A vida como espetáculo - Sinal dos Tempos Blog

Transcrição

A vida como espetáculo - Sinal dos Tempos Blog
A vida como espetáculo
Por Olegario Schmitt
Broadway
Q
uando, em 1981, Jean Baudrillard (1929-2007) escreveu sobre a sociedade do
espetáculo no seu Simulacros e Simulações, predisse, em partes, o estado atual em
que nos encontramos. Se ainda vivo fosse, é possível que estivesse mais do que nunca
tendo verdadeiros curtos-circuitos intelectuais com base na observação do desenvolvimento
de suas profecias eletrônico-apocalípticas.
Baudrillard “à parte”, é fato que, sendo usada por aproximadamente 2.7 bilhões de
habitantes do planeta
— 1/3 da população mundial em outubro de 2013 (Fonte:
International Telecommunications Union) —, a Internet tem se tornado a cada dia mais
onipresente, onipotente e onisciente, se transformando no verdadeiro Deus da nossa
sociedade compulsivamente conectada, especialmente entre os jovens.
Isso tudo, obviamente, abre espaço para inúmeros novos paradigmas no comportamento
humano e cujas conseqüências a longo prazo ainda não são muito claras. Saliente-se, no
entanto, que a Internet, em si, não é culpada ou responsável por coisa alguma que as
pessoas fazem através dela, sendo apenas um novo meio — instantâneo, “anônimo” e
massivamente popular — para que cada um manifeste, da tranquilidade de suas telas, sua
verdadeira natureza interior.
Alguns desses aspectos serão abordados livremente aqui, na intenção de que pensemos ou
repensemos o papel que estamos desempenhando em relação às tecnologias, assim como o
papel social que estamos, individualmente, assumindo e interpretando dentro do todo.
1
O flashmob
Flashmob
H
á algum tempo tem pipocado nas
mídias e redes sociais (YouTube,
F a c e b o o k , Tw i t t e r, e t c . ) , c o m
popularidade crescente, uma nova espécie
de happenings contemporâneos, chamados
de flashmobs.
Fortemente influenciados — mesmo que
inconscientemente — pela arte moderna,
sobretudo pelos movimentos dadaísta e
surrealista, não poderiam deixar de carregar
em si todo seu diletantismo inerente. Apesar
de também serem usados para práticas
políticas e sociais, geralmente são apenas a
coisa pela coisa, sem mensagem significante
ou razão de ser além da própria existência.
O flashmob consiste em pessoas —
quaisquer pessoas — que, utilizando a
internet e suas tecnologias correlatas, se
encontram em algum local e hora para
executar determinada ação, a qual pode ser
literalmente qualquer coisa. Os flashmobbers podem, por exemplo, se misturar
2
anonimamente aos usuários de uma estação
de trem e, sob determinado sinal
previamente combinado, fingirem-se de
estátuas durante determinado tempo, para
logo em seguida se dissiparem de maneira
tão rápida, dissimulada e silenciosa como se
reuniram.
Notadamente, flashmobs são extremamente
voláteis como tudo o que é pós-moderno,
mas são eternizados através do registro
compulsivo de gravações digitais de vídeo,
as quais são devidamente compartilhadas
ad nauseam nas redes sociais.
Poderia-se pensar que o objetivo principal
da ação seria meramente causar um choque
na realidade cotidiana, uma ruptura no
automático previsível de nossas rotinas
urbanas. E muitas vezes o pretexto utilizado
é justamente esse. Mas dentro desse
contexto de superexposição massiva em que
vivemos, o vídeo assume o papel de ser
muito mais do que mero registro, ou obra
derivada. Ao contrário do happening
tradicional, onde a própria ação é que é o
objeto (que se extingue ao fim da
apresentação), no flashmob o objeto será
vídeo. Mais do que isso simplesmente,
deverá ser o vídeo espontaneamente
compartilhado.
Porém, apesar de suas idiossincrasias e
midiossincrasias, o flashmob continua
mantendo relação intrínseca com o
happening: como verdadeira combustão
“espontânea”, é extremamente volátil; e
mesmo com sua finalidade eletrônica e
virtual, continua sendo intangível.
3
A diferença é que se no moderno “tudo o
que é sólido se desmancha no ar”, no pósmoderno, sob a égide do bit e do
compartilhamento, não se chega a ter nem
mesmo uma solidez que possa ser
desmanchada e sua vitalidade perdura
apenas durante aquele átimo de tempo
durante o qual consegue manter o hype e o
buzz dos trending topics. Se bit foi uma vez
a simplificação da expressão binary digit,
conseguiu na contemporaneidade alcançar
seu sentido mais absoluto, que é ser apenas
um pedaço — just a little bit — de algo que,
sem a fisicalidade, estará para sempre
incompleto, em estado de eterno devir.
Zumbilândia pós-eletrônica
Pessoas conectadas
G
radativamente mais impregnados e
compartilhaminados pelas tecnologias
ditas sociais, juntamente com todos os
seus aparatos objetais — de maneira geral
e sorrateira, quase imperceptíveis de tão
assimiladas e dissimuladas — estamos, nem
tão lentamente assim, fazendo da Second
Life nossa First Life. É extremamente comum,
por exemplo, que em shows de música ao
vivo as pessoas levantem as câmeras de
seus celulares para gravar o que se passa à
sua frente e, em vez de observarem a olho
nu os músicos no palco, o fazem através da
tela do aparelho. Essa experiência, que não
chega a ser exatamente vivenciada, ou é
vivenciada de maneira bastante comprometida, poderá depois ser revivida infinitas
vezes de maneira eletrônica.
Platão certa vez tentou nos fazer ver além do
mundo das aparências, mas continuamos
ainda hoje, como sociedade, optando
inconscientemente em fazer o caminho
inverso. A diferença é que agora temos
4
meios muito mais eficazes para isso e, em
vez de experimentarmos o real, o tangível,
optamos por observar a imagem projetada
na parede dos monitores eletrônicos. Temos
desprezado de maneira crescente o toque
físico no outro em detrimento do toque na
tela, e isso, seres sociais que somos, acaba
por criar um vazio existencial sempre
crescente e que jamais encontrará, dessa
maneira, meios de ser preenchido.
Diante desse vazio íntimo é necessário que,
como medida compensatória, se lance mão
do espelho, ou seja, que se lance mão do
outro (o qual obviamente está fora) para
que reflita de volta, para que valide —
através de uma curtida, um compartilhamento ou um comentário — aquilo que
foi “vivido” pelo indivíduo, porque a ele não
é mais possível encontrar dentro de si
mesmo raízes profundas calcadas no real
possibilitando nutrir sua existência.
Sem conexão não há validação. Dessa
forma, como compensação pela ausência
da convivência real, com tudo o que há de
bom e de ruim nela, se faz necessário
estarmos o tempo todo conectados... sem
que estejamos realmente conectados. É
comum — e chocante — perceber nos
espaços públicos todas as pessoas com suas
cabeças abaixadas e olhares vidrados nas
telas de seus celulares, verdadeiros robôs
tecnológicos na mais absoluta solidão uns
dos outros.
Sob esse ponto de vista, se questiona o
embuste da expressão social utilizada para
essas redes, e se questiona também a
expressão conexão, uma vez que tais coisas,
em vez de realmente nos unirem e de fato
nos conectarem — permitindo que sejamos
uma sociedade na acepção mais correta,
profunda e extensa do termo —, estão
desmoronando nossa sociedade à parte,
nos transformando em membros de uma
verdadeira zumbilândia pós-eletrônica.
Voltando ao flashmob, essa percepção
apocalíptica (que seria absurda se não fosse
fatídica) em torno das conseqüências do
nosso uso indiscriminado das “novas”
tecnologias, faz com que ele seja quase
como um último resquício de vida. Para
executá-lo as pessoas deixam por alguns
instantes o virtual para vivenciar e executar
algo real, interagindo presencialmente umas
com as outras. Sem sentido na maioria das
vezes, mas real. Sem verdadeiras conexões
emocionais entre uns e outros, mas ainda
assim real. Porque depois disso é apenas o
vídeo, depois disso é apenas a rede social...
e depois disso é o nada. E, pior ainda do
que o nada, é sermos levados a tomá-lo
como simulacro de algo que sequer existe,
mas não obstante transforma em real uma
ilusão de existência.
5
Viver, de fato, não é mais importante. O
importante é aparentar ou passar (para os
outros e conseqüentemente para nós
mesmos) a ilusão de ter vivido e, para tal, os
vídeos no YouTube e as fotos no Instagram
são evidências mais do que satisfatórias.
Contudo, não se pode dizer que nenhum
desses comportamentos, especialmente o
parecer ser, seja algo exatamente novo, mas
com o advento da internet, tudo assume
proporções estratosféricas. Sendo a vida de
todos finita, por questões óbvias toda posse
invariavelmente é passageira. Não obstante,
nesse estágio o ter é igual a ser passa a
ocupar um lugar ainda mais privilegiado,
pois com a mídia social é extremamente
fácil mostrar e compartilhar aquilo que se
tem por fora do que aquilo que, afinal, já
nem mesmo se tem por dentro. Assim como
a aparência da posse, também a virtude
aparente passou a ser mais importante do
que a virtude ela mesma. É como se,
compartilhando uma imagem com mensagens elevadas no Facebook, isso atestasse
que quem a compartilhou assim o seja. Mas
isso, antes de expor publicamente o que ela
efetivamente é por dentro, mostra mais
aquilo que ela no fundo gostaria de ser.
Não é a indicação de uma presença de
espírito, mas o atestado de um vazio.
Se toda superfície, por questões lógicas
rudimentares, ainda mantém um contato
íntimo com a coisa que superficia, pode-se
concluir que o mundo contemporâneo já se
encontra muito além do superficial! O que
temos hoje é um desprendimento completo,
é mero fantasma ilusório da superficialidade
de que se tornou ser. Porque os seres
humanos dentro desse mundo eletrônico às
vezes se contentam com pouco, às vezes se
contentam com nada. E cada vez mais se
contentam unicamente com a aparência
construída de tudo.
O público, o privado e as partes íntimas da
Paris Hilton
Partes púb(l)icas de Paris Hilton
N
ão só o pós-eletrônico tem essa
capacidade funesta de perverter tudo
aquilo que considerávamos real,
como a realidade ela própria, aliás, parece
ser algo tão raro e exótico que passou a nos
ser vendida em forma de reality shows. A
realidade, bicho exótico em exposição no
zoológico. A realidade, com suas disfunções
atuais descaradamente expostas nesses
verdadeiros circos dos horrores.
À primeira vista pode-se pensar que cada
um mostra de si o que bem quer, pois é livre
para tal. Mas isso, que superficialmente é a
expressão de uma liberdade, facilmente
deriva em libertinagem, ou seja, numa
ausência completa de limites saudáveis, com
conseqüências assustadoras não apenas do
ponto de vista social, mas também da
formação dessa unidade que constitui cada
indivíduo.
6
Oras, quando se joga tudo para fora,
quando se divide aquilo que se tem de mais
íntimo com os outros, isso permite que estes
possam por sua vez dividir o que foi dividido
com ainda “outros outros”. Mesmo que,
para decepção íntima de quem se expôs,
não o façam, essa possibilidade de divisão é
aberta, o que acaba por fazer toda a
diferença. A cada compartilhamento, a
parte não dividual, o indiviso caracterizando
cada ser, vai se diluindo gradualmente até
que seja completamente perdida.
Através da ilusão dos amigos virtuais —
cada pessoa ao redor do mundo tem, em
média, 130 deles no Facebook — e da
falácia das configurações de “privacidade”,
e mesmo com toda a discussão inerente
sobre este último assunto, nos sentimos
livres para compartilhar de tudo. Com essa
queda constante e gradual da diferenciação
entre público e privado, mesmo o teor de
algo tão simples e rudimentar quanto nossa
própria alimentação básica diária, passou a
ser não apenas registrado, mas também
exibido apenas para 130 amigos (se algo é
compartilhado com mais de cem pessoas,
como pode ser considerado privado?). É
nesse ponto que a coisa deixa de ser um
almoço especial e íntimo de dia dos
namorados... e passa a ser um espetáculo!
É justamente essa névoa de indiferenciação
entre o que mostrar ou não, e para quem
mostrar ou não, que a cada dia vai abrindo
mais espaço para o esfacelamento completo
daquilo que uma vez foi considerado íntimo
e/ou privado. Apenas como exemplo, Paris
Hilton é o supra-sumo de tudo que se tenta
dizer aqui. Ao contrário do que lembramos,
ela não se tornou famosa apenas por ser
extremamente rica, nem por figurar em
diversos reality shows (cujo tema central
sempre era, obviamente, ela mesma),
entrevistas ou aparições constantes na
mídia, e absurdamente ela também não se
tornou famosa unicamente por ser famosa,
nesse verdadeiro moto-contínuo que são as
celebridades.
Bem, ela se tornou conhecida após o
“vazamento” de um vídeo onde fazia sexo
com seu então namorado Rick Salomon... o
que há de mais privado, o que há de mais
íntimo para um ser humano do que, como a
própria expressão já diz...
suas partes
íntimas? Não obstante, protagonizou depois
inúmeros “acidentes” onde foi fotografada
de pernas abertas e sem calcinha, nos
permitindo afirmar que as partes íntimas de
Paris Hilton, fazendo parte do domínio
7
público, podem ser tudo, menos privadas...
e muito menos ainda íntimas!
Não esqueçamos que o espetáculo de certa
forma sempre fez parte da própria
existência. Não apenas da existência
humana, mas da existência em si! Observemos, por exemplo, as orquídeas e os
pavões. Nestes, no entanto, há uma
finalidade biológica reprodutiva, o que não
se pode dizer de Paris Hilton (a qual,
felizmente, nunca procriou). Os seres
humanos com o passar dos séculos, de
maneira gradual e constante, foram
esticando o limite que cada um era capaz
ultrapassar com a finalidade única de
a p a r e c e r, a t é c h e g a r m o s à e f e t i v a
conjuntura das coisas . E, ao contrário das
orquídeas, não acabamos por produzir
coisas mais belas a cada nova geração, mas
sim essas personalidades nefastas em
exposição constante na mídia.
A superexposição tem como característica
nos deixar torpes ao que se é exposto, o que
faz com que aquilo que num primeiro
momento foi considerado excesso, acabe
por ser tornar algo comum e banal. Claro
que o caso de Paris Hilton (entre inúmeros
outros) é apenas o extremo de uma escala
formada por diferentes graus. Mas essa
exposição constante, esse não bastar-se
consigo e em si mesmo, somada à inerente
necessidade de validação pelo outro, não
acaba por fazer de cada um de nós,
resguardados os níveis, prostitutos da
atenção? E é isso que nascemos para ser,
prostitutos da atenção?
A vida como espetáculo
Flashmob de casamento
N
ada é o bastante. Devido ao excesso
de tudo — sobretudo da necessidade
de estímulos gerados pela aprovação
alheia — vivemos uma espécie de torpor
social generalizado. O simples, o
corriqueiro, a vida besta de todo dia... nada
disso gera serotonina suficiente e por isso
precisamos do exagero.
O casamento, por exemplo, que deveria ser
unicamente a celebração da união entre
duas pessoas que se amam, quando
observado com um pouco de distanciamento revela ter se transformado num
espetáculo extremamente bizarro. A dança
dos noivos virou performance digna da
Dança dos Famosos. Aliás, o pedido de
casamento ele mesmo incorporou o
flashmob com direito até mesmo a
patrocinadores que, de maneira subreptícia
mas não casual, estão inseridos discretamente na cena. Há de se questionar, aliás,
se tais uniões em algum ponto foram
designadas para darem certo ou se foram
8
unicamente utilizadas como pretexto para o
espetáculo em si! E, se “por acaso” o
casamento cenográfico não deu certo, o
próprio evento da separação (o qual seria
dolorosamente íntimo numa pessoa
psicologicamente saudável) será celebrado
numa Festa de Divórcio.
Mas celebrar o fracasso de uma união, sob
um ponto de vista deturpado, não deixa de
abrir caminho para uma pequena esperança nesse mundo onde todos os fracassos
são estrategicamente ocultados do conhecimento público. O perigo nesse caso é que
o fracasso é distorcido para ser transformado numa vitória, pois somos cada vez
mais seres sempre vitoriosos cada vez
menos sabendo lidar com a decepção de ter
uma simples vontade contrariada. Custe o
que custar, e custe a quem custar, celebraremos efusivamente a nossa vitória,
porque a ordem da vez é a celebração
constante, de braços dados com o excesso.
Excesso. Há muito excesso dos ricos lado a
lado à carência excessiva dos pobres, os
quais por sua vez sonham em ser ricos para
poderem exceder-se também. Sim, porque
se a alimentação, como seres humanos, nos
bastasse, não teríamos a cozinha francesa.
Se um simples ovo cozido já não basta, que
tragam o ovo poché! Nós gostamos do
excesso porque ele está acima da média o
que, por momentos, nos tira do torpor do
cotidiano. Por momentos breves, é claro,
pois como viciados precisaremos sempre
aumentar a dose.
Pelo excesso de comida e de sedentarismo
derivamos necessariamente no aumento, ou
da obesidade ou da freqüência das
academias. Porque o próprio corpo, do jeito
que é, não é mais suficiente. E dessa forma
o seio feminino, siliconado, perde gradativamente sua função de nutrir a vida de um
bebê e passa a ter a função de alimentar a
lascívia de adultos que jamais cresceram
senão por fora. Esses adultos-bebês de
psique sub-desenvolvida tentam compensar
exteriormente com seus corpos bem
definidos o inevitável vazio interior trazido
pelo mundo que nos cerca e, de maneira
passiva, nos invade: o único propósito dos
peitorais inflados com anabolizantes e dos
seios recheados de plástico é atrair o outro,
na tentativa vã de preencher tal vazio. Mas,
ironicamente, isso tudo acaba fazendo com
que o outro se relacione unicamente com a
superfície — que, afinal, a única coisa que
está disponível por ser a única coisa que se
tem a oferecer — e o íntimo de ambos
restará para sempre não preenchido.
Paradoxalmente, a padronização do corpo
definido é uma busca por diferenciação que
também acaba por anular a individualidade, levando-nos a nos tornar viciosamente mais amorfos e indefinidos dentro
dessa uniformidade estética da forma física
perfeita.
Os corpos, antes de servirem para abrigar o
ser, servem também ao propósito de
alimentar fantasias, assim como o flashmob
alimenta a fantasia de vivermos não nessa
vida chata de todo dia, mas num musical da
Broadway. E necessitamos de fantasias
porque a vida, tão cheia e incrivelmente tão
vazia de tudo, a própria vida já não basta.
O ser, que se encontra do lado de fora do
Ser, é um ser virtual, um tamagotchi
necessitando da gratificação constante dos
likes para que não deixe de existir,
necessitando constantemente da dose diária
de aprovação do outro para o seu simulacro
de felicidade.
Enquanto seguirmos esse caminho, tudo
existente entre o nascimento e a morte,
passa a ser um espetáculo criado para ser
projetado na tela. Desde o nascimento da
nova criança real até o casamento da
pseudocelebridade e o enterro do Papa,
passando por nossas vidas, de maneira
sempre crescente passamos a ser apenas
uma sombra projetada no mural virtual das
atualizações de status. É possível supor que
Platão, quando nos alertou sobre isso há
2300 anos atrás, não fizesse idéia de a que
ponto chegaríamos nesse sentido. Ou talvez
já soubesse da capacidade humana de se
sempre se exceder da pior maneira possível.
Isso tudo, afinal, é apenas fruto da busca
constante por dar significância às nossas
existências. Mas estamos fazendo o caminho
inverso e buscando no lugar errado. Porque
a significância não pode estar contida em
nenhum lugar senão dentro, e deve bastarse em si mesma, e o caminho não pode ser
outro senão aquele que é de dentro para
fora.
Olegario Schmitt
fevereiro de 2014
9