Revista Nº 23 2010

Transcrição

Revista Nº 23 2010
ano 11 • Nº 23 • anual • 2010
índice
Capa e contracapa: concelho de Alter do Chão
NOTICIAS DA ALMA
14º Aniversário...........................................56
Deputada Paula Santos visitou o
CD do Laranjeiro........................................56
A Palavra ao Presidente da Associação.........3
Com o Alentejo na pegada.............................5
Por não ter nada e tudo querer......................7
Saramago:
Hino ao Poder da Simplicidade.......................9
PREC - Cantar a Revolução no Alentejo........12
CONCELHO DE ALTER DO CHÃO
Uma visão, para um futuro melhor!.............17
Património Histórico....................................19
Arqueologia..................................................22
Tradição.......................................................25
Gastronomia................................................26
Fundação Alter Real.....................................28
2
Homenagem Dr. Simas Abrantes.................33
CNIS, UDIPSS e
Assembleia da República............................57
As Cantadeiras e a
Companhia de Dança de Almada...............57
Lançamento do CD
“O Alentejo não tem fim”............................58
XII Feira do Alentejo....................................60
CULTURA
“Associatvismo, Património e Cidadania”
Um livro de Luis Maçarico............................69
Francisco Naia e
“A Ronda Campaniça”...............................70
“Retalhos da Manta”
Poemas de Joaquim Guiomar......................70
“Uma infância amarga e doce
no Alentejo” de José Russo.........................71
Tratado do Cante........................................41
Cante Alentejano
Um registo importante...............................71
Alentejo em foto .........................................50
A República e a luta das mulheres...............73
Ficha Técnica
Propriedade: Alma Alentejana, Associação para o Desenvolvimento,
Cooperação e Solidariedade Social
Sede: Av. Prof. Ruy Luís Gomes, 13 - R/c - Laranjeiro - 2810-274 Almada
Telefone / Fax: 212 551 296 Email: [email protected]
Redacção: Av. Prof. Ruy Luís Gomes, 13 - R/c - Laranjeiro - 2810-274
Almada
Director: António Oliveira
Director editorial: Luís Maçarico
Coordenação: José Rabaça e José Moutela
Colaborador Técnico: Hélio Heitor
Publicidade: Alma Alentejana
Tiragem: 2000 exemplares
Fotolito, produção gráfica e paginação: Tipografia Lobão, Lda.
A Alma Alentejana Revista Cultural, não se responsabiliza pelas opiniões expressas pelos seus colaboradores
A PALAVRA AO PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO
A sustentabilidade das IPSS,
enquanto instituições sem fins
lucrativos, está em perigo e todo
o apoio solidário é bem-vindo.
Tenhamos consciência que, hoje,
o grande capital não se sente obrigado a fazer
quaisquer concessões. Daí os PEC’s e a
orientação no sentido da privatização de tudo
o que pode dar lucro, desde a saúde, o ensino,
a segurança social, a água, etc. Por este andar
qualquer dia até temos que pagar o ar que
respiramos.
A falta de receitas próprias, um sistema de
financiamento preverso que teimosamente é
mantido sem actualização face à realidade
dos custos fixos (queiramos ou não estamos
nas mãos da segurança social e as orientações
do grande capital em curso nos vários países
da EU são de cortar nos direitos sociais tão
duramente conquistados por muitas gerações
ao longo do século passado) o aumento do
Iva, as baixas reformas dos nossos utentes, a
não actualização em 2010 do subsídio que
legalmente nos é devido pela segurança social
estão a estrangular a Alma Alentejana.
O papel insubstituível das IPSS, particularmente as desligadas de qualquer instituição
de caracter religioso ou às Misericórdias,
substituindo o Estado no cumprimento dos
seus deveres sociais constitucionalmente
3
É preciso falar claro!
Assumi, na última edição da nossa
revista, logo após a tomada de posse, o propósito da nova Direcção em
dar continuidade às actividades desenvolvidas até então pela Alma Alentejana,
quer na vertente social quer na cultural.
Continuidade que exigiria uma maior participação de um mais vasto número de sócios nelas envolvidos.
No entanto, ao longo deste passado ano de
mandato, tais expectativas não vieram a concretizar-se (ao contrário, vários escolhos tivemos que contornar) valendo-nos a “carolice”
de um núcleo de meia dúzia dos eleitos que se
tem mantido unido e coeso assegurando a
realização das reuniões da direcção e o
regular funcionamento da Instituição, na base
da discussão colectiva de todas as questões
relacionadas com a sua actividade em todas as
frentes.
Não estaria a ser justo se omitisse o apoio
daqueles, trabalhadores, sócios ou amigos da
Alma Alentejana que, irmanados do espírito
solidário que os tem caracterizado, sempre se
mostraram disponíveis nos momentos de
maior aperto e dificuldade. A nossa gratidão é
muito pouco para tão valiosa ajuda!
Seja como for, neste momento que atravessamos,
é preciso falar claro!
4
consignados, está a ser posto em causa a
propósito da crise económica em que o país
está mergulhado.
Não fora o apoio das autarquias, nomeadamente a Câmara Municipal de Almada e a
Junta Freguesia da Cova da Piedade, com a
cedência das instalações onde funcionam as
nossas valências, para além de outros tipos de
apoio, generalizado a todas as autarquias do
concelho, o panorama de hoje seria muito
mais negro para a Alma Alentejana.
Contudo, é necessário que o Poder Local
Democrático tenha uma outra visão das IPSS
do tipo da nossa. A Alma Alentejana não é
uma Associação com Cantadeiras ou Cavaquinhos de caráter cultural e regionalista, somos
uma instituição que dá apoio a 158 idosos, em
quatro freguesias de Almada, através de 2
centros de dia, 2 centros de convívio e um serviço de apoio domiciliário e damos emprego a
22 trabalhadores (mal pagos tendo em conta
o serviço que prestam à comunidade e sem
actualização salarial este ano pelas razões anteriormente aduzidas) contribuindo positivamente para a manutenção da nossa rede social concelhia. Não podemos competir ou
Centro de Dia do Laranjeiro
melhorar muito a qualidade do serviço que
prestamos porque não temos a possibilidade
de autofinanciamento que outras IPSS que,
curiosamente, são as que mais chorudos
apoios municipais conseguem, num concelho
que, muito justamente, se arroga de pensado,
solidário, democrático, progressista e voltado
para o futuro.
Espero que o que acabo de escrever no
parágrafo antecedente não seja interpretado
como uma crítica ao poder local porque não
é, antes um ponto de partida para uma
discussão frutuosa sobre a forma, qualidade e
quantidade dos apoios sociais concedidos, ou
não, pelo Munícipio às diversas instituições
que constituem o ímpar movimento
associativo almadense.
Termino chamando a atenção para a homenagem que no próximo dia 25 (sábado), a Alma
Alentejana em parceria com o Município de
Alter do Chão, propõe ao Homem e Cidadão
Alentejano Dr. Simas Abrantes, primeiro
Presidente da Direcção da Instituição. Uma
homenagem merecida para a qual convido
todos os sócios e amigos!
COM O ALENTEJO NA PEGADA
a gesta dos homens simples do
sul, a sua resistência heróica ao
fascismo.
Simas Abrantes, médico, professor,
dirigente associativo, natural de
Alter do Chão, fundador desta
“Alma Alentejana”, cuja obra multifacetada se
inscreve numa percepção do Mundo à
escala humana, serviu a sua terra e todos os
necessitados de cuidados e de uma palavra de
consolo com o seu empenho pessoal, através
do voluntariado.
Duas vidas, dois exemplos que honramos
nestas páginas.
Enquanto director editorial, confesso que
parte substancial dos artigos e colaboradores
deste número não são da minha
responsabilidade, ao invés do que sucedeu no
número anterior. Isto não significa, nem
desconhecimento, nem alheamento, relativamente às temáticas abordadas, sobre as quais
me foi solicitado parecer.
Destaco, pelo interesse, o subsídio para o
Tratado do Cante, contributo de José Pereira,
organizador do Congresso, realizado em Beja
há mais de dez anos, que introduz este
assunto, sempre pertinente, pois muito se
escreveu e escreverá, tendo em conta o filão
inesgotável das supostas origens e evolução
do cantar alentejano.
5
Conduzem cabalmente os processos eleitorais do associativismo,
quando as colectividades têm
alguma pujança, a novos rostos e a
equipas directivas, que seguem ou
inovam o percurso delineado pela
experiência cimentada por fundadores e
primeiros obreiros, cumprindo-se os
objectivos estatutariamente aprovados.
A vitalidade desses trajectos será tanto maior
quanto mais abrangente for o empenho e a
repercussão dos que se envolvem nestas
causas solidárias, por isso, cabe-me desejar
aos que, tendo assumido encargos tão vastos
como são as diversas valências de uma IPSS,
que levem o barco a bom porto.
Àqueles que deram o seu melhor no passado,
igualmente
uma
saudação
fraterna,
agradecendo a entrega dos muitos dias de
dedicação.
Felizmente, a Instituição enraizou-se e
desenvolveu-se, com todos esses contributos,
e, honrando o nome de cada um no colectivo,
aqui estamos, ajudando a continuar uma
tarefa, que nos foi legada por gente que ama
o Alentejo.
No presente número da revista, homenageamos
dois homens que enriqueceram o País e o
Alentejo: José Saramago, escritor maior da
Lusofonia, que em páginas imortais eternizou
6
Chamo também a atenção para o artigo do Dr.
Paulo Mota, pelas questões que coloca, face
ao envelhecimento e às carências dos utentes
dos Centros de Dia.
Desta vez, o município em foco é Alter do
Chão. O seu património e o dia a dia de quem
administra politicamente o concelho,
consubstanciam um dos motivos maiores da
abordagem daquele território, cuja identidade
se alicerça na criação dos Cavalos de Raça
Lusitana.
A actividade da associação, com destaque
para a divulgação do CD das Cantadeiras e da
Feira, que todos os anos traz a sabedoria
alentejana à Margem Sul, são notícia, e ainda
a intervenção, junto do Poder Legislativo e a
menção aos Jogos Florais, de entre muitas
acções quotidianas, com menos visibilidade,
mas que não são menos importantes para o
seu bom funcionamento.
Na análise de publicações e discos, onde de
algum modo o Alentejo se manifesta, ou nas
imagens de Évora, a respiração pujante dos
homens do sul, a sua acção e criatividade
sobressaem.
Folhear a revista será a forma segura de
encontrar estes e outros aliciantes, conforme
o interesse e gosto de cada um.
Permitam-me uma reflexão final, a propósito
do incremento das redes sociais, que na
Internet incensam o Alentejo, com belíssimas
ilustrações dos seus campos, oriundas de
alentejanos apartados das suas terras de
origem, exilados em grandes cidades, onde
criaram rotinas, bem distantes da vivência
campesina. São olhares nostálgicos e
poéticos, que parecem ignorar o outro lado
da realidade, teimando em recordar um
Alentejo cristalizado, da sua meninice, esse
Alentejo de outrora, que também foi de
escravidão laboral e miséria. Insistindo em
não ver o Alentejo de agora, comprado pelos
estrangeiros, que praticam uma agricultura,
nem sempre ecológica.
Afinal, quando falamos do Alentejo, falamos
de qual Alentejo?
POR NÃO TER NADA E TUDO QUERER
Respostas Sociais, já não prestam
apoio, apenas a idosos. Há também uma franja da população que
por vários motivos tem de
recorrer aos serviços de instituições como a nossa.
Os dois principais motivos, em nosso
entender, desta “nova” procura assentam
sobretudo em duas grandes questões. Por um
lado, a grave crise económica que nos tem
afectado, e da qual não se prespectivam
melhores dias, tem feito aumentar as
solicitações de apoio alimentar, especialmente
na freguesia do Laranjeiro, onde ainda se
aguarda pelo arranque do Refeitório Social.
Por outro lado, verifica-se também uma
crescente procura dos serviços da Resposta
Social de Centro de Dia, por parte de
indivíduos, que independentemente do
grupo etário a que pertencem, padecem das
mais variadas demências.
Este último aspecto tem crescido desmesura-
7
No último Boletim Informativo da
Alma Alentejana (número 29,
Janeiro/Março de 2010), no artigo
entitulado “Quem somos nós?”, no
seu último parágrafo ficou
entreaberta a porta para novas
prespectivas de funcionamento das diversas
Respostas Sociais, desta Instituição. Deste
modo, este texto tem a pretensão de
prespectivar as possiveis transformações que
a curto, médio prazo poderão ocorrer no
nosso funcionamento.
Num passado bem recente, temos observado
uma profunda alteração na caracterização dos
utentes que beneficiam dos serviços
prestados pela Alma Alentejana, sobretudo
no que diz respeito aos Centros de Dia.
Se analisarmos os dados estatisticos referidos
no artigo já mencionado, constatamos que
cerca de 27,5% dos utentes dos dois Centros
de Dia, têm menos de 65 anos. Aqui regista-se
a primeira grande transformação. Estas
damente nos últimos tempos, e é fruto da inexistência quer de equipamentos, quer de recursos humanos capazes de fazer frente a esta
problemática. Daqui resulta, uma outra questão fundamental e que vai para além da
existência de equipamentos e que está fundamentalmente associada à falta de formação
dos trabalhadores destas Respostas Sociais.
Deste modo, assistimos a uma mudança de
cenário, onde os principais actores, já não são
apenas os tipicos idosos independentes ou
semi-autónomos, que frequentam o Centro
de Dia, como forma de conviverem com outros indivíduos, mas também o espaço onde
coexistem pessoas com necessidades especiais, onde toda atenção é necessária.
No artigo já citado, ficou também o alerta
para as transformações que se avizinham ao
nível dos horários de funcionamento, destes
equipamentos, pois dever-se-à ter em
consideração que o actual modelo encontra-se
obsoleto e ultrapassado, face às reais
necessidades das populações, isto é, utentes
e seus familiares.
Porém, não basta apenas querer efectivar
estas alterações, tem também que existir por
parte da Tutela, não só as exigências
fundamentais que as instituições devem
cumprir, mas também criar os alicerces para
que se operem as mudanças necessárias e
que vão de encontro aos anseios das populações.
Se tudo isto se concretizar, estará a ser dado
um importante passo para a inclusão social de
alguns dos mais vulneráveis.
2010, foi escolhido pela União Europeia, como
sendo o ano de arranque no Combate à
Pobreza e Exclusão Social.
Temos assistido ao longo destas três últimas
décadas, à implementação de um Modelo
Neo-Liberal, que teve como expoente
máximo o famigerado Tratado de Lisboa.
Contudo, aquilo que se verificou foi uma luta
desenfreada pelo domínio dos mercados,
onde os indivíduos se tornaram meros peões
dos tabuleiros de xadrez da Era da
Globalização. Como seria previsível (e houve
quem o tivesse vaticinado), este Modelo
foi-se desmoronando e provocou ondas de
descontentamento social, como o leitor
poderá estar recordado dos recentes
confrontos nos arredores de Paris e em toda a
Grécia.
Esta vaga de descontentamento, irá
concerteza chegar ao nosso país, caso não
sejam tomadas medidas que invertam as
políticas, que se avizinham, de privatização de
determinados sectores fundamentais para o
bom funcionamento das sociedades. Aqui
está também incluído o trabalho, que as
instituições como a Alma Alentejana, fazem
no domínio da Acção Social. Pois se os cortes
orçamentais continuarem a existir, todo o
trabalho que até aqui tem sido realizado irá
perder-se, sob pena de não se poder chegar a
quem realmente mais precisa de nós.
Não se trata de sermos “subsídio-dependentes”,
nada disso! Apenas, pretendemos ter as
condições essenciais para podermos
desempenhar o nosso papel, de uma forma
clara, directa e objectiva. Sabendo sempre,
que quem recebe, também tem que dar algo
em troca. E é deste modo que pretendemos
trabalhar, mais e cada vez melhor, sempre em
prol de um serviço que se quer de qualidade.
8
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SARAMAGO: HINO AO PODER DA SIMPLICIDADE
Luis Maçarico
nome, na província do Ribatejo. Chamavam-se Jerónimo Melrinho e Josefa Caixinha esses
avós, e eram analfabetos um e outro. No
Inverno, quando o frio da noite apertava ao
ponto de a água dos cântaros gelar dentro da
casa, iam buscar às pocilgas os bácoros mais
débeis e levavam-nos para a sua cama. Debaixo das mantas grosseiras, o calor dos humanos livrava os animaizinhos do enregelamento e salvava-os de uma morte certa. Ainda
que fossem gente de bom carácter, não era
por primores de alma compassiva que os dois
velhos assim procediam: o que os preocupava, sem sentimentalismos nem retóricas, era
proteger o seu ganha-pão, com a naturalidade de quem, para manter a vida, não aprendeu a pensar mais do que o indispensável.
Ajudei muitas vezes este meu avô Jerónimo
nas suas andanças de pastor, cavei muitas
vezes a terra do
quintal anexo à
casa e cortei lenha
para o lume, muitas vezes, dando
voltas e voltas à
grande roda de ferro que accionava a
bomba, fiz subir a
água do poço
comunitário e a
transportei ao ombro, muitas vezes, às
escondidas
dos
guardas das searas,
fui com a minha
avó, também pela
madrugada, munidos
de ancinho, panal
e corda, a recolher
nos restolhos a
palha solta que
depois haveria de
servir para a cama
do gado. E algumas
vezes, em noites
9
José Saramago, o nosso Nobel da Literatura,
que retratou com genialidade a luta dos trabalhadores rurais alentejanos, em “Levantado do
Chão”, deixou-nos no início do Verão e acerca
dele, como costuma acontecer sempre que
um vulto da cultura desaparece, muito foi
escrito, pelo que estas páginas de evocação
respiram através da sua obra imortal, que não
necessita de palavras laudatórias de
circunstância.
Quando Saramago recebeu a consagração
daquele prémio mundial, ofereceu um
espantoso texto à memória de seus avós, que
é um hino à simplicidade e à beleza das almas
pueris, ao telúrico amor à terra e à labuta
desses seres humildes, que nada tendo,
possuíam em si, na sua dedicação, nos seus
gestos diários, toda a poesia do Mundo, que o
escritor espelhou ao falar assim deles:
“O homem mais
sábio que conheci
em toda a minha
vida não sabia ler
nem escrever. Às
quatro da madrugada,
quando a promessa
de um novo dia
ainda vinha em
terras de França,
levantava-se
da
enxerga e saía para
o campo, levando
ao pasto a meia
dúzia de porcas de
cuja fertilidade se
alimentavam ele e
a mulher. Viviam
desta escassez os
meus avós maternos,
da pequena criação
de porcos que,
depois do desmame,
eram vendidos aos
vizinhos da aldeia.
Azinhaga de seu
10
quentes de Verão, depois da ceia, meu avô me
disse: “José, hoje vamos dormir os dois
debaixo da figueira”. Havia outras duas
figueiras, mas aquela, certamente por ser a
maior, por ser a mais antiga, por ser a de
sempre, era, para toda as pessoas da casa, a
figueira. Mais ou menos por antonomásia,
palavra erudita que só muitos anos depois
viria a conhecer e a saber o que significava...
No meio da paz nocturna, entre os ramos
altos da árvore, uma estrela aparecia-me, e
depois, lentamente, escondia-se por trás de
uma folha, e, olhando eu noutra direcção, tal
como um rio correndo em silêncio pelo céu
côncavo, surgia a claridade opalescente da Via
Láctea, o Caminho de Santiago, como ainda
lhe chamávamos na aldeia. Enquanto o sono
não chegava, a noite povoava-se com as
histórias e os casos que o meu avô ia
contando: lendas, aparições, assombros,
episódios singulares, mortes antigas,
zaragatas de pau e pedra, palavras de
antepassados, um incansável rumor de
memórias que me mantinha desperto, ao
mesmo tempo que suavemente me
acalentava. Nunca pude saber se ele se calava
quando se apercebia de que eu tinha
adormecido, ou se continuava a falar para não
deixar em meio a resposta à pergunta que
invariavelmente lhe fazia nas pausas mais
demoradas que ele calculadamente metia no
relato: “E depois?”. Talvez repetisse as
histórias para si próprio, quer fosse para não
as esquecer, quer fosse para as enriquecer
com peripécias novas. Naquela idade minha e
naquele tempo de nós todos, nem será
preciso dizer que eu imaginava que o meu avô
Jerónimo era senhor de toda a ciência do
mundo. Quando, à primeira luz da manhã, o
canto dos pássaros me despertava, ele já não
estava ali, tinha saído para o campo com os
seus animais, deixando-me a dormir. Então
levantava-me, dobrava a manta e, descalço
(na aldeia andei sempre descalço até aos 14
anos), ainda com palhas agarradas ao cabelo,
passava da parte cultivada do quintal para a
outra onde se encontravam as pocilgas, ao
lado da casa. Minha avó, já a pé antes do meu
avô, punha-me na frente uma grande tigela
de café com pedaços de pão e perguntava-me
se tinha dormido bem. Se eu lhe contava
algum mau sonho nascido das histórias do
avô, ela sempre me tranquilizava: “Não faças
caso, em sonhos não há firmeza”. Pensava
então que a minha avó, embora fosse
também uma mulher muito sábia, não
OUVINDO BEETHOVEN
Venham leis e homens de balanças,
mandamentos d’aquém e d’além mundo.
Venham ordens, decretos e vinganças,
desça em nós o juízo até ao fundo.
Nos cruzamentos todos da cidade
a luz vermelha brilhe inquisidora,
risquem no chão os dentes da vaidade
e mandem que os lavemos a vassoura.
A quantas mãos existam peçam dedos
para sujar nas fichas dos arquivos.
Não respeitem mistérios nem segredos
que é natural os homens serem esquivos.
Ponham livros de ponto em toda a parte,
relógios a marcar a hora exacta.
Não aceitem nem queiram outra arte
que a prosa de registo, o verso acta.
Mas quando nos julgarem bem seguros,
cercados de bastões e fortalezas,
hão-de ruir em estrondo os altos muros
e chegará o dia das surpresas.
José Saramago
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11
alcançava as alturas do meu avô, esse que,
deitado debaixo da figueira, tendo ao lado o
neto José, era capaz de pôr o universo em movimento apenas com duas palavras. Foi só
muitos anos depois, quando o meu avô já se
tinha ido deste mundo e eu era um homem
feito, que vim a compreender que a avó,
afinal, também acreditava em sonhos. Outra
coisa não poderia significar que, estando ela
sentada, uma noite, à porta da sua pobre
casa, onde então vivia sozinha, a olhar as
estrelas maiores e menores por cima da sua
cabeça, tivesse dito estas palavras: “O mundo
é tão bonito, e eu tenho tanta pena de
morrer”. Não disse medo de morrer, disse
pena de morrer, como se a vida de pesado e
contínuo trabalho que tinha sido a sua
estivesse, naquele momento quase final, a
receber a graça de uma suprema e derradeira
despedida, a consolação da beleza revelada.
Estava sentada à porta de uma casa como não
creio que tenha havido alguma outra no
mundo porque nela viveu gente capaz de
dormir com porcos como se fossem os seus
próprias filhos, gente que tinha pena de ir-se
da vida só porque o mundo era bonito, gente,
e este foi o meu avô Jerónimo, pastor e contador de histórias, que, ao pressentir que a
morte o vinha buscar, foi despedir-se das
árvores do seu quintal, uma por uma,
abraçando-se a elas e chorando porque sabia
que não as tornaria a ver.”
Fica uma obra marcante que resgata os
simples e os oprimidos, que é a magistral
memória ficcionada de tempos opressores e
dos infindáveis sofrimentos dos que nada
possuem, a não ser sonhos e revoltas. Como
escreveu o fotógrafo Mário Sousa, “era um
homem autodidacta, não estudou na
universidade, mas, a universidade estudou-o
a ele.”
Mas Saramago autor de romances, que por
vezes agitaram elites arcaicas, com tiques de
um passado inquisitorial, foi igualmente
Poeta, cantado por Manuel Freire.
Este sentido tributo ao Homem de Cultura,
partilha um poema premonitório, que
esperemos, um dia se cumpra.
PREC - CANTAR A REVOLUÇÃO NO ALENTEJO
Eduardo Raposo
12
Pediu-me o amigo José Moutela da Alma
Alentejana um texto sobre os cantores de intervenção – tema a que eu há quase década e
meia tenho dedicado a investigação, o estudo
e a publicação. Aconteceu dias depois de um
recital realizado no dia 1º de Maio, no âmbito
do aniversário da Casa do Povo de Corroios,
intitulado “José Afonso – o Canto da Utopia,
onde propomos uma viagem intimista pela
Arte e pela Vida de José Afonso, a partir das
suas palavras, através da Voz de Francisco
Naia, e da música de José Carita, Edmundo
Silva e Marco Rodrigues. Recital homónimo
de uma conferência que apresentámos no dia
25 de Abril de 2007, na grande homenagem
promovida pela Casa da Música ao génio
maior da Música Popular Portuguesa.
Pediu-me o amigo Moutela o dito texto e eu
não tinha como recusar-lhe. Porque não se
recusa com quem connosco foi correligionário
na construção de sonhos e de projectos em
nome da dignidade como aconteceu há 15
anos quando participámos nesse sonho
colectivo de erguer uma grande associação
cultural de Alentejanos na Margem Sul, onde
se pudessem rever os 60 mil Alentejanos
residentes em Almada e nos concelhos vizinhos.
Esse projecto carregado de Utopia, quando
um pequeno grupo – a Comissão Instaladora
- fez “das tripas coração” para aliciar novos
“patrícios”, as longas reuniões de trabalho na
Junta de Freguesia do Laranjeiro – sempre
acarinhados pelo Cremildo Possante, pelo
José Ferreira e restante equipa, e as longas
noites e fins de semana redigindo textos,
compondo para se fazerem os primeiros
boletins informativos e a 1ªsérie desta revista
onde agora escrevo, a Alma Alentejana
Revista Cultural que amei como uma mãe a
um filho acabado de parir, Menina dos meus
olhos, onde como director editorial tive o
grato prazer de trabalhar directamente com o
1º Presidente da “Alma Alentejana”, o
Dr. Simas Abrantes, a quem presto a minha
homenagem.
De entre muitos companheiros fundadores
com quem tive o prazer de trabalhar na
1ª Direcção, uns que depois assumiram os
cargos máximos da associação e outros que
seguiram outros caminhos, quero destacar o
invulgar espírito de tolerância de Simas
Abrantes. Homem fraterno, Amigo e
companheiro com grande Humanismo,
sensatez e postura democrática sempre
gerindo com uma qualidade rara os pontos de
vista naturalmente diversos, inclusivé quando
a Associação optou pelo Caminho da
Solidariedade Social em desfavor da vertente
Cultural com os sócios fundadores divididos,
Simas Abrantes escolheu o diálogo e a concórdia. O Simas Abrantes personificou esse espírito de tolerância que caracteriza o alentejano.
Depois desta longa introdução, podia aqui
falar dos livros que publiquei entre outros,
mas tristes e sem alma do Norte da Europa,
começaram aí a destruição da agricultura do
nosso país, hoje moribunda.
Esta Exposição é a minha Homenagem aos
Homens e às Mulheres Alentejanas que
provaram que a Utopia é realizável e que a
Dignidade é a maior riqueza para um
Alentejano, porque souberam dar um
contributo decisivo para a existência de “Um
dos momentos mais fabulosos da história
recente do nosso país” , como Francisco
Fanhais caracterizou o PREC.
“Há momentos raros na vida dos Povos em
que o imenso e transformador potencial de
progresso e justiça social, surpreendentemente adormecida por longos períodos,
desabrocha e uma incomensurável explosão
de esperança, criatividade, calor e solidariedade
humanas a vassala sociedades caducas, rasga
novos e quantas vezes inesperados caminhos
do colectivo futuro, nos toca de forma
indelével e irrepetível.” Assim inicia Carlos
Pinto de Sá, Presidente do Município de
13
Cantores de Abril – Entrevistas a cantores e
outros protagonistas do “Canto de
Intervenção”(com prefácio de Manuel
Alegre), Edições Colibri, em 2000 ou o que
mais visibilidade alcançou: Canto de
Intervenção 1960-1974, com três edições,
8000 exemplares – 2000, 2005 e 2007 – as
duas últimas pelo Público e a terceira apresentada exactamente no mesmo dia da
referida conferência na Casa da Música –
livros que deram origem a um recital que tem
percorrido o país e não só - Badajoz, Évora,
Coimbra, Santarém, Casa da Música, Festa do
Avante e muitas cidades e vilas Alentejanas e
da Margem Sul. Podia até falar-vos dest´outro
projecto poético musical sobre José Afonso e
a sua Liberdade Livre, mas espero poderem
ver, participar, saborear em próximas actuações.
Todavia, prefiro falar-vos de Utopia. E se estou
consciente que vivemos um tempo, “um triste
tempo de anti-utopia” (António Murteira),
como remar contra a maré é uma
característica que me persegue, apesar de vivermos um tempo propiciador ao
alastramento da peçonha da mediocridade,
da sabujice, apesar disso continuo a acreditar,
a acreditar na Fraternidade, a acreditar na
Beleza, a acreditar na Poesia, a acreditar na
Amizade, a acreditar no Amor, a acreditar na
construção, diária, permanente da construção
da Utopia.
Acreditar, no meu léxico passa por agir, fazer,
construir. Venho falar-vos de um trabalho que
realizámos recentemente, a Exposição PREC
Cantar a Revolução no Alentejo - inaugurada
em Montemor-o-Novo em Março e que em
Maio iniciou itinerância em Beja - trabalho
iconográfico onde destaco também os dados
biográficos e depoimentos de 16 cantores de
intervenção, desde Zeca Afonso… a Vitorino:
16 cantautores que estiveram no Alentejo a
cantar a Reforma Agrária, solidários com os
Homens e as Mulheres Alentejanas que antes
de Abril não vergaram e mantiveram acesa a
chama da dignidade humana, e que, depois
tomaram o destino nas mãos. Acabaram
derrotados mas não vencidos, por
“estrangeirados” que começaram então a
“venda” do nosso país aos mais poderosos,
14
Montemor-o-Novo, a referida exposição.
Conforme referimos no Catálogo:
Passam 35 anos sobre o PREC – Período
Revolucionário em Curso, que se baliza entre
o 11 de Março e o 25 de Novembro de 1975.
O 11 de Março marca a viragem à esquerda
com a derrota dos sectores militares ligados
ao General António de Spínola.
Neste período assiste-se a um grande
movimento laboral e popular, com a Reforma
Agrária, as nacionalizações da banca e dos
seguros, e de sectores chave da indústria
nacional. Dá-se lugar a ocupação de casas por
moradores pobres e à constituição de
comissões de moradores que, em muitos
casos, resolvem os problemas mais
prementes, desde o saneamento básico,
electrificação, como construção de creches,
jardins de infância e equipamentos de cultura
e recreio. É lançada a “sementeira” do Poder
Local democrático, mas este período, “um
dos momentos mais fabulosos da história
recente do nosso país” (Francisco Fanhais),
situa-se não apenas naqueles “breves” mas
exultantes oito meses e meio de 1975, mas
inicia-se logo em 25 de Abril de 1974 e, como
foi o caso do Alentejo e da Reforma Agrária,
têm continuidade e consequências ao longo
de toda a década de 70 e seguinte.
Adelino Gomes e José Pedro Castanheira,
acrescentam na sua obra - Os dias loucos do
PREC:
(…)
“Menos de dois anos antes, o mundo tinha
assistido à liquidação, a tiros de blindados e
de caças, do socialismo de rosto humano de
Salvador Allende no Chile. E acompanhava o
avanço imparável do vietcong num Vietname
do Sul donde o poder norte-americano,
humilhado, havia de retirar, pelos telhados da
sua embaixada, os últimos soldados e
funcionários diplomáticos.
Em Portugal, de norte a sul, na cidade e no
campo, homens e mulheres, jovens, soldados
e oficiais recém-chegados de 13 anos de uma
guerra fora de tempo em África, viviam uma
experiência inimaginada no Velho Continente,
no cabo da Europa.
Acordados, de um dia para o outro, pela
“divina surpresa” (Eduardo Lourenço) de um
país sem polícia política, nem censura nos
jornais, nem mobilização obrigatória para a
guerra no horizonte de vida, os portugueses
confrontavam-se com a possibilidade real de
construírem de raiz uma sociedade nova e
diferente: livre, justa, fraterna, igualitária. O
desafio chamou-se rapidamente, num
consenso surpreendente e suspeitamente
fácil, socialismo. A sua alta probabilidade
perturbou seriamente, em dada altura, a
ordem acordada entre os senhores do mundo
de então.
Homens, mulheres, jovens, operários,
camponeses, funcionários públicos, oficiais,
soldados, marinheiros, professores, estudantes,
artistas e jornalistas, engenheiros e
carpinteiros, intelectuais, donas de casa
saltaram para o espaço público, E, de cada
local de trabalho, de cada caserna, de cada
escola, de cada folha de jornal, de cada
episódio de vida fizeram palco de uma peça
por eles próprios criada e representada.
Mobilizados na mudança de tudo em busca
do nunca alcançado: no emprego, no bairro,
na família, no amor, na sociedade, no Estado.
Misturados na festa da revolução. Que
haveria de ser – nem mais nem menos –
única. À portuguesa…
Cada dia com mais intensidade até ao paroxismo
do Verão Quente, os portugueses – e com
eles, de algum modo também espanhóis,
franceses, ingleses, italianos, belgas, holandeses, alemães, aqui presentes fosse como
enviados de imprensa, fosse como turistas da
revolução – dividiram-se entre a prioridade à
revolução (nas suas diferentes versões) ou à
democracia parlamentar. Um dilema abordado
logo em Março pelo filósofo francês Jean-Paul
Sartre, após a sua inesquecível visita ao Ralis,
símbolo da radicalização do PREC.
No final, os “moderados” derrotaram os
“revolucionários”. Puseram termo ao sonho
da “cidade sem muros nem ameias” (Zeca
Afonso), acusam estes últimos. “Colocámos
calhas de bom senso no caminho aberto pelo
25 de Abril”, argumentam os vitoriosos.
Acrescentando que, não fora tão decisivo
travão, o País teria desembocado em nova
breves apontamentos biográficos e imagens
da época referentes a 16 figuras da música
portuguesa – alguns nomes decisivos, então e
hoje da Música Popular Portuguesa - desde
Zeca Afonso a … Vitorino. Estas referências
não esgotam nem pretendem ser estanques.
Para além dos representados na exposição,
outros intérpretes, músicos, compositores,
maestros, cantautores terão participado no
processo, nomes como António Macedo,
Brigada Víctor Jara, Carlos Alberto Moniz,
Carlos do Carmo, Carlos Paredes, Fernando
Lopes Graça, José Barata Moura, Pedro
Barroso, Trovante e outros. Não se pretende
fazer aqui a história da participação dos
cantores no PREC. Há limitações de espaço e
outras. Pretende-se sim dar um contributo,
até porque a História como ciência social,
dinâmica que é, está em constante evolução e
não é imutável.
Pretende-se que quem visite a exposição
tenha a percepção de como as lutas acontecidas
durante o PREC se revelaram decisivas para a
conquista dos direitos que a democracia veio
a proporcionar aos cidadãos deste país,
nomeadamente aos mais jovens.”
A Mesa-redonda, intitulada “O PREC no
Alentejo: Poder Popular ou imposição
revolucionária?” que teve lugar no dia da
inauguração da exposição, contou com a
presença de diversos participantes activos
neste processo: figuras que lideraram a
15
ditadura, de sinal contrário.
Ninguém pode garantir que uma ditadura
esperava os portugueses se o 25 de Novembro
tivesse travado a cavalgada revolucionária. O
País voltaria, seguramente, a ser votado ao
ostracismo internacional. E assim adiaria de
novo, o cada vez mais indispensável
desenvolvimento.
A degenerescência da cidadania e das
instituições políticas, o espezinhamento de
valores como a solidariedade, a ausência de
determinação em acabar com a pobreza e
atenuar a desigualdade social demonstram,
entretanto, quão desviados nos encontramos
de alguns dos sonhos que o 25 de Abril permitiu.
Mas está à vista, também, que não foi o regresso ao 24 de Abril o destino de Portugal de
Novembro. Antes pelo contrário: a democracia representativa consolidou-se, a Constituição foi aprovada e, com ela, os pilares de uma
democracia avançada.”
(…)
O que ficou dito, se por um lado tem a marca
da opinião dos respectivos autores, por outro
dá-nos uma visão abrangente e plural do
período em questão.
Foi nosso objectivo trazer à memória este
importante e decisivo período da nossa
história recente. À memória, ao debate, à
reflexão. Daí a a realização desta Exposição e
da Mesa-redonda.
Recordar e regressar à Memória, através de
16
Reforma Agrária na região, militares de Abril,
com responsabilidades de comando no
Alentejo e cantautores que participaram
activamente em jornadas de apoio à Reforma
Agrária, de que em seguida vos damos conta:
“Havia palavras e afectos. Havia vozes e
imagens da meninice de um tempo anterior quando na Casa da Malta o Amor era proibido
e o desejo ostracizado - pela voz serena,
humanista e bem timbrada de Custódio Gingão.
Havia o discurso mais politizado de Murteira e
a afirmação clara, objectiva do Carlos (Pinto
de Sá) que, como disse, não se limita a gerir a
Autarquia, mas antes realiza um projecto
político caracterizado pela fraternidade, pelo
humanismo, pela dignidade na valorização da
auto-estima, da Memória. Havia o discurso
inflamado, subtil e bem humorado de
Andrade e Silva e havia o riso e o choro do
Chico Ceia, recordando a “deixa” do som da
voz de Gingão, quando nos anos 70 percorriam
de motorizada e guitarra a tiracolo as cooperativas, levando palavras com sabor a futuro...
Depois, de pé - como o Homem Alentejano
Vive; a prumo para o Sol e para a Terra fazendo da voz a guitarra, 31 anos depois,
partilhando o poema/canção que dedicou a
Caravela e a Casquinha irrompeu no silêncio
imenso de uma sala toda ocupada de afectos.
E terminou com a “Grândola” cantada em
uníssono, consumação do futuro, hino de propostas da (re) construção da dignidade no
Alentejo, deixadas pelo Custódio e pelo
Murteira e concretizadas pela acção do Carlos
e dos companheiros na Autarquia, pela
disponibilidade do Andrade e... pela Poesia
serena e bela na voz do Ceia.”
Esta Exposição, que é complementada com
um suporte sonoro com canções da época e
respectivas capas de vinis referentes a José
Afonso, Adriano, Francisco Naia, Luísa Basto,
Luís Cília, José Jorge Letria, Samuel, Sérgio
Godinho e Vitorino, conta no seu acervo principal com imagens, breves biografias e textos/
depoimentos relativos a 16 figuras da música
portuguesa: Zeca Afonso, Adriano, Luís Cília,
Sérgio Godinho, Manuel Freire, Francisco
Fanhais, Francisco Naia, Francisco Ceia,
Fausto, José Jorge Letria, Samuel, Luísa Basto,
Maria do Amparo, José Mário Branco, Janita
Salomé, Vitorino.
Produzida pelo Município de Montemor-o-Novo, tendo Eduardo M. Raposo como Autor,
Comissário e responsável pela Investigação e
Textos, contou com um vasto espólio
iconográfico (cartazes, fotos, autocolantes,
discos, desenhos) e biográfico resultante de
diversas solidariedades individuais (mais de
20 pessoas colaboraram das mais diversas
formas e uma dezena dos cantautores representados
disponibilizaram
imagens,
depoimentos, discos da época, etc,) e
colectivas de entidades como a Associação
José Afonso, o jornal Avante!, o Centro de
Documentação 25 de Abril da Universidade
de Coimbra, a Universidade de Aveiro/Colecção Madeira Luís, ou o Arquivo Municipal de
Montemor-o-Novo/Centro de Documentação
da Reforma Agrária - onde se encontra um
espólio de grande riqueza que é necessário
fazer chegar às jovens gerações para que a
nossa História recente não seja ostracizada.
Ali encontrámos os rostos e os gestos da
Reforma Agrária, corrobados nas palavras de
António Gervásio, António Murteira, António
Ramos, Custódio Gingão, José Orta, Francisco
Naia, Teresa Fonseca (fontes orais e
bibliográficas), personificadas nas palavras
inscritas nos painéis de Carlos Pinto de Sá,
Custódio Gingão ou de algumas das Mulheres
Montemorenses da Resistência (Lizete Pinto
de Sá, Mariana Besuga e Florinda Anes) e aos
rostos e aos gestos da Reforma Agrária. Nesta
exposição - encontramos também a pintura
de Manuel Casa Branca, o desenho (a cabeça
da camponesa) de José da Fonte Santa ou a
Poesia de José Carlos Ary dos Santos e de
Maria Lascas – poeta e pintor montemorenses.
Exposição e respectivo catálogo que tem
autoria de designer gráfico do Ateliê de Inês
Ramos - que deu forma gráfica e estética à beleza iconográfica da Revolução, ao sonho, ao
PREC no Alentejo.
Ou como escreve Carlos Pinto de Sá
“(…) Porque a Reforma Agrária foi, é, no seu
alentejano âmago, uma certa forma de
cantar!
Ouçamo-la!”
CONCELHO DE ALTER DO CHÃO
Uma visão, para um futuro melhor!
iniciativas empreendedoras são realidades
que temos que combater.
A visão para um futuro melhor assenta em
cinco aspectos de Intervenção Estratégica
que resultaram da reflexão conjunta entre os
agentes locais e regionais de onde emergiram
contributos relevantes para o desenvolvimento económico, sociocultural e ambiental do
concelho.
A aposta no crescimento do cluster do
turismo com expressão em espaços e apoios
para novos equipamentos hoteleiros e de
animação e forte crescimento da actividade
de novos serviços.
Alter do Chão apresenta um valioso património
histórico, cultural e arqueológico com vários
vestígios romanos, como a Ponte Romana de
Vila Formosa, classificada como
monumento nacional, as Ruínas
Romanas bem no centro da vila, o
Castelo, o Palácio do Álamo, a Igreja
de S. Jesus do Outeiro, a Igreja do
Convento de Santo António, a
Coudelaria de Alter, entre outros,
são recursos patrimoniais que
temos de potenciar, temos ainda
Alter Pedroso que constitui um
atractivo, não só pelos elementos
culturais que ainda preserva,
como também pela sua
beleza paisagística e
arquitectónica.
O Apoio ao Tecido
Empresarial para
melhorar a Competitividade do
Território
do
Concelho como
uma aposta no
incentivo ao espírito empresarial, fortalecendo
17
Um território que crie mais riqueza e emprego,
que consiga fixar e atrair população,
incluindo gente jovem e qualificada, que
ofereça qualidade de vida aos seus residentes
e que proporcione experiências autênticas a
quem nos visita ou usufrui dos nossos
produtos, bens e serviços, é o nosso objectivo
maior.
Por isso aumentar o emprego através de uma
aposta mais forte na educação e no incentivo
ao empreendedorismo, valorizar os sectores
chave da economia local e regional,
nomeadamente os produtos tradicionais,
ligados à agricultura, vinha, cortiça, azeite e o
turismo nas suas diversas vertentes, será
sempre uma prioridade.
Criar comunidades mais coesas, confiantes e
capacitadas, que tenham acesso a
bens e serviços de qualidade,
saúde, ambiente, habitação,
educação, cultura, e que adoptem
uma postura mais participativa,
pró-activa e preparada para lidar
com o contexto de mudança,
deverá ser uma obrigação de todos.
Os diagnósticos realizados confirmaram reconhecidas debilidades
do Norte Alentejano, já presentes
em
diversos
estudos.
A contínua perda de
capital humano, o
elevado índice de
envelhecimento, o
reduzido peso dos
jovens, as reduzidas
qualificações da
população activa,
uma base económica frágil, pouco diversificada
e competitiva e
a escassez de
as actividades económicas com tradição regional.
Para o concelho de Alter do Chão este é um
desafio importante, não só para impulsionar o
desenvolvimento e a base económica do
concelho, como para melhorar as infraestruturas de suporte para a implementação
de novas empresas e para oferecer melhores
condições às empresas já existentes.
A dinamização da Coudelaria de Alter de
modo a que este local se torne num forte
atractivo da Região e num centro de
excelência do cavalo e das práticas e eventos
equestres contribuindo como factor de
desenvolvimento social, económico e de
formação, do Município e da Região.
A melhoria contínua da oferta em equipamentos
e serviços sociais de apoio aos jovens e idosos
é uma obrigação de todos os responsáveis.
A aposta na educação, formação e qualificação
das pessoas para a vida activa promovendo o
18
Vista de Alter do Chão
aumento da oferta de formação e o crescimento
dos níveis de escolaridade consolidando a articulação entre a oferta formativa e a procura
de qualificações por parte das empresas deverá
ser sempre uma prioridade.
São estes cinco vectores de intervenção que
norteiam a actividade municipal, sempre na
procura contínua da melhoria da qualidade de
vida dos nossos habitantes e da criação de
condições mais atractivas para quem nos visita.
Não poderia terminar sem lembrar um ilustre
Alterense
que
irá
ser
justamente
homenageado no próximo dia 25 de Setembro,
em Alter do Chão. Falo do Dr. Simas Abrantes,
um dos fundadores da Associação Alma
Alentejana e um grande amigo do Alentejo e
de Alter do Chão.
Um abraço do Presidente da Câmara
Joviano Vitorino
PATRIMÓNIO HISTÓRICO
Promover o concelho com uma aposta firme
no Turismo e no Património – a criação do
Parque Temático “O Eco-Museu de Vila
Formosa”, que pretende valorizar toda a
envolvente da Ponte Romana de Vila Formosa;
e a promoção do património histórico e
arqueológico, são alguns dos projectos que a
Câmara Municipal pretende concretizar.
Sendo Alter do Chão uma vila rica em património histórico, importa referir as características dos principais monumentos a visitar:
D. Fernando II, Duque de Bragança, terá
usado este espaço como prisão.
Classificado como Monumento Nacional em
1910, viu as suas funções reduzidas a uma loja
de ferrador, carpintaria, celeiro, cavalariça, lagar
de azeite ou mesmo uma lixeira. É adquirido
pela Fundação Casa de Bragança em 1955.
Fonte Renascentista
Castelo de Alter do Chão
Mandada construir pelo Duque D. Teodósio
de Bragança em 1556, a “fontinha” (nome
pelo qual é vulgarmente conhecida) foi inicialmente construída noutro local do largo.
É constituída por uma alpendrada em forma
de cúpula dupla sustentada por três elegantes
colunas de fustes lisos e perlados, com
capitéis de inspiração jónica ao gosto do
Renascimento. O monumento apresenta
proporções homogéneas.
Como material exclusivo da construção
usou-se mármore fino de Estremoz.
Ostenta ao fundo e sobre as três bicas de
mármore 2 medalhões heráldicos com mais
de um metro de diâmetro cada. Apresentam-se
nesses medalhões o Brasão dos Duques de
Bragança e o Brasão da Vila de Alter.
19
O castelo de Alter do Chão, pertença da
Fundação da Casa de Bragança, mandado
construir por D. Pedro I em 1359 distingue-se
do comum dos castelos de cariz militar por se
encontrar num sítio plano.
Foi utilizado pelos monarcas da dinastia de
Bragança aquando das suas deslocações a
esta região, facto que o torna, essencialmente
num castelo de função residencial.
Desde a construção, no séc. XIV, foram inúmeras as utilizações dadas a este castelo, bem
como as intervenções a que foi sujeito. Logo
no séc. XV foi alvo de uma campanha de
obras, sendo que no final deste século
Chafariz do Largo Barreto Caldeira
Mandado construir pela Câmara Municipal
em 1799.
Inicialmente construído junto à entrada
principal do castelo, foi posteriormente
transferido para a sua actual localização.
Construção ao estilo da época, apresenta um
frontão recortado em forma de espaldar
realçado por linhas elegantes. Na parte
superior do espaldar estão 2 escudos reunidos
por festões e um medalhão oval.
20
Ponte de Vila Formosa
Esta Ponte foi construída pelos romanos no
final do séc.I, início do séc.II D.C., sobre a
Ribeira de Seda na estrada que liga a vila de
Alter do Chão a duas das suas freguesias:
Chancelaria e Cunheira. Costruída em grossa
cantaria, aparelhada e almofadada, consta de
seis arcos iguais, compostos nas frentes por
trinta e três aduelas e cinco olhais em forma
de pórtico. É um monumento nacional.
Janela Manuelina
Situada numa das ruas da vila (Rua General
Blanco), esta janela é do estilo Manuelino,
que data o séc. XVI.
Pelourinho
O Pelourinho de Alter do Chão, com a sua
coluna torsa rematada pela esfera armilar,
assinala a concessão do foral manuelino,
realizado a 1 de Junho de 1512. Os dois
elementos decorativos são comuns aos
pelourinhos da mesma época.
convivem esperando a aragem fresca das
noites estivais. Subindo a Rua do Castelo
chegamos ao Talefe, construído por entre as
ruínas do Castelo de Alter Pedroso, e de onde
se avista, em dias de céu limpo, a Serra da Estrela.
A incrível atmosfera deste lugar é motivo mais
que suficiente para visitar Alter Pedroso, uma
pequena Aldeia no coração do Alto Alentejo.
Palácio e Jardim do Álamo
Moradia brasonada, mandada construir em
1649 por Diogo Mendes de Vascolcelos. Os
diversos espaços encontram-se repartidos
conforme a época de construção. O portal,
encimado pelo escudo de armas, que dá
entrada para o jardim, e da segunda metade
do séc. XVIII. No jardim tipicamente
setecentista, destacam-se um pequeno
tanque com decoração em alvenaria e o
jardim de buxo. O Palácio e o Jardim foram
adquiridos pela Câmara Municipal em 1988.
Alter Pedroso
21
Há um lugar no Concelho onde o tempo parou
e a paisagem se mantém intacta, o quadro
perfeito, que nos prende à encantadora
Aldeia de Alter Pedroso.
Casas tipicamente alentejanas, uma igreja de
estilo barroco, construída sobrenum maciço
rochoso, embeleza o Largo, onde os habitantes
ARQUEOLOGIA
Estação Arqueológica de
Alter do Chão
22
A Estação Arqueológica de Alter do Chão
localiza-se no sítio de Ferragial d’El-Rei, na
freguesia e sede do concelho de Alter do
Chão, distrito de Portalegre. É propriedade do
estado e encontra-se sob a tutela da Câmara
Municipal de Alter do Chão. Em 1982 foi
classificada como Imóvel de Interesse Público.
Os vestígios arqueológicos foram descobertos
em 1954, durante os trabalhos de construção
do Campo de Futebol Municipal. Desde essa
data, as intervenções arqueológicas colocaram
a descoberto parte de um edifício termal,
uma casa romana e uma necrópole datada da
Antiguidade Tardia. Contudo, estas estruturas
representam apenas uma pequena parte do
aglomerado urbano de Abelterium.
No Itinerário de Antonino, Abelterium surge
localizada numa das três vias que ligava
Olisipo (Lisboa) à capital da província da
Lusitânia, Augusta Emerita (Mérida). Apesar
de não ser conhecida a data da sua fundação,
nem o seu estatuto jurídico-administrativo,
seria o centro aglutinador de um territorium
polvilhado por uma intensa rede viária, da
qual fazia parte a Ponte de Vila Formosa
(Monumento Nacional), e por povoamento
rural, do qual se destaca a Villa Romana da
Quinta do Pião (em vias de classificação patrimonial).
Em resultado da descoberta de vestígios
arqueológicos em Ferragial d’El-Rei, o
arqueólogo João Manuel Bairrão Oleiro
escavou o sítio em 1956, com a participação
de Jorge Alarcão. Durante esta intervenção
colocaram a descoberto as latrinas, algumas
fornalhas e diversos hypocausta do complexo
termal.
António Brazão interveio no local em 1979,
1980 e 1982, identificando alguns compartimentos
da casa romana com pavimentos de mosaico
policromo, decorado com motivos geométricos.
Entre 2004 e 2007 o sítio foi escavado por
Jorge António, no âmbito do “Projecto de
Recuperação e Valorização da Estação
Arqueológica de Alter do Chão”, sendo este,
uma candidatura aprovada pelo Programa
Operacional da Cultura e desenvolvida pelo
IGESPAR, em parceria com a Câmara Municipal
de Alter do Chão e com a colaboração da Direcção Regional de Cultura do Alentejo.
Edifício Termal
As termas eram espaços lúdicos indispensáveis
para os romanos, tanto para higiene pessoal
como também pelo papel terapêutico das
massagens de tonificação e relaxamento do
corpo. Associadas às actividades físicas,
tornaram-se fundamentais na prevenção de
doenças. Os banhos desempenharam ainda
um importante papel social e político, enquanto
espaços de relacionamento e de convivência.
As termas de Abelterium terão obedecido a
um plano de construção indissociável da
política urbanística, no intuito de dar resposta
às necessidades muito próprias do modus
vivendi romano, um ritual imprescindível e
quase diário – o costume do banho.
As obras de ampliação da área aquecida do
edifício termal, que passaram a permitir
novos circuitos internos, poderão estar
relacionadas com o aumento da população de
23
Intervenções Arqueológicas
Abelterium e o consequente acréscimo de
utilizadores, ou talvez com a construção de
uma nova ala de banhos, a fim de permitir a
separação de sexos.
Casa da Medusa
Casa romana de grandes dimensões e de
grande fausto localizada a nordeste do edifício
termal. O proprietário seria uma figura ilustre
de Abelterium, uma pessoa de inquestionável
riqueza, cultura e gosto requintado, que
ostensivamente decorou a sua habitação,
transformando-a numa residência de luxo,
com pinturas murais, pavimentos em mosaico
e diversas esculturas, de enorme qualidade
técnica e artística.
O triclinium da casa foi pavimentado a mosaico
policromático, com motivos geométricos e
figurativos, ostentando ao centro um
medalhão figurativo, no qual está reproduzida
a penúltima cena do Canto XII da Eneida, de
Virgílio.
A casa recebeu o nome de Casa da Medusa,
visto esta figura mitológica surgir no escudo
segurado por Eneias, representado no
mosaico figurativo.
Necrópole Tardo-Antiga
Antiguidade Tardia
24
Durante a Antiguidade Tardia (séc. IV-VIII), a
população de Abelterium não terá ficado
alheia às discussões filosófico-teológicas das
querelas cismáticas, das heresias ariana e
prisciliana, que opuseram bispos e animaram
concílios, e que caracterizaram os primeiros
séculos da cristandade.
A população hispano-romana também não
terá ficado indiferente à introdução do
cristianismo na cidade, que lentamente se
sobrepôs aos milenares deuses pagãos.
A nova ordem religiosa começou progressivamente a marcar o urbanismo, com construções
dotadas de novas funções litúrgicas e
funerárias, embora inicialmente condicionadas
a edifícios públicos romanos já existentes.
Necrópole
No período que medeia entre a primeira
metade do séc. VI e a primeira metade do séc.
VII e já numa fase de total abandono e ruína
das termas, uma das piscinas do frigidarium
foi utilizada como necrópole. A disposição
cuidada e o enquadramento arquitectónico
das sepulturas, indiciam, fortemente, a possibilidade de serem sepulturas privilegiadas,
que estarão dentro ou junto de uma basílica
ou oratorium funerário.
As sepulturas apresentavam-se seladas, com
tampas de laje de xisto e na sua construção foi
reutilizado material de construção romano,
nomeadamente fragmentos de opus signinum,
silhares de granito e um tambor de coluna.
No âmbito das últimas intervenções arqueológicas em Alter do Chão, as quais estiveram a
cargo do Gabinete de Arqueologia da Câmara
Municipal, foi descoberta uma jarrinha em
cerâmica, no interior de uma sepultura, ao
lado de um esqueleto. Este achado
arqueológico, com cerca de 1500 anos, foi
sem dúvida o mais relevante de toda a
intervenção, o que demonstra, mais uma vez,
o enorme potencial arqueológico do concelho
de Alter do Chão.
TRADIÇÃO
Romaria a S. Bartolomeu
considera “muito importante manter esta
tradição, que afinal de contas faz parte da
identidade da nossa terra e fico muito satisfeito
por ver, todos os anos, tanta gente em
romaria até às Ruínas da Ermida”.
25
Em Alter do Chão a tradição ainda é o que era,
e todos os anos, no dia 24 de Agosto realiza-se
a romaria à Capela de S. Bartolomeu, situada
nos terrenos da Coudelaria, na antiga
Freguesia do Reguendo.
O dia de S. Bartolomeu assinalava, em
tempos, o final das colheitas do trigo, era uma
relevante data religiosa e muito festejada.
Alter do Chão mantém este ritual, levando
S. Bartolomeu de charrete da Igreja Matriz de
Alter até às ruínas da Ermida, na tapada do
Arneiro. Chegando ao local o Padre procede à
cerimónia litúrgica. Depois toca-se o sino e
iniciam-se os festejos.
Costumam participar nesta romaria a Banda
Municipal Alterense, o Rancho Folclórico “As
Ceifeiras”, e o Grupo de Cantares Abelterium.
Para além da música, organizam-se jogos
tradicionais, passeios a cavalo e de charrete, e
demonstração de falcoaria.
O evento é promovido pela Câmara Municipal,
em parceria com a Fundação Alter Real e com
a colaboração de Maria Antónia Beirão, como
já vem sendo habitual em anos anteriores. O
Presidente da Câmara, Joviano Vitorino,
GASTRONOMIA
O Saber da Tradição com
Sabor a Açafrão
26
Testemunhos
remotos atestam a utilização
do cártamo,
sobretudo na
tinturaria, mas
em Alter do
Chão a especificidade do seu
uso sempre foi
a culinária. Na verdade, ao longo dos tempos
foi frequente a tentativa de confundir
cártamo e açafrão, dadas as aparentes
semelhanças entre as duas especiarias. No
entanto, as diferenças no aroma que
imprimem aos pratos e, sobretudo, no preço,
levaram a que, tanto no reinado de Henrique
VIII, como na poderosa Nuremberga do séc.
XV, essa falsificação fosse severamente punida.
Estudos preliminares, desenvolvidos recentemente, são prometedores no que diz respeito
às condições agro-climáticas do Alentejo para
a produção do açaflor.
É somente em Alter do Chão que o chamado
açafrão-bastardo
ganha
estatuto
de
protagonista, servindo de base à elaboração
do saboroso arroz amarelo que acompanha o
ensopado de borrego. Na verdade, pouco se
sabe em relação às motivações que terão
levado os alterenses a associar esta especiaria
ao seu “Prato-Rei”.
São sobretudo de origem lendárias as razões
apresentadas. E muito estará ainda por
descobrir em relação a este mistério.
Conta a Lenda
“Por entre aventuras dos marinheiros nas
plantações do açafrão e a imagem de um
arcebispo escrevendo pacatamente o dicionário
de Brâmane-Português, situa-se na Índia
memória que Alter do Chão retêm a epopeia
os descobrimentos portugueses.
Alter do Chão ainda hoje mantém a tradição
festiva do arroz de açafrão, desenvolvida
no sec. XVI com a introdução de tal especiaria
indiana nos seus costumes gastronómicos.
O caminho marítimo fora descoberto em
1498, os primeiros quatro vice-reis haviam
consolidado o poderio em Goa, e em Alter do
Chão o requinte da preparação de um arroz
de açafrão passou a construir quase um dia
feriado, tal a forma como os marinheiros o haviam aprendido a confeccionar com os indianos.
Os descendentes dos marinheiros que regressavam a esta vila conservaram o hábito de
utilizar sempre o forno do pão e de cozer o
arroz na respectiva calda, bem temperada de
açafrão, num alguidar de barro vidrado.
Sobre leito de canas atravessado no alto do
alguidar, coloca-se um alho a escorrer, por
turno bem temperado, para o arroz. Hoje é
um prato típico deste concelho do Alto
Alentejo, onde variantes na sua confecção,
sujeitas a concursos anuais com direito a prémios, introduzem vulgarmente louro,
cravinho, colorau e nós-moscada.
Alter do Chão não recorda só, porém, os
benefícios gastronómicos oferecidos pelas
especiarias, através da expansão marítima
portuguesa.”
Visite o Núcleo Museológico do Açafrão no
Palácio do Álamo – Alter do Chão
Horário das visitas:
Verão: 10h00 – 13h00 / 15h00 – 19h00
Inverno: 9h00 – 12h30 / 14h00 – 17h30
BOLO DE AÇAFRÃO
Ingredientes:
2 copos de açúcar mascavado
3 ovos
200 g de margarina (à temperatura ambiente)
3 1/2 copos de farinha
1 colher de sopa de aroma de baunilha
1 colher de sopa de fermento
1 copo de leite
raspa de 1 laranja
1 colher de sobremesa de açafrão
3 colheres de sopa de nozes picadas
Bata muito bem os ovos com o açúcar. Junte a
margarina, o aroma de baunilha, o fermento e
continue a mexer. Por fim, adicione as nozes
picadas e a raspa da laranja. Coloque o
preparado numa forma redonda untada e
polvilhada. Leve ao forno, a uma temperatura
de 185º, durante 45 minutos. Pode decorar
como preferir. Neste caso, foi coberto com
pudim de baunilha instantâneo e polvilhado
com cacau.
CAMARÃO COM AÇAFRÃO
Ingredientes:
2 colheres de sopa de manteiga
1 kg de camarão descascado
Sal
1 cálice de vinho branco
3 g de açafrão
Pimenta-do-reino
3 conchas de molho branco
Derreta a manteiga numa frigideira e junte os
camarões temperados com sal, o vinho, o
açafrão e pimenta-do-reino a gosto. Em
seguida, adicione o molho branco, mexa e
deixe cozinhar. Arranje os camarões num
prato e despeje o molho por cima. Sirva com
ervilha, torta ou vagem cozida.
LOMBO COM AÇAFRÃO
Ingredientes:
1 1/2 quilos de lombo de porco
2 colheres (sopa) de vinho branco seco
1 colher (chá) de pimenta-do-reino moída
1 colher (chá) de gengibre ralado
1 colher (chá) de açafrão em pó
1 colher (chá) pimenta caiena
1 colher (chá) de mostarda
2 colheres (sopa) de vinagre
2 colheres (sopa) de manteiga
2 colheres (sopa) de mel
2 colheres (chá) de sal
2 dentes de alho
Temperar o lombo com o sal, as pimentas, o
gengibre, o açafrão, o alho socado, e a mostarda. Regar com vinagre e o vinho. Deixar
marinar durante 2 horas. Colocar o lombo
numa travessa refratária com os temperos.
Besuntar com a manteiga e o mel. Levar ao
forno médio durante 1 e 1/2 hora. Servir em
fatias com arroz no açafrão.
ENSOPADO DE BORREGO COM ARROZ
AMARELO
Ingredientes:
1Kg de carne de borrego
Sal q.b.
1/2 dl de azeite
1 Cebola
3 Dentes de alho
1 Folha de louro
2 Cravinhos
Colorau e noz-moscada q.b.
1 Chávena de arroz
1 Chávena de água quente
1 Chávena de caldo do ensopado
1 Colher (café) de açafrão
Corte a carne em pedaços, tempere-os com
os alhos e sal e deixe assim uma horas. Num
tacho, leve ao lume o azeite e a cebola picada
e, quando alourar, junte a carne, o louro, colorau, noz-moscada e os cravinhos e deixe
refogar um pouco; junte então a água necessária para cozer a carne e para ficar com caldo
para arroz; deixe apurar, sem cozer demasiado
e sirva depois com o arroz. O arroz - Seque o
açafrão em forno pouco quente (já apagado),
depois pise-o, dissolva-o na água quente e
passe depois por um passador. Num tacho,
leve ao lume o arroz com o caldo do ensopado
e a água do açafrão e deixe cozer.
27
Receitas de Açafrão
FUNDAÇÃO ALTER REAL
A Fundação Alter Real é uma instituição com
mais de 260 anos de história, sediada em
Alter do Chão, rodeada por uma paisagem
tipicamente alentejana, onde os cavalos são
de puro sangue e as artes equestres
predominam no tempo.
História
28
A Coudelaria de Alter nasceu num tempo
histórico de grande prestígio Coudélico.
D. João V, ao ser aclamado rei, viu o seu reino
sem o brilho equestre. As Coudelarias Gerais
do Reino tinham uma fraca produção cavalar
e as infra-estruturas não estavam ao nível europeu.
Por altura do seu casamento, em 1708, com a
Arquiduquesa D. Maria Ana de Habsburgo,
D. João V adquiriu em Espanha 40 cavalos de
bom Quilate para serviço das Cavalariças
Reais e pompa da Picaria Real, também uma
cortesia para com a rainha, tão recentemente
vinda da Áustria, ainda com os olhos na
deslumbrante Picaria Imperial de Viena.
Na picaria Real, em Lisboa, o ensino de
D. Pedro de Meneses, 4º Marquês de Marialva
e Estribeiro-Mor da casa real, alcança a
perfeição no rigor da técnica, na beleza dos
movimentos e na elegância das atitudes.
Com D. João V veio o tempo faustoso da
Picaria Real onde as embaixadas deslumbravam a
Europa com o aparato dos nossos coches e o
garbo dos nossos cavaleiros.
O cavalo Alter Real atinge o seu esplendor
Com o nome de Coudelaria Nacional foi
criada, em 1887 na quinta da Fonte Boa, no
vale de Santarém, outra coudelaria do reino
no sentido de melhorar a criação nacional,
detendo um depósito de garanhões para
beneficiação de éguas dos criadores
particulares. Enquanto isso, a Coudelaria de
Alter sofria roubos dos melhores cavalos,
danos nas piaras e reduções na área de
pastoreio.
Proclamado o regime republicano, a Coudelaria
de Alter é integrada no Ministério da Guerra.
Nos anos 40 passa para o Ministério da
Agricultura e inicia-se um processo de
recuperação do cavalo Alter Real.
Em 1979 é criada a Escola Portuguesa de Arte
Equestre, reconstituição da Real Picaria
Equestre, cessada em 1807 com a ida do Rei
D. João VI para o Brasil.A Fundação Alter Real
é instituída em 2007, como entidade de
direito privado e de utilidade pública, com
sede na Coudelaria de Alter – Tapada do
Arneiro – Alter do Chão.
A Fundação Alter Real tem como fins principais
a manutenção e desenvolvimento do património
genético animal das raças Lusitana, Sorraia e
Garrano, da Escola Portuguesa de Arte
Equestre bem como do Laboratório de Genética
Molecular, sem prejuízo da prossecução de
outros fins estipulados.
A Fundação Alter Real presta serviços à
produção equina Nacional, é a autoridade
nacional para o sector da Equinicultura,
responsável pela preservação de um conjunto
de valores de enorme interesse nacional. A
história das duas Coudelarias – Alter Real e
Nacional – assim como a Escola Portuguesa
de Arte Equestre, não podem ser desligadas
da História de Portugal e representam um
património cultural que importa preservar e
divulgar.
Pátio das éguas: unidade de reprodução,
obstetrícia e neonatologia.
As éguas Alter Real pastam em liberdade na
Tapada do Arneiro sendo recolhidas pela
manhã para ser administrado o complemento
alimentar e ser feito o controlo reprodutivo.
As éguas percorrem diariamente as
verdejantes pastagens da Tapada do Arneiro
na companhia das suas crias (poldros até aos
6 meses).
A vinda das éguas do campo para o monte é
um acontecimento marcante que pode ser
visto por volta das 10:30, a entrada, e por
volta das 15:30, a saída.
Turismo
Centro de recepção e interpretação –
“Casas Altas”
Potril (da Coudelaria de Alter): Estrutura de
apoio ao desmame.
Unidade que acolhe os poldros a partir dos 6
meses, onde iniciam o seu desmame e
aguardam a transferência para o Potril da
Azambuja, onde permanecerão até aos 3
anos, no caso dos machos; e a transferência
para o campo (em liberdade) das fêmeas.
Pátio D. João VI: Unidade de desbaste,
selecção e testagem.
29
As “ Casas altas” foram a primeira cavalariça
da Coudelaria de Alter. Edifício centenário que
se caracteriza pelo primeiro andar ser bastante
alto onde era guardado o alimento para as
manadas. As “Casas Altas” são actualmente o
Centro de Recepção e Interpretação da
Fundação Alter Real. Integra no seu interior
uma exposição interpretativa sobre a história
e actividades da Coudelaria.
Os machos chegam da Ilha com aproximadamente 3 anos de idade e iniciam aqui um
processo de Desbaste, Selecção e Testagem. É
iniciado o contacto entre o homem e o cavalo
num processo de socialização e desenvolvimento do animal. Serão avaliados parâmetros
como o temperamento, docilidade, capacidade
atlética e andamentos base através de
duradouras jornadas de trabalho com o
objectivo claro de fazer progredir o cavalo até
ao mais alto nível. Daqui saem os cavalos que
integram as fileiras da Escola Portuguesa de
Arte Equestre, onde continuarão o seu
trabalho seguindo a tradição secular da
Picaria Real.
Depósito de garanhões.
30
Local de permanência de cavalos reprodutores
de várias raças como Lusitanos, Árabes,
Sorraia, Selle Français, KWPN entre outros.
Após serem sujeitos a provas de apreciação
morfo-funcionais e de apresentarem um
currículo desportivo aceitável, os cavalos
ficam aptos para beneficiarem as éguas da
Fundação Alter Real mas também as éguas de
criadores particulares.
Casa dos trens – Exposição: carros de cavalos do Sec.XIX
Núcleo expositivo de carros de cavalos do
Sec. XIX pertencentes à Fundação Alter Real.
Aqui podemos encontrar carros de caça,
carros de passeio, carros senhoriais entre
outros, de reprodução decorre normalmente
entre 15 de Fevereiro e 31 de Julho.
Galeria de exposições
Centro que acolhe uma exposição da
ex-colecção de Rainer Daehnardt sobre a
relação milenar entre o cavalo e o homem e a
sua utilidade nos séculos remotos. Contém
uma sala dedicada ao espólio arqueológico
encontrado na Tapada do Arneiro, outra
dedicada a peças e adorno dos tempos
antigos da Coudelaria, com utensílios de
veterinária e adereços de cavaleiros. Possui
ainda uma sala dedicada a exposições
tem¬porárias destinada a artistas locais.
Falcoaria – Cetraria
De entre todos os animais que o homem utilizou como auxiliares de caça, apenas uma criatura dotada de destreza singular, poderia ser
útil ao homem na caça ao voo – a ave de presa.
Messe e Biblioteca Manuel Leitão –
Residência Oficial do Arneiro e Bibliotecas
com o acervo biblio-arquivistico da Associação
Central da Agricultura Portuguesa, fundada
em Lisboa no ano de 1860.
Também na Fundação é possível estudar. É
possível preparar o futuro:
Escola Profissional de Desenvolvimento Rural
de Alter do Chão – Nas instalações da
Coudelaria de Alter funciona a Escola
Profissional de Desenvolvimento Rural de
Alter do Chão com os cursos de equitação e
cinegética.
Escola Portuguesa de Arte Equestre - Palácio
Nacional de Queluz.
A Escola Portuguesa de Arte Equestre é a
reconstituição da Real Picaria cessada em
1807 com a ida do Rei para o Brasil. A Escola
Portuguesa de Arte Equestre só utiliza cavalos
Alter Real e semanalmente realiza espectáculos regulares no Palácio de Queluz onde todo
o potencial do cavalo Alter Real é
demonstrado.
VISITAS À COUDELARIA DE ALTER
As visitas são guiadas. Há uma diversidade
muito grande de visitas, e de horários,
algumas compostas de actividades temáticas.
A partir das “Casas Altas” onde é feita a
recepção, poderá visitar as instalações,
assistir à exibição de voo – Falcoaria; pode
montar a cavalo; pode alugar TREM (Milord)
com parelha, cocheiro e ajudante; visitar o
Museu do Cavalo.
Através
do
site
www.alterreal.pt/
conservar&educar
ou
do
e-mail
conservar&[email protected] ou ainda
pelo telf. 245610060 poderá obter toda a
informação para uma visita à Coudelaria.
31
A arte de adestrar e caçar com aves de presa
denomina-se falcoaria. A Falcoaria ou
Cetraria, é pois uma das mais antigas e
engenhosas modalidades de caça inventadas
pelo Homem. Era feita a cavalo e crê-se que
tenha surgido em período neolítico, algures
na Ásia Central mas foi durante a Idade Média
que a falcoaria conheceu a sua “Idade de
Ouro”, transformando-se na distracção favorita
dos senhores medievais e num privilégio da
nobreza. As cortes europeias tinham ao seu
serviço falcoeiros profissionais que treinavam e
cuidavam estas aves de luxo.
Na Fundação Alter Real, o apoio às suas
actividades é feito através de equipamentos
modernos existentes nas suas instalações:
Laboratório de Genética Molecular: Registo
Nacional de Equinos membro (SAG Internacional society for animal genetics)
onde são realizados testes de ADN para
controlo de Filiação e identificação.
Clínica Hipiátrica D. Miguel - Unidade de
clínica cirúrgica, Podologia e fisioterapia
(piscina), à disposição da medicina privada.
Parcerias com universidades como pólo de
Formação Universitária
Oficina de Siderotecnia - Instalações e equipamento para formação e prática da ferragem.
32
HOMENAGEM DR. SIMAS ABRANTES
A Força da Identidade Alentejana
isto representa uma aproximação e divulgação dos valores alentejanos, num intercâmbio
que se tem revelado útil para ambas as partes.
Depois não podemos deixar de salientar a actividade social que a Alma tem desenvolvido
como IPSS junto da população carenciada e
idosa da Margem Sul. São centros de dia e
centros de convívio, abertos com o apoio das
autarquias locais, é o (…) apoio domiciliário,
em que são beneficiários alentejanos residentes nestas zonas, além da população local carenciada.”
Simas Abrantes deixou na sua mensagem um
apelo final, com o qual nos identificamos e
que destacamos, enquanto linha mestra de
toda a actividade futura da nossa associação:
“Há que olhar em frente e não esmorecer nos
objectivos que têm norteado desde o início a
nossa Associação – elo de ligação entre as
gentes e os valores da terra alentejana e de
todos os que se vieram fixar nesta terra que
os acolheu. Há que sensibilizar a juventude
para os valores da cultura alentejana e
ir preparando os dirigentes de amanhã.”
O trabalho actual, tal como das direcções
que nos precederam, persegue os
ensinamentos
da
experiência
adquirida, procurando, sempre
com muito esforço e esperança, ser digno dos objectivos
traçados.
Bem - Haja, Dr. Simas Abrantes,
pelo exemplo da sua
postura associativista, que
não podíamos deixar de
sublinhar, num tempo
em que os valores
identitários
podem
tornar-se estratégias
de sobrevivência, face
à globalização vigente.
33
O pensamento da figura notável do nosso
fundador Dr. Simas Abrantes, está bem reflectido no depoimento que teve a gentileza de
partilhar connosco e foi publicado no nº 19 da
nossa revista, em 2006.
Cumprida a primeira década de actividade,
aquele nosso antigo presidente fez assim o
balanço do percurso da “Alma”:
“Além da necessidade que havia em reunir e
ajudar alguns mais desfavorecidos, começou
por se impor no campo associativo da Margem
Sul, terra rica em associações prestigiadas e
centenárias, pelo seu dinamismo e também
porque o seu nome, logo à primeira vista,
transmite uma das maiores riquezas do povo
alentejano – a sua maneira de estar na vida, a
cultura da amizade e do convívio, o sentido
solidário que irradia daquelas gentes. Tudo
isto é transmitido através das duas palavras
mágicas: ALMA ALENTEJANA.
A nossa Associação tem-se distinguido pela
divulgação do Alentejo junto da população da
Margem Sul, com iniciativas culturais,
gastronómicas e económicas. São feiras
de produtos tradicionais, são almoços
temáticos, colóquios culturais, divulgação e lançamento de obras de autores alentejanos, e a homenagem a
figuras que se têm distinguido
nas suas actividades. Enfim,
é trazer até estas zonas da
Grande Lisboa, a grande
riqueza e valor das gentes
e da terra alentejana.
Além desta actividade a
nível local, há que referir a importância que
têm tido as visitas
culturais dos seus associados e amigos, a
lugares e eventos realizados no Alentejo. Tudo
Luis Maçarico
Jerónimo de Matos
Sentida homenagem e voto ardente
Conheci o Dr. Simas Abrantes em 2005, numa
viagem da Associação de Professores do Concelho de Almada (APCA) ao Porto. Foi-me
apresentado pelo Prof. Antão Vinagre,
tendo-se estabelecido logo entre nós uma relação de grande empatia, decorrente da sua
personalidade aberta de trato afável e grande
curiosidade intelectual.
Tomou então conhecimento do projecto da
Universidade Sénior (USALMA), sabendo do
interesse que tínhamos em criar uma
disciplina de gerontologia (que ele queria
transformar numa área em que trabalhariam
4 ou 5 profissionais de saúde) ofereceu a sua
colaboração que aceitámos com entusiasmo,
tanto mais que, soubemos, tinha feito uma
pós-graduação na área de gerontologia. Ao
mesmo tempo inscreveu-se como membro
do coro polifónico da USALMA, para matar
saudades do seu tempo de coralista do orfeão
académico de Coimbra, na qual se afirmou
com a sua voz grave e quente de baixo.
Da qualidade humana e cientifica do seu
trabalho como professor na USALMA dão testemunhos um grupo de alunos em texto
anexo, em que sobressai a sua sensibilidade
cultural e pedagógica e o gosto do convívio e
do diálogo. O seu entusiasmo pelo projecto
34
Dr. Simas Abrantes com amigos e familiares
USALMA teve como ponto alto a sua
participação como “actor” nas actividades de
encerramento do ano lectivo de 2007, ao
subir ao palco com os seus alunos, que
brindaram a assistência com a declamação de
um conjunto de pensamentos que constituíam
um programa de defesa da saúde e da alegria
de viver.
Aos seus alunos e à direcção da USALMA
manifestava a vontade de realizar um grande
sonho: a criação de um centro de acolhimento
para idosos, a juntar a outros em que a sua
capacidade realizadora e grande determinação
ficaram patentes, entre os quais é justo
salientar a sua clínica fisiátrica no Feijó e
sobretudo a “Rumo ao Futuro”, instituição
para deficientes profundos.
Foi para nós um choque, a sua quebra de
saúde, quando a sua mente generosa fervilhava
de ideias e projectos, alguns dos quais a levar
a cabo na USALMA. Mas a vida impõe os seus
imprevistos e nem os melhores projectos alteram a sua marcha cega.
Resta-nos esperar e fazer ardentes votos pelo
seu restabelecimento e regresso a uma vida
activa de homem empreendedor, benemérito
e solidário.
alunos de gerontologia da Usalma
Testemunho dos seus alunos
Simas Abrantes - estudante do Liceu de Portalegre
conviver connosco, ainda que fosse tomando
um chá num dos cafés em frente á escola, o
que fez com que o grupo mais se unisse e ainda hoje se mantenha com uma forte relação
de amizade.
Para o ano seguinte tinha grandes projectos e
lamentamos que a sua saúde não lhe tenha
permitido concretizá-los e que não pudéssemos continuar a desfrutar da sua companhia
como professor e como amigo.
Bem haja, Professor Simas Abrantes pelos
ensinamentos e amizade que nos transmitiu.
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35
Tivemos a felicidade de ter como professor, na
Usalma - Universidade Sénior de Almada, na
disciplina de Gerontologia, no ano lectivo
2006/2007, o Dr. Simas Abrantes.
Pessoa muito afável, simpática, bem disposta,
bom conversador, sempre com uma graça
para introduzir na matéria, sendo também
um grande contador de historias vividas como
médico, mas que sobretudo nos transmitia
uma mensagem positiva.
As aulas tinham sempre uma frase célebre
introdutória, baseada na matéria que ia dar
nesse dia, sendo pedido aos alunos que a comentassem, razão pela qual as tornava muito
participadas.
Levou-nos em visita de estudo á sua própria
Clínica, no Feijó, á instituição “Rumo ao
Futuro” em Marisol e ao Lar “O Cantinho dos
Avós” em Azeitão, sempre com o objectivo de
que adquiríssemos novos conhecimentos e
ensinamentos, ao mesmo tempo que ficávamos
mais sensibilizados e conhecedores da realidade
social dos nossos idosos.
Tinha um grande objectivo: construir um centro
de acolhimento para idosos com condições
especiais, do qual esperava vir a ser utente
mais tarde com a sua esposa, e eventualmente a filha que frequentava um centro de
educação especial.
Dentro dessa ideia, sonhava construir um grupo de pessoas com formação humana e técnica,
alunos da USALMA que estivessem interessados
em fazer formação especial e também conseguir um grupo de voluntariado.
Arranjava sempre tempo após as aulas, para
Dr. Simas, o Homem Solidário
A Associação Almadense Rumo ao Futuro é
uma instituição particular de solidariedade
social cujos fins estatutários estão
vocacionados para apoiar cidadãos com
deficiência de vários tipos, seja motora,
intelectual, orgânica ou sensorial e está
sediada na Marisol/Charneca de Caparica.
Para tanto, tem actualmente a funcionar no
local da sede um centro de actividades
ocupacionais que recebe 45 cidadãos com
deficiência em regime de centro de dia e um
lar residencial para 14 permanentes e 2
ocasionais, que foi inaugurada em 20 de Maio
de 2010 e que já está em funcionamento.
Foi fundada por escritura pública de 22 de
Junho de 1990, por iniciativa de vários pais
que sentiam na pele a falta de estruturas de
apoio nesta área e devido ao entusiasmo da
Dr.ª Maria Emília Teodósio, fundadora da
instituição e sua presidente da direcção até 25
de Janeiro de 2002.
O Dr. Simas Abrantes é seu associado desde
1992, tendo sido eleito vice-presidente da
mesa da Assembleia Geral em 1993 e
Presidente da Mesa em 26 de Outubro de
1995, cargo que ocupou até 25/1/2002.
É nesta altura que as nossas vidas se cruzam.
Efectivamente, em finais de 2001, princípios
de 2002, esta instituição estava à beira do
António G. Rocha
colapso financeiro, pois apresentava um
passivo superior a 300.000 euros.
É então que um grupo de pais, perante a
eminência do seu encerramento, resolve criar
um movimento para arcar com a sua gestão,
sendo eleita em 25 de Janeiro de 2002, uma
direcção presidida pelo Dr. Simas Abrantes e
que eu próprio integrava também como
vice-presidente, sendo tesoureiro Abranches
Silva e Joaquim Grosso como vogal.
Sem dinheiro começámos a bater a todas as
portas, Câmara, juntas de freguesia e outras
entidades, públicas e privadas, para evitarmos
que a instituição encerrasse, trabalho que
com o entusiasmo de todos os membros da
direcção deu os seus frutos, face à credibilidade
do grupo de pessoas que a compunham, ao
dinamismo do trabalho desenvolvido e ao
prestígio de que gozava o seu presidente da
direcção, Dr. Simas Abrantes.
De qualquer modo, os efeitos deste trabalho
não foram imediatos e era necessário pagar
os salários dos funcionários, bem como as
despesas correntes do seu funcionamento,
nomeadamente com fornecedores.
É então que o Dr. Simas se oferece para
contrair um empréstimo de 10.000 euros
junto do seu banco, dinheiro que canalizou
para a instituição e que mensalmente lhe pas-
36
Rumo ao Futuro - Almada
herdado no primeiro mandato e que era
superior a 300 000 euros, conseguiu ainda angariar durante o segundo mandato, valores
suficientes para a construção do lar/residencial recentemente inaugurado.
Efectivamente, a construção desta valência,
terminada em 2009, foi apoiada financeiramente pelo programa pares em 265.641
euros; pela CMA que apoiou com 70.000
euros; e pela Junta de Freguesia da Charneca
que apoiou com 15.000 euros.
Tratou-se dum apoio importante por parte
destas entidades.
Assim, o homenageado muito contribuiu com
o seu trabalho para o engrandecimento da
Associação Almadense Rumo ao Futuro.
Mas, emprestando o seu dinheiro e ficando
fiador da conta caucionada aberta na CGD,
pôs até o seu património ao serviço desta
instituição, contribuindo assim decisivamente
para a melhoria das condições de vida das
pessoas com deficiência, que tanto precisam
desta casa.
Bem haja!
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37
sou na pagar o valor da respectiva amortização,
sendo com ele que se conseguiu pagar os
ordenados de Março de 2002.
Com este quadro e face às dívidas existentes,
a direcção presidida pelo Dr. Simas, teve que
imprimir uma gestão de rigor e de forte
contenção de custos, o que aliado aos apoios
que se obtiveram veio a dar os seus frutos.
Arrumada a casa e pagas todas as dívidas nos
finais de 2004, logo se começou a trabalhar na
obtenção de fundos financeiros que permitissem a construção dum lar para cidadãos com
deficiência, o que se foi conseguindo ao longo
do segundo mandato da presidência da
Dr. Simas, entre 2005 e 2008.
Infelizmente e por razões de saúde a parte
final deste mandato já não pôde ser ocupada
em pleno pelo seu presidente, que ainda
chegou a ser eleito presidente da mesa da
Assembleia Geral para o triénio 2008/2011.
De qualquer modo, ficou um trabalho notável
das duas direcções presididas pelo Dr. Simas
Abrantes, que depois de liquidar, em pouco
mais de dois anos, o passivo da instituição,
Ao Dr. Simas Abrantes
Nasceu em Alter do Chão,
Homem sereno e bom,
Profissional competente,
Ele acarinhou muita gente.
Em Coimbra se formou,
Médico muito dedicado,
Todos os doentes são amigos,
De uma grande humildade,
Sempre do lado da verdade.
Defensor de grandes causas,
Afável e pronto a ajudar,
À Marinha foi parar,
Em Angola esteve a trabalhar.
Director de Especialidade,
Fisiatria é a sua alegria.
Foi Presidente da “Alma Alentejana”,
Associação de mérito e louvor.
À qual dedicou muito amor.
Na Associação “Rumo ao Futuro”,
Foi seu fundador,
E Presidente da Direcção.
Francisco Sancho
São sentimentos profundos,
Vividos com emoção.
Pessoa sem vaidade,
Professor da “Usalma”,
Universidade da Terceira Idade.
Sabe para onde quer ir,
Pertence à Associação 25 de Abril.
Amigo da sua terra,
Que nunca desprezou,
Alguns cargos desempenhou,
Por todos é estimado,
Até canta bem o fado.
Moderado a falar,
Sempre gostou de dançar.
Nas zonas do Laranjeiro e Almada,
Onde tem muitos admiradores.
Na sua Clínica,
Tem vários colaboradores.
A Esposa sempre a seu lado,
Que é uma grande mulher,
Tinham o destino marcado,
Quando saíram de Alter.
38
Festa de formatura em Medicina - Alter do Chão 1962
Joaquim Manuel Simas Abrantes
39
1937 - Nascido a 01/08/37 na Vila de Alter do Chão
1944 a 47 - Frequência da Escola Primária
1947 a 49 - 1º Ciclo do Ensino Secundário em Alter do Chão
1950-53 - 2º Ciclo do Ensino Secundário no Liceu Nacional de Portalegre
1953-55 - 3º Ciclo do Ensino Secundário no Liceu D. João III de Coimbra
1962 - Licenciatura em Medicina na Universidade de Coimbra
1963 - Estágios nos Hospitais da Universidade de Coimbra
1964 - Ingresso, por concurso de provas públicas, no quadro permanente dos Oficiais Médicos
da Marinha no posto de 2º Tenente Médico Naval
- Comissão de serviço em Angola, como Chefe do Serviço de Saúde de uma companhia de Fuzileiros
- Prestou serviço no Hospital Militar de Luanda no Serviço de Cirurgia.
1965 - Delegado de Saúde em Sto António do Zaire em acumulação com as funções militares.
1967 - Aprovado no concurso para o Internato Geral dos Hospitais Civis de Lisboa
1968 - Promovido a 1º Tenente Médico Naval
1969 - Aprovado no concurso para Internato Complementar de Medicina Física e Reabilitação
1970 - Aprovado em concurso de provas públicas para assistente de Medicina Física e
Reabilitação do Hospital da Marinha
1971 - Especialista em Medicina Física e Reabilitação pela Ordem dos Médicos
1972 a 1995 – Exerceu as funções de médico nos Bombeiros Voluntários de Algés
1973 a 1983 - Sócio e Director Clínico do Centro Médico da Cruz de Pau, Ldª
1973 a 2008 - Director Clínico do Centro Médico - Dr Simas Abrantes, Ldª
1973 a 2010 - Sócio e gerente do Centro Médico - Dr. Simas Abrantes, Ldª
1974 a 2007- Sócio e Director Clínico da Policlínica dos Álamos, Ldª
1975 a 1987 – Director Clínico da Clínica de São João Baptista
1976 - Aprovado em concurso de provas documentais e discussão curricular para Chefe de
Serviço do M.F.R. do Hospital da Marinha.
1976 a 2006 - Sócio e Director Clínico da Clínica Médica - Pulmoasma, Ldª
1977 - Promovido a Capitão Tenente Médico Naval
1978 - Curso de especialização em doenças reumáticas do Instituto POAL de Reumatologia
Universidade de Barcelona
1980 a 2007 – Sócio e Director Clínico da Clínica Médica - Saúde Mar, Ldª
1984 - Promovido a Capitão de Fragata Médico Naval
- Curso de Pós-graduação de Medicina Ortopédica e Manipulação Vertebral na
Universidade de Madrid
1988 - Chefe de Departamento da Escola de Serviço de Saúde Militar
1987 - Promovido a Capitão de Mar e Guerra Médico Naval
1989 - Chefe do Serviço de Saúde do Estado Maior General das Forças Armadas
1990 - Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Associação dos Deficientes “Rumo ao Futuro”
1995 - Curso de Pós-graduação em Gerontologia na Universidade Internacional
1995 - Sócio Fundador da Alma Alentejana e 1º Presidente da Direcção
1999 - Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Alma Alentejana
2001 a 2004- Membro da Assembleia Municipal de Alter do Chão eleito pelo Partido Socialista
2002 a 2008- Presidente da Associação Almadense “Rumo ao Futuro”
2004 a 2006- Professor na Universidade Sénior de Almada (USALMA)
X Jogos Florais – 2010
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ReGULAMenTO
1 - Os X Jogos Florais da Alma Alentejana são abertos a associados ou não. A Alma Alentejana, com a edição dos
Jogos Florais criou, em simultâneo, a figura do Patrono dos Jogos. Esta iniciativa pretende homenagear personalidades
alentejanas importantes na vida cultural portuguesa.
Em 2010 será Patrono do Jogos o Dr. Simas Abrantes, fundador e primeiro Presidente da Direcção da Alma
Alentejana.
2 – Também, este ano queremos que a juventude participe, vamos por isso criar uma categoria especial para esta
faixa etária. Os temas serão os mesmos e a idade limite será os 25 anos.
3 – Estes Jogos compreendem três categorias de obras originais:
a) Quadra – A República
b) Poesia – Tema livre
c) Conto – 100 anos da implantação da República
Todos os trabalhos, dactilografados (à máquina de escrever ou em computador) em tipo Times New Roman,
tamanho 12, a espaço e meio, e no caso da poesia de tema livre e do conto deverão ter um máximo de três (3) páginas.
4 – Os trabalhos deverão dar entrada na sede da Alma Alentejana (Avenida Professor Ruy Luís Gomes, 13 – R/C
Laranjeiro 2810-274 ALMADA – Telefone: 212 540 053) até ao final do dia 8 de Outubro de 2010, nos seguintes termos:
a) Cada obra deve figurar em folha individual (mas em triplicado), identificada com pseudónimo, no canto superior
direito;
b) Será também entregue um envelope fechado, com o mesmo pseudónimo no exterior e no interior a identificação
do autor (que apresentará os seguintes dados): nome, data e local de nascimento, local de residência e telefone.
c) A obra (ou conjunto de obras) e o envelope fechado serão entregues dentro de outro envelope (este sem
remetente), com a indicação: “Alma Alentejana – X Jogos Florais – 2010”.
5 – Cada concorrente pode no máximo competir com três (3) quadras, dois (2) poemas e um (1) conto.
6 – O júri, de cuja decisão não haverá apelo, será composto pelas seguintes seis personalidades idóneas, designadas
pela Direcção da associação:
- 1 elemento em representação da Alma Alentejana;
- 1 elemento da Câmara Municipal de Almada
- 1 elemento em representação da Associação Portuguesa de Poetas;
- 1 escritor
- 2 elementos designados pelas Juntas de Freguesia do Laranjeiro e da Amora.
Em caso de empate o presidente do júri exercerá o seu voto de qualidade
7 – Os componentes do júri (ou familiares directos) não podem participar neste concurso.
8 – A cada categoria mencionada no ponto 3, serão atribuídos 1.º, 2.º e 3.º prémio e um máximo de duas menções
honrosas; porém, o júri poderá não conceder um ou mais prémios, ou menções honrosas, caso a qualidade das obras
levadas a concurso assim o determine. Há possibilidade de publicação dos trabalhos premiados. Os prémios, que
constarão de diplomas e livros de autores portugueses, serão entregues em 24 de Outubro de 2010, em cerimónia
que terá lugar em Almada (em local a designar). Haverá este ano, pela sexta vez, um “PRÉMIO ABSOLUTO”.
9 – A Alma Alentejana poderá utilizar no futuro as obras premiadas conforme lhe aprouver.
10 – A Alma Alentejana não se responsabiliza pela devolução das obras não premiadas que não forem levantadas no
exacto prazo de dois meses sobre a data da divulgação/atribuição dos prémios.
11 – Todas as questões omissas no presente regulamento serão resolvidas por decisão do júri.
TRATADO DO CANTE
José Francisco Pereira
O nome dos poetas populares....
(...)
No contexto de uma sala de aula
Não estarem esses nomes me dá pena
A escola devia ensinar
Pro aluno não me achar um bobo
Sem saber que os nomes que eu louvo
São vates de muitas qualidades
O aluno devia bater palma
Saber de cada um o nome todo
Se sentir satisfeito e orgulhoso
E falar deles para os de menor idade
O nome dos poetas populares
(...)
Poema de Padre António Vieira. Maria
Bethânia dá voz e alma (CD Pirata, faixa 12).
Que deveria estar na boca do povo.
Registo de memória
Recordo aqueles tempos em que nas tabernas, palco privilegiado de tantas modas: umas
de passatempo e outras de amarfanhamento;
algumas de festa mas ainda outras de tristezas. Mas era encantador ver grupos de jovens,
mais ou menos da mesma idade, que depois
de um copo, um petisco, uma boa moda,
saíam em grupo, circulavam pelas ruas e onde
morava uma namorada de alguém do grupo,
paravam, faziam um círculo e então o ponto
(pretendente) começava com uma cantiga
quase sempre dirigida à pretendida e logo
surgia a moda levantada pelo alto a dar entrada ao coro dos restantes elementos. Era assim
na minha meninice. E eu registei esses
momentos que sempre me acompanharam.
Quando a mocidade passa
À minha porta cantando
Venho me assumar à porta
Volto para trás chorando2.
Era ainda nas tabernas que os homens
alentejanos se uniam, depois de um dia de
trabalho; de um dia de festa; de um dia em
que o capataz não o contou para a jornada de
trabalho; e até por outros motivos de compensação para alegrias e desgraças que a
todos ocorrem, certos das suas fraquezas e
forças, onde atrás de um copo de vinho e de
um petisco surgia uma cantiga e a moda que
então andava na moda; depois outra
cantiga... a mesma moda3.
Quando eu oiço o bem cantar
Paro e tiro o meu chapéu
Não se me dava morrer
Se houvesse cante no céu1.
Venha o copo, venha a pinga
Venha mais meia canada
Eu sem o copo não bebo
Sem a pinga não sou nada4.
41
Longe vão os tempos da minha infância.
Recordo-os com muita saudade. Tive uma
infância rica! Foram-me dadas possibilidades
e ocasiões de leitura e de grande entendimento sobre tudo o que me rodeava. Soube ler!
Na minha terra «Montoito» havia tudo e de
quase tudo para a minha evolução. Registo
com agrado esta paixão pelo cante que me alimenta desde então. De tal maneira o cante
está entranhado que ainda hoje não consigo
despegar na tentativa de saber ainda mais sobre tão nobre forma de ser e querer.
1 - Hoje posso... podemos ter presente o que esta quadra (cantiga) quer dizer. Este sentimento está entranhado no alentejano como fazendo
parte do ser Ser.
2 - Hoje posso comungar deste sentimento com o envolvimento e a carga emotiva que esta quadra (cantiga) contém.
3 - Deixo aqui o registo de três tabernas, entre outras, da minha terra (Montoito) que existiam na minha infância: a do Zé Bagulho; a do Ti Feliz; a do Zé Palheta. Era nestas taberna que mais ouvia cantar.
4 - Não sei a origem desta quadra (cantiga). Julgo que não é do Alentejo. Mas vem a contendo.
No campo era a labuta. E que labuta! Os
homens tinham que se levantar muito cedo
para que ao nascer do sol estivessem prontos
para enregar a trabalhar: a lavoura..., a
sementeira..., naqueles dias de invernia onde
parecia que o céu vinha abaixo, lá iam os
homens sujeitos à inclemência do tempo e
das necessidades. Ainda hoje rememoro a
saída das parelhas, com toda a ocharia da
lavoura, sob um intenso nevoeiro, vento e
chuva e lá iam para as terras de barro da
herdade da Casa Alta. Logo à saída do monte,
não se via nada, só se ouviam as esquilas dos
cabrestos dos animais. Era para o pão nosso
de cada dia.
LAVOURA (Almocreve)5
Ponto:A vida dum almocreve
É uma vida arriscada
Ao descer duma ladeira
Ao cerrar duma carrada
Ao cerrar duma carrada
Alto:
Coro:
Lembra-me os tempos passados
Tudo se vai acabando
Os bois puxando o arado
O almocreve cantando
O almocreve cantando
Alto:
Coro:
O almocreve cantando
Cultivando lindos prados
Quando vejo alguém lavrando
Lembra-me os tempos passados
Lembra-me os tempos passados
42
Ponto:Às vezes lá no meu monte
Faço vazas de ganhão
Lavro com dois bois vermelhos
Que fazem tremer o chão
Que fazem tremer o chão
Alto:
Lembra-me os tempos passados
Depois vinha a monda e era vê- las, as mulheres
que saíam de casa, ao grito da manajeira, que
no início de cada rua da vila, as ia chamando
para a monda, numa herdade a uns quilómetros de distância. Sinto ainda nos meus ouvidos aquele chamamento cantado que engrenava no processo de início da jornada6.
A ceifa. Grandes ranchos de homens e mulheres. Grandes searas. Sol abrasador. Mas... era
uma alegria! Lá no fundo das minhas memórias7 ainda vislumbro aquela chegada à vila,
de um rancho que tinha acabado a ceifa na
herdade da Mencoca, “que estímulo orientava aquela gente para aquele transbordar de
alegria?” Ainda vinham a alguns quilómetros
da vila e já se ouviam a cantar. Foi muito
envolvente.
VERÃO8
Ponto:Verão, a brasa dourada e celeste
Esvaiu do Sol agreste
Dourando mais as espigas
Ceifeiros corpos curvados
Ceifando e atando molhos
E benção loira da vida
Alto:
Coro:
Meu Alentejo
Enquanto isto se processa
O Sol ferido e sem pressa
Queima mais a tez bronzeada
O suor rasga a camisa
Homem queimado mais fica
A vida é feita de brasa
Ponto:O suor caustica os corpos
Os ceifeiros vão ceifando
Sem parar no seu labor
O seu cantar é dolente
É certo que é boa gente
É verdade e tem mais sol
Alto: Meu Alentejo
Coro:...
5 - Esta moda foi feita por Estêvão “Olhicos” da Amareleja. É popular.
6 - Deixo aqui a minha homenagem à minha mãe, manajeira, que recordo com muita saudade. Bem Haja!
7 - Em finais da década de 50.
8 - Moda feita por Manuel Conde de S. Pedro do Corval para o Grupo Coral da casa do Povo de Reguengos de Monsaraz.
Registo ainda como um facto marcante na
minha caminhada, na UCP Estrela Negra de
Sousel, aquela adiafa no final da apanha da
azeitona do ano de 1976, com um grande
desfile pelas ruas de Sousel, onde as saias
cantadas à cooperativa e ao povo alentejano
marcaram toda aquela gente muito
profundamente. Bem Hajam!
A PLANÍCIE ALENTEJANA9
Ponto:
No alvor da madrugada
Sai o gado p’ra pastagem
Num silêncio tão profundo
Lembra-me assim a vida selvagem
Alto:
Coro:
Na planície alentejana
Oiço os chocalhos do gado
O assobio do pastor
E o latir dos cão macaco
Alto:
Coro:
Debaixo do Sol escaldante
Vão pastando nos montados
Na planície alentejana
Oiço o balir e os seus chocalhos
Ponto: Desde o começo do mundo
Desbravando a natureza
O homem guarda o seu gado
Cheio de amor carinho e beleza
Alto: Na planície alentejana
Coro:...
QUANDO EU CHEGUEI AO BARREIRO10
Vou-me embora para Lisboa
Porque a vida cá é má
À busca de coisa boa
Pergunto não encontro cá
Quando eu montei no comboio
Que assoprava pela linha
Às vezes penso comigo e digo
Não sei que sorte é a minha
Quando cheguei ao Barreiro
No barco que atravessa o Tejo
Chora por mim que eu choro por ti
Já deixei o Alentejo
43
Do campo retenho ainda com grande intensidade o cheiro da terra, a rotina da volta do
gado, o enleio do cantar dos pássaros... Tudo
isto ainda me traz cativo. Ser pastor, num tempo de interiorização, no bom uso das suas
faculdades com o sentido de liberdade e de sã
convivência com a natureza, com a cumplicidade dos animais que guarda, com a ajuda do
seu cão macaco, do ajuda, dá forçosamente
muita capacidade criativa. É com este embevecimento que se fizeram grandes modas ao
pastor. Bem Hajam os seus criadores!
Chega a hora de romper com esta vida. O
sentido de arranjar mais proventos, o dar outro padrão de vida aos filhos, não conseguíveis na sua terra, fez com que os seus melhores
partissem. Mas nunca houve separação nem
afastamento. Sempre se arranjaram motivos
para se estar perto do seu Alentejo. Esta
ligação foi sempre feita através do Cante.
Estação da Funcheira
9 - Moda feita por Manuel Martins do Grupo Coral e Musical “Diversos do Alentejo” de Pinhal dos Frades.
10 - Esta moda parece-me ter sido feita na zona de Odemira. Não tenho a certeza.
Corais Alentejanos
Da paixão chegou a necessidade de saber
mais sobre o cante. As primeiras tentativas
foram muito desanimadoras. Não tínhamos
ideia nenhuma do que iríamos encontrar. De
Encontro em Encontro foi sendo recolhida a
informação para o livro Corais Alentejanos,
editado em 1997. Não é uma obra completa,
nem exaustiva, mas que marca profundamente
o pensar sobre o cante, isso marca. Fica-se
finalmente a saber quem somos! É uma obra
para consulta com informação de grande utilidade.
Dizia o Prof. Manuel Joaquim Delgado11: “Ai
dos académicos se não fossem os curiosos”.
Pode ser que a partir daqui haja mais humildade e se criem os laços oportunos para a justa
posição do Nosso Cante!
Foram inventariados 104 grupos:
61 em Beja: 45 masculinos; dois mistos; seis
femininos; sete infantis; um instrumental.
12 em Évora: nove masculinos; um misto; dois
instrumentais; 6 em Setúbal: três masculinos;
um feminino; dois instrumentais; 25 na diáspora (Lisboa/Setúbal): 22 masculinos; três
instrumentais.
O lançamento do livro foi feito na Biblioteca
Bento de Jesus Caraça, na Moita em Outubro
de 1997, durante a iniciativa “Viver Alentejo”.
De todo o material recolhido para este trabalho:
cassetes audio, discos de vinil e Cd’s com
canções tradicionais alentejanas e com registos e entrevistas; documentação e livros,
estão depositados na Biblioteca Municipal da
Moita, Pólo da Baixa da Banheira, onde será
digitalizado e divulgado, podendo assim ser
consultado por qualquer interessado.
Grupos Corais existentes em 1997 na
Diáspora (Lisboa/Setúbal)12
in: Corais Alentejanos
Almada
- Grupo Coral “Amigos do Alentejo” –
- Clube Recreativo do Feijó
Amadora
- Grupo Coral Alentejano da Soc. Fil. Recreio
Artístico da Amadora.
- Grupo Coral Alentejano da Brandôa
- Grupo Coral “Os Alentejanos da Damaia”
Barreiro
- Grupo Coral Alentejano “Os Amigos do Barreiro”
- Grupo Coral Alentejano “Unidos do Lavradio”
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Cascais
- Grupo Coral “Estrelas do Guadiana”
- Ass. Cultural e Recreativa dos Alentejanos
Residentes em Tires
- Grupo Coral Alentejano Bairro Além das Vinhas
- Clube Desportivo e Recreativo “Os Vinhais”
11 - Grande estudioso “curioso”. Autor de Subsídio para o Cancioneiro Popular do Baixo Alentejo.
12 - Antes de 1996/97 já tinham ficado pelo caminho os Grupos da Abrunheira; Venda Nova; Cerromaior; Camarate e Carnaxide.
Entretanto dos inventariados em 1997 acabaram os grupos do Bairro Além das Vinhas; As Andorinhas; Os Unidos do Alentejo;
Ac. de Linda-a-Velha; e Ecos do Alentejo. Mesmo assim e depois de 1997 foram criados os Grupos: Cantadeiras da Alma Alentejana; 1º. de Maio do Bairro Alentejano; e Amigos do Independente de Setúbal. O Grupo “Os Sadinos” ainda está em actividade
agora com o nome de “Amigos dos Sadinos”
Loures
- Grupo Coral da Liga dos Amigos da Mina de
São Domingos
- Grupo Coral e Instrumental “Ecos do Alentejo”
Moita
- Grupo Coral União Alentejana da Baixa da
Banheira
- Soc. Recreativa e Cultural União Alentejana
da Baixa da Banheira
Oeiras
- Grupo Coral Alentejano da
Academia Recreativa de Linda-a-Velha
- Grupo Coral Instrumental “Norte Sul”
Palmela
- Grupo Coral “Ausentes do Alentejo”
Seixal
Sesimbra
- Grupo Coral “Voz do Alentejo” da
Quinta do Conde
Setúbal
- Grupo Coral os “Os Unidos do Alentejo”
Cp. H. Ct. Ec. Bem-Vinda Liberdade, CRL - Faralhão
- Grupo Coral do Clube de Futebol “Os Sadinos”
Sintra
- Grupo Coral Alentejano “Os Populares do Cacém”
- Grupo Coral da AFAPS “As Andorinhas”
Vila Franca de Xira
- Grupo Coral “Unidos do Baixo Alentejo”
Congresso do Cante Alentejano
Realizado em Beja em Novembro de 1997,
este congresso organizado pela Casa do
Alentejo, ocorreu numa altura terrível e
penosa para o Povo alentejano. Mas realizou-se!
Como prova disso e para que conste, foi feito
um livro que se chama: Que modas? Que
modos? - 1º. Congresso do Cante – Actas -,
editado pela Faialentejo, em 2005. Foi
lançado na ilha do Pico e em Évora.
RESUMO DAS CONCLUSÕES:
Podemos sintetizar em seis pontos as grandes
conclusões deste Congresso:
1. O incentivo à investigação da génese, ainda
desconhecida, em certa medida, do cante
alentejano, havendo quem sustente a sua origem gregoriana, eclesiástica ou cristã e quem
advogue a sua origem arábica ou islâmica.
2. O desenvolvimento de esforços no sentido
da constituição de um organismo que seja depositário da memória da idiossincrasia do
cante alentejano - um arquivo audiovisual do
45
- Grupo Coral Alentejano dos Serviços Sociais
das Autarquias do Concelho de Seixal
- Grupo Coral “Eco do Alentejo” –
Casa do Povo de Corroios
- Grupo Coral Alentejano “Lírio Roxo” –
Soc. Musical 5 de Outubro
- Grupo Coral “Operário Alentejano”
Centro Cultural e Desportivo das Paivas
- Grupo Coral e Musical Diversos do Alentejo
de Pinhal dos Frades
- Centro de Solidariedade Social de Pinhal dos
Frades
46
Alentejo. Neste deverão figurar as gravações
sonoras (comerciais ou de campo); os registos
visuais dos grupos de cante entoando as
melodias, narrando estórias da vida, etc.; os
livros e diverso material iconográfico; os
trajes; os objectos de artesanato, de trabalho,
mineiro, rural, etc.; a colaboração com as
Universidades ou outras escolas, onde leccionem
especialistas do cante, poderá e deverá existir.
Poderá este arquivo estar incluído num futuro
Instituto Alentejano da Cultura / Desenvolvimento.
3. A inserção da teoria e da prática do cante
alentejano nos programas escolares, havendo
quem sustente essa incorporação nas escolas
de ensino público e quem defenda a criação
de escolas de cante independentes do poder
do Estado13.
4. A preservação da etnomusicologia alentejana como um todo (o cante, o despique, o
baldão a viola campaniça), nesta matéria as
opiniões dividem-se, os mais fixistas
sustentam que os espectáculos de cante se
devem realizar com o traje a rigor tradicional;
outros evolucionistas advogam que o cante
deve manter a sua genuinidade musical, mas
as letras das canções e os trajes podem
evoluir e ser adaptados a este final do século
XX e a inclusão no cante da voz feminina14.
5. A vinculação das autarquias em todos os
concelhos alentejanos, na defesa e propagação do cante. As câmaras municipais deverão
dar apoio logístico (transporte, sedes para
grupos corais, imprensa, etc.) e financeiro aos
grupos e escolas de cante, sem que estas
caiam no domínio da política partidária.
6. A formação de uma federação de folclore
alentejana - a Federação de Grupos Corais
Alentejanos que poderá ser a força motriz da
formação do arquivo audiovisual do cante
alentejano e dos próximos Congressos do
cante alentejano15.
Beja, 9 de Novembro de 1997
Senhor Alentejo
“Ao Vitor Paquete
Da verticalidade do “sonho” ao horizonte das
realidades, Vitor Paquete sempre acreditou
nas Razões do seu Povo, na sua História e na
sua Cultura.
Por elas lutou uma vida inteira, sofrido,
esperançado.
(...)
Hoje, memória constante das Coisas, lembro-me de vivências, de acontecimentos, de
estórias felizes, cativantes, dramáticas ou
irónicas, em que a personalidade do Paquete
contagiava pela erudição, pelo empenho
exaustivo, da sua grande alma Alentejana.
Hoje, compadre dos quatro costados, (...)”
palavras de António Galvão, Pintor de arte
13 - Está a ser posta em prática nos concelho de Almodôvar, Castro Verde e Vidigueira.
14 - A prática assumida nos concelhos de Almodôvar, Odemira e Castro Verde leva-nos a crer que o futuro da viola campaniça
e do cante ao baldão está assegurado. O cante no feminino tem ganho posições em todo o Alentejo com a criação de muitos
grupos só com vozes femininas.
15 - A Associação A Moda é o resultado desta conclusão.
(...) de um camponês do Baixo-Alentejo (...):
«Ajudem-me que eu não posso
Cantar a moda sozinho
A moda está muito alta
E o meu cantar é baixinho.»
in: Jornal de Notícias, Suplemento Literário,
pág. 5, de 4 de Agosto de 1957.
Tratado do Cante
Hoje, que nos chegam recados de alma alentejana
Hoje, que nos viram do avesso as modas
Hoje, que se levou ao cante a fórmula da
sobrevivência
Será oportuno malhar na eira dos justos
E crer que é possível amedrontar o silêncio
Dos que se instituem no poder inocente
E procurar no Povo do Teu Alentejo
A justiça de te fazer valer
“Gostava de lhe fazer umas perguntas:
- Qual a sua profissão?
- Porque se dedica ao estudo do cante?
- Quanto ao Congresso do Cante, como se processou a sua organização e de que modo foi o
Sr. o comissário?
(...)
Cumprimentos,
J Moniz”
...
Caro amigo,
Sobretudo sou alentejano, amante da sua
Pátria e dos seus valores. Nasci em Montoito
filho de um pastor e de uma mondadeira, com
boas vozes e paixão pelo cante que mo
incutiram. A profissão pouco conta para isto.
Motivos vários me fazem correr atrás do
cante: a paixão, o eterno sabor, o mais que
evidente Alentejo (terra forte e esmagadora).
Tudo isto: porque não posso, nem quero,
contornar as minhas raízes. Então o melhor é
respeitá-lo, amá-lo e praticá-lo. Procurarei
sempre fazê-lo da melhor maneira que sei.
Daí até ao Congresso foi um passo. Feito o
inventário dos Grupos existentes, que deu um
livro: “Corais Alentejanos”, logo o convite
para comissariar o Congresso. Atenção que a
Organização foi da Casa do Alentejo de
Lisboa.
Estarei sempre ao dispor para as Boas causas
e o Cante é uma Boa causa.
47
Lembrando Vitor Paquete
(Uma pequena entrevista, como introdução
justificativa, para este imenso e meritório
trabalho a que JFP decidiu abalançar-se... e já
leva mais de uma dezena de anos...)
48
E foi aqui que ficou marcado o traço de união
para este trabalho que esperamos ter pronto
no final deste ano de 2010. Assim os poderes
instituídos e sobretudo os elementos dos
Grupos se motivem para que o resultado se
torne num bom Tratado sobre o cante alentejano.
Não tem sido fácil o relacionamento com as
instituições. Da parte da Direcção Regional da
Cultura do Alentejo acabamos de receber
uma informação: “de momento não podemos
apoiar este trabalho”. Das autarquias tem
aparecido algum interesse, mas muito comedido. Em contrapartida temos recebido todo
o apoio e disponibilidade dos elementos dos
Grupos Corais.
Para este trabalho preparámo-nos para
recolher os elementos necessários que
respondam e dêem significado a:
– O Ser Alentejano
– A Motivação Alentejana
– A Vestimenta
– As terras do Cante
– O Cante
– As Cantigas
– As Modas
– Os Ranchos/Grupos
– Os Mestres
– Os Cantadores
– Os Pontos/Solistas
– Os Altos (Falsete)
– O Coral
- Os Registos Fonográficos
– A História do Cante
– O Cante na actualidade
– O Futuro do Cante
- A Bibliografia
Para nós, o Ser, com nomes e tudo o que dê
resposta à criatividade, faz toda a diferença. E
é da diferença que nos valemos: diferença de
Ser Povo e não mais que isso.
ALENTEJO, ALENTEJO
Ponto:
Eu sou devedor à terra
A terra me está devendo
A terra paga-me em vida
Eu pago à terra (em) morrendo
Alto:
Eu pago à terra (em) morrendo
Coro: Eu sou devedor à terra
Eu sou devedor à terra
A terra me está devendo
Alto:
Coro:
Alentejo, Alentejo
Terra sagrada do pão
Eu hei-de ir ao Alentejo
‘inda que seja no verão
Alto:
Coro:
Ver searas a loirar
Nessa imensa solidão
Alentejo, Alentejo
Terra sagrada do pão
O Cante
Situação geográfica
É indiscutível que no Baixo Alentejo, na área
geográfica que vai da Serra de Portel a Norte
até ao início do Algarve a Sul, e da fronteira da
Espanha a Leste até ao mar a Oeste, há uma
forma de cantar em polifonia específica a que
se chama cante.
Das origens
De onde vem este mavioso canto que nos
toca no mais íntimo do ser? Que ondas
magnéticas e que sentir misterioso e
profundo fizeram chegar até nós e perdurar
esta forma de cantar?
Nunca se saberá ao certo a origem do cante.
Paulo Lima fez uma síntese das tendências
conhecidas: origem autóctone, baseada em
cantos litúrgicos pré-romanos; berbere, do
tempo em que os árabes estiveram no sul; do
cantochão. E ainda do Norte do país, de Entre
Douro e Minho, trazido no tempo da
Reconquista; ou restos de cantos eslavos ou
de ópera italiana do século XVIII. Interessante
a hipótese, tal como se sabe do canto
polifónico da Córsega, de ter sido trazido por
franciscanos mendicantes que o utilizariam
para difundir o cristianismo no Sul. Assim sendo, o cante do Baixo Alentejo todo ele teria
tido origem no canto religioso, o que não choca mesmo nada, na medida em que há um
considerável número de canções sobre a
natureza, de acordo com o modelo
franciscano, baseado no homem de Assis que
Das mutações
Perdendo-se a origem do cante, não restam
dúvidas de que houve ao longo dos tempos
factores que o forjaram, limando-o, introduzindo-lhe algumas alterações, de acordo com
as mudanças da comunidade que o praticou e
que o fizeram chegar aos nossos dias da
forma como o ouvimos. Aponta-se como uma
das hipóteses as influências de frades
residentes em conventos do Alentejo como o
da Serra de Ossa e o de Serpa. Deviam ser
frades conhecedores de música e que
poderão ter tido um papel importante na
fixação do cante. Na verdade, surpreende a
quantidade de cânticos religiosos ainda hoje
vivos na tradição alentejana. Exemplo disso
são os espectáculos de Cânticos ao Menino
pela altura do Natal e pelos Reis. Outras
influências são conhecidas como a origem da
postura actual dos grupos de braços dados
numa mesma cadência que data da década de
trinta do século passado.
As transformações socioculturais provocadas
pelas alterações socio-económicas fruto da
saída de soldados para os Açores durante a
Segunda Guerra Mundial, para a guerra
colonial na década de sessenta e das
migrações para as zonas de Lisboa e Setúbal
(avalia-se em 30% os que para estas zonas
saíram entre 1950 e 1970) e mesmo para o
estrangeiro, e ainda as modificações que o 25
de Abril de 1974 veio introduzir, também são
marcos a ter em conta.
Verifica-se atualmente uma tendência de
aligeirar a moda nos grupos de cante que se
formaram na zona industrial de Lisboa e
Setúbal e as canções alentejanas que se cantam por todo o lado são cantadas em ritmos
mais rápidos. A poética, se bem que continue
com os grandes temas tradicionais (a natureza: árvores, flores, rios e ribeiras, por vezes
como metáforas do amor, da solidão, do
sofrimento... nomes de terras e pessoas...),
adquiriu novos temas como hinos dos grupos
e cantares às terras de adopção.
Da paixão
Não há dúvida nenhuma que a maioria das
pessoas que cantam nos Grupos Corais
alentejanos são verdadeiramente apaixonadas
pelo Cante e isso é difícil explicar por palavras.
O Cante é a sua cultura, está-lhes no sangue e,
principalmente quem vivenciou o cante como
forma natural fazendo parte do trabalho, hoje
sente vontade de lhe dar continuidade e isso
agora só ou quase só em espectáculo e gravação.
O que terá levado já este ano a Liga dos
Amigos da Mina de S. Domingos a gravar em
quatro Cd’s cerca de 200 canções? Desejo de
continuidade e paixão?!...
E não serão as paixões a guiar o mundo?
Mer e Al-Zéi
2010, Setembro
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49
tratava por irmãos tanto o sol como o lobo. E
agora interrogo-me eu, toda a música não
terá origem na religiosidade? Religiosidade,
entenda-se, no seu sentido etimológico de
ligação ou religação. Quando alguém canta
não é para ser ouvido por outrem? A música
não nos une e eleva a todos?
ALENTEJO EM FOTO
50
Joaquim Carrapato
Évora - Arcadas da Cidade
51
O som na Praça de Geraldo
52
Aguadeira
53
Cromeleque dos Almendres
54
O Templo de Diana
55
Évora - Cidade Branca
NOTÍCIAS DA ALMA
14º Aniversário
56
Em Abril, a Alma Alentejana comemorou o
14º Aniversário com um almoço, nas
instalações do Centro de Dia do Laranjeiro,
que juntou mais de uma centena de Sócios,
Órgãos Sociais, Colaboradores e Convidados,
além de antigos Dirigentes e Entidades
Oficiais, representantes das Câmaras de
Almada e Seixal, Governador Civil de Setúbal,
Casa do Alentejo, não esquecendo muitas
Instituições congéneres.
O almoço – carne do alguidar – confeccionado
pelo Chefe Amadeu Poupinha e servido pelo
Luis Bastos e Luis Valentim permitiu que
todos, Direcção e colaboradores, se
juntassem à mesa e partilhassem a efeméride.
Após intervenções de alguns convidados o
Presidente da Direcção manifestou “o agradecimento e alegria deste convívio, dando
relevo à presença solidária de todos”.
O convívio terminou com a intervenção
musical das nossas Cantadeiras e dos sócios e
amigos José Carita e Francisco Naia.
Deputada Paula Santos
visitou o CD do Laranjeiro
No passado mês de Maio recebemos, no CDL,
a visita de uma delegação do PCP, chefiada
pela Deputada Paula Santos. Recebida pelo
Presidente da Direcção da A.A., a Deputada
inteirou-se das dificuldades com que nos debatemos para manter o serviço de apoio aos
nossos idosos, manifestou-nos a sua solidariedade e assumiu o compromisso de, nas suas
tarefas e do grupo parlamentar do PCP, trabalhar para que os apoios governamentais às
IPSS sejam justos e efectivos.
de Associações, na Assembleia da República.
Foram pelas IPSS expostos os seus problemas
e sugeridas soluções. Num debate vivo, deixamos registado a nossa vontade de continuar
este nosso trabalho – voluntário – em prol
duma sociedade mais justa e digna.
As Cantadeiras e a
Companhia de Dança de Almada
As Cantadeiras da Alma Alentejana participaram, a convite da Companhia de Dança de
Almada, no espectáculo “Olhares” realizado,
em Maio, no Fórum Romeu Correia. Foi um
bonito e sugestivo espectáculo de dança,
onde a intervenção das Cantadeiras foi muito
apreciada pelo público.
CNIS, UDIPSS e
Assembleia da República
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57
A Direcção da AA, durante o primeiro semestre deste ano, participou em diversas reuniões
na CNIS e na UDIPSS onde foram debatidos os
muitos problemas que afectam a nossa Instituição e põem em causa a viabilidade da
prestação do Serviço de apoio aos idosos.
Sensibilizar o Governo para necessidade de
uma maior atenção e responsabilização
perante a actividade desenvolvida pelas IPSS,
com uma respectiva comparticipação de
meios para que o nosso trabalho seja cada vez
maior e de melhor qualidade, foi o tema central destas reuniões.
Convidados pelo Grupo Parlamentar do PCP
estivemos reunidos, com mais umas dezenas
Lançamento do CD
“O Alentejo não tem fim”
58
Foi um dia muito bonito! 5 de Junho de 2010
vai ficar na memória de todos os sócios e
amigos da Alma Alentejana, mas sobretudo
de todos os alentejanos, pois nesse dia a Direcção da Alma Alentejana concretizou um
sonho – o lançamento público do 2º CD das
Cantadeiras da Alma.
“O Alentejo não tem fim” é o corolário de um
trabalho imenso em prol da cultura alentejana,
honra quem o idealizou e permite a quem o
ouve desfrutar do prazer de sentir o nosso
“cante”, interpretado por gente que deixou o
Alentejo sem nunca o esquecer. É também a
concretização de uma das missões da nossa
Associação – “preservar e divulgar a cultura
alentejana e as suas gentes”.
Tendo como cenário a bonita Baía do Seixal e
no espaço privilegiado do Restaurante
O Cacilheiro do Tejo, o Grupo Coral Etnográfico
Os Amigos do Alentejo, do Feijó, fez a
recepção, como padrinho, às “Cantadeiras”,
cantando à entrada do Barco uma moda alusiva ao momento. A entrega de flores e os
abraços e aplausos deram um tom de emoção
enorme ao acontecimento.
No interior, após o “Amigos do Alentejo” terem cantado mais duas modas, o Presidente
da Direcção da Alma Alentejana, António
Oliveira, agradeceu a presença de todos,
sublinhando a “importância do evento, o
esforço de todos
os que colab o ra ra m
para que
fosse
possível
a edição
do CD,
em especial o ensaiador
Luís Moisão,
os poetas e
compositores Euclides Cavaco, Rosa Dias, José
Borralho, Manuel Martins, a autora da capa
Fátima Borges, a cantora Luísa Basto e todas
as cantadeiras, além dos patrocinadores
Marcolino Sebo, Cacilheiro do Tejo, Câmaras
Municipais de Almada e Seixal, Convento dos
Capuchos – espaço lindíssimo onde foi feita a
gravação - António Bizarro, técnico de som,
inexcedível no trabalho cuidadoso e perfeito,
que permitiu um produto final de grande qualidade. Agradecemos também a todas as
Câmaras do Alentejo e Juntas de Freguesia da
Margem Sul, que adquiriram Cd´s, ainda
antes dos mesmos estarem prontos. Certos
de que, como Direcção, fizemos tudo para
que “O Alentejo não tem fim” fosse uma realidade, resta-nos desejar as maiores felicida-
des a todos no futuro e que o trabalho até
agora desenvolvido pelas “Cantadeiras” seja
ainda melhor, suportado no registo sonoro
que hoje damos à estampa. Uma palavra final
para os nossos outros Grupos: Os Cavaquinhos, as Sevilhanas e o Grupo de Violas
Campaniças, este a fazer a sua estreia durante
a XII Feira do Alentejo, registando que muitos
dos seus elementos estão aqui connosco, para
eles a nossa promessa de todo o apoio na nobre tarefa da divulgação da cultura alentejana
que vêm fazendo. Estamos em fase de
reestruturação e enquadramento estatutário
dos Grupos mas não deixaremos nunca de
estar atentos à sua evolução e acompanhamento. Com um sincero e emocionado
obrigado a todos.”
A Direcção fez a entrega do CD nº1 ao
Ensaiador Sr. Luís Moisão e também de uma
travessa, em barro de S. Pedro do Corval,
ilustrada com a imagem da capa do CD. Seguiu-se a entrega de CD’s e lembranças comemorativas.
As “Cantadeiras” actuaram de seguida, cantando vários temas do novo CD. Terminaram
em actuação conjunta com o Grupo do Feijó.
Após todo o “Convés” aplaudir de pé e cantando, juntos partimos para a viagem final –
um “cocktail alentejano” onde não faltaram
os pezinhos de coentrada, o queijo alentejano,
a orelha de porto, as moelas, os enchidos, o
pão alentejano e as azeitonas, tudo regado
com um bom vinho de Borba, da Adega
Marcolino Sebo.
59
O cd das Cantadeiras da Alma Alentejana “O Alentejo não tem fim”, pode ser requisitado através do
n.º 212 540 053 , ou por via postal através do impresso:
Solicito o envio de ___ CD para o qual junto cheque de ______ € S/ Banco_________
Nome________________________________________________
Morada______________________________________________
Código Postal ______-________ Localidade____________________
XII Feira do Alentejo
Grupo Coral As Trigueiras do Alentejo
um êxito.
No terceiro dia (sábado) a Feira abriu às 10
horas e cerca das 15 horas começou o desfile
dos grupos. Numa extraordinária demonstração do que é o Cante, passaram pelo palco o
Grupo Coral Etnográfico Cubense Amigos do
Cante, de Cuba, o Grupo Coral Alentejano Os
Amigos do Independente, de Setúbal e ainda
o Grupo Coral Etnográfico Amigos do Alentejo, do Feijó. Seguiu-se um Colóquio onde foi
apresentado o Livro “Uma infância amarga e
doce no Alentejo” de José Russo, autor alentejano de Borba radicado desde os 15 anos na
Margem Sul. A noite veio de Évora. O Grupo
Coral da Malagueira e o Grupo Coral Instru-
60
Mais uma vez a “ nossa” Feira foi um êxito.
Este ano, a Feira contou com apenas quatro
dias, com um programa centrado na
Gastronomia Alentejana. A parceria realizada
com o Restaurante “O Cantinho Alentejano”
proporcionou aos visitantes e participantes
um serviço de refeições, tipicamente alentejanas, onde não faltaram as açordas, o ensopado de borrego, a sopa de cação, as migas, a
sericaia, entre outras delícias, servidos num
espaço decorado com motivos do Alentejo. A
festa abriu com um tributo ao poeta Ary dos
Santos, cantado pelo jovem Mário Barradas,
acompanhada pela vozes belas de Olga Vilanova e Cláudia Flores, a que se seguiu a actuação dos Grupos Corais “As Trigueiras do Alentejo”, de Safara e o Grupo Coral Alentejano e
Operário das Paivas. A Grande Noite de Fados, apresentada pela Poetisa Rosa Dias, onde
o fado e a poesia se misturaram, constituiu
um momento marcante da Feira. Foi uma
grande noite, com muitos aplausos de uma
sala cheia de gente. Para que fique registado,
os Guitarristas foram o João Costa e o Jorge
Costa. Os fadistas Ruca Fernandes, Mélita,
João Tiago e Géninha Tiago, Anaísa Soares,
Mariana Beatriz, Débora Oliveira, Maria Amália e Rafael Bailão, fizeram da noite de fados
Mário Barradas
Grupo Coral Etnográfico Os Amigos do Alentejo
sob o tema “Évora com Neve” que mereceu
dos visitantes os melhores comentários.
Assim foi a nossa “Feira”. Um obrigado a todos
que ajudaram neste nosso evento.
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61
mental “Os Amigos da Malagueira” fizeram
vibrar toda a assistência, com uma actuação
de grande qualidade e rigor artístico, criando
entre músicos, cantores e público momentos
de grande emoção.
Domingo foi o dia da “Alma”. Os Grupos da
casa transformaram a tarde de calor numa
tarde de grande convívio e confraternização,
com actuações espectaculares. A estreia do
Grupo de Violas Campaniças, sob a direcção
do Prof. Ricardo Fonseca, mostrou que a
existência da Escola de Violas Campaniças da
Alma Alentejana é uma mais valia no que
respeita à divulgação da música alentejana
dos instrumentos cordofónicos.
Os “Cavaquinhos da Alma” deram continuidade ao espectáculo com brilho e mostraram a
grande evolução do Grupo que honra, quer os
tocadores quer a nossa Associação.
As “Cantadeiras” estiveram ao seu nível cantando e encantando quem assistiu. Foi o culminar de todo um trabalho exaustivo patente
no CD “O Alentejo não tem fim”, lançado a 5
de Junho (ver reportagem na página 70). Finalizámos com a actuação, plena de alegria, do
Grupo das “Sevilhanas da Alma Alentejana”,
onde o nosso amigo Toni tem feito um
trabalho digno e merecedor do nosso carinho.
Durante todo o certame esteve patente uma
exposição fotográfica de Joaquim Carrapato
Grupo Coral da Malagueira
62
Grupo Coral Instrumental Os Amigos da Malagueira
63
Grande Noite de Poesia e Fados
Vista geral da feira
64
Grupo Coral Alentejano Os Amigos do Independente
Grupo Coral Etnográfico Cubenses Amigos do Cante
65
Grupo Coral Alentejano e Operário das Paivas
As Cantadeiras da Alma Alentejana
66
Grupo de Violas Campaniças
Grupo de Cavaquinhos da Alma Alentejana
67
As Sevilhanas da Alma Alentejana
Lançamento do livro de José Russo
68
pormenor da assistência na 12.ª edição da feira
Restaurante “O Cantinho Alentejano”
CULTURA
José Moutela
“Associativismo, Património e Cidadania”
Um livro de Luis Maçarico
novos desafios do associativismo face à globalização”, L. Maçarico escreve: “Os valores
do mundo actual contaminam, sobretudo, os
mais novos, de quem naturalmente se espera
que tomem as rédeas do futuro. Quando o
egoísmo reinante sugere a desresponsabilização
e o utilitarismo, próprios de uma visão consumista do quotidiano e ter um corpo moldado
pelo Yogurt X pressupõe ideias de libertação e
realização pessoal, é preciso investir na
formação que o poder local tem obrigação de
não descurar. Mas os dirigentes associativos
não podem descansar os
pergaminhos e as tarefas de rotina. Um associativismo sem
ideias e com participação reduzida,
está condenado à extinção, por
ausência de dinamismo e de um
projecto que envolva a comunidade.
(….) Quantas vezes, ouvimos
aqui no Alentejo e pelo país, a
lamentosa voz dos dirigentes,
referindo a preferência dos
jovens pela discoteca, em vez
das colectividades? A esses,
pergunto
quantos
jovens
convidaram para a direcção do
clube, que responsabilidades
lhes transmitiram, que acompanhamento
lhes deram, quantas vezes trouxeram à colectividade netos e filhos, se de facto os
habituaram ao espaço e à convivência
inter-geracional e se os deixaram desenvolver
algum projecto, em suma o que é que lhes
proporcionaram, em termos de efectiva comparticipação na vida associativa, para lá do
desempenho desportivo? É que por detrás
daquela desculpa muitas vezes esconde-se o
temor de inovar e o receio de perder o controle
a uma situação, da qual, não raras vezes,
pelos anos de sacrifício e militância associativa,
os velhos dirigentes se consideram donos.”
69
No início de 2010 foi publicado mais um livro
do Dr. Luís Maçarico. Desta vez o tema não é a
poesia, mas sim uma séria e profunda
reflexão sobre o associativismo. Podíamos
dizer que é uma reflexão histórica, no sentido
de que nos fala de estórias e de pessoas, da
história de colectividades e das suas actividades sócio-desportivas e culturais, da sua
importância na formação de jovens e menos
jovens na área dos valores e da cidadania, da
solidariedade, da amizade, etc., mas o livro é
muito mais do que isso. É um apelo à vida, ao
futuro. É um alerta às consciências “adormecidas” nesta sociedade global, individualista, não
solidária, isenta de valores
essenciais da vida. Nesta sociedade surda-muda, em que até o
“bom dia” ou “boa-noite”,
sairam dos nossos hábitos. Onde
“o estar com os amigos” foi
substituído por um sms ou um
e-mail, linguagem impessoal e
fria destes tempos em que
sobrevivemos. Os exemplos
relatados no livro são pedaços
de vida, espaços de emoção e
alimento da alma. Vivamente
convidamos os nossos leitores a ler este livro
e, alguns de vós, a reverem-se nesta obra.
O prefácio do livro é escrito pelo Dr. Augusto
Flor, Presidente da Confederação Portuguesa
das Colectividades de Cultura, Recreio e
Desporto, que diz. “O conjunto de textos que o
Luís nos oferece neste seu trabalho, realça a
importância do associativismo como meio de
coesão social, como forma de combate à
descriminação, como instrumento de prevenção contra a depressão individual e colectiva e
ainda, como a forma mais desenvolvida de
viver em sociedade politicamente organizada,
ou seja, em democracia participada”.
Na página 31, num capítulo dedicado “Aos
Francisco Naia e
“A Ronda Campaniça”
70
Encontrámos o nosso sócio e amigo Francisco
Naia após mais um Concerto seu, baseado no
último Cd (2009) cujo título “De Sol ao Sul” dá
também o mote ao espectáculo. Dono de
uma voz inconfundível, e porque não dizer
bonita, sentida, o “Xico” está como o vinho do
Porto “quanto mais velho melhor”. Nesta fase
da sua vida artística, o Xico Naia atinge um
elevado nível, quer nos textos quer na música,
até mesmo no alinhamento do que nos
transmite durante os seus concertos.
Entre dois dedos de conversa, perguntámos:
- Xico Naia, quando é que temos um novo
trabalho teu?
- Talvez lá para o fim do ano. Vai chamar-se
“Francisco Naia e a Ronda Campaniça”. É um
projecto todo virado para o Alentejo, sua
cultura musical, temática e sonoridades.
Neste momento, e após todo um tempo de
levantamento, pesquisa e construção de
ideias, preparam-se os temas, as letras e
abordaram-se as estruturas musicais; fizeram-se
arranjos, definiu-se o instrumental a utilizar e,
finalmente, passou-se à fase de ensaios.
- E concertos?
- Estamos a iniciar a fase dos concertos, já
com alguns convites, antecipando a saída do
CD. Vai ser um concerto Vivo, Alegre e Contagiante. Vamos pôr o público a cantar e a
interagir. Estamos confiantes!
- Xico, o que é a “Ronda Campaniça”?
A “Ronda Campaniça” é um grupo musical e
de canto, com a utilização das vozes dos
elementos que o constituem, em simultâneo
com a sua função de músicos, aproveitando a
circunstância de todos eles serem alentejanos
e sentirem o Cante a correr-lhes nas veias.
- Já agora diz-nos quem são esses teus companheiros.
- São o Edmundo Silva (Sheiks), o José Carita
(Zimbro), o Nuno Faria (Afonsinhos do
Condado) e o Marco Rodrigues (Arentius).
Vamos utilizar um instrumental tão diverso
que vai das guitarras acústicas, baixo acústico,
contrabaixo, cavaquinho, bandolim, viola
campaniça, acordeão e clarinete até à percussão
dita “Sul Mediterrânica”.
A terminar o Francisco Naia deixou uma
palavra para a nossa Alma Alentejana, no sentido de desejar-lhe a maior das forças para
que a sua direcção e staff, levem bem longe a
sua obra cívica e cultural, projectando-a num
futuro, que proclamo de vitorioso. Obrigado!
Contactos www.myspace.com/francisconaia
“Retalhos da Manta”
Poemas de Joaquim Guiomar
Do poeta popular Joaquim Catita Guiomar, a
Alma Alentejana recebeu alguns exemplares
so seu último livro “ Retalhos da Manta” o
qual pode ser consultado na biblioteca do
Centro de Dia do Laranjeiro e aqui deixamos
um pequeno exerto:
Poemas da minha lavra
Retalhos da minha vida
Doces da minha palavra
Amargos d’Alma sentida
Consoante a circunstância
A caneta dá a volta!
Uns serão de tolerância...
Outros de grande revolta.
“Uma infância amarga e doce
no Alentejo” de José Russo
Do livro, 97 páginas que se lêem de um fôlego,
enriquecidas com fotografias de Eduardo
Gageiro, respigámos: “Zé Cágado e seus
companheiros pararam para descansar
debaixo de um grande sobreiro. O chão estava
fresco devido à sombra da árvore de grande
porte, ali se sentaram, comeram algumas
bolotas e pão duro, cada um falava de suas
queixas em relação ao abuso e sofrimento que
alguns
l
avradores já lhes tinham causado…”. (...)
Cante Alentejano
Um registo importante
71
Na XII Feira do Alentejo, com a presença do
autor, José António Russo da Silva, foi feita a
apresentação do livro “Uma infância amarga e
doce no Alentejo.
Do prefácio, da autoria do professor e escritor
Álvaro Ferreira Gomes, citamos “Este livro
corre como um riacho de águas lentas e
cristalinas, saltitando de pedra em pedra,
limadas pelo tempo. Impressões fugidias, com
raízes do vivido, desse Alentejo dos anos
quarenta e cinquenta, que permitem construir
verdadeiras personagens que ecoarão na nossa memória: Cachapim, Soldado, D. Vitória,
José e João, Padre Vinagre… entre outras.
Cada um destes seres, plantado no chão imemorial, arrancado do húmus, ficará a inundar
de luz os nossos sentidos despertos, avivará o
nosso coração como uma chama que não se
apagará.”
Apresentamos aqui e prestamos a nossa homenagem a este notável trabalho de recolha
e divulgação de cerca de duas centenas de
MODAS que serão o núcleo do CANTE. É uma
edição da Liga dos Amigos de S. Domingos e
enriquecida com uma capa de Eduardo Gageiro.
«Durante mais de três décadas, muita memória da comunidade alentejana, relativa ao
cancioneiro alentejano. “O maior do nosso
país”, foi preservada e até desenvolvida na
zona de Sacavém, pela actividade da Liga dos
Amigos da Mina de S. Domingos (LAMSD) e do
seu Grupo Coral.» (introdução).
A colectânea encontra-se à venda na sede da
Liga, em Sacavém.
72
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A REPÚBLICA E A LUTA DAS MULHERES
professora no Colégio Moderno
de Serpa, onde cria cursos
nocturnos gratuitos para mulheres
e raparigas.
No Alentejo escreve nos jornais
A Folha de Beja, O Lidador, e na revista
A Tradição. Em 1902 publica Biblioteca
Infantil – Contos Cor-de-Rosa e o fascículo
Emancipação Feminina.
Em 1905 fixa residência em Lisboa e ingressa
como professora-regente no Centro Escolar
Republicano Afonso Costa, depois de um
período difícil visto encontrar-se muito
doente e ter a seu cargo dois filhos e a sua
mãe.
Em 1906 inicia a sua colaboração no jornal A
Vanguarda no qual escreve sobre política,
feminismo e educação e pela mão de Boto
Machado torna-se oradora e propagandista
dos ideais republicanos. Nos seus discursos,
artigos e conferências Veleda exortava as
mulheres a terem uma participação política
activa, a emanciparem-se através da educação,
a tornarem-se independentes através do
exercício de uma profissão, professava os
ideais republicanos e combatia o obscurantismo
religioso. Depressa se tornou alvo das alas
conservadoras e reaccionárias chegando a
receber ameaças de morte.
Em 1908/09, após o regicídio, publica o artigo
A Propósito onde afirma “Morreu um rei?
Antes ele que um Homem” que suscitou
manifestações de apreço e de ódio. Entre elas
Veleda recebe uma carta de uma senhora
monárquica à qual responde publicamente
com o artigo Carta a uma dama franquista,
pelo qual é julgada e condenada a pagar uma
pesada multa por abuso de liberdade de
imprensa.
É também nesta altura que funda e dirige os
Cursos Femininos no Centro Escolar Afonso
73
No ano do Centenário da Implantação
da Republica vários artistas foram
convidados a participar nas suas
comemorações. Nesse âmbito, criei
o solo 23 + 1 integrado no programa
Solos com Convicção, que se debruçou sobre
o papel das mulheres na luta pela Implantação
da Republica. Tive então contacto com o
trabalho desenvolvido por estas mulheres,
nomeadamente por Maria Veleda, que serviu
como mote para o referido solo.
Maria Veleda nasceu na cidade de Faro a 26
de Fevereiro de 1871. O seu pai ocupava uma
posição de relevo na sociedade farense tendo
desempenhado as funções de vereador,
procurador-fiscal e vice-presidente da Câmara
Municipal, para além de ser o responsável
cultural pela Sociedade Teatral de Faro. Veleda teve uma infância despreocupada e feliz
até à morte do pai, que coloca a família numa
situação económica difícil e faz com que
comece a trabalhar dando explicações
particulares aos 15 anos.
Sonhando ser escritora, desde cedo dedicou
muito do seu tempo à leitura de livros e de
jornais, começou a escrever poesia, contos,
novelas e peças de teatro de cariz revolucionário, educativo e feminista, mais tarde encenadas e representadas. Em 1890 estreia-se no
jornal O Distrito de Faro, colaborando
posteriormente nos periódicos Pequenos em
Tudo, O Algarve, Almanaque de S. Braz de
Alportel, O Futuro, Almanaque das Senhoras,
O Repórter, O Cruzeiro do Sul, A Tarde, entre
outros.
Aos 19 anos adopta um bebé órfão com 14
meses e em 1899 nasce o seu filho biológico
fruto da sua relação com o poeta Cândido
Guerreiro. Fixa residência em Ferreira do
Alentejo como professora régia na escola
mista de Odivelas e dois anos depois torna-se
Costa, Os cursos Nocturnos no Centro Escolar
António José de Almeida e os Cursos Dominicais
do Centro Boto Machado; apresenta a tese
Feminismo no I Congresso Nacional do Livre
Pensamento, no qual integra a Comissão
Organizadora; dirige a Tribuna Feminina no
jornal A Republica; publica ainda o livro
A Conquista – Discursos e Conferências e solta
um “Viva a Republica!” em pleno parlamento
monárquico.
Com a Implantação da Republica a 5 de
Outubro de 1910, dia que Veleda vive atenta e
apaixonadamente, a Liga Republicana das
Mulheres Portuguesas entrega uma petição
ao governo reclamando a revisão do Código
Civil e o sufrágio feminino restrito. Veleda
demarca-se então de outras feministas mais
conservadoras ao defender o voto para todas
as mulheres e não apenas para uma elite e ao
afirmar que o voto só por si não contribuía
para a alteração da situação económica da
maioria das mulheres, condição fundamental
à sua emancipação.
Critica ainda ferozmente nesta altura todos
aqueles que, a pretexto de servirem a
Republica, procuravam apenas servir os seus
interesses pessoais acusando-os de praticarem
um crime de lesa-socialismo e lesa-humanidade.
Em 1911 torna-se presidente da Liga
Republicana das Mulheres Portuguesas e
funda o Grupo das Treze que visa combater o
fanatismo religioso. Participa ainda no
Congresso
do
Partido
Republicano.
Em 1912 a Liga entrega nova petição ao
Parlamento reclamando o sufrágio feminino
que não teve reflexos uma vez que o voto
continuou a ser concedido apenas aos
cidadãos do sexo masculino.
Por volta de 1915, desiludida, demite-se da
direcção Liga, filia-se no Partido Democrático
e funda a Associação Feminina de Propaganda
Democrática. Afirma na altura que “ a mulher
moderna não pode ser só defensora do seu
sexo, mas deve contribuir para a libertação
geral”.
Após os acontecimentos daquela que ficou
conhecida como a Noite Sangrenta, que
ocorreu em 1921, na qual foram assassinados
diversos políticos republicanos, Maria Veleda
horrorizada com este morticínio, abandona o
activismo político. Continuará contudo a
escrever para o jornal republicano de Luanda
A Pátria, comentando a vida política do País,
até ao golpe militar de 1928 e consequente
instauração da Ditadura.
Maria Veleda faleceu a 8 de Abril de 1955,
sendo sepultada civilmente no Cemitério do
Alto de S. João, em Lisboa.
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foto de António Coelho
Maria Veleda pode ter-se desiludido aos 50
anos mas deixou um legado de luta para todas
as mulheres. Para as que combateram a
Ditadura Fascista ou para aquelas que cresceram
após a revolução de 1974 e que
actualmente assistem à tentativa de
aniquilamento das conquistas de Abril.
Hoje o inimigo não tem, aparentemente, um
rosto tão reconhecível como no tempo da
I Republica ou da Ditadura Fascista. Apresenta-se disfarçado de democrata, de socialista,
de sindicalista até mas existe onde o retrocesso
civilizacional se torna uma evidência. No
ataque ao Estado Social, na Revisão
Constitucional, no ataque à Escola Pública e
ao Serviço Nacional de Saúde, no ataque aos
direitos dos trabalhadores, nas novas formas
de ingerência na liberdade de expressão dos
cidadãos, na financeirização da economia, na
impunidade, nos lucros ignóbeis dos grandes
grupos económicos, na economização da
Cultura, etc.
A nós compete-nos dar continuidade à luta
sempre, quando e onde o retrocesso civilizacional se apresente por mais atraente que
seja o rosto do mensageiro.
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O que mais me fascinou no trabalho e na vida
de Maria Veleda foi a sua visão abrangente da
sociedade e da luta. Tendo em conta que a
Revolução de Outubro ocorreu em 1917 e que
o Partido Comunista Português foi criado em
1921, impressionou-me que esta mulher,
considerada demasiado vermelha por alguns
sectores republicanos, deslocasse o discurso
feminista da questão de género e o situasse
no contexto de uma luta mais abrangente nos
domínios económico, social, político e cultural.
A sua preocupação com a educação e instrução
das crianças e com a necessidade de combater
o analfabetismo feminino, a consciência de
que a emancipação feminina passa pela sua
independência económica e pelo seu
activismo político, o apelo para que homens e
mulheres lutem lado a lado pelos mesmos
ideais, a defesa do sufrágio para todas as
classes e não apenas para uma elite, a
denuncia frontal e feroz dos traidores dos
ideais republicanos e dos oportunistas, a
apologia de separar o Estado da Igreja e a
Igreja das mulheres, dão-nos a real dimensão
de Maria Veleda, que afirma “o lugar da
feminista não é nas fileiras burguesas nem nas
alas reaccionárias: é nos partidos operários,
em volta da bandeira vermelha”.
foto retirada do livro “Maria Veleda - Uma professora feminista, republicana e livre-pensadora”
Edição Câmara Municipal de Lisboa - Junho de 2005
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