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EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
MATERIAL DE APOIO AO PROFESSOR
*
REFORMA E RESTAURO DO
ANTIGO PAÇO MUNICIPAL
DE PARATY
Março de 2012
1
SUMÁRIO
Apresentação
03
UNIDADE I - O que é Arqueologia
Os vestígios arqueológicos
O sítio arqueológico
Os sambaquis
A arte rupestre
O trabalho do arqueólogo
04
06
07
08
09
10
UNIDADE II - O que é Patrimônio Cultural
Preservação
Sobre o tombamento
A candidatura de Paraty a patrimônio mundial
O patrimônio natural e cultural de Paraty
As comunidades tradicionais (indígenas, caiçaras e quilombolas)
Quem são os Guarani
A aldeia de Paraty-Mirim
Comunidades quilombolas
Quilombo do Campinho
Comunidades caiçaras
As festas religiosas e populares
A Ciranda
O Carnaval
O patrimônio histórico e arquitetônico
Caminho do Ouro
Museu de Arte Sacra de Paraty
Forte Defensor Perpétuo
13
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20
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33
UNIDADE III – A evolução da cidade de Paraty
O povoamento da região de Paraty
As sesmarias
A antiga Vila de Paraty
Os séculos XIX e XX
Os sobrados de Paraty
O antigo Paço Municipal de Paraty
Documentos queimados
Técnicas construtivas tradicionais
Alvenaria de pedra
Pau-a-pique ou taipa de mão
Enxaimel
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51
51
52
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Sugestão de atividades
54
Fontes de consulta
55
2
Apresentação
Este material foi elaborado com o objetivo de auxiliar professores e
educadores de Paraty a desenvolverem atividades de educação patrimonial junto
aos alunos, apresentando conceitos e informações sobre arqueologia, sobre o rico
patrimônio cultural de Paraty e sobre a restauração do Antigo Paço Municipal, uma
das mais importantes edificações do conjunto arquitetônico situado no Centro
Histórico da cidade.
O material vem acompanhado de fotos e imagens que podem ser trabalhadas
em sala de aula e de sugestões de atividades que poderão ser desenvolvidas nas
escolas, de modo que os estudantes tenham acesso a informações e possam
reconhecer a importância de preservar o patrimônio cultural local.
As sugestões de atividades foram pensadas tendo como público-alvo alunos
dos 8º e 9º anos do ensino fundamental e alunos do ensino médio.
As atividades educativas sugeridas poderão ser realizadas após a visita dos
alunos ao Antigo Paço Municipal, tanto durante o trabalho de reforma e
restauração como após a conclusão das obras do prédio, ocasião em que os
visitantes poderão ver exposição fotográfica (fotos antigas e fotos da obra) e
exposição das peças arqueológicas encontradas no local.
3
UNIDADE I - O que é Arqueologia
A Arqueologia pode ser definida como a ciência que estuda o passado humano a
partir dos vestígios e restos materiais deixados pelos povos. A Arqueologia PréHistórica estuda vestígios de sociedades que não dominavam a escrita, enquanto a
Arqueologia Histórica se debruça sobre os vestígios de sociedades que dominavam
essa forma de expressão. Mas esta ciência não estuda apenas o passado remoto da
humanidade. Assim, estudos vêm sendo desenvolvidos no subsolo de grandes
cidades, nas sedes de antigas fazendas, em quilombos, campos de batalha, navios
naufragados e fortes, permitindo que se conheçam inúmeros aspectos do cotidiano
que geralmente não constam dos documentos oficiais. É muito grande a
responsabilidade do arqueólogo: muito antes de ser um pesquisador, ele é um
cientista voltado à preservação da herança cultural humana.
Estatueta feminina em argila, Santarém (PA).
Acervo: MAE- USP. Foto: Wagner de S. e Silva
Ponta de flecha em sílex. Acervo: MAE-USP.
Foto: Wagner de S. e Silva
Peso para sal datado de 1822, encontrado na Casa de Registro. Fonte: Dossiê de candidatura de Paraty a
Patrimônio Mundial UNESCO. Foto: Adriana Mattoso
4
Colhendo informações para a pesquisa
etnoarqueológica entre grupos Xerente, TO.
Acervo: MAE - USP
Foto: Walter F. Morales
A Etnoarqueologia estuda o indígena atual para
compreender sociedades extintas.
Acervo: MAE - USP
Foto: Walter F. Morales
Cotidiano em aldeia Xerente no Tocantins: produção de cestaria em palha.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia - USP
Foto: Walter F. Morales
5
Os vestígios arqueológicos
cabanas),
Através dos mais variados vestígios
(como
materiais deixados pelas sociedades
estruturas construídas pelo homem
antigas,
(aparentes ou já escondidas sob o
o
arqueólogo
procura
as
inscrições
pinturas
rupestres)
invisível,
irrigação, caminhos ou ruínas de casas
comportamentos
e
vestígios
materiais
portanto,
as
pistas
crenças,
ideias.
Os
canais
e
solo),
pelas
antigos
desenhos
reconstituir o mundo que lhe é
formado
como
e
de
e outras edificações.
constituem,
de
que
o
arqueólogo dispõe para reconstruir os
diferentes modos de vida do passado.
Estes vestígios podem ser artefatos,
objetos, fragmentos ou evidências
(como vasos de cerâmica ou de pedra,
ferramentas em pedra lascada e
pedra polida, sepultamentos ou urnas
funerárias, restos de fogueira, silos e
Buscando vestígios através de sondagens
manuais. Sítio Areia Branca 5, Itapeva, SP.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia-USP
Foto: Paulo De Blasis
até os buracos de estacas das
Escavação de uma estrutura de sepultamento,
sítio Areia Branca 6, Itapeva, SP.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia-USP
Foto: Paulo De Blasis
Detalhe de sepultamento em Água Vermelha,
SP. Acervo: Museu de Arqueologia e EtnologiaUSP.
Foto: Erika González
6
O sítio arqueológico
arqueológicos
Sítio arqueológico é o nome dado ao
considerados bens patrimoniais da
local onde os vestígios das atividades
União.
humanas
arqueológicos é feito por interesse
do
passado
ficaram
preservados. Existem vários tipos de
sítios
arqueológicos
sambaquis,
abrigos
os
(como
os
aldeamentos,
os
rupestres).
Os
O
brasileiros
registro
de
são
bens
científico ou ambiental.
sítios
arqueológicos são muito variados,
apresentando
grandes
diferenças
entre si: podem ser uma grande
aldeia ou um pequeno acampamento
de caça. Um sítio arqueológico pode
ser definido também pelo potencial
Diferentes áreas de escavação permitem
conhecer a dimensão e profundidade do sítio.
Água Vermelha, SP.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia-USP
Foto: Eduardo Goes Neves
de descobertas que ele oferece –
quanto
mais
antigo
e
mais
transformações ele tenha passado,
mais importantes são as informações
que ele pode conter. Da mesma
forma, um sítio pode apresentar
grande variedade e quantidade de
objetos, ou pode conter um único
Toca do Cassununga (Paraty - RJ)
Foto: André Bazzanella Escritório Técnico IPHAN na Costa Verde
tipo de evidência. Todos os sítios
Mapeando sítio arqueológico com o auxílio de teodolito.
Sítio Areia Branca 5, Itapeva, SP.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia-USP
Foto: Erika González
Trecho do antigo Caminho do Ouro (Paraty-RJ)
7
Os sambaquis - O nome sambaqui vem da
língua tupi (tampa = marisco, e ki =
amontoado), e é mais ou menos isto que os
sambaquis
representam.
Grupos
que
habitaram o litoral tinham o hábito de juntar
em um mesmo lugar as coisas que faziam e
comiam. Em um sítio sambaqui encontramos
marcas de fogueiras, de habitações, restos de
alimento e dezenas de sepultamentos.
Encontramos, ainda, muitos dos instrumentos
que os grupos utilizavam em suas atividades,
como pontas projéteis em osso, lâminas de
machado, quebra-coquinhos, agulhas, pesos
de rede, anzóis e outros mais.
Colar feito a partir de dentes de
mamíferos e peixes encontrado em
sambaqui, SP.
Acervo: MAE-USP.
Foto: Wagner de S. e Silva
Toca do Cassununga (Paraty - RJ). Foto: Escritório
Técnico IPHAN na Costa Verde – André Bazzanella
Monumento construído com conchas, o sambaqui se
destaca na paisagem. O sitio Figueirinha-I, em
Jaguaruna (SC), atinge aproximadamente 15 metros de
altura. Foto: Paulo De Blasis
8
A arte rupestre
No Brasil, as pinturas rupestres mais antigas datam de 12 mil anos de idade e
foram encontradas na região de São Raimundo Nonato, no Piauí. São desenhos
de animais, pessoas, plantas e objetos, muitas vezes retratando cenas da vida
cotidiana ou eventos cerimoniais. Esses desenhos são testemunhos gráficos de
antigos agrupamentos humanos. Além das pinturas, muitos sítios apresentam
outro tipo de arte rupestre, as gravuras, feitas com a técnica da
abrasão(raspagem) das pedras, resultando figuras em baixo relevo.
Pinturas sobrepostas em paredão rochoso. Parque Nacional da Serra da Capivara.
Toca do Boqueirão da Pedra Furada (PI).
Acervo: Zanettini/Documento.
Foto: Erika González
Gravuras geométricas encontradas em sítio
(abrigo), região do alto Araguaia, MT.
Foto: Erika González
Figuras de animais em paredão rochoso, GO.
Foto: Irmhild Wust
9
O trabalho do arqueólogo
Para
realizar
arqueólogo
seu
trabalho,
o
procura
identificar
e
escavar sítios arqueológicos, onde
documenta
estruturas
e
coleta
objetos que pertenceram ao cotidiano
de uma determinada sociedade. Em
seguida, inicia a fase de estudos e
trabalhos
sistemáticos
em
laboratório, onde procura relacionar
Entendendo e interpretando o tempo através
das camadas de sedimentos.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia USP.
Foto: Paulo De Blasis
os objetos coletados ao grupo que os
produziu e ao seu modo de vida.
O arqueólogo realiza assim uma série de atividades, como o preenchimento de
fichas de cadastro, medição da área, descrição dos vestígios, registro fotográfico,
coleta de peças, análises e estudos de laboratório. As equipes de pesquisa contam
com especialistas de diferentes áreas: zoólogos, geógrafos, geólogos e
antropólogos físicos, entre outros. Do mesmo modo, o arqueólogo lança mão de
procedimentos e análises desenvolvidos em outras áreas de conhecimento, como a
matemática, a física e a química.
Arqueólogos examinando paredões no vale do rio Tocantins,
em busca de inscrições rupestres.
Acervo: Museu de Arqueologia e Etnologia – USP.
Foto: Erika González
10
Uma das principais atividades é a
humana
escavação arqueológica. A noção de
peças
escavação está fortemente vinculada
profundos
ao
ocupação bem mais antiga.
processo
geológico
de
mais
recente,
encontradas
em
pertenceriam
enquanto
estratos
a
uma
estratificação do solo, que obedece à
denominada "lei da superposição": as
camadas
superiores
do
terreno
seriam resultado de ações recentes,
enquanto camadas inferiores e mais
profundas seriam resultado de ações
antigas.
A
deposição
de
peças
arqueológicas no solo obedece ao
mesmo princípio geral: as encaixadas
Escavação no Sítio Sauipe 17, Sauipe, BA.
Foto: David Glatt
nos estratos próximos à superfície
seriam relacionadas a uma ocupação
Mesmo quando feita com grande cuidado, a escavação é uma atividade destrutiva:
ao retirar as peças do solo, o arqueólogo está "apagando" os vestígios de nosso
passado. Isto quer dizer que não é possível repetir uma escavação, e por esta razão
o pesquisador precisa realizar uma documentação bastante precisa e rigorosa.
Assim fichas, diários, mapas, plantas, desenhos, fotografias, filmagens e
depoimentos constituem, juntamente com o conjunto de peças coletadas, os
ingredientes para o estudo em laboratório.
Técnica de relevé, utilizada para a reprodução
de grafismos.
Acervo: MAE – USP.
Foto: Erika González
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Sítio pré-histórico Santa Elina, Jangada (MT).
Foto: Flávio Calippo
Químico e arqueólogo colhendo amostra para
análise. Cidade de Pedra, Rondonópolis (MT)
Foto: Karin Shapazian
Para realizar uma pesquisa arqueológica, é necessário possuir graduação. No Brasil,
existem poucos cursos de graduação em arqueologia e em algumas faculdades há
somente pós-graduação (mestrado ou doutorado).
Com o diploma o arqueólogo está apto a realizar uma pesquisa, mas antes deve
entrar em contato com o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional), órgão federal que é responsável pela proteção dos bens culturais do
nosso país.
Para realizar uma pesquisa, o arqueólogo segue um procedimento. É necessário
montar um projeto, possuir uma equipe e ter documentos para solicitar
autorização de pesquisa ao IPHAN. Após aprovação desta primeira etapa do
processo, a autorização é publicada no Diário Oficial da União, com um período
determinado para início e conclusão do estudo.
Se algum dia identificarmos um material de populações antigas ou um sítio
arqueológico, como um abrigo com pintura rupestre, devemos contatar o IPHAN (o
Escritório Técnico do IPHAN na Costa Verde fica na Praça Monsenhor Hélio Pires
s/n – Centro Histórico - Tel: 3371-6291), que pedirá a um profissional para realizar
uma pesquisa. A destruição de qualquer material arqueológico ou cultural constitui
crime, sujeito a pena de multa.
O trabalho no edifício do antigo Paço Municipal segue todas essas exigências, tanto
no âmbito arquitetônico como arqueológico. Este sítio faz parte do patrimônio
cultural e está protegido pela constituição brasileira e pela Lei Federal nº 3924/61.
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UNIDADE II - O que é Patrimônio Cultural
O patrimônio cultural é o conjunto de manifestações, realizações e representações
de um povo, de uma comunidade. É o conjunto de bens materiais e imateriais que
por seu relevante valor simbólico se associa à história ou à identidade cultural de
um determinado agrupamento humano.
Ele está presente em todos os lugares e atividades: nas ruas, em nossas casas, em
nossas danças e músicas, nas artes, nos museus e escolas, igrejas e praças. Nos
nossos modos de fazer, criar e trabalhar. Nos livros que escrevemos, na poesia que
declamamos, nas brincadeiras que organizamos, nos cultos que professamos. Ele
faz parte de nosso cotidiano e estabelece as identidades que determinam os
valores que defendemos. É ele que nos faz ser o que somos.
Museu da Inconfidência - Ouro Preto (MG)
Fonte: Wikipedia
Ceramista em atividade - Acervo IPHAN
Tatuagem usando grafismo indígena
Acervo IPHAN
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Os elementos naturais também fazem parte do patrimônio cultural - o Brasil é
repleto de exemplos, como o Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro, as Cataratas do
Iguaçu, no Paraná, ou o encontro das águas que formam o rio Amazonas, em
Manaus.
Morro do Pão de Açúcar (RJ).
Fonte: Wikipedia
O encontro das águas na confluência dos rios
Negro e Solimões (Manaus - AM).
Fonte: Wikipedia
Panorâmica do lado brasileiro das Cataratas do Iguaçu (PR). Fonte: Wikipedia
O patrimônio cultural de cada comunidade é importante na formação da
identidade de todos nós, brasileiros. A herança cultural permite a uma sociedade
reconhecer suas origens e compreender a necessidade de transmitir esses valores
às gerações futuras.
Preservação
O termo preservação é usado para designar o conjunto de ações que se destinam à
proteção e conservação de bens culturais cujo significado e permanência
constituem referenciais importantes para a memória de uma nação, de um povo,
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de uma cidade ou região. A proteção desses bens garante às gerações futuras o
conhecimento de sua própria história e cultura, promovendo, dessa forma o
exercício da cidadania. Preservar é, em suma, conhecer, identificar, valorizar,
proteger, conservar e, em muitos casos, restaurar a integridade dos bens culturais,
sejam eles físicos ou simbólicos. O Estado tem papel fundamental nessa tarefa,
servindo-se de vários instrumentos legais que são utilizados de acordo com a
natureza dos bens que se destinam à preservação.
Sobre o tombamento
Tombamento é a declaração de que um bem se encontra sob proteção oficial,
mediante seu registro em livro próprio do órgão de proteção ao patrimônio
cultural, nos níveis federal, estadual ou municipal. Os tombamentos federais são da
responsabilidade do IPHAN e começam pelo pedido de abertura do processo, por
iniciativa de qualquer cidadão ou instituição pública. O tombamento tem como
objetivo preservar bens materiais de valor histórico, cultural, arquitetônico,
ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo a destruição
e/ou descaracterização de tais bens. Pode ser aplicado aos bens móveis e imóveis,
de interesse cultural ou ambiental. É o caso de fotografias, livros, mobiliários,
utensílios, obras de arte, edifícios, ruas, praças, cidades, regiões, florestas, cascatas
etc.
O nome "tombamento" tem origem lusitana e é uma referência ao Arquivo
Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa, local onde se acham preservados
documentos históricos ligados à formação e à expansão da nação portuguesa,
incluindo aqueles relativos às suas antigas colônias, como o Brasil. Tombar não
significa desapropriar o bem, o direito de propriedade é mantido, embora limitado
em vista da proibição quanto à demolição ou descaracterização. Cabe ao
proprietário zelar pela manutenção e conservação do bem tombado, como
também prestar contas de seu estado de conservação quando solicitado pelo órgão
governamental competente.
15
Com a finalidade de preservar o conjunto arquitetônico da cidade de Paraty, seu
entorno imediato e a paisagem do município, algumas edificações e determinadas
áreas foram tombadas pelo governo estadual e pelo governo federal. Em 1945 o
sítio histórico foi elevado à categoria de Monumento Histórico do Estado do Rio
de Janeiro. Esse mesmo sítio histórico foi tombado em 1958 pelo Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), englobando a Santa Casa de
Misericórdia. O Forte Defensor Perpétuo e as igrejas localizadas no interior do
sítio histórico foram tombados isoladamente. Em 1966 um decreto converteu a
cidade em Monumento Nacional, fixando áreas especiais de proteção no sítio
tombado. Em 1974, com o intuito de aumentar a área de proteção para além do
conjunto arquitetônico histórico (passando, assim, também a abranger toda a
mata circundante), foi tombado todo o território do Município de Paraty.
Vista do Centro Histórico a partir da baía de Paraty
Acervo Prefeitura Municipal de Paraty
16
A candidatura de Paraty a patrimônio mundial
No ano 2000, o então prefeito do município de Paraty encaminhou ofício ao Ministro
da Cultura para que se efetivasse a inscrição da cidade de Paraty na Lista Indicativa. À
época, a proposta recebeu a denominação de “O Parque Nacional da Bocaina e o
Conjunto Arquitetônico e Paisagístico de Paraty” e tinha como intuito a inscrição do
sítio como bem cultural.
A atual proposta para inscrição de Paraty na Lista do patrimônio mundial da UNESCO é
resultado da reformulação e aprofundamento do dossiê intitulado “O Caminho do
Ouro de Paraty e sua Paisagem”, apresentado em 2009. Em 2009, a UNESCO
recomendou uma mudança na abordagem proposta, reorientando a candidatura de
Paraty para a categoria de sítio misto, e não apenas como bem cultural, dadas as
singularidades da relação estabelecida entre as populações tradicionais, o sítio
histórico e a natureza. Essa solução faz justiça aos atributos de Paraty: lugar de
abundância, de exuberância e de riqueza, onde cultura e natureza se complementam
de tal forma que é difícil descrever até onde vai a obra natural e onde inicia a indústria
humana.
O Brasil, que apresentou em 2011 o terceiro dossiê de proposição, "Paraty, Cultura e
Natureza", agora sob a coordenação direta do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio), está convencido de que Paraty reúne todos os requisitos
necessários ao seu reconhecimento como Patrimônio da Humanidade e
enquadramento na Lista do Patrimônio Mundial como sítio misto, complementando e
engrandecendo ainda mais o seleto rol de excepcionalidades já reconhecidas pela
UNESCO.
Foram solicitadas revisão e complementações pela UNESCO que estão sendo
elaboradas neste momento pelo governo brasileiro.
Em amarelo – área proposta. Em vermelho – Zona de amortecimento Fonte: Dossiê de candidatura de
Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
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O patrimônio natural e cultural de Paraty
O patrimônio histórico e arquitetônico de Paraty é riquíssimo, fruto da origem
secular da cidade. A herança colonial e imperial permanece viva nos casarões, nos
sobrados, nas igrejas, nas ruas de Paraty, que preserva até hoje os seus encantos
arquitetônicos. Devido aos elementos de sua formação histórica, Paraty conta com
um vasto e rico patrimônio cultural.
A cultura paratiense se mantém e se renova ao longo do tempo, manifestando-se
em diferentes espaços onde se concentram e se reproduzem práticas culturais
coletivas. Essa riqueza cultural se revela também em festas religiosas (algumas
centenárias) e em manifestações artísticas.
Com cerca de 80% de sua área ocupada pela Mata Atlântica e com uma baía
exuberante, Paraty possui uma rica biodiversidade e em seu território foram
identificadas centenas de espécies de peixes, moluscos, aves, além de mamíferos
marinhos, mamíferos terrestres, répteis e anfíbios.
Serra da Bocaina. Fonte: Wikipedia
Praia Vermelha (Paraty – RJ). Foto: site Paraty
Convention & Visitors Bureau
Em Paraty há três Unidades de Conservação Ambiental, áreas com características
naturais importantes e limites definidos: o Parque Nacional da Serra da Bocaina, a
Área de Proteção Ambiental do Cairuçu e a Reserva Ecológica da Juatinga.
A riqueza ambiental de Paraty atrai turistas de todo o mundo, sendo cada vez mais
necessário e importante pensar em formas de preservar as tradições culturais
locais e diminuir o impacto ambiental associado ao turismo, tornando-o uma
atividade ecologicamente sustentável, geradora de renda e promotora de
desenvolvimento social e econômico para as comunidades locais.
18
Saco do Mamanguá.: Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
Foto: Adriana Mattoso
Fonte: Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
Foto: Renato dos Anjos
19
As comunidades tradicionais (indígenas, caiçaras e quilombolas)
Paraty possui comunidades étnicas que compõem um rico cenário de tradições que
ainda influenciam o modo de vida de toda cidade, sendo o elo entre várias
gerações.
Os saberes, conhecimentos e modos de fazer estão enraizados no
cotidiano das comunidades, apesar das influências que sofrem.
Quem são os Guarani
No
Brasil,
os
Guarani
são
aproximadamente 40 mil, subdivididos
em três grupos linguísticos: Nhándeva,
Kayová e Mbyá. Eles vivem, hoje, em
dezenas de aldeias espalhadas por mais
de 100 municípios de 10 estados
brasileiros. No Rio de Janeiro, os
Guarani que vivem no litoral sulfluminense são basicamente Mbyá, e
estão estimados em mais de 500
indivíduos distribuídos em quatro
aldeias: Sapukai, em Bracuí, no
município de Angra dos Reis, ParatyMirim, Araponga e Rio Pequeno, no
município de Paraty. Chegaram a partir
do final da década de 1940, em
sucessivas ondas migratórias, quando
se deslocaram discretamente do vale
do rio Paraná em direção ao litoral
fluminense, onde foram contatados,
em 1972, com a abertura da estrada
Rio-Santos.
A aldeia de Paraty-Mirim
A aldeia está situada às margens do Rio Carapitanga, próxima à estrada que dá acesso
a Paraty-Mirim. A população indígena que reside na aldeia não é originária da região,
perdeu grande parte de seu acervo cultural no que se refere às artes tradicionais
(como a música, a cerâmica e o tear) e procura resgatar as suas práticas culturais
ancestrais.
Foto: site Associação Nhandeva
Foto: site Associação Nhandeva
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Comunidades quilombolas
Quilombolas é designação comum dada aos escravos refugiados em quilombos, ou
descendentes de escravos negros cujos antepassados no período da escravidão
fugiram dos engenhos de cana-de-açúcar, fazendas e pequenas propriedades onde
executavam diversos trabalhos braçais para formar pequenos vilarejos autônomos
chamados de quilombos. No Brasil há mais de mil comunidades quilombolas que se
mantêm vivas e atuantes, lutando pelo direito de propriedade de suas terras.
Quilombo do Campinho
A comunidade Campinho da Independência foi fundada no século XIX por três
mulheres escravas (Marcelina, Antonica e Luzia) que viviam na casa grande da antiga
Fazenda Independência. Com o fim da escravidão, o senhor da fazenda doou às
mulheres a terra onde hoje vivem cerca de 120 famílias remanescentes de antigos
escravos. Os habitantes do local têm um histórico de lutas e conquistas pela
regularização de suas terras. A comunidade sobrevive em torno do artesanato
(cestaria, cerâmica), do plantio para venda e para consumo (milho, feijão, banana) e de
atividades ligadas ao turismo étnico (nas quais se pode travar contato com práticas
culturais como o jongo).
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Comunidades caiçaras
Caiçara é uma palavra de origem tupi que designava uma armadilha para cercar o
peixe. Com o passar do tempo, passou a ser o nome dado às palhoças construídas nas
praias para abrigar as canoas e os apetrechos dos pescadores e, mais tarde, para
identificar o morador de Cananeia. Posteriormente, passou a ser o nome dado a todos
os indivíduos e comunidades do litoral dos Estados do Paraná, São Paulo e Rio de
Janeiro.
Comunidade caiçara (Paraty - RJ) Fonte: Wikipedia
Sede da Associação de Moradores e Amigos do Mamanguá. Dossiê de candidatura de Paraty a
Patrimônio Mundial UNESCO. Foto: Renato dos Anjos
Em Paraty existem comunidades de pescadores que ainda preservam alguns de seus
hábitos e características originais. As comunidades mais tradicionais estão localizadas
nas regiões mais isoladas, como Ponta Negra e Saco do Mamanguá. A abertura da
estrada BR 101 (Rio – Santos) provocou profundas transformações nessas
comunidades: grileiros, especulação imobiliária e turismo desordenado entre outros
fatores forçam a descaracterização de sua cultura. Históricos como a luta dos
moradores de Trindade e Praia do Sono são reflexos visíveis da luta pela perpetuação
de toda uma herança cultural.
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Pescador. Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
Foto: Adriana Mattoso
Pescador. Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
Foto: Dom João de Orleans e Bragança
Fonte: Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
Foto: Adriana Mattoso
23
As festas religiosas e populares
As festas religiosas e populares de Paraty representam uma das principais
manifestações do rico acervo da cultura imaterial existente na cidade. As
manifestações compreendem procissões, folguedos, festejos, cantorias e danças. Uma
das mais importantes manifestações religiosas é a Festa do Divino Espírito Santo
(“Festa do Divino”).
Festa do Divino. Fonte: Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO. Foto: Renato
dos Anjos
Em 2005 o IHAP - Instituto Histórico e Artístico de Paraty encaminhou ao IPHAN
requerimento solicitando o Registro de Bem Cultural de Natureza Imaterial da Festa do
Divino Espírito Santo da Cidade de Paraty. Após os trâmites junto ao IPHAN, a
Superintendência do Rio de Janeiro deu início ao Projeto de Identificação e Inventário para
o Referenciamento e Instrução do pedido de Registro da Festa.
Tendo em vista que a Festa do Divino de Paraty é uma manifestação em torno da qual se
aciona uma série de referências culturais atreladas à devoção, optou-se pela realização do
Inventário de Referências Culturais da Festa do Divino Espírito Santo da Cidade de Paraty
utilizando a metodologia do INRC – Inventário Nacional de Referência Cultural,
compreendendo este bem cultural a partir da categoria Celebrações.
Após 18 meses, o resultado do trabalho é a produção de um dossiê que reúne acervo de
registros audiovisuais e documentos pesquisados durante o Inventário; um registro em
DVD da edição da Festa do Divino inventariada no ano de 2009; a sistematização dos
dados nas fichas do INRC; além da produção de textos analítico-reflexivos, de caráter
etnográfico, que compõem a instrução do Processo de Registro.
As conclusões da pesquisa evidenciam a expressividade desse fenômeno religioso e
cultural, no entanto a decisão favorável ao Registro da Festa do Divino como Patrimônio
Imaterial do Brasil caberá ao Conselho Consultivo do IPHAN, instância máxima de decisão
do órgão, composto por representantes da sociedade civil de reconhecido destaque no
cenário nacional.
24
A Ciranda
A Ciranda veio de Portugal no período colonial, transformou-se e fincou raízes em
várias regiões do Brasil. Há alguns grupos de cirandeiros em Paraty, alguns mais
tradicionais e outros mais recentes, como a Ciranda Elétrica, que substituiu os
tradicionais instrumentos acústicos por instrumentos elétricos, embora mantendo a
raiz original. Segundo Diuner Mello, a Ciranda em Paraty antigamente era chamada de
Chiba: “Os Chibas, bailes na roça, duravam a noite toda. Lá se executavam vários tipos
de danças".
Foto: site Cirandas de Paraty
Ciranda. Fonte: Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial UNESCO.
Foto: Lia Capovila
25
O Carnaval
Durante o Carnaval, estão presentes nas ruas de Paraty vários blocos locais, a
tradicional banda Santa Cecília , os famosos bonecos Assombrosos do Morro,
Mascarados e o Bloco da Lama.
Os famosos bonecos , característicos do carnaval
de rua de Paraty. Foto: Giancarlo Mecarelli
Criado há 26 anos, o Bloco da Lama teve origem em uma simples brincadeira e se
tornou hoje um dos mais conhecidos blocos de Paraty. Os foliões têm o corpo
completamente coberto com a lama da praia do Jabaquara e surgem na tarde de
sábado de carnaval caracterizados como homens das cavernas.
O Bloco da Lama, uma das marcas do Carnaval paratiense.
Foto: Giancarlo Mecarelli
26
O patrimônio histórico e arquitetônico
O Centro Histórico de Paraty é um dos mais harmoniosos conjuntos arquitetônicos
coloniais do Brasil e reúne, entre seus 33 quarteirões, cerca de 500 construções
preservadas (casas térreas, sobrados, armazéns e praças). O traçado urbano foi
estruturado desde o início do século XVIII e os logradouros periféricos sofreram
ocupação e adensamento ao longo dos séculos XIX e XX.
O assentamento urbano de Paraty se estruturou em condições diversas das vilas que
até então se haviam estabelecido no Brasil – que buscavam a proteção de sítios
elevados, eram cercadas por muralhas ou paliçadas, apresentando malhas urbanas
irregulares, dotadas de quarteirões difusos onde predominava a linha curva. Paraty
buscou a planície, contígua ao porto, organizando-se segundo desenho geométrico, no
qual os quarteirões são claramente diferenciados e predomina a linha reta.
Como consequência, o atual centro histórico da cidade é formado por malha
francamente ortogonal, embora implantada com pouco rigor geométrico –
característica brasileira, que se distingue dos modelos mais regulares implantados
pelos portugueses no oriente, com os quais Paraty não deve ser confundido.
Vista aérea de Paraty – Acervo IPHAN
27
Além da estrutura regular, a paisagem urbana é marcada pela preponderância
absoluta da arquitetura colonial luso-brasileira, mesclando sobrados e casas térreas,
notabilizada pela quase ausência de conventos e organizações religiosas, de onde se
sobressaem as poucas igrejas mais por suas posições estratégicas na malha urbana do
que por dimensões ou suntuosidades – virtualmente inexistentes em Paraty. Em
síntese, o centro histórico de Paraty pode ser descrito como composto por vias
predominantemente retilíneas, pavimentadas por grandes pedras cortadas e
assentadas irregularmente, que apresentam como ponto de fuga o mar ou a
interposição de trechos do próprio casario – como regra, as ruas não são interceptadas
por praças nem por edifícios oficiais ou religiosos que direcionem as vias.
Rua Marechal Deodoro - Acervo João Miranda / IHAP
Igreja Matriz de Nª. Srª. Dos Remédios - Acervo IPHAN.
28
Vista parcial do Centro Histórico de Paraty tendo ao fundo o antigo Paço Municipal – Acervo IPHAN
Vista aérea de Paraty – Acervo IPHAN
29
Caminho do Ouro
Percorrido desde muito tempo pelos indígenas, esse caminho foi apropriado ainda no
século XVI pelos colonizadores europeus, que viram nele uma das melhores vias de
penetração no sertão então inexplorado - por ali circulou o metal extraído das minas
descobertas em meados do século XVIII no interior do Brasil. Decaída a produção do
ouro, o caminho permaneceu em uso, interligando o planalto ao litoral, conhecendo
mais tarde novo surto de riquezas no desenvolvimento da cultura cafeeira. Seu apogeu
histórico, entretanto, deu-se no momento em que constituiu o caminho oficial do
transporte do ouro – embarcado em Paraty para o Rio de Janeiro e depois para
Portugal.
Dos quase 2 mil quilômetros que ligam Paraty às cidades mineiras de Ouro Preto,
Mariana e Diamantina, está em Paraty o trecho pavimentado mais expressivo e bem
conservado do antigo Caminho do Ouro. O trecho de Paraty distingue-se pela
existência de larga extensão pavimentada, dotada das ruínas de pousos e registros,
cuja origem remonta ao século XVII e que conheceu sucessivas melhorias ao longo do
século XVII até meados do século XIX. Uma Carta Régia de 1703 mandou que se
instalasse na cidade uma Casa do Registro do Ouro para controlar o fluxo do metal
vindo das minas. A Casa do Registro ou Casa dos Quintos foi instalada no Caminho, no
alto da serra.
O trecho do Caminho do Ouro em Paraty encontra-se calçado de pedra, em excelente
e bom estado de conservação, por cerca de 75% do seu percurso. Os 25%
remanescentes deste trecho encontram-se perfeitamente identificáveis tendo porém
sofrido diferentes níveis de erosão natural. A pavimentação deste trecho do caminho
com pedras foi necessária devido à alta pluviosidade da Serra combinada com declives
acentuadíssimos. Por isto ele só se tornou trafegável com esse calçamento construído
com grandes cuidados de engenharia. Graças a isso esse trecho antigo do caminho do
ouro sobreviveu em sua materialidade enquanto outros trechos dessa rota tornaramse estradas hoje pavimentadas de asfalto ou desapareceram na mata ou na lama. Ele
foi utilizado como principal rota entre Paraty e o Vale do rio Paraíba do Sul até os anos
1950/60, quando da abertura da rodovia Paraty/Cunha.
30
Os trechos do século XVIII são compostos por pedras mais toscas, mais arredondadas e
menos resistentes. Já no século XIX o calçamento foi composto por rochas de formato
mais retilíneo, as maiores medindo mais de um metro de lado, entremeadas por areia
grossa e outras menores que dão uniformidade ao conjunto. A face superior é mais
regular. Têm em média 20 centímetros de altura, mas pedras enormes também foram
utilizadas, criando momentos impressionantes ao longo do percurso.
Esta camada superior se assenta sobre outra composta de saibro e pedregulho, cuja
espessura varia em torno de 10 centímetros. Os trechos do século XIX apresentam
uma faixa central de largura variando entre 60 e 80 centímetros, composta de pedras
mais largas e regulares, com duas faixas de bordo, com os blocos inclinados em direção
ao centro. Dessa forma, o centro da calçada apresenta um desnível em relação aos
bordos, e direciona o correr das águas da chuva.
O calçamento original foi construído em pedra seca, com trechos entre 3 e até 10
metros de largura, sustentado por muros de arrimo de até cinco metros de altura, que
acompanham as curvas de nível da serra. O Marco de Sesmaria, o sistema de
escoamento de águas pluviais com suas guias e drenos, bueiros, e especialmente uma
galeria de pedra cobrindo um vão de sete metros e meio, denominado viaduto, com
guarda-corpo e pingadeiras para proteger a estrutura da construção, atestam a
excelência da cantaria, técnica que constitui uma especialidade portuguesa.
Trecho do antigo Caminho do Ouro
(Acervo Sítio Histórico e Ecológico do Caminho do Ouro)
31
Museu de Arte Sacra de Paraty
O Conjunto arquitetônico, localizado no Largo de Santa Rita e tombado pelo IPHAN, é
composto por igreja, consistório, sacristia, cemitério com columbário e pátio
ajardinado. Entre 1967 e 1976, passou por minuciosa restauração, sendo adaptado
para funcionar como museu. O Museu de Arte Sacra de Paraty abriga importante
acervo de arte sacra pertencente a ordens religiosas da cidade, expondo peças dos
séculos XVII, XVIII e XIX, com destaque para as imagens da padroeira de Paraty (Nossa
Senhora dos Remédios), além das coroas e cetros usados nos cortejos de festas
religiosas tradicionais da cidade.
Museu de Arte Sacra, Igreja de Santa Rita.
Fotos: Cynthia Tarrisse
32
Forte Defensor Perpétuo
O Forte Defensor Perpétuo foi erguido em 1703 pelos colonizadores portugueses para
proteger o porto e defender o acesso à baía de Paraty dos ataques piratas. Com o
declínio econômico da região, o forte ficou em ruínas, sendo reconstruído em 1822,
quando recebeu o nome atual em homenagem ao imperador D. Pedro I. O forte foi
tombado pelo IPHAN em 1957 e restaurado nos anos 1960. No local há desde 1984
uma exposição permanente com objetos do artesanato da região, uma casa de farinha
e utensílios de cozinha de casa rural. Também fazem parte do acervo do Forte tachos
ou caldeirões para a produção de açúcar, de origem inglesa, e outras peças de
fazendas da região, como um tronco de escravos e tambores de Jongo, todos do
período colonial.
( site IPHAN)
( site IPHAN)
33
UNIDADE III – A evolução da cidade de Paraty
A história do antigo Paço Municipal está ligada à história de Paraty e às
transformações econômicas, políticas e sociais que a cidade sofreu desde o período
colonial. Antes de conhecer a história do prédio, portanto, é necessário abordar
alguns aspectos da história da cidade.
O povoamento da região de Paraty
A região da baía de Ilha Grande era habitada por povos indígenas. A
descoberta dessa região em 1502 está vinculada às primeiras expedições de
exploração da costa brasileira feitas pelos colonizadores portugueses. No entanto,
o seu povoamento pelos europeus só ocorreria décadas mais tarde a partir da
empreitada de Martin Afonso de Souza, que chega ao Brasil em 1530 com o
objetivo de encontrar caminhos que levassem às cobiçadas minas peruanas.
Naquele momento, Martim Afonso funda o
povoado de São Vicente e ao doar terras almejava
fixar moradores na porção que lhe cabia no “Novo
Mundo”. A partir de então, o povoamento da
capitania de São Vicente ocorreria de forma lenta.
Segundo o historiador Diuner Mello, estes
moradores de São Vicente aos poucos foram se
espalhando pelo litoral na direção norte e sul,
criando pequenos povoados e chegando à região
de Angra dos Reis.
Nessas
paragens,
naquela
ocasião,
os
tamoios, índios que ocupavam essa porção do
continente, comerciavam com os franceses o paubrasil,
animais selvagens exóticos e
peles.
Cronistas como Hans Staden e o padre José de
Anchieta deixaram testemunhos desse período e
As sesmarias
A colonização das
terras
brasileiras
ocorreu pelo sistema
de sesmarias, no qual
o donatário recebia
um pedaço de terra e
tinha a obrigação de
colonizá-la no prazo de
cinco anos, sob pena
de perdê-la. No caso
de Paraty as sesmarias
eram entregues a
colonos da capitania
de São Vicente. A
primeira sesmaria da
região foi criada por
volta de 1560 em
algum local do atual
município de Angra
dos Reis.
registram os primitivos nomes daquelas sítios.
34
Em 1596 a expedição de Martim Correa de Sá chega à região com o objetivo
de atingir o Vale do Paraíba. Para tanto, serviu-se de antigas trilhas indígenas: a
“Trilha dos Guaianás” (os guaianás eram índios que também habitavam aquela
região e que mantinham boas relações com os portugueses). O uso dessas trilhas
foi determinante nos anos seguintes, como explica Diuner Mello:
O certo é que a partir de então este lugar passa a ser ponto de entrada e
passagem obrigatória para os que buscavam o sertão, subindo o
caminho da serra. Vindos do Rio de Janeiro em barcos, daqui subiam a
serra até atingir São Paulo e o interior e por aqui entravam as
mercadorias vindas da Europa. Em virtude da movimentação existente
nesta região, do desenvolvimento do comércio de gêneros alimentícios,
tecidos e especiarias, enriqueceu o povoado.
A antiga Vila de Paraty
A fixação do primitivo núcleo de Paraty ocorreu a partir do Morro da Vila
Velha (atual Morro do Forte) e atendeu à necessidade de defesa do povoado,
situado em um ponto estratégico que possibilitava o controle do acesso à baía da
Ilha Grande. A ocupação dessa posição não foi, porém, duradoura e, em 1636,
Maria Jacomé de Mello doou parte da sua sesmaria para nela se estabelecer a
futura Vila de Paraty, entre a margem direita do Rio Perequê-Açu e a margem
esquerda do Rio Patitiba (atual Mateus Nunes).
35
Imagem aérea.
As áreas destacadas correspondem ao antigo Morro da Vila Velha e ao Centro Histórico.
36
O reconhecimento da vila (com o nome de Vila de Nossa Senhora dos
Remédios de Paraty) aconteceu em fevereiro de 1667, mediante carta régia de D.
Afonso VI. Em outubro do mesmo ano foi instalada a primeira Câmara Municipal e
foram nomeados os juízes e autoridades. Esse panorama, conforme explica Diuner
Mello, acelerou o desenvolvimento comercial, o plantio de cana-de-açúcar e a
fabricação de aguardente e açúcar.
A descoberta de ouro em Minas Gerais no final do século XVII transformou a
vila de Paraty em local de embarque do ouro e pedras preciosas para o Rio de
Janeiro, de onde seguiam para Lisboa, capital da metrópole. O antigo Caminho do
Ouro que ligava Paraty às zonas de mineração foi o elemento fundamental desse
processo. O movimento no porto de Paraty intensificou-se não apenas com o
embarque de ouro, mas também com a entrada de ferramentas, gêneros
alimentícios e escravos para abastecer São Paulo e as minas.
As primeiras descrições da Vila de Paraty, nas primeiras décadas do século
XVIII, revelam um rústico aglomerado cujas casas em sua grande maioria são
erguidas em taipa e cobertas de palha. Entretanto, o comércio com a região das
minas incrementou a economia da vila trazendo certa abastança que se refletiu em
algumas construções nas quais se utilizou a alvenaria de pedras.
Uma característica do desenvolvimento urbano de Paraty foi a preocupação
com a padronização estética de suas construções. Desde o final do século XVIII
foram criadas normas para as edificações de modo a garantir o aspecto ordenado e
harmonioso do núcleo urbano. As primeiras regulamentações municipais de que se
tem notícia datam de 1799 e procuraram determinar a aparência e a altura das
novas edificações, bem como medidas das portas, janelas e prumadas. Em 1831 e
1836, novas regulamentações estabeleceram regras complementares. Para evitar
incêndios, foram proibidas as construções em madeira e as coberturas de palha,
que deveriam ser trocadas por telhas. Buscou-se também garantir bons índices de
salubridade, determinando o calçamento das ruas (obra iniciada ainda no século
XVIII) e impondo a obrigação de os munícipes manterem a frente de suas casas
limpas.
37
A pavimentação das ruas do centro histórico foi executada utilizando-se pedras
irregulares (assentamento conhecido como pé-de-moleque). O calçamento
irregular das ruas é um elemento típico de Paraty, sendo parte da imagem da
cidade e uma das principais características do centro histórico. As ruas foram
projetadas com uma inclinação para uma calha central e caimento em direção ao
mar, facilitando, assim, o escoamento das águas.
Site Paraty Convention & Visitors Bureau
Os séculos XIX e XX
O ciclo do café fez surgir um novo interesse por Paraty, fato que possibilitou a
sua elevação à categoria de cidade em 1844. O café produzido no vale do Paraíba
era escoado pelo porto de Paraty e nessa época a cidade funcionava como
entreposto de abastecimento de produtos que seguiam para as fazendas daquela
região. Da cidade partiam tropeiros com suas mulas levando sal, azeite, produtos
europeus de luxo para os barões do café.
Nesse período, foram feitas melhorias urbanas: a construção de praças
públicas, a constituição de um cemitério, a construção de um chafariz e do novo
mercado, além da ponte de desembarque. A partir do século XIX, o crescimento
urbano de Paraty passa a ocorrer também na direção do litoral para o interior e
não apenas paralelamente em relação à linha do mar. Devido ao grande
incremento das atividades comerciais, ocorreu uma transformação nos tipos de
edificações, os sobrados se desenvolveram a partir das casas térreas préexistentes, às quais foi acrescentado mais um pavimento.
38
No final do século XIX, Paraty passou por um período de estagnação
econômica devido à construção da estrada de ferro que passou a ligar o Rio de
Janeiro a São Paulo através do Vale do Paraíba, transferindo para aquela região a
rota do comércio de café, isolando Paraty e fazendo cessar o movimento do porto.
Sobreviveriam somente as atividades dos pescadores e os engenhos de
aguardente, em menor escala devido à escassez de mão-de-obra motivada pela
abolição da escravatura.
Paraty viveu assim um grande período de isolamento e esquecimento em
relação ao restante do país. Para a historiadora Marina de Mello e Souza, do final
do século XIX até a década de 1960, “a cidade pouco se alterou em sua
materialidade, assim como na maneira de viver e de pensar das pessoas,
mantendo-se muito parecida com o que era há 200 anos”. (SOUZA, 2008, p. 92).
Esse isolamento começou a ser rompido somente nos anos 50, conforme o relato
de Diuner Mello:
A década de 1950 veio modificar substancialmente a vida de Paraty com
a construção de uma estrada de rodagem ligando Paraty à cidade de
Cunha, no Estado de São Paulo. Por esta estrada alcançava-se a cidade
de Guaratinguetá e a Via Dutra que une as duas maiores metrópoles
brasileiras, Rio e São Paulo. A viagem de barco [...] continuou a existir
[...]. A nova estrada, porém, possibilitava um maior e melhor fluxo de
transporte, em menor tempo, com mais segurança e qualidade. [...] Por
ela começaram a descer os paulistas que, eternos aventureiros,
buscavam o litoral perdido dos sonhos e o encontravam nessa cidade
abandonada, diferente [...]. Apesar de sérios problemas como a
constante queda de barreiras, deslizamento de pista e outros menores,
eles adquiriram velhas casas, às vezes em ruínas, e as restauraram com
capricho e bom gosto para veraneio.
A década de 70 introduziu um novo dinamismo em Paraty, fortemente
impulsionado pela construção da rodovia litorânea Rio-Santos (a BR-101). Este
fator desencadeou muitas transformações econômicas, intensificando atividades
de comércio e prestação de serviços – especialmente o turismo – e culminou em
acréscimo populacional.
39
Os sobrados de Paraty
No final do século XVIII, Paraty apresentava um conjunto arquitetônico constituído
na sua maioria por casas de um único piso. Nas primeiras décadas do século XIX,
devido ao enriquecimento da cidade com o comércio do café, muitas casas
passaram a ter um segundo pavimento, construído a partir das edificações térreas
pré-existentes. A não correspondência entre os vãos dos primeiros e segundos
pisos é uma característica de muitos sobrados paratienses (isso se deve não só aos
diferentes períodos em que os andares foram construídos, como também às
regulamentações promovidas pelo poder público). Na parte inferior prevalecia a
atividade de comércio, e a parte superior era destinada à residência das famílias.
Com a estagnação econômica sofrida pela cidade após o declínio do comércio de
café houve uma reestruturação em algumas edificações e os armazéns
reassumiram a sua função residencial.
Sobrados de Paraty - Acervo João Miranda / IHAP
40
Típica residência de Paraty com suas fileiras de portas do estabelecimento comercial à
frente e janelas da residência aos fundos. Arquivo do IPHAN.
Alçados de ruas de Paraty onde se encontram duas alturas distintas de sobrados, resultado
provável das diferentes épocas em que foram construídos ou de diferentes regulamentações
promovidas pelo poder público. Fonte: Direção Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais –
Lisboa. Inventário do Patrimônio Arquitetônico.
41
O antigo Paço Municipal de Paraty
Prédio atual da Câmara Municipal de Paraty, na
confluência da Rua do Comércio com Samuel
Costa. Neste ponto, esta última alarga-se como
que compondo o adro da Igreja do Rosário.
Nessas condições, o edifício da Câmara possui
maior área livre à sua testada configurando-se
num diminuto, porém gracioso Paço Municipal.
Foto: s/a. e s/d.
Rua Dr. Samuel Costa. Ao centro vê-se o alçado
principal da Igreja do Rosário e, à esquerda,
quase de perfil, o sobrado adquirido pela
Câmara Municipal em 1908. Acervo João
Miranda / IHAP.
A história desse prédio acompanha a evolução de Paraty desde o período
colonial. A edificação original era térrea e ocupava apenas a esquina das ruas
Samuel Costa (antiga rua do Rosário) e do Comércio. Sua construção teria ocorrido
ainda no século XVIII – o que pode ser observado pelos batentes de portas e janelas
no térreo, feitos em pedra. Em algum momento, já no século XIX, um segundo
pavimento teria sido construído, com outras ampliações ao longo da rua do
Comércio - o que pode ser verificado pelos batentes de madeira.
O prédio pertencia a Leovegildo Alves da Rocha Barreto e constitui-se como
um típico sobrado de um próspero mercador que reservou o térreo aos negócios e
o andar superior para moradia. Em 1863 o prédio foi alugado e passou a sediar a
Câmara Municipal de Paraty .
Aspecto parcial da Rua do Comércio com Samuel Costa. Ilustração de Patrícia Sada
42
Em 1908 a Câmara Municipal decide comprar o imóvel, negócio que se
concretiza pela quantia de três contos de reis. A vendedora era a então viúva de
Leovegildo Barreto, Dona Maria Magdalena Barreto, residente no Rio de Janeiro, o
que denota a alta condição econômica dessa família.
Prédio da Câmara Municipal de Paraty, adquirida à viúva Maria Magdalena Barreto em
1908. Foto s/a. e s/d. – Acervo João Miranda/IHAP
Em muitas cidades brasileiras até o início do século XX a administração
pública era exercida diretamente pelas Câmaras, como nos tempos coloniais. Em
Paraty, com a criação do cargo de prefeito, o sobrado passou a ser compartilhado
entre a Câmara e a Prefeitura.
Antigo Paço Municipal - Acervo IPHAN
43
Documentos queimados
Sabe-se que em 1932, o prédio foi requisitado para abrigar tropas do Governo
Federal que enfrentava os revoltosos de São Paulo. Naquele momento, afirmam
alguns paratienses que a municipalidade esvaziou as salas do pavimento térreo
abarrotadas de documentos referentes a Paraty e os incinerou para ceder lugar à
soldadesca. A relação do paratiense com o passado e as tradições é de reverência
(.). No entanto, a cidade pouco guardou de seus registros. Para entendermos esse
fenômeno citamos trecho da obra da historiadora Marina de Mello e Souza:
O passado é motivo de orgulho de grande parte dos moradores da cidade, e
mesmo quando esse sentimento não é explícito aparece no respeito às tradições,
na permanência das formas antigas de comportamento e de religiosidade. Esse
sentimento, difuso entre as pessoas, compensa de alguma forma o descaso com o
qual os documentos escritos foram até agora tratados pelos administradores
públicos e religiosos. Grande parte dos arquivos perdeu-se com a ação de bichos,
umidade ou mesmo foram destruídos. O passado era algo valorizado como
formador de uma maneira de ser. Não precisava ser guardado em armários, pois
estava presente no dia a dia, nos casos contados, na memória dos vivos. Só
recentemente essa atitude modificou-se, ao mesmo tempo em que houve uma
valorização das tradições e bens culturais a serem preservados, fazendo com que
surgisse o interesse em se guardar documentos manuscritos, impressos e
fotográficos, como mais um testemunho palpável de tempos gloriosos que
estavam na raiz do ser paratiense. (Parati, a cidade e as festas, p. 222).
Rua do Rosário (atual Samuel Costa) e à direita o sobrado da Câmara
Municipal. Segundo o historiador Diuner Mello a foto é de 1932, pois
registra a presença dos soldados das forças federais que ocuparam a
cidade durante o conflito. Acervo João Miranda / IHAP.
44
Inserido nessa mudança de atitude para com o conhecimento da história da cidade,
o Instituto Histórico e Artístico de Paraty
vem trabalhando, ao longo de sua
existência, na preservação da memória documental escrita e iconográfica de
Paraty, desenvolvendo projetos voltados para a organização e a catalogação de
seu acervo histórico, constituído em sua maioria de documentos e livros da
Câmara Municipal que foram resguardados.
Esse possibilitou a publicação dos Roteiros Documentais I e II c om transcrição de
documentos dos séculos XVIII, XIX e XX, facilitando o acesso a estudantes e
pesquisadores, além da Coleção Paratiana, disponível na Biblioteca Municipal Fabio
Villaboim e que atende o mesmo propósito.
Antiga Cadeia: Sede da Biblioteca Municipal Fabio Villaboim e do Instituto Histórico
e Artístico de Paraty. Foto: Lucineide Silva.
E
45
Acervo João Miranda / IHAP ( década de 1940)
À esquerda, lateral do prédio da antiga Prefeitura e Câmara
de Paraty, em seu alçado voltado para a Rua do Comércio.
À direita, Igreja do Rosário. Acervo João Miranda / IHAP.
46
Em segundo plano a empena com seis portas remanescentes do prédio vizinho ao sobrado
da Câmara, localizado na Rua do Comércio.
Foto da década de 1940 que exibe os alunos da Escola Lopes Trovão perfilados.
Acervo João Miranda / IHAP.
Parada do Dia 7 de Setembro em frente ao Prédio da Câmara, na presença do então
Prefeito Paulo “Carijó” C. de Moura. Foto da década de 1970. Acervo João Miranda/ IHAP.
47
Outra parada do Dia 7 de Setembro. Foto da década de 1970.
Fonte: Acervo João Miranda/ IHAP.
Detalhe do balcão no alçado principal do Sobrado da Câmara.
Foto da década de 1960. Fonte: Acervo João Miranda/IHAP
48
Fachada do antigo Paço Municipal – Acervo IPHAN
O salão nobre da Câmara de Paraty funcionou como tribunal de justiça até a
construção do atual prédio do Fórum Silvio Romero. Em 2002, Prefeitura Municipal
deixa de compartilhar o prédio da Câmara Municipal, instalando-se no bairro do
Pontal.
No salão nobre estão depositadas as “Varas de Vereança”, bastões originais,
únicos no Brasil, datados dos séculos XVIII e XIX, e que eram conduzidos pelas
autoridades nas ocasiões festivas e solenes. Há também os sofás da antiga Loja
Maçônica, destinados aos aprendizes. Encontramos também o dossel e crucifixo
sobre a mesa da presidência e as réplicas das antigas cadeiras e tribunas (as
tribunas originais estão sendo restauradas). Suas paredes são revestidas de papéis
estampados e há um quadro com fragmentos de antiga bandeira da Vila do século
XVIII.
49
Interior do Plenário da Câmara de Paraty.
Formatura do Ginásio.
Foto da década de 1960. Fonte: Acervo João Miranda/IHAP
Plenário da Câmara. Solenidade com a presença do então Prefeito Antonio Nubile França,
do Presidente da Câmara Irênio Araujo Marques e do Vice-Prefeito Norival R. de Oliveira.
Na imagem vê-se o dossel sobre a mesa da presidência e um dos bancos da antiga Loja
Maçônica ‘União e Beleza’. Foto da década de 1960. Fonte: Acervo João Miranda/ IHAP.
O sobrado é uma das construções mais importantes do Centro Histórico e
testemunha as diversas transformações pelas quais a cidade passou. Justifica-se,
plenamente, a necessidade de preservar e revitalizar esse precioso exemplar do
acervo arquitetônico e cultural da cidade, que está passando por um trabalho de
restauração de seus aspectos característicos para que seja remodelado e
reintegrado de forma harmoniosa à paisagem do centro histórico.
50
Plenário da Câmara na visita do Secretário de Obras do Estado do Rio de Janeiro, com a
presença do Prefeito ‘Nhonhô’ e do Presidente da Câmara, Irênio Araujo Marques.
Foto da década de 1960. Fonte: Acervo João Miranda/ IHAP.
Salão da Câmara de Vereadores. Foto da década de 1940.
Fonte:Arquivo IPHAN
51
Técnicas construtivas tradicionais
Nas edificações que fazem parte do conjunto arquitetônico do Centro
Histórico de Paraty, é possível identificar técnicas construtivas tradicionais. O
sobrado foi construído com diversas técnicas, destacando-se a alvenaria de pedras,
o pau-a-pique e o enxaimel de tijolos.
Podemos identificar a presença de alvenarias de pedra no pavimento térreo,
o que remete à edificação térrea do século XVIII.
Alvenaria de pedra
Alvenaria formada por pedras de diversos tamanhos, arrumadas umas sobre as
outras, com utilização de um material ligante (argamassa, por exemplo) e calçadas
com lascas da mesma pedra. As pedras são grandes e com faces planas. A
construção de alvenarias de pedra é caracterizada pelas grandes espessuras, com
pelo menos 1/5 de sua altura.
Alvenaria de pedra no antigo Paço Municipal – Centro Histórico de Paraty
Foto: Cynthia Tarrisse
Alvenaria de pedra na Igreja Nossa Senhora da Conceição – Paraty-Mirim
Foto: Cynthia Tarrisse
52
O pau-a-pique está presente na compartimentação interna do pavimento
superior. Diferentemente do que podemos observar nas casas térreas paratienses
(onde a estrutura de madeira é composta por palmeiras, pau de mangue ou
bambus amarrado com cipós), no sobrado do antigo Paço Municipal o gradeado de
madeira é feito com madeira serrada e pregos. A identificação desta técnica é
bastante particular no conjunto arquitetônico de Paraty, o que provavelmente
caracteriza a sua execução já no século XIX.
Pau-a-pique ou taipa de mão
Pau-a-pique em edificação contígua à Igreja N. Sra. da Conceição (Paraty-Mirim) e em casa térrea do
Centro Histórico de Paraty. Fotos: Cynthia Tarrisse
O pau-a-pique, também conhecido como taipa de mão, é uma tradicional técnica
construtiva brasileira, definida por uma estrutura de madeira entremeada por gradeado de
varas equidistantes, amarradas entre si por cipós, preenchida com barro colocado
manualmente. À terra utilizada na taipa de mão é comumente adicionado um pouco de
capim ou cal e areia, para aumentar o seu endurecimento e evitar rachaduras. No Centro
Histórico de Paraty essas alvenarias receberam acabamento alisado e caiação.
No período colonial, esta técnica construtiva foi muito difundida, sendo que em Paraty
foram utilizadas apenas na compartimentação interna das edificações, considerando a
fragilidade de sua composição frente às intempéries.
Argamassa e pau-a-pique de alvenaria no salão da Câmara de Vereadores.
Antigo Paço Municipal - Centro Histórico de Paraty
Foto: Cynthia Tarrisse
53
É possível identificar o enxaimel nas alvenarias externas do pavimento
superior e empena do telhado. Neste caso os painéis de vedação são executados
em tijolos maciços, técnica construtiva utilizada a partir do século XIX. A utilização
desta técnica acaba por evidenciar o acréscimo do segundo pavimento na
edificação térrea do século XVIII. As alvenarias receberam acabamento alisado e
caiação.
Enxaimel
O enxaimel é um sistema de madeira autônomo e de origem muito antiga, que se
desenvolveu na Idade Média. A madeira bruta é serrada em peças estruturais
providas de encaixes, sem a utilização de pregos. A montagem das peças forma
um sistema estrutural autônomo que depois de montado é preenchido com
material de vedação. Os painéis de vedação podem ser executados, em pau-apique ou tijolos maciços.
Detalhe do telhado do antigo Paço Municipal – Foto: Cynthia Tarrisse
54
Sugestão de atividades
Arqueologia
Programar uma visita com os alunos a um dos sítios arqueológicos existentes em
Paraty (região urbana, zona rural ou zona costeira). Os alunos podem fazer registros
escritos e fotográficos da visita e posteriormente apresentar na escola seminários
sobre a importância desses sítios.
Patrimônio Cultural
Pesquisa sobre o patrimônio histórico, arquitetônico e ambiental de Paraty.
Pesquisa sobre as comunidades tradicionais de Paraty (indígenas, caiçaras,
quilombolas)
Antigo Paço Municipal
Desenhar fachadas de antigos sobrados de Paraty
Construir maquetes de antigos sobrados de Paraty. Essas maquetes poderão fazer
parte da exposição prevista no prédio após a restauração.
Estudar as técnicas construtivas (taipa, pau-a-pique etc.) e materiais utilizados na
edificação dos antigos sobrados do centro histórico de Paraty e realizar uma oficina
reproduzindo essas técnicas em uma prancha ou tabuleiro de pequenas dimensões
(características das construções). Essas pranchas poderão fazer parte da exposição
prevista no prédio após a restauração.
Entrevistar um arqueólogo envolvido na escavação do sobrado.
Entrevistar um arquiteto envolvido na restauração do sobrado.
Entrevistar um historiador que conheça a história do sobrado.
Entrevistar moradores antigos de Paraty que tenham vivenciado as transformações
pelas quais passou o prédio e que possam dar algum testemunho sobre isso.
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Fontes de consulta
Arqueologia Brasileira – www.itaucultural.org.br
Associação Nhandeva - www.nhandeva.org
Cirandas de Paraty - www.cirandasdeparaty.com.br
Dossiê de candidatura de Paraty a Patrimônio Mundial apresentado à UNESCO (2011)
Instituto Histórico e Artístico de Paraty - www.ihap.org.br
IPHAN - www.iphan.gov.br
MELLO, Diuner. Paraty Estudante.Instituto Histórico e Artístico de Paraty e Prefeitura
Municipal de Paraty – Gráfica Freitas, Angra dos Reis, RJ, 2009.
MELLO, Diuner. Roteiro do Visitante. Informativo turístico e cultural.3@ ed. Gráfica
Servgraf, Paraty, 2011.
Paratiando - www.paratiando.com
Paraty Convention & Visitors Bureau - www.paratycvb.com.br
Quilombo do Campinho - www.quilombocampinho.org.br
Rameck, Maria José S., Mello, Diuner (orgs).Roteiro Documental do Acervo Público de
Paraty. Instituto Histórico e Artístico de Paraty.Gráfica e Editora Dias, 2003
SADA, Patrícia. Paraty: traçados de um centro histórico. São Paulo: Projeto, 1989.
Silo Cultural José Kleber - www.silocultural.org.br
SOUZA, Marina de Mello e. Parati, a cidade e as festas. Rio de Janeiro: Ouro Sobre
Azul, 2008.
Wikipedia - pt.wikipedia.org
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EQUIPE DO PROJETO
Coordenadora
Lucineide Silva
Arquiteta
Cynthia Tarrisse
Gerente Administrativo
Weriks Ribeiro
Secretária
Milena Barros
Auxiliar
Eduardo Oliveira
Coordenador Pedagógico
Ovídeo Poli Junior
Prefeitura Municipal de Paraty
Prefeito
José Carlos Porto Neto
Instituto Histórico e Artístico de Paraty
Presidente
Maria José S. Rameck
Antiga Cadeia s/n- Largo de Santa Rita
Centro Histórico – Paraty – RJ
Tel/Fax 24)3371 1056
www.ihap.org.br
[email protected]
IHAP
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