ISV _jan.-fev.2011_ MECANOGRAFIA

Transcrição

ISV _jan.-fev.2011_ MECANOGRAFIA
INFORMATIVO SÃO VICENTE
INFORMATIVO
SÃO VICENTE
Boletim
de circulação
interna da
Boletim de circulação
interna da da Missão
Província Brasileira
da Congregação
Província Brasileira da Congregação da Missão
Ano XLIV - No 283
Janeiro − Fevereiro de 2011
Rua Cosme Velho, 241
“A caridade e a missão es-
22241-125 Rio de Janeiro - RJ
tão unidas de modo inseparável. A caridade sem a missão não é concebível e a missão sem a caridade não tem
sentido. A caridade chega à
sua plenitude na missão. A
missão se alimenta da caridade (...). Nosso mundo precisa de novos apóstolos da
caridade e da missão, que falem aos pobres do Deus Amor, que tornem visível o seu
rosto de Pai misericordioso,
libertador e defensor dos oprimidos” (Irmã Evelyne
Franc, superiora geral das Filhas da Caridade, aos participantes da 40ª AG).
Telefone: (21) 3235 2900
Fax: (21) 2556 1055
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Equipe responsável pelo Informativo
São Vicente
- Pe. Vinícius Augusto R. Teixeira
- Pe. Paulo Eustáquio Venuto
- Pe. Gentil José Soares da Silva
Revisão:
- Pe. Lauro Palú
Formatação e Impressão:
- Cristina Vellaco
- Equipe de Mecanografia do
Colégio São Vicente de Paulo
1
SUMÁRIO
Editorial ..................................................................................................... 3
Voz da Igreja ............................................................................................. 5
Superior Geral .......................................................................................... 10
Palavra do Visitador ................................................................................. 14
Família Vicentina
Santas Missões Populares Vicentinas – 2001
Missões Vicentinas no Vale do Jequitinhonha ........ 16
Pe. Marcus Alexandre M. de Andrade
Pe. Vinícius Augusto R. Teixeira
Missões Vicentinas em Pedra de Guaratiba ........... 23
Pe. Juarez Carlos Soares
Realidade
Chuvas e mortes na região serrana do RJ: resposta da natureza ou castigo divino? ............................ 28
Tiago de França
Olhar Teológico
Por que os pobres não se suicidam .......................
Victor Codissa, S. J.
Homenagem
Padre Sebastião Mendes Gonçalves recebe
condecoração ........................................................ 36
Pe. Agnaldo Aparecido de Paula
CLAPVI
Escola de Espiritualidade Vicentina – Curitiba – 2011... 45
Tradução do Pe. Vinícius Augusto R. Teixeira
Na Missão do Céu
Pe. Antenor Pinto de Resende, C. M. ..................... 52
Pe. Célio Maria Dell’ Amore
32
Notícias ..................................................................................................... 55
2
EDITORIAL
O novo ano já não é tão novo assim, mas
este primeiro número do nosso Informativo São
Vicente o é. Em poucos dias, muitas coisas
aconteceram, trazendo-nos algumas alegrias e
esperanças como também tristezas e
preocupações. Atônitos e chocados, assistimos
às dores de tantas famílias que iniciaram o ano
com grandes perdas. Por outro lado, vimos,
também, a mobilização e a solidariedade que
trouxeram consolo e esperança, num sinal
significativo de que nem tudo está perdido.
Em sua mensagem para o Dia Mundial do
Enfermo, o Santo Padre nos afirma que o sofrimento permanece sempre
cheio de mistério. Convida-nos a meditar sobre aquele que carregou sobre
si a paixão do homem de todos os tempos e lugares. E nos diz que, a exemplo de Tomé em seu encontro com o Ressuscitado, podemos transformar a
dor da morte em esperança de vida. Podemos fazer-nos mensageiros da alegria e da vida, na medida em que nos empenhamos em enfrentar a prepotência do mal que impõe o sofrimento a grande número dos nossos irmãos. Podemos utilizar os muitos instrumentos de que dispomos para alcançar este objetivo.
Cada vez mais presentes em nosso dia a dia e ao alcance de todos nós,
as ferramentas tecnológicas podem tornar-se instrumento precioso para
esse serviço. O nosso Superior Geral propõe aos Missionários o uso dessas
novas ferramentas para desenvolverem as habilidades e as estruturas cada
vez mais necessárias para o exercício da missão e a eficiência da evangelização.
Evangelização que, entre nós, cada ano, se faz de maneira mais especial através das Santas Missões Populares Vicentinas, arregimentando a
3
Família Vicentina nos dois Regionais de Belo Horizonte e do Rio de Janeiro.
Cada região com as suas especificidades e seus desafios, mas, em ambas,
missionários carregados de zelo, de disponibilidade, de dedicação e de atenção para com as necessidades das Comunidades a serem missionadas.
E exemplos de verdadeiros missionários não nos faltam. Um, deixando
os seus e a própria pátria e inflamado de zelo e de amor pelos Pobres, vem
consumindo suas energias e seus conhecimentos na longínqua Moçambique. Por isso, recebeu o reconhecimento de seus conterrâneos através de
uma merecida homenagem. O outro, após longa caminhada nesta terra e
numerosos serviços prestados à Igreja, à Congregação e aos Pobres, partiu
para a Pátria definitiva, onde Aquele que foi a razão de sua vida lhe tinha
reservado a recompensa.
Após a leitura deste Informativo São Vicente e percebendo em seu
conteúdo tanta coisa bonita e tanta esperança, agora é continuar a caminhada, durante este ano, com o sentimento de que não serão vãos os esforços por poder contribuir também para a construção de um mundo e de
uma sociedade sem dores e sofrimentos
Pe. Paulo Eustáquio Venuto, C. M.
4
VOZ DA IGREJA
Mensagem do papa Bento XVI para o 19º Dia Mundial do Enfermo
«Por suas chagas fostes curados» (1Pd 2,24).
Queridos Irmãos e Irmãs!
Todos os anos, na memória da Bem-Aventurada Virgem de Lourdes,
que se celebra no dia 11 de fevereiro, a Igreja propõe o Dia Mundial do Enfermo. Esta circunstância, como quis o venerável João Paulo II, torna-se a
ocasião propícia para refletir sobre o mistério do sofrimento e, sobretudo,
para tornar as nossas comunidades e a sociedade civil mais sensíveis aos
irmãos e irmãs enfermos. Se todos os homens são nossos irmãos, aquele
que é débil, sofredor ou necessitado de cuidado deve estar mais no centro
da nossa atenção, para que nenhum deles se sinta esquecido ou marginalizado. Com efeito, “a grandeza da humanidade determina-se essencialmente na relação com o sofrimento e com quem sofre. Isto vale tanto para o indivíduo como para a sociedade. Uma sociedade que não consegue aceitar
os que sofrem e não é capaz de contribuir, mediante a compaixão, para fa5
zer com que o sofrimento seja compartilhado e assumido mesmo interiormente é uma sociedade cruel e desumana” (Spe Salvi, 38).
As iniciativas que serão promovidas nas diversas Dioceses, por ocasião
deste Dia, sirvam de estímulo para tornar cada vez mais eficaz o cuidado
para com os sofredores, também na perspectiva da celebração de modo solene, que terá lugar em 2013, no Santuário mariano de Altötting, na Alemanha.
1. Tenho ainda no coração o momento em que, durante a visita pastoral a Turim, pude deter-me em reflexão e oração diante do Santo Sudário,
diante daquele rosto sofredor, que nos convida a meditar sobre Aquele que
carregou sobre si a paixão do homem de todos os tempos e lugares, inclusive os nossos sofrimentos, as nossas dificuldades e os nossos pecados.
Quantos fiéis, no curso da história, passaram diante daquele tecido sepulcral, que envolveu o corpo de um homem crucificado, que corresponde em
tudo ao que os Evangelhos nos transmitem sobre a paixão e a morte de Jesus! Contemplá-lo é um convite a refletir sobre quanto escreve São Pedro:
“Por suas chagas fostes curados“ (1Pd 2, 24). O Filho de Deus sofreu e morreu, mas ressuscitou, e, exatamente por isto, aquelas chagas tornam-se o
sinal da nossa redenção, do perdão e da reconciliação com o Pai; tornamse, contudo, também um banco de prova para a fé dos discípulos e para a
nossa fé: todas as vezes que o Senhor fala da sua paixão e morte, eles não
compreendem, rejeitam, opõem-se. Para eles, como para nós, o sofrimento
permanece sempre carregado de mistério, difícil de aceitar e suportar. Os
dois discípulos de Emaús caminham tristes, devido aos acontecimentos daqueles dias em Jerusalém, e só quando o Ressuscitado percorre a estrada
com eles, se abrem a uma visão nova (cf. Lc 24, 13-31). Também o apóstolo
Tomé mostra a dificuldade em crer na via da paixão redentora: “Se eu não
vir o sinal dos cravos nas suas mãos, se não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado, não acreditarei” (Jo 20, 25). Mas, diante de Cristo
que mostra as suas chagas, a sua resposta transforma-se numa comovedora profissão de fé: “Meu Senhor e meu Deus” (Jo 20, 28). O que antes era
um obstáculo intransponível, porque sinal da aparente falência de Jesus,
torna-se, no encontro com o Ressuscitado, a prova de um amor vitorioso:
“Somente um Deus que nos ama a ponto de carregar sobre si as nossas feridas e a nossa dor, sobretudo a dor inocente, é digno de fé” (Mensagem
Urbi et Orbi, Páscoa de 2007).
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2. Queridos doentes e sofredores, é justamente através das chagas de
Cristo que podemos ver, com olhos de esperança, todos os males que afligem a humanidade. Ressuscitando, o Senhor não tirou o sofrimento e o mal
do mundo, mas extirpou-os pela raiz. À prepotência do Mal, opôs a onipotência do seu Amor. Indicou-nos, então, que o caminho da paz e da alegria
é o Amor: “Como eu vos amei, vós também vos deveis amar uns aos outros”
(Jo 13,34). Cristo, vencedor da morte, está vivo no meio de nós. E, enquanto com São Tomé dizemos também: “Meu Senhor e meu Deus”, seguimos o
nosso Mestre na disponibilidade a prodigalizar a vida pelos nossos irmãos
(cf. 1 Jo 3, 16), tornando-nos mensageiros de uma alegria que não teme a
dor, a alegria da Ressurreição.
São Bernardo afirma: “Deus não pode padecer, mas pode compadecer”. Deus, a Verdade e o Amor em pessoa, quis sofrer por nós e conosco;
fez-se homem para poder compadecer com o homem, de modo real, em
carne e sangue. Em cada sofrimento humano, portanto, entrou aquele que
partilha o sofrimento e o suporta; em cada sofrimento, difunde-se a consolatio, a consolação do amor partícipe de Deus para fazer surgir a estrela
da esperança (cf. Spe salvi, 39).
A vós, queridos irmãos e irmãs, repito esta mensagem, para que sejais
suas testemunhas através do vosso sofrimento, da vossa vida e da vossa fé.
3. Considerando o encontro de Madrid, no mês de agosto de 2011, para a Jornada Mundial da Juventude, gostaria de dirigir também um pensamento especial aos jovens, especialmente aos que vivem a experiência da
doença. Com frequência, a Paixão e a Cruz de Jesus causam medo, porque
parecem ser a negação da vida. Na realidade, é exatamente o contrário! A
Cruz é o “sim” de Deus ao homem, a expressão mais elevada e intensa do
seu amor e a fonte da qual brota a vida eterna. Do Coração trespassado de
Jesus, brotou esta vida divina. Só ele é capaz de libertar o mundo do mal e
de fazer crescer o seu Reino de justiça, de paz e amor ao qual todos aspiramos (cf. Mensagem para a Jornada Mundial da Juventude de 2011, 3).
Queridos jovens, aprendei a “ver” e a “encontrar” Jesus na Eucaristia, onde
ele está presente de modo real para nós, até se fazer alimento para o caminho, mas sabei reconhecê-lo e servi-lo também nos pobres, nos doentes,
nos irmãos sofredores e em dificuldade, que precisam da vossa ajuda (cf.
ibid., 4).
A todos vós jovens, doentes e sadios, repito o convite a criar pontes de
amor e solidariedade, para que ninguém se sinta sozinho, mas próximo de
7
Deus e parte da grande família dos seus filhos (cf. Audiência Geral, 15 de
novembro de 2006).
4. Ao contemplar as chagas de Jesus, o nosso olhar dirige-se ao seu Sacratíssimo Coração, no qual se manifesta em sumo grau o amor de Deus. O
Sagrado Coração é Cristo crucificado, com o lado aberto pela lança, do qual
brotam sangue e água (cf. Jo 19, 34), “símbolo dos sacramentos da Igreja,
para que todos os homens, atraídos pelo Coração do Salvador, bebam com
alegria na fonte perene da salvação” (Missal Romano, Prefácio da Solenidade do Sacratíssimo Coração de Jesus). Especialmente vós, queridos doentes, sentis a proximidade deste Coração cheio de amor e bebeis com fé e
alegria de tal fonte, rezando: “Água do lado de Cristo, lava-me. Paixão de
Cristo, fortalece-me. Oh, bom Jesus, ouve-me. Nas tuas chagas, escondeme” (Oração de Santo Inácio de Loyola).
5. Na conclusão desta minha Mensagem para o próximo Dia Mundial
do Enfermo, desejo exprimir o meu afeto a todos e a cada um, sentindo-me
partícipe dos sofrimentos e das esperanças que viveis quotidianamente em
união com Cristo crucificado e ressuscitado, para que vos conceda a paz e a
cura do coração. Juntamente com ele, ao vosso lado, vigie a Virgem Maria,
que invocamos com confiança como Saúde dos Enfermos e Consoladora dos
sofredores. Aos pés da Cruz, realiza-se para ela a profecia de Simeão: o seu
Coração de Mãe é trespassado (cf. Lc 2, 35). Do abismo da sua dor, participação no sofrimento do Filho, Maria tornou-se capaz de assumir a nova
missão: tornar-se a Mãe de Cristo nos seus membros. Na hora da Cruz, Jesus apresenta-lhe cada um dos seus discípulos, dizendo-lhe: «Eis o teu filho» (cf. Jo 19, 26-27). A compaixão materna para com o Filho torna-se
compaixão materna para cada um de nós nos nossos sofrimentos cotidianos (cf. Homilia em Lourdes, 15 de setembro de 2008).
Queridos irmãos e irmãs, neste Dia Mundial do Enfermo, exorto também as autoridades, a fim de que invistam cada vez mais energias em estruturas médicas que sirvam de ajuda e apoio aos sofredores, sobretudo
aos mais pobres e necessitados e, dirigindo o meu pensamento a todas as
Dioceses, transmito uma saudação afetuosa aos Bispos, aos sacerdotes, às
pessoas consagradas, aos seminaristas, aos agentes no campo da saúde,
aos voluntários e a todos os que se dedicam com amor a cuidar e aliviar as
chagas de cada irmão e irmã doente, nos hospitais ou casas de cura, nas
famílias: nos rostos dos doentes, sabei ver sempre o Rosto dos rostos: o de
Cristo.
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A todos, garanto a minha recordação na oração, enquanto concedo a
cada um a especial Bênção Apostólica.
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SUPERIOR GERAL
Vaticano, 21 de novembro de 2010.
Papa Bento XVI
CONGREGAZIONE DELLA MISSIONE
CURIA GENERALIZIA
Via dei Capasso, 30
00164 Roma – Italia
e-mail: [email protected]
Tel. (39) 06 661 3061
Fax (39) 06 666 3831
13 de janeiro de 2011.
A Congregação não é agora o que era antes, nem o que será um dia.
Queridos Coirmãos,
Que a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo encham seus corações agora e sempre!
O mundo não é agora o que era antes, nem o
que será um dia. Irmãos, o mundo mudou mais depressa do que a maior parte de nós poderia ter previsto. A internet é uma das causas dessa mudança. Só
uma rede, a Facebook, conta com uma população equivalente ao terceiro país do mundo, perdendo só para a China e a Índia. Vivemos num mundo sem fronteiras. Podem os Missionários descuidar deste
país virtual ou escolher evitar comunicar-se com seus concidadãos, jovens em
sua maioria? Os Missionários não tinham sempre que aprender as línguas e
as culturas do território de missão? O Papa Bento XVI nos disse que devemos
“ajudar os homens e as mulheres desta era digital a sentir a presença do Se10
nhor, a crescer em expectativas e a aproximar-se da Palavra de Deus que oferece salvação e proporciona um desenvolvimento humano integral. Dessa
forma, a Palavra poderá superar muitas encruzilhadas criadas pelo cruzamento dos diferentes caminhos que formam o ciberespaço e que mostram que
Deus tem um lugar em todas as Eras Históricas, incluindo a nossa” (Mensagem para o 44º Dia Mundial das Comunicações Sociais). Como podemos realizar isso se não falamos sua linguagem e se não nos encontramos com os outros em seu mundo virtual?
A Congregação não é o que era antes, nem é também o que será um dia.
Há apenas 20 anos, poucos na Congregação eram conscientes da mudança
que o mundo iria sofrer como consequência da tecnologia. Há apenas 10 anos, no início do terceiro milênio, nosso antigo Superior Geral, Pe. Robert Maloney, escreveu uma série de cartas e, numa delas, dizia a todas as Províncias
da Congregação que pusessem conexão com a internet na Casa Provincial e
nas Casas de Formação. Avançamos até o ponto de poder enviar correios eletrônicos da Cúria a todas as Províncias e Vice-Províncias da C. M. e a muitos
Coirmãos particulares. Padre Maloney animou também todas as Províncias a
pôr uma página na internet. Há que admitir que, hoje, só um punhado de
Províncias tem páginas na internet ativas e atraentes. O Pe. Maloney nos desafiava a usar a tecnologia como meio de trabalho pastoral em favor dos Pobres.
Hoje, gostaria de propor duas perguntas para sua reflexão:
1ª. Como será o mundo dentro de apenas seis anos? Gostemos ou não,
nossa vida diária estará entrelaçada com a tecnologia, inclusive entre os mais
pobres.
2ª. Estamos preparados para servir um mundo assim? Nossas Linhas de
Ação da Assembleia Geral 2010 nos proporcionam uma direção a seguir:
A formação: animando os Coirmãos a formar atitudes e a desenvolver as
habilidades necessárias à pastoral nos próximos seis anos.
Reconfiguração: ser capazes de tornar mais eficientes nossas estruturas
e nossos processos administrativos.
Diálogo: ampliando nossos horizontes para descobrir novas necessidades e caminhos de colaboração para evangelizar e servir.
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Criatividade: respondendo com coragem às necessidades de um mundo
sem fronteiras.
Mudança de Estruturas: indo às raízes que causam a pobreza.
Todas estas metas muito podem ser favorecidas com o uso da internet e
com as ferramentas da tecnologia.
Podemos usar os recursos de nossa tecnologia vicentina:
Trabalhar em união com outros grupos, especialmente com membros da
Família Vicentina e, inclusive, com outros, com o fim de servir aos pobres e
investigar as causas da pobreza?
Buscar fundos para estabelecer centros de aprendizagem de tecnologia
internet nos países mais pobres? Já tivemos um projeto piloto na África relacionado a computadores e centros de ensino, mas devido à falta de recursos
financeiros, o projeto não pôde se desenvolver. Entretanto, havia 8 ou 9 países em nossas Províncias da África interessados em levar em frente esse meio
de desenvolvimento como ferramenta para educar e, ao mesmo tempo, evangelizar.
Continuar treinando os Coirmãos nesta tecnologia de computadores?
Conheço Coirmãos na Congregação que têm um desejo concreto de aperfeiçoar-se nessa tecnologia, que estão bem preparados e que estão se mobilizando. Um bom exemplo é o Pe. Aidan Rooney, na Bolívia. Da Bolívia, ele tem
a oportunidade de desenvolver grande parte da tecnologia a serviço das dioceses e em favor dos pobres, aos quais ele e os Missionários estão servindo.
Criar formas para que os Coirmãos idosos possam ajudar os pobres através da tecnologia internet? Devemos revisar algo e dar passos concretos:
Que todas as Províncias tenham um site que seja atraente, especialmente para os jovens e que se atualize com freqüência. Isso implica um compromisso pessoal. Entretanto, é um compromisso que permitirá ao Coirmão ou
aos Coirmãos chegar a um bom número de pessoas por meio do avanço nessa tecnologia.
Em nível internacional, queremos progredir nesse treinamento. Tentaremos oferecer tudo o que nos seja possível aos Coirmãos para que aprendam a usar este meio de evangelização.
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Podemos ajudar a estabelecer as pautas ou perspectivas sobre o uso
pastoral da internet por parte dos Missionários.
Podemos ajudar, através de Famvin, a criar sites nas línguas mais faladas, que possam ser atualizados por qualquer um que tenha um conhecimento básico do processamento de textos.
Pensamos também na possibilidade de uma reunião internacional (real
ou virtual) para compartilhar as habilidades e preparar-nos para avançar neste campo tão necessário tecnologicamente.
Permitam-me concluir com o pensamento de João Paulo II, em seu documento sobre a Igreja e a tecnologia internet, de 2002: “Ainda que a realidade virtual do ‘ciberespaço’ não possa substituir de verdade uma comunidade interpessoal, a realidade encarnada dos sacramentos e a liturgia ou a proclamação imediata e direta do Evangelho, entretanto, pode completá-la, pode
atrair as pessoas a uma experiência de vida de fé mais profunda e pode enriquecer a vida religiosa dos que a utilizam”.
Irmãos, peço-lhes que reflitam seriamente sobre esta mensagem e que
avancem no desejo de evangelizar e servir aos que são nossos amos e senhores, com novas formas e novos meios de ser fiéis ao nosso chamado.
Seu irmão em São Vicente,
G. Gregory Gay C. M.,
Superior Geral
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PALAVRA DO VISITADOR
Atenção ao Essencial
Já se foram três meses de minhas atividades como Visitador. Em visitas
às casas, reuniões e contatos pessoais começo a conhecer mais profundamente a Província. Por onde tenho passado vejo bastante esforço dos
coirmãos em realizar do melhor modo possível a missão vicentina de evangelizar e servir os pobres.
No envolvimento com esta missão ocorre com frequência certo clima
de agitação de espírito, consequência do desejo impetuoso de vermos resultado imediato do trabalho. “Tempus Fugit”. E nos vem a pressa. Junto
com ela, a impaciência, mau humor e indisposição contra as pessoas.
Em meio aos inúmeros apelos da realidade sociocultural e religiosa em
que vivemos e atuamos, nossa agenda vai ficando cada dia mais repleta.
Neste cenário de inúmeros desafios não podemos perder de vista três pontos, em ordem crescente de importância:
1) O que é urgente; 2) O que é necessário; 3) O que é essencial.
Estes vocábulos merecem alguma reflexão. Devem passar pelo crivo
de nosso discernimento. Pois no corre-corre dos compromissos cotidianos
podemos nos equivocar. A cultura atual, sob o império da eficiência técnica, nos deixa, com frequência , reféns das ‘urgências’. Quase sempre há algo passando da hora. Sobra-nos pouco tempo para buscarmos o ‘necessário’ e menos ainda o ‘essencial’. Conscientes dessa situação, resta-nos uma
pergunta: o que podemos fazer?
* O Mestre nos diz:
1) ”Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça, e todo o resto vos será
dado gratuitamente” (Mt 6,33). É um preceito do Senhor a ser observado
fielmente. Cabe a nós escutar com atenção e entregar-nos a Deus, para
transformar a palavra em ação.
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2) “De fato, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro se perde a
própria vida?” (Lc 9,25). É uma advertência do Senhor a ser acolhida em cada momento de nossas vidas, a fim de transformarmos a palavra em ação.
* São Vicente afirmava que quando alguém deseja encher sua vida de ‘atividades’ (urgências e necessidades) deve, antes, encher-se de ‘eternidade’
(oração, interioridade). Do contrário, será comparado ao construtor imprudente que edificou sua casa sobre a areia. Quando veio a tempestade, a ruína foi completa (cf. Mt 7, 26-27).
* Um sábio da antiguidade dizia que certa vez um homem estava, a todo
vapor, construindo sua casa. Tinha pressa de terminá-la. De repente chegou-lhe a notícia de que o mundo estava pegando fogo. Ouviu-se um veemente apelo para salvar o mundo. Mas o construtor não fez caso do aviso.
Concluída a obra arquitetônica (urgente/necessária), restou o problema essencial: “Onde colocar a casa”? O planeta era apenas um monte de cinzas.
Nesse tempo que se chama hoje, podemos nos perguntar a quantas
anda nossa atenção ao essencial. Não se trata de desprezar as urgências e
as necessidades, até porque, em nossa Província é difícil enumerá-las. São
muitas. O essencial é que, como construtores prudentes, saibamos ponderar as várias situações que a vida nos oferece e colaboremos para que cada coisa fique no seu justo lugar.
Haja o que houver, é sempre bom distinguir os termos. Contudo, o
mais importante mesmo é não perdermos de vista o essencial e sempre nos
orientar por ele. Fica, então, o convite para vivermos e convivermos neste
estado de bem-aventurança.
Pe. Geraldo Ferreira Barbosa, C. M.
Visitador Provincial
15
FAMÍLIA VICENTINA
Santas Missões Populares Vicentinas – 2011
Missões Vicentinas no Vale do Jequitinhonha
Pe. Marcus Alexandre Mendes de Andrade, C. M.
Pe. Vinícius Augusto Ribeiro Teixeira, C. M.
1. Deus o pensava por vós...
Pensávamos em pós-missão... Queríamos dar continuidade ao que já
fora iniciado em janeiro de 2010, quando nos foi dado celebrar as Santas
Missões Populares Vicentinas (SMPV) na paróquia de Jenipapo de Minas,
depois de tê-las realizado em Francisco Badaró, no ano anterior. A Providência, porém, tinha outros desígnios e, para concretizá-los, contava conosco. O Regional de Belo Horizonte uniu-se, então, ao Regional do Nordes16
te de Minas, seu irmão caçula, para dizer: “Com prazer, faço a vossa vontade, Senhor” (Hb 10, 7). E eis que as Missões Vicentinas se realizaram em 7
comunidades do município de Chapada do Norte, em alguns povoados vizinhos e em outras 5 comunidades de Jenipapo. Se comparado a outras experiências, um trabalho muito menos ostensivo e dispendioso, mas em nada menos intenso, desafiador e gratificante. “Deus o pensava por vós”, São
Vicente teria dito (IX, 113).
2. É preciso ver os Pobres em suas casas...
No mês de fevereiro de 2010, o bispo da diocese de Araçuaí solicitou aos
Padres da Missão de Badaró e Jenipapo que passassem a acompanhar pastoralmente as referidas comunidades de Chapada do Norte.
Diante da nova configuração da Missão, os Padres e as Irmãs, em diálogo
com a coordenação das SMPV, decidiram concentrar a presença dos missionários nesses novos rincões ainda pouco conhecidos. Os desafios são os mais diversos. A própria distância é um deles, pois as comunidades estão todas muito
afastadas dos municípios circunvizinhos (Jenipapo, Minas Novas, Novo Cruzeiro
e, principalmente, Chapada do Norte, a mais ou menos 100km). O descaso do
poder público, que parece ignorar a existência de famílias nesses lugares, é
estarrecedor e não passa sem provocar justa indignação. A falta de transporte
e a precariedade das estradas inviabilizam o acesso a recursos e oportunida17
des oferecidos apenas na zona urbana: atendimento médico-odontológico,
qualificação escolar e profissional, participação em eventos religiosos e sociais, etc.
Estruturalmente, as comunidades sofrem problemas que poderíamos
chamar de desumanos. Algumas delas não contam com banheiros, nem
mesmo com a tradicional fossa, a tal “casinha”. É o caso de Ribeirão da Cachoeira, talvez a mais pobre das quase 70 comunidades rurais, um antigo mocambo de escravos que se ocupavam do árduo trabalho da Fazenda Boa Esperança, perto dali. Nesta comunidade “quilombola”, a pobreza salta às vistas: doentes abandonados, vivendo à espera da morte que não chega; alcoolismo em todos os níveis e idades; constante falta d’água, razão pela qual
muitas famílias perdem suas minguadas criações; casas de enchimento, mais
precárias do que as casas de adobe, por serem feitas de madeira e barro, uma
ótima hospedaria para o barbeiro, transmissor de um dos maiores males do
Vale do Jequitinhonha – a doença de chagas; além de muitos outros problemas que obrigam as pessoas a uma vida de extenuantes sacrifícios e diuturnas privações.
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As outras comunidades enfrentam desafios semelhantes, mas não em
tamanha força e complexidade. Comum a todas, porém, é a alarmante migração da maioria dos homens para o corte de cana no interior de São Paulo. Dos
400 mil habitantes dos 24 municípios da diocese de Araçuaí, pelo menos 35
mil homens, quase 10% de sua população, estão nas usinas. Trata-se de uma
realidade ambígua. De um lado, os rendimentos do corte de cana, ópio que
ilude os mais jovens, despertam muito interesse e cobiça nos lavradores. Estes, submetidos a um trabalho quase escravo, são confinados nos canaviais
por horas a fio, alguns por mais de 12 horas por dia. De outro lado, a penosa
solidão de suas mulheres, mães e esposas, que têm que assumir sozinhas a
ingente tarefa de educar os filhos e o cuidado das pequenas propriedades.
Mulheres que sofrem e choram às escondidas, que renunciam a seus maridos
e filhos, acalentando o sonho de uma vida melhor; mulheres deixadas grávidas e reencontradas com filhos lactentes. Filhos que vêem seus pais num relance de fim de ano para só reencontrá-los após incontáveis meses. Numa palavra, famílias partidas pela falta de perspectiva local e pela sedutora atração
do suado dinheiro paulista.
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Em meio a tudo isso, o que mais nos surpreende é a resistência teimosa
e prenhe de esperança deste povo sofrido, deste povo de Deus, que continua
percorrendo léguas e léguas à procura de sentido, vigor e transformação para
suas vidas. Sua alegria contagiante, seu largo e branco sorriso, em contraste
com sua pele enegrecida e explorada, sua vibração e sua atenciosa acolhida
aos missionários, tudo isso é sinal inconfundível de que o Reino está entre eles, não obstante os entraves que retardam sua total implantação. Eis um retrato do que podemos chamar de “pobreza das grotas”, um misto de abandono estrutural, ausência de recursos básicos, carências humanas e falta de
perspectivas. Espaço privilegiado da experiência do Deus libertador e da vivência plena do carisma vicentino. Frente a essa realidade, só nos restava acolher, como se dirigida a nós, a atualíssima recomendação de Vicente de
Paulo: “É preciso ver os pobres em suas casas. Em cada região, em cada aldeia, fazer a lista dos pobres, conhecer diretamente os mais necessitados e
os que não o são” (SV VI, 348).
3. “A Missão tudo pode!”
“Saímos das comunidades, mas as comunidades não saíram de nós”,
foi o que ouvimos de uma leiga missionária. De fato, não nos despedimos
com a sensação do dever cumprido. No momento da revisão, latejava a
convicção de que muito mais ainda podia ser feito junto àquelas pessoas
cujos nomes e rostos agora conhecemos, das famílias que nos acolheram
em suas casas com o melhor de sua pobreza, das comunidades que se tornaram também nossas.
Sentimo-nos desafiados pela precariedade das condições de sobrevivência naqueles pequenos povoados, inacessíveis a não ser depois de longas caminhadas, privados dos recursos mais elementares, inescrupulosamente abandonados pelos órgãos públicos e ainda desarticulados na luta
por seus direitos. A evangelização também nos fez pensar, convocando-nos
a colher antes de semear, a exercitar a paciência, a recriar nossa linguagem,
a reinventar nossos métodos, a repensar nossa maneira de transmitir e ce20
lebrar a fé em comunidade. Tais desafios só nos fizeram mais entusiasmados, apesar de muito exigirem de nós. Deixaram-nos em verdadeira tensão
missionária e com reacendido ardor apostólico. E assim foi nossa presença
de 15 dias: visitas a todas as famílias, com a possibilidade de voltar a muitas
casas; caminhadas quilométricas, enfrentando barro, poeira, rios e pedras,
para encontrar todas as pessoas e favorecer celebrações e encontros lá onde o povo vive e luta; reuniões com crianças (que, de tão numerosas, pareciam germinar das profundezas mais férteis da terra!), jovens, adultos e lideranças; missas, batismos e até casamentos. Uma fecunda experiência de
presença gratuita e de solidariedade missionária, sem nenhuma pretensão,
sem muito alvoroço, sem barulho e propaganda. Presença fraterna de irmãos que decidiram encontrar e amar outros irmãos.
Mais uma vez, tocou-nos o coração a seriedade do trabalho realizado
pelas Irmãs e pelos Padres junto às comunidades, sempre disponíveis, despo
jados e diligentes no atendimento das crescentes demandas da missão
que o Senhor lhes confiou e que assumem numa exemplar permuta de
dons e habilidades. Edifica-nos também, sempre de novo, ver florescer, nos
ramos de nossa Família Vicentina, leigos e leigas convictos e sensíveis, generosos e criativos na vivência de nosso carisma missionário.
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Da parte da Família Vicentina de BH era preciso fazer alguma coisa para levar em frente o trabalho apenas iniciado e transformá-lo em projeto.
Então, resolvemos assumir o compromisso de voltar para celebrar a Semana Santa nas mesmas comunidades pelas quais passamos, com a possibilidade de uma nova quinzena missionária em julho também. Na Missa de
despedida, não pudemos apresentar ao Senhor os frutos do trabalho que
realizamos com o suor do nosso rosto e a força dos nossos braços. A colheita não nos pertence. Apresentamos apenas nossas mãos vazias, por não
termos deixado de lançar nenhuma daquelas sementes que ele mesmo nos
confiou. E, novamente, confirmamos: “A Missão tudo pode, pois temos em
nós o germe da onipotência de Jesus Cristo. Eis porque nada é escusável sob
o pretexto da incapacidade. Teremos sempre mais força do que o necessário” (SV XI, 204).
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Missões Vicentinas em Pedra de Guaratiba (RJ)
“Ai de mim se eu não evangelizar!”
Pe. Juarez Carlos Soares, C. M.
É com profunda alegria e entusiasmo missionário, que venho partilhar,
resumidamente, o que vimos, ouvimos e sentimos nas Santas Missões Populares Vicentinas, realizadas em Pedra de Guaratiba, subúrbio do Rio de Janeiro, de 8 a 23 de janeiro de 2011.
Tudo começou no dia 7 de janeiro, às 21h, na capela de Nossa Senhora das
Graças, da Casa Dom Viçoso, com a celebração da Eucaristia em memória da
grande missionária e mártir Lindalva Justo de Oliveira, F. C. Nesta celebração,
fomos enviados, um grupo de 29 missionários leigos, seminaristas e padres.
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Chegamos ao Rio de Janeiro, às 7h do dia 8 e fomos acolhidos no Colégio São
Vicente de Paulo, onde nos esperavam os coordenadores da missão e um grupo
de missionários. Tomamos um farto café da manhã e começamos a integração
entre os membros dos dois Regionais (Belo Horizonte e Rio de Janeiro). Em seguida, partimos para Pedra de Guaratiba.
Chegando ao local, cada um foi pegando sua bagagem e entrando na
humilde escola, em fase de reforma, onde iríamos nos hospedar. Antes do
descanso, porém, foi preciso pôr o alojamento em ordem, fazendo a limpeza, espalhando os colchões pelo chão e arrumando somente o necessário
para permanecermos 15 dias. Fizemos valer o refrão que cantamos com
frequência e entusiasmo: É hora, missionário, é hora de evangelizar! Às
15h, fizemos a primeira reunião com o pároco, os coordenadores da missão, os missionários do local e os de fora, a fim de obter informações a respeito da realidade, favorecer o entrosamento, formar as equipes e dividir
os trabalhos.
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Do muito que vimos, ouvimos e sentimos, destacamos o seguinte: Pedra de Guaratiba está localizada a caminho do bairro Santa Cruz e faz limite
com o bairro de Sepetiba. É uma área com imensa extensão territorial e
com uma população estimada em torno de 120 mil pessoas. Os locais destinados a essa primeira etapa das Missões ficam muito distantes das sedes
das duas paróquias: Santa Edwiges e São Pedro Apóstolo. As áreas das duas
comunidades missionadas são a “Favela da Foice”, onde se situa a incipiente Comunidade São João Maria Vianney, e a “Sementinha”, Comunidade do
Divino Espírito Santo, esta mais desenvolvida, com algumas lideranças
constituídas e uma capela maior. A ocupação de ambas as regiões foi feita
de maneira irregular, através de invasões e loteamentos indevidamente
demarcados por algumas lideranças locais, o que desencadeou uma rápida
expansão do contingente populacional, vindo, em sua grande maioria, do
Nordeste. As duas regiões ou bairros carecem totalmente de saneamento
básico: esgotos, água, asfalto, limpeza, etc. A população é de baixa escolaridade e muito mal servida pelos serviços públicos. As pessoas dizem agora
que vivem em paz, pois são protegidas pela “milícia”, a quem atribuem a
diminuição do número de mortes, roubos, etc. Encontramos um povo pobre e sofrido, um povo bom, humilde, acolhedor, mas com “certas resistências”.
Nestes 15 dias, pudemos realizar:
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1. Visitas diárias (manhã e tarde)
2. Encontros com crianças, jovens, famílias e lideranças
3. Via-sacra missionária
4. Celebrações eucarísticas
5. Atendimento aos doentes
6. Confissões individuais
7. Avaliações
8. Noite cultural
A realidade social, política, econômica, cultural e religiosa de Pedra de
Guaratiba apresenta sérios e profundos questionamentos para nossa ação eclesial e missionária. Fomos desafiados tanto pelo indiferentismo religioso quanto
pela proliferação de igrejas de toda natureza, assim como pela atuação de outras práticas religiosas. Concluímos, então, que esta é uma realidade que precisa realmente de nossa presença e ação. Ficou combinado com os Padres do
local e com algumas lideranças o retorno da Família Vicentina por pelo menos
mais dois anos no mês de janeiro, bem como em outras ocasiões, como Semana Santa, para dar continuidade ao projeto missionário iniciado.
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A avaliação foi altamente positiva e realista. Temos consciência das falhas
e lacunas no trabalho realizado, mas, sobretudo, da semente lançada com entusiasmo e zelo, da alegria e da amizade, do bem que realizamos e do testemunho que recebemos desse bom povo de Deus. Queremos expressar aqui, em
nome da Família Vicentina, os nossos profundos agradecimentos a todos os
missionários pela incansável dedicação, despojamento e ardor. Que Jesus, o
Missionário do Pai, e São Vicente, patrono e companheiro na missão, abençoem a todos e a cada um em particular.
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REALIDADE
Chuvas e mortes na região serrana do RJ:
resposta da natureza ou castigo divino?
Tiago de França
Seminário Interno Interprovincial
Os brasileiros assistiram, dolorosamente, à situação calamitosa da região serrana do Rio de Janeiro: muitas chuvas e centenas de mortes. O desespero diante da situação tem levado muita gente a pensar muitas coisas.
Uns acham que a natureza está revoltada, outros que Deus está castigando
o mundo. Cristãos que se deixam levar pelo dogmatismo e pelo fundamentalismo crêem que a mão de Deus está acabando com os iníquos.
A partir da experiência missionária de Jesus de Nazaré, o que pensar e
dizer diante de tal situação? Se for Deus o culpado de tamanho número de
mortos, não estaria ele contradizendo-se a si mesmo, uma vez que a Bíblia
revela que Deus é amor e que do amor não procede o ódio? Se não é Deus o
culpado, por que, então, ele permite que aconteçam tamanhas desgraças?
São questões que precisam ser pensadas à luz da razão iluminada pela fé.
Na verdade, não precisaríamos escrever um artigo tendo como questão
o enunciado da presente reflexão, pois todos já sabemos da resposta: O que
está acontecendo no Rio de Janeiro e em todo o mundo é a resposta da natureza à violência praticada pelo ser humano. As pesquisas científicas têm de28
nunciado os diversos males que o ser humano tem causado à natureza. Desde a escola primária, sabemos disso. Uma questão nos intriga: Por que será
que mesmo sabendo que está violentando-se a si mesmo, o ser humano insiste num projeto socioeconômico que explora e destrói, impiedosamente, a natureza?... São inúmeros os avisos, constatações, previsões e estudos realizados por gente séria, que apontam para o fim trágico da humanidade, caso esta insista em continuar alimentando o capitalismo selvagem.
Assistindo e lendo os jornais, percebemos, facilmente, a falácia que nunca convence e sempre se repete: As mortes poderiam ser evitadas se os governos planejassem melhor a edificação das moradias e das cidades. Seguramente, podemos afirmar que, quando a natureza resolve responder às ações
irresponsáveis dos seres humanos, não há cidade planejada nem equipada
que suporte. Tudo é destruído. Não há inteligência que produza tecnologia
suficiente que barre a revolta da natureza. Quando esta resolve se manifestar, num grito doloroso de socorro, infelizmente, muitas pessoas inocentes
perdem a vida. É aqui que surge outra questão: Todos são responsáveis pela
destruição da natureza? Claro que não!
Um trabalhador do campo, que cultiva respeitosamente a terra, não tem
culpa nenhuma no processo contínuo de destruição da natureza. Afirmar que
a culpa é do capitalismo selvagem não significa nada, não diz nada e não acusa ninguém. Então, de quem é a culpa? O capitalismo, expressão genérica que
não diz quase nada, tem seus agentes, ou seja, é constituído por pessoas ambiciosas que detêm o poder econômico que constrói empresas, que exploram
e poluem a terra, a água e o ar. Os funcionários destas empresas, não tendo
outra saída para sobreviver, aplicam-se às especializações das técnicas sofisticadas de exploração. Quem não aprende a lidar com as novas tecnologias,
gradativa e silenciosamente, vai ficando para trás; tornando-se ultrapassado
e, conseqüentemente, desempregado. E desemprego, por sua vez, só gera violência e mais mortes.
A partir de sua face enganosa e doentia, o capitalismo é um sistema que
vicia e adoece as pessoas, chegando até a torná-las objetos de consumo. Trata-se de um sistema que envolve e compromete todos os aspectos da vida
humana e que não permite projeto alternativo de economia. O segredo de
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tudo está no lucro e quem se envolve com o lucro não quer deixar mais de lucrar, torna-se escravo. No mundo capitalista, todas as pessoas querem ter
vantagens, ninguém aceita ser derrotado. A partir dessa lógica, o exemplo de
pessoa é aquela que conseguiu vencer, economicamente, na vida. Esta pessoa deve ser aplaudida, venerada e até adorada, pois os vencedores tornamse ídolos.
O lucro não dá espaço para as pessoas pensarem no valor da natureza e
de sua respectiva preservação. O lucro é incompatível com a idéia de cuidado.
Cuidar da natureza, das pessoas e da vida como um todo, aos olhos do capitalismo, é coisa de gente alienada, coisa de quem não tem o que fazer. Para um
empresário empreendedor, é inadmissível renunciar ao lucro doentio e demasiado para cuidar da natureza e preservá-la. Para ele, isso se chama retrocesso e/ou prejuízo. Mesmo diante das catástrofes naturais, os grandes investidores e especuladores da economia capitalista não se convencem de que o
mal não se encontra numa imaginária imperfeição da natureza nem numa intervenção divina, mas na busca insaciável do lucro que se dá na exploração
criminosa dos recursos naturais.
Assim sendo, está mais que comprovado que Deus não tem nenhuma
culpa no desequilíbrio da natureza. A tradicional teologia da criação ensinanos que tudo foi, perfeitamente, criado por Deus e dado, gratuitamente, ao
homem. Se não é o culpado, por que ele teria que intervir, evitando a destruição? A doutrina do livre arbítrio nos leva a entender que o homem é um ser
livre e que pode fazer o que quiser de sua liberdade. Claro que Deus não nos
chama para a irresponsabilidade, mas para o cuidado para com as pessoas e o
mundo. Agora, se o homem resolve, livremente, destruir a natureza, a realidade tem mostrado que Deus respeita esta infeliz iniciativa. O ser humano
precisa aprender a arcar com as conseqüências daquilo que faz. Infelizmente,
tal aprendizado tem se mostrado doloroso.
É pecado afirmar que Deus não evita o mal? Seria Deus um ser frio e sem
sentimentos? Mesmo sabendo que os sentimentos são da ordem da humanidade, cremos que Deus veio ao mundo na pessoa de Jesus de Nazaré e, compassivamente, agiu a favor das pessoas, especialmente das que se encontravam em situações desesperadoras. Assim sendo, Deus não é insensível e a
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história da salvação, que se encerra em Jesus Cristo, demonstra, historicamente, que Deus se compadece do gênero humano e de toda a criação. Na
verdade, não se trata de Deus evitar ou não o mal, mas de respeitar até as últimas conseqüências a liberdade concedida ao ser humano. A partir de Jesus
de Nazaré, acertadamente, podemos afirmar que dói no coração divino ver
tanta desgraça, mas a esperança cristã nos desperta para um novo céu e uma
nova terra, que precisamos construir a cada dia.
É verdade que nossas explicações sobre a ação divina no mundo não
conseguem abarcar uma realidade que é, por si mesma, misteriosa. Por que
Deus não interferiu na morte de mais de 700 pessoas no Rio de Janeiro e em
outras tantas ocasiões? Podemos apelar para várias hipóteses, mas temos
que admitir que tudo se encerra no mistério daquilo que denominamos Deus.
Ninguém consegue explicar, lógica e/ou racionalmente, a ação de Deus em
nós e no mundo, porque Deus ultrapassa a nossa capacidade de imaginação e
pensamento. O que falamos se pauta naquilo que nos foi revelado em Jesus
de Nazaré e o mistério da vida deste também é inesgotável. As pessoas que
pensam ser castigo divino a situação atual do RJ e do mundo inteiro se apegam às explicações mitológicas que precedem o aparecimento das ciências e
da técnica. Explicações que não explicam nada! Antes do aparecimento das
ciências que explicam os fenômenos, tudo era culpa ou de Deus ou do demônio. Este, juntamente com os espíritos maus.
Apesar dos pesares da vida, cremos que Deus é amor e nos oportuniza
compreendermos esta verdade salvífica. Diante daquilo que não compreendemos, não nos resta outra alternativa senão o silêncio, mas não um silêncio
omisso e irresponsável diante dos desafios da vida. Cremos no poder e na criatividade da inteligência humana, que deve buscar formas alternativas de
subsistência, que não seja uma economia pautada somente no lucro. O ser
humano precisa reaprender e/ou redescobrir o autêntico significado da palavra economia: do grego oikonomía, que significa a arte de bem administrar a
casa. Oxalá nossa economia t como princípio fundamental o cuidado permanente de nossa Casa e Mãe comum, a Terra.
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OLHAR TEOLÓGICO
Por que os pobres não se suicidam
Víctor Codina, S.J.
Gustavo Gutiérrez se pergunta “Onde dormirão os pobres esta noite?” É
uma pergunta interpeladora, que expressa a preocupação angustiada por
tanta gente que vive à intempérie, sem lar nem trabalho. Mas eu gostaria de
completar esta pergunta com outra que, talvez, nos pareça estranha: Por que
os pobres não se suicidam coletivamente?
Não pretendo aqui fazer um estudo sociológico do fenômeno do suicídio
no mundo, nem apresentar estatísticas sobre o número de suicídios individuais nos países ricos do Norte em relação aos países pobres do Sul, embora,
seguramente, possamos constatar que seu número é maior no Norte do que
no Sul, onde também há suicídios individuais por motivos sentimentais, familiares e, às vezes, econômicos.
Minha pergunta tem outra intenção: por que nos países pobres do Sul,
na América Latina mais concretamente, não se dão esses suicídios coletivos
que, em algumas “seitas” fundamentalistas e apocalípticas, se produziram
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sob as ordens de um líder fanático? Por que, por exemplo, os grupos indígenas não decidem se extinguir e desaparecer?
Na América Latina, os pobres, os grupos marginalizados, os camponeses,
os indígenas e afrodescendentes padecem, muitas vezes, fome e desnutrição;
muitos deles não têm água nem eletricidade, não gozam de um emprego estável, não possuem uma moradia digna; sofrem por falta de escolas e hospitais, sentem-se excluídos, muitos emigram para o exterior em busca de melhores condições de vida… E, entretanto, seguem em frente e lutam pela vida,
namoram, casam e têm filhos, as crianças brincam e riem, as mulheres compram flores e celebram festas, levantam-se, a cada dia, com a esperança de
melhorar sua vida, com o sonho de construir um mundo melhor, de lutar para
que seus filhos vivam uma vida mais digna e não padeçam a escassez econômica que eles sofreram.
Quando, no Primeiro Mundo, as Utopias morreram e os Grandes Relatos
desapareceram, quando os ideais de Maio de 68 são objeto de crítica e de ironia e cada um busca viver o melhor possível prescindindo dos outros… na
América Latina o povo ainda sonha com um amanhã melhor, com um mundo
onde haja justiça, solidariedade, respeito às diferenças étnicas, liberdade, inclusão, harmonia com a natureza, onde, como o profeta anunciava, o lobo e o
cordeiro possam pastar juntos e o menino possa brincar com a serpente (cf. Is
11, 6-8).
De onde nasce esta esperança de que outro mundo é possível e necessário? Esta esperança não é fruto de estudos sobre economia política, nem de
uma reflexão sobre a história das civilizações, mas de algo mais simples e profundo.
Frente a todos os agouros da sociologia que anunciavam que, na América Latina, a secularização raivosa e linear do Ocidente ilustrado ia varrer a religião
e produzir uma sociedade agnóstica e ateia como a europeia, a religião perdura com força, dentro de um grande pluralismo religioso. Esta religiosidade
pluriforme é, sem dúvida, a fonte última de sua esperança existencial na vida.
Sem querer fazer um estudo pormenorizado do pluralismo religioso na
América Latina, podemos afirmar que, junto às velhas raízes culturais e religiosas das cosmovisões ancestrais anteriores ao cristianismo, perdura uma forte religiosidade popular que é a forma mais inculturada de viver a fé a partir
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de suas raízes culturais e que é a mais difundida nos setores pobres. Junto a
essa forma de religiosidade popular, estão os praticantes dominicais e um
grupo minoritário de cristãos que podemos chamar comprometidos, militantes, discípulos e missionários. Indubitavelmente, fazem parte desse pluralismo religioso os que pertencem a comunidades evangélicas e também os que
integram grupos para-cristãos ou não cristãos. Poderíamos dizer, simplificando e generalizando um pouco, que, em todos estes grupos religiosos, persiste
um sentido do sagrado e do transcendente, ao mesmo tempo em que, em
muitos deles, coexiste uma certa relativização (pós-moderna?) das instituições, uma crença com pouca ou nenhuma pertença institucional. Uma fé e
uma religião “a la criolla”, a gosto, bastante livre e atípica diante dos ensinamentos e normas oficiais, uma espécie de religião e Igreja informal, quase
subterrânea.
Mas, em meio a esse grande pluralismo religioso, há, sobretudo nos
mais pobres, um sentido convergente e profundo de amor à vida, de que
Deus não nos abandona, mas escuta o clamor dos pobres, de que Deus dá
força para lutar pela vida, sempre nos acompanha, perdoa, salva e está com o
povo em sua caminhada pela história.
De onde nasce esta convicção? Das raízes ancestrais das culturas e religiões originárias? É fruto da tradição bíblica que recorda que Deus salvou o
povo de Israel da opressão do Egito e o levou à terra da promissão? Fundamenta-se no conhecimento do Evangelho, da proximidade e do carinho de
Jesus de Nazaré para com os pobres, aos quais chama de bem-aventurados, a
quem cura e perdoa? Está ligada à figura materna de Maria que nunca abandona os seus filhos e filhas? Apoia-se no testemunho de muita gente
de boa vontade e de Igreja que se solidariza com eles? Ou melhor, é uma misteriosa convicção interna, inexplicável racionalmente, que assegura aos pobres que Deus está sempre com eles, que “Deusinho” sempre os acompanha?
O Espírito do Senhor, que é vida e esperança, é quem interiormente os faz
experimentar essa esperança e lhes dá força para seguirem em frente na vida.
Esta misteriosa convicção se converte em força, em esperança, em ideal,
em lutar, amar, casar, ter filhos, celebrar festas, não se suicidar coletivamente. O Deus da vida lhes infunde ânimo para viver, ainda que tudo isso seja
misterioso e dificilmente comensurável. Os pobres intuem que o mal, a dor, a
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pobreza, a injustiça, a morte não podem ter a última palavra, que um dia triunfarão a justiça e a verdade, e isso é o que já antecipam simbolicamente em
suas festas. É a atitude da mulher do Apocalipse que, frente ao dragão que a
ameaça de morte, engendra vida (cf. Ap 12), convencida de que a vida vencerá a morte. É a fé das mulheres que vão ao sepulcro e que, ao achá-lo vazio,
crêem que o crucificado ressuscitou e vive (cf. Lc 24, 1-11). Teologicamente,
poderíamos acudir aos textos evangélicos onde Jesus dá graças a seu Pai,
porque ocultou aos sábios e prudentes deste mundo os mistérios do Reino e
os revelou aos simples e pequenos (cf. Lc 10, 21-22).
Desconhecemos como evoluirá esta religiosidade no futuro, mas atualmente essa esperança e esses sonhos constituem uma lição para os que vivem (também na América Latina…) num Primeiro Mundo que fez do dinheiro
seu sacramento burguês, o sinal visível da graça invisível, para os que não têm
sonhos nem utopias, estão encerrados no cárcere da mais árida imanência e
só desejam desfrutar da vida. Alguns já não querem ter filhos, outros pensam
seriamente em tirar a vida quando esta declina e já não tem encanto para eles.
Frente a essa realidade, os pobres nos ensinam que, com menos, é possível viver mais humanamente, que se pode sonhar, que se pode arriscar, lutar por um mundo melhor, que tem sentido esperar, ainda que não vejamos
plenamente os resultados, que a vida é digna de fé, que há Alguém que nos
acolhe e envolve, misteriosamente, com seu carinho, porque estamos em
boas mãos, nas mãos bondosas de um Pai-Mãe. Apesar de todos os males,
os pobres intuem que não há por que se suicidar, porque a vida é bela, é
um dom do Deus da vida.
(Tradução: Vinícius Augusto R. Teixeira, C. M.)
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HOMENAGEM
Padre Sebastião Mendes Gonçalves recebe condecoração
Pe. Agnaldo Aparecido de Paula, C. M.
No dia 22 de janeiro de 2011, no Plenário da Câmara Municipal de
Campina Verde, Pe. Sebastião Mendes Gonçalves recebeu condecoração da
Ordem Municipal do Mérito “João Batista Siqueira” no Grau de Comendador. A iniciativa do vereador Dr. João Silva contou com a aprovação unânime dos vereadores e a cerimônia de outorga foi abrilhantada com a presença de parentes, amigos, autoridades e cidadãos de Campina Verde que
lotaram o Plenário da Câmara Municipal.
Ao Pe. Sebastião Mendes Gonçalves, as felicitações de seus Coirmãos da PBCM pela justa homenagem.
A seguir, publicamos o relato dos dados biográficos do homenageado apresentado durante a sessão solene de outorga da Condecoração.
Dados biográficos
Sebastião Mendes Gonçalves nasceu a 16 de janeiro de 1933, na Fazenda Córrego do Meio, município de Campina Verde, Estado de Minas Gerais. É o terceiro filho do casal Pedro Moreira Gonçalves e Luísa Mendes da
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Silva que, como pais cuidadosos e esmerados na arte de educar, logo se
preocuparam em trabalhar arduamente para que seus 18 filhos tivessem
boa formação religiosa. Após o nascimento de Sebastião, aos 8 de abril do
mesmo ano de seu nascimento, foi levado à pia batismal para receber seu
primeiro sacramento, provavelmente ministrado por Padre José Alves de
Araújo, pároco naquela ocasião, iniciando-se assim sua caminhada religiosa.
Para ilustrar melhor, o próprio homenageado conta a história de
sua infância, em forma de poesia:
“O dom da vida Deus me deu,
Após tempo de gestação,
No dia que Ele me escolheu
E deu vida ao meu coração.
Chegou, portanto a minha vez
Em mil novecentos e trinta e três
Dezesseis do primeiro mês,
De mamãe o número três.
Pedro, meu pai, era inda jovem,
Luísa, minha mãe, mais ainda...
Ainda hoje me comovem,
Pela fidelidade infinda...
Logo fiquei sendo o segundo,
Pois a primeira irmãzinha
Deus quis levá-la desse mundo,
Mesmo ainda muito novinha...
Segundo minha mãe me disse,
Também eu andava doente;
Foi frágil minha meninice;
Disso meu corpo inda se ressente...
Vieram quinze, depois de mim,
Mas três Jesus pro céu levou;
Hoje, catorze somos sim,
De um lar que Deus abençoou...
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Campina Verde é minha terra
Santa Vitória me criou;
E, com certeza, ninguém erra
Se diz que lá Deus me pescou...
Com o crescimento daquele garotinho, já se podia perceber seu
despertar vocacional que, a bem da verdade, é creditado, em grande parte, à religiosidade de seus pais, a começar por seu avô paterno, Antônio
Moreira, que lhe dispensava grande incentivo. Certamente, Sr. Pedro e
Dona Luísa pretendiam fazer de seu lar um berço de santas vocações, tanto que tiveram a felicidade de ter dois filhos que se tornaram padres. Sendo assim, o ingresso de Sebastião Mendes no Seminário deu-se em 28 de
janeiro de 1946, graças aos cuidados de Padre Breiner, tendo sua entrada
oficial na Congregação da Missão, como Noviço, em 25 de janeiro de 1953.
Realizou seus estudos em Irati, Colégio do Caraça e Petrópolis, vindo a receber o sacramento da Ordem, nesta cidade, sua terra natal, em 27 de setembro de 1960.
Em forma de poema, ouçamos o relato do homenageado:
Eu tinha apenas doze anos,
Quando meu pai me despertou,
Quando me falou de seu plano
Que, com o de Jesus, calhou.
Queria ver-me padre um dia;
E ao pároco me entregou;
Esse, sua missão cumpria
E ao seminário me levou.
Caí nas mãos dos vicentinos
E nas malhas de grandes santos.
Gostei sempre de seus ensinos
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E me dobrei aos seus encantos...
Quinze anos de formação
Trouxeram-me ao Presbitério;
E é com muita emoção
Que eu vivo hoje esse mistério...
Mistério de perseverança,
No correr de cinquenta anos;
Onde a graça de Deus me alcança,
Apesar de meus desenganos...
Sob a proteção de Maria,
Nossa Mãe e Mãe de Jesus,
É sempre a Eucaristia
Que me conforta e conduz...
Agarrei-me a São Vicente
E não largo sua herança:
“Jesus está na pobre gente”,
Essa gente é minha poupança...
A ordenação sacerdotal de Padre Sebastião Mendes aconteceu em
meio à grande festa em Campina Verde, quando se comemorava o terceiro
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centenário da morte do glorioso São Vicente de Paulo, o Patrono da Caridade.
Esta unção sacerdotal fazia parte do programa de festividades em louvor ao
santo fundador da Congregação da Missão, que, em Campina Verde, já vinha
inspirando a devoção e o seguimento de todo o povo, desde 1830.
Após sua ordenação, Padre Sebastião sempre convicto de seu ideal e
fazendo a máxima de São Vicente o seu lema: “Não sou daqui nem dali, mas
de onde Deus me mandar”, pôs-se a caminho, sempre obediente aos seus superiores, a fim de cumprir suas obrigações de sacerdote. Lecionou no Seminário do Caraça, no Colégio de Irati, Estado do Paraná, no Seminário em Fortaleza
e em Campina Verde, no Ginásio Nossa Senhora das Graças. Em sua terra natal, foi pároco no período de 1967 a 1970, quando foi para o Rio de Janeiro
participar de curso no ISPAC – Instituto Superior de Pastoral Catequética. Concluído este curso, Padre Sebastião foi designado para servir à Paróquia de Taguatinga, Distrito Federal, indo em 1972 reorganizar o Santuário do Caraça que
havia sofrido grande incêndio. Tem-se conhecimento de que lá Padre Sebastião desenvolveu um brilhante trabalho.
Em 1977, retornou à sua terra natal para administrar as fazendas de
propriedade da Congregação da Missão, quando pôde demonstrar seu grande
potencial empreendedor. Como administrador, cuidou com sabedoria do patrimônio, não se esquecendo do lado humanitário e caritativo que estava
sempre impresso no seu relacionamento com os empregados e seus familiares. Além disso, fazia grande esforço para, através do resultado financeiro gerado nas propriedades rurais, aliviar o sofrimento daqueles que necessitassem
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de ajuda material, aqueles que um dia o caridoso coração de São Vicente
chamou de “o outro Cristo”.
Em Campina Verde, fundou o Banco da Providência Padre Guilherme,
cuja ação dentro da comunidade era assistir as famílias carentes, visando a
promoção humana. Esta entidade, que teve sua abertura devidamente publicada no Diário Oficial em 17 de novembro de 1966 e devidamente registrada
no Cartório competente em 5 de abril de 1967, recebia ajuda também da Cáritas – organização humanitária da Igreja Católica – que enviava toneladas e toneladas de mantimentos para serem distribuídos aos pobres. Além desta significativa ajuda da Cáritas, o Banco da Providência podia contar também com a
generosidade dos fazendeiros que faziam a doação de arroz para a distribuição
aos pobres.
Vale ressaltar que este trabalho não se resumia em uma atitude assistencialista, mas algo muito mais completo, pois os pobres eram auxiliados a
construir sua própria casa a partir da doação de material que, depois, segundo
as possibilidades de cada um, iam ressarcindo o Banco da Providência para
que outras moradias pudessem ser construídas, tornando estes capazes de serem no futuro os agentes de sua própria história. As casas foram construídas
em terrenos pertencentes ao loteamento da PBCM – Província Brasileira da
Congregação da Missão – doados àqueles que, após rigorosa triagem, fizessem
jus àquela doação. Além do terreno para a casa, era assegurada ao beneficiário
uma pequena gleba no entorno da moradia, onde se podia cultivar hortaliças
ou outros vegetais. O Banco da Providência prestava assistência a mais ou menos duzentas famílias carentes, proporcionando-lhes além do arroz, farinha e
outros mantimentos, uma vaca era abatida todos os meses, doada pelas fazendas da Congregação.
Além deste belo e eficiente trabalho em favor dos pobres, o homenageado fazia questão de prestar assistência às comunidades da zona rural, indo
aos domingos para estas comunidades para as celebrações, onde tinha a oportunidade de estabelecer ótimo relacionamento com os trabalhadores e fazendeiros, além de prestar-lhes assistência espiritual.
Este período se estendeu até 1988, quando se colocou à disposição do
Superior Geral da Congregação para as Missões no continente africano, chegando a Moçambique em 7 de fevereiro de 1989. Em sua primeira celebração,
em 19 de fevereiro do mesmo ano, Padre Sebastião disse ao povo que estava
presente:
41
“Tenho certeza de que o povo da minha terra está rezando por mim,
porque eu disse a eles: ‘Vou para Moçambique, mas não quero ir sozinho, quero que meu povo me acompanhe. O povo de minha Paróquia é também o povo da Igreja de Moçambique. Somos uma comunidade só, uma Igreja só no
mundo todo, porque é o Cristo que nos une”.
Ao iniciar seu trabalho missionário em Moçambique, foi primeiro para
a Paróquia de Chókwè, Província de Gaza, ao sul de Moçambique. Chegando
em meio à guerra civil que assolava o país, teve que conviver com as agruras
da violência. O povo sofria muito vitimado pelos atentados terroristas e a Igreja se posicionava sempre em favor do povo, defendendo-o da violência e da
falta de justiça que faziam parte da realidade do momento. Em meio a este
clima de terror, em 16 de abril de 1992, Padre Sebastião, juntamente com outras Irmãs, Filhas da Caridade, foram vítimas de emboscada militar, tendo seu
veículo alvejado por rajadas de metralhadora e atentado a bomba, ficando o
homenageado gravemente ferido nas pernas.
Após sua recuperação, continuou convicto de suas proposições e ideais, ajudando e apoiando aquele povo tão sofrido. Pôs-se novamente a caminho para trabalhar nas Missões em Mabalane-Mapai e Massangena, indo depois para Chilembeme, Maputo, Chókwè e Massingir. Atualmente, está na
Província de Tete, a 1.500 km da capital, trabalhando na Missão de MavudziPonte, região central de Moçambique. Diga-se, de passagem, que esta Paróquia, onde atualmente serve é composta de 39 comunidades engastadas em
locais de dificílimo acesso, permeados por montanhas, matagais e péssimas
estradas. Neste trabalho, Padre Sebastião pode contar com a valiosa ajuda do
Pároco da localidade, Padre Inocêncio Francisco Sipoia, moçambicano que conhece bem os idiomas e dialetos pertinentes ao lugar, o que favorece muito a
comunicação.
O clima de guerra foi, aos poucos, se desvanecendo, dando lugar a
uma razoável tranquilidade e paz. Hoje, pode-se dizer que o país, apesar de ser
um país de misteriosas tradições, de muita pobreza material e péssima distribuição de renda, possui um povo muito receptivo e alegre e sempre desejoso
de caminhar na fé.
Nessa noite tão especial, temos a honra de estar aqui reunidos, em
clima de grande festa, pois a meritória homenagem que prestamos ao ilustre
filho desta terra leva-nos a ouvir, através de seu próprio relato em forma poé-
42
tica, a perseverança em seus ideais, desenhados pelo grande São Vicente de
Paulo. O homenageado assim descreve sua vocação:
Quem pôs as mãos no arado
E fica a olhar para trás
Na vida está parado
Não faz render o que faz.
Deus me deu uma empreitada,
Em sua grande seara,
Deu-me terra preparada,
Onde outro cultivara.
A vida missionária
É caminhar sempre em frente;
É passar pela malária
E suar em solo quente.
Zelar do que está plantado,
Ervas daninhas cortar,
Exige muito cuidado,
Para etapas não queimar.
Se dos pobres é a Igreja,
Com pobres, devo viver,
Com eles, devo sofrer
Prá que Deus louvado seja.
As férias renunciar,
Nesse ano jubilar,
É sacrifício no altar,
É vida santificar.
Para mim, nada de festa,
Mas somente ação de graça,
Pois, em data como esta,
O amor de Deus me abraça...
Se dos anos são cinquenta,
Na ordem presbiteral,
43
Meu espírito lamenta
O que em mim houve de mal.
Nenhum louvor eu mereço,
Pois só Deus tudo merece;
O que tenho não tem preço
É do céu graça que desce...
Em amparo permanente,
Mãe do céu, Imaculada,
Espero seguir em frente,
Nessa vida consagrada...
44
CLAPVI
Escola de Espiritualidade Vicentina
CURITIBA - 2011
CRÔNICA
Queridos Coirmãos que lerão estas crônicas da Escola de Espiritualidade Vicentina, realizada em Curitiba (Brasil), de 17 de janeiro a 11 de fevereiro de 2011.
Chegamos no dia 16 de janeiro, nós, os participantes das diferentes
Províncias da América Latina: Argentina (2), Chile (1), Peru (2), Rio de Janeiro (2), Fortaleza (1), Colômbia (1), América Central (1) e da Vice-Província
de Costa Rica (1).
A Escola teve início no dia 17, com a Missa de abertura presidida pelo
Pe. Fabiano Spisla, Visitador da Província anfitriã. Depois de dar-nos as boas-vindas, convidou-nos a viver este tempo de formação e renovação de
nossa espiritualidade e vocação missionária.
Tomamos a barca do Evangelho para navegar durante este mês no mar
da Escola de Espiritualidade Vicentina. Todos sabemos que Cristo é o grande capitão, mas sabemos também que ele se vale de outros para chegar e
45
conduzir seus missionários ao porto que ele quer que cheguemos. O primeiro capitão desta barca foi o Pe. Andrés Motto, da Província da Argentina. Durante esta viagem arrepiante, fomos saboreando a riqueza moral das
cinco virtudes vicentinas, com o seguinte esquema: introdução, aspectos
cristológicos, benefícios de viver as virtudes, prática das mesmas, virtudes
relacionadas e vícios contrários a essas virtudes e sua atualização. Como a
viagem se fazia um tanto perigosa, decidimos mudar de rota. O capitão
Motto disse que o novo menu era a Doutrina Social da Igreja (DSI) baseada
nos documentos do CELAM. Partimos do Rio para o Caribe; chegamos a
Medellín, Puebla, Santo Domingo e, finalmente, voltamos ao Brasil, em Aparecida. A modo de conclusão: a DSI deve inspirar uma verdadeira espiritualidade e iluminar nossa concepção social, para que se lance novamente
o desejo de criar uma sociedade que promova a totalidade dos homens e a
totalidade de suas áreas e, assim, não nos limitemos a ser espectadores da
história.
Quinta-feira, dia 20, à noite, recebemos a visita do Pe. Marcos Gusmieiro, missionário da Província de Curitiba, que, atualmente, trabalha como
formador na Vice-Província de Moçambique. Partilhou conosco sua experiência de trabalho missionário ad gentes. Entre os temas partilhados, po46
demos citar: a situação do país a partir de sua perspectiva sóciopolítica, religiosa e cultural; a formação dos Nossos; a saúde, etc. Partilhou como se
deu e se dá a reconstrução do país depois dos acontecimentos chaves para
a vida do mesmo: sua independência como colônia portuguesa, ocorrida
em 1975, e a guerra civil que terminou em 1992. Essas situações originaram
no país diferentes formas de pobreza, marginalização, exploração e corrupção. O trabalho do Pe. Marcos Gumiero na Vice-Província é a formação dos
Nossos, a qual constitui um grande desafio devido às circunstâncias dessa
cultura. Existe um grande interesse dos jovens pela Vida Consagrada ou Sacerdotal, mas a perseverança é mínima.
Nesta semana, nem tudo foi estudo, também houve tempo para partilhar e conhecer algumas obras da Província, tanto das Filhas da Caridade
como dos Missionários da Congregação da Missão. Nessa partilha, pudemos conhecer e saudar nosso novo bispo vicentino, Pe. José Carlos Chacorowski.
No domingo, 23, deleitamo-nos conhecendo as belezas naturais desta
cidade em um passeio comunitário.
A semana terminou com uma avaliação. Alguns dos pontos avaliados
foram: conteúdos das palestras, expositores, logística, comunidade e fraternidade, oração, passeios, alimentação, etc. A avaliação foi muito positiva, o que nos anima a continuar vivendo com muito ânimo e boa disposição
os dias que nos restam nesta apaixonante Escola de Espiritualidade.
SEGUNDA SEMANA
Na segunda semana, o novo capitão da barca foi o Pe. José Carlos Fonsatti, que, com muita habilidade, nos fez navegar, sem nenhum temor, no mar
das bases bíblicas de nossa espiritualidade. Durante essa viagem, paramos para celebrar, junto a muitos Coirmãos do Brasil, o dia da fundação da Congregação da Missão e, em seguida, retomamos nossa viagem, falando espanhol e
português. Terminamos esta semana refrescando-nos na praia, partilhando
um novo espaço de fraternidade.
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TERCEIRA SEMANA
Depois de alguns dias refrescantes de praia ou playa, novamente nos encontramos no Seminário para reiniciar nossa terceira semana de formação
permanente.
O novo capitão de nossa barca foi o Pe. Simão Valenga. Ele a conduziu às
origens desta Escola. Depois, estando em alto mar, não sabíamos onde íamos
parar. Alguém pedia auxílio: salve-nos, estamos afundando! Então, debaixo dessa tempestade, apareceu uma pequena, mas grande figura, não era Jesus Cristo
caminhando sobre a água, era o Pe. Daniel Vásquez, Visitador da Colômbia, que
chegava para orientar-nos o retiro, por um espaço de três dias. Este novo capitão acalmou a tempestade com muita simplicidade. Em terra firme, conduziunos ao deserto e, com o coração na mão, falou-nos do amor de Deus. Foram dias intensos, foram dias de oração. Obrigado, capitão, por fazer-nos conhecer
mais de perto o amor de Deus através do coração de São Vicente.
Neste momento, cada um teve a oportunidade de fazer sua própria viagem para dentro de si mesmo e ver como está caminhando como missionário
vicentino. Nosso retiro teve um broche de ouro ou de santidade ou conversão,
como se queira chamar, porque terminamos com o sacramento da reconciliação: foi o momento para escutar, na pessoa de um confessor, o amor de Deus
por cada um de nós e também para manifestar a Deus nossa sincera decisão
de continuar trabalhando em nossa própria conversão. Terminado nosso retiro
espiritual, tivemos a oportunidade de partilhar, durante dois dias, a vida e os
trabalhos com os Padres da Congregação nas paróquias que eles atendem aqui
em Curitiba. Cada um pôde experimentar o árduo labor missionário dos Padres. Foi também um desafio para os de língua espanhola ter que presidir a
Santa Eucaristia em português. Muitos tivemos que pedir perdão ao povo por
alguma expressão inapropriada à cultura. A bondade do pessoal não se fez esperar: como resposta, recebemos sorrisos e, no final, aplausos. Podemos dizer
que era como uma espécie de Pentecostes: ainda que não nos entendêssemos, todos sentíamos o mesmo. Depois dessa experiência, voltamos ao Seminário e, em nosso reencontro, partilhamos nossas experiências como a dos 72
discípulos que voltaram alegres da missão. Muitos diziam que haviam expulsado demônios, outros maravilhados por ter visto a grande obra vicentina reali48
zada pelos Padres Vicentinos, outros se maravilharam do compromisso dos
leigos em cada comunidade, alguns outros porque tinham visto o Pe. Francisco
de Assis vicentino.
QUARTA SEMANA
Entramos na última semana desta viagem formativa e, como capitão deste barco, tivemos o Pe. Mizáel Donizeti. Ele teve a responsabilidade, com sua
ampla experiência, de fazer-nos navegar no mar imenso do carisma e da Família Vicentina. Novamente, dirigimo-nos à fonte deste carisma, ao coração de
São Vicente e, em São Vicente, ao coração de Cristo. Que bom que São Vicente
não repetiu a espiritualidade da Escola Francesa daquele momento, já que
Deus o levou a sentir a urgência de servir ao pobre de um modo diferente. São
Vicente encontrou a fórmula para a santidade, santidade que se alcança no
exercício da caridade, servindo e evangelizando o pobre. Portanto, o pobre,
para um Vicentino, tem que ser e é o sacramento de Cristo, o lugar teológico ao o qual a Família Vicentina tem que ir para encontrar-se com Cristo.
49
É memorável a frase que compartilhava conosco: “São Francisco amava a
pobreza, São Vicente de Paulo amava o pobre”, que são duas coisas diferentes.
Estando em alto mar, aparece um novo capitão, é o Pe. Gilson Camargo,
que dirige nossa barca para o Vaticano II. Neste lugar, nos detivemos a estudar a
liturgia e a conhecer um dos últimos documentos pontifícios, a Exortação PósSinodal Verbum Domini.
Finalmente, estando todos em terra firme e no Seminário, sabendo
que esta viagem foi real, mas imaginária, muitos disseram que foi um Seminário Interno reduzido a um mês. Chegou a Missa de encerramento, presidida pelo secretário executivo da CLAPVI, Pe. Jair Vélez, e concelebrada
pelo Visitador de Curitiba e outros Coirmãos.
Depois deste mês de Escola de Espiritualidade, damos graças a Deus
por sua enorme bondade para com cada um de nós e por nos haver permitido participar desta maravilhosa experiência e com este grupo de Coirmãos vindos de distintos países.
Obrigado a São Vicente e à Congregação da Missão pelo carisma que
nos legaram: seguir Cristo evangelizador e servidor dos Pobres. Obrigado à
CLAPVI pelo grande interesse de fazer que a espiritualidade vicentina conti-
50
nue como fogo ardente no coração de seus missionários. Obrigado à Província
de Curitiba.
(Tradução: Pe. Vinícius Augusto R. Teixeira, C. M.)
51
NA MISSÃO DO CÉU
Pe. Antenor Pinto de Resende, C. M.
No dia 14 de janeiro de 2011, placidamente faleceu no Senhor este nosso
bom Coirmão. Padeceu de um câncer por mais de 3 anos. Sofreu caladinho e
submeteu-se a todos os tormentos do tratamento com paciência. Nascido em
Resende Costa (MG), no dia 7 de outubro de 1929 e batizado na matriz de sua
cidade, em 28 de outubro do mesmo ano. Filho de Domiciano Pinto de Resende e Linfonsina Augusta de Resende. Família adornada de vidas consagradas
para várias Comunidades de padres e freiras.
Verdadeiro filho de São Vicente de Paulo, ornado das cinco virtudes:
simplicidade, humildade, mansidão, mortificação e zelo. De boa convivência, parecia até simplório no trato, mas era virtude em tudo o que fazia.
Chegava sempre para somar e não dividir. Aceitava todos os encargos que
lhe dava a obediência pelo mando dos superiores. Fez seus primeiros estudos na roça, onde morava na fazenda, donde a mostra da sua simplicidade.
52
Foi para a Escola Apostólica do Caraça, onde já estudavam parentes e conterrâneos, em 26 de setembro de 1942. Sofreu um tanto com os árduos
métodos daquele célebre educandário de rígida tradição em estudos sérios.
Venceu. Formou-se em humanidades e, com seus quatro colegas, foi para
Petrópolis (RJ). Em 22 de janeiro de 1949, ingressou no Seminário Interno
da Congregação da Missão. Aí, cursou filosofia e teologia, sendo ordenado
sacerdote, no dia 14 de outubro de 1956, por D. Manoel Pedro da Cunha
Cintra, de quem recebeu todas as ordenações.
Após as primícias sacerdotais em sua terra natal, teve sua primeira colocação no Seminário de São Luís do Maranhão, em 1957, pelo vigor de sua saúde e capacidade de acomodar-se a qualquer trabalho. Já em 1960, é transferido para o seminário de Orleans, em Curitiba (PR) e, após o Congresso Eucarístico, foi mudado, em julho, para o Seminário Provincial de Diamantina
(MG). Em 1964, vemo-lo colocado na Escola Apostólica do Caraça. Homem
fácil de manejo, em 1965 é transferido para o Colégio de Campina Verde
(MG). Já em 1968, encontramo-lo na Paróquia de Santana em Bambuí (MG).
Feito missionário em Limeira do Oeste e Iturama, ambas no Triângulo Mineiro, em 1977. Volta como vigário a Bambuí, em 1981. Retorna ao Triângulo
53
Mineiro, paróquia de Carneirinhos, no ano de 1982. Passa para Iturama (MG),
em 1988, como pároco. Já em 1991, atua no Seminário São Justino de Jacobis, em Campina Verde (MG). Daí, passa para Santa Vitória (MG). Depois, torna-se pároco em Contagem (MG), de 1992 a 1994. Retorna a Bambuí (MG),
como pároco de 1995 a 2002. Encarregado do Santuário do Matoso (RJ), de
2002 a 2004. Retoma as atividades paroquiais em Contagem, de 2004 a 2006,
onde celebra, com grandes festejos, o jubileu de ouro sacerdotal, em 14 de
outubro de 2006. Meio combalido na saúde, em 2007, vai para a Casa Dom
Viçoso, onde a irmã morte veio buscá-lo na manhã de 14 de janeiro de 2011.
Seu corpo foi levado para sua terra natal, conforme desejo dos familiares e aí
vai descansar das muitas peregrinações. Como se vê, foi um ativo missionário
e não recusava labores. Enquanto professor lecionou diversas disciplinas: Português, Latim, Grego, História Geral e do Brasil, Geografia e Matemática. Pela
gama de matérias ensinadas, vê-se sua capacidade intelectual e o esforço para transmitir a seus reconhecidos discípulos o capricho no preparo das aulas e
a prontidão na clareza em ensiná-las. Agora, recebe do Senhor da Messe o
prêmio do servo bom e prudente. Descanse em PAZ.
Pe. Célio Maria Dell’Amore, C. M.
54
NOTÍCIAS
I – Notícias da Província
1) Dia 4/2/11 aconteceu a abertura oficial das atividades de nossas casas de
formação. Houve concelebração eucarística na capela do seminário São Justino de Jacobis, com a participação de vários padres, irmãos, seminaristas e
boa representação de alguns ramos da FV de Belo Horizonte. Após a missa,
estendemos o clima de alegria no ágape fraterno.
2) Ainda no dia 4/2 aconteceu a primeira reunião da Equipe Central do
SAVV sob a coordenação do Pe. Alexandre Nahass Franco. Ele nos apresentou um bom esquema de planejamento do trabalho vocacional. O clima é
bastante promissor. Nosso desejo é de, progressivamente, vocacionalizar
toda a Província. Brevemente você receberá comunicação do Pe. Alexandre
tratando deste assunto.
3) Dia 11/2/11, no Centro Social Pe. Raimundo Gonçalves (CSPRG), houve
uma reunião para tratar da inserção dos seminaristas no mundo do trabalho. Estavam presentes os formadores (Pe. Juarez, Pe. Luís Carlos, Pe. Wander e Pe. Vinícius), Pe. Geraldo Barbosa, Ir. Milton de Jesus e o Ir. Adriano
Ferreira, coordenador da reunião. De início ele nos colocou a pergunta: “De
que maneira podemos oferecer aos seminaristas uma experiência de trabalho formativo, sem atrapalhar os estudos acadêmicos e as atividades comunitárias?” Surgiram várias propostas de ação, todas relacionadas com as
possíveis atividades no CSPRG, tais como: organização da Biblioteca Provincial, monitoria nas aulas de informática, monitoria de estudos para jovens
carentes dos arredores (reforço escolar), aulas no futuro pré-vestibular comunitário.
Concluímos que, a título de experiência, nos dedicaremos primeiro à organização da Biblioteca Provincial. Conforme a proposta da equipe, cada estudante dedicará uma tarde de trabalho por semana, no aprendizado e exercício da função de ajudante de bibliotecário. Esperamos, com isso, ex55
pandir os horizontes da formação, oferecendo aos seminaristas uma nova
possibilidade de crescimento pessoal e comunitário. Ademais, a partir deste
trabalho iniciado de modo simples e bem organizado, será possível adiantar
o processo de implantação e implementação da Biblioteca Provincial.
Quanto às outras sugestões de trabalho (monitorias, aulas, etc) ficam para
depois. Aguardemos o desenrolar das atividades na biblioteca. No momento, o importante é começar e começar bem.
Dia 3 de março próximo, Ir. Adriano fará uma reunião com os seminaristas,
a fim de apresentar-lhes esta proposta de trabalho na biblioteca e ouvir os
pontos de vista e as sugestões deles.
4) A data do Retiro Provincial sofreu alteração: será de 6 a 9 de setembro e
não de 13 a 16 como fora anunciado anteriormente.
II – Abertura do Seminário Interno Interprovincial - 2011
Em Campina Verde (MG), às 11h do dia 20 de janeiro do corrente ano,
aconteceu a Missa de Abertura do Seminário Interno Interprovincial. Presidida pelo Pe. Fabiano Spisla, Visitador Provincial da CMPS, e concelebrada
pelos Padres Agnaldo Aparecido de Paula, Diretor do Seminário, e Pe. José
de Morais Gonzaga, C.M., a Missa contou com a presença de representan56
tes dos ramos da Família Vicentina que atuam na Paróquia. Depois da Oração Pós-Comunhão, o Padre Diretor apresentou à Comunidade os novos
Coirmãos admitidos, dando início, assim, oficialmente, ao Seminário Interno. Os admitidos são quatro, a saber: Élio da Silva e Éder Fabrício Lourenço
(CMPS), Antônio Deuzin Bibiano Leitão (PFCM) e Tiago de França da Silva
(PBCM). De acordo com as Constituições da Congregação, estes jovens, a
partir desta data, são membros admitidos da Congregação da Missão. Após
a Missa, todos foram convidados para um almoço. Na ocasião, os admitidos
foram presenteados com o livro Sob o signo da Fé, de autoria da Sra. Dalva
Vieira dos Santos, que conta a história da presença dos Lazaristas desde a
fundação da cidade de Campina Verde. Assim, humilde e simplesmente,
encerrou-se a solenidade de abertura do Seminário Interno Interprovincial.
Coirmãos de Campina Verde
III – Bom Propósito e Abertura do Semestre nas Casas de Formação
57
No dia 4 de fevereiro de 2011, os Coirmãos e estudantes das Casas de Belo Horizonte se reuniram no Seminário São Justino de Jacobis para a Celebração Eucarística de abertura do semestre. A Santa Missa foi presidida pelo Visitador Provincial, Padre Geraldo Ferreira Barbosa, que, com sincero contentamento, acolheu os novos formandos, iniciantes na PBCM; os estudantes de filosofia; os seminaristas admitidos, Hélio, João Paulino e Paulo Velozo, que, pela primeira vez, emitiram o Bom Propósito; e os seminaristas Erik e José Valdo,
que o renovaram. Na homilia, Pe. Geraldo refletiu sobre a Vocação Humana e
Cristã, chamando a atenção para a realização pessoal, o compromisso com a
promoção da dignidade do ser humano e a vivência do Batismo como resposta
ao chamado de Deus. No momento das Preces, alguns seminaristas e padres
ressaltaram a importância de desenvolver, à luz do Espírito Santo, um maduro
discernimento vocacional e externaram a alegria deste início de um novo semestre. Logo após a Missa, fomos convidados para uma confraternização.
58
Nossas Casas de Formação estão assim constituídas:
Seminário São Justino de Jacobis (Propedêutico e Filosofia)
• Formadores
Pe. Wander Ferreira
Pe. Vinícius Augusto R. Teixeira
• Propedêutico
Ezequiel Alves de Oliveira
Naison de Souza e Silva
Pôlier Sales de Oliveira
• Filosofia
1º ano
Allyson Giovanni Garcia
Hugo Silva Barcelos
Lucas de Souza Santos
Vinicius Alves de Oliveira
2 º ano
Adalberto Silva Costa
Divino Abel Mendes Pires
Maelson Santos Rocha
3º ano
Ailton Ferreira Batista
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Comunidade São João Gabriel Perboyre (Teologia)
• Formadores
Pe. Juarez Carlos Soares
Pe. Luís Carlos do Vale Fundão
1º ano
Ademar Santos Mendes
Gustavo Alivino Silva
2º ano
Hélio Correia Maia
João Paulino da Silva Neto
Paulo Cezar Velozo
3º ano
Erik de Carvalho Gonçalves
José Valdo dos Santos Filho
Lucas de Souza Santos (1º ano de Filosofia)
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Mensagem Final
“Não há fórmulas para sair da pobreza. Não há estratégias, só espírito
e coração. Para ganhar a confiança do povo, não há receitas, só olhares,
gestos, calor humano. Há que se chegar ao pobre sem atropelá-lo, sem pretender convertê-lo, dando tempo ao tempo. Então, o respeito vai se despertando, o amor cria raízes e, um dia, de repente, o povo começa a responder” (Pe. Pedro Opeka, C. M., indicado para o Nobel da Paz pela obra humanitária desenvolvida em Madagascar).
61

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