O Toque de Recolher e sua Desconformidade com os Direitos

Transcrição

O Toque de Recolher e sua Desconformidade com os Direitos
O TOQUE DE R E COL HE R E SUA DESCONFOR M I D ADE CO M OS DI RE I TOS
FUNDA M ENTA IS DE C R I ANÇAS E ADOL ESCENTES.
“aquellos que no pueden recordar su pasado están condenados a repertirlo”
(Geor ge Sa nta y a na)
INTRODUÇÃO
E ssa f r ase ca i c o m o u m a l u v a p a ra t o d os aq ue l es q u e se a v e n t u ra m a est u da r e c o n h e cer os
d i re i t os d a i n f â n c i a e j u v e n t u d e. C r e i o q ue se t o r n a i m p o r ta n te c o n h e ce r a e v o l u çã o h ist ó r i ca
d os d i re i t os d a i n f â n c i a p a ra q u e p ossa m os c o m p r ee n d e r e até n os p os i c i o na r m os so b re al g u m as
q u est ões q u e n os sã o su b m e t i d as n a at ua l i d a de. É i m p o r ta n te ressal ta r q u e a l u ta p e l o
re c o n h e c i m e n t o e a e fet i v a çã o d os d i re i t os h u m a n os, c o m o é o cas o d os d i re i t o d a i n f â n c i a, n ã o
é al g o q u e se c o n q u i st o u n u m p asse d e m á g i ca, m a s q ue f o i f r u t o de m u i tas b ata l has p e r m e a das
d e so f r i m e n t o, san g u e e m u i t o sac r i f í c i o a o l o n g o d o te m p o.
N a v e r da de, q u a n d o o f e n ô m e n o d a c r i m i n a l i d a de j u v e n i l n o B r as i l au m e n ta c o m e ça a apare cer
c o m o se f o ra u m a d esc o be r ta d e u m tes o u r o p r o ce d i m e n t os c r i at i v os e v a r i á v e is, c o m o so l u çã o
e f i ca z e l e ga l p a ra os g ra v es p r o b l e m as d e v i o l ê n c i a q u e n os asso la. O “t o q u e de re c o l he r” o u
“ac o l h e r”, c o m o e u f e m i st i ca m e n te ta m b é m é d e n o m i n a d o é u m desses teso u r os desc o be r t os e
re m é d i o m i l a g r os o q u e c o m e ça a ser i m p l a n ta d o e m al g u m as c o m a r cas b r asi le i ras. E sse
p r o c e d i m e n t o ta m b é m está sen d o a p l i ca d o a al u n os – c r i a n ças e a d o l esce n tes – q u e estã o f o ra
d as salas d e a u l as, q u a n d o e ntã o são m o l esta d os e m sua l i b e r d a de e o b r i ga d os a f r e q ü e n tare m a
esc o l a. O c o r r e, t o da v i a, q u e esses p r o ce d i m e n t os d e v i és m a n i f esta m e n te a ut o r i tár i o e t í p i c o de
E sta d os aut o r i tá r i os está n a c o n t ra-m ã o d o E s ta d o D e m o c rát i c o d e D i r e i t o, p o is trata suas
c r i a n ças e a d o l esce n te c o m o m e r o o b j et os de i n te r v e n çã o de E s ta d o, d esc o ns i d e ra n d o a sua
c o n d i çã o es pec ia l d e su j e i t os d e D i r e i t os e p r o ta g o n ista d e sua p r ó p r i a h i st ó r i a. C o m e fe i t o,
v á r i os d i re i t os f u n d a m e n ta is al ber ga d os n a C o n st i t u i çã o F e de ra l, C o n v e n ç õ es i n te r na c i o na is d e
D i r e i t os d e C r i a n ças e A d o l es ce n te e n o p r ó p r i o E C A estã o sen d o f l a g ra n te m e n te v i o l a d os p o r
esse p r o ce d i m e n t o esp ú r i o.
E ste m o d est o t ra ba l h o b us cará m o s t ra r a v i o l a çã o d esses d i re i t os, a sua n o r m a t i v i d a de, a
d o u t r i n a d a p r o te çã o i n te g ra l, e t o da a re de p r o te çã o d os d i re i t os h u m a n os, i n c l us i v e n o p l a n o
i n ter na c i o n a l, p a ra d e m o n strar a i l e ga l i da de e i n c o nst i t u c i o n a l i d a de d o t o q u e d e re c o l h e r n o
B r as i l.
1 EVOLUÇÃO HISTÓRI CA
N o q u e t o ca es pec i f i ca m e n te a i m p u ta b i l i d a de p e na l d os “ m e n o res”, p o d e m o s i d e n t i f i ca r três
g r a n des c o r re n tes o u eta pas n a h i st ó r i a: d o u t r i na d o d i re i t o pe na l d o m e n or, d o u t r i n a da si t ua çã o
i r re g u l a r e d o u t r i na d a p r o te çã o i n te g ra l. C a d a eta pa c o m suas ca racte r íst i cas p r ó p r i as. O j u r ista
E m í l i o G a r c i a M é n d e z e m seu art i g o i n t i t u l a d o “ E v o l u çã o H i s t ó r i ca d o D i r e i t o da I n f â n c i a e da
Ju ve n t u de” d e n o m i n a a d o u t r i n a d o d i re i t o p e na l d o m e n o r, c o m o “la eta pa d e l t rata m i e n t o
p e na l i n d i f e re n c i a d o”. D i z o i l ust re j u r ista:
Una primera etapa que puede denominarse de carácter penal indiferenciado, que se
extiende desde el nacimento de los códigos penales de corte netamente retribucionista del
siglo X I X, hasta 1919 . La etapa del tratamento penal indiferenciado se caracteriza por
considerar a los menores de edad práticamente de la misma forma que a los adultos. Com
la única excepción de los menores de siete años, que se consideraban, tal como em la vieja
tradición del derecho romano, absolutamente incapaces e cuios actos eran equiparados a
los de los animales, lá única diferenciacion para los menores de 7 a 18 años consistia
generalmente em la disminnucion de la pena em um tercio em relacion com los adultos.
C o m o se i n f e re, essa c o r re nte c o ns i de ra v a o m e n o r e nt re 7 a 1 8 a n os so m e n te so b o as pect o
p e na l. O j u r ista e d ese m b a r ga d or, G u a ra c i V i a n n a , u m d os m a i o res es pec ia l ista d o assu n t o n o
B r as i l, p r e l ec i o n a:
A doutrina do Direito Penal do Menor: por esta corrente antiga e consagrada ainda em
alguns ordenamentos de países, a criança e o adolescente são vistos exclusivamente pela
ótica do Direito Penal.
N e sse d i a pasã o, c o m o ai n da nã o h a v i a n e n h u m est u d o c i e n t í f i c o à é p o ca so b re as
es pec i f i c i da des d a i n f â n c i a e j u v e n t u d e, m o r m e n te n o q u e t o ca á c o n d i çã o p e c u l i a r de p ess oa
e m d ese n v o l v i m e n t o, o E s ta d o só se p re o c u pa v a c o m o m e n o r a pa rt i r d os sete a n os de i d a de n o
m o m e n t o e m q u e este c o m e t i a al g u m d e l i t o, q u a n d o e ntã o d e v e r i a ser cast i ga d o, p u n i d o. A
p u n i ç ã o c o ns ist ia n a m e s m a pe na i m p osta a os i m p u tá v e is, só q u e re d u z i da de u m ter ç o,
e nt reta nt o, c u m p r i a a p e na n o m e s m o esta be l ec i m e n t o d est i na d o a o a d u l t o, c o m t o d a a
p r o m i s c u i d a de da í d e c o r re nte. O m e n o r a ba i x o d os sete a n os d e i da de era e q u i p a ra d o a u m
a n i m a l, se m v o n ta de p r ó p r i a, p o r ta nt o, era u m a p ess oa a bs o l u ta m e n te i n ca pa z n os m o l d es d o
d i re i t o c i v i l r o m a n o. N a v e r d a de, o m e n o r a p a r t i r d e sete a n os d e i d a de era u m a d u l t o e m
m i n i at u ra, p o is a o p r at i ca r u m f at o d e l i t u os o so f r i a as m es m as c o nse q üê n c i as d o a d u l t o, se m
q u e h o u v esse q u a l q ue r t u te la espe c i a l, e m f a ce d e sua c o n d i çã o d e pessoa e m d ese n v o l v i m e n t o.
N o B r as i l I m p e r i a l e so b a v i g ê n c i a d as o r de na ç ões f i l i p i n as, a p o l í t i ca re p ressi v a era f u n d a da
n o te m o r e c r u e l da de d as p e nas. A i m p u ta b i l i d a de p e na l era a p a rt i r d os sete a n os de i d a de,
q u a n d o o m e n o r c u m p r i a a m e s m a p e na d o i m p u tá v e l c o m re d u çã o d e u m ter ç o. V a l e ressal tar
q u e e nt re 1 7 a 2 1 a n os, o j o v e m p o d i a so f re r pe na d e m o r te. A e x ce çã o era a pe nas c o m re l a çã o
a o m e n o r a p a r t i r d e 1 4 a n os d e i d a de q u e v i esse a c o m e ter c r i m e d e f a ls i f i ca çã o d e m o e da,
q u a n d o e ntã o p o d e r i a ser c o n d e na d o a p e na de m o r te. O C ó d i g o Pe na l d o I m p é r i o B r as i l e i r o
m a n te v e a i m p u ta b i l i d a de p e na l a p a r t i r d os sete an os d e i d a de, e nt reta nt o, c o m b ase n o c r i té r i o
su b j et i v o d o d i scer n i m e n t o, o u seja, o m e n o r e nt re 7 a 1 4 a n os d e i da de q u e c o m e tesse u m
d e l i t os f i c a v a a m e r cê d o c r i tér i o su b j et i v o d o j u i z, o u seja, o j u l g a d o r é q u e d a r i a a ú l t i m a
p a l a v ra p a ra d e c i d i r se ele p oss u í a á é p o ca d is ce r n i m e n t o su f i c i e n te p a ra a p rát i ca d o f at o
d e l i t u os o. O p r i m e i r o C ó d i g o Pe na l d o B r as i l R e p ú b l i ca a u m e n t o u a i m p u ta b i l i da de p e na l p a ra
9 a n os d e i da de, c o m b ase n o c r i té r i o d o d i scer n i m e n t o, de sorte q u e en t re 9 an os d e i d a de até
1 4 a n os, a i m p u ta b i l i da de p e na l era a fer i da p e l o c r i té r i o su b j et i v o d o d i s cer n i m e n t o, e a p a rt i r
d os 1 4 an os, a i m p u ta b i l i d a de p e na l era o b j et i v a, o u seja, os m e n o res era m p u n i d os da m e s m a
f o r m a q ue o a d u l t o, i n c l us i v e c u m p r i a a p e na n o m es m o esta be l ec i m e n t o, só q u e c o m a p e na
re d u z i d a e m u m ter ç o.
A gê nese d a i m p os i çã o de cast i g os a os m e n o res v e m d es de te m p o s re m o t os. A p r ó p r i a B í b l i a e m
D e u te r ô n i m o – C a p. 2 1, v e rs í c u l os 1 8 a 2 1 - j á esta be le c i a q u e o f i l h o re be l de e i n c o r r i g í v e l,
q u e nã o o b e de c ia a os p a is p o d e r i a ser casti ga d o até a m o r te. N o D i r e i t o R o m a n o, o pa ter f a m i l i a
p oss u í a o d i re i t o d e v i d a e m o r te so b re seus d e pe n d e n tes, p r i n c i p a l m e n te so b re os m e n o res, q u e
era eq u i pa ra d o a res.
O i n í c i o d o séc u l o X X é ca ra cter i za d o p o r al g u m as m u d a n ças n o ce nár i o m u n d i a l. A c i ê n c i a e a
ra zã o a os p o u c os v ã o t o m a n d o o l u g a r d a f é . C o m e ç a ra m as c o n v e n ç õ es so c ia is e as p es q u isas
c i e n t í f i c as, n o se nt i d o d e c o m p r ee n de r o f e n ô m e n o d a d e l i q u ê n c i a j u v e n i l e a fastar o “ m e n o r”
d o siste m a p e na l. A s p es q u isas rea l i za das, p r i n c i p a l m e n te, n a área d a ps i c o l o g i a, a nt r o p o l o g i a e
soc i o l o g i a, c o m e ça v a m a d es ve n da r q u e o m e n o r nã o m a i s era u m a d u l t o e m m i n i at u ra, m a s
u m a p essoa c o m d ete r m i n a das es pec i f i c i da des e n a c o n d i çã o p e c u l i a r d e pessoa e m
d ese n v o l v i m e n t o. F o i rea l i za d o e m Pa r is, e m 1 9 1 1 o p r i m e i r o C o n g ress o I n te r na c i o n a l so b re os
d i re i t os d e m e n o res, t o da v i a, n o f i n a l d o séc u l o X I X sur ge n os E sta d os U n i d os u m m o v i m e n t o
v o l ta d o p a ra a a d m i n i st ra çã o e es pec ia l i za çã o d a Justi ça de M e n o r es , f u n d a da n a c r i a çã o de
g r a n des re f o r m a t ó r i os p a ra m e n o r es, c o m o f o r m a de aca bar c o m a m i st u ra d e ad u l t os e m e n o r es
n o m e s m o a m b i e n te ca r cerá r i o. E s ta va l a n ça da a se m e n te de u m a n o v a eta pa n a e v o l u ç ã o
h ist ó r i ca d os d i re i t os i n f a n t o-j u v e n i s, q u e E m í l i o G a r c i a M e n d e z c ha m a d e C a rá c ter t ute lar, e
q u e n ós d e n o m i n a m o s d e D O U T R I N A D A S I T U A Ç Ã O I R R E G U L A R . E ssa i n f l u ê n c i a d os
g r a n des re f o r m a t ó r i os n os E s ta d os U n i d os p a ra t ratar d os m e n o r es l o g o c h e g o u a E u r o p a. E m
Par is é rea l i za d o o p r i m e i r o C o n g ress o I n te r na c i o na l so b re M e n o r es, q u a n d o e ntã o f o i d is c u t i d a
a c r i a çã o d e j u í zes e T r i b u na is es pec ia l i za d os p a ra m e n o r es. N o B r as i l, e m 1 9 0 2 o Se na d o r
L o p es T r o v ã o a p rese n ta o p r i m e i r o p r o j et o d e f e n d e n d o i n teresses d e m e n o r es, se n d o seg u i d o
p o r A l c i n d o G u a na ba ra, q u e ap rese nt o u u m p r o j et o v o l ta d o p a ra os m e n o r es e m 1 9 0 6. O m e s m o
Se na d o r a p rese nt o u o u t r o p r o j et o e m 1 9 1 7 c o ns i de ra n d o i n i m p u tá v e is os m a i o res d e 1 2 e
m e n o res d e 1 7 a n os. C o m e ça v a a ga n ha r es paç o a i dé ia d e q u e os m e n o res d e v e r i a m rece be r
u m a p r o te çã o espe c i a l d o E s ta d o, a p r o x i m a n d o a Just i ça d a A s s istê n c i a S o c i a l .
A q u estã o d o m e n o r a ba n d o n a d o o u e n j e i ta d o n ã o p o d e d e i x a r de ser c o ns i de ra da. A i nst i t u i çã o
R o d a d os E x p ost os q u e n asce u n a E u r o p a m e d i e v a l, pe r d u r o u n o B r as i l p o r m a i s de três séc u l os,
p assa n d o pe l o B r as i l C o l ô n i a, I m p e r i a l e R e p ú b l i ca. A P r i m e i ra r o d a d e e x p ost os f o i aberta e m
Sa l v a d o r e m 1 7 2 6 , a se g u n d a n o R i o d e Jane i r o e m 1 7 3 8 e a ter ce i ra e ú l t i m a na Sa n ta C asa de
M i s e r i c ó r d i a d o R e c i f e, e m 1 1.5. 1 789. A ú l t i m a r o d a d e e x p osta a ser e x t i n ta f o i a d e Sa l v a d or,
q u e o c o r re u e m 1 9 5 9. O siste m a d e r o d a d e e x p ost o era u m a espé c i e d e r o da c i l í n d r i ca, d i v i d i d a
a o m e i o, q u e era f i x a d a n o m u r o o u j a ne la d a i nst i t u i çã o. A p ess oa q u e, p o r q u a l q u e r m o t i v o,
n ã o deseja va p e r m a ne cer c o m a c r i a n ça re cé m-n asc i da, a o i n v és d e a ba n d o n á-l a nas r uas o u
b os q ues, u t i l i za v a a r o d a d e e x p ost os p a ra n ã o se e x p o r e asseg u ra r o seu a n o n i m a t o. A s
i nst i t u i ç ões re l i g i osas n o r m a l m e n te e n ca m i n h a v a m as c r i a n ças p a ra as a m as-d e-l e i te, q u e
p e r m a n e c i a m c o m elas p o r al g u m te m p o, m e d i a n te o p a ga m e n t o d e u m esti pê n d i o. N e sse
p e r í o d o as c r i a n ças a ba n d o n a das q u a n d o n ã o era ab r i ga das p e l as r o d as d e e x p ost os o u pe l as
C â m a ras M u n i c i p a is, era m c r i a das p o r al g u m a f a m í l i a c o m o se f o sse f i l h o, n os m o l d es d a
a d o çã o à b ras i l e i ra, o u m es m o se m re g ist r o n e n h u m. É i m p o r ta nte sal i e ntar q u e ne n h u m a
o r de na çã o d o re i n o t rat o u da a d o çã o, o q u e só v e i o a o c o r rer c o m o a d v e n t o d o C ó d i g o C i v i l e m
1 9 1 6. A l g u m as c r i a n ças aca ba v a m se n d o c r i a das p o r f a m í l i as p o b res e al g u m as p a rt ia m p a ra a
r u a e p a ra a d e l i n q ü ê n c i a. E ssa sit ua çã o c h a m o u a ate n çã o d e A t a u l p h o d e Pa i v a , q u e assi m se
m a n i f est o u so b re o f e n ô m e n o:
A simples repressão, que constitui a idéia fundamental dos códigos, sempre confundiu a
causa do menor, deixando-o ao desamparo do Direito e da Justiça. A crise tremenda em
que se vê a delinqüência juvenil assumiu proporções assustadoras, máxime em sua
comparação com a criminalidade dos adultos. Aí está para atestar eloquentemente à
imprestabilidade dos velhos moldes e dos processos anacrônicos (PAIVA, ano, p.101).
N e sse c o n te x t o f e r m e n ta v a m as i dé ias p a ra a c r i a çã o d e Ju í z o e T r i b u n a is de M e n o r es c o m
i ns p i ra çã o n o m o d e l o d os E sta d os U n i d os. O p r i m e i r o T r i b u n a l d e M e n o r es f o i c r i a d o e m
I l i n o is, E sta d os U n i d os e m 1 8 9 9. A i n f l uê n c i a n o r te a m e r i ca na c he g o u a E u r o p a e d e p o i s a
A m é r i ca L a t i n a. N a I n g l ate r ra e m 1 9 0 5 f o i c r i a d o o se u T r i b u n a l o u Ju i za d o E s p e c ia l d e
M e n o r es n os m o l d es d o m o d e l o n o r te a m e r i ca n o. D e p o is f o i c r i a d o o T r i b u n a l d e M e n o r es d a
A l e m a n h a e m 1 9 0 8, P o r t u g a l e H u n g r i a e m 1 9 1 1, F ra n ça e m 1 9 1 2, A r g e n t i n a e m 1 9 2 1, Ja pã o
e m 1 9 2 2, e o B r as i l e m 1 9 23, alé m d a E s pa n h a e m 1 9 2 4, M é x i c o e m 1 9 2 7 e C h i l e e m 1 9 2 8.
E ssas i nstâ n c i as, e m b o ra de f o r te c u n h o re p ressi v o e se m as g a ra n t ias m í n i m as d o d i re i t o,
re p rese n ta v a m, se m d ú v i d a, u m g r a n de a va n ç o n a é p o ca. A P r o m o t o ra d e Just i ça e j u r ista,
M a r t h a T o l e d o , e m sua e x ce le n te o b ra “ A P r o te çã o C o n st i t u c i o n a l d e C r i a n ças e A d o l esce ntes e
os D i r e i t os H u m a n os” assi m p re le c i o n a:
Essas instâncias judiciais especiais, verdadeiras instâncias judiciais de exceção eis que
apartadas completamente das estruturas tradicionais de aplicação do Direito, é que
acabaram por propiciar a criação e aplicação do chamado direito do menor, que sempre se
caracterizou, no dizer de Mendez, por subordinar a tarefa de salvaguarda das crianças
(desassistidas socialmente) às exigências da defesa social.
I m p o r ta n te sal i e ntar q u e o p r i m e i r o Ju i za d o d e M e n o r es n o B r as i l f o i c r i a d o n o R i o d e Jane i r o,
e ntã o ca p i ta l d o B r as i l, p o r f o r ça d o D e c r et o F e d e ra l d e nº 1 6.273, d e 20. 1 2. 1 9 23. Sã o Pa u l o
c r i o u o seg u n d o e m d e ze m b r o d e 1 9 24, pe l a L e i E s ta d ua l d e nº 2.059.
O p r i m e i r o C o n g ress o I n te r na c i o na l d e M e n o r es, real i za d o e m Pa r is, n o pe r í o d o d e 29 d e j u n h o
a 0 1 de j u l h o de 1 9 1 1, f o i u m e ve n t o i n te r na c i o n a l d e g ra n d e i m p o r tâ n c i a n a área m e n o r i l, p o is
os j u r istas q ue d e l e pa rt i c i p a ra m c o n c l u í ra m q ue era n e cessár i o e x ist i r u m a j u r is d i çã o es pec ia l
p a ra o b ter u m m á x i m o d e e f i cá c i a n a l u ta c o n t ra a d e l i n q ü ê n c i a j u v e n i l. H a v i a, e m t o d o o
m u n d o, u m a p re o c u pa çã o e m ret i rar os m e n o r es d o cár ce res d est i na d os a ad u l t os, esti m u l a n d o
assi m, se m d ú v i d a, a c r i a çã o d os Ju í z os e T r i b u n a is de m e n o res e m t o d o o m u n d o. A l g u n s
C o n g r essos i n ter na c i o n a is c o m e ça v a m a d is c u t i r assu n t os re l ac i o n a d os à v i o l ê n c i a j u v e n i l,
c o m o o C o n g ress o d e A n t r o p o l o g i a c r i m i n a l, real i za d o e m T u r i n, real i za d o e m 1 9 0 6.
A si t ua çã o de a ba n d o n o d e al g u ns m e n o r es, o u a sua sit ua çã o d e d es v a l i d o, c o m e ça v a a se
re l a c i o na r c o m a q u estã o d a d e l i q u ê n c i a j u v e n i l n o B r as i l, f a ze n d o assi m n asce r u m a p o l í t i ca d e
i nst i t u c i o n a l i za çã o d esse seg m e n t o v u l n e rá v e l d a so c ie da de. N o B r as i l, e m 1 9 00 f o i i nstal a da n o
P o r t o d o B o n f i m e m Sa l v a d or, a p r i m e i ra E s c o l a C o r r e c i o n a l d a B a h i a, d est i na da
e x c l us i v a m e n te a o re c o l h i m e n t o d e m e n o r es. N o R i o d e Ja ne i r o sur g i u e m 1 9 0 3 à c o l ô n i a
c o r re c i o na l d e D o i s R i o s p a ra m e n o res i n f rat o res, e a E s c o l a Q u i n ze d e N o v e m b r o, p a ra a p a r te
p r e v e n t i v o-c o r re c i o na l d os j o v e ns e nt re 9 a 1 4 a n os. L o g o d e p o is, sur g i ra m o u t ras i nst i t u i ç ões
e m Sã o Pa u l o, B e l o H o r i z o n te e B e l é m d o Pa rá. E m Sã o Pa u l o, p o r o cas iã o d a c r i a çã o d o Ju í z o
d e M e n o r es, e m d e ze m b r o d e 1 9 24, j á ha v i a re f e rê n c i a da e x i stê n c i a d e u m i nst i t u t o c o r re c i o na l
d est i na d o a m e n o r es na ca p i ta l e u m a esc o l a re f o r m a t ó r i a e m M o g i-M i r i m. C o m b asta nte
p e rs p i cá c i a, a j u r ista M a r t h a T o l e d o e m sua o b ra j á c i ta da, p e r ce be n esse c o n te x t o da v i o l ê n c i a
j u v e n i l e c r i a çã o d os j u í z os d e T r i b u n a is d e M e n o r es, b e m c o m o d os re f o r m a t ó r i os o u casas d e
c ust ó d i a p a ra os m e n o r es, a ra i z o u a se m e n te d a d o u t r i n a d a si t ua çã o i r re g u l ar, m o s t ra n d o q u e a
h ist ó r i a d a assistê n c i a soc i a l d o B r as i l c o m e ç o u i n i c i a l m e n te m a r ca da p e l a ca r i d a de , de p o is
p asso u p e l a f i l a n t r o p i a, e a g o ra, c o m a c resce n te v i o l ê n c i a j u v e n i l, p assa v a ag o ra a ter a
i n ter v e n çã o d o P o d e r P ú b l i c o, atra v és d a p o l í t i ca d e i nst i t u c i o n a l i za çã o v o l ta da, p r i n c i pa l m e n te,
p a ra os m e n o res ca re n tes, des va l i d os e d e l i n q ü e n tes. V e j a m os a sua e x p os i çã o:
E m sí n tese, c o m a c o nst i t u i çã o d os Ju í z os d e m e n o r es e a c r ista l i za çã o d o d i re i t o d o m e n o r
c r i o u-se u m siste m a so c i o p e na l d e c o n t r o l e d e t o da a i n f â n c i a so c i a l m e n te d esassist i da, c o m o
m e i o d e de fesa so c i a l e m f a ce d a c r i m i n a l i d a de j u v e n i l, q u e so m e n te se re v e l o u p oss í v e l e m
ra zã o d a i de n t i f i ca çã o j u r í d i ca e i d e o l ó g i ca e nt re a i n f â n c i a ca re nte e i n f â n c i a d e l i n q ü e n te.
E ssa i d e n t i f i ca çã o j u r í d i ca se m p re f o i e x p ressa na l e g is l açã o b ras i l e i ra i ns p i ra da n essa d o u t r i n a,
q u e, p oste r i o r m e n te e e m ra zã o da ter m i n o l o g i a e m p r e ga n o C ó d i g o d e M e n o r es d e 1 9 7 9 (Lei
F e de ra l nº 6.697/79), f i c o u c o n h e c i d a c o m o d o u t r i na d a sit ua çã o i r re g u l ar. É o q u e se d e p ree n de
d o c o te j o en t re as d i s p os i ç ões d o re fe r i d o C ó d i g o, d o D e c ret o E s ta d ua l Pa u l ista nº 3.828/25 e d o
D e c r et o F e d e ra l d e nº 1 7.943-A/27.
D e s ta f o r m a, o D e c r et o E sta d ua l nº 3.828, de 25.03.25, d o E s ta d o d e Sã o Pa u l o, v o l ta d o p a ra
d is c i p l i n a r à c o n d u ta d os m e n o r es a ba n d o na d os, p e r v e r t i d os e de l i n q üe n tes, assi m d is p u n h a e m
se us art. 2º:
Art. 2º - Consideram-se em estado de abandono os da referida idade:
I – que não tenham habitação certa, nem meios de subsistência, por serem seus pais
falecidos, desaparecidos ou desconhecidos, ou por não terem tutor ou pessoa sob cuja
guarda vivam;
I I – que se encontrem eventualmente naquelas condições, devido a negligência,
enfermidade, ausência ou prisão dos pais, tutor ou pessoa que, por qualquer título, tenha a
vigilância, direção ou educação dos referidos menores;
I I I – que tenham pai, mãe, tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente
impossibilitado ou incapaz de cumprir os seus deveres relativamente a ditos menores;
IV – que vivam em companhia de pai, mãe, tutor ou pessoa que se entregue à prática de
atos contrários à moral e aos bons costumes;
V – que, devido à crueldade, exploração, perversidade dos pais, tutores ou pessoa sob cuja
guarda ou em cuja companhia vivam, sejam:
a) vítimas de maus-tratos físicos habituais ou castigos imoderados;
b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensáveis à saúde;
c) empregados em ocupações proibidas ou manifestamente contrárias à moral e aos bons
costumes, ou que lhes ponham em risco a vida ou a saúde;
d) induzidos à gatunice, mendicidade ou libertinagem.
VI – que tenham pai, mãe, tutor ou pessoa encarregada de sua guarda condenada por
sentença com trânsito em julgado:
h á m a i s d e d o is a n os d e p r i sã o p o r q u a l q ue r c r i m e;
a q ua l q ue r pe na c o m o c o-a ut o r o u c ú m p l i ce d e c r i m e c o m e t i d o p o r f i l h o, p u p i l o o u m e n o r so b
sua g u a r d a, o u p o r c r i m e c o n t ra estes.
A r t. 3º - C o ns i de ra m-se p e r v e r t i d os os m e n o r es v a d i os, m e n d i g os o u l i be r t i n os.
§ 1 º - Sã o v a d i os os q ue, te n d o d e i x a d o, se m ca usa l e g í t i m a, o d o m i c í l i o d o pa i, m ã e, t ut or,
g u a r d a, o u os l u g a res o n d e se ac ha v a m c o l o ca d os p o r a q ue le a c u j a a ut o r i da de esta v a m
su b m e t i d os o u c o n f i a d os, sã o e n c o n t ra d os h a b i t ua l m e n te a v a g a r p e l as r u as o u l o g ra d o u r os
p ú b l i c os, se m q u e te n ha m m e i o d e v i d a re g u l ar, o u t i ra n d o se us rec u rs o d e o c u pa çã o i m o r a l,
p r o i b i da o u p r o v a da m e n te i ns u f i c i e n te.
§ 2º - Sã o m e n d i g os os q u e h a b i t ua l m e n te p e de m es m o l a, p a ra si o u p a ra o u t re m, ai n da q u e este
seja se us p a i o u m ã e, o u pe de m d o n at i v os so b p rete x t o d e v e n d a o u o f e re c i m e n t o d e o b j et os;
§ 3º - Sã o l i b e rt i n os os q u e h a b i t ua l m e n te:
a) n a v i a p ú b l i ca p e rse g ue m o u c o n v i d a m c o m p a n he i r os o u t ra nse u n tes p a ra a p rát i ca d e at os
i m o ra is;
b) se e nt re ga m à p r ost i t u i çã o e m sua p r ó p r i o d o m i c í l i o, o u v i v e m e m casas d e p r ost i t u ta; o u
f r e q ü e n ta m casa d e t o l e râ n c i a , p a ra p r at i ca r at os i m o ra is;
c) sã o e n c o n t ra d os e m q u a l q ue r casa o u l u g ar, p rat i ca n d o at os i m o r a is c o m o u t re m;
d) v i v e m d a p r ost i t u i çã o d e o u t re m.
A r t. 6º C o ns i de ra m-se m e n o r es d e l i n q ü e n tes p a ra os e fe i t os d e l e i nº 2.059 e d este re g u l a m e n t o,
a q ue les q u e, te n d o m a i s d e 1 4 a n os e m e n os d e 1 8 a n os d e i da de, f o re m i n d i c i a d os a ut o res o u
c ú m p l i c es d e f a t o q u a l i f i ca d o p e l a l e i c o m o c r i m e o u c o n t ra v e n çã o. Sã o e x c l u í d os d essa
cate g o r i a os m e n o res d e 1 4 a n os, os q u a is nã o serã o su b m e t i d os a p r o c esso p e na l d e espé c i e
al g u m a. A res pe i t o d estes m e n o res p r o ce de rá a a ut o r i da de c o m o se ac ha d i s p ost o n o ca p í t u l o I I I.
Se g u i n d o essa l i n h a, o p r i m e i r o C ó d i g o d e M e n o r es d o B r as i l, ta m b é m c o n h e c i d o c o m o C ó d i g o
M e l o M a t os – D e c r et o F e d e ra l d e nº 1 7.943-A , a p ós esta be le cer q ue as n o r m as d esti na v a m a
d is c i p l i n a r as c o n d u tas d o m e n o r d e 1 8 a n os de i da de, a ba n d o n a d o o u d e l i n q ü e n te, d is c r i m i n a v a
o q u e se e nte n d i a p o r m e n o r es a ba n d o n a d os e m seu art. 26, se nã o v e j a m os:
Art. 26. Consideram-se abandonados os menores de 18 anos:
I – que não tenham habitação certa, nem meios de subsistência, por serem seus pais
falecidos, desaparecidos ou desconhecidos, ou por não terem tutor ou pessoas sob cuja
guarda vivam;
I I – que se encontrem habitualmente sem habitação certa, nem meios de , devido à
indigência , enfermidade, ausência ou prisão dos pais, tutor ou pessoa encarregada de sua
guarda;
I I I – que tenham pai, mãe, tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente
impossibilitado ou incapaz de cumprir os seus deveres para com o filho, ou pupilo ou
protegido;
IV – que vivam em companhia de pai, mãe, tutor ou pessoa que se entregue à prática de
atos contrários à moral e aos bons costumes;
V – que se encontrem em estado habitual de vadiagem, mendicidade ou libertinagem;
VI – que freqüentem lugares de jogo ou de moralidade duvidosa, ou andem em companhia
de gente viciosa ou de má vida;
VI I – que, devido à crueldade, abuso de autoridade, negligência ou exploração dos pais,
tutores ou encarregados de sua guarda, sejam:
a) vítimas de maus-tratos físicos habituais ou castigos imoderados;
b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensáveis à saúde;
c) empregados em ocupações proibidas ou manifestamente contrárias à moral e aos bons
costumes, ou que lhes ponha em risco a vida ou a saúde;
d) excitados habitualmente para a gatunice, mendicidade ou libertinagem.
VI I I – que tenham pai, mãe, tutor ou pessoa encarregada de sua guarda condenada por
sentença com trânsito em julgado:
a) a mais de dois anos de prisão por qualquer crime;
b) a qualquer pena como co-autor ou cúmplice, encobridor ou receptador de crime
cometido por filho, pupilo ou menor sob sua guarda, ou por crime contra estes.
N a v e r da de, o c ó d i g o M e l o M a t o c o n d e nsa v á r i as n o r m as espa rsas so b re m e n o r e x iste ntes e m
n oss o o r de na m e n t o j u r í d i c o, p r o c u ra n d o abar car a é p o ca a assistê n c i a a os m e n o res d es va l i d os,
a ba n d o n a d os e d e l i n q ü e n tes. C o m e fe i t o, j á se n o ta v a q u e a res p osta d o E s ta d o era a m e s m a
ta nt o p a ra os m e n o r es ca re ntes – a ba n d o n a d os, d es va l i d os e p e r v e r t i d os – c o m o p a ra os m e n o res
d e 1 8 an os d e l i n q ü e n tes. A res p osta era se m p r e o re c o l h i m e n t o d esses m e n o r es n os g ra n d es
re f o r m a t ó r i os e x iste n tes à é p o ca p o r d ete r m i n a çã o d o j u i z d e m e n o r es. O j u r ista e
d ese m b a r ga d o r G u a ra c y V i a n n a , c o m p e r c u c i ê n c i a, p r e l e c i o na:
É importante compreender o significado da aliança firmada entre Justiça e Assistência –
uma associação, cujos reflexos são claramente detectáveis no processo de desenvolvido nas
duas primeiras décadas do século X X e que deu origem à ação tutelar do Estado,
legitimada pela criação de uma instância regulatória da infância – o Juízo de
Menores( ambos na década de 1920). Veremos que Justiça e assitência buscam na aliança a
auto-sustentação pela complementação de suas ações. Ambas inserem-se na lógica do
modelo filantrópico, que visava o saneamento moral da sociedade a incidir sobre o pobre.
E ssa é a l i n h a d e i de n t i f i ca çã o d a d o u t r i na da sit ua çã o i r re g u l a r q u e c h e g o u a seu á p i ce n o B r as i l
e m 1 9 79, c o m a e d i çã o d o seg u n d o c ó d i g o d e m e n o r – L e i 6.697/79, p e r d u ra n d o p o r m a i s d e
u m a d é ca da.
2 JUIZ DE M E NORES
N e sse c o n te x t o, sur ge a f i g u ra d o j u i z d e m e n o res, c o m o u m su j e i t o, c u j os p o de res q u ase n ã o
tê m l i m i tes, p o is é d ete nt o r de u m a car ga d e su b j et i v i d a de e d i s c r i c i o n a r i e da de, q u e m u i tas
v e zes u l t ra passa p a ra a seara d o ar b í t r i o, p o i s se m o d e v i d o p r o cess o l e ga l e se m q u a l q u e r
d e c isã o f u n d a m e n ta da p o d e r i a p r i v a r u m m e n o r d e sua l i b e r d a de, d est i t u i r o u sus pe n d e r os pa is
d o p o d e r f a m i l i a r se m m a i o r es e x i g ê n c i as p r o b at ó r i as, p o d e n d o ai n da l e g is lar atra v és de
p o r ta r i as so b re t o da a m a t é r i a ati ne n te ao m e n o r, alé m d e esta be l ecer o r i t o p r o c essua l e m
al g u m as sit ua ç ões. N e sse se nt i d o, M a r t h a T o l e d o e x p l i c i ta:
E agindo com os poderes do bom pai de família, evidentemente o juiz de menores não está
sujeito ao princípio da inércia da jurisdição e muito menos ao da imparcialidade, nem se
deve submeter ao cumprimento do formalismo garantista das normas processuais.
O j u r ista S o u t o M a i o r, c i ta d o p o r M a r t h a T o l e d o , c o m e n ta n d o os p o d e res d o j u i z d e m e n o res n o
â m b i t o d e d o u t r i na d a sit uaçã o i r re g u l a r d esc r i ta n o C ó d i g o de M e n o r es d e 1 9 7 9, p r e l e c i o na:
(...) pelo texto da lei, o Juiz de Menores exsurge como um ser onipotente, já que se lhe
permite, entre outras coisas, decidir levando às últimas conseqüências o princípio da livre
convicção (art.5º), legislar sobre a matéria de menores mediante portarias e provimentos
(art.8º), decretar a perda ou a suspensão do pátrio poder e a destituição da tutela em
situações das mais variadas, inclusive de gravidade discutível (art.45), afastar dirigentes e
ordenar o fechamento provisório ou definitivo de estabelecimentos particulares ( art. 49),
atuar como censor dos espetáculos teatrais, cinematográficos, circenses e radiofônicos e de
televisão (art.52) e criar rito processual a revelia de qualquer texto legal (art.87).
O j u r ista e d ese m b ar ga d o r G u a ra c y V i a n n a , c o m m a estr i a, e x p l i c i ta o su per p o d e r q u e era
d e p os i ta d o n o Ju i z d e M e n o r es d a d o u t r i na da sit ua çã o i r re g u l a r:
Sob a ótica da legislação revogada (Lei 6.697/79), antigo código de menores, a função do
juiz de menores poderia ser tida tranquilamente como anômala, posto que não se
enquadrava nas atividades normais do Judiciário (funções jurisdicionais) e nem tampouco
nas funções não jurisdicionais da magistratura (atividades secundárias ou atos do governo
interno). Na verdade, por uma tradição histórico-social, talvez confiava-se ao juiz o papel
de pai-social ou investiam-lhe de um “pátria potestas” quase tão absoluto quanto o
exercido pelo pater famílias a que alude o Direito Romano.
D e s tarte, a m e d i d a m a i s e f i c i e n te pa ra a satis fa çã o d a so c i e da de era a p r isã o ca u te lar. T o d os os
p r o b l e m as( p o b r e za, i n f r a çã o p e na l, aba n d o n o, m a u s-trat os etc) era m “reso l v i d os” c o m a
“i n te r na çã o”, i n d ist i n ta m e n te. T o d os os cas os era m n i v e l a d os e a p r o p osta d e so l u çã o era ú n i ca,
até m e s m o p o r q ue o Ju d i c i á r i o n ã o t i n ha o u t ra al ter nat i v a.
O B r as i l res p i ra v a os p r i m e i r os a n os da re p ú b l i ca e h a v i a u m a g r a n de p r e o c u p a çã o e m e d u ca r o
p o v o b ras i l e i r o, p r i n c i p a l m e n te, e m b uscar as ca usas p a ra c o n te r o a u m e n t o d a de l i n q üê n c i a
j u v e n i l. E sse d is c u rs o, seg u n d o G u a ra c i V i a n n a, p a r t i a d os h i g i e n istas e m sa ú de p ú b l i ca, c o m o
O s w a l d o C r u z, M i g u e l C o u t o e B e l i zá r i o Pe na, p a ra q u e m a i n f â n c i a era v i sta c o m o a “se m e n te
d o f u t u r o ”. N a v e r d a de, p o d e m o s d estacar o u t r o e ve n t o i m p o r ta n te n esse i n í c i o d e séc u l o X X ,
q u e f o i a C o n v e n çã o de G e n e b ra d e 1 9 2 4, q u e a d es pe i t o de d e f i n i r c r i a n ça c o m o a pessoa c o m
até 1 8 a n os d e i da de e de re c o n h e cer al g u ns d i re i t os f u n d a m e n ta is, c o m o o d i re i t o à v i d a e a
l i b e r d a de, n ã o p asso u d e u m a ca rta d e b o as i n te n ç õ es, p o i s n ã o o b r i ga v a os E s ta d os si g natá r i os
a t o r na r o b r i g at ó r i o os seus p r e ce i t os, m a s ape nas d i r i g i a o b r i ga ç ões a os p a is de t o das as n a ç ões,
n ã o te n d o, p o r ta nt o, e fet i v i d a de os se us p ost u l a d os.
A d e m a r d e B a r r os e m 1 9 38 – D e c r et o nº 9.744/38 – c r i o u o Se r v i ç o S o c i a l d e M e n o r es
A b a n d o n a d os e D e l i n q ü e n tes, q u e t i n h a, d e n t re o u t ras f u n ç õ es, re c o l he r te m p o r a r i a m e n te os
m e n o res su j e i t os a i n v est i ga çã o e o p r o cess o, b e m c o m o re ce ber e d i st r i b u i r p e l os
esta be l ec i m e n t os d o ser v i ç o os m e n o res j u l g a d os e e x e r cer v i g i l â n c i a so b re eles. N o R i o d e
Ja ne i r o e m 1 9 4 1, atra vés d o d e c ret o 3.799/4 1, f o i c r i a d o o S A M – Se r v i ç o d e A s s istê n c i a a o
M e n o r, c u j a p r o p osta era i n o v a d o ra à é p o ca, p o i s o b j et i v a v a siste m at i zar e o r i e n ta r os ser v i ç os
d e assistê n c i a a m e n o res d es va l i d os e d e l i n q ü e n tes, i n ter na d os e m esta be le c i m e n t os o f i c i a is e
p a rt i c u l a res.
P o d e m o s c o ns i de rar q u e a D e c l a ra çã o U n i v e rsal d os D i r e i t os H u m a n os d e 1 9 4 8, l o g o a p ós o
f l a ge l o d e m u i tas f a m í l i as ó r f ãs d u ra n te a se g u n d a g u e r ra m u n d i a l, c o nst i t u i u m d os p r i n c i pa is
d o c u m e n t os i n te r na c i o n a is na d e fesa d os d i re i t os h u m a n os, p r i n c i pa l m e n te, c o m re l açã o à
c r i a n ça, q u e p asso u a ser re c o n h e c i da e m v á r i as n a ç ões, c o n t r i b u i n d o p a ra o a v a n ç o n essa área.
A re fe r i da d e c l a ra çã o, d e p o is d e a f i r m a r n os seus p r i m e i r os art i g os q u e “t o d a a p ess oa te m
d i re i t o à v i d a, à l i b e r d a de e a se g u ra n ça p essoa l, e q u e n i n g u é m será su b m e t i d o a t o r t u ra, o u a
trata m e n t o c r ue l o u d e g ra da n te”, e n f at i za, d e d i ca u m art i g o espe c i f i ca m e n te à i n f â n c i a.
E sta be l ece o art. X X V , o se g u i n te, i n v e r b is:
A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças
nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.
A de c l araçã o u n i v e rsal d os d i re i t os h u m a n os, p o r f o r ça d o res pe ct i v o m o m e n t o h i st ó r i c o, q u e
p r e ga v a a c o o pe ra çã o i n ter na c i o n a l d e t o d as as n a ç õ es u n i das c o m v i sta ao re c o n h e c i m e n t o d os
d i re i t os h u m a n os, c o nst i t u i u, se m d ú v i d a, u m m a r c o i m p o r ta n te p a ra q u e a c r i a n ça j á p u d esse
ser v i sta c o m o u m seg m e n t o q ue m e re c i a u m a p r o te çã o es pec i a l d o E s ta d o. T o d a v i a, p o d e-se
i n f o r m a r q u e f o i a D e c l a ra çã o I n te r na c i o na l d os D i r e i t os d a C r i a n ça d e 1 9 5 9, q u e, d e f o r m a
es pec í f i ca t rat o u d os d i re i t os d as c r i a n ças e q ue c o nst i t u i a p r i m e i ra g ra n d e re fe rê n c i a n a
p r o te çã o d os d i re i t os i n f a n t o-j u v e n i l, p o is, re c o n he ce n d o e x p ressa m e n te a v u l n e ra b i l i d a de d a
c r i a n ça esta be le ce u e x p ressa m e n te o p r i n c í p i o d o m e l h o r i n te resse d a c r i a n ça e ta m b é m da
p r o te çã o c o n t ra q u a l q u e r f o r m a d e e x p l o ra çã o, c r ue l da de e d is c r i m i n a çã o, seja d e q u e n at u re za
f o r. O P r i n c í p i o 2º d a D e c l a ra çã o d e 1 9 5 9, esta be le c i a o seg u i n te:
PRINCÍPIO 2º - A criança gozará proteção especial e ser-lhe-ão proporcionadas
oportunidades e facilidades, por lei e por outros meios, a fim de lhe facultar o
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, de forma sadia e normal e em
condições de liberdade e dignidade. Na instituição de leis visando este objetivo levar-se-ão
em conta, sobretudo, os melhores interesses da criança.
N a d é ca da d e sesse nta p assa m os a e x pe r i m e n ta r n o B r as i l a u m l o n g o pe r í o d o d e d i ta d u ra e a
v i o l a çã o siste m á t i ca d os d i re i t os h u m a n os, p r i n c i pa l m e n te, c o m re la çã o a os d i re i t os d e c r i a n ças
p o b r es, d es v a l i d as e d e l i n q u e n tes, q u e p asso u a ser c o ns i de ra da c o m o p r o b l e m a d e seg u ra n ça
n a c i o n a l. O j u r i sta G u a ra c i V i a n n a e x p l i c i ta:
Iniciado o período militar , em 1964, o Estado passou a entender que o menor de rua, o
menor em conflito com a lei e o menor abandonado colocavam em jogo a ordem social e a
Doutrina da Segurança Nacional.
I n f l u e n c i a d o p e l a f i l os o f i a d o E sta d o d o B e m-E star-S o c i a l c o m re l at i v o su cess o n a E u r o p a e
E sta d os U n i d os, e so b a i ns p i ra çã o d e M á r i o A l t e n f e n d er, f o i c r i a da a F U N A B E M , n o d i a
0 1/ 12/1964, c o m i dé i as i n o v a d o ras, v o l ta das p a ra o b e m-estar d o m e n o r, q u e d e v e r i a ser v i st o ,
se g u n d o G u a ra c i V i a n n a, n a o b ra j á c i ta da “ n ã o c o m o d es pesa, m a s c o m o i n v est i m e n t o m a i s
sal u tar q u e q u a l q ue r n a çã o p o d e r i a f a ze r p a ra se u f u t u r o”. A F U N A B E M – F u n d a çã o N a c i o n a l
d o B e m E sta r d o M e n o r, c o m o ó r gã o ce nt ra l i za d o r d a p o l í t i ca d o b e m estar d o m e n o r t i n ha a
f u n çã o p re c í p ua d e c o o r de na r e f i s ca l i za r as e nt i d a des q u e ab r i ga v a m m e n o res, alé m, de n t re
o u t ras, d e c u m p r i r os c o m p r o m i ss os c o nsta n te d os d o c u m e n t os i n te r na c i o n a is a q u e o B r as i l
t i n h a a der i d o, alé m d e p r i o r i za r os p r o g ra m as v o l ta d os p a ra a i n te g ra çã o q u e v i sasse m à
i n te g ra çã o f a m i l i a r e c o m u n i tár i a d o m e n or, atra v és d e i n ce n t i v o à a d o çã o e assistê n c i a à
f a m í l i a. N o s E s ta d os f e de ra d os f o ra m c r i a das as F E B E N S, q u e a p r o v e i tara m d a m es m a
estr ut u ra d as casas d e c o r re ç ões d e m e n o res. N e sse c o n te x t o d e E s ta d o a ut o r i tár i o, as
i nst i t u i ç ões c r i a das pe l a F U N A B E M e F E B E N S ac o l h i a m os m e n o res a ba n d o n a d os, ó r f ã os,
d es va l i d os e a ut o res d e at os i n f r a c i o n a is, c o m até 1 8 a n os d e i da de, re p r o d u z i n d o m u t at is
m u t a n d o m e s m o p r o ce d i m e n t o d is pe nsa d os a os i m p u tá v e is n os cá r ceres b rasi le i r os, o u seja,
trata va-os c o m o a n i m a l, t o rt u ra n d o-os e t rata n d o-os c r ue l m e n te. A i n te r na çã o p oss u í a c o n te ú d o
a pe nas p u n i t i v o. O siste m a era ce n t ra l i za d o r e f u n d a d o p r e c i p u a m e n te n o ter r o r d o
i n ter na m e n t o, q u e era a t ô n i ca d a f i l os o f i a d o b e m-estar d o m e n o r, q u a n d o se t rata v a d e m e n o r
e m sit uaçã o i r re g u l ar. N e sse se nt i d o, m e re ce tra nsc r i çã o o te x t o e x t ra í d o d a o b ra d e R o b e r t o
D i n i z S A U T , q u a n d o e x p l i c i ta:
Na perspectiva da situação irregular, o juiz centralizava sua decisão com fundamento no
direito do menor, em medidas terapêuticas de sua vontade, determinando qual o
tratamento, com base em diagnósticos, e, tendo o menor como objeto de intervenção do
Estado, em desrespeito à condição do adolescente e da criança como sujeito ativo de
Direitos. Em tese, o juiz, faça-se a justiça do razoável, transformava-se na verticalidade e
na centralidade, até porque não obtinha do Estado, da sociedade, da família e da
comunidade outra alternativa, senão , a de determinar a internação à revelia da relação
pedagógica, mas pela via da relação verticalizada e punitiva.
O s m e n o res d esassist i d os, d es v a l i d os e d e l i n q ü e n tes p assara m a ser i de n t i f i ca d os c o m o
“ p i v etes”, “tr o m b a d i n h as”, se n d o al v o d e p r e o c u p a çã o d o E s ta d o. H a v i a u m a p ressão m u i t o
g r a n de d a so c i e da de p a ra q u e o E sta d o a d o tasse m e d i d as q u e p r o te gesse as pessoas “ de b e m ” -,
os re g u l a res - desses m e n o res e m sit ua çã o i r re g u l ar, q u e a m ea ça v a m a t ra n q ü i l i d a de d o m e i o
soc i a l. E l es – os m e n o r es e m si t ua çã o i r re g u l a r – c o nst i t u í a m u m a pat o l o g i a so c i a l e d e v e r i a ser
e x c l u í d a d a so c ie da de. C o m e fe i t o, a m e d i d a m a i s p e rt i ne n te e e m c o ns o n â n c i a c o m os p a d r õ es
e a i de o l o g i a d o re fe r i d o m o m e n t o h ist ó r i c o q u e v i v í a m o s, era p r i v á-l os d e sua l i b e r d a de e
l a n çá-l os n os cá r ceres f ét i d os e d es u m a n os d o B r as i l o m a i s ce d o p ossí v e l, p a ra q u e se p u d esse
se l i v r a r d a sua n e f asta p rese n ça, e assi m q u e eles pe r m a n e cesse m l á o m a i o r te m p o p ossí v e l,
atrás das g ra des e esq ue c i d os. N e sse sent i d o, e m p l e na d i ta d u ra m i l i ta r n o B r as i l, f o i a p r o v a da
p e l o C o n g r esso N a c i o n a l a l e i q u e esta be le c i a a re d u çã o da m a i o r i da de p e na l d e 1 8 p a ra 1 6
a n os, t o da v i a, ai n d a d u r a n te a “ va cat i o l e g is” a re f e r i da l e i f o i re v o g a da, n ã o c he ga n d o ne m
m e s m o a e nt rar e m v i g or, o q u e d e n o ta q u e à ép o ca j á h a v i a m e n tes l u m i n a res q u e e nte n d i a m
q u e a p u n i çã o p e la p u n i çã o n ã o ser ia ca pa z d e res o l v e r o p r o b l e m a d o m e n or.
C h e g a m o s a o f i n a l d a dé ca da d e 70, ai n d a so b os a us p í c i os da d i ta d u ra d o g o v e r n o m i l i ta r
b r asi le i r o, q u a n d o al ca n ça m os o a p o g e u, o á p i ce d a d o u t r i n a da si t ua çã o i r re g u l a r n o B r as i l c o m
a en t ra da e m v i g o r d o n oss o se g u n d o C ó d i g o d e M e n o r es – L e i nº 6.697/79, t raze n d o e m suas
l i n h as ge ra is o ca ráter t u te l ar, p u n i t i v o, ce nt ra l i za d o r d o t o d o p o d e r os o “j u i z d e m e n o res”, b e m
c o m o a i nst i t u c i o na l i za çã o c o m o res p osta p o r e x ce l ê n c i a p a ra os m e n o r es c o ns i de ra d os e m
sit uaçã o i r re g u l ar.
O art. 2º d a L e i nº 6.697/79 esta be l ec i a o q ue era c o ns i de ra d o sit uaçã o i r re g u l a r:
Art. 2º - Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor:
I - privado de condições essenciais à sua subsistência , saúde e instrução obrigatória, ainda
que eventualmente , em razão de:
a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;
b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;
I I - vítima de maus-tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável;
I I I – em perigo moral, devido a:
encontrar-se , de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes;
IV – privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou
responsável;
V - com desvio de conduta , em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;
VI – autor de infração penal
A d e n o m i n a da sit uaçã o i r re g u l a r c o n te m p l a v a os m e n o res ca re n tes e d e l i n q ü e n tes, de so rte q u e
t o d os os m e n o res q u e est i v esse m n essa sit uaçã o era m p r i v a d os d e sua l i b e r d a de, se m q ua l q ue r
g a ra n t i a c o nst i t u c i o n a l, p o r d eter m i n a çã o d o j u i z d e m e n o r es e e n ca m i n h a d os p a ra as F E B E N S,
o n d e pe r m a n e c i a m i nst i t u c i o n a l i za d os i n d e f i n i da m e n te. O si m p l es f i l h o re be l de, até m e s m o o
f i l h o p o b re o u des va l i d o, e aq ue l e q u e c o m e t i a at o i n f ra c i o na l era m c o l o ca d os n a m e s m a v a l a e
trata d os c o m o m e r os o b j et os d e i n te r v e n çã o d o p o d e r estatal. N e sse sent i d o, c o m i ne gá v e l
p e r c u c i ê n c i a, a P r o m o t o ra d e Justi ça e j u r ista M a r t ha T o l e d o assi m se p os i c i o na so b re a l i n h a
i de o l ó g i c a dessa d o u t r i na:
Em síntese, com a constituição dos juízos de menores e a cristalização do direito do menor
criou-se um sistema sociopenal de controle de toda a infância socialmente desassistida,
como meio de defesa social em face da criminalidade juvenil, que somente se revelou
possível em razão da identificação jurídica e ideológica entre infância carente e infância
delinqüente
(....)
Permissa vênia da insistência e da certa crueza de minhas palavras, note-se a perversidade
da ardilosa construção intelectual: o carente pode ser privado de liberdade, sob a
presunção de que ele é o futuro delinqüente; aquele que delinqüiu efetivamente pode ser
encarcerado sem observância das garantias individuais que continuaram a ser conferidas
aos adultos, sob a falaciosa premissa de que ele está sendo protegido pelo Estado, um vez
que a medida jurídica imposta pela prática do crime( internação em reformatório) é
essencialmente a mesma aplicada ao carente e ao abandonado.
D e s ta f o r m a, n o â m b i t o d e u m E sta d o t ota l i tá r i o h a v i a u m a l e g is la çã o es pec í f i ca p a ra os
m e n o res c o ns i de ra d os e m si t ua çã o i r re g u l a r e o u t ra desti na da às c r i a n ças e j o v e ns e m sit uaçã o
re g u l ar, o u seja, f i l h os d e p ess oas d e “ be m ” o u d a c l asse soc i a l m a i s f a v o r e c i da d a so c ie da de. A
e x p ressã o “sit ua çã o i r re g u l a r”, seg u n d o A l y r i o C a v a l i e r i f o i p r o f e r i da p e l a p r i m e i ra v e z n u m
C o n g r esso I n te r na c i o n a l n a V e ne z ue la.
O j u i z d e m e n o res c o n t i n u a v a a u t i l i za r d os su pe r p o d e res, d e f o r m a q u e p o d i a l e g is la r
p r at i ca m e n te so b re q u a l q u e r assu n t o q u e se re fe r isse ao m e n o r, atra vés d e p o r ta r i as. O
i n ter na m e n t o era, d e f a t o, a ú n i ca m e d i da u t i l i za da p e l o j u i z d e m e n o r es t o da v e z q u e u m m e n o r
esti v esse e n q u a d ra d o n u m a sit ua çã o c o ns i d e ra da i r re g u l ar. A s f e b e ns p assara m a f i c a r
su pe r l o ta das re p r o d u z i n d o m u t at is m u t a n d i o q u e o c o r r i a n os cá r ce res b r asi l e i r os d est i na d os a os
i m p u tá v e is. O s m e n o r es era m su b m e t i d os a t rata m e n t o des u m a n o e c r ue l, m u i t os de l es era
t o r t u ra d os p e l os m o n i t o res. N ã o h a v i a a i m p l e m e n taçã o n a p rát i ca d e q u a l q u e r p r o j et o
p e da g ó g i c o d e resso c i a l i za çã o. O m e n o r f i ca v a t ra n ca f i a d o a n os a f i o n os re f o r m a t ó r i os d as
f e b e ns, q u e b ra n d o-se, c o nse q ue n te m e n te, os se us v í n c u l os f a m i l i a res e c o m u n i tá r i os.
E ssa sit ua çã o p ass o u a c ha m a r a ate n çã o d e v á r i os seg m e n t os d a so c ie da de, c o m o o m o v i m e n t o
m e n i n os e m e n i n as d e r ua, b e m c o m o d e p r o f issi o n a is d e d i v e rsas áreas, c o m o j u í zes,
p r o m o t o res, assiste ntes so c i a is, pe da g o g os, ps i c ó l o g os, q u e c o m e ça ra m a se m o b i l i za r c r i a n d o
u m a f re n te p a r l a m e n tar su p ra pa rt i d á r i a e sens i b i l i za n d o a p o p u l a çã o b ras i l e i ra p a ra a
n e cessi da de d a m u d a n ça na p o l í t i ca i n f a n t o-j u v e n i l.
C o m e ç a v a a so p ra r n o B r as i l os p r i m e i r os v e n t os da d e m o c r a c ia. N o B r as i l e m 1 9 8 5, o g o v e r n o
d i tat o r i a l de i x a o p o d er. T a n c re d o N e v es é ele i t o p e l o C o l é g i o E l e i t o ra l P resi de n te d o B r as i l,
t o d a v i a, m o r re u a ntes d e t o m a r p osse. E m se u l u g a r e c o m a l i de ra n ça d e U l i sses G u i m a rães,
José Sar ne y assu m e a P resi dê n c i a d a R e p ú b l i ca e d á i n í c i o a o p r o cesso de re de m o c r at i za çã o d o
p a ís.
A c o m u n i da de i n ter na c i o n a l c o n t i n ua a se m o v i m e n ta r pa ra te n tar i m p l e m e n ta r os d i re i t os
h u m a n os v o l ta d os p a ra as c r i a n ças, assi m c o ns i de ra das as p essoas c o m até 1 8 a n os d e i da de.
C o m e fe i t o, é real i za da e m B e i j i n g e m 1 9 8 5 a C o n v e n çã o i n te r na c i o n a l p r o m o v i d a p e l a O N U
v o l ta da p a ra os d i re i t os d as c r i a n ças, ta m b é m c o n h e c i d a c o m o “as re g ras m í n i m as de B e i j i n g ”,
c u j o c o n te ú d o p r o c l a m a v as u m a sér ie d e g a ra nt i as às c r i a n ças ac usa das d a p rát i ca d e al g u m at o
i n f r a c i o n a l, c o m o d i re i t o de c o m u n i c a r i m e d i ata m e n te a os seus pa is o u se us p a is so b re á sua
p r isã o; j á p r e v i a o de v i d o p r o cess o l e ga l e j á p r e v i a u m a sér ie d e m e d i das soc i oe d u cat i v as p a ra
o j u i z a p l i car, c o m o p r estaçã o d e ser v i ç os à c o m u n i d a de, l i b e r da de assist i da, i n d e n i za ç ões,
m u l tas, a d v e rtê n c i a, re m i ssã o, se m i l i b e r d a de e i n te r na m e n t o, está ú l t i m a j á pe r m ea da p e l os
p r i n c í p i os d a b r e v i d a de e e x ce p c i o n a l i da de. A c o n v e n çã o d e n o m i n a d a “re g ras m í n i m as d e
B e i j n g’ j á p re v i a a i n c i d ê n c i a d o p r i n c í p i o d a p res u n çã o d a i n o c ê n c i a c o m re l açã o a m e n o r es
ac usa d os d a p r át i ca de al g u m at o i n f ra c i o na l, t o da v i a, j á a d m i t i a a p r isã o p re v e n t i v a, q u e e m
n oss o cas o c o r res p o n d e a o i n ter na m e n t o p r o v i s ó r i o. C a m i n h a v a-se assi m, p a ra t ra ns f o r m a r o
m e n o r – m e r o o b j et o d e d i re i t o – e m v e r d a de i r o su je i t os d e d i re i t o c o m os m e s m o s d i re i t os e
g a ra n t i as p r o cessua is d os a d u l t os, d ete r m i n a n d o ai n d a q ue v i esse m a c u m p r i r a p e na – m e d i da
soc i oe d u cat i v a – e m l u ga r d i v e rs o d o a d u l t o, e q u e res pe i tasse a c o n d i çã o d e pessoa e m
d ese n v o l v i m e n t o e o p r i n c í p i o da p r o p o r c i o na l i d a de n a a p l i ca çã o d a m e d i d a. V e j a m os al g u ns
p r i n c í p i os n o r tea d o res d as “re g ras m í n i m as d e B e i j i n g ”:
(....) 17. Princípios norteadores da decisão judicial o das medidas
17.1 A decisão da autoridade competente pautar-se-á pelos seguintes princípios:
a) a resposta à infração será sempre proporcional não só às circunstâncias e à gravidade
da infração, mas também às circunstâncias e às necessidades do jovem, assim como às
necessidades da sociedade;
b) as restrições à liberdade pessoal do jovem serão impostas somente após estudo
cuidadoso e se reduzirão ao mínimo possível;
c) não será imposta a privação de liberdade pessoal a não ser que o jovem tenha praticado
ato grave, envolvendo violência contra outra pessoa ou por reincidência no cometimento
de outras infrações sérias, e a menos que não haja outra medida apropriada;
d) o bem-estar do jovem será o fator preponderante no exame dos casos.
17.2 A pena capital não será imposta por qualquer crime cometido por jovens.
17.3 Os jovens não serão submetidos a penas corporais.
17.4 A autoridade competente poderá suspender o processo em qualquer tempo.
18. Pluralidade das medidas aplicáveis
18.1 Uma ampla variedade de medidas deve estar à disposição da autoridade competente,
permitindo a flexibilidade e evitando ao máximo a institucionalização.
T a is m e d i d as, q u e p o d e m al g u m as v e zes ser a p l i ca das si m u l ta nea m e n te, i n c l ue m :
a) determinações de assistência, orientação e supervisão;
b) liberdade assistida;
c) prestação de serviços à comunidade;
d) multas, indenizações e restituições;
e) determinação de tratamento institucional ou outras formas de tratamento;
f)determinação de participar em sessões de grupo e atividades similares;
g) determinação de colocação em lar substituto, centro de convivência ou outros
estabelecimentos educativos;
h) outras determinações pertinentes.
1 8.2 N e n h u m j o v e m será e x c l u í d o, t ota l o u p a r c i a l m e n te, d a su pe r v isã o p ate r na, a n ã o ser q ue
as c i r c u nstâ n c i as d o cas o o t o r ne m n e cessár i o.
1 9. C a ráter e x ce p c i o n a l d a i nst i t u c i o n a l i za çã o
1 9. 1 A i n ter na çã o d e u m j o v e m e m u m a i nst i t u i çã o será se m p re u m a m e d i d a d e ú l t i m o re c u rs o e
p e l o m a i s b re v e p e r í o d o p ossí v e l.
20. P re v e n çã o d e d e m o r as d es necessár ias
N e sse c o n te x t o d e u n i v e rsal i za çã o d e n o r m as d e d i re i t os h u m a n os v o l ta d os p a ra c r i a n ças,
p essoas c o ns i de ra das até 1 8 a n os i n c o m p l et os, é rea l i za da p e l a O N U a C o n v e n çã o i n ter na c i o na l
p a ra a p re v e n çã o d a d e l i n q ü ê n c i a j u v e n i l, n o p e r í o d o d e 28 d e f e v e re i r o a 1 º d e m a r ç o d e 1 9 8 8,
ta m b é m c o n h e c i d a c o m o “as d i retr i zes d e R i a d”, q u a n d o f o i e n f at i za da a c o n d i çã o d e su j e i t os
d e d i re i t os d as c r i a n ças e d e t i t u l a res d e d i re i t os f u n d a m e n ta is, c o m o o d i re i t o à ed u ca çã o, á
sa ú de, à l i b e r d a de, à d i g n i d a de, d i re i t o à c o n v i v ê n c i a f a m i l i a r e c o m u n i tár i a, b e m c o m o o
d i re i t o de n ã o re ce be r t rata m e n t o m a i s r i g o r os o d o q u e a q ue le d i s pe nsa d o a os i m p u tá v e is,
q u a n d o se t ratar d e ac usaçã o d a p rát i ca d e al g u m at o i n f r a c i o n a l.
L o g o d e p o is, N o d i a 20 d e n o v e m b r o d e 1 9 8 9 a A s se m b l é ia G e r a l d a O r g a n i za çã o d as N a ç õ es
U n i d as a p r o v o u a c o n v e n çã o i n te r na c i o na l so b re os d i re i t os d a c r i a n ça, f a ze n d o c o m q u e t i v esse
f o r ça c oe r c i t i v a pa ra t o d os os p a íses si g n atár i os. O C o n g r esso N a c i o n a l a p r o v o u a c o n v e n çã o
i n ter na c i o n a l atra v és d o D e c r et o L e g i s l at i v o d e nº 28, d e 1 4 d e sete m b r o d e 1 9 9 0, rat i f i ca da
p e l o g o v e r n o b r asi le i r o e m 24 d e sete m b r o d e 1 9 90 e ent r o u e m v i g o r n o d i a 23 d e o u t u b r o d e
1 9 90. V á r i os d is p os i t i v os d essa c o n v e n çã o f o r a m c o m p i l a d os e i nser i d os n o E s tat u t o d a C r i a n ça
e d o A d o l es ce n te, q u e ai n da esta v a n asce n d o.
O B r as i l se m o b i l i za d e f o r m a i n é d i ta e c o nse g ue l e v a r a o C o n g r esso N a c i o n a l m a i s d e 200.000
assi nat u ras de ele i t o res d e t o d o o pa ís e 1. 200.000 assi nat u ras de c r i a n ças e ad o l esce ntes,
f a ze n d o c o m q u e a A s se m b l é i a C o ns t i t u i n te i nse r isse n a n o v a carta a d o u t r i na d a p r o te çã o
i n te g ra l, p re c isa m e n te n o art. 227, r o m p e n d o assi m, d e f i n i t i v a m e n te, c o m a d o u t r i na d a sit ua çã o
i r re g u l a r e f a ze n d o e xs ur g i r o n o v o d i re i t o d a i n f â n c i a e j u v e n t u de, c o m seus p r ó p r i os p r i n c í p i os
e d i ret r i zes, nã o f o c a d o a pe nas n o aspe ct o c r i m i n a l, m as n os d i re i t os f u n d a m e n ta is d e c r i a n ças e
a d o l esce n tes, f u n d a da na sua p e c u l i a r c o n d i çã o de p essoa e m d ese n v o l v i m e n t o, c o m o o d i re i t o à
v i d a, à ed u ca çã o, à saú de, ao l a zer, a p r o f issi o n a l i za çã o, á l i b e r da de, à c o n v i v ê n c i a f a m i l i a r e
c o m u n i tá r i a, c o l o ca n d o-o l i v re d e q u a l q ue r trata m e n t o d is c r i m i n a t ó r i o o u c r u e l. N a s c i a assi m
u m n o v o d i re i t o, o n o v o pa ra d i g m a d os D i r e i t os d a i n f â n c i a e j u v e n t u de nã o m a i s ce n t ra l i za d o
n a f i g u ra a ut o r i tár i a d o “t o d o p o d e r os o” j u i z d e m e n o res, m as n a re de h o r i z o n ta l i za da d e v á r i os
at o res so c i a is, n u m a art i c u l a çã o e c o-res p o nsa b i l i d a de d a f a m í l i a, d a so c i e da de e d o p o d e r
p ú b l i c o n as suas d i v e rsas es feras de p o d e r . O j u i z d a i n f â n c i a e j u v e n t u d e p assa a ser o
g a ra n t i d o r d as p r o m essas d o c o nst i t u i n te, m o r m e n te n o q ue t o ca a p reser v a çã o d os i n te resses
su pe r i o res das c r i a n ças e a d o l esce n tes, a g o ra n ã o m a i s c o ns i de ra d os m e r o o b j et os d e d i re i t o,
m a s v e r da de i r os su j e i t os d e d i re i t os f u n d a m e n ta is e p r o ta g o n i stas d e suas p r ó p r i as h i st ó r i as.
3 - ESTATUTO DA C R IANÇA E DO ADOL ESCENTE – NOVO PARAD I G M A.
D e s ta f o r m a, te n d o c o m o n ú c l e o a p r o teçã o i n te g ra l d os d i re i t os d e c r i a n ças e a d o l esce ntes,
n asce o E C A c o m o u m n o v o p a ra d i g m a, c o n f o r m a n d o n u m m e s m o d i p l o m a os d e n o m i n a d os
d i re i t os c i v i s e os d i re i t os so c i a is d o seg m e n t o i n f a n t o-j u v e n i l, e n ã o se l i m i ta n d o a pe nas c o m a
n o r m a t i za çã o d e u m a cate g o r i a o u c l asse – os m e n o r es - , c o m o v i n h a o c o r re n d o c o m os
d i p l o m as a nte r i o res, c r i a n d o assi m, o p r i n c í p i o d a res p o nsa b i l i da de so l i dá r i a d o E s ta d o, d a
soc i e da de e d a f a m í l i a. A res p o nsa b i l i da de p e l a e fet i v a çã o d os d i re i t os d a c r i a n ça e d o
a d o l esce n te n ã o estã o m a i s ce n t ra l i za d os n a f i g u ra d o j u i z, q u e p assa a ser m a i s u m d os d i v e rs os
at o res, e m b o r a i m p o r ta n t íssi m o, d i r i a até, i m p r esc i n d í v e l p a ra a e fet i v a p r o te çã o d os d i re i t os
asseg u ra d os n o E C A e N a C o n st i t u i çã o F e de ra l. Se g u n d o o esc ó l i o de M a r t h a T o l e d o, a
i m p l e m e n ta çã o d e p o l í t i cas p ú b l i cas e a t u te l a j u r is d i c i o n a l c o ns u bsta n c i a m e m d o is
m e c a n is m o s j u r í d i c os p a ra q ue se al ca n ce a e fet i v a p r o teçã o d esses d i re i t os. P re l ec i o na a i l ust re
j u r ista :
Na esfera da tutela jurisdicional, essa participação, embora não expressa e completamente
pormenorizada, dá-se na medida em que a Constituição não apenas criou poderosos
instrumentos de defesa judicial dos direitos fundamentais [...], como possibilitou a
legitimação da sociedade civil organizada para a provocação da tutela jurisdicional em
defesa dos direitos de crianças e adolescentes (Na Constituição Federal, artigo 129, § 1º,
concretizado pela Lei de Ação Civil Pública e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente).
Já n a es fera d as p o l í t i cas p ú b l i cas a p a r t i c i p a çã o p o p u l a r v e i o e x p ressa m e n te d estaca da p e l a
re m i ssã o d o p a rá g ra f o 7º d o art. 227 a o art. 204 da C F: a) i nst i t u i u-se, c o m o c o m a n d o
c o nst i t u c i o na l, a p a r t i c i pa çã o p o p u l a r n a f o r m u l a çã o e n o c o n t r o l e d as aç ões, o u seja, n o
c o n t r o l e d a e xe c u çã o d as p o l í t i cas p ú b l i cas re l ac i o n a das c o m a p r o te çã o d e c r i a n ças e
a d o l esce n tes (art. 204, I I, d a C F)b) c ha m o u-se as c o m u n i d a des o r g a n i za das e m en t i da des d e
c l asse, o u o r ga n i za ç ões n ã o-g o v e r na m e n ta is se assi m se p re fe r i r, a e xe c u tar u m a p a r ce la d as
p o l í t i cas p ú b l i cas d e ate n çã o à i n f â n c i a e à a d o l escê n c i a (art. 204, I, i n f i n e, d a C F).
E ssa p a rt i c i pa çã o d a c o m u n i d a de o r g a n i za da na d e fesa d os d i re i t os d e c r i a n ças e a d o l esce n tes
re f o r ça a n o çã o d e p r o te çã o i n te g ra l d e l es e, p e ns o, d e r i v a ta m b é m d a p e c u l i a r c o n d i çã o de
p essoa e m dese n v o l v i m e n t o, p e la f a ceta d e m a i o r v u l n e ra b i l i da de q u e ela t ra z e m si, m as,
so b ret u d o, p e la f a ceta d e f o r ça p o te n c i a l d e tra ns f o r m a çã o d a rea l i da de p a ra re d u çã o d as
d esi g ua l d a des so c i a is, l i ga das a o p r i n c í p i o f u n d a n te da d i g n i d a de h u m a n a e a os o b j et i v os
f u n d a m e n ta is d a R e p ú b l i ca re fe r i d os n o art i g o 3º d a C o nst i t u i çã o F e de ra l.
N o â m b i t o d o E C A , p o r ta n t o, n ã o h á m a i s m a r g e m p a ra at ua çã o d o “j u i z d e m e n o r es” e se us
su pe r p o r d e res. C o m o v.g., o d e l e g is lar, atra vés d e p o r ta r i a so b re t o d o o te m a a fet o à c r i a n ça e
a d o l esce n te, c o m o era p e r m i t i d o n a l e g is la çã o a nter i or. A t u a l m e n te, o Ju i z d a I n f â n c i a e
Ju ve n t u de, e m f a ce d o p r i n c í p i o d a l e ga l i d a de, só p o d e b a i x a r p o r ta r ias n os cas os e x p ressa m e n te
a d m i t i d os p e l o art. 1 4 9 d o E C A , d e f o r m a m o t i v a d a, cas o a cas o, v e d a das as d eter m i n a ç ões d e
ca ráte r ge né r i c o. C o m a d e v i d a v ê n i a da q ue l es q u e d e f e n d e m o “t o q ue d e R e c o l h e r”, o u
sua v i za n d o m e l h o r “t o q u e d e ac o l h e r”, o u a n o m e n c l at u ra q u e q u iser e m p r estar, e nte n d o q u e
f e re o d i re i t o f u n d a m e n ta l d a l i b e r d a de d e i r e v i r d e c r i a n ças e a d o l esce ntes asse g u ra d os p e l o
art. 227 d a C F, a d i g n i d a de d a p essoa h u m a na, o p r i n c í p i o d a l e ga l i d a de, b e m c o m o d i v e rs os
p r e ce i t os d o E C A e de c o n v e n ç õ es i n ter na c i o n a is. A c i o n a r os a nt i g os “c o m i ssár i os de m e n o r es”
p a ra “re c o l h e r” c r i a n ças e a d o l esce ntes n as r uas p o r q u e e x i ste u m a p o r ta r i a b a i x a d a p o r u m j u i z
d eter m i n a n d o ta l m e d i d a é ret r o ce der a o c ó d i g o de m e n o r es e res gatar m o s a f i g u r a te m í v e l d o
j u i z d e m e n o res d a d o u t r i na u l t ra passada d a si t ua çã o i r re g u l ar. C r e i o q u e a m e d i d a – t o q u e d e
re c o l h e r -, q u e te m g ra n d e ap o i o p o p u l a r e m f a ce da c resce nte v i o l ê n c i a j u v e n i l, só p o d e rá ser
v i a b i l i za da atra vés d e al teraçã o l e g is l at i v a, p o is o art. 1 5 d o E C A asse g u ra à c r i a n ça e o
a d o l esce n te o “ d i re i t o à l i be r da de, a o res pe i t o e á d i g n i d a de c o m o p ess oas h u m a n as e m p r o cess o
d e d ese n v o l v i m e n t o e c o m o su j e i t os d e d i re i t os c i v i s, h u m a n os e so c i a is g a ra n t i d os n a
C o n st i t u i çã o e n as l e is”, e o art. 1 6, I d o E C A , re f o r ça n d o e e x p l i c i ta n d o ai n da m a i s essa
g a ra n t i as c o nst i t u c i o n a l, esta be le ce q u e “o d i re i t o à l i be r da de c o m p r ee n de os seg u i n tes
as pect os: I – i r, v i r e estar n os l o g ra d o u r os p ú b l i c os e es paç os c o m u n i tár i os, ressal v a das as
restr i ç ões l e ga is”.
N o â m b i t o d o E C A , c r i a n ça p asso u a ser a p ess oa de até d o ze a n os i n c o m p l e t os, e a d o l esce n te
a q ue la p essoa d e d o z e até 1 8 a n os i n c o m p l e t os, t o d os, n ã o m a i s c o m o m e r o o b j et os d e d i re i t os,
m a s c o m o su j e i t os d e D i r e i t os e t i t u l a res d os d i re i t os f u n d a m e n ta is, c o m o o d i re i t o à v i d a, à
sa ú de, e d u ca çã o, á l i be r da de, a o l a zer, a o es p o r te, à al i m e n taçã o, à c u l t u ra, à d i g n i da de, a o
res pe i t o, à p r o f issi o n a l i za çã o e a c o n v i v ê n c i a f a m i l i a r e c o m u n i tár i a. A i m p l e m e n ta çã o d esses
d i re i t os f u n d a m e n ta is de pe n de d o t ra ba l h o art i c u l a d o e si n c r o n i za d o de t o d a u m a re de
h o r i z o n ta l i za da d e at o res e m e xe r c í c i o n as d i v e rsas áreas. O l e g is la d o r i nst i t u i u u m siste m a de
g a ra n t i as d e d i re i t os, esta be l ece n d o o d e v i d o p r o c esso l e ga l pa ra q u e u m a d o l esce n te te n ha o
se u d i re i t o restr i n g i d o o u á sua l i be r da de p r i v a d a, asseg u ra n d o e m seu arts. 1 0 6 e 1 1 0, q u e
n e n h u m a d o l esce n te será p r i v a d o de sua l i be r da de se nã o e m f l a g ra n te d e at o i n f r a c i o n a l o u p o r
o r de m esc r i ta e f u n d a m e n ta da d a a ut o r i da de j u d i c i á r i a c o m p e te nte, o u seja, e x i ge-se
estr i ta m e n te a o bser v â n c i a d o p r i n c í p i o da l e ga l i d a de o u d o d e v i d o p r o cess o l e ga l. A Se c retar ia
E s pe c i a l d e D i r e i t os H u m a n os e o C O N A N D A i nst i t u i u atra v és d e p o r ta r ia o S I N A S E – S iste m a
N a c i o n a l d e A t e n d i m e n t o S o c i o e d u c at i v o, q u e é c o n j u n t o o r de na d o d e p r i n c í p i os, re g ras e
c r i tér i os, d e ca ráter j u r í d i c o, p o l í t i c o, p e da g ó g i c o, f i n a n ce i r o e a d m i n istrat i v o, q u e e n v o l v e
d es de o p r o cess o d e a p u ra çã o d e at o i n f ra c i o na l até a e xe c u çã o d e m e d i d a so c i oe d u cat i v a .
T a m b é m te m u m a f u n çã o espe c i f i ca d e esta be le ce r p a râ m e t r os e c o n d i ç ões d e f u n c i o n a m e n t o
d as u n i d a des de ate n d i m e n t o so c i o e d u cat i v o, seja m e i o a bert o, se m i l i be r da de o u i n te r na çã o,
e x p l i c i ta n d o t o d a a o p e ra c i o n a l i za çã o d a m e d i d a so c i oe d u cat i v a e o p l a n o i n d i v i d u a l d e
ate n d i m e n t o.
O l e g is la d o r c r i o u o C o nse l h o T u te lar, c o m o ó r gã o au t ô n o m o, n ã o-j u r is d i c i o n a l, c o m atr i b u i çã o
d e ap l i ca r m e d i d as p r o tet i v as às c r i a n ças q ue c o m e te re m al g u m at o i n f r a c i o n a l o u q u e esteja m
e m si t ua çã o d e r isc o, so f re n d o al g u m t i p o d e v i o l ê n c i a. C r i o u u m siste m a d e res p osta
d i f e re n c i a da – res p o nsa b i l i za çã o, pa ra os a d o l esce nte q u e c o m e tere m at os i n f r a c i o n a is,
esta be l ece n d o as m e d i d as so c i oe d u cat i v as – a d v e r tê n c i a, re paraçã o d e da n os, l i be r da de
assist i da, p restaçã o de ser v i ç os c o m u n i tá r i os, se m i l i b e r da de e i n te r na çã o, t o d as re v esti das d e
u m ca ráter retr i b u t i v o, m a s p re p o n d e ra nte m e n te p e da g ó g i c o, l e v a n d o e m c o ns i de ra çã o a
c o n d i çã o p e c u l i a r d e p ess oa e m d ese n v o l v i m e n t o, c o ns o l i d a n d o ai n da o caráter d e b re v i d a de e
e x ce p c i o n a l i d a de d as m e d i as so c i o e d u cat i v as d e se m i l i b e r da de e i n ter na m e n t o, c u j a
c o m p e tê n c i a p a ra a p l i cá-l as será d o j u i z d a i n f â n c i a e j u v e n t u d e, d e p o i s d e o bser v a d o o d e v i d o
p r o c esso l e ga l. O M i n i sté r i o P ú b l i c o p ass o u a ser u m at o r i m p o r ta nt íssi m o, ú n i c o l e g i t i m a d o a
aj u i za r a açã o so c i o e d u cat i v a e ac o m p a n h a r t o d os os p r o cessos, seja c í v e l o u a d m i n i st rat i v o,
o n d e h a ja i n te resses d e c r i a n ças e a d o l esce n tes. É u m d os l e g i t i m a d os p a ra aj u i za r açã o c i v i l
p ú b l i ca re la c i o na d os a d i re i t os i n d i v i d u a is h o m o g ê n e os, c o l et i v os e d i f us os de c r i a n ças e
a d o l esce n tes.
O E C A , na v e r d a de, é u m m i c r ossiste m a, o n de é p re v ist o v á r i os p r o c e d i m e n t os – c í v e l,
a d m i n istrat i v o e c r i m i n a l - , q u e v i sa f u n d a m e n ta da m e n te t ute la r t o d os os d i re i t os e i n teresses
d e c r i a n ças e a d o l esce ntes, i n d e pe n d e n te m e n te d e sere m p essoas “care ntes”, be m c r i a das, f i l h a
d e f a m í l i as m i l i o n á r i as, i n f r at o ras, e n f i m, a n o r m a é d i re c i o na da p a ra seres h u m a n os na p e c u l i a r
c o n d i çã o d e p essoas e m d ese n v o l v i m e n t o. O E C A é u m siste m a n o r m a t i v o d e g a ra nt i as d e
d i re i t os d e c r i a n ças e a d o l esce n tes, i n d e pe n d e n te m e n te d e sua si t ua çã o o u c l asse so c i a l, e n f i m, é
u m o r d e na m e n t o n o r m a t i v o d i re c i o n a d o à t o d a i n f â n c i a e j u v e n t u d e.
O E C A c r i o u u m ó r g ã o res p o nsá v e l pe l a f o r m u l a çã o d e p o l í t i cas p ú b l i cas re l at i v as à i n f â n c i a e
Ju ve n t u de, q u e é o c o nsel h o d os D i r e i t os d a C r i a n ça e A d o l esce nte – C O N A N D A -, n a es fera d a
U n i ã o, o C o nse l h o E sta d ua l na es fera d os esta d os m e m b r os, e na ó r b i ta m u n i c i p a l, o C M D C A –
C o n se l h o M u n i c i p a l d os D i r e i t os d a C r i a n ça e d o A d o l es ce n te, q u e te m c o m o f u n ç ã o p re c í p ua
d e l i b e ra r e f o r m u l a r p o l í t i cas p ú b l i cas re l at i v a à i n f â n c i a e j u v e n t u d e n o m u n i c í p i o, se n d o
ta m b é m o ó r gã o o n d e t o das as o r ga n i za ç ões g o v e r na m e n ta is e nã o-g o v e r na m e n ta is q u e
tra ba l h e m c o m c r i a n ças e a d o l esce ntes d e v e m i ns c re v er-se seus p r o g ra m as d e ate n d i m e n t o
soc i oe d u cat i v o.
O E C A esta be l ece u as i n f r a ç õ es a d m i n ist rat i v as c o m i n a n d o p e na d e m u l t a a p ess oas f í s i cas o u
j u r í d i cas, p re v e n d o, i n c l us i v e, e m al g u ns cas os a i n ter d i çã o d o esta be le c i m e n t o, p a ra a h i p ó tese
d e p rát i ca re i te ra das d e c o n d u tas q u e v e n h a m v i o l a r n o r m as d e p r o te çã o à c r i a n ça o u
a d o l esce n te. T a m b é m esta be l ece u v á r i as f i g u r as t í p i cas p a ra d eter m i n a das c o n d u tas g ra v es
p r at i ca das c o n t ra c r i a n ça e a d o l esce n te, c o m i n a n d o pe nas d e m u l ta e d e p r i v a çã o d e l i b e r d a de.
O E C A d i sc i p l i na o ac o l h i m e n t o i nst i t u c i o n a l e f a m i l i a r d e c r i a n ças a ba n d o n a das o u v i t i m as d e
m a u s-trat os, o b j et i v a n d o a re i n te g ra çã o f a m i l i a r o u a c o l o ca çã o e m f a m í l i a su bst i t u ta, seja
atra v és d a g u a r da, t u te la o u a d o çã o.
N a v e r d a de, c o m o j á en fat i za d o, o E s tat u t o d a C r i a n ça e d o A d o l esce nte i n a u g u r a u m n o v o
p a ra d i g m a, f u n d a d o n o p r i n c i p i o d a p r o te çã o i n te g ra l e d a d i g n i d a de da p ess oa h u m a n a,
re c o n h e ce n d o a q u a l i da de de su je i t os d e d i re i t os de c r i a n ças e a d o l esce n te, n a sua p e c u l i a r d e
p essoa e m p r o cess o d e d ese n v o l v i m e n t o f í s i c o, i n te l ect ua l, e m o c i o n a l, m o r a l e esp i r i t ua l, e q u e
d e v e m e re ce r u m t rata m e n t o d i f e re n c i a d o d o E sta d o, p r i n c i pa l m e n te, n a p r eser va çã o d os seus
d i re i t os f u n d a m e n ta is, c o m o o d i re i t o à v i d a, saú de, ed u ca çã o, al i m e n taçã o, l a zer,
p r o f i ssi o n a l i za çã o, c u l t u ra, d i g n i d a de, res pe i t o, c o n v i v ê n c i a f a m i l i a r e c o m u n i tár i a, e, ac i m a de
t u d o, l i be r da de, q u e de v e m ser t ute la d os c o m o p r i o r i da de a bs o l u ta. A d e m a is, de c o n f o r m i d a de
c o m as d i ret r i zes d e R i a d, o a d o l esce nte nã o p o d e e n ã o d e v e re ce ber t rata m e n t o m a i s r i g o r os o
d o q u e aq ue l e d i s pe nsa d o ao a d u l t o i m p u tá v e l. N e sse d i a pasã o, o j u i z da i n f â n c i a e j u v e n t u de
d e v e ser o g u a r d i ã o d essas g a ra nt i as e d i re i t os i nser i d os e m n oss o o r d e na m e n t o j u r í d i c o p e l as
c o n v e n ç ões i n ter na c i o na is, pe l a C o n st i t u i çã o F e de ra l e p e l o E stat ut o d a C r i a n ça e d o
A d o l es ce n te.
A pe r g u n ta q u e se f a z é a seg u i n te: n o at ua l está g i o, n o â m b i t o d a d o u t r i na d a p r o te çã o i n te g ra l,
o d e n o m i n a d o t o q ue de re c o l h e r está e m c o n f o r m i d a d e c o m a C o nst i t u i çã o F e de ra l d e 1 9 8 8,
c o m as C o n v e n ç õ es I n te r na c i o n a is d os d i re i t os d e c r i a n ças, d as q u a is o B r as i l seja si g natár i o, o u
c o m o E s tat u t o d a C r i a n ça e d o A d o l esce n te?
4 O QUE É TOQUE DE RE CO L HE R?
O t o q u e de re c o l he r n a v e r da de é u m a re m i n is cê n c i a d o E s ta d o aut o r i tá r i o e i nstr u m e n t o
u t i l i za d o p e l a E s ta d o e m sit ua ç ões d e a n o r m a l i da de i nst i t u c i o n a l. A s p r i m e i ras n o t í c i as q u e se
te m so b re o t o q u e de re c o l he r re m o n ta m a i da de m é d i a, q u a n d o os si n os d as i g re jas d o b ra v a m
p a ra a v isar q u e era h o ra de a pa ga r as l u zes, so p ra r as v e l as, p a ra q u e a c i d a de f i c asse as esc u ras,
e assi m ser v i r d e si na l p a ra os v i a j a n tes q u e a c i d a de esta va às esc u ras. O t o q u e d e re c o l h e r
se m p r e f o i u t i l i za d o e m m o m e n t os de a n o r m a l i d a des, c o m o g u e r ras, catástr o f es, o u al g o si m i l a r
q u e j ust i f i casse te m p o ra r i a m e n te a l i m i ta çã o d o d i re i t o d e i r e v i r d as p essoas n as r uas. T o d a v i a,
f o i na A l e m a n h a N a z i sta e nt re 1 9 3 3 a 1 9 4 5 q ue o t o q u e d e re c o l h e r f o i u t i l i za d o d e f o r m a
b asta n te re c o r re nte c o n t ra os j u de us. H á ta m b é m n o t í c i as de q u e o t o q u e d e re c o l he r f o i
u t i l i za d o n os E U A c o n t ra os i m i g r a n tes Ja p o neses e se us d esce n d e n tes na C a l i f ó r n i a e e m
W a s h i n g t o n.
Q u a n t o a o T o q u e d e re c o l h e r n o B r as i l, o j u i z d a I n f â n c i a e Ju v e n t u d e d e F e r na n d ó p o l is-SP ,
c o m b ase n u m i n q u é r i t o p o l i c i a l, q ue re c o n h e ce u q u e as r u as nã o são u m l u g a r se g u r o pa ra
m e n o res d esac o m p a n h a d os, al tas h o r as d a n o i te, d i a n te d a m a i o r p r o b a b i l i d a de d e d i st r i b u i çã o
d e d r o g as e d e est í m u l os à p r ost i t u i çã o i n f a n t i l, e d a m e n o r v i g i l â n c i a d os pa is res p o nsá v e is,
b a i x o u p o r ta r ias j u d i c i a is d eter m i n a n d o à p o l í c i a e a o c o nse l h o t ute l ar o rec o l h i m e n t o de
m e n o res e m sit ua çã o d e r is c o e o e n ca m i n h a m e n t o de l es aos p a is o u res p o nsá v e l, alé m d e
d eter m i n a r h o rá r i os d e p e r m a n ê n c i a n as r uas d e m e n o res d e 1 8 a n os, d esac o m p a n ha d os d os pa is
o u res p o nsá ve l. O t o q ue de re c o l h e r f o i ta m b é m este n d i d o pa ra as esc o l as, n o sent i d o d e
re c o l h e r c o m p u l s o r i a m e n te t o da c r i a n ça e a d o l esce nte q u e est i v e r n as r uas n o h o r á r i o esc o l a r e
u t i l i za n d o o f a r da m e n t o d a esc o l a. N e sse cas o, res o l v e ra m m u d a r o n o m e p a ra “t o q u e d e
ac o l he r”, c o m o se iss o v i esse a j ust i f i ca r o ar b í t r i o.
N a v e r da de, o q u e se o bse r v a é q u e o d is c u rs o é o m e s m o d a é p o ca d a d o u t r i na d a si t ua çã o
i r re g u l ar, o u seja, o t o q u e d e re c o l he r – q u e é u m a f o r m a d e a p ree nsã o c o m p u l s ó r i a d e c r i a n ças
e a d o l esce n tes nas r u as – é c o ns i de ra d o en ge n h osa m e n te c o m o m e d i d a d e p r o te çã o. V e j a m o s o
p e nsa m e n t o d o i l ust re m a g i st ra d o d e F e r d a n ó p o l i s, E v a n d r o Pe ra l i n :
E um dos princípios mais destacados do Estatuto da Criança e do Adolescente – que a
medida do “toque” busca alcançar – é, justamente, o da “proteção integral” (artigo 3.º). A
finalidade do “toque” não é proteger parcialmente o menor, apenas com a medida de
proteção, mas é protegê-lo integralmente, como manda a lei, valendo-se da medida de
prevenção, no caso, a recomendação de horário.
O t o q u e de re c o l he r c o nst i t u i, n a v e r d a de, u m i nstr u m e n t o a ut o r i tár i o e i l e ga l, q u e rec o l h e
c r i a n ças e a d o l esce n tes nas r u as e m d ete r m i n a das sit ua ç ões e h o r á r i os, f e r i n d o d i re i t os
f u n d a m e n ta is desses su je i t os v u l n e rá v e is. O P o de r Ju d i c i á r i o te nta, i n de v i d a m e n te, su bst i t u i r a
atr i b u i çã o d os pa is o u res p o nsá v e l, e ta m b é m d o P o d e r E x e c u t i v o, p a r te l e g í t i m a pa ra a
i m p l e m e n ta çã o d e p o l í t i cas p ú b l i cas. A m e d i d a c oe r c i t i v a, l o n g e d e ser u m a m e d i da d e
p r o te çã o, na v e r da de é u m a m e d i d a d e d e f esa so c i a l, q ue v i sa p r e c i p u a m e n te a d i m i n u i ç ã o de
v i o l ê n c i a j u v e n i l, p o r ta n t o, d es p r o v i d a d e q u a l q ue r ca ráte r p e da g ó g i c o. C o m e fe i t o, nã o e x iste
q u a l q ue r p r o j et o d e i n ter v e n çã o e d u cat i v a n a v i d a desses j o v e ns, q ue são l esa d os e m se us
d i re i t os f u n d a m e n ta is e su b m e t i d os a si t ua çã o d e c o nstra n g i m e n t o e v e x a m e.
5 L IBE RDADE DE I R E V I R
A l i be r da de c o n ce b i d a c o m o o d i re i t o d e q u a l q ue r i n d i v í d u o de i r e v i r, d e tra nsi ta r l i v r e m e n te
p e l as r uas e l o g ra d o u r os p ú b l i c os, está c o nsa g ra da n a C o n st i t u i çã o F e d e ra l, p re c isa m e n te n o se u
art. 5º, X V , L I V e L X I d a C F . N o q u e c o n ce r ne es pec i f i ca m e n te à c r i a n ça e a d o l esce nte, o art.
227 d a C F , asseg u ra ta m b é m a esse seg m e n t o v u l n e rá ve l o d i re i t o a l i be r da de d e i r e v i r, c o m o
p r i o r i da de a bs o l u ta. A n o r m a q u e asse g u ra o d i re i t o à l i be r da de a c r i a n ças e ad o l esce nte ta m b é m
está re p r o d u z i d a n o art. 4º d o E C A . L o g o, t rata-se d e u m d i re i t o f u n d a m e n ta l c o nsa g ra d o às
c r i a n ças e a d o l esce n tes, c o m o su je i t os d e d i re i t os. O j u r ista F á b i o K o n d e r C o m p a rat o e x p l i c i ta
b e m esse d i re i t o f u n d a m e n ta l, senã o v e j a m o s:
O homem é o único ser dotado de vontade, isto é, de capacidade de agir livremente, sem
ser conduzido pela inelutabilidade dos instintos.
É so b re o f u n d a m e n t o ú l t i m o d a l i be r da de q u e se assent o t o d o o u n i v e rs o a x i o l ó g i c o, ist o é , o
m u n d o d as p re f e rê n c i as v a l o rat i v as, b e m c o m o t o d a a ét i ca de m o d o g e ra l, o u seja, o m u n d o das
n o r m as , as q u a is, c o n t rar i a m e n te a o q u e su ce de c o m as l e is n at u ra is, a p rese nta m-se se m p r e
c o m o p r e ce i t os suscet í v e is de c o nsc i e nte v i o l a çã o. É a l i b e r da de q u e f a z d o h o m e m u m ser
d o ta d o d e a ut o n o m i a, v a l e d i ze r da ca pa c i da de p a ra d i ta r suas p r ó p r i as n o r m as de c o n d u ta.
A l i b e r d a de é a f o n te d a c o ns c i ê n c i a m o r a l, d a f a c u l d a de d e j u l ga r as aç ões h u m a n as seg u n d o a
p o l a r i d a de en t re o be m e m a l.
C o m o se i n f e re, este d i re i t o f u n d a m e n ta l q u e está ta m b é m c o nsa g ra d o e m v á r i as c o n v e n ç õ es
i n ter na c i o n a is v o l ta das pa ra a d e fesa d e d i re i t os d e c r i a n ças e a d o l esce n te, n ã o p o d e so f re r
q u a l q ue r espé c i e d e restr i çã o o u m o l ést ia, a n ã o ser q u e h a j a e x p ressa a ut o r i za çã o l e ga l. É b e m
v e r da de q u e a l i be r da de d e i r e v i r c o n f e r i d a às c r i a n ças e a d o l esce nte n ã o é tã o a m p l a c o m o
a q ue la c o n f e r i da a os a d u l t os, p r i n c i p a l m e n te, e m f a ce d e sua c o n d i çã o p e c u l i a r d e p ess oa e m
d ese n v o l v i m e n t o e q u e ai n d a está so b a a ut o r i d a de d o p o d e r f a m i l i ar, e nt reta n t o, essa restr i çã o
n ã o p o d e ser v i r de p rete x t o p a ra q u e a ge ntes p ú b l i c os p ossa m p r i v a r a l i be r da de d e c r i a n ças e
a d o l esce n te q u e se e n c o n t rar e m l o g ra d o u r os p ú b l i c os e m d ete r m i n a d o h o r á r i o, n o se nt i d o d e
ate n de r d eter m i n a çã o d e j u i z d a i n f â n c i a e j u v e n t u de tra v est i d o d a t o ga d e “j u i z d e m e n o r es”,
seja m e d i a n te p o r ta r i a d e caráter g e né r i c o, seja atra vés d e d e c isã o j u d i c i a l ta m b é m d e ca ráter
g e né r i c o, c u j a m e d i d a d e caráter ar b i t rár i o v i sa tã o so m e n te ate n d e r a pe l o p o p u l a r c o n t ra a
v i o l ê n c i a, o u seja, a d e c isã o se re v este d e n í t i d o ca ráter d e m e d i d a de d e f esa so c i a l, an te a
a usê n c i a d e q u a l q u e r p r o p osta p e da g ó g i ca v o l ta da p a ra as c r i a n ças e a d o l esce n tes. O i ns i g ne
c o nst i t u c i o na l ista José A f o n s o d a S i l v a , c o m e n ta n d o o art. 1 6 d o E C A , assi m p r e l ec i o n a:
Ir, vir e estar são expressões da liberdade de locomoção, que a CF prevê no art. 5º, X V, em
sentido mais amplo do que o disposto no art. 16, I do Estatuto.De fato, o dispositivo
constitucional declara livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo
qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens [...].
Significa que “podem todos locomover-se livremente nas ruas, nas praças, nos lugares
públicos, sem temor de serem privados sua liberdade de locomoção” (cf. Sampaio Dória,
Direito Constitucional – Comentários à Constituição de 1946, 4º / 651, São Paulo, Max
Limonad, 1960).
[...] C l a r o q u e a c r i a n ça e o ad o l esce nte n ã o g o z a m d a l i b e r d a de de l o c o m o ç ã o e m te r m o s assi m
tã o a m p l os, p o r q u e sua c o n d i çã o j u r í d i ca i m p õ e l i m i ta ç ões à sua l i b e r d a de d e l o c o m o ç ã o. P o r
iss o é q u e o d is p os i t i v o so b c o m e n tá r i os m e n c i o na i r e v i r e estar n os l o g ra d o u r os p ú b l i c os e
es paç os c o m u n i tá r i os, ressal v a das as restr i ç ões l e ga is.
C o m o se i n f e re, a c r i a n ça e a d o l esce nte c o m o v e r d a de i r os su je i t os d e d i re i t o e t i t u l a res d o
d i re i t o f u n d a m e n ta l d e i r e v i r e estar p o d e m l o c o m o v e r-se n os l o g ra d o u r os p ú b l i c os e espa ç os
c o m u n i tá r i os, se m q u e seja m m o l esta d os p o r q u a l q u e r a ge n te p ú b l i c o, o u seja, esses su j e i t os d e
d i re i t os p o d e m l o c o m o v e r-se e m p ra ças p ú b l i cas, r u as, a v e n i d as, j a r d i ns, p a r q ues, r o d o v i as,
d e n t re o u t r os, b e m c o m o e m es paç os c o m u n i tá r i os, e nte n d i d os c o m o a q ue les g r u p os q u e
p r o m o v e m a e d u ca çã o, c u l t u ra, esp o r te, l a zer, c o m o teatr o, i g re ja, c l u b es, etc, só p o de n d o so f re r
q u a l q ue r restr i çã o se p r o v i e r d e l e i. E v i d e n te m e n te q u e esse c o n t r o l e é de atr i b u i çã o d a f a m í l i a,
e m f a ce d os p o d e res i n e re n tes a o p o d e r f a m i l i a r o u d a g u a r da e t ute la, q ue d e v e f i s ca l i zar e
m o n i t o ra r a l i b e r d a de d e se us f i l h os o u p u p i l os. A l e i, q u a n d o q u i s restr i n g i r, o f e z d e f o r m a
e x p ressa, c o m o esta be le ce u n o art. 75 d o E C A , o d is c i p l i n a m e n t o d o acesso de c r i a n ças e
a d o l esce n tes às d i v e rs ões p ú b l i cas e espetác u l os c l assi f i ca d os c o m o a de q ua d os á sua f a i x a
etár ia, esta be l ece n d o e m al g u m as sit uaç ões q ue so m e n te terã o acesso ac o m p a n ha d os d e se us
p a is o u res p o nsá ve l. O art. 80 d o E C A p r o í b e a e nt ra da e p e r m a nê n c i a d e c r i a n ças e
a d o l esce n tes e m l o ca is q u e e x p l o re m j o g os e a p ostas. O E C A ta m b é m p r e v ê a l i m i ta çã o d o
d i re i t o d e l o c o m o ç ã o nas si t ua ç ões de v i a ge m d e c r i a n ça pa ra q u a l q ue r l u g a r d o te r r i t ó r i o
n a c i o n a l, b e m c o m o d e c r i a n ças e a d o l esce n tes, d esac o m p a n h a d os d os p a is o u res p o nsá ve is,
p a ra o e x ter i or. F i n a l m e n te, o a d o l esce nte só p o d e ser p r i v a d o d e sua l i be r da de e m cas o d e
f l a g ra n te d e at o i n f ra c i o na l o u p o r o r d e m esc r i ta e f u n d a m e n ta da da a ut o r i da de j u d i c i á r i a, n os
ter m os p r e v i st os n o art. 1 0 6 d o E C A , d e so rte q u e f o r a d essas h i p ó teses rest r i t i v a m e n te
p r e v i stas e m l e i – n o E C A – a p r i v a çã o d a l i b e r d a de d e c r i a n ças e a d o l esce n te e m l o g ra d o u r os
p ú b l i c os o u c o m u n i tá r i os p o r a ge n tes p ú b l i c o, p o r q u a l q ue r m o t i v o, é ar b i t rá r i o, p o is v i o l a
f r o n ta l m e n te o d i re i t o d e i r e v i r. O j u r ista José A f o n s o S i l v a n a o b ra c i ta da e x p l i c i ta:
É necessário ter em conta, ainda, que a liberdade aí reconhecida não significa que a
criança e o adolescente podem locomover-se nos logradouros públicos a seu simples
alvedrio, pois estão sujeitos à autorização dos pais ou responsáveis, segundo critérios de
conveniência e de educação. É liberdade que se volta especialmente contra
constrangimentos de autoridades públicas e de terceiros.
É sab i d o q u e a c r i a n ça e a d o l esce nte, e m f a ce de sua c o n d i ç ã o p e c u l i a r d e p ess oa e m
d ese n v o l v i m e n t o, so f re, e m ra zã o d e sua i m a t u r i da de e v u l n e ra b i l i d a de, al g u m as restr i ç õ es n o
se u d i re i t os de i r e v i r, n ã o oste nta n d o a m e s m o l i be r da de c o n f e r i d a a os a d u l t os, t o d a v i a,
q u a l q ue r restr i çã o dessa n at u re za d e v e estar res pa l da da e m l e i e f u n d a da n a p r o te çã o d os
d i re i t os f u n d a m e n ta is desse se g m e n t o v u l n e rá ve l. A d eter m i n a çã o j u d i c i a l – t o q ue d e rec o l h e r –
q u e a ut o r i za q u e a ge n tes p ú b l i c os rec o l h a m c r i a n ças e a d o l esce n tes na r uas, restr i n g i n d o o seu
d i re i t o d e l o c o m o ç ã o n os l o g ra d o u r os p ú b l i c os ta m b é m p e ca p o r u n i f o r m i z a r c r i a n ças e
a d o l esce n tes, c o l o ca n d o-os n u m a m e s m a sit ua çã o, q u a n d o se sa be q u e u m a c r i a n ça d e 5 an os d e
i da de n ã o te m a m e s m a d ese n v o l t u ra e l i b e r da de d e u m a d o l esce n te d e 1 6 o u 1 7 a n os, q u e j á
p o d e v o t a r e f r e q ü e n ta r de ter m i n a d os a m b i e n tes à n o i te. A s c r i a n ças e a d o l esce n te q u e estã o n as
r u a e e m si t ua çã o d e r is c o p o d e m e v i de n te m e n te ser ab o r da das, de u m a f o r m a e d u cat i v a e
p r e v e n t i v a, p o r c o nsel he i r os t ute la res, assiste n tes so c i a is, n o â m b i t o d e u m a m p l o p r o j et o d e
p o l í t i cas p ú b l i cas, v o l ta d o p re c i p ua m e n te p a ra a p r eser v a çã o d os se us d i re i t os f u n d a m e n ta is e a
sua i nser çã o n o siste m a d e g a ra nt i as d e d i re i t os, ent reta n t o, q u a n d o p o l i c i a is o u age n tes p ú b l i c os
i n v est i d os de p o d e r d e p o l í c i a rec o l he m c r i a n ças e a d o l esce n tes d as r uas, d e f o r m a i n c o n t i ne n t i
e ag ressi v a, m i n a n d o q ua l q u e r a q u i escê n c i a d a q ue l as, e v o l ta da u n i ca m e n te pa ra c o n te r a
v i o l ê n c i a e ate n de r os i m p e rat i v os d e d e fesa so c ia l, se m d ú v i d as, q u e a m e d i da é
i n c o nst i t u c i o n a l. N e sse sent i d o a j u r ista M a r t h a T o l e d o assi m se m a n i f esta:
Mas quais são os limites jurídicos de intervenção da ação social revelada nas políticas
públicas de proteção, ditados pelos contornos do direito de liberdade de crianças e
adolescentes?
Nas respostas jurídicas a esse tipo de indagação, penso que pesa sobremaneira a noção que
procuro detalhar: o limite básico é, essencialmente, a preservação ou a recomposição dos
direitos fundamentais de crianças e adolescentes, sob a premissa de que essas medidas de
proteção nunca visam a proteção sociedade em decorrências de condutas incômodas (mas
atípicas penalmente) que crianças e adolescentes possam ter.
[....]
Urge, pois, uma positivação mais detalhada dos contornos desses direitos de crianças e
adolescentes, com fundo respeito por essa diversidade cultural que nos marca como nação
e tanto nos orgulha, ou mesmo de pormenorização dos limites das políticas públicas, pela
via legislativa, via que, a rigor, é a única legitimada no Estado de Direito para tal tipo de
escolha.
[....]
Por outras palavras, na medida em que essa constrição da liberdade seja requisito da
própria intervenção pedagógica da assistência pública e fique no mínimo necessário para
atingir a proteção concreta dos direitos fundamentais do ser imaturo, para contribuir com
o sadio desenvolvimento da personalidade deles, ela é lícita e legítima; mas não no que
transborde para a conveniência dos adultos ou se assemelhe a uma sanção privativa de
liberdade, imposta em nome da antiga noção de desvio de conduta, hoje inconstitucional.
I m p õ e-se d e l i m i ta r c o m o se dá essa i n ter v e n çã o d o E sta d o-j u i z e o e n ca m i n h a m e n t o d a c r i a n ça
e ad o l esce nte p a ra sua f a m í l i a. O p r ó p r i o Ju i z de F e r da n ó p o l is, E v a n d r o Pe l ar i n, e m se u art i g o
i n t i t u l a d o “ T o q u e d e R e c o l h e r pa ra C r i a n ças e A d o l esce ntes” , e x p l i c i ta:
O disposto no artigo 101, inciso I, do Estatuto fala que o jovem cujos direitos estiverem
violados ou ameaçados de violação (entre eles, especificamente, o direito à convivência em
ambiente livre de entorpecentes), deve ser protegido mediante o seu “encaminhamento aos
pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade”. E a forma como se dará esse
encaminhamento, aqui em Fernandópolis, é a retirada do menor da situação de risco real
ou iminente, por transporte em viatura do Conselho Tutelar, para a sede do Conselho ou
Delegacia de Polícia, intimando-se os pais, em seguida, para buscar os filhos.
C o m o se d e p ree n de, a c r i a n ça o u a d o l esce nte é a p ree n d i d o p o r a ge n tes d o E sta d o – seja
c o nse l he i r os o u p o l i c i a is – e só é l i b e ra d o da D e l e ga c i a o u d a sede d o C o n se l h o q ua n d o
a ut o r i za d o. N ã o h á d ú v i d a q u e está v i o l a d o o d i re i t o d e i r e v i r asse g u ra d o n o art. 227 d a C F e
n os v á r i os d is p os i t i v os d o E C A .
6 PRINCIPIO DA DI GNIDADE DA PESSOA HU M ANA
C r i a n ça e a d o l esce nte d e v e m ser c o ns i de ra d os à l u z d os p re ce i t os d a d o u t r i n a da p r o teçã o
i n te g ra l c o m o su j e i t os d e D i r e i t os, o u seja, t i t u l a res d e d i re i t os f u n d a m e n ta is p os i t i v a d os n o
E C A e e m n ossa C o n st i t u i çã o F e de ra l d e 1 9 8 8. A s s i m se n d o, n ã o d e v e m ser o b j et os d e
i n ter v e n çã o ar b i t rár i a d o E sta d o, c o m o ac o n te c ia n a é p o ca d a v i g ê n c i a d a d o u t r i n a d a sit ua çã o
i r re g u l ar. A u t i l i za çã o d o t o q u e d e re c o l her, a p o i a d o e m m e r a p o r tar ia d e a ut o r i d a de j u d i c i á r i a,
v i o l a n ã o so m e n te o d i re i t o a l i b e r da de d e i r e v i r, c o m o ta m b é m à d i g n i d a de d e c r i a n ças e
a d o l esce n tes, c o m o su je i t os d e d i re i t os, t i t u l a res d e d i re i t os f u n d a m e n ta is e p r o ta g o n istas de sua
p r ó p r i a h ist ó r i a. O j u r ista José A f o n s o d a S i l v a d i sc o r re n d o so b re o p r i n c í p i o d a d i g n i d a de
h u m a n a, n a v i sã o d e K a n t, assi m p re le c i o n a:
A filosofia Kantiana mostra que o homem, como ser racional, existe como um fim em si
mesmo, e não simplesmente como meio, enquanto os seres desprovidos de razão tem um
valor relativo e condicionado, o de meios, eis porque se lhes chamam coisas; ao contrário
os seres nacionais são chamados pessoas, porque sua natureza já os designa como um fim
em si, ou seja, como algo que não pode ser empregado simplesmente como meio e que, por
conseguinte, limita na mesma proporção o nosso arbítrio, por ser objeto de respeito.
A c o nst r u çã o d essa d i g n i d a de é i n d i ss o c i á v e l d a l i be r da de, p o is o ser h u m a n o, e m f a ce d e sua
n at u re za g re gá r i a, n e cessi ta i n tera g i r c o m o u t ras pessoas, p a r t i c i pa r d e g r u p os e d a v i d a
c o m u n i tá r i a, n o se nt i d o de d ese n v o l v e r t o das as suas h a b i l i da des e p o te n c i a l i d a des. N e sse
se nt i d o, V a n d e r F e r re i ra d e A n d r a de , c o m b ase n a f i l os o f i a d e P i c o D e l l a M i r a n d o l a,
p os i c i o n o u:
Desta forma, a dignidade do homem está longe de ser algo dado ou acabado e
mecanicamente fixo. O homem se faz. E como esta perfectibilidade está condicionada pela
liberdade é na dinâmica do processo de conquista de si e da autodignificação crescente que
o homem precisa da filosofia. Não se faz assim a apologia da Filosofia, mas entende-se a
mesma como instrumento imprescindível para se atingir o fim existencial da dignidade
humana.
N o â m b i t o d essa p e rs pe ct i v a o l e g is la d o r c o nst i t u i n te b ras i l e i r o, c i e nte d essa ne cessi da de
p r i m á r i a, i nser i u n o te x t o c o nst i t u c i o n a l o art. 227 , atra v és d o q u a l são asseg u ra d os à c r i a n ças e
a d o l esce n tes, d e n t re o u t r os d i re i t os f u n d a m e n ta is, a p reser v a çã o d o p r i n c í p i o da d i g n i d a de
h u m a n a e o d i re i t o à c o n v i v ê n c i a f a m i l i a r e c o m u n i tá r i a, q u e n ã o p o d e m ser v i o l a d os o u
m o l esta d os p o r ar b í t r i o d e a ge n tes d o E s ta d o. O de n o m i n a d o “t o q ue de re c o l h e r”, so b o p rete x t o
d e ser i nst r u m e n t o de p r o teçã o, n a v e r da de c o nst i t u i u m m e i o d e d e f esa so c i a l u t i l i za d o p a ra
c o n te r a v i o l ê n c i a p rat i ca da p o r c r i a n ças e a d o l esce ntes. T r ata-se d e u m p r o ce d i m e n t o ar b i t rár i o
q u e f e re o art. 1 8 d o E C A , q u e esta be le ce te x t ua l m e n te q u e “ É de v e r d e t o d os v e l a r p e l a
d i g n i d a de d a c r i a n ça e d o a d o l esce nte, p o n d o-os a sal v o de q u a l q ue r t rata m e n t o d es u m a n o,
v i o l e n t o, ater r o r i za nte, v e x a t ó r i o o u c o nst ra n ge d o r”. O r a, o t o q u e d e re c o l he r é v i o l e n t o, p o i s
u t i l i za i n c l us i v e o p o d e r de p o l í c i a p a ra f a ze r c u m p r i r sua d e c isã o, o b r i g a n d o a c r i a n ça e
a d o l esce n te q u e esti v e r c i r c u l a n d o e m al g u m l o g ra d o u r o p ú b l i c o e m dete r m i n a d o h o rá r i o a
d e i x a r o l o ca l i m e d i ata m e n te, al g u m as v e zes, a c r i a n ças o u a d o l esce nte é c o n d u z i d o a u m a
d e l e ga c i a o u a o u t r o l o ca l i n d i ca d o p e l a P o l í c i a, p a ra d e p o i s e ntã o ser e nt re g u e a seus p a is o u
res p o nsá v e is, e v i de n c i a n d o n esse at o o seu m a n i f est o caráter v e x a t ó r i o o u c o nst ra n ge d or.
7 - PRINCÍPIO DA L E G A L IDADE
N o c o n te x t o d e u m E s ta d o D e m o c r át i c o d e D i r e i t o t o r na-se c u r i a l q u e t o d os te n ha m
c o n he c i m e n t o d as l e is, n a sua ace p çã o o r i g i na l, c o m o v e r da de i r o f r u t o d a v o n ta de p o p u l ar, n o
se nt i d o d e q u e ca da p essoa e m pa rt i c u l ar, n a sua l i be r da de d e a g ir, só p ossa f a zer o u d e i x a r de
f a ze r al g o senã o e m v i r t u d e da l e i, c o n f o r m e estat u i o art. 5º, I I d a C F. N a v e r da de, t rata-se d e
u m a v e r da de i ra g a ra nt i a c o nst i t u c i o n a l q u e v i sa p re c i p ua m e n te c o n ter o ar b í t r i o d o E s ta d o, p o is
p a ra os a ge ntes d a a d m i n istraçã o p ú b l i ca só se p o d e p rat i ca r d eter m i n a d o d es de q u e h a j a
a ut o r i za çã o l e g is l at i v a, ent reta n t o, n o q u e se re fe re às pessoas e m g e ra l, o se u p o d e r d e ag i r é
m a i s a m p l o, p o i s p o d e m f a ze r o u d e i x a r d e f a zer t u d o a q u i l o q u e a l e i nã o p r o í be. N a v e r da de, o
p r i n c í p i o da l e ga l i d a de é u m i m p e rat i v o n o E sta d o D e m o c r át i c o d e D i r e i t o, p o i s esta be l ece u m
l i m i te n a at uaçã o d o E s ta d o e c o nst i t u i u m a g a ra n t i a d os d i re i t os f u n d a m e n ta is d os c i d a dã os.
O R e f e r i d o p r i n c í p i o ta m b é m se m a n i f esta n a ó r b i ta p e na l (art. 5º, i n c is o X X X I X d a C F),
q u a n d o esta be l ece q ue n u l l u m c r i m e n, n u l l a p o e na si ne l e ge).
N o ca m p o es pec í f i c o d o E s tat u t o d a C r i a n ça e A d o l es ce n te, v ê-se q u e o l e g is l a d o r si n t o n i za d o
c o m os p ost u l a d os d a ca rta m a g n a e d as c o n v e n ç õ es i n ter na c i o n a is, l i m i t o u a at i v i d a de d o Ju i z
d a I n f â n c i a e Ju v e n t u de a o esta be l ece r n o art. 1 4 9 d o re f e r i d o d i p l o m a l e ga l, q u a is as m a té r i as
q u e ele p o d e r i a d i s c i p l i na r atra v és d e p o r tar i a e al v a rás. N a v e r d a de, f o i e x t i n t o o p o de r de
l e g is l ar c o n f e r i d o a o e ntã o j u i z d e m e n o r es p e l a d o u t r i na d a sit uaçã o i r re g u l ar. N e sse sent i d o, é
l a p i d a r a l i çã o d e A n t o n i o F e r n a n d o d o A m a r a l e S i l v a :
Não mais se cogita do antigo poder normativo. Houve coerência e juridicidade ao se
extinguir o poder normativo do art. 8º do Código de Menores. Não é do Judiciário ditar
normas de caráter geral, mas decidir, no caso concreto, a aplicação do Direito Objetivo.
Ju i z n ã o é l e g is la d or, n ã o ela b o ra n o r m as d e c o m p o r ta m e n t o so c i a l. Ju l ga os c o m p o r ta m e n t os
f r e n te às re g ras d e c o n d u ta d a v i d a soc i a l. E ssas g e ra l m e n te de c o r re m d o p r o cesso l e g is lat i v o,
reser va d o p e l a C o n st i t u i çã o a o u t ra ó r b i ta.
D e s ta f o r m a, i n f e re-se q u e o d e n o m i n a d o “t o q u e d e re c o l he r”, d ete r m i n a d o atra v és d e d e c isã o
j u d i c i a l, d e f o r m a g e né r i ca, v i o l a f r o n ta l m e n te o p r i n c í p i o d a l e ga l i da de, p o is o art. 1 4 9 d o E C A
n ã o au t o r i za q u e o m a g i st ra d o d is c i p l i n e p o r p o r ta r ia m a t é r i as alé m d a q u e l as e n u m e ra d os n o
re fe r i d o d i s p os i t i v o. A d e m a is, c o m o p r e ce i t ua o § 2º d o art. 1 4 9 d o E C A , e x i ge-se q u e a p o r ta r i a
o u al v a rá ba i x a d os c o m b ase n o ca p u t d o art i g o d e v e ser f u n d a m e n ta da cas o a cas o, v e da n d o
e x p ressa m e n te ás d ete r m i n a ç ões d e ca ráter g e né r i c o. T a m b é m n ã o d e v e ser acei t o o ar g u m e n t o
d e q ue o art. 72 d o E C A , d á m a r ge m p a ra q u e o j u i z a p l i q u e o u t ras m e d i d as d e p re v e n çã o, p o is
q u a n d o se t rata d e restr i çã o a d i re i t os f u n d a m e n ta is d e c r i a n ças e a d o l esce n tes a i n te r p retaçã o
n e cessar ia m e n te d e v e ser restr i t i v a, p r i n c i pa l m e n te q u a n d o ati n ge o stat us l i b e rtat is. O i l ust re
Ju i z d e F e r da n ó p o l i s e m se u art i g o j á c i ta d o, te nta suste n tar a l e ga l i da de d o t o q ue d e rec o l h e r
n este d i s p os i t i v o, se nã o v e j a m os:
E q u a n d o esta be l ece m e d i d as d e p re v e n çã o, o E stat ut o d a C r i a n ça e d o A d o l esce nte, n o art i g o
72, d i z q u e “as o b r i ga ç ões p r e v i stas n esta L e i n ã o e x c l u e m d a p r e v e n çã o es pec i a l o u t ras
d e c o r re ntes d os p r i n c í p i os p o r ela a d o ta d os”. Se g u n d o R o b e r t o Joã o E l i as, “ O d is p os i t i v o e m
q u estã o a b re e nse j o a q u e o u t ras o b r i ga ç ões, n o t o ca n te à p re v e n çã o espe c i a l, p ossa m ser
a d o ta das. D e p r ee n de-se q u e, a o q u e c o nsta, [o d i s p os i t i v o] n ã o e xa u re as m e d i das q u e p o d e m
ser t o m a d as, q u e, c o n t u d o, de pe n de rã o d e al g u m at o e m a na d o d e q u e te m c o m p e tê n c i a”. Pa ra o
E stat ut o, p o r ta n t o, é p ossí v e l a e d i çã o d e o u t ras m e d i d as d e p r e v e n çã o q u e nã o a pe nas as
e x p ressa m e n te i nst i t u í das n o E stat ut o (arti g os 74 a 85), des de q u e as m e d i das p re v e n t i v as seja m
c o n d i ze n tes c o m os p r i n c í p i os d o p r ó p r i o E s tat u t o, p a ra q u e a c r i a n ça e o a d o l esce nte te n h a m,
e nt re o u t r os, “la zer, d i v e rsã o, espetác u l os, p r o d u t os e ser v i ç os q u e res pe i te m sua c o n d i çã o
p e c u l i a r de p ess oa e m d ese n v o l v i m e n t o ” (arti g o 7 1).
O r a, c o m o j á suste n ta m o s e c o m a de v i d a v ê n i a, ta l e nte n d i m e n t o f e re d e m o r te o p r i n c í p i o da
l e ga l i d a de, q u e n ã o a d m i te i n ter p retaçã o e x te nsi v a o u a na l ó g i ca, p o i s at i n g e d i re i t os
f u n d a m e n ta is d e c r i a n ças e ad o l esce ntes.
8 C R IANÇAS E ADOLESCENTES CO M O VÍTI M AS SOCIA IS
N a v e r d a de, o t o q ue d e re c o l h er, c o m o i nst r u m e n t o aut o r i tá r i o e d e re p ressão selet i v a, v o l tará o
se u f o c o p a ra c r i a n ças e ad o l esce ntes p o b r es e d es va l i das, m a r g i na l i za das, q u e n ã o t i v e ra m u m a
f a m í l i a o u esc o l a, e q u e nã o te m n i n g u é m e n a da p a ra se p r o te ger d este m o d e l o c r ue l e
e x c l u d e n te d e E s ta d o. O Ju r ista T a r c ís i o M a r t i ns e m se u art i g o i n t i t u l a d o M e d i d as
S o c i oe d u cat i v as i d e n t i f i c o u c o m m a est r i a esse se g m e n t o v u l n e rá v e l:
Se a principal característica dos sistemas de controle social, em qualquer País do Mundo, é
a seletividade, esta se faz tanto mais expressiva quanto maior o contingente populacional
dos chamados excluídos, isto é, daqueles que historicamente, jamais tiveram acesso a
condições mínimas de bem-estar e de dignidade e, que, portanto, nunca se reconheceram
ou foram reconhecidos como cidadãos plenos pela sociedade e o Estado.
T r a ta-se, n a v e r da de, d os d i m i n u í d os ec o n ô m i c os, so c ia is, p o l í t i c os e c u l t u ra is, c i da dã os d e
se g u n d a c l asse, i n ca pa zes de e xe r ce r a c i d a da n i a e n q ua n t o d i re i t os d e ter d i re i t os.
N a v e r da de, a p a r ce l a m a i s a feta da, se m d ú v i d a, será a d os e x c l u í d os q u e n ã o d es f r u ta d os
m e s m os re c u rs os d as c r i a n ças d e c l asse m é d i a e al ta. O i ns i g ne f i l ós o f o c o n te m p o r â ne o R o n a l d
D w o r k i n e m sua o b ra i n t i t u l a da “ A v i r t u de S o be ra na” e x p l i c i ta:
N ã o se se g ue q u e tais restr i ç ões à l i b e r da de seja m, d e al g u m a f o r m a, i dê n t i cas p a ra t o d os.
I m a g i n e m o s q u e d uas p ess oas so f ra m d e restr i ç ões à l i be r da de de v i d o à m e s m a p r o i b i çã o l e ga l
i l e g í t i m a, m a s u m te m m a i s e a o u t ra m e n os re c u rs os n o r m a i s, e m ter m o s m o n e tár i os, d o q ue
ter ia m e m u m a d i st r i b u i çã o si m é t r i ca i d ea l. É te n ta d o r d i ze r q u e o d é f i c i t d e e q u i da de g e ra l d o
m a i s p o b r e p re c isa ser m a i o r d o q u e o d o r i c o, p o i s se u d é f i c i t d e l i be r da de é i d ê n t i c o, e só o
m a i s p o b r e te m d é f i c i t d e rec u rs os. M a s n ã o esta m o s m a i s cert os ao d i ze r q u e as restr i ç ões á
l i b e r d a de seja m i dê n t i cas d o q u e a o d i ze r q u e o d e u m é m a i o r d o q u e o d o o u t r o.
O t o q ue de re c o l h er, ta m b é m d e n o m i n a d o e u f e m i st i ca m e n te “t o q ue d e ac o l he r”, c o m o se
o bse r v a, f e re ta m b é m os p r i n c í p i os d a i g u a l da de e d a e q u i d a de. N a v e r d a de o t o q ue d e re c o l h er,
so b o f a l a c i os o d is c u rs o de m e d i d a d e p r o te çã o à c r i a n ça e a d o l esce n te, i m i s c u i n as o b r i g a ç õ es
d a f a m í l i a p a ra se t ra ns f o r m a r e m i nst r u m e n t o d e p u r i f i ca çã o d o m e i o so c ia l c o m a ret i ra da
ar b i t rá r i a d e m e n i n os e m e n i nas d e r ua, n o sent i d o d e c o n te r a v i o l ê n c i a j u v e n i l. N e sse se nt i d o,
T a r c is i o M a r t i ns n a m e s m a o b ra c i ta da, q u est i o n a:
O q u e te m f e i t o o E s ta d o B r as i l e i r o pa ra c o r r i g i r o d a r w i n i s m o so c ia l i m p ost o pe l as l e is de
m e r ca d o d i ta das p o r u m m o d e l o ec o n ô m i c o p e r v e rs o, h i st o r i ca m e n te c o n ce n t ra d o r d e re n das,
f á b r i ca d e m e n i n os e m e n i n as d e r uas?
É h o n est o d i ze r q ue a C o ns t i t u i çã o F e de ra l, p a rt i n d o d a c o n ce p çã o p os i t i v i sta d a i g u a l d a de d e
t o d os p e ra n te a l e i, o u t o r ga a t o d os eles as m e s m as o p o r t u n i d a des o u i g u a is p ossi b i l i d a des de
p r o m o ç ã o so c i a l?
A n e ga çã o d o re c o n h e c i m e n t o d a m e n o r i d a de m a r g i n a l c o m o u m g r u p o d i f e re nte, q u e e x i g e u m
trata m e n t o es pec i a l si m i l a r a o p r o p ost o p a ra as m i n o r i as ét n i cas e c u l t u ra is a b o r í ge nes, está
l e v a n d o à v i o l a çã o m assi v as d os d i re i t os f u n d a m e n ta is, so c i a is e c i v i s d os f r a g i l i za d os
i n te g ra n tes d esse g r u p o su b c u l t u ra l.
C o m o se d e p ree n de, o t o q ue d e rec o l he r ao esta be le cer q u e c r i a n ças e a d o l esce n tes,
i n d i f e re n te m e n te, n ã o pe ra m b u l e m p e l as r u as e l o g ra d o u r os p ú b l i c os, a p a r t i r d e de ter m i n a d o
h o r á r i o – 22 h o ras -, v i o l a v á r i os d is p os i t i v os c o nsta n te d o E C A , d a C o n st i t u i çã o F e d e ra l de
1 9 88, b e m c o m o de al g u m as c o n v e n ç õ es i n ter na c i o n a is, c o m o as d i retr i zes d e R i a d e a
c o n v e n çã o i n ter na c i o n a l so b re d i re i t os d e c r i a n ças d e 1 9 8 9. N e sse se nt i d o, o p a ís c o m o
si g n atá r i o d esses p a c t os i n te r na c i o n a is p o d e res p o n d e r p e ra n te a C o r te I n te ra m e r i ca na de
D i r e i t os H u m a n os e o u t ras i nstâ n c i as i n ter na c i o n a is. C o m o j ust i f i ca r q u e u m j o v e m d e 1 6 an os
q u e p o de v o ta r e v i a j a r p a ra q u a l q u e r l u g a r d o ter r i t ó r i o n a c i o n a l, nã o p ossa p e r m a n e ce r n as
r u as a p a rt i r d as 22 h o ras? C o m o j ust i f i ca r a p r i v a çã o d o se u d i re i t o à c o n v i v ê n c i a so c i a l
asseg u ra d o c o nst i t u c i o n a l m e n te, q u a n d o nã o c o m e te u q u a l q ue r at o i n f ra c i o na l? E o p r i n c i p i o d a
p r es u n çã o d a i n o cê n c i a, q ue esta be le ce q u e t o d o c i da dã o, seja ele a d o l esce n te o u a d u l t o d e v e
ser c o ns i d e ra d o p r es u m i v e l m e n te i n o ce n te até q u e h a ja u m a d e c isã o c o n de nat ó r i a tra nsi ta da e m
j u l g a d o?
C o m o se i n f e re, a p o r tar ia b a i x a d a pe l o Ju i z d e F e r d a n ó p o l i s nã o te m suste nta çã o j u r í d i ca e
d e v e ser re c ha ça da p e l os tr i b u na is p át r i os.
9 V I O L A Ç Ã O D AS D IRET RIZES D E RI A D E D A CO N V E N Ç Ã O I N TER N A CI O N A L D OS
D I R E I T O S D A S C R I A N Ç A S D E 1 989
O t o q u e de re c o l her, c o m o se n ã o b astasse, f e re f r o n ta l m e n te o art. 54 d as D i r et r i zes d as N a ç õ es
U n i d as Pa ra P re ve n çã o da D e l i n q u ê n c i a Ju v e n i l, ta m b é m c o n he c i da c o m o as d i ret r i zes d e R i a d,
q u e i m p e de à est i g m a t i za çã o e a i n c r i m i n a çã o d e c r i a n ças e a d o l esce n tes, se m q u e seja p o r
d e l i t o p re v ist o p re v i a m e n te e m l e i, nã o d e v e n d o so f re r trata m e n t o m a i s r i g o r os o d o q u e aq ue l e
d is pe nsa d o a o ad u l t o. R e za o art. 54, d as D i r e t r i zes d e R i a d de 1 9 90 “i n v e r b i s”:
A r t. 54 – C o m o o b j et i v o d e i m p e d i r q ue se p r ossi ga à est i g m a t i za çã o, à v i t i m i za çã o e à
i n c r i m i n a çã o d os j o v e ns, d e v e rá ser p r o m u l g a da u m a l e g is la çã o p e l a q u a l seja g a ra nt i d o q u e
t o d o at o q u e n ã o seja c o ns i d e ra d o u m d e l i t o, n e m seja p u n i d o q u a n d o c o m e t i d o p o r u m a d u l t o,
ta m b é m n ã o d e v e rá ser c o ns i de ra d o u m d e l i t o, n e m ser o b j et o de p u n i ç ã o q ua n d o f o r c o m e t i d o
p o r u m j o v e m.
N a v e r d a de, as D i r et r i zes d e R i a d, a o l o g o d e suas 66 re g ras, b us ca f u n d a m e n ta l m e n te e v i tar a
esti g m a t i za çã o e a p r ó p r i a e x c l usã o e m a r g i na l i za çã o d a c r i a n ça e d o a d o l esce nte, re f o r ça n d o o
p a pe l da c o-res p o nsa b i l i da de d a f a m í l i a, d a so c i e da de e d o p r ó p r i o p o d e r p ú b l i c o, n o se nt i d o d e
se a bster d e a d o tar i n te r v e n ç ões a ut o r i tár ias e ar b i t rá r i as n os d i re i t os f u n d a m e n ta is de p essoas
m e n o res d e 1 8 a n os. C o m e fe i t o, re f o r ça e esti m u l a a a p l i ca çã o d e m e d i das soc i oe d u cat i v as e m
m e i o a be rt o, e v i ta n d o-se o m á x i m o a p r i v a çã o d e l i b e r da de d a c r i a n ça q ue ai n da está n a pe c u l i a r
c o n d i çã o d e p essoa e m d ese n v o l v i m e n t o. O t o q u e d e re c o l he r sur ge n a c o n t ra-m ã os d essas
d i ret r i zes, p o is m o l esta, a feta, o d i re i t o f u n d a m e n ta l d e c r i a n ças e a d o l esce ntes d e i r e v i r nas
r u as e l o g r a d o u r os p ú b l i c os, ret i ra n d o-os c o m p u l s o r i a m e n te d esses l u g a res , q u a n d o est i v e re m,
f o ra d a esc o l a o u q u a n d o e x t ra p o l a re m o h o rá r i o d as 22 h o ras f i x a d o p e l o Ju i z d a I n f a n c i a e
Ju ve n t u de. E ssa si t ua çã o nã o ac o n tece c o m o i m p u tá v e l m a i o r d e 1 8 a n os d e i da de. O b se r v e q u e
esse p r o ce d i m e n t o – estar f o ra d a sala d e a u l a e n a r u a, o u estar p e ra m b u l a n d o p e l as r u as a p ós
d eter m i n a d o h o rá r i o – n ã o é c r i m e p r e v i st o na l e g is l açã o p e na l. L o g o, se n ã o o a d u l t o n ã o p o de
ser m o l esta d o e m sua l i b e r da de p o r esse f a t o, a c r i a n ça e ad o l esce nte ta m p o u c o. A r i g or, c o m o
se sa be, esse c o n t r o l e d e v e ser f e i t o p r i m a r i a m e n te pe l a f a m í l i a, q u e d e v e ter a l i b e r da de d e
e d u ca r e c r i a r se u f i l h o e a d o ta r as m e d i d as p e rt i ne n tes p a ra tal m i s ter. L ó g i c o, q ue o E C A
q u a n d o a ut o r i z o u a i n ter v e n çã o d o E sta d o o f e z e x p l i c i ta m e n te n os d i s p os i t i v os q u e restr i n ge o u
p r o í b e o acess o de c r i a n ças e a d o l esce n tes. D e sta f o r m a, n ã o d ú v i d a, de q u e o t o q ue d e rec o l h e r
f e re o art i g o 54 d as D i r et r i zes d e R i a d. A d o u t o ra K a t h i a R e g i n a M a r t i ns C h e n u t e m se u art i g o
i n t i t u l a d o “ A d o l esce ntes e m c o n f l i t o c o m a l e i: O m o d e l o d e i n ter v e n çã o p re c o n i za d o p e l o
D i r e i t o I n te r na c i o na l d os D i r e i t os H u m a n os”, e x p l i c i ta f u n d a m e n ta da m e n te so b re as d i retr i zes
d e R i a d:
Na verdade, comportamentos que não são punidos quando o autor é maior de idade, não o
devem ser quando o autor for menor de idade. Um dos pontos fundamentais e inovadores
deste conjunto de regras é a definição ampla da privação de liberdade, não se atendo à
detenção em estabelecimento penitenciário. Esta proteção estende-se a toda forma de
internação em estabelecimento público ou privado, do qual o jovem não pode sair por sua
livre e espontânea vontade, estando sua saída condicionada a uma decisão judicial,
administrativa ou proveniente de qualquer outra autoridade pública.
O t o q u e de re c o l her, a o p r i v a r o d i re i t o d e i r e v i r d e c r i a n ças e a d o l esce n te, c o m b ase e m u m a
d e c isã o j u d i c i a l g e né r i ca, ati n ge o stat us l i be r tat is, p o i s o j o v e m é i m p e d i d o d e t ra ns i tar n as r uas
e m d ete r m i n a das sit uaç ões e h o rá r i os, e f i ca c o n d i c i o na d o a u m a d e c isã o o u a v o n ta de d e
a ge n tes p ú b l i c os.
O t o q u e de re c o l he r ta m b é m f e re o art. 40, I I, “a” d a C o n v e n çã o I n te r na c i o na l d os D i r e i t os d e
C r i a n ça d e 1 9 89, q u e p resc re v e q u e:
Não se alegue que nenhuma criança tenha infringido as leis penais, nem se acuse ou
declare culpada nenhuma criança de ter infringido essas leis, por atos ou omissões que não
eram proibidos pela legislação nacional ou internacional no momento em que foram
detidos.
O r a, c o m o se d e p ree n de, as c r i a n ças e a d o l esce n tes sã o su je i t os de d i re i t os e c o m o ta l tê m
g a ra n t i as, c o m o o d e só sere m ati n g i d os n o stat us l i b e rtat is n as h i p ó teses e x p ressa m e n te
p r e v i stas e m l e i, d e v e n d o ser c o ns i de ra d o i n o ce n te até q u e se c o m p r o v a atra v és d o d e v i d o
p r o c esso l e ga l á sua c u l p a b i l i da de, n ã o d e v e n d o ser o b j et o de i n te r v e n ç ões ar b i t rár i as d e a ge n tes
p ú b l i c os e q u e p ossa m ca usar-l hes c o nst ra n g i m e n t os e v e x a m es.
10 DI RE I TO A RG ENTINO
O o r d e na m e n t o j u r í d i c o ar ge n t i n o a de r i u t ota l m e n te a C o n v e n çã o I n te r na c i o na l d os D i r e i t os d a
C r i a n ça d e 1 9 89 – C o n v e n çã o I n te r na c i o na l so b re L o s D e r e c h os D e l N i ñ o – so m e n te e m 28 d e
sete m b r o d e 2005 c o m a san çã o da L e i nº 26.06 1, q u e re v o g o u a l e i 1 0.903 d o Pat r o n at o d e
M e n o r es, ac o l he n d o assi m, n a sua í n te g ra a d o u t r i n a d a p r o teçã o i n te g ra l e aba n d o n a n d o
d e f i n i t i v a m e n te a d o u t r i n a d a sit ua çã o i r re g u l ar. N e sse se nt i d o, E m í l i o G a r c i a M é n d e z
p r e l e c i o na:
Argentina, país pioneiro em la región em lá producción de una legislación “ compassivarepresiva” específica, para los hijos de los primeros inmigrantes ( ley de patronato 10.903
de 1919), resulto practicamente el último en adecuar sua vieja legislación AL espíritu e la
letra de La Convención Internacional sobre los Derechos del Niño.
A s s i m, a L e i nº 26.06 1 al ç o u a pessoa até 1 8 a n os d e i da de a c o n d i çã o d e su je i t os d e d i r i e i t os e
t i t u l a res d e d i re i t os f u n d a m e n ta is, v e da n d o ta m b é m q ua l q u e r i n te r v e n çã o d o E s ta d o, m e s m o q u e
so b o p r ete x t o d e p r o te çã o, q u e v e n h a at i n g i r a sua a ut o n o m i a e l i b e r d a de, se m q u e ha j a
p r e v i sã o l e ga l e o bse r v â n c i a ao d e v i d o p r o cesso l e ga l. O s j u r istas ar ge nt i n os L a u r a R o d r i g u e z e
E r n est o B l a n k , c o m e n ta n d o so b re a “ L a p r o te c c i ó n d e p e rs o na ” e x p l i c i ta:
La protección de persona há sido um puerta de entrada e La judicialización de cuestiones
sociales ejecutando uma ‘ política social judicial” para las famílias com carências
materiales, o “mal’ constituídas según el critério del juez interviniente.
[.....]
La proteccion de persona vulnera el principio de legalidad, em tanto no se encuentran
definidas claramente las causales de procedencia. Nada limita La actividad del juez,
ningún critério objetivo que conduza sua decisión, ningún tipo de taxatividade em sua
intervención o control de sua actividad.
C o m o se i n f e re o “t o q ue d e rec o l h e r” g u a r da ce rta si m i l i t u d e c o m a “la p r o te c c i ó n d e p e rs o na’
d o D i r e i t o A r g e n t i n o, p o is sã o i nstr u m e n t os da v e l ha d o u t r i na d a si t ua çã o i r re g u l ar, de caráter
t u te l ar, q u e ce n t ra l i za a d e c isã o nas m ã o s d o j u i z, q u e res o l v e o cas o c o m e x cessi v a car ga d e
d is c r i c i o n a r i e da de e se m o bser v a r o p r i n c í p i o d a l e ga l i da de o u o d e v i d o p r o c esso l e ga l, é d i zer,
se m a o bser v â n c i a d as g a ra n t i as c o nst i t u c i o n a is asse g u ra das à c r i a n ça e a d o l esce n tes, c o m o
v e r da de i r os su j e i t os d e d i re i t os.
11 CONSIDE RA ÇÕES FINAIS
C o m o se d e p ree n de, p e l o q u e f o i e x p ost o, o t o q u e de re c o l he r o u ac o l her, c o m o
e u fe m i st i ca m e n te f o i su ger i d o, c o nst i t u i u m i nstr u m e n t o a ut o r i tá r i o, t í p i c o d e E s ta d o t o ta l i tá r i o,
q u e e xs ur ge n a c o n t ra-m ã o da e v o l u ç ã o h ist ó r i ca d os d i re i t os i n f a n t o-j u v e n i l e q ue n os f a z
ret r o ce de r á eta pa d a d o u t r i na da sit ua çã o i r re g u l ar, n a q u a l “os m e n o res” era m d es p r o v i d os de
q u a l q ue r g a ra n t i a c o nst i t u c i o n a l, se n d o, p o r ta n t o, c o ns i d e ra d os m e r os o b j et os d e i n te r v e n çã o d o
E sta d o, m a n i p u l a d os e m se us d i re i t os f u n d a m e n ta is p e l os su per p o d e res d o t o d o p o d e r os o j u i z
d e m e n o r es.
C o m e fe i t o, o t o q u e d e re c o l he r v i o l a os d i re i t os f u n d a m e n ta is d e c r i a n ças e ad o l esce ntes
c o nsta n te d o art. 227 d a C F d e 1 9 9 8, p r i n c i pa l m e n te, n o q u e t o ca a o d i re i t o d a l i be r da de d e i r e
v i r, d i g n i d a de h u m a n a e os d i re i t os à c o n v i v ê n c i a c o m u n i tár i a, b e m c o m o o art.54 d as D i r et r i zes
d e R i a d, o art. 40, I I, “a” d a c o n v e n çã o i n te r na c i o n a l d os D i r e i t os d a C r i a n ça d e 1 9 8 9, alé m d e
v á r i os d i s p os i t i v os d o E C A (art. 4º, 1 5, 1 6, I, 1 8 e 1 4 9), os q u a is c o ns o l i da m a c o n d i çã o d e
su je i t os de d i re i t os d e c r i a n ças e a d o l esce n te. D e sta rte, o t o q u e d e re c o l he r te m u m caráter
i nesc o n d í v e l d e d e fesa so c i a l, n ã o se re v est i n d o d e ne n h u m atr i b u t o p e da g ó g i c o, sen d o,
p o r ta nt o, u m i nstr u m e n t o esp ú r i o e v i o l a d o r de d i re i t os h u m a n os e q ue d e v e, p o r ta nt o, ser
re c ha ça d o pe l o j u i z d a i n f â n c i a e j u v e n t u de, q u e é, de f at o e d e d i re i t o, o v e r da de i r o g u a r d i ã o
d as g a ra n t i as e d i re i t os i n d i v i d u a is asse g u ra d os n a C o n st i t u i çã o F e d e ra l de 1 9 8 8, n as
C o n v e n ç õ es i n ter na c i o na is i n c o r p o r a das p e l o o r d e na m e n t o j u r í d i c o p át r i o e ta m b é m d o E stat ut o
d a C r i a n ça e d o A d o l esce nte.
REFE RENCIAS BIBL IOG RÁFI CAS
A N D R A D E, V a n d e r F e r re i ra. A d i g n i da de d a p ess oa h u m a n a: v a l o r-f o n te d a o r de m j u r í d i ca.
Sã o Pa u l o: C a u te la, 2007.
B Í B L I A . P o r t u g u ês. B í b l i a sag ra da. T r a d u çã o d o C e n t r o B í b l i c o C a t ó l i c o. 34. e d. rev. Sã o
Pa u l o: A v e M a r i a, 1 9 82.
B R A S I L. C o n st i t u i çã o F e de ra l d e 1 9 8 8. D i s p o n í v e l e m: . A c ess o e m: 20 o u t.20 1 0.
B R A S I L. S iste m a N a c i o n a l d e A t e n d i m e n t o S o c i o e d u c at i v o. Se c retar i a E s pe c i a l d os D i r e i t os
H u m a n os/C O N A N D A . B r as í l i a-D F : C O N A N D A , 2006.
C H E N U T, K á t h i a R e g i n a M a r t i ns. A d o l es ce n te e m C o n f l i t o c o m a L e i: O m o d e l o d e I n te r na çã o
P re c o n i za d o pe l o D i r e i t o I n te r na c i o n a l d os D i r e i t os H u m a n os. R e v i sta d o I L A N U D . Sã o Pa u l o:
I L A N U D , 2003.
C O M P A R A T O , F á b i o K o n d er. F u n d a m e n t os d os D i r e i t os H u m a n os. R e v i sta D i r e i t o H u m a n os.
Sa l v a d o r: e d i t o ra Jus p o d i v m, 20 1 0.
C U R Y, M u n i r (coo r de na d o r). E s tat u t o d a C r i a n ça e d o A d o l es ce n te C o m e n ta d o. C o o r d e na d o r
M u n i r C u r y. Sã o Pa u l o: M a l h e i r os, 2005.
D W O R K I N , R o n a l d. A v i r t u de so bera na: a te o r i a e p r át i ca d a i g u a l da de. T r a d u çã o Jussara
S i m õ es. Sã o Pa u l o: M a r t i ns F o n tes, 2005.
M A C H A D O , M a r t h a d e T o l e d o. A P r o teçã o c o nst i t u c i o na l d e c r i a n ças e a d o l esce n tes e os
d i re i t os h u m a n os. B a r u e r i-S P: M a n o l e, 2003.
M A R T I N S, T a r c is i o. M e d i d as S o c i o e d u c at i v as. I n: I C o n g ress o d a A s s o c i a çã o I n te r na c i o n a l
(M E R C O S U L) d os Ju í zes d a I n f â n c i a e d a Ju v e n t u de. R e v i sta d a A B R A M I N J. R e c i f e:
C o m u n i g ra f E d i t o ra, 1 9 98.
M É N D E Z , E m i l i o G a r c i a. H i j os y ente na d os. P r o te c c i ó n I n te g ra l d e D e r e c h os d e N i ñ as, N i ñ os
y A d o l esce ntes: A n á l is is d a L a L e y 26.06 1. 2ª ed. B u e n os A i r es: D e l P ue rt o, 2008.
M E N D É Z , E m í l i o G a r c i a. E v o l u ç ã o H i s t ó r i ca d o d i re i t o d a i n f â n c i a e da Ju v e n t u de. R e v i sta
Just i ça, A d o l es ce n te e A t o I n f ra c i o na l: so c i oe d u ca çã o e res p o nsa b i l i za çã o. Sã o Pa u l o:
I L A N U D , 2006.
P E R A L I N , E v a n d r o. T o q u e de R e c o l he r pa ra C r i a n ças e A d o l esce ntes. D i s p o n í v e l n o si te:
w w w. a b ra m i n j. or g.br. A c ess o e m 22 o u t.20 1 0.
R O D R Í G U E Z, L a u ra; B L A N K , E r n est o. L e y 26.06 1: i n ter v e n c i ó n estatal y m e d i das d e
p r o te c c i ó n. P r o tec c i ó n I n te g ra l d e D e r e c h os d e N i ñ as, N i ñ os y A d o l es ce n tes: A n á l i s is de l a L e y
26.06 1. 2ª E d. B u e n a os A i r es: D e l P u e rt o, 2008.
S A R A I V A , Joã o B a t ista C o s ta. C o m p ê n d i o d e D i r e i t o Pe na l Ju v e n i l: a d o l esce nte e at o
i n f r a c i o n a l. 3ª e d. P o r t o A l e g r e: L i v r a r i a d o A d v o g a d o, 2006.
S A U T, R o b e r t o D i n i z. O N o v o D i r e i t o d a C r i a n ça e d o A d o l es ce n te: u m a ab o r da ge m p ossí v e l.
B l u m e n a u: E d i f u r b, 2008.
S I L V A , José A f o n s o d a. A d i g n i d a de da p essoa h u m a n a c o m o v a l o r su p re m o d a d e m o c r a c i a.
R e v i sta d e D i r e i t o A d m i n i st rat i v o. R i o d e Ja ne i r o, 2 1 2:89-94, a b r/ju n, 1 9 9 8.
V I A N N A , G u a ra c i d e C a m p o s. D i r e i t o i n f a n t o-j u v e n i l:
m u l t i d is c p l i n a res. R i o d e Ja ne i r o: F r e i tas B a st os, 2004.
te o r i a,
p rát i ca
e
as pect os
V I A N N A , G u a ra c i d e C a m p os. O C ó d i g o d e M e l l o M a t t os e o E s tat u t o d a C r i a n ça e d o
A d o l es ce n te. C o n e x õ es. R e v i sta d a E m e r j, v. 1 0, e d. E s p e c i a l. R i o d e Ja ne i r o: E M E R J, 2007.

Documentos relacionados