TCC 2008.2 – Redes Sociais web 2.0

Transcrição

TCC 2008.2 – Redes Sociais web 2.0
0
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Ciências da Comunicação
Comunicação Social: Habilitação em Publicidade e Propaganda
Caroline da Rosa Miltersteiner
ONDE ESTAMOS?
Uma reflexão sobre a percepção de lugar nas interações
mediadas pela Internet
São Leopoldo
2008
1
Caroline da Rosa Miltersteiner
ONDE ESTAMOS?
Uma reflexão sobre a percepção de lugar nas interações
mediadas pela Internet
Trabalho de conclusão de curso entregue à Universidade do Vale do Rio dos Sinos como requisito
para obtenção do título de graduada em Comunicação Social: Habilitação em Publicidade e Propaganda.
Orientadora: Profª Drª Suely Fragoso
São Leopoldo
2008
2
Caroline da Rosa Miltersteiner
ONDE ESTAMOS?
Uma reflexão sobre a percepção de lugar nas interações
mediadas pela Internet
Trabalho de conclusão de curso entregue à Universidade do Vale do Rio dos Sinos como requisito
para obtenção do título de graduada em Comunicação Social: Habilitação em Publicidade e Propaganda.
Aprovada em ______ de ___________ de 2008.
BANCA EXAMINADORA:
__________________________________________________________
__________________________________________________________
__________________________________________________________
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Aos meus amores, mestres e amigos.
4
AGRADECIMENTOS
Ao Matheus, meu revisor, conselheiro,
inspirador e melhor amigo.
Aos meus pais, Enio e Marlene, pelo
investimento financeiro e emocional e pelo amor com
que me trouxeram até aqui, e meus irmãos Aline e
Diego, por iniciarem o percurso da família na pesquisa
acadêmica e pelo exemplo pessoal e profissional.
À professora Suely Fragoso, por ter sido bem
mais do que uma orientadora e me fazer gostar tanto de
ter escrito este trabalho.
Aos professores da Unisinos Gustavo Fischer,
Alexandre Rocha, Lara Espinosa e Ana Iwancow, pela
participação decisiva que tiveram na minha formação.
A toda a Pmweb, especialmente aos meus
amigos Eduardo Escobar, Felipe Igansi e Cleber Maia,
pelo apoio que sempre me ofereceram.
Aos entrevistados, pela atenção e tempo dispendido
nesta pesquisa, que renderam grandes contribuições ao
trabalho.
À toda minha família e amigos.
E à vó.
5
Não considero necessário saber exatamente
quem sou. O que constitui o interesse principal
da vida e do trabalho é que eles lhe permitem
tornar-se diferente do que era no início. Se, ao
começar a escrever um livro, você soubesse o
que iria dizer no final, acredita que teria
coragem de escrevê-lo? O que vale para a
escrita e a relação amorosa vale também para
a vida. Só vale a pena na medida em que se
ignora como terminará...
Michel Foucault
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RESUMO
Este estudo pretende identificar e analisar a percepção de lugar por parte dos sujeitos que interagem mediados pela Internet, principalmente através de comunicadores instantâneos como
o MSN Messenger. Para isso, parte-se de uma reflexão a respeito das noções e percepções de
espaço e lugar que revisa a evolução social da percepção espacial trazida por David Harvey
(2007), a noção de lugar e não-lugar proposta por Marc Augé (1994), e o conceito de
heteropia de Michel Foucault (1984). A seguir, discute-se as especificidades da interação mediada pela internet em vista das considerações de Maria Luisa Vassallo (2007) sobre telepresença e constrói-se a hipótese de que as interações on-line são realizadas em heterotopias.
Para verificarmos se esta idéia é compatível com a percepção dos sujeitos das interações online, identificou-se um conjunto de pessoas a partir de sua participação em comunidades do
serviço de rede social Orkut, aos quais foi solicitado que colaborassem participando de uma
entrevista individual em profundidade, realizada através do MSN Messenger. Três pessoas
concordaram em serem entrevistados, de acordo com um Termo de Consentimento. As
respostas dessas pessoas foram analisadas e levaram à conclusão de que sua percepção
espacial durante as interações on-line eram mais próximas da noção de proximidade (presença
social) do que presença em algum outro ambiente (heterotopia). Percebemos também que as
relações on-line estabelecidas entre nossos entrevistados possuem, na grande maioria das
vezes, alguma ligação com seu mundo off-line e seu dia-a-dia independente da comunicação
pela Internet. A visão da Internet como um lugar de passagem para encontar alguém que já é
conhecido se aproxima bastante da idéia de não-lugar. Heteropias podem ser criadas pelo
histórico de situações de interação, mas não apareceram nas respostas de nossos entrevistados.
Palavras-chave: interação, lugar, heterotopias, telepresença, não-lugar, sistemas de rede social, comunicadores instantâneos, Orkut, MSN.
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ABSTRACT
This study intends to identify and analyse the perception of place by individuals who interact
over the Internet, specially using instant communications systems such as MSN Messenger.
To that end, we start reviewing the social evolution of spacial perception as proposed by David Harvey (2007), Marc Augé's (1994) notion of place and non-place, and Michel Foucault's
(1984) concept of heterotopy. Later we discuss the specifics of computer mediated interactions according to considerations by Maria Luisa Vassallo (2007) about telepresence. We
launch the hypothesis that online interactions take place in heterotopias. To verify whether
this idea is compatible with the perception of the people who take part in online interactions, a
group of subjects were identified in interest groups in the social network service Orkut. They
were invited to take part in individual interviews through MSN Messenger. Three subjects
agreed to be interviewed in terms detailed in a Term of Consent. Their answers were analysed
and led to the conclusion that their spatial perception during online interactions related more
closely to the notion of proximity (social presence) than presence in other environment (heterotopia). We also noticed that our interviewees prefer to interact online with people they already knew from their offline daily lives. This idea of the Internet as a connecting place to
meet someone who is already known is similar to the idea of non-place. Heteretopias can be
created by a history of interactions and situations, but were not present in the answers from
our interviewees.
Keywords: interaction, place, heterotopias, telepresence, non-place, social network systems,
instant communicators, Orkut, MSN.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1. Comunidade Saudades da galera da escola!.................................................52
FIGURA 2. Comunidade Aposentados no Orkut..............................................................53
FIGURA 3. Captura de tela no momento de uma das entrevistas.....................................58
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1. Relação entre usuários convidados para a entrevista e aceites......................51
TABELA 2. Alguns dados relacionados aos entrevisados................................................54
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SUMÁRIO
Introdução ..........................................................................................................11
1 Do espaço.........................................................................................................15
1.1 Uma trajetória espácio-social ............................................................................................. 16
1.2 Espaços comprimidos no mundo pós-moderno ................................................................. 23
1.3 A visão de dentro ou de fora? Espaço relativo e espaço absoluto ...................................... 24
2 Dos lugares ......................................................................................................26
2.1 A invenção do lugar…........................................................................................................ 26
2.2 … e do não-lugar................................................................................................................ 28
2.3 Existe algo entre o espaço e o lugar ................................................................................... 31
3 Da Internet e seus lugares ..............................................................................36
3.1 Do espaço on-line............................................................................................................... 40
3.2 Dos lugares on-line ............................................................................................................ 42
4 Das entrevistas ................................................................................................48
4.1 Procedimentos .................................................................................................................... 48
4.1.1 Metodologia ................................................................................................................................. 49
4.1.2 Seleção da amostragem............................................................................................................... 49
4.1.3 Análise de comunidades.............................................................................................................. 52
4.1.4 Análise dos entrevistados ............................................................................................................ 54
4.2 A entrevista......................................................................................................................... 57
4.3 Análise das entrevistas ....................................................................................................... 59
5 Discussão .........................................................................................................64
Conclusão ...........................................................................................................69
Referências Bibliográficas ................................................................................72
Apêndice A – Termo de Livre Consentimento ....................................................74
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INTRODUÇÃO
Sempre tive muita familiaridade com a Internet e observo, com grande curiosidade, os
fenômenos que nela acontecem. Se a compararmos com os demais meios de comunicação,
perceberemos que ela sintetiza características de praticamente todos eles, quando permite
tanto a comunicação em massa como a interação individual através de textos, áudios, vídeos e
aplicativos variados. Dentro do universo de situações que a Internet torna possíveis, considerei particularmente interessante a questão da espacialidade – especialmente a percepção de
lugar de ocorrência das interações interpessoais.
A escolha por adotar o ponto-de-vista da espacialidade – especialmente a percepção de
lugar – foi provocada pela grande dicotomia existente entre a possibilidade de uma compreensão totalmente desvinculada ao plano físico e material do sujeito, e uma visão que indica que
o sujeito está em seu corpo e seu lugar o tempo todo.
Esta dicotomia se manifesta, na literatura relacionada, através da oposição entre, por um
lado, a defesa de que o sujeito permanece consciente de faz uma projeção quando ele está interagindo através da Internet, descolando-se de seu corpo material (Santaella 2003), e, por
outro, a noção de que há questões locais e territoriais irredutíveis a estas relações (Fragoso,
2003). Com isso, procuro apreender quais indícios o próprio sujeito pode fornecer ao estudo
deste tema, coletando informações que partem de sua própria percepção.
Este não é um tema de fácil abordagem, compreensão ou aceitação, sobretudo se tentarmos incorporá-lo, tal como aqui o tratamos, à nossa realidade cotidiana. As questões relacionadas ao espaço e ao lugar não provocam reflexões, entre o público geral, que apenas o aceita
ou pressupõe a existência de espaços e lugares, principalmente em relação ao espaço na Internet. Assim como o tempo, o espaço é seguido e contado, regendo as relações sem que hajam
grandes questionamentos a cerca de seu funcionamento.
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O espaço e o tempo são categorias básicas da existência humana. E, no entanto, raramente discutimos o seu sentido; tendemos a tê-los por certos e lhes damos
atribuições do senso comum ou auto-evidentes. (Harvey, 2007, p. 187)
No entanto, o estudo que faremos aqui tem muito a dizer do uso da Internet tanto como
um fenômeno cultural e social como um fenômeno comunicacional. Em relação a este último,
o que aqui abordamos pode fornecer uma contribuição à construção de produtos comunicacionais ao tentar esclarecer as sensações do sujeito ao interagir através da Internet, e principalmente em sua relação com o lugar que ocupa.
Os resultados que poderemos estimar com esta pesquisa podem ser importantes para
oferecer uma interpretação do porquê de certas ações e ferramentas construídas para o funcionamento on-line têm mais ou menos sucesso, ou atingem a um público e não a outro. Será
possível pensar, também através dele, qual o tipo de abordagem mais eficaz para atingir estes
usuários, se algo mais territorializado e conectado a uma realidade off-line, que aproxime o
serviço das pessoas ou que as faça sentir-se em um outro ambiente diferente de onde estão
física e corporalmente.
O objeto que tomaremos para este estudo é a relação interpessoal on-line, principalmente
as interações do tipo um-a-um (ou seja, entre dois sujeitos) e realizadas através de SRSs (Sistemas de Redes Sociais), dentre os quais destacamos o site de relacionamentos Orkut, e de
CIs (Comunicadores Instantâneos), dentre os quais destacamos o aplicativo MSN Messenger.
A escolha por estas ferramentas como representantes do universo semelhante de SRSs e CIs
se deu, principalmente, devido à ampla audiência de ambos e, por isso, a possibilidade de se
apreender variados padrões de uso de Internet. Nestas interações on-line, o que nos instiga é
saber qual a percepção de lugar que os sujeitos têm ao utilizar essas redes sociais e aplicativos
têm ao utilizá-los para conversar com amigos, familiares, colegas ou desconhecidos de forma
individual.
Com isso, temos como objetivo principal identificar que lugar os indivíduos compreendem ocupar quando em interação com outras pessoas on-line. Também pretendemos observar o tipo de relações que estes indivíduos mantêm com as pessoas com quem interagem e
como ocorrem estas interações a partir do seu próprio ponto de vista.
Para isso, precisamos antes de mais nada investigar que tipo de noção de espaço e lugar
se construiu culturalmente nas sociedades ocidentais, trazendo principalmente as reflexões
sobre a construção da percepção do espaço por Harvey (2007), a compreensão de lugar e não-
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lugar por Augé (1994) e o conceito de heterotopias proposto por Foucault (1984), para depois
relacionar a teoria à visão prática do sujeito das interações.
Com base no absolutismo das duas visões que discutimos acima como a dicotomia básica
das relações on-line (de um lado a imaterialidade e, de outro, o enraizamento irreversível),
propomos uma visão que seja intermediária a estas. Com base no conceito de heterotopia de
Foucault (1984), temos como hipóteses uma composição sob a qual o sujeito percebe as relações em um lugar outro, que sobreponha estas diversas configurações, inclusive a identidade
local do sujeito, e seja um ambiente on-line compartilhado entre os indivíduos da interação.
Também consideramos de grande expressão o conceito de telepresença aliado ao de presença social descritos por Vassallo (2007), sob o qual as interações on-line (principalmente as
que se utilizam de áudio e vídeo) provocam uma sensação de estar em um ambiente compartilhado com o outro, ou seja, a noção de se estar em um outro lugar que, para nós, poderá significar uma heterotopia. O que Vassallo nos traz de complemento à nossa hipótese é a dimensão da presença social, na qual o sujeito sente estar próximo do outro com quem se conversa.
Com isso, propomos que as interações ocorram numa heterotopia on-line que provoca uma
sensação de telepresença.
Uma das principais intenções neste trabalho é propor uma reflexão a respeito do espaço e
do lugar, geralmente não discutido, através de uma forte ancoragem teórica e com olhos no
cenário onde nosso objeto aparece. Para isso, utilizaremos de uma revisão bibliográfica que
apresentará os principais conceitos envolvidos com nosso tema e problema de pesquisa, que
nos concederão argumentação para a hipótese acima descrita, e a verificaremos através de
uma pesquisa com entrevistas individuais em profundidade com alguns usuários de SRSs e
CIs a aplicação prática de nossa proposta de perspectiva.
Este estudo constará de cinco capítulos, sendo os três primeiros dedicados à revisão bibliográfica, o quarto, às entrevistas, e o quinto, à relação teórica entre o que foi verificado nas
entrevistas e o que se buscou abarcar de embasamento teórico, verificando também a comprovação ou não das hipóteses.
No primeiro capítulo, recuperamos a questão espacial de um ponto de vista social conforme Harvey (2007), tendo como principal foco a noção de compressão espácio-temporal
proposta como a regra da pós-modernidade. Esta abordagem será a visão “de fora pra dentro”,
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ou seja, do espaço absoluto, como um todo, que nos preparará para a percpectiva “de dentro
pra fora”, sob o ponto-de-vista do lugar, que será abordado no segundo capítulo.
Nesta etapa, convocaremos Augé (1994) a trazer-nos sua noção de lugar e, posteriormente, de não-lugar, uma configuração que, segundo ele, adquiriu uma enorme força na pósmodernidade e pode ser encontrada em aeroportos, estações e rodovias, que têm como principal função ligar-nos ao nosso destino, sem nunca ser o destino e sem uma carga simbólica e
identitária inscrita. Logo após, com Michel Foucault (1984), aprofundaremos nossa visão sobre heterotopias, comentando cada um dos princípios por ele estabelecidos para a caracterização das mesmas.
No terceiro capítulo, abordaremos nosso objeto e problema de pesquisa, comentando algumas informações gerais sobre a Internet no Brasil voltando o olhar sobre os SRSs e CIs, e
sobre as interações on-line. Em seguida, apresentamos as hipóteses que supomos responder ao
nosso problema de pesquisa e que serão verificadas no capítulo seguinte, que se voltará à metodologia da pesquisa. Este capítulo justificará e descreverá a opção por uma metodologia
qualitativa, em especial a realização de entrevistas individuais semi-estruturadas e os critérios
para a localização dos sujeitos a serem entrevistados. A seguir, apresentamos a amostragem,
as etapas das entrevistas em profundidade realizadas, e analisamos as respostas de cada um
dos três respondentes, traçando algumas linhas gerais que serão mais profundamente tratadas
no capítulo seguinte. O quinto capítulo será a discussão das entrevistas, na qual serão relacionados os resultados estimados e as hipóteses, retornando aos demais conceitos apresentados
no trabalho quando necessário. Finalmente, na conclusão, são retomadas diversas considerações que apareceram ao longo do trabalho e aprofundadas as teorizações e achados da pesquisa.
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1 DO ESPAÇO
Iniciar uma discussão sobre o espaço requer um amplo estudo a respeito da compreensão
que se tem a seu respeito no decorrer da história das sociedades. O objetivo deste capítulo é
oferecer insumos conceituais para construir uma proposição da percepção espacial originada e
fomentada nas áreas de interação social na Internet, objeto deste trabalho.
Conforme Abbagnano (2001), o espaço é um problema filosófico que pode ser considerado a partir de três dimensões de pensamento: (1) do espaço como medição, (2) da natureza do
espaço em suas definições, e (3) a da realidade – ou não – do espaço. Cada uma dessas, por
sua vez, origina conceitos distintos, porém relacionáveis entre si.
A dimensão do espaço como algo mensurável é o princípio da geografia física, que atende a uma necessidade econômica, cultural e social de representação e racionalização do espaço. Já o que diz respeito à natureza do espaço, revisa Abbagnano, abrange três perspectivas: a
do espaço de coexistências, a do espaço como recipiente e a do campo, proposta na teoria da
relatividade de Albert Einstein.
O caráter de realidade do espaço, por sua vez, possui um cunho mais social e cultural,
sendo o mais relevante para este trabalho. Esta dimensão foi e tem sido discutida sob três pontos de vista primordiais: a do caráter teológico e realista da apreensão do espaço, do subjetivismo e da negação do problema do espaço.
Para este trabalho, não interessa tanto delimitar um conceito, mas articular proposições
que estejam conformes ao contexto e à perspectiva em pauta. E é compreendendo as manifestações e reflexões a respeito do espaço no decorrer dos séculos e décadas que poderemos
prosseguir em busca de elementos mais específicos ao nosso estudo, que pretende relacionar
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aspectos sociais da apreensão do espaço com a investigação da percepções pessoais. A respeito destes dois níveis de compreensão do espaço, Fragoso (2000, p. 2) lembra que o espaço é
concebido sob influência das peculiaridades fisiológico-anatômicas do sujeito da
percepção, e das circuntâncias da cultura e organização social e econômica em que
se encontra inserido o mesmo sujeito.
David Harvey (2007) discute os mecanismos da pós-modernidade1 – se é que ela pode ser
assim chamada, como o próprio Harvey questiona – a partir das transformações espaçotemporais provocadas pela evolução do mercado mundial. O estudioso britânico analisa a história da sociedade ocidental, desde o sistema feudal até a modernidade e o subseqüente pósmodernismo que, para ele, responde, com sua dinamicidade e pluralismo, aos estímulos do
capitalismo. É importante discutirmos, aqui, o histórico revisitado por Harvey no tocante às
percepções e representações do espaço. Afinal, foram elas que formularam o que vemos apresentar-se, hoje, de uma maneira possivelmente diversa.
1.1 Uma trajetória espácio-social
Na Idade Média2, a divisão política e social se dava através de pequenos territórios, e a
percepção de espaço restringia-se ao limite dos feudos. O que ultrapassasse este limite era
considerado um infinito desconhecido, místico e temido. O poder que se colocava sobre toda
a sociedade era o clero e, por isso, “um conceito de espaço infinito permitia que o globo fosse
percebido como totalidade finita sem se questionar, ao menos em teoria, a sabedoria infinita
da divindade” (Harvey, 2007, p. 223).
O desenvolvimento dos mercados, com a era das colonizações por parte de alguns países
europeus, ampliou o espaço percebido. O que antes era um mistério configurava-se cada vez
mais como um desafio a ser conquistado.
Sobretudo o progresso de monetização (com seu efeito perturbador sobre a comunidade tradicional) e da troca de mercadorias – no início entre comunidades mas depois por meio de formas mais independentes de comércio praticadas pelos mercadores – sugeria uma concepção de tempo e espaço (…) inteiramente diferente da que
dominava a ordem feudal. (Harvey, 2007, p. 219)
1
Serão utilizados livremente, no decorrer deste trabalho, termos que servirão para localizar historicamente os fatos e movimentos, como (1) modernidade, (2) pós-modernidade e (3) supermodernidade. Eles estão presentes, entre os autores
aqui referidos, de forma bastante acentuada em (1) e (2) Harvey (1989) e (3) Augé (1994).
2
Poderíamos, aqui, voltar ainda mais no tempo e retomar as interessantes proposições e apreensões a respeito do espaço da
Antiguidade, mas é preferível tomar a posição de Harvey e refletir os acontecimentos mais próximos, pois serão mais relevantes à finalidade do estudo.
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O espaço precisava, naquele momento, ser representado. Após o século XIV, o papel dos
mapas foi fundamental para definir as fronteiras espaciais de navegação e colonização. O espaço era o limite para o desenvolvimento das grandes potências européias, pois quem conquistasse mais territórios e colônias estrangeiras, expandindo seus impérios, tinha maior poder. Isso implica em uma transição social entre a representação do espaço de uma perspectiva
próxima e subjetiva, que era a regra até então, e a tentativa de representação objetiva e precisa, projetando todo o planeta numa grade.
(…) Ptolomeu imaginara como o globo todo seria visto por um olho humano que o
visse de fora. Isso tem uma série de implicações. Uma delas é a capacidade de ver o
globo como totalidade apreensível. (…) Uma segunda implicação é que os princípios matemáticos podiam ser aplicados, tal como na óptica, a todo o problema da representação do globo numa superfície plana. (…) Como resultado, parecia que o espaço, embora infinito, era conquistável e contível para fins de ocupação e ação humanas. (Harvey, 2007, p. 225)
E foi a capacidade de resumir, utilizando escalas, o mundo todo no espaço de um desenho, que permitiu ao projeto Iluminista imaginar possível o domínio da natureza. A importância que o conhecimento tomou após a Idade Média refletiu-se em uma representação que pretendia ser exata e icônica da realidade cotidiana. O surgimento e aperfeiçoamento das técnicas
de mensuração – como cronômetros e bússolas – provocou o sentimento de conquista do espaço em âmbito mundial. Afinal, agora podia-se “enxergar” o mundo em uma única e confiável representação. Poderíamos dizer, inclusive, que o Iluminismo promoveu uma racionalização do espaço.
A respeito deste movimento, Fragoso (2000) assinala o espaço como sendo da ordem do
“olhar unificador que mapeia”. Este distanciamento objetivo está de acordo com o que adotamos para este momento, no qual falamos do conceito de espaço como dimensão do que pode
ser analisado, medido e o que constitui a cultura e a sociedade, mas não possui sujeito. Isso
porque, quando se fala sobre qualquer tipo de percepção e subjetivação espacial, devemos
compreender que, ali, falamos a respeito do lugar – conceito que trataremos no próximo capítulo.
Entre os séculos XVII e XIX, o mundo via surgir o capitalismo da forma como o conhecemos hoje. E, por isso, este é um momento fundamental na revisão histórica de Harvey. É
nesse período que iniciam-se as operações de comércio e a conquista do espaço, mais do que
um símbolo de poder, torna-se poder de fato.
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(…) o capitalismo entrou numa incrível fase de investimento de longo prazo maciço
na conquista do espaço. A expansão da rede de estradas de ferro, acompanhada do
advento do telégrafo, do desenvolvimento da navegação a vapor, da construção do
Canal de Suez, dos primórdios da comunicação pelo rádio e da viagem com bicicletas e automóveis do final do século, mudou o sentido do tempo e do espaço de maneira radicais. (Harvey, 2007, p. 240)
Harvey utiliza, para amplificar sua reflexão a respeito da modernidade, a imagem da cidade descrita por Joseph Raban em Soft City (in: Harvey, 2007). Descrevendo uma formação
social que encontraria ecos não só naquele momento, como na pós-modernidade, Raban apresenta o caráter plural daquela estrutura que seria reproduzida em todas as partes do mundo. A
cidade, em Soft City, apresenta uma multiplicidade de papéis entre os quais os cidadãos podem escolher qual desempenhar, em uma pluralidade de estruturas que mais lembraria “um
empório de estilos, uma enciclopédia, um livro de rabiscos de um maníaco cheio de itens coloridos” (Raban apud: Harvey, 2007, p. 83).
A ascensão das cidades e suas conseqüentes relações sociais recebeu um grande impulso
das técnicas de comunicação em massa que surgiam naquelas décadas. A consolidação do telégrafo e as inaugurações do telefone e do rádio provocaram mudanças radicais no modo como se percebia o espaço. Entre o final do século XIX e o início do século XX, o mundo tornava-se mais apreensível do que nunca, e a comunicação em massa começava a tratar as sociedades como um bloco homogêneo. Tanto eventos trágicos (como o naufrágio do Titanic, em
1912) como grandiosos (o primeiro sinal de rádio emitido mundialmente a partir da torre Eiffel, por exemplo) colocavam o mundo em contato, simultaneamente, com a mesma mensagem
e/ou informação, de uma forma homogênea. Giovani Giovannini (1987) explicita em linhas
técnicas a dimensão que assumia a disseminação da comunicação mediada pelo telefone no
período:
Contudo, dois elementos contribuíram para a afirmação – rápida, afinal depois das
desconfianças iniciais – do telefone. O primeiro deles é representado pela comutação
automática, já experimentada pela telegrafia, capaz de permitir um sistema de comunicação de rede; o segundo, pela utilização de ondas eletromagnéticas em condições de transmitir numa velocidade de 300 mil quilômetros por segundo, permitindo
a comunicação entre regiões opostas do globo quase em “tempo real”, teriam dito
atualmente os peritos em informática. (p. 163)
Mas foi, ironicamente, quando o mundo tornava-se cada vez mais enraizadamente integrado que estouraram as duas Guerras Mundiais – o que pode ser compreendido como uma
profunda angústia com todo o furor provocado pelas comunicações que atravessavam continentes. Harvey (2007) menciona
19
(…) uma idéia que Kern lança, mas aproveita pouco: “Uma das respostas foi um
crescente sentido de unidade entre pessoas antes isoladas pela distância e pela falta
de comunicação. Isso não foi, contudo, uma coisa pacífica, porque a proximidade
também gerou ansiedade – a apreensão que os vizinhos se aproximassem demais”
(p. 244)
E foi esta apreensão que tensionou os modos de compreensão social e espacial. Ainda antes da Primeira Guerra Mundial (e antes da chegada do século XX), a arte ensaiava uma nova
forma de representação do espaço com o cubismo, uma escola da pintura que expressava o
espaço como algo não-linear, com algumas doses de simultaneidade e heterogeneidade dos
elementos que o compunham.
O cubismo traduziria os horrores da primeira guerra mundial, um fenômeno como nunca
se havia imaginado – o mundo integrado e conectado simultaneamente em diversos acontecimentos.
Tanto para Gertrude Stein como para Picasso, ela pareceu uma guerra cubista, tendo
sido travada em tantas frentes e em tantos espaços que essa denotação parece razoável mesmo em escala global. (Harvey, 2007, p. 252)
Nas décadas centrais do século XIX, a popularização dos meios de comunicação em massa ganhou uma proporção incrível. O pós-Primeira Guerra Mundial marcou a difusão do rádio
em escala mundial em um processo que pode ser considerado como o primeiro passo da comunicação em massa instantânea, que encontrava-se cada vez menos atrelada ao tempo e ao
espaço. Voltando a Giovannini (1987), vemos que o rádio funcionou, no princípio de sua
massificação, como agente de processos sociais e culturais (entre elas, a expansão de ideologias políticas pré-Segunda Guerra Mundial). O estudioso destaca que o principal atributo do
rádio é justamente a sua possibilidade de recepção instantânea e a grandes distâncias:
Finalmente, não só era possível estender seu alcance [do rádio] a maiores distâncias
terrestres, como também abria-se lugar para dezenas de milhares de novos canais de
comunicação destinados a modificar o modo de vida de toda a humanidade. (Giovanini, p. 184)
Ao mesmo tempo, o capitalismo começou a ganhar força com o crescimento das atividades comerciais e chegou ao seu ápice quando do sucesso dos empreendimentos fordistas – a
linha de montagem. A industrialização, grande vedete do sistema financeiro, permitia a fabricação massiva de produtos idênticos de forma rápida e com etapas divididas no espaço. Este
modo de produção refletiu o comportamento de consumo até então utilizando-se de produção
em larga escala para um público de grande adesão e sem muitas restrições geográficas. Enquanto isso, o período que sucedeu a Segunda Grande Guerra promoveu uma adesão massiva
à televisão também mundialmente. A popularização da TV manteve-se em altos níveis desde
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então e, até hoje, poucos são os países em que ela não tenha uma importância no mínimo considerável. Conforme Taylor (apud: Harvey, 2007), a televisão é
o primeiro meio cultural de toda a história a apresentar as realizações artísticas do
passado como uma colagem coesa de fenômenos equi-importantes e de existência
simultânea, bastante divorciados da geografia e da história material e transportados
para as salas de estar e estúdios do Ocidente num fluxo mais ou menos ininterrupto.
(p. 63)
A contra-cultura dos anos 60 (no Brasil, com a Tropicália e os movimentos anti-ditadura)
e a evolução tecnológica (sempre motivada pela competição promovida pelo modo capitalista,
como lembra Harvey) promoveram ainda mais avanços na comunicação, cultura e sociedade
que se desenhava como pós-moderna.
A comunicação via satélite colocou o último alicerce na construção de um mundo conectado. Até o final dos anos 70, as barreiras da distância já eram transpostas pelo satélite, pelo
rádio, pela televisão, pelo telefone. A partir de então, tornava-se cada vez mais fácil estar presente em um lugar sem precisar necessariamente estar lá. A popularização do telefone, que dá
a sensação de proximidade com a pessoa que está do outro lado, do rádio e da televisão, que
simulam fazer-nos presenciar um grande acontecimento, transformaram a sensibilidade naquela segunda metade de século. Afinal, a quebra das barreiras espaciais não se dava por mecanismos inovadores de transporte, como trens-bala interligando continentes ou sistemas de
tele-transporte (tão explorados na ficção científica). Não estava mais fácil de estar em outro
lugar, e sim sentir-se neste outro lugar. Ou ainda, ficou mais fácil estar presente, ainda que de
uma forma simbólica, em lugares mais diversos, como assistir a um show – utilizando a TV –
ou conversar com alguém de outro país – através do telefone.
Com esse desencaixe (entre o estar cá e o sentir-se lá), a percepção social ficou muito
mais afeita às imagens do que às coisas em si. Ao mesmo tempo, ocorre um processo de retroalimentação no que diz respeito a esses estados, como podemos verificar com o turismo.
Se, por um lado, há um enorme volume de procura por imagens de um lugar distante, por outro os indivíduos muitas vezes não se satisfazem em ver ou sentir-se lá, mas precisam estar no
lugar. O turismo teve um grande avanço por conta da facilidade com que as relações diplomáticas e de transporte passaram a se dar entre os países e continentes, favorecendo a ágil e dinâmica mobilidade de pessoas e produtos.
21
A internacionalização das relações de cultura e sociedade – em que passa a existir a mediação por alguma mídia como uma extensão do homem – culmina no conceito de aldeia global, proposto por McLuhan (1964, p.17).
Depois de três mil anos de explosão, graças às tecnologias fragmentárias e mecânicas, o mundo ocidental está implodindo. Durante as idades mecânicas projetamos
nossos corpos no espaço. Hoje, depois de mais de um século de tecnologia elétrica,
projetamos nosso próprio sistema nervoso central num abraço global, abolindo tempo e espaço até diversos meios e veículos
Esta efervescência econômica, social e comunicacional em âmbito mundial tensionou de
forma severa as estruturas da modernidade, que já passava por múltiplas mudanças. Marc Augé (1994) considera a transição entre a modernidade e a pós-modernidade como um período
em si: a supermodernidade. Como o próprio nome diz, o período contemplou a saturação de
todos os modos de funcionamento modernos, deflagrando a pós-modernidade.
Augé nos traz algumas “figuras do excesso” (1994, p. 33) que impulsionaram a “bolha”
da supermodernidade a crescer exponencialmente até estourar e ver chegar a pósmodernidade. Entre eles, o que nos é mais interessante refere-se à superabundância espacial.
Do excesso de espaço poderíamos dizer, primeiro, ainda aí meio paradoxalmente,
que é correlativo do encolhimento do planeta: dessa colocação à distância de nós
mesmos (…). O mundo, porém, no mesmo tempo, abre-se para nós (…): os meios
de transporte rápidos põem qualquer capital no máximo a algumas horas de qualquer
outra. (Augé, 1994, p. 34)
Ao falar da “supermodernidade”, Augé abre o terreno dos processos de significação e
relação social presentes na pós-modernidade, que surgiu a partir dos movimentos que levaram
à compressão de tempo-espaço e à fragmentação da sociedade. Vale lembrar, aqui, que a motivação desta transição está, para Harvey, numa mudança também ocorrida no capitalismo.
Os modos de produção de bens e a carga de informação que as pessoas impactadas pelos
meios de comunicação recebiam desses obrigou o sistema capitalista a renovar-se, repensando
o sistema fordista que entregava produtos idênticos em escala massiva. A aceleração da produção acarretava em aceleração do consumo, forçando uma constante inovação. Esses aspectos abriram as portas da sociedade ocidental para a aceitação da necessidade de variedade e
multiplicidade, tanto no âmbito econômico como no cultural e social.
Esses sistemas de produção flexível permitiram uma aceleração do ritmo de inovação do produto, ao lado da exploração de nichos de mercado altamente especializados e de pequena escala – ao mesmo tempo que dependeram dela. (…) Mas a aceleração no tempo de giro na produção teria sido inútil sem a redução do tempo de giro
no consumo. (…) A estética relativamente estável do modernismo fordista cedeu lu-
22
gar a todo o fermento, instabilidade e qualidades fugidias de uma estética pósmoderna que celebra a diferença, a efemeridade, o espetáculo, a moda e a mercadificação de formas culturais. (Harvey, 2007, p. 148)
A “acumulação flexível” (p. 140), como denomina Harvey, é o modo de ser no capitalismo que permitiu a evolução das linhas de produção em série para modelos mais maleáveis,
favorecendo a integração e valorização do chamado “capital fictício” (p. 264). O capital fictício surge na pós-modernidade como um dos maiores símbolos deste movimento. Ele indica
que o valor das coisas concentra-se muito mais em sua potencialidade e no que ela representa
do que em um padrão pré-definido. É a perpetuação da força que as imagens e seus significados vinham trazendo desde o princípio da comunicação em massa.
A pós-modernidade, como já apontado anteriormente, privilegia a fragmentação, a variedade e a instantaneidade, por serem essas as principais conquistas de seu início. A exploração
dos mercados a cada dia mais segmentados e diversificados e a agilidade dos processos de
comunicação culminam numa proliferação de produtos culturais. Em meio a tanta variedade,
aumenta a importância do elemento significante3 das coisas – sua imagem e superfície. Os
produtos do pós-modernismo relacionam-se muito melhor com a colagem, a mistura aleatória
de elementos das mais diversas origens, com a ironia e com a rapidez em qualquer período
anterior. Diversos autores, dos quais destacamos aqui Harvey (2007) e Jameson (1984), relacionam esta fragmentação a uma desvalorização da profundidade, ao dizer que
o outro lado da perda da temporalidade e da busca do impacto instantâneo é uma
perda paralela de profundidade. Jameson (1984a; 1984b) tem sido particularmente
enfático quanto à “falta de profundidade” de boa parte da produção cultural contemporânea, quanto à sua fixação nas aparências, nas superfícies e nos impactos imediatos que, com o tempo, não têm poder de sustentação. (Harvey, 2007, p. 60)
É importante avaliar que a “perda paralela da profundidade” (Harvey, 2007, p. 60) a que
Harvey se refere acima tem muito mais a ver, na verdade, com uma abundância de imagens e
significantes produzidos – o que não quer dizer que esses significantes não contenham uma
forte carga simbólica em si. Como já foi referido e ainda será discutido no decorrer deste estudo, o pós-modernismo traz, além da aceleração e da mobilidade em uma configuração de
“compressão espaço-tempo” (Harvey, 2007, p. 219), a possibilidade do sentir-se lá enquanto
se está aqui, em uma telepresença que nos coloca – em nossa percepção – em espaços que não
estamos habitando de fato.
3
Por significante, compreendemos aqui o elemento material do processo de significação descrito por Saussure, sendo “o
significante (plano da expressão) a parte perceptível do signo e o significado (plano do conteúdo) como sua contraparte
inteligível”. (Carvalho, 2003)
23
Uma reflexão mais dedicada ao espaço na pós-modernidade requer a revisão do conceito
da “compressão espaço-tempo” proposto por Harvey (2007, p. 219), e que analisaremos adiante por ser uma das mais fortes visões a respeito da percepção do espaço neste momento.
1.2 Espaços comprimidos no mundo pós-moderno
Com os aparatos e possibilidades de transposição das fronteiras entre países e continentes, a sensação que fica é a de que sofremos uma compressão na percepção tanto do espaço
como do tempo. Esta percepção iniciou com as navegações no século XV e vem sofrendo
uma enorme acentuação nas últimas décadas. Hoje, chegamos de forma rápida a lugares distantes fisicamente, e não precisamos fazer quase esforço para chegar aos mesmos lugares de
forma simbólica, através dos meios de comunicação disponíveis.
O conceito de compressão espaço-tempo de Harvey (2007) permeia toda a sua compreensão a respeito dos mecanismos sociais na pós-modernidade, procurando estabelecer a percepção destas duas dimensões humanas e sociais.
Uso a palavra “compressão” por haver fortes indícios de que a história do capitalismo tem se caracterizado pela aceleração do ritmo da vida, ao mesmo tempo em que
venceu as barreiras espaciais em tal grau que por vezes o mundo parece encolher sobre nós. (Harvey, 2007, p. 219)
Ainda no período que compreendeu as duas guerras mundiais e precedeu o início da pósmodernidade, a ligação constituída entre territórios através dos transportes, da economia e da
comunicação tornava-se a cada dia mais complexa. Com isso, a percepção de tempo-espaço
reduziu-se drasticamente, permitindo-se pensar em uma “aniquilação do espaço pelo tempo”.
A partir deste movimento, que acompanha a compressão do tempo-espaço, gerou-se duas expectativas distintas, as quais podemos definir como (1) internacionalista e (2) local:
[1] “Celebrando a aniquilação do espaço pelo tempo, a tarefa era relançar o projeto
iluminista de emancipação humana universal num espaço global tornado coeso mediante mecanismos de comunicação e de intervenção social. (…) [2] o princípio de
que, quanto mais unificado o espaço, tanto mais importante se tornam as qualidade
das fragmentações para a identidade e ação sociais. (Harvey, 2007, p. 245-6)
Algo que o próprio Harvey (2007) percebe antes dos anos 90 e já afirma como sendo a
perspectiva dominante é o fato de que “Com a redução das barreiras espaciais, aumenta muito
mais a nossa sensibilidade ao que os espaços do mundo contêm” (p. 265). A sobrevida das
qualidades locais sobre alguma provável ameaça de aniquilação espacial por meio da comunicação global pode ser observada em diversos âmbitos da vida pós-moderna. Afinal de contas,
24
deslocar-se de um território a outro já não é mais tão oneroso, e o olhar passa a ser nas qualidades específicas do local e sua identidade.
A compressão do tempo-espaço, para Harvey (2007), traduz toda uma gama de sensações
promovidas pelos processos competitivos do capitalismo, que expandiram os limites geográficos e temporais até a exaustão, e encontrou na pós-modernidade uma grande aliada a ser
constantemente estimulada: a percepção. Foi através dela que o capitalismo pôde continuar
como forma econômica que dita as regras sociais e de mercado, pois ela forneceu a ele a possibilidade de expansão e de lucro apenas com imagens, com conceitos de propaganda, com
ficção, com serviços e eventos, e com o capital fictício. Se o esforço para deslocar-se fisicamente utilizando os transportes ficou cada vez menor, tão ou mais fácil ainda tornou-se incentivar as pessoas a projetar-se e adquirir a experiência através de imagens e interações.
1.3 A visão de dentro ou de fora? Espaço relativo e espaço absoluto
Toda esta variedade de percepções e representações espaciais que foram-se definindo no
decorrer dos séculos abrigou-se, em diversos momentos, sob uma divisão categórica: a distinção entre o espaço absoluto e o espaço relativo. Muitas são as interpretações para cada um dos
termos, mas nos atentaremos ao ponto de vista mais adequado ao propósito e aos conceitos
envolvidos neste trabalho.
Fragoso (2000) esclarece a oposição (que também pode ser concebida como complementaridade) apontando que o espaço absoluto é o que estudamos, o que medimos e tentamos capturar de forma racional e ampla em uma compreensão herdada da ciência moderna, vinda da
Física Newtoniana e da Geometria Euclideana (p.2). Por outro lado, o espaço relativo é dependente do sujeito, e configura-se como lugar, conforme assinalou-se na Antiguidade Clássica. Fragoso também lembra que tendemos a pensar no espaço como absoluto, mas experenciá-lo e apreendê-lo como relacional, sendo
o espaço absoluto um existente anterior e independente dos elementos que o ocupam, cujas características fundamentais seriam a homogeneidade e a infinitude, enquanto o espaço relativo emerge a partir das relações entre os objetos que o compõem. (Fragoso, 2000, p. 2)
O espaço absoluto está mais para o espaço em sua natureza, estando consoante à compreensão abordada por Abbagnano (2001), vista acima, como recipiente de objetos que configuram-se de variadas formas. Enquanto isso, o espaço relativo aproxima-se do conceito de lugar,
25
algo que tem mais a dizer sobre processos particulares e de relações entre estes objetos do que
a atmosfera que os envolve. E é o lugar, visto sob a perspectiva da subjetividade e da relação,
que dará o sentido ao estudo que estamos a desenvolver no trabalho.
Neste capítulo, procuramos abordar o espaço como dimensão objetiva, cultural e social,
justamente para chegarmos à discussão que será conduzida no próximo capítulo. Em seguida,
trataremos do conceito de lugar, essencial para o estudo da percepção espacial nos processos
de interação mediada pela Internet do ponto de vista dos sujeitos.
26
2 DOS LUGARES
Pensar a espacialidade sob a perspectiva do lugar e suas configurações é o movimento
necessário para a compreensão dos processos perceptivos que elaboram-se nas redes sociais
da Internet. Por isso, as páginas que seguem cuidarão dos enfoques ao lugar mais pertinentes
ao prosseguimento deste trabalho.
No capítulo anterior, Fragoso (2000) oferece uma definição do lugar, ao relacionar os
conceitos de espaço absoluto e relacional, mencionando que o lugar trata-se de uma dimensão
espacial da ordem da percepção e da subjetividade. Autores como Michel de Certeau (1990),
Marc Augé (1994) e Michel Foucault (1984) tratarão do lugar em suas especificidades, respectivamente, como prática do cotidiano moderno/pós-moderno, como configuração em nãolugares e fruto da supermodernidade e ainda como espaços outros, conhecidos como heterotopias.
Conforme já analisamos, nossa concepção da oposição lugar e espaço se dá no tocante à
subjetividade. Compreendemos o espaço numa dimensão mais ampla, que parte de fora de
nós, enquanto o lugar é uma dimensão cuja efetiva percepção se dá na escala do indivíduo.
Conforme destaca Fragoso (2000), “o indivíduo conhece o espaço, mas percebe o lugar.”
2.1 A invenção do lugar…
Michel de Certeau (1990), ao mapear o funcionamento do cotidiano pós-moderno, também passa pelas “práticas de espaço”, definindo e mencionando algumas de suas configurações. Por isso, é interessante observar o que Certeau tem a nos dizer sobre o lugar:
Um lugar é a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuem elementos nas relações de coexistência. Aí se acha portanto excluída a possibilidade, para duas coisas,
27
de ocuparem o mesmo lugar. (…) Um lugar é portanto uma configuração instantânea
de posições. (p. 201)
Em resumo, o ponto de vista de Certeau em relação ao lugar está de acordo com a concepção relacional. Ela é aprofundada em Augé (1994), que, ao iniciar a sua abordagem dos
não-lugares (que veremos logo em seguida), primeiro passa pelos lugares, definindo-os conforme três características específicas: identitários, relacionais e históricos.
Para Augé, pensar o lugar é estar sempre ocupando um ponto e, com isso, estabelecer relações com os outros corpos que, por sua vez, ocupam seus respectivos lugares de acordo com
as características acima descritas. Em sua dimensão identitária, o lugar possui um estatuto de
origem e pertencimento, partindo da idéia de que “cada corpo ocupa o seu lugar” (p. 52) e isso
o difere dos demais. O caráter relacional dá conta das relações que se estabelecem entre os
lugares ocupados pelos objetos (e sujeitos), sejam de oposição ou até da formação de uma identidade partilhada. E, por último, o lugar é também histórico, pois sua identidade e relação
se dá no decorrer do tempo, e a história sempre modifica o lugar, seja alterando sua identidade, seja mantendo-a mesmo sob mudanças físicas.
O “lugar antropológico” (p. 51) de Augé opõe-se ao espaço, principalmente, pelo fato de
cada lugar carregar um componente simbólico particular, justamente por seu caráter identitário. Um campo de futebol é um lugar cujas funções e regras são definidas e sabidas socialmente – não se pode obter o mesmo acontecimento com as mesmas configurações em outro
lugar que não ali, o que o torna particular, ao mesmo tempo que relaciona-se com outros lugares da cidade e assinala suas peculiaridades no decorrer da história.
É importante ressaltar, neste momento, que Augé traça uma abordagem do lugar do ponto de vista da passagem da modernidade para a pós-modernidade, guardando algumas semelhanças com o olhar de Harvey (2007), de quem falamos no capítulo anterior. O diferencial de
Augé é, além de dedicar-se mais ao lugar do que ao espaço, perceber e materializá-lo a partir
da supermodernidade, período em que as estruturas modernas encontravam-se em seu mais
alto nível de tensionamento.
Neste momento, Augé fala em excessos e superabundâncias de lugares, promovida pela
velocidade das operações e a mobilidade daí surgida. Enquanto Harvey menciona uma compreensão do espaço a uma estrutura identificável e conquistável, podendo ser representada em
um desenho do papel (o mapa), Augé fala da profusão de lugares. É como se a redução de um
28
objeto como um círculo, por exemplo, gerasse milhares de novos pontos, antes desconhecidos.
Esta oposição conceitual entre Harvey e Augé é, sobretudo, definida por uma diferença
de ponto de vista. Harvey vê o espaço – portanto, observa o mundo e suas relações “de fora”,
como a olhar para um mapa mundi – e o percebe sofrendo uma compressão pela possibilidade
de se atravessar este mapa com cada vez mais facilidade. Já Augé está no interior deste mapa,
à altura dos objetos que o cercam e relacionando-se com eles. E é por isso que percebe a superabundância de lugares – ele está em constante relação com eles.
E é justamente essa proliferação de lugares que promove o nascimento de uma configuração que, à primeira vista, pode ser considerada um esvaziamento desses lugares, e abre as portas à pós-modernidade: os não-lugares.
2.2 … e do não-lugar
Talvez pareça redundante voltar a falar das intensas transformações pelas quais as sociedades passaram no último século, mas tratar de conceitos tão peculiares e enraizados nesses
movimentos exige uma grande atenção a eles. Portanto, voltemos a falar em supermodernidade para chegar aos não-lugares.
Mencionamos anteriormente que as primeiras décadas do século XX promoveram uma
aceleração incrível nos modos de produção, favorecendo a abertura de mercados internacionais e construindo redes de comércio de produtos e serviços em âmbito mundial. Também nos
referimos à posterior proliferação dos meios de comunicação em massa que, além de conectar
o mundo através de transmissões de rádio ou televisão em escala mundial e simultânea, também promoveu uma enorme amplificação da importância aos processos de significação mediados. Ou seja, a palavra e a imagem significante passaram a tomar o lugar da coisa referida.
Para Augé, a supermodernidade é o momento em que todas essas estruturas ultrapassam
os seus limites, e a superabundância espacial é uma de suas mais fortes características. Ao
mesmo tempo em que o mundo, como refere Harvey (2007), comprime-se e torna-se um pequeno globo que pode ser facilmente representado em sua totalidade, também tomamos conhecimento de absolutamente todos os seus territórios e mais: temos a possibilidade de chegar
a todos eles – e às vezes, parece, a necessidade de fazê-lo.
29
Na intimidade de nossas casas, enfim, imagens de toda espécie, transmitidas por
satélites (…): [a imagem da informação] exerce uma influência, possui um poder
que excede de longe a informação objetiva da qual ela é portadora (…) como as paisagens onde os vemos evoluir regularmente: o Texas, a Califórnia, Washington,
Moscou, o Eliseu, Twickenham, os Pireneus ou o deserto da Arábia; mesmo que não
as conheçamos, nós as reconhecemos.” (Augé, 1994, p. 34-35)
Essa proliferação de lugares acessíveis e conquistáveis (se falarmos como Harvey)
acabou por gerar uma nova configuração espacial. Os não-lugares respondem ao funcionamento social das últimas décadas, que passou a demonstrar muito mais importância no que
é passageiro, no que se modifica constantemente e no que possui uma grande carga simbólica,
seja através de palavras ou imagens.
Definindo de forma bastante resumida, não-lugares são “espaços que não são lugares
antropológicos” (Augé, 1994, p. 73), ou seja, que não possuem sentido inscrito e simbolizado
em si. Não são territórios, muito menos destinos. São do caráter da passagem, de forma fugidia, tal como um sujeito não vai a uma estação de trem para visitá-la (cotidianamente), mas
para partir dela percorrendo um itinerário e chegar a um ponto determinado e que é descrito
na própria estação. Um sujeito nunca está em um não-lugar; ele sempre passa pelo não-lugar.
Os não-lugares são tanto as instalações necessárias à circulação acelerada das pessoas e bens (vias expressas, trevos rodoviários, aeroportos) quanto os próprios meios
de transporte ou os grandes centros comerciais, ou ainda os campos de trânsito prolongado onde são estacionados os refugiados do planeta.” (Augé, 1994, p. 36-37)
A relação que o não-lugar possui com o lugar não é de concorrência, mas de diferença e
complementaridade. Isso significa que um não exclui o outro, mas apóiam-se mutuamente e
constantemente (quando um torna-se outro), bem como há lugares com características de nãolugar, e vice-versa. Existem pessoas que vão até o aeroporto para ficar lá, e não para pegar um
avião em direção a algum lugar; que o vêem como um destino, e não uma passagem. Neste
caso, o aeroporto assume status de lugar.
Lugares e não-lugares são diferentes em sua essência. As três características básicas do
lugar propostas por Augé (1994) não aparecem nos não lugares. Quando um não-lugar passa a
tornar-se identitário, relacional e/ou histórico, ele já está deixando de ser o que é para tornarse um lugar.
Ao contrário do lugar, que é convencionado e instituído socialmente com base nas identidades individuais, o não-lugar torna os indivíduos em usuários (ou passageiros), comportando-se de forma a não se deixar ser afetado por eles.
30
Todas as interpelações que emanam de nossas estradas, centros comerciais ou vanguardas do sistema na esquina de nossas ruas visam simultânea e indiferentemente a
cada um de nós (“Obrigado por sua visita”, “Boa viagem”, “Grato por sua confiança”), qualquer um de nós: elas fabricam o “homem médio”, definido como
usuário do sistema rodoviário, comercial ou bancário. (p. 92)
Uma diferença ainda maior é encontrada entre lugar e não-lugar do ponto de vista histórico. Enquanto o primeiro só é validado como tal através da história, o segundo, a partir do
momento que passa a ter uma história, deixa de ser ele mesmo. Nas palavras de Augé,
Ele [o não-lugar] também não concede espaço à história, eventualmente transformada em elemento de espetáculo, isto é, na maior parte das vezes, em textos alusivos. A atualidade e a urgência do momento presente reinam neles. (p. 95)
À primeira vista, o não-lugar parece um esvaziamento de sentido provocado pela superabundância espacial. Na verdade, Augé nos permite pensar no não-lugar como ponte de uma
significação dos lugares em si, como o aeroporto, de onde partem os aviões para os lugares de
destino, mas não costuma ser ele mesmo um destino.
Uma vantagem dos não-lugares sobre os lugares é a sua ausência de limites geográficos.
Eles não são lugares físicos nem socialmente constituídos, tampouco dependem de fronteiras.
Nesse sentido, as configurações que podem ser compreendidas no âmbito dos não-lugares
servem às interações mediadas pela Internet, visto que elas têm como característica a ausência
(total ou parcial) de barreiras geográficas. Aos não-lugares, interessam fatores bem diferentes
de fronteiras ou identidades socialmente formadas. Ao mesmo tempo – e talvez por uma superabundância de não-lugares – tem sido mais fácil perceber a instituição de lugares com caráter
simbólico independente de alguns fatores relacionais a ele – como a identidade conferida pela
localização geográfica. Ao verificarmos que um gaúcho, morando em outro país, preserva os
sotaque e hábitos que o fazem sentir-se ainda parte do sul do país, identificamos que – neste
sentido – o lugar se estabelece por suas relações culturais mais do que pela territorialidade.
Sobre isso, Augé exemplifica que a língua é um fator que pode determinar um lugar:
O personagem está em casa quando fica à vontade na retórica das pessoas com as
quais compartilha a vida. O sinal de que se está em casa é que se consegue se fazer
entender sem muito problema, e ao mesmo tempo se consegue entrar na razão de
seus interlocutores, sem precisar de longas explicações. (Augé, 1994, p. 99)
De tudo isso, podemos supor que um não-lugar pode ser considerado uma espécie de “coringa”, tanto no sentido de ser local de passagem como repertório imaginário individual e ambiente de interação sem fronteiras.
31
Essa noção proposta por Augé pode-nos ser útil no decorrer deste estudo, uma vez que a
investigação aqui proposta pretende dar conta de uma condição específica da percepção de
lugar. Mas não nos restrinjamos a ela. Se não-lugares são configurações de passagem e caráter
simbólico nulo, precisamos prever uma possibilidade de que existam lugares que tenham, sim,
identidade e significado, mas sejam diferentes dos relacionados e convividos em nosso cotidiano. A estes, poderemos chamar, com Michel Foucault (1984), de heterotopias.
2.3 Existe algo entre o espaço e o lugar
Além de compreendermos como a sociedade ocidental sofreu, por um lado, uma compressão espacial e, por outro, uma superabundância de lugares como nos informam Harvey
(2007) e Augé (1994), é relevante analisar configurações que podem-se dar em dimensões
intermediárias ao espaço absoluto do primeiro e à individualidade do lugar do segundo. Conforme abordaremos a seguir, essas dinâmicas não estão nem para uma visão totalizante e externa do espaço mundial que habitamos, nem para a particularização de lugares e suas identidades, mas sim, estão mais afeitas a funcionamentos sociais e culturais específicas e que, espacialmente falando, estariam “acima” do lugar e “abaixo” do espaço4.
Há duas teorias que se adequam ao que estamos discutindo. A primeira, que é apresentada pelo próprio Harvey (2007) em sua definição das espacialidades que se definiram na pósmodernidade, corresponde a três dimensões da produção do espaço tratadas pro Henri Lefebvre (in: Harvey, 2007), e a segunda refere-se ao conceito de heterotopias definido por Michel
Foucault (1984).
Henri Lefebvre argumenta que a produção social do espaço se dá de acordo com a articulação de três dimensões distintas: o (1) espaço vivido, o (2) percebido e o (3) imaginado.
O espaço vivido (1) é uma dimensão de “práticas espaciais materiais”, as quais compreendem o espaço físico. É desta ordem o território, os sistemas de transporte e os espaços localizáveis e determináveis. Em suma, é o espaço e seus elementos em si.
Enquanto isso, o espaço percebido (2) dá conta das representações deste espaço vivido;
estas representações se dão através de “signos, códigos, e conhecimentos que permitem falar
4
E é por estas razões que, apesar do uso da palavra “espaço” por ambos os autores, Augé e Harvey, observamos que estas
teorias estariam à margem do que conceituamos, neste trabalho, como sendo “espaço” e ”lugar”.
32
sobre essas práticas materiais” (p. 201). É o espaço percebido que cria o discurso do espaço
vivido.
Já os espaços imaginados (3) configuram-se como espaços de representação, materialmente intangíveis e consoantes ao plano da utopia e da fantasia individual.
Com o espaço imaginado, é possível ver encerrado um ciclo de produção social do espaço, no qual o espaço percebido representa o espaço vivido, que por sua vez é renovado pelo
espaço imaginado. No entanto, como comenta o próprio Harvey (2007), esta visão é um tanto
reducionista. O ciclo realmente funciona, mas há bem mais relações entremeadas e que colocam as três dimensões em contato do que uma breve definição é capaz de capturar.
Por se tratar de uma articulação que possui uma dimensão simbólica e outra utópica, as
dimensões espaciais de Lefebvre estão muito mais relacionadas a uma configuração social
que produz, representa e imagina os espaços atuais, modificando e atualizando-os. É importante reforçar que esta é uma compreensão que trata de tentar apreender os mecanismos que
compõem a produção espacial por uma perspectiva social e, portanto suas dimensões possuem
relação tanto com o caráter amplo do espaço quanto com o localizável do lugar e, por isso,
percebemos tratar-se de um tipo diverso de compreensão espacial.
Podemos identificar que uma praça, por exemplo, é um espaço vivido, por ser um território material e localizável, ao mesmo tempo em que há sinais que a identificam como tal, como
placas e seu nome próprio, e uma produção de sentido em torno dela que a modifica, tornando-a conhecida como um ambiente ideal para encontrar-se com a família aos finais de semana.
Este tipo de carga simbólica que envolve a produção espacial conforme proposto por Lefebvre pode também produzir um outro tipo de espaço, com ainda mais significado e de funcionamento peculiar. Na metade do século XX, Michel Foucault (1984, on-line) conceitua
uma nova visão do que tratamos neste capítulo, que corresponderia a “espaços outros”, criados por quaisquer das culturas do mundo e munidos de uma carga simbólica diferenciada. A
estes lugares, Foucault (1984) chama de “heterotopias”.
Inicialmente, Foucault estabelece uma dicotomia entre heterotopias e utopias, assinalando
que a última configura-se como espaços fundamentalmente irreais e opostos à realidade. Já as
33
heterotopias seriam lugares diversos aos lugares do cotidiano, mas atrelados à realidade. Conforme a definição do próprio Foucault (1984),
há também, provavelmente em todas as culturas, em todas as civilizações, espaços
reais – espaços que existem e que são formados na própria fundação da sociedade –
que são algo como contra-lugares, espécies de utopias realizadas nas quais todos os
outros lugares reais dessa dada cultura podem ser encontrados […] Este tipo de lugares está fora de todos os lugares, apesar de se poder obviamente apontar a sua posição geográfica na realidade. (on-line)
As heterotopias não são, portanto, exatamente um lugar, mas uma configuração que os
sobrepõe e até ultrapassa os lugares, por agregar elementos externos ao cotidiano – de caráter
quase imaginário e fortemente simbólico. Elas também opõem-se aos não-lugares por poderem ser consideradas um ponto de chegada (e não de passagem) e possuir identidade e história.
Uma das primeiras e mais fortes contextualizações trazidas por Foucault para as heterotopias é a analogia do espelho, na qual tanto heterotopia como utopia se entrecruzam: ao
mesmo tempo que o sujeito que encontra-se do outro lado é irreal e, portanto, o espaço refletido não existe senão como imagem (portanto, utopia), o espelho em si, do lado de cá, é uma
heterotopia justamente por proporcionar esta relação tão peculiar e permitir a produção de
uma utopia.
O espelho funciona como uma heterotopia neste momentum: transforma este lugar, o
que ocupo no momento em que me vejo no espelho, num espaço a um só tempo
absolutamente real, associado a todo o espaço que o circunda, e absolutamente
irreal, uma vez que para nos apercebermos desse espaço real, tem de se atravessar
esse ponto virtual que está do lado de lá. (Foucault, 1984, on-line)
O conceito de heterotopia está muito mais relacionado a um ponto de vista sob o qual
podemos compreender os lugares – especialmente os que são heterotópicos por natureza – do
que uma classe específica à qual somente determinados lugares poderiam corresponder. O
shopping center, por exemplo, é um tipo peculiar de lugar, que surgiu para centralizar as operações comerciais e de lazer de uma região urbana. Sem ele, para comprar um hambúrguer do
Mc Donald’s, ir ao cinema e comprar um livro em seguida, por exemplo, seria preciso deslocar-se por grandes distâncias para chegar aos três lugares. Com ele, é possível realizar todas
essas atividades em apenas um “lugar”. Nos shopping centers, são relacionados diferentes tipos de lojas, restaurantes e formas de lazer, como cinemas e parques com jogos. Por reunir
diversos lugares e suas respectivas funções, podemos afirmar que o shopping center seria uma
heterotopia.
34
Se formos aplicar, também neste exemplo, as dimensões de produção de espaço propostas
pro Henri Lefebvre (in: Harvey, 2007) que discutimos acima, percebemos a seguinte mecânica: (1) há um território físico e material onde se instalam os shoppings centers, o que diz respeito ao espaço vivido; (2) ao mesmo tempo, existe um processo de significação em sua estrutura que faz com que os indivíduos possam identificá-lo como tal (seja através de placas e sinais, seja no mapa de lojas, seja em quaisquer outras formas de enunciação), referindo-se ao
espaço percebido; (3) por último, o que faz do shopping center uma heterotopia é justamente
sua carga simbólica e seu projeto utópico que tenta atualizar-se constantemente.
Para definir de forma precisa o conceito de heterotopias, Foucault (1984) lança mão de
cinco princípios básicos aos quais ela deve corresponder: (1) de que todas as culturas possuem, de forma particular, heterotopias; (2) que as heterotopias desempenham papéis determinados nas sociedades mas que podem, com o tempo, assumir funções diversas da original; (3)
que têm a capacidade de reunir, “num só espaço real, vários espaços, vários lugares que por si
só seriam incompatíveis”; (4) de que as heterotopias, como dimensão espacial, possuem uma
ligação com o tempo – constituindo heterocronias – e podem aparecer como heterotopias acumulativas, nas quais “o tempo não pára de se acumular e empilhar-se sobre si próprio”, ou
como heterotopias passageiras, como lugares estabelecidos temporariamente (como eventos,
circos ou locais que não permitam uma acumulação do tempo); e (5) de que elas possuem
uma relação com o “espaço que sobra”, seja o de reflexo dos lugares cotidianos “expondo-os
como ainda mais ilusórios”, seja como realização de uma utopia, a criação de um espaço idealizado.
Retornando ao exemplo do shopping center, podemos relacioná-lo diretamente a estes
princípios se considerarmos que (1) apesar de possuírem um formato padronizado, os shopping centers acabam sendo traduzidos conforme a cultura dos lugares onde funcionam; (2)
podemos estimar que a proposta principal e primeira dos shoppings foi a de concentrar o comércio urbano, mas com o tempo eles foram-se tornando lugares de passeio e entretenimento
(e por isso muitas pessoas vão aos shoppings sem a intenção de fazer compras); (3) e é justamente esta evolução de sua função cultural que faz com que estes locais centralizem as atividades comerciais, através de diversas lojas (desde supermercados até joalherias), opções de
alimentação, com extensa variedade de restaurantes e lanchonetes, lazer, em seus miniparques, e entretenimento, comportando até grandes salas de cinema que, até há poucas décadas atrás, funcionavam somente em enormes prédios exclusivos no centro das cidades. Os
35
shoppings também possuem uma relação com o tempo (4) sendo impermeabilizados a ele: se
entrarmos no mesmo shopping em um intervalo de 10 anos, eles permanecerão quase o mesmo em sua estrutura e aparência geral; o que muda são suas unidades (os lugares dentro do
lugar), que aí sim configuram-se na dimensão fugaz do tempo estando sempre vulneráveis às
últimas modas, tendências e datas comemorativas. Além disso, a arquitetura do shopping center é pensada de modo a excluir a interferência do tempo: ela dificulta a percepção da passagem das horas, situando o shopping portanto também numa outra temporalidade, uma heterocronia. Por último e justificando as proposições acima, (5) um shopping center é a concretização de um mundo totalmente esterilizado contra o que há de desorganizado, sujo e perigoso
no mundo exterior a ele; dentro de seus limites e paredes, uma maquete do mundo ideal que
vai desde a limpeza do piso até a organização simétrica da disposição das lojas, do verde da
folhagem e à tranquilidade no caminhar das pessoas e famílias que por ali transitam, compram, almoçam e vão ao cinema. Nesta última instância, nosso exemplo também manifesta
algo de utopia, algo de fantasioso, idealizado e irreal se comparado ao que se encontra fora
dos limites deste lugar.
A partir disto, resume-se que por heterotopias compreendem-se as dimensões do lugar
que ultrapassam o nosso cotidiano – não deixando, por isso, de poder fazer parte dele – conforme cada um dos passos vistos acima.
Incitada a discussão teórica a respeito do espaço e do lugar em suas diferentes perspectivas e configurações, é hora de iniciarmos a tratar do tema deste trabalho, sobre o qual recairão
todos os conceitos que vimos até então. No próximo capítulo, investigaremos como a Internet
e as redes sociais constituem as interações que pretendemos relacionar, finalmente, com a
percepção de lugar.
36
3 DA INTERNET E SEUS LUGARES
Os conceitos observados nos capítulos anteriores, referentes à evolução das concepções
de espaço e lugar, foram abordados neste trabalho para que pudéssemos, a partir de tais compreensões, analisar nosso objeto de pesquisa, que é a interação entre indivíduos mediada pela
Internet, especialmente aquelas realizadas através dos sistemas redes sociais virtuais (SRSs)
ou comunicadores instantâneos (CIs).
Embora o uso comercial e público da Internet no Brasil tenha sido inaugurado apenas no
ano de 1995 e o acesso ainda seja proporcionalmente restrito5, sua adesão tem uma grande
intensidade por parte de seus usuários. Pesquisas do Nielsen/Netratings colocam o Brasil em
primeiro lugar entre os países com maior média de permanência on-line em média de horas
mensais, estando mais de duas horas à frente do Reino Unido e Alemanha, por exemplo6. Estima-se que grande parte deste tempo dispendido na Internet seja utilizando ferramentas de
comunicação on-line, sejam elas um-a-um, como os CIs MSN Messenger7 e Skype8; ummuitos, por exemplo, blogs e fotologs; e muitos-muitos, como os SRSs, como Orkut9 e Facebook10, apontando um maior interesse por parte dos brasileiros em explorar a Internet como
meio de relacionamento do que pesquisa e informação (Fragoso, 2006). Este cenário apresenta, em números, a realidade brasileira em termos de apropriação do uso da Internet. Casos já
5
Segundo a Nielsen/Netratings, o número de usuários domésticos de Internet no Brasil em agosto de 2008 foi de aproximadamente 24,3 milhões (Ibope/Netratings, 2008), o que representa cerca de 22% do total da população brasileira – que, segundo o IBGE, ultrapassou os 191 milhões em 2007.
6
Em agosto de 2008, a média brasileira de tempo de acesso foi de 23 horas e 50 minutos (Ibope/Netratings, 2008).
7
Disponível em http://messenger.msn.com.br [Nov 2008]. Atualmente, a aplicação chama-se Windows Live Messenger, mas
a nomenclatura utilizada neste trabalho será a que permanece sendo utilizada tanto por grande parte dos usuários (MSN
Messenger ou simplesmente MSN).
8
Disponível em http://www.skype.com [Nov 2008].
9
Disponível em http://www.orkut.com.br [Nov 2008].
10
Disponível em http://www.facebook.com [Nov 2008].
37
profundamente estudados, como a “tomada” dos brasileiros no Orkut (Fragoso, 2006), demonstram a avidez do público brasileiro na Internet, especialmente quando se trata de comunicação interpessoal.
A este trabalho interessa, principalmente, a interação através da Internet entre indivíduos
no formato um-a-um, que pode ser mediada tanto pelos SRSs como pelos CIs. Entre as redes
sociais virtuais e os comunicadores instantâneos destacam-se, pela popularidade que adquiriram entre os usuários brasileiros, o Orkut e o MSN Messenger, respectivamente. Alguns índices comprovam a ampla adesão especificamente a esses ambientes no Brasil: em dezembro de
2007, mais de 12 milhões de brasileiros (ou seja, 68% do total de usuários de Internet domiciliar do país) acessaram o Orkut (ComScore in: Fragoso, 2008). Enquanto isso, o MSN apresenta números ainda maiores: em setembro de 2008, foi utilizado por cerca de 17,1 milhões
de brasileiros, o que corresponde a 74% dos internautas domiciliares do Brasil (Ibope/Netratings 2008b).
Uma das razões para tamanha popularização de justamente estas aplicações entre os usuários brasileiros é a função a que elas se propõem. Já foi dito que o perfil de uso da Internet por
parte dos brasileiros sugere que seu uso é majoritariamente direcionado a potencializar as relações interpessoais. Fragoso (2006), ao tratar especificamente dos jogos via Internet, recupera uma classificação dos ambientes on-line que pode nos esclarecer tal fenômeno, no qual haveria (1) ambientes com uma finalidade específica e objetivos de interação bem claros, como
como o Linkedin11, que serve para aprimorar relações profissionais, ou o Myspace12, se pensarmos em sua seção voltada para a divulgação de bandas e músicos; (2) sistemas cujo fim
principal é a interação em si, sem oferecer claramente um propósito para que elas ocorram,
servindo como uma plataforma onde as conversas um-a-um ou muitos-muitos ocorra livremente, nos quais se encaixam os SRSs como o Orkut ou o Plurk13, e os CIs como MSN Messenger, Google Talk e Skype; e (3) os espaços de jogo on-line, em que há uma intenção definida de diversão e entretenimento, como os MMORPGs14.
11
Disponível em http://www.linkedin.com [Nov 2008].
12
Disponível em http://www.myspace.com [Nov 2008].
13
Disponível em http://www.plurk.com [Nov 2008].
MMORPGs, ou Massive Multiplayer Online Role-Playing Games, são versões online dos Role-Playing Games, nos
quais os participantes atuam como personagens de uma estória. Assim como nos RPGs fora da rede, as atuações são
balizadas pelo universo ficcional e caracterização de cada personagem. (Fragoso, 2007, p.1).
14
38
Como se pode perceber, embora procuremos identificar alguns traços comuns à interação
on-line, os ambientes que interessam à nossa pesquisa são aqueles cujo objetivo é a comunicação interpessoal em si. Isto é, através das aplicações que oferecem a possibilidade de uma
“livre”15 interação que tem como principal objetivo e resultado o diálogo entre duas pessoas,
independente da localização geográfica de cada uma delas. As SRSs e os CIs que adequam-se
a esta categoria de ambiente on-line possuem um funcionamento bastante semelhante com o
da rede Orkut e do MSN Messenger, respectivamente.
Orkut é um sistema de rede social on-line com funcionalidades que permitem a comunicação um-a-um, um-muitos e muitos-muitos. Ao criar uma conta, o usuário pode personalizar
sua página (chamado “Perfil”) incluindo informações como país e cidade, descrição pessoal,
músicas e filmes favoritos, profissão e atividades, além de fotos e vídeos. Para interagir com
os outros membros da rede, basta adicioná-los como amigos (através da importação de contatos de e-mail, busca por palavra-chave como nome ou cidade, ou da relação de amigos de um
usuário ou dos membros de uma comunidade) e enviar recados (que ficam registrados na página “Livro de Recados”) ou depoimentos (um texto de até 1024 caracteres que é exibido na
página pessoal de quem o recebe), ou então participar dos grupos temáticos, chamados “Comunidades”. O Orkut possui milhões de usuários (sendo mais de 50% brasileiros16) e milhares
de comunidades.
O perfil do usuário de Orkut permite a interação do tipo um-muitos17, pois é uma página
pessoal que exibe informações e álbum de fotos, além da relação de amigos, comunidades e
recados dos usuários. Já as comunidades permitem a interação muitos-muitos à medida em
que todos os membros podem ler os tópicos dos fóruns e participar das discussões. É bastante
comum verificarmos que os fóruns com maior número de interações são os destinados a jogos
e socializações (Fragoso, 2008), acentuando o potencial interativo da rede. A interação um-aum se dá, principalmente, através dos livros de recados dos usuários, que deixam mensagens
de texto, imagens e links. É possível observar que o comportamento de alguns usuários neste
15
Escrevo “livre” entre aspas, pois não se pode desconsiderar, seja qual for a plataforma de interação, que exista uma mediação que define a forma como este diálogo deverá acontecer. O sentido da palavra, neste contexto, é de que não existe uma
motivação por parte da aplicação, como podemos observar nos jogos on-line ou nas redes segmentadas por algum posicionamento, por exemplo.
16
Dados disponíveis apenas para usuários do Orkut em http://www.orkut.com.br/Main#MembersAll.aspx [Nov 2008].
17
Dependendo das configurações de privacidade do usuário, os outros membros que não forem seus “amigos” não poderão
ver suas informações pessoais, fotos e vídeos.
39
livro de recados é semelhante à interação através dos CIs, com mensagens que devem ser lidas e respondidas com uma certa sincronia.
Já os CIs como o MSN Messenger têm em sua principal função a interação individual e
síncrona. Lançado em 1999 pela Microsoft para integrar o sistema operacional Windows, o
Messenger assumiu a liderança mundial no mesmo ano de sua inauguração, passando à frente
de outros comunicadores como o ICQ18 em termos de popularidade (Discovery Communications, 2008)19.
Para utilizar o MSN Messenger também é necessário criar uma conta de usuário, onde ficarão registradas as contas dos outros que forem adicionados como “amigos”. A diferença
básica entre o Messenger (bem como os outros comunicadores, como o ICQ o Skype) e os
SRSs é que as interações se dão quase que exclusivamente no âmbido do um-a-um e são privadas. Ou seja, ao contrário do Orkut, por exemplo, em que é possível visualizar (dependendo
ds configurações de privacidade) as interações entre um determinado usuário com seus amigos em seus livros de recados ou com as comunidades que pertence através dos fóruns, os diálogos via MSN são restritos aos participantes da conversa.
A interação através do Messenger ocorre quando um usuário clica sobre o ícone do outro,
e uma janela de conversa exclusiva é aberta para cada um deles, como uma entrada em sala de
chat privada, da qual apenas os dois usuários podem acessar e participar inicialmente. É possível convidar mais pessoas para participar da conversa, mas o ponto de partida é sempre entre dois usuários. As atualizações e modificações de interface sofridas pelo Messenger desde
seu lançamento sempre tendem a facilitar a utilização de suas funcionalidades e agregar novas
ferramentas para o diálogo nessas janelas, como os emoticons e as formas de conversa por
áudio ou vídeo, utilizando um microfone e uma câmera e transmitindo imagens quase em
tempo real. A sincronia da interação é outro diferencial dos CIs como o Messenger: o usuário
pode acompanhar quando o outro está digitando uma mensagem através de um aviso na janela, e a visualização da própria mensagem em uma fração de segundo após o envio dá a impressão de que a comunicação se dá em tempo real. O modo de funcionamento do Messenger
serve a potencializar as interações entre indivíduos na forma de uma conversa entre duas pessoas.
18
Disponível em http://www.icq.com [Nov 2008].
19
http://www.discoverybrasil.com/internet
40
Desta forma, observamos que a escolha pelo SRS Orkut e o comunicador MSN Messenger como principais representantes das formas de interação através da Internet, que é nosso
objeto de pesquisa, baseou-se na sua popularização no Brasil e na fidelidade que apresentam
às formas mais elementares de interação entre os indivíduos. As interações online que ocorrem nesses sistemas têm sido majoritariamente estudadas sob o ponto de vista das redes sociais que eles ajudam a formar, fomentar ou desenvolver (por exemplo, ver Recuero, 2005). O
que interessa a esta pesquisa, entretanto, é uma outra abordagem, com foco nos conceitos relacionados a espaço e lugar na Internet. É nesta direção que prosseguimos, portanto, nas seções que seguem.
3.1 Do espaço on-line
Para chegarmos ao conceito que pode nos fornecer indícios de nosso problema de pesquisa, que é a percepção de lugar nas interações on-line, é importante realizarmos o mesmo movimento feito nos capítulos anteriores, começando por uma perspectiva do espaço para chegar
ao que pode-se considerar o lugar.
Ao investigar lado a lado as noções espaciais da cultura ocidental com o objetivo de apreender o que seria o espaço on-line, Fragoso (2000) chega ao conceito de ciberespaço, que seria “o conjunto de informações codificadas binariamente que transita em circuitos digitais e
redes de transmissão” (p. 1).
O termo “ciberespaço”, que teria sido cunhado por William Gibson em Neuromancer,
tenta dar conta de abarcar todo o ecossistema de páginas, aplicações, hipertextos e informações que trafegam entre os servidores de Internet (Fragoso, 2003). Em termos de escala, podemos comparar o ciberespaço ao que aqui convencionamos chamar “espaço”, ou seja, a
perspectiva objetiva e vista “de fora” de toda essa profusão de dados e interações, à qual é necessária a complementação por uma visão “de dentro”.
Em relação à comparação entre espaço absoluto e relativo, tratada no primeiro capítulo
deste trabalho, Fragoso (2000) conclui que o ciberespaço é “um espaço do tipo relacional” (p.
6). Há que se considerar, no entanto, que a conceituação aqui adotada será outra: o espaço relacional, como já mencionamos, dará conta das questões relativas ao lugar, pois é fruto de
uma perspectiva subjetiva ao contrário do espaço absoluto, que será considerado como o “todo” objetivo dentro do qual as configurações do lugar aparecem inseridas.
41
Mais tarde e ainda sobre o ciberespaço, Fragoso (2003) propõe uma discussão que é fundamental a este trabalho, a respeito de algumas convenções que por vezes são consideradas
em relação à popularização da Internet e seus efeitos sobre o funcionamento social. Retomando a proposição de Harvey (2007) relativa à compressão de tempo e espaço, já abordada neste
trabalho, Fragoso (2003) comenta que a aparente aniquilação das distâncias promovida pelas
tecnologias digitais, principalmente a Internet, não exclui o fator local das relações.
Muito pelo contrário, como defende através de três motivos principais: (1) a estrutura
física do funcionamento das redes, que depende de tecnologias que, se por um lado segmentam por estarem física e geograficamente instaladas, por outro estão sujeitas à realidade
sócio-econômica dos países, estados e cidades a que pertencem20; (2) a ação dos agentes que
fazem com que o ciberespaço tome determinados traços, tendo como exemplo a ação dos hackers sobre os sistemas e, de forma mais localizada, as influências da grande popularização do
Orkut no Brasil sobre o funcionamento do SRS; e, por último, (3) alguns movimentos interessantes de serem observados no que diz respeito aos websites: ao mesmo tempo em que a
audiência desses sites aumenta em proporções exponenciais ano a ano, não se pode dizer que
o mesmo aconteça com os canais emissores. Como um sistema convencional de televisão ou
rádio, a Internet tem-se concentrado em pequenos números de fontes emissoras21. Desta
forma, pode-se compreender que
Assim, embora em mais de um sentido o ciberespaço não possua as qualidades
tangíveis do espaço geográfico, os fluxos de dados encontram-se ancorados em localidades 'reais' cuja heterogeneidade condiciona significativamente não apenas a
disponibilidade e o perfil das ferramentas tecnológicas disponíveis, mas também os
usos e apropriações realizados com essas mesmas ferramentas. (Fragoso, 2003, p. 7)
A partir desta reflexão, percebemos que, ao mesmo tempo em que a história social ocidental, com a pós-modernidade, provocou uma compressão tempo-espaço (Harvey, 2007)
tornando o planeta conquistável e as distâncias cada vez mais insignificantes, fez surgir no
âmbito de uma outra configuração, o ciberespaço, um funcionamento que é a um só tempo o
símbolo da aniquilação das distâncias (reduzindo ainda mais a distância já reduzida geogra-
20
A isto soma-se o dado do Ibope/Netratings (2008), citado no início desde capítulo, de que apenas 22% das residências brasileiras possuem conexão para Internet. Além disso, há variáveis como o tipo de conexão (discada ou banda larga) que
podem fazer diferença no acesso à Internet em termos de agilidade dos processos.
21
Atualmente, muitos dos SRSs e CIs que figuram entre os mais populares no Brasil e no mundo são propriedade de três
grandes grupos: o Google (http://www.google.com.br), atualmente o maior nome da Internet mundial, que concentra
redes como o Orkut, Youtube, Blogger, Picasa e o CI Google Talk; a Microsoft (http://www.microsoft.com.br) com o CI
MSN Messenger (atual Windows Live Messenger) e o Yahoo! (http://www.yahoo.com.br), com as redes Flickr e Yahoo!
Respostas e o comunicador Yahoo! Messenger.
42
ficamente) e da retomada do lugar (assinalando a importância do indivíduo como agente das
interações e de sua posição como influenciadora dos processos de interação). Podemos considerar, inclusive, que a percepção de lugar que procuramos identificar passe por esses atributos espaciais, e que seja construída de forma bem mais localizada do que “uma alucinação
consensual”, das palavras de Gibson (apud: Fragoso, 2000, p. 4).
A discussão central que interessa a este trabalho referente ao ciberespaço é justamente o
que dele é eliminação das distâncias, o que é desterritorialização e o que é localização e atua
na percepção do lugar. A partir do exposto acima, é possível supor que a compreensão do indivíduo durante as interações mediadas pela Internet deva passar, de alguma forma, por esses
limites geográficos – seja na forma como o diálogo é conduzido, seja na forma como ele é
percebido.
Vale retomar neste momento que, dentro do ciberespaço, as interações que pretendemos
investigar e analisar são as que ocorrem entre indivíduos. Em relação ao termo “interação”, há
divergências do seu uso e significado, mas o que adotamos neste trabalho é conforme a definição de Fragoso (2001), segundo a qual, enquanto a interação é o que existe entre os sujeitos,
a interatividade é a interação entre as pessoas e as mensagens, por exemplo as interfaces dos
programas de computador ou os links de um hipertexto (Fragoso, 2001). As interações entre
pessoas, que são o foco deste estudo, podem ser face-a-face, e portanto mediadas apenas pelas
linguagens naturais (voz, expressão corporal, etc), ou à distância. Neste último caso, dependem de uma nova camada de mediação, a das tecnologias. É deste tipo a situação que pretendemos estudar, já que se tratam das interações mediadas pela internet.
3.2 Dos lugares on-line
Para buscar nossa hipótese do que se pode configurar como um lugar on-line na percepção dos sujeitos da interação, recorremos ao conceito de heterotopias proposto por Foucault
(1984), apresentado no segundo capítulo deste trabalho. Com base nesta teoria, estima-se que
a percepção de lugar se configura em uma heterotopia própria da Internet, uma vez que é um
lugar compartilhado entre os dois ou mais sujeitos da interação que os aproxima sem desterritorializá-los. Sobre o conceito de heterotopias, Tucherman (2006) complementa que:
há também, em todas as culturas e civilizações, lugares reais, efetivos, que funcionam quase como utopias realizadas, espécies de lugares que são fora de todos os lu-
43
gares embora sejam efetivamente localizáveis. Exerceriam uma contestação ao
mesmo tempo mítica e real dos espaços onde vivemos. (p. 89)
Retomando os princípios para a existência das heterotopias de Foucault (1984), temos
que: (1) cada cultura tem as suas heterotopias; (2) elas evoluem e mudam com o tempo; (3)
conseguem unir em um lugar real diversos lugares que não poderiam ser reunidos de outra
forma; (4) estão ligadas a pequenas fatias de tempo; (5) têm a função de criar um lugar quase
utópico em relação aos lugares reais.
É possível supor que as interações on-line ocorram em lugares heterotópicos se pensarmos que (1) as relações interpessoais são extremamente culturais, de modo que essas interações e a forma como elas ocorrem também o são. Exemplo disso é a grande adesão do Brasil,
um país culturalmente conhecido por sua sociabilidade, às redes sociais e comunicadores instantâneos (Fragoso, 2006). Também é possível perceber algumas diferenças de identidade e
uso das ferramentas de interação no formato muitos-muitos entre os estados brasileiros (Fragoso, 2008).
Em relação à evolução desses lugares (2), percebe-se que as ferramentas que dão suporte
à interação, especialmente instantânea, estão em constante atualização, oferecendo cada vez
mais artifícios para transmitir proximidade nos diálogos – como as conversas por áudio e vídeo em tempo quase real nos CIs como MSN e Skype e a ampla utilização dos emoticons para
transmitir sentimentos, como alegria e raiva. Já o Orkut, por exemplo, foi concebido para funcionar como uma “'rede de amigos confiável” (como dizia sua descrição na página de login),
pois só era permitido o ingresso de pessoas que fossem convidadas por seus amigos a cadastrar-se. Hoje, o SRS sofreu diversas alterações – entre elas, o aumento do limite de fotos para
cada álbum pessoal e a inserção de comentários nessas fotos.
Tanto os SRSs como os CIs oferecem a possibilidade de (3) sobreposição de lugares reais22. O primeiro acumula diferentes espaços das próprias redes sociais virtuais em sua estrutura: tanto o Orkut como o Facebook, por exemplo, passaram a adotar ferramentas antes isoladas nos blogs, fotologs, videologs, fóruns e até guestbooks, possibilitando a criação de álbuns de fotos com espaço para comentários, a personalização de seus dados pessoais com freqüência ilimitada, a participação em discussões temáticas e o envio de mensagens para a pá-
22
Vale lembrar, aqui, que as interações on-line são do plano do virtual, mas nem por isso esses lugares deixam de ser reais.
Conforme Lévy (1996), o virtual opõe-se ao atual, enquano o real opõe-se ao possível.
44
gina pessoal de seus amigos, que podem ser adicionados ou excluídos. Já a sobreposição de
lugares dos comunicadores instantâneos se dá no campo das formas de interação: é possível
utilizar, ao mesmo tempo, recursos de texto, imagem, áudio e vídeo para uma conversa entre
duas ou mais pessoas, que também podem enviar arquivos quaisquer durante o diálogo, e pode-se interagir com vários contatos diferentes simultaneamente e de forma síncrona, como se
o sujeito estivesse, ao mesmo tempo, em vários lugares diferentes.
Em relação às (4) heterocronias, pode-se dizer que ambas as formas de interação funcionam com velocidade, estando afeitas à metáfora do circo ou festival, uma heterotopia que se
instala durante um curto tempo e logo se acaba. A medida em que o sujeito decide excluir todos os seus dados, como fotos, recados, comunidades e amigos do Orkut e resolve iniciar sua
participação do zero, ou quando inicia uma nova conversa por MSN Messenger sem ter guardado um histórico, por exemplo. Por outro lado, os comunicadores e SRSs têm como característica acumular estas parcelas de tempo de forma automática, seja através dos registros do
usuário em fóruns e mensagens, seja através de logs de conversas armazenadas pelo Messenger.
E, finalmente (5), uma das funções mais comumente atribuídas ao ciberespaço é a aniquilação das distâncias (Fragoso, 2003). Isto significa que, em relação ao espaço “do lado de cá”
das interações, elas são heterotópicas por conseguir reunir, independentes do tempo, pessoas
de diversas localidades diferentes em uma mesma conversa. Sob esta ótica, é possível dizer
que essas interações aproximam as pessoas de uma forma organizada, colaborativa e, pode-se
até dizer, segura, na medida em que a separação física garante que não haja ocorrência de pelo
menos um tipo de violência, que atente sobre os bens ou sobre os corpos.
Além disso, esses ambientes on-line potencializam nossa capacidade de interação com
usuários, nos munindo das mais diversas ferramentas de comunicação para utilizarmos (seja
para interagir com um amigo ou para publicar uma mensagem que poderá gerar interação de
uma legião de desconhecidos). A essência dessas ferramentas atende a um projeto de mundo
ideal, onde todas as pessoas têm a oportunidade de se expressarem da maneira que achar conveniente, onde é possível compartilhar seu mundo com sujeitos sem as fronteiras temporais e
espaciais dos espaços fora do ciberespaço.
45
Podemos considerar, ainda, que haja uma noção de presença na composição desta noção
de lugar. Vassallo (2007), ao trazer o conceito de telepresença no Teletandem23, acaba fornecendo-nos indícios do que poderá ser encontrado ao final desta pesquisa sobre a percepção
espacial das pessoas que interagem pela Internet. Para investigar como se dão as relações entre os participantes da aprendizagem no Teletandem, Vassallo procura relacionar a telepresença com outro conceito de grande relevância e que, até então, era comumente considerado como oposto nos seus estudos: o de telepresença (mais espacial), relacionado à percepção do
lugar do sujeito da interação, e o de presença social (mais social), que diz respeito à sensação
de proximidade com o outro sujeito da relação. Tudo isto formando o conceito geral de telepresença, sob a compreensão inicial de que a presença seria a “ilusão perceptiva da não mediação” (Lombard & Ditton apud: Vassallo, 2007).
Segundo Vassallo, a telepresença se dá com a utilização da conversa por vídeo durante a
interação, através da qual um sujeito conseguiria perceber o lugar do outro e, portanto, ambos
poderiam sentir-se no mesmo lugar enquanto conversam. Para identificar tais configurações,
são propostos dois elementos que, quanto mais fortes, maior a sensação de telepresença: vividez e interatividade24. Corresponde à vividez a representação do ambiente onde ocorre a interação, seja através dos sentidos envolvidos no diálogo ou da intensidade de envolvimento.
Com base nisso, podemos inferir que uma conversa que utilize áudio (audição), vídeo (visão)
e texto (tato) tenha muito mais vividez do que uma que contemple apenas um desses recursos.
Em relação à interatividade (para nós, conforme o sentido anteriormente apresentado, interação), conforme Vassallo, três fatores contam para a telepresença: (1) o controle sobre o
ambiente, que indica as possibilidades de personalização e alteração de sua forma e/ou conteúdo; (2) a comunicação estabelecida através da troca de mensagens entre os sujeitos; e a (3)
velocidade de resposta a essas mensagens, tanto por parte do aplicativo como do outro sujeito.
Segundo Khalifa e Shen (in: Vassallo, 2007.), o fator de comunicação facilitaria especialmente a percepção quanto à presença social, enquanto o controle sobre o ambiente e a velocidade
afetariam na sensação de telepresença no sentido de lugar.
23
Teletandem é um método educacional direcionado à aprendizagem de línguas entre brasileiros e estran-geiros através de
interações por CIs que se propõe a “criar um âmbito de coexistência e com-partilhamento de línguas e culturas, colocadas
no mesmo plano” (Vassallo, 2007, on-line).
24
Em Vassallo (2007), a interatividade é entendida como a qualidade de um meio em promover a interação.
46
Analisando as interações que buscamos compreender sob os elementos da sensação de telepresença, podemos observar que: em relação aos SRSs, a vividez é relativamente reduzida,
uma vez, do ponto de vista da interação um-a-um, ela só é possível através do envio de mensagens de texto ou imagem, despertando quase principalmente o sentido da visão. O mesmo
acontece com a interatividade, uma vez que num SRS como o Orkut só é possível modificar o
conteúdo do ambiente da interação e a forma de comunicação não é síncrona e, por isso, é difícil que se discuta um assunto, por exemplo, apenas através das mensagens do livro de recados. Isso acontece porque os SRSs não funcionam com a lógica de conversação entre dois sujeitos, de modo que todos os contatos autorizados podem enviar mensagens ao livro de recados do usuário, que guarda apenas as mensagens recebidas como uma caixa de entrada de um
sistema de e-mail ou um mural de avisos.
Já os comunicadores instantâneos como o MSN Messenger oferecem mais elementos para
a percepção de telepresença, como podemos observar através dos fatores indicados por Vassallo (2007): quanto à vividez, é dada a possibilidade de se interagir em áudio, vídeo e texto
ao mesmo tempo, atingindo o máximo dos sentidos que podem ser impactados atualmente
através da Internet. A interatividade nos CIs também é ampliada, já que o usuário pode alterar, desde a aparência da janela e a fonte do texto de conversação, até a imagem que quiser
exibir ao outro sujeito através de sua webcam. Além disso, o diálogo é síncrono, ou seja, realizado em tempo quase real. Dependendo da conexão dos usuários e da estabilidade dos aplicativos de comunicação instantânea, uma mensagem demora poucos instantes para chegar ao
seu destinatário, e pode ser visualizada na janela de conversação junto a todo o diálogo ativo
que se está travando com o outro usuário. Com isso, podemos supor que os comunicadores
instantâneos promovam uma maior sensação de telepresença, tanto em sua dimensão espacial
como social, nas interações on-line.
Propondo uma visão que integra a noção de telepresença (mais espacial) à presença social
(mais social), Vassallo desenvolve uma perspectiva sob a qual as interações no Teletandem
consigam, ao mesmo tempo, tornar próximas pessoas antes desconhecidas (e, em grande parte
das vezes, de nacionalidades diferentes) e fazê-las compartilhar um ambiente, que podemos
considerar que seja uma heterotopia on-line no sentido anterirmente apresentado. É importante observar, contudo, que essas possibilidades prevêem um tipo de conversa que utiliza artifícios de vídeo, e as interações que buscamos identificar podem ocorrer baseando-se apenas em
texto, seja nos CIs ou SRSs.
47
Apesar de considerarmos esta perspectiva de lugares on-line e até de telepresença, é importante destacarmos que uma percepção que leve a uma possibilidade heterotópica não implica que o sujeito se descole de sua presença física, até porque, como já comentamos sobre o
ciberespaço, estima-se que esta compreensão mantenha, em alguma dimensão, um enraizamento no local e no real do indivíduo. Isto está de acordo com a concepção de alguns teóricos, como Santaella (2003), quando diz que
De um lado, o corpo mantém a propriocepção de sua existência carnal no espaço em
que existe. De outro lado, o arranjo monitorado de interfaces transporta o aparato
sensorial e perceptivo aumentado do corpo para uma jornada imersiva em um
mundo espectral. Isso significa que, para julgamento de percepção, que desempenha
o papel do signo nesta semiose, há duas distintas e simultâneas representações do
corpo: aquela do corpo carnal e aquela dos corpos alternativos das projeções desencarnadas. Isso explica por que a coerência proprioceptiva pode ser mantida a despeito das fronteiras mutáveis do corpo no ciberespaço. (p. 313)
A questão que fica e é o ponto central deste trabalho é: estará presente esta compreensão
heterotópica entre os sujeitos que participam das interações on-line? Estarão estes usuários,
enquanto conversam com seus amigos, colegas e familiares, sentindo-se presentes em suas
casas, projetados em uma completa virtualização corporal, presentes um mesmo ambiente ou
apenas mais próximos dos seus interlocutores? Com isso, cabe agora partirmos para nosso
campo de pesquisa, com o objetivo de investigar que tipo de consciência os sujeitos dessas
interações on-line têm em relação à percepção de lugar, verificando se existe algum tipo de
configuração da ordem das heterotopias nessas interações.
48
4 DAS ENTREVISTAS
Após discutirmos os conceitos de espaço e lugar sob óticas distintas e complementares,
e abordarmos as questões referentes à Internet, às redes sociais e às formas de presença online e off-line, os rumos deste trabalho apontam para a necessidade de uma investigação empírica de como estas interações se dão no ponto de vista de quem participa delas.
Se o principal atributo que comentamos até este momento foi a percepção de lugar, torna-se fundamental então, buscar o contato com os indivíduos de onde parte esta percepção,
enquanto estejam em contato constante com a realidade das relações e interações via redes
sociais (SRS) e comunicadores instantâneos (CIs). Dado que não seria possível investigar
percepções individuais em sua totalidade com procedimentos quantitativos, a metodologia
seguida por este trabalho é a pesquisa qualitativa com entrevista individual em profundidade
realizada através do comunicador instantâneo MSN, utilizando amostragem coletada em comunidades selecionadas no SRS Orkut.
4.1 Procedimentos
A aplicação da pesquisa deste trabalho se deu com base em uma organização dos procedimentos em etapas sucessivas e integradas, iniciando pela escolha da metodologia, que foi
seguida pela seleção de amostragem, a análise das comunidades selecionadas, a análise de
perfis dos membros que aceitaram participar da pesquisa e a entrevista propriamente dita.
49
4.1.1 Metodologia
Para poder investigar e analisar de forma empírica como se dá a percepção de lugar por
parte dos usuários das redes sociais virtuais, a metodologia escolhida foi a entrevista individual e semi-aberta em profundidade. A principal razão para se utilizar deste método é a apreensão de valores subjetivos proporcionada por ela, que nos possibilita verificar de forma mais
profunda as formas de percepção que procuramos identificar nestre trabalho. A respeito deste
tipo de abordagem, Jorge Duarte (2006) aponta que
A entrevista em profundidade é um recurso metodológico que busca, com base em
teorias e pressupostos definidos pelo investigador, recolher respostas a partir da experiência subjetiva de uma fonte, selecionada por deter informações que se deseja
conhecer. (…) o objetivo [da entrevista] muitas vezes está mais relacionado à aprendizagem por meio da identificação da riqueza e diversidade, pela integração das informações e síntese das descobertas do que ao estabelecimento de conclusões precisas e definitivas. (p. 63)
A forma de entrevista realizada com os usuários das SRS foi semi-aberta, ou seja, existe
um roteiro pré-definido e que guiará o diálogo com o entrevistado, mas é possível realizar alterações de percurso quando for necessário. Com isso, as questões são semi-estruturadas, uma
vez que o roteiro conta com perguntas que direcionam a entrevista ao foco necessário, mas
suas perguntas podem ser apresentadas de forma e ordem diferente do previsto ou até suprimidas caso o encaminhamento anterior indique que o conteúdo daquela pergunta não se aplica
àquele entrevistado.
Para que a pesquisa pudesse ser feita utilizando-se das peculiaridades que as redes sociais
online apresentam, optamos por realizar a entrevista através do comunicador instantâneo
MSN. Ao mesmo tempo em que a realização da entrevista por meio do MSN facilitou o registro da conversa e a aproximação entre entrevistador e entrevistado, o diálogo pôde ocorrer nas
próprias condições sob as quais justamente trata este trabalho – ou seja, através de interações.
mediadas pela tecnologia digital. Isso também facilitou a abordagem e a compreensão do assunto por parte dos entrevistados, uma vez que a discussão se deu sobre a realidade que estavam presenciando naquele momento.
4.1.2 Seleção da Amostragem
A definição da amostragem deu-se em duas etapas: a escolha da fonte de amostras e a seleção dos indivíduos para a entrevista, tendo como principal critério o perfil de uso da Internet. Para realizar tais escolhas, foi necessária uma definição de grupos que deveriam ser con-
50
templados na pesquisa: (1) a geração que começou a utilizar a web ainda entre a infância e
adolescência, estando atualmente bastante adaptados ao funcionamento de websites e SRS,
que já fazem parte do seu cotidiano de alguma forma; (2) uma geração anterior a esta, formada por pessoas que “descobriram” a internet e a web 2.0 há pouco tempo, e ainda estão em
processo de aprendizagem e adaptação.
Para que se pudesse encontrar indivíduos de acordo com estas faixas, foi escolhido como
instrumento de fonte de amostras o SRS Orkut, por ser o mais utilizado no Brasil. Lançado
em 2004, o Orkut abarca mais de 68% do total de usuários de internet do país, tendo sido acessado por mais de 12 milhões de usuários únicos no ano de 2007 (Comscore 2007 in: Fragoso, 2008).
A partir da definição dos grupos para amostragem e da seleção da fonte onde se buscaria
os entrevistados, definiu-se como encontrá-los. Entre as principais funcionalidades do Orkut,
estão suas comunidades, que chegam a agregar milhões de usuários, de modo que estes foram
os locais onde a amostragem foi selecionada. Para que fosse possível encontrar indivíduos
com o perfil de entrevistados definido, selecionaram-se duas comunidades: (1) Saudades da
galera da escola! (139.719 membros em 25/10/2008), e (2) Aposentados no Orkut (796 membros em 27/10/2008).
Estas comunidades foram escolhidas de forma intencional, através do mecanismo de busca interna do Orkut, utilizando as palavras-chave (1) “saudades escola” e (2) “aposentados” 25,
relacionadas aos critérios para os perfis definidos inicialmente e dando preferência às que
continham mais pessoas.
As comunidades selecionadas foram Saudades da galera da escola! e Aposentados no Orkut e agregam usuários de faixas etárias conforme os critérios acima descritos, sendo uma (1)
mais relacionada a jovens adultos que ainda possuem algum tipo de vínculo com a escola ou
saíram há poucos anos dela (ou seja, aproximadamente entre os 18 e 25 anos), e (2) adultos já
aposentados, possivelmente acima dos 40 anos26. Através destas comunidades, a escolha dos
25
Nos resultados da pesquisa por “aposentados”, geraram mais de mil resultados e foram apresentadas outras 2 comunidades
com mais membros do que a selecionada. Uma possuía mais de 17.000 membros, e a outra, mais de 1.500, mas ambas eram relacionadas aos jogos Counter Strike e Mu, o que não se adequava ao perfil desejado desta pesquisa.
26
Excetuam-se aqui os aposentados por invalidez, que podem ter idades inferiores a esta.
51
entrevistados também obteve uma maior isenção em termos de localização geográfica e perfil
sócio-cultural.
A seleção dos entrevistados, a partir da escolha das comunidades, foi por conveniência ou
acidental, na qual foram convidados as 15 pessoas que ocupavam a primeira página de membros de cada uma das comunidades – no total, foram selecionadas 30 pessoas. Vale destacar
que o Orkut ordena seus membros conforme seus status no website. Logo, os 15 primeiros
membros de uma listagem são os que estão online naquele momento, ou as últimas pessoas
daquela relação a se 'logarem' no Orkut. Selecionar os 15 membros que estavam online (ou
haviam estado há pouco tempo) nas comunidades também significou escolher pessoas que
possivelmente utilizassem o Orkut mais freqüentemente e, portanto, estivessem mais próximas do perfil de entrevistado desejado.
Cada um dos 30 indivíduos recebeu mensagens pessoais em seus livros de recados convidando-os para as entrevistas, explicando os objetivos do trabalho, a instituição à qual pertencia e o tempo médio de duração da entrevista, informando também que ela seria feita via
MSN. Devido a configurações de privacidade de grande parte dos usuários, foi preciso enviar
“convites” de amizade pelo Orkut para que se pudesse contatar os selecionados e convidá-los
para a entrevista. Esta etapa a mais (a de pedido para “adicionar como amigo”) já foi eliminatória. Tanto os convites como a entrevista foram realizados a partir de minhas contas pessoais
de Orkut e MSN, o que facilitou a abordagem e o contato com os entrevistados.
O quadro abaixo apresenta as etapas de convite e aceite dos selecionados para a entrevista. Para preservar a identidade dos usuários, eles são identificados pelas iniciais de seu nome
de exibição do perfil. Como pode-se acompanhar no quadro abaixo, houve resposta positiva
em 7 dos 30 selecionados para participar da entrevista, e 3 destes efetivamente a responderam.
Entrevistas – Seleção da amostragem
Convites “Adicionar como amigo”
Enviados
Aceitos
Grupo I
“Saudades do Colégio”
Grupo II
“Aposentados no
Orkut”
Convites para a entrevista por scrap
Enviados
Aceitos
Entrevistados
7
2
8
3
2
6
1
10
3
1
Tabela 1. Relação entre usuários convidados para a entrevista e aceites.
Somente uma pessoa manifestou-se contrária à entrevista. As demais aceitavam o convite ou simplesmente o ignoravam.
52
4.1.3 Análise de Comunidades
Como já foi dito acima, a seleção das comunidades de onde seriam escolhidos os participantes desta pesquisa foi feita através da busca por palavras-chave relacionadas aos perfis de
entrevistados desejados.
A comunidade “Saudades da galera da escola!” (Figura 1) possui uma abordagem que
permite a interpretação de que é voltada a pessoas recém-saídas da escola, que possivelmente
não ingressaram na faculdade (ou ainda não adaptaram-se a ela) por diversos fatores.
O primeiro deles é o seu título, que destaca a saudade dos amigos da escola, o que evoca
um caráter de um vínculo que, é provável, ainda não foi totalmente encerrado. Sua descrição
também oferece indícios de que as pessoas que se identificam com a comunidade e a ela
pertencem ainda possuem lembranças bastante recentes desta época.
Figura 1. Comunidade Saudades da galera da escola!27.
Os tópicos do fórum da comunidade também indicam que há 3 tipos de membros na comunidade: os que concluíram o Ensino Médio há cerca de três anos28; os que mudaram-se de
cidade ou trocaram de escola, mas ainda estudam no Ensino Fundamental ou Médio; e os que
apenas trocaram de turma.
27
Disponível em http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=3559814. [Out 2008]
28
No tópico “Sua galera continua a se encontrar?”, cuja última atualização data de 17/09/2008, as postagens indicam que há
diversos membros que formaram-se após de 2004. P.F., por exemplo, escreveu que “Depois de 3 anos sem nos encontrar,
agora estamos encontrando bastante.”
53
É interessante observar que esta comunidade possui uma função muito mais identitária do
que de discussão, pois seu fórum possui em grande parte tópicos de spam, ou com poucas respostas29.
Fragoso (2008) observa as movimentações desses fóruns como um dos critérios para a
análise da função de comunidades do Orkut. Esta função pode ser puramente identitária, o que
se observa em comunidades com laços mais fracos entre seus membros30, nas quais as interações são bem inferiores que seu número de participantes, ou agregadora, quando os laços são
mais fortes 31entre os membros e a comunidade serve como um “ponto de encontro” onde ocorrem diversos diálogos e há uma maior socialização.
Já a comunidade “Aposentados no Orkut” possui uma função mais agregadora: em seu
reduzido número de membros, há uma grande atividade. O fórum é amplamente utilizado para
discutir benefícios, projetos de lei, tirar dúvidas e relacionar-se com outros aposentados. Utilizando esta comunidade como fonte de amostragem para o segundo grupo de nossa pesquisa,
o objetivo era reunir pessoas que estivessem, em sua maioria, acima dos 40 anos.
Figura 2. Comunidade Aposentados no Orkut32.
29
O tópico mais ativo possui 736 postagens, conforme consulta no dia 01/11/2008, um número bem abaixo de seus mais de
130 mil membros
30
Comunidades com muitos membros podem ter laços mais fracos – mas isto não é uma regra, devido à maior probabilidade
do uso dessas como identidade. Neste caso, a comunidade serve mais para identificar o seu membro como alguém que
tem saudades da escola do que para reunir ex-colegas – o que geraria laços bem mais fortes, por exemplo.
31
Para saber mais sobre laços fortes e fracos como configuração de redes sociais virtuais, ver Recuero, 2005.
32
Disponível em http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=228091. [Out 2008]
54
O que se encontrou nesta comunidade, no entanto, são dezenas de membros mais jovens,
muitos deles aposentados por invalidez. Isso se comprova nas discussões da comunidade: há
quatro tópicos com o nome “Aposentadoria por Invalidez” e variantes (como “Aposentados
por Invalidez), e um tópico chamado “Aposentadoria Precoce”. Ao todo, são mais de 100 postagens com o termo “invalidez” nos quais os aposentados relacionam-se pedindo ajuda e consolando-se uns aos outros por estar impossibilitado de trabalhar antes dos 60 anos.
Por tratarem de etapas da vida comum a uma grande parcela da população brasileira
(principalmente se contarmos apenas os usuários de Internet no país), ambas as comunidades
são bastante genéricas, de modo que a escolha delas não refletiu em nenhuma outra segmentação sócio-cultural ou geográfica à qual poderíamos estar sujeitos.
4.1.4 Análise dos entrevistados
Apesar de se ter definido as comunidades de modo a facilitar a observação de uma ampla
variedade de perfis, os 3 convidados que realizaram a entrevista possuem traços que, à primeira vista, os tornam bastante semelhantes. A tabela que segue apresenta alguns dados quantitativos destes usuários, coletados no início das entrevistas, que demonstram esta semelhança:
Entrevistados
Grupo I
“Saudades
do Colégio”
Grupo II
“Aposentados
no Orkut”
Há quanto tempo
usa a Internet
Entrevistado
Sexo
Idade
Escolaridade
Estado
E.M
Fem.
23
Superior
Incompleto
RN
Pessoal e estudo
8 anos
T.C.
Masc.
22
Superior
Incompleto
MG
Profissional e pessoal
8 anos
D.V.
Fem.
35
Médio Incompleto
RJ
Profissional e religioso
4 anos
33
Uso de Internet
Tabela 2. Alguns dados relacionados aos entrevistados.
Se analisarmos de forma quantitativa e objetiva cada um deles, perceberemos que a média de idade é relativamente equilibrada, assim como a experiência com a Internet em termos
de tempo. É importante destacar que os dois entrevistados do Grupo I começaram a usar a
33
Referente ao uso prioritário. Os 3 entrevistados declararam utilizar a Internet para conversar com amigos, colegas e família.
55
web na época do surgimento e popularização das redes sociais e de grande parte dos CIs34, o
que contribuiu para que eles fossem adaptando-se às modificações e atualizações desses sistemas. Isso já posiciona os grupos de forma diferente: asism como o planejado, o primeiro
grupo compreendeu pessoas bem mais adaptadas à Internet do que o Grupo II, que é composto por uma usuária que teria aprendido a usá-la há menos tempo, ainda não a tendo incorporado ao seu cotidiano pessoal.
Apesar de sabermos que, neste trabalho, o Orkut foi utilizado somente para a seleção de
amostragem para as entrevistas, é importante que observemos alguns indicadores nos perfis
desses usuários que participaram da pesquisa. Dessa forma, é possível fazer um cruzamento
entre algumas respostas iniciais e o que é possível apreender nesses perfis.
A usuária E.M., 23 anos, afirmou que utiliza a Internet, principalmente, para conversar
com seus amigos e irmãos que moram longe, e também para trocas de e-mails sobre trabalhos
da universidade. Seu perfil também revela isso: entre os únicos itens preenchidos de seu perfil, há dois links para eventos e centros acadêmicos de seu curso, o que se repete em relação
às comunidades que participa (como “Direito UFRN” e “Bolsistas CNPq/PIBIC-CAPES"). A
entrevistada participa de outras 95 comunidades, sendo várias outras relacionadas a assuntos
acadêmicos e outras de assuntos pessoais (como “Indique um bom filme” e “Comunidade do
irmão mais velho”).
Já T.C., 22 anos, relatou que divide suas relações conforme o contato através da Internet:
para ele, os CIs e e-mails possuem uma função mais profissional, sendo utilizados principalmente para contatar seus clientes, enquanto que os SRSs como o Orkut abarcam relações pessoais, com amigos, familiares e colegas. T.C. também utiliza os CIs para conversar com seu
irmão que atualmente mora em Londres. Seu perfil no Orkut ilustra essa divisão de que fala,
já que demonstra a dedicação de T.C. em incluir em seu perfil uma série de informações bem
particulares, como uma auto-descrição, dezenas de fotos com a família e os amigos, depoimentos e participação em muitas comunidades (155 ao todo) que denotam seu gosto pessoal
(como “U2 Brasil”) e algumas até debochadas (como “Odeio privada gelada”).
34
No início dos anos 2000, ainda destacavam-se as salas de chat e já começavam a se popularizar os sistemas de comunicação instantânea, como o ICQ e o MSN Messenger. Um dos entrevistados, inclusive, afirmou que utilizava o ICQ no ano
de 2002, através do qual conheceu sua atual namorada.
56
Os perfis desses entrevistados para este trabalho ilustram traços de um comportamento
que se buscava no Grupo I quanto à relação dos indivíduos com as redes sociais e os CIs: por
um lado, T.C. alega ter principalmente relações profissionais através da Internet, e também
dedica um grande tempo e investimento em participar e estar presente nessas redes, mantendo
seu perfil sempre atualizado e rico em informações sobre sua vida, família e até personalidade. Provavelmente isto ocorra por ele estar acostumado e adaptado à Internet e às redes sociais. Por outro, a usuária E.M., segundo seu relato, utiliza largamente os CIs para comunicar-se
com seus amigos, colegas e familiares. Desta forma, os perfis se complementam de modo que
poderemos obter, a partir de suas respostas a respeito do tema deste trabalho, as impressões de
quem utiliza a Internet e as redes sociais de formas distintas e, também, em ambos os casos,
mantendo relações pessoais.
No Grupo II, a única selecionada a ser entrevistada foi D.V., 35 anos, que respondeu utilizar a Internet principalmente com fins de pesquisa e interação em fóruns relacionados à sua
religião e contato com a família, uso que se relaciona ao conteúdo de seu perfil no Orkut.
Com uma descrição que faz menção à religião (“Simples e apaixonada por Jesus, meus filhos
e meu amor...”), diversas das 58 comunidades de que D.V. participa são de temas religiosos
(como a comunidade “Igreja Batista Getsêmani”).
A participação de D.V. na comunidade “Aposentados no Orkut”, que utilizamos neste
trabalho como fonte de nosssa amostragem do Grupo II, é bastante peculiar: D.V. está entre
os membros para interagir com os aposentados, por conta do trabalho que realiza em um CID
(Centro de Inclusão Digital) prestando serviços de auxílio e iniciação ao uso da Internet entre
os aposentados. Não se trata, portanto, de uma pessoa mais velha e aposentada, como era previsto selecionar daquela comunidade. A conversa e o tempo de uso da Internet relatados por
D.V., no entanto, mantiveram o perfil esperado de seu grupo, isto é, alguém mais familiarizada com outros meios que ainda estivesse aprimorando sua experiência na Internet.
Após a apresentação da forma como foi conduzida a entrevista, analisaremos as respostas
obtidas conforme o problema de pesquisa deste trabalho partindo, em seguida, para a discussão dos resultados.
57
4.2 A entrevista
Como foi mencionado acima, apenas 3 das 30 pessoas convidadas atenderam à entrevista.
Para preservar sua identidade e informações pessoais, usaremos aqui, para representar os entrevistados, as iniciais de seus nomes como apareciam em seus perfis de Orkut no momento
do convite. Além disso, por se tratar de entrevistas longas (que duraram, em média, 1h cada, e
geraram arquivos muito extensos) suas transcrições (mais precisamente, os logs de conversa
do MSN) não foram incluídas neste trabalho. Os arquivos com as entrevistas na íntegra serão
guardados pelos próximos cinco anos e poderão ser disponibilizados com fins científicos e
acadêmicos mediante solicitação à autora.
As entrevistas ocorreram através do MSN durante um período médio de 1h, no qual se
procurou responder às questões e temas apontados no roteiro estimado a seguir:
- Apresentação da entrevista;
- Coleta inicial de dados: idade, escolaridade, cidade onde mora, onde acessa a Internet
e há quanto tempo;
- O que faz na Internet?
- A partir de que redes sociais se comunica com as pessoas?
- Que relação tem com as pessoas com quem interage nessas redes: familiares, colegas
(trabalho ou estudos), amigos off-line, amigos on-line e/ou desconhecidos?
- Onde moram as pessoas com quem interage?
- Tem vontade de conhecer pessoalmente (ou já conheceu) seus amigos virtuais?
- Considera-se próximo ou distante das pessoas com quem interage?
- Conversa com pessoas que estão na mesma sala ou ambiente que você? Por quê?
- Onde está agora? Sente-se fisicamente situado nesse lugar enquanto conversamos?
- Consegue fazer uma comparação entre este lugar e algum outro?
- Durante a interação, há diferença entre quem está próximo e quem está distante?
- O que é estar próximo a alguém?
- Utiliza artifícios para sentir-se mais próximo das pessoas com quem interage?
58
- Quando interage com Redes Sociais, sente-se em um lugar diferente? Como é? Isto
muda entre redes (por exemplo, diferença entre Orkut e MSN)?
- Onde acha que estamos agora?
- Acredita que nesta conversa estamos em lugares diferentes ou compartilhamos um
mesmo espaço?
Figura 3. Captura de tela no momento de uma das entrevistas.
Por ser uma entrevista semi-aberta, o roteiro acima não foi aplicado de forma literal, utilizando a mesma abordagem na formulação das perguntas para todos os entrvistados, nem
conforme um ordenamento estritamente planejado, durante as entrevistas. O que se buscou,
portanto, foi apreender a compreensão de cada entrevistado e introduzir os temas que fossem
mais pertinentes ao estágio do diálogo, algumas vezes dedicando-se mais a um do que a outro
aspecto, e outras retornando a alguns assuntos. Se observarmos como se deu a aplicação neste
trabalho, confirmaremos que a entrevista
não é simplesmente um trabalho de coleta de informações, mas, sempre, uma situação de interação, ou mesmo de influência entre dois indivíduos e que as
´informações´ dadas pelo sujeito (o material´ que ele fornece) podem ser profundamente afetadas pela natureza de suas relações com o entrevistador. (Kandel apud:
Duarte, 2006, p. 71)
As entrevistas ocorreram sob o aceite de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A) por parte dos entrevistados, que foram informados desde o início da abordagem a respeito da função acadêmica, dos objetivos da pesquisa e do compromisso em preservar a imagem e informações pessoais dos participantes.
59
4.3 Análise das Entrevistas
Antes de partirmos para a discussão, relacionando os traços identificados na pesquisa
com os conceitos apresentados neste trabalho em busca de um caminho conclusivo, é importante fazermos uma análise detalhada das entrevistas realizadas. Como já comentado, não serão disponibilizados os arquivos das entrevistas na íntegra, mas reproduziremos alguns trechos relevantes. Os perfis dos entrevistados que participaram da entrevista foram bastante
complementares, e as entrevistas puderam abordar, de forma particular e mais aprofundada, as
impressões e compreensões de cada um a respeito da percepção de lugar utilizando-se de redes sociais e CIs on-line.
A primeira parte da entrevista, na qual foram coletados alguns dados quantitativos (expostos na Tabela 2), procurou delinear estes perfis e identificar como se dava o uso da Internet por cada um dos entrevistados. Como comentado anteriormente, a entrevistada E.M. utiliza o Orkut e o MSN tanto para interagir com familiares como com amigos e colegas de faculdade, tratando através deles de assuntos pessoais e acadêmicos; T.C. utiliza CIs e e-mail para
contatos profissionais, com amigos e com a família (incluindo um irmão que atualmente mora
na Inglaterra), enquanto direciona o Orkut apenas para uso pessoal; e D.V. faz um uso pessoal
e religioso, pois participa de fóruns evangélicos e conversa com alguns amigos através do Orkut e MSN, mas prefere comunicar-se apenas com sua família através do comunicador instantâneo.
Quando introduzidos ao tema da pesquisa35, os 3 entrevistados sentiram uma certa dificuldade de compreendê-lo, mas os selecionados do Grupo I captaram com mais facilidade.
Por utilizar os SRSs e CIs para conversar tanto com familiares e amigos que moram em outro
estado como com colegas que moram na mesma cidade, a entrevistada E.M. respondeu que
entende que a Internet seria um “lugar que existe sem existir”, referindo-se à sua função de
permitir a comunicação instantânea com diversas pessoas que estão em vários lugares diferentes ao mesmo tempo:
é, talvez eu nunca tenha parado pra refletir sobre isso... mas, de fato, é um lugar que
"existe sem existir" né hehehe36... não concretamente, mas que é muito prático com
35
Visto a dificuldade de compreensão que se poderia ter para apresentar o problema de pesquisa aos entrevistados, a abordagem utilizada foi a de perguntar se já haviam ouvido falar (ou pensado) sobre a existência de uma espécie de lugar virtual, que seria o local onde ocorrem as conversas entre pessoas através da Internet.
36
As grafias e expressões utilizadas pelos entrevistados foram mantidas nos trechos citados.
60
relação à possibilidade de permitir que você se comunique simultaneamente com diversas pessoas, estando cada uma delas em lugar físico completamente distinto da
outra. (E.M.)
Já T.C., que utiliza a Internet para contatar com clientes e fazer negócios em todo o país,
analisa a diferença de postura que ela permite ao usuário:
Já pensei nisso sim, a internet nos possibilita muitas coisas, sermos mais comunicativos, mais brincalhões. Permite conversar com quem temos vergonha ou até por timidez, pessoalmente (se é que vergonha e timidez não são a mesma coisa).
Acredito no "eu" virtual sim. Até o meu trabalho mesmo, se fosse uma loja, não daria tão certo devido as facilidades que a internet impôe. Seja em divulgação
...do mesmo ou na forma de contatar os clientes. (T.C.)
Já D.V., que pertence ao segundo grupo de selecionados, afirma não compartilhar desta
idéia: “a sim, já mas acho muita viagem, ou seja loucura bobera não acredito” (D.V). Apesar
de, como observamos anteriormente, D.V. não se enquadrar entre os aposentados da comunidade onde foi selecionada, seu perfil de uso de Internet assemelha-se bastante a eles, já que
sua experiência começou após a popularização da web 2.0 e dos SRSs e CIs. Além disso, por
ter uma grande vivência comunicando-se com outras pessoas antes da Internet através de outros meios, D.V. também faz comparações entre as conversas através da web e por telefone,
por exemplo. Esta é uma percepção interessante, pois essas experiências tendem a ser consideradas fundamentalmente diferentes, mesmo nos casos em que são quase idênticas (por exemplo, quando duas pessoas interagem por voz utilizando o Skype).
A discussão sobre a proximidade e distância teve respostas bastante relevantes e, de um
modo geral, os três entrevistados declararam que, de alguma forma, sentem-se mais próximos
das pessoas com quem conversam quando interagem através dos CIs e das redes sociais online. E, para os três, essa sensação de proximidade tem influência direta na relação que se tem
off-line: ou seja, quanto mais forte for a relação entre os indivíduos (irmãos, amigos próximos) fora da Internet, maior a sensação de proximidade que a conversa on-line proporciona.
A esta pergunta, a entrevistada E.M. respondeu:
na verdade, acho que depende de quem é a pessoa... mas é que normalmente, apesar
de ter mais de 200 pessoas no MSN, eu converso sempre com as mesmas pessoas,
que são todas muito próximas, ou meus irmãos ou meus amigos mais próximos
mesmo... então me considero próxima, de certa forma (E.M)
Por conversar com bastante freqüência com pessoas desconhecidas através da Internet
(em função de seu trabalho), T.C. acrescentou que, para ele, há diferenças entre conversar
61
com quem mora mais próximo ou distante durante a conversa, devido à possibilidade de encontro com estas pessoas no mundo off-line.
Mais ou menos, por saber onde cada um mora é engraçado, pq alguns dá pra marcar
de encontrar um dia ou outro em um lugar X, mas outros já não dá pra encontrar tão
facilmente
Dá pra sentir sim (T.C)
Para D.V., a sensação de proximidade se dá através de alguns fatores bastante específicos. Por não utilizar recursos de áudio e vídeo nas conversas pela Internet, D.V. compara as
interações com o telefone, afirmando que a conversa por telefone possibilita a aproximação
pelo tom de voz das pessoas. Para ela, a sensação de proximidade também depende da relação
com quem está do outro lado – no seu caso, a relação familiar é a que mais promove essa sensação. D.V. relata que a falta de sensação de proximidade com seus amigos pela Internet a
impede de gostar de contatá-los on-line.
Em relação ao lugar, a proximidade é a sensação mais bem definida entre os usuários entrevistados. A percepção de estar em algum outro lugar enquanto interage com um amigo ou
familiar através da web foi expressa somente por T.C.
Me considero próximo sim, parece que tô conversando pessoalmente
Pessoalmente seria como encontrar o pessoal da faculdade, parece que tô conversando com esse(s) amigo(s) num bar, jogando ocnversa fora
A sensação relatada por T.C., no entanto, é restrita a uma ordem de relação: com os amigos que moram próximos e os colegas de faculdade, com quem T.C. normalmente sai para
conversar. Ou seja, esta percepção de lugar é motivada por uma realidade pré-existente aos
diálogos através da Internet. É interessante observar, contudo, esta manifestação de compreensão do entrevistado, uma vez que suas interações on-line também motivam este tipo de percepção. Esta hipótese é atestada pela declaração de T.C. a respeito das conversas que tem com
seu irmão, que mora na Inglaterra. Nestes momentos, T.C. não afirma sentir-se em um outro
lugar, como quando conversa com os colegas, apenas mais próximo do irmão. Neste caso,
misturam-se dois fatores para a formação da sua percepção: a força do relacionamento entre
os dois off-line e a motivação da realidade externa aos diálogos através dos CIs.
Sim, me sinto próximo sim, mata um pouco da saudade. Você ouvir e ver a pessoa,
saber que ela está bem e que lembra de você diariamente. Os mesmos interesses que
ainda continuam mesmo depois de muito tempo.
parece que ele tá noutro cômodo da casa
62
(…) Nunca pensei ou senti que ele estivesse aqui não
(…) Sei que estamos em lugares diferentes sim... só mais próximos (T.C.)
Já D.V. e E.M. afirmam que nunca sentem-se em algum outro lugar, e acreditam que isto
aconteça por estarem sempre efetuando diversas tarefas simultaneamente. Ou seja, ambas afirmam que raramente dedicam-se exclusivamente a conversar com outras pessoas através da
Internet pois dividem-se entre atividades on e off-line.
T.C. e E.M. também fizeram algumas observações referentes à permeabilidade das relações on-line e off-line. Ao comentar sobre o que seria o “lugar virtual” da Internet, E.M. opinou que “o fato de conversar muito virtualmente acaba substituindo o contato ao vivo”. Ao
mesmo tempo, no entanto, ela afirmou que as pessoas com quem mais conversa são justamente as que encontra freqüentemente. T.C. também observou que o contato on-line pode até ajudar o off-line, contando que fez amigos e os encontrou pessoalmente após conhecê-los online.
Das respostas obtidas pelos três entrevistados, podemos intuir uma série de hipóteses, inclusive dividi-los em 3 estágios em relação à compreensão das interações mediadas pela Internet: (1) o representado por D.V., que refere-se a um uso menos apropriado ao cotidiano e
uma forte separação entre as relações on-line e off-line, apresentando até uma certa dificuldade em interagir com algumas pessoas através da Internet; (2) o de E.M., que utiliza a Internet
com mais freqüência e experiência, mas com restrições referentes às pessoas com quem conversa (não interagir com desconhecidos) e uma sensação bem mais clara de proximidade do
que de presença em um outro lugar; e (3) o de T.C., que demostra um uso e uma leitura mais
intensos da web e compreende mais naturalmente a sensação de proximidade possibilitada por
ela, manifestando até percepções relativas a sentir-se em outro lugar em determinadas situações.
Estas diferentes formas de compreensão se dão pelas diferenças de perfil já comentados
anteriormente. Podemos, inclusive, supor que esses comportamentos correspondam a tendências gerais de utilização e assimilação por parte dos milhões de usuários dos SRSs e CIs no
Brasil sendo, respectivamente, (1) referente a uma porção de “iniciantes” não só em tempo de
experiência com a Internet como em intensidade e incorporação das interações ao dia-a-dia;
(2) correspondendo ao que hoje é a maior parte dos usuários de Internet no país e (3) como
sendo uma minoria que possui uma percepção mais avançada dos recursos da rede e a tem
intensamente incorporada ao seu cotidiano e com uma compreensão que, por isso, está à fren-
63
te dos demais usuários. Esta proposição, contudo, não pretende definir de forma conclusiva as
possibilidades de comportamento dos usuários de Internet no Brasil mas, antes, identificar
alguns traços que podem ser encontrados de forma geral entre esses indivíduos. Para confirmá-la, ou não, seria necessário um estudo mais detalhado e que partisse de uma amostra com
maior representatividade, capaz de permitir esse nível de generalização.
O capítulo a seguir presta-se a relacionar estas hipóteses e alguns traços encontrados nesta análise aos conceitos anteriormente apresentados relacionados ao lugar, em busca de um
caminho final para esta discussão.
64
5 DISCUSSÃO
Apesar de terem tratado de um assunto de difícil abordagem, as entrevistas foram capazes de nos fornecer algumas linhas de reflexão bastante interessantes relativas às interações
on-line e à noção de lugar. A primeira delas foi a proposição apresentada ao final da análise
do capítulo anterior, que identifica nos três perfis dos entrevistados alguns traços significantes
na utilização da Internet como meio de comunicação interpessoal, a qual analisaremos de modo mais atento. Vale reafirmar, aqui, que a amostragem da pesquisa foi muito pequena para
que se possa propor de forma definitiva esses comportamentos como categorias de usuários
de Internet no Brasil, mas a profundidade com que ocorreram as entrevistas pôde nos evidenciar alguns fatores que talvez possam ser encontrados entre demais indivíduos.
O primeiro perfil, representado pela entrevistada D.V., foi apontado como o menos experiente em termos de uso da Internet. Se nos basearmos em critérios numéricos, utilizando o
Ibope/Netratings (2008) referente à média mensal em horas on-line dos brasileiros, podemos
estimar que este perfil possivelmente encontra-se abaixo da média nacional de uso37. Os principais motivos deste tipo de comportamento são o acesso à tecnologia e incorporação de atividades on-line ao cotidiano e a maior familiarização com outros meios de comunicação, como o telefone. D.V. afirmou, durante a entrevista, que não gosta de conversar com seus amigos pela Internet pois não consegue sentir-se confortável neste tipo de interação, ao mesmo
tempo em que comparava as conversações on-line com diálogos por telefone, comentando
que uma conversa telefônica a fazia sentir-se mais próxima de seus interlocutores do que através do Orkut ou MSN Messenger.
37
Em maio de 2008, 23 horas e 48 minutos por mês – pouco mais de 47 minutos por dia, proporcionalmente (Ibope/Netratings 2008).
65
É possível que esta avaliação se dê em função deste tipo de usuário estar mais familiarizado com outros meios do que com a Internet e, também, por conta do tipo de acesso que tem
à rede. Como bem colocou Fragoso (2003), as formas de configuração do ciberespaço estão
sujeitas a questões locais e, inclusive, de infra-estrutura dos pontos de conexão. Durante a entrevista, D.V. declarou não utilizar conversa por vídeo ou áudio, o que, se recordarmos os elementos que compõem a percepção de telepresença de acordo com Vassallo (2007), dificulta
a noção de presença por parte da entrevistada.
Intermediário nesta nossa proposição e, provavelmente, comum a uma grande parte dos
atuais usuários de CIs e SRSs no Brasil, o segundo perfil, representado por E.M., indica um
uso mais freqüente e adaptado ao cotidiano. Comparado aos outros perfis em termos numéricos, poderíamos supor que este segundo tipo de comportamento estaria dentro da média nacional em horas de uso da Internet. O segundo perfil provavelmente têm uma visão um pouco
mais avançada do que o primeiro em relação às interações on-line e, conseqüentemente, mais
naturalidade em incorporar as conversações em CIs e SRSs ao cotidiano. Sob este tipo de
comportamento, esta naturalidade em interagir on-line se dá quase que exclusivamente com
pessoas com as quais o sujeito já tenha estabelecido uma relação off-line, isto é, os usuários
com este perfil dificilmente conversam com quem já não conhecem.
A entrevistada E.M., cuja forma de apreender e utilizar a Internet é o espelho do terceiro
tipo desta proposta de perfil, relatou que percebe uma proximidade com as pessoas com quem
interage através do MSN e Orkut, mas, segundo o que se pôde perceber de sua entrevista, esta
proximidade está bem mais alinhada à presença social do que à telepresença. Ou seja, este tipo de comportamento, em termos de percepção de lugar, já apresentam uma noção de estar
próximo do outro sujeito, mas isso se configura somente num plano social e não espacial –
não sendo, pelo menos ainda, a sensação de telepresença como proposta por Vassalo (2007).
Tanto o primeiro como o segundo perfil não percebem que suas interações on-line estejam
ocorrendo em um lugar diferenciado, não correspondendo, neste sentido, à compreensão heterotópica que se apresentou aqui como possibilidade de percepção.
O que mais se aproxima da nossa hipótese, tanto em relação à heterotopia como em relação à telepresença no seu modo mais completo, é o terceiro tipo de comportamento, representado conforme nossas entrevistas pelo participante T.C.. A este perfil de usuário, podemos
associar a experiência e incorporação da Internet ao cotidiano estimando que sua média mensal de acesso em horas seja superior à nacional. Esta inferência já nos faz supor que neste per-
66
fil o uso das interações on-line, bem como das demais ferramentas da Internet, seja muito
mais intenso no que os dois anteriores – e haja mais facilidade para conversar até com pessoas
com as quais não há uma relação prévia off-line. Conforme pôde-se observar na entrevista
com T.C., a percepção de proximidade com o outro é muito bem afirmada, chegando até a
alguns estágios de telepresença, alterando a percepção de lugar e aproximando-se da compreensão de uma heterotopia on-line.
Com esses modos de comportamento, podemos imaginar um gradiente de percepção de
lugar, no qual os estágios sejam proporcionais aos padrões de comportamento acima analisados. Se adotarmos este pensamento, notaremos que a parte mais importante do gradiente, em
termos de aceitação e adoção, é o padrão do segundo perfil, por ser intermediário e guardar
semelhanças com a média dos usuários de Internet. Portanto, é à noção de lugar que é mais
evidenciada neste perfil aquela a que nos ateremos neste momento.
Se observarmos atentamente as manifestações deste segundo perfil, perceberemos que o
traço predominante das interações on-line, no que interessa a este trabalho, é a sensação de
estar mais próximo ao outro. Como a própria entrevistada E.M. relata, “as distâncias físicas se
contraem”. Esta constatação nos leva, primeiro, ao que apresentamos no início deste capítulo
como o ponto-chave da percepção espacial da pós-modernidade, a compressão tempo-espaço,
de acordo com Harvey (2007):
Uso a palavra “compressão” por haver fortes indícios de que a história do capitalismo tem se caracterizado pela aceleração do ritmo da vida, ao mesmo tempo em que
venceu as barreiras espaciais em tal grau que por vezes o mundo parece encolher sobre nós. (p. 219)
Os três participantes desta pesquisa afirmaram ter algum tipo de interação on-line (seja
através de fóruns, como D.V., seja por CIs, como E.M. e T.C.) com uma ou mais pessoas que
moram longe. Os entrevistados que correspondem aos dois últimos perfis concordaram que
este tipo de interação “aproxima estas pessoas”. Do ponto de vista da presença e telepresença,
isto indica que há a predominância da presença social, ou seja, de sentir-se próximo ao outro,
sem implicações espaciais (Vassallo, 2007). A sensação de estar em um ambiente propriamente dito durante a interação apareceu em duas ocasiões: durante a entrevista com E.M.,
que, motivada pela abordagem através do termo “lugar virtual”, respondeu a uma das últimas
questões “onde nós estamos agora?” com “conversando no MSN (...) num lugar virtual”. Em
seguida, a entrevistada retomou sua percepção afirmando que “pelo menos assim de cara,
considero que estamos eu na minha casa e vc, na sua”. A outra ocasião, a mais relevante, foi
67
na entrevista com T.C., que relatou sentir-se em um bar da faculdade enquanto conversa com
seus colegas de aula pelo MSN. Estas percepções nos fazem pensar que a visão majoritária
dos sujeitos das interações diz respeito muito mais à proximidade do que a localidade. Isso
indica que, pelo menos na amostragem que selecionamos para esta entrevista, não existe um
lugar propriamente dito onde ocorram essas interações. Augé (1994) oferece três características que devem estar presentes para que se possa afirmar a existência de um lugar. Ele deve ser
identitário, relacional e histórico.
Se analisarmos as interações do ponto de vista das manifestações de percepção dos participantes de nossa pesquisa, verificaremos que no que tange as interações on-line a questão
identitária é um fator que depende dos usuários que a percebem, e não podemos considerar
que a identidade possua um estatuto de origem, visto que ela é muito fortemente relacionada à
funcionalidade. O entrevistado T.C., por exemplo, utiliza MSN Messenger e e-mail para interações profissionais, e Orkut e Messenger para contatos de amizade, enquanto E.M. e D.V.
não percebem de forma definida esta diferenciação. Além disso, constantemente os usuários
acabam fazendo um uso muito diferente do inicialmente proposto por uma ferramenta de interação. Exemplo disso é o usuário que usa o livro de recados no Orkut como forma de conversa síncrona ao invés do MSN Messenger, ou deixa um recado para um contato que está offline no Messenger ao invés de o fazer através de um recado no Orkut. Já o caráter relacional
pode-se dar justamente através das diferenças entre as ferramentas de interação já descritas
anteriormente, e em relação à percepção de proximidade social dos usuários. A questão da
história, por sua vez, também é muito mais relacionada ao uso individual ou por um grupo,
em relação a interações anteriores.
Como pudemos perceber, na compreensão dos sujeitos das interações on-line a configuração de lugar é bastante vaga, de acordo com a definição proposta por Augé, insuficiente para caracterizar um lugar. Com isso, a questão que nos é imposta é: se não existe uma configuração de lugar como a definida acima no âmbito da percepção dos sujeitos das interações online, e a sensação predominante é a de presença social, como pode ser considerado o lugar
dessas interações? O próprio Augé nos responde:
Se um lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que
não pode se definir nem como identitário, nem como relacional, nem como histórico
definirá um não-lugar. (p. 73)
68
Assim, a concepção que encontra-se mais próxima do que se verificou na investigação
deste estudo é a de que as interações ocorrem, na verdade, em não-lugares. Esta percepção
estava presente, de alguma forma, no discurso dos três entrevistados. Podemos considerar esta
proposição se relembrarmos de alguns exemplos de não-lugares: os aeroportos, as rodovias, as
estações, entre vários outros. O principal traço de um não-lugar é que, não tendo função identitária, relacional ou histórica, ele não é o fim, mas o meio, a passagem de um lugar a outro.
Assim como quem utiliza o trem para deslocar-se diariamente não vai à estação simplesmente
para visitá-la, e sim para utilizá-la como meio para chegar ao seu objetivo, o motivo das interações on-line está além da interação em si. Não fosse isso, nossa pesquisa não demonstraria
que há quase um consenso em relação a conversar apenas com as pessoas que conhece fora da
Internet. Podemos usar o exemplo de T.C., que se comunica com o irmão que está na Inglaterra. Ele não interage para sentir-se no ambiente da interação em si, mas para conversar com
seu irmão. Esta situação é análoga a T.C. pegar um avião para ir visitá-lo: ele não terá viajado
pela vontade de estar dentro de um avião por mais de 10 horas, mas para chegar à Inglaterra e
encontrar o irmão.
O traço mais marcante que pudemos verificar em nossas entrevistas, em termos de telepresença, foi o de presença social, ou seja, o de um sujeito estar perto do outro. Isso confirma
nossa proposta conforme a colocamos acima: as interações ocorrem em um não-lugar, como
uma rodovia que conecta duas cidades que podem ser destinos de viagem, sem que a estrada
seja um destino em si.
Como já comentamos neste trabalho, o não-lugar nunca é um fim, mas sempre um meio.
E pudemos perceber, com base nestas entrevistas, que a intenção é muito mais a de sentir-se
próxima do outro do que estar necessariamente no mesmo lugar do outro, observamos que as
interações on-line ocorrem, portanto, em não-lugares.
69
CONCLUSÃO
O estudo desenvolvido neste trabalho foi capaz de trazer-nos uma série de noções de
grande importância na investigação dos processos comunicacionais que ocorrem na Intenet,
principalmente do ponto de vista da interação e espacialidade. Através de nossa revisão teórica, pudemos compreender como se deu a percepção espacial nas sociedades ocidentais até
chegarmos ao momento onde estamos, quando a questão do indivíduo assume grande
importância e a noção de lugar aparece como reflexo deste movimento.
A reflexão sobre a evolução da percepção espacial trazida por Harvey (2007) demonstrou
o movimento de compressão do espaço ocasionado pelas práticas capitalistas e a necessidade
de expansão dos mercados, que incentivou a produção de redes de transporte, interligando
cidades, estados, países e continentes, tornando o mundo um roteiro totalmente reconhecível e
conquistável, e redes de comunicação, colocando em contato pessoas de diferentes lugares
através da imprensa, do rádio, da televisão e, mais atualmente, com a Internet. Como observamos nas entrevistas, esta visão é amplamente compartilhada pelos usuários, que mencionaram sempre a Internet como um instrumento que aproxima as pessoas de outros estados e até
países, estando a serviço, portanto, da compressão espácio-temporal tratada por Harvey
(2007).
Ao mesmo tempo em que há esta redução do mundo, espacialmente falando, vem à tona
uma profusão de lugares, porções cuja abordagem pede uma perspectiva a adotar deve ser a
“de dentro para fora”, pois como o próprio Harvey (2007) menciona, “com a redução das barreiras espaciais, aumenta muito mais a nossa sensibilidade ao que os espaços do mundo contêm” (p. 265). Com isso, é de grande importância que voltemos nossa ótica à dimensão dos
lugares, como o fazemos principalmente a partir de Augé (1994), que nos oferece um panorama antropológico de como enxergar o lugar e, conseqüentemente, o não-lugar.
70
E foi neste ponto que a análise de nossas entrevistas tomou um rumo diverso do que foi
previsto na hipótese. Supondo encontrar percepções que estivessem afeitas ao conceito de heterotopias (Foucault, 1984), estimamos que os sujeitos das interações compreendessem os
“lugares” que utilizam para elas de uma forma mais evidente. O que esperávamos era identificar, entre os usuários, percepções como se, por exemplo, alguém decidisse ir a um festival
pelo evento em si, por estar em um ambiente diferente do seu cotidiano, com uma configuração única e particular e, que ao mesmo tempo, concentrasse em si diversas atrações só encontradas separadamente nos outros lugares. Aliado a isto, consideramos também como possível
a sensação de telepresença aqui apresentada segundo Vassallo (2007), a partir da qual o invidíduo que participa de uma interação sente-se em um ambiente on-line (e para nós, até então,
heterotópico) compatilhado com seu interlocutor, ao mesmo tempo em que sente-se mais próximo dele.
O que percebemos entre os três perfis de usuários que identificamos, e com quem interagimos por cerca de uma hora em cada entrevista, no entanto, foi uma compreensão significativamente diferente. A percepção por eles relatada tem muito mais a ver com a sensação de
proximidade com o outro (e, por isso, compartilham com a visão de Harvey, 2007) do que
com a presença em algum outro ambiente. Isso porque as relações on-line estabelecidas entre
nossos entrevistados possuem, na grande maioria das vezes, alguma ligação com seu mundo
off-line e seu dia-a-dia fora do uso dos SRSs e CIs.
Como pudemos observar, a fixação nas atividades off-line é unânime em nossos entrevistados, que se manifesta de algumas formas, como: a atitude de restringir contatos que não sejam previamente conhecidos, raramente interagindo com pessoas desconhecidas (relatada por
E.M. e D.V.); a forte ligação das atividades on-line com as atividades off-line, como nos relatou T.C. ao mencionar que conversa com desconhecidos quando são relacionados ao seu contexto profissional e/ou interage com as pessoas (sejam conhecidos ou desconhecidos) quando
há uma oportunidade de conhecerem-se pessoalmente fora da Internet. Além disso, T.C., o
único entrevistado a afirmar seguramente sentir-se em um ambiente diferente quando interage
com outras, relaciona a conversa com colegas de faculdade com uma conversa no bar onde
freqüentem – ou seja, o outro lugar ao qual T.C. refere-se é um local existente e que sedia as
interações feitas off-line entre ele e seus colegas.
Conforme vimos no capítulo anterior, essas questões nos levam para o conceito de nãolugares, segundo Augé (1994). Se as interações on-line são percebidas principalmente do pon-
71
to de vista do diálogo em si, e não do lugar ou do modo como acontece, e se os usuários afirmam sentir-se mais próximos das pessoas com quem conversam através dos SRSs e CIs, então esses sistemas funcionam como um táxi que serve apenas para facilitar o trânsito de um
indivíduo de um ponto a outro da cidade, mas que nada significam ao passageiro, que está ali
de passagem, e não entrou no táxi para andar de táxi. Como já comentamos anteriormente, a
motivação das interações on-line está, de forma bastante expressiva, nas relações e na vida
off-line dos sujeitos.
Esta conclusão provoca uma relevante discussão a quem desenvolve produtos comunicacionais direcionados à Internet, pois propõe que o público médio está muito mais preparado
para sentir-se próximo de alguém ou alguma coisa já conhecida e aprendida off-line do que
para projetar-se em ambientes virtuais sem vinculação ao seu cotidiano. Para este público, em
termos de interação, a Internet está mais para o avião que o transporta até seu destino, que é
uma pessoa que ele conhece, do que um destino em si.
É importante ressaltarmos, no entanto, que as questões levantadas na defesa da hipótese
das interações ocorrerem em um ambiente heterotópico não deixam de valer com esta diferença de perspectiva. Assim como um avião de uma companhia aérea de luxo ou uma estação de
trem que vira um ponto turístico acaba trazendo para si um significado que antes não tinha de
forma tão expressiva, e então passa a tornar-se um lugar, as possibilidades de interação online podem evoluir no sentido de conquistar uma carga simbólica que as faça tornar-se, então,
um lugar. Situações ocorridas durante conversas pela Internet, por exemplo, passam a fazer
parte da história de vida das pessoas e assim tornam-se parte de sua identidade tanto quanto as
próprias situações adquirem uma certa historicidade e identidade.
Se é próprio da pós-modernidade ser proliferante em criar e recriar significações (Harvey,
2007), o esperado é que, junto à profusão de não-lugares prevista por Augé e comprovada
neste trabalho, haja um proporcional aumento de lugares, provocando, também, uma proliferação de heterotopias. Além disso, parece provável, até mesmo desejável, que esse movimento não cesse, pelo menos tão cedo.
72
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74
APÊNDICE A – TERMO DE LIVRE CONSENTIMENTO
Termo de Consentimento livre e Esclarecido
1 – Esta pesquisa está sendo realizada para o Trabalho de Conclusão de Curso de Comunicação Social: Habilitação em Publicidade e Propaganda da Universidade do Vale do Rio dos
Sinos (UNISINOS), situada em São Leopoldo, RS, sob orientação da prof. Dra. Suely Fragoso;
2 – Título do trabalho: “Um outro espaço? A percepção de lugar dos sujeitos das redes sociais” (provisório);
3 – A pesquisa será realizada através de uma entrevista que funcionará como uma conversa
entre entrevistador e entrevistado via MSN com duração aproximada de 15 minutos;
4 – Essas informações estão sendo fornecidas para sua participação voluntária neste estudo,
que visa investigar como os usuários de redes sociais percebem o lugar onde estão enquanto
interagem on-line com outras pessoas;
5 – A pesquisadora Caroline da Rosa Miltersteiner não utilizará a imagem ou nome do entrevistado, comprometendo-se a divulgar apenas as respostas da entrevista de forma anônima e
preservada;
6 – As informações obtidas na entrevista são exclusivamente para fins desta pesquisa acadêmica, e seus dados pessoais não serão divulgados sob hipótese alguma.
Acredito ter sido suficientemente informado(a) a respeito das informações que li, descrevendo
o estudo “Um outro espaço? A percepção de lugar dos sujeitos das redes sociais” (provisório)”.
75
Aceito participar nesse estudo, e ficaram claros para mim quais são os propósitos da pesquisa,
os procedimentos a serem realizados e as garantias de anomimato de minhas informações pessoais.
------------------------------------------------Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e Esclarecido
deste entrevistado para a participação neste estudo.

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