Ricardo Bimbo

Transcrição

Ricardo Bimbo
Quando a venda casada não beneficia ninguém
CORPORATE
Ricardo Bimbo
Vincular o software ao hardware configura a venda casada, e é uma prática danosa ao mercado.
por Ricardo Bimbo
V
ocê vai à padaria, pede um café expresso e o
atendente lhe sugere um pão de queijo. Você
compra um carro e o vendedor lhe oferece
um rádio. Aliás, como sair da concessionária sem
comprar um seguro para o carro?
Muitas empresas têm investido na integração de
produtos como estratégia para acelerar os negócios.
Sem maiores detalhes acerca da proposta, a estratégia parece boa quando agrega valor para o consumidor, em qualidade ou oferta de preço. Nada
mais justo, então, do que o hardware ser vendido
com o software, certo? Errado!
Por muitos anos foi omitido do consumidor final,
corporativo ou doméstico as diferenças e o leque de
produtos, serviços e garantias que existem para o
melhor aproveitamento do seu equipamento, principalmente no que tange a sistemas operacionais.
No Brasil, faz pouco mais de três anos que o tema
ganhou notoriedade, e algumas diferenças puderam
ser destacadas com o avanço e aprimoramento dos
sistemas abertos e o apoio de ações governamentais
a projetos de inclusão digital com softwares abertos,
a exemplo do Computador para Todos e da Medida
Provisória 252/97 (“MP do Bem”). Porém, desde o
glorioso UNIVAC que desembarcou no porto de
Santos em 1957, o gestor de TI, tanto da área pública quanto do setor privado, corre o risco de ser
submetido à obrigatoriedade de adquirir produtos
de hardware e software de forma “casada”.
No exemplo do café expresso e do pão de queijo,
você pode recusar e até comprar o pão de queijo em
outra loja. É justamente a essa liberdade de escolha que me refiro, e infelizmente o software acaba
sendo usado como uma armadilha de dependência
tecnológica para o consumidor de hardware e de
alguns serviços.
No setor público, com apoio de órgãos de fiscalização, avançou-se um pouco, e administradores puderam saber pela primeira vez qual é o gasto efetivo
do hardware e do software para estações de trabalho
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e determinados tipos de servidores. Entretanto, ainda se cerceia a liberdade com sistemas embarcados
e sistemas que compõem produtos como storages e
firewalls, dentre outros, que insistem em utilizar o
recurso da venda casada.
Para o setor público, já existem dezenas de recomendações da Secretaria de Logística e Tecnologia
da Informação e até algumas sentenças do Tribunal de Contas da União que condenam a prática
e recomendam a separação das compras. Há um
projeto de lei, o PL167/07, da deputada Raquel Teixeira (PSDB/GO), que ataca diretamente o ponto
e proíbe definitivamente a venda casada.
O movimento do Código Aberto colaborou muito para a consolidação do software enquanto produto; contribuiu para que tomadores de decisão e
até o senso comum começassem a entender que o
sistema operacional ou determinado aplicativo não
eram apenas uma mídia. Um exemplo foi o navegador Firefox, que mostrou a centenas de milhares de
internautas que havia uma opção de melhor qualidade e com mais segurança do que o navegador
até então dominante.
Existindo concorrência e disputa, tanto pelo preço
quanto pela qualidade técnica, a indústria de software imediatamente se fortalece, impondo novos
desafios, ampliando, democratizando e tornando
transparentes os produtos, modelos de negócios,
custos e lucros.
Os fabricantes devem entender que cada vez mais
os tomadores de decisão querem ser apoiados, e não
aprisionados. Deixar o freguês à vontade e livre para
escolher pode ajudar a vender mais cafés e mais
pães de queijo do que imaginamos. ■
Sobre o autor
Ricardo Bimbo é Government Relations da Red Hat Brasil e defende a idéia de que todo o conhecimento deve ser compartilhado.
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