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A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA DA UNIÃO EUROPEIA“URBAN”
NA REQUALIFICAÇÃO DOS CENTROS HISTÓRICOS DAS CIDADES
ITALIANAS DE PALERMO E GÊNOVA
MARIA ELENA CASTORE
Universidade Federal da Bahia - UFBA
RESUMO
O trabalho procura apresentar a experiência da aplicação do Programa da União Europeia, denominando Urban,
no processo de requalificação dos centros históricos de duas cidades italianas, Palermo e Gênova, como
exemplo de politica urbana integrada, que abarca numerosos aspectos - econômicos, socioambientais, culturais atua em diversos níveis administrativos e persegue o elemento participativo.O Programa Urban, que previa
arecuperação de áreas urbanas com altos níveis de degradação e problemas de integração social e económica,
encontrou aplicação em muitas áreas periféricas de cidades europeias, mas foi implementado também em
alguns centros históricos, que apresentavam condições de degrado e marginalidade similares às áreas
periféricas.Palermo e Gênova beneficiaram em tempos e fases diferentes dos financiamentos europeus
destinados ao Programa Urban: dotadas de centros históricos muito extensos,ricos em patrimônio arquitetônico e
urbanístico, mas ao mesmo tempo extremamente degradados, apostaram na requalificação destas áreas para se
reapropriar deuma parte fundamental do próprio tecido urbano e se posicionar novamente no circuito urbano
global. O diferente contexto sócio-politico-econômico e os diferentes resultados obtidos demostram como a
eficácia de uma política urbana de requalificação não possa desconsiderar as especificidades de cada âmbito de
aplicação, requerendo posturascríticas e atentas análises para cada situação.
Palavras-chaves: Requalificação deCentros Históricos. Programa Comunitário Urban. Palermo.Gênova
ABSTRACT
This paper presents the experience‟ s result of the European Union Urban Programme in the historic city centres
renovation of two Italian cities, Palermo and Genoa. It‟s an example of integrated urban policy, involving several
aspects – economic, cultural, socio-environmental –, enacting in various levels of administration and pursuing the
participatory effect. The Urban Programme scheduled the regeneration of urban areas with high decline levels,
and problems of social and economic integration. It has been applied in many peripheral areas of European cities,
but was also implemented in some historic city centres showing decline and marginality conditions like urban
suburbs. Palermo and Genoa benefited from the Urban Programme funding in different times and phases. They
had large old town centres very degraded, but yet with rich architectonic and urban heritage, and bet on their
requalification to recover an important part of the city structure and get back to the global circuit. The different
socio-political-economic context and the different results show how the effectiveness of an urban regeneration
policy needs critical attitude and deep analysis for every situation, and can‟t ignore the specificity of all the
application areas.
Keywords: Historic Centres‟Regeneration.Communitarian Urban Programme.Palermo. Genoa.
1
1. INTRODUÇÃO
O tema da requalificação dos centros históricoscomeçou a ganhar vigor a partir da década
de „60, quando o interesse para a preservação do patrimônio histórico e artístico se ampliou
em decorrência de um novo conceito de monumento histórico, codificado internacionalmente
pela Carta de Veneza, passando a compreender não somente o exemplar arquitetônico
isolado, mastambém o conjunto urbano, “mesmo modesto, testemunho de evoluções,
civilizações ou acontecimentos históricos” (VASCONCELOS; MELLO, 2006, p.58)1.
Desde aquela época começaram a surgir - em contraposição às precedentes praticas de
demolição de extensas áreas da cidade para fins de expansão e/ou substituição de usos e
edificações
-planos
urbanísticos
voltados
à
recuperaçãodos
centros
urbanos,
identificadosfrequentemente, sobretudonas cidades europeias,com os centros históricos, (ou
seja, os núcleos fundacionais das cidades), refletindo as diferentes ideologias, as posturas,
os interesses políticos e econômicos da classe dominante, caraterísticas de cada período.
A partir dos anos „70, o novo sistema de acumulação flexível, a segmentação do mercado, a
evolução dos meios de comunicação permitiu que o território se transformasse em
mercadoria; a globalização mudou o conceito de cidade, que através da espetacularização
dos seus espaçosse tornou um meio de atrair capital e pessoas.
Conforme VARGAS(2006, p.32), “O capital imobiliário e o poder público tornaram-se
grandes parceiros nesse processo; [...] juntos adotaram os princípios do planejamento
estratégico e introduziram as técnicas de city marketing” para vender a imagem renovada da
cidade, tornando-a assim competitiva no mundo globalizado. Assim como muitas outras
áreas desvalorizadas das cidades, os centros históricos, em muitos casos abandonados e
degradados, se tornaram objetos de uma série de programas de recuperação que, porém,
perseguindo na maioria das vezes exclusivamente o viés econômico e turístico, os
cristalizaram em cenários urbanos fictícios, parques temáticos históricos. “Nessa direção,
são valorizados os lugares geográficos, os elementos arquitetônicos e urbanos, em
detrimento do conteúdo social“ (VARGAS, 2006, p.3).
A experiência bem sucedida da recuperação do centro histórico de Bolonha, no inicio da
década de „70, que inspirou muitas outras sucessivas intervenções em vários centros
históricos italianos e europeus, mostrou ao contrario um exemplo de estruturação urbana
integrada, “um programa ao mesmo tempo urbanístico e social, um processo destinado a
ser
realizado
diretamente
por
todos
os
cidadãos
e
não
só
por
alguns
2
intelectuais”(CERVELLATI, SCANNAVINI, 1979, p.125).
Cervellati e Scannavini, autores do plano de recuperação do centro histórico de Bolonha de
1969, sustentam que
não se pode definir uma politica de centro histórico autônoma e marginal à politica
econômica e territorial mais geral e que è necessário unir os fenômenos de natureza
econômica e social, que constituem a realidade dentro da qual se está operando
com os aspectos da conservação e da valorização(CERVELLATI, SCANNAVINI,
1979, p.120).
À distância de muitos anos, em época e contextos políticos, sociais e econômicos
diferentes, a necessidade de atrelar as problemáticas sociais às preocupações urbanísticas
no planejamento urbano è ainda muito sentida. (GAGLIARDI, 2011)
A partir dessas últimas considerações, este trabalho, desenvolvido no âmbito da Disciplina
“Centros Históricos”, ofertada pelo Programa de Pós-graduação da FAUFBA em 2011,
procura apresentar a experiênciado Programa de Iniciativa da União Europeia,
denominandoUrban, no processo de requalificação dos centros históricos de duas cidades
italianas, Palermo e Gênova, como exemplo de política urbana integrada, possível
alternativa às políticas de regeneração urbana, interessadas exclusivamente no retorno
financeiro das intervenções urbanas.
Palermo e Gênovabeneficiaram em tempos e fases diferentes dos financiamentos europeus
destinados ao Programa Urban: dotadas de centros históricos muito extensos e de origem
muito antiga, surgidos e desenvolvidos ao longo de muitos séculos em volta das áreas
portuárias, ricos em patrimônio arquitetônico e urbanístico, mas ao mesmo tempo
extremamente degradados, apostaram na requalificação dos próprios centros históricos
como elemento necessário para recuperar o antigo esplendor e se posicionar novamente no
circuito global das grandes cidades mundiais.
Odiferente contexto sócio-politico-econômico em que o Programa Urban foi aplicado nas
duas cidades e os diferentes resultados obtidos demostram como a eficácia de uma política
urbana de requalificação não possa ser avaliada desconsiderando as especificidades de
cada âmbito de aplicação, requerendo uma postura crítica e uma atenta análise de cada
caso.
2. O PROGRAMA DE INICIATIVA COMUNITÁRIAURBAN
Nos tempos atuais as cidades representam cada vez mais um espaço crucial da economia
3
global, concentrando a metade da população mundial e 75% dos recursos naturais
mundiais. As cidades europeias, principais motores do crescimento, concentram a maior
parte da riqueza, do conhecimento e das tecnologias da Europa, mas ao mesmo tempo
apresentam alguns dos mais graves problemas da sociedade atual: carências múltiplas,
exclusão
social
e
econômica,
degradação
do
ambiente
natural
e
construído,
congestionamento, criminalidade, intolerância, racismo, e perda do sentimento de
comunidade. As mudanças ocorridas ao longo das últimas três décadas, deflagradas a partir
dos processos de globalização e de integração comunitária, por um ladoastêm aproximadas
tornando-as mais parecidas, por outro tem acentuado as diferencias preexistentes.
(DIREÇÃO-GERAL DA POLÍTICA REGIONAL, 2003)
A partir dos anos „90, o reconhecimento desse novo quadro por parte da União Europeia
levou a política urbanapara o centro dos esforços da União com o intuito de criar uma
Europa forte, competitiva e sustentável, salvaguardando ao mesmo tempo a coesão social.A
coesão econômica e social (e hoje também territorial) se tornou um dos principais objetivos
da União Europeia a ser implementado através da assim chamadaPolítica de
Coesão,instrumento privilegiado para a sua realização.2
No âmbito desta política, que visa promover a coesão económica e social através da
redução das disparidades entre Estados-Membros e regiões e representa a maior fonte de
apoio financeiro ao investimento no crescimento e emprego3, três são os objetivos
perseguidos:
a
dotação
de
infraestruturas
básicas,
em
termos
de
transportes,
telecomunicações, formação, educação, saúde, água, energia e tratamento de resíduos,
além do incentivo à atividade econômica e empresarial; a reconversão econômica e social
de áreas que se defrontam com dificuldades estruturais, como áreas industriais ou zonas
urbanas em dificuldade; a modernização dos sistemas de formação, a promoção de
emprego e o combate à exclusão social.
Neste contexto se inserem uma série de iniciativas comunitárias de caráter regional e social,
entre as quais, em tema de política urbana,emerge o Programa Urban,financiado com
recursos dos Fundos Estruturais da União4, que tem o objetivo de recuperar áreas urbanas
“em crise", ou seja, áreas com altos níveis de degradação e problemas de integração social
e económica, frequentemente associados a uma concentração de minorias étnicas.
A política do programa è concentrar recursos em favor destas áreasdesfavorecidas,
determinadas pelos Estados-Membros,apoiando projetos já emergidos a nível local que
4
enfrentem globalmente as problemáticas sociais, econômicas e ambientais das áreas
individuadas, apoiandoas atividades econômicas locais, a melhoria das infraestruturas e do
ambiente, a formação personalizada e ações em favor das classes sociais mais frágeis.
Enfim, o programa se propõe como o catalizador do desenvolvimento local através da
realização de projetos pilotos que visam melhorar, de maneira duradoura, as condições de
vida dos habitantes dos bairros socialmente degradados.
Lançada em 1994,aprimeira fase do programa,Urban I (1994-1999), teve como objetivo
geralapoiar a revitalização e requalificação das áreas urbanas europeias com fortes sinais
de depressão e degradação, com problemas de declínio económico e urbano, desemprego
e deterioração da qualidade de vida e acumulação de fenómenos de exclusão social e
insegurança pública.
O programa visava projetos de recuperação de infraestruturas, criação de postos de
trabalho, combate à marginalização social e requalificação ambiental. Cento e dezoitos
cidades europeias beneficiaram de mais de 900 milhões de euros de financiamentos
comunitários; dentre elas, 16 cidades italianas, a maioria das quais localizadas no sul, a
área menos desenvolvida do país.
Embora o programa se referisse especificamente aáreas desfavorecidas que na maioria dos
casos coincidem com as periferias das grandes cidades, no caso das cidades do sul da
Itália5,Urban I foi implementado nos centros históricos destas cidades, que apresentavam
condições de degrado e marginalidade tanto quanto as áreas fisicamente periféricas. Entre
elas a cidade de Palermo, na região da Sicília, beneficiou dos recursos financeiros europeus
para uma vasta área do seu centro histórico.
No período 2000-2006 foi criada a segunda etapa do programa, Urban II, tendo como
objetivos: a promoção da melhoria da qualidade de vida das populações de centros urbanos
ou de subúrbios em crise das grandes cidades, através da formulação e da aplicação de
estratégias inovadoras de revitalização socioeconômica sustentável;a promoção do
desenvolvimento e o intercâmbio de conhecimentos sobre a revitalização e o
desenvolvimento urbano sustentável.
Tendo como base a experiência do Urban I, aportaram-se significativas melhorias ao
programa: simplificação administrativa, rede de intercambio de experiências e grande ênfase
nas parcerias locais.
5
Nesta fase, o programa focou projetos de revitalização econômica e social e a constituição
de uma rede de cidades para a troca de experiências, beneficiando 70 áreas desfavorecidas
da União, com uma contribuição de 730 milhões de euro. As cidades italianas que
beneficiaram dos recursos do Urban II foram dez, espalhadas em todo o território nacional.
Entre elas, Gênova, que foi a única cidade italiana a beneficiar-se das duas fases6, nesta
segunda etapa privilegiou a área do seu centro histórico no qual, já há alguns anos, tinha-se
começado um importante processo de recuperação.
3. O PROCESSO DE REQUALIFICAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE
PALERMO: A APLICAÇÃO DO PROGRAMA URBAN I
A maioria dos centros históricos das cidades do sul da Itália apresentam fortes contrastes:
por um lado uma ampla riqueza de valores históricos e culturais, uma grande concentração
de edifícios monumentais e históricos, uma complexa e dinâmica estrutura físicatestemunha
de profundas estratificações, por outro uma forte degradação física dos edifícios, graves
condições de marginalidade social dos seus habitantes, um acentuado processo de
esvaziamento populacional, a progressiva perda de atividades produtivas e a ineficácia das
politicas públicas. (CANNAROZZO, 2006)
Se estas últimas caraterísticas são associadas geralmente às periferias urbanas das
grandes cidades europeias,o centrohistórico de Palermo pode ser considerado ainda uma
área periférica;a sua centralidade física,herançados processos históricos de crescimento da
cidade,
deve
ser
ainda
construída
em
relação
ao
atual
contexto
urbano
e
territorial(ORLANDO, 2006).
Apesardisso, o centro, grande contentor da históriada cidadeno interior do qual è ainda
possível ler a convivência de vários traçados urbanos7, com suas ricas arquiteturas
monumentais nas quais se fundem diferentes sistemas culturais e artísticos8,é o ponto de
partida para o reconhecimento da identidade da cidade, continuando a comunicar a imagem
de uma grande capital.(CANNAROZZO, 2006)
O centro histórico,ou seja, a área incluída dentro do traçado das muralhas quinhentistas que
se estende por 250 ha com uma população de 30.000 habitantes, è dividido em quatro
quadrantes, chamados Mandamenti9,de extensão parecida, que se estendem entre o mar e
as colinas. Eles sãodivididos por dois eixos viários, um mais antigo, o Cassaro,("alquasr", ou
seja castelo fortificado,que dava o nome ao bairro do Castelo, construído durante a
dominação árabe no sec. IX)que atravessava em direção Leste-Oeste toda a cidade
6
medieval ligando o velho porto com o Palácio Real, outro, a via Maqueda, perpendicular ao
Cassaro, aberto no século XVII durante a dominação espanhola, símbolo da cultura barroca
que celebrou assim uma nova Forma Urbis, redefinindo a identidade da cidade histórica.
Ao longo destes dois eixos ainda hoje è possível ler a história da cidade através dos
inúmeros edifícios, palácios, igrejas e conventos, ricos em estratificações arqueológicas e
arquitetônicas, que aqui se localizam e que testemunham a identidade cultural multiétnica da
cidade entre Islã, Oriente Médio e Cristandade. Eles influenciaram a história e o crescimento
da cidade determinando também as diretrizes de expansãoextramoenia.
O território do centro histórico de Palermo coincide com a primeira e a menos extensa da
cidade das oito Circoscrizioni10 que constituem o território municipal, embora apresente os
índices mais altos de densidade populacional. O 40% da sua superfície è ocupada por
edifícios residenciais, enquanto 33% è ocupado por ruas, praças e espaços públicos.
(GIAMBALVO, LUCIDO, 2011)
Embora o processo de degradação do centro histórico tenha começado já a partir do século
XIX11, foi só depois da II Guerra Mundial, quando o centro foi gravemente bombardeado,
que ele sofreu uma forte degradação econômica e social12, com o progressivo abandono,
forçado ou espontâneo, por parte da população residente13, o consequente fechamento de
inúmeras atividades comerciais, e a inexorável transformação do lugar em área de
marginalidade, lugar privilegiado de atividades ilícitas e criminalidade organizada.
Embora a situação de extrema degradação física, econômica e social énessa área da
cidade que, ainda hoje, muitas instituições públicas culturais e de governo têm a própria
sede14.
Nas últimas décadas, a onda migratória de populações norte-africanas e asiáticas tem
reduzido o processo de esvaziamento do centro histórico, levando também a abertura de
pequenas atividades comerciais15; por outro lado, porém, a instalação dessas populações no
centro, devido à falta de politicas sociais eficazes, tem agravado as condições de
marginalidade social e degradação físicas dos edifícios, além de alimentar a criminalidade
organizada que infelizmente, na Sicília, possui raízes bem profundas.
A recuperação do centro histórico de Palermo começouem 1993 quando a Região
Sicíliaaprovouo Piano ParticolareggiatoEsecutivo (PPE) do Centro Histórico, encomendado
pelo governo local de esquerda a L.Benevolo e P. Cervellati, autores do mais famoso plano
7
de recuperação do centro histórico de Bolonha de 1969.
O plano se configurava como um instrumento urbanístico de dupla valência, normativa e
executiva; baseado na análise da tipologia edilícia e, portanto no conhecimento histórico e
do patrimônio edilício da cidade, visava regulamentar a conservaçãodo centro históricoem
todos os seus elementos, prevendo a conservação do tecido urbano e dos edifícios e
levando em consideração as diferentes fases históricas, os hábitos da população que ali
morava e a adequação às exigências funcionais contemporâneas e do entorno. Através de
uma atenta análise das categorias tipológicas individuadas, o plano determinou as diferentes
tipologias de intervenção que iam desde o restauroaté a reconstrução.
Além de intervenções físicas sobre o patrimônio edilício, o plano previa a volta de 50.000
habitantes ao centro da cidade, o incremento das atividades comerciais e artesanais, a
promoção de atividades culturais e de serviços, a proteção da população residente e das
atividades radicadas no centro histórico. (CANNAROZZO, 2006)
No mesmo ano, a lei regional 25/93 instituiu financiamentos e incentivos fiscais para a
recuperação de imóveis degradados no centro histórico, disciplinando os editais através dos
quais a Prefeitura de Palermo geriu a concessão de financiamentos regionais para as
intervenções privadas. A lei previa também que a Prefeitura da cidade potenciasse e
reorganizasse um Escritório Técnico para o centro histórico seja para a elaboração de
projetos em áreas e edifícios públicos, seja para a instrução e a fiscalização das
intervenções privadas, estabelecendo critérios de intervenção para o reuso do patrimônio
público (o assim chamado Piano d’uso, aprovado em 1994)
Em 1994, apenas um ano depois da aprovação do PPE, Palermo se candidatou ao
ProgramaUrban I, para a revitalização de uma área do centro correspondente aos dois
Mandamenti- Tribunalie Castellamare, aberta em direção ao mar, de extensão de 112
hectares (pouco menos da metade da superfície total do centro) e com uma população de
11.000 habitantes.A área foi escolhida pela particular situação de degradação e abandono
do tecido social, edilício e ambiental. (Fig.1)
8
Fig.1 – Mapa do Centro Histórico de Palermo evidenciando os dois âmbitos de atuação do
Programa Urban I
Fonte: http://www.unipa.it/ignazio.vinci/Pdf_09010/SIT_09010_Vinci_02.pdf
O programa propôs um conjunto integrado de ações diretas à melhoria das infraestruturas e
do ambiente, ao desenvolvimento econômico e à integração social, através da aplicação de
cinco medidas:

Medida 1 - Apoio as pequenas e media empresas existentes e incentivos para o
surgimento de novas atividades econômicas: através da representação de
manifestações artístico-culturais nos sítios históricos dos dois Mandamenti; de ações
em favor das estruturas teatrais presentes e a revitalização dos laboratórios teatrais;
de intervenções para a requalificação da dotação de carroças existentes e a
revitalização das atividades econômicas conexas; de ações de promoção turística e
cultural do bairro por meio de empresas especializadas.

Medida 2 - Promoção e apoio à criação de empregos a nível local: através da criação
de cursos de formação para profissionais especializados no uso de técnicas e
praticas de restauro do patrimônio arquitetônico; oficinas para a formação de
9
trabalhadores da construção civil; cursos para diretores de orquestra e musicistas
jazz; cursos de formação para operadores no campo empresarial, comercial e
turístico.

Medida 3 - Reforço e adequação da oferta de serviços sociais: através de ações de
assistência aos emarginados, menores e drogados; a recuperação de espaços
urbanos higienicamente degradados; a otimização de sistemas de coleta de lixo; a
recuperação de áreas verdes publicas.

Medida 4 - Melhorias das infraestruturas e do ambiente: através da valorização do
patrimônio arquitetônico e urbano; a realização de intervenções para a melhoria do
transito no interior da área interessada; a criação de ilhas de pedestres e áreas de
estacionamento arborizadas; implementação de ações voltadas à instalação de
novos equipamentos tecnológicos para a economia de energia nos edifícios do
centro histórico da área UrbanI

Medida 5 - Promoção e difusão dos resultados: através de ações de planejamento
estratégico, ideação, coordenação técnica e relações com o público; projetação
executiva, controle dos resultados e relações com as mídias; produção de materiais
promocionais (audiovisuais, websites, material tipográfico, High memorycard, placas
informativas, estruturas expositivas, reportagem fotográficos, mailing); controle dos
indicadores e monitoramento (pesquisas e elaborações estatísticas); compra de
espaços publicitários na Tv, no radio, jornais, revistas especializadas, meios de
transporte público, aeroporto; encontros, congressos, seminários e viagens.
As ações de UrbanIse concentraram numa área limitada entre os dois MandamentiTribunali
e Castellamare, o bairro LaKalsa, que resume em si os principais elementos da história
urbana e social da cidade e das dinâmicas atuais de transformação16.
Como todo aconteceu em todo o centro histórico da cidade, depois da II Guerra mundial,
décadas de degradação e abandono causaram a deterioração de edifícios, palácios e
monumentos históricos com a consequente perda de população. Nos anos „80 até os
primeiros anos „90, o bairro e o seu entorno se tornaram uma área totalmente arruinada,
sem iluminação e serviços públicos básicos; uma área habitada por camadas sociais muito
baixas, ocupadas em atividades entre legalidade e ilegalidade, dominada por algumas
“famílias” que mantinham em vida a economia do bairro, regulando as relações com os
políticos locais.
10
No seu programa de regeneração urbana, Urban I identificou “o sistema integrado do bairro
LaKalsa” como uma nova “centralidade urbana”. Nessa área foram realizadas importantes
ações de recuperação urbanística e de restauro arquitetônico com a finalidade explicita de
atrair investimentos, turistas e novos residentes; foram criados centros sociais de bairro e
sedes descentradas de serviços públicos; foram atuadas reformas de habitações sociais
através de financiamentos facilitados e regulamentos municipais para favorecer a
intervenção privada tentando conter o fenômeno da especulação imobiliária.
Dentro das cinco medidas programáticas,Urban I previu nesta área a promoção do
Progettol’isolachec’è, uma unidade de serviços específicos dirigidos às famílias. A sede para
as atividades se localiza no ex Mosteiro das Carmelitas e inclui um centro diurno para
idosos, uma brinquedoteca para menores, uma creche, um Banco do Tempo, um refeitório,
um centro de agregação para mulheres, um laboratório teatral. Além dessas atividades foi
inserido um laboratório de bordado Ric’amando Palermo, um projeto destinado a vinte
quatro jovens mulheres do bairro LaKalsa.
4. O PAPEL DO PROGRAMA URBAN II NA REQUALIFICAÇÃO DO CENTRO
HISTÓRICO DE GÊNOVA
Como Palermo, Genova, localizada no norte da Itália, è uma cidade portuária de origem
muito antiga, que se desenvolveu ao longo dos séculos em volta do seu antigo porto.
Caraterizado por um tecido urbano medieval de grande densidade edilícia17, o centro
histórico se estende por uma superfície de aproximadamente 113 hectares, tendo uma
população de cerca de 23.000 habitantes.
Essa área possui um patrimônio habitacional muito antigo, com uma elevada percentual de
unidades habitacionais que ao longo do tempo não foi adequada às exigências funcionais
contemporâneas, sendo desprovida, por exemplo, de banheiro e de sistema de
aquecimento. Devido às caraterística urbanas do tecido medieval, a escassez de espaços
públicos18tornou difícil a instalação de infraestruturas e serviços públicos adequados aos
padrões contemporâneos.
A partir do final do século XIX, com a expansão da cidade fora dos muros, o surgimento de
novos bairros mais salubres, o desenvolvimento de novas indústrias e a construção de um
novo porto mais eficiente, começou o processo de abandono do centro antigo, levando
gradativamente a uma degradação física do seu patrimônio arquitetônico e a uma
desestruturação do seu tecido econômico e social. A deterioração e a consequente
11
desvalorização dos imóveis levaram, ao longo do século XX, a um processo de
esvaziamento daárea central da cidade e a uma gradual substituição do tecido social
historicamente instalado, favorecendo, na primeira metade do século, a instalação dos
migrantes pobres do sul da Itália, já substituídos,a partir dos anos 90, pelos novos
migrantes, especialmente oriundos da África e América do Sul.(GAGLIARDI, 2011)
O processo de marginalização que caracterizou essa área da cidade, acentuado também
pela proximidade à zona portuária, determinouuma serie de problemas de ordem social que,
a partir dos anos „80, tornaram o centro um espaço de criminalidade, distanciando-o do resto
da cidade.Apesar dessas transformações, essa área possui ainda características e valores
únicos que marcam a identidade da cidade: um notável patrimônio arquitetônico e conjunto
urbanoque conta a história da cidade e que possui um forte potencial de atração turística, a
presença de importantes estruturas culturais e educativas e de instituições de governo que
no centro têm a própria sede, a facilidade de acesso aos principais serviços urbanos e ao
sistema de transporte público, a convivência de funções e classes sociais diferenciadas.
Com o intuito de enfrentar os problemas socioeconômicos que se abateram sobre a cidade,
em particular sobre a sua área central, Gênova deu inicio, a partir dos anos „90, a uma série
de intervenções que ao longo destes últimos 20 anos permitiram recuperar uma parte
considerável do seu centro histórico.
A ocasião para o inicio do processo de requalificação foram as “Colombiane” em 1992, ou
seja, as Comemorações para o V Centenário da descoberta das Américas, para as quais foi
recuperada uma grande área do antigo porto, através de intervenções arquitetônicas de
escala monumental/espetacular que renovaram a imagem da cidade, recolocando-a no
cenário internacional. A recuperação do waterfront, com a criação de novos espaços
culturais e de lazer, aproximou novamente a cidade ao mar e ao centro históricoabrindo o
caminho para a realização de outros grandes eventos e para as sucessivas intervenções de
recuperação do centro histórico.
O Encontro do G8 em 2001 e Genova Capital da Cultura em 2004 permitiram arrecadar uma
considerávelquantidade de recursos, indispensáveis para dotar essa área da cidade de
infraestruturas urbanas importantes e começar o processo de requalificação do antigo
centro.Junto aos grandes eventos,Gênova se mostrou pronta para aproveitar as numerosas
ocasiões de financiamentos (nacionais e europeus) que se apresentaram a cavalo do
novomilênio (FERRARI, 2008)
12
A partir dos primeiros anos „90, as instituições publicas apostaram na requalificação do
centro histórico da cidade que se tornou objeto de inúmeros programas urbanísticos: foram
realizadas obras de urbanização primária e secundária, provisão de moradia – construção,
recuperação e subvenção do Estado para facilitar o acesso aos imóveis – e de serviços
públicos, mas ao mesmo tempo foram implementadas ações para a geração de emprego e
renda, restauro do patrimônio arquitetônico e valorização do sistema de museus da cidade,
levando à inclusão de uma área do centro histórico na lista do patrimônio mundial19.
Em novembro de 2001 foi aprovado o Programa de Iniciativa Comunitária Urban II, com um
financiamento do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional – FESR – de cerca de 30
milhões de euros, para sustentar estratégias de requalificação urbana da inteira área do
centro histórico (Fig.2), através da integração de intervenções de natureza física,
socioeconômica e cultural.
O objetivo do programa, tendo em vista também o grande evento Genova Capital Europeia
de 2004, foi a reconquista do centro histórico para que se tornasse novamente o núcleo vital
da cidade, melhorando as condições de vida da população residente e a acessibilidade para
os turistas.
Fig.2 – Mapa do Centro Histórico de Genova ilustrando os âmbitos de atuação de alguns dos
programas de recuperação da área central e do antigo porto. Fonte:
http://www.urbancenter.comune.genova.it/node/257
As ações do programa foram agrupadas em quatro eixos prioritários:
13
Eixo 1 – Valorização e requalificação urbana: voltado para a melhoria da qualidade de vida
por meio da realização de espaços públicos agradáveis e seguros e da valorização do
patrimônio histórico, artístico e arquitetônico. As intervenções principais interessaram o
bairro Galata, na área do antigo porto, com a recuperação de um edifício histórico e a
instalação no mesmo do Museu do Mar e da Navegação; reformas, melhoria das
infraestruturas subterrâneas, recuperação de pavimentações urbanas e de espaços públicos
da área central, em particular na Piazza Statuto.
Eixo 2 – Revitalização socioeconômica e cultural: voltado para a melhoria da situação
econômica, das condições de moradia e da segurança dos espaços públicos, junto à
sustentação de faixas sociais mais frágeis. As ações foram dirigidas: ao reforço da
segurança, através da instalação de sistemas de vigilância com câmeras, fechamento de
becos sem uso, instalação de espaços para coleta de drogas injetáveis; à realização de
serviços para menores, idosos e imigrantes, como a instalação de serviços públicos
(creches, ambulatórios, Drop-in) e a criação de centros sociais educativos; ao apoio às
atividades econômicas, através de incubadoras de empresas, financiamentos às empresas
já existentes ou concessões para aquelas que querem abrir a própria sede no centro
histórico, favorecendo assim a criação de novos postos de trabalho.
Eixo 3 – Ambiente e mobilidade: voltado à melhoria do transporte alternativo, como
elevadores e funiculares, para garantir uma melhor conexão entre o centro histórico e a
cidade e à melhor gestão dos resíduos. Entre as obras realizadas com esses objetivos se
colocam a reativação do elevador de Montegalletto, a experimentação de pontos equipados
para a coleta seletiva de lixo sólido urbano, a pavimentação com calçamento tradicional e o
tratamento das canalizações subterrâneas de alguns percursos históricos.
Eixo 4 – Assistência técnica, informação e divulgação:voltado à promoção de uma
campanha de comunicação para a publicização dos projetos realizados, difundindo as
problemáticas destacadas e os resultados obtidos com o Programa. (GAGLIARDI, 2011)
Como já evidenciado, além das inúmeras intervenções físicas no patrimônio arquitetônico e
urbano, realizadas em conjuntocomoutros programas, Urban II investiu na requalificação do
tecido socioeconômico do centro com a finalidade de devolver à população o antigo núcleo
da cidade, caído há varias décadas numa condição de estremo degrado, estimulando nela
um novo senso de pertencimento. A sua estratégia visou impactos imediatos, mas ao
mesmo tempo, perseguiu o objetivo de
14
produzir efeitos de continuidade e manutenção no tempo, através de uma
reconquista progressiva do âmbito em questão, operando em uma escala reduzida,
no nível de bairro ou de um quarteirão e mediante uma programação voltada às
suas caraterísticas especificas e exigências particulares”. (GAGLIARDI, 2011,
p.133).
Nesta visão é significativa uma pequena intervenção que pode ser tomada como
representativa das logicas que sustentaram as intervenções do programa Urban II no centro
histórico de Genova, no período entre 2001 e 2006: a requalificação dapiazzettadi Vico
Indoratori, atualmente chamada depiazzadei Ragazzi.
Graças à colaboração entre público e privado, a praça voltou à vida, se tornando um espaço
de lazer e de convívio, de encontro e de jogo. No lugar dos escombros de um edifício
bombardeado durante a II Guerra Mundial, nos anos „80 foi realizado uma pequena área de
verde público, que, devido à incúria e ao abandono, cedo se transformou em espaço
degradado. A Prefeitura, através de Urban II, propôs uma intervenção de requalificação da
praça com o objetivo de estimular a criação de um grupo espontâneo de cidadãos
interessados na gestão daquele espaço. Nasceu assim uma Associação, sem fins lucrativos,
realidade ativa no território desde 2008, que através de atividades recreativas, artísticas e
culturais20, permite à população, especialmente aos residentes, apropriar-se e desfrutar
daquele espaço. A parceria entre público e privado, com a abertura de um pequeno
restaurante, contribuiuno processo de requalificação, pois aliou à função comercial aquela
social oferecendo uma maior segurança e usabilidade do território.
5. CONCLUSÕES
O Programa Urban, desde a sua primeira fase na segunda metade dos anos ‟90, revelou-se
um válido exemplo de política urbana, entendida esta última no sentido mais amplo do
termo, como integração de ações politicas e urbanísticas, operadas por uma pluralidade de
atores públicos e privados, tendo como objetivo a transformação e o governo do território.
Ao retratar do programa Urban e da sua aplicação nos centros históricosde Palermo e
Genova, emerge nessas paginas aespecificidade de Urbanem relação a outras políticas
urbanas e aos outros instrumentos existentes em vários níveis: ela reside no fato de ser um
programa integrado, onde a palavra integração deve ser considerada sob diferentes pontos
de vista. A integração que caracteriza o programa diz respeito ao fato que, ao perseguir seu
objetivo, ele abarca numerosos aspectos considerando-os como as diferentes partes de um
todo: o desenvolvimento econômico, a atenção às problemáticas socioambientais, a
mobilidade sustentável e as temáticas culturais.
15
Sua integração também diz respeito à forma de atuação, já que diversos níveis
administrativos contribuem para a definição da programação e para sua execução:
Comunidade Europeia, Estado, Região, Município. Além disso, pelo fato de definir escalas
reduzidas de intervenção, persegue-se o elemento participativo, seja na relação com as
organizações
da
sociedade
civil,
como
também
na
relação
com
os
cidadãos
individualmente.
Embora o programa tenha sido reconhecido em âmbito internacional como um valido
exemplo de política urbana, o seu sucesso deve ser avaliado considerando a especificidade
de cada caso, nem sempre alcançando os resultados previstos.
No caso de Palermo a aplicação do Programa Urban I tem acontecido logo depois a
aprovação de um ótimo instrumento urbanístico estudado especificadamente para o centro
histórico, o PPE de 1993, sem o qual teria sido impensável estudar e elaborar um projeto
piloto para uma área do centro histórico. Urban se inseriu, portanto, no âmbito de uma mais
ampla programação de ações, começadas pela Administração local de Palermo, que viu na
recuperação do centro histórico um momento fundamental para a renascença da cidade.
Além disso,o sucesso do programa que integra ações físicas de recuperação do patrimônio
edilício a ações de recuperação do tecido socioeconômico, tem sido possível graças à
tomada de consciência por parte da classe política local das reais problemáticas de
degradação que caracterizavam o centro histórico naquele momento e da coesão e da
capacidade da administração local e dos técnicos envolvidos, na elaboração dos programas
de intervenções (SANSEVERINO, 2009).
Infelizmente, a mudança politica na administração política da cidade a partir de 2001 de fato
eliminou a finalidade social das intervenções de requalificação do programa Urban,
marcando uma ruptura em relação à estratégia da precedente administração. Hoje, depois
de quase 20 anos das primeiras intervenções, o bairro daKalsa, onde se concentraram a
maioria das intervenções de Urban Ié profundamente mudado: embora o processo de
requalificação do patrimônio arquitetônico e urbano seja ainda em andamento, e haja ainda
muito a se recuperar, a área se tornou um dos lugares símbolo da cidade, graças a abertura
de numerosos bares, restaurantes, hotéis, centros culturais e atrações turísticas.
Por um lado a experiência da Kalsa aparece como um dos típicos exemplos de makeup
urbano, com as consequentes transformações em termos de composição social da
16
população residente, de tipologias de usuários e funções urbanas; por outro, estas
transformações não têm levado à expulsão automática dos antigos moradores, nem têm
eliminado completamente as preexistentes logicas de gestão informal do território. As
dinâmicas da gentrification se inseriram num território com caraterísticas específicas
próprias, no interior de equilíbrios consolidados num sistema até aquele momento fechado,
introduzindo novos dinamismos na economia do bairro e turbulências nos mecanismos de
gestão informal da ordem e do território. (GIAMBALVO, LUCIDI, 2011)
As transformações descritas estimularam a oferta de serviços legais, informais e também
ilegais geridos pelos residentes históricos, regenerando assim uma economia privada
escondida que vai desde a regulamentação abusiva das poucas áreas de estacionamento
atéà gestão de pontos comerciais sem licença, ou à venda de drogas.
No caso de Gênova, o sucesso da recuperação do centro histórico se deve a um conjunto
de elementos e fatores entre os quais o Programa Urban II jogou um papel determinante, se
tornando um modelo operativo para os outros programas e intervenções de requalificação
territorial que foram e ainda estão sendo atuadas na área central da cidade.A grande
quantidade de recursos financeiros arrecadados através da realização dos Grandes
Eventos,que a cidade sediou a partir de 1992, foi fundamental para realizar muitas
intervenções no centro histórico de Gênova, mas a atuação da administração local
contribuiu em maneira decisiva para o sucesso do inteiro processo. A colaboração entre os
vários entes envolvidos, em todos os níveis, a manutenção da equipe de profissionais que
atou nesse processo nos últimos anos, as escolhas do poder públicopara a requalificação da
área central da cidade privilegiando uma integração entre programas que atuavam
contemporaneamente na área urbana, econômica e social, permitiram a redescoberta, por
parte dos genoveses, do próprio patrimônio artístico-cultural e uma nova apropriação do
centro da cidade.
Embora a presença de processos de gentrification em algumas áreas do centro histórico que
tiveram de fato uma forte valorização imobiliária e uma pressão sobre os moradores,
programas como Urban II tentaram minimizá-losproduzindo ações voltadas à realização de
programas de habitação popular, ao envolvimento da população, dos comerciantes e dos
empreendedores para a reconstrução da vida econômica e social do lugar, à implementação
de atividades de inserção de diferentes grupos étnicos no mercado de trabalho e na vida
cultural da cidade.
17
A escala reduzida ao nível de quarteirão e a tipologia das intervenções voltadas à
construção de uma qualidade urbana, que gera também turismo e valorização da cidade,
através do uso de estratégias que pensam na resolução de problemas econômicos e
sociais, mais do que no retorno financeiro, mostram,através do exemplo de Gênova,
umapossível alternativa a programas de requalificação de centros históricos que os
consideram cenários fictícios, desvinculados do resto da cidade, transformando-os em
parques temáticos, espaços-mercadoria a serem vendidos no mundo.
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Notas
1
A Carta de Veneza de 1964 afirma no art.1 que “O conceito de monumento histórico engloba, não só as
criações arquitetônicas isoladamente, mas também os sítios, urbanos ou rurais, nos quais sejam patentes os
testemunhos de uma civilização particular, de uma fase significativa da evolução ou do progresso, ou algum
acontecimento histórico”
2
O Ato Único Europeu de 1986 deu um novo impulso à política social, tornou a coesão económica e social numa
nova competência da Comunidade e fixou os seus objetivos e meios.
3
Através dos três Fundos: FEDER, FSE e Fundo de Coesão.
4
O Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional “FEDER”, e o Fundo Social Europeu “FSE”
5
Palermo, Bari, Napoli, Salerno, Lecce, Cosenza, Catania, Siracusa e Cagliari
19
6
A área escolhida pelo Programa Urban I em Genova corresponde aos bairros “Cornigliano” e “SestriPonente” na
zona oeste da cidade, caraterizada pela presença de áreas industriais e grandes infraestruturas nas
proximidades de áreas residências, além de elevados índices de desemprego.
7
Desde o púnico-romano, até o medieval, o árabe e o barroco.
8
Especificadamente o Islâmico e o Cristiano.
9
Os quatro Mandamenti são: Monte diPietà, Castellammare, PalazzoReale e Tribunali.
10
Unidades administrativas nas quais é dividido o território municipal
11
Com o abandono dos grandes palácios nobres pela aristocracia em plena crise econômica e a mudança da
nascente burguesia em novas áreas de expansão, o centro começa a ser gradativamente habitado por camadas
de população de mais baixa renda e nível social: pequena burguesia e proletariado. A falta de manutenção dos
edifícios, o aumento da população residente e a precariedade das condições higiênicas aceleram a degradação
física dos edifícios.
12
O êxodo da população originaria do centro, começado depois da II Guerra Mundial, em direção de bairros
populares ou de novas áreas de expansão e a consequente rarefação das atividades produtivas tornam o centro
um lugar de marginalidade social, de criminalidade, de uso inadequado do patrimônio arquitetônico, que se torna
uma fonte de depredação.
13
Conforme os dados do censo de 1951 e de 2001 a população residente no centro passou progressivamente de
125.271 a 21.489 habitantes (GIAMBALVO, LUCIDO, 2011).
14
Universidade, Prefeitura, Província, Arcebispado, Bibliotecas publicas, Museus.
15
Conforme GIAMBALVO e LUCIDI (2011), a população estrangeira residente no centro histórico de Palermo
corresponde ao 20% do total da população residente na I°Circoscrizione, sendo em constante aumento.
16
La Kalsa, Al-Halisah em árabe,ou seja,“a escolhida”, era um dos quatro bairros que formavama cidade
naprimeira metade do século X, durante a dominação árabe; bairro fortificado foi sede do Emir e das suas tropas,
dos edifícios de governo, do arsenal das prisões, resultado da primeira expansão da cidade realizada através de
um programa orgânico. (GIAMBANCO, 2006)
17
Espremida entre a montanha e o mar, a cidade cresceu reconstruindo-se sobre si mesma, muitas vezes
aumentando em altura, originando assim um tecido urbano muito denso, distribuído em cerca de 2500 edifícios.
18
As praças representam apenas o 4% da superfície total do centro histórico
19
Em 2006 a UNESCO reconhece como patrimônio mundial da humanidade o conjunto urbanístico-arquitetônico
“StradeNuove e il Sistema dei Palazzi dei Rolli” , por constituir o primeiro exemplo europeu de projeto urbanístico
planejado por uma autoridade pública com estrutura unitária. O sistema representa um notável exemplo de
âmbito urbano caraterizado pela presença de um amplo conjunto de edifícios nobres de elevado valor, resultado
do alto nível econômico e do poder alcançado pela cidade no período entre o século XVI e o século XVII .
20
Torneios de palavras cruzadas, cursos básicos para aprender jogar xadrez, competição de confeitaria, festas
étnicas, são algumas das atividades propostas pela Associação em 2009
20

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