Cap 40 A PEDAGOGIA MARXISTA

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Cap 40 A PEDAGOGIA MARXISTA
Cap 40 A PEDAGOGIA MARXISTA
Ramiro Marques
A pedagogia marxista partilha com a teoria marxista a
concepção dialéctica e materialista da história e o entendimento de
que a educação e a cultura são super-estruturas derivadas da infraestrutura económica e social. Para além disso, partilha com a teoria
marxista a defesa do "valor supremo e antropogenético do trabalho,
a teoria da praxis como modelo da actuação humana, a explicação
dualista e conflitual das classes sociais na sociedade burguesa
(aparecidas pelo facto da posição de domínio e exploração de uma
delas sobre a outra), a afirmação do triunfo final da supressão das
alienações humanas (religião, culto do pensamento abstracto,
existência da família, vigência do papel político do Estado, divisão
social do trabalho, dependência do operário com respeito a um
salário, renúncia do operário em ser dono do produto do seu
trabalho), propriedade colectiva dos meios de produção, a revolução
violenta como meio de avançar nesse processo até ao comunismo
universal, e a ditadura do proletariado para dirigir essa revolução"
(1).
Uma vez que a pedagogia marxista é profundamente
dogmática, não tem conhecido grandes evoluções desde que Karl
Marx criou os seus fundamentos filosóficos, na segunda metade do
século XIX. Quintana Cabanas (2) resume, assim, os seus princípios:
"atribuição da força educativa aos factores ambientais e
metodológicos; educação no seio do grupo e por meio do grupo (o
colectivo infantil e juvenil); prioridade da formação prática do aluno
sobre a sua formação teórica; sistema educativo baseado na escola
do trabalho, segundo a ideia de que o trabalho é não só meio mas
também finalidade da educação; incorporação do trabalho produtivo
no currículo escolar; formação polivalente do indivíduo, capacitando-o
para
diversas
actividades
profissionais;
ideal
humanista
complementar dessa formação profissional, com especial relevância
para a educação física e a educação estética dos alunos; a educação
moral é objecto de atenção particular, entendendo-se por ela a ética
marxista (que considera como dever principal dos indivíduos a luta
pela defesa e expansão do comunismo); inculcação sistemática e
obrigatória, aos educandos, da ideologia marxista; tendência para a
formação do homem novo, quer dizer, do homem comunista para
uma sociedade comunista; a educação será, pois, não só dogmática,
mas também autoritária; a educação compete ao Estado; a família só
pode educar por delegação do Estado e sob o controle deste; sistema
de escola única e igual para todos, sujeita a critérios sociais de
selectividade; sistema de coeducação absoluta, no sentido de dar o
mesmo tipo de educação aos dois sexos e conjuntamente; a
educação não tem uma finalidade individualista (educar o indivíduo
para si mesmo), mas social".
Marx e Engels escreveram muito pouco sobre educação,
embora seja deles a concepção de que a educação e a cultura fazem
parte da super-estrutura derivada da infra-estrutura económica e
social. Quer isto dizer que a escola está sempre ao serviço do regime
económico e social e dos detentores dos meios de produção. Legitima
esse domínio e ajuda a perpetuá-lo. Lenin e, sobretudo, Makarenko,
traçaram as linhas gerais de uma pedagogia marxista aplicada a uma
sociedade a caminho do socialismo e dirigida pelo partido comunista.
A pedagogia marxista sofreu um enorme revés com a queda do
muro de Berlim e o colapso da União Soviética, registados na
Segunda metade da década de 80. Ficaram, ainda, alguns países
dirigidos por partidos comunistas, como a China, a Coreia do Norte,
Vietnam e Cuba, mas, na China e no Vietnam, os partidos comunistas
têm vindo a criar uma nova economia capitalista, cujas
consequências estão, ainda por apurar. Seja como for, esses países
continuam, ainda, a impor a pedagogia marxista nas escolas do
Estado. Para um estudo mais aprofundado da pedagogia marxista nos
tempos da União Soviética, aconselhamos a leitura do livro de
Suchodolski, "Teoria Marxista da Educação" (México, Grijalbo, 1965).
A pedagogia marxista, tal como foi imposta na União Soviética
durante sete décadas, assumiu duas dimensões: "uma dimensão de
ideologia marxista, correspondente à cosmovisão comunista e ao
programa pedagógico dos princípios antes mencionados e que resulta
totalmente arbitrária e inoportuna a quem não tiver uma mentalidade
marxista e uma dimensão de Pedagogia realista, respondendo a uma
concepção tradicional da educação, feita de experiência prática e de
bom senso, que encerra muitos dos valores da chamada Pedagogia
perene e que é a causa de alguns bons resultados da educação
comunista. Assim, por exemplo, enquanto nos países liberais está em
crise o princípio da autoridade na educação, até ao ponto de muitos
professores se verem impotentes para fazer trabalhar os alunos nas
nossas escolas e enquanto baixamos o nível dos estudos com
métodos globalistas que não exigem o hábito do esforço e da
memória, ou pretendemos respeitar muito as opções dos alunos,
deixando-os abandonados aos seus caprichos e falta de experiência,
nos países comunistas exige-se ao aluno respeito e cortesia para com
as pessoas mais crescidas, atenção e obediência ao professor,
rendimento na aprendizagem, sentido de responsabilidade social,
disciplina na sala de aula e uma série de virtudes tradicionais que são
a base de um trabalho escolar sério" (3).
Quintana Cabanas (4) descreve deste modo as características
mais importantes da pedagogia marxista soviética: "a superestrutura
da sociedade influencia activamente o desenvolvimento histórico.
Pode impedir ou impulsionar o progresso social. A educação é um
elemento essencial da superestrutura da sociedade...; a educação é
um fenómeno social consistente em que uns homens actual sobre
outros para os formarem segundo um fim proposto...; a chave da
pedagogia soviética está na união do ensino com o trabalho
produtivo, a ginástica e a formação politécnica...;um princípio de
política educacional é a implementação de uma escola politécnica do
trabalho; os princípios da educação soviética são os seguintes.
Educação igual, gratuita e obrigatória para todos, em instituições
estatais...; na idade pré-escolar, podem certas formas de trabalho
desempenhar um papel importante na formação da criança, sendo o
meio mais importante para se inserir na sociedade e para motivar a
sua personalidade...; a didáctica obedece aos seguintes critérios: há
que dar um ensino científico e sistematizado, que seja inteligível para
o aluno, o qual há que relacionar os novos conhecimentos com os
anteriores...; a educação comunista exige que se faça participar
directamente os alunos na luta política, propondo-lhes tarefas
correspondentes e cuidando para que tenham experiências que os
façam confrontar com as contradições da luta de classes e lhes
suscitem decisões de tipo político e moral. Os alunos devem
participar em acções das associações juvenis e de pioneiros, devem
ter ocasião de realizar trabalhos socialmente úteis e de ampliar os
seus interesses e inclinações para actividades extra-escolares...; os
alunos estão organizados em agrupamentos chamados colectivos, no
seio dos quais vivem, estudam e trabalham. Ficam, por isso,
marcados pela sua pertença a um colectivo, o qual oferece um forte
influxo educativo...; os pressupostos básicos de uma boa educação
familiar são uma atmosfera familiar normal, a autoridade paterna, um
correcto horário familiar e o hábito da leitura e do trabalho; a
educação burguesa encerra factos e conceitos que caracterizam o
imperialismo como inimigo da humanidade. Os alunos devem poder
descobrir e desmascarar esse inimigo em todo o lado...; o professor
censura as faltas cometidas pelo aluno em forma de notas negativas
no trabalho de grupo...; a formação das crianças na disciplina - e a
educação em geral - aumenta quando o colectivo de alunos se
encarrega dessa função".
Embora a pedagogia marxista soviética tivesse sido o modelo
seguido em Cuba, há algumas particularidades específicas do
pequeno país das Caraíbas: o homem é um ser social que só se
desenvolve integralmente dentro do colectivo; a educação deve
contribuir para a criação de um homem novo, profundamente
envolvido na revolução socialista; a educação moral e política deve
exprimir os pontos de vista do materialismo dialéctico e histórico; o
trabalho produtivo assume uma dimensão formativa importante na
criação de uma mentalidade proletária; o papel da família na
educação das crianças deve convergir num sistema único de
educação socialista, composto pela escola, as organizações juvenis e
o partido comunista; a finalidade da educação é fazer dos jovens
internacionalistas, anti-imperialistas e patriotas; o trabalho intelectual
deve estar intimamente ligado ao trabalho produtivo.
Notas
1) Quintana, J. M. (1995). Teoria de la Educación: Concepción
Antinómica de la Educación. Madrid: Dykinson, p. 165
2) Idem, p. 166
3) Ibid., p. 169
4) Ibid., p. 170-71

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