MUDANÇA LINGÜÍSTICA

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MUDANÇA LINGÜÍSTICA
MUDANÇA LINGÜÍSTICA: A OCORRÊNCIA DE EMPRÉSTIMOS E
ESTRANGEIRISMOS DA LÍNGUA INGLESA NA LÍNGUA
PORTUGUESA, ENCONTRADOS NAS REVISTAS
MONET DE MARÇO DE 2007
E JULHO DE 2008
Auricéia Dumke
[email protected]
Qualquer língua viva do mundo muda constantemente. Novas palavras, pronúncias e
formas gramaticais entram em uso ao mesmo tempo em que outras tantas caem em
desuso. Quando duas ou mais línguas entram em contato, uma ou ambas podem se
modificar. Segundo a lingüista britânica Jean Aitchison, “As causas dessa mudança se
apresentam numa camada dupla. Na camada superior, Estão os “gatilhos sociais” – a
moda, a influência estrangeira, as necessidades sociais etc. – que, disparam ou aceleram
causas mais profundas, tendências escondidas que podem estar adormecidas, latentes,
dentro da língua” (Bagno 2003: 112) A razão mais comum para que um falante queira
empregar uma palavra estrangeira é que a palavra denomina algo novo. Outra razão é o
prestígio: algumas palavras entram para o vocabulário de outra nação devido ao
prestígio que o domínio de tal idioma confere ao seu usuário. Assim, pode-se fazer a
distinção entre empréstimo lingüístico e estrangeirismo. Os empréstimos lingüísticos
são recursos que utilizamos de outra língua para nomear algo que não temos em nossa
língua materna. Os estrangeirismos são recursos utilizados de outra língua quando
temos o equivalente na nossa língua materna. Segundo Carvalho (1989), os
empréstimos / estrangeirismos originam-se no momento em que objetos, conceitos e
situações nomeados em língua estrangeira transferem-se para outra cultura. O falante
adapta ou acomoda a seu sistema, um elemento de um sistema diverso.
Na era da
globalização, a língua mais freqüentemente citada neste aspecto é o inglês. Mas como
uma língua chega a atingir um status global? De acordo com Crystal (2003), uma língua
atinge um status global quando desenvolve um papel especial que é reconhecido em
cada país. Conforme Pedro M. Garcez e Ana Maria Zilles (2001), “Não há dúvida de
que há uma avalanche de anglicismos. Por um lado, há os termos da tecnologia e da
pesquisa avançada, desenvolvida e registrada quase hegemonicamente nessa língua. De
outro lado, há o universo do consumo e dos negócios. O apelo da máquina capitalista
globalizante é forte demais para que a mídia da informação, do entretenimento e,
principalmente, da publicidade possa ou queira deixar de explorar as associa- coes
semióticas entre a língua inglesa e o enorme repositório de recursos simbólicos,
econômicos e sociais por ela mediados” (Faraco 2001: 22-23). A variedade tecnológica
começou a ficar mais disponível ao grande público por volta do ano 2000, pois os
preços dos computadores ficaram mais acessíveis. Crystal (2005) afirma que a internet
gera uma troca de experiências entre idiomas sem precedentes na história da
humanidade. Muitas línguas ostentaram momentos revolucionários, mas eles ocorreram
em épocas e por razões distintas. A Revolução Francesa teve implicações importantes
tanto para o francês quanto para as línguas minoritárias da França, mas desempenhou
pouca influência lingüística em outros lugares. É raríssimo ver mudanças tão globais
capazes de afetarem todas as línguas. Porém, desde que as comunidades possuam um
computador, a internet é capaz. Esta pesquisa pretendeu buscar evidências que
comprovem a incidência, bem como classificar os tipos de itens em inglês encontrados
na língua portuguesa, através do levantamento de dados realizado nas revistas Monet de
março de 2007 e julho de 2008, para verificar se o emprego dos mesmos vem
aumentando, contribuindo para a mudança lingüística, se é um emprego necessário
(empréstimos), ou se existem os equivalentes em português (estrangeirismos). Trabalhase com a hipótese de que a maioria dos itens em inglês encontrada não é necessária,
devido à existência dos seus equivalentes em nossa língua materna. Pretendeu-se
também, aprofundar as questões teóricas da mudança lingüística a fim de buscar as
causas para a adoção de estrangeirismos.
A pesquisa buscou embasamento teórico
principalmente nos estudos realizados pelos seguintes autores: Bagno (2003), Carvalho
(1989), Crystal (2000, 2003, 2005), Faraco (2001), Haugen (1972), Hockett (1965),
Jenkins (2007), e Weinreich (1964) Segundo Carvalho (1989), as línguas se refazem
continuamente, porém se fundamentando em modelos anteriores. A adoção de um termo
estrangeiro pode ser um ato de cultura e gosto, mas é sempre gerada por uma
necessidade prática. As mudanças começam a se desenvolver como deslocamento de
uma norma. A percepção das mudanças ocorridas será comprovada se estas forem
aplicadas por vários falantes, salvo em raros casos. Desta forma torna-se praticamente
impossível descobrir quem ou quando começou uma inovação lingüística. A inovação
lingüística ocorre através dos empréstimos ou dos estrangeirismos. Os empréstimos
lingüísticos são recursos que utilizamos de outra língua para nomear algo que não temos
em nossa língua materna. Os estrangeirismos são recursos utilizados de outra língua
quando temos o equivalente na nossa língua materna, podendo ser considerados
desnecessários. A reação das pessoas varia muito em relação a esses influxos, algumas
os acolhem bem, considerando-os fontes de riqueza léxica, outras os condenam,
entendendo-os como um ataque aos valores tradicionais da língua. O número e o tipo de
palavras emprestadas de outra nação nos mostra em que atividades uma foi superior à
outra. De acordo com Crystal (2005), cerca de 80% de todos os filmes lançados em
cinema são falados em inglês. A influência deles sobre o público que os assiste é
incerta, mas muitos observadores concordam com a opinião do diretor Wim Wenders:
“As pessoas acreditam cada vez mais no que vêem e compram aquilo em que
acreditam... Elas usam, dirigem, vestem, comem e compram o que vêem nos filmes.” As
pessoas imitam aqueles que admiram e que geralmente são considerados superiores.
Podemos ligar o fenômeno da moda com a idéia de prestígio, uma vez que, algo que
está na moda é imitado / seguido por outras pessoas que, por sua vez imitam por razões
de prestígio. Quando um elemento estrangeiro é introduzido em uma língua, ele passa
por muitas mudanças, normalmente visando à simplificação. Podem ocorrer mudanças
na pronúncia devido à inexistência de sons na língua materna, na ortografia consoantes
ou vogais podem ser eliminadas ou inseridas, de acordo com a palavra emprestada.
Hockett (1965), diz que “Quem toma emprestado nem sempre importa completamente
as palavras usadas pelo Doador”, e ele continua, afirmando que “três coisas distintas
podem acontecer, dando origem respectivamente a loanwords, loanshifts, e loanblends,
que é a terminologia seguida por Haugen (1972), incluindo loan translations e semantic
loans. Weinreich (1964), acrescenta loan translation à esta lista, que ele subdividiu em:
loan translations propriamente dito, loan renditions e loan creations. Loanword –
(Empréstimo de palavra): É a nova forma no idioma do falante, quando ele adota a
palavra do doador juntamente com o objeto ou prática. Loanshifts – (Mudança no
empréstimo): O falante pode adaptar o material disponível em sua própria língua para
evitar usar as palavras do doador, junto com o novo item cultural, que pode ser um
objeto ou prática. Semantic loans – (Empréstimos Semânticos): O novo significado é a
única evidência do empréstimo. Loan translations – (Tradução de empréstimos): O
modelo é reproduzido exatamente, palavra por palavra. Loan renditions – (“Rendições”
de empréstimos): O modelo apenas dá uma idéia geral para a reprodução (ex.
wolkenkratzer = cloud scraper = sky scraper = arranha-céu). Loan creations – (Criação
de empréstimos): Criação de novas palavras, estimulada não por inovações culturais,
mas pela necessidade de equiparar itens/ nomenclaturas utilizadas em uma língua em
contato. Loanblends – (Mistura nos empréstimos): Parte do modelo é importado, e parte
dele é substituída por termo já existente na língua do que faz o empréstimo. O resultado
pode ser um tipo de palavra híbrida. O primeiro passo foi a escolha de duas revistas
Monet, de março de 2007 e de julho de 2008. As revistas escolhidas divulgam
mensalmente a programação da rede de televisão a cabo Net, o que direciona os
possíveis tipos de itens em inglês para a área de filmes, cinema, televisão, etc. As duas
revistas foram analisadas página por página, com exceção das programações dia-a-dia,
pois as mesmas mantêm muitos nomes de filmes em língua estrangeira.
Os dados
foram coletados através de anotações de todos os itens encontrados nas seções
selecionadas. Após o levantamento, foi feita a comparação da incidência para calcular o
percentual da diferença de ocorrência entre as duas revistas. O próximo passo foi
classificar os tipos de empréstimos obtidos. Com o levantamento dos dados coletados
nas revistas selecionadas, foi possível obter a diferença da proporção de ocorrência de
itens em inglês através do cálculo de porcentagem. Na revista Monet de março 2007,
foram encontrados 167 itens; e na revista Monet de julho de 2008, foram encontrados
155 itens. Percebe-se uma redução de 7,2% na freqüência do uso de itens de língua
inglesa, comparando a incidência nas duas revistas.
Com este resultado, podemos
concluir que a hipótese de que a ocorrência de itens de língua inglesa está aumentando
nas revistas Monet, não recebeu confirmação, uma vez que há mais itens na revista de
março de 2007 (167), do que na revista de julho de 2008 (155). De acordo com a
definição de tipos de empréstimos, podemos observar que as ocorrências encontradas
foram de Loanwords, Loanblends e Loan Creations; formados por substantivos e/ou
adjetivos. Exemplos de Loanwords mais freqüentes nas duas revistas: mixer, site,
reality shows, rock, Pay-per-view, games, hits, quiz, pop, serial killer, shows, show
business, happy hour, rock’n’roll. Exemplos de Loanblends: “um setzinho de oito
músicas”, videoclipes, geração multimidiática, holliwoodianas, clique (ao alcance de
um clique), camarins glamourosos. Exemplos de Loan Creations: Games interativos,
mundo fashion, Projeto Constellation. Aqui não haveria a necessidade da utilização dos
itens em inglês, por termos os equivalentes em português. O Brasil esteve e continua em
contato com nações falantes de língua inglesa, o que aumenta cada vez mais com a
internet. Considerando a área de filmes, transmissões de TV, a maioria dos itens
utilizados pode ser considerada desnecessária, já que seus equivalentes existem em
língua portuguesa, tratando-se então de estrangeirismos. A razão para a utilização destes
estrangeirismos poderia ser classificada como “atração” – pelo conhecimento da arte de
fazer filmes dos falantes de língua inglesa – as pessoas da área acham que serão
entendidas por quem lida/ gosta de filmes, TV; já que, de acordo com Crystal (2005),
cerca de 80% de todos os filmes lançados em cinema são falados em inglês. A chance
para que muitos destes itens entrem para o vocabulário dos brasileiros é muito remota,
por serem termos usados apenas por pessoas de um determinado ramo, e não pela
população inteira. Outros, já fazem parte do nosso dia-a-dia, como por exemplo, site,
rock, games, happy hour. Com relação à hipótese de que a utilização de itens em inglês
estaria aumentando, esta não se confirma, pois o levantamento dos dados comprovou
um decréscimo de 7,2%.
Palavras-chave: empréstimo lingüístico; estrangeirismo; prestígio.

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