Folha de sala

Transcrição

Folha de sala
Alunos Atores
João Bailão
Rui Daysi
Francisco Lavídeo
CD-Atómico
Raphael Ken
Milu Rocha
Diego Duchese D’Hoffman
Luís Lula II
Ju Blood Shot
Catarina, a Grande (delegada de turma)
Irmã Lúcia
Simão d’Oliveira
Nuno Álvares Pereira
Miguel Metias
Isabel a Lêndea
Inês Maiscedo
Professor Responsável
Francisco Salgado
Professores de apoio
DRAMATURGIA Maria Sequeira Mendes
CORPO Luca Aprea
VOZ Sara Belo
Gabinete de Produção
Pedro Azevedo
Conceição Alves Costa
Rute Reis
Mestra do Guarda-Roupa
Olga Amorim
inocência, o modo como é sucessivamente enganado pelo Diabo e
pela certeza de que o seu eu presente merece ser valorizado relativamente ao que seria o seu eu futuro. Neste exercício privilegiase assim o momento da decisão de Fausto, aquele em que, instigado por Mefistófeles, se deixa persuadir da bondade do presente e
para sempre é condenado.
O exercício
Fausto, ou estes seus fragmentos que hoje aqui se apresentam, encena o tão contemporâneo problema da gratificação
imediata e das suas consequências. A possibilidade de obtenção
rápida de conhecimento e de prazeres leva Fausto a decidir vender a sua alma ao Diabo. Esta decisão baseia-se tanto na crença
de que o futuro é uma entidade distante, como na convicção de
que o Inferno pode não existir. Observe-se que a actividade inicialmente escolhida por Fausto, a de um estudioso, se caracteriza
pela lenta progressão no tempo, no sentido em que a aprendizagem exige um avolumar de conhecimentos que, para não ser
superficial, não pode ser apressado. O que nos surpreende relativamente a Fausto, tão jovem e supostamente tão sábio, é a sua
Dizem os nossos alunos:
Para interpretar Fausto procurou-se o despojamento desse
barroquismo da linguagem que parecia não caber em actores tão
jovens. Tal despojamento era todavia contraditório com o texto,
pelo que se tentou sem se conseguir. Não se conseguiu destruir
essa plasticidade, essa artificialidade que tanto mói e irrita. Experimentou-se amarrar Fausto, prender-lhe os movimentos, gritarlhe ao ouvido o mais alto possível. Demos-lhe melancias e a possibilidade de as esquartejar, cuspimos-lhe na cara, demos e pedimos estalos em plena Baixa-Chiado e restantes vizinhanças, travestimo-lo, vasculhámos-lhe o perfil no Facebook, demos-lhe
PAUS, Rolling Stones, Violent Femmes, entre muito blá blá blá.
Fechámo-lo no armário, inundámo-lo de referências e de parvoíces. Tentámos seduzi-lo com a mais bela mulher da Alemanha – a
Isabel aprontou-se a isso – e não resultou. A luta com o Diabo, viemos a descobrir, é infrutífera, e por isso acabamos todos no armário de onde quisemos sair.
Procrastinámos bastante. Trabalhámos bastante. Discutimos bastante. Construímos e destruímos bastante. Sujámos bastante. Houve vários feridos, mas ninguém morreu (a pena será só
daqui a 24 anos, e até lá não nos doa a cabeça). Por isso continuámos. No fundo, o nosso Fausto tem armários, melancias, gelo,
batom vermelho numa figura travestida, giz, uma piscina, desejos
concretizados, capas transparentes e uma guitarra. Não voltamos
atrás, porque depois de se fazer um pacto com o Diabo não há
retorno. Mergulhámos de vez, e (uma vez que a água é pouca)
ninguém se vai afundar. Até porque no Inferno costuma estar abafado.
“Pode ser que eles saiam do armário”, disse alguém ao
espreitar a sala. Esperemos que não. Não temos idade para sair do
armário. Não queremos sair do armário. Não vamos sair do armário, seja lá o que isso for. Queremos dizer e fazer coisas – queremos mesmo? Às vezes sabemos fazê-las e quase nunca as sabemos
dizer. Entretanto o Belard vai filmando.