano de N-H pode ser
observada em 1580 cm-1.
Em 1105 cm-1 ocorre uma banda intensa que é devida
à deformação axial assimétrica de C-O-C. Os grupos alquilaril-éteres mostram uma banda de deformação axial
assimétrica de C-O-C em 1270 cm-1, com a deformação
axial simétrica aparecendo em 1030 cm-1.
Figura 4: Gráfico de Rietveld do fármaco Cloridrato de
Propranolol (F): o padrão calculado está representado pela
linha azul, o padrão observado pelos círculos em preto, a
diferença entre o padrão observado e calculado pela linha
azul e as posições dos picos de Bragg pelas barras verticais
rosa.
A vibração de deformação axial de C-O de álcoois é
encontrada em 1235 cm-1. Essa deformação acopla-se com a
vibração de deformação axial do C-C adjacente. A vibração
de deformação angular no plano da ligação O-H ocorre em
1330 cm-1. Tanto em álcoois primários como em
secundários, a deformação angular no plano de O-H acoplase com as vibrações de deformação angular simétrica fora do
plano de C-H, gerando duas bandas de absorção, uma em
torno de 1448 cm-1 e outra em 1330 cm-1.
Page | 65
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
No caso do grupo naftaleno α-substituído, a banda
correspondente aparece em 800 cm-1. Para este mesmo
grupo, as vibrações de deformação angular fora do plano de
C-H ocorrem em 900 cm-1 e 670 cm-1 [18,19].
Os valores para as vibrações dos grupos presentes na
estrutura química dos fármacos estão de acordo com os
relatados na literatura para ambas as amostras [20,21].
Nas Figuras 6 e 7 são apresentados os espectros FTIR
das amostras de Cloridrato de Propranolol provenientes das
farmácias F e V, respectivamente.
Figura 8: Espectro FTIR para o Cloridrato de Propranolol
Referência, obtido com resolução de 4 cm-1 na região de
4000 a 650 cm-1, onde as principais bandas de absorção que
caracterizam o fármaco estão destacadas por suas
respectivas frequências.
Figura 6: Espectro FTIR para o Cloridrato de Propranolol
(farmácia F), obtido com resolução de 4 cm-1 na região de
4000 a 650 cm-1, onde as principais bandas de absorção que
caracterizam o fármaco estão destacadas por suas
respectivas frequências.
Figura 9: Espectro FTIR para o Cloridrato de Propranolol
Genérico, obtido com resolução de 4 cm-1 na região de 4000
a 650 cm-1, onde as principais bandas de absorção que
caracterizam o fármaco estão destacadas por suas
respectivas frequências.
Figura 7: Espectro FTIR para o Cloridrato de Propranolol
(farmácia V), obtido com resolução de 4 cm-1 na região de
4000 a 650 cm-1, onde as principais bandas de absorção que
caracterizam o fármaco estão destacadas por suas
respectivas frequências.
Os espectros FTIR dos medicamentos referência,
genérico e similar estão apresentados nas Figuras 8, 9 e 10.
Nota-se que as vibrações referentes ao princípio ativo estão
presentes em todos os medicamentos.
Figura 10: Espectro FTIR para o Cloridrato de Propranolol
Similar, obtido com resolução de 4 cm-1 na região de 4000 a
650 cm-1, onde as principais bandas de absorção que
caracterizam o fármaco estão destacadas por suas
respectivas frequências.
Um estudo realizado por Bartolomei e colaboradores
[2] apresentou as diferenças entre os espectros de FTIR para
a Forma I e para a Forma II (farmaceuticamente ativa) do
Cloridrato de Propranolol.
Page | 66
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
Apesar das sutis diferenças entre os espectros, é
possível identificar as diferenças entre elas na região de
fingerprint do espectro.
Na Figura 12 são apresentadas as curvas TG/DTG
da amostra de Cloridrato de Propranolol proveniente da
farmácia V.
A diferença mais pronunciada é um duplo pico por
volta de 1600 cm-1 para a Forma II, sendo que para a Forma
I um pequeno pico aparece em 3337 cm-1, enquanto para a
Forma II este pico é deslocado para 3280 cm-1.
Na curva TG, pode-se observar que não há perda de
massa até aproximadamente 205 °C.
Desta forma, pela comparação entre os espectros é
possível identificar picos que estão presentes em uma forma
e ausentes em outra, ou seja, a amostra analisada se refere à
Forma II do Cloridrato de Propranolol.
3.3. Análise térmica
Podemos verificar na Figura 11 que o fármaco é
termicamente estável até 219 °C.
Para temperaturas mais altas, inicia-se a degradação
do insumo farmacêutico ativo. Este processo de
decomposição térmica ocorre em uma única etapa, como
pode ser visto na curva DTG, que apresenta perda de massa
(Δm = 100%) entre 200 °C e 354 °C associada ao pico
endotérmico em 304 °C.
De acordo com a curva DTG, o Cloridrato de
Propranolol da farmácia V apresenta perda de massa em
uma única etapa, entre 205 °C e 325 °C, correspondendo ao
pico endotérmico em 301,63 °C (DTG).
As curvas DSC das amostras de Cloridrato de
Propranolol das farmácias F (pontilhada) e V (cheia) são
apresentadas na Figura 13. Na amostra da farmácia F pode
ser observado um único evento endotérmico em 163,72 °C
(Tpico) referente à fusão do princípio ativo, assim como na
farmácia V onde o pico é sutilmente deslocado para 163 °C
(Tpico).
Figura 13: Curva DSC da amostra de Cloridrato de
Propranolol F (pontilhada) e V (cheia), obtida a 10 °C min-1,
sob atmosfera dinâmica de N2 (50 mL min-1) com massa da
amostra 3 mg.
Figura 11: Curva TG (pontilhada) e DTG (cheia) da
amostra de Cloridrato de Propranolol (F), obtida a
10 °C min-1, sob atmosfera dinâmica de N2 (100 mL min-1),
com massa da amostra de 5 mg.
Figura 12: Curvas TG (pontilhada) e DTG (cheia) da
amostra de Cloridrato de Propranolol (V), obtida a 10 °C
min-1, sob atmosfera dinâmica de N2 (100 mL min-1), com
massa da amostra de 5 mg.
Na Figura 14 é apresentada a curva TG/DTG do
medicamento referência.
Figura 14: Curva TG (pontilhada) e DTG (cheia) da
amostra de Cloridrato de Propranolol Referência, obtida a
10 °C min-1, sob atmosfera dinâmica de N2 (100 mL min-1),
com massa da amostra de 5 mg.
Nota-se uma pequena perda de massa em
aproximadamente 100 °C, seguida de um evento
endotérmico onde há sobreposição de perda de massa, não
sendo possível determinar estes eventos individualmente.
Page | 67
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
Ao final do experimento, há um resíduo de Δm =
29,50% do medicamento que não foi decomposto até a
temperatura de 600 °C.
descolado para 168 °C; para o genérico houve uma redução
do ponto de fusão para 155 °C e para o similar o ponto de
fusão ocorreu em 164 °C.
Na Figura 15 é apresentada a curva TG/DTG do
medicamento genérico onde são evidenciados três eventos
de perda de massa.
Figura 15: Curva TG (pontilhada) e DTG (cheia) da
amostra de Cloridrato de Propranolol Genérico, obtida a
10 °C min-1, sob atmosfera dinâmica de N2 (100 mL min-1),
com massa da amostra de 5 mg.
O primeiro, em aproximadamente 154 °C, com perda
de massa de aproximadamente Δm = 6%. O segundo e o
terceiro eventos endotérmicos aparecem sobrepostos na
curva TG com uma perda de massa de Δm = 56% e ao final
do experimento ainda há um resíduo de Δm = 38%.
Para o medicamento similar (Figura 16) os eventos
endotérmicos aparecem sobrepostos. Juntos, eles apresentam
uma perda de massa de Δm = 72% e, ao final do
experimento, há um resíduo de Δm = 28%.
Figura 16: Curva TG (pontilhada) e DTG (cheia) da
amostra de Cloridrato de Propranolol Similar, obtida a
10 °C min-1, sob atmosfera dinâmica de N2 (100 mL min-1),
com massa da amostra de 5 mg.
Na Figura 17 as curvas DSC dos medicamentos
referência (tracejada), genérico (cheia) e similar (pontilhada)
são apresentadas.
O Cloridrato de Propranolol possui ponto de fusão
entre 160 °C e 164 °C. Podemos identificar diversos pontos
de fusão na curva DSC dos medicamentos, onde para a
amostra referência o pico de fusão referente ao fármaco foi
Figura 17: Curva DSC da amostra do medicamento
Cloridrato de Propranolol Referência (tracejado), Genérico
(cheia) e Similar (pontilhada), obtida a 10 °C .min-1, sob
atmosfera dinâmica de N2 (50 mL .min-1) com massa da
amostra 3 mg.
4.
Conclusão
Existem três diferentes formas cristalinas do
Cloridrato de Propranolol, chamadas de Forma I, II e III,
sendo a Forma II a farmaceuticamente ativa. Para as
amostras dos medicamentos genérico, similar e referência
foram realizados experimentos de difração de raios X por
policristais e após o refinamento de Rietveld foi possível
concluir que a Forma II estava presente em todas as
amostras dos medicamentos. Para o medicamento referência
a lactose é fase que se encontrava em maior proporção com
~(82,150,44)%,
seguida
do
princípio
ativo
~(17,850,44)%. Para o medicamento genérico a fase que
apresenta maior quantidade é referente ao manitol
~(73,63,1)% seguida pelo princípio ativo, que representa
~(20,73,3)% e o talco ~(5,73)% . Para o medicamento
similar, foram utilizados os excipientes cristalinos dióxido
de silício com ~(34,02,1)% e a lactose com ~(48,62,6)%.
O insumo farmacêutico ativo representa ~(17,43,5)%
referente a fase cristalina do medicamento.
Para as amostras provenientes das farmácias de
manipulação foram realizados diversos experimentos de
modo a identificar a forma cristalina presente no insumo
farmacêutico ativo. A difração de raios X juntamente com o
método de Rietveld pode fornecer informações importantes
sobre a estrutura cristalina dos fármacos. Tanto a amostra da
farmácia F como da farmácia V apresentaram a forma
farmaceuticamente ativa, pode se notar um bom ajuste entre
o difratograma experimental e teórico. Como dito
anteriormente, foi reportado na literatura que há diferenças
sutis entre as diferentes formas do Cloridrato de Propranolol
nos espectros FTIR, algumas bandas são características de
uma ou de outra forma cristalina. Assim, por meio da
comparação entre os espectros notou-se algumas diferenças
como um duplo pico sobreposto próximo de 1600 cm-1 e um
pico em 3280 cm-1 característicos da Forma II. Para as
amostras dos medicamentos referência, genérico e similar
foi possível identificar a presença dos grupos funcionais
pertencentes ao Cloridrato de Propranolol com alguns sutis
Page | 68
J. A. P. Sato et al. – Braz. J. Therm. Anal. V. 4 N. 4 (2015) 62 – 69
deslocamentos de algumas bandas nas amostras genérico e
similar.
Por fim, a partir dos experimentos de análise térmica,
pudemos inferir que ambas as amostras possuem degradação
do insumo farmacêutico ativo em uma única etapa. Para a
amostra proveniente da farmácia F este evento ocorre entre
200 °C e 354 °C e para a amostra da farmácia V, entre 205
°C e 325 °C. A fusão do princípio ativo ocorre em 164 °C
para a amostra da farmácia F e em 163 °C para a farmácia V.
As curvas TG/DTG para os medicamentos apresentam
variações em perda de massa devido aos diferentes
excipientes presentes na amostra e para os três
medicamentos não houve perda de massa total, sempre
havendo resíduo ao final do experimento. Estas informações
corroboram com os valores encontrados na literatura.
Agradecimentos
Os autores agradecem o suporte financeiro do CNPq
(proc. no 305186/2012-4 e proc. n° 141308/2012-5),
FAPESP (proc. no 2008/10537-3) e à CEM-UFABC, ao
Programa de Pós-Graduação em Nanociência e Materiais
Avançados da UFABC (PPG-Nano).
Referências
[1] http://www.who.int/cardiovascular_diseases/publications
/global_brief_hypertension/en/ Acessado em 25 Out
2015.
[2] Bartolomei M, Bertocchi P, Cotta Ramusino M,
Signoretti E. C. Thermal Studies on the Polymorphic
Modifications of (R,S) Propranolol Hydrochloride.
Thermochim Acta 1998:321:43-2.
[3] Bartolomei M, Bertocchi P, Ramusino M C, Santucci N,
Valvo L. Physico-chemical Characterisation of the
Modifications I and II of (R.S) Propranolol
Hydrochloride: Solubility and Dissolution Studies. J
Pharm Biomed Anal. 1999:21:299-09
[4] Hernández J M A, Valdés E A, Paz M, Torres J H.
Experimental and Theoretical Study of the
Conformational Analysis of Hydrochlorotiazide. J Mol
Struct. 2006:786: 1-8.
[5] http://www.fda.gov/downloads/Drugs/Guidances/UCM0
72866.pdf Acessado em 25 Out 2015.
[6] Bernstein J. Polymorphism in Molecular Crystals. 1° ed.
New York:Oxford University Press; 2002.
[7] Shanks R G. The Peripheral Vascular Effects of
Propranolol and Related Compounds. Br J Pharmacol
Chemother.1967:29:204-17.
[9] Bredikhin A A, Savel D V, Bredikhina Z A, Gubaidullin
A T, Litvinov I A, Crystallization of Chiral Compounds.
Propranolol: Free base and Hydrochloride. Russian
Chemical Bulletin, International Edition. 2003:4:853-61.
[10]
Lima V L E. Os fármacos e a quiralidade: uma
breve abordagem. Quim Nova. 1997: 20:657-63.
[11]
Hang H P, Dale M M, Ritter J M, Flower R J.
Farmacologia. 6° ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2007.
[12]
Bruno I J, Cole J C, Edgington P R, Kessler M,
Macrae C F, McCabe P, Pearson J, Taylor R. New
software for searching the Cambridge Structural
Database and Visualising Crystal Structures. Acta
Crystallogr B. 2002:58:389-7.
[13]
Barrans Y, Cotrait M, Dangoumau J,
Conformations cristallines d'adrénolytiques β-bloquants:
propranolol et alprénolol. Acta Crystallogr B.
1973:29:1264-72
[14]
Ammon H L, Howe D B, Erhardt WD, Balsamo A,
Macchia B, Macchia F, Keefe W E. The crystal
structures of dichloroisoproterenol, propranolol and
propranolol hydrochloride. Acta Crystallogr B
1977:33:21-29
[15]
Rietveld H M. Line profiles of neutron powderdiffraction peaks for structure refinement. Acta Cryst.
1967:22:151-2.
[16]
Rietveld H M. A Profile Refinement Method for
Nuclear and Magnetic Structures. J Appl Crystallogr.
1969:2:65-1.
[17]
Toby B H. R factors in Rietveld analysis: How
good is good enough? Powder Diffraction. 2006:21:67-0.
[18]
Takka S, Propranolol Hydrochloride-anionic
Polymer Binding Interaction. Il Farmaco. 2003:58:10516.
[19]
Chaturvedi K, Umadevi S, Vaghani S. Floating
Matrix Dosage Form for Propranolol Hydrochloride
Based on Gas Formation Tecnique: Development and In
Vitro Evaluation. Sci Pharm. 2010:78:927-39
[20]
Skoog D A, Holler F J T A Nieman. Princípios de
Análise Instrumental. 5° ed. São Paulo:Bookman; 2002.
[21]
Silverstein R M, Webster F X, Kiemle D. J.
Identificação espectrométrica de compostos orgânicos.
7° ed. Rio de Janeiro:LTC: Rio de Janeiro;2007.
[8] Bredikhin A A, Bredikhina Z A, Gubaidullin A T,
Krivolapov D B, Litvinov I A, Rational Approach to a
Conglomerate-Forming Propranolol Derivative: Pointed
Modifications of the Crystal Structure. Mendeleev
Commun. 2004:14:268-70.
Page | 69

Documentos relacionados