Completa - Faculdades FIO

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Completa - Faculdades FIO
Alm. Med. Vet. Zoo. 1
ASPECTOS CLÍNICO-PATOLÓGICOS DO MORMO EM EQUINOS - REVISÃO DE
LITERATURA
CLINICAL-PATHOLOGICAL ASPECTS OF GLANDERS IN EQUINES - REVIEW
Lillian Roberta Dittmann* Thaís Oliveira Cardoso* Felipe Gazza Romão† Luiz Daniel de
Barros†
RESUMO
O mormo é uma doença infecto-contagiosa causada pela bactéria Burkholderia mallei e que
acomete equídeos, carnívoros, pequenos ruminantes e até os homens, caracterizando-se uma
zoonose, de notificação obrigatória. Os animais infectados e portadores assintomáticos são as
principais fontes de infecção. A principal porta de entrada é pela via digestiva, podendo ocorrer
também pelas vias respiratórias e cutânea. Os equídeos de qualquer idade são susceptíveis,
porém, com maior incidência em animal idoso, debilitado e sujeito a situações de estresse. Os
sinais clínicos mais frequentes incluem febre, tosse e corrimento nasal. Na forma aguda da
doença a morte por septicemia ocorre em poucos dias. A fase crônica da doença é caracterizada
por três formas de manifestação clínica: a nasal, a pulmonar e a cutânea. O diagnóstico é
realizado pelo teste de fixação de complemento e maleinização. Os animais devem ser
eutanasiados, pois o tratamento é proibido devido à possibilidade de animais tratados se
tornarem portadores crônicos do agente. Como prevenção e controle, devem ser realizadas
quarenta e interdição de fazendas provenientes de animais positivos, limpeza e desinfecção das
áreas de foco, e aquisição de animais de áreas livres da doença. O presente trabalho teve como
objetivo revisar os principais achados clínico-patológicos do mormo, doença de grande
importância na equideocultura.
Palavras-chave: equídeos; zoonose; maleinização; Burkholderia mallei
ABSTRACT
Glanders is an infectious disease caused by the bacterium Burkholderia mallei that affects
horses, carnivores, small ruminants and even humans, being considered a notifiable zoonotic
disease. Infected animals and carriers are the main sources of infection. The main entrance is
through the digestive tract but can also occur through the respiratory tract and skin. Horses of
any age are susceptible, however with higher incidence in elderly, impaired and raised in stress
conditions. Common clinical signs include fever, cough and runny nose. In the acute phase of
the disease, death from septicemia occurs in a few days. Chronic phase is characterized by three
types of clinical manifestation: a nasal, lung and skin. Diagnosis is made by complement
fixation test and mallein. Animals must be euthanized because the treatment is prohibited due
to the possibility of treated animals become chronic carriers of the agent. For prevention and
control, should be carried fortyand ban of farms with positive animals, cleaning and disinfection
of the focus areas and acquisition of animals from free disease areas. This paper aims to review
the main clinicopathological features of glanders, of great importance in equideocultura disease.
Keywords: equine; zoonosis; mallein; Burkholderia mallei.
INTRODUÇÃO
*
Discente do Curso de Medicina Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil. E-mail: [email protected]
†
Docente do Curso de Medicina Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil.
Dittmann LR, Cardoso TO, Romão FG, Barros, LD. Aspectos clínicopatológicos do mormo em equinos - revisão
de literatura. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 1-5.
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O mormo é uma enfermidade infecto-contagiosa, aguda ou crônica, de caráter
zoonótico, causada pela bactéria Burkholderia mallei, que acomete principalmente os equídeos,
podendo também acometer o homem, os carnívoros e eventualmente os pequenos ruminantes.
É uma das doenças mais antigas dos equídeos, descrita por volta do século III e IV a.C. (1,2).
O agente etiológico B. mallei foi identificado em 1882, pelo seu isolamento em órgãos
de um equino. O patógeno já foi identificado como Loefflerella mallei, Pfeifferella mallei,
Malleomyces mallei, Actinobacillus mallei, Corynebacterium mallei, Mycobacterium mallei,
Pseudomonas mallei e Bacillus mallei. O gênero atual, Burkholderia, foi classificado após a
realização da homologia do DNA-DNA, lipídios celulares, composição de ácidos graxos e
características fenotípicas, como o gene 16S rRNA tipificado em 1992 (3).
A doença foi descrita pela primeira vez no Brasil em 1811. Acredita-se que foi
importada da Europa pela inserção de animais infectados, provocando epizootias em extensas
áreas nacionais, acometendo muares, equinos e humanos, que apresentaram sinais de catarro e
cancro nasal (3).
O presente trabalho teve como objetivo descrever uma revisão de literatura sobre o
mormo, abordando as principais características clínico-patológicas desta enfermidade.
REVISÃO DE LITERATURA
Etiologia
A Burkholderia mallei é um bastonete gram-negativo, não esporulado, imóvel e com 25µm de comprimento e 0,5 µm de espessura e podem ser pleomórficas em determinadas
condições de meio de cultura. Cresce bem em meios que contenham glicerol ou sangue, não
produz hemólise no ágar sangue e as colônias apresentam aspecto mucoide e brilhante. O bacilo
do mormo é aeróbio e anaeróbio facultativo, oxidase e catalase positiva e redutor de nitrato (4).
A B. mallei é um patógeno intracelular obrigatório bem adaptado ao seu hospedeiro, porém
apresenta baixa resistência ambiental. São sensíveis à ação da luz solar, calor e desinfetantes
comuns e podem sobreviver em ambientes úmidos por 3 a 5 semanas (5).
Epidemiologia
Responsável por alta taxa de mortalidade em equídeos, pode ser considerada uma
doença re-emergente devido ao aumento do número de surtos da doença nos últimos anos. A
doença tem sido descrita em diferentes partes do mundo, porém devido a programa de controle,
foi erradica nos Estados Unidos, Europa Ocidental, Canadá e Austrália (6).
Animais infectados e portadores assintomáticos são importantes fontes de infecção
(4,8,9).
A disseminação ocorre principalmente por meio da contaminação de forragem, cochos
e bebedouros por secreção oral e nasal (9). Esporadicamente, a forma cutânea da infecção
decorre do contato direto com ferimentos ou por utensílios usados na monta dos animais. Lesões
pulmonares crônicas, que se rompem nos brônquios e infectam as vias aéreas superiores e
secreções orais e nasais, representam a mais importante via de excreção da B. mallei (4,9).
A principal via de infecção é a via digestiva, mas também pode ocorrer pelas vias
respiratórias e cutânea (1). A disseminação por inalação também pode ocorrer, mas essa forma
de infecção é provavelmente rara sob condições naturais (9).
Todos os equídeos, de qualquer idade são susceptíveis, porém a doença acomete
principalmente em animais idosos, debilitados e submetidos a estresse, em virtude de trabalho
excessivo, má alimentação e habitação em ambiente com condições sanitárias inadequadas
(2,9).
Felinos, camelos e caprinos também são susceptíveis à infecção e o homem é hospedeiro
acidental, sendo, geralmente, uma doença ocupacional. Os equinos e muares são os únicos
reservatórios naturais do agente conhecidos até o momento (3).
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Sinais Clínicos
Os sinais clínicos mais frequentes são febre, tosse e corrimento nasal, entretanto o
período de incubação pode demorar 3 dias a meses, podendo na fase aguda apresentar edema
em região peitoral e vir a óbito em 48 horas (7). Na forma aguda da doença a morte por
septicemia ocorre em poucos dias (3), ocorrendo principalmente em asininos, que são mais
susceptíveis à esta forma (5). A fase crônica da doença, que pode desenvolver-se após semanas
ou meses, é caracterizada por três tipos de manifestações clínicas: a nasal, a pulmonar e a
cutânea, porém estas não são distintas e o mesmo animal pode apresentar simultaneamente
todas as formas, sendo a forma pulmo-cutânea a mais comum em surtos da doença (3,6).
Animais cronicamente infectados são importantes na disseminação da doença (5).
A forma nasal se caracteriza por descarga nasal serosa que pode ser unilateral, tornandose com a evolução do processo, em purulenta fluida de coloração amarelo-escura e purulentahemorrágica. Já a forma pulmonar manifesta-se por pneumonia lobar com abscedação
cavernosa e desenvolvimento de pleurite fibrinosa. A forma cutânea apresenta-se com formação
de abscessos subcutâneos que ulceram e drenam secreção purulenta e adenopatia, que na face
do animal pode apresentar linfonodos e vasos linfáticos superficiais aumentados de volume (7).
Patogenia
O agente penetra pela mucosa intestinal, atinge os linfonodos onde fazem proliferação
e se espalham para órggãos de eleição via corrente sanguínea. O agente é encontrado nos
pulmões, porém pode ser observado também na pele e mucosa nasal. Nos animais infectados,
formam-se lesões primárias na faringe, estendendo-se para o sistema linfático onde causa lesões
nodulares. Metástases são encontradas nos pulmões, baço, fígado e pele. No septo nasal podem
ocorrer lesões primárias de origem hematógena ou secundária a um foco pulmonar (1,4).
Diagnóstico
O diagnóstico do mormo consiste na associação dos aspectos clínico-epidemiológicos,
anátomo-histopatológicos, isolamento bacteriano, inoculação em animais de laboratório (prova
de Strauss), reação imunoalérgica (maleinização) e testes sorológicos, tais como fixação de
complemento (FC), teste da hemaglutinação indireta (IHAT), imunoeletroforese (CIET), teste
indireto do anticorpo fluorescente (IFAT) e ELISA. A PCR é uma importante ferramenta no
diagnóstico, visto que apresenta alta especificidade, diferenciando da infecção por B.
pseudomallei (11). Os testes sorológicos podem apresentar resultados inconclusivos por até seis
semanas após a realização do teste de maleína (4) e todos esses testes apresentam reação
cruzada com B. pseudomallei. Dessa maneira, locais onde a melioidose é endêmica, os testes
sorológicos podem resultar em falso-positivo (3).
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) recomenda como testes
oficiais para diagnóstico e controle do mormo, apenas a realização dos testes de Fixação do
Complemento (FC) e maleinização (1,3).
O teste de FC apresenta alta sensibilidade e boa especificidade e deve ser realizado em
laboratórios oficial ou credenciado pelo MAPA (9). Baseado pela detecção de anticorpos
específicos contra a B. mallei que podem ser observados uma semana após a infecção.
Entretanto, estudos demonstraram que o melhor período para realizar o exame é dentro de 4-12
semanas após a infecção (3,4), visto que esse teste identifica os animas que não tem aparência
clínica e aqueles infectados na fase crônica (8).
O primeiro teste de diagnóstico realizado para detecção de mormo foi o teste de maleína,
e até então, este tem sido o melhor teste para diagnóstico a campo e programas de controle e
erradicação desde 1890. É limitado em relação à sensibilidade, especificamente em casos
avançados da doença. Foram descritas reações cruzadas entre B. mallei e Streptococcus equi,
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resultando em reações falso-positivas. É inoculado 0,1 mL de maleína por via intradérmica na
pálpebra inferior, realizando a leitura após 48 horas. O resultado é considerado positivo quando
apresentar edema palpebral com presença ou não de secreção purulenta (3).
É necessário realizar o diagnóstico diferencial para doenças como: linfangite epizoótica,
linfangite ulcerativa, esporotricose, melioidose e outras causas de pneumonia (9).
Tratamento
O tratamento é proibido devido à possibilidade de animais tratados se tornarem
portadores crônicos do agente, tornando-se assim fonte de infecção para animais sadios.
O MAPA recomenda a eutanásia dos animais positivos devido à falta de tratamento
adequado e vacina para a prevenção do mormo, sendo a eutanásia realizada por profissionais
do serviço de Defesa Sanitária (3).
Prevenção e Controle
No momento, não existe nenhuma vacina animal ou humana eficiente contra a infecção
da B. mallei. Estudos estão sendo realizados para fabricação de uma vacina eficaz para o
mormo, uma vez que o tratamento dos animais infectados é proibido (1,4).
De acordo com o MAPA (10), a prevenção da doença em seres humanos baseia-se no
manejo do ambiente e controle animal que envolve a eliminação de animais com diagnóstico
laboratorial positivo, controle rigoroso de trânsito interestadual com prova sorológica de FC
negativa (validade de 60 dias), quarentena e interdição da fazenda, limpeza e desinfecção das
áreas de foco, incineração e destino apropriado de carcaças de animais infectados (assim como
de todos os materiais utilizados nas instalações de propriedades epizoóticas), desinfecção de
veículos e equipamentos (cabrestos, arreios e outros), abolição de cochos coletivos, aquisição
de animais de áreas livres e com diagnóstico laboratorial negativo, e utilização de equipamentos
de proteção individual, como luvas, máscara, óculos e avental, por parte de médicos
veterinários, magarefes, tratadores de animais, laboratoristas e pessoas que tem contato com
animais suspeitos ou com equipamentos contaminados.
A interdição da propriedade somente será suspensa pelo serviço veterinário oficial após
a eutanásia dos animais positivos e a realização de dois exames de FC sucessivos de todo
plantel, com intervalos de 45 a 90 dias, com resultados negativos no teste de diagnóstico (10).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se concluir que o mormo é uma doença infecto-contagiosa grave, de caráter
zoonótico, onde a prevenção torna-se indispensável, devendo ser realizado o monitoramento
dos rebanhos, como a identificação e sacrifício dos animais infectados e a interdição de
propriedades com focos comprovados da doença.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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de literatura. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 1-5.
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Artigo recebido dia 22 de setembro de 2014.
Artigo publicado dia 02 de março de 2015.
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CONTENÇÃO DE GRANDES FELINOS - REVISÃO DE LITERATURA
CONTAINMENT WILD FELIDS - REVIEW
Andréa Silvia Yoneda Rasmussen Chaves * Caio José Xavier Abimussi†
RESUMO
A contenção química dos grandes felídeos é de extrema importância para a manutenção segura
desses animais e da equipe técnica que está envolvida nesse procedimento. Sendo rápida,
eficiente, fácil de aplicar, vem substituindo a contenção física, se tratando principalmente de
sua captura e imobilização. Dentro deste contexto, o objetivo desse estudo foi verificar as
técnicas mais adequadas e seguras para a realização dessas contenções, preservando a
integridade física dos animais. Muitos felídeos, em algum momento de suas vidas, seja em
cativeiro ou em vida livre, precisam ser contidos e anestesiados. Porém, muitas vezes torna-se
um episódio perigoso e difícil se comparado ao manejo das espécies domésticas.
Palavras-Chave: anestesia dissociativa; fármacos; felídeos
ABSTRACT
A chemical restraint of large felines is of utmost importance for the safe maintenance of these
animals and the technical team that is involved in this procedure Being fast , efficient , easy to
apply, has replaced the physical restraint , especially when it comes to his capture and detention.
Within this context, the objective of this study was to determine the most suitable and safe way
for the realization of these contentions techniques, preserving the physical integrity of the
animals. Many felines, at some point in their lives, whether in captivity or in the wild, they need
to be restrained and anesthetized. But often it becomes a dangerous and difficult episode
compared to the management of domestic species.
Keywords: dissociative anesthesia; drugs; felines
INTRODUÇÃO
Os felídeos selvagens pertencem a um dos grupos de mamíferos mais apreciados pelo
homem, seja pela sua beleza majestosa, seja pelo respeito imposto pela imponência dos grandes
felinos como os maiores predadores terrestres (1).
Adicionalmente, quando os fármacos são administrados por meio de um dardo, é
importante que sejam suficientemente potentes e/ou concentrados de modo a serem
administrados em pequenos volumes (idealmente < 3 mL), o que diminui o risco de trauma,
além de aumentar a precisão do vôo do dardo (2).
Este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão de literatura atualizada sobre a
contenção química em grandes felinos.
REVISÃO DE LITERATURA
Espécies de Felídeos Selvagens
Para Wozencreft (3) atualmente a família Felidae está dividida em duas subfamílias
(Felinae e Pantherinae) e conta com 14 gêneros e 40 espécies. As 10 espécies neotropicais são
divididas em três linhagens: maracajá, puma e pantera, sendo que destas oito ocorrem
naturalmente em território brasileiro (4), e estão descritas na tabela 1.
*
Discente do Curso de Medicina Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil. E-mail: [email protected]
†
Docente, Disciplina de Anestesiologia Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São
Paulo, Brasil.
Chaves ASYR, Abimussi, CJX. Contenção de grandes felinos - revisão de literatura . Alm. Med. Vet. Zoo. 2015
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Tabela 1 - Felinos neotropicias habitantes no Brasil (5)
Gênero
Espécie
Panthera
Panthera onça
Puma
Puma concolor
Puma yagouarondi
Leopardus
Leopardus pardalis
Leopardus wiedii
Leopardus tigrinus
Leopardus geoffroyi
Leopardus colocolo
Nome popular
Onça-pintada
Onça-parda ou suçuarana
Gato-mourisco
Jaguatirica
Gato-maracajá
Gato-do-mato-pequeno
Gato-do-mato-grande
Gato-palheiro
Contenção química
Nos grandes felinos, deve-se ter muito cuidado no momento da contenção, e a equipe
deve ser experiente com a escolha das tarefas de cada membro antes do inicio da operação.
Antes das atividades, todos os equipamentos de contenção devem ser previamente
inspecionados, verificando se estão em perfeita ordem e desinfetados. Esses devem ter sido
estocados em local limpo e de fácil acesso (6).
Os equipamentos de contenção nada mais são do que uma extensão da mão humana, os
quais de uma forma ou de outra possibilitam que se alcance o animal. A grande maioria dos
animais selvagens mantidos em cativeiro, em algum momento de sua vida precisa ser contido
e anestesiado. Porém, muitas vezes torna-se um episódio perigoso e difícil se comparado ao
manejo das espécies domésticas, tendo em vista que os animais selvagens são mais suscetíveis
ao estresse e lesões que as espécies domésticas, particularmente durante a captura, manejo,
contenção química e o transporte (3).
A contenção por meios químicos pressupõe o emprego de fármacos tranquilizantes,
hipnóticos ou anestésicos. Este método é especialmente útil quando se precisa capturar espécies
agressivas ou muito estressadas (3).
Até a determinação precisa do peso de um animal é muitas vezes impossível antes da
imobilização, devendo o médico veterinário conhecer a gama de valores padrão do peso da
espécie e sexo do animal a imobilizar (6).
Devido a esta incapacidade de realizar uma avaliação pré-anestésica meticulosa, a
resposta de cada animal aos fármacos, bem como a sua recuperação, pode decorrer de forma
imprevisível ou mesmo resultar em complicações inesperadas (7).
Equipamentos para injeções à distância - Zarabatana
Segundo Spinosa (8), o emprego da imobilização química remonta a certas tribos da
América do Sul que impregnavam suas flechas com curare. Este método tornou-se efetivo, e os
derivados do curare foram utilizados por muitos anos. Os relaxantes musculares de ação
periférica, também denominados bloqueadores neuromusculares ou ainda de agentes
curarizantes, produzem um profundo relaxamento da musculatura, facilitando tanto a anestesia
como a cirurgia.
As zarabatanas eram utilizadas como instrumento de propulsão, o qual disparava o dardo
a certa distância no animal escolhido (9). Essas zarabatanas eram feitas, geralmente, de cana ou
palmeira, mediam até 3 metros de comprimento e podiam alcançar até 40 metros de distância
nas mãos de um caçador experiente (10). As massas musculares cervical, escapular e femoral,
ricas em vasos sanguíneos, são as mais indicadas para a colocação do dardo (2,11) (figuras 1 e
2).
A zarabatana oferece muitas vantagens, como ausência de estampido, ou seja, menor
trauma ao impacto do dardo com o animal, e boa precisão a distâncias de até 10 a 15 metros.
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Porém, quando se deseja precisão a maiores distâncias, ou quando se trabalha com animais de
maior porte, o mais indicado é a utilização de armas (12).
Figura 1 - Onça parda pré dardejamento. Fonte:
Arquivo pessoal, 2014
Figura 2 - Onça parda após dardejamento. Fonte:
Arquivo pessoal, 2014
Treino Comportamental Para Injeções Manuais
A utilização do treino, dessensibilização e/ou condicionamento operante para facilitar
ou realizar um procedimento com a cooperação de um animal, chamada de “contenção
comportamental”, deve ser tida em conta quando do desenvolvimento de um plano de
contenção, de forma a reduzir o estresse e dessensibilizar o animal para o procedimento (13).
Segundo COE (14), o condicionamento animal é normalmente realizado por meio da
administração de recompensas ao animal que apresente uma resposta comportamental
desejável. Desta forma, os animais são treinados a desenvolver atitudes voluntárias, como, por
exemplo, a apresentação dos membros anteriores para a realização de colheita de sangue,
mediante o oferecimento de algo que o animal goste, como, por exemplo, de determinados
alimentos. A cooperação voluntária do animal diminui sensações como o medo e a ansiedade,
que surgem normalmente na realização destes procedimentos, e contribui para a diminuição do
estresse.
Sistemas de Projeção Com Carga e Dardos
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As armas especiais mais utilizadas no Brasil são importadas e pertencentes às marcas
Dan-Inject®, Telinject®, Cap-Chur® e Dist-Inject®. Estes são equipamentos que utilizam CO2,
ar comprimido ou pólvora para o lançamento de dardos plásticos e/ou metálicos. Dessa forma,
é possível atingir maiores distâncias e injetar maiores volumes (15).
Genericamente, estes sistemas projetam dardos de duas formas: através da expansão de
gás resultante do disparo de cargas de pólvora ou através da libertação de ar ou CO2. O primeiro
método é o que permite um maior alcance, mas também o menos silencioso. O segundo é
relativamente silencioso e preciso, sendo habitualmente usado para projetar dardos de baixo
peso a distâncias curtas a médias, como, por exemplo, em animais de zoológico confinados,
mas não adestrados. As espingardas podem utilizar ambos os sistemas, enquanto as pistolas
estão disponíveis apenas com o segundo (2).
Segundo Greene (16) os principais fatores a serem considerados são o tamanho do
animal e a distância na qual o fármaco pode ser administrado. Os dardos podem produzir
considerável lesão ou morte se não forem usados adequadamente. A energia de impacto é igual
à massa do dardo multiplicado pela velocidade ao quadrado.
Fármacos tranquilizantes
Podem-se utilizar fármacos tranquilizantes associados a outros anestésicos. Uma grande
variedade de fármacos pode ser utilizada na contenção de felídeos selvagens, mas é fundamental
que cada instituição possua seu protocolo de anestesia para ser utilizado em cada situação. Da
mesma forma, os profissionais de cada instituição devem possuir um protocolo de fuga,
principalmente para grandes felinos (1).
Cetamina e Similares
O cloridrato de cetamina é um derivado do cloridrato de fenilciclidina (17). Segundo
Swan (18), uma grande vantagem deste fármaco é a sua ampla margem de segurança é
geralmente necessária uma dose até dez vezes maior que a dose normal para causar toxicidade.
O tempo de indução e a duração da imobilização dependem da dose e da espécie do animal (2).
A cetamina é amplamente utilizada para imobilização de animais selvagens, em virtude
de sua elevada DL 50 que permite seu uso sem o conhecimento do peso exato do animal, e da
boa absorção por IM, o que permite a administração por meio de dardos (19). Entretanto, deve
ser usada em associação com outros fármacos, como os benzodiazepínicos, pois pode causar
estimulo cardiovascular, catalepsia e recuperação agitada (20).
Associação de Cetamina-Medetomidina
Segundo Massone (21) o uso desta associação promove mínimos efeitos colaterais,
observando-se ótimo moirrelaxamento e arreflexia em altas doses. A medetomidina é um
agonista de receptores α-2 adrenérgicos centrais e periféricos, sendo tranquilizante, relaxante
muscular de ação central e analgésico. Apresenta rápida absorção e distribuição lipofílica, com
pico de concentração entre 10-15 minutos na associação cetamina-medetomidina, as doses
desses medicamentos são inferiores aquelas quando empregadas isoladamente.
Associação Cetamina-Midazolam
O midazolam é utilizado em associação à cetamina visando a promover um adequado
miorrelaxamento, reduzindo, assim, a hipertonicidade muscular (5,21). Promove ainda
tranquilização, hipnose, além de possuir atividade anticonvulsivante. Por apresentar veículo
aquoso, pode ser aplicado pela via intramuscular, apresentando rápida absorção e eliminação e
sendo indicado na dose de 0,5 a 1,0 mg/kg (20).
Associação Tiletamina-Zolazepam (TZ)
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Segundo Spinosa (8) a tiletamina é um anestésico dissociativo pertencente ao mesmo
grupo da ketamina, associado a um benzodiazepinico, o zolazepam é mais potente que a
ketamina, e o zolazepam possui ação anticonvulsivante e miorrelaxante, aliviando as ações
cataleptóides da tiletamina. A margem de segurança desta associação é grande, estimando-se a
DL50 em 200 mg/mL do Zoletil, por IM. Esta via é mais adequada para animais silvestres.
Como esse fármaco vem liofilizado, pode-se preparar uma solução com altas concentrações
(500 mg/mL).
Xilazina
A xilazina é uma agonista de α2 - adrenoreceptores. Adquiriu popularidade como prémedicação anestésica, atuando em ampla gama de espécies domésticas e silvestres. Seu uso em
animais silvestres foi reportado por Sagner e Haas (1969), sendo as doses variáveis, conforme
a suscetibilidade das diferenças espécies exóticas, podendo ser administrada por via
intramuscular ou intravenosa (8).
Embora promova relaxamento muscular, sedação, analgesia ou mesmo inconsciência
prolongada, os animais silvestres sob ação da xilazina podem reagir a estímulos dolorosos, em
particular os grandes felinos, como se constatou em leoas em fase pré-operatória de cesariana.
Deve-se por esse motivo, manusear o animal com cuidado, pois movimentos bruscos podem
promover reações. Recomenda-se o uso de peia e mordaça no animal sedado, como medidas de
segurança para a equipe que trabalha com animais silvestres (8).
Opióides
Os opioides produzem analgesia e sedação, mas não têm propriedades relaxantes
musculares. São previsíveis na sua ação, fornecem uma indução relativamente rápida, e os seus
efeitos podem ser revertidos com a administração de antagonistas adequados (2).
A indução e a duração de ação dependem do fármaco e da dose (11). A indução ocorre
geralmente dentro de dez minutos após a administração e passa tipicamente por várias fases,
começando por ligeiras alterações comportamentais, seguidas de ataxia, excitação,
hipertonicidade muscular e finalmente, decúbito. A subdosagem pode resultar num período de
indução prolongado, o que é indesejável, pois a excitação opioide prolongada resulta
inevitavelmente em problemas como hipertermia, taquicardia, acidose, exaustão metabólica,
miopatia de captura e morte (22).
Carfentanil
O citrato de carfentanil é um derivado sintético do fentanil aproximadamente 8000 vezes
mais potente que a morfina (23).
Produzido e encontrado comercialmente na América do Norte sob a denominação de
®
Widnil . É um narcótico moderno, mais potente que a etorfina e cujos efeitos farmacológicos
são similares ao da morfina. A literatura especializada já apresenta centenas de citações sobre
seu emprego em diversas espécies selvagens, geralmente em combinação a tranquilizantes,
inclusive na captura de exemplares de vida livre (12).
Apesar de poder ser usado isoladamente, é geralmente combinado com um agonista α2adrenérgico ou tranquilizante (23), de forma a reduzir a excitação durante a indução e a
contrariar a rigidez muscular, melhorando, assim, a qualidade da imobilização (2,11). Os
principais efeitos adversos das combinações baseadas em carfentanil incluem depressão
respiratória, hipoxemia, hipertensão e hipertermia (24,25,26,27,28).
Etorfina
Segundo Pachaly (12) o cloridrato de etorfina é produzido atualmente na África do Sul,
em concentração de 2,8 mg/mL, com o nome de Immobilon®, e na Europa, em duas
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apresentações o Large Animal Immobilon® (1 mL = 2,45 mg de etorfina + 10 mg de
acetilpromazina) e, o Small Animal Immobilon® (1mL = 0,07 mg de etorfina + 18 mg de
metotrimeprazina). Recentemente deixou de ser fabricada a apresentação mais conhecida da
etorfina, denominada M-99®, que era produzida nos EUA.
Estes fármacos têm uma margem de segurança muito reduzida em humanos,devem ser
manuseados com cuidado extremo para evitar uma exposição acidental, e apenas se estiver
prontamente disponível um antagonista apropriado (11,23,29). A exposição humana a estes
fármacos pode levar à morte por depressão e parada respiratória (11).
Reversão dos Efeitos: Diprenorfina
A diprenorfina é um antagonista especifico da etorfina, sendo este agente importante
para reverter os efeitos provocados pela etorfina, permitindo que o animal fique em estação
após quatro a dez minutos da injeção IV. Caso a diprenorfina não seja administrada, a
recuperação do animal é lenta, levando mais de três horas. É comercializada apenas paro uso
animal, devido a alucinações descritas no homem. Este antagonista deve ser administrado via
IV e a dose para reverter os efeitos da etorfina em animais silvestres corresponde ao dobro da
comumente aplicada (8).
Anestesia Inalatória
Massone (21) relata que em casos de anestesia prolongada, a melhor opção é a utilização
da anestesia inalatória. Com o uso desta obtém-se um completo controle das vias aéreas e da
profundidade anestésica. A intubação é feita através de visualização direta com o auxilio de
laringoscópio, com exceção do leopardo que possui a laringe mais profunda e, desta forma sua
intubação pode ser realizada com auxilio de endoscópio rígido. Recomenda-se em felinos
grandes utilizar um abridor de boca para segurança profissional. As sondas endotraqueais
utilizadas nos felinos grandes são as mesmas utilizadas em potros (com diâmetro interno de 12
a 18). Os agentes mais utilizados são halotano e o isoflurano.
A Captura do Animal
Os eventos de captura de animais selvagens devem ser planejados e organizados
cuidadosamente, de modo a antecipar e evitar complicações, garantindo a menor mortalidade
possível durante e após a captura (2,22).
Primeiramente, os aspectos biológicos da espécie devem ser conhecidos bem como seu
comportamento, anatomia, fisiologia e suas formas de defesa. E alem disso a compreensão da
patofisiologia do estresse é essencial (1,3,31).
Desta forma antes da contenção propriamente dita deverá ser identificada qual o
comportamento do animal para se reduzir assim o risco de injúrias ao operador, o hábito e o
grau de vulnerabilidade ao estresse do animal. E associado a isso tudo o operador necessitará
de um pleno domínio do uso das técnicas e equipamentos a serem empregado, além do
planejamento criterioso da manobra de contenção, priorizando sua rapidez e eficiência (30,32).
Indução
O intervalo de tempo entre a administração dos fármacos e o momento em que o animal
fica satisfatoriamente imobilizado é chamado tempo de indução (11,33). Idealmente, o animal
deve ficar imobilizado dentro de 1-5 minutos, apesar de, na prática, a maioria das combinações
anestésicas atuais poderem levar mais tempo a induzir a anestesia (2).
A anestesia de animais silvestres é considerada um procedimento de risco. O uso de
doses excessivas ou uma analgesia inadequada são exemplos de situações que ocorrem por falta
de um padrão de referência para a espécie e acabam interferindo na indução e na recuperação
anestésica (34).
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Segundo Atkinson et al. (33) se a colocação de um dardo não for apropriada, deve-se
dardejar o animal novamente de imediato, com uma dose completa ou reduzida, de forma a
alcançar o decúbito rapidamente e evitar que o animal parcialmente sedado continue a
desgastar-se. Se, mesmo após um dardejamento correto, o animal não parecer estar respondendo
aos fármacos dentro de um período de tempo razoável, pode ser dardejado novamente, sendo
recomendável que decorram cerca de 30 minutos entre injeções consecutivas (11).
Monitoração e Recuperação
A monitorização dos animais anestesiados é essencial para detectar alterações
fisiológicas a tempo de corrigir, garantir uma profundidade anestésica adequada e avaliar a
eficácia de tratamentos de suporte. Os princípios e técnicas usados em animais domésticos
podem ser aplicados na maioria das espécies encontradas em medicina zoológica (35).
A recuperação é um ponto crítico no maneio anestésico de espécies selvagens,
especialmente de grande porte, uma vez que, devido a considerações de segurança, é geralmente
impossível qualquer intervenção durante esse período (7). As considerações para a recuperação
anestésica variam, dependendo da escolha dos fármacos e de cada situação, mas na maioria dos
casos é desejável uma técnica anestésica reversível (2).
Complicações
As complicações relacionadas com a anestesia são comuns e podem estar relacionadas
com o uso inapropriado de equipamento, efeitos farmacológicos adversos, suporte
cardiovascular e respiratório e preparação do paciente inadequados, fatores inerentes ao
paciente (como regurgitação) ou processos patológicos multifatoriais complexos (como
miopatia) (36).
Estresse
O animal em estado apreensivo está sob estressor psicológico de nível médio e, se
houver intensificação, pode transformar em ansiedade, medo ou, na sua forma mais aguda, em
terror. Frustração outro estresse psicológico, ocorre no animal sob contenção física, pois ele
não pode escapar e se defender. Se o animal estiver em fase iminente de exaustão, por doenças
ou outro fator, e se for submetido à contenção, poderá ocorrer choque adrenal fatal em função
do consumo das últimas reservas corporais estocadas (8).
A contenção é o momento de maior estresse na vida de um animal silvestre podendo
acarretar reações potencialmente fatais. O óbito decorrente da contenção pode ser dividido em:
superagudo (durante a realização da contenção), agudo ou mediato (até uma hora após a
contenção) e o tardio (de horas a dias após a contenção) (12,32).
A resposta aguda geralmente está representada pela resposta de luta ou fuga, envolvendo
como fator principal a descarga de catecolaminas, que dentre outros efeitos é responsável pelo
aumento da FC e PA, midríase (dilatação da pupila), broncodilatação, aumento da glicemia e
da taxa de metabolismo e ereção dos pelos (12,15).
Miopatia de Captura (MC)
Segundo Dias (37), quando um animal é capturado, ocorre subitamente a interrupção da
atividade muscular esquelética e, dessa forma, o bloqueio de um processo fisiológico conhecido
como “bomba muscular”. Esse fenômeno é caracterizado pela ação mecânica da contratura
muscular sobre o plexo vascular, com consequente expulsão do sangue dos leitos venocapilares.
Dessa forma, tanto o calor gerado pela atividade muscular é dissipado, como os subprodutos da
glicogenólise, em especial o ácido lático, são retirados do microambiente muscular.
A mioglobina é tóxica e pode conduzir a insuficiência renal, ao passo que o potássio e
o cálcio sensibilizam o sistema de condução elétrica do coração à adrenalina, podendo resultar
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em FV e consequente parada PC. O acúmulo de lactato pode ainda destruir as células
miocárdicas, comprometendo mais a função cardíaca. A destruição muscular liberta também
enzimas intracelulares - AST, LDH e CPK - cujos níveis séricos elevados são um bom indicador
da probabilidade de desenvolvimento de MC (11).
Trauma Físico
Durante a captura, podem ser infligidas no animal lesões físicas como contusões,
abrasões, lacerações e fraturas, acidentalmente ou por mau manejo (22). Em contusões deve-se
aplicar imediatamente compressas frias e/ou gelo. A maioria das abrasões pode ser tratada
simplesmente com a sua limpeza e a aplicação de pomadas (23).
Mortalidade
O risco anestésico em animais selvagens é altamente influenciado pelo protocolo de
captura aplicado, pelo que a equipe de captura deve ser capaz de minimizar o risco de
mortalidade ao usar fármacos imobilizadores e doses com segurança provada, sistemas de
administração de fármacos adequados e métodos e técnicas de captura estabelecidos (2). Uma
taxa de mortalidade associada à captura maior que 2% não é aceitável (pelo menos em
mamíferos de grande porte) e obriga à reavaliação do protocolo de captura. Dados os avanços
recentes nas técnicas, ferramentas e fármacos anestésicos, a aplicação de protocolos adequados,
bem como a sua constante melhoria e adaptação, permitem reduzir as taxas de mortalidade
relacionada com a captura para valores próximos de zero (38).
Segurança Humana
Existem muitos perigos para a segurança humana inerentes à imobilização de animais
selvagens, nunca deve ser realizada por uma única pessoa e a equipe de captura deve ser treinada
em ressuscitação cardiopulmonar e primeiros socorros (2,23,29).
O carregamento do dardo é um momento de alto risco para exposição aos fármacos,
durante o qual deve ser considerado o uso de equipamento de proteção e os antagonistas
indicados para tratar a exposição humana devem estar imediatamente disponíveis (2,29). Os
dardos já carregados devem ser transportados sob uma cobertura de proteção, de forma a
diminuir o risco de exposição acidental. Os fármacos podem entrar na circulação através de
uma injeção acidental ou por absorção através da pele ou membranas mucosas (18).
CONCLUSÃO
Conclui-se que um planejamento correto na captura de animais selvagens e uma
monitoração continua anestésica minuciosa é necessária para minimizar e evitar complicações
e mortalidades desses animais. A captura de animais selvagens pode ser necessária por uma
variedade de razões, tais como: transporte, exames, tratamentos, recaptura de animais ferozes,
animais fugitivos dos recintos dentre outros. A contenção causa muita tensão e pode
desencadear complicações como o estresse, miopatia de captura, morte, além de perigosa para
quem está manejando, sendo necessário conhecer o comportamento de cada espécie e
conhecimento prático das ferramentas a serem utilizadas.
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Artigo recebido dia 29 de janeiro de 2015.
Artigo publicado dia 02 de março de 2015.
Chaves ASYR, Abimussi, CJX. Contenção de grandes felinos - revisão de literatura . Alm. Med. Vet. Zoo. 2015
fev; 1 (1): 6-15.
Alm. Med. Vet. Zoo. 16
ANESTESIA EM CALOPSITA (Nymphicus Hollandicus) PARA RETIRADA DE
CISTO DE INCLUSÃO DE PENA - RELATO DE CASO
ANESTHESIA IN COCKATIEL (Nymphicus Hollandicus) REMOVAL OF
INCLUSION CYST FEATHER - CASE REPORT
Marilia D’Elia Enéas* Caio José Xavier Abimussi†
RESUMO
Cistos inclusão de pena são comuns em várias espécies, que podem ter como formação de
caráter hereditário ou induzido por traumas. Foi atendido no Hospital Veterinário das
Faculdades Integradas de Ourinhos – FIO uma calopsita de aproximadamente um ano, pesando
0,089Kg apresentando uma massa em região peitoral. O animal recebeu como medicação préanestésica midazolam por via intra nasal (12,5 mg/kg) associado a morfina (2,5 mg/kg) pela via
intramuscular. Antecedendo o ato cirúrgico, foi administrado meloxicam (0,3mg/kg) e
enrofloxacina (10mg/kg), ambos por via intra muscular. O animal foi posicionado em decúbito
dorsal e a manutenção anestésica foi realizada com isofluorano. O objetivo é relatar a realização
de um procedimento anestésico cirúrgico a que foi submetida uma calopsita (Nymphicus
Hollandicus).
Palavras-chave: sedação; benzodiazepínicos; opioides; aves
ABSTRACT
Inclusion feather cysts are common in several species, which may have the hereditary form or
induced to trauma. Was attended the Veterinary Hospital of Faculdades Integradas de Ourinhos
– FIO one cockatiel about a year, weighing 0,089Kg showing a node in the pectoral region.
The animal received as premedication as midazolam intranasal administration (12.5 mg/kg)
combined with morphine (2.5 mg/kg) intramuscular. Preceding to the surgery, was
administered meloxicam (0.3 mg/kg) and enrofloxacin (10 mg/kg), both by intramuscular
injection. The animal was positioned supine and anesthesia was maintained with isoflurane.
The objective is to report the execution of a surgical anesthetic procedure they underwent one
Cockatiel (Nymphicus Hollandicus).
Keywords: sedation; benzodiazepines; opioids; birds
INTRODUÇÃO
O crescente interesse e conhecimento de espécies silvestres desde os anos 1960
resultaram em uma maior demanda exigindo necessidade de anestesia segura para
procedimentos médicos e cirúrgicos mais especializados. Apesar de existir diferenças entre
aves e mamíferos, os princípios básicos de anestesiologia são os mesmos (1).
A anestesiologia é uma das áreas mais controversas da medicina aviária e, para muitos,
representa um desafio devido às particularidades anatômicas, fisiológicas e comportamentais
(2), margem inferior de segurança, maior dificuldade no monitoramento e, atualmente,
informações limitadas em analgésicos eficazes para estas espécies (3).
Durante o exame pré-anestésico, os sinais vitais de base e peso corporal exato (gramas
em pequenas aves) devem ser registrados (4). A medicação pré-anestésica não é rotineiramente
*
Discente do Curso de Medicina Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil. E-mail: [email protected]
†
Docente, Disciplina de Anestesiologia Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São
Paulo, Brasil.
Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia em calopsita (Nymphicus Hollandicus) para retirada de cisto de inclusão
de pena – relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1(1): 16-20.
Alm. Med. Vet. Zoo. 17
empregada em aves, porque os sedativos ou tranquilizantes irão prolongar a recuperação e
podem levar a uma recuperação prolongada (4).
Atualmente tem-se demonstrado que o dano tecidual, como em uma cirurgia, pode levar
a sensibilização do sistema nervoso central, aumentando o desconforto pós-operatório. A
analgesia preemptiva impede que o estímulo nocivo chegue ao sistema nervoso central, quando
fornecida num estágio inicial de trauma tecidual, como no pré e trans operatório, havendo
redução da inflamação, melhorando potencialmente a recuperação a curto e longo termo (5).
Outro benefício é a redução da quantidade de anestésicos requerida, diminuindo os riscos
associados à anestesia (6).
A anestesia inalatória é eleita ao invés dos anestésicos injetáveis para aves, sendo
indicada para procedimentos extensos pela fácil manutenção ou para procedimentos curtos
devido à rápida recuperação (7-9). Gases anestésicos e vapores são rapidamente absorvidos na
corrente sanguínea de modo a que a indução anestésica e a recuperação sejam igualmente
rápidas (10). O ingresso do isofluorano como agente anestésico inalatório foi o evento mais
importante para o progresso da anestesia em aves (11). Se o pássaro parece estar em um
profundo plano da anestesia, redução adicional no cenário vaporizador é garantido (4).
MATERIAL E MÉTODOS
Foi atendido no Hospital Veterinário das Faculdades Integradas de Ourinhos- FIO uma
calopsita (Nymphicus hollandicus), de aproximadamente um ano de idade, pesando 0,089 Kg,
apresentando uma massa em região peitoral com evolução de quatro meses.
Como medicação pré-anestésica (MPA) foi administrado midazolam intranasal
12,5mg/kg (12) equivalente a duas gostas por narina e posteriormente morfina 2,5 mg/Kg
(diluído em 0,08 mL de NaCl) por via intramuscular. Após 20 minutos, foi realizada a limpeza
e remoção das crostas com solução fisiológica 0,9%, H2O2 e clorexidine sabão. Ato contínuo,
realizada a depenagem da região e preparo para o início do ato cirúrgico.
Previamente ao ato cirúrgico, foi administrado 0,3 mg/kg de meloxicam 0,02% e 10
mg/kg de enrofloxacina 0,5 %, ambos por via intramuscular (Tabela 1).
Para a indução e manutenção do animal durante o procedimento cirúrgico foi
administrado isofluorano, empregando o uso de máscara. O animal foi posicionado em decúbito
dorsal sobre um colchão térmico, visando evitar perda de temperatura. Como monitorização
posicionou-se um doppler vascular na região da cintura escapular.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As aves podem ser restringidas para que a anestesia possa ser induzida utilizando uma
máscara facial ou podendo ser confinados em uma caixa de plástico transparente material,
enquanto que os gases anestésicos ou vapores são introduzido na caixa (10). Como foi feito
durante o procedimento cirúrgico mantendo o animal na máscara com o anestésico inalatório
isofluorano.
A morfina é um antagonista puro, que não tem sido muito utilizado na medicina aviária
devido ao pouco conhecimento do efeito da droga em aves e pelos resultados controversos de
estudos que demonstram pouca analgesia ou até mesmo hiperalgesia, além de incoordenação
motora e sedação (13), o que diferente do que foi observado, não causando incoordenação do
animal durante a recuperação. Para manter um nível plasmático terapêutico da droga, deve ser
administrado na dose mínima de 2mg/kg, sendo a leve sedação o único efeito adverso
observado (14). A dose utilizada da morfina por ter sido um pouco mais elevada levou a
sedação do animal como um procedimento pré anestésico. A morfina tem como seu principal
efeito é a analgesia, pois induz a uma rápida diminuição na síntese de serotonina, o que foi
notado (9).
Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia em calopsita (Nymphicus Hollandicus) para retirada de cisto de inclusão
de pena – relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1(1): 16-20.
Alm. Med. Vet. Zoo. 18
O meloxicam tem seu mecanismo de ação antiinflamatória que consiste na inibição
exclusiva da enzima COX2 (15). Na dose de 0,5mg/kg não ocorrem efeitos colaterais em
psitacídeos, em uso oral ou venoso, sendo a biodisponibilidade alta em ambas as vias (16),
porém o efeito analgésico desta droga em aves não foi estabelecido (17). O uso do meloxicam
neste animal não foi com o intuito exclusivamente da analgesia, pois a morfina já havia sido
realizada como medicação pré anestésica, por isso a diminuição da dose recomendada (16).
Tabela 1- Diluição dos fármacos administrados para a ave
Fármaco
Meloxicam
Enrofloxacina
Dose
Concentração
Conteúdo
administrado
0,3mg/kg
0,2mg/mL (0,1 mL
Meloxicam 0,2% +
0,9 mL NaCl 0,9%)
0,14mL
10mg/kg
5mg/mL (0,1 mL
Enrofloxacina 10%
+ 0,9 mL NaCl
0,9%)
0,18 mL
Figura 1 - Animal posicionado em decúbito
dorsal sob a administração de isofluorano.
Fonte: Arquivo pessoal, 2014.
Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia em calopsita (Nymphicus Hollandicus) para retirada de cisto de inclusão
de pena – relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1(1): 16-20.
Alm. Med. Vet. Zoo. 19
Figura 2 - Animal em recuperação após o
término do procedimento anestésico-cirúrgico.
Fonte: Arquivo pessoal, 2014.
Figura 3 - Animal recuperado da sedação e
anestesia. Fonte: Arquivo pessoal, 2014.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O procedimento cirúrgico para retirada do cisto de inclusão de pena pode representar
um método eficaz de tratamento, possibilitando ainda uma melhor qualidade de vida para o
animal. A técnica anestésica e os fármacos utilizados neste estudo mostraram-se ser viáveis e
seguros, sendo uma alternativa para outros animais da mesma espécie que necessitem passar
por um procedimento anestésico cirúrgico.
Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia em calopsita (Nymphicus Hollandicus) para retirada de cisto de inclusão
de pena – relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1(1): 16-20.
Alm. Med. Vet. Zoo. 20
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Artigo recebido dia 23 de dezembro de 2014.
Artigo publicado dia 02 de março de 2015.
Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia em calopsita (Nymphicus Hollandicus) para retirada de cisto de inclusão
de pena – relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1(1): 16-20.
Alm. Med. Vet. Zoo. 21
ANESTESIA POR TUMESCÊNCIA COM LIDOCAÍNA 0,08% EM CADELA
SUBMETIDA À MASTECTOMIA RADICAL UNILATERAL: RELATO DE CASO
TUMESCENT LOCAL ANESTHESIA WITH LIDOCAINE 0.08% IN DOG
UNDERGOING UNILATERAL MASTECTOMY: CASE REPORT
Néfily Alves Esteves*, Marília D’Elia Eneas*, Caio José Xavier Abimussi†
RESUMO
A anestesia por tumescência é uma técnica utilizada em cirurgias oncológicas envolvendo
glândula mamária que necessitam de grandes margens de ressecção. Esta técnica produz
analgesia trans e pós-operatório além de reduzir o sangramento cirúrgico. Foi atendido no
Hospital Veterinário “Roque Quagliato” uma cadela da raça Teckel, fêmea, oito anos, 11 kg,
que foi submetida à mastectomia unilateral. Como medicação pré-anestésica foi administrado
acepromazina (0,02 mg/kg) associado a metadona (0,3 mg/kg) pela via intramuscular. A
indução anestésica foi realizada com etomidato (1 mg/kg) e midazolam (1 mg/kg) por via
intravenosa, seguido pela intubação orotraqueal da paciente e a manutenção anestésica foi
mantida com isoflurano diluído com oxigênio, em concentrações suficientes para manter o
animal em plano anestésico cirúrgico, instituído por Guedel (Plano II/Estágio III). Para a técnica
de tumescência, foi utilizada uma solução composta por 480 mL de solução Ringer Lactato
resfriada, acrescidos de 20 mL de lidocaína a 2% sem vasoconstritor e 1 ml de adrenalina
(1:1000) resultando em uma solução a 0,08%, em volume 30 mL/kg. No transoperatório foram
monitoradas FC, f, temperatura e pressão arterial. O objetivo desse trabalho é relatar a
realização de uma anestesia por tumescência a 0,08% em uma cadela submetida à mastectomia
unilateral.
Palavras-chave: anestesia local; lidocaína; analgesia; diminuição do sangramento
ABSTRACT
Tumescent local anesthesia is a widely used technique in oncologic surgeries necessitating large
resection margins. This technique produces trans and postoperative analgesia, reducing surgical
bleeding. A female, 11 kg, eight year old dog of breed Teckle was submitted to a unilateral
mastectomy at the Veterinary Hospital “Roque Quagliato”. As preanesthetic agent was given
acepromazine (0.02 mg.kg¹) associated with methadone (0.3 mg.kg¹), intramuscularly. The
anesthetic induction was performed with etomidate (1 mg.kg¹) and midazolam (1 mg.kg¹)
intravenously, followed by orotracheal intubation and anesthesia was maintained with
isoflurane diluted with oxygen in concentrations sufficient to keep the animal in surgical
anesthesia, established by Guedel (Plan II/Stage III). For the tumescent technique, was used a
solution consisting of 480 mL of Ringer Lactate, added by 20 mL of vasoconstrictor free
lidocaine at 2% and 1 mL of adrenaline(1:1000) resulting in a 0.08% solution to a volume of
30 mL/kg, kept in a temperature of 8 to 12 ºC. Temperature, FC, f and blood pressure were
monitored on the transoperative. The goal of this project is to account for the realization of a
tumescent anesthesia at 0.08% in a dog that was submitted to unilateral mastectomy.
Keywords: local anesthesia; lidocaine; analgesia; decreased bleeding
INTRODUÇÃO
*
Discente do Curso de Medicina Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil. E-mail: [email protected]
†
Docente, Disciplina de Anestesiologia Veterinária. . Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São
Paulo, Brasil.
Esteves NA, Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia por tumescência com lidocaína 0,08% em cadela submetida à
mastectomia radical unilateral: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 21-25.
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Nas últimas décadas tem se constatado um crescente aumento na predominância de
câncer nos animais de estimação, sendo considerada por alguns autores a maior causa morte na
espécie canina (1). As neoplasias mamárias são os tumores mais frequentes de cadelas não
castradas ultrapassando uma incidência de malignidade de 50% nessa espécie implicando em
altos índices de mortalidade devido a recidivas e metástases em outros órgãos (2,3).
A mastectomia é uma cirurgia de eleição para tumores mamários com alta malignidade,
na qual envolve a manipulação superficial de estruturas em grandes dimensões desde a região
torácica até a inguinal, promovendo uma ferida cirúrgica com grau de dor de moderada a grave.
Essa dor é provida pelas suturas de aproximação, que em medicina humana é descrito como
síndrome da dor pós mastectomia (1,2,3).
A dor compromete a reabilitação desses pacientes, resultando em hiporexia, catabolismo
proteico exacerbado, hipersensibilidade central e dor crônica aumentando as complicações no
pós-operatório. Com isso a busca por novos métodos de controle de analgesia tem se tornado
cada vez mais importante na medicina veterinária (4).
Os anestésicos locais são utilizados como constituintes do protocolo anestésico em
cirurgias de mastectomia uma vez que promovem a redução da vaporização dos anestésicos
voláteis minimizando os riscos advindos dos planos anestésicos profundos (5,6). São descritas
também como vantagens da utilização desses fármacos conforto pós-operatório, diminuição do
uso opióides e diminuição da incidência da dor crônica (4).
Em meio às técnicas de anestesia locorregional podemos destacar a técnica de anestesia
por tumescência, que vem se sobressaindo cada vez mais na medicina veterinária por ser um
método prático e seguro para esse procedimento. (7,8). Tal técnica consiste na infiltração de
grandes quantidades de soluções anestésicas no tecido subcutâneo (6,9,10). Apresentando como
vantagens a potencialização bioquímica dos anestésicos, o aumento da disponibilidade do
anestésico no local de administração, a eficiência em atingir pele e tecido subcutâneo, a mínima
absorção sistêmica do fármaco, redução da toxidade sistêmica, aumento da dose limite, a
elevação mecânica das camadas da pele por hidrodivulsão, analgesia pós-operatória (10 a 18
horas), ação antibacteriana e o aumento da pressão hidrostática local consequentemente
reduzindo o sangramento tanto no transoperatório quanto no pós-operatório (4,5,6,8,11).
Os benefícios dessa técnica se devem as propriedades dos componentes da solução que
na maioria das vezes é constituída por um anestésico local, um fármaco com efeito
vasoconstritor, uma substância reguladora de pH e ainda uma solução de infusão intravenosa
estéril. Ainda que a literatura relate várias formulações dessa solução, não há um consenso
quanto à padronização dessa anestesia embora a lidocaína, adrenalina e uma solução estéril
intravenosa sejam os componentes mais utilizados na formulação (4,5,11). Contudo essa prática
isolada não é exequível, devido a colaboração do paciente que muitas vezes reluta em
permanecer em decúbito e imóvel durante a cirurgia (5,8)
Os anestésicos locais de maneira geral têm como mecanismo de ação o bloqueio dos
impulsos nervosos aferentes, principalmente os que conduzem os estímulos dolorosos.
Apresentam perda temporária da sensibilidade, pois bloqueia os canais de cálcio e
consequentemente a despolarização da membrana. Dispõe de um rápido efeito e uma meia vida
plasmática média, quando combinado com um fármaco vasoconstritor onde seu metabolismo é
previsível e sua toxidade mais fácil de reverter correspondendo um melhor prognóstico (4).
A lidocaína é o fármaco mais empregado na anestesia por tumescência, a qual é
encontrada em soluções a 1% e 2% com ou sem epinefrina, em forma de gel a 2%, aerossol a
10%, em solução a 4 % e em creme a 5%, podendo ser empregada em anestesias tópicas,
intravenosas ou infiltrativas. Esta sem vasoconstritor é indicada também como antiarrítmico e
como analgésico, tanto como anestésicos quanto analgésicos para dor crônica. A dose máxima
recomendada para tumescência em caninos é de 12 mg/kg e a dose para desencadear convulsões
é de 22±6,7 mg/kg (5). Para a técnica de tumescência a concentração fica a critério do médico
Esteves NA, Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia por tumescência com lidocaína 0,08% em cadela submetida à
mastectomia radical unilateral: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 21-25.
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veterinário que deverá levar em consideração a superfície e volume da região a ser anestesiada
não devendo ultrapassar a dosagem recomendada (4).
O objetivo desse trabalho é relatar a realização de uma anestesia por tumescência a
0,08% em uma cadela submetida à mastectomia.
MATERIAIS E METODOS
Foi atendido no Hospital Veterinário “Roque Quagliato” um canino doméstico da raça
Teckel, fêmea, oito anos, 11 kg, com queixa de nódulos em região mamária. Após atendimento
pelo serviço de clínica cirúrgica de pequenos animais, foi constatado que se tratava de uma
neoplasia mamária e após confirmação por exame citológico, foi indicado o tratamento
cirúrgico, com remoção da cadeia mamária acometida.
O animal foi encaminhado à internação, permanecendo em jejum alimentar e hídrico
(12 horas e 2 horas, respectivamente). No dia do procedimento, o animal foi encaminhado para
a sala de preparo anestésico onde foi submetido à avaliação física (FC, f, temperatura retal,
avaliação e mucosas e hidratação). O animal recebeu como medicação pré-anestésica (MPA)
acepromazina (0,02 mg/kg) associada com metadona (0,3 mg/kg) pela via intramuscular.
Decorridos 10 minutos, realizou-se a tricotomia da região a ser abordada cirurgicamente bem
como o local para a cateterização e fornecimento de fluidoterapia. Após alocação de um cateter
22G em veia cefálica, o animal foi conduzido ao centro cirúrgico onde se realizou indução com
etomidato (1mg/kg) e midazolam (1 mg/kg), por via intravenosa, seguida de intubação e
manutenção anestésica com isoflurano em concentrações suficientes para manter o animal em
plano anestésico cirúrgico, instituído por Guedel (Plano II/Estágio III).
Para a anestesia de tumescência, foi utilizado o mandril do cateter 18, acoplada a uma
torneira de três vias, um equipo macrogotas e uma seringa de 20 mL Em seguida realizou-se
assepsia da região com álcool onde o mandril foi introduzido no subcutâneo iniciando-se a
administração da solução de tumescência num volume fixo de 30 mL/kg. A solução foi
composta de 480 ml de solução Ringer lactato, 20 ml de lidocaína a 2% sem vasoconstritor e 1
ml de adrenalina resultando em uma solução a 0,08%, e resfriada a uma temperatura de 8 a 12
ºC.
Os parâmetros foram aferidos ao longo do procedimento cirúrgico, em intervalos de
cinco minutos. O animal recebeu como medicação trans operatória: cefazolina (30 mg/kg) por
via intravenosa e meloxicam (0,15 mg/kg) por via subcutânea.
RESULTADOS
O ato cirúrgico perdurou durante duas horas onde o animal foi monitorado, através de
frequência cardíaca, frequência respiratória, temperatura e pressão arterial a qual mantiveramse estáveis confirmando o plano anestésico adequado. A temperatura durante todo o
transoperatório foi inferior a temperatura basal, sendo o valor mínimo encontrado de 35,6ºC.
A frequência cardíaca manteve-se abaixo dos 10% da frequência cardíaca basal (114
batimentos por minuto) durante todo o ato cirúrgico.
Durante o procedimento cirúrgico a frequência respiratória não apresentou nenhuma
relevância já que o animal manteve-se na ventilação mecânica. A pressão arterial média teve
um aumento durante o ato cirúrgico, devido à técnica de exérese por tração manual, se
estabilizando novamente após o término do método. O volume expirado do anestésico
halogenado não apresentou variância significante no período do transoperatório.
Tabela 1 - Paramentos avaliados durante o trans cirúrgico.
Parâmetros
Basal
Inicio Cirurgia
Exérese
Final Cirurgia
FC (bpm)
114
85
102
122
Esteves NA, Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia por tumescência com lidocaína 0,08% em cadela submetida à
mastectomia radical unilateral: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 21-25.
Alm. Med. Vet. Zoo. 24
f (mpm)
36
10
16
23
38,2
37,2
36.3
35,6
PAM (mmHg)
-
53
68
73
V (%)
-
1,3
1.16
1,0
SpO2 (%)
-
98
98
98
T (ºC)
FC (frequência cardíaca), f (frequência respiratória), T (temperatura), PAM (pressão arterial
media), V (vaporização) e SpO2 (saturação de oxihemoglobina)
DISCUSSÃO
Conforme verificado em estudos anteriores as concentrações da anestesia por
tumescência podem apresentar variações de 0,05 a 0,1 % portanto devido a não padronização
da composição e uma variância na taxa a ser infundida outras concentrações foram constatadas
como 0,3%, 0,16% até 0,32% na qual não ultrapassaram os limites plasmáticos tóxicos de
lidocaína (5,4). No estudo apresentado a solução foi composta de um fármaco anestésico local,
uma substância vasoconstritora e uma solução reguladora que apresentou uma concentração
0,08% consideradas baixas perante o procedimento no qual é considerado com um grau de dor
de moderado a grave.
A solução foi administrada por meio de um cateter não sendo, de acordo com Credie et
al (2013) e Abimussi et al (2014) (6,10) o mais adequado devido a sua limitação de tamanho
para alcançar todo o tecido, necessitando de várias perfurações na pele o que resulta em
hematomas. Os autores ainda ressaltam a realização da infiltração utilizando a cânula de Klein
por possuir ponta romba e tamanho variado, características essas que reduzem os traumas e
hematomas na pele bem como o número de punções. Outra vantagem é a presença vários
orifícios na extremidade da cânula o que facilita a difusão da solução para todo o tecido com
maior eficiência.
A frequência cardíaca apresentou estável, contando que o animal encontrava-se em
plano anestésico adequado, não precisando administrar fármacos analgésicos durante todo o
procedimento como verificado durante estudos por Correia (4). A frequência respiratória não
apresentou nenhuma relevância nesse estudo já que o animal se manteve na ventilação
controlada, mas sendo um fator importante a observa pois segundo Hustad & Aitken (2006)
(12) uma das complicações na medicina humana gerada pela anestesia de tumescia são as
complicações respiratória, como o edema pulmonar pela grande infusão de líquidos. A pressão
arterial media apresentou-se aumento devido exérese por tração manual do tecido como verifico
também por (8).
Os parâmetros monitorados mantiveram-se estáveis, embora tenha ocorrido a queda da
temperatura durante o procedimento cirúrgico. Isso pode ser atribuído ao fato de o paciente
encontrar-se sob anestesia geral e a solução infiltrada estar resfriada. (8). Essa ocorrência não
é verificada em medicina humana, pois as soluções são infundidas a uma temperatura de 38ºC
a 40ºC minimizado a perda de temperatura e melhorando o conforto na hora da infiltração já
que em muitos casos, os pacientes encontram-se sob mínima sedação (11,12).
CONCLUSÃO
Conclui-se que a utilização da técnica de anestesia por tumescência é efetuada com
grande sucesso em mastectomias, entretanto no presente estudo a associação com epidural pode
ter infuenciado na eficiencia dessa tecnica como sujere alguns autores nos quais preconizam a
assosiação das mesmas para maior excelencia. Verificou-se tambem que a concentração de
lidocaina de 0,08% apesar de encontram-se abaixo da dosagem prescrita produziram um efeito
Esteves NA, Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia por tumescência com lidocaína 0,08% em cadela submetida à
mastectomia radical unilateral: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 21-25.
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desejado na qual o animal mante-se em plano anestesico adequado com valores de vaporização
de anestesico baixo e estaveis, e conforto no pos-cirurgico.
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Recebido em 14 de janeiro de 2015.
Publicado em 02 de março de 2015.
Esteves NA, Eneas MD, Abimussi CJX. Anestesia por tumescência com lidocaína 0,08% em cadela submetida à
mastectomia radical unilateral: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 21-25.
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ASPECTOS CLÍNICO-PATOLÓGICOS DA DEMODICIOSE CANINA E O USO DO
TRATAMENTO DE DORAMECTINA ATRAVÉS DA EXTRAPOLAÇÃO
ALOMÉTRICA INTERESPECÍFICA
CLINICAL PATHOLOGICAL ASPECTS OF CANINE DEMODICOSIS AND THE
DORAMECTIN TREATMENT OF THE USE THROUGH EXTRAPOLATION
INTERSPECIFIC ALLOMETRIC
Camila Zanon Gonçalves* Freddi Bardela de Souza†
RESUMO
A demodiciose canina é uma das dermatopatias mais comumente encontradas nas clínicas
veterinárias, sendo que a forma generalizada é a manifestação mais grave dessa doença nos
cães, principalmente nos jovens, devido a uma imunodeficiência hereditária que leva a
proliferação excessiva do ácaro Demodex. Com o insucesso no tratamento através do amitraz,
sendo que este se estabeleceu como padrão terapêutico por mais de 20 anos, e por suas
consecutivas recidivas e efeitos colaterais, que uma nova classe terapêutica vem ganhando
espaço, a doramectina, uma avermectina do grupo das lactonas macrocíclicas. A doramectina é
extremamente eficiente no tratamento da demodiciose, quando empregada semanalmente por
via subcutânea, em doses calculadas por meio de extrapolação alométrica interespecífica, sem
apresentar quaisquer efeitos colaterais.
Palavras-chave: cão; Demodex; doramectina; extrapolação alométrica
ABSTRACT
Canine demodectic mange, or canine demodiciosis, is one of the most commonly found skin
diseases in veterinary practice, and the general shape is the most severe manifestation of this
disease in dogs, especially in the young due to an inherited immunodeficiency disease leads to
excessive proliferation Demodex canis mite. After the failure of treatment with amitraz that had
been established as a therapeutic standard for over 20 years, and in consecutive relapses and
side effects, new therapeutic class has been increasing, the Doramectin, an avermectin of
Macrocyclic lactones family. Doramectin is extremely efficient in treating demodiciose, when
used weekly subcutaneously at doses calculated by interspecific allometric extrapolation,
without showing any side effects.
Keywords: dog; Demodex; doramectin; allometric scaling
INTRODUÇÃO
A demodiciose canina consiste em uma dermatopatia primária inflamatória, não
contagiosa, causada pela excessiva proliferação do Demodex canis, que é um ácaro comensal
da microbiota cutânea canina (1). Também podem ser mencionadas outras novas espécies de
ácaros, não tão frequentes, como Demodex cornei e Demodex injai (2).
A doença é classificada como localizada (DCL) ou generalizada (DCG), E dependendo
das primeiras manifestações clínicas, pode ser classificada como juvenil ou adulto (3).
O diagnóstico é feito a partir dos sinais dermatológicos e por exame microscópico para
pesquisa do ácaro no material colhido do exame parasitológico cutâneo (4).
*
Discente do Curso de Medicina Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil. E-mail: [email protected]
†
Docente, Disciplina de Patologia Veterinária. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo,
Brasil.
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 27
Devido ao insucesso no tratamento da demodiciose com o uso de amitraz (5),
atualmente, a terapia com doramectina, uma avermectina, vem sendo preconizada devido ao
seu perfil farmacocinético prolongado e sua alta potência contra nematódeos e artrópodes (6).
Nos cães, seu uso é através de doses por extrapolação alométrica interespecífica (7). As
doses são calculadas com base na massa corporal do paciente, e expressas de maneira
unidimensional, como quantidade por unidade de massa (mg/Kg). Dessa maneira, a quantidade
total do fármaco aumenta de maneira linear à elevação do peso corporal do animal (8).
Sendo assim, prognóstico é bom, em mais de 95% dos casos apresentam cura e sem
recidivas, como também é o único método eficaz para as raças Collie, já que esta apresenta
sensibilidade a outras classes de fármacos, como a ivermectina (9).
O objetivo deste trabalho é descrever sobre os aspectos clínico-patológicos da
demodiciose canina e o uso do tratamento com doramectina através da extrapolação alométrica
interespecífica.
REVISÃO DE LITERATURA
Etiologia
O Demodex canis é um parasito obrigatório da pele de cães e morre facilmente fora
desta, pela dissecação (10). O parasito habita o interior dos folículos pilosos, e ocasionalmente
as glândulas sebáceas e glândulas sudoríparas apócrinas (11), e se alimenta de secreção sebácea,
de escamas e de células vivas (12). O Demodex injai possui opistossoma mais longo, enquanto
o Demodex cornei possui um corpo mais curto que os demais (13).
As fêmeas fecundadas depositam seus ovos no folículo piloso. Ao eclodirem, as larvas
deslocam-se para a superfície, alimentam-se e mudam para protoninfa, e depois para
deutoninfa. As larvas e as ninfas se movimentam pelo fluxo sebáceo para a entrada do folículo,
onde alcançam o estágio adulto e repetem o ciclo, que é completado em até 35 dias (16).
Epidemiologia
A demodiciose canina é mais comum em regiões tropicais e subtropicais, onde tende a
seguir um curso mais agressivo e ocorre em igual freqüência em cães de pêlos longos e pêlos
curtos (17).
As raças mais comum de serem vistas nas clínicas veterinárias são o Boxer, Buldog
Inglês, Collie, Dálmata, Dachshund, Lhasa Apso, Pug, Rottweiller, Shar-Pei Chinês, Pit Bull
Terrier e Shi Tzu (18).
A demodiciose não é contagiosa para o homem. Acomete animais tanto na fase jovem
com aproximadamente dezoito meses, como na fase adulta com idade geralmente superior a
quatro anos (19).
Existem alguns fatores predisponentes para a manifestação da demodiciose como
estresse, desnutrição, traumatismo, estro, parto, lactação, ou até mesmo doenças
imunossupressoras, como diabetes mellitus, doenças hepáticas, neoplasia, hipotireoidismo e
hiperadrenocorticismo (14). A administração de drogas imunossupressoras também pode
predispor à doença (20).
Patogenia e Transmissão
Supõe-se que certas cadelas transportem um fator geneticamente transmitido que resulta
em imunodeficiência em seus filhotes, tornando-os mais suscetíveis á invasão por ácaros (22).
Além disso, supõe-se que o próprio Demodex canis cause uma imunodeficiência mediada por
células que suprime a resposta normal de células T (14).
A transmissão ocorre da cadela para os neonatos lactantes por contato direto nos dois
ou três primeiros dias de vida neonatal, uma vez que o Demodex canis é residente normal da
pele canina. Os ácaros são observados primeiramente na face dos filhotes, e quando atingem 16
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 28
horas de vida são evidenciados nos folículos pilosos (17). Quando os filhotes nascem por
cesária, recebem a alimentação sem ser pela mãe infectada, eles não albergam os ácaros, assim
como nos filhotes natimortos o que demonstram que a transmissão in útero não ocorre (12).
Sintomatologia Clínica
A demodiciose pode ser reconhecida em dois tipos: a localizada, ou escamosa e a
generalizada, ou pustular (16). Também há relato da pododemodiciose (6).
Os sinais clínicos da demodiciose causada pelo Demodex. injai são semelhantes àqueles
ocasionados pelo Demodex canis, como alopecia, descamação, eritema, hiperpigmentação e
prurido variável (23).
Demodiciose Canina Localizada
A demodiciose canina localizada (DCL), ou demodiciose escamosa, é a forma mais
comum da doença e acomete cães jovens de menos de um ano, (geralmente entre os 3 a 6 meses
de idade) (24), e se caracteriza pela presença de menos de seis lesões cutâneas circulares,
alopécicas, escamosas e mais ou menos inflamadas, sendo na maioria das vezes autolimitante
(22).
As lesões são mais frequentemente observadas na face, na região periocular, nos lábios,
nas comissuras labiais, no queixo e condutos auditivos externos (otodemodiciose) (19). Estas
regiões são mais frequentemente acometidas em razão da sua densidade elevada de glândulas
sebáceas, de umidade mantida pela lágrima e pela saliva trazida pelas lambeduras e, também,
por serem zonas de maior contato com a mãe no momento do aleitamento (24).
As lesões são caracterizadas por graus variados de eritema, descamação, alopecia e
hiperpigmentação com comedões, com ou sem prurido. As áreas afetadas tornam-se “quentes
ao toque”, ásperas e espessadas, podendo apresentar-se recobertas por escamas prateadas (12).
Demodiciose Canina Generalizada
A demodiciose canina generalizada (DCG) acomete mais os jovens, entre 3 a 18 meses
de idade. No cão adulto, às vezes é observada em animais que tiveram ocorrência branda da
sarna quando jovens, mas sem diagnóstico ou sem resolução da doença (6).
As lesões são frequentemente dolorosas e com mais de cinco áreas de alopecia focal,
especialmente na cabeça, nas pernas e no tronco (25), mas podem afetar toda a região corpórea,
com envolvimento dos espaços interdigitais de duas ou mais patas (pododemodiciose) (19).
A alopecia generalizada difusa é a única anormalidade cutânea no curso inicial da
afecção. Em pouco tempo podem ser observadas eritema, descamação, formação de crostas e
tamponamento folicular que resultam na forma escamosa da DCG. Alguns cães, em especial os
adultos, exibem manchas multifocais de hiperpigmentação (13).
As lesões de pele ocasionadas pelo D. canis em sua forma generalizada permitem que a
flora bacteriana normal da pele se torne patogênica. A piodermite gerada por essa proliferação
é ocasionada principalmente pelo Staphylcoccus intermedius, uma bactéria gram-positiva que
está envolvida em aproximadamente 90% dos casos (16-22).
As infecções oportunistas podem levar ao quadro de demodiciose pustular caracterizada
pela presença de pápulas, pústulas e foliculite, com secreção sanguinopurulenta, além de edema
e comprometimento geral do paciente. Podem ocorrer piodermite profunda com formação de
crostas, ulceração e exsudação das lesões (19). Prurido, que não é uma característica comum na
demodiciose, pode estar presente, em decorrência de uma reação de hipersensibilidade e
infecções secundárias. O animal pode apresentar odor desagradável e uma ampla
descaracterização da pele (17).
Pododemodiciose
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 29
Esta forma da doença ocorre nas extremidades dos membros do animal, sem que
ocorram lesões generalizadas. Podem-se observar lesões digitais e interdigitais, susceptíveis às
piodermites secundárias. Em alguns cães, a pododemodiciose pode cronificar, tornando-se
extremamente resistente à terapia (12).
As lesões caracterizam-se por prurido interdigital, dor, eritema, alopecia,
hiperpigmentação, liquenificação, descamação, edema, crostas, pústulas, bolhas e comedões
(19).
Diagnóstico
Devemos suspeitar de demodiciose canina se houver uma história de demodiciose
familiar. Temos sempre que questionar os proprietários uma série de eventos ou situações
poderiam descompensar a capacidade do animal de controlar a proliferação de ácaros (3).
Deve-se realizar um exame físico completo para identificar fatores ou doenças
predisponentes (16). São utilizados os testes laboratoriais para triar quanto às doenças
predisponentes, especialmente quando se encontra presente a demodiciose generalizada canina.
Perfil bioquímico sérico, urinálise e hemograma completo, constituem os testes de triagem
básicos (26). Se juntarmos a anamnese, o exame físico e os testes laboratoriais de triagem e os
mesmos indicarem uma disfunção endócrina ou disfunção interna possível, deve-se então
realizar testes mais específicos, como por exemplo, testes para o diagnóstico do
hiperadrenocorticismo (27).
Geralmente a técnica de primeira escolha para o diagnóstico de demodiciose é o exame
parasitológico de raspado cutâneo o qual apresenta fácil execução, baixo custo e alta
sensibilidade (3).
Os raspados de pele devem ser profundos e realizados na direção do crescimento dos
pelos, realizando em diferentes regiões do corpo, especialmente em áreas de transição de pele
saudável e a lesão, e com presença de comedões (15). Deve-se pinçar a pele para tentarmos
expor os ácaros para fora dos folículos pilosos, e realizar o raspado com uma lâmina de bisturi
cirúrgico, bem profundo, até que ocorra sangramento capilar (27). O material coletado deverá
ser colocado em uma lâmina e observado ao microscópio no aumento de 40X e 100X (16).
De acordo com Mueller (15), o diagnóstico é feito quando se observa grande número de
ácaros adultos ou pelo achado de uma relação aumentada de ovos, larvas ou ninfas em relação
aos adultos. Mas como é difícil achar um ácaro no raspado de um animal, quando visualizado
em pequena quantidade, não devemos descartar a hipótese do animal estar com a doença;
portanto o melhor seria realizar vários raspados antes de se excluir o diagnóstico.
Em áreas delicadas como região periocular, podemos optar pela técnica da impressão
em fita adesiva, que é realizada através do beliscamento da pele lesionada para externação dos
ácaros do folículo piloso e posterior decalque da face adesiva da fita sobre a área pressionada
(19).
O exame histopatológico é indicado em casos onde há suspeita de demodiciose, e os
raspados cutâneos rotineiros deram negativos (12). Isto é, particularmente comum em pacientes
com lesões crônicas ou cicatrizes, como as da pododemodiciose. Cães da raça Shar Pei também
são relatados por serem difíceis de realizar raspado cutâneo devido a suas dobradiças na pele e
assim requererem exame histopatológico (6). A biópsia cutânea relata graus variáveis de
perifoliculite, foliculite e furunculose. Os folículos afetados estão repletos de ácaros, restos
queratinosos em número variável de alguns tipos de células inflamatórias. É comum aparecer
infecção secundária bacteriana (27).
O diagnóstico diferencial para DCG é feito principalmente para foliculite e a
furunculose causadas por outros agentes que não sejam o Demodex spp. Ainda quando há
esfoliação é importante diferenciar de seborréia (25). Já a DCL deve ser diferenciada de
dermatofitoses ou trauma localizado (28). Em cães adultos, as doenças de base devem ser
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 30
investigada especialmente as que levam a quadros de imunossupressão, com ênfase aos casos
de hiperadrenocorticismo (3).
Tratamento
A demodiciose canina localizada e a generalizada devem ser consideradas como duas
entidades patológicas distintas, exigindo avaliação clínica e tratamento diferentes (6). As
possibilidades de cura são maiores quando controladas as causas primárias da imunossupressão
em animais adultos (16), sendo que o insucesso terapêutico se deve, basicamente, à tríade
composta por localização profunda dos ácaros, imunocomprometimento e piodermites
secundárias (10). Os tratamentos mais usados atualmente são o amitraz e as lactonas
macrocíclicas (15).
O amitraz é um acaricida/inseticida da família da formamidina, e foi o primeiro produto
licenciado para tratamento de demodiciose canina generalizada, constituindo um passo
significativo na terapia, e permanecendo por mais de 20 anos como padrão terapêutico (20).
A eficácia do tratamento com amitraz apresenta grande variação, em estudos com
acompanhamento de 12 meses, ocorreu recidiva diagnosticada por raspagens cutâneas em 29
de 254 cães (11%) (15). Os efeitos adversos observados no tratamento com amitraz foram
depressão, sonolência, ataxia, polifagia/polidipsia, êmese/diarreia, além de eritema
generalizado, descamação e odor desagradável (26).
Ao longo de duas décadas de uso do amitraz no tratamento da demodiciose foi possível
observar indícios de resistência parasitária, sendo que provavelmente a seleção de ácaros
resistentes decorreu do uso incorreto da aplicação do produto (20). Assim, como consequência
da resistência e dos inconvenientes da utilização do amitraz, moléculas com ação sistêmica
passaram a ser testadas, destacando-se as lactonas macrocíclicas (LM), como a doramectina
(15).
Os primeiros estudos sugeriam que as LM atuavam somente na modulação da
neurotransmissão mediada pelo ácido gama-aminobutírico (GABA), mas atualmente sabe-se
que as LM se ligam seletivamente aos canais de cálcio mediados por glutamato, pelos quais
têm grande afinidade, potencializando-os ou ativando-os diretamente, resultando em aumento
da permeabilidade celular aos íons cloro e causando bloqueio neuromuscular, que resulta em
paralisia e morte do parasito (6, 15, 22).
A doramectina é uma avermectina que passou a ser usada com sucesso tratamento da
demodiciose a partir de 1999 (9). O medicamento também já foi empregado de forma preliminar
no tratamento de sarna sarcóptica canina e sarna notoédrica felina (6).
No Brasil, o produto comercial chama-se Dectomax®, e a doramectina é produzida a
partir da fermentação por uma nova cepa de Streptomyces avermitilis, sendo escolhida para
produção industrial, em função de seu perfil farmacocinético prolongado e sua alta potência
contra nematódeos e artrópodes (27).
Em um estudo feito por PACHALY et al., (9), onde 18 cães portadores da demodiciose,
empregando o uso da doramectina durante seis a doze semanas, com doses semanais calculadas
por meio da extrapolação alométrica interespecífica, obteve-se resultado de quase 95% de cura,
e 15 destes animais acompanhados em um período de 12 meses após término do tratamento,
não apresentaram nenhuma recidiva. Assim a doramectina apresenta uma eficiência comparável
à da milbemicina oxima e superior à ivermectina. Outro estudo com 15 cães portadores da
doença, tratados durante cinco a quinze semanas, durante a primeira e décima terceira semana
de tratamento já obteve o raspado negativo, não evidenciando o ácaro. Com isso, os resultados
mostraram que todos os animais apresentaram cura (100%), e sem recidivas, logo após 12 meses
do fim do tratamento (6).
No que diz respeito ao emprego da doramectina em raças que têm notória
hipersensibilidade à ivermectina, existe um relato de administração experimental da
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 31
doramectina em um Collie adulto (29), utilizando doses calculadas por meio de extrapolação
alométrica interespecífica. Naquele caso, o fármaco foi administrado semanalmente durante
cinco semanas, sendo as doses ajustadas também semanalmente, uma vez que houve expressivo
ganho de peso à medida que o paciente recuperava, observando-se ausência de efeitos colaterais
e excelente recuperação (29).
Segundo Silva (6), a partir da dose de doramectina de 0,02 mg/kg, recomendada para
um bovino doméstico com peso de 500 kg, foram feitos cálculos de extrapolação alométrica
interespecífica. Tendo em vista a concentração 10 mg/mL do produto comercial Dectomax®,
tais cálculos geraram tabelas referentes às doses em mL para administrar em cães domésticos
pesando entre 1,0 e 89,5 kg (tabela 1 e 2). Sendo em via subcutânea e o intervalo de
administração semanal (sete dias). As doses devem ser reajustadas semanalmente, de acordo
com a variação de peso apresentada pelos pacientes.
Tabela 1 - Doses de doramectina a 1%, em mL, a administrar semanalmente, por via
subcutânea, para tratamento de demodicose, cães pesando de 1,0 a 10,1 kg (5)
Peso (kg)
1,00
1,10
1,20
1,30
1,40
1,50
1,60
1,70
1,80
1,90
2,00
2,10
2,20
2,30
2,40
2,50
2,60
2,70
2,80
2,90
3,00
3,10
3,20
Dose
(mL)
0,095
0,102
0,108
0,115
0,122
0,128
0,135
0,141
0,147
0,153
0,159
0,165
0,171
0,177
0,182
0,188
0,194
0,199
0,205
0,210
0,216
0,221
0,226
Peso (kg)
3,30
3,40
3,50
3,60
3,70
3,80
3,90
4,00
4,10
4,20
4,30
4,40
4,50
4,60
4,70
4,80
4,90
5,00
5,10
5,20
5,30
5,40
5,50
Dose
(mL)
0,232
0,237
0,242
0,247
0,252
0,257
0,262
0,267
0,272
0,277
0,282
0,287
0,292
0,297
0,302
0,307
0,311
0,316
0,321
0,326
0,330
0,335
0,340
Peso (Kg)
5,60
5,70
5,80
5,90
6,00
6,10
6,20
6,30
6,40
6,50
6,60
6,70
6,80
6,90
7,00
7,10
7,20
7,30
7,40
7,50
7,60
7,70
7,80
Dose
(mL)
0,344
0,349
0,353
0,358
0,363
0,367
0,372
0,376
0,381
0,385
0,389
0,394
0,398
0,403
0,407
0,411
0,416
0,420
0,424
0,429
0,433
0,437
0,441
Peso (Kg)
7,90
8,00
8,10
8,20
8,30
8,40
8,50
8,60
8,70
8,80
8,90
9,00
9,10
9,20
9,30
9,40
9,50
9,60
9,70
9,80
9,90
10,00
10,10
Dose
(mL)
0,446
0,450
0,454
0,458
0,462
0,467
0,471
0,475
0,479
0,483
0,487
0,491
0,496
0,500
0,504
0,508
0,512
0,516
0,520
0,524
0,528
0,532
0,536
Tabela 2 - Doses de doramectina a 1%, em mL, a administrar semanalmente, por via
subcutânea, para tratamento de demodicose, cães pesando de 10,0 a 89,5 kg (5)
Peso (kg)
10,00
10,50
11,00
11,50
12,00
Dose
(mL)
0,532
0,552
0,571
0,591
0,610
Peso (kg)
30,00
30,50
31,00
31,50
32,00
Dose
(mL)
1,212
1,227
1,242
1,257
1,272
Peso (Kg)
50,00
50,50
51,00
51,50
52,00
Dose
(mL)
1,778
1,792
1,805
1,818
1,831
Peso (Kg)
Dose (ml)
70,00
70,50
71,00
71,50
72,00
2,289
2,301
2,313
2,325
2,338
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 32
12,50
13,00
13,50
14,00
14,50
15,00
15,50
16,00
16,50
17,00
17,50
18,00
18,50
19,00
19,50
20,00
20,50
21,00
21,50
22,00
22,50
23,00
23,50
24,00
24,50
25,00
25,50
26,00
26,50
27,00
27,50
28,00
28,50
29,00
29,50
0,629
0,647
0,666
0,684
0,703
0,721
0,739
0,757
0,774
0,792
0,809
0,826
0,844
0,861
0,878
0,894
0,911
0,928
0,944
0,961
0,977
0,993
1,009
1,025
1,041
1,057
1,073
1,089
1,105
1,120
1,136
1,151
1,167
1,182
1,197
32,50
33,00
33,50
34,00
34,50
35,00
35,50
36,00
36,50
37,00
37,50
38,00
38,50
39,00
39,50
40,00
40,50
41,00
41,50
42,00
42,50
43,00
43,50
44,00
44,50
45,00
45,50
46,00
46,50
47,00
47,50
48,00
48,50
49,00
49,50
1,287
1,302
1,317
1,332
1,346
1,361
1,375
1,390
1,404
1,419
1,433
1,447
1,462
1,476
1,490
1,504
1,518
1,532
1,546
1,560
1,574
1,588
1,602
1,616
1,629
1,643
1,647
1,670
1,684
1,698
1,711
1,725
1,738
1,752
1,765
52,50
53,00
53,50
54,00
54,50
55,00
55,50
56,00
56,50
57,00
57,50
58,00
58,50
59,00
59,50
60,00
60,50
61,00
61,50
62,00
62,50
63,00
63,50
64,00
64,50
65,00
65,50
66,00
66,50
67,00
67,50
68,00
68,50
69,00
69,50
1,845
1,858
1,871
1,884
1,897
1,910
1,923
1,936
1,949
1,962
1,975
1,988
2,001
2,013
2,026
2,039
2,052
2,064
2,077
2,090
2,102
2,115
2,127
2,140
2,152
2,165
2,177
2,190
2,202
2,215
2,227
2,240
2,252
2,264
2,276
72,50
73,00
73,50
74,00
74,50
75,00
75,50
76,00
76,50
77,00
77,50
78,00
78,50
79,00
79,50
80,00
80,50
81,00
81,50
82,00
82,50
83,00
83,50
84,00
84,50
85,00
85,50
86,00
86,50
87,00
87,50
88,00
88,50
89,00
89,50
2,350
2,362
2,374
2,386
2,398
2,410
2,422
2,434
2,446
2,458
2,470
2,482
2,494
2,506
2,518
2,530
2,542
2,554
2,565
2,577
2,589
2,501
2,512
2,524
2,536
2,548
2,659
2,671
2,682
2,694
2,706
2,717
2,729
2,740
2,752
Além do tratamento acaricida, recomenda-se para uma maior eficácia do tratamento,
tratar casos de piodermite secundárias com xampus antissépticos locais, como xampu de
peróxido de benzoíla a 3%, clorexidine e permanganato de potássio a 3% em casos de
pododemodiciose (3). A cefalexina tem sido o antibiótico de eleição, na dose de 20 a 30 mg/kg
duas vezes ao dia, por no mínimo duas a três semanas, e em caso de prurido, o uso de antihistamínicos pode ser recomendado (14).
O controle de cura com a realização do exame parasitológico cutâneo é de suma
importância no sucesso terapêutico, pois a melhora clínica não pode ser considerada como
parâmetro se um cão está totalmente curado, e as recidivas podem ser mais graves, caso o
proprietário decida desistir do tratamento (15).
Extrapolação Alométrica Interespecífica
. Alometria (alo = diferente, metria = medida), é o estudo da maneira pela qual uma
variável dependente (taxa metabólica), varia em relação a uma variável independente (massa
corporal) (30). Ou seja, é a comparação matemática entre animais de tamanhos/massas
diferentes, colocando-os dentro de um mesmo padrão numérico (7). O propósito do método
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
Alm. Med. Vet. Zoo. 33
alométrico é a extrapolação das doses de drogas entre animais de forma e/ou tamanhos díspares,
possibilitando o uso de dados farmacológicos obtidos em um animal modelo (animal para o
qual o fármaco foi desenvolvido), para a farmacoterapia em um “animal alvo” (paciente em
estudo) (8).
Convencionalmente, as doses de drogas são calculadas com base na massa corporal do
paciente, e expressas de maneira unidimensional, como quantidade por unidade de massa
(mg/Kg) (7). Quando existem grandes diferenças na massa e nas taxas metabólicas, como
acontece quando se comparam animais com dezenas ou centenas de kg de diferença, como cães
e bovinos, por exemplo, as doses empregadas podem variar tremendamente (30). O método de
extrapolação alométrica corrige essa distorção, empregando um sistema energético
(tridimensional ou volumétrico), que permite calcular e expressar doses como quantidade por
energia consumida pelo animal em situação de metabolismo basal, em mg/Kcal (6). Então, a
comparação alométrica permite que se calculem dosagens e freqüências de administração de
drogas para indivíduos diferentes daqueles para os quais já se realizaram estudos
farmacocinéticos, com base em suas necessidades energéticas (30).
Prognóstico e Controle
O prognóstico depende da genética, da resposta imunológica e das doenças subjacentes,
sendo que a forma localizada, na maioria dos casos apresenta resolução espontânea, em um
período que dura de seis a oito semanas, como também pode evoluir para a forma generalizada
(18).
Com o uso da doramectina o prognóstico é bom, em mais de 95% dos casos apresentam
cura e sem recidivas, como também é o único método eficaz para a raça Collie, já que esta
apresenta sensibilidade a outras classes de fármacos, como a ivermectina (9).
Para prevenir a demodiciose, deve-se evitar o uso de drogas imunossupressoras, retirar
os machos e as fêmeas portadores da doença da reprodução, e nas fêmeas deve ser realizada a
ovário salpingo histerectomia (OSH), uma vez que estas poderão ter recidivas quando estiverem
em estro, devido a supressão do sistema imunológico (19).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A demodiciose canina acomete principalmente cães de raças puras, devido a uma
predisposição genética que estaria relacionada a um defeito primário na imunidade mediada por
células T, podendo ser tanto localizada como generalizada, sendo esta a forma mais grave.
Devido ao insucesso no tratamento com o amitraz, atualmente o uso da doramectina no
tratamento da demodiciose com doses calculadas por extrapolação alométrica, permite-se um
percentual de quase 95% de cura, sem recidivas, e sem apresentar efeitos colaterais, sendo este
o único método eficaz para a raça Collie, já que esta apresenta hipersensibilidade a outras
drogas. Assim o clínico pode oferecer boas perspectivas de êxito na recuperação de animais
acometidos por esta dermatose.
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Recebido em 14 de janeiro de 2015.
Publicado em 02 de março de 2015.
Gonçalvez CZ, Souza FB. Aspectos clínico-patológicos da demodiciose canina e o uso do tratamento de
doramectina através da extrapolação alométrica interespecífica. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1 (1): 26-35.
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CARDIOMIOPATIA HIPERTRÓFICA FELINA: RELATO DE CASO
FELINE HYPERTROPHIC CARDIOMIOPATHY: CASE REPORT
Vinícius Aquiles Gomes Zamboni* Felipe Gazza Romão†
RESUMO
As doenças envolvendo o miocárdio formam o grupo de desordens cardíacas de maior
importância na espécie felina. Dentre as afecções do musculo cardíaco, a de maior prevalência
é a cardiomiopatia hipertrófica (CMH). A CMH é caracterizada por alterações fisiopatológicas
e estruturais no coração que implicam em um déficit no relaxamento ventricular e em uma
hipertrofia concêntrica da parede ventricular, resultando em disfunção diastólica, que por sua
vez acarreta na alteração de pressão de enchimento ventricular, atuando finalmente para o
desenvolvimento de insuficiência cardíaca congestiva. Por ser assintomática na maior parte da
vida, geralmente passa desapercebido pelo proprietário, até que o animal comece a apresentar
sinais de apatia, anorexia, prostração, emagrecimento, dispneia, intolerância ao exercício e
síncope, já em um estágio mais avançado da cardiomiopatia. O diagnóstico é difícil, pois as
alterações hematológicas, bioquímicas séricas, radiográficas e eletrocardiográficas muitas
vezes não se mostram eficientes. Por esta característica, o uso de ferramentas diagnósticas mais
específicas, como a ecocardiografia, se faz fundamental para o diagnóstico precoce da doença
e posteriormente para classificação do grau de alterações estruturais. O prognóstico é de
reservado a ruim, tendo em vista que a maior parte dos animais já chega em um estágio
avançado da doença. O tratamento visa garantir a qualidade de vida dos animais e prolongar a
sobrevida. O presente trabalho relata o caso de um felino da raça Persa, fêmea, de cinco anos
de idade, que deu entrada no Hospital Veterinário “Roque Quagliato”, das Faculdades
Integradas de Ourinhos, apresentando dispneia e taquicardia, posteriormente diagnosticado com
CMH.
Palavras-chave: cardiopatia; felino; hipertrofia concêntrica; hipertensão arterial;
tromboembolismo
ABSTRACT
Diseases involving the myocardium account for the group of heart disorders of utmost
importance in feline species. Among the diseases of the heart muscle, the most prevalent is
hypertrophic cardiomyopathy (HCM). Hypertrophic cardiomyopathy is characterized by
structural and pathophysiological changes in the heart which causes a deficit in the ventricular
relaxation, and a concentric hypertrophy of the ventricular wall, resulting in diastolic
dysfunction, which in turn leads to ventricular filling pressure change, acting to finally
development of congestive heart failure. Because it is asymptomatic in most of life, usually
goes unnoticed by the owner, until the animal begins to show signs of apathy, anorexia,
prostration, weight loss, dyspnea, exercise intolerance and syncope, already at a more advanced
stage of cardiomyopathy. Diagnosis is difficult because the hematological, serum biochemical,
radiographic and electrocardiographic studies often do not show signs. For this characteristic,
the use of more specific diagnostic tools, echocardiography, is essential for the early diagnosis
of the disease and later for classifying the degree of structural changes. The prognosis is poor,
*
Aluno do Programa de Aperfeiçoamento em Clínica Médica de Pequenos Animais. Faculdades Integradas de
Ourinhos - FIO, Ourinhos, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected]
†
Docente, Disciplina de Clínica Médica de Pequenos Animais. Faculdades Integradas de Ourinhos - FIO,
Ourinhos, São Paulo, Brasil.
Zamboni VAG, Romão FG. Cardiomiopatia hipertrófica felina: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1
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Alm. Med. Vet. Zoo. 37
considering that most of the animals is presents an advanced stage of the disease. The treatment
aims to ensure quality of life for animals and prolong survival. This paper reports one case of a
feline, Persian breed, female , five years old , at the Veterinary Hospital "Roque Quagliato" of
the Faculdades integradas de Ourinhos , presenting dyspnea and tachycardia , diagnosed with
HCM
Keywords: heart disease; feline; hypertrophy concentric; arterial hypertension;
thromboembolism
INTRODUÇÃO
As afecções do musculo cardíaco, ou cardiomiopatias, são as principais doenças
cardíacas em felinos, e podem basicamente ser caracterizadas por anormalidades estruturais e
funcionais do miocárdio (1,2). A cardiomiopatia hipertrófica (CMH) é a disfunção cardíaca de
maior prevalência entre os felinos, respondendo por dois terços de todas as doenças
cardíacas(3,4). É definida pelo aumento da massa cardíaca, sem dilatação ventricular, associada
à hipertrofia concêntrica do ventrículo esquerdo, podendo atingir diferentes proporções da
parede interventricular e/ou da parede livre do ventrículo esquerdo, com consequente redução
do tamanho da câmara ventricular esquerda (3,5). Esse conjunto de modificações estruturais,
em uma apresentação mais severa da doença, pode vir associada a sinais de dilatação do átrio
esquerdo, por hipertrofia ventricular direita e por sobrecarga atrial direita (5).
Embora haja um fundo hereditário para a doença, já relatado nas raças Maine Coon e
Ragdoll, transmitida por genes autossômicos dominantes que codificam proteínas sarcoméricas,
ainda são largamente classificadas como idiopáticas (6,7,8). Desta forma podemos classificar a
CMH em primária ou idiopática, ou em secundária, por alterações decorrentes de anormalidades
sistêmicas, como a hipertensão arterial sistêmica, metabólicas, como hipertireoidismo, ou
mesmo nutricionais (3,4).
Há uma incidência maior de CMH em machos, assim como em humanos, com a idade
média de acometimento por volta de quatro a sete anos (9,10). O prognóstico é de reservado a
ruim, levando em conta que geralmente os animais passam grande parte da vida assintomáticos,
e somente com o aparecimento dos primeiros sinais da doença, na sua maioria inespecíficos,
como apatia, anorexia, náusea, êmese, e em casos mais graves, dispneia, intolerância ao
exercício, síncope, é que os proprietários buscam o atendimento médico (5,9).
O diagnóstico se faz difícil nos estágios iniciais da doença, pois as alterações
hematológicas, bioquímica séricas, radiográficas, e eletrocardiográficas podem ser
inespecíficas, ou apenas sugerirem o comprometimento cardiovascular (10). É fundamental o
uso da ecocardiografia para o diagnóstico e classificação da CMH, evidenciando a importância
do exame como o de eleição nas desordens cardíacas (1). O tratamento visa conter a
hipertensão, tentar reduzir o remodelamento ventricular, diminuir o risco de tromboembolismo,
e combater os sinais da insuficiência cardíaca congestiva, visando o aumento ou manutenção
da qualidade de vida e a sobrevida do animal (3,9).
O presente trabalho tem como objetivo relatar o caso de um felino da raça Persa, fêmea,
de cinco anos de idade, que deu entrada no HV-FIO com sinais de dispneia e taquicardia,
posteriormente diagnosticado com CMH.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Incidência
A CMH é a doença cardíaca mais comum dentre todas as idades. Alguns autores referem
maior incidência em felinos entre quatro e sete anos, outros em torno da média de quatro a sete
anos; entretanto, já foi relatada em filhotes de cinco meses de idade (5,10,11).
Zamboni VAG, Romão FG. Cardiomiopatia hipertrófica felina: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1
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Os gatos machos respondem pela maior proporção em relação às fêmeas, sendo os gatos
domésticos de pelo curto os mais acometidos, principalmente das raças Maine Coon, Ragdoll,
Persa, e American e British Shorthair (6,7,8,10).
Etiologia
A etiologia da CMH primária ainda permanece não completamente elucidada, e é de
grande importância, pois é a forma mais comum dentre as cardiomiopatias nos felinos (12). Nos
últimos anos, vários trabalhos reconheceram a existência de um padrão hereditário da doença,
caracterizado por um padrão autossômico dominante, associado principalmente, mas não
exclusivamente a determinadas raças de pelo curto (7,10). A forma secundária da CMH está
associada principalmente ao hipertireoidismo, hipertensão arterial sistémica, acromegalia ou
infiltrações inflamatórias e tumorais (5,13,14).
Cardiomiopatia Hipertrófica Primária ou Idiopática
A etiologia da CMH primária em felinos ainda não é totalmente conhecida (3,12,14).
Em seres humanos já é sabido do padrão hereditário da doença, sendo classificada como
cardiomiopatia hipertrófica familiar, possuindo um caráter autossômico dominante, tendo como
base mutações no conjunto de genes responsáveis pela sintetização de proteínas do sarcômero,
que estão envolvidas no processo de contração e relaxamento muscular (15). Esse padrão
autossômico dominante ocorre de maneira parecida em gatos Maine Coon, Ragdoll, Persa e
British e American Shorthair (1,7,10). Em humanos, já são identificadas mais de 240 mutações
em genes que codificam proteínas sarcoméricas. A hipótese é que a mutação em um ou mais
desses genes também seria responsável pela CMH em felinos (2,6,15).
Em gatos da raça Maine Coon já foi identificada uma mutação no gene MyBPC3, que
altera a conformação da proteína C de ligação à miosina, resultando em disfunção na atividade
dos sarcômeros (2,7). Em animais da raça Ragdoll, foi identificada uma mutação também no
gene MyBPC3, identificada como R820W, que também altera a conformação da proteína C de
ligação à miosina nesta raça (6). Embora haja evidência do fundo hereditário da doença, os
trabalhos ainda são recentes para sugerir se a doença está relacionada à homozigose ou
heterozigose da mutação, pois alguns animais portadores da mutação no gene não desenvolvem
fenotipicamente a doença (2,5,8).
Todavia, as descobertas do padrão hereditário da doença se fazem fundamentais para o
aprimoramento na detecção precoce da doença, principalmente no plantel de reprodutores, para
o rastreamento dos indivíduos que podem perpetuar as mutações (15,16)
Cardiomiopatia Hipertrófica Secundária
A CMH pode ocorrer secundariamente a uma série de doenças sistêmicas,
principalmente ao hipertireoidismo, à hipertensão arterial sistêmica, e infiltrações inflamatórias
ou tumorais (13,14).
No hipertireoidismo, o aumento nos níveis do hormônio tiroxina (T4) vai levar a um
estado hipermetabólico, que induz ao aumento de uma isoforma da proteína miosina; por
consequência, há um aumento na interação entre a actina e miosina, levando à maior
contratilidade do miocárdio (13,16,17). Os níveis excessivos de T4 também aumentam a
atividade na bomba Ca2+ ATPase do reticulo sarcoplasmático e dos canais de cálcio (12). O
hipertireoidismo atua ainda aumentando o número e a sensibilidade dos receptores βadrenérgicos, levando a uma maior sensibilidade às catecolaminas, e desta forma levando à
taquicardia. O hipertireoidismo atinge diretamente a função cardiovascular, seja pelo seu efeito
simpático a nível do musculo cardíaco, seja pelo excesso nos níveis do T4 e suas ações sobre o
miocárdio (17).
Na hipertensão arterial sistêmica, as alterações estruturais no átrio e ventrículo esquerdo
correspondem à resposta adaptativa ao aumento da pressão de pós-carga, levando ao estresse
Zamboni VAG, Romão FG. Cardiomiopatia hipertrófica felina: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1
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da parede ventricular esquerda, que promove aumento na isquemia do miocárdio juntamente
com o aparecimento de fibrose, consequentemente diminuindo a complacência do musculo
cardíaco, e instalação de insuficiência cardíaca em casos sem controle (9,18).
Fisiopatologia
A CMH consiste no espessamento do miocárdio, podendo atingir o septo
interventricular, a parede livre do ventrículo esquerdo, além dos músculos papilares4. A
hipertrofia concêntrica leva à baixa complacência ventricular, ou seja, diminuição da
capacidade de distensão e ao desenvolvimento de alterações no relaxamento do miocárdio5.
Como consequênciada alteração no padrão de enchimento ventricular esquerdo, devido à maior
rigidez e menor distensibilidade ventricular, maior pressão diastólica é necessária19. O
relaxamento miocárdico pode se tornar mais prolongado e incompleto, principalmente se houve
isquemia miocárdica, pois o relaxamento também é dependente de energia e oxigênio (14). O
desenvolvimento de insuficiência cardíaca congestiva esquerda pode ter inicio com a
progressão da disfunção diastólica (20). Atualmente acredita-se que a disfunção diastólica é a
principal alteração deletéria na CMH (21).
Pressões de enchimento do ventrículo esquerdo progressivamente maiores levam ao
aumento nas pressões do átrio esquerdo e venosa pulmonar. Como resultado, pode haver
dilatação progressiva do átrio esquerdo, bem como congestão e edema pulmonar (22). O átrio
aumenta de tamanho, mas o volume ventricular esquerdo pode permanecer normal ou diminuir
progressivamente (21,22). Se o volume diminui, o resultado é contribuir para a ativação do
sistema renina-angiotensina-aldosterona e do sistema nervoso simpático, ocorrendo elevação
da pressão arterial e da frequência cardíaca, aumentando o risco de arritmias (9,16,23). As
deformidades estruturais do ventrículo esquerdo e/ou dos músculos papilares ou o movimento
sistólico anormal da válvula mitral levam ao fechamento anormal da mesma (24). A
regurgitação mitral é o resultado final, elevando ainda mais o volume e a pressão atrial esquerda
(19,20).
O aumento na frequência cardíaca interfere ainda mais no enchimento ventricular
esquerdo, agravando o quadro de isquemia miocárdica e levando à piora da congestão venosa
por encurtamento do período de enchimento diastólico (20,24). A contratilidade, ou função
sistólica, geralmente se encontra normal nos animais afetados; porém a isquemia e o infarto de
regiões do miocárdio levam progressivamente à disfunção sistólica nos casos mais severos
(4,8,21). A isquemia e regiões de infarto aumentam as áreas de fibrose, que reduzem ainda mais
a capacidade de distensão do ventrículo esquerdo, piorando o quadro de disfunção diastólica
(7,10,20).
Diversos fatores contribuem para o desenvolvimento da isquemia miocárdica nos gatos
com CMH (18), como estreitamento das artérias coronárias intramurais, aumento na pressão de
enchimento do ventrículo esquerdo, redução na pressão de perfusão das artérias coronárias e
densidade capilar miocárdica insuficiente para o grau de hipertrofia (16,20,25). O aumento da
frequência cardíaca contribui para a isquemia pelo aumento das necessidades de oxigênio
miocárdico, enquanto reduz o tempo diastólico de perfusão coronariana (8,10).
O aumento da pressão atrial esquerda leva a congestão venosa e edema pulmonar, e
alguns animais podem apresentar efusão pleural, com característica de transudato modificado
na maior parte dos casos, ou de aspecto quiloso (18). O aumento das pressões das veias e
capilares pulmonares, e consequente vasoconstrição pulmonar, leva ao aumento da pressão
arterial pulmonar, e posteriormente insuficiência cardíaca congestiva direita secundária. Nestes
animais, podem haver sinais de derrame pleural (14).
O risco de tromboembolismo é alto nos animais portadores de CMH, principalmente no
interior do átrio esquerdo dilatado ou em outras áreas do coração, e o possível deslocamento
destes trombos pode levar ao quadro de tromboembolismo arterial sistêmico. A provável causa
Zamboni VAG, Romão FG. Cardiomiopatia hipertrófica felina: relato de caso. Alm. Med. Vet. Zoo. 2015 fev; 1
(1): 36-48.
Alm. Med. Vet. Zoo. 40
é o aumento da pressão e tamanho atrial esquerdo e a estase sanguínea secundária, o que
aumenta o risco para a formação dos trombos (20).
Sinais Clínicos e Diagnóstico
As principais alterações clínicas apresentadas pelos animais incluem alterações do
sistema respiratório inferior, por conta do edema pulmonar, como taquipneia, dispneia e
cansaço fácil; muitas vezes a tosse pode ser confundida com êmese (5,16). Geralmente, as
manifestações agudas incluem tromboembolismo arterial sistêmico, episódios de síncope e, em
alguns casos, morte súbita (18,24). Em alguns animais, os únicos sinais clínicos podem ser
letargia, prostração e anorexia (12). O estresse é fator importante que pode desencadear ou
exacerbar os sinais clínicos (26). Procedimentos cirúrgicos, anestesias e doenças sistêmicas
podem levar ao aparecimento de insuficiência cardíaca congestiva em gatos com CMH
compensada (21). A doença na forma assintomática pode vir a ser descoberta com a detecção
sopro ou ritmo de galope durante auscultação de rotina (9,10).
Sopros sistólicos compatíveis com regurgitação de mitral ou obstrução da via de saída do
ventrículo esquerdo são achados comuns durante o exame físico (4,19). Alguns animais podem
não apresentar sopro audível, mesmo aqueles com hipertrofia ventricular severa (24). O sinal
de arritmia cardíaca é relativamente comum (5). O pulso femoral pode se apresentar forte, a
não ser que ocorra tromboembolismo aórtico distal (28). Os sons pulmonares incluem
crepitações, mas podem estar abafados devido à presença de efusão pleural; porém, nem sempre
gatos com edema apresentam alterações dos sons pulmonares (4,16). Ainda existe a
possibilidade do exame físico não apresentar nenhuma alteração em animais assintomáticos
(10).
As alterações radiográficas nos casos avançados de CMH incluem a dilatação atrial
esquerda e aumento ventricular esquerdo de grau variável. Nem sempre o sinal de coração dos
namorados (Valentine Shape) é encontrado. A imagem se deve ao aumento atrial bilateral, mas
é um achado comum na CMH (9). Efusão pericárdica pode estar presente de leve à moderada,
acentuando radiograficamente a silhueta cardíaca (19,20). Nos casos de CMH leve, o contorno
cardíaco pode se apresentar sem alterações e, em contrapartida, animais assintomáticos podem
apresentar alterações na conformação cardíaca (16). Nos pacientes que apresentam edema
pulmonar, podem ser encontrados padrões de infiltração intersticiais ou alveolares. Efusão
pleural pode ser um achado em alguns casos mais severos (21).
Anormalidades no eletrocardiograma são comuns, mas não conferem valor diagnóstico
alto; junto a outros exames diagnósticos podem fornecer parâmetro de suspeita (9). As
alterações incluem anormalidades nos critérios para aumento do átrio e ventrículo esquerdo,
taquiarritmias ventriculares e, ou supraventriculares, e padrão de bloqueio fascicular anterior
esquerdo. Ocasionalmente, podem ser encontrados sinais de atraso na condução atrioventricular
e bloqueio atrioventricular completo (3).
A ecocardiografia é o método de eleição para o diagnóstico da CMH, bem como
diferencial para outras cardiopatias (12). Os modos M e bidimensional vão fornecer a extensão
da hipertrofia e sua distribuição ao longo da parede ventricular esquerda, do septo
interventricular e dos músculos papilares (19). A modalidade Doppler demonstra as
anormalidades diastólicas e sistólicas, e a presença de regurgitação mitral e dos casos de padrão
obstrutivo (1,2,8).
Os testes hematológicos e de bioquímica sérica frequentemente não contribuem para o
diagnóstico, mas podem levar a suspeita do comprometimento cardíaco, como por exemplo na
disfunção renal secundária, e consequente elevação dos níveis de ureia e creatinina (16,25). Na
medicina humana, uma série de biomarcadores atualmente de lesão e função miocárdica
cardíaca já estão disponíveis, e aos poucos estão entrando na rotina da medicina veterinária
(29).
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Os peptídeos natriuréticos estão sendo utilizados como importantes marcadores
diagnósticos e prognósticos de cardiopatias e insuficiência cardíaca (12,30). São hormônios
produzidos pelo coração em resposta a agressão do miocárdio e ao aumento da pressão
diastólica (29,30). Entre os de maior relevância estão o PNA e o PCN, sendo o último de maior
importância na CMH, pois é produzido especificadamente nos ventrículos, principalmente no
quadro de disfunção diastólica (30,31).
As troponinas cardíacas estão envolvidas no processo de contração do miocárdio, e
possuem três tipos: a troponina-C (TnC), troponina-I (TnI) e a troponina-T (TnT). Porém,
somente a TnC e a TnI possuem isoformas cardíacas especificas ao miocárdio (29).Desta forma,
tem grande valor como biomarcadores de lesão do miocárdio, mas ainda é muito cedo e há
poucos trabalhos relatando o uso na Medicina Veterinária, especificamente na CMH (32).
Tratamento
O tratamento da cardiomiopatia hipertrófica visa facilitar o enchimento ventricular,
diminuir os sinais de congestão, controlar arritmias, minimizar a isquemia do miocárdio e
prevenir a formação de trombos9. O enchimento ventricular é favorecido ao se reduzir a
frequência cardíaca e ao promover o melhor relaxamento do musculo cardíaco; portanto, é de
fundamental importância diminuir o risco de situações estressantes e o nível de atividade dos
animais apresentando CMH (12). A utilização de fármacos para favorecer a função diastólica é
essencial, dentre os quais podemos citar o uso de bloqueadores de canal de cálcio e
betabloqueadores. Os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) são benéficos
nos gatos com insuficiência cardíaca congestiva (21).
Deve-se lançar mão da terapia diurética nos gatos com edema pulmonar grave, de maneira
sistemática até a melhora do quadro, e nos casos de edema pulmonar de leve a moderado, em
doses ajustadas ao menor nível efetivo (22,33). A furosemida é a droga de eleição, mas pode
vir associada à espironolactona (9,12).
OS IECA tem efeitos benéficos por atuar na inibição do sistema renina-angiotensinaaldosterona (23). A inibição da enzima conversora de angiotensina pode reduzir a dilatação
atrial, a espessura do septo interventricular e da parede livre do ventrículo esquerdo (34). O
enalapril e o benazepril são os agentes utilizados mais frequentemente (25).
Os bloqueadores dos canais de cálcio, nomeadamente o diltiazem, parecem ter um efeito
benéfico por atuar diminuindo o inotropismo e cronotropismo de forma modesta, o que
promove o menor consumo de oxigênio, diminuindo a isquemia miocárdica, além de atuar
como vasodilatador coronariano e, consequentemente, proporcionar um efeito positivo no
relaxamento do miocárdio (9,21).
Os bloqueadores beta-adrenérgicos possuem a capacidade de reduzir a frequência
cardíaca e a obstrução sistólica da via de saída do ventrículo esquerdo, melhorando a fração de
ejeção e diminuindo o consumo de oxigênio, reduzindo a isquemia do miocárdio, assim como
as arritmias decorrentes da taquicardia (4,10). O atenolol é utilizado mais comumente por ser
um beta-bloqueador seletivo16. O propranolol deve ser usado com cautela nos animais com
insuficiência cardíaca congestiva, pois não é seletivo, e sua atividade nos receptores β2 levam
à bronconstrição4. O carvedilol também é um β-bloqueador não seletivo que bloqueia
competitivamente os receptores β1, β2 e α1 (21).
Para prevenção do tromboembolismo a droga de eleição é a aspirina em baixas doses pelo
seu efeito anticoagulante (25).
Prognóstico
É difícil determinar o prognóstico nos animais acometidos por CRM, em razão de
diversos fatores influenciarem na sobrevida dos animais, como a velocidade de progressão da
doença, a severidade das alterações estruturais, a ocorrência de eventos tromboembólicos e/ou
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arritmias, e a resposta ao tratamento (10). Gatos com a forma assintomática da doença com
presença de hipertrofia discreta a moderada do ventrículo esquerdo e dilação atrial podem viver
bem por vários anos (14). Os animais com severa dilação atrial e hipertrofia mais grave
aparentemente apresentam maior risco de desenvolverem insuficiência cardíaca congestiva,
tromboembolismo, e maior risco de morte súbita (19,24). O tamanho atrial esquerdo e a idade
(especialmente animais mais velhos), aparentam ter uma menor sobrevida (3,4,9).
O tempo médio de vida dos animais com presença de insuficiência cardíaca congestiva é
de um a dois anos (10,19). Animais com fibrilação atrial ou insuficiência cardíaca direita
secundária tem pior prognóstico (9,14). O tromboembolismo junto ao quadro de insuficiência
cardíaca congestiva tem sobrevida de dois a seis meses, apesar de alguns animais viverem por
um período maior se responderem bem à terapia (35). A recidiva do tromboembolismo é
comum (36).
RELATO DE CASO
Foi atendido no Hospital Veterinário “Roque Quagliato” (HV-FIO), nas Faculdades
Integradas de Ourinhos um felino da raça Persa, fêmea, cinco anos de idade, com histórico de
episódio de taquipneia e taquicardia há dois dias.
O proprietário relatou que após o ocorrido o animal voltou ao seu comportamento normal,
relatando normofagia, normodipsia, normoquesia e normúria, e negando êmese, diarreia, tosse
ou espirros. Ao exame físico, o animal apresentava-se normopneico, mas com a frequência
cardíaca em 220 batimentos por minuto (bpm). Durante a ausculta pulmonar foi possível
identificar o som de estertores, e na ausculta cardíaca sopro sistólico. Foi requerido exame
radiográfico do tórax, ECG, hemograma completo, bioquímica sérica (albumina, alanina
aminotransferase, fosfatase alcalina, gamaglutamiltransferase, ureia, creatinina e proteínas
séricas totais). Foi procedida a mensuração da pressão sistólica (170 mmHg).
O exame radiográfico (Figura 1) constatou a presença de sinais de edema pulmonar (A)
e dilatação do átrio esquerdo (B). Não houve alterações no exame hematológico e na bioquímica
sérica. O eletrocardiograma revelou taquicardia sinusal, com ritmo sinusal normal com
presença de marca-passo migratório e desvio de eixo à esquerda.
Figura 1 - Imagem do exame radiográfico de tórax, realizado no HV-FIO Fonte:
Serviço de Radiologia Veterinária, HV “Roque Quagliato”, 2014
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O paciente encontrava-se sem sinais de CMH descompensada no atendimento
ambulatorial, mas dada a hipertensão e o edema pulmonar, foi prescrito inicialmente terapia
diurética à base de furosemida na dose de 2 mg/kg/BID por via oral, em associação com
carvedilol, fármaco da classe dos β-bloqueadores, na dose de 6,25 mg/animal/SID até a
realização do exame de ecocardiografia. Foi recomendada a restrição de situações estressantes
e exercícios ao animal e nutrição adequada a animais cardiopatas.
O exame ecocardiográfico confirmou a suspeita de CMH. A análise quantitativa no modo
M e B encontrou sinais de aumento na relação átrio esquerdo/aorta (1,82cm), aumento na parede
livre do ventrículo esquerdo (0,82cm) e diminuição discreta no diâmetro diastólico do
ventrículo esquerdo (1,05cm). Na análise qualitativa no modo M e B, havia a presença de
movimento anterior sistólico na valva atrioventricular esquerda e hipertrofia do ventrículo
esquerdo. Já no modo Doppler foi possível identificar o fluxo sistólico no interior do átrio
esquerdo, ou seja, a presença de insuficiência da valva atrioventricular esquerda de grau
discreto. Com base nos achados ecodopplercardiográficos foi possível o diagnóstico de CMH
de grau moderado a grave.
Após a realização de todos os exames, foi dado início à administração de carvedilol na
dose de 12,5 mg/animal/SID. A terapia visando combater o tromboembolismo foi à base de
aspirina, na dose de 10mg/kg/a cada 72 horas.
DISCUSSÃO
Apesar da etiologia da CMH ainda ser desconhecida, os gatos da raça Persa possuem,
aparentemente, uma predisposição ao desenvolvimento desta doença, o que sugere a influência
genética nesta raça (6,7,10). Apesar de já existirem marcadores moleculares para os genes
envolvidos no desenvolvimento da doença, em algumas raças, como Maine Coon e Ragdoll, os
trabalhos ainda são recentes e demandam maiores estudos, pois ainda há um percentual de
animais positivos para as mutações que não apresentam fenotipicamente a doença (6,8). Dada
à grande variedade de sinais clínicos, animais de raças predispostas devem sempre passar por
uma avaliação cuidadosa do sistema cardiovascular (5,12).
O paciente encontra-se dentro da faixa de idade média para o início da doença, que é em
média aos quatro anos de idade, embora animais de qualquer idade podem ser acometidos
(10,11). Os animais podem passar grande parte da vida assintomáticos, quando é comum o
início súbito dos sinais clínicos, de maior incidência, como taquicardia, taquipneia e prostração
(1,16). Aproximadamente 15% dos animais aparentemente saudáveis são diagnosticados como
portadores da doença em exames de ecocardiografia (10). A proprietária negou que o animal
havia mudado de comportamento antes dos fatos, ou se alguma vez notou esses sinais de
comprometimento cardíaco, como cansaço fácil ou sincope.
O difícil reconhecimento de alteração na atitude ou padrão de vida do animal pelo
proprietário é relatado (5). No início, os efeitos positivos dos sistemas de compensação são para
manter a pressão arterial e o débito cardíaco em níveis fisiológicos (12,20,24). Com o início da
doença miocárdica, há diminuição do volume de ejeção, e consequentemente queda no debito
cardíaco (9). Com menos sangue sendo enviado pela aorta, a pressão arterial sistêmica tende
diminuir. Os barorreceptores aórticos e carotídeos e as arteríolas aferentes renais percebem que
o nível da pressão arterial não está normal e ativam o sistema nervoso autônomo simpático
como um dos mecanismos compensatórios (5).
Esses efeitos hipertensivos cronotrópico e inotrópico positivos do sistema simpático
inicialmente auxiliam a manutenção do débito cardíaco (37). Posteriormente estes efeitos levam
à sobrecarga de pressão e volume no ventrículo esquerdo, induzindo a remodelação miocárdica,
que contribui para a isquemia do miocárdio e fibrose (23). O tecido conjuntivo diminui a
complacência ventricular e novamente há sobrecarga de pressão do ventrículo esquerdo (19).
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Com a sobrecarga de pressão e volume no ventrículo, é necessária maior força de contração,
levando à hipertrofia concêntrica (14).
Assim tem início a disfunção diastólica e dada a necessidade de maior pressão para
enchimento ventricular, há sobrecarga atrial, levando a dilação do átrio esquerdo (21). O débito
cardíaco continuando baixo, mesmo com a ativação simpática, faz com que o volume de sangue
que chega aos órgãos diminua, levando a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona
(23).
Muitas vezes o único achado em animais sem sinais clínicos da doença é o sopro
sistólico, que tanto pode ser da regurgitação mitral quanto da estenose subaórtica (12,19). Após
o início agudo dos sinais clínicos, dois dias atrás, relatado pela proprietária no momento da
anamnese, e que já não estavam presentes, a única alteração durante o exame clínico foi a
presença de sopro sistólico em todos os focos de auscultação cardíaca. O baixo valor
diagnóstico dos exames hematológicos e bioquímicos tem sido relatado e o paciente
apresentava todos os parâmetros testados dentro da normalidade (16).
O exame radiográfico é pouco sensível na fase inicial da doença, pois geralmente não
existem alterações na silhueta cardíaca neste estágio (9). Nos estágios mais avançados, é
comum encontrar cardiomegalia com maior proeminência do átrio e ventrículo esquerdo (38).
Outros achados comuns incluem edema pulmonar e derrame pleural (39). Apesar do baixo valor
diagnóstico na CMH, o exame radiográfico constitui um meio confiável para monitorização da
progressão das alterações morfológicas, e para controle da dose dos diuréticos nos casos de ICC
(40). O uso da vertebral heart scale (VHS) tem sido proposto como parâmetro para
cardiomegalia, onde o eixo maior do coração deve ter o tamanho de até sete vértebras torácicas
e o eixo menor de quatro vértebras (41,42). O edema tem por vezes um padrão pulmonar
alveolar do tipo generalizado e irregular (39). O exame radiográfico do paciente demonstrou a
presença de edema pulmonar de padrão alveolar intersticial, e cardiomegalia com dilatação
mais proeminente do lado esquerdo do coração.
Até 70% dos gatos com CMH podem apresentar alguma alteração no exame
eletrocardiográfico; tais alterações incluem arritmias ventriculares e supraventriculares,
aumento da amplitude da onda R e/ou aumento na duração do intervalo QRS, devido ao
aumento do ventrículo esquerdo (3). Outro achado comum é o desvio esquerdo do eixo cardíaco
(12). A única alteração significava no caso deste paciente foi em relação ao desvio do eixo à
esquerda.
Os achados radiográficos e eletrocardiográficos não foram suficientes para determinar
o diagnóstico, mas auxiliaram na suspeita de CMH. O ecocardiograma é a ferramenta de escolha
para o diagnóstico das doenças do miocárdio em gatos, através deste exame é possível
identificar alterações estruturais e disfunções do músculo cardíaco (43). É um meio eficaz e não
invasivo de avaliar o animal “in vivo” e é considerada na cardiomiopatia hipertrófica felina
como exame de ouro para diagnóstico e prognóstico da doença (44).
No exame ecocardiográfico de rotina, é possível avaliar com os diferentes modos de
imagem, alterações tanto anatômicas quanto funcionais do miocárdio. As alterações anatômicas
no processo fisiopatológico da CMH envolvem hipertrofia ventricular esquerda, podendo
atingir o ventrículo de forma simétrica ou assimétrica, incluindo a parede livre do ventrículo
esquerdo, o septo interventricular, e/ou músculos papilares (44,45). A forma simétrica vem
sendo relatada como sendo mais comum, quanto a distribuição da hipertrofia 14,20,43). A
hipertrofia do animal relatado atingiu de forma simétrica a parede livre do VE e o septo
interventricular, o que confere com a literatura pesquisada.
O aumento atrial também é relatado como uma alteração estrutural comum nos casos de
cardiomiopatia hipertrófica, devido ao maior gradiente de pressão de enchimento ventricular
exigido na disfunção diastólica (20,7). No paciente em questão, o tamanho atrial estava dentro
dos parâmetros ecocardiográficos normais, mesmo com a imagem radiográfica indicando um
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aumento desta estrutura. Já a relação entre o tamanho atrial esquerdo e a aorta estava acima dos
valores ecocardiográficos normais de referência; a relação AE/Ao vem sendo relatada de
normal a aumentada em animais com CMH (38,45). O aumento atrial é uma situação que
predispõe à formação de trombos intracardíacos, principalmente dentro do átrio, o que pode
levar a uma possível embolização sistêmica (36,46,47).
Uma complicação comum nos casos de cardiomiopatia hipertrófica, que acomete cerca
de 50% dos animais são acometidos, é a obstrução dinâmica da via de saída do ventrículo
esquerdo (5,24). A hipertrofia do septo interventricular e/ou dos músculos papilares pode
obstruir a vida de saída para aorta (48). Outra causa que pode levar a um processo de estenose
subaórtica é o movimento anterior sistólico da válvula mitral (MASVM), e vários mecanismos
e fatores são predisponentes para o MASVM, como a hipertrofia do miocárdio, alterações
estruturais da válvula mitral, estreitamento subaórtico, dilatação dos folhetos anterior e
posterior e das cordas tendíneas, deslocamento dos músculos papilares e o aumento da
velocidade do fluxo sanguíneo do VE (19,24,48). O paciente deste relato possui insuficiência
da válvula mitral acompanhado do movimento anterior sistólico, condição que dificulta a ejeção
do sangue do ventrículo esquerdo para a aorta, duas condições que são agravantes uma para
outra.
O tratamento da cardiomiopatia hipertrófica felina visa facilitar o enchimento
ventricular, diminuir os sinais congestivos, controlar as arritmias, minimizar a isquemia do
miocárdio e prevenir a formação de trombos (4,9,12,21).
Os inibidores da enzima conversora de angiotensina têm efeitos benéficos por atuar
bloqueando no sistema renina-angiotensina-aldosterona, promovendo vasodilatação, e podendo
atuar indiretamente na redução da dilatação atrial (34). Porém, são contraindicados nos casos
de obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo, pois a vasodilatação pode causar
taquicardia compensatória, piorando o quadro obstrutivo e de regurgitação mitral (49).
Os bloqueadores do canal de cálcio têm um efeito benéfico pois atuam reduzindo o
inotropismo e o cronotropismo, porem de forma modesta, mas ainda assim tem efeito de
promover o menor consumo de oxigênio, reduzindo a isquemia do miocárdio (9,21).
Os bloqueadores β-adrenérgicos têm sido relatados por vários autores como sendo a
droga de escolha nos casos de CMH felina (10). Atuam bloqueando os efeitos do sistema
nervoso simpático, e seus benefícios resultam do melhoramento da função diastólica, atuando
indiretamente reduzindo o gradiente de pressão de enchimento ventricular, através da
diminuição da FC (4). Conseguem melhorar a fração de ejeção, a perfusão do miocárdio,
consumindo menos oxigênio e assim diminuindo a isquemia do miocárdio (50). Como reduz a
taquicardia, tem efeito benéfico em pacientes portadores de arritmias (21). Também se mostram
eficientes na redução ou resolução da obstrução dinâmica da via de saída do VE (51).
O tratamento prescrito foi a base de carvedilol na dose de 12,5mg/animal uma vez ao
dia . O ácido acetilsalicílico tem sido a droga de eleição para prevenção da formação de
trombos, e foi prescrita na dose de 10mg/kg/a cada 72 horas (25).
Levando em consideração a idade do animal, a hipertrofia assimétrica, presença de
regurgitação mitral e de um grau de obstrução da vida de saída do ventrículo esquerdo, o
prognóstico do animal é de reservado a ruim. Após 150 dias do inicio da terapia, o animal não
apresentou recidiva ou outros sinais clínicos de CMH, dentro do esperado pela literatura.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se concluir com a realização do presente relato de caso, a importância da
cardiomiopatia hipertrófica felina como a doença cardíaca de maior incidência nesta espécie.
Ainda existem muitos desafios para elucidar de maneira clara a etiologia da doença. O
diagnóstico complexo desta afecção se da por conta de existir como doença primária do
miocárdio ou secundária a uma serie de doenças sistêmicas. Foi possível constatar a importância
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da aplicação dos métodos de diagnósticos como eletrocardiografia e radiografia para a suspeita
inicial da doença, mas essencialmente a ecocardiografia se mostra fundamental como exame de
ouro no diagnóstico e prognóstico da doença.
No que tange a terapêutica, hoje é possível com base nos estudos farmacológicos na
área da veterinária, prolongar o tempo de vida destes animais e permitir uma boa qualidade de
vida. O prognóstico continua a ser de reservado a ruim, dado o caráter crônico e progressivo da
doença. A descoberta de mutações em alguns genes envolvidos com estruturas e proteínas
miocárdicas, só reforçam que o futuro se passa no diagnóstico precoce, essencialmente na
biologia molecular e no controle periódico através da ecocardiografia.
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Recebido em 10 de fevereiro de 2015.
Publicado em 02 de março de 2015.
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