a influência da sociedade e da moral religiosa nas

Transcrição

a influência da sociedade e da moral religiosa nas
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
AMOR X DOR: A INFLUÊNCIA DA SOCIEDADE E DA MORAL RELIGIOSA NAS PERSONAGENS
FEMININAS EM “A DAMA DAS CAMÉLIAS” E “LUCÍOLA”
Adriana Célia Alves (UFU)
Aline Tavares e Soares Guimarães (UFU)
Andréa Landell Martinelli (UFU) 3
Márcio Issamu Yamamoto (UFU)
“A
influência não cria nada: ela desperta”, é esta reflexão de Gide é que vai nos
conduzir ao longo deste trabalho, mostrando que o processo de criação pode
se dar pela influência de outra obra, mas que isso não implica em cópia, e sim
em insights para o desenvolvimento de uma nova obra.
Para tal análise escolhemos nos restringir nas características do Romantismo do século
XIX, dando especial ênfase na influência que o Romantismo francês teve sobre o Romantismo
brasileiro, analisando duas obras bem conhecidas do período: “A dama das Camélias” de
Alexandre Dumas e “Lucíola” de José de Alencar.
A leitura dessas duas obras literárias nos levou a uma série de discussões principalmente
sobre a atualidade das personagens femininas nesses dois romances, o papel da cortesã da
sociedade do século XIX e a tentativa de quebrar estereótipos. Notamos também uma forte
influência da religião nas duas obras através da busca de redenção pelo amor puro ou mesmo
pela dor, que, nos dois casos, se desdobra em morte.
O romantismo... ici et ailleurs
O romantismo é um movimento filosófico, artístico e estético surgido na Alemanha e na
Inglaterra no final do século XVIII, mas que logo se espalhou por toda a Europa. Já no Brasil, o
romantismo aparece no século XIX coincidindo com manifestações libertárias e abolicionistas
como a independência política em 1822 no Segundo Reinado e a Guerra do Paraguai. Dessa
forma, temos o nacionalismo e a busca por uma identidade como umas das características
marcantes desse período. Além disso, podemos citar como características românticas o lirismo,
o sonho, o escapismo, a subjetividade, o pessimismo, a sensibilidade, a idealização da mulher, o
individualismo e a aventura.
No Brasil, a literatura torna-se mais popular, e com a vinda da família real, a impressa se
desenvolve propiciando a divulgação dos romances publicados em capítulos nos jornais da
época, os “romances folhetinescos” que difundem a literatura e atingem cada vez mais pessoas,
principalmente mulheres e o público jovem.
Na França, o movimento romântico surge e se desenvolve no desenrolar da Revolução
de 1789, sendo que esta se torna um mito para os escritores românticos 2, principalmente por
3
E-mail: [email protected]
Os principais escritores românticos são: Victor Hugo, Théophile Gautier, Gerard de Nerval, Alexandre Dumas o pai e o filho,
Alfred de Vigny, Alphonse de Lamartine e Jacques Michelet.
2
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
27
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
trazer a noção de indivíduo essencial, que reivindica a singularidade e a originalidade de cada
pessoa.
Les sentiments transmis sont toujours relatives à son état d’âme: la tristesse, la
douceur, la solitude, l´amour, le chagrin, le couer, les larmes, la douler…3
E são essas características, incluindo também a religiosidade, que encontraremos nas
comparações das obras românticas “Lucíola”, de José de Alencar, e “La Dame aux Camelias” de
Alexandre Dumas Filho.
Os autores, as obras e as personagens... algumas comparações
O papel social da mulher e da cortesã no século XIX
A sociedade do século XIX era apoiada em bases religiosas cristãs, em que a família era
do tipo patriarcal, na qual as mulheres da época eram responsáveis pelos serviços domésticos,
pela reprodução e a educação dos filhos. Como se comprova no depoimento de Louisa Garret
Anderson, mulher que viveu no século XIX.
Permanecer solteira era considerado uma desgraça e aos trinta anos uma mulher
que não fosse casada era chamada de velha solteirona. Depois que seus pais
morriam, o que elas podiam fazer, para onde poderiam ir? Se tivessem um irmão,
poderiam viver em sua casa, como hóspedes permanentes e indesejados. Algumas
tinham que se manter e, então, as dificuldades apareciam. 4 5
Desta forma qualquer manifestação feminina que se desviasse dos patrões pré–
estabelecidos pela sociedade patriarcal era vista com maus olhos. Além disso, a virgindade era
considerada fator de orgulho e definição da chamada “boa moral”, pois ser virgem era sinal de
honestidade. Ao tomar como tema as “mulheres cortesãs”, Alencar e Dumas denunciam a visão
cruel que a sociedade tinha das prostitutas.
– Quem é esta senhora? Perguntei a Sá.
– Não é uma senhora, Paulo! É uma mulher bonita. Queres conhecê-la? 6
No século XIX a alta sociedade foi invadida pelos elegantes bailes, pelas apresentações
de óperas, festas, passeios, cafés e bares. Nesse contexto vemos presente a figura da cortesã. A
cortesã é uma mulher cuja profissão é o amor e cujos clientes podem ser mais ou menos
distintos, ela escolhe seus amantes. A maioria delas tinha seu próprio hotel, cavalos e
carruagens, jóias, roupas e muita influência sobre os homens da época. Como podemos ver na
3
“Os sentimentos transmitidos são sempre relativos à seu estado de alma: a tristeza, a doçura, a solidão, o amor, o pesar, o
coração, as lágrimas, a dor...”, extraído de um texto encontrado no site: <http://www.geocities.com/sania_eq/
romantisme_literature.html>.
4
Depoimento de Louisa Garrett Anderson, escrito de 1860. Disponível em: <http://www.planetaeducacao.com.br/novo/
artigo.asp?artigo=203>.
5
DUMAS FILHO, Alexandre. La dame aux Camélias. (TIRADO DO LIVRO ONLINE)
6
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Editora Ática S.A., 1978. p. 12.
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
28
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
descrição de Alexandre Dumas em Dama das Camélias:
Or, s’il y a une chose que les femmes du monde désirent voir, et il y avait là des
femmes du monde, c’est l’intérieur de ces femmes, dont les équipages
éclaboussent chaque jour le leur, qui ont, comme elles et à côté d’elles, leur loge à
l’Opéra et aux Italiens , et qui étalent, à Paris, l’insolente opulence de leur
beauté, de leurs bijoux et de leurs scandales.(p. 10) 7
Il n’en était pas ainsi pour Marguerite. Elle arrivait aux Champs-Élysées toujours
seule, dans sa voiture, où elle s’effaçait le plus possible, l’hiver enveloppée d’un
grand cachemire, l’été vêtue de robes fort simples… Ses deux chevaux
l’emportaient rapidement au Bois. Là, elle descendait de voiture, marchait
pendant une heure, remontait dans son coupé, et rentrait chez elle au grand trot
de son attelage. 8 9
O preconceito com as cortesãs pode ser percebido em toda sociedade do século XIX,
Lúcia, personagem de José de Alencar, é o exemplo de uma mulher inspirada nas cortesãs da
época, assim percebemos a própria personagem com consciência desse preconceito. Vemos
que tanto Alencar quanto Dumas exibem de forma crítica a sociedade da época, pois “A
sociedade que renega os vícios e a mesma que os alimenta”. 10
– Ah, esquecia que uma mulher como eu não se pertence; é uma coisa pública, um
carro de praça, que não pode recusar quem chega. Estes objetos, este luxo, que
comprei muito caro também, porque me custaram vergonha e humilhação, e nada
disto é meu. 11
Que importa? Contanto que tenha gozado de minha mocidade! De que serve a
velhice de mulheres como eu?
Porque lhe falaste nesse tom? Naturalmente a trataste por senhora como da
primeira vez; e lhe fizeste duas a três barretadas. 12
A religiosidade nas obras românticas “La dame aux camélias” de Alexandre Dumas e “Lucíola” de
José de Alencar
7
“Ora, se há algo que as mulheres da alta roda - é a intimidade dessas mulheres, cujo séqüito macula a cada dia os seus, que
têm, como dama da sociedade, o seu assento no Opéra e no Theâtre Italiens e que espamarram, em Paris, a insolente
opulência de sua beleza, de suas jóias e de seus escândalos.” Tradução: DUMAS FILHO, Alexandre. A dama das Camélias.
Porto Alegre: Editora L&PM. 2004. p. 10.
8
FILHO DUMAS, Alexandre. A dama das Camélias. São Paulo: Editora. p. 15.
9
“Não era assim com Marguerite. Ela chegava na Champs-Élysées sempre só, no seu veiculo, onde fazia o possível para não
chamar a atenção: no inverno, enrolada em uma grande caxemira, no verão com vestidos bem simples... Ela não passeava em
círculos na avenida Champs-Élysées, como fazem e faziam todas as suas colegas. Seus dois cavalos levaram rapidamente ao
Bois. Lá descia da condução, caminhava durante uma hora, tornava a subir no cupê e voltava para casa ao trote de sua
parelha.”
10
ANDRADE, Juliana Cristina; SILVA, Francis Pauline Lopes. A prostituta na literatura: contestação e denúncia. Disponível em:
<http://www.ichs.ufop.br/conifes/anais/LCA/lca2701.htm>.
11
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Editora Ática S.A., 1978. p. 68.
12
Idem, p. 20
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
29
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
A religiosidade, sendo uma das características do Romantismo como movimento
literário, permeia os romances de Dumas e Alencar em todas as esferas sobressaindo-se através
dos personagens, da sociedade, bem como da alma humana e suas limitações.
Os autores apresentam suas personagens, não só como cortesãs de uma sociedade do
século XIX, mas também como símbolos da condição humana que abriga em um só ser, o bem e
o mal, o pecado e a redenção, o ser transgressor e o ser indulgente.
Ao mesmo tempo em que dá indícios de que o amor divino redime e transforma o
homem como ser espiritual, Dumas questiona, em sua obra, quanto a se perdoar os
transgressores, já que o exemplo de Cristo era o do perdão diante da pecadora Maria Madalena.
Le christianisme est là avec sa merveilleuse parabole de l'enfant prodigue pour
nous conseiller l'indulgence et le pardon. Jésus était plein d'amour pour ces âmes
blessées par les passions des hommes, et dont il aimait à panser les plaies en
tirant le baume qui devait les guérir des plaies elles-mêmes. Ainsi, il disait à
Madeleine: ‘Il te sera beaucoup remis parce que tu as beaucoup aimé’, sublime
pardon qui devait éveiller une foi sublime.
Pourquoi nous ferions-nous plus rigides que le Christ? Pourquoi, nous en tenant
obstinément aux opinions de ce monde qui se fait dur pour qu'on le croie fort,
rejetterions-nous avec lui des âmes saignantes souvent de blessures par où,
comme le mauvais sang d'un malade, s'épanche le mal de leur passé, et
n'attendant qu'une main amie qui les panse et leur rende la convalescence du
cœur? (L.D.A.C., p. 19) 13
No Romance de José de Alencar, essa postura indulgente se manifesta mais
explicitamente na opção de Paulo em aceitar a identidade de Lúcia como sendo sua também,
não no aspecto devasso, mas no de redenção. Contudo essa verdade não é mais evidente na fala
daquele, senão na desta. Ao aceitar a vida com Lúcia, ele abdica do privilégio de constituir uma
família, ou uma vida em sociedade de uma forma tradicional, com o leito imaculado. Ele se torna
o “salvador” daquela que era rejeitada, desprezada e rechaçada por uma sociedade que defendia
a integridade moral de seus indivíduos.
Não te desprezo, tenho pena de ti. (L., p. 46)
Quando ela colou a sua boca na minha pareceu-me que todo o meu ser se difundia
na ardente inspiração; senti fugir-me a vida, como o líquido de um vaso haurido em
ávido e longo sorvo. (L., p. 47)
Esta metáfora usada por Alencar exemplifica a doação da vida de Paulo para seu amor,
Lúcia. “... obrigando-o a sacrificar –lhe a honra, a dignidade, o sossego, bens que ela não
possui...” (p.55) “...Não sou eu criatura tua? Não renasci pela luz que derramaste em minha
13
“O Cristianismo está presente com sua maravilhosa parábola do Filho Pródigo para nos aconselhar à indulgência e ao
perdão. Jesus tinha muito amor por essas almas feridas pelas paixões dos homens. Ele amava tratar suas feridas tirando delas
o bálsamo que seria capaz de curá-las profundamente. Assim ele dizia à Madalena: “Muito te será dado, porque muito
amaste,” sublime perdão que deveria despertar uma fé sublime. Por que nós seriamos mais rígidos do que o Cristo? Por que
aceitaríamos tão obstinadamente a opinião deste mundo que se faz duro para que o acreditemos forte. Rejeitaríamos assim as
almas sangrando pelas feridas por onde se esgota o mal de ser passado, que esperam somente uma mão amiga que não os
cure e lhes devolva a convalescência do coração?” (tradução nossa).
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
30
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
alma? Não és meu senhor? meu artista, meu pai e meu criador?” (L. p.121)
Esses autores também denunciam o meio em que vivem essas pessoas. Dumas, ao
comentar o status das madames e senhores quando da venda das posses de Marguerite, critica a
postura hipócrita daquela sociedade. Alencar a delata como uma sociedade moralista. Porém
não se conformando com este “mal do século”, eles propõem um caminho diferente daquele
que suas sociedades estavam seguindo: o da hipocrisia vestida de falso moralismo religioso.
Se tivesse ao meu lado o Sr. Couto, estou certo que ele me aconselharia para as
ocasiões difíceis uma reticência. Com efeito, a reticência não é a hipocrisia no livro,
como a hipocrisia é a reticência na sociedade?(L., p. 38).
C'est à ma génération que je m'adresse, ...La science du bien et du mal est à
jamais acquise; la foi se reconstruit, le respect des choses saintes nous est rendu,
et si le monde ne se fait pas tout à fait bon, il se fait du moins meilleur. Les efforts
de tous les hommes intelligents tendent au même but, et toutes les grandes
volontés s'attellent au même principe: soyons bon, soyons jeune, soyons vrais! Le
mal n'est qu'une vanité, ayons l'orgueil du bien, et surtout ne désespérons pas. Ne
méprisons pas la femme qui n'est ni mère, ni sœur, ni fille, ni épouse. Ne
réduisons pas l'estime à la famille, l'indulgence à l'égoïsme. Puisque le ciel est
plus en joie pour le repentir d'un pécheur que pour cent justes qui n'ont jamais
péché, essayons de réjouir le ciel. Il peut nous le rendre avec usure. Laissons sur
notre chemin l'aumône de notre pardon à ceux que les désirs terrestres ont
perdus, que sauvera peut-être une espérance divine, et, comme disent les bonnes
vieilles femmes quand elles conseillent un remède de leur façon, si cela ne fait
pas de bien, cela ne peut faire de mal. (L. D. A. C., p. 20) 14
Por meio da personagem, Alencar tenta, na fala de Lúcia, quebrar o paradigma religioso
da época e mostra que o livro favorito de Lúcia era a própria Bíblia. Nas entrelinhas, ele critica os
moralistas de então e propõe uma nova forma de se ver o que era analisado de uma forma
legalista, sem compaixão e amor. Ou seja, como poderia uma cortesã ter como leitura predileta
um livro sagrado que a exortaria a uma conduta regrada diferente daquela em que Lúcia vivia? A
cortesã que luta contra suas limitações na obra literária, não representa simplesmente a
limitação de uma meretriz, mas sim aquela da própria humanidade com seus dilemas
existenciais, morais e espirituais. Mulheres como Lúcia e Marguerite personificam não só a
licenciosidade das mulheres daquela época, mas também a dualidade humana de lutar e decidir
entre assumir condutas que levem ao bem ou ao mal.
Ao mesmo tempo em que os autores pintam a imagem dessas mulheres como virginais,
inocentes e puras, eles também revelam a concupiscência da carne que as leva a viver de
maneira dissoluta. “Tens razão, Laura, perdi a vergonha para ganhar o dinheiro de que
14
“É a minha geração que eu me dirijo,... A ciência do bem e do mal nunca é adquirida; a fé se reconstrói; o respeito às coisas
santas nos é devolvido e se o mundo não se faz completamente bom, ele se faz pelo menos melhor. Os esforços de todos os
homens bons se dirigem para o mesmo objetivo, e todas as grandes vontades se atrelam ao mesmo princípio: sejamos bons,
sejamos jovens, sejamos verdadeiros! O mal é somente uma vaidade, tenhamos orgulho em fazer o bem e sobretudo não nos
desesperemos. Não desprezemos a mulher que não é mãe, irmã, filha, nem esposa. Não produzamos a amizade somente a
família, à indulgência, ao egoísmo. Uma vez que o céu fica mais feliz pelo arrependimento de um pecador do que por cem
justos que nunca pecaram, tentemos agradá-lo. Deixemos sobre nosso caminho a dádiva do nosso perdão àqueles que os
desejos terrestres fizeram se perder, que salvará talvez uma esperança divina, e como diz o ditado popular: se o remédio não
faz bem, ele não pode fazer mal. (tradução nossa).
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
31
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
precisas; e desci a este ponto, Nina, desde que me habituei a desprezar o insulto, tanto como o
corpo que nós costumamos vender.” (p.44)
A apresentação desses estereótipos contrapondo-se à religiosidade remete a imagem
das prostitutas e santas que a tradição judaica cristã traz para a civilização ocidental: Maria
Madalena, a prostituta redimida, e Maria, a mãe de Cristo.
Comment sa vie ardente laissait-elle au visage de Marguerite l'expression
virginale, enfantine même qui le caractérisait, c'est ce que nous sommes forcé de
constater sans le comprendre. (L.D.A.C., p. 11) 15
[...] Mas se me voltava para aquela fisionomia doce e calma, perfumada com uns
longes de melancolia; se encontrava o seu olhar límpido e sereno; se via o gesto
quase infantil, o sorriso meigo e a atitude singela e modesta [,..](L., p. 18)
Ao retroceder no tempo e na história, observamos que esta imagem da Virgem Maria
pode corresponder à imagem das deusas da mitologia grega e romana, que ora são defensoras
do casamento, da família e do lar, ora são as deusas do amor carnal, do prazer libidinoso, às
vezes incestuoso.
Lembremo-nos de Afrodite e Vênus, entre outras que, posteriormente serão absorvidas
pela tradição judaico-cristã simbolizando a virgem Maria ou Nossa Senhora. Daí a possibilidade
de interpretarmos a imagem da Nossa Senhora da Glória, no primeiro encontro de Paulo com
Lúcia, no Rio de Janeiro, e a descrição tão ambígua da “Senhora Lúcia” e da “Cortesã Lúcia”,ou
“Lúcifer”, estrela caída, como diriam os amigos de Sá.
[...] À mais leve resistência dobrava-se sobre si mesmo como uma cobra, e os
dentes de pérola talhavam mais rápidos do que a tesoura o cadarço de seda que lhe
opunha obstáculos...e eu vi aparecer aos meus olhos pasmos, nadando em ondas
de luz, no esplendor de sua completa nudez, a mais formosa bacante que esmagara
outrora com o pé lascivo as uvas de Corinto.” (L., p. 24-5)
A mensagem central, proveniente da fé cristã, a que os autores fazem alusão é a do
amor sacrificial e do perdão incondicional o qual o homem não merece, podendo, contudo,
receber.
O sacrifício que tanto Marguerite como Lúcia fazem em prol do amor puro, místico e
transcendental é o que leva à purificação da alma e, aos olhos humanos, serve como “preço”
pago pelos pecados outrora cometidos pelo pecador, elevando-o até mesmo a um status de
deificação.
Celle chez qui me trouvais était morte: les femmes les plus vertueuses pouvait
donc pénétrer jusque dans sa chambre. La mort avait purifié l'air de ce cloaque
splendide,... Malheureusement les mystères étaient morts avec la déesse, et,
malgré toute leur bonne volonté, ces dames ne surprirent que ce qui était à
15
“Como é que o seu ardente viver deixava no rosto de Margarida a expressão virginal, infantil até, que o caracterizava, é o
que somos obrigados a afirmar sem o perceber.”
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
32
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
vendre depuis le décès,[...] ”(L.D.A.C., p. 2) 16
Estas páginas foram escritas ...para lhe transmitir um perfume da mulher sublime,
que passou na minha vida como sonho fugace.
Há nos cabelos da pessoa que se ama não sei que fluido misterioso, que comunica
com o nosso espírito. A senhora há de amar Lúcia, tenho a certeza; talvez pois
aquela relíquia, ainda impregnada de seiva e fragrância da criatura Angélica, lhe
revele o que eu não pude exprimir. (L., p. 128)
As obras e as personagens
É interessante observar o trabalho que os autores desenvolvem, uma vez que ambas as
obras, lingüísticamente, são muito bem escritas, tendo em vista a construção dos diálogos, o
desenvolvimento das descrições tanto das personagens como da sociedade da época e o
vocabulário escolhido. Esses são procedimentos encontrados pelos autores para fazer um
retrato da sociedade carioca e parisiense de acordo com a visão de cada um deles.
As histórias têm um narrador semelhante, ambas são contadas por pessoas que
‘ouviram’ relatos de outrem e receberam a incumbência de redigir um livro relatando a história
de vida de duas mulheres admiradas pela sociedade, apesar de serem conhecidas por sua
profissão: cortesãs.
A descrição das personagens é outro aspecto similar nas duas obras. Paulo descreve
Lúcia como um ser puro, cândido, limpo, sempre demonstrando alto grau de admiração por ela,
como podemos observar nos trechos abaixo:
[...] uma linda moça, que parara um instante para contemplar no horizonte as
nuvens brancas esgarçadas sobre o céu azul e estrelado. Admirei-lhe do primeiro
olhar um talhe esbelto e de suprema elegância. O vestido que o moldava era
cinzento com orlas de veludo castanho e dava esquisito realce a um desses rostos
suaves, puros e diáfanos, que parecem vão desfazer-se ao menor sopro, como os
tênues vapores da alvorada. Ressumbrava na sua muda contemplação doce
melancolia e não sei que laivos de tão ingênua castidade, que o meu olhar
repousou calmo e sereno na mimosa aparição. 17 (grifo nosso).
Uma encantadora menina, sentada ao lado de uma senhora idosa, se recostava
preguiçosamente sobre o macio estofo, e deixava pender pela cobertura derreada
do carro a mão pequena que brincava com um leque de penas escarlates. Havia
nessa atitude cheia de abandono muita graça; mas graça simples, correta e
harmoniosa; não desagarro com ares altivos, decididos, que afetam certas mulheres
à moda.
No momento em que passava o carro diante de nós, vendo o perfil suave e delicado
que iluminava a aurora de um sorriso raiando apenas no lábio mimoso, e a fronte
límpida que à sombra dos cabelos negros brilhava de viço e juventude, não me
pude conter de admiração.
Durante que se desimpedia o caminho, tínhamos parado para melhor admirá-la; e
16
“Aquela em casa de quem eu me encontrava, já morrera; as mais virtuosas senhoras podiam por conseguinte penetrar no
seu quarto. A morte purificara o ar dessa casa esplêndida ,... Infelizmente os mistérios tinham morrido com a deusa, e, apesar
de toda a sua boa vontade, essas senhoras não surpreendem senão o que estava para se vender depois do óbito,...”
17
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo. Editora Moderna. 1998. p. 19.
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
33
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
então ainda mais notei a serenidade de seu olhar que nos procurava com ingênua
curiosidade, sem provocação e sem vaidade[...] 18 (grifo nosso)
Essa atitude descritiva segue em toda obra, um artifício utilizado para que o leitor
também admire a personagem. Esse artifício é utilizado, de forma muito similar, na obra de
Alexandre Dumas Filho, Marguerite também é descrita como exemplo de beleza, candura e
simplicidade:
[...] et avoir alors remarque en elle une distinction peu commune à ses
semblables, distinction que rehaussait encore une beauté vraiment
exceptionnelle. 19
Grande et mince jusqu’à l’exagération, elle possédait au suprême degré l’art de
faire disparaître cet oubli de la nature par le simple arrangement des choses
qu’elle révélait. 20
La tête, une merveille, était l’objet d’une coquetterie particulière. Elle était toute
petite, et sa mère, comme dirait de Musset, semblait l’avoir faite ainsi pour la
faire avec soin. 21
Comment sa vie ardente laissait-elle au visage de Marguerite l’expression
virginale, enfantine même qui le caractérisait, c’est ce que nous sommes forcés
de constater sans le comprendre. 22 23 (grifo nosso)
Quando lemos as duas obras e nos dispomos a observar os pontos em comum,
percebemos que Marguerite e Lúcia têm personalidades e atitudes muito parecidas: a vida de
prostituição, o desejo de redenção, a mudança de vida pelo sofrimento, a separação da alma
pura e do corpo impuro através da morte. Acrescentamos ainda, a personalidade forte de Lúcia,
pois mesmo não ‘merecendo’ o amor puro de Paulo, ela resolve fazer uma mudança completa
de vida, muda-se para o campo para viver ‘dignamente’ ao lado da irmã, como podemos
comprovar através dos trechos a seguir:
– Amanhã mudo-me. Venha-me buscar ao romper do dia. Desejo... careço de
entrar apoiada ao seu braço na casa onde vou viver a minha nova existência. 24 (grifo
nosso)
Lúcia não poderia aceitar o amor de Paulo, mas gostava de tê-lo sempre por perto, pois
18
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Editora Moderna, 1998. p. 21.
“... e ter então notado nela uma certa distinção pouco vulgar entre as suas semelhantes, distinção que era ainda realçada
pela sua beleza verdadeiramente excepcional.” (tradução nossa)
20
“Alta e magra até quase exagerar, possuia no supremo grau a arte de fazer desaparecer esse esquecimento da natureza pelo
modo singelo com que arranjava as coisas que a revestiam.” (tradução nossa)
21
“A cabeça, uma maravilha, era objeto de uma garridice espetacular. Era pequenina, e sua mãe, como diria Musset, parecia
tê-la feito assim para a fazer com mais perfeição.” (tradução nossa)
22
DUMAS FILHO, Alexandre. A dama das Camélias.
23
“Como uma vida ardente ainda deixou em Marguerite uma expressão virginal, e até mesmo infantil, que somos obrigados a
constatar sem entender.” (tradução nossa)
24
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo. Editora Moderna. 1998. p. 107.
19
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
34
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
os olhos de Paulo sempre a olhavam com brandura, simplicidade e admiração.
– Paulo! Paulo... Tu bem sabes que com essa palavra me farias cometer crimes, se
crimes fossem necessários para te provar que eu só vivo da vida que me dás, e me
podes tirar com um sopro. Não sou eu criatura tua? Não renasci pela luz que
derramaste em minha alma? Não és meu senhor, meu artista, meu pai e meu
criador? 25
É com estas palavras que percebemos a influência da presença de Paulo na vida da excortesã, e também uma imagem cristã: renascer pela luz.
Marguerite, decide mudar de vida com o amor de Armand Duval, mas quando é
obrigada a deixá-lo, ela decide voltar a vida antiga, como observamos no bilhete que ela envia
terminando o relacionamento:
A l’heure ou vous lirez cette lettre, Armand, je serai déjà la maîtresse d’un autre
homme. Tout est donc fini entre nous. Retournez auprès de votre père, mon ami,
allez revoir votre sœur, jeune fille chaste, ignorante de toutes nos misères, et
auprès de laquelle vous oublierez bien vite ce que vous aura fait souffrir cette
fille perdue que l’on nomme Marguerite Gautier, que vous avez bien voulu aimer
un instant, et qui vous doit les seuls moments heureux d’une vie qui, elle l’espère,
ne sera pas longue maintenant. 26
É possível observar ainda nesse trecho que Marguerite deseja morrer e faz de tudo para
que isso aconteça bem rápido, por isso volta à vida de cortesã, aos bailes e às orgias. Ela prefere
morrer à continuar a viver sem a presença de Armand.
Outras comparações
Duas passagens significativas dos romances “Lucíola” e “A dama das Camélias” nos levam
a refletir a respeito da semelhança entre as duas obras. A primeira passagem pode ser
encontrada no capitulo XV do livro “Lucíola” 27 e a segunda no capitulo III de “A dama das
Camélias” 28, sendo que ambas têm em um objeto, um livro, o centro da tensão de ambos
capítulos.
Começando pela comparação que nos parece mais visível, temos no capitulo XV de
“Lucíola” um interessante acontecimento: em uma de suas costumeiras visitas à casa de Lúcia,
Paulo se depara com uma situação que lhe chama atenção: “Chegando uma tarde vi Lúcia
assustar-se e esconder sob amplas dobras do vestido um objeto que me pareceu um livro” 29.
A novidade não se dá pelo ato de leitura da cortesã, e sim pela tentativa de esconder o
25
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo. Editora Moderna. 1998. p. 114.
“À hora em que ler esta carta, Armand, eu serei amante de outro homem. Está tudo acabado entre nós. Volte para junto de
seu pai, vá tornar a ver sua irmã, casta menina que ignora todas as nossas misérias, e junto da qual bem depressa esquecerá
as dores que lhe infligiu esta mulher perdida que se chama Marguerite Gautier, que se dignou amar por um instante, e que
lhe deve os únicos momentos felizes de uma vida, essa a esperança que ela tem, que já agora não será longa.” (tradução
nossa)
27
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Editora Ática S.A., 1978. 128 p.
28
FILHO, Alexandre Dumas. A Dama das Camélias. São Paulo: Editora Brasileira LTDA, 1963. (?)
29
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Editora Ática S.A., 1978. p. 82.
26
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
35
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
que estava lendo e depois, ainda maior admiração, pela obra que estava lendo: “Era um livro
muito conhecido – A Dama das Camélias”30. Não podemos supor que o pensamento do
personagem seja um recado do próprio José de Alencar sobre a influência que sofreu de
Dumas 31, mas podemos inferir que pelo menos a intenção era de mostrar a tentativa de busca
de um “espelho” na cortesã de Dumas pela própria Lúcia:
Muitas vezes lê-se, não por hábito ou distração, mas pela influência de uma
simpatia moral que nos faz procurar um confidente de nossos sentimentos, até nas
páginas mudas de um escritor.Lúcia teria, como Margarida, a aspiração vaga para o
amor? Sonharia com as afeições puras do coração? 32
Neste momento é importante estabelecer a ligação da obra de Alencar com a de Dumas,
uma vez que no capítulo III de “A Dama das Camélias”, o narrador trata com especial atenção
um livro da cortesã que havia sido leiloado. Trata-se de Manon Lescaut de Giacomo Puccini 33, e
o título chama tanta atenção quanto a dedicatória que havia na primeira página.
Não se torna clara a intenção do narrador na compra de tal livro, mas a análise que faz
dele, se ocupando de alguns parágrafos nos levam a pensar que, assim como na obra de José de
Alencar, Alexandre Dumas Filho nos queria dar uma pista a respeito da construção da
personagem de Marguerite ou até mesmo mostrar a influência que teria recebido de Puccini.
Nas palavras do narrador:
Manon Lescaut est une touchante histoire (…) Manon était morte dans un
désert, il est vrai, mais dans les bras de l’homme qui l’aimait avec toutes les
énergies de l’âme, qui, morte, lui creusa une fosse, l’arrosa de ses larmes et y
ensevelit son cœur; tandis que Marguerite, pécheresse comme Manon, et peut-être
convertie comme elle, était morte au sein d’un luxe somptueux, s’il fallait en
croire ce que j’avais vu, dans le lit de son passé, mais aussi au milieu de ce désert
du cœur, bien plus aride, bien plus vaste, bien plus impitoyable que celui dans
lequel avait été enterrée Manon” 34 35
Mas não é só o narrador que faz a comparação de Marguerite com Manon, a própria
Marguerite o faz no capítulo XVII do mesmo livro na versão francesa original 36. Nas palavras de
Armand: “Elle me disait toujours que lorsqu’une femme aime, elle ne peut pas faire ce que
faisait Manon...”. Mesmo que a comparação seja de forma a rejeitar a semelhança, tornando o
30
Idem, p.83.
Segundo muitos críticos, como Joaquim Nabuco, a obra de Alencar não passa de uma cópia do romance francês, para tal
vide: <http://www.dacex.ct.utfpr.edu.br/angela.htm>.
32
Pensamentos de Paulo sobre o motivo que teria levado Lucia a escolher tal romance para leitura. ALENCAR, José de.
Lucíola. São Paulo: Editora Ática S.A., 1978. p. 83.
33
Giacomo Puccini é autor da ópera entitulada Manon Lescaut.
34
FILHO, Alexandre Dumas. A dama das Camélias. São Paulo: Editora Brasileira LTDA, 1963. p. 255. (As palavras em negrito
são para reforço da comparação)
35
“Manon Lescault é sem dúvida uma tocante história (...) Manon morrera num deserto, é verdade, mas morrera nos braços
do homem que a amava com todas as energias de sua alma, que lhe abriu a cova, regou-a com suas lágrimas, e nela sepultou
o seu próprio coração; enquanto Margarida, pecadora como Manon, e talvez convertida como esta, morrera no seio de um
luxo suntuoso, a avaliar pelo que eu vira, no leito do seu passado, mas também no meio desse deserto do coração, muito
mais árido, muito mais vasto, muito mais despiedoso do que aquele em que fora sepultada Manon.”
36
Disponível em: <http://fr.wikisource.org/wiki/La_Dame_aux_cam%C3%A9lias>. Acesso em: 2 abr. 2008.
31
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
36
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
exemplo de Manon um oposto do que Marguerite considerava como amor, temos de ressaltar
esse trecho da obra uma vez que nos remete à mesma atitude de Lúcia ao se comparar com
Marguerite.
Isso se dá a partir da leitura de “Dama das Camélias” por Lúcia. Ela nega a possibilidade
de que um dia amaria, uma vez que o amor não pode ter vínculos com o prazer carnal, do
contrário seria confundido com um vício. Para Margarida isso já se daria de outra forma: o amor
puro e verdadeiro purificaria o corpo de pecado e este pensamento é reforçado nas palavras de
Gustavo: “... a inocência das mulheres pertence ao primeiro amor e não ao primeiro amante”. 37
Lúcia ainda enfatiza a distância entre o prazer e o amor:
O que há de real e de melhor na vida é o prazer, e esse dispensa o coração. O
prazer que se dá e recebe é calmo e doce, sem inquietação e sem receios. Não
conhece o ciúmes que desenterra o passado. (...) Quando lhe ofereço um beijo
meu, que importa ao senhor que mil outros tenham tocado o lábio que o provoca?
A água lavou a boca, como o copo que serviu ao festim; e o vinho não é menos
bom, nem menos generoso, no cálice usado, do que no cálice novo.
Mas o tom – descrito por Paulo – com que Lúcia diz estas palavras e depois ainda como
confirma a Paulo que nem ela é Marguerite e nem Paulo é Armando, soa a Paulo como uma
“solenidade que me pareceu caricata” 38. Lúcia não aceita o que Marguerite considera como
amor, mas o nervosismo descrito pelo personagem quando Lúcia diz: “O amor! O amor para
uma mulher como eu seria a mais terrível punição que Deus poderia infligir-me” e também pela
pergunta que faz a Paulo “E podemos nós ser amadas de outro modo? Como? Arrependendonos, e rompendo com o passado?”, nos levam a crer que a personagem busca sua “forma de
amar”, mesmo que sendo rejeitando a posição de Margarida que, uma cortesã como ela,
escolheu o amor.
A riqueza encontrada nesses dois trechos das obras nos deixam claro o espelhamento
que ambos autores buscaram em outras obras para a criação ou mesmo para a justificativa da
ação das personagens, que nos dois casos negam tomar rumos parecidos com as personagens
dos livros que lêem. De qualquer forma, a influência de uma obra na outra só nos mostra a
riqueza do que pode ser despertado a partir de uma leitura, sem que se rotule qualquer uma
delas como um mero plágio.
REFERÊNCIAS:
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Ática, 1981. 128 p.
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Ed. Moderna, 1998. 120 p.
ALENCAR, José. Lucíola. 5. ed. São Paulo: Ática, 1978. 128 p.
CANDIDO, Antonio; CASTELO, Aderaldo. Romantismo. In: ___. Das Origens ao romantismo. 2. ed. São Paulo:
Difusão Européia do Livro, 1966.
37
A conversa se dá entre Gustavo, Nichette e Margarida, esse trecho não é encontrado no livro original em prosa, somente na
adaptação do romance ao teatro. Vide: FILHO, Alexandre Dumas. A dama das Camélias. Peça em 5 atos. São Paulo: Editora
Brasiliense. Cena III, p. 56
38
ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo: Editora Ática S.A., 1978. p. 85.
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
37
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes
DUMAS FILHO, Alexandre. A dama das Camélias. v. 11. Peça em 5 atos. São Paulo: Editora Brasiliense. 108 p.
DUMAS FILHO, Alexandre. La dame aux Camélias. 10. ed. Project Gutenberg G-TM Ebooks. Disponível
em: <http://www.gutenberg.org/etext/2419>. Acesso em: 19 abr. 2008. Disponível em:
<http://fr.wikisource.org/wiki/La_Dame_aux_cam%C3%A9lias>. Acesso em: 02 abr. 2008.
MENDES, Oscar. José de Alencar: romances urbanos. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1965.
A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 1, n. 1, p. 27-38, jan./jun. 2008
38