e-Terra Neotectónica e períodos de recorrência de

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e-Terra Neotectónica e períodos de recorrência de
e-Terra
http://e-terra.geopor.pt
ISSN 1645-0388
Volume 11 – nº 4
2010
Revista Electrónica de Ciências da Terra
Geosciences On-line Journal
GEOTIC – Sociedade Geológica de Portugal
VIII Congresso Nacional de Geologia
_________________________________________________________
Neotectónica e períodos de recorrência de grandes sismos e
tsunamis na margem SW Ibérica e Golfo de Cádis
Neotectonics and recurrence period of large earthquakes and tsunami
in the Gulf of Cadiz and SW Iberia margin
T.A. CUNHA – [email protected] (Unidade de Geologia Marinha, Laboratório Nacional de Energia e
Geologia, Lisboa; Cento de Geofísica da Universidade de Lisboa-Instituto Don Luiz, Lisboa)
L. M. MATIAS – [email protected] (Centro de Geofísica da Universidade Lisboa- Instituto Don Luiz, Lisboa)
P. TERRINHA – [email protected] (Departamento de Geologia Marinha, Laboratório Nacional de Energia e
Geologia, Lisboa)
A. M. NEGREDO – [email protected] (Facultad de Ciencias Físicas, Universidad Complutense de Madrid,
Madrid, Espanha)
F. ROSAS – [email protected] (Laboratório de Tectonofísica e Tectónica Experimental (LATEX), Instituto D. Luiz,
Lisbon, Portugal)
R.M.S. FERNANDES – [email protected] (Centro de Geofisica da Universidade Lisboa, Instituto D. Luiz,
Lisboa)
L.M. PINHEIRO – [email protected] (Departamento de Geociências e CESAM, Universidade de Aveiro, Aveiro)
RESUMO: Neste trabalho usámos o método numérico das placas finas (Bird, 1999) para modelar a
Neotectónica no Golfo de Cadiz e estimar os períodos de recorrência de grandes sismos e tsunamis.
Foram testadas várias configurações de falhas e condições fronteira, e os resultados comparados com as
observações de GPS, tensão e deformação sísmica. O melhor ajuste às observações é obtido com um
modelo que apresenta uma taxa de movimentação de 1mm/a nos cavalgamentos com orientação E-O e
NE-SO, o que corresponde a períodos de recorrência de 1150, 3620 e 9900 anos para sismos de
magnitude Mw de 7, 8 e 8.75.
PALAVRAS-CHAVE: Neotectónica, placa fina, período de retorno, sismo, tsunami.
ABSTRACT: We used a thin-shell approximation (Bird, 1999) to model the neotectonics of the Gulf of
Cadiz and SW Iberia Margin and put constraints on the recurrence periods of large earthquakes and
tsunamis. Different plate boundary conditions and fault networks have been tested and the results
compared with the seismic strain, GPS observations and stress data. In our preferred tectonic model,
maximum slip rates of 1 mm/y are estimated in E-W and NE-SW trending thrusts. This corresponds to
minimum return periods of 1150 yr, 3620 yr and 9900 yr for an earthquake of Mw 7, 8 and 8.7,
respectively.
KEYWORDS: neotectonics, thin-sheet, return period, earthquake, tsunami.
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1. INTRODUÇÃO
O sector oriental da fronteira de placas Açores-Gibraltar caracteriza-se por uma deformação
distribuída em compressão e transpressão que acomoda a convergência oblíqua entre as placas
Africana e Eurasiática. Apesar de não se ter uma fronteira de placas bem definida, as falhas
activas nesta região podem causar grandes sismos e tsunamis destruidores, como o grande sismo
de Lisboa a 1 de Novembro de 1755 (Mw~8.7). O maior sismo instrumental registado foi o de 28
de Fevereiro de 1969 (Mw=8.0) localizado na planície abissal da Ferradura, com um mecanismo
em cavalgamento quase puro.
Neste trabalho usamos o método de modelação numérica por placas finas (código SHELLS de
Bird, 1999) para simular a actividade neotectónica neste segmento da fronteira de placas. O
nosso objectivo é o de obter estimativas realistas para o período de retorno dos grandes sismos e
tsunamis. Relativamente a modelos neotectónicos anteriores (e.g. Negredo et al., 2002), este
trabalho beneficia de um conhecimento estrutural mais detalhado, fruto da análise dos dados
mais recentes de batimetria multi-feixe, sonar de varrimento lateral e linhas sísmicas mono e
multi-canal, obtidos por vários grupos de investigação no Golfo de Cadiz (e.g. Zitellini et al.,
2009, Terrinha et al., 2009). O novo mapa estrutural da região mostra a existência de vários
cavalgamentos com uma orientação geral de NNE-SSO a ENE-OSO, associados a proeminentes
relevos observados na batimetria, assim como um conjunto de longos lineamentos ONO-ESE em
desligamento (lineamentos SWIM, até 600 km de comprimento) que se estendem entre a
Planície Abissal da Ferradura e o bordo Oeste do Golfo de Cadiz (Zitellini et al., 2009).
2. RESULTADOS
No processo de modelação numérica foram ensaiadas várias configurações para a fronteira de
placas (geometria e modelos cinemáticos) assim como várias geometrias para o sistema de falhas
activas. Os resultados da modelação foram depois comparados com as observações fornecidas
pelo GPS, orientação da tensão e deformação sísmica. O modelo de partida encontra-se ilustrado
na Figura 1a.
Considerando os lineamentos SWIM como contínuos, e tendo uma expressão à escala da
litosfera, a modelação numérica mostra que nesse caso eles absorveriam a maior parte da
movimentação relativa entre as placas, (~4 mm/a), numa fronteira de placas do tipo
transformante (ver Figura 1b). Nesta circunstância apenas se observaria uma actividade tectónica
em cavalgamento residual a norte dos lineamentos, além do que se teria uma grande atenuação
do campo de velocidades entre o norte de Marrocos e Gibraltar, em contradição com as mais
recentes observações por GPS.
Figura 1 – Modelos neotectónicos usados na modelação por placas finas. Os valores representam a taxa
de movimentação inferida para a falha em mm/a. As cores traduzem o tipo de movimentação. (a) Modelo
inicial de referência. (b) Modelo com lineamentos SWIM contínuos. (c) Modelo final preferido.
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No modelo por nós escolhido, como sendo aquele que está mais de acordo com as
observações (ver avaliação dos modelos na Figura 2), os lineamentos SWIM aparecem
fragmentados e uma parte significativa da movimentação relativa das placas (1 a 2 mm/a) é
acomodada pelo sistema de falhas em cavalgamento de orientação NE-SO situado no norte do
Golfo de Cadiz e na Margem SO Ibérica (ver modelo na Figura 1.c). Este sistema de falhas
estará provavelmente ligado entre si por falhas de transferência em desligamento com uma
orientação NO-SE.
Figura 2 – Avaliação dos diferentes modelos por comparação com as observações. O modelo 3 é aquele
que apresenta melhores resultados por comparação com o valor da velocidade medida por GPS, com a
correlação da deformação sísmica e com a orientação da máxima tensão horizontal.
Para estimar o período de recorrência de grandes sismos assumimos um modelo de geração
(sismo característico) em que a maior parte da deformação é acomodada pela movimentação
associada ao sismo máximo. Sendo assim, para uma movimentação na falha de VF e um
deslizamento SM associado ao sismo máximo, nesta aproximação o intervalo de recorrência TR
vem dado por
Este modelo de recorrência dá-nos o limite inferior para o intervalo entre grandes sismos
gerados pela falha para uma dada magnitude máxima. Para calcularmos o deslizamento médio,
SM, associado a uma dada magnitude, assumimos um modelo de geração baseado nas
observações efectuadas para o sismo de 28/Fev/1969 (Fukao, 1973), para o sismo de
12/Fev/2007 (Stich et al., 2007) e baseado nas propostas para a geração do sismo e tsunami de
1/Nov/1755 (Ribeiro et al., 2009) (ver tabela).
Mw
7.0
7.5
8.0
8.5
8.75
SM (m)
1.2
2.0
3.6
7.8
9.9
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Usando o procedimento indicado, verificamos que as falhas identificadas no modelo preferido
podem originar sismos com uma magnitude de 8, com um período de recorrência da ordem de
2000-4000 anos. A ocorrência de um sismo do tipo de 1755, magnitude Mw~8.7, implica a
rotura em cadeia de várias destas falhas e teria um período de recorrência da ordem de 10000
anos.
Agradecimentos
Este trabalho foi apoiado pelos projectos MATESPRO (PDCTM/P/MAR/15264/1999), SWITNAME
(PDCT/CTE-GIN/59244/2004), EUROMARGINS SWIM (01-LEC-EMA09F), MVSEIS (01LEC_EMA24F; PDCTM 72003/DIV/40018), NEAREST (n. 01-LEC-EMA09F contract n. 037110) e
TOPOMED (TOPOEUROPE/0001/2007).
Referências
Bird, P. (1999) - Thin-plate and thin-shell finite element modeling programs for forward dynamic modeling of plate
deformation and faulting, Comput. Geosci., 25, pp. 383– 394.
Fukao, Y. (1973) - Thrust faulting at a lithospheric plate boundary: the Portugal earthquake of 1969. Earth Planet.
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Negredo A.M., P. Bird, C. Sanz de Galdeano and E. Buforn (2002) - Neotectonic modeling of the Ibero-Maghrebian
region, J. of Geoph. Res., V107(B11), 2292, doi:10.1029/2001JB000743.
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Stich, D.,F. Mancilla, S. Pondrelli, and J. Morales (2007) - Source analysis of the February 12th 2007, Mw 6.0
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Terrinha, P., L. Matias, J. Vicente, J. Duarte, J. Luíse, L. Pinheiro, N. Lourenço , S. Diez, F. Rosas, V. Magalhães,
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Zitellini, N., E. Gràcia, L. Matias, P. Terrinha, M.A. Abreu, G. DeAlteriis, J.P. Henriet, J.J. Dañobeitia, D.G.
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west of the Strait of Gibraltar, Earth and Planetary Science Letters, 280, pp. 13–50.
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