1 O assistente social como educador em saúde nas ações voltadas

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1 O assistente social como educador em saúde nas ações voltadas
O assistente social como educador em saúde nas ações voltadas ao
HIV/AIDS: a experiência de Juiz de Fora/MG, Brasil1
Heloisa Helena da Silva 2
[email protected]
Auta Iselina Stephan-Souza 3
[email protected].
Modalidade de trabalho:
Eixo temático:
Palavras chaves:
Apresentação de Experiências profissionais e
metodologías de intervenção
O Trabalho Social e as manifestações da questão
social (pobreza, desemprego, saúde, idoso, gênero,
género, etc.)
Serviço Social, Educação em Saúde, promoção da
saúde, qualidade de vida, HIV/AIDS
Introdução e Objetivos
O presente artigo que perfaz um relato de experiência empreendido no cuidado em
HIV/AIDS, tem por objetivo abordar o exercício do assistente social na área da saúde,
enquanto educador. Tomando por base o lócus privilegiado de atuação do Assistente
Social no campo do HIV/AIDS, discute-se seu papel enquanto facilitador no processo de
cuidado, preconizando o direito à saúde, o atendimento qualificado em HIV e a
participação dos usuários enquanto sujeitos de direitos. Neste contexto, o Serviço Social,
enquanto profissão em interface com a saúde trabalha numa perspectiva ampliada de
saúde e lança mão da prática educativa para atender ao usuário de forma integral.
No setor saúde, o ato de educar sempre esteve presente, perpassando
conjunturas e objetivos distintos, influenciando o processo de cuidado dos indivíduos e
grupos. Até as primeiras décadas do século XX, o educar em saúde primou pela adoção
de bons hábitos. A partir de sua segunda metade, o educar, tomado por um viés
1
Ponencia presentada en el XIX Seminario Latinoamericano de Escuelas de Trabajo Social. El Trabajo Social en la
coyuntura latinoamericana: desafíos para su formación, articulación y acción profesional. Universidad Católica
Santiago de Guayaquil. Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009.
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Estudante de pós-graduação. Universidade Federal de Juiz de Fora. Brasil. Assistente Social, graduada na Faculdade de
Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora/FSS-UFJF (2003), especialista em Política e Pesquisa em Saúde
Coletiva /UFJF (2005), aluna do Programa de Mestrado em Serviço Social/FSS-UFJF (2008-2010). Possui experiência na
área de Serviço Social, de Saúde Coletiva através da docência. Atualmente, desenvolve o estudo sobre as práticas em
saúde desenvolvidas nos serviços de referência em HIV/AIDS no Município de Juiz de Fora/MG em dissertação de
Mestrado.
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Docente. Universidade Federal de Juiz de Fora. Brasil. Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Federal
Fluminense (1977), Mestrado em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1982), doutorado
em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (1996) e pós-doutorado pelo IMS/UERJ ( 2002). Atualmente é professora
adjunta da Universidade Federal de Juiz de Fora, leciona as disciplinas - Seminário de Pesquisa e Política de Saúde nos
Mestrados de Serviço Social e de Saúde Coletiva, Política de Seguridade _Saúde na graduação, coordena um projeto
interdisciplinar de pesquisa sobre a Regionalização em Saúde na macrorregião Sudeste/MG, financiado pela Fapemig e
participa de um projeto de pesquisa sobre a Integralidade: Acesso, Processo de Trabalho e Gestão Pública na atenção
primária em Juiz de Fora, também financiado pela Fapemig. Tem experiência na área de Serviço Social e de Saúde
Coletiva e apresenta estudos sobre os seguintes temas: Serviço Social e Saúde ( Política de Seguridade, Trabalho em
Saúde, Residência Hospitalar) e Saúde Coletiva (Reginalização, Integralidade, Acesso, Gestão do SUS,
Interdisciplinaridade e Trabalho Coletivo.
1
pedagógico
mais
progressista,
patrocinado
pela
educação
popular,
alicerçada
principalmente nas idéias libertárias de Paulo Freire, passou a preconizar o protagonismo
do sujeito, no sentido de estimular a reflexão e a autonomia dos educandos em seu
processo saúde-cuidado, conformando este cuidado enquanto sinônimo de qualidade de
vida.
No processo de mudança da concepção do cuidado, que, por sua vez, envolve
uma nova concepção do educar em saúde, a Constituição de 1988 trouxe sua
contribuição, ao consagrar a Saúde como um direito de todo cidadão e um dever do
Estado, de acordo com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde/SUS
constantes nas leis 8.080 e 8.142 – denominadas Leis Orgânicas da Saúde/LOS – a partir
dos anos 1990. Princípios como universalidade, equidade, preservação da autonomia,
direito à informação, integralidade, dentre outros, passaram também a fortalecer o
enfoque mais crítico da Educação em Saúde, proporcionando um fazer profissional
diferenciado do tradicional.
Ao longo dos mais de 20 anos de SUS, pode-se perceber a vinculação de práticas
em saúde já consagradas – como consultas, exames diagnósticos, vacinações,
internações, prescrição de medicação, dentre outras – com práticas educativas em saúde
com objetivo de promoção da saúde e não apenas prevenção de doenças. Vários foram e
são, atualmente, os programas que envolvem a Educação em Saúde, como o Programa
Nacional de DST/AIDS. No campo do HIV/AIDS, a educação em saúde torna-se uma
ferramenta fundamental, dada às novas configurações que a mesma tem apresentado na
realidade brasileira e em municípios como de Juiz de Fora, considerado o segundo com
maior número de casos em Minas Gerais, de acordo com dados da Secretaria Municipal
de Saúde de Juiz de Fora.
1 - O Educar em Saúde como forma de enfrentamento da Epidemia de AIDS
A AIDS configura-se como problema de saúde pública e, atualmente, apresenta a
feminização, a juvenização e a interiorização como características marcantes, para além
do perfil consagrado na década de 1980 de acometimento apenas em grupos de risco.
Com base na mudança de seu perfil ao longo dos anos, e acreditando que seu trato não
se restringe apenas a uma intervenção médica e medicamentosa, o desenvolvimento de
práticas educativas em saúde promotoras de um cuidado integral tornam-se importantes
aliadas na luta pelo não avanço da epidemia.
2
Para controle da AIDS, o Brasil disponibiliza ações e serviços de saúde, visando
abarcar a sociedade como um todo. As ações materializam-se através das campanhas
educativas vinculadas aos meios de comunicação de massa, especialmente em datas
significativas como carnaval e 1º de dezembro – Dia Mundial de Combate à AIDS –, além
dos serviços de saúde, seguindo as diretrizes do Programa Nacional de DST/AIDS. Para
atender às diretrizes do Programa, há uma rede estruturada que perpassa todos os níveis
de atenção, com frentes de trabalho desde a atenção básica, Centro de Testagem e
Aconselhamento/CTA, passando por unidade intermediária de Serviço de Assistência
Especializada/SAE, até a alta complexidade com Hospitais de referência como o Hospital
Universitário/Centro de Atenção à Saúde da Universidade Federal de Juiz de Fora/HUCAS. Ainda como parte integrante da atenção dispensada aos portadores do vírus, é
disponibilizado o tratamento antirretroviral, comumente chamado coquetel.
O Programa Nacional de DST/AIDS, descentralizado em Programa Municipal de
DST/AIDS nos municípios objetiva o cuidado integral em saúde abarcando a Promoção,
Proteção/Prevenção e o Diagnóstico e a Assistência. Conciliando estes dois aspectos, o
Programa apregoa além do cuidado convencional – consultas, exames, coquetel –, o
desenvolvimento de atividades educativas, não apenas voltadas para a população
acometida, mas também para todo segmento da sociedade, com vistas à promoção da
saúde.
O conceito de Educação em Saúde liga-se diretamente ao de promoção da saúde,
pois abarca processos que visam não só a qualidade de vida daquela parcela dos
indivíduos acometidos por algum risco social, mas também o bem-estar da população
como um todo, reforçando o conceito ampliado de saúde que busca, entre outros,
preconizar aspectos comunitários, ambientais e sociais. Assim, o conteúdo educativo
preconizado pelo Programa nas atividades de grupo, sala de espera, atendimento
individual, campanhas, dentre outras, aparece como elemento importante no cuidado em
HIV/AIDS.
Nas primeiras décadas do surgimento da epidemia, quando não se tinha uma
dimensão de totalidade sobre a doença, as ações perpassavam um crivo biologicista e
discriminatório voltado para a adoção de comportamentos ditos saudáveis, numa relação
verticalizada entre profissionais/usuários/serviços. Com os avanços da medicina e uma
compreensão mais global dos elementos que envolvem o adoecer em AIDS, atualmente
os profissionais de saúde e os serviços também se preocupam com o aspecto subjetivo
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da doença – a adesão ao tratamento, o abandono do mesmo, as questões culturais, o
estigma, a família, dentre outros, para além do aspecto objetivo: o diagnóstico positivo e o
coquetel. Hoje, é possível perceber o desenvolvimento de um trabalho pedagógico mais
político do que disciplinador.
A preocupação com (...) [o ato educativo] como mediação social para
fortalecer grupos e diminuir desigualdades (...). A pedagogia da
problematização (...) [tem] o intuito de desenvolver propostas educativas
voltadas para a ampliação da capacidade técnica e da consciência crítica
de adultos (...). Problematizar significa levantar os problemas com seus
diferentes aspectos e de acordo com o entendimento dos diferentes
atores sociais ou participantes da situação. (STOTZ, DAVID e
BORNSTEIN, 2007, 57-58).
O
educar
em
saúde
em
HIV/AIDS
na
atualidade
busca,
na
relação
usuário/profissional o desenvolvimento da consciência crítica dos indivíduos em relação
aos problemas de saúde com a não-transmissão vertical de informações; o
estabelecimento de relação entre saberes popular e científico; o privilegiamento de
espaços coletivos com trabalhos individuais e em grupo ricos em debate e participação.
Logo, esta forma de educar está voltada para assegurar pelo menos três tipos de direitos:
o direito à informação, o direito ao acesso e o direito à assistência.
No que concerne ao direito à informação, o conjunto informação/comunicação é
tônica que compõe o conteúdo de reforço à cidadania preconizada por esta outra
modalidade de educar em saúde, cidadania esta entendida como direito “construído
coletivamente, não só em termos de necessidades básicas, mas de acesso a todos os
níveis de existência” (MANSINI-COVRE, 1998, p.11). A informação aqui é concebida não
como a simples passagem de dados e fatos, mas uma interlocução de qualidade que
proporcione ao cidadão arcabouço para exercer seus direitos (GENTILLI, 1995).
Em todos os espaços da vida moderna, em especial no âmbito da saúde, a
disseminação de informações é fundamental. Como princípio inscrito na Lei 8.080-90,
demonstra que o usuário tem o direito de receber toda informação necessária sobre seu
estado de saúde. Entretanto, apenas informar não é suficiente para que os cidadãos
formem opinião e se apoderem das rédeas de suas vidas. É preciso, haver inter-relação
entre os indivíduos, no sentido do diálogo e do exercício da fala e da escuta para a
reflexão (PERUZZO, 2007; PASQUALI, 2005). Desta forma, as práticas educativas em
saúde de cunho crítico inscrevem-se em “um processo que se insere num tipo de ação de
levantamento de problemas e busca de soluções compartilhadas, [onde] não existe um
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‘que sabe e ensina’ e outro ‘que não sabe e executa’” (STOTZ, DAVID e BORNSTEIN,
2007, p. 54).
A partir do entendimento da informação como um direito, abre-se espaço para o
direito ao acesso. Para Travassos, Oliveira e Viacava (2006, p. 2), o acesso “refere-se à
possibilidade de utilizar serviços de saúde quando necessário”. Os indivíduos, de posse
das informações que auxiliarão seu processo de cuidado, passam a procurar os serviços
de acordo com suas necessidades, buscando soluções para as questões apresentadas,
interagindo com o processo educativo.
Do direito de acesso, a Educação em Saúde Crítica promove o direito à
assistência pautada no acolhimento, na responsabilização e no vínculo. Segundo Ramos
e Lima (2003, p.29),
o acolhimento evidencia as dinâmicas e os critérios de acessibilidade a
que os usuários estão submetidos. (…) Assim, o acolhimento constitui-se
em tecnologia para a reorganização dos serviços, com vistas à garantia
de acesso universal, resolutividade e humanização do atendimento.
Para fortalecer estes direitos preconizados nas práticas educativas mais amplas,
um trabalho em equipe consolidado torna-se de fulcral importância e o Assistente Social
possui sua contribuição.
2 - O Assistente Social como Educador em Saúde nas Ações Voltadas ao HIV/AIDS
O Serviço Social, enquanto uma profissão em interface com a saúde, trabalha
numa perspectiva ampliada de saúde, fazendo um intercâmbio entre os aspectos
biopsicosociais e culturais de forma a perceber o usuário enquanto um ser integral,
portador de direitos e múltiplas demandas. Desenvolve uma intervenção em saúde
pautada nos preceitos da Reforma Sanitária, destacando o processo de democratização
das relações e a universalização do direito à saúde, reforçando os princípios e diretrizes
do SUS de: universalidade, integralidade, equidade, descentralização e controle social.
O enfoque do educar voltado para a autonomia dos indivíduos impulsiona o
profissional a perceber e lidar com o universo cultural do usuário e a compartilhar os
conteúdos de seus saberes, estabelecendo relações de vínculo e responsabilização,
promovendo uma atenção mais humanizada e integral à disposição da comunidade
demandante.
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O trabalho realizado pelo Assistente Social nos serviços de referência em
HIV/AIDS, especialmente em conjunto aos demais profissionais que compõem a equipe
de saúde, ao optar por um educar em saúde crítico considera a importância do exercício
do diálogo, da pertinência do universo cultural dos usuários e do incentivo ao
posicionamento crítico e à reflexão sobre a realidade social. No trabalho educativo voltado
ao HIV/AIDS, o Assistente Social, enquanto educador em saúde, procura captar as
necessidades humanas através da realidade em que vive a população.
Para Agnes Heller (1986), as necessidades não têm só uma conotação econômica
e, quando são assim reduzidas, ocorre o processo de alienação. O processo de
percepção dessas necessidades não é algo fácil. O primeiro elemento que aparece
geralmente é a demanda a ser resolvida – por exemplo, a demanda pelo coquetel no caso
da AIDS. Num exercício de escuta qualificada, pode-se, a partir dessa demanda aparente
(o medicamento), descobrir uma necessidade (essência), que é maior e mais complexa.
Assim, para Heller, as verdadeiras necessidades são aquelas ligadas à emancipação
humana, desencadeada pela reflexão global e não aparente das situações, e qualquer
outra manifestação será apenas demanda. Pertinente a este questão, Stotz (2004, p.1)
aponta que as “necessidades de saúde ligam-se ao conceito que se tem de saúde”. Para
o autor, “falar em necessidades de saúde significa admitir a saúde como um direito dos
cidadãos e um dever do Estado” e, mais ainda, “necessidades são individualmente
sentidas; são biológica e socialmente determinadas; sua atenção, satisfeita socialmente, é
o sinal de seu reconhecimento” (STOTZ, 2004, p.3). Logo, o educar em saúde crítico
apresenta como elemento marcante a escuta das necessidades e a proposição de
soluções conjuntas para o fato apresentado.
No cotidiano do trabalho do Assistente Social, a solução de problemas significa
não uma tarefa em que os indivíduos resolvem por si só suas questões, mas envolve
todos os sujeitos imbricados na relação de cuidado em saúde: usuários, profissionais,
gestores e instituições. Segundo Assis (1998, p. 7), na prática educativa crítica, “a
intervenção (...) tenderia a se encaminhar para a busca de soluções coletivas dos
problemas de saúde”, ou seja, contribuir de alguma maneira para o incremento da luta por
direitos. Assim, a Educação em Saúde Crítica, sob os pilares da participação, da
cidadania, da dialogicidade, pode ser percebida como estratégia que privilegia o método
de resolução de problemas.
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Assis, Stotz, Valla, dentre outros, são alguns autores contemporâneos que
defendem a Educação em Saúde como aquela que prima pelo diálogo entre os atores
envolvidos, no sentido da busca de soluções conjuntas dos problemas de saúde,
objetivando, como produto, a qualidade de vida e a reflexão sobre os determinantes
sociais que desencadeiam a saúde e o cuidado. Seguindo esta mesma linha, encontra-se
o Serviço Social que, já na década de 1950, ensaiava uma postura diferenciada no trato
com o usuário, o que pode inferir certa proximidade com o pensamento de Paulo Freire e
das práticas educativas emancipatórias contemporâneas, através do modelo “solução-doproblema”.
Na literatura que trata da solução de problemas, dentro da produção do Serviço
Social, destacam-se os estudos de Helen Perlmann na década de 1950, que trazem uma
contribuição do Serviço Social à Educação em Saúde. Segundo a autora, o modelo
“solução-do-problema” requer processo de aprendizagem, ou seja, aprender a lidar com
as situações que aparecem no cotidiano. Isso porque, sendo a vida humana um processo
de solução de problemas, os indivíduos em suas relações com o outro, com as
circunstâncias, serviços e instituições agem no sentido de resolver questões, buscando a
qualidade de vida. Para lidar com as situações-problema, faz-se necessário a busca de
soluções conjuntas construídas na mediação dos profissionais com os usuários. Isso
significa que os indivíduos não têm que resolver os problemas sozinhos, pois muitos deles
rebatem no âmbito coletivo e não somente no individual. No processo de resolução de
situações-problema, encontram-se estreitamente relacionados, além dos indivíduos, os
profissionais, os serviços e todo arcabouço técnico-operacional disponível. Segundo
Perlman (1976, p. 34), na solução de problemas estão os “4 Ps”:
Uma pessoa assediada por um problema procura solução em um local
[place] (obra social ou outra instituição social) e lhe é oferecida ajuda por
um AS [assistente social], cujo processo profissional simultaneamente
engaja e intensifica suas (...) capacidades de solucionar os problemas
e/ou intensificar (...) recursos para consegui-lo.
Dito de outra forma: o usuário tem um problema de saúde ou necessidade de
saúde, recorre a um serviço de saúde e busca um processo de trabalho acolhedor e
interativo, voltado para discutir e orientar decisões a serem tomadas por ele. O usuário,
neste processo, aprende a solucionar seu problema de saúde e, gradativamente, se
qualifica para novas decisões, assegura a formação da cidadania e fortalece a
7
compreensão de seus direitos, entre eles o direito de receber toda informação sobre seu
estado de saúde.
Os “4 Ps” adotados por Perlman (1976) estão em constante interação. Num
quadro de saúde, por exemplo em HIV/AIDS, o usuário procura o serviço de saúde, fala
sobre o que lhe aflige e recebe explicações e orientações. Receber informação qualificada
sobre o seu estado de saúde é primordial para que o problema seja resolvido ou, ao
menos, controlado. O ato de bem informar o usuário, esclarecendo suas dúvidas e
acolhendo suas angústias revela o caráter responsivo do serviço em relação à população.
A responsabilização desencadeia outros processos como o de acolhimento e vínculo,
ampliando a reflexão de todos os atores sociais envolvidos no cuidado em saúde,
proporcionando ou despertando capacidades para solução das questões apresentadas,
rompendo a aparência, buscando a essência dos fatos.
A solução de problemas em HIV/AIDS, vista sob um ângulo ampliado, demanda a
participação. Segundo Bordenave (1992), a participação promove a democracia, sendo
facilitadora do crescimento da consciência crítica dos indivíduos, fortalecendo o poder
reivindicatório e de ampliação desse poder. No processo participativo em busca da
solução de problemas em HIV/AIDS, a educação – não bancária, depositária de
informações sem diálogo com o outro – contribui na medida em que instiga o indivíduo
sobre seu papel enquanto sujeito e não paciente. O Assistente Social, neste contexto,
auxilia este processo de cuidado ao preconizar, amparado em seu código de ética, a
autonomia e o direito do usuário em se cuidar e ser cuidado, seja no plano coletivo, seja
no plano individual.
À Guisa de Conclusão
No contexto histórico em que se concebe a saúde como direito de todos e
sinônimo de qualidade de vida, o educar em saúde é uma prática política que se propõe a
contribuir para a formação da consciência crítica. Seu papel enquanto prática políticopedagógica é o de possibilitar uma concepção abrangente de saúde. Para Assis (1998, p.
8), “os trabalhos nesta perspectiva crítica questionam a transmissão vertical de
informações e trazem a preocupação de valorizar o saber popular sobre as questões de
vida e saúde” e devem levar em consideração tanto a abordagem individual quanto a
coletiva.
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As atividades educativas desenvolvidas pelos profissionais de saúde, dentre eles o
Assistente Social – em qualquer nível de atenção –, concentram em si um grande
potencial, na medida em que podem contribuir para que o indivíduo amplie sua
compreensão acerca tanto de seu estado de saúde, quanto dos determinantes sociais
que envolvem o adoecer e o estar sadio em HIV/AIDS, favorecendo um posicionamento
crítico com relação ao contexto social e à qualidade de vida. Entretanto, para que se
consiga promover as atividades de Educação em Saúde – pautada no eixo emancipatório
– faz-se preciso vencer desafios e reforçar as conquistas como o tratamento em
HIV/AIDS. Para os segmentos comprometidos com uma visão global de um cuidado em
saúde, destaca-se como fator positivo o aprendizado que possui mão dupla: o
aprendizado pessoal (onde o lidar com o outro pode despertar um novo ser naquele que
aplica o cuidado) e o aprendizado profissional (em que vão se aprimorando técnicas,
incorporando saberes e vivências).
Destacando o papel do Serviço Social neste processo de aprendizagem
compartilhada em HIV/AIDS, pode-se dizer que a contribuição do assistente social reside
no fato de seu projeto ético-político possuir estreita vinculação com o objetivo máximo da
Educação em Saúde: a promoção da cidadania, a autonomia, a emancipação da pessoa
humana, o respeito aos saberes, busca de condições de vida mais dignas e igualitárias.
De acordo com o Código de Ética (1993:13-14) desse profissional, constitui-se em alguns
dos princípios fundamentais da profissão
O compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e
com o aprimoramento intelectual na perspectiva da competência
profissional; Posicionamento em favor da equidade e justiça social, que
assegure a universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos
programas e políticas sociais, bem como a gestão democrática;
Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas
políticas a ela inerentes – autonomia, emancipação e plena expansão
dos indivíduos sociais.
O educar em saúde em HIV/AIDS é um dinâmico processo em construção e, que
tende a alçar resultados próximos aos almejados a partir participação igualitária de todos
os agentes envolvidos (usuários, família, profissionais e gestores).
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