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Transcrição

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expedição
Pedalando até a
última fronteira
Graças às chamadas “fat
bikes” – bicicletas com pneus
gordos que podem percorrer
trilhas na neve –, aventureiros
correm para ver quem se torna
o primeiro a chegar ao Polo Sul
em duas rodas
Por Mariana Mesquita
48 Go Outside
DESDE QUE O norueguês Roald Amundsen liderou a primeira expedição bem-sucedida ao Polo Sul, em 1912, uma longa lista de aventureiros
já explorou a região mais fria da Terra a pé, de esqui e até usando pipas
de kite. Mas, até muito recentemente, nunca ninguém havia tentando
chegar lá pedalando. No entanto, graças à tecnologia e à popularização das chamadas “fat bikes” — modelos encorpados e com pneus
gorduchos de quatro a cinco polegadas que conseguem atravessar
terrenos com muita neve e areia —, uma nova “corrida ao ouro” tem
agitado o universo das expedições polares. Quem será o primeiro a
conquistar em duas rodas aquela que é considerada por muitos umas
das últimas fronteiras da aventura?
Gente renomada já se lançou no desafio, entre eles o norte-americano Eric Larsen, que há 15 anos se dedica a expedições nos lugares mais
remotos do planeta (em 2010, tornou-se a primeira pessoa a chegar
aos “três polos do globo”, o Polo Sul, o Norte e o Everest, em um período menor que 365 dias). No finalzinho do ano passado, Eric anunciou
fotos kate leeming
MULHER
MARAVILHA:
A australiana
Kate Leeming
durante fase
de testes para
sua expedição
polar de bike,
que se iniciará
em 2014
que estava dando início a sua Cycle
South Expedition, com o ambicioso projeto de se tornar o primeiro
a cruzar o continente antártico, da
costa até o Polo Sul, percorrendo
um total de 1.200 quilômetros em
uma Moonlander, fat bike da marca
Surly. “Além da aventura, meu objetivo com essa expedição é mostrar
que a bicicleta pode ajudar a proteger o meio ambiente e a melhorar
a vida das pessoas”, disse ele na
época. Infelizmente, as péssimas
condições de tempo fizeram Eric
cancelar sua viagem após 275 quilômetros e 16 dias.
A saga, ainda que mal sucedida,
fez os olhos de outros aventureiros
crescerem para o possível recorde do pedal polar. Caso do norteamericano Daniel Burton, que, em
outubro deste ano, divulgou seu
projeto The South Pole Epic. A
missão é parecidíssima
com a de Eric: percorrer
de bike com pneuzões de quatro
polegadas cerca de 2.200 quilômetros (ida e volta) até a Antártida, a
partir de um ponto chamado Hercules Inlet (o mesmo escolhido por
Eric), até o Polo Sul. Com quase 50
anos, a serem completados durante a viagem, Daniel passou 23 anos
trabalhando como programador de
computador e levando uma vida
sedentária. Até que, pouco antes
de ser demitido da empresa, exames mostraram que seu colesterol
estava alto. A crise de meia-idade
veio com tudo e, com ela, a vontade
de se transformar em uma fonte de
inspiração para outras pessoas que
desejam levar uma vida mais saudável. Abriu uma bicicletaria, a Epic
Biking, em Utah, onde vive. Após
saber que poderia virar um recordista mundial, detentor de um feito
inédito no universo das expedições
polares, Daniel não titubeou, jogando-se de cabeça na aventura.
Pequenos detalhes fazem a diferença em uma
viagem desse tipo. Da escolha da luva até o tipo de
pneu, tudo tem de ser muito bem calculado para
evitar imprevistos”, diz Juan
Gordinhas simpáticas
Com pneus que podem ter de quatro a cinco polegadas de largura, quase
duas vezes mais que os encontrados em mountain bikes tradicionais, as
chamadas fat bikes (bicicletas gordas, na tradução literal) são feitas para
irem onde as magrelas comuns não conseguem — principalmente terrenos desafiadores de neve e areia, já que os pneuzões fazem com que elas
afundem menos. São, claro, mais pesadas, com, em geral, 13 quilos, porém
oferecem mais sustentação e conforto. A geometria é bem parecida com
uma mountain bike “normal” e algumas podem ter suspensão dianteira.
As marcas já perceberam o potencial das fat bikes e, nos últimos anos,
vêm investimento cada vez mais nesses modelos. A Salsa, por exemplo,
lançou a Beargrease Carbon XX1, que pesa dez quilos e, com quadro de
carbono, é considerada a mais leve da categoria (US$ 5.500; salsacycles.
com). A Trek tem sua Farley, rígida, com quadro de alumínio, dez velocidades (passadores Sram X7) e pneus Surly 26x3.8”, com rodas Salsa
(US$ 2.700; trekbikes.com). O Brasil ainda não comercializa as fat bikes,
mas a expectativa é que, no primeiro semestre de 2014, alguns modelos
cheguem ao país, como o Fatboy, da marca Specialized (preço a ser definido; specialized.com.br).
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POR CAUSA DAS DURÍSSIMAS condições climáticas,
com dias de friaca que podem despencar abaixo dos
30ºC negativos, e traiçoeiras fendas no gelo, expedições polares de bike podem ser extremamente perigosas. Daniel não sabe precisar quanto tempo levará
para percorrer todo o trajeto, mas calcula algo em
torno de 50 a 60 dias até o polo, a partir da data de
seu voo do Chile até o glaciar Uno, agendada para 23
de novembro. A viagem de volta, com vento a favor,
demoraria menos, e ele prevê estar em casa em 22 de
janeiro de 2014. Daniel, que viajará sozinho, carregará
toda a comida que precisará, além de dois
telefones satelitais para enviar informações
a parentes e amigos.
Única mulher nessa “corrida ao
ouro”, a australiana Kate Leeming
já fez várias expedições de bike,
suficientes para dar duas voltas ao
mundo na linha do Equador
Daniel precisa contar com a sorte e não perder tempo
se quiser vencer essa corrida. Logo atrás dele está o espanhol Juan Menendez Granados. Nos últimos dois anos,
ele tem se preparado para pedalar da costa da Antártida
até o Polo Sul, em uma jornada não assistida (ele levará
todo o equipamento e alimentação, e nenhum veículo
irá ajudá-lo ao longo do trajeto) de 1.200 quilômetros,
previstos para serem percorridos em 35 dias, a partir de
dezembro deste ano. Amarrado na bike, haverá um trenó
com 90 quilos de comida, roupas e outros produtos para
sua sobrevivência.
Para testar seu equipamento — uma bike Surly de pneus
de 4.8 polegadas — e suas capacidades físicas sob um frio
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de lascar, Juan foi para a Groenlândia em setembro. Ao
lado de uma equipe para monitorá-lo, pedalou 600 quilômetros em 27 dias, enfrentando seis tempestades (em
vez de três, como havia previsto). “Pequenos detalhes
fazem a diferença em uma viagem desse tipo. Da escolha
da luva até o tipo de pneu, nutrição e estratégia, tudo tem
de ser muito bem calculado para evitar imprevistos”, diz
Juan, que, entre outras aventuras, já pedalou pelo lago
Baikal, na Sibéria. Também traz no currículo expedições
na Amazônia, nos Montes Urais (Rússia), na Austrália e
nas neves do Canadá.
Até uma mulher entrou na caça ao título de primeiro ser humano a pedalar até o Polo Sul: a australiana Kate Leeming divulgou que, no segundo
semestre de 2014, terá início seu projeto Breaking
the Cycle: South Pole. Sozinha, tentará pedalar da
costa antártica até o Polo Sul, em um trajeto de
pelo menos 1.200 quilômetros. Kate não é nenhuma
novata deslumbrada do mundo das expedições: em
aventuras que somam, segundo ela, quilometragem
suficiente para duas voltas ao mundo na Linha do
Equador, a moça já pedalou, por exemplo, mais de
22 mil quilômetros pela África, incluindo o norte
da Somália. Também já rodou de bike 25 mil quilômetros pela Austrália e 13.400 quilômetros pela
Transiberiana. “Preciso de mais tempo para me preparar direito, por isso resolvi que vou partir apenas
em novembro de 2014. Quero desenvolver melhor
os equipamentos que vou usar e também treinar
bastante para conseguir ter sucesso nessa nova expedição”, anunciou Kate recentemente. Enquanto
isso, ela tem feito training camps em locais como
Spitsbergen, uma ilha no Ártico repleta de fiordes,
montanhas cobertas de neve e dias abaixo de zero
semelhantes ao que encontrará no Polo Sul.
foto Phil Coates
expedição
EU VENCEREI: O espanhol Juan
Menendez Granados, que partirá
em dezembro na tentativa de ser o
primeiro a pedalar até o Polo

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