Dossiê Nacional Dossiê Nacional - Andes-SN

Transcrição

Dossiê Nacional Dossiê Nacional - Andes-SN
3
Dossiê Nacional
PUBLICAÇÃO ESPECIAL
ESPECIAL DO
DO ANDES
ANDES-SN
-SN
PUBLICAÇÃO
Precarização
do trabalho
docente II
Na defesa
da educação
pública de
qualidade
arta ao Leitor
Diretoria do
mandato 2012-2014
Coordenação editorial:
Luiz Henrique Schuch e Marinalva Silva Oliveira
Coordenação de reportagem,
edição e texto final:
Carla Lisboa (Registro Profissional: 1635/DRT-DF)
Reportagem:
Carla Lisboa, Fátima Xavier, Ricardo Borges,
Valdeci Rodrigues, Washington Sidney
Diagramação:
Ronaldo Alves (RP: 5103/DRT-DF)
Ilustrações:
Alex Leal
Fotografias:
Arquivo ANDES-SN e Seções Sindicais
Tiragem:
40.000 exemplares
Gráfica:
Athalaia Gráfica e Editora LTDA
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Sindicato Nacional dos Docentes
das Instituições de Ensino
Superior (ANDES-SN)
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Brasília-DF, novembro de 2013
A
pesar dos recursos públicos aplicados, o Programa de Reestruturação e
Expansão das Universidades Públicas Federais (Reuni) – projeto de ampliação
e de interiorização – acabou por aprofundar os problemas infraestruturais,
pedagógicos, administrativos e financeiros das IFE e revelou-se desastroso quanto à
qualidade acadêmica e precarizador das condições de trabalho docente.
Ao colocar o Reuni em prática, a pretexto de democratizar o acesso ao ensino público
superior, sem debate com a comunidade universitária, o governo federal expôs seu propósito
de impor à sociedade um conceito de universidade condicionado pelo mercado, com sérios
prejuízos para todos os envolvidos na educação e na produção de conhecimentos.
Pior. Com a expansão desordenada, os problemas estruturais que as universidades
públicas enfrentavam se agravaram. Hoje, o que se vê, de Norte a Sul do País, são
improvisações, obras inacabadas, equipamentos deteriorados e a mais absoluta falta de
condições de lecionar e de fazer pesquisa. Caso do Polo Universitário Rio das Ostras, da
UFF, onde os professores dão aulas em contêineres alugados.
Outros problemas pioraram o funcionamento das IFE – a desconstrução da carreira
docente, perdas salariais, a falta de transparência na gestão dos orçamentos e de democracia
no meio acadêmico, a imposição de interface por meio de estruturas privadas e de processos
avaliativos descolados da contribuição peculiar de cada percurso acadêmico ao projeto
de desenvolvimento institucional – e trouxeram como efeitos colaterais o estímulo à
individualização, a divisão da categoria e o incremento da lógica produtivista.
Esse quadro marca o processo de decadência a que a educação superior pública vem
sendo conduzida, conclusão de um modo de operar adotado nacionalmente que secundariza
o valor e a importância da educação para a consolidação da democracia, da liberdade, da
solidariedade, da cultura e do saber para as atuais e futuras gerações.
A educação como processo emancipador do ser humano deixa de ser prioridade. Seus
objetivos são deturpados pela lógica utilitária dos resultados imediatos de um ensino
puramente mimético e sem raízes, sem compromisso com a construção cultural. Enfim,
dominada pelo fazer mais rápido e mais rentável como ocorre nos processos industriais em
suas linhas de produção. Uma lástima!
Outra atitude lamentável é o fato de que, até o fechamento da edição, os Ministérios da
Educação e do Planejamento e algumas reitorias das universidades citadas nas matérias não
responderam às perguntas encaminhadas pela reportagem.
Assim, neste segundo fascículo do terceiro número da revista Dossiê Nacional
Precarização, mostramos, por meio de uma série de dez reportagens, como o governo federal
vem contribuindo, por intermédio do Reuni e de outros instrumentos político-pedagógicos,
para a dilapidação desse direito social consagrado na Constituição Federal.
Boa leitura
A Diretoria do ANDES-SN
3
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
umário
9
Reuni expande a precarização
nas universidades
19 Ataques à carreira preparam o
terreno da privatização
27 Faltam democracia e
transparência na gestão
do orçamento
31 Desvio ideológico na concepção
de mérito acadêmico
4
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
41 Administrações marcadas pela
repressão e por perseguições
51 Aumentam casos de assédio
moral a professores das IFE
59 No Brasil, lecionar faz
mal à saúde
65 Armadilha federal para
a saúde pública
79 Expansão sem qualidade deixa
dois Cefets à beira do caos
87 A covardia do
Estado liberal
5
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
ois ciência implica no exercício
da crítica e essa é inseparável
da existência da liberdade
(Mauricio Tragtenberg)
7
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Reuni expande a
precarização nas
universidades
Docentes das Instituições Federais
de Ensino Superior das 5 regiões do
País denunciam o mau funcionamento
e as péssimas condições de trabalho
Carla Lisboa
E
nquanto o governo
passa para a sociedade
a falsa ideia de que as
demandas do ensino superior estão sendo atendidas,
a comunidade universitária
sofre as consequências de uma
expansão desordenada e com
interrupção. Em todo o país,
a constatação é a mesma: da
forma como foi implantado,
o Reuni (Programa de Apoio
a Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades
Federais) não cumpriu as
metas que o próprio governo
determinou e ainda agravou as
9
Revista Andes Especial
condições de funcionamento
das instituições federais de ensino superior.
O Polo Universitário de
Rio das Ostras, um dos sete
campi da Universidade Federal
Fluminense (UFF) no interior
do estado, é um bom exemplo
dessa expansão precarizada.
Foi criado em 2004 a partir
de uma parceria entre a UFF
e a Prefeitura do município, o
Polo de Rio das Ostras ganhou
um novo ritmo de expansão
com a entrada do Ministério
da Educação (MEC), em
2006-2007. O problema é que
a verba do Reuni acabou em
2010 e, com a falta de conclu-
Novembro de 2013
Contêineres improvisados como salas de aula trazem prejuízo mensal de R$ 55 mil para a universidade
são das obras de infraestrutura,
os cursos continuaram a ser
ministrados em espaços absolutamente inadequados.
Com duas unidades (os
institutos de Humanidades
e Saúde e de Ciência e
Tecnologia) e seis cursos
(Enfermagem, Psicologia,
Serviço Social, Produção
Cultural, Engenharia da
Produção e Ciências da
Computação), o campus de
Rio das Ostras virou um improviso só. Como ocupa um
espaço construído para abrigar
uma escola de ensino médio,
a “solução” foi o aluguel de
contêineres, usados como salas
de aulas, salas de professores e
almoxarifado. O valor do aluguel mensal de cada “módulo
escolar” é de R$ 2.500. Como
são usados 22 contêineres, a
universidade gasta, por mês,
R$ 55 mil para funcionar.
Diversos problemas surgiram em razão dessa solução
improvisada: salas inadequadas para o trabalho didático-pedagógico, insalubridade por
falta de ventilação, inexistência
de laboratório de produção audiovisual e auditório pequeno
para as atividades de ensino,
pesquisa e extensão. E mais:
além do perigo das instalações,
em virtude da provisoriedade
que se tornou definitiva, há
dificuldades na solicitação e no
armazenamento de materiais
porque estão em contêineres.
Os estudantes sofrem com
a falta de um restaurante uni-
10
Revista Andes Especial
versitário e com moradia estudantil cercada de terrenos baldios e iluminação deficiente.
Vários deles foram assaltados
nas proximidades do campus. A
precariedade da infraestrutura
em Rio das Ostras se reflete na qualidade da formação
profissional e no adoecimento
de professores por não conseguirem realizar suas atividades
dentro da qualidade esperada.
“Temos dificuldade em
atender ao projeto pedagógico
com as instalações improvisadas. Inexistência de auditório,
de laboratórios adequados, etc.
Inexistência de espaço para realização da completude da vida
universitária, como espaços para
reunião de pesquisa e de projeto
de extensão. A característica de
Novembro de 2013
provisoriedade põe a condição
de irresolução crônica, levando
até mesmo alguns professores
ao adoecimento por não conseguirem realizar as suas atividades laborativas na qualidade esperada”, constata o professor do
Departamento Interdisciplinar
(RIR), Ramiro Dulcich.
Obras paradas
A Universidade Federal
Rural de Pernambuco
(UFRPE) é um retrato da falta
de planejamento da expansão
do ensino público superior. Das
53 obras paradas em 20 universidades, a UFRPE tem nove. A
instituição tem cinco unidades
acadêmicas no interior e, na
sede, em Recife, funcionam
17 departamentos. Algumas
obras estão paradas porque as
empresas contratadas faliram
antes de terminar a construção
dos prédios. Outras, porque não
tiveram condições de honrar os
contratos.
Na Unidade Acadêmica de
Serra Talhada (Uast), no sertão, uma residência estudantil,
dois prédios para laboratórios
e outros dois para salas de professores começaram a ser feitos, mas não foram concluídos.
Em Garanhuns, no Agreste,
um reservatório de água, um
prédio para salas de aula, um
para administração e outro
para necropsia de animais estão inacabados. Os estudantes
fizeram vários protestos. A
gestão da UFRPE diz que os
problemas com as obras começaram em 2009.
Passados seis anos do
Reuni, a precariedade das instalações e do funcionamento
da Uast parece ter se cristalizado. Não há espaço físico
apropriado para as atividades
de ensino, pesquisa e extensão.
Os docentes amontoam-se em
salas que chegam a abrigar
até 30, causando uma série de
prejuízos nas orientações de
pesquisa e extensão e na preparação dos estudantes e das aulas. A ausência de laboratórios
de ensino e de pesquisa ou seu
funcionamento improvisado
tem provocado o adiamento
de muitos trabalhos de fundo
científico, prejudicando enormemente a preparação dos
estudantes que vão para o mercado de trabalho.
A falta de espaços para
recepção de materiais e instalação dos equipamentos e maquinários adquiridos ao longo
desses seis anos fez com que
UFRPE-UAST está com quase todas as obras inacabadas, o que causa transtornos à comunidade universitária
11
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
estes tenham sido estocados
de forma precária, amontoados
uns sobre os outros, contribuindo para diminuir a sua
vida útil e até mesmo inviabilizando o uso futuro desses equipamentos, o que representará
um enorme gasto de dinheiro
para recuperá-los e fazê-los
funcionar. “Esta demanda,
além de impossibilitar o aprofundamento da aprendizagem
por parte dos estudantes, também se reflete numa evasão de
professores pesquisadores que
acabam por fazer outros concursos em centros mais bem
estruturados ou com o mínimo
de estrutura para tal”, afirma
o professor de zootecnia, Cauê
Guion de Almeida.
O professor conta que os
cursos práticos, como zootecnia e agronomia, não têm
um setor ou área, “o que traz
grandes danos aos estudantes,
que se formam sem nenhuma
experiência prática ou que,
para adquirir essa experiência,
precisam viajar para locais distantes a fim de realizar aulas
práticas”. Ele diz que os estudantes enfrentam ainda a falta
de restaurante universitário e
de áreas de convivência, além
de terem transporte coletivo de
péssima qualidade. As salas de
aulas são insuficientes e a cada
semestre é preciso fazer um
remanejamento, desalojando
outros setores para atender às
demandas de ensino.
A comunicação entre os
setores da unidade acadêmica
é inviabilizada pela falta de
equipamentos, como telefones e
ramais nas salas dos docentes,
biblioteca, apoio didático, laboratórios, garagens e almoxarifados, o que obriga a todos a um
gasto enorme de tempo e energia na agilização do fluxo diário
de trabalho. O professor afirma
haver uma deficiência crônica
na rede de computadores e que
este problema se arrasta ao
longo dos anos, inviabilizando
a qualidade dos trabalhos que
dependem do recebimento e do
envio de arquivos para os órgãos
de fomento, consulta a bibliotecas virtuais e levantamentos
sistemáticos de dados, principalmente de imagens.
A falta de pessoal, técnico-administrativos, tem colocado em condições de vulnerabilidade os mais diversos
setores da unidade, dentre
eles a Biblioteca (que funciona
em espaço totalmente inadequado e insuficiente).“Não há
como conceber uma comunidade acadêmica, que já abrange um público aproximado
de três mil usuários e que em
breve alcançará os cinco mil, à
mercê da falta de qualidade de
tão importantes ferramentas
para o avanço de suas pesquisas e de seu desenvolvimento
pleno”, declara o professor.
Até o fechamento, nenhuma
reitoria respondeu às perguntas
encaminhadas e o MEC avisou
por email que não podia atender à solicitação.
Obra interrompida
do campus de Serra
Talhada dificulta o
trabalho docente
UFS convive
com obras
inacabadas
Um canteiro de obras sem
previsão de término. É isso
o que virou a Universidade
Federal de Sergipe (UFS)
com o programa de expansão
do ensino superior. “As obras
são bem-vindas, já que visam,
teoricamente, à melhoria da
qualidade do ambiente oferecido à comunidade acadêmica. Entretanto, na prática,
temos obras com prazo para
começar e não para terminar”,
critica a professora do Sistema
Integrado de Gestão de
Atividades Acadêmicas (Sigaa)
da UFS, Brancilene Araújo.
Ela diz que a falta de planejamento para execução de
melhorias na infraestrutura da
universidade é uma constante.
“Em razão disso, obras finalizadas precisam ser desfeitas
porque é preciso fazer outras
obras. A falta de planejamento
é tão séria que vários prédios
têm ou tiveram os banheiros
interditados por muito tempo.
Isso sem contar a probabilidade de se sofrer um acidente em
virtude do entulho no campus”,
alerta a docente.
Nos campi do interior, a
situação é agravada pela inexistência de áreas de expansão
tanto para atender aos novos
Equipamentos
amontoados no
corredor do prédio
do laboratório
docentes quanto aos estudantes, pela falta de salas para
professores ou espaços para
construção de restaurantes universitários. No fim, o barulho
gerado em todo esse processo
prejudica o desenvolvimento
das atividades docentes.
Além da infraestrutura física, a UFS tem problemas na
área didática. As salas de aula
não comportam o número de
estudantes, faltam reagentes,
vidrarias e técnicos nos laboratórios, o que obriga os professores a depender de monitores
13
Revista Andes Especial
para preparar suas práticas
e até mesmo seu material de
aula. A carga horária docente
na graduação é um problema
sério, agravado pelo número
de turmas que cada docente
tem. Isso faz com que o professor muitas vezes atenda
de 100 a 120 estudantes por
semestre com cargas horárias
quase sempre superiores a
50% do regime de trabalho
docente, sem contar as atividades de pesquisa e extensão.
“Há ainda o caso da multiplicação dos formulários,
Novembro de 2013
Na UFS III entulho dá uma
boa medida da quantidade
de problemas enfrentados
por estudantes e professores
quando o professor perde um
tempo precioso preenchendo
o Currículo Lattes, o SIGAA,
relatórios de progressão e
promoção, relatórios para o
estágio probatório, quando
cabível, e o plano de atividades
docentes. Com isso, não têm
sido poucos, na UFS, os casos
de docentes com problemas
cardiovasculares, casos de infarto registrados, problemas
psicológicos ou, ainda, casos
de neoplasias as mais variadas”,
garante a professora.
Os estudantes também sofrem com as precariedades. As
bibliotecas muitas vezes não
têm livros suficientes para aten-
dê-los, nem mesmo aqueles com
necessidades especiais, dentro
do programa Incluir. Brancilene
Araújo diz que o atendimento
no Restaurante Universitário
(RU), que só existe no campus
sede da UFS, em São Cristóvão,
é péssimo. “Em razão de uma
reforma que deveria ter terminado há pelo menos seis
meses, os estudantes ficam em
filas longas o suficiente para
prejudicar as aulas próximas ao
horário de almoço”.
O transporte e a segurança
também são problemas graves.
Na sede da universidade, as
linhas de ônibus trafegam nos
horários de funcionamento do
Na Universidade Federal de Sergipe não há prazo para o final das obras
14
Revista Andes Especial
campus, mas nos campi do interior, mesmo estes tendo cursos noturnos até as 23h, não
há oferta de transporte, de
modo que os ônibus praticamente não circulam no horário noturno. A iluminação não
existe em boa parte do campus
sede, o que gera apreensão e
insegurança na comunidade.
Proliferam os casos de roubos
ou tentativas de roubos, além
de estarem se tornando frequentes os relatos de mulheres
vítimas de violência sexual.
Brancilene relata que, em
razão da instalação do sistema
de refrigeração das salas de
aula em alguns prédios, professores têm de dar aula em
contêineres, os quais, embora
refrigerados para conforto dos
docentes e discentes, estão
localizados em área erma, o
que causa também apreensão e
insegurança. “O atendimento
administrativo está nas mãos
de funcionários de empresas
terceirizadas, que muitas vezes atrasam muito os salários
e não respeitam os direitos
trabalhistas”.
Novembro de 2013
Prédio da Fundação Universidade do Rio Grande foi construído dentro de uma Área de Proteção Permanente
Furg agride ambiente
e prejudica o ensino
para ampliar vagas
Árvores nativas foram retiradas
para não impedir a visão do prédio
Na Fundação Universidade
do Rio Grande (Furg), a comunidade universitária relata
uma série de problemas decorrentes da expansão promovida
pelo Programa de Apoio a
Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades
Federais (Reuni). Entre
2007-2008, fase mais acelerada da expansão, foram criados
vários cursos superiores fora
do campus central, como os de
Santo Antônio da Patrulha,
Santa Vitória do Palmar e São
José do Norte.
15
Revista Andes Especial
Dados do Censo da
Educação Superior divulgados pelo MEC em setembro
deste ano (2013) dão conta do
resultado da expansão das universidades públicas e informam
que, em 2012, havia “7.037.688
estudantes matriculados em
cursos de graduação no Brasil,
distribuídos em 31.866 cursos
oferecidos por 2.416 instituições — 304 públicas e 2.112
particulares —, e que as universidades são responsáveis por
mais de 54% das matrículas; as
faculdades concentram 28,9%;
Novembro de 2013
os centros universitários, 15,4%;
as instituições federais de educação tecnológica, 1,6%”.
No Rio Grande do Sul,
houve ampliação geográfica
das universidades federais
para 18 municípios, aumento
do número de matrículas e
de estudantes e construção
de prédios. “Todavia, falando
assim, até parece que é uma
coisa dominantemente positiva
e acreditamos que é bom que
a universidade cresça e tenha
técnicos e professores para realizar o trabalho de que precisa
e que possam ser ampliadas as
vagas na graduação e na pós-
-graduação, assim como projetos de extensão possam ser
ampliados para que a universidade cumpra seu papel social,
entretanto, é preciso ressaltar
os problemas seriíssimos que
têm afetado essa universidade
em termos da precarização e
das condições de trabalho em
geral por causa das expansão”,
observa o professor de educação física do Instituto de
Educação, Billy Graeff.
Estudantes
denunciam EAD
Ex-diretor da Seção
Sindical dos Docentes da
Universidade Federal do Rio
Grande (Aprofurg), Graeff
diz que não se pode falar
em expansão por meio do
Reuni sem destacar que boa
parte dela foi realizada pela
Educação à Distância (EAD)
e que a Aprofurg tem recebido, embora não sistemática e
nem organizadamente, uma
série de relatos de que a EAD
não é a melhor forma de se realizar a educação em nível de
graduação e formação inicial
no nível superior.
“Dois, três anos atrás tivemos uma formatura de uma
turma de administração de
EAD, de São José do Norte,
em que o orador não fez senão delatar a forma precarizada pela qual havia se dado
a sua formação. Com certeza
isso foi feito com o apoio
de seus colegas porque estavam todos lá na formatura
e o reitor não deu resposta
alguma para esse problema”,
conta o professor.
Na Furg, a precarização
do trabalho docente e a queda da qualidade do ensino
estão relacionadas também
às condições estruturais dos
prédios. Várias obras, senão
todas, foram embargadas por
falta de licença ambiental. “É
impossível acreditar que uma
universidade que tem abaixo
do seu nome o seguinte dizer:
“uma universidade voltada ao
ecossistema costeiro” não soubesse que era necessário pedir
e nem esperar pela licença ambiental para iniciar obras em
Área de Proteção Permanente
(APP), áreas em que não
poderia haver construções,
áreas próximas a cursos de
água, obras sem o projeto
de saneamento básico. É um
problema muito sério, o qual
envergonha qualquer pessoa
que tenha envolvimento com a
Universidade Federal do Rio
Grande”, declara.
Todavia, mesmo as obras
prontas oferecem muitas razões para que a comunidade
universitária problematize a
expansão da Furg. “Não tenho notícia de um único prédio aqui na Furg que tenha
sido construído e entregue
sem que não haja problemas
estruturais do tipo: baixa
qualidade do material usado,
serviços sem acuidade, aberturas que não oferecem segurança, problemas de infiltração na cobertura e depois de
um, dois, três anos das obras
entregues aparecem os problemas estruturais, tais como
rachaduras em paredes”.
A estrutura dos prédios
novos e antigos revela que a
universidade não consegue se
desenvolver por causa da falta
de estrutura para telefone,
internet e outros serviços que
precisam ser prestados e sem
os quais a instituição não
funciona. “Na Furg, os serviços de internet e telefone são
intermitentes. Não é todo
dia que se pode contar com
internet e telefone. Acaba
que isso redunda em um
direito social precarizado e
malfeito para a sociedade”,
reclama o docente.
A construção do prédio e de uma
rua em Área de Banhado causou
a destruição de boa parte da uma
área de relevante interesse ambiental
Ataques à carreira
preparam o terreno
da privatização
Para atender aos interesses do mercado,
governo afeta o bolso e a saúde dos
professores e enfraquece o vínculo do
trabalho docente com a instituição
Valdeci Rodrigues
e Fátima Xavier
A
desconstrução da carreira docente é uma
das estratégias do governo federal para acelerar o
processo de privatização “por
dentro” do ensino público
superior no Brasil. Ano após
ano aprofunda-se a subtração
de direitos dos professores –
justamente do grupo que se
relaciona diretamente com os
estudantes para produzir conhecimentos.
“Tudo ficou mais claro logo
depois da ocorrência do que
chamamos de ‘marco histó-
19
Revista Andes Especial
rico’ da categoria, ou seja, da
conquista do Plano Único de
Classificação e Redistribuição
de Cargos e Empregos
(PUCRCE), em 1987, após
uma longa greve”, lembra a primeira secretária do ANDESSN, Marina Barbosa.
Um dos principais pontos
do plano foi o de oferecer
igualdade aos professores que
trabalhavam em locais diferentes, respeitando a autonomia
da instituição em relação ao
desenvolvimento da carreira e a
indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão. A categoria finalmente conseguiria uma
carreira que previa isonomia,
Novembro de 2013
igualava as condições de trabalho, colocava a dedicação exclusiva como componente central
e reconhecia os indutores −
formação continuada, tempo
de serviço e avaliação do plano
de trabalho realizado dentro da
própria instituição.
Mas não foi isso que aconteceu e hoje a realidade é muito
diferente. Não apenas para os
que têm mais tempo de serviço, mas, também, para os novos
contratados. Por exemplo, o
objetivo da carreira imposta em
2012 é manter uma estrutura
hierarquizada, seguindo determinadas denominações para
cada classe. Porém, os muitos
novatos portadores do título
de doutor agora ficam enquadrados no sopé da hierarquia.
Eles se sentem ludibriados.
Depois o governo mudou
para adjunto A. “Isso foi para
enganar”, acusa o presidente
da Associação dos Docentes
da Universidade Federal do
Espírito Santo (Adufes), José
Antônio Rocha Pinto.
No caso dos professores antigos, houve a criação da classe
de associado, distanciada por
um fosso salarial da classe de
adjunto. Esta nova classificação
faz com que os docentes levem
mais tempo para chegar ao
topo da carreira. Isso acontece
porque, para progredir e chegar
à classe de associado, o professor precisa dar mais aulas em
programas de pós-graduação,
nos quais as vagas são restritas,
e participar de programas de
pesquisa inalcançáveis para a
maioria dos professores lotados
nos campi do interior.
A desestruturação se expressa visivelmente na relação
entre os regimes de trabalho.
Ilustram bem a situação os
casos em que a quantidade de
hora/aula é dobrada, mas os
vencimentos não têm aumento
na mesma proporção. Nem a
diminuição dos níveis salariais,
de 17 para 13, amenizou as
perdas e a falta de lógica na
classificação. Às vezes, a diferença salarial de um nível para
o outro é inferior a 1%. Mas há
mudança de patamar em que
esse percentual chega a 25%.
João Negrão, presidente da
Associação dos Professores da
Universidade Federal do Paraná
Professores universitários lotaram Esplanada dos Ministérios para reivindicar melhores condições de trabalho
20
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
(APUFPR), Seção Sindical
do ANDES-SN, lembra que a
desestruturação da carreira vem
desde os primeiros governos
depois da ditadura militar, os
quais “adotaram a gestão neoliberal”. Mas a redução salarial,
segundo ele, começou no governo Collor de Mello (19901992). Ele cita como exemplo
os “40 salários mínimos pagos a
um professor adjunto” na época. Hoje, o mesmo profissional
recebe “15 salários mínimos”.
Os professores têm consciência de que se trata de uma
política de governo e muitos
sentem na pele os efeitos da
desconstrução da carreira.
Hugo Blois, professor em
Santa Maria (RS), conta que
o estresse da carreira docente
lhe custou três pontes de safena e uma mamária. “Conheço
gente que tem problemas psíquicos”, afirma.
A presidente do ANDESSN, Marinalva Silva Oliveira,
comenta que esse processo
está de acordo com “o projeto
mercantilista do governo”, mas
precisa ser revertido para beneficiar a sociedade brasileira e
não as forças do mercado. Ela
argumenta que uma universidade pública está ancorada em
três pilares indissociáveis: o
ensino, a pesquisa e a extensão.
Por isso, deve ser financiada
pelo Estado, conforme estabelece a Constituição. Para
dar ao cidadão o que lhe é de
direito, “um bom ponto de
Ensino de qualidade também mobiliza estudantes e técnico-administrativos
partida é a destinação, já, de
10% do Produto Interno Bruto
(PIB) do país para a educação
pública”, propõe.
A assessoria de comunicação do Ministério da Educação
21
Revista Andes Especial
(MEC) não se manifestou
sobre a perda de direitos dos
docentes. A do Ministério do
Planejamento limitou-se a informar que quem decide é o
Ministério da Educação.
Novembro de 2013
A defesa da universidade
pública ganha as ruas de
Brasília. Uma bandeira
desfraldada por docentes,
discentes e técnicos
Mercantilização muda o papel dos docentes
Os professores universitários entendem que os ataques
à carreira docente têm como
pano de fundo a proposta de
mudança radical do conceito
de educação pública superior.
A ideia é retirar a função social
da universidade e transformá-la
em uma “prestadora de serviços” com foco nas demandas
do mercado. Assim, o Estado
se livra de sua obrigação com a
sociedade e transforma a atividade docente em parte de um
grande negócio.
“Isso muda o paradigma
da educação que temos na
Constituição Federal e faz parte da reforma do Estado nos
moldes do neoliberalismo que
teve início no governo FHC,
com o então ministro Bresser
Pereira”, analisa o professor
Daniel Nedel, da Universidade
Federal do Pampa (Unipampa).
“Começou com Bresser, mas as
mudanças mais profundas foram efetivadas agora”, pontua.
De fato, quem vai operar
nesse novo modelo organizacional não é mais o docente
que trabalha com a concepção humanista histórica de
universidade, mas um outro
tipo, condicionado por um
plano de carreira condizente
com essa lógica mercantilista.
Difícil é identificar a função
social da universidade em um
contexto em que o Estado,
antes provedor, limita-se a
atuar como uma espécie de
regulador de mercado.
Ao reduzir a educação a uma
mera fatia de mercado a ser
explorada pelo capital, com um
funcionamento do tipo privado
sob o pomposo nome de “organização social”, o Estado transforma o professor universitário
em um transmissor mecânico
de conhecimentos, rompendo a
indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão.
“De uma forma geral, não
é a um projeto de educação
22
Revista Andes Especial
concebido pela comunidade
acadêmica que o mercado tem
de se adaptar, mas, ao contrário, o mercado é quem dita
qual será nosso projeto de
educação”, ressalta Nedel. Por
sua vez, o mercado quer um
negócio que dê lucro e para
gerar lucro é necessário fazer
uma série de modificações. “E
aí começa a mudar também
a forma como nos relacionamos com o ensino de terceiro
grau”, explica o professor. As
universidades passam a ser
geridas de uma forma análoga
às empresas comerciais, as instituições privadas.
“Nossa carreira passou a
ser mal vista para essa nova
função da universidade porque não tem mais o compromisso de gerar conhecimento. Muda a concepção de
universidade, muda a forma
como o docente interage com
a universidade, muda tudo”,
observa Nedel. Nesse contex-
Novembro de 2013
to fica cada vez mais difícil
ter espaço para questionar a
função social da universidade,
pois ela sofre efeitos da nova
forma de organização e dos
interesses do capital.
Professor patrocinado
Agora, o professor universitário deixa de atuar coletivamente, contribuindo para a
construção do conhecimento,
para dedicar-se apenas à formação de novos profissionais ou à
pesquisa condicionada à busca
de seus próprios patrocinadores. De acordo com a professora Maria de Fátima Siliansky,
da Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ), tudo
caminha para a figura do “docente empreendedor” – aquele
que tem iniciativa própria para
captar recursos públicos e privados no mercado.
Entre os critérios de avaliação do corpo docente dos
programas de pós-graduação,
a Capes/MEC (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior) pontua o
docente que vai buscar financiamentos na avaliação para a
progressão vertical na carreira.
E a Lei 12.863/2013, que a
presidente Dilma Rousseff
sancionou em setembro deste
ano, sacramenta a possibilidade de ganhos financeiros para
quem participa desses projetos.
A depender da área em que
o professor está inserto, se está
numa área tecnológica ou numa
área básica de saúde, e da disposição pessoal de se submeter
a determinadas exigências externas, ele tem a possibilidade
de fazer parceria com as empresas que buscam nos centros
de pesquisa a oportunidade de
desenvolver os seus projetos,
oferecendo vantagens. “Isso
passa a ser uma atividade individual do docente, criando uma
fragmentação enorme porque
perde a perspectiva mais coletiva do trabalho, com grande
repercussão sobre a graduação”,
observa Fátima.
O docente da graduação
tornou-se o que chamam pejorativamente de “baixo clero”
porque não é bem pontuado,
não é bem avaliado e por isso
mesmo tem dificuldade de
ascender na carreira. Para
Fátima, legitimando o “alto” e
o “baixo clero”, o governo cria
universidades distintas, ou seja,
universidades que se tornam
centro de excelência e as universidades que viram grandes
escolas de terceiro grau.
Nesse quadro, surge “a
desigualdade intrauniversidade” porque aquilo que pode
ser decantado como o sucesso
do trabalho do docente vai
depender de um conjunto de
condicionantes, muitas vezes
distanciados do interesse acadêmico efetivo e mais ainda
do interesse social. Se ele
pesquisa assuntos que não têm
interesse comercial, vai encontrar dificuldade não importa
qual seja a relevância do trabalho dele para a sociedade.
Fátima lembra que já existe uma grande heterogeneidade. “Há setores que têm
mais relação com o mercado,
financiamento externo, boas
condições de trabalho, e os
setores completamente sucateados, que dependem apenas
do financiamento governamental, do Ministério da
Educação”, afirma. Quando o
Reuni se expandiu, uma das
grandes transformações que
provocou foi o “escolão” de
terceiro grau.
Os professores universitários são claros em suas reivindicações
23
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
No ano em que o governo lançou o Reuni, docentes denunciaram a mudança de concepção de universidade
Lei cria novo
modelo de
universidade
“O projeto de lei aprovado
(complementado agora pela
Lei 12.863/2013) é mais um
marco no distanciamento da
esfera pública, instaura uma
nova carreira e precariza o
trabalho dos professores ainda
mais. O governo precisa destruir a carreira docente para
adequar as relações de trabalho à nova universidade, mais
instrumental”, reage o professor Daniel Nedel.
Como uma “organização
social” ou com suas ativida-
des próprias interpostas por
entes privados, tem normas
específicas que não se pautam
pela universalidade, mas pela
instrumentalidade; tem uma
meta específica, que é competir com a outra organização
social que tenha a mesma
meta. “É típico de uma organização social um contrato
de gestão para atingir essas
metas, como está acontecendo
com as universidades por meio
do Reuni”, diz o professor.
O Reuni é uma espécie de
contrato de gestão, a universidade tem de cumprir metas
para receber dinheiro e as
metas não são instituídas pela
universidade, mas de cima para
baixo, pelo MEC. Se não aprovar 90% dos estudantes, por
24
Revista Andes Especial
exemplo, não cumpre a meta e
tem dificuldade para justificar
a necessidade de recursos”.
Para Nedel, outra consequência danosa da nova lei é a
desvalorização da Dedicação
Exclusiva (DE). Ele lembra
que já existe nas universidades, pela lógica do Reuni,
uma coisa chamada “Banco de
Professor Equivalente”. Com
um contrato de dedicação exclusiva, o docente tem tempo
de fazer pesquisa, é pago para
pensar em projetos de longo
prazo e fazer extensão, porém
custa mais para a universidade
do que dois professores com
contrato de 20 horas sem dedicação exclusiva.
“Quando se fala na questão gerencial da universidade,
Novembro de 2013
por umas contas que eles fazem lá, é mais vantajoso contratar dois de 20 horas sem
DE. O gerente disso tudo é
o reitor, agora essa figura de
“dono de empresa que tem de
fechar a equação”, reclama. A
universidade pública ficaria
mais parecida com a privada,
em que o professor, por conta
do tipo de contrato que lhe
é imposto, não tem tempo
nem para fazer pesquisa e
extensão, nem para se dedicar ao ensino de qualidade.
Antes dessa lei, os contratos
de 20 horas ou 40 horas sem
DE eram muito pouco valorizados, financeiramente não
eram atraentes, agora, em
algumas circunstâncias, são
impostos como condição para
atender às horas-aulas sem
cobertura de docentes.
Com esse tipo de lógica
contida no contrato de gestão da organização social, o
Estado vai diminuindo cada
vez mais o financiamento da
universidade, até que ela precise buscar outras formas de
financiamento. Daniel Nedel
diz ainda que não há surpresa
no fato de o atual governo, antes considerado politicamente
“de esquerda”, promover essas
mudanças neoliberais.
“Ele consegue implantar
reformas que os governos anteriores não conseguiram porque
é mais habilidoso em massacrar
os movimentos sociais, mesmo
porque ele vem dos movimentos
sociais, conhece muito bem a
linguagem, a aparelhagem –
hoje, muitos sindicatos são aparelhados pelo governo e fazem o
papel de chapa-branca”, declara.
E cita como exemplo a oportuna “criação” da Federação de
Sindicatos de Professores de
Instituições Federais de Ensino
Superior (Proifes).
“O Proifes assina qualquer
coisa. Quando vamos para
a mesa de negociação para
rechaçar certos tipos de propostas, o Proifes compactua
com o governo”, acusa. A prova disso, segundo ele, seria o
fato de a categoria ter feito
a maior greve de sua história
em 2012, o governo atropelado todas as negociações
e fechado um simulacro de
acordo com o Proifes.
Cadeiras, móveis e equipamentos degradados são o sinal do pouco caso do Estado com a educação
25
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Faltam democracia
e transparência na
gestão do orçamento
Comunidade universitária só
conhece o destino do dinheiro
designado às IFE depois de
tudo decidido nos gabinetes
Valdeci Rodrigues
F
altam democracia e
transparência na distribuição dos recursos públicos, internamente,
nas Instituições Federais de
Ensino. A comunidade acadêmica fica fora das decisões,
tomadas em grupos pequenos
e fechados – como o Conselho
Diretor – que, geralmente,
apenas homologam o que fora
decidido nos gabinetes.
Para justificar a falta de
participação dos docentes, a
desculpa é sempre a mesma:
os conselhos são formados por
membros eleitos pelos próprios
professores. Quem não faz parte da direção não opina sobre
as prioridades na gestão do
orçamento e, às vezes, só toma
27
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
conhecimento do destino do
dinheiro depois de tudo decidido nos gabinetes.
A luta pela transparência na aplicação do dinheiro
do contribuinte continua na
pauta de reivindicações do
ANDES-SN. Os dirigentes
sindicais justificam que os
mecanismos existentes funcionam como uma cortina
de fumaça para esconder da
comunidade universitária o
uso dos recursos financeiros,
tantas vezes moeda de troca
em um balcão de interesses
caso a caso.
Os relatos dos que acompanham de perto a situação
são parecidos, o que revela a
dimensão nacional da falta de
critérios e de transparência. As
decisões centralizadas trazem
prejuízos para todos – comunidade universitária e sociedade.
Isso porque, sem a participação
dos três segmentos das universidades, ações prioritárias são
deixadas de lado.
Na Universidade Federal
do Recôncavo da Bahia, o
vice-presidente da Associação
dos Professores Universitários
do Recôncavo (Apur), Herbert
Toleto Martins, não se conforma com a notificação do
destino do dinheiro pela internet. Para ele, isso não resolve as grandes questões das
universidades.
“O grande problema é gastar com ‘x’ ou com ‘y’. Sempre
ficam prioridades de fora.
É um grupo muito pequeno
que decide politicamente. A
comunidade não fica sabendo.
Aqui não temos restaurante
universitário nem área de lazer, por exemplo”, reclama o
dirigente sindical.
O presidente da Associação
dos Docentes da Universidade
Federal de Pernambuco
(Adufepe), José Luiz Simões,
é ainda mais veemente ao comentar a situação no seu estado: “Não há discussão nem
no Conselho Universitário,
imagine diante da sociedade
(...). É ruim. Dá a impressão
de decisão de cima para baixo.
Como sabemos se a prioridade é construir um prédio ou
fazer manutenção em outro?
A reitoria prioriza o que não
é prioritário”, acusa. Simões
cita, entre os muitos problemas na UFPE, os prédios sem
manutenção e a falta de segurança e de gabinetes para os
novos professores.
O presidente da Associação
dos Docentes da Universidade
Federal do Rio de Janeiro
(ADUFRJ), Mauro Iasi, faz
uma análise contundente. Para
ele, a falta de democratização e
de transparência é uma política
de governo. Iasi conta que o
A revolta dos docentes contra
a precarização do trabalho é
uma realidade em todo o país.
Em Sergipe eles foram às ruas
mostrar sua indignação
28
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
orçamento da universidade é
controlado pela reitoria:
“É um processo administrativo centralizado na reitoria, pré-estabelecido pelo
Ministério do Planejamento.
Há uma série de determinações
dos ministérios da Educação
e do Planejamento”, critica.
O diagnóstico de Iasi é claro:
“Não há autonomia na universidade” porque está tudo
sendo encaminhado no sentido
da mercantilização do ensino
superior, com as instituições
complementando suas verbas
vendendo serviços e fazendo
até venda de cursos”.
Recursos já chegam
“carimbados” na UFPE
Das universidades citadas, apenas a UFPE disse como administra a aplicação das verbas que chegam à instituição. O
pró-reitor de Planejamento, Orçamento e Finanças, Hermano
Perrelli, contou que, dos cerca de R$ 1 bilhão que a universidade recebe do governo, algo em torno R$ 800 milhões já
chegam “carimbados”. São destinados ao pagamento do pessoal ativo e inativo.
Segundo ele, os aproximadamente R$ 200 milhões restantes
fazem parte de programas nacionais, como o Reuni, e são também destinados a obras e manutenção da UFPE. Ele assegura que
a verba é repartida entre as 12 faculdades da instituição, segundo
a decisão do Conselho Universitário, que tem “de 50 a 60 membros”. O pró-reitor diz que “a queixa maior é a dificuldade de
execução”. “O difícil é gastar”, acentua, referindo-se à burocracia,
que provoca “um engessamento muito grande” nas IFE.
A Universidade Federal de Pelotas (UFPel) segue o mesmo
padrão, com a diferença de que muitos ali ainda se lembram de
uma gestão diferenciada, de 1989 a 1992, com Amílcar Gigante
como reitor. “Professores, funcionários e estudantes sabiam
quais os recursos e onde eram aplicados”, recorda-se o professor
Hélvio Casalinho.
O Ministério da Educação, por intermédio da assessoria de
comunicação, diz que os recursos públicos são destinados para
cada universidade e a instituição pode até determinar o que será
gasto com custeio ou com investimento. Mas quase todo dinheiro serve para custear as despesas.
De acordo com o ministério, há programas específicos –
como expansão de um curso ou implantação de novos campi –,
em que a verba já vai rubricada para custeio ou investimento.
Depois que os recursos são enviados, segundo o Ministério
da Educação, a decisão sobre o detalhamento e a utilização do
dinheiro fica por conta de cada instituição, dentro da autonomia universitária.
A assessoria de comunicação do Ministério do Planejamento,
também apontado como responsável pela falta de democracia e
de transparência nos gastos públicos nas universidades, diz que
a Pasta se limita a acompanhar as decisões, que são de competência do MEC.
29
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Desvio ideológico
na concepção de
mérito acadêmico
Governo compele a categoria
a avaliações que estimulam a
individualização e provocam efeitos
da heteronomia sobre a função docente
Carla Lisboa
A
professora titular em
análises clínicas do
curso de Farmácia
da Universidade Federal do
Paraná (UFPR), Maria Suely
Leonart, descobriu e produziu
amostras-controle para calibragem de aparelho de hemograma. Era segredo industrial.
As indústrias estrangeiras não
repassam esse conhecimento e
dizem que se usar amostras de
outra origem pode danificar
os aparelhos que elas vendem.
A professora provou que isso
não é verdade. “Testamos por
três meses em 14 laboratórios
31
Revista Andes Especial
de Curitiba e conseguimos um
super-resultado. Confirmamos
que dava para usar as amostras e que serviam para calibrar os aparelhos”.
Ela publicou a pesquisa,
mas não patenteou e nem
vendeu. Queria criar o conhecimento e disponibilizá-lo
para o Brasil baratear custos
de importação, como faz hoje
com pesquisas que objetivam
melhorar a qualidade de exames de detecção de câncer
e do tratamento de anemia
falciforme. Estuda a padronização de uma nova técnica
mais eficiente de coleta de
material com meio líquido
Novembro de 2013
Arquivo ANDES-SN
Maria Suely atua no
Laboratório de Citologia e
fez descobertas importantes,
mas não patenteou para que
fossem de domínio público
para exame de Papanicolau de
baixo custo para laboratórios e
para o Sistema Único de Saúde
(SUS). Na outra pesquisa,
estuda como as substâncias
antioxidantes podem proteger
os portadores de falciforme da
oxidação exacerbada das células. “A ideia de que o antioxidante pode melhorar a qualidade de vida deles poderia ser um
tema que o governo ajudasse
financeiramente”.
O dinheiro que precisa para o Laboratório de
Citologia a própria Maria
Suely tem de captar, por meio
de concorrência a editais. “A
universidade não faz planejamento de gastos dos min-
guados recursos que recebe.
Eles são distribuídos de forma
insuficiente e sem equidade. Para mim, por exemplo,
compram o mínimo”, revela.
Se quiserem receber dinheiro
para pesquisa, os docentes
são obrigados a ingressar num
sistema produtivista de atividades acadêmicas e de captação de recursos instituído
pelo Ministério da Educação
(MEC) por meio dos órgãos
de fomento à pesquisa.
Se não se integrarem nesse
sistema, nem sequer entrarão
na disputa pelo dinheiro e,
pior, não obterão boa avaliação
de desempenho e não terão
ascensão funcional e nem
salarial, não ingressarão na
pós-graduação, não receberão
dinheiro para pesquisa e colocarão em risco a pontuação da
universidade perante um sistema federal de recebimento de
recursos, ao qual a instituição
está presa. Maria Suely é exemplo do que ocorre país afora.
Os docentes têm de captar
recursos financeiros, condicionados a critérios externos,
assegurar pesquisas e conquistar boa pontuação para evoluir
na carreira. Caso contrário,
deixam de existir perante os
órgãos de fomento à pesquisa,
perdem a oportunidade de ascender na carreira e, com isso,
a possibilidade de obter reajustes salariais, uma vez que o
plano de carreira está ligado à
lógica da produtividade.
32
Revista Andes Especial
O efeito negativo e mais
evidente dessa situação é a
transformação da atividade
acadêmica em tarefas de cunho
produtivista e instrumental
a serem executadas em curto
prazo, as quais se distanciam
do conteúdo profundo do conhecimento e reduzem a qualidade da pesquisa científica e da
educação superior pública.
“A incorporação da avaliação individual e dos programas
e cursos isoladamente, desvinculados das instituições, o
que é exótico e anticientífico, é
proveniente de um complexo de
fatores interligados. Quando
examinamos os documentos do
Banco Mundial, em particular
o famoso ‘Banco Mundial e
a Educação Superior: Lições
Derivadas da Experiência’,
1994, percebemos que a
avaliação foi pensada como
instrumento para golpear a
autonomia universitária. O
controle dos resultados – produtividade, eficiência –, guiado
por referências utilitaristas, é
fundamentalmente coercitivo,
recursos, bolsas, simbolismo.
E esse controle é um controle
sobre o processo de trabalho,
sobre o modo de apropriação
do tempo, agravando a heteronomia”, esclarece o professor titular da Faculdade de
Educação e do Programa de
Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do
Rio de Janeiro (PPGE/UFRJ),
Roberto Leher.
Novembro de 2013
Além disso, a própria oferta
de financiamento mediante
órgãos de fomento passa a ser
vinculada a Câmaras Setoriais
(CT-Hidro, CT-Petro, etc.)
que terminam por direcionar
a pesquisa a assuntos do interesse do setor econômico, que
destinam recursos aos fundos
setoriais. “Não há mais pesquisa livre ou desinteressada,
e o debate sobre o valor da
pesquisa básica em relação à
pesquisa aplicada se torna distorcido”, acrescenta o professor
do Departamento de Ecologia
da Universidade de Brasília
(UnB), Carlos Hiroo Saito.
Desenvolvimento Científico
e Tecnológico (CNPq) passaram a ser uma questão de
sobrevivência, pois os recursos
e os suportes das agências de
fomento são dirigidos para
os programas e indivíduos
“bem avaliados”. “Isso exige
um esforço sobre-humano dos
indivíduos, uma profunda reorientação dos trabalhos universitários, objetivando a produção regular de produtos, pois,
sem isso, o seu programa pode
cair na avaliação e, certamente,
será identificado o docente que
produziu abaixo do esperado.
Isso aprofunda a alienação do
trabalho, provoca adoecimento
e tristeza, como mostraram
Valdemar Sguissardi e João dos
Reis, e, sobretudo, perda da
relevância do que é investigado
na universidade brasileira”.
Excluídos do sistema
Um dos principais quesitos da avaliação institucional
e de docentes é a vinculação à
Wilson Dias-abr
Critérios produtivistas
A docência superior e a
pesquisa científica estão cada
vez mais reduzidas ao cumprimento de metas localizadas sob
parâmetros irracionalmente
homogeneizados. A avaliação
de desempenho segue parâmetros produtivistas com intensa
produção de artigos científicos,
orientação de estudantes na
pós-graduação, execução de
aulas na graduação, captação
de recursos financeiros por
meio de elaboração de projetos
para disputas de editais, dentre outras atividades que, “no
fundo, refletem uma política
global produtivista e deslocada
da função social do trabalho
docente”. O resultado disso,
segundo o ANDES-SN, tem
sido o adoecimento da categoria, a queda da qualidade das
pesquisas e do magistério, a
precarização do trabalho e a
mercantilização da ciência e da
educação superior pública.
Leher explica que, como as
universidades não têm recursos de outros custeios capazes
de financiar a pesquisa e a
extensão, o “bom desempenho” na pós-graduação sob
a ótica da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (Capes) e
a boa qualificação do indivíduo no Conselho Nacional de
Os problemas provocados pelas avaliações do governo também são motivo de mobilização dos professores
33
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
informais, uma estrutura de
pirâmide excludente de conteúdo ideológico. “Na última
greve denunciamos a mentira
do governo de dizer que estava
concedendo 40% de reajuste
aos docentes. Ele aplicava valores de aumento maior na parte
de cima da tabela, para titular
e associado 4, 3, mas, para
baixo, o índice de aumento era
bem inferior. Vimos que o que
está por trás do que hoje é o
produtivismo não é o que havia explicitamente no período
de vigência da Gratificação de
Estímulo à Docência (GED), e
sim está implícito na estrutura
da carreira e existe uma barreira significativa para a maioria
dos professores”, explica Saito.
O fato é que os docentes
são cada vez mais cobrados
pela produção científica e por
publicação, o que gera um círculo vicioso. “Por exemplo: se
o docente consegue entrar na
pós-graduação, depois que os
estudantes concluem as dissertações e teses, ele tem a possibilidade de compartilhar publicação com o seu orientando.
Mas o professor que não está
na pós tem o campo de atuação
restrito, porque diminuem as
publicações e, assim, as chances de obter um financiamento
de projeto são ínfimas e menor
ainda é a possibilidade de publicar artigos em periódicos
classificados como Qualis, que
a Capes adota”, esclarece o professor da UnB.
34
Revista Andes Especial
Arquivo Adufrj
pós-graduação, à quantidade
de orientandos e à redução do
tempo dos cursos desses orientandos. Exatamente por causa
disso uma parcela grande de docentes está excluída do sistema.
Além do surgimento de novos
programas, constantemente
outros enxugam seus quadros
ou reduzem o número de credenciados em razão da avaliação
da Capes estar baseada nesse
tipo de produtividade. Docentes
que condicionam seu trabalho a
esses critérios são, gradualmente, postos à margem até serem
eliminados porque são considerados peso morto.
A Capes vê programas que
reúnem maior número de docentes como inchados e, quando
isso ocorre, mantém no quadro
os professores que assinam o
maior número de publicações.
O resultado é um grande contingente de docentes impedidos
de atuar na pós-graduação. Essa
situação piorou depois da abertura de concurso para ampliação
do quadro nos governos Lula
e Dilma. Muitos docentes não
conseguem entrar imediatamente na pós-graduação porque
estão fora do já estabelecido
critério de credenciamento
baseado nas publicações. “O
destino de muitos professores é
ficar estacionados na classe de
adjunto sem conseguir passar
para o nível de associado”, alerta
o professor Carlos Saito.
Com esse sistema, foi instituída, por meios formais e
Roberto Leher acredita que a
avaliação de desempenho
foi pensada como um
instrumento para golpear
a autonomia universitária
O fator de impacto
Para ser valorizado pela
Capes, o artigo tem de ser
publicado em periódicos científicos com Fator de Impacto
(FI) elevado, segundo critérios da Thomson Reuters
Corporation. Esse índice, criado pelo cientista norte-americano e fundador do Institute
for Scientific Information
(ISI),Eugene Garfiel, mede
quantas vezes a revista é citada em outras publicações.
Usando preponderantemente
o fator de impacto (justificado como forma de eliminar o
subjetivismo), a Capes criou
Novembro de 2013
Carla Lisboa
o Sistema Qualis. O Qualis
A1, por exemplo, é representado pelas revistas de mais alto
impacto. O problema é que o
FI é medido pela Thomson
Reuters Corporation e as revistas, para poder ter o seu fator
avaliado, precisam associar-se
a essa organização e pagar uma
taxa. “Quando se pergunta se
tem uma lucratividade, parece
que existe um sistema editorial montado em torno do
FI. Tem revistas consideradas
importantes, mas não estão no
sistema Thomson, por isso elas
não têm FI e são consideradas
marginais”, diz Saito.
Os docentes observaram,
na discussão entre eles, haver
mecanismos que forçam as
revistas a aumentarem artificialmente os seus FI. “Os
docentes submetem o artigo a
uma revista que, para ter seu
FI elevado e se posicionar melhor no ranking da Thomsom,
por vezes exige que ele cite
“Quando se
pergunta se tem
lucratividade,
parece que existe
um sistema editorial
montado em
torno do FI”
Professor Carlos Saito
na bibliografia um ou dois
artigos dela mesma. Assim,
começa a criar um sistema artificial. O pesquisador acaba
perdendo porque ele apela pela
publicação em conjunto ou em
separado ou outro pesquisador
cita o trabalho dele e ele cita
o trabalho do outro. E assim
se consegue criar grupos fechados e se cria um círculo
vicioso. Há um sistema de
produtivismo com essas características na universidade”,
denuncia o professor de ecologia da UnB.
O professor
Carlos Saito, do
Departamento
de Ecologia da
Universidade de
Brasília, diz que já
não há pesquisa
desinteressada
35
Revista Andes Especial
Roberto Leher esclarece que
essa sucessão de acontecimentos em círculo ocorre porque o
eixo dessas políticas de avaliação passa pela pós-graduação
“de excelência”. “Isso cinde os
professores entre aqueles que
atuam apenas na graduação e
os que atuam também na pós.
Só os que atuam na pós podem
percorrer a dita rota da excelência. Então, temos aqui uma
profunda cisão. Mas existem
outras que coexistem com a
anterior, envolvendo a hierarquia de áreas. É só observar o
numero de bolsas de produtividade para as áreas ditas estratégicas e as áreas secundárias. É
gritante! Assim, mesmo entre
os que estão na pós, temos rotas distintas de excelência, algumas mais bem pavimentadas
e mais fáceis, outras são mais
ásperas. A carreira docente infelizmente reproduz tais deformações heterônomas”.
O professor da PPGE/
UFRJ explica que uma carreira
universitária deveria estar referenciada na instituição e em sua
função social, valorizando, de
modo equilibrado, os fins constitucionais da universidade: o
ensino, a pesquisa e a extensão,
indissociáveis. “O esforço sério
da pesquisa sistemática, da preparação dos cursos, o trabalho
de socialização do conhecimento para a sociedade, tudo isso
precisa ser seriamente considerado. E também o tempo, o
momento da vida acadêmica
Novembro de 2013
“O controle dos
resultados guiado
por referências
utilitaristas é
fundamentalmente
coercitivo”
Professor Roberto Leher
do professor. Não é possível
pensar a evolução na carreira
para um recém-concursado e
um docente com muitos anos
na instituição, que já tem maior
reconhecimento na área, recebe
convites para comitês editoriais,
artigos etc. Temos de abrir o
debate sobre o fato de que o
ensino, a pesquisa e a extensão,
embora indissociáveis, podem
ser diferentemente equilibrados
Avaliações da Capes intensificam o trabalho e geram insatisfação
36
Revista Andes Especial
e dimensionados ao longo da
vida laboral do professor”.
Ele acredita que, juntamente
com a avaliação institucional e,
nela, a avaliação dos docentes,
pode ser trabalhada uma distribuição de funções, direitos e
deveres que não é pela carreira,
que pode ser muito boa tanto
para a categoria como para a
educação superior. “Uma carreira que valorize o trabalho
vis-à-vis aos fins da universidade pode criar condições
para percursos formativos mais
sistemáticos, densos, rigorosos,
pois, atualmente, a docência é
completamente desvalorizada;
o mesmo pode ser dito sobre a
pesquisa abrangente, teoricamente rigorosa, comprometida
com a produção de conhecimento novo, eticamente orientado.
Daí porque a última greve foi
uma luta por concepção de
universidade. Os problemas
socioambientais, econômicos,
energéticos, alimentares, educacionais da humanidade exigem
uma universidade livre, não
operacional aos interesses do
mercado. Daí a aspereza das
lutas pela carreira no Brasil de
hoje. Os setores dominantes
operam diretamente a educação
básica (Todos pela Educação) e
superior (por meio da Inovação
Tecnológica). Enquanto isso,
domínios estratégicos do conhecimento são eclipsados,
agravando a condição capitalista
dependente do país”, conclui o
professor da UFRJ.
Novembro de 2013
GED introduziu o produtivismo nas IFE
A avaliação docente tem
várias facetas e uma delas é ser
realizada periodicamente e fazer
parte da estrutura da carreira
para fins de promoção e progressão. O caráter produtivista da
produção acadêmica foi escancarado em 1998, com a introdução
da Gratificação de Estímulo à
Docência (GED) na remuneração e sua correspondência depois
na carreira do Ensino Básico
Técnico e Tecnológico (EBTT).
Na época, havia o entendimento
de que a gratificação teria implicação direta na composição do
salário e que não tinha nada que
ver com promoção e progressão,
ou seja, não tinha que ver com
a estrutura da carreira. A GED
foi instituída pela Lei 9.678/98,
pelo governo Fernando Henrique
Cardoso, a qual, apesar da greve
dos docentes, foi sancionada e
durou dez anos. Somente em
2008, com a Medida Provisória
431/2008, convertida na Lei nº
11.784/2008, essa sigla desapareceu, sua essência , porém, foi
mantida sob outra denominação.
“Para se chegar a esse resultado,
o movimento docente lutou por
muitos anos denunciando a perversidade do sistema e reivindicando o fim do seu caráter produtivista, e sua incorporação foi
reivindicada na esteira de uma
luta mais ampla pelo fim de todas as gratificações – uma única
linha no contracheque”, afirma o
professor da UnB.
Na proposta original, ela
iria se chamar PID – Projeto de
Incentivo à Docência –, depois
se tornou GED. Com essa gratificação, o governo introduziu
um componente variável no salário como se fosse produtivida-
de, o qual estava atrelado a uma
pontuação, principalmente à
quantidade de horas em sala de
aula. Aprovada pelo Congresso
Nacional, a GED estabeleceu
um sistema em que o docente
ficava refém dessa gratificação
para elevar seu salário.
“Se o docente desse um
número a mais de horas, ele ganhava mais pontos e se somava
a isso publicação de artigos”,
lembra Saito. Em seguida,
criou-se uma tabela de pontuação em função das atividades
dos docentes. E a partir de um
determinado número de pontos
alcançados, o professor teria
direito à gratificação plena. Se
não alcançasse os pontos, tinha
80% da gratificação. A remuneração era variável e calculada
ao fim do ano. Uma comissão
recebia do professor cópias que
Gratificações e outros
penduricalhos no
contracheque destroem
a carreira docente
37
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
comprovassem tudo o que ele
havia feito e a pontuação valia
para o ano seguinte. Se durante
12 meses o docente não alcançasse a pontuação definida, ele
ficava com o salário reduzido.
O professor Carlos Saito
acredita que foi a GED que
introduziu na carreira docente o modelo produtivista. “E
tanto era um modelo produtivista que o governo calculava,
para a instituição, uma cota
de recursos para pagamento
da GED. No máximo, 70%
dos docentes podiam alcançar
100%. Se todos os docentes de
uma instituição atingissem a
pontuação para receber a GED
integral, não haveria recursos
financeiros para isso. Teria de
estabelecer um ranking para ver
quem era que estaria mais no
topo e ganharia os 100%”, explica. Essa situação criou uma
disputa na universidade. Hoje a
Capes, por exemplo, tem a avaliação trienal dos programas,
em que verifica o tempo de
titulação e também o de produção científica dos docentes
e dos discentes. É feita de três
em três anos porque há uma
oscilação natural na produção
científica. Dependendo da área,
o pesquisador leva dois anos
fazendo experimentos em campo para poder obter um resultado. O que se têm são ciclos.
Com a GED não era assim.
A avaliação era feita num período curto de tempo de apenas
um ano. “O que acontecia é
que, naquele ano em que o
professor não tinha produção
científica porque estava trabalhando para isto, ele tinha de
dar um jeito de correr para as
salas de aula e cobrir a pontuação por meio de aula. E como
a pontuação era calculada no
fim do ano, às vezes só na
metade do segundo semestre
é que o professor via que não
ia ter a produção com base nas
outras coisas e ele corria para
tentar negociar ou brigar para
que o outro colega saísse da
turma e ele assumisse aulas
para poder se pontuar”, conta
o professor Saito.
A GED criou a competição
entre os pares porque não havia a possibilidade de todos,
mesmo obtendo a pontuação
mínima, receberem o teto da
gratificação. Para obter os
pontos, a disputa por horas
aula era tão intensa que, independentemente de sua especialidade, os docentes queriam
pegar qualquer aula para poder
pontuar. “O princípio dentro
da UnB é que a universidade
deve procurar alocar os professores dentro de suas especialidades, supondo que ele vai
conseguir contribuir com sua
experiência de pesquisa e de
vida para tornar as aulas mais
ricas com exemplos etc. E a
GED criou uma situação absolutamente anômala”, afirma.
A GED também gerou o
problema da falta de paridade
entre os ativos e os aposentados e foi a forma que o ex-ministro da Educação, Paulo
Renato, encontrou para suprir
as vagas de docentes que surgiam nas universidades e não
podiam ser preenchidas porque
o ex-presidente FHC proibiu
a realização de concursos públicos. “Como a gratificação
era de estímulo à docência, e
os aposentados já não estavam
dando aula, num primeiro momento se criou uma discussão
sobre como é que seria resgatada a paridade e aí o governo
sinalizou com a proposta de
pagar 90% para os aposentados. Isso também permitiu
criar essa desigualdade”.
No Sul, docentes questionam o produtivismo e a precarização do trabalho
38
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Unipampa
não entrou
no jogo
Os professores da
Universidade Federal do
Pampa (Unipampa) impediram o governo federal
de implantar o Sistema de
Planejamento e Gestão de
Desempenho (SPGD) na
instituição – um modelo de
avaliação de docentes que
reforçava a transformação do
trabalho acadêmico como ati-
vidade produtivista na instituição. Isso ocorreu em 2008,
quando o corpo docente era
formado por cerca de 400
professores que, mobilizados
contra essa proposta, superaram todas as dificuldades,
como a distância entre os dez
campi e a falta de recursos financeiros, fundaram uma seção sindical do ANDES-SN
39
Revista Andes Especial
para organizar a luta, lotaram
as assembleias e barraram,
no Conselho Universitário,
a aprovação da proposta de
adoção do SPGD.
Até o fechamento, nenhuma
reitoria mencionada nesta matéria respondeu às perguntas
encaminhadas. Em mensagem
eletrônica, o MEC avisou que
não podia atender à solicitação.
Novembro de 2013
Administrações
marcadas pela repressão
e por perseguições
Gestores punem divergências de docentes
e técnicos com processos administrativos
disciplinares, sindicâncias e demissões. Com
os estudantes, fazem pior: chamam a polícia
Carla Lisboa
A
lgumas iniciativas de
repressão e o tratamento dado às divergências
de opinião voltam a lembrar
o que havia nas universidades
públicas nos anos de chumbo.
Engana-se quem pensa que
apenas nos regimes autoritários
os campi universitários são invadidos pela polícia para reprimir
manifestações de estudantes e
que professores e técnicos são
perseguidos e até demitidos
por defenderem ideias contrárias às de quem está no poder.
A Universidade Federal do
Maranhão (UFMA) é um dos
41
Revista Andes Especial
vários exemplos de instituição
tomada por um clima de ameaças mais ou menos veladas,
orquestrado para funcionar
sem ser notado e para relegar
ao limbo quem pensa diferente.
Quando isso não dá certo, as
forças policiais atuam para pôr
as coisas nos lugares definidos
pelos gestores. Os docentes
queixam-se de estar vivendo
uma das gestões autoritárias
mais repressivas da história da
universidade. “A repressão às
manifestações, principalmente
aos estudantes da Anel e do
DCE, quando houve a ocupação da Reitoria, no início de
2013, foi a forma que os diri-
Novembro de 2013
Professor Ayala é sentenciado pela alta cúpula da Universidade Federal do Maranhão à perda do emprego
gentes avisaram à comunidade
como lidam com as divergências”, declara o professor do
Departamento de Engenharia
de Eletricidade, Vilemar
Gomes da Silva.
O que ocorre no Maranhão
se repete em outros locais afora, como atestam a
Universidade Federal do Oeste
do Pará (Ufopa), a Fundação
Universidade do Rio Grande
do Sul (Furg), a Universidade
Federal do Tocantins (UFT)
e a Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul (UFMS).
Nessas instituições apareceu
uma forma mais sofisticada de
repressão. Os gestores usam
os instrumentos do processo
jurídico-administrativo do serviço público, que deveriam ser
usados no combate à corrupção, para perseguir qualquer
um que critique as atitudes
dos poderes instituídos: instalam comissões de sindicância, instauram Processos
Administrativos Disciplinares
(PAD) ou recorrem a processos na Justiça comum para perseguir e punir pessoas e abafar
as divergências.
Pedagogia do medo
Na UFMA, no dia 6 de
fevereiro de 2012, formou-se
uma comissão de sindicância
para castigar o professor do
Departamento de Filosofia,
Wildoberto Gurgel, porque ele
teria afirmado em blogs que
havia alterações irregulares de
notas do Sistema de Controle
Acadêmico. Encerrada a sindicância, abriram um PAD, que
funcionou de junho a novembro de 2012 e concluiu pela
42
Revista Andes Especial
demissão do docente. Ele foi
exonerado um mês depois, no
dia 11 de dezembro de 2012.
Somente após uma difícil luta
política e jurídica da Associação
dos Professores da UFMA
(Apruma), que contou com o
apoio dos estudantes da Anel, o
professor foi readmitido no dia
13 de agosto de 2013.
“Outros três PAD, sem
justificativa sustentável e com
tramitação que desrespeita
normas internas e prazos, foram abertos. Dois deles começaram após uma intervenção
no Conselho Universitário
(Consun), deflagrados em
agosto de 2012. Nesses dois
processos, professores que
atuaram na greve de 2012 e
fazem oposição à atual administração superior estão
arrolados. Um terceiro PAD
Novembro de 2013
foi aberto em maio de 2012
contra a professora do Campus
de São Bernardo, Alina
Miranda. Concluído, não teve
o resultado divulgado”, diz
o professor do Colégio de
Aplicação da UFMA, denominado Colégio Universitário
(Colun), e diretor administrativo financeiro da Apruma.
Ele contou que “Bartolomeu
Mendonça foi notificado no
fim de agosto deste ano em
uma ação por danos morais
movida contra ele por um
ex-coordenador do Ensino
Médio do Colun e membro da
gestão interventora do atual
reitor. O autor da ação, invertendo a autoria de constrangimento ocorrida no colégio durante a intervenção da gestão
pro tempore, acusa o professor
Bartolomeu de, em uma única
expressão pronunciada durante debate acadêmico em referência à gestão interventora,
ter causado danos morais subjetivos a ele”, afirma Vilemar
Gomes da Silva.
“Na Ufopa está em curso a pedagogia do medo para
calar e amedrontar a comunidade. No caso dos docentes,
a atual gestão usa, para isso,
PAD, sindicâncias e emissão
de notas baixas na avaliação
do estágio probatório. Outro
modo recorrente é não convocar os professores para a participação no Plano Nacional
de Formação de Professores
da Educação Básica (Parfor),
chamando docentes de outras universidades ou sem
qualificação para participar
do programa. As instâncias
deliberativas não existem e
as que foram criadas, como o
Consun, só o foram em razão
da pressão da comunidade.
Entretanto, elas funcionam
pro forma com conselheiros
biônicos e sem discussão real
sobre a vida da universidade,
ou seja, a gestão procura passar para a sociedade e para a
própria comunidade universitária a existência de participação, mas, na realidade, o que
há é uma falsa participação”,
relata o professor da Ufopa,
Luiz Fernando França.
Até o fechamento, apenas a
reitoria da UFT respondeu às
perguntas encaminhadas. As
demais não deram retorno. O
MEC avisou por email que não
podia atender à solicitação.
Comunidade acadêmica da UFOPA realizou greve e dentre as reivindicações exigiu também dignidade
43
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Choque de
gestão coíbe
liberdades
democráticas
O ANDES-SN acredita que
o estrangulamento das liberdades democráticas e da participação, o excesso de centralização
da gestão, a verticalização e as
escolhas antidemocráticas de
direções não são casuais. Foram
produzidas como política geral
para o setor público e impostas
pelo poder central. Prova disso
é o Decreto nº 6.944, editado em 2009 e apelidado de
Decreto do Choque de Gestão,
que estabelece “medidas organizacionais para o aprimoramento da Administração Pública
Federal direta, autárquica e
fundacional”.
No entendimento do
ANDES-SN, o “choque de
gestão que tem sido praticado
nas universidades federais tem
o sentido de dobrar o número
de estudantes por professor
e forçar o índice de diplomados, mesmo sem as condições
para isso, dobrar o número
de diplomados em relação
aos ingressantes, conforme as
cláusulas pétreas do Reuni,
o que resulta na precarização
das condições de trabalho; no
aligeiramento da formação
acadêmica; no abandono do
princípio da indissociabilida-
DCE Mário Prata, Sintufrj e Adufrj fazem ato na escadaria do IFCS/UFRJ, 23/10
de; na alteração das estruturas
organizacionais, reduzindo os
espaços colegiados e ampliando
o poder das direções executivas
(dos gestores)”.
Trata-se de um choque de
gestão para exercer o controle
heterônomo justamente no
momento em que o governo tem em andamento um
projeto de expansão e de
interiorização da universidade pública. No decreto, o
governo diz que o objetivo da
reforma é diminuir os níveis
hierárquicos para aumentar
a amplitude de comando e
declara que a meta é baixar a
linha a partir dos gabinetes.
É um sistema de gestão que
pune as divergências de opinião e de concepção de gestão, de universidade e outras.
Casos exemplares disso estão
relatados em dossiês das
Seções Sindicais enviados ao
ANDES-SN sobre situações
de impedimento à participa-
44
Revista Andes Especial
ção, com perseguição política
a quem se arrisca a defender a
categoria docente das condições de trabalho precarizadas.
Dossiês
A comparação das denúncias
registradas nos dossiês, advindas de várias Seções Sindicais,
demonstra haver características
comuns nos estilos de gestão,
como, por exemplo, o simulacro
de participação e de observância
às normas. Outra característica
da gestão que se amplia são
as decisões tomadas de forma
apressada sobre temas importantes, sem o debate amplo com
a comunidade universitária e
sem a apreciação e deliberação
nos colegiados competentes das
instituições, ou com convocação feita descumprindo preceitos básicos de democracia e
não observância nem sequer do
que está instituído pelo estatuto e pelo regimento interno
das instituições.
Novembro de 2013
O atual estatuto da UFT
foi elaborado sem a participação da comunidade universitária e implantado em 2003,
quando a instituição teve
efetivamente suas atividades
iniciadas. Ele concentra o poder decisório na administração
superior. “A composição dos
conselhos tem a maior parte
formada por pessoas ligadas
ao reitor, o que não envolve os
setores da universidade num
amplo debate, até porque, caso
a composição fosse diferente
e mais equilibrada, reclamaria
do reitor uma habilidade maior
na capacidade de dialogar e de
convencer os segmentos e seus
respectivos representantes”,
analisa o professor de filosofia,
Fábio Duarte.
O professor Vilemar Silva
conta que, no Maranhão, a
sessão do Conselho Superior
(Consun) para deliberar sobre
a adesão ao Reuni foi convocada com menos de 72 horas de
antecedência. E, mesmo com
o protesto de professores e
estudantes, ela foi realizada e
concluída sob o aparato policial
(Polícia Federal), numa pequena sala da Advocacia Geral da
União (AGU), cujo acesso foi
restringido para os conselheiros.
Eles, por sua vez, tiveram pouco tempo para ler o projeto de
adesão ao Reuni, sobre o qual
se sabia que afetaria significativamente a vida de toda a comunidade acadêmica e também a
concepção de universidade.
O professor da UfT, Fábio
Duarte, conta que uma das
formas de eliminar a participação dos docentes foi explicitada durante o ajuste do calendário acadêmico após a greve dos
professores das Instituições
Federais de Ensino Superior
(IFES), em 2012. “Foi elaborado e implantado pela
administração superior sem a
apreciação e deliberação pelo
Conselho de Ensino, Pesquisa
e Extensão (Consepe), ferindo regimento e estatuto das
universidades”. Na UFMA,
segundo Vilemar Silva, ocorreu o mesmo. E mais: “o curso
de Bacharelado em C&T, com
modificações significativas na
formação dos profissionais
da área de Ciências Exatas
e Tecnológicas, foi criado e
implantado sem debate com a
comunidade acadêmica, desrespeitando os trâmites regimentais nas instâncias colegiadas”.
Dossiês sobre a situação
do trabalho docente nas uni-
versidades elaborados pelas
Seções Sindicais para subsidiar o ANDES-SN na defesa
da categoria dão conta de que
algumas gestões têm tomado atitudes antidemocráticas
camufladas ou travestidas de
ações democráticas que visam
a eliminar a participação. Um
exemplo dessa situação é o
esvaziamento das instâncias
deliberativas das unidades acadêmicas e dos conselhos superiores. “As eleições para chefe
de departamento, coordenadores de curso e diretores acadêmicos na UFMA têm sido
realizadas com até um ano
de atraso, o que fere o prazo
regimental. Não há eleição
para os cargos dirigentes da
maioria das unidades acadêmicas localizadas no interior
do Maranhão e no Colégio
Universitário, no campus de
São Luís. Depois de muita
luta, a Apruma-ANDES-SN
conseguiu garantir as eleições
para o Centro de Imperatriz e
Escolha do reitor na UFMA desagrada estudantes e professores
45
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Docentes e estudantes fazem o enterro simbólico da democracia na Universidade Federal do Maranhão
para o Colun”, informa o professor Vilemar Silva.
A FURG é outro exemplo
que ilustra esse tipo de situação.
Há seis anos houve uma modificação interna na universidade
que transformou unidades
acadêmicas em institutos e,
aproveitando esse momento de
transformações, diminuiu-se a
representatividade nos colegiados superiores e das unidades.
“No curso de educação física,
eliminaram a representatividade
dos técnico-administrativos e
reduziram a dos estudantes de
quatro para um e a dos docentes
de quatro para dois. Docentes,
estudantes e técnicos afirmam
que a transformação feita foi
somente para piorar. Até mesmo
a representatividade dos professores é ‘eleita’ por meio eletrônico, escolhida por meio de listas
chapa branca e sem um mínimo
de debate ou de votação”, relata
o professor de educação física,
Billy Graeff.
Docentes e estudantes do
Campus de Três Lagoas da
UFMS têm cobrado dos dirigentes da instituição a implantação imediata do Plano de
Transparência para que a universidade passe a pôr à disposição da comunidade informações
dos recursos recebidos, dos
gastos previstos e efetivados,
bem como da política de disponibilização de recursos (como
diárias, material permanente e
de custeio) e a forma de solicitação por parte da comunidade
acadêmica. Esse plano faz parte
do acordo que a comunidade
acadêmica fez com a reitoria durante a greve de 2012.
O diretor do campus de
Três Lagoas da Universidade
Federal de Mato Grosso do
46
Revista Andes Especial
Sul, José Antônio Menoni,
contudo, informou aos docentes e estudantes que participaram de uma reunião com
ele, em setembro deste ano
(2013), que a UFMS não vai
implantar o plano por falta
de funcionário. Disse que
as planilhas de gastos estão
à disposição para consulta e
que o Portal Transparência
permite a consulta dos gastos
efetivados. “Salientamos que as
planilhas não são prestação de
contas públicas e que o Portal
Transparência individualiza
os gastos e recursos. No nosso
entendimento, o que o Campus
precisa é de uma prestação de
contas simplificada e de fácil
acesso, disponibilizada na página da instituição”, disse o
presidente da ADLeste-Seção
Sindical do ANDES-SN,
Vitor Oliveira.
Novembro de 2013
Falta democracia na escolha do reitor
A escolha do dirigente também é usada como instrumento
de exclusão da participação
dos segmentos universitários.
Novamente a UFMA ilustra
a situação de boa parte do
que ocorre nas universidades.
Vilemar Silva conta que lá
“esse é um processo draconiano que começa por uma
consulta prévia à comunidade
universitária em que o voto do
professor tem o peso de 70%,
o do técnico-administrativo e
o do estudante têm peso 15%,
respectivamente”.
Numa segunda fase do
processo, o Consun, que passa
a exercer o papel de Colégio
Eleitoral, elabora a composição de uma lista tríplice, com
os três mais votados, todos
com votação acima de 10%.
“O conselho pode alterar a
ordem escolhida pela comunidade, cujos segmentos que a
compõem participam de forma
bastante desigual. Por último
o Presidente da República escolhe um dos três. Com tais
regras, fica claro que não é
a comunidade que escolhe o
reitor, pois o Colégio Eleitoral
pode fazer nova votação e, o
mais importante, o Presidente
é quem escolhe qual será o
reitor”, afirma o professor.
A UFT, por sua vez, nas
últimas eleições, tem posto
no Conselho Universitário
(Consuni) o referendo do resultado da consulta na comunidade universitária, respeitando
a paridade entre os segmentos
(docente, discente e técnico-administrativo). “No entanto, a lei
federal deixa isso em um terreno instável, posto que a lista
tríplice permite que a consulta
não seja respeitada pelo governo
e isso abre margem para que se
estabeleça um jogo de manipulações da administração superior com grupos ou unidades.
Há uma dificuldade, portanto,
por causa de algumas entidades
representativas e por as ditas
lideranças estarem manipuladas
pela administração superior, o
que é óbice para um processo
realmente aberto e democrático”, avalia Fábio Duarte.
O presidente do Sindicato
dos Docentes da Ufopa –
Seção Sindical do ANDESSN (Sindufopa-ANDES-SN),
Luiz Fernando de França,
informa que na Ufopa é diferente. Nunca houve escolha
democrática e participativa de
reitor. Ele diz que, “no caso
da Ufopa, é preciso se fazer
uma retrospectiva: o reitor
foi nomeado pelo MEC sem
nenhum diálogo com a comunidade universitária. A gestão
pro tempore completou quatro anos em novembro deste
ano e, para se ter uma ideia
da situação, o reitor Seixas
não tem residência fixa em
Santarém e até pouco tempo
ele e toda a sua equipe ficavam
hospedados em um hotel de
luxo na cidade”, disse.
Na UFOPA, comunidade acadêmica reivindica saída de reitor indicado pelo MEC
47
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Reitoria
diz que
regimento
garante
participação
Das cinco universidades
procuradas para esclarecimentos sobre as denúncias do
cerceamento da participação,
a única que se manifestou
até o fechamento desta revista, entre 9 de setembro e
20 de outubro deste ano, foi
a Reitoria da Universidade
Federal do Tocantins (UFT).
Na mensagem enviada por
meio eletrônico, a Assessoria
de Comunicação (Ascom)
da UFT informou que o posicionamento que a reitoria
tem assumido é marcado pela
democracia desde a criação da
universidade.
Professores da UFT lutam para participar das deliberações na universidade
“Inicialmente, esclarecemos que a representatividade dos docentes, técnico-administrativos e estudantes
é assegurada pelo Regimento
dos Conselhos Superiores
Universitário (Consuni) e de
Ensino, Pesquisa e Extensão
(Consepe) e tem sido criteriosamente incentivada e garantida a participação de todos.
Essas sessões obedecem a um
calendário anual e são convocadas com antecedência mínima
de 10 dias, de forma a garantir
Sem restaurante e nem lanchonetes, estudantes cobram providências da reitoria
48
Revista Andes Especial
a presença, assim como o recebimento das diárias ou ajuda
de custo a todos os participantes. Buscando maior interação,
essas seções são transmitidas a
todos os campus pela intranet e
são abertas à comunidade acadêmica”, afirma a nota enviada
à reportagem da revista Dossiê
Nacional Precarização II.
No documento enviado, a
Reitoria diz estar, atualmente,
com um calendário acadêmico de reposição de cem dias
letivos relativos à última paralisação docente, ocorrida em
2012. “Conforme aprovação do
Conselho Superior, em maio
de 2013, o cronograma das
atividades de ensino, pesquisa
e extensão busca atender aos
direitos legais dos professores,
mantendo, conforme solicitado
pela comunidade acadêmica,
períodos intermediários de
recesso nos meses de julho e
dezembro. Como forma de
melhor discutir os próximos
encaminhamentos em relação
Novembro de 2013
DCE/UFT-Divulgação
Federal de Tocantins na manifestação do ANDES-SN em Brasília
ao Calendário, foi garantida
pelo reitor e reafirmada no
último Consuni a formação de
uma comissão para discussão
do calendário acadêmico”.
A nota dá conta de que,
“em relação à adesão à Ebserh,
esclarecemos que o Hospital
Universitário da UFT encontra-se ainda em processo de
licitação do projeto básico e
complementar e que os contatos com o Ministério da
Educação têm sido no sentido
de viabilizar a construção de
um hospital para que os cursos de medicina, enfermagem,
nutrição, serviço social possam
ter no prazo de cinco anos
um Hospital Universitário de
referência capaz de propiciar
aos estudantes as condições
de formação necessárias ao
bom profissional. Não temos
um hospital universitário em
Palmas, todavia, não há como
negar o fato de que a criação de
hospitais federais implica em
novas formas de organização
junto ao Ministério da Saúde
e ao Ministério da Educação.
O mesmo ocorre em relação ao Hospital de Doenças
Tropicais, recentemente doado
pelo governo estadual à UFT
e que se encontra em fase de
procedimentos legais de transferência de mantenedora”.
A Reitoria informa ainda
que a UFT tem, atualmente,
51 cursos de graduação, cinco
doutorados e 19 mestrados,
aproximadamente 19 mil estudantes regulares e que tem
buscado todas as formas de
gestão, com proposição de
revisão dos conselhos como
forma de contemplar de forma
mais democrática os docentes, técnico-administrativos e
discentes. “Somos defensores
dos processos democráticos,
participativos e temos implementado medidas que incrementam o diálogo e a participação democrática em todos os
setores. Implantamos ações de
descentralização acadêmico-administrativa”.
Conscientes do perigo que ronda a educação pública, os docentes protestam nas ruas de todo o País
49
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Aumentam casos
de assédio moral a
professores das IFE
Opressão faz parte de uma reconfiguração do
trabalho docente para responder às exigências
do mercado. Alguns gestores aproveitam-se desse
quadro para praticar todo tipo de autoritarismo
Ricardo Borges
U
mas das facetas mais
perversas da expansão
das IFE, por meio
do Reuni, é a degradação das
relações e das condições de
trabalho. O discurso oficial de
expansão e de democratização
do acesso à universidade encobre um quadro de opressão
dos docentes. Situações de violência têm sido frequentes nas
instituições de ensino superior.
Em todo o país, crescem as
ocorrências de assédio moral
e perseguição aos professores.
São casos que revelam a imposição de uma reconfiguração do
trabalho docente para responder às exigências do mercado e
ao autoritarismo de gestores.
51
Revista Andes Especial
O professor Vicente
Ribeiro, lotado no campus
Chapecó da Universidade
Federal da Fronteira Sul
(UFFS), é uma das vítimas
de perseguição. O professor
está sofrendo um Processo
Administrativo Disciplinar
(PAD) movido pela reitoria
pro tempore, por ter questionado
o vice-reitor durante reunião
do Conselho Universitário
(Consuni), dia 15 de junho
de 2012. Na ocasião, estava
sendo debatido o ato do reitor de criar novo campus em
Passo Fundo, sem consulta às
instâncias colegiadas. Por decisão de ampla maioria de seus
membros, o Consuni aprovou
uma moção de repúdio ao ato
do reitor, por considerá-lo uma
Novembro de 2013
Desde que chegou à Ufam, Izabel Heckmann enfrenta perseguição
afronta aos princípios da gestão democrática.
Esse não foi o único PAD
contra servidor que manifestou posição contrária à da
reitoria. “Infelizmente, há
um uso abusivo desse instrumento”, avalia Ribeiro, que
também é diretor da Seção
Sindical dos Docentes da
UFFS (Sinduffs). A reitoria apresentou ainda uma
representação ao Ministério
Público Federal. “Acreditamos
que não sofreremos condenação, pois em nenhum momento desacatamos a reitoria, mas
apenas questionamos uma decisão tomada unilateralmente
pelo reitor e a condução dos
trabalhos do Consuni”, argumenta Vicente Ribeiro.
Além de uma moção de
apoio aprovada no VI Encontro
Intersetorial do ANDES-SN,
circula na internet abaixo-
-assinado em solidariedade ao
professor. O documento acusa
a reitoria de buscar, com os
PAD, “levar para a esfera disciplinar e criminal o legítimo
debate realizado nas instâncias
colegiadas da universidade,
contribuindo para disseminar
uma política de amedrontamento em toda a comunidade
universitária.” A diretoria do
ANDES-SN denunciou o ato
arbitrário da reitoria e disponibilizou a assessoria jurídica
para acompanhar o processo.
Em nota oficial, a
Universidade Federal da
Fronteira Sul (UFFS) rebate
as acusações alegando que “não
fez, não faz e não fará assédio
moral e tão pouco tolerará qualquer prática do tipo”. Ainda
segundo a nota, “o caso está
sendo tratado com absoluta
isenção e objetividade, respeitando, na forma e no conteúdo,
52
Revista Andes Especial
os procedimentos emanados da
legislação federal, do código de
ética do servidor público e das
demais disposições que regem
processos como este”.
Humilhações e perseguições fazem parte dos assédios sofridos por docentes
da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM). Lotada
no Instituto de Saúde e
Biotecnologia de Coari (ISB/
Ufam) desde 2006, a doutora em Genética Molecular
Humana, Izabel Heckmann,
conta que desde que chegou
à unidade acadêmica passou a ser perseguida pela
direção. Responsável pela
criação do Laboratório de
Genética Molecular Humana
(LABGEN), a professora
afirma que durante a aprovação o parecerista questionou
a real necessidade da criação
de um laboratório de Genética
Molecular, isso num campus de
Saúde e Biotecnologia. Além
disso, segundo IzaBel, o ex-diretor exigia constantemente
a destinação do local exclusivamente ao ensino, ferindo o
tripé do ensino superior. “Fui
informada por colegas que a
intenção da direção era me tirar do laboratório”, relata.
Segundo a professora, as
humilhações intensificaram-se a partir de 2010, quando
o ex-diretor informou, “aos
gritos e batendo com uma
muleta na mesa”, da nomeação de um segundo professor
Novembro de 2013
para coordenar o LABGEN.
Seu isolamento dos demais
colegas, apelidada de “dona
de laboratório”, e o corte de
materiais de pesquisa fizeram
parte das práticas de assédio, segundo a professora.
“Quando houve a alocação dos
professores nas novas salas,
senti-me punida ao ter minha
mesa de trabalho instalada em
um laboratório vazio, localizado em outro bloco”, lembra.
No dia 17 de março de
2010, ela protocolou denúncia na Reitoria. Em resposta,
a Procuradoria da UFAM
sugeriu a abertura de um
PAD, que não ocorreu. Para
seguir na luta contra as perseguições, Izabel participou de
audiência pública sobre assé-
dio moral no Senado, quando
relatou as humilhações sofridas. Ao retornar, encontrou
diversos assediados, que se
reuniram para enfrentar juntos o problema. Com o apoio
da Associação dos Docentes
da Universidade Federal do
Amazonas (Adua), criaram
uma comissão de combate ao
assédio moral na UFAM.
No Pará, sindicato apelou para o MEC
Na Universidade Federal
do Oeste do Pará (UFOPA),
os sinais de aumento dos casos
de assédio moral e perseguição motivaram o Sindicato
dos Docentes da UFOPA
(Sindufopa) e o Comando
Local de Greve a protocolar,
em junho de 2012, um dossiê
no Ministério da Educação. O
Dossiê do Sindufopa reúne 40
documentos com denúncias
feitas pelo sindicato, até mesmo
e-mails de membros da administração superior que comprovam
a prática de intimidação e assédio moral na universidade.
Um dos casos mais
ilustrativos é o do professor Gilson Costa, lotado
no Instituto de Ciências e
Sociedade. Ele foi advertido pela reitoria depois de
apoiar uma manifestação
de estudantes contra as
más condições oferecidas
pela universidade. Segundo
Sandra Moreira, diretora da
Regional Norte II à época e
que acompanhou o relato do
Docentes cobram estatuto para garantir transparência e evitar arbitrariedades
53
Revista Andes Especial
caso, o professor passou a
sofrer perseguição da administração da UFOPA desde
que entrou na universidade e
tentou organizar uma seção
sindical no campus.
“No início, as perseguições
foram sutis, como delegar ao
docente um número abusivo
de disciplinas e ainda colocá-lo para ministrar aulas, cujas
disciplinas não estão em sua
área de atuação, além de enviá-lo para aulas no interior do
estado”, relata.
Sandra conta que a retaliação ao professor ficou mais
evidente depois que Costa
apoiou os estudantes em uma
manifestação durante a aula
magna no início do ano letivo
de 2011. “Os estudantes reclamavam das condições precárias
da UFOPA e Gilson apoiou
o movimento. Depois disso,
ele foi acusado falsamente de
instigar os discentes e impedir
a realização da aula. A reitoria
Novembro de 2013
abriu um PAD contra ele, que
resultou em uma advertência
ao docente”, completa.
Casos de perseguição
também têm sido frequentes
na Universidade Federal do
Maranhão (UFMA). Não
só o Núcleo de Processo
Administrativo tem sido usado como forma de legitimar
perseguição a docentes e servidores, como aqueles que não
concordam com esse tipo de
postura são retirados de lá. Foi
o que ocorreu com a servidora
Fabianne Gomes, exonerada
do cargo de Coordenadora
do NUPAD tão logo acatou
denúncia contra interesse da
reitoria (a denúncia versava
sobre irregularidades em concurso público).
Tornou-se pública na imprensa local e nacional a movimentação da reitoria contra o
professor Wildoberto Batista
Gurgel (Ayala Gurgel), do
Departamento de Filosofia.
Antes mesmo de qualquer processo administrativo, o reitor
anunciou à imprensa que o
professor seria demitido. O
professor havia comentado nas
redes sociais a inoperância do
sistema de controle de notas
da universidade, o que permitia falhas, e que ele tinha um
processo sobre essa matéria
tramitando nos colegiados
superiores havia nove anos.
Embora tenha deflagrado uma
perseguição moral ao professor
e não reconhecido publicamen-
te a fragilidade do sistema, a
UFMA modificou seu sistema
de controle acadêmico. Após
sindicância que apontava para
advertência, foi aberto, sem
nenhum fato novo, um PAD
que culminou com a indicação de demissão do servidor,
prontamente aceita pelo reitor,
o que veio a ocorrer em dezembro de 2012, sem a aprovação
do Consun. O sindicato dos
professores recorreu à Justiça
e conseguiu anulação da portaria e obrigou convocação do
Consun para discutir o caso.
Nova demissão foi aplicada, em
fevereiro de 2013.
Supostamente o professor teria praticado ato que se
enquadraria no inciso IX do
artigo 117, da Lei 8.112/1990:
“valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de
outrem, em detrimento da
dignidade da função pública”. Entretanto, o PAD não
conseguiu reunir provas que
comprovassem tal conduta.
Em nota oficial, a UFMA faz
alegações que não foram matéria do PAD, como acúmulo
de cargo nos últimos dois
anos e ter sido beneficiado
por universidade privada para
denegrir a imagem da UFMA.
A tramitação do PAD versou
sobre uma matéria (as postagens no Twitter sobre alterações de notas na UFMA),
considerando-a como improbidade administrativa, ato suficiente para demitir o docente.
54
Revista Andes Especial
Professor Batista Gurgel foi vítima
de perseguição moral na UFMA
“Para a imprensa, a nota oficial fazia outras alegações inexistentes”, afirma o professor
Ayala. Por meio do sindicato,
o docente conseguiu retornar
à instituição mediante liminar. O processo tramita na 3ª
Vara Federal. “A universidade
ainda não me pagou diversos
direitos e mudou a minha matrícula e data de posse, o que
estamos analisando juntos, o
advogado do sindicato e eu”,
diz Ayala Gurgel
Segundo o professor, o
apoio do sindicato foi imediato e providencial. “Assim que
expus a situação na Apruma,
Novembro de 2013
carências normativas, em função da fragilidade de um projeto político pedagógico para
os cursos, do não cumprimento da legislação e das resoluções da universidade e da
insuficiente regulamentação
do próprio campus. Isso vem
gerado um ambiente propício
a situações de assédio moral.
“Os problemas são dos
mais variados possíveis. Há,
por exemplo, problemas de
tratamento diferenciado aos
docentes, conforme o lado político que esse docente assume
na instituição. Os conflitos
são constantes, o que precariza as condições de trabalho”,
denuncia a vice-presidente da
APUFPR, Astrid Avila.
A APUFPR requereu formalmente providências da reitoria,
que levou o assunto à discussão
em sessão extraordinária do
Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão, em 19 de julho deste
ano, que deliberou criar comissão especial para apurar os fatos
e propor soluções.
Segundo a reitoria da
UFPR a situação do setor
Litoral começou a ser resolvida
com a criação das coordenações
de curso. “Após ouvir a comitiva de docentes do Litoral,
e a diretoria da APUFPR, a
reitoria da UFPR intensificou as ações das pró-reitorias
de Gestão de Pessoas, de
Graduação e de Administração
nas atividades do cotidiano
do Setor Litoral”, afirma a
Reitoria, em nota sobre o
Setor Litoral. Ainda segundo
a reitoria, foi constituída, em
julho, comissão de mediação
para harmonizar as relações
entre servidores e a diretoria
do Setor Litoral.
Esses são apenas alguns
exemplos de uma situação que
se repete em diversas IES do
país. Para o ANDES-SN, é
importante que as seções sindicais realizem encontros nos
quais os docentes possam denunciar as situações de assédio
moral, repressão ou perseguição no âmbito da universidade.
abr
minha causa foi analisada e
compreendida que se tratava de
um ato autoritário e persecutório”, afirma. Na avaliação do
professor Gurgel a demissão
foi um ato autoritário do reitor, que não admite a liberdade
de expressão. “O episódio de
falar publicamente sobre a fragilidade do sistema e os abusos
cometidos contra o trabalho
docente foi apenas um, em
meio a tantos”, conclui.
Na Universidade Federal
do Paraná (UFPR), o aumento no número de denúncias envolvendo situações de
violência moral e psicológica
também é significativo. O
caso mais emblemático é o
do campus Litoral, sediado
no município de MatinhosPR. Criado em 2004 pelo
Conselho Universitário da
UFPR, em 2007 foi transformado no Setor Litoral da
UFPR, com representação
nos Conselhos Superiores da
Universidade. Entretanto, desde a sua criação, apresentou
Nas ruas, professores também protestam contra o assédio moral praticado contra a categoria
55
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Estágio probatório, danos permanentes
A precarização do trabalho
docente é ainda mais danosa
durante o estágio probatório,
período em que o servidor público se encontra fragilizado
na relação com a instituição.
São vários os casos de assédio
e perseguição a docentes, que
não raro sofrem graves sequelas
emocionais, mas têm dificuldade em denunciar.
A professora Eblin Farage,
do Departamento de Serviço
Social da Universidade
Federal Fluminense (UFF)
e doutora em serviço social,
afirma que “os docentes fazem
relatos, ‘desabafos’, mas não
querem denunciar, não dão
elementos para que o sindicato
possa dar visibilidade a essas
situações”. Eblin explica que
o assédio moral também se
apresenta na forma de sobrecarga de trabalho, porém não
é percebido dessa forma pelo
professor que está entrando
na universidade. “Alguns professores chegam a dar mais de
20h em sala, mas não acham
que isso é uma imposição da
chefia, mesmo que em seu
departamento tenha professor
com apenas 4h/aula. Alguns
entendem que é o ‘pedágio
justo’ de quem entra”, conclui.
A professora Gabrielle
Silveira Rocha Matos, do curso de fisioterapia do Instituto
de Saúde e Biotecnologia de
Coari da Universidade Federal
do Amazonas (ISB/UFAM),
conhece bem essa situação de
ameaça durante o estágio probatório. Ela relata um processo de
56
Revista Andes Especial
“desmoralização profissional”,
que teve início em setembro de
2009, após questionar em uma
reunião do colegiado do curso o
afastamento de uma professora.
Novembro de 2013
“A coordenadora do curso,
presidente do colegiado, após a
reunião, levou ao conhecimento
do diretor do ISB/UFAM o
meu questionamento e de outra
professora e fomos chamadas
para a sala do diretor. Nesse
momento fomos informadas
por ele que não deveríamos
questionar os atos administra-
57
Revista Andes Especial
tivos e nos lembrou que estávamos em estágio probatório”,
afirma Gabrielle.
Segundo ela, desde então
passou a sofrer perseguição
institucional e isolamento, tanto pessoal quanto no exercício
do trabalho. “Repetidamente
fui ‘convidada’ à sala da direção do ISB para ser lembrada
da minha condição em estágio
probatório”, acrescenta.
Em março de 2010, ela resolveu protocolar um pedido
de mudança de orientador de
estágio probatório. Depois
disso, sofreu repetidos pedidos de sindicância para apurar
sua “conduta profissional”.
Pela Portaria 633/2010, foi
estabelecida uma comissão de
sindicância contra ela, concluída em outubro daquele ano,
favorável à abertura de um
PAD contra o então diretor
da unidade. A comissão de
ética acatou o pedido, mas o
processo parou. “Ainda aguardo uma providência administrativa, que até o momento
parece não ter sido tomada.
Sofri e sofro as consequências do dano causado por esse
processo e pela ‘má fama que
fiquei depois disso”, desabafa
Gabrielle. Atualmente, a professora Gabrielle Matos está
afastada para capacitação, mas
ainda se submete a acompanhamento psicológico.
Novembro de 2013
No Brasil,
lecionar faz
mal à saúde
Intensificação e precarização do trabalho
prejudicam qualidade do ensino e adoecem
os professores. Transtornos comportamentais
são as principais causas das licenças médicas
Washington Sidney
A
expansão desordenada
do ensino público superior tornou o magistério
uma atividade de risco. O aumento do número de turmas, da
carga horária e de estudantes em
sala de aula inviabilizou a relação
professor-estudante, com graves
prejuízos para a qualidade do ensino e para a saúde dos professores. Somem-se a isso o aumento da correção de trabalhos, em
geral nos fins de semana, e as
péssimas condições ambientais
a que os professores são expostos e o resultado são licenças
médicas em profusão.
59
Revista Andes Especial
Karla Estelita Godoy,
professora da Universidade
Federal Fluminense (UFF),
enfrenta problemas recorrentes de garganta por causa de
infecções adquiridas no trabalho. Ela atribui a doença ao
aumento da carga horária nos
últimos semestres, ao excesso
de estudantes por turma e,
principalmente, às salas de
aula com janelas que não se
abrem, o que a obriga a usar
um aparelho de ar-condicionado sem manutenção. Os diagnósticos não deixam dúvida
quanto à origem da doença.
“Consultei-me com diversos médicos nos últimos anos,
Novembro de 2013
Falta de manutenção dos
equipamentos adoece e coloca
em risco docentes e estudantes
quando esses problemas começaram. Alguns suspeitaram de
processos alérgicos ou de infecções bacteriológicas ou virais
em virtude de uma grande exposição a ambientes insalubres
na universidade. Meu otorrinolaringologista sugeriu que
eu pesquisasse a Síndrome do
Edifício Doente, que é quando há grande incidência de
doenças provocadas nas pessoas que frequentam o mesmo
ambiente. Pesquisei e vi que
vários estudos demonstram
essa tese, cujos sinais podem
ser encontrados no meu local
de trabalho. Não sou só eu
que tenho passado por isso,
mas diversos colegas e estudantes”, conta. A docente
também faz seu diagnóstico
da situação: “O que está doente é o sistema educacional e
é isso que nos adoece”.
Karla ministra oito horas
de aula por semana, com uma
carga horária que varia de duas
a três disciplinas. Mas, por
ser professora de Dedicação
Exclusiva, tem diversas outras
atividades acadêmicas que
exigem dela permanecer nos
mesmos ambientes e fazer uso
consecutivo da voz, atendendo
a orientandos (que não são
poucos na graduação), coordenando projetos de pesquisa
e participando de eventos em
nome da universidade. “Em
razão da quantidade excessiva
de estudantes no primeiro semestre de 2013, foi necessário
dividir uma turma, que contava
com quase 90 inscritos. Isso
fez com que dobrasse a carga
horária da disciplina, que passei a lecionar de 11h às 13h e
de 14h às 16h, às segundas e
quartas-feiras. O desgaste foi
grande e adoeci três vezes no
semestre”, comenta.
Situações ainda mais graves enfrentam os docentes da
área de saúde da universidade.
A presidente da Aduff, Eblin
Farage, conta que eles lidam
com doenças infecciosas e
arriscam a saúde no contato
com secreções e com materiais
perfuro-cortantes contaminados. “Alguns cursos têm laboratórios montados de forma
provisória há anos. No mês
passado tivemos notícia de que
todos os laboratórios de determinado curso haviam sido
condenados por um setor na
60
Revista Andes Especial
universidade. Estamos tentando obter o laudo”, diz a professora. Segundo ela, há pouco
tempo, no Polo Universitário
de Rio das Ostras, uma professora passou mal em sala de
aula e faleceu, o que dá uma
boa medida do descaso dos dirigentes com a saúde dos principais agentes da educação.
Produtivismo
O incremento da lógica
produtivista no meio acadêmico, com exigências cada vez
maiores de desempenho nas
pesquisas e publicações de artigos, agrava o estresse e ajuda a
explicar por que os transtornos
mentais e comportamentais
ocupam lugar de destaque entre as doenças que mais levam
os docentes ao afastamento
por licenças médicas, conforme
revelam estudos feitos em duas
universidades.
A pesquisadora Adriana
Modesto de Souza, mestre
em Ciências da Saúde com
especialização em Gestão
de Saúde pela Universidade
de Brasília (UnB), analisou
2.218 prontuários no Serviço
de Assistência Médica (SAM)
da instituição e constatou que
202 docentes tiveram licenças
médicas entre 2006 e 2011, o
que resultou em 15.108 dias
de afastamentos. Vários docentes tiveram mais de uma
licença no período.
Em sua tese de mestrado
O perfil do adoecimento docente na
Novembro de 2013
UnB, Adriana catalogou algumas morbidades como justificativa para as licenças médicas,
mas chamou sua atenção as
motivadas por transtornos
mentais e comportamentais e
por problemas no sistema músculo-esquelético e tecido conjuntivo. As primeiras responderam por 71 lançamentos e
2.238 dias de afastamento. As
segundas, com 74 lançamentos,
resultaram em 2.527 dias de
afastamento. A frequência de
afastamentos por transtornos
mentais e comportamentais no
período foi de 21 mulheres e
11 homens. No sistema ósteo-muscular e tecido conjuntivo,
23 mulheres e sete homens.
Movéis estragados fazem parte de
situações que precarizam o trabalho
Porta velha denuncia o desleixo com a infraestrutura nas universidades públicas
Adriana lamenta a perda
amostral referente aos docentes aposentados e/ou afastados e cujos prontuários já
não se encontravam no SAM.
Salientou que, na época da
pesquisa, o setor encontrava-se em processo de adequação
ao que preconiza o Subsistema
Integrado de Atenção à Saúde
do Servidor Público Federal
(SIASS) e com limitação de
espaço físico para a organização dos prontuários. A dissertação está disponível para
consulta no Repositório da
Biblioteca da UnB.
Levantamento dos afastamentos por licença médica
entre junho de 2010 e junho
de 2013 na Universidade
Federal Fluminense (UFF),
feito pela Pró-Reitoria de
Gestão de Pessoas (Progepe),
mostra que houve 2.053 casos
de adoecimento de docentes,
o que resultou em um total
de 81.374 dias de afastamento no período. As doenças
61
Revista Andes Especial
ósteo-musculares lideraram
os episódios (27,9% dos casos
de 10 de junho de 2010 a 9
de junho de 2011; 23,7%, de
10 de junho de 2011 a 9 de
junho de 2012; e 34,4%, de
10 de junho de 2012 a 9 de
junho de 2013). Os agravos
mentais e comportamentais
responderam, respectivamente,
por 25,6%; 32,6% e 31,1% nos
mesmos períodos.
Em Mato Grosso, o professor Ricardo Costa fez uma
pesquisa com 200 professores
e concluiu que 55,1% deles
apresentavam cansaço mental;
52,2%, tinham sintomas de
estresse; 42,9%, sofriam de
ansiedade, e 42,9%, admitiram ter esquecimentos. A
frustração acometeu 37,8%
dos docentes; 31,1% tinham
sintomas de nervosismo;
29,3% sentiam angústia;
29,1% sofriam com insônia;
e 16,8% queixaram-se de depressão. A pesquisa foi feita
em setembro de 2013.
Novembro de 2013
O trabalho à base
de antidepressivos
Não é difícil encontrarmos casos
de adoecimento de docentes por
transtornos mentais e comportamentais.
As professoras de Enfermagem Maíra
Toffer, da Universidade de Pelotas
(UFPel), e Sirliane de Souza Paiva,
da Universidade Federal do Maranhão
(UFMA), são exemplos disso. Apesar
da dificuldade de relacionar a doença
ao trabalho, já que a considera
multifatorial, Maira também atribui
a crise de depressão que a acometeu em
2006 à intensificação e à precarização
do trabalho. Prova disso é que viu casos
semelhantes ao seu entre alguns outros
docentes da Faculdade de Enfermagem.
“Percebo muitos colegas
estressados, pois são muitas horas de
aula. E pelo método construtivista, são
muitos trabalhos a serem avaliados
e uma relação docente-discente
muito alta. No meu caso, atuo na
graduação, mestrado e doutorado. O
que me chama a atenção é que sempre
temos alguns professores fazendo uso
de antidepressivos para suportar a
carga de trabalho. Outro problema
são as cargas de trabalho acrescidas
pelos meios virtuais. Estamos
constantemente em contato com os
estudantes, resolvendo problemas. Isso
é um acréscimo não computado como
carga a mais de trabalho”.
Por causa da intensificação e da
precarização do trabalho, Sirliane
Paiva adquiriu uma disfunção
têmporo-mandibular (conhecida
como bruxismo), reflexo do estresse.
Durante o sono ou quando está
trabalhando no computador, ela cerra
os dentes com tal força que causou
danos à musculatura facial e fratura
nas raízes dos dentes. Já perdeu seis
dentes por causa disso. Como não
tem plano de saúde, boa parte do
salário dela é revertida no tratamento
dessa disfunção. Sirliane tem de
fazer fonoaudiologia e frequenta três
especialistas de odontologia. Alérgica,
a professora de Enfermagem não pode
tomar analgésicos. Por isso, sofre com
uma dor que classifica de “nível dez”.
“É uma dificuldade muito grande
porque você tem uma sensação de que
não está ensinando tudo o que deveria
e podia ensinar. É uma sensação de
impotência e isso gera um estresse
grande porque leva a pensar melhor as
condições, aí você requisita professor e
não há professor. É complicado. E no
final há um prejuízo para o estudante
e para o professor”, desabafa a docente.
Ela afirma que a UFMA tinha sete
mil estudantes. Nos últimos seis anos,
por causa do Reuni, passou a ter 21
mil. E o quantitativo de docentes, que
já estava defasado antes do programa
de expansão, não foi reposto.
Explicações
Especialistas tentam explicar o
que vem acontecendo com a saúde
dos docentes à luz da psicologia e
da sociologia do trabalho. “Esse tipo
de relação que está se estabelecendo,
essa precarização, sem dúvida, tem
ampliado os problemas de saúde
mental dos professores. O nível de
62
Revista Andes Especial
Maíra teve crise de depressão
com o excesso de trabalho
depressão e obsessão aumenta. São
sofrimentos psicológicos que vêm
desse tipo de trabalho que o professor
universitário realiza, sobrecarregado
e precarizado. O que o sofrimento
mental do professor fala para você?
Ele diz assim: ‘Eu quero trabalhar
direito e não posso. Eu quero educar
e não consigo!’”, analisa o professor
Wanderley Codo, pesquisador da
UnB e coordenador do Laboratório de
Psicologia do Trabalho.
O professor Sadi Dal Rosso,
especialista em Sociologia do Trabalho,
diz que a intensificação do trabalho
docente é antiga, mas ele acredita
que foi agravada pelo Reuni. “Isso
se reflete, por exemplo, em maior
número de turmas por professor,
maior número de orientandos por
professor. Você tem de corrigir mais
trabalhos. Essas coisas representam um
acréscimo de labor. Mas são problemas
que já ocorriam anteriormente,
estabelecidos pela pressão quanto à
produção. Muito fundamentalmente
pela avaliação da Capes, CNPq,
que são, basicamente, os organismos
avaliadores”, justifica.
Novembro de 2013
Uma das Mesas do V Encontro Nacional do ANDES-SN sobre Saúde do Trabalhador na UFC
ANDES-SN cobra condições
adequadas de trabalho
No fim de setembro deste
ano, na Mesa Combate à precarização das condições de trabalho
que gera insalubridade e periculosidade, durante o V Encontro
Nacional do ANDES-SN
sobre Saúde do Trabalhador,
na reitoria da Universidade
Federal do Ceará (UFC), o
vice-presidente da entidade,
Luiz Henrique Schuch, destacou a necessidade de se ter
clareza e disposição de luta
para, prioritariamente, “exi-
gir condições adequadas de
trabalho e todos os mecanismos preventivos ao perigo e
às condições insalubres”. Em
segundo lugar, “exigir que
não haja retrocesso em relação aos direitos dos trabalhadores e que as obrigações
patronais sejam integralmente cumpridas”.
Ele lembrou que a precarização das condições de
trabalho nas IFES tem sido
demonstrada nos eventos
anteriores e foi muito debatida, ocupando centralidade
na pauta durante a greve
nacional dos docentes em
2012. E demonstrou preocupação com as iniciativas
do Estado no sentido de
transferir para o trabalhador
a responsabilidade pelos
riscos a que está sujeito e de
economizar dinheiro com
as indenizações, “já que as
providências para evitar os
riscos não são adotadas”.
Professores da Universidade Federal do Ceará participaram do encontro nacional sobre saúde
63
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Armadilha
federal para a
saúde pública
Ao criar a Ebserh, governo deu primeiro passo para a
privatização dos hospitais universitários. Com perfil autoritário,
empresa colabora para reduzir autonomia das IFE, provoca
retrocesso e pode levar à destruição do Sistema Único de Saúde
Fátima Xavier
“U
m figurino inadequado”. Assim
o procurador
do Tribunal de Contas da
União (TCU) Júlio Marcelo
de Oliveira considera a
Empresa Brasileira de Serviços
Hospitalares (Ebserh), vinculada ao Ministério da Educação.
Uma empresa pública criada
pela Lei nº 12.550/2011, nos
moldes estabelecidos pelos
governos militares por meio
dos Decretos-Lei nº 200/1967
e nº 900/1969, inicialmente voltada para 47 Hospitais
Universitários (HU), perten-
65
Revista Andes Especial
centes a 33 universidades federais públicas. A Ebserh tem
patrimônio próprio – os hospitais que vai assumir –, capital
exclusivo da União (todos os
recursos destinados por lei aos
próprios hospitais), mas de direito privado, que se rege pelas
normas comerciais.
Os empregados da Ebserh
serão em sua maioria celetistas e requisitados da própria
universidade e do MEC e os
cargos de chefia e gerência,
incluindo os de superintendentes e gerentes dos hospitais que aderirem, segundo
critérios estabelecidos pela
nova empresa, serão de livre
Novembro de 2013
Categoria protesta contra qualidade do atendimento nos hospitais universitários de todo o Brasil
nomeação. “A estatal tem perfil autoritário, é um retrocesso
e põe em risco a autonomia
universitária”, afirma o procurador. “É a privatização
da saúde pública”, reagem os
docentes, estudantes, profissionais concursados do MEC
e remanescentes do antigo
Inamps (Instituto Nacional
de Assistência Médica e
Previdência Social), que ainda
trabalham nos HU.
Ainda que tenha, desde a
sua criação, todos os recursos
orçamentários destinados a todos os hospitais universitários
e por ser a gestora do Programa
Nacional de Reestruturação
dos Hospitais Universitários
Federais (Rehuf), a Ebserh precisa formalizar dois contratos.
Um, com as universidades, que
chama inicialmente de “contrato de parceria”, para assumir
cada unidade hospitalar, e outro
com o Sistema Único de Saúde
(SUS), do Ministério da Saúde.
E aí está armado o alçapão.
CAOS
É de conhecimento público que o governo federal vem
reduzindo seus investimentos
no setor desde o fim da década
de 1990, levando a maioria
dos hospitais ao caos. Agora,
o governo impõe como solução para todos os problemas,
a submissão das universidades
federais à nova empresa. Para
completar o quadro, restam os
empregados terceirizados, na
verdade, precarizados, por causa da recusa do governo em autorizar a realização de concurso público nos últimos anos,
como prevê a Constituição
brasileira. Em 2011, o TCU
estabeleceu um prazo para a
substituição desses empregados por concursados e contratados pelo Regime Jurídico
Único (RJU), mas o governo
não autorizou a realização de
concursos nesses moldes.
Bem ou mal, são os precarizados que asseguram o
funcionamento desses hos-
66
Revista Andes Especial
pitais até hoje e a demissão
sumária poderia promover
“uma tragédia social”, com a
descontinuidade do serviço de
saúde prestados à população.
Por isso, a luta do ANDESSN é pela realização de concurso público e progressiva
substituição dos precarizados,
até que todas as necessidades
sejam atendidas por trabalhadores regidos pelo RJU.
Com a Ebserh, porém, o
regime de contratação será
mantido como o dos atuais
terceirizados pela CLT e a
empresa já publicou editais
de concursos públicos para
preencher as vagas, que julga necessárias, nas unidades
da Federação onde assinou
contrato com a universidade.
Nessas localidades, estabeleceu sua filial, cuja chefia, na
prática, substitui a diretoria
do hospital e é regiamente
remunerada. E os demais HU,
como ficam? Muitos restringiram ou suspenderam total ou
Novembro de 2013
parcialmente o atendimento
ao público, como uma forma
de pressão a favor da Ebserh.
“As universidades que, na
defesa e no exercício pleno de
sua autonomia universitária
e da indissociabilidade do
ensino, pesquisa e extensão,
decidirem não sucumbir e não
se submeter à proposta da
Ebserh, estarão inconstitucional e imoralmente desprovidas
de uma autorização necessária
e inadiável do Ministério do
Planejamento, como têm estado até hoje, para a solução do
grave problema dos terceirizados em seus HU”, declarou o
procurador do TCU ao tentar
prorrogar o prazo previsto em
Acórdão 2.081/2011 para a
demissão dos terceirizados. O
acórdão que teria sido brandido como prazo fatal a ser
observado pelas universidades
federais para adesão à Ebserh,
sob pena até de prisão dos reitores. Na verdade, o TCU de-
termina a contratação de concursados sim, mas pelo RJU, o
que, como empresa estatal de
direito privado que é, a Ebserh
não vai e nem pode fazer.
Contrato padrão
Mesmo propiciando “um
cenário de pressões ilegítimas
e de coações morais inaceitáveis”, como avaliou o procurador Júlio Marcelo de Oliveira,
a Ebserh já conseguiu a
adesão das Universidades
Federais do Piauí (UFPI),
Maranhão (UFMA), Brasília
(UnB), Triângulo Mineiro
(UFTM) e Rio Grande do
Norte (UFRN). O Conselho
Universitário (Consuni)
da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM) aprovou
a cessão do Hospital Getúlio
Vargas e todo o seu patrimônio à Ebserh, mas a UFAM
espera ajustes no contrato
para aumentar a participação
da universidade na adminis-
tração. Pouco provável, pois o
contrato é padrão.
No dia 13 de setembro,
surge a primeira derrota para
a Eberh, uma liminar suspendeu o contrato de adesão da
UFMA porque o Conselho
Universitário não foi ouvido. A liminar foi cassada no
Tribunal Regional Federal 1ª
Região, em Brasília. Não há
previsão para o julgamento do
mérito. No dia 23, no Piauí, o
Ministério da Saúde, por meio
do Departamento Nacional de
Auditoria do SUS (Denasus)
começou a fazer uma auditoria
para saber por que o atendimento prestado à população pelo
HUPI, da Ebserh no Piauí, só
representa pouco mais de 1%
dos recursos financeiros recebidos do SUS. O SUS repassa
R$ 2 milhões por mês para o
hospital. A UFPI foi a primeira
a assinar contrato de compromisso com a Ebserh no dia 14
de agosto de 2012.
Na UnB, houve intensa mobilização e protestos contra à entrega do hospital universitário à Ebserh
67
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Vários setores do HU do Piauí não estão em funcionamento, o que levou o SUS a abrir auditoria a pedido do MPF
Hospital sofre auditoria do SUS no Piauí
Com a responsabilidade de
administrar apenas seis hospitais universitários até agora,
a Ebserh já é alvo de auditoria
do SUS pelo menos no Piauí.
O objetivo é identificar as causas do não funcionamento de
diversos setores do hospital, o
dano social que essa ociosidade tem causado aos usuários e
o prejuízo financeiro sofrido
pelo SUS. A auditoria começou
no dia 23 de setembro por solicitação do Ministério Público
Federal (MPF) e sob a responsabilidade do Departamento
Nacional de Auditoria do SUS
(Denasus), do Ministério
da Saúde, em Teresina. Os
resultados irão subsidiar o
Inquérito Civil público Nº
1.27.000.000905/2013.
De acordo com o chefe da
Representação do Denasus,
José Ademir Ramos de Sousa,
a auditoria estará concluída
em 60 dias. A assessoria de
imprensa da Ebserh, contudo, informou que a empresa
considera a auditoria como
um instrumento norteador de
outras ações que possam ser
68
Revista Andes Especial
identificadas como causadoras
do atraso no cronograma proposto. E garantiu que as ações
que competem ao hospital já se
encontram planejadas e repactuadas com o gestor municipal,
representante do Ministério da
Saúde, UFPI e Ebserh.
Após as visitas técnicas de
praxe que justificaram a auditoria, o Denasus/PI descobriu
que o SUS pagou à Ebserh
R$ 10 milhões, entre abril e
agosto de 2013, segundo extrato fornecido pelo Fundo
Nacional de Saúde, enquanto
Novembro de 2013
a produção do hospital, no
primeiro semestre de 2013,
corresponde apenas a 1,64%
do valor pago pelo SUS: “Esse
índice representa a entrega do
dinheiro do SUS à Ebserh em
troca de quase nada”. Afirmam
que a Ebserh e a diretoria do
hospital não estão honrando o
contrato de prestação de serviços celebrado com o Gestor
do SUS em Teresina, pois não
implantaram os serviços que
constam do Plano Operativo
e que, de fato, diversos setores e equipamentos do HU
estão ociosos ou funcionando
parcialmente. Entre outros, a
UTI cardíaca e coronariana e o
equipamento de hemodinâmica
estão ociosos e as enfermarias,
serviços de imagem (tomografia, ultrassonografia, Raio-X,
eletrocardiograma, etc.) funcionam precariamente.
Interferência
A necessidade da realização
de uma auditoria no hospital
surgiu com a insistência de
notícias na mídia sobre a situação estrutural e operacional
do HUPI, no último semestre
deste ano. Por meio de audiências com os diversos segmentos
do setor, o MPF aprofundou
sua avaliação sobre o que estava
acontecendo ouvindo queixas que vão desde a falta de
estrutura de trabalho para os
médicos, bebedouros, falta de
acomodação para repouso, de
lençóis descartáveis, de banhei-
José Ademir prevê que auditoria
deverá estar concluída em 60 dias
ros para médicos e funcionários, banheiros para pacientes
que estão quebrados, deficiência na estrutura fornecida a
eles para atender aos casos de
alta complexidade até a falta de
medicações, como anti-hipertensivos, e materiais básicos,
como máscaras de oxigênio.
Médicos denunciaram que
as determinações para internação de doentes não são
emitidas como consequência
do ato médico, são impostas
69
Revista Andes Especial
pela direção do hospital que
também não respeita a autonomia do profissional quando
são solicitadas transferências:
“Há interferência da Direção,
impedindo-as, em detrimento
da saúde do paciente”.
Algumas especialidades
clínicas, como neurologia,
reumatologia, hematologia,
dermatologia, contam apenas
com um profissional. Os pacientes ficam na dependência
do plantão de cada especialista. E, finalmente, uma das
maiores e frequentes queixas
dos docentes nos hospitais
da Ebserh: além de ensinar,
atendendo aos pacientes acompanhados dos estudantes,
os médicos docentes têm de
atender o mesmo número de
doentes que os médicos que
não lecionam.
Segundo documento da
superintendência da Ebserh/
PI apresentado ao MPF em
julho de 2013, a empresa assumiu o HUPI em novembro
de 2012, três meses depois de
assinar um “contrato de compromisso” com a UFPI (14 de
agosto). Nessa data, a empresa abriu apenas o ambulatório
para a realização de consultas, de exames de análises
clínicas e de imagem – “conforme contratualização com o
gestor do SUS”. Somente em
junho passado, foi reaberto
o setor de internação para
patologias clínicas de baixa e
média complexidade.
Novembro de 2013
Liminar suspende contrato no Maranhão
em Brasília (Processo Nº
0059137-88.2013.4.01.0000).
A UFMA acionou a Advocacia
Geral da União (AGU) para
formalizar o agravo de instrumento. A preocupação maior
era com a realização do concurso público marcado para o
dia 20 de outubro e previsto
para preencher 1.877 vagas.
Cerca de 120 mil pessoas
se inscreveram. Em defesa da
UFMA, os procuradores federais argumentaram que “a
universidade tem competência
para definir as diretrizes orçamentárias, distribuição de
recursos e o estabelecimento de
normas gerais para a celebração
de contratos” e que essa responsabilidade não se confunde com
a autorização para celebrá-los
“porque o Consad é uma instância deliberativa e não executiva”. O Consuni nem sequer foi
mencionado na nota da AGU.
A concessão da liminar foi
uma vitória política, diz a secretária geral da seção sindical,
professora Marizélia Rodrigues.
Ela acha que foi uma sinalização para o julgamento do
mérito, pois o juiz reconheceu a
ilegalidade do contrato.
Marizélia acredita também
que o concurso não deveria
se realizar até o julgamento
do mérito porque pode trazer
problemas ainda mais sérios
se o contrato for considerado
nulo de forma definitiva. A
AGU, por meio das unidades da
Procuradoria-Geral Federal, é
quem presta assessoria jurídica
e representa as autarquias e fundações públicas federais, incluindo aí a UFMA. A Ebserh
possui representação jurídica
própria. O presidente da empresa, José Rubens Rebelatto, não
deu entrevista “por incompatibilidade de agenda”.
Rebelatto não
deu entrevista:
“incompatibilidade
de agenda”
70
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Divulgação
O contrato de adesão à
Ebserh, assinado pelo reitor
da UFMA, Natalino Salgado,
em 17 de janeiro de 2013,
poderá ser anulado, pois
os Conselhos Universitário
(Consuni) e de Administração
(Consad) não foram ouvidos.
No dia 13 de setembro, a pedido da Associação
de Professores da UFMA
(Apruma), seção sindical do
ANDES-SN, o juiz da 5ª
Vara da Justiça Federal, em
São Luiz, José Carlos do Vale,
chegou a conceder liminar – já
cassada – suspendendo o contrato e todos os atos futuros
ou praticados nesse sentido.
O juiz entendeu que a
UFMA não poderia celebrar
o contrato sem a deliberação
dos conselhos por ferir a autonomia da universidade, os
princípios da gestão democrática e a participação da comunidade, conforme previsto no
Estatuto da instituição. Ele
considerou que a manutenção
do contrato pode macular
o princípio de moralidade
administrativa, com drástica
repercussão na situação econômico-financeira da UFMA.
Pouco mais de duas semanas após ser deferida e por
iniciativa da própria universidade, a liminar foi derrubada pelo Tribunal Regional
Federal da Primeira Região,
Precarizar para privatizar
A criação da Ebserh está no
bojo de um processo de precarização do trabalho no serviço
público que se iniciou no governo FHC, na forma de contratos com empresas privadas,
autônomos e cooperativados,
principalmente no SUS. Na
sequência, o ex-presidente Lula
toma posse com um discurso
de que iria desprecarizar o trabalho no SUS. O Ministério
da Saúde já no início do primeiro governo petista, chega a
criar um “comitê de desprecarização”, mas, nas declarações
do governo desde a primeira
Conferência Nacional de Saúde
que ocorreu depois da posse de Lula, ficou claro que o
discurso de "desprecarização"
não era contratar servidores
públicos pelo Regime Jurídico
Único (RJU), mas substituir as contratações precárias
por contratações pelo regime
CLT. "A desprecarização para
o governo é precarizar o RJU
e privatizar também", avalia
Claudia March, professora do
Instituto de Saúde Coletiva
da Universidade Federal
Fluminense (UFF) e secretária geral da Aduff-S.Sindical.
"E ao privatizar os hospitais
universitários, o governo vai
avançar na destruição do SUS,
já em curso com as privatizações pelas organizações sociais
e fundações estatais de direito
privado”, completa.
Presidente do Conselho
Nacional de Saúde no período
de 2006 a 2011 e ex-presidente da Central Única dos
Trabalhadores (CUT) no Rio
Grande do Norte, Francisco
Batista Júnior lembra que a
forma mais cruel de privatização é aquela que ocorre por
meio da ocupação da estrutura
pública e de suas instituições, exatamente na qual se
enquadra a Ebserh. "Grupos
políticos utilizam o patrimônio e os recursos públicos
para fins privados, seja por
meio de processos estritamente econômicos, seja por meio
de processos políticos, com o
objetivo de se locupletar e se
fortalecer política e eleitoralmente", acredita. O benefício
econômico pode acontecer mediante compras direcionadas,
viciadas e voltadas para grupos
que se organizam previamente
num grande acordo de interes-
ses e o político, por meio das
nomeações clientelistas e contratações "fisiologistas".
"É um instrumento privilegiadíssimo para ocupação político-partidária, "cabides de emprego" que, em certa medida,
acaba se revelando muito mais
cruel ao erário e ao patrimônio
público do que a privatização
clássica", considera. Francisco
também acusa a Ebserh de
fazer uma intervenção direta
na autonomia universitária,
particularmente no que diz
respeito à formação profissional que se dará de acordo com
os interesses e a ideologia dos
"dirigentes" da "empresa". Para
professora Cláudia March, a
existência por si só de uma
instituição de direito privado
externa à universidade e centralizada pelo Ministério da
Educação, que possibilitará o
estabelecimento de convênios,
contratos e outras relações
Claudia March alerta: ao privatizar os HUs, governo destruirá o SUS
71
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
mercantis com entidades privadas para execução de sua
competência, ou seja, “apoio”
às finalidades universitárias –
ensino pesquisa e extensão – já
impede que a autonomia universitária seja exercida.
Assistência X Docência
Médico urologista, professor e diretor do ANDES-SN,
Antônio Gonçalves Filho já
está sentindo na prática a
chegada da Ebserh no hospital universitário (HU)
da Universidade Federal do
Maranhão (UFMA). "A
relação profissional é uma
relação de assédio moral. Ou
você se submete às regras ou
você está fora. O médico vai
ter que se submeter às metas
construídas não a partir de
um pacto de discussão acadêmica, mas dentro de um
gabinete", acusa. "Se eu dou
minha aula prática dentro
do hospital, não tem como
desvincular a assistência da
docência. Quando era direção
da universidade, nós pactuávamos. Quem fazia docência
atendia oito, quem não fazia,
atendia 16 pacientes. Não
existe mais isso. Querem criar
uma situação que nos obrigue
a sair. Não fomos chamados
em nenhum momento para
discutir o assunto".
A criação da Ebserh seria
para acabar com os HUs, já
que passariam a ser administrados por uma empresa esta-
Junior diz que a forma mais cruel
de privatização é a que ocorre pela
ocupação da estrutura pública
tal e desvinculados da universidade. "A lógica da empresa é
melhorar a gestão, fazer mais
com menos, isso compromete
o meu processo de ensino-aprendizagem porque eu
vou ter menos condições de
executar os procedimentos
necessários para a formação
de um médico", desabafa. Essa
formação, em sua opinião,
requer mais do que um hospital meramente de assistência.
"Preciso pensar em novos
recursos pedagógicos, rever
minha prática docente, contribuir mais com a melhoria do
projeto pedagógico do curso,
da forma que trabalhamos
com a Ebserh no hospital, eu
não tenho mais tranquilidade
para fazer isso".
72
Revista Andes Especial
Outra mudança significativa aconteceu na compra de
material médico-hospitalar.
"Há 15 dias não tinha seringa
para retirar a sonda de um
paciente e esse tipo de coisa
não acontecia antes", diz o
professor. O material acabou
e o almoxarifado não teria
comprado porque a forma
que as compras eram feitas
na estrutura antiga era muito
burocrática, a Ebserh vai acelerar e comprar mais barato,
centralizando pelo menos as
compras grandes em Brasília.
As compras de todos os HUs
serão feitas em bloco. "Pode
até parecer interessante, mas
quando pensamos sob o ponto
de vista de corrupção, o poder
dessa comissão de licitação,
vai ser problemático, são compras milionárias. Não é assim
no SUS", avalia Gonçalves.
O professor cita também
outro exemplo que o surpreendeu: uma possível compra
de "fibras de laser" no lugar
de "alças de ressecção" para
cirurgia de próstata, sem que
nenhum urologista tenha sido
consultado sobre a mudança.
Além de encarecer muito os
custos da cirurgia, as tais fibras
são usadas em outratécnica que,
segundo Gonçalves, ainda não
é adotada. A superintendente
da Ebserh no Maranhão, Joyce
Lajes, iniciou uma entrevista
que logo foi interrompida, não
atendeu mais o telefone e não
retornou a ligação.
Novembro de 2013
Leia o depoimento do professor Antônio Gonçalves Filho:
"Temos uma fila de 40
pacientes para operar de próstata
e usamos uma técnica consagrada,
com bisturi elétrico. Cada alça
de ressecção custa em torno de
R$ 200,00. Para operar 40
pacientes, com R$ 8 mil eu consigo
comprar as alças necessárias para
operar todos pacientesque ficam
internados por 48 horas. Eu
tive conhecimento que a Ebserh
nacional tomou a iniciativa de
não comprar alças de ressecção,
mas comprar fibras de laser
para baratear os custos com a
internação. Com laser, os pacientes
teriam alta com 24 horas. Só que
cada fibra de laser custa R$ 5
mil, para operar 40 pacientes, em
vez de R$ 8 mil, eu vou gastar
R$ 200 mil. Nem preciso fazer
pesquisa para saber se compensa.
Uma diária num hospital
particular de São Luiz custa R$
300,00.E é um outro método,
que ainda está em fase de estudo.
A compra vai ser local e não
foi uma demanda da Urologia.
O próprio chefe da Urologia se
espantou quando soube que iam
comprar essas fibras. E não vão
comprar só as 40, mas oitenta
fibras, ou seja, 400 mil reais
sem licitação porque só tem um
fornecedor no Maranhão. E tem
mais, o corpo clínico hoje não
tem treinamento nessa técnica. Se
fosse uma pesquisa científica era
outro contexto, mas não existe
nada nesse sentido. É esta a gestão
que nós queremos? Ou queremos
democratizar as decisões?
Enquanto isso, eu tenho uma fila
de 150 pacientes com pedras nos
rins para operar de cálculo renal
e só temos um nefroscópio. Com
esse dinheiro -- 400 mil reais
-- daria para eu operar todos
os pacientes de próstata e ainda
triplicar os materiais necessários
para operar os rins. Eu fico muito
revoltado. É esse o distanciamento
da gestão de gabinete para a de
quem está na ponta".
Docentes alertam para a
privatização dos HUs. Eles
preveem que iniciativa vai
acabar com a saúde pública
73
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
ADI aguarda decisão do STF
Uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI)
com pedido de medida cautelar
contra a Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares (Ebserh),
vinculada ao MEC, aguarda
há nove meses parecer do relator, ministro Dias Toffoli,
no Supremo Tribunal Federal
(STF). A ADI, que leva o
número 4.895, é do então
procurador-geral da República,
Roberto Gurgel, foi proposta
há um ano e pede a declaração
de inconstitucionalidade da Lei
12.550/2011, que autoriza a
criação da empresa. Indeferida,
a análise da medida cautelar
foi prejudicada porque Tofolli,
entendendo a ação como matéria relevante, resolveu adotar o
"rito abreviado", a fim de que a
decisão que vier a ser tomada
seja em caráter definitivo. Três
ministros do tribunal também
não entenderam o caso como
uma situação de urgência.
Na ação, Gurgel requer a
declaração da inconstitucionalidade dos artigos 1º ao 17
da lei, que tratam das atribuições, gestão e administração
de recursos da empresa ou,
sucessivamente, dos artigos
10, 11 e 12, que tratam da
forma de contratação de servidores da empresa por meio
da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), de processo
seletivo simplificado e de contratos temporários. Pelo me-
nos cinco pedidos de ingresso
como amicus curiae (amigo da
Corte), intervenção assistencial em processo de controle
de constitucionalidade por
parte de instituições que tenham representatividade para
se manifestar nos autos. São
oito entidades nacionais que,
se acatadas, não poderão atuar
como partes do processo mas
como interessados na causa.
Querem ser amicicuriae da
ADI contra a Ebserh:
ADI Nº 4895
AMICUS CURIAE
AUTORES
•
Associação Nacional do
Ministério Público de Defesa da
Saúde (Ampasa)
Pedido de Ingresso
Nº 9095
05/03/2013
Associação Nacional do Ministério
Público de Contas (Ampcon)
• Associação Nacional dos
Auditores de Controle Externo dos
Tribunais de Contas do Brasil (ANTC)
•
Federação de Sindicatos de
Trabalhadores das Universidades
Brasileiras (Fasubra)
Pedido de Ingresso
Nº10697
11/03/2013
•
Federação Nacional dos
Sindicatos de Trabalhadores em
Saúde, Trabalho e Previdência
Social (Fenasps)
•
Sindicato Nacional dos Docentes
das Instituições de Ensino Superior
(ANDES-SN)•
Pedido de Ingresso
Nº 18452
22/04/2013
•
Pedido de Ingresso
Nº 23508
07/05/2013
•
Pedido de Ingresso
Nº 41349
25/08/2013
•
74
Revista Andes Especial
Federação Nacional dos Médicos
(Fenan)
Conselho Federal de Medicina
(CFM)
Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Saúde (CNTS)
Novembro de 2013
Universidades se mobilizam contra a Ebserh
Um plebiscito pode decidir o destino do Complexo
Hospitalar da Universidade
Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ). A Empresa Brasileira
de Serviços Hospitalares
(Ebserh), do Ministério da
Educação, que o governo pretende que assuma todos os
hospitais universitários do
País, pode também acabar
com o complexo hospitalar
formado por sete instituições
de saúde. De acordo com o
presidente da Associação dos
Docentes da UFRJ (Adufrj),
Mauro Iasi, a Ebserh só se
interessa por três, os maiores
e, principalmente, de média e
alta complexidade. A mobilização de todos os segmentos
da universidade vem surpreendendo a cada dia e levou o debate a um impasse cujo desfecho é difícil de prever. Caberá
ao reitor, professor Carlos
Antônio Levi da Conceição,
acatar ou não a proposta.
Depois de um longo
processo de discussões que
Iasi informa que Ebserh
só se interessa por
três dos sete institutos
do complexo hospitalar
75
Revista Andes Especial
culminou com relatórios das
comissões permanentes do
Consuni apontando uma série de irregularidades no contrato da Ebserh e a necessidade de se buscar uma proposta
alternativa do movimento
docente, a UFRJ mostrou
sua força contra a empresa na
reunião do Consuni no dia
26 de setembro. Mais de mil
pessoas, entre estudantes,
docentes, servidores, associações e sindicatos marcaram presença. Participando
da reunião do Consuni, a
presidente do ANDES-SN,
Marinalva Oliveira, acusou
a Ebserh de ser um retrato
claro de intervenção direta
do capital sobre os serviços
e alertou que não é possível
permitir que a autonomia da
universidade seja afrontada
dessa forma. "Não aceitamos
que nos tirem o desenvolvimento do conhecimento com
qualidade", disse a presidente.
"O que vemos com a possibilidade da entrada da empresa é a perda da autonomia
universitária e a não priorização do HU como um hospital-escola", disse a diretora do
Centro Acadêmico Carlos
Chagas, da Medicina, Diana
Portela. Por ser uma empresa
pública de direito privado, a
estudante acredita que a finalidade econômica é superior
ao ensino, à pesquisa e à ex-
Novembro de 2013
tensão. Ela questiona também
a substituição do modelo de
concurso público pelo regime
privado de CLT, a possibilidade de formação de duas “portas de entrada”, uma pelo SUS
e outra por planos de saúde
(Artigo 32 da Lei 9.656/98).
"Vimos nos últimos tempos
um Hospital sendo sucateado
propositalmente para que as
pessoas se desesperem e acreditem no discurso de que se a
Ebserh não entrar o hospital
vai fechar", relatou.
O reitor tentou na penúltima reunião do conselho
universitário impor uma votação que é contra o estatuto
da UFRJ, o diretor do hospital nem sequer recebe os
estudantes, o coordenador de
uma importante disciplina
em quatro períodos do curso
de Medicina, passou de sala
em sala no início do semestre,
dizendo que o hospital iria fechar. Os estudantes começaram
então a pesquisar os hospitais
em que a Ebserh já assumiu o
controle, como UFPI, UnB e
UFMA. "No Piauí, a empresa
recebeu o dinheiro e não investiu no hospital, no Maranhão
a entrada foi feita de forma
ilegal e revogada pela Justiça,
em Brasília, os estudantes, professores e técnicos perderam
participação que, no processo
de assinatura do contrato, tinha sido dada como certa. A
situação, então, é uma empresa
sendo imposta, sem debate,
sem conversa, sem certeza de
melhora, desrespeitando os
estudantes, os profissionais e o
estatuto da universidade.
Por meio de sua assessoria
de Imprensa, a Ebserh nega
a preferência por apenas três
hospitais, quer todos. É só
uma questão de tempo: "Entre
setembro de 2012 e setembro de 2013 foram realizadas
atividades voltadas para a
caracterização do perfil hospitalar, dimensionamento de
serviços assistenciais e de pessoal do Hospital Universitário
Clementino Fraga Filho e da
Maternidade Escola. Os resultados serão encaminhados à
universidade, que os discutirá
no âmbito de suas instâncias
colegiadas, cabendo decidir
pela contratação ou não da
empresa, uma vez que a decisão
pela contratação é da autonomia de cada universidade federal. Concluída esta etapa e, se
concretizada a parceria entre
Ebserh e UFRJ, as próximas
unidades hospitalares também
serão diagnosticadas". Uma
das maiores queixas em todo o
território nacional é o fato da
empresa fazer "diagnósticos"
dos HUs antes da adesão à
Ebserh, sem ouvir os segmentos envolvidos com o trabalho
no hospital e não compartilhar o resultado.
Paralelamente a uma reunião no Conselho Universitário
da UFRJ, realizada em setembro de 2013, estudantes
76
Revista Andes Especial
e professores reuniram-se no
Teatro de Arena do Centro de
Ciências da Saúde para avaliar
as implicações de uma eventual contratação com a Ebserh.
Naquele encontro, a estudante
de medicina da Universidade
de Brasília (UnB), Camila
Damasceno, disse que os
problemas do Hospital
Universitário de Brasília
(HUB) não foram resolvidos.
Ao contrário, agravaram-se.
“Setores considerados ‘menos
produtivos’, isto é, com menor
potencial para gerar lucro,
estão sendo desmontados. As
residências de otorrino, pediatria e radiologia passaram
a ser realizadas em unidades
fora da universidade. E essas
áreas tinham grande demanda
social. A cardiologia, por sua
vez, com tratamentos caros,
obteve 16 concursos”.
Pelotas
O grande argumento da
Ebserh para assumir o hospital
da Universidade Federal de
Pelotas (UFPel) é a realização
de um velho sonho dos docentes, estudantes e demais profissionais da área de saúde: a
construção de um hospital próprio. "Estamos vivendo uma
situação importante porque
o antigo reitor, Cesar Borges,
havia proposto a construção
de um hospital regional, com
30 leitos no terreno da própria
universidade, conta a professora Celeste dos Santos Pereira,
Novembro de 2013
vezes que o procuramos a resposta é sempre esta" diz a professora. Del Pino não diz que é
a favor da Ebserh mas, segundo
Celeste, já permitiu todo o
processo de diagnóstico do
hospital. "A promessa é de que
o hospital será 100% público
não é verdade, pois a Ebserh é
uma parceria público-privada,
o estatuto diz que a empresa
está aberta à contratação de
serviços, aplicações financeiras, o ressarcimento do SUS
vai para a empresa, e não para
Camila disse que,
depois da Ebserh, os
problemas do HUB
se agravaram
77
Revista Andes Especial
o fundo monetário de saúde,
como sempre aconteceu", argumenta Celeste. "Nós entregamos um patrimônio sem perspectiva de retorno, entregamos
os servidores para ficar a mercê
da dessa administração".
Adufrj-SSind/Marco Fernandes
presidente da Associação dos
Docentes da Universidade de
Pelotas (Adufpel). O atual
reitor, Mauro Del Pino, argumenta que sem a Ebserh não
tem hospital e acaba jogando a
população contra os docentes
porque, como hospital regional, o atendimento pelo SUS
cobriria Pelotas e toda a região.
Ao tomar posse, o reitor
comprometeu-se em conversar
com a comunidade acadêmica.
"Em março ele disse que estava
preparando o debate e todas as
Pará
O reitor da Universidade
Federal do Pará (UFPA),
Carlos Maneschy, ainda não
colocou em pauta a adesão da
UFPA á Ebserh no Conselho
Universitário. Segundo o professor e jornalista José Carneiro,
da Secretaria Regional Norte
2 do ANDES-SN, as mobilizações se multiplicam por iniciativa da Regional, da Adufpa,
Fasubra e Sinditifes. "O reitor
está apenas protelando, dando tempo ao tempo, de modo
que, nos últimos segundos do
tempo previsto, ele tomará as
providências de praxe, tanto as
subliminares quanto as formais,
para que a Ebserh chegue triunfalmente na UFPA", ironiza
o professor. O atual diretor
do Hospital Universitário da
UFPA, Antônio Carlos Franco
da Rocha, recentemente empossado no cargo, não tem posição
pessoal firmada sobre a estatal,
mas, em entrevista concedida
ao jornal da Adufpa, disse que
a adesão da universidade é uma
questão de tempo, pois alguns
serviços (compras de materiais
etc.) já são feitos por intermédio da Ebserh, como acontece
em todo o País.
Novembro de 2013
Expansão sem
qualidade deixa dois
Cefets à beira do caos
Crescimento dos Centros Federais de Educação
Tecnológica do Rio de Janeiro e de Minas Gerais
veio acompanhado de uma asfixia institucional
com falta de democracia interna e autonomia
Washington Sidney
A
tores fundamentais
na formação em todos
os graus de ensino, os
Centros Federais de Educação
Tecnológica (Cefet) do Rio
de Janeiro e de Minas Gerais
enfrentam intensa pressão do
governo federal desde que se
recusaram a aderir à proposta
do Ministério da Educação
(MEC) de transformá-los em
Institutos Federais (Ifets). Os
dois Cefets lutam para serem
reconhecidos como universidades, a exemplo do que ocorreu,
em 2005, com o antigo Cefet
do Paraná, hoje Universidade
79
Revista Andes Especial
Tecnológica Federal do Paraná
(UTFPR). Diretores, professores e estudantes recusam-se
a aceitar que os dois centros
venham a perder as características de ensino superior e a
autonomia que conquistaram,
se vierem a seguir o modelo
idealizado pelo MEC.
“Dado o amadurecimento
e o tamanho alcançado pelas
duas instituições, existe uma
percepção interna de que a
transformação em institutos
federais, como proposto pelo
MEC, não atende às nossas
demandas institucionais, sobretudo nos aspectos relacionados à democracia interna e à
Novembro de 2013
Márcio Basílio diz que o Cefet
de MG sofreu estrangulamento
autonomia administrativa. Os
institutos nasceram com estrutura extremamente vinculada a
decisões advindas dos ministérios, os estatutos já vêm prontos e não há debate interno nas
instituições sobre o assunto.
Além disso, a lei que cria os
Ifets prevê a existência de um
único órgão colegiado eleito
pela comunidade. Isso é um
retrocesso enorme”, condena o
professor Antonio Arapiraca,
presidente do Sindicato dos
Docentes do Cefet de Minas
Gerais (Sindcefet-MG).
Arapiraca também rejeita
o modelo de Universidade
Tecnológica (UT) apresentado
pelos gestores do Cefet-MG.
“É um modelo ruim, muito
centrado na lógica produtivista,
portanto, apesar de apoiarmos
a transformação da instituição
em universidade, acreditamos
que o modelo deve ser outro,
centrado numa articulação concreta entre os três níveis de ensino pretendidos na instituição,
de modo que o estudante do
curso técnico possa ter desde
cedo contato com a pesquisa, o
que sem dúvida produzirá trabalhadores mais qualificados.
Não apoiamos qualquer modelo baseado em apurar o olho
e adestrar a mão, que produza
mão de obra barata para atender aos interesses industriais
num cenário globalizado de
ultraespecialização, em que o
trabalhador especialista numa
única atividade fica fora do
mercado se aquela linha de
produção fecha. Acreditamos
na formação de um trabalhador
com autonomia para atuar na
sua área”, destaca.
O diretor-geral do Cefet do
Rio de Janeiro, Carlos Henrique
Figueiredo Alves, acha que a
transformação em Ifet deformaria institucionalmente o centro.
Por força de lei, os institutos
têm de reservar 50% das vagas
a cursos de nível médio e 20%
a cursos de licenciatura. Para
adequar-se a esses requisitos, o
Cefet/RJ, que possui 14 cursos
de bacharelado e apenas dois em
licenciatura, precisaria diminuir
80
Revista Andes Especial
a oferta de vagas de graduação
em engenharia e aumentar as de
licenciatura. “Queremos que o
MEC olhe para gente de outra
maneira, porque não temos a
proposta de instituto. Estamos
colocando a seriedade da oferta
dos cursos de engenharia na
instituição, e acabar com esses
cursos no Cefet é uma falta de
compromisso com a sociedade”,
desabafa o diretor.
Impasse
A rigor, a transformação
dos Cefets em institutos é
uma tentativa de reduzir estas
instituições a um perfil apenas
instrumental, o que sacrificará o caráter acadêmico deles,
caso essa iniciativa venha a ser
concretizada. O objetivo do
governo é priorizar a formação de profissionais técnicos
de nível médio e a adaptação
às cadeias produtivas do País.
Desde 2008, a transformação
já ocorreu em quase todos os
Cefets. Só os do Rio de Janeiro
e Minas Gerais não aderiram à
proposta do MEC.
Por força desse impasse,
que já dura alguns anos, os
dois Cefets sofrem verdadeira
asfixia política – de vagas para
a contratação de pessoal – e,
durante alguns períodos, também financeira por parte do
governo. A má vontade é clara.
“Não vou chamar de retaliação, mas, como consequência
da não adesão ao modelo de
Instituto, o Cefet-MG sofreu
Novembro de 2013
todos os estrangulamentos
possíveis. Mais impactante até
o momento é a falta de regras
para oferecer vagas de professores. Desde a criação do Reuni
e do Programa de Expansão da
Rede de Educação Técnica, o
Cefet-MG não recebe professores para repor as aposentadorias e as vacâncias ocorridas
nesse período. Ou seja, desde
2006 não temos concurso para
repor perdas. E mais: nem
mesmo as vagas de professores
acordadas para a expansão foram liberadas em sua totalidade”, queixa-se o diretor-geral
do Cefet-MG, Márcio Basílio.
Segundo ele, a consequência
disso é que, hoje, o Cefet-MG
conta com 630 professores
efetivos e 306 temporários.
Ou seja, quase metade dos do-
centes não é do quadro, o que
implica numa sobrecarga dos
efetivos, obrigados a assumir
mais encargos administrativos e a dar conta dos projetos
de pesquisa, de extensão e da
orientação dos estudantes. “A
demora na publicação do banco de professores equivalentes
da Carreira de Magistério
do Ensino Básico, Técnico e
Tecnológico (EBTT) é enorme, uma vez que foi acordado
ainda em outubro de 2011,
quando tomei posse. Soma-se
a isso a decisão do Ministério
do Planejamento de recolher as
vagas de professor temporário
agora no mês de outubro, considerando que toda a demanda
por efetivos foi atendida pela
promulgação do Projeto de
Lei (PL) 2134/11. Se isso se
confirmar, estaremos entrando
2014 com um saldo negativo
de mais de 100 professores”,
contabiliza Basílio.
Por causa da falta de docentes e dos problemas estruturais
resultantes da retaliação do governo federal, professores, funcionários e estudantes do Cefet
do Rio de Janeiro fizeram, no
início deste ano, um protesto
contra o MEC. Na carta aberta
em repúdio à transformação
do centro em Ifet, os manifestantes dizem que o projeto do
governo de fazer do centro um
Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia “forçará
o fechamento de boa parte
dos atuais cursos de graduação, que já eram referência no
cenário nacional, em favor de
cursos de licenciatura”.
No Cefet MG, metade dos docentes não é do quadro, o que implica uma sobrecarga de trabalho para os efetivos
81
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Crescimento
desordenado
sacrificou os
professores
A exemplo do que ocorreu
com as Instituições Federais
de Ensino Superior (IFES),
os Cefets do Rio de Janeiro e
de Minas experimentaram, nos
últimos anos, um crescimento
significativo na oferta de vagas
a novos estudantes. O processo
se deu de forma desordenada.
O de Minas, por exemplo, conta hoje com dez campi em nove
cidades do estado e oferece 74
cursos, 42 deles de ensino técnico, 18 de graduação e 14 de
pós-graduação (seis de especialização lato sensu, sete de mestrado acadêmico e um de doutorado acadêmico). Conta com 990
professores (deste quantitativo
Washington da Costa elenca vários problemas decorrentes da expansão
82
Revista Andes Especial
quase 40% são substitutos e
temporários) e 530 técnicos
administrativos para atender a
15.333 estudantes. O déficit é
de 400 docentes.
O professor Antônio
Arapiraca condena a exclusão
dos Cetefs do chamado Banco
de Professor Equivalente, ou
seja, sistema pelo qual, quando um professor aposenta ou
sai da instituição, a vaga é
logo preenchida. Este mecanismo tem problemas, pois
funciona da seguinte maneira:
cada instituição tem direito
a um quantitativo de vagas e
o professor DE (Dedicação
Exclusiva) equivale a 1,5 docente; o professor 40h a um
docente e o professor 20h a
0,5 docente, o que significa
dizer que, para ter mais docentes, muitas instituições
têm de optar por contratar
professores 40h.
“O ANDES-SN é contra
este mecanismo, somos a favor
da contratação de professor
em dedicação exclusiva sem
pressão contrária provocada
por estas proporções, mas
também temos a compreensão de que este é o único
mecanismo que o governo
disponibiliza para a reposição
de quadros. Deixar-nos fora
disso foi muito perverso, pois
as pessoas foram aposentando
e saindo da instituição e não
repuseram estas vagas. Outra
forma de retaliar é a prática
de discutir ponto a ponto cada
Novembro de 2013
questão relacionada à instituição, o que significa que os
gestores têm de se deslocar
com uma frequência muito
grande a Brasília e na maior
parte das vezes nada é resolvido. Esse tipo de tática é usado
largamente pelo governo, até
mesmo nas negociações com
nosso sindicato”, acusa.
Washington da Costa,
presidente da Associação
dos Docentes do Cefet RJ,
conta que, além da unidade Maracanã, foram criadas
outras seis nos últimos anos
(Nova Iguaçu, Maria da Graça,
Petrópolis, Nova Friburgo,
Valença e Angra dos Reis).
“Apesar de criadas em momentos diferentes, a implantação
dessas unidades ocorreu de
forma similar: sem planejamento para médio e longo
prazos, em condições precárias,
umas por falta de professores,
outras por falta de laboratórios. Alguns laboratórios ainda
não estão concluídos e há equipamentos adquiridos há anos
que não foram instalados por
falta de recursos para as obras
de infraestrutura”, comenta o
dirigente sindical. Segundo ele,
os docentes estão levantando
vários problemas, alguns de
âmbito interno e outros relacionados a questões externas
(governo federal).
Ele cita, entre os problemas do Cefet-RJ, a falta de
construção e conclusão de
laboratórios experimentais,
a necessidade de contratação
de professores EBTT (mais
de 190 para todo o sistema),
carência de técnicos de laboratório e técnicos administrativos em educação, criação de
restaurantes universitários,
climatização das salas de aula,
material de consumo para práticas laboratoriais, adicional
de insalubridade para docentes
que trabalham em condições
insalubres e criação de conselhos gestores deliberativos em
todas as unidades, com representações dos três segmentos
(docentes, técnicos administrativos e discentes) eleitos
por seus pares. As reivindicações foram aprovadas em
assembleias pelos professores
do Cefet/RJ e algumas estão
sendo negociadas.
Expansão do Cefet do Rio de Janeiro, com criação de seis novos campi, causou déficit de 190 professores
83
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Cartazes no campus de Curitiba da UTFPR com a contagem dos dias de intervenção de um reitor interino
UTFPR: frustração, intervenção
e falta de democracia
A transformação do Cefet
do Paraná em universidade tecnológica federal não resolveu os
problemas, frustrando a comunidade acadêmica tanto no que
se refere à estrutura como pela
falta de democracia no meio
acadêmico. O presidente da
Seção Sindical dos Docentes
da UTFPR (Sindutf-PR), Ivo
Pereira de Queiroz, acusa a
reitoria de operar longe dos
parâmetros democráticos, sem
ouvir a comunidade acadêmica.
“Prova disso foi a apropriação
arbitrária do campus de Curitiba
pela reitoria, em setembro do
ano passado. Um ano após
este golpe, a comunidade
do maior campus da UTFPR
permanece impedida de votar
para eleger o diretor geral do
campus”, comenta.
Ivo acredita que a forma
centralizada de administração
impede a democratização da
gestão e da aplicação dos recursos. “Um exemplo diz respeito
às verbas que a instituição recebe do governo: por causa das
falhas no planejamento, para
evitar a devolução de verbas
não utilizadas, a administração
sai às compras de última hora.
84
Revista Andes Especial
A Sindutf-PR pondera que, se
houvesse uma administração
qualificada pelo diálogo com a
comunidade, os recursos poderiam ser redirecionados, ao longo do ano, para o atendimento
de demandas emergidas”.
A UTFPR contabiliza hoje,
em seu quadro docente, 1.096
professores efetivos de magistério superior, 1.051 da carreira
EBTT e 1.029 funcionários
técnico-administrativos. Mas
a relação professor-estudante
está se tornando inviável. Ivo
conta que houve a conversão de
centenas de códigos de vagas de
Novembro de 2013
docentes da carreira de Ensino
Básico Técnico e Tecnológico
para a de ensino superior,
possibilitando a realização de
concursos. No entanto, as novas aposentadorias da carreira
EBTT não têm sido convertidas
para o ensino superior, gerando
um déficit de vagas.
“Consequentemente, há
uma repercussão danosa sobre
as condições de trabalho dos
docentes remanescentes e a
penalização dos discentes pela
redução de turmas ofertadas
em diversas disciplinas. Em
Curitiba, cerca de 700 discentes ficaram impossibilitados
de frequentar disciplinas na
área da matemática, pois o
departamento não tem profissionais para atendê-los. A
mesma coisa acontece com
o Departamento de Física:
faltam docentes. A carência
de professores atinge pratica-
mente todos os campi. Existe
uma importante demanda por
técnicos administrativos e
laboratoristas e as vagas não
têm sido ofertadas por meio
de concursos”, afirma.
A Sindutf-PR tem recebido queixas frequentes de
docentes dos campi relatando
carências derivadas da expansão proporcionada pelo Reuni.
Ivo diz que alguns dados são
evidentes: “Cresceu o número de discentes por turmas.
Mas as pessoas sentem falta
de infraestrutura, caso dos
laboratórios. Nos novos campi,
docentes são destinados aos
trabalhos administrativos,
gerando lacunas no atendimento em salas de aulas”. O
resultado disso, segundo ele,
é o aumento de registros de
licença-saúde de docentes.
A Universidade Tecnológica
Federal do Paraná foi conta-
tada, mas, segundo o assessor
de imprensa Paulo Strogenski,
o reitor Carlos Eduardo
Cantarelli estava viajando e
não poderia dar entrevista. A
reportagem também tentou
contato com as secretarias de
Educação Superior (Sesu) e
de Educação Profissional e
Tecnológica do Ministério da
Educação, mas até o fechamento desta edição nenhuma
das duas respondeu as perguntas encaminhadas.
É importante ressaltar que
todo o acúmulo de discussões
do movimento docente produziu referências para a universidade brasileira, conforme
está expresso no Caderno 2
– Proposta do ANDES-SN
para a universidade brasileira,
no qual o conceito de universidade não se coaduna com
subdivisões por especialidade
ou por área do saber.
Assembleia Comunitária com docentes, técnicos e estudantes para discutir a autonomia do campus Curitiba, em 28/9/ 2012
85
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
A covardia
do Estado
liberal
Em duas décadas, governos Collor,
FHC e Lula saquearam os docentes
aposentados. Redução salarial chega a
R$ 24 mil ao ano com quebra de direitos
Washington Sidney
O
saco de maldades
do Estado brasileiro
parece não ter fundo. Que o digam os docentes
aposentados das Instituições
Federais de Ensino Superior
(IFES). Nos últimos anos,
eles foram vítimas de um verdadeiro saque por parte de
seguidos governos. Os prejuízos começaram na era Collor,
com os ataques aos servidores
públicos e também aos direitos de aposentadoria do
conjunto dos trabalhadores,
foram sacramentados na gestão de FHC e não escaparam
87
Revista Andes Especial
nem sequer da administração
do petista Lula da Silva.
Há relatos dramáticos de
depreciação não só dos proventos, mas também do valor
que deveria ser dado a quem
muito fez pela educação pública no Brasil. Pessoas que dedicaram suas vidas à educação
e a construir conhecimentos,
caíram nas ciladas de governantes que administraram o
país com uma visão patrimonialista, baseada nas piores
práticas da política brasileira.
Para não perder os direitos
adquiridos em 35 anos como
professor, Salatiel Menezes dos
Santos, 73 anos, viu-se obri-
Novembro de 2013
gado a aceitar a aposentadoria
precoce em 1991. “O então
presidente Collor, para desviar
a atenção da quadrilha que
havia montado para desvio de
dinheiro público, iniciou uma
campanha contra os servidores, colocando no mesmo saco
médicos, professores e pesquisadores como funcionários que
ganhavam salários altíssimos,
chamados de “marajás”.
O professor aposentado
Salatiel ainda trabalhou cinco
anos no Instituto de Biofísica
sem remuneração extra além do
salário integral de aposentado,
até que o último estudante de
Doutorado defendesse sua tese.
Aposentado da UFRJ há 22
anos, alguns deles exposto a
radiações ionizantes e a outros
elementos perigosos, Salatiel
contraiu câncer e viu seus direitos serem gradativamente
solapados, até mesmo o adicional de 40% de periculosidade,
apesar de ter cumprido todas
as obrigações contratuais que
assumira com o serviço público, portanto, com o Brasil, e
não com os governantes.
“Durante muitos anos,
recebi os salários da aposentadoria de acordo com meu contrato: tendo optado desde o
início pelo regime estatutário,
pagava 11% do total de minha
remuneração como contribuição ao INSS. Por muitos anos
Tomáz: contribuição lhe dá um prejuízo equivalente ao 13º
88
Revista Andes Especial
não tive direito ao 13º salário,
nunca tive direito a Fundo de
Garantia. Em compensação,
tinha aposentadoria integral,
com paridade salarial com os
ativos e a garantia de que todo
aumento que fosse dado aos
ativos eu os receberia também.
Havia garantia também de que
todos os direitos legais incorporados a meu salário seriam
mantidos até o fim de minha
vida ou de minha dependente-pensionista (esposa).
Desrespeito
Ao constatar as maldades
que o governo FHC tramava contra a categoria, José
Queiroz Carneiro, docente na
Universidade Federal do Pará
(UFPA), 66 anos, também
optou por se aposentar antes
dos 50 anos. Ainda hoje ele se
ressente da forma desrespeitosa
como foi tratada a categoria
pelo sociólogo. “Falando a respeito de aposentadoria, ele chamou de ‘vagabundos’, em alto e
bom som, os professores que se
aposentavam antes dos 50 anos
de idade. Ironicamente, ele
estava chamando a si próprio
pelo termo desqualificador.
Como já tinha ultrapassado a
idade de ser considerado vagabundo, me aposentei. Não
pensei nos prejuízos que a aposentadoria, de certa forma precoce, dada minha pouca idade
na época, me reservava”.
Mas a maior queixa dos
aposentados, além do fim da
Novembro de 2013
paridade com os docentes da
ativa, refere-se à criação da
contribuição previdenciária. O
aposentado Tomáz de Aquino,
da Universidade Federal de
Mato Grosso (UFMA), calcula que só essa “contribuição”
representa, na soma dos 12
meses do ano, a perda do 13º
salário. Ele define a cobrança
como “um absurdo jurídico criado com a chancela do
Supremo Tribunal Federal”.
Salatiel Menezes também
condena a contribuição de
11% sobre o salário bruto
para a Seguridade. “A isenção
era assegurada por cláusulas pétreas da Constituição,
as quais foram desprezadas
principalmente nos governos
do PT. Infelizmente, com a
covardia do STF, que, em demonstração de pusilanimidade
sem precedentes, ‘rifou’ este
direito dos aposentados em
troca de que o Judiciário ficasse fora da contribuição. Esta
‘contribuição’ se caracteriza
claramente como confisco de
salário. Mas o STF, composto
quase totalmente por ministros nomeados por Lula ou
Dilma, validaram este crime”.
Números concretos
Especialista em matemática, Raimundo Renato
Patrício, 74 anos, aposentado
da Universidade Federal do
Maranhão (UFMA), dá números concretos ao prejuízo,
levando-se em conta a ausência de várias vantagens, como
Gratificação por Tempo de
Serviço, Gratificação por
Produção Científica (esta era
de 25% do salário básico e
cuja perda, totalizando um
salário a cada quatro meses,
perfaz três salários ao longo
de um ano). “No meu caso
particular, as perdas maiores
foram a retirada da URP,
correspondente a R$ 600
por mês, e a transformação
da aposentadoria de integral
para proporcional, causando
um prejuízo de R$ 1.300
por mês. Isso tudo, aferido
ao longo de um ano, provoca
uma redução salarial em torno de R$ 24.000”.
Patrício não se constrange
de colocar, no papel, o tamanho da sua perda de poder
aquisitivo em razão das iniciativas do Estado brasileiro
contra os docentes aposentados. Em agosto de 2010 ele
percebeu R$ 5.439,38. Em
agosto do ano seguinte, R$
3.453,04. Em agosto de 2012
seus vencimentos subiram para
R$ 3.838,39 e em agosto deste
ano, para R$ 5.123,03. Ou seja,
passados três anos, ele está recebendo R$ 316,35 a menos.
Em agosto de 2010, docentes participaram do XV Encontro Nacional de Assuntos de Aposentadoria, na sede da APUFPR
89
Revista Andes Especial
Novembro de 2013
Uma luta e várias frentes de batalha
Há 15 anos – desde a aprovação da Emenda Constitucional
nº 20, do governo FHC –, o
ANDES-SN luta contra os ataques aos direitos dos docentes
aposentados. Sendo uma das
bandeiras de lutas aprovadas e
reafirmadas nos eventos deliberativos do sindicato, essa luta se
desenvolve em várias frentes: no
Congresso, nos tribunais, movimentos sociais, nas manifestações de rua e nas incontáveis audiências com o Poder Executivo.
Por entender que essa luta
envolve todos os servidores federais, o ANDES-SN
participa das atividades da
coordenação das Entidades
dos Servidores Públicos
Federais, no Fórum dos
Servidores Públicos e no
Espaço de Unidade e Ação. No
Legislativo, concentra-se na
aprovação da PEC 555/2006,
que propõe o “fim da con-
tribuição previdenciária dos
aposentados e pensionistas”,
e acompanha o PL do senador Paulo Paim, que trata da
inclusão dos docentes sobre a
equiparação do posicionamento
de aposentados e pensionistas
às tabelas remuneratórias dos
servidores da ativa.
No âmbito jurídico, participou no Mandado de Injunção
880 (aposentadoria especial e
contagem do tempo trabalhado
sob condições especiais e sua
conversão para aposentadoria
comum, no período pós-RJU),
julgado procedente pelo STF,
mas enfrenta obstáculos na implantação, o que levará a uma
luta no Parlamento pela aprovação dos PLC 472/09 e 555/10 e
a uma atuação no STF.
Segundo o professor responsável pela Encarregatura de
Assuntos de Aposentadoria do
ANDES-SN, Almir Serra, o
Almir acredita que adesão ao Funpresp causará prejuízo para os servidores
90
Revista Andes Especial
ataque mais recente veio com a
Lei nº 12.628/2012, do governo Dilma, regulamentando as
normas dos fundos de pensão
e criando as Fundações de
Previdências Complementares
do Servidor Público Federal
(Funpresps), fundações públicas de direito privado, para
gerir esses fundos.
No fim de setembro de
2013, reunidos com integrantes do governo, representantes
do ANDES-SN perceberam a
preocupação do governo com a
aceitação, por parte dos docentes, do material produzido pelo
sindicato (cartilha, panfleto e
cartazes) sobre o Funpresp e
que este material está provocando baixa adesão à fundação.
“O material denuncia o prejuízo que a adesão a esse fundo
significará para os servidores,
pois se trata da entrega de parte dos salários dos funcionários durante 30, 40 anos, para
uma empresa privada investir
no mercado, sem nenhuma garantia de retorno desse dinheiro e cuja resposta, se haverá
ou não algum retorno, se dará
no período em que o servidor
mais necessitará dele, que é
na aposentadoria. O resultado
que ficou da reunião é que o
ANDES-SN deve continuar
com a campanha Diga não à
Funpresp, atuando de forma
mais intensa”, diz o professor
Almir Serra.
Novembro de 2013