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A Revista Mato-grossense de Políticas Públicas/RMPP é uma publicação da Associação
Mato-grossense de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas/AMEPPP que visa
divulgar o debate e as reflexões sobre Políticas Públicas e a produção de conhecimento
nas diversas áreas da administração pública, constituindo-se num canal aberto,
interdisciplinar e coletivo de socialização de saberes.
Os artigos publicados na Revista são de inteira responsabilidade de seus autores.
Permitida a reprodução parcial ou total desta obra desde que citada a fonte.
CONSELHO EDITORIAL DA REVISTA
Ademar Sales Macaúbas / Mestre em Serviço Social pela PUC/SP
Alexandre Cândido de Oliveira Campos / Mestre em Educação pela USP/SP
Geni Melo / Mestre em Economia pela UFMT/MT
Imar Domingues Queiroz / Doutora em Sociologia pela UFSC/SC
Janaina Loeffler de Almeida / Mestre em Serviço Social e Direitos Humanos pela
UFSC/SC.
CONSELHO CONSULTIVO E CIENTÍFICO/CCC
Elvis Silva / Pós Doutor em Física pela UNICAMP-SP e docente da UFMT-MT;
Gláucia Lélis Alves / Doutora em Serviço Social pela UFRJ e docente da UFRJ-RJ;
Imar D. Queiróz / Doutora em Sociologia Política pela UFSC-SC e docente da UFMT-MT;
Leana Freitas / Doutora em Políticas Públicas pela UFMA-MA e docente da UFMT-MT;
Paulo Alberto Santos Vieira / Doutor em Economia pela UFSCAR-SP e docente da
UNEMAT-MT;
Rinaldo Ribeiro de Almeida Segundo / Mestre em Direito pela Universidade de
HARVARD e Promotor de Justiça em Mato Grosso.
Capa: Ricardo Sardinha
Coordenação editorial: Janaina Loeffler de Almeida
A Revista está disponível na versão on-line e pode ser acessada pelo site
www.ameppp.org.br nas versões PDF e on-line.
Endereço eletrônico: www.ameppp.org.br e e-mail: [email protected]
CNPJ nº 15.110.558/0001-05
ISSN: 2316-8641 (on line)
RMPP/Revista da Associação Mato-Grossense de Estudos e Pesquisas em Políticas
Públicas – AMEPPP. - ano 1, n. 1 (fev./jul.2012) . – Cuiabá: AMEPPP, 2012 – .
Ano 2, n. 2 (fev./jul. 2013).
Semestral.
Resumo em português.
Tema: Transparência, assistência e meio ambiente.
ISSN: 2316-8641 (on line)
1. Políticas Públicas – Periódicos. 2. Governos subnacionais. 3. Servidores
públicos.
I. Associação Mato-grossense de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas (AMEPPP)
CDU: 351.01
CDD: 350.01
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ................................................................................................................ 3
OS PORTAIS TRANSPARÊNCIA NOS MUNICÍPIOS DE MATO GROSSO ................................... 5
A emergência da sociedade da informação ........................................................................................................ 7
A pesquisa ......................................................................................................................................................... 12
Os resultados .................................................................................................................................................... 17
Considerações Finais ......................................................................................................................................... 21
DIREITO À INFORMAÇÃO E ACESSO ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS: UM ATO DE CIDADANIA DOS
UNIVERSITÁRIOS ............................................................................................................. 25
Introdução......................................................................................................................................................... 26
Direito à informação e acesso às políticas públicas .......................................................................................... 27
Metodologia do estudo ..................................................................................................................................... 30
Resultados e discussões .................................................................................................................................... 32
Conclusão .......................................................................................................................................................... 38
ASSISTÊNCIA SOCIAL, GESTÃO DO TRABALHO E OS IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO
PRODUTIVA: DINÂMICA, CONTRADIÇÕES E DESAFIOS NA IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS EM
MATO GROSSO ................................................................................................................ 41
Notas introdutórias ........................................................................................................................................... 42
Estado, Neoliberalismo e Modelo de Gestão Gerencial ................................................................................... 42
A Política Nacional de Assistência Social e o Sistema Único de Assistência Social. .......................................... 46
A Gestão do Trabalho no SUAS: aproximações, dinâmica, contradições e desafios na implementação do
SUAS em Mato Grosso ...................................................................................................................................... 48
Considerações finais.......................................................................................................................................... 52
ANÁLISE DO REPASSE DO ICMS ECOLÓGICO AOS MUNICÍPIOS DE MATO GROSSO, COM
ENFÂSE À MELHORIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................... 57
O ICMS Ecológico no Brasil................................................................................................................................ 58
Legislação no Mato Grosso ............................................................................................................................... 58
Municípios de Mato Grosso .............................................................................................................................. 59
Unidades de Conservação ................................................................................................................................. 60
Políticas Públicas ............................................................................................................................................... 61
Apresentação e Análise dos dados – Metodologia e Pesquisa ......................................................................... 62
Considerações Finais ......................................................................................................................................... 68
APRESENTAÇÃO
É com satisfação que apresentamos aos leitores a segunda edição da Revista Matogrossense de Políticas Públicas – RMPP. Versando sempre sobre temáticas atuais e
vinculadas ao cotidiano das instituições, a Revista faz circular uma série de artigos de
profissionais que trabalham com políticas públicas nas mais diferentes áreas.
Na presente edição a Revista abre espaço, em seus artigos iniciais, para dois trabalhos
a respeito da Transparência Pública que, na verdade, se completam. O primeiro dá
publicidade ao resultado de um processo de avaliação dos portais transparência dos
municípios mais populosos do Estado e, o segundo, busca dimensionar a dinâmica entre o
Portal Transparência de um daqueles municípios – Rondonópolis – e um público alvo
específico.
Na sequência, a Revista tematiza a Política de Assistência Social, retratando a gestão
do trabalho no Sistema Único de Assistência Social/SUAS, sobretudo na realidade matogrossense, em tempos de reestruturação produtiva e acirramento do capital.
No artigo que trata sobre o meio ambiente, os autores discutem sobre o repasse do
ICMS Ecológico aos municípios de Mato Grosso, com foco na melhoria das políticas
públicas. Para tanto, abordam aspectos regulatórios, conceituais e socioambientais visando
analisar a contribuição do repasse aos municípios e seus desdobramentos para a sociedade.
A expectativa é de que esta segunda edição consiga consolidar um passo importante
no projeto coletivo proposto pela AMEPPP: levar o debate das políticas públicas a territórios
cada vez mais diversificados. De um lado, o fato de os autores desenvolverem seus trabalhos
em diferentes municípios, como Cuiabá, Rondonópolis e Cáceres, pode contribuir para a
transposição dos territórios geográficos. De outro lado, o fato de parte dos autores serem
servidores públicos de carreiras não-universitárias demonstra a diversificação dos territórios
de produção do conhecimento social.
Desejamos uma excelente leitura e o convidamos a dialogar com os autores pelos emails constantes nas páginas iniciais de cada artigo.
OS PORTAIS TRANSPARÊNCIA NOS MUNICÍPIOS DE MATO GROSSO
Alexandre Cândido de Oliveira Campos1
RESUMO
O artigo apresenta o resultado da avaliação dos Portais
Transparência dos oito municípios mais populosos do Estado de
Mato Grosso, excluindo-se a capital Cuiabá. Insere as
discussões numa perspectiva de possibilidade de avanços
democráticos mediante o bom uso da revolução na Tecnologia
da Informação que vem se consolidando em nível mundial.
Descreve o cenário legal em que os Portais Transparência estão
inseridos, sobretudo no que se refere à Lei Complementar n.º
101/2000 e à Lei Federal n.º 12.527/2011. Constata que
nenhum dos municípios pesquisados atende plenamente ao
que está previsto nas legislações, mas que os municípios de
Várzea Grande e Primavera do Leste se encontram em um
estágio avançado de implementação de seus portais.
Palavras-chave: Cidadania. Portal Transparência. Acesso à
informação. Mato Grosso. Municípios.
1
Mestre em Educação pela USP. Historiador e Especialista em Gestão Pública. Gestor Governamental do
Estado de Mato Grosso. E-mail: [email protected].
6
REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
O declínio do Antigo Regime
Os séculos XVIII e XIX foram palcos de profundas transformações na sociedade
ocidental no que se refere à sua organização política. A principal delas se concentrou na
desconstrução do Estado Absolutista marcado pelo patrimonialismo e pela ausência de
liberdades religiosa, econômica e política.
Caracterizar o sistema em declínio, no entanto, não apresenta complexidade maior
que a tarefa de identificar os pilares do "novo regime" que ocupou o seu lugar.
Um conjunto de discursos jurídicos, econômicos e filosóficos - e muitos pensadores
articulavam todas essas temáticas em um mesmo discurso - fizeram do início do século XIX
um período de instabilidades políticas e experimentos democráticos.2
De uma forma ou de outra, a partir do final do século XVIII tanto a filosofia política
quanto os levantes sociais desencadeados durante todo o século XIX acabaram dialogando
com o modelo de democracia delineado por Rousseau que, em seu Contrato Social,
publicado em 1762, retrata com bastante clareza as preocupações que gravitavam em torno
dos debates antiabsolutistas.
Nascido cidadão de um Estado Livre e membro do soberano3, por
fraca influência que possa ter meu voto nos negócios públicos, o
direito de votar é suficiente para me impor o dever de me informar a
respeito disso ... (ROUSSEAU, 2008. p. 15).
Esse pequeno excerto poderia ser analisado sob várias óticas. No entanto, reservome a destacar a necessidade que o autor atribui a uma postura ativa do cidadão e a relação
intrínseca existente entre a participação política e a busca das informações a respeito dos
"negócios públicos".
2
Não é propósito deste artigo discorrer a respeito de tais discursos. O que se pretende é situar melhor o leitor no
cenário em que foram forjados conceitos basilares para o entendimento dos contextos políticos da transparência
pública.
3
Ao classificar a si próprio como "membro do soberano" Rousseau oferece uma alegoria alternativa à do
Leviatã, de Hobbes. Para Rousseau, "Tão logo essa multidão se encontre reunida num corpo, não se pode
ofender um dos membros sem atacar o corpo, menos ainda ofender o corpo sem que os membros disso se
ressintam. Assim, o dever e o interesse obrigam igualmente as duas partes contratantes a se auxiliarem de forma
recíproca e os próprios homens devem procurar reunir sob essa dupla relação todas as vantagens que disso
dependem. Ora, o soberano, sendo formado tão somente dos privados que o compõem, não tem nem pode ter
interesse contrário ao deles." (ROUSSEAU, 2008, p. 34).
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Transparência, assistência e meio ambiente
Também em outra passagem, ao argumentar em favor da "vontade geral" do povo,
Rousseau nos remete, ainda que de forma indireta, à importância do acesso à informação
por parte do cidadão.
Se, quando o povo suficientemente informado delibera, e os cidadãos
não tivessem nenhuma comunicação entre si, do grande número de
pequenas diferenças resultaria sempre a vontade geral e a
deliberação seria sempre boa" (ROUSSEAU, 2008, p. 47-8). (Grifo
nosso).
Corroborando a tese da importância do acesso à informação no contexto da
transição dos "regimes", Batista (2012), destaca que, "Poucos anos antes da Revolução
Francesa (1789), num édito de 1784, Frederico II, rei da Prússia, dispunha sobre proibições
absolutistas."
Não é permitido que um particular divulgue opiniões críticas, nem
faça saber ou divulgue através de material impresso as notícias que
recebe referente às ações, procedimentos, leis, castigos e editais do
monarca e das cortes, seus funcionários governamentais, corpos
colegiados e tribunais. Um particular é incapaz de formar tal opinião
porque não tem o pleno conhecimento das circunstâncias e dos
motivos. (KUNCZIK, 1997, p. 25 apud BATISTA, 2012. p. 7 e 8). (Grifo
nosso).
Como se verifica, nesse caso a justificativa para a negação do direito de manifestação
política se concentra precisamente na falta de conhecimentos a respeito de circunstâncias e
motivos por parte do cidadão. Ou, entendido de outro modo, a falta de acesso a um certo
tipo informações por parte do cidadão. Como se essa falta de acesso à informação fosse um
fato dado, e não a consequência de um modelo de sociedade avessa à participação social.
A emergência da sociedade da informação
Da Revolução Francesa até o início do último quartel do século XX foi sendo moldada
uma cidadania contraposta ao Antigo Regime.4 Esse processo foi marcado pela tensão dos
4
Uma análise mais detalhada desse período histórico pode ser verificada nas obras do historiador inglês Eric
Hobsbawm, que identifica quatro eras distintas em que operaram os elementos centrais da modernidade: a Era
das Revoluções, de 1789 a 1848; a Era do Capital, de 1848 a 1875; a Era dos Impérios, de 1875 a 1914; e a Era
dos Extremos, de 1914 a 1991.
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7
8
REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
discursos próprios da "modernidade", com destaque para o nacionalismo, o positivismo, o
liberalismo, o marxismo5 e também os discursos jurídicos.6
No entanto, há quase meio século vivemos o avanço do que vem sendo denominado
de "Pós-modernidade", ou como definem Lyotard e Harvey, "Condição Pós-moderna".7
Giddens (1991), apesar de discordar da excessiva pulverização dos projetos sociais como
corolário de algumas teses pós-modernas, apresentou um panorama geral bastante preciso
dessa nova condição social. Segundo ele:
Hoje, no final do século XX, muita gente argumenta que estamos no
limiar de uma nova era, a qual as ciências sociais devem responder e
que está nos levando para além da própria modernidade. Uma
estonteante variedade de termos tem sido sugerida para esta
transição, alguns dos quais se referem positivamente à emergência
de um novo tipo de sistema social (tal como a "sociedade de
informação" ou a "sociedade de consumo"), mas cuja maioria sugere
que, mais que um estado de coisas precedente, está chegando a um
encerramento ("pós-modernidade", "pós-modernismo", "sociedade
pós-industrial", e assim por diante). Alguns dos debates sobre estas
questões se concentram principalmente sobre transformações
institucionais, particularmente as que sugerem que estamos nos
deslocando de um sistema baseado na manufatura de bens materiais
para outro relacionado mais centralmente com informação. Mais
freqüentemente, contudo, estas controvérsias enfocam amplamente
questões de filosofia e epistemologia. Esta é a perspectiva
característica, por exemplo, do autor que foi em primeiro lugar
responsável pela popularização da noção de pós-modernidade, JeanFrançois Lyotard. Como ele a representa, a pós-modernidade se
refere a um deslocamento das tentativas de fundamentar a
epistemologia, e da fé no progresso planejado humanamente. A
condição da pós-modernidade é caracterizada por uma evaporação
da grand narrative — o "enredo" dominante por meio do qual somos
inseridos na história como seres tendo um passado definitivo e um
futuro predizível. A perspectiva pós-moderna vê uma pluralidade de
reivindicações heterogêneas de conhecimento, na qual a ciência não
tem um lugar privilegiado. (GIDDENS, A. As consequências da
modernidade. São Paulo, Ed. Unesp, 1991, p. 8-9).
5
A respeito da construção e desconstrução dos discursos marxistas, destacando suas causas e implicações
sociopolíticas, considero bastante completa a análise do historiador espanhol Josep Fontana. (Cf. FONTANA,
Josep. História: Análise do passado e projeto social. Bauru, SP: Edusc, 1998).
6
Cf. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos; tradução de Carlos Nelson Coutinho; apresentação de Celso Lafer.
– Nova ed. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
7
Cf. LYOTARD, 2000; HARVEY, 1992.
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Transparência, assistência e meio ambiente
A opção em trazer para este artigo uma contribuição direta de Giddens ao invés de
outra de Lyotard tem o objetivo de mostrar que, independente dos diferentes
entendimentos a respeito das transformações ocorridas nas últimas décadas do século XX,
pode-se identificar certo consenso com relação às grandes proporções alcançadas pelas
transformações no campo das informações.
Essas transformações atingem de modo muito peculiar a esfera pública. Para Akutsu
e Pinho (2002),
A teoria da sociedade da informação procura não somente analisar as
transformações provocadas pelas novas TIs, mas também prever
mudanças que poderão ocorrer em um futuro próximo. Um dos
pressupostos da teoria da sociedade da informação é que o advento
de novas TIs, ao possibilitar o acesso a informações a um maior
número de pessoas, com maior rapidez e menor custo, não somente
aumentaria a oferta de bens disponíveis para a humanidade por meio
da melhoria do gerenciamento dos bens de produção, como também
diminuiria os conflitos sociais, ao permitir aos cidadãos melhor acesso
às informações acerca da gestão dos administradores públicos,
permitindo-lhes acompanhar as administrações, avaliar e escolher
melhor seus governantes.(AKUTSU E PINHO, 2002.p.4).8 (Grifo nosso).
Os governos, segundo esses autores, podem se valer desses avanços tecnológicos
para promover uma utilização comercial das informações, para promover a automação de
determinados serviços públicos, ou, o que é mais importante, promover uma “democracia
eletrônica”.
Ainda que esses entendimentos não sejam homogêneos9, o fato é que, de um lado, a
sociedade tem se utilizado das mídias sociais para divulgar e organizar ações políticas
8
Ainda segundo esses autores, "Os teóricos da sociedade da informação entendem que ela gera mudanças
fundamentais na sociedade, sendo o trabalho e o capital substituídos, como variáveis básicas da sociedade
industrial, pela informação e o conhecimento. Para esses teóricos, a sociedade da informação deve ser vista como
um estilo de vida completo, por provocar mudanças em várias áreas da vida. Tais autores também esperam uma
sociedade mais democrática, com uma completa reestruturação das instituições, baseadas no computador.
(AKUTSU E PINHO, 2002. p. 5)
9
Alguns autores, como Bellamy e Taylor (1998), "classificam em dois grandes grupos os autores que têm
procurado prever o impacto das novas TIs na sociedade. Os teóricos da sociedade da informação são rotulados
como “utópicos”, por pregarem uma nova sociedade onde as novas tecnologias promoverão a harmonia no
sistema político, em decorrência da maior consciência política dos cidadãos, derivada do maior acesso à
informação, e da quebra das estruturas de poder atualmente vigentes, centradas no monopólio das informações
sensíveis. O segundo grupo mencionado por Bellamy e Taylor é o dos “antiutópicos”, que contrapõem-se à
teoria da sociedade da informação e defendem essencialmente a idéia de que os governos utilizarão as novas
tecnologias de informação para aumentar seu controle sobre a sociedade. As informações serão disponibilizadas
Disponível em: www.ameppp.org.br
9
10
REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
coletivas que introduzem elementos novos nos padrões de cidadania atuais e, de outro, os
governos tem iniciado – ainda que de forma muito tímida – um movimento no sentido de
maior utilização dos recursos das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) em sua
relação com os cidadãos.
É o caso do que vem sendo classificado como "Governo Eletrônico". Para Mezzaroba
e Rover (2012),
As TIC também se fazem sentir no setor governamental, dando início
ao que se conhece por governo eletrônico, ou seja, (1) a
informatização das atividades governamentais e, (2) a comunicação
entre governo e público externo: cidadãos, fornecedores, empresas
ou outros setores governamentais ou da sociedade (PINHO, 2008).
Nesse sentido cabe destacar que: Os avanços tecnológicos das TICs e
engenharia e gestão do conhecimento produzem desafios para as
empresas e para a respectiva competitividade. Igualmente, os
governos, se preocupados com os resultados que oferecem à
sociedade, são instados a modernizar a própria gestão e a
apropriação dos atos, fatos e atendimentos que geram e/ou
produzem. O governo eletrônico (e-gov) tem sido definido como o
uso intensivo das TICs para promover um governo mais eficiente e
efetivo. Isto é: para facilitar a acessibilidade ao serviço
governamental, através de um maior acesso público à informação e
para fazer um governo mais prestador de contas aos cidadãos
(RUSCHEL, et al, 2009, p. 86). (...) O governo eletrônico brasileiro
conta, desde 2004, com um departamento específico: o
Departamento de Governo Eletrônico (DGE). Criado pelo Decreto
5.134, de 07 de julho de 2004, o DGE é encarregado de coordenar e
articular a implantação de ações unificadas e integradas de governo
eletrônico, as atividades relacionadas à prestação de serviços
públicos por meios eletrônicos, além de normatizar e disseminar o
desenvolvimento de ações e informações de governo eletrônico na
administração federal. (MEZZAROBA E ROVER, 2012. p. 35-36).10
em maior quantidade e rapidez, porém os grandes grupos econômicos e os detentores do poder político somente
divulgarão as informações que lhes interessam." (AKUTSU E PINHO, 2002.p.4).
10
No entanto, na visão de Frey (2001), "A maior parte dos governos limita suas iniciativas ao que Lawson
chama de “visão fraca” da e-governança; uma abordagem essencialmente conservadora que evita mudanças mais
profundas na maneira em que o governo opera e funciona. O governo está preocupado em não passar poder ou
influência a outros atores sociais ou políticos. Por outro lado, a visão mais radical ou “visão forte” da governança
eletrônica busca reformar a própria base do governo: “A mudança de como o governo opera e que serviços ele
presta está de mãos dadas com a transformação de sua cultura, abordagem e estrutura” (Lawson 1998: 16). A
partir desse ponto de vista as TIC oferecem uma oportunidade única de ligar as estratégias para serviços online
às reformas administrativas que são tão urgentemente necessárias para preparar as administrações públicas para
lidar com os desafios de um ambiente cada vez mais complexo, incerto e mutante. Um desses desafios tem a ver
com a crise de legitimidade que afetou a democracia e o governo em tempos recentes e a busca de novas formas
de cooperação entre governos, o setor privado e a sociedade civil. As TIC podem ser um catalisador não apenas
para mudar o foco dos serviços públicos para uma maneira de prestar serviços que seja mais dirigida ao povo,
Disponível em: www.ameppp.org.br
Transparência, assistência e meio ambiente
Além do conceito de "governo eletrônico" e de "democracia digital", nos últimos
anos tem se utilizado com frequência a expressão "Governos Abertos" para se referir aos
processos que ampliaram a permeabilidade da esfera estatal e permitiram novos espaços de
intervenção popular nas ações governamentais.11
O avanço da tecnologia da informação, no entanto, não pode ser entendido como
mero instrumento a serviço do ser humano. Na verdade, não faz sentido a existência de
ferramentas tecnológicas avançadas sem o domínio do ser humano sobre elas. E esse uso
contínuo das ferramentas, esse domínio da tecnologia, produz não uma somatória simples
de "tecnologia + ação humana", mas uma nova humanidade.
Isso significa que o avanço tecnológico também se impregna no próprio ser humano.
Seus procedimentos cotidianos, seus modelos de solução de problemas, suas relações
sociais, e até mesmo sua inserção política, se transformam por completo. O desequilíbrio
provocado pela inserção de uma nova tecnologia no cotidiano dos seres humanos motiva a
construção
de
novos
esquemas12
de
ação
e
representação,
remodelando
os
comportamentos sociais tanto na esfera privada quanto na esfera pública.
É o que Maturana (2001) explica com o conceito de acoplamento estrutural,
devido à natureza do acoplamento estrutural entre organismo e
meio, qualquer dimensão de interação estrutural do organismo e do
meio, que se acopla com o fluir de mudanças estruturais do sistema
nervoso, pode tornar-se uma dimensão sensorial, e uma expansão do
espaço comportamental do organismo. (MATURANA, 2001. p. 186).
Desse modo, os discursos que versem sobre os avanços da democracia no mundo
contemporâneo não podem mais ignorar o avanço tecnológico em que vivemos, sobretudo
no que se refere à tecnologia digital. Não se trata de apenas mais um instrumento à
com maior qualidade, mais personalizada, holística, efetiva e criativa (Lawson 1998: 16); mas também oferece
possibilidades para sustentar novos modos de criação de redes sociais e políticas e novas formas de participação
democrática". (FREY, 2001. p. 36-37).
11
Cf. A Parceria para Governo Aberto do qual o governo brasileiro faz parte. Disponível em:
http://www.acessoainformacao.gov.br/acessoainformacaogov/acesso-informacao-mundo/governo-aberto.asp.
12
As expressões "desequilíbrio" e "esquema”, presentes no texto, estão sendo utilizadas em sua concepção
piagetiana.
Disponível em: www.ameppp.org.br
11
12
REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
disposição do ser humano, mas de um novo comportamento social de uma geração que
conviveu desde sempre com a presença das ferramentas digitais.
A pesquisa
As principais delimitações da pesquisa foram pensadas a partir dos comandos
presentes nas legislações relacionadas a essa temática. As legislações que versam sobre o
acesso à informação e tornam obrigatórios os “Portais Transparência” para todos os poderes
em todos os níveis de governo, se vinculam a comandos constitucionais. Um deles é o
previsto no caput do Art. 37, que relaciona a “publicidade” como princípio a ser seguido por
toda a administração pública brasileira.
No entanto, além de ser um dever da administração pública divulgar seus atos, o
acesso à informação é insculpido como direito fundamental dos cidadãos, estando previsto
no inciso XXXIII do art. 5º da Constituição Federal:
XXXIII – todos têm o direito a receber dos órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou
geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de
responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado.
Verifica-se, então, que o acesso à informação não pode ser reduzido a um
instrumento democrático pontual, mas considerado como um dos elementos constituidores
do modelo de cidadania moderno.
De igual modo, os dispositivos infraconstitucionais que tratam do acesso à
informação também dialogam com as conjunturas políticas em que são elaborados. A Lei nº
131/2009, por exemplo, alterou a Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei Complemetar n.º
101/2000 – inserindo novos mecanismos de transparência alinhados com os avanços
observados no campo da Tecnologia da Informação.
Com efeito, o parágrafo único do Art. 48 da Lei de Responsabilidade Fiscal passou a
figurar com a seguinte redação:
Disponível em: www.ameppp.org.br
Transparência, assistência e meio ambiente
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante:
I – incentivo à participação popular e realização de audiências
públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos,
lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;
II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da
sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a
execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso
público;
III – adoção de sistema integrado de administração financeira e
controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido por
Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A.
Aqui verificamos que a lei faz referência direta à internet ao determinar o uso dos
meios eletrônicos de acesso público (Art. 48, Inciso II). Ao impor o “tempo real” à publicação
das informações também se verifica a necessidade de maior utilização dos avanços
tecnológicos.
Cabe observar que a característica “tempo real” e a ênfase na informação
relacionada à execução orçamentária e financeira foram levadas em conta nesta pesquisa no
momento da elaboração dos formulários para a avaliação dos portais dos municípios
selecionados. Como também se levou em conta os itens mínimos a serem divulgados nos
portais, previstos no art. 48-A:
Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do
art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa
física ou jurídica o acesso a informações referentes a:
I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades
gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua
realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao
número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço
prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e,
quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado;
II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita
das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários.
Os prazos estipulados para a inserção dessas informações nos meios eletrônicos
levam em consideração o porte do ente federado, tendo os municípios menores maior
tempo para se adaptarem às determinações previstas, conforme previsto no art. 73-B da
LRF:
Art. 73-B. Ficam estabelecidos os seguintes prazos para o
cumprimento das determinações dispostas nos incisos II e III do
parágrafo único do art. 48 e do art. 48-A:
Disponível em: www.ameppp.org.br
13
14
REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
I – 1 (um) ano para a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios com mais de 100.000 (cem mil) habitantes;
II – 2 (dois) anos para os Municípios que tenham entre 50.000
(cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes;
III – 4 (quatro) anos para os Municípios que tenham até 50.000
(cinquenta mil) habitantes.
Parágrafo único. Os prazos estabelecidos neste artigo serão contados
a partir da data de publicação da lei complementar que introduziu os
dispositivos no caput deste artigo.
Para observar melhor os prazos tesbalecidos pela legislação e seu impacto nos
municípios de Mato Grosso vejamos a Tabela 1:
TABELA 1
Prazos para implantação do Portal Transparência (LC n.º 131/2009 de 27/05/2009)
Início (venceu em 27
de maio de 2009)
Publicação da Lei
Complementar n.º
131/2009.
1 ano (venceu em 27
de maio de 2010)
União, Estados,
Duistrito Federal e
municípios com mais
de 100 mil habitantes
2 anos (venceu em
27 de maio de 2011)
Municípios com 50
mil a 100 mil
habitantes
4 anos (vence em 27
de maio de 2013)
Municípios com até
50 mil habitantes
Considerando os prazos estabelecidos pela legislação e o fato de a coleta de dados
para a pesquisa que subsidia este artigo ter sido realizada antes do dia 27 de maio de 2013,
optou-se por avaliar os portais dos municípios mato-grossenses que possuem mais de 50 mil
habitantes.
Uma excessão foi feita para o município de Cuiabá devido à atuação direta do
pesquisador na implementação do Portal Transparência desse município. Os problemas
vivenciados, as desilusões, os sucessos obtidos, toda a experiência acumulada nesse
processo, enfim, contaminam o pesquisador de forma irremediável impedindo uma análise
mais isenta.
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Transparência, assistência e meio ambiente
Com efeito, entre os dias 20 e 26 de maio de 2013 foram avaliados os Portais
Transparência dos seguintes municípios mato-grossenses:
TABELA 2
Muncípios que tiveram seus portais avaliados
MUNICÍPIO
Várzea Grande
Rondonópolis
Sinop
Cáceres
Tangará da Serra
Sorriso
Barra do Garças
Primavera do Leste
POPULAÇÃO EM 2011
255.488
202.309
116.013
88.427
84.076
68.894
56.903
53.003
Além dos itens elencados na Lei de Responsabilidade Fiscal, considerou-se, para fins
de avaliação, a presença do conteúdo previsto no art. 8º, § 1º da Lei n.º 12.527 – Lei de
Acesso à Informação:
Art. 8º É dever dos órgãos e entidades públicas promover,
independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil
acesso, no âmbito de suas competências, de informações de
interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.
§ 1º Na divulgação das informações a que se refere o caput, deverão
constar, no mínimo:
I – registro das competências e estrutura organizacional, endereços e
telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao
público;
II – registro de quaisquer repasses ou transferências de recursos
financeiros;
III – registros das despesas;
IV – informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive
os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos
celebrados;
V – dados gerais para acompanhamento de programas, ações,
projetos e obras de órgãos e entidades; e
VI – respostas a perguntas mais frequentes da sociedade.
§ 2º Para cumprimento do disposto no caput, os órgãos e entidades
públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos de
que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da
rede mundial de computadores (internet).
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
Assim, os conteúdos obrigatórios relacionados na Lei Complementar n.º 131/2009 e
na Lei 12.527/2011, constituíram a base principal da avaliação realizada e representou 70%
da pontuação máxima atribuída a cada portal avaliado, conforme Tabela 3.
TABELA 3
Conteúdo avaliado na pesquisa e seus respectivos pesos na nota final
CONTEÚDO
Despesa
Receita
Licitação
Contrato
Convênio
Pessoal
Informações das secretarias
(conforme art. 8º, § 1º, da Lei n.º
12.527/2011)
Total
PESO
10 %
10 %
10 %
10 %
10 %
10 %
10 %
70%
Considerando ainda a importância que a Lei de Acesso à Informação reserva à
transparência efetiva, ou seja, à possibilidade real de uso das informações pelo cidadão
comum, foi avaliada também a “usabilidade” do portal – critério que representou 15% da
pontuação máxima.
A pontuação para o critério “usabilidade” considerou as ferramentas de consulta –
7% da pontuação máxima –, as formas de geração de relatórios da receita e da despesa
(download) – 5% da nota máxima –, e a interação com o usuário – 3% da nota máxima.
Além do conteúdo e da usabilidade, foi avaliada a dimensão temporal das
informações, representando 10% da pontuação máxima. Para a avaliação da dimensão
temporal foram consideradas a periodicidade da atualização do portal (7% da pontuação
máxima) e a série histórica disponível (3% da pontuação máxima).
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Transparência, assistência e meio ambiente
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O último critério avaliado foi o da apresentação do portal, que representou apenas
5% da pontuação máxima. Nesse critério levou-se em conta a facilidade de encontrar as
informações, o que se relaciona principalmente com os títulos utilizados e a localização dos
títulos ou ícones nas páginas.
***
Toda a metodologia apresentada foi detalhada em formulários impressos e
eletrônicos, contemplando fórmulas que pudessem dimensionar as notas atribuídas a cada
portal a partir dos pesos estipulados para as categorias avaliadas. Não cabe, neste artigo,
pormenorizar o passo-a-passo da atribuição das notas aos portais dos oito municípios
avaliados, no entanto, o acesso a esse detalhamento será franqueado a todos que
solicitarem pelo e-mail disponibilizado na folha de rosto deste artigo.
Os resultados
Os formulários para a análise dos portais foram aplicados entre os dias 20 e 26 de
maio de 2013, obtendo-se o resultado geral apresentado no Quadro 1.
QUADRO 1
Resumo Geral da Avaliação dos Municípios
Município
Apresentação
(Máx.: 5%)
Conteúdo
(Máx.: 70%)
Várzea Grande
Primavera do Leste
Rondonópolis
Barra do Garças
Cáceres
Sinop
Tangará da Serra
Sorriso
3,00%
2,59%
2,59%
1,60%
2,96%
2,74%
2,62%
1,23%
37,20%
28,60%
19,40%
20,00%
18,90%
2,00%
0,00%
0,00%
Dimensão
temporal
(Máx.: 10%)
8,00%
2,15%
3,00%
1,80%
0,60%
0,00%
0,00%
0,00%
Usabilidade
(Máx.: 15%)
Total
(Máx.: 100%)
5,63%
8,00%
3,77%
2,20%
2,57%
1,00%
0,00%
0,00%
53,83%
41,34%
28,76%
25,60%
25,03%
5,74%
2,62%
1,23%
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
O Quadro 1 destaca dois resultados principais, o percentual da nota final máxima que
o município obteve – o que pode ser verificado na coluna “Total” – e a contribuição de cada
uma das categorias nesse total.
O município de Várzea Grande, por exemplo, atendeu a 53,83% dos requisitos da
pesquisa. É possível afirmar, desse modo, que dentre os 8 maiores municípios de Mato
Grosso – excetuando-se Cuiabá – o portal de Várzea Grande foi o mais bem avaliado no
levantamento. Esse mesmo portal também foi o melhor avaliado em três dos quesitos
utilizados: “apresentação”, “conteúdo” e “dimensão temporal”.
No quesito “usabilidade” o município de Primavera do Leste é o que apresenta uma
ferramenta eletrônica mais flexível. Nos demais quesitos o Portal Transparência de
Primavera do Leste também demonstrou um estágio avançado de implementação.
Os municípios de Rondonópolis, Barra do Garças e Cáceres têm portais que
apresentam um nível de atendimento aos quesitos da pesquisa variando entre 25% a 29%.
Isso pode significar que esses municípios vêm buscando implementar seus Portais
Transparência, mas que ainda se encontram em uma fase inicial desse processo.
Já os municípios de Sinop, Tangará da Serra e Sorriso, a julgar pelas informações
constantes em seus sites oficiais, não se encontram nem mesmo em uma fase inicial da
implementação dos seus Portais Transparência e do atendimento à transparência ativa de
que trata a Lei de Acesso à Informação.
A metodologia utilizada permitiu também uma análise mais genérica a respeito das
categorias definidas para a pesquisa. Foi possível verificar, por exemplo, se as maiores
dificuldades dos municípios concentraram-se na “apresentação” do Portal, na inclusão das
informações (Conteúdo), na atualização e na série histórica das informações (Dimensão
temporal), ou nas possibilidades de uso oferecidas ao cidadão (Usabilidade). O Quadro 2
apresenta um resumo da avaliação desses quesitos.
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Transparência, assistência e meio ambiente
QUADRO 2
Resumo Geral da Avaliação dos Portais das Prefeituras
CATEGORIA
Apresentação
TÓPICO AVALIADO
Na página principal da prefeitura
Nas páginas internas das secretarias
Na página principal do Portal
Conteúdo
Despesa
Receita
Licitação
Contrato
Convênio
Pessoal
Informações das secretarias
Dimensão temporal
Série Histórica
Atualização
Usabilidade
Interação com o usuário
Consultas
Download da Receita e da Despesa
%
48,33
87,50
23,88
53,19
22,52
30,06
27,92
37,78
17,50
12,25
17,22
4,69
19,44
21,36
17,08
19,31
18,50
14,42
25,00
Apresentação
Verifica-se que a categoria mais cumprida pelas prefeituras é a da “apresentação”.
Em média as administrações municipais cumprem 48,33% dos quesitos relacionados a essa
categoria. Isso significa que o usuário terá facilidade de encontrar os principais atalhos para
acessar as informações.
O atalho para os Portais Transparência e os atalhos para acessar as páginas internas
das secretarias estão bem visíveis nas páginas principais das prefeituras. Nesse aspecto
chega-se a cumprir em média 87,50% dos critérios estipulados pela pesquisa.
Uma vez no Portal Transparência o usuário também encontra de forma relativamente
fácil os principais títulos para a pesquisa: “Despesa”, “Receita”, “Licitação”, “Contrato”,
“Convênio” e “Pessoal”. Nesse tópico, o Portal Transparência atende a 53,19% dos
requisitos.
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
Na contramão desses resultados positivos, as páginas internas das secretarias
dificilmente apresentam títulos relacionados às informações obrigatórias, sobretudo aquelas
previstas no art. 8º da Lei Federal n.º 12.527/2011, como o “horário de atendimento”, as
“competências” e a “estrutura organizacional” das secretarias. Nesse aspecto as prefeituras
cumprem apenas 23,88% dos requisitos.
Conteúdo
No que se referem aos conteúdos disponibilizados pelas prefeituras constata-se um
baixo cumprimento das legislações. Apenas 22,52% das informações consideradas
necessárias foram encontradas nos Portais Transparência e nas páginas internas das
secretarias.
Em sua maioria as informações se referem à “Licitação”, com a disponibilização de
30,06% das informações obrigatórias, à “Despesa”, com 30,06% e à “Receita”, com 27,92%
das informações obrigatórias disponibilizadas.
Tratam-se justamente das áreas mais reguladas pelo ordenamento jurídico
brasileiro.13 Observe-se também que as informações relacionadas à receita e à despesa tem
lugar de destaque na LC n.º 131/2009, sendo as únicas que precisam constar em tempo real
nos meios eletrônicos.
A parte não contábil das informações relacionadas a contratos, convênios, pessoal e
as informações pontuais dos órgãos e entidades – sobretudo aquelas previstas no art. 8º da
Lei n.º 12.527/2011 – são reguladas num tempo mais recente e carecem de um corpo
profissional específico para avaliá-las.
Os órgãos de controle interno e externo parecem ter sido, historicamente, os
principais destinatários das informações publicadas pelos governos estaduais e municipais.
13
Cf. Lei n.º 8.666/1993, Lei n.º 9.755/1998 e Lei Complementar n.º 101/2000. Todas elas, ao determinarem
transparência aos dados públicos, centram-se nas informações relacionadas à execução orçamentária e
financeira.
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Transparência, assistência e meio ambiente
E, via de regra, esses órgãos de controle estão mais concentrados nos demonstrativos dos
fatos contábeis, negligenciando a avaliação da efetividade das políticas públicas.14
A Lei de Acesso à Informação inova justamente ao eleger o Controle Social como o
interlocutor privilegiado das informações públicas. Daí a necessidade de uma divulgação
mais ampliada e com linguagem adequada a esse novo público.
Considerações Finais
Ainda que aceitemos que poderiam ser obtidos outros resultados intermediários caso
alterássemos os pesos atribuídos a cada tipo de informação trazida pelos portais,
consideramos muito improvável não se chegar à conclusão de que os municípios de Várzea
Grande e Primavera do Leste encontram-se em um estágio avançado de implementação dos
seus portais; de que os municípios de Rondonópolis, Barra do Garças e Cáceres encontramse em estágio inicial de implementação de seus portais; e de que os municípios de Tangará
da Serra e Sorriso não apresentam iniciativas visíveis de implementação do Portal
Transparência.
Mostra-se bastante robusta, também, a evidência de que as informações voltadas ao
público em geral e ao controle social são pouco divulgadas se comparadas às informações
mais contábeis voltadas ao atendimento das demandas dos Tribunais de Contas e dos
Órgãos de Controle Interno.
Essa tendência se realça ainda mais diante de um cenário político e social que não
oferece ferramentas e instâncias mais concretas para a avaliação dos resultados das ações
governamentais. O outro lado dessa moeda é, precisamente, a ausência de dispositivos
punitivos vinculados à efetividade das políticas públicas, tais como os que existem no âmbito
do controle técnico-burocrático exercido pelas auditorias.
14
Exceção à regra são as iniciativas do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso que buscam disseminar
junto a seus jurisdicionados o modelo de gestão pública voltada para resultados.
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
É possível sugerir, ainda, um problema a ser respondido por outros estudos
congêneres: Em que medida as ferramentas eletrônicas disponíveis aos municípios
interferem na qualidade das informações disponibilizadas à sociedade?
No decorrer desta pesquisa fomos levados a crer que se fossem instituídos nos
municípios mato-grossenses sistemas padronizados e integrados – de execução
orçamentária, de controle de licitações, de gestão de contratos, de portal transparência –
teríamos um avanço significativo no nível inicial da transparência pública.
Isso significa que para disponibilizar informações à sociedade é preciso que, antes,
estas informações estejam disponíveis ao próprio governo municipal. Devido à ausência de
procedimentos internos eficazes para a gestão da informação muitos prefeitos enfrentam
grandes dificuldades de acesso a dados e a informações qualificadas.
Referências bibliográficas
AKUTSU, Luiz. PINHO, José Antonio Gomes de. Sociedade da informação, accountability e
democracia delegativa: investigação em portais de governo no Brasil. Revista de
Administração Pública. Rio de Janeiro 36(5):723-45, Set./Out. 2002.
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Porto Alegre, UFRGS, n. 26, p. 204-222, jul. 2012.
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos; tradução de Carlos Nelson Coutinho; apresentação de
Celso Lafer. – Nova ed. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
FONTANA, Josep. História: Análise do passado e projeto social. Bauru, SP: Edusc, 1998.
FREY, Klaus. Governança eletrônica: experiências de cidades europeias e algumas lições para
países em desenvolvimento. Revista de Informática Pública, Belo Horizonte, ano 3, n. 1, p.
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Disponível em: www.ameppp.org.br
Transparência, assistência e meio ambiente
LYOTARD, J. F. A condição pós-moderna. Trad. Ricardo Corrêa Barbosa. 6a ed. Rio de Janeiro:
José Olympio, 2000.
MATURANA, R. Humberto. Cognição, ciência e vida cotidiana. Organização e tradução:
Cristina Magro, Victor Paredes. - Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001.
MEZZAROBA, Orides. ROVER, Aires José. Democracia Digital e Governo Eletrônico.
Florianópolis: Conceito Editorial, 2012.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. O contrato social ou princípio do direito político. 2 ed. Trad. Ciro
Mioranza. São Paulo: Editora Escala, 2008.
Disponível em: www.ameppp.org.br
23
DIREITO À INFORMAÇÃO E ACESSO ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS: UM ATO DE CIDADANIA DOS
UNIVERSITÁRIOS
Cleia Simone Ferreira1
Everton Neves dos Santos2
João Baptista Ventura Junior3
RESUMO
O objetivo geral deste artigo foi identificar se os acadêmicos do 5º
Semestre de Direito de uma instituição particular de RondonópolisMT conhecem e acessam o Portal de Transparência do Município.
Com o propósito de alcançar o objetivo traçado foi desenvolvida uma
pesquisa exploratório-descritiva. O estudo observou falhas no Portal
de Transparência de Rondonópolis-MT quanto às atualizações das
informações, bem como, o desinteresse de uma grande parcela de
acadêmicos em conhecer as Políticas Públicas efetivadas pelos
gestores públicos municipais.
Palavras-chave: Transparência. Gestão Pública. Direito à Informação.
1
Aluna especial no Mestrado em Educação da UFMT. Pós-graduada em Direito Público. Pós-graduanda em Didática do
Ensino Superior e em Gestão Pública Municipal. Coordenadora do Núcleo de Prática Jurídica da UNIC, professora
universitária e advogada em Mato Grosso. E-mail: [email protected].
2
Aluno especial no Mestrado em Política Social da UFMT e Educação-IFG. Especialista em Direito Público Material,
em Didática e Metodologia do Ensino Superior e em Tecnologia Contemporânea e Novas Práticas Educacionais.
Graduado em Direito e em Licenciatura em Matemática. Técnico do Ministério Público de Mato Grosso e Professor
Universitário. E-mail: [email protected].
3
Especialista em Educação Matemática e em Didática e Metodologia do Ensino Superior pela IBPEX. Bacharel em
Economia. Professor em Cuiabá. E-mail: [email protected].
26
REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
Introdução
O presente artigo se propôs a discutir a importância do Portal de Transparência para que a
sociedade tenha conhecimento das ações do poder público, com ênfase para as políticas públicas
realizadas em benefício de todos, na construção de um mundo mais digno e justo.
O acesso ao Portal de Transparência traz a lume o exercício do direito de cidadãos
garantido pela Constituição Federal brasileira, que previu a partir da Lei Orgânica de Assistência
Social e regulamentação o direito de todos terem acesso ao direcionamento dos recursos públicos
conhecendo as ações efetivas dos gestores do poder público.
O estudo enfatizou também a consciência dos acadêmicos do Curso de Direito de uma
universidade particular de Rondonópolis-MT, especificamente do 5º semestre matutino, sobre o
exercício de sua cidadania no acesso ao Portal de Transparência de Rondonópolis-MT e o
acompanhamento das políticas públicas efetivadas.
Identificou-se, ainda, que a disponibilidade de informações quanto às políticas públicas
efetivadas pelo poder público municipal é elemento fortalecedor da democracia, porém, esta é
consolidada quando pela participação da sociedade acessando o portal e tendo maior controle
sobre as ações executadas pelo poder público.
Segundo Canela e Nascimento (2009, p.10) é dever do Estado salvaguardar os direitos dos
cidadãos em relação às informações acerca das ações da gestão pública ao “institucionalizar
instrumentos para o acesso a informações é a forma encontrada pelas democracias para impedir
que os ‘porteiros da informação’, em um claro abuso de poder, desrespeitem um direito
fundamental de todos os indivíduos [...]”.
Para tanto, foi desenvolvida uma pesquisa exploratório-descritiva, com a coleta de
informações a partir de um questionário e análise quali-quantitativa.
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Transparência, assistência e meio ambiente
Direito à informação e acesso às políticas públicas
Quando se discute enfaticamente o direito à informação em todo o Brasil e especialmente
no meio acadêmico, tem-se o entendimento de que tais discursos são originados na consciência
moderna de todos os cidadãos. No entanto, Herkenhoff e Rabelo (2011, p.80) apontam que a
relação entre comunicação e democracia não é elemento atual, pois desde a década de 1980
envolve o interesse em todo o mundo, sendo que: “Em 1980, a Organização das Nações Unidas
para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) lançou o documento “Um mundo e muitas vozes –
comunicação e informação na nossa época”. [...]”.
Conforme esclarecem Herkenhoff e Rabelo (2011) um dos motivos que gerou o uso dos
meios de comunicação para que os gestores e órgãos públicos construíssem um elo com a
sociedade civil foi o desenvolvimento das tecnologias da informação na década de 1980 e, ainda, a
abertura democrática em todo o mundo, em que o povo clamava por transparência. Assim,
surgiram organizações que passavam a reivindicar o direito de saber como os recursos públicos
eram aplicados e, no Brasil, tal direito foi fortalecido pela Constituição de 1988.
O direito à informação constitui na interpretação de Correia (2000) como um instrumento
que capacita à sociedade civil a interferir na gestão pública, especialmente, no que se refere às
Políticas Públicas. Todavia, para o autor este quadro de controle social a partir da informação
somente pode alcançar os objetivos traçados de transparência quando o gestor público assim
como a sociedade civil busca utilizar de forma cidadã os recursos de comunicação e informação.
As discussões acerca da importância da transparência das ações de gestão do poder
público gera o interesse em compreender e conhecer as Políticas Públicas, sendo que no Brasil
estas ganharam maior notoriedade, segundo Setubal (2012), somente na última década, sendo
que não se concebe mais a gestão pública sem políticas para a educação, saúde, cultura, esporte,
justiça e assistência social.
Salienta ainda Setubal (2012) que a transparência das Políticas Públicas pode tornar mais
participativos os cidadãos, porém não é garantia de que efetivamente alcancem os objetivos
traçados. No entanto, cabe à gestão pública buscar de todas as formas a construção de uma
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
sociedade mais digna e justa, alicerçada no desempenho positivo do poder público a partir da
efetivação de Políticas Públicas e da participação da sociedade civil em sua formulação e
implementação.
Para Mendel (2009) discutir temas relacionados com o direito à informação ou o direito da
sociedade civil, dos acadêmicos, da mídia e até mesmo dos governos saberem o que vem sendo
desenvolvido pela gestão pública, é um processo que fortalece a democracia e emerge como um
instrumento de conscientização da população quanto ao desempenho e efetividade de sua
cidadania.
Traçando um histórico do direito à informação Mendel (2009) esclarece que enquanto no
ano de 1990 somente 13 países haviam adotado leis nacionais de transparência com o direito à
informação, uma década mais tarde, em 2009, já eram 70 países em nível global que
oportunizavam aos seus cidadãos este acesso. Ressalta-se ainda que órgãos mundiais como
grandes instituições financeiras internacionais adotaram políticas de divulgação de suas
atividades, oportunizando a sociedade conhecer as ações executadas e o trabalho de resgate da
responsabilidade social ou socioambiental.
Para Michener (2011), embora nas últimas duas décadas tenha crescido o número de
empresas e governos que numa ação democrática fazem da informação de suas ações uma forma
de comunicação com a sociedade, esta transparência das políticas públicas ainda é limitada, pois
não basta apenas que o governo disponibilize as informações, mas também que a sociedade tenha
interesse em acessá-las e divulgá-las. Entende-se ainda que as leis de acesso às informações
também enfrentam problemas, seja pela fragilidade dos meios de comunicação para a
imparcialidade, seja pela falta de consciência cidadã.
Para a ocorrência desta abertura de transparência, foi assim, necessário que ocorresse um
processo de evolução nas leis, sendo que estas se fundamentam nos seguintes princípios:
LIDERANÇA: a vantagem mais importante é a liderança política, o que pode
elevar o status da liberdade de informação como uma prioridade entre os
servidores públicos e cidadãos e que garante os recursos necessários para
sustentar legislações de acesso efetivas.
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Transparência, assistência e meio ambiente
USO AMPLO DO DIREITO: socializando-se o direito de acesso a informações
governamentais aumentando o uso de leis de liberdade de informação
elevará as expectativas para a abertura exigindo uma maior atenção por
parte dos líderes (MICHENER, 2011, p.9).
Verifica-se, portanto, que a transparência das ações do poder público é elemento
construtor de uma sociedade diferente, em que a responsabilidade social parte não apenas da
elaboração de Políticas Públicas, mas da liderança política e direito de desenvolver a cidadania de
toda a sociedade civil.
Esta transparência das ações do poder público, segundo Canela e Nascimento (2011),
somente alcança os objetivos traçados a partir do aprofundamento das relações de confiança de
confiança entre poder público e a sociedade civil, e a confiança nos mecanismos institucionais de
controle e acesso às informações por todas as pessoas, de forma ampla e irrestrita. Apontam
ainda que:
Sempre que necessário, devem ser, também, tomadas providências para
garantir a certos grupos específicos efetiva acessibilidade às informações,
como, por exemplo, as pessoas que não sabem ler nem escrever, as que
não falam a língua usada nos documentos ou as que portam alguma
restrição física, como aqueles com deficiência visual. Deve ser estipulado
que todos os organismos públicos utilizem sistemas internos abertos e
acessíveis para garantir o direito do cidadão à informação (CANELA;
NASCIMENTO, 2011, p.24).
Existe a necessidade de que este Portal de Transparência seja acessível a todas as pessoas
e, quando isto não for possível, é pertinente que outras formas de acesso à informação sejam
disponibilizadas para a população em uma clara demonstração de que a democracia tem como o
principal elemento a clareza de ações.
Para Gruman (2012), a lei de acesso à informação no Brasil está alicerçada no artigo 5º da
Constituição Federal de 1988 que, em seu inciso XXXIII, preceitua o direito de todo cidadão
brasileiro de ter conhecimento acerca dos órgãos públicos e de interesse geral ou coletivo, “que
serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja
imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”, bem como o artigo 37, o qual preleciona
que “toda a administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
União, do Estado, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá ao princípio da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
Sobre o acesso à informação no Brasil, tem-se que, em maio de 2012, entrou em vigor a Lei
n. 12.527/2011, denominada Lei de Acesso à Informação, que se embasou nos princípios da
publicidade e da transparência da prática de todos os atos da Administração Pública, na totalidade
dos níveis da Federação, regulamentando assim, o art. 5º da Constituição Federal, especificamente
o inciso XXXIII. Segundo Gomes e Siqueira (2013), além de tratar o art. 37, §3º, II, a referida Lei
traz a lume o art. 216, §2º (que determina à Administração Pública franquear a consulta à
documentação governamental a quem possa interessar, na forma da lei).
De acordo com o entendimento de Gomes e Siqueira (2013), a Lei n. 12.527/2011, é em
sua essência um instrumento que buscou colaborar para que a gestão pública seja transparente,
regulamentando os dispositivos constitucionais que garantem a todo e qualquer cidadão brasileiro
o exercício de seu direito de informação e conhecimento das ações públicas.
O Estado de Mato Grosso, a exemplo da União, vem trabalhando para tornar acessível a
todos os cidadãos o seu direito à informação. Neste sentido, o Tribunal de Contas do Estado de
Mato Grosso aprovou a Resolução nº 25/2012 do Tribunal Pleno, aprovando a “Guia para
Implementação da Lei de Acesso à Informação e Criação das Ouvidorias dos Municípios”, de modo
a garantir o acesso amplo a todos os cidadãos mato-grossenses a usufruir de seu direito à
informação.
Esta Resolução nº 25/2012-TP agrega a importância do exercício de cidadania e do controle
social que pode ser realizado por toda a sociedade civil, buscando, assim, a construção de uma
sociedade mais justa e transparente, em que o poder público possa trabalhar sob o “olhar” e
controle de todo o cidadão.
Metodologia do estudo
A base do presente artigo foram duas pesquisas uma exploratória e outra descritiva, sendo
a primeira somente com base em dados teóricos e a segunda com base em estudo prático, tendo
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como público alvo da pesquisa os acadêmicos do Curso de Direito do 5º Semestre Matutino de
uma instituição de ensino superior de Rondonópolis-MT.
Na interpretação de Severino (2007) a pesquisa bibliográfica fundamenta o conhecimento
teórico dos pesquisadores e permite o aprofundamento sobre o tema abordado, enfatizando os
principais aspectos que envolvem a pesquisa. No caso específico deste estudo o direito à
informação de toda a sociedade e a importância do Portal de Transparência para efetividade da
cidadania.
Sobre a pesquisa descritiva, esta de acordo com Gil (2002), é uma forma de conhecer
profundamente um objeto ou público, sendo que neste artigo foram realizadas análises que
permitiram avaliar o interesse dos acadêmicos de Direito da instituição de ensino superior em
relação ao direito de informação a partir do Portal de Transparência municipal e o seu exercício de
cidadania.
Neste sentido, o público alvo foi composto por 42 (quarenta e dois) acadêmicos do Curso
de Direito do 5º Semestre Matutino de uma instituição de ensino superior de Rondonópolis-MT,
sendo que o público participante foi 35 (trinta e cinco) acadêmicos que responderam a um
questionário, que continha 5 (cinco) questões fechadas e foram aplicados pelos pesquisadores,
significando a adesão de 83,33% da população do estudo.
Depois de coletados os dados os mesmos foram tabulados e realizado o estudo de caso
que, de acordo com Yin (2005), é um dos principais métodos de estudo para o conhecimento
amplo do objeto analisado, sendo que a apresentação das informações foi realizada a partir da
representação gráfica e da análise quali-quantitativa.
De acordo com Vergara (2005, p.59), o uso de uma pesquisa quali-quantitativa permite o
aprofundamento do estudo, isso porque “é possível tratar os dados quantitativa e
qualitativamente no mesmo estudo. Por exemplo, pode-se usar estatística descritiva para apoiar
uma interpretação dita subjetiva ou para desencadeá-la”.
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Resultados e discussões
A importância do direito à informação para a perpetuação da democracia foi um tema
discutido neste estudo, partindo do princípio que os acadêmicos de Direito necessitam ter
consciência do exercício do direito da cidadania e, ao mesmo tempo, das ações do poder público
quanto às Políticas Públicas executadas. Segundo apontou Correia (2000) o exercício da cidadania
não apenas permite a sociedade civil conhecer as ações do poder público como fazer um trabalho
de controle e participação.
Ao iniciar a exposição dos dados da pesquisa descritiva, tem-se que a primeira questão
levantou se os acadêmicos do Curso de Direito do 5º Semestre Matutino de uma instituição de
ensino superior de Rondonópolis-MT tinham conhecimento do Portal de Transparência do
Município de Rondonópolis-MT, cujas respostas podem ser verificadas no Gráfico 1.
GRÁFICO 1
Conhecimento do Portal de Transparência do Município de Rondonópolis - MT
60%
57,1%
50%
Não
37,2%
Sim, porém não tenho o
hábito de acessar
40%
30%
20%
10%
5,7%
Sim, inclusive acesso
para conhecer as
Políticas Públicas
efetivadas
0%
Fonte: Pesquisa (2013)
Observa-se no Gráfico 1 que, dentre os acadêmicos participantes do estudo, somente 5,7%
tinham conhecimento e acessavam a ferramenta do Portal de Transparência, exercendo assim seu
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direito de cidadão à informação quanto às ações da gestão pública para identificação e controle
das aplicações das verbas públicas. Já 37,5% dos entrevistados apontaram conhecer, mas não
terem o hábito de acessar.
Do grupo de pesquisados, 57,1% dos acadêmicos responderam não acessar o portal sendo,
portanto, um fator relevante que a maioria desconheça os instrumentos da democracia para
conhecer as Políticas Públicas desenvolvidas.
Embora, desde 2006 já existissem municípios em todo o Brasil com esse portal da
transparência com acesso a população, Rondonópolis-MT somente iniciou atividades a partir de 1º
de março de 2013, conforme projeto 01/2013 do vereador Thiago Alexandre Rodrigues da Silva
(PMDB).
No entendimento de Mendel (2009), a democracia somente é fortalecida quando os
cidadãos exercem o seu direito à informação, desta forma, quando os próprios acadêmicos do
Curso de Direito não utilizam este instrumento fica evidente a fragilidade desse Portal como
ferramenta da democracia.
As temáticas do “exercício da cidadania”, do “controle social” e da “ necessidade de
transparência” vêm sendo discutidas com maior ênfase nos primeiros dias do mês de junho de
2013, quando se iniciou um processo de clamor social com a execução de protestos, muitos dos
quais de forma violenta, em que os cidadãos brasileiros não mais querem ser subjugados pela falta
de informação das ações da Gestão Pública.
Assim, nota-se que apesar do Direito estar entrelaçado em muitos ramos com a política e
esta ser de total importância para a convivência da população, os acadêmicos, enquanto cidadãos
desconhecem as ferramentas que podem ser utilizadas no dia-a-dia para o acompanhamento da
Administração Pública e o fortalecimento da democracia.
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GRÁFICO 2
Exercício do direito de acesso à informação acessando o
Portal de Transparência do Município de Rondonópolis - MT
80%
71,5%
Não
70%
60%
50%
40%
Sim, esporadicamente
28,5%
30%
20%
10%
Sim, sempre
0,0%
0%
Fonte: Pesquisa (2013)
Dos entrevistados do Curso de Direito apenas 28,5% afirmou que exerce seu direito de
acesso a informação por meio do Portal de Transparência do Município de Rondonópolis-MT,
sendo que 71,5% não exercem este direito que possuem para saber mais a respeito do
direcionamento dos recursos públicos.
Nota-se claramente não apenas uma falta de interesse, como também de conhecimento
tanto desta ferramenta de informação geradora de democracia, quanto dos direitos de cidadãos
em controlar as ações dos gestores públicos pela construção de uma sociedade mais digna e justa.
A falta de interesse da sociedade civil em relação às atividades públicas, segundo Mendel
(2009), é um fato histórico, sendo que em 1990 somente 13 países em todo o mundo
disponibilizavam tais informações, seja pelo desinteresse dos próprios gestores públicos em
compartilhar suas ações com a sociedade, seja pela falta de sentimento de cidadania e respeito à
democracia pelos cidadãos.
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A terceira questão levantou se os pesquisados tinham conhecimento sobre o Portal de
Transparência do Município, considerando sua importância na formação acadêmica:
GRÁFICO 3
Tem conhecimento acerca do Portal de Transparência do Município de Rondonópolis – MT e sua
importância para a formação acadêmica
60%
51,4%
Muito importante
50%
Importante
40%
Pouco Importante
30%
20%
10%
20,0%
14,2%
11,5%
2,9%
Sem importância
Não respondeu
0%
Fonte: Pesquisa (2013)
Dentre os 42,9% que afirmaram nas questões anteriores conhecerem o Portal de
Transparência e o acessarem sempre ou esporadicamente, destes 51,4% consideram importante
para sua formação na área do Direito esta ferramenta que gera conhecimento, já 20% consideram
muito importante ao seu desenvolvimento enquanto 11,5% consideram pouco importante e
14,2% preferiram não responder a esta questão sendo que somente 2,9% declararam sem
importância.
Caso se observe os pesquisados que possuem conhecimento acerca do Portal de
Transparência, nota-se um elevado grau de importância chegando a 71,4% a consciência do valor
de tais dados para a sociedade no exercício de sua cidadania e fortalecimento da democracia.
Porém, segundo Michener (2011), embora venha crescendo o interesse da sociedade civil em
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relação ao direcionamento dos recursos em Políticas Públicas, ainda é preciso mais engajamento
nesta longa caminhada rumo a uma democracia livre e cidadã.
É importante ainda reiterar que o Portal de Transparência de Rondonópolis-MT está em
funcionamento desde 1º de março de 2013, não tendo seu funcionamento amplamente divulgado
pelos órgãos do poder público municipal, o que gera limitação da sociedade civil, quanto ao
conhecimento e importância em seu acesso.
GRÁFICO 4
Tem o hábito de indicar aos seus colegas o Portal de Transparência para que eles também possam
ficar informados
74,3%
80%
Não respondeu
70%
60%
Não
50%
40%
Sim, esporadicamente
30%
20%
8,5%
11,5%
5,7%
Sim, sempre
10%
0%
Fonte: Pesquisa (2013)
A ferramenta de disponibilização da informação é útil não apenas aos acadêmicos, mas a
toda população, visando divulgar o conhecimento sobre as ações da gestão pública municipal.
Porém, além de acessar, é preciso que os cidadãos divulguem este instrumento democrático. Não
obstante, o levantamento realizado evidenciou que dentre os acadêmicos pesquisados 5,7%
relataram divulgar sempre, enquanto 11,5% afirmaram contar esporadicamente aos colegas sobre
o que leem no portal divulgando este instrumento.
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Grande parcela dos entrevistados, 74,3%, negou realizar qualquer divulgação do Portal,
sendo um dos principais motivos para o baixo índice de acadêmicos de Direito fazendo uso do seu
direito à informação.
Nota-se, com estes resultados, que apesar da parcela relevante de 62,9% (Gráfico 3)
considerar importante para a formação acadêmica o conhecimento acerca do portal, pouco é feito
para divulgar a ferramenta que poderia ser útil para um número maior de acadêmicos no exercício
de sua cidadania. Para Michener (2011), o exercício do direito à informação das ações públicas
somente ocorre quando os gestores públicos, assim como a própria sociedade, se comprometem
com uma postura de controle e fiscalização, sendo o Portal de Transparência uma ferramenta de
largo e consciente uso.
Por fim, a última questão identificou a opinião dos acadêmicos sobre a importância em
conhecer as Políticas Públicas de seu município com o seguinte entendimento:
GRÁFICO 5
Importância em conhecer as Políticas Públicas de seu Município na formação cidadã
70%
62,8%
Muito importante
60%
Importante
50%
40%
Pouco Importante
28,5%
30%
20%
10%
Sem importância
2,9%
2,9%
2,9%
Não respondeu
0%
Fonte: Pesquisa (2013)
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O Gráfico 5 aponta que 62,8% dos pesquisados tem consciência que é importante para o
seu curso de graduação conhecer as Políticas Públicas de transparência e reconhecê-las enquanto
possibilitadoras de uma formação cidadã, 28,5% afirmou ser apenas importante, o que gerou uma
análise de 91,3% de acadêmicos conscientes da importância em ter conhecimento sobre as
Políticas Públicas desenvolvidas, sendo que um dos entrevistados ainda escreveu em seu
formulário: “enfatizo a importância das políticas públicas na área da educação”.
Nas três últimas respostas verificou-se uma coincidência de percentuais. Isso porque 2,9%
dos acadêmicos afirmaram que “conhecer as Políticas Públicas de Rondonópolis tem pouca
importância”; outros 2,9% apontaram não ter importância alguma e, um último grupo de
acadêmicos, representando também 2,9%, preferiram omitir sua opinião sobre essa tópico. Sendo
assim, fica claro, que apesar da ideia de que a ferramenta é muito importante ainda é pouco usada
tanto na esfera acadêmica, quanto na sociedade civil, fator que pode ser consequência da falta de
compreensão acerca de que uma verdadeira democracia se faz com a participação ativa da
sociedade.
Conclusão
O direito à informação a partir do acesso a portais de transparência é uma ferramenta que
efetivamente agiganta a democracia e o Brasil, embora tenha apresentado na Constituição Federal
de 1998 esse elemento, somente em 2006 foi iniciado um processo de transparência nas gestões
municipais, estaduais e da União.
Considerou-se que os portais de transparência permitem que os indivíduos conheçam e
participem do processo democrático. Todavia é preciso que haja interesse em conhecer as
políticas e as ações da gestão pública, na intenção de controlar o uso dos recursos públicos, o que
vem ocorrendo em Rondonópolis com o acesso ao Portal de Transparência, porém, constata-se a
necessidade de maior divulgação por parte tanto da administração municipal quanto dos próprios
cidadãos.
Observou-se, ainda, que durante o desenvolvimento desta pesquisa os acadêmicos
pesquisados demonstraram maior interesse em conhecer o Portal de Transparência de
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Rondonópolis-MT. Não obstante, assistimos a manifestações em sala de aula quanto à falta de
atualização do portal e a dificuldade em acessar devido às instabilidades do link, o que gera
desinteresse em seu acesso e no exercício efetivo da cidadania.
Referências bibliográficas
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públicas. Brasília-DF: ANDI, Artigo 19, 2009.
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GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
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GRUMAN, Marcelo. Lei de acesso à informação: notas e um breve exemplo. Revista Debates. Porto
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MENDEL, Toby. Liberdade de informação: um estudo de direito comparado. 2. ed. Brasília:
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Possíveis Soluções. In: Leis de Acesso à Informação: dilemas da implementação. Estudos em
Liberdade em Informação. Julho 2011.
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SEVERINO, Antonio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. Rev. de acordo com a
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VERGARA Sylvia Constant. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 6. ed. São Paulo:
Atlas, 2005.
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.
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ASSISTÊNCIA SOCIAL, GESTÃO DO TRABALHO E OS IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO
PRODUTIVA: DINÂMICA, CONTRADIÇÕES E DESAFIOS NA IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS
EM MATO GROSSO
Anne Grace Gomes1
Izabel Cristina Dias Lira2
Janaina Carvalho Barros3
Janaina Loeffler de Almeida4
RESUMO
O presente artigo visa discutir os rebatimentos do modelo de
gestão do trabalho flexível na Assistência Social, abordando os
principais desdobramentos para a materialização da Política, as
contradições entre o modelo preconizado pelo Sistema Único
de Assistência Social/SUAS e a forma como vem sendo
implementada, sobretudo, em Mato Grosso. Neste sentido, o
texto discorre sobre a forma como as transformações no
mundo do trabalho vêm impactando a gestão do trabalho no
espaço público, em especial no SUAS, e os rebatimentos
decorrentes desse processo para a operacionalização da
Política de Assistência Social, uma vez que tais mudanças
acirraram as condições de precarização e desregulamentação
do trabalho, impactando também na esfera pública.
Palavras-chave: Reestruturação produtiva, gestão do trabalho
no SUAS, política de Assistência Social.
1 Mestre em Serviço Social e Política Social pela UEL/PR. Professora da UFMT e pesquisadora do Grupo
Trabalho e Sociabilidade.
2 Doutora em Serviço Social pela PUC/SP. Professora da UFMT e pesquisadora do Grupo Trabalho e
Sociabilidade.
3 Doutora em Serviço Social e Política Social pela UFRJ/RJ. Professora da UFMT e pesquisadora do Grupo
Trabalho e Sociabilidade. Coordenadora do Curso de Serviço Social da UFMT. E-mail: [email protected].
4 Mestre em Serviço Social e Direitos Humanos pela UFSC/SC. Professora da UFMT e pesquisadora do Grupo
Trabalho e Sociabilidade. Vice-presidente da ABEPSS/Centro-Oeste (Gestão: 2013/2014). E-mail:
[email protected].
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
Notas introdutórias
A reestruturação produtiva e suas repercussões sobre as condições de vida e de
trabalho, no final do século XX e início do XXI, têm provocado alterações bruscas, do ponto
de vista do processo de desproteção social, na sociedade, principalmente no que diz respeito
aos trabalhadores e as políticas sociais que procuram promover redistribuição de renda
direcionada ao atenuamento das desigualdades geradas pelo capitalismo.
As mudanças processadas na gestão estatal da força de trabalho, o posicionamento
do Estado quanto ao uso, remuneração e reprodução da força de trabalho
contemporaneamente, demonstram que a relação entre Estado e capital, necessária e
primordial à continuidade e existência do segundo, vem passando por alterações nas últimas
décadas.
Nesta direção, este artigo tem como finalidade discutir sobre a forma como as
transformações no mundo do trabalho vêm impactando na gestão do trabalho no espaço
público, em especial no Sistema Único de Assistência Social/SUAS. Também pretende
problematizar as consequências decorrentes desse processo para a operacionalização da
política de Assistência Social, fazendo o recorte para o estado de Mato Grosso.
Para tanto, se faz necessário compreender as bases em que tem se operacionalizado
a gestão do trabalho no SUAS, com atenção especial ao estado de Mato Grosso. Elementos
como o trabalho intensificado, flexibilizado e precarizado, colocam-se como limites à
execução do SUAS, assim como previsto no seu modelo.
Esta conjuntura tem íntima relação com o cenário das transformações no mundo do
trabalho e no Estado, incidindo sobre as políticas sociais e a gestão do trabalho, que passam
a se desenvolver sob a égide do projeto neoliberal e de uma nova etapa no padrão de
acumulação capitalista.
Estado, Neoliberalismo e Modelo de Gestão Gerencial
O processo de reestruturação capitalista tem como características de organização da
produção e do trabalho, entre outras, o enxugamento da estrutura da produção; a
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Transparência, assistência e meio ambiente
diminuição do número de trabalhadores com a respectiva ampliação de atribuições
(polivalência) e a terceirização da força de trabalho (subcontratação). Assistimos à dinâmica
de um mercado marcado pelo crescimento da flexibilização, da intensificação e da
precarização do trabalho, mecanismos estes que têm se mostrado eficientes para garantir a
reprodução ampliada do capital e que se constituem em formas de exploração e dominação
dos trabalhadores.
Essas características internacionalizadas e disseminadas através do processo de
mundialização do capital impõem formas e relações de trabalho, sociais, econômicas e
modos de vida que estabelecem condições e parâmetros, que de acordo com a organização
dos trabalhadores e da sociedade em determinadas condições sócio-históricas, redesenham
as relações políticas entre capital, Estado e sociedade.
Atualmente o que se constata é que uma das maiores consequências dessa
mundialização é o crescimento da desigualdade social, com a ênfase na construção de
relações sociais desumanizadas e alienadas, que viabiliza a exploração, dominação do modo
de ser imposto pelo capitalismo.
A reforma do Estado brasileiro aparece nos anos de 1990 como um pressuposto
ideológico que parte da referência da crise localizada no inchaço da máquina estatal e de seu
déficit. O discurso da reforma5 teve como fundamento a herança de uma crise acumulada,
que se intensificou no período da ditadura, período no qual a vigência de gestão era pautada
pelo modelo burocrático. Deste modo, como assinala Bresser Pereira (1999), a conjuntura de
crise da década de 1990 foi produto direto do déficit fiscal, do endividamento externo e de
uma gestão populista, ou seja, na medida em que se centralizava na figura do Estado
responsabilidades de gestão social e de mercado, também se criava as condições objetivas
de falência da instituição.
No Brasil, a luta pela redemocratização, e com ela as tentativas de construção e
ampliação dos direitos sociais, se viram impactadas pelo reordenamento do capital mundial.
Deste modo, o discurso da reforma não se referiu só a reestruturação de um Estado falido,
5
Sobre o assunto ver Behring (2003) e Nogueira (1998).
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mas também à adequação aos ditames internacionais para fortalecimento do capital
produtivo e financeiro e do neoliberalismo. Equivale dizer que o processo de reforma do
Estado tem relação íntima com a reestruturação capitalista, e com ela a reorganização no
sentido de adequar e atender as necessidades que são colocadas por esta nova ordem.
O Estado em um contexto neoliberal tem como características a privatização,
focalização das políticas e absorção da gestão gerencial da esfera privada. Essa transferência
da lógica privada para o espaço público terá como consequência o privilegiamento da
eficiência e da produtividade de acordo com a racionalidade privada, na qual a atenção do
Estado deve se voltar para os segmentos populacionais que não tem condições de acessar os
bens e serviços que atenderão suas necessidades via mercado. Isto significa repassar ao
mercado, os serviços que anteriormente eram ofertados por esse Estado (saúde, educação,
segurança, etc) – É o que podemos chamar de desresponsabilização do Estado.
Acompanham essas mudanças da Contrarreforma do Estado a discussão sobre a
ênfase da instrumentalidade nas práticas institucionais de gestão, desde a década de 1990,
nas quais passa a ser priorizada a dimensão técnica no lugar da dimensão política (processo
de despolitização das práticas sociais). “Os direitos sociais passam a ser abordados
tecnicamente, dependendo mais da adequada aferição da realidade, mediante delimitação
dos focos essenciais de atenção pública, do que de projeto político de enfrentamento das
desigualdades sociais e da exploração capitalista” (BARBOSA, 2004 p.53).
Nesse caminho indica-se a “urgência de dotar a gestão da seguridade de maior
eficiência e competitividade” (BARBOSA, 2004 p.53), e para isto restringe-se a
responsabilidade do Estado no que se refere à proteção social, a ponto de submetê-la a
descentralização, focalização e privatização.
Para a consolidação dessas mudanças, o modelo gerencial vem sendo utilizado como
principal referencial orientador da gestão na administração pública, tendo como objetivo a
flexibilização administrativa. O modelo gerencial (NOGUEIRA, 1998) toma como eixo
estruturador os mecanismos de mercado. Significa que se trata de uma estratégia para
formatar a administração pública em termos mais “empresariais”, alterando concepções
dentro da esfera pública, como exemplos, a introdução da ideia de “cliente” e
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Transparência, assistência e meio ambiente
contratualismo, principalmente no que se refere à diminuição do Staff de empregados
diretos pelo Estado, reforçando a discussão em torno do fim da estabilidade dos servidores
públicos, entre outros.
O gerencialismo, enquanto modelo, referenda a discussão dos teóricos da reforma no
que se refere a redução do funcionalismo público6. O principal argumento refere-se aos
privilégios dos funcionários e os elevados custos na manutenção dos mesmos pelo Estado.
Neste sentido, a defesa dos teóricos da reforma foi no sentido de promover o fim da
estabilidade dos funcionários públicos e, no seu lugar, utilizar como modalidade, os
contratos de trabalho diversificados.
Esta concepção de gestão de trabalho no Estado caracteriza a flexibilização e
desregulamentação experimentada no mundo do trabalho com o processo de
reestruturação produtiva, refletindo a relação da precarização do trabalho neste contexto.
Embora o Estado não tenha obtido êxito no que se refere a extinção da estabilidade
funcional, conseguiu ampliar os contratos rotativos e temporários, fragmentando e
fragilizando a gestão do trabalho nos serviços públicos, ao mesmo tempo em que facilitava,
de forma indiscriminada, o desmonte das garantias trabalhistas contidas na CLT –
Consolidação das Leis Trabalhistas.
Neste sentido, percebe-se que há uma profunda relação entre as transformações
ocorridas no mundo do trabalho e os fundamentos orientadores da reforma do Estado
brasileiro. Sinaliza não só o papel do Estado em garantir as condições objetivas para
consolidação das mudanças necessárias ao reordenamento do capital, mas na própria
absorção, pela administração pública, dos processos de flexibilização, e terceirização do
trabalho.
A gestão do trabalho flexível tem variados impactos. Por um lado enfraquece e
desmobiliza o funcionalismo público, na medida em que aumenta os contratos temporários
e os cargos de comissão, em detrimento da realização de concursos públicos para efetivação
dos funcionários. De outro lado, compromete a gestão das políticas públicas, visto que a
6
A questão é mais aprofundada pelo principal teórico defensor da reforma do Estado brasileiro, Bresser Pereira
(1999).
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
rotatividade de profissionais descaracteriza a continuidade das ações, assim como a garantia
de qualidade das mesmas, já que a fluidez nos serviços demanda novos aprendizados e
reorganizações, que interferem diretamente na operacionalização das políticas, bem como
no acesso e permanência dos sujeitos às mesmas.
Para compreender melhor a repercussão dessas mudanças na gestão do trabalho no
SUAS é preciso conhecer como o sistema foi pensado e implantado, bem como a estrutura
que propõe para a operacionalização da Política de Assistência Social. E é sobre a esta
Política e o SUAS que passaremos a tratar no próximo item.
A Política Nacional de Assistência Social e o Sistema Único de Assistência Social.
A Política Nacional de Assistência Social de 2004 surge como forma de resistência
frente à restrição de direitos sociais respaldada pelo ideário neoliberal. Esta política indica as
diretrizes para efetivação da Política Nacional, entendida enquanto direito e
responsabilidade do Estado, pautada em um modelo de gestão compartilhada, destacandose quais as atribuições e competências dos três níveis de governo na provisão de atenção
socioassistencial, conforme indicado na LOAS – Lei orgânica da Assistência Social e nas
Normas Operacionais Básicas (NOBs), realizadas a partir das recomendações e deliberações
das Conferências, dos Conselhos e das Comissões de Gestão Compartilhada.
Paralela a Política Nacional de Assistência Social/PNAS seguiu-se o processo de
construção e normatização nacional do SUAS, aprovado em 2005 pelo Conselho Nacional de
Assistência Social/CNAS (por meio da NOB nº 130, de 15 de julho de 2005). O SUAS volta-se
para a ação conjunta em todo o território nacional das responsabilidades, vínculos e
hierarquias, do sistema de serviços, benefícios e ações de assistência social. Ações essas,
baseadas nas orientações da PNAS.
[...] pode-se afirmar que a implantação da PNAS e do SUAS tem
liberado, em todo o território nacional, forças políticas que, não sem
resistências, disputam a direção social da assistência social na
perspectiva da justiça e dos direitos que ela deve consagrar, a partir
das profundas alterações que propõe nas referências conceituais, na
estrutura organizativa e na lógica da gestão e controle das ações na
área (COUTO et. al., 2010, p. 38).
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Transparência, assistência e meio ambiente
A Política Nacional de Assistência Social e o Sistema Único de Assistência Social
ampliam o número de usuários a serem atendidos pela política. A intenção é superar a
fragmentação existente na abordagem por segmentos, como por exemplo, idoso, criança e
adolescente, população em situação de risco, entre outros.
Devido ao quadro de desemprego estrutural e do enxugamento de medidas
protetivas decorrentes do trabalho, há atualmente, um processo de redefinição do perfil
desses usuários. A tendência é a ampliação dos demandatários do acesso a serviços e
benefícios da assistência social, “são trabalhadores e suas famílias que, mesmo exercendo
atividades laborativas, têm suas relações de trabalho marcadas pela informalidade e pela
baixa renda” (COUTO et. al., 2010, p. 34).
[...] as configurações que assumem as classes sociais na sociedade
brasileira contemporânea, especialmente a “classe-que-vive-dotrabalho”, nos termos de Antunes (1995), e seu rebatimento no
campo de ação das políticas sociais, especialmente da assistência
social, desencadeando novas articulações entre pobreza, trabalho e
desigualdade social (COUTO et. al., 2010, p. 47).
As referidas autoras, ao tratarem dos trabalhadores e da gestão do trabalho no SUAS,
apontam que as novas configurações da assistência social, introduziram significativas
inflexões neste campo, dentre elas a exigência de novos modelos de organização e gestão do
trabalho. E ainda afirmam que “[...]o trabalho da assistência social está estrategicamente
apoiado no conhecimento e na formação teórica, técnica e política do seu quadro de
pessoal, e nas condições institucionais de que dispõe para efetivar sua intervenção” (idem,
2010, p. 58).
Também as formas e modos de organização e das condições no qual este trabalho se
realiza devem ser identificados, uma vez que as condições atuais evidenciadas no
capitalismo contemporâneo, com a globalização financeira do capital e sistemas de
produção, ancorados no desenvolvimento tecnológico e de informação, impulsionam
significativas mudanças nos processos de organização, relações e vínculos de trabalho. Um
contexto que impõe aos trabalhadores várias formas de precarização do trabalho, e que
atingem fortemente o trabalho assalariado “(...) sua realização concreta e as formas de
subjetivação, levando a redefinição dos sistemas de proteção social” (Ibidem, 2010 p. 60).
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Dessa maneira, a implantação do SUAS estabelece não apenas, novas formas de
gestão e novas formas de regulação do trabalho, como também a ampliação do número de
trabalhadores cuja estabilidade funcional é condição primordial, ao lado de processos
continuados de formação e qualificação (COUTO et. al., 2010, p. 60).
A expansão da Assistência Social, nos anos 2000, se gestou numa conjuntura política
em que os programas de combate à pobreza vêm ganhando maior centralidade na América
Latina, como instrumento fundamental de enfrentamento das desigualdades sociais. A
implementação e a operacionalização da política de Assistência Social, por sua vez,
focalizada e seletiva, voltada para as frações mais pauperizadas da população, fez com que a
inserção dos profissionais da área da assistência social fosse ampliada.
Considerando essa expansão, torna-se imprescindível refletir sobre as condições sob
as quais vem se desenvolvendo a gestão do trabalho vinculada ao SUAS, cujo recorte para
efeitos de estudo, focou-se, sobretudo, no Estado de Mato Grosso.
A Gestão do Trabalho no SUAS: aproximações, dinâmica, contradições e desafios na
implementação do SUAS em Mato Grosso
Destacamos que o presente estudo insere-se um uma pesquisa mais abrangente
relacionada ao Estado da Arte sobre a gestão do trabalho no SUAS, vinculada à Universidade
Federal de Mato Grosso e, portanto, serão apresentados algumas aproximações iniciais ao
que ora vem sendo pesquisado. Outras análises posteriormente serão adensadas e
aprofundadas em novos estudos.
Neste sentido, compreender as repercussões da gestão do trabalho no SUAS, a partir
da perspectiva do modelo gerencial, implica em considerarmos o movimento engendrado na
realidade de inserção do SUAS em Mato Grosso, bem como seu contexto e expressão.
São inegáveis as conquistas e os avanços trazidos pela PNAS e pelo SUAS que vieram
contrapor-se ao paradigma tradicional da assistência social. O SUAS propõe gestão
compartilhada com financiamento da política pelas três esferas do governo e com Comando
Único, no qual o objetivo e o resultado devem consagrar direitos de cidadania e inclusão
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social. Trata-se das condições para a extensão e universalização da proteção social,
organicamente articulada as demais políticas públicas.
Fazendo parte do movimento mais amplo em que a assistência social veio constituirse política pública de direito no conjunto da Seguridade Social, Mato Grosso se fez presente
no cenário nacional quando diferentes segmentos da sociedade política e civil participaram
do processo que culminou com a institucionalização da LOAS, PNAS e NOB, como ainda das
mudanças que foram processadas no decurso das últimas duas décadas.
A partir de 2004, sob o ponto de vista da organização do sistema descentralizado,
gesta-se um novo panorama, quando se inicia a construção do SUAS no país, vindo Mato
Grosso a fazer parte deste processo em 2006, buscando progressivamente cumprir as
prerrogativas em relação a assegurar a política de assistência social aos diferentes
segmentos sociais.
A rede SUAS em Mato Grosso vem buscando ser constituída em conformidade com a
legislação, em que pese as ingerência políticas e dificuldades. No que se refere ao porte e
nível dos municípios, observa-se o enfrentamento de contradições e dificuldades próprias de
um Estado, de grande extensão territorial, onde a cultura do favor e do assistencialismo
permanece enraizada e que se contrapõe à política de direito.
Mato Grosso possui o maior número de municípios classificados como de Pequeno
Porte, totalizando 112, entre os 141 que compõe o estado, os quais não vêm conseguindo
garantir a competência administrativa e financeira para a implementação da rede conforme
exigências contidas na NOB/2006 em termos de espaço físico, equipamentos sociais para o
desenvolvimento de ações que favoreçam a promoção dos usuários.
Ainda em conformidade com a NOB e a PNAS, os demais municípios mato-grossenses
em termos de classificação pelo SUAS, encontram-se distribuídos em Porte II com 20
municípios; Porte Médio com 05 e Grande Porte com 04, fazendo parte da Gestão Plena 20
município e da Gestão Básica 21, ficando comprovada a necessidade da implementação de
consórcios para que a rede socioassistencial se consolide, pois é inadmissível pensar nesta
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REVISTA MATO-GROSSENSE DE POLÍTICAS PÚBLICAS – N. 02
forma de gestão apenas idealizada, quando a maioria dos municípios não possuem
condições estruturais e conjunturais de implementação da rede socioassistencial.
De acordo com Freitas (2007, p. 125) em 2006 foram instalados os CRAS – Centro de
Referência da Assistência Social em todos os 141 municípios de Mato Grosso, “cumprindo
em tese, as condições mínimas para a implantação do SUAS”. Todavia, segundo a mesma
autora, conforme informações dos registros do Conselho Estadual de Assistência Social, nos
anos de 2004 e 2005, alguns municípios:
[...] operacionalizaram os CRAS de forma irregular, tanto do ponto de
vista técnico, quanto financeiro. Muitos foram os municípios que, de
afogadilho, improvisaram locais para sua instalação desrespeitando
normas e orientações técnicas tanto de instalação quanto de
funcionamento, o que permite afirmar que mudanças institucionais
não geram, necessariamente, mudanças de prática, especialmente
em um campo marcado pelo improviso, emergência e escassez de
recursos (FREITAS, 2007, p. 125).
O sistema descentralizado e participativo impõe uma forma de gestão compartilhada
e que deveria envolver as três esferas de governo, cada qual com atribuições e
competências definidas. Neste caso, os municípios passaram a ter maior responsabilidade e
encargos, que não obrigatoriamente foram acompanhados de co-financiamento equilibrado
que pudesse dar suporte às estratégias de intervenção locais para que caminhassem no
sentido de uma maior aproximação e adequação à realidade local.
As informações acerca do processo de implementação da política de assistência
social e da rede socioassistencial no estado, extraídas do Relatório do Plano Estadual de
Capacitação dos Trabalhadores do SUAS do Estado de Mato Grosso (SETAS, 2012)
demonstram que o número de CRAS em 2012 ampliou-se para 171 CRAS, 43 CREAS (Centro
de Referência Especializada de Assistência Social) e 01 CREAS POP (para população em
situação de rua).
Dados relativos à estrutura trabalhista por vínculo empregatício no SUAS (IBGE, 2012)
revela que entre os 445 trabalhadores que compõem a assistência social do estado, 245 são
estatutários, 119 comissionados, 23 estagiários e 58 sem vínculo permanente.
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Conforme os parâmetros inaugurados pela NOB (2006), no que se referem aos
trabalhadores da assistência social, os dados demonstram que tal amortização não vem
sendo cumprida, na medida em que a maioria dos municípios vem realizando concurso para
um número de vagas inferior ao preconizado, com ausência de planos de cargos e salários e
capacitação continuada, fatores que fragilizam a materialização do SUAS .
Essas questões aliada a falta de valorização dos trabalhadores da assistência social
provoca alta rotatividade dos serviços pela não inserção de profissionais concursados; a
indicação de cargos de gestão meramente por critérios político-eleitorais; a ineficiência de
recursos aplicados na área; a concentração dos investimentos nas políticas de transferência
de renda e o reduzido quantitativo para o restante da política de assistência; a tendência ao
“familismo” e uma perspectiva de responsabilização da família e de seus membros, são
alguns dos desafios colocados pela Assistência Social atualmente e que precisam ser
enfrentados com a urgência que a realidade coloca.
No que diz respeito à escolaridade por vínculo empregatício verificou-se que entre os
trabalhadores da assistência social do estado, 116 possuem ensino fundamental, 205
possuem ensino fundamental completo, 118 ensino superior e 06 possuem pós-graduação
(IBGE, 2010). No que se refere a área de formação, alguns cursos se destacaram, tais como
serviço social, psicologia e pedagogia, o que, em alguma medida, vai ao encontro do
estabelecido pela própria política, tanto nos municípios de pequeno, médio e grande porte,
os quais preveem a composição de uma equipe mínima, geralmente, formada por
assistentes sociais e psicólogos.
A política de educação permanente e de capacitação continuada encontra-se frágil
no estado de Mato Grosso, haja vista que a NOB/SUAS prevê a composição de uma “equipe
multidisciplinar básica para serviços e programas, natureza e número de profissionais
adequados, plano de carreira, cargos e salários, condições de trabalho necessário a uma
atuação qualificada e um sistema de capacitação e educação permanente” (BRASIL, 2008, p.
32). Todos esses fatores já mencionados devem considerar os limites colocados à Política
que tem como um de seus fortes parâmetros a influência da lógica econômica.
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Disso resultam as principais críticas suscitadas por teóricos e intelectuais sobre essa
Política, uma vez que se reconhece que a mesma tem contribuído por meio dos programas
de transferência de renda como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Bolsa Família
(PBF), para impulsionar o consumo, estabelecer padrões de acesso a bens e serviços mais
elevados e aumentar a circulação de mercadorias. No entanto, seus limites centram-se,
evidentemente, na incapacidade de redução dos níveis de desigualdade social (COUTO et.
al., 2010).
Permeado por um conjunto de contradições e desafios, a expansão da Política de
Assistência Social vem se tornando a principal política de proteção social no país, sem
contudo, assistirmos paralelamente ao fortalecimento da política intra-setorial e
intersetorial e o reforço das políticas de saúde, educação, previdência, geração de trabalho e
renda. Observa-se ainda o co-financiamento por parte de alguns municípios e por vezes, do
estado. Isto culmina com o não cumprimento do paradigma do SUAS, mesmo após dezenove
anos da implementação da Lei Orgânica da Assistência Social e oito anos do SUAS.
Além dos desafios pontuados, existem ainda as desigualdades espaciais oriundas da
própria estrutura administrativa e de gestão dos municípios mato-grossenses, bem como as
questões históricas, tanto no que se refere aos parcos recursos, estrutura física e material
inadequada, recursos humanos pouco qualificados e em quantidade reduzida, e ausência de
articulação das ações intersetoriais das políticas sociais. Ademais, a ausência de
planejamento integrado das secretarias municipais, acaba por perpetuar o modelo
fragmentado e setorializado, mesmo com a materialização do marco legal/formal da PNAS e
do SUAS.
Considerações finais
De acordo com os argumentos expostos nos itens anteriores, a forma de organização
e gestão do trabalho sob o modelo de acumulação flexível, que privilegia os processos de
flexibilização, precarização e intensificação do trabalho, como mais um modo de exploração
e dominação dos trabalhadores, vem se inserindo no espaço público de maneira a refletir
essas transformações no e do trabalho, e aquelas macrossocietárias que repercutem
diretamente no Estado e nas políticas sociais.
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A rotatividade e os baixos salários provocam mudanças na forma de realizar sua
intervenção, o tempo dedicado ao processo de conhecimento e sistematização sobre a
realidade com a qual deverá trabalhar é dividido com o volume de demandas excessivas
para o número de profissionais disponíveis. Isso leva a uma tendência de aligeiramento e
superficialização que termina por restringir a intervenção ao atendimento de demandas
emergenciais, sem a devida problematização e prejudicando a análise sob a ótica da
dimensão coletiva. Assim, trata-se de forma individual, questões que são coletivas e que
fazem parte da vida da maioria dos usuários (SANTOS, 2011).
Quanto ao processo de intensificação do trabalho, que também vem se apresentando
como uma tendência na gestão do trabalho no SUAS, tais como: o acúmulo de atividades, a
sobrecarga de tarefas gerada pela ampliação das demandas e das atribuições e o número
restrito de profissionais para atendê-las, se manteve o mesmo ou foi reduzido com a
flexibilização e terceirização da estrutura estatal. Soma-se a isso o uso de tecnologias online
para organização dos trâmites burocráticos, que apresentam condicionalidades como a
exigência de mais atenção e tempo para o preenchimento de uma série de formulários.
De acordo com Dal Rosso (2008, p. 131) “ a cobrança de resultados pode ser
entendida como forma de intensificação num sentido subjetivo”, se expressa como meio ou
forma de pressão sobre os trabalhadores, que são compelidos a “mostrar resultados do seu
trabalho”, mesmo sem entender o processo como um todo e ter o tempo e as condições
necessárias para isso.
A técnica de gestão por resultado, uma forma de intensificação do trabalho está
pouco a pouco, sendo incorporada ao serviço público. As formas de intensificação do
trabalho no setor público, “[...] referem-se mais ao ritmo e à velocidade do trabalho, às
cobranças e às exigências, ao volume de tarefas, às características do trabalho intelectual
demandante, ao peso da responsabilidade e, em menor escala, ao espírito de competição”
(DAL ROSSO, 2008, p. 188).
Essa situação constatada na área da assistência social em Cuiabá, relacionada aos
assistentes sociais (TRUGILLO, 2012), se repete em outras cidades do estado e do país e em
diferentes profissões, o que é motivo de preocupação quanto a indicação de estratégias para
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o fortalecimento de resistências por parte dos profissionais do SUAS, contra esses processos
de precarização e intensificação do trabalho, sob pena de perdermos os avanços
conquistados em prol da defesa de uma política social que de fato tenha a perspectiva de
considerar a assistência social um direito de todos.
De acordo com os dados acerca da realidade mato-grossense, de fontes locais (sites
do estado) e nacionais (MDS e IBGE), além de pesquisas sobre mercado de trabalho dos
assistentes sociais em Mato Grosso7 (2010), é possível identificar diversas contradições,
dentre as quais: quadro reduzido de profissionais, com o agravante que mais de 50% desses
possuem vínculos temporários e/ou precários de trabalho, o que prejudica o atendimento
com qualidade, continuidade do serviço e ir além das demandas emergenciais.
O quadro restrito de funcionários pode ser apontado como um dos fatores que
contribui para a fragilidade dos diagnósticos territoriais, que abordam, geralmente, apenas
aspectos quantitativos, fragmentados e que não contemplam as interfaces da assistência
social com as demais políticas sociais, e terminam por inviabilizar o conhecimento da
realidade numa perspectiva de totalidade.
Ao quadro limitado e à rotatividade, também devem ser acrescidos os problemas
relacionados à qualificação dos profissionais que ainda não é a recomendada nas
normatizações do SUAS, o que amplia a dificuldade de organização da rede socioassistencial.
Isso é agravado quando se trata da alta complexidade do Sistema, o que se apresenta como
um desafio a mais para avançar na concretização da Política, pois a complexificação em
conjunto com o elevado número de municípios de pequeno porte e associada a extensa
dimensão territorial do estado, colocam uma série de desafios a serem problematizados e
enfrentados para de fato materializar
o SUAS e a PNAS nos 141 municípios mato-
grossenses.
Discutir a forma como a gestão do trabalho no âmbito do SUAS vem sendo
desenvolvida, e as consequências para a materialização da Política de Assistência Social, é
manifestar e assumir o compromisso não apenas com a discussão sobre a qualidade do
7
Pesquisa concluída em 2010 e realizada pelo Grupo Trabalho e Sociabilidade do Departamento de Serviço
Social da UFMT em parceria com o Conselho Regional de Serviço Social/CRESS/20ª Região MT.
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Transparência, assistência e meio ambiente
exercício dos profissionais envolvidos, mas, sobretudo, pensá-lo na perspectiva da qualidade
dos serviços prestados aos trabalhadores e trabalhadoras, usuários da Política, e que
cotidianamente buscam os serviços da rede.
Referências bibliográficas
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Porto Alegre: ABEPSS, Ano 4, n. 8 (jul/dez) 2004.
BEHRING, Elaine. Brasil em contra-reforma: desestruturação do Estado e perda de direitos.
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DAL ROSSO, Sadi. Mais Trabalho! A intensificação do labor na sociedade contemporânea.
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FREITAS, Leana Oliveira. O potencial estratégico da Política Pública de Assistência Social no
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TRUGILLO, Luciana. A política de Assistência Social no contexto neoliberal, as transformações
no trabalho e seus impactos no trabalho dos assistentes sociais dos CRAS e CREAS de CuiabáMT. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Mato Grosso, ICHS, Programa de PósGraduação em Política Social, Cuiabá, 2012.
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ANÁLISE DO REPASSE DO ICMS ECOLÓGICO AOS MUNICÍPIOS DE MATO GROSSO, COM
ENFÂSE À MELHORIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
Rubens dos Santos1
Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello2
Raniella Ferreira da silva Souza3
RESUMO
Analisa os benefícios da aplicação do mecanismo fiscal
conhecido como ICMS Ecológico, inserido no Estado através da
lei complementar nº 073/2000, cujo objetivo principal é de
compensar financeiramente os Municípios que possuem
restrições para uso do solo. Ele é destacado como instrumento
econômico de melhoria das Políticas Públicas, bem como os
benefícios proporcionados à sociedade. A pesquisa realizada
apontou que o fato de alguns municípios ainda não receberem o
benefício se deve ao fato de serem pequenos em fase de
desenvolvimento econômico. Aponta também que a implantação
do ICMS Ecológico no Estado de Mato Grosso, trouxe
benefícios apenas financeiros para a maior parte dos municípios.
A implantação do critério de qualidade será um dos meios de
transformá-lo em um instrumento de Política Pública eficaz para
todos os municípios e não apenas um instrumento
compensatório.
Palavras-Chave: ICMS Ecológico. Políticas Públicas.
Instrumentos Econômicos. Sustentabilidade. Unidades de
Conservação.
1
Mestre em Contabilidade – Controladoria e Finanças (UNISINOS). Professor Assistente do Departamento de
Ciências contábeis da UNEMAT em Cáceres-MT. E-mail: [email protected].
2
Mestre em Agronegócios e Desenvolvimento Regional (UFMT,2011). Professora Assistente do Departamento
de Ciências Contábeis da UNEMAT em Cáceres-MT. E-mail: [email protected].
3
Acadêmica do curso de Ciências Contábeis da UNEMAT em Cáceres-MT. Trabalha na Construtora e
Terraplanagem Prata – Cáceres-MT. E-mail: [email protected].
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O ICMS Ecológico no Brasil
O ICMS Ecológico tem como fundamentação legal o artigo 158 da Constituição
Federal do Brasil, de 05 de outubro de 1988, que trata da repartição das receitas tributárias
do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que dispõe 25% (vinte e
cinco por cento) para os municípios, sendo três quartos na proporção do valor adicionado
nas operações referentes à circulação de mercadorias e serviços realizada em seu território,
e um quarto no que dispuser a Lei Estadual (PAULO, 2009).
O primeiro Estado a aproveitar essa oportunidade da Constituição Federal (CF) foi o
Paraná, que inicialmente adotou o conceito de compensação para os municípios que tinham
restrições legais para expandir suas atividades econômicas, e com o tempo e a experiência
foi evoluindo, e a lei Estadual do ICMS Ecológico no Estado do Paraná passou de um conceito
de compensação para um instrumento de contribuição para a conservação ambiental
(LOUREIRO, 2002).
Com a iniciativa do Paraná o ICMS Ecológico foi instituído em outros Estados do país,
como São Paulo, Minas Gerais, Rondônia, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Mato
Grosso sendo o sexto Estado aderir o critério.
Legislação no Mato Grosso
“No Mato Grosso a conquista do ICMS Ecológico se deu pela atuação de várias
instituições, especialmente pela persistente ação do Deputado Estadual Gilney Viana” (SEMA
MT, 2012), sendo instituído através da lei complementar nº 73, de 07 de dezembro de 2001,
que dispõe sobre os critérios de distribuição do ICMS aos Municípios, e regulamentado
através do Decreto Estadual nº 2.758, de 16 de julho de 2001, adotando como critérios de
distribuição Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Saneamento Ambiental.
Em 20 de Janeiro de 2004, através da lei complementar nº 157, a Assembleia
Legislativa do Estado deliberou a modificação dos critérios para o cálculo do índice de
participação dos municípios na distribuição do ICMS, caracterizando ao ICMS Ecológico a
exclusão do critério de saneamento ambiental, portanto este passa a representar 5% (cinco
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Transparência, assistência e meio ambiente
por cento) do total repassado do ICMS aos municípios, referente às unidades de
conservação e terras indígenas.
Municípios de Mato Grosso
Inicialmente o ICMS Ecológico beneficiou 78 (setenta e oito) municípios no Estado de
Mato Grosso e até 2012 possuía 86 (oitenta e seis) Municípios cadastrados. Tomando como
exemplo do Estado de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso adotou inicialmente apenas o
critério quantitativo de distribuição deste recurso, que levam em consideração o tamanho
em hectares e o fator de conservação das áreas protegidas contidas nos municípios. Tendo
como pretensão a adoção do critério qualitativo que avaliará a Unidade de Conservação
através de um escore, ou seja, passará a ter uma nota e essa desde que positiva sempre
representará um incremento financeiro ao município, no entanto Mato Grosso ainda não
tem previsão para a adoção desse critério uma vez que possui restrições de equipe técnica e
orçamentária para a realização das avaliações (SEMA MT, 2012).
Para alguns municípios o ICMS Ecológico é o principal critério de cálculo para
composição dos Índices de Participação no ICMS enquanto para 55 (cinquenta e cinco)
municípios ele não contribui com nenhuma parte, conforme o Relatório Sobre a Aplicação
do ICMS Ecológico no Estado de Mato Grosso Período de 2002 a 2007, criado pelo Governo
do Estado de Mato Grosso, conforme demonstrado na tabela 1.
TABELA 1
Índice do ICMS Ecológico nos Municípios de MT
Quantidade de
Municípios
18
34
12
8
5
5
2
55
Percentual do Valor Total Repassado de ICMS Ecológico em relação
ao ICMS
Menos de 1%
Entre 1 a 10%
Entre 10,1% a 20%
Entre 20,1% a 30%
Entre 30,1% a 40%
Entre 40,1% a 50%
Entre 60% a 67%
Não contribui com Nenhuma Parte
Fonte: Governo do Estado de Mato Grosso (2008)
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De janeiro a novembro de 2010 o ICMS Ecológico representou R$53.025.165,67 na
renda dos 86 (oitenta e seis) municípios que possuem Unidades de Conservação e Terras
Indígenas em seu território, sendo que o recurso do ICMS Ecológico de alguns desses
municípios apresentam valores significativos em relação aos demais critérios de distribuição
do ICMS.
Quando Mato Grosso passar a aderir o critério qualitativo para o beneficio do ICMS
Ecológico, alguns dos 86 municípios poderão perder parte ou totalmente o repasse do ICMS
Ecológico, uma vez que ele deixará de ser um beneficio apenas compensatório e passará a
incentivar as prefeituras a aumentar a efetividade das suas ações socioambientais, um
exemplo claro é o município de Alto Boa Vista, que é um dos maiores arrecadadores do ICMS
Ecológico do Estado em função da terra indígena Marãiwatsédé, onde parte de seu território
encontra-se devastado, ameaçando a população indígena.
Por outro lado, apesar da legislação não obrigar os Municípios a aplicar os recursos
em ações voltados às terras indígenas e Unidades de Conservação, alguns Municípios como
Juína, estabeleceram termos de cooperação para elaboração de programas de proteção
ambiental (PAUTA SOCIO AMBIENTAL, www.pautasocioambiental.com, 2012). Salvo que o
ICMS Ecológico é propositivo e não punitivo, sendo assim o critério qualitativo poderá
solucionar problemas de devastação, uma vez que ganha mais quem ajuda a proteger o
meio ambiente.
Unidades de Conservação
Hoje, o Brasil é considerado um país rico em biodiversidade, pois é onde se encontra
uma grande variedade da Fauna e da Flora, um dos melhores climas do mundo, água pura e
em grande quantidade, terras férteis e paisagens paradisíacas, e para proteger essas áreas o
governo brasileiro criou as Unidades de Conservação definidas pelo Ministério do Meio
Ambiente (MMA) (www.mma.gov.br) como:
Espaços territoriais, incluindo seus recursos ambientais, com
características naturais relevantes, que têm a função de assegurar a
representatividade de amostras significativas e ecologicamente
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Transparência, assistência e meio ambiente
viáveis das diferentes populações, habitats e ecossistemas do
território nacional e das águas jurisdicionais, preservando o
patrimônio biológico existente.
Até 2012 Mato Grosso possuía 102 (cento e duas) unidades de conservação
distribuídas em todo seu território, sendo 23 (vinte e três) federais, 46 (quarenta e seis)
estaduais e 33 (trinta e três) municipais.
A criação de Unidades de Conservação no Brasil é pautada nas metas da Conservação
sobre Diversidade Biológica (CDB) que estabelece que 10% (dez por cento) de cada bioma
brasileiro sejam protegidos (MMA, www.mma.gov.br, 2012).
As Unidades de Conservação são criadas a partir da necessidade de proteger áreas de
importância biológica e cultural, ou até mesmo para assegurar o uso sustentável, e se dá
através de atos do poder público (Federal, Estadual e Municipal), onde os mesmos são
responsáveis pelos estudos técnicos e os demais procedimentos para a criação das Unidades
de Conservação, no entanto, a participação da sociedade é fundamental nesse processo,
pois a preservação desse patrimônio natural é de todos.
Após a criação dessas áreas, é necessário que seja elaborado um plano de manejo,
documento no qual se inclui o diagnóstico da área e estabelecem normas, restrições de uso
e as ações a serem desenvolvidas nas unidades.
Políticas Públicas
O meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental de todos os
brasileiros, a Constituição não dá direito de escolha ao governo de proteger ou não o meio
ambiente, ela impõe essa obrigatória política pública e aos cidadãos compete o direito de
acionar o Estado a cumprir essa obrigação (HEMPEL, 2008).
De acordo com Gerber João (2004) a políticas ambientais vem utilizando
instrumentos para alcançar um desenvolvimento ecologicamente correto e esses
instrumentos podem ser classificados em dois sistemas: Sistema Regulatório (De comando e
controle) e os Sistemas de Incentivo (Induzem mudanças de comportamento em relação ao
meio ambiente).
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No Brasil a utilização desses instrumentos econômicos é mais propícia do que os de
comando e controle, afinal num país onde existe escassez de recursos financeiros, a
disposição a receber é maior do que à disposição a pagar (HEMPEL, 2008).
Segundo o Dr. Alexandre Bilaré Batistela (Analista de Meio Ambiente da SEMA-MT,
2012), “as políticas públicas no Estado de Mato Groso evoluiram nos últimos dez anos em
relação aos demais Estados da Federação, mas ainda há muito que fazer em relação ao
tema, e o principal desafio é aumentar a sensibilização da população, já que as políticas
públicas são focadas nas demandas da sociedade e infelizmente as Unidades de Conservação
não são uma de suas principais demandas”.
Neste contexto o ICMS Ecológico pode ser considerado um instrumento de política
pública eficaz para o Estado, embora, tenha suas restrições, ele já tem ajudado na
conservação e na criação de novas áreas protegidas, e também tem auxiliado a contrapor a
visão da sociedade em relação a essas áreas, pois ele tem dado a oportunidade aos
municípios de mantê-las, ao invés de permitir a expansão de atividades econômicas que são
ambientalmente incorretas.
Apresentação e Análise dos dados – Metodologia e Pesquisa
No que se refere aos dados foi utilizado uma amostra que se segundo MARCONI e
LAKATOS (2009), caracteriza-se por selecionar uma parcela conveniente do universo que
seria população, neste caso a população é os 141 (cento e quarenta e um) Municípios do
Estado de Mato Grosso divididos entre os que recebem o repasse do ICMS Ecológico (86
Municípios) e o que não recebem (55 Municípios). Que para fins desse estudo foram
selecionados uma amostra aleatória de 46 Municípios divididos entre 30 (trinta) Municípios
para os que recebem e 16 (dezesseis) para os que não recebem.
Análise dos Municípios que são Beneficiados com o repasse do ICMS Ecológico
a) Identificação dos Respondentes
Através da aplicação do questionário os municípios que já recebem o repasse tiveram
seus representantes considerados aptos a participar da pesquisa, portanto suas respostas
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são consideradas válidas para o desenvolvimento deste trabalho, como demonstra a Tabela
2.
TABELA 2
Respostas dos Municípios quanto sua identidade profissional
Qual o setor Público onde você trabalha?
Prefeitura
Secretarias
Qual cargo você ocupa?
De confiança
Funcionário Efetivo
Qual sua formação profissional?
Biólogo
Administrador
Contador
Jornalista
80%
20%
56%
44%
44%
30%
20%
6%
Fonte: Tabela elaborada pelos autores.
b) Caracterização dos Municípios
A caracterização dos Municípios entrevistados é de grande relevância para este
trabalho uma vez que o ICMS Ecológico é um dos critérios de repasse do ICMS aos que os
Municípios têm direito. A maioria dos Municípios entrevistados caracteriza sua população
entre 10.000 a 20.000 mil habitantes, cuja principal fonte de captação do ICMS é a
Agropecuária, como demonstra a tabela 3.
TABELA 3
Caracterização da População e fonte de arrecadação do ICMS
População
De 10.000 à 20.000 mil
70% dos municípios
habitantes
participantes
Mais de 50.000 mil
30% dos municípios
habitantes
participantes
Fonte de Captação do ICMS
Agropecuária
44% dos municípios
participantes
Comércio
30% dos municípios
participantes
Serviços
20% dos municípios
participantes
Agronegócio
6% dos municípios
participantes
Fonte: Tabela elaborada pelos autores
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Para esta pesquisa os dados demonstram que as Unidades de Conservação, bem
como quaisquer outros tipos de iniciativa para proteção Ambiental não é um empecilho para
o desenvolvimento econômico, apesar de 44% (quarenta e quatro por cento) dos municípios
terem a agropecuária como principal fonte de arrecadação do ICMS o comércio vem logo
atrás com 30% (trinta por cento) de participação, demonstrando que é possível estabelecer
uma ponte entre o desenvolvimento econômico e sustentabilidade ambiental.
c) Caracterização das Políticas Públicas
O ICMS Ecológico é um instrumento econômico muito importante na formulação das
Políticas Públicas do Estado, no entanto, um ponto importante a ser levado em conta é a
gestão descentralizada dos Municípios, onde este instrumento está sendo utilizado apenas
para a geração de receitas, sem preocupação com os benefícios que poderiam ser gerados.
Os dados levantados na pesquisa apontam que mais de 70% (setenta por cento) das
Unidades de Conservação responsáveis pela distribuição do ICMS Ecológico são Unidades
Federais e Estaduais, ou seja, aquelas que foram automaticamente cadastradas pela SEMA
(Secretaria de Estado e Meio Ambiente) sem a participação dos Municípios, por outro lado é
importante ressaltar que esses mesmos 70% (setenta por cento) conhece o programa do
ICMS Ecológico no Estado, e 100% (cem por cento) acreditam que ele trouxe benefícios para
o Município, mesmo que só financeiramente.
Uma das maiores preocupações da implantação do ICMS Ecológico no Estado é o
destino que seria dado a este recurso, uma vez que a lei não obriga que o recurso seja
voltado ao seu gerador, ou seja, as Unidades de Conservação e Terras Indígenas, essa
preocupação pode ser confirmada na realização desta pesquisa, onde 80% (oitenta por
cento), dos municípios disseram que não separam os recursos repassados do ICMS, e eles
são aplicados conforme demanda a Lei Orçamentária Anual do Município, e apenas 20%
(vinte por cento) disseram que destinam o recurso na manutenção e conservação das áreas
protegidas.
Outro ponto interessante a ser observado é que 43% (quarenta e três por cento) dos
Municípios disseram que o valor repassado do ICMS Ecológico faz diferença no orçamento
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do Município e esses mesmos 43% (quarenta e três por cento) dizem receber entre
R$100.000,00 à R$500.000,00 (cem a quinhentos mil reais) por ano, e por outro lado 57%
dos Municípios dizem que o valor repassado não faz diferença no seu orçamento e destes
24% (vinte e quatro por cento) disseram que recebem mais de R$1.000.000,00 (um milhão
de reais) por ano, neste contexto percebe-se a falta de interesse dos gestores com a questão
ambiental, mesmo em sua maioria, como demonstra a tabela 2, sendo biólogo, pois o
recurso que a maioria deles desconsidera, com certeza em alguma instância fez muita falta
para maioria de seus contribuintes, que querendo ou não tiveram que pagar o ICMS que
estão embutidos nos produtos adquiridos, que deveria ser investido na preservação e
recuperação de áreas ambientais.
Em relação às Políticas Públicas, a pesquisa aponta que mesmo mal ou poucas elas
existem, como demonstra a tabela 4.
TABELA 4
Respostas dos Municípios beneficiados em relação às Políticas Públicas
No seu Município existem Terras Indígenas?
Sim
50%
Não
50%
Se sim, o Município investe recurso para a manutenção da cultura e saúde desses povos?
Sim
50%
Não
50%
O seu Município está localizado em qual Bioma Brasileiro?
Cerrado
86%
Pantanal
14%
Quem é responsável pela fiscalização das Unidades de conservação Existentes em seu Município?
SEMA
73%
O Município
20%
Ambos depende da Jurisdição
7%
No seu Município existem projetos de consciência ambiental?
Sim
100%
Não
0%
Se sim que tipo?
Reflorestamento
63%
Coleta seletiva
37%
Como você classifica as Políticas Públicas do seu Município?
Precisa melhorar
100%
Fonte: Tabela elaborada pelos autores.
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Como se pode perceber a maioria dos Municípios reconhece a falta de empenho no
que diz respeito a Políticas Públicas, no entanto, a maior preocupação é para onde elas estão
sendo voltadas, é importante que o Município tenha projetos de proteção ambiental como
apontou a pesquisa, isso demonstra que eles estão preocupados com o meio ambiente, mas
por outro lado à pesquisa também aponta que maior parte deles está localizada no Cerrado
mato-grossense, e ele tem sido um dos biomas com maior número de devastação nos
últimos tempos, por conta da expansão agrícola, além de ser um bioma com maior número
de espécies em risco de extinção, que são classificadas como áreas de hotspost, isso requer
cuidados especiais em relação ao compromisso do Município com as Unidades de
conservação, mesmo que a maior delas seja de esfera Estadual e Federal, os gestores locais
podem assinar termos de compromisso com SEMA e ajudá-la a fiscalizar e manter essas
áreas sempre protegidas.
O ponto fraco encontrado na implantação do ICMS Ecológico no Estado pela pesquisa
realizada foi à falta de efetivação do compromisso entre os Municípios e SEMA, isso porque
50% (cinquenta por cento) dos Municípios conhecem a intenção do Estado em adotar o
critério qualitativo para distribuição do ICMS Ecológico, e 30% (trinta por cento) destes
reconhecem que quando isso acontecer eles podem perder parte ou totalmente o repasse,
por não existir nenhum vinculo entre eles e as Unidades de Conservação, e o repasse que
recebem é baseado somente na existência e no tamanho da área protegida existente em seu
território.
d) Opinião dos Respondentes
Apesar de todo incentivo financeiro que o ICMS Ecológico proporciona aos
municípios, ainda assim existe muito que fazer em relação à questão ambiental no Estado,
mesmo que pouco ou urgente todos os Municípios entrevistados reconhecem que precisam
de atenção especial em relação ao meio ambiente, o fato é que todos eles têm recurso para
investir em projetos e ações que protejam o meio ambiente, o que falta mesmo é
administração correta destes recursos, uma gestão capaz e focada no desenvolvimento
sustentável.
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Análise dos Municípios que não são Beneficiados com o repasse do ICMS Ecológico
a) Identificação dos Respondentes
Maior parte dos respondentes foi considerada apta a responderem o questionário,
pois, 100% (cem por cento) desses trabalharem dentro da Prefeitura de seus Municípios,
75% (setenta e cinco por cento) ocuparem cargo de confiança e 43% (quarenta e três por
cento) terem formação em Contabilidade, suas respostas são válidas para análise e
desenvolvimento deste trabalho.
b) Caracterização dos Municípios
Os municípios que ainda não recebem o repasse do ICMS Ecológico são municípios
pequenos e que têm o comércio como principal fonte de captação do ICMS, a pesquisa
aponta que esse pode ser um dos motivos pelos quais eles ainda não são beneficiados com
repasse, pois são Municípios de pequeno porte que visam o desenvolvimento econômico, e
como as Unidades de Conservação são vistas como empecilho ao desenvolvimento, a criação
dessas áreas nestes locais ficam comprometidas. No entanto não se pode apontar esse como
o único problema para a arrecadação do ICMS Ecológico nesses Municípios, é preciso
analisar as demais respostas obtidas na pesquisa, como segue adiante.
c) Identificação da existência de Políticas Públicas nos Municípios
Como já descrito neste trabalho, o ICMS Ecológico surgiu com o intuito de compensar
financeiramente aqueles Municípios que possui restrições legais para o desenvolvimento
econômico por possuírem áreas de conservação ambiental em seus territórios, bem como da
necessidade de estruturação de instrumentos alternativos de políticas públicas para a
conservação ambiental e os dados levantados nesta pesquisa apontam que 75% (setenta e
cinco por cento) dos municípios que ainda não recebem o repasse não conhecem esse
mecanismo.
Segundo o Coordenador de Unidades de Conservação Estaduais de Mato Grosso, o
principal motivo desses municípios não serem beneficiados, não é somente a falta de
conhecimento desses tipos de instrumentos como ICMS Ecológico, mas também a grande
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pressão de setores da sociedade que são opositores em relação às Unidades de Conservação
e Terras Indígenas, conforme demonstra a pesquisa 75% (setenta e cinco por cento) desses
municípios não têm Unidades de Conservação e nenhum projeto de criação das mesmas,
embora tenham outros tipos de projetos onde 50% (cinquenta por cento) são de iniciativa
da Prefeitura e os outros 50% (cinquenta por cento) da comunidade externa, como o de
coleta seletiva (25% dos respondentes), por exemplo, reconhecem a falta de políticas
públicas e necessidade de atenção especial para meio ambiente.
Em relação às Terras Indígenas existe uma preocupação muito grande, pois 25%
(vinte e cinco por cento) dos Municípios que dizem conhecer o programa do ICMS Ecológico
reconhecem que existem Terras Indígenas em seu território, mas que não possuem nenhum
compromisso com a manutenção dos mesmos, a situação é preocupante, pois no Mato
Grosso existem muitas dessas terras que se encontram em processo de restituição,
tornando-se áreas de conflito entre indígenas e não indígenas, no entanto o único
prejudicado é próprio meio ambiente, embora o ICMS Ecológico seja um mecanismo de
incentivo a proteção ambiental, ele não tem influência para resolver esse tipo de problema,
pois os valores são repassados em função da existência das áreas, a única forma existente
capaz de influenciar no repasse e possivelmente resolver esse tipo de conflito, será com a
adoção do critério qualitativo, que embora já tenha estudos sobre o tema, infelizmente
ainda não se tem previsão para sua implantação.
Considerações Finais
O objetivo principal deste trabalho foi avaliar se o ICMS Ecológico trouxe benefícios
para o Estado de Mato Grosso, uma vez que seu principal objetivo é compensar
financeiramente os municípios que possuem restrições para o desenvolvimento econômico,
incentivar a criação de novas áreas de proteção e tentar mudar a visão da sociedade em
relação às mesmas.
No entanto os resultados obtidos neste trabalho são preocupantes, pois os
Municípios recebem o repasse em função de Unidades de Conservação Estaduais e Federal,
na prática isso quer dizer que a maior parte dos municípios não fizeram nenhum esforço
para serem beneficiados, pois essas Unidades de Conservação são de responsabilidade de
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seus gestores, no caso a SEMA e o ICMS Bio, ou seja, os municípios não tiveram nenhuma
participação quanto à efetivação do recurso, o trabalho constatou também que a verba
repassada para esses municípios são destinadas as principais demandas locais, embora boa
parte dessa renda não seja destinada as Unidades de Conservação e Terras Indígenas as
demandas ambientais também vem sendo atendidas através de projetos de consciência
ambiental, como de coleta seletiva e tratamento de esgoto, isso quer dizer que, o ICMS
ecológico mesmo que em pequena quantidade trouxe benefícios ambientais para os
municípios beneficiados.
Outra questão importante que o trabalho apontou foi em relação aos municípios que
ainda não são beneficiados, cujo motivo ficou bem claro, que é a não existência de Unidades
de Conservação em seus territórios, consequência da falta de conhecimento dos gestores
municipais e de setores da sociedade que são opositores da existência de áreas de proteção
ambiental nesses municípios.
O ICMS Ecológico tem possibilidades de melhorar a qualidade de vida das populações
dos Municípios do Estado de Mato Grosso, mas para isso é necessário a introdução de
medidas que respaldem as “brechas” deixadas na Lei que o instituiu, como tem sido em
outros Estados como Minas Gerais, que implantou a Lei chamada “Robim Hood”, onde
redistribuiu os critérios enfatizando a qualidade de vida e não somente as questões
ambientais, o “ponta pé” inicial para Mato Grosso se inserir nesse grupo de Estados que tem
sido exemplo para os demais, é a adoção do critério de qualidade, tornando maior o grau de
responsabilidade e comprometimento por parte das prefeituras em relação as Unidades de
Conservação e terras Indígenas, além de tornar mais justos o repasse, visto que o premio
seria para aqueles que estão trabalhando melhor e não somente para aqueles que possuem
restrições para o desenvolvimento econômico.
Com resultados obtidos neste trabalho sugere-se ao Estado a implantação de novos
instrumentos que possam não só auxiliar o ICMS Ecológico, mas também estimular ações
ambientalmente corretas, de forma que elas sejam mais determinantes nas questões de
Governo.
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