estafilococos coagulase-negativa

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estafilococos coagulase-negativa
NESTE NÚMERO:
• O ABC DA ASMA
• AVALIAÇÃO CLÍNICA DO TRATAMENTO CIRÚRGICO
DA HIPERIDROSE
• REVALIDAÇÃO DO TÍTULO DE ESPECIALISTA —
GARANTIA DE QUALIDADE NO ATENDIMENTO?
E AINDA SEÇÕES E INFORMAÇÕES
NOV./DEZ., 2007 • VOL. 93 • N.os 5/6
ESTAFILOCOCOS
COAGULASE-NEGATIVA
RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS
ISSN 0047-2077
NOV./DEZ., 2007 • ESTAFILOCOCOS COAGULASE-NEGATIVA — RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS • VOL. 93 • N.os 5/6
• CURSO ATUALIZAÇÃO EM CARDIOLOGIA — AULA 8
— ARRITMIAS PARA CONDUTA CLÍNICA
EDITORIAL
ISSN 0047-2077
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PUBLICAÇÕES DO GRUPO: Jornal Brasileiro de
Medicina, Dicionário de Especialidades Farmacêuticas,
Atualização Médica Contínua e LiveMed Brasil.
São inegáveis os progressos derivados da introdução dos
antibióticos na prática médica. Contudo, a partir do momento em
que os mesmos passaram a ser amplamente utilizados surgiu o
fenômeno da resistência bacteriana. No estudo realizado pelo
Dr. João Carlos de Oliveira Tórtora e equipe, que é a matéria de capa
desta edição do JBM, avaliou-se a resistência de 36 amostras de
estafilococos coagulase-negativa, isoladas de hemoculturas de
pacientes internados em hospital público da cidade do Rio de
Janeiro. Afirmam os autores que estes estafilococos estão
associados à presença de corpos estranhos, como válvulas
protéticas, próteses ortopédicas, cateteres intravasculares, urinários
e de diálise, sendo atualmente reconhecidos como verdadeiros
patógenos, associados a graves morbidades. A pertinência do
assunto, com suas implicações na prática médica, é mais do que
motivo para uma leitura atenta.
Outro assunto que certamente despertará sua atenção diz respeito
à asma. É muito importante que os profissionais de Medicina, seja
qual for a especialidade, nos consultórios e nas unidades de
emergência, obtenham o máximo possível de informações sobre
esta moléstia. Assim eles serão capazes de identificá-la e orientar o
seu tratamento, como pensa o Dr. Hisbello S. Campos, médico do
Centro de Referência Professor Helio Fraga, que oferece aos leitores
valiosas informações sobre a doença no trabalho O ABC da Asma.
Diz o articulista que a asma é uma importante causa de consultas
médicas e de hospitalizações em nosso País.
Um motivo a mais para sua leitura deste número de JBM é uma
questão que interessa aos profissionais de todas as especialidades.
É consenso que a qualidade do atendimento médico é uma meta que
deve ser constantemente perseguida, ainda mais nesta época de
consideráveis avanços da Medicina e de grande quantidade de
informações sobre novas drogas e procedimentos à disposição dos
pacientes. Diante deste cenário, quatro conceituados médicos
discutem aspectos relacionados à revalidação do título de
especialista. Os autores afirmam que sem um programa de
educação ativa nenhum médico pode se manter atualizado por mais
do que alguns anos após a sua formação. Deste modo, a revalidação
(e não a recertificação, já que o título de especialista é permanente) é
extremamente necessária, o que realça a importância dos programas
de atualização médica contínua. Mas, ela é garantia de qualidade no
atendimento? Não deixe de conhecer mais sobre esse tema tão
atual.
Nossa disposição no sentido de fornecer cada vez mais aos
leitores um material útil para o seu dia-a-dia profissional não pára por
aqui: uma equipe da Universidade Católica de Brasília, composta por
médicos e fisioterapeuta, traz atualidades sobre a síndrome da
bexiga hiperativa, uma condição comum que afeta cerca de 16% a
22% dos adultos nos EUA; o tratamento cirúrgico da hiperidrose,
produção excessiva de suor que aflige 0,6% a 1% da população
mundial, é avaliado clinicamente em trabalho produzido pelo
Prof. Luiz Felippe Júdice e equipe; e o curso de Atualização em
Cardiologia, já em sua oitava aula (Arritmias para Conduta Clínica),
completa esta última edição de 2007 de JBM.
Boa leitura.
A Redação
Membro Fundador do
Global Alliance for Medical Education
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
3
SUMÁRIO
EDITORIAL
3
• Estafilococos Resistentes
ARTIGOS
10
• O ABC da Asma
Dr. Hisbello S. Campos
26
• Resistência aos Antimicrobianos em Estafilococos Coagulase-negativa
Isolados de Hemocultura
Drs. Paula Marcele Afonso Pereira, Eduardo Almeida Ribeiro de Castro, José
Augusto Adler Pereira e João Carlos de Oliveira Tórtora
SEÇÕES
CURSO
30
• Avaliação Clínica do Tratamento Cirúrgico da Hiperidrose
Drs. Flavio Nunes Fialho Neto, Natalia Parisi Severino, Omar Moté Abou Mourad,
Ângelo Mesquita Júdice, Filipe Moreira de Andrade e Luiz Felippe Júdice
41
• Revalidação do Título de Especialista — Garantia de Qualidade no Atendimento?
Drs. Fabio Biscegli Jatene, Rosangela Monteiro, Wanderley Marques Bernardo e
Aldemir Humberto Soares
6
57
59
65
• PANORAMA INTERNACIONAL
44
• CONGRESSOS
• NOTICIÁRIO
• ÍNDICE GERAL
• ATUALIZAÇÃO EM CARDIOLOGIA
Coordenador: Dr. Hans Fernando Rocha Dohmann
Aula 8 — Arritmias para Conduta Clínica
Drs. Luiz Eduardo Camanho, Fernanda Ferreira, Ieda Prata,
Paulo Maldonado, Angelina Camiletti e Eduardo Saad
CONSELHO CIENTÍFICO - Presidente: Prof. Moacyr Pádua Vilela
BAHIA
Heonir Rocha
Zilton A. Andrade
PARÁ
Raimundo Geraldo
Viana Sales
BRASÍLIA
Aluízio Prata
José Antônio Ribeiro
Filho
PARANÁ
Dalton Paranaguá
MINAS GERAIS
José Laurentis
Luiz de Paula Castro
Sebastião Cabral Filho
4
PERNAMBUCO
Amauri Coutinho
Rui João Marques
RIO DE JANEIRO
Aderbal Sabrá
Affonso B. Tarantino
Álvaro Accioli
Claudio Mallet Zarur
Clementino Fraga Filho
Gilberto Perez Cardoso
Jorge Alberto Costa e Silva
José Galvão Alves
Júlio de Moraes
Lourival Ribeiro
Marta Carvalho Galvão
Paulo Belfort
Reinaldo de Menezes Martins
Stans Murad Netto
NOV./DEZ., 2007
SÃO PAULO
Capital
Adib Jatene
Aldo Fazzi
Antônio Atílio Laudana
Chible M. Haddad
Eduardo Marcondes
Eulógio Martinez Filho
Manoel Lopes dos
Santos
Stephan Geocze
Wilson Cosermelli
VOL. 93 • N.os 5/6
Botucatu
Álvaro Oscar Campana
Domingos Alves Meira
Oswaldo Melo da Rocha
Campinas
Frederico Borges de Camargo
Sílvio dos Santos Carvalhal
Ribeirão Preto
José Augusto Laus
Rui Ferreira Santos
SANTA CATARINA
Waldomiro Dantas
O ABC da Asma
PNEUMOLOGIA
O ABC da Asma
Introdução
HISBELLO S. CAMPOS
Médico do Centro de Referência Prof. Helio Fraga.
RESUMO
A asma afeta parcela significativa da população global, representando um importante problema de Saúde Pública em muitos países. Resultado da interação entre fatores genéticos e
ambientais, a asma tem complexos e imbricados mecanismos
patogênicos, desenvolvidos em conseqüência do comportamento anormal da maior parte das células constituintes do aparelho respiratório. Doença crônica, de caráter inflamatório, não
pode ser curada. Os sintomas e as disfunções por ela causados interferem no cotidiano de seus portadores. Entretanto, o
tratamento adequado, se instituído precocemente, pode controlá-la e permitir ao asmático ter uma vida normal. Dado ser
causa freqüente de atendimento médico em consultórios e em
unidades de emergência, bem como razão de elevado número
de hospitalizações, é importante que o médico, independentemente de sua especialidade, esteja capacitado para identificála e orientar o seu tratamento.
Unitermos: Asma; diagnóstico de asma; tratamento da asma.
SUMMARY
Asthma affects a significative proportion of the global population and is an important Public Health problem in many countries. It results from the interaction of genetic and environmental
factors. Its complex pathogenic mechanisms are a consequence of the abnormal behaviour of part of the cells that form the
respiratory system. An inflammatory, long term condition, asthma cannot be cured and its symptoms interfere with the dayto-day activities of those with asthma. If correct treatment is
initiated promptly, it can be controlled and the patient can live
a normal life. As asthma is a frequent reason for medical consultations, emergency unit use and hospitalizations, it is important that medical physicians, independently of their speciality,
are able to diagnose and treat asthma.
Keywords: Asthma; asthma diagnosis; asthma treatment.
10
NOV./DEZ., 2007
A asma, uma doença inflamatória crônica das vias aéreas,
é responsável por grande utilização dos serviços de saúde,
motivando atendimentos repetidos em pronto-socorros e
em ambulatórios, hospitalizações e despesas elevadas para
seus portadores, comunidades e governos. Aparentemente,
sua prevalência está aumentando, tanto em países
desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento,
afetando pessoas de todas as idades, raças e grupos
étnicos (1 ). Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS)
permitem estimar que entre 100-150 milhões de pessoas
em todo o mundo — 4% a 12% da população — sofrem
de asma, com as taxas aumentando em todos os grupos
etários, embora essas tendências sejam mais marcantes
entre as crianças (2 , 3 ). Sua distribuição é variada:
prevalência próxima a zero em algumas regiões, e a 30%
em outras (4 , 5 ). Os principais fatores responsáveis por
essa variação certamente incluem diferenças genéticas
entre as diversas etnias, as características ambientais locais
e os meios diagnósticos empregados.
A asma é uma relevante causa de consultas médicas
e de hospitalizações em nosso País. Se forem excluídas
as hospitalizações relacionadas à gravidez e ao parto
(Capítulo 11 da CID-9), ela costuma estar situada entre as
cinco principais causas de hospitalização nos serviços
financiados pelo SUS (6 ). No Brasil, segundo as
estatísticas oficiais de mortalidade, a asma causou cerca
de 2.200 mortes, ao ano, nas últimas duas décadas, 70%
delas ocorrendo em hospitais. Ela ocupa, em média,
a 65ª posição como causa de morte (7 ) e motiva elevado
número de atendimentos de emergência. Ao mesmo
tempo em que, globalmente, sua letalidade não pode ser
considerada alta, deve-se destacar que, em 80% das
vezes, a morte poderia ter sido evitada se os cuidados
adequados tivessem sido tomados a tempo.
Por ser tão freqüente, é importante que o médico,
independentemente de sua especialidade, esteja
capacitado para diagnosticar e traçar as linhas gerais de
tratamento, referendando para o especialista apenas o
asmático cujo controle adequado não foi possível com as
ações básicas. Assim, neste artigo, serão apresentados
os principais aspectos relacionados ao diagnóstico e às
linhas mestras do tratamento da asma.
Definição de asma
Na asma, todas as células do trato respiratório, tanto
as estruturais como as funcionais, interagem, gerando
VOL. 93 • N.os 5/6
O ABC da Asma
uma alteração inflamatória das
clínica, no exame físico e em
vias aéreas. Particularmente os
exames complementares,
mastócitos, eosinófilos,
incluindo a espirometria. Na
linfócitos T, macrófagos,
maior parte das vezes, os
or ser tão freqüente, é importante
neutrófilos, assim como as
sintomas surgem na infância e
que o médico, independentemente
células epiteliais e musculares
são recorrentes. Se iniciados na
de sua especialidade, esteja
lisas, têm sido diretamente
idade adulta, é importante fazer
capacitado para diagnosticar e
relacionados ao processo
o diagnóstico diferencial
inflamatório característico
com doenças cardíacas e
traçar as linhas gerais de tratamento,
da asma. É provável que o
principalmente com a
referendando para o especialista
comportamento celular alterado
doença pulmonar
apenas o asmático cujo controle
seja conseqüência da carga
obstrutiva crônica (11 ).
adequado não foi possível com
genética envolvida com
A asma na criança difere da
a patogenia da doença.
dos adultos em alguns aspectos
as ações básicas
Nas pessoas com essa
clínicos e anatômicos. O padrão
predisposição genética, o
e a gravidade da asma na
processo inflamatório causa
infância variam enormemente e,
episódios recorrentes de
na maioria das crianças, ela
dispnéia, sibilos, sensação
desaparecerá ou melhorará com
de aperto no peito e tosse,
a idade. Um dado freqüente na
particularmente à noite ou ao amanhecer. Esses
criança asmática é a asma induzida pelo exercício (AIE),
episódios estão usualmente associados a graus
na qual os sintomas são desencadeados por esforços
variáveis de obstrução ao fluxo aéreo e são reversíveis
vigorosos e prolongados.
espontaneamente ou através de tratamento adequado
História clínica
(8 ). A inflamação também causa resposta exagerada das
vias aéreas a uma grande variedade de estímulos
A presença de um ou mais dos sintomas a seguir faz
(hiper-responsividade brônquica — HRB) (9 ). Os gatilhos
pressupor o diagnóstico de asma:
potenciais para o processo inflamatório incluem:
P
• Alergia.
• Infecções virais respiratórias.
• Irritantes respiratórios (fumaça do tabaco, poluentes
aéreos, poeiras ocupacionais, gases e produtos
químicos).
• Determinados fármacos.
• Estímulos inespecíficos, como ar frio e exercício.
A obstrução ao fluxo aéreo (estreitamento excessivo
das vias aéreas) na asma é o resultado da contração da
musculatura lisa que envolve os brônquios e do aumento
do volume da parede da via aérea, que é devido a:
•
•
•
•
•
•
•
Hipertrofia e hiperplasia do músculo liso.
Infiltração de células inflamatórias.
Edema.
Hiperplasia de células glandulares na mucosa.
Hipersecreção de muco.
Depósito de proteínas, incluindo colágeno.
Descamação epitelial.
•
•
•
•
Sibilos.
Aperto no peito.
Dispnéia.
Tosse.
O diagnóstico de asma deve ser considerado sempre
que os sintomas forem:
• Recorrentes ou sazonais.
• Piores à noite ou ao amanhecer.
• Desencadeados por exercício, irritantes, fatores
alérgicos ou infecções virais.
• Rapidamente aliviados por broncodilatadores.
Na maioria das crianças, o diagnóstico baseia-se
na história de sibilos recorrentes ou persistentes,
na ausência de qualquer outra causa aparente.
Habitualmente:
• Os sibilos devidos à asma são acompanhados por
tosse, dispnéia ou ambas.
A maior quantidade de secreção brônquica na luz da
via aérea também colabora para a obstrução ao fluxo
aéreo. A interação entre o processo inflamatório e a carga
genética pode causar mudanças permanentes na via
aérea: remodelamento brônquico (RB). Essas alterações
incluem maior quantidade de músculo liso peribrônquico,
aumento da vascularização brônquica, espessamento da
camada colágena e perda da distensibilidade normal das
vias aéreas. O RB é o fator responsável pela persistência
dos sintomas e disfunções observados na asma, dando o
caráter crônico à doença (10 ).
• Uma história de eczema, urticária ou de asma em
parentes diretos suporta o diagnóstico.
• Em crianças menores ou em bebês é difícil distinguir o
primeiro episódio de asma de determinadas infecções
do trato respiratório (bronquiolite aguda ou viral).
Os sintomas de asma variam enormemente de pessoa
para pessoa. A ausência de sintomas típicos não exclui o
diagnóstico de asma. Na suspeita diagnóstica, deve-se
perguntar sobre:
Diagnóstico e classificação da asma
• Padrão dos sintomas.
• Fatores desencadeantes ou agravantes de sintomas
Não há um “padrão ouro” para o diagnóstico de asma.
Basicamente, o diagnóstico fundamenta-se na história
• Características do ambiente domiciliar ou do trabalho.
• História familiar de asma e de atopia.
(p. ex.: exercício, infecções virais, alérgenos, etc.).
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VOL. 93 • N.os 5/6
11
O ABC da Asma
Exame físico
Deve-se examinar o tórax buscando hiperinsuflação e
sibilos, assim como procurar por sinais de rinite alérgica,
que, habitualmente, coexiste com a asma. É importante
lembrar que:
diagnóstico. Finalmente, é possível que outros exames —
eosinofilia no escarro e óxido nítrico exalado — venham a
fazer parte dos métodos rotineiros de diagnóstico de
asma no futuro.
Assim, num adulto, o diagnóstico de asma pode ser
feito com razoável margem de segurança quando:
• Sibilos são sinais sugestivos, mas não diagnósticos de
• A pessoa tem sintomas variáveis (especialmente tosse,
asma.
• A ausência de sinais físicos não exclui o diagnóstico de
asma.
• Estertores à ausculta indicam diagnóstico alternativo ou
associado.
aperto no peito, sibilos e dispnéia); e
• A espirometria demonstra limitação ao fluxo aéreo
significativamente reversível.
Medidas seriadas do PFE ao longo do tempo podem
ajudar no diagnóstico. Ele é muito provável se:
Exames complementares
• A medida varia pelo menos 20% (ou > 60l/min) por três
A espirometria é o único exame complementar que
dias ao longo de várias semanas; ou
• O PFE aumenta pelo menos 20% como resposta ao
pode auxiliar no diagnóstico ou na avaliação da resposta
tratamento da asma.
ao tratamento, pois permite medir o grau de limitação ao
fluxo aéreo e avaliar mudanças em seu valor. A medida
Finalmente, considerando o RB, a ausência de
do volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1)
e da capacidade vital forçada (CVF), aliada ao cálculo do
reversibilidade da limitação ao fluxo aéreo não exclui o
índice de Tiffeneau (VEF1/CVF), permitem estimar o grau
diagnóstico de asma.
da obstrução brônquica com
Já nas crianças,
segurança razoável. É
particularmente entre as
importante lembrar que
menores, o diagnóstico de
medir apenas o pico de
asma pode ser confirmado
fluxo expiratório (PFE) tem
pela resposta clínica ao
espirometria é o único exame
limitações significativas
broncodilatador inalável,
complementar
que
pode
auxiliar
no
na avaliação da função
associada à exclusão de
diagnóstico ou na avaliação da resposta
pulmonar. Uma espirometria
outras causas de sibilos.
ao tratamento, pois permite medir o grau
completa, que pode ser feita
Entre aquelas com idade
pela maioria dos adultos e
superior a sete anos,
de limitação ao fluxo aéreo e avaliar
por crianças maiores que
está indicado o uso da
mudanças em seu valor
sete anos, fornece dados
espirometria para confirmar o
importantes para
diagnóstico. O diagnóstico
o diagnóstico e
diferencial deve ser
acompanhamento. A medida
cuidadoso quando a tosse for
acurada da função pulmonar, especialmente se feita
o sintoma predominante. Finalmente, mesmo em crianças
antes e após a inalação de um broncodilatador de ação
com o diagnóstico de asma estabelecido, nem sempre a
rápida, permite:
dispnéia induzida pelo exercício é devido à asma.
A sibilância costuma ser causa freqüente de consulta
• Diagnosticar a limitação ao fluxo aéreo.
médica. Assim, na investigação diagnóstica, outras
• Medir o grau da limitação.
causas de sibilos em crianças devem ser investigadas
• Monitorar os efeitos do tratamento.
(Quadro 1).
• Demonstrar a presença e a reversibilidade da limitação
QUADRO 1
para o paciente.
Diagnóstico diferencial de sibilos em crianças
• Providenciar feedback para o doente sobre a presença e
Condição
Características
a gravidade de sua asma.
A
Outros exames complementares, como a radiografia
do tórax (Rx), testes de provocação e testes alérgicos,
podem ser considerados. O Rx deve ser feito se o
diagnóstico é incerto ou se há sintomas inexplicáveis pela
asma, ou para excluir outras condições. Os testes de
provocação (inalação de determinadas substâncias e
subseqüente medida da função respiratória) devem ser
feitos apenas por especialistas, dado o risco inerente ao
procedimento. Eles podem ser úteis quando:
Sibilos transitórios
Início na infância
Sem atopia associada
Associados ao tabagismo materno
Fibrose cística
Sibilo recorrente, com pouca ou
nenhuma resposta ao
broncodilatador
Inalação de corpo estranho
Início súbito
Aspiração de leite — tosse
durante as mamadas
Especialmente com líquidos
Associada a retardo no
desenvolvimento
Anormalidade estrutural
Início ao nascer
Insuficiência cardíaca
Associada com doença cardíaca
congênita
Como a alergia é importante fator causal de asma,
pode-se considerar fazer testes alérgicos no momento do
Doença pulmonar supurativa
Tosse produtiva no início da manhã
12
VOL. 93 • N.os 5/6
• Há suspeita de asma ocupacional.
• O diagnóstico é incerto.
• O doente não se beneficia com o tratamento.
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O ABC da Asma
A tosse também é um sintoma comum entre crianças.
Quando a tosse é devido à asma, usualmente é
acompanhada por sibilos e dispnéia. A tosse pode ser o
sintoma predominante da asma, mas raramente é o único.
Tosse recorrente inespecífica na ausência de sibilos
é um sintoma comum entre crianças, particularmente
aquelas em idade pré-escolar. Não deve ser confundida com
asma, já que sua fisiopatologia é diferente. Habitualmente,
não está associada a atopia ou a história familiar de asma.
Freqüentemente, a criança desenvolve a tosse em
associação a uma infecção do trato respiratório superior. Na
maior parte das vezes, a tosse recorrente inespecífica
desaparece em torno dos seis a sete anos, e não deixa
resíduos patológicos no pulmão. Tipicamente, a tosse:
•
•
•
•
É seca.
Ocorre em paroxismos curtos.
É pior nas horas iniciais da manhã e durante o exercício.
Pode ser seguida de vômito. Entre os períodos de
tosse, a criança está bem, sem taquipnéia ou sibilos.
• Dura de duas a quatro semanas.
• Não responde ao tratamento.
Sintomas respiratórios induzidos pelo exercício são
freqüentemente mencionados em crianças asmáticas.
No entanto, em muitas crianças asmáticas nas quais se
reporta AIE não se consegue demonstrar limitação
ao fluxo aéreo durante o exercício. A investigação
diagnóstica deve ser cuidadosa, porque equívocos na
interpretação da dispnéia como asmática podem levar
ao tratamento errado.
Sintomas de doença pulmonar supurativa (bronquite
crônica e bronquiectasias) podem ser confundidos com
os da asma. Tipicamente, a tosse é o principal sintoma,
não perturba o sono e é mais freqüente ao acordar.
Ao fazer o diagnóstico de asma, é fundamental avaliar
o padrão e a gravidade da doença, para guiar a terapia
inicial e o intervalo das revisões médicas. Quanto mais
grave a asma, menores os intervalos com os quais deve
ser visto o doente. Como sintetizado no Quadro 2, num
paciente com asma recém-diagnosticada, previamente
ao início do tratamento, a asma é classificada
segundo a freqüência dos sintomas e os índices
espirométricos em:
Asma intermitente — Antes do início do tratamento, a
asma pode ser assim classificada se todas as condições a
seguir estiverem presentes:
• Os sintomas diurnos acontecem com freqüência inferior
a uma vez por semana.
• Os sintomas noturnos surgem menos que duas vezes
por mês.
• As exacerbações são infreqüentes e rápidas.
• O valor do VEF1 é, pelo menos, igual a 80% do previsto
e varia menos que 20%.
Asma leve persistente — Antes do início do tratamento,
a asma pode ser assim classificada como persistente se
uma ou mais das condições a seguir estiverem presentes
(e não houver sinais e sintomas mais graves):
• Os sintomas diurnos acontecem com freqüência maior
que uma vez por semana, mas não todos os dias.
• Os sintomas noturnos surgem mais que duas vezes por
mês, mas não todas as semanas.
• As exacerbações ocorrem ocasionalmente, e podem
afetar a atividade ou o sono.
• O valor do VEF1 é, pelo menos, igual a 80% do previsto
e varia entre 20%-30%.
Asma moderada persistente — Antes do início do
tratamento, a asma pode ser assim classificada se uma
ou mais das condições a seguir estiverem presentes
(com ausência de sinais e sintomas mais graves):
• Os sintomas diurnos acontecem todos os dias, mas
nem sempre restringem a atividade física.
• Os sintomas noturnos ocorrem pelo menos uma vez
por semana.
• As exacerbações ocorrem ocasionalmente, e podem
afetar a atividade ou o sono.
• O valor do VEF1 está entre 60%-80% do previsto e varia
mais que 30%.
Asma grave persistente — Antes do início do
tratamento, a asma pode ser assim classificada se
uma ou mais das condições a seguir estiverem
presentes:
• Os sintomas
QUADRO 2
Classificação da asma em adultos
Persistente
Intermitente
Leve
Moderada
Grave
Sintomas
Raros
Semanais
Diários
Diários ou
contínuos
Despertares noturnos
Raros
Mensais
Semanais
Quase diários
Necessidade de beta-2 de alívio
Rara
Eventual
Diária
Diária
Limitação das atividades
Nenhuma
Presente nas
exacerbações
Presente nas
exacerbações
Contínua
Exacerbações
Raras
Afeta atividades
e o sono
Afeta atividades
e o sono
Freqüentes
VEF1 ou PFE
≥ 80% predito
≥ 80% predito
60%-80% predito
≤ 60% predito
Variação do VEF1 ou PFE
< 20%
< 20%-30%
> 30%
> 30%
Fonte: Consenso Brasileiro (12).
14
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
diurnos acontecem
todos os dias e
restringem a
atividade física.
• Os sintomas
noturnos ocorrem
todas as noites.
• As exacerbações
são freqüentes.
• O valor do VEF1 é
igual a 60% ou
menos que o
previsto, e varia
mais que 30%.
Como é comum
que a asma tenha
apresentações
particulares na
infância (13), a
O ABC da Asma
definição de sua gravidade pode sofrer pequenas
adaptações. Na maior parte das vezes, essa definição
é baseada em dados clínicos. Nas crianças com idade
superior a seis anos, a espirometria e a medida do pico
de fluxo expiratório (PFE) podem ser úteis. Em
crianças, a asma intermitente ou episódica pode
ser subclassificada em infreqüente ou freqüente. A
primeira situação é a mais comum, ocorrendo em
cerca de 70%-75% das crianças. Nela, os episódios
sintomáticos são isolados e esporádicos, podendo
durar de 1-2 dias até 1-2 semanas. Geralmente, os
intervalos duram mais de 6-8 semanas e as crianças
ficam assintomáticas entre eles. Habitualmente, são
desencadeados por infecções do trato respiratório
superior ou por alérgenos ambientais. A gravidade da
asma intermitente infreqüente varia. As crises são
usualmente leves, mas hospitalizações não são raras.
Recomenda-se medicar apenas durante os episódios
sintomáticos, sendo desnecessário o tratamento
preventivo regular. Aproximadamente 20% das
crianças têm asma intermitente freqüente (14). Nelas,
habitualmente, os episódios sintomáticos ocorrem com
intervalo menor que seis a oito semanas. Finalmente,
cerca de 5%-10% das crianças têm asma persistente
(15). Os sintomas estão presentes na maior parte dos
dias e, geralmente, incluem dispnéia, sibilos, distúrbios
do sono devidos aos sibilos ou à tosse, opressão
torácica ao acordar e intolerância ao exercício. A
gravidade dos sintomas varia de leve a grave. A
classificação da asma em crianças pode ser vista no
Quadro 3.
características particulares da asma podem comprometer
o corpo e o condicionamento físico, o que faz da prática
regular de exercícios um componente importante do
tratamento.
Outro ponto essencial, ao iniciar o tratamento de um
asmático, é informá-lo, e a seus familiares/responsáveis,
das características de sua doença e de seu tratamento.
Na asma, assim como na maior parte das doenças
crônicas, a adesão ao tratamento é problemática. Diversos
fatores — tais como estigma, medo da “bombinha”,
corticosteroidofobia, custo da medicação — interferem,
reduzindo a adesão. Para aumentar as chances de o
asmático seguir a prescrição adequadamente, é
fundamental que ele seja esclarecido sobre:
•
•
•
•
As bases genéticas e ambientais da asma.
A necessidade de longo tempo de tratamento.
O fato de não ter sintomas não o cura da asma.
O papel dos diferentes medicamentos (remédios de
alívio sintomático e preventivos).
• A diferença entre asma controlada e cura.
• A possibilidade de ocorrerem exacerbações episódicas,
mesmo que ele venha seguindo rigorosamente as
instruções médicas.
O principal objetivo do tratamento é controlar a asma.
O controle é considerado bom quando:
• Os sintomas diurnos ou noturnos são mínimos.
• Há redução da medicação de alívio.
• Não se observam exacerbações.
• Não há limitação na
atividade física.
QUADRO 3
Classificação da gravidade da asma em crianças
Intermitente
infreqüente
• A função pulmonar é
Sintomas diurnos
entre exacerbações
Sintomas noturnos
entre exacerbações
Exacerbações
PFE ou
VEF1*
Raros
Raros
Breves e leves.
Intervalos >
4-6 semanas
> 80%
previsto
Variabilidade
do PFE**
< 20%
normal ou próxima
ao normal (VEF1 ou
PFE > 80% do
previsto).
A seguir, vamos nos
deter no tratamento
Intermitente
Raros
Raros
> 2/mês
≥ 80%
< 20%
medicamentoso da
freqüente
previsto
asma. Idealmente, a via
de administração dos
Persistente
> 1/semana, mas
> 2/mês, mas não
Podem afetar
≥ 80%
20%-30%
remédios é a inalatória.
leve
não todos os dias
todas as semanas
atividade e sono previsto
Por ela, a medicação
Persistente
Diários
> 1/semana
≥ 2/semana.
atinge quase que
moderada
Restringem
60%-80% > 30%
exclusivamente os
atividade ou
previsto
pulmões, e os efeitos
afetam sono
sistêmicos são
reduzidos ou
Persistente
Contínuos
Freqüentes
Freqüentes.
≤ 60%
> 30%
grave
Restringem
previsto
insignificantes. Para
atividade
que as possíveis
repercussões
Adaptado do GINA (8).
sistêmicas não tragam
* Os valores previstos são baseados na idade, sexo e altura.
** Diferença entre os valores matinais e noturnos.
problemas, o doente
deve ser orientado a
Tratamento da asma
lavar sempre a boca após cada inalação. Os principais
medicamentos usados no tratamento da asma estão
Inicialmente, deve ficar claro que tratar um asmático é
listados no Quadro 4.
mais do que prescrever medicamentos. Os sintomas da
Atualmente, o pilar terapêutico da asma é o
asma são modulados por diversos fatores, como o meio
corticosteróide inalatório (CI), agente antiinflamatório
ambiente, o estado emocional e processos infecciosos,
potente e fisiológico. Seu uso regular reduz a freqüência
entre outros. Assim, prevenir os fatores desencadeantes
e a intensidade das crises, reduz o número de
de agudizações da asma (“gatilhos”) é tão importante
atendimentos de urgência e hospitalizações, assim como
quanto usar a medicação. Ao mesmo tempo,
a mortalidade, e melhora a qualidade de vida (16). O início
16
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
O ABC da Asma
QUADRO 4
Principais medicamentos efetivos no tratamento da asma
em poucos minutos (três a quatro) e dura cerca de quatro
a seis horas. No entanto, atualmente, dispomos de beta-2
agonistas de ação prolongada (β2AP), cujo efeito
Antiinflamatórios
broncodilatador dura cerca de 12 horas. Eles também
Corticosteróides
Beclometasona, budesonida,
protegem as vias aéreas da broncoconstrição secundária
ciclesonida, fluticasona
à exposição a alérgenos ou a estímulos inespecíficos,
Antagonistas de receptores Montelucaste e zafirlucaste
assim como ao exercício. Dentre as opções disponíveis
de leucotrienos
(formoterol, salmeterol e bambuterol), o formoterol é o
mais indicado para alívio dos sintomas agudos, dado que
Cromonas
Cromoglicato e nedocromil
pode ser usado pela via inalatória, seu início de ação se
Broncodilatadores
dá em 2-3 minutos e seu efeito é prolongado, reduzindo o
Beta-2 agonistas de ação
Fenoterol, salbutamol e terbutalina
número de doses necessárias para o alívio. O bambuterol
curta (β2AC)
só existe para a via oral e é uma alternativa eficiente para
Beta-2 agonistas de ação
Formoterol, salmeterol e bambuterol
crianças e idosos com dificuldade de inalar a medicação.
prolongada (β2AP)
A associação de um β2AP ao CI em bases regulares
Anticolinérgicos
Brometo de ipratrópio
melhora a função pulmonar e o controle dos sintomas,
Teofilina
Aminofilina
reduzindo as exacerbações e a dose necessária de CI
Outros
(22). O uso da associação deve ser considerado quando
Omalizumabe
os sintomas ou a função pulmonar subótima persistirem
apesar do uso isolado de CI, ou quando se deseja reduzir
a dose corrente do CI mantendo o controle adequado da
precoce da corticoterapia inalatória melhora a função
asma (23).
pulmonar e pode prevenir o desenvolvimento de limitação
O brometo de ipratrópio é um broncodilatador
irreversível do fluxo aéreo. A curva dose-resposta tem um
anticolinérgico inalável com início lento de ação (30-60
patamar horizontal no qual há pouco benefício adicional
minutos). Dadas as características neurais predominantes
com o aumento da dose além da recomendada (17). O
na patogênese da asma (adrenérgicas), tem papel menos
risco de efeitos adversos é diretamente proporcional à
relevante no tratamento dessa doença, quando
dose e à sensibilidade individual do doente. Há poucas
comparada à doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC),
evidências de que, em adultos, doses menores que
cujo estreitamento brônquico é principalmente modulado
500mcg de beclometasona ou equivalente possam
pelo sistema colinérgico.
causar qualquer efeito prejudicial além de disfonia ou
O papel da teofilina no tratamento da asma deve-se à
candidíase orofaríngea. Se administrados nas doses
sua ação relaxante do músculo liso peribrônquico, bem
recomendadas e adotados os cuidados para reduzir a
como aos seus efeitos antiinflamatórios (que requerem
absorção oral, os potenciais efeitos sistêmicos não
concentrações menores que aquelas necessárias para
costumam ter significância clínica, a não ser em situações
a broncodilatação) e potencializadores da contratilidade
especiais (18). Dentre os potenciais efeitos adversos
diafragmática. No entanto, como seu uso está associado
destacam-se o risco elevado de catarata, osteoporose,
a efeitos adversos freqüentes e potencialmente fatais,
glaucoma e lesão cutânea. Entre crianças, o uso de doses
seu emprego vem declinando (24).
iguais ou superiores a 200mcg de beclometasona ou
Há outros antiinflamatórios que podem ser usados no
equivalente pode estar associado a efeitos sistêmicos,
tratamento da asma, porém com valor inferior ao dos
como, por exemplo, alteração da velocidade de
corticosteróides (25). Dentre eles, os antagonistas de
crescimento (19). A supressão do crescimento, quando
receptores de leucotrienos têm ação antiinflamatória
ocorre, não costuma ser superior a 1cm, e não é
limitada e só devem ser usados em situações
progressiva. De qualquer modo, a possibilidade de
particulares, e associados aos β2 e aos CS (26).
insuficiência adrenal deve ser considerada em qualquer
As cromonas representam um outro grupo de
criança submetida à corticoterapia inalatória regular que
antiinflamatórios que, devido à sua baixa potência
apresente redução do nível de consciência e(ou)
e efetividade, vem sendo abandonado (27).
alterações séricas bioquímicas ou da glicemia (20). O
A associação de asma e atopia é comum, e grande
corticosteróide oral (CO) é o medicamento de escolha
parte dos “gatilhos” na asma são fatores alérgicos. Com
para o tratamento das exacerbações graves da asma (21).
base nisso, procurou-se desenvolver um medicamento
Nessas situações, deve ser
antialérgico efetivo na asma: o
administrado em dose única
omalizumabe. Ele é um
diária, próximo às 15h, nas
anticorpo monoclonal
doses de 40-60mg para adultos
recombinante humanizado
e de 1mg por quilo de peso
específico. Sua ação, inibindo a
(máximo 50mg) para crianças.
ligação da IgE com seu receptor
Os broncodilatadores são
na superfície de mastócitos e
eve ficar claro que tratar um
usados para alívio dos sintomas.
basófilos, previne a liberação de
asmático é mais do que prescrever
Dentre os disponíveis, os beta-2
mediadores inflamatórios
medicamentos. Prevenir os fatores
agonistas inaláveis, sejam de
(histamina, leucotrienos,
desencadeantes de agudizações da
ação curta (β2AC) ou de ação
citocinas e outros).
asma (“gatilhos”) é tão importante
prolongada (β2AP), são a melhor
Conseqüentemente, há inibição
opção. Tradicionalmente, dá-se
dos sintomas e disfunções
quanto usar a medicação
preferência aos β2AC (fenoterol,
ligados ao componente alérgico
salbutamol e terbutalina), cujo
da asma. Está indicado para os
efeito broncodilatador acontece
casos de asma alérgica de difícil
D
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
19
O ABC da Asma
controle, nos quais o nível
de IgE é elevado. Deve
sempre ser usado associado
aos β2 e aos CS (28) e
possibilita redução da dose
de CI usada (29).
No dia-a-dia, diversos
outros medicamentos são
empregados no tratamento
do asmático, nem sempre
adequadamente. Dentre
eles:
2. O tratamento preventivo
(regular) deve ser feito
sempre que os sintomas
ocorrerem com
tualmente, o pilar terapêutico da asma
freqüência superior a duas
é o corticosteróide inalatório (CI), agente
a três vezes por semana,
antiinflamatório potente e fisiológico.
ou houver necessidade de
Seu uso regular reduz a freqüência e a
uso de um β2AP mais do
que três vezes por
intensidade das crises, reduz o número
semana.
de atendimentos de urgência e
3. Após o diagnóstico, inicie
hospitalizações, assim como a mortalidade,
o tratamento com o
e melhora a qualidade de vida
esquema indicado de
Antibióticos — Devem
acordo com a gravidade
ser reservados para o
da asma. Após atingir o
tratamento de infecções
controle da doença,
bacterianas e não para o
reduza gradualmente a
emprego rotineiro nas
medicação, até alcançar a
exacerbações da asma. Hipersecreção de muco e tosse
manutenção do controle com o mínimo de remédios.
produtiva são manifestações freqüentes da asma.
4. O CI deve ser prescrito para todos os asmáticos
Alterações na cor do catarro podem ser devido à
persistentemente sintomáticos (veja no Quadro 5 as
inflamação alérgica, e não devem ser interpretadas como
equivalências de doses dos diferentes CIs). Uma vez
indicativo de infecção na ausência de outros sinais e
atingido o controle, reduza gradualmente sua dose até a
sintomas.
menor capaz de manter o controle da doença. Na média,
há pouco efeito adicional na resolução dos sintomas ou do
Anti-histamínicos — Podem ser usados no tratamento de
dano funcional com doses acima de 500mcg/dia de
doenças alérgicas associadas. Deve-se dar preferência às
beclometasona/fluticasona, de 800mcg/dia de budesonida
alternativas mais recentes, já que os antigos têm efeito
ou de 320mcg/dia de ciclesonida. Em crianças, doses
anticolinérgico significativo, que pode causar sedação e
superiores a 250mcg de beclometasona ou equivalente só
ressecamento das secreções.
devem ser recomendadas por especialistas.
A
Sedativos — Estão contra-indicados durante as crises de
asma. A agitação durante uma exacerbação pode ser
devida ao broncoespasmo e à hipoxemia, e é mais bem
tratada com β2 agonistas e oxigênio. A maior parte dos
sedativos interfere no drive respiratório.
Do mesmo modo, alguns medicamentos podem
causar agudizações da asma ou afetar negativamente o
seu controle. É fundamental que todo asmático seja
orientado sobre eles. Sempre que se inicia uma nova
medicação para um asmático e não se tem certeza se ela
pode comprometer o controle da asma, o doente deve
ser orientado a carregar com ele um β2 agonista e a
observar sinais de descompensação de sua asma. Caso
isso aconteça, deve conversar com o seu médico
assistente sobre a nova medicação. Dentre os remédios
que podem provocar broncoconstrição em asmáticos,
destacam-se os betabloqueadores (usados no tratamento
da hipertensão, da enxaqueca e do glaucoma), os agentes
colinérgicos (pilocarpina e carbacol) e os inibidores da
colinesterase. Exacerbações imprevisíveis podem ser
decorrentes do uso de aspirina ou outros
antiinflamatórios não-esteroidais (incluindo os inibidores
da cicloxigenase-2). Uma exacerbação da asma causada
por esses medicamentos é caracterizada por eritema
e rinorréia, geralmente minutos a uma hora após a
administração. Outras drogas que podem causar reação
incluem carbamazepina, penicilina e conservantes
(bissulfitos e metabissulfitos, por exemplo).
A seleção dos medicamentos que irão compor os
diferentes esquemas terapêuticos segue alguns
princípios. Dentre eles:
1. Medicação de alívio deve ser prescrita para todos os
doentes sintomáticos.
22
NOV./DEZ., 2007
QUADRO 5
Equivalência das doses dos corticosteróides inalatórios
Fármaco
Dose baixa
(mcg)
Dose média
(mcg)
Dose elevada
(mcg)
Adultos
Beclometasona
Budesonida
Ciclesonida
Fluticasona
200-500
200-400
80-160
100-250
500-1.000
400-800
160-320
250-500
> 1.000
> 800
> 320
> 500
Crianças
Beclometasona
Budesonida
Budesonida susp. p/ inal.
Ciclesonida*
Fluticasona
100-400
100-200
250-500
*
100-200
400-800
200-400
500-1.000
*
200-500
> 800
> 400
> 1.000
*
> 500
Fonte: Adaptado das IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma — 2006 (SBPT) (12),
adaptadas do Global Initiative for Asthma (GINA), 2006 (8).
* Indicada para crianças com idade superior a quatro anos.
5. Nos pacientes com asma moderada a grave, deve-se
associar o β2AP ao CI. Essa conduta é melhor que elevar a
dose do CI. Assim como no uso do CI isolado, a dose da
associação β2AP + CI deve ser reduzida até o mínimo
necessário para manter a doença controlada. Nessa fase
de decréscimo, a interrupção do β2AP deve ser
considerada assim que o controle for possível com a dose
de 100mcg/dia de beclometasona, ou equivalente. A partir
desse momento, o CI pode ser usado isoladamente.
O esquema terapêutico é definido com base na
classificação inicial do asmático (Quadro 6). Medicação de
“alívio” (broncodilatador) é aquela usada para o controle
de sintomas agudos; “preventiva” (antiinflamatório) é a
usada para o controle da doença, que deve ser utilizada
diariamente. Nesse momento deve ser considerada
também a habilidade do cliente no uso dos diferentes
VOL. 93 • N.os 5/6
O ABC da Asma
QUADRO 6
Esquema medicamentoso inicial de acordo com a gravidade da
asma
Gravidade
Alívio
Preventivo
Intermitente
β2AP**
Persistente leve
β2AP** CI*** em dose baixa
Persistente moderada
Persistente grave
QUADRO 8
Grau de controle da asma e respectiva conduta
Grau de controle
Conduta
Controlada
Manter o doente na etapa mais baixa de controle
Parcialmente controlada
Considerar aumentar a etapa de controle
Não-controlada
Aumentar a etapa de controle até a obtenção do
controle
Exacerbação
Conduta apropriada para a ocorrência
Uso de CO*
Não há necessidade
Nas exacerbações
graves
β2AP** CI*** em dose moderada Nas exacerbações
a alta
graves
OU
β2AP + CI**** em dose
baixa
β2AP** β2AP + CI**** em dose
alta
OU
β2AP + CI**** em dose
alta associado ao
omalizumabe
Nas exacerbações
graves
OU
Uso contínuo, a critério
médico, na menor dose
para atingir o controle
Fonte: Adaptado das IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma — 2006 (SBPT) (12),
adaptadas do Global Initiative for Asthma (GINA), 2006 (8).
* Corticosteróide oral. ** β2AP: beta-2 de ação prolongada (formoterol). *** CI:
corticosteróide inalatório. **** β2AP + CI: associação de beta-2 de ação prolongada +
corticosteróide inalatório.
sistemas de inalação e sua preferência. Nos diversos
consensos sobre asma pode ser visto um número maior
de opções terapêuticas de acordo com a gravidade. No
Quadro 6, para simplificar, foram colocadas apenas uma
ou duas opções em cada situação. Essas, usando os
preceitos da “Medicina baseada em evidências”, são
consideradas as melhores alternativas.
Após o início do tratamento, nas consultas
subseqüentes, a classificação inicial deve ser revisada e o
esquema medicamentoso pode ir sofrendo mudanças ao
longo do tempo, de acordo com a resposta terapêutica.
Nas consultas de revisão, as orientações sobre a
necessidade de evitar os “gatilhos” e o tabagismo, de ter
atividade física regular e acerca dos cuidados dietéticos
devem ser reforçadas. Nesse momento deve-se
comentar e apresentar, por escrito, um plano sobre
a conduta a ser seguida no caso de exacerbações.
Finalmente, deve-se avaliar o grau de controle alcançado
com o esquema previamente prescrito. Esse nível de
controle pode ser escalonado em três etapas (Quadro 7),
de acordo com as quais se define a conduta a ser adotada
(Quadro 8), conforme o Quadro 5.
Fonte: IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma — 2006 (SBPT) (12), adaptadas do Global
Initiative for Asthma (GINA), 2006 (8).
cerca de 60% a 80% dos asmáticos têm rinite alérgica
(32). Dessa forma, o tratamento da rinite alérgica facilita o
controle da asma (33).
A crise de asma é uma situação que pode ser grave
e potencialmente fatal. É fundamental que o asmático
seja esclarecido sobre o que fazer na vigência de uma
exacerbação. Idealmente, esse esclarecimento deve
incluir um plano de ação por escrito. Saber adotar o
comportamento adequado e quando buscar ajuda num
pronto-socorro pode significar viver ou morrer.
Ao se atender um asmático em crise, a primeira coisa
a fazer é uma avaliação objetiva da gravidade da
exacerbação (Quadro 9). O termo “exacerbação” é
entendido como uma deterioração aguda ou subaguda
dos sintomas e da função pulmonar (comparada com
o nível habitual de variação naquele asmático) que é
suficiente para causar angústia ou riscos à saúde e requer
tratamento imediato. No primeiro momento, é importante
fazer avaliação e anamnese objetivas e rápidas, para
confirmar o diagnóstico de crise de asma. É importante
lembrar que a sibilância não é um indicador confiável de
gravidade e pode estar ausente nas crises muito graves.
A seguir, administrar oxigênio e β2AP (idealmente,
formoterol). Nas crises moderadas a graves, usar
prednisona ou prednisolona oral (34), já que os
QUADRO 9
Avaliação inicial de uma crise de asma
Gravidade
QUADRO 7
Etapas de controle do asmático
Parâmetro
Controlado
Parcialmente controlado
(pelo menos 1 em
qualquer semana)
Não-controlado
Sintomas diurnos
Nenhum ou
mínimo
≥ 2/semana
Despertares noturnos
Nenhum
≥1
≥ 3 parâmetros
Necessidade de
medicação de resgate
Nenhuma
≥ 2/semana
Presentes em
qualquer semana
Limitação das atividades
Nenhuma
Presente em qualquer
momento
PFE ou VEF1
Normal ou
próximo do
normal
< 80% do predito ou
melhor individual
Nenhuma
≥ 1/ano
Exacerbação
1 em qualquer
semana
Fonte: IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma — 2006 (SBPT) (12), adaptadas do Global
Initiative for Asthma (GINA), 2006 (8).
Finalmente, estão cada vez mais claras as relações
funcionais entre o trato respiratório inferior e o superior
(30). Os portadores de rinite alérgica freqüentemente têm
hiper-responsividade brônquica (HRB) associada (31), e
NOV./DEZ., 2007
Achados
Leve
Moderada
Grave
Exaustão física
Não
Não
Sim
Fala ...
Sentenças
Frases
Palavras
Pulso
< 100bpm
100-120bpm
> 120bpm
Cianose central
Ausente
Pode estar presente
Normalmente
presente
Intensidade dos sibilos
Variável
Moderada a baixa
Geralmente
silente
PFE
> 75% previsto
50%-75% previsto
< 50% previsto
(ou < 100l/min)
VEF1
> 75% previsto
50%-75% previsto
< 50% previsto
(ou < 1l)
Oximetria
—
—
< 90%
Gasometria arterial
Desnecessária
Necessária se a
resposta inicial for
pobre
Necessária
Outras investigações
Desnecessárias
Podem ser
necessárias
Rx de tórax para
excluir outras
patologias
VOL. 93 • N.os 5/6
23
O ABC da Asma
corticosteróides orais são tão efetivos quanto os
injetáveis (35). A corticoterapia oral pode ser interrompida
abruptamente ao final do ciclo de 5-10 dias. A redução
gradual da dose não previne recidiva e é desnecessária
após períodos breves de uso (36). Embora haja fortes
evidências de que os β2AC sejam efetivos no manejo das
exacerbações, as características do formoterol (rápido
início de ação e efeito broncodilatador prolongado), um
β2AP, justificam o seu emprego nessa situação (33).
Os beta-2 agonistas devem ser administrados pela via
inalatória, idealmente através do inalador dosimetrado
(metered dose inhaler — MDI) acoplado a um espaçador
(32, 37). Em adultos, nas exacerbações não consideradas
graves o suficiente para tornar a hospitalização
necessária, doses altas de corticosteróide inalatório
(3.200mcg/dia de beclometasona ou equivalente),
idealmente associado ao β2AP, podem ser efetivas
no controle (38, 39). Deve-se avaliar a resposta ao
tratamento inicial usando a espirometria, a saturação
de oxigênio e as freqüências cardíaca e respiratória.
É importante distinguir uma exacerbação de uma
asma mal controlada. Em pacientes com asma estável,
exacerbações intermitentes (particularmente aquelas
devidas a infecções virais do trato respiratório) podem
ocorrer apesar de a asma estar sendo bem controlada.
O controle inadequado da asma, seja por emprego de
esquema terapêutico inapropriado, baixa adesão ao
tratamento ou técnica incorreta de uso dos inaladores,
tem de ser identificado, para que os planos terapêutico e
de ação na crise sejam apropriadamente revistos. Os
pontos práticos mais importantes no manejo de uma
crise de asma estão listados no Quadro 10.
QUADRO 10
Pontos práticos no manejo de uma crise de asma
Manejo das exacerbações em adultos
Nas crises moderadas a graves, prescrever sempre CO por sete a 10 dias
Utilizar sempre um espaçador quando usar um MDI com β2AP
Nas crises suficientemente graves para indicar hospitalização, doses altas
de CS inalatório podem ser efetivas
Meramente dobrar a dose de manutenção do CS inalatório não é efetivo
no manejo das exacerbações
Manejo das exacerbações em crianças
Nas exacerbações graves, prescrever sempre CO (prednisolona na dose
1mg por quilo de peso), por sete a 10 dias
Crianças em uso de medicação regular devem continuar utilizando as
mesmas doses durante as exacerbações
Utilizar sempre um espaçador quando usar um MDI com β2AP
Meramente dobrar a dose de manutenção do CS inalatório não é efetivo
no manejo das exacerbações
Após o controle da crise é importante fazer uma
anamnese, para obter alguns dados que possibilitem
identificar a causa da descompensação (infecção
respiratória, exposição a alérgenos, etc.), a rotina
medicamentosa que vinha sendo seguida e a adesão ao
tratamento. Informações sobre eventual uso de outras
medicações que possam agravar a asma, hospitalizações
ou idas anteriores ao pronto-socorro e episódios prévios
de crise de asma com risco de morte e co-morbidades
(DPOC, ppte) ajudam a definir o plano terapêutico
pós-controle da crise. O momento após o controle de
uma crise, particularmente se ela foi de moderada a
grave, é uma oportunidade valiosa para rever o plano de
manejo da asma naquele doente. Deve-se avaliar se a
medicação de manutenção que vinha sendo empregada
24
NOV./DEZ., 2007
está adequada e se o asmático tinha um plano de ação
para orientá-lo no momento de uma crise mais forte.
Finalizando, uma exacerbação pode ser um evento
imprevisível, causado por uma infecção viral do trato
respiratório, por exemplo, ou um indicador de um
controle inadequado da asma. De qualquer modo, é
sempre uma oportunidade para repensar a conduta que
vinha sendo adotada e uma lição. Serve para demonstrar
que ainda há muito que aprender sobre os finos
mecanismos envolvidos na patogenia da asma e que
ainda não somos capazes de controlar totalmente essa
doença.
Agradecimento
Agradeço a Maria Beatriz Campos, pela revisão
gramatical do texto.
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Obs.: As 12 referências restantes que compõem este artigo se encontram na Redação
à disposição dos interessados.
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
DR. HISBELLO S. CAMPOS
Rua do Catete, 311/708 — Largo do Machado
22220-001 — Rio de Janeiro-RJ
E-mail: [email protected]
VOL. 93 • N.os 5/6
Resistência aos Antimicrobianos em Estafilococos Coagulase-negativa Isolados de Hemocultura
MICROBIOLOGIA
Resistência aos Antimicrobianos em
Estafilococos Coagulase-negativa
Isolados de Hemocultura
PAULA MARCELE AFONSO PEREIRA
SUMMARY
Bióloga — Universidade Gama Filho (UGF).
EDUARDO ALMEIDA RIBEIRO DE CASTRO
Mestre em Medicina Social. Médico do Serviço de Controle de Infecção
Hospitalar da Faculdade de Ciências Médicas da Uerj.
JOSÉ AUGUSTO ADLER PEREIRA
Doutor em Microbiologia. Professor responsável pela Disciplina de
Imunologia da UGF. Professor adjunto de Microbiologia e Imunologia
da Faculdade de Ciências Médicas da Uerj.
JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA TÓRTORA
Doutor em Microbiologia. Professor titular da Disciplina de Microbiologia
da UGF. Professor titular de Bacteriologia da Universidade Federal
Fluminense. Diretor científico do Instituto de Pesquisas Biomédicas
Gonzaga da Gama Filho — UGF.
RESUMO
Os estafilococos coagulase-negativa (ECNs) estão entre os
microrganismos que constituem a microbiota normal da pele.
O seu significado clínico como agente causal de várias infecções em pacientes com materiais implantados e outras
infecções hospitalares tem aumentado nas últimas décadas.
No presente estudo avaliou-se a resistência de 36 amostras
de ECNs, isoladas de hemoculturas de pacientes internados
em hospital público da cidade do Rio de Janeiro. As amostras revelaram um perfil de alta resistência às drogas do grupo betalactâmico, e o emprego da cefoxitina, em substituição à oxacilina, para indicação da presença do gene mecA e
detecção da resistência a estas drogas, mostrou-se adequado. O perfil de alta resistência observado entre as amostras
recomenda maior rigor e critério na seleção de drogas para
o tratamento das infecções por ECNs.
26
NOV.DEZ., 2007
Coagulase-negative staphylococci (CNS) are a group of microorganisms that constitute the normal skin flora. Their clinical significance as causal agents of infections in patients with implanted material and nosocomial infections have increased in the last
decades. In this study the drug resistance of 36 CNS strains recovered from blood cultures of inpatients in a public hospital located in Rio de Janeiro city was evaluated. The samples of CNS
showed a profile of high resistance to the drugs of the betalactamic group. The use of cefoxitin in substitution to the oxacillin
for detection of the gene mecA and the resistance to these drugs
revealed adequate. The profile of high resistance observed between the samples recommends more attention in the selection of drugs for the treatment of infections for CNS.
Introdução
O gênero Staphylococcus pertence à família
Micrococcaceae, que na atualidade é composta
por 33 espécies, 17 das quais podendo ser isoladas
de amostras biológicas humanas. Os estafilococos
coagulase-negativa (ECNs) pertencem à microbiota
normal da pele e mucosas dos humanos, enquanto os
estafilococos coagulase-positiva provocam supuração,
formação de abscessos, várias infecções piogênicas e
até mesmo septicemia fatal.
Os ECNs estão associados à presença de corpos estranhos,
como válvulas protéticas, próteses ortopédicas, cateteres
intravasculares, urinários e de diálises. São os organismos
mais freqüentemente isolados de culturas sangüíneas,
tendo sido considerados contaminantes e, atualmente,
reconhecidos como verdadeiros patógenos, por estarem
associados a graves morbidades e identificados com fatores
de virulência. A sua associação com diversas infecções
hospitalares vem despertando o interesse de investigadores
no conhecimento de aspectos relacionados à sua
patogenicidade e resistência aos antimicrobianos (1, 5, 7, 8).
O teste de sensibilidade por difusão de antimicrobianos
em discos deve ser efetuado rotineiramente com
estafilococos isolados de infecções clinicamente
significativas. A resistência à oxacilina/meticilina ocorre
em cerca de 75% das amostras de S. epidermidis. Os
perfis de sensibilidade às drogas antimicrobianas podem
elucidar se múltiplos isolados de S. epidermidis em
hemoculturas representam bacteremia devido à mesma
cepa obtida a partir de um nicho de infecção (8).
A resistência dos ECNs à oxacilina está, geralmente,
acompanhada da resistência a outros agentes
VOL. 93 • N.os 5/6
Resistência aos Antimicrobianos em Estafilococos Coagulase-negativa Isolados de Hemocultura
antimicrobianos. Este fato
tem como conseqüência o
aumento da prescrição de
glicopeptídeos para a
terapia empírica, o que
pode resultar na seleção de
linhagens resistentes a
estes antimicrobianos e na
sua transmissão entre as
espécies, realçando a
prudência do uso restrito
desses antimicrobianos (4).
Estima-se que ocorram
2,1 milhões de infecções
nosocomiais anualmente
nos EUA, sendo os ECNs
responsáveis por
aproximadamente 230 mil.
Episódios devidos ao potencial patogênico dos ECNs
no ambiente hospitalar, o interesse pela variedade de
espécies relacionadas às infecções e pelo potencial
toxigênico e virulência dessas bactérias têm sido
motivo de muitos estudos e publicações (2).
A cada ano, nos EUA, mais de 350 mil pacientes
apresentam sepse, com mortalidade variando de 5%
a 58%. A mortalidade por ECN está em torno de 21%.
No Brasil, de junho de 2006 a maio de 2007 as sepses
hospitalares por ECN corresponderam a 23% do total
notificado, sendo que 14% das amostras foram
resistentes à oxacilina (2).
Este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de
investigar a presença do gene mecA e determinar o perfil
de sensibilidade de amostras de ECNs (provenientes de
hemoculturas de pacientes internados em hospital
público da cidade do Rio de Janeiro) a drogas
terapêuticas e o nível de resistência dessas amostras
à cefoxitina, contribuindo para o conhecimento e o
estabelecimento de esquema terapêutico empírico
local a ser utilizado nessas infecções.
Material e métodos
Amostras
Foram avaliadas 36 amostras de ECNs provenientes
de hemoculturas de pacientes internados em hospital
público da cidade do Rio de Janeiro, além de quatro
amostras padrão (ATCC). O projeto foi aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da
Universidade Gama Filho (CAEE 0006.0.312.000-06) e o
período de estudo compreendeu janeiro a junho de 2007.
Identificação das amostras
As amostras de ECNs foram submetidas a
testes para confirmação da sua pureza e identidade
(características coloniais, coloração de Gram, teste de
catalase, teste da coagulase, fermentação do manitol,
teste da DNAse e teste de hemólise).
Teste de resistência aos antimicrobianos
Método da disco-difusão em gel
Inicialmente foi obtida uma cultura em fase ativa de
crescimento a 35oC-37oC/24h, em ágar Müeller-Hinton.
NOV./DEZ., 2007
A partir desta, algumas
colônias foram suspensas
em solução salina estéril
(NaCl 0,85%), de modo
a ser obtida turvação
equivalente à metade
do grau 1 da escala de Mac
Farland. A superfície do ágar
Müeller-Hinton,
recentemente preparado,
foi semeada com swab
umedecido na suspensão
padronizada, e, após cerca
de cinco minutos, 24 discos
de papel-filtro com as
drogas a serem testadas
foram adicionados ao meio
semeado. Empregou-se o
sistema polidisco 24, com as drogas distribuídas em
três placas de Petri. Após 15 minutos, as placas
semeadas foram incubadas entre 35oC e 37oC,
durante 24 horas.
Após o crescimento, fez-se a medida dos halos de
inibição com o emprego de régua milimetrada, e o uso
de valores de referência permitiu a classificação da
amostra bacteriana como sensível (S) e resistente (R)
a cada droga empregada.
Determinação da concentração inibitória mínima (CIM)
A CIM referente à cefoxitina foi avaliada na
superfície de ágar Müeller-Hinton, preparado com
diferentes concentrações desta droga (0,5µg/ml,
1µg/ml, 2µg/ml, 4µg/ml, 8µg/ml, 16µg/ml, 32µg/ml,
64µg/ml e 128µg/ml).
A padronização do inóculo foi feita como
anteriormente descrita para o teste de difusão em
ágar utilizando-se discos contendo antimicrobianos.
Cada placa de Petri foi semeada com seis amostras
diferentes de ECNs, empregando-se a técnica de
esgotamento. A incubação foi efetuada entre 35oC e
37oC durante 24 a 48 horas, e a menor concentração
capaz de inibir o crescimento de uma amostra foi dada
como a CIM para a referida amostra.
Resultados e discussão
Desde 1943, com o emprego clínico da penicilina
para tratamento das infecções bacterianas, tem-se
observado o surgimento de resistência dos
estafilococos a este antibiótico. Os cocos
Gram-positivos sensíveis à penicilina G são também
sensíveis à oxacilina e meticilina. Os resultados
obtidos neste trabalho confirmam esses dados. A
produção de betalactamase por estas bactérias
resultou na pesquisa e fabricação de diferentes
penicilinas resistentes à penicilinase. Porém,
amostras de estafilococos apresentando o gene mecA
foram encontradas produzindo uma transpeptidase de
baixa afinidade pelas penicilinas (PBP-2), exibindo
resistência simultânea aos betalactâmicos. No
presente trabalho observou-se resistência à penicilina
em 83% das amostras e à oxacilina em 72,2%.
A resistência simultânea às drogas do grupo
betalactâmico ocorreu em 33,3% das amostras
de ECNs empregadas.
VOL. 93 • N.os 5/6
27
Resistência aos Antimicrobianos em Estafilococos Coagulase-negativa Isolados de Hemocultura
100
N = 36
%
no de amostras
75
50
25
0
Penicilina
Cefalosporina 1a Cefalosporina 2a Cefalosporina 3a
A potencialidade de essas amostras serem
reservatórios de genes de resistência para S. aureus
é uma possibilidade factível (9).
A dificuldade de detecção fenotípica da expressão
do gene mec A pode estar representada nesses
resultados (6). Observa-se que diversas amostras
apresentaram resistência à maioria das drogas
betalactâmicas, mas exibiram sensibilidade in vitro
a algumas cefalosporinas. O uso dessas drogas
in vivo não é recomendado, pois se tem a
cefoxitina como preditor de sensibilidade para
as cefalosporinas (3). Embora podendo envolver
mecanismos diferentes quando a amostra de ECNs
apresenta resistência in vitro à cefoxitina, não se
deve prescrever as outras drogas betalactâmicas
in vivo (9).
O emprego da cefoxitina para identificar
amostras de ECNs como reservatório do gene
mec A tem sido uma prática recomendada como
alternativa ao uso da oxacilina/meticilina, pois
apresenta maior especificidade e igual
sensibilidade às últimas.
A concordância de resultados relativos à resistência
dessas drogas ocorreu em 27 (75%) amostras. A
resistência à cefoxitina foi observada em 35 (97,2%)
amostras e, entre estas, 30 (83,3%) apresentaram
GRÁFICO 2
Resistência de ECNs isolados de hemoculturas à oxacilina e
cefoxitina
resistência a dois ou mais grupos de antimicrobianos,
caracterizando-as como multirresistentes.
O nível de resistência à cefoxitina das amostras
empregadas pode ser avaliado no Gráfico 3.
Na concentração de 0,5µg/ml todas as amostras
apresentaram crescimento. A concentração mais
elevada deste antibiótico utilizada no presente
trabalho não foi efetiva sobre 52,7% das amostras
de ECNs, o que revela o elevado nível de resistência
dessas amostras a este antibiótico. A expressão
fenotípica correspondente ao gene mec A
(resistência simultânea às drogas do grupo
betalactâmico) foi observada em 33,3% das
amostras, o que sugere a heterogeneidade
da sua expressão e caracterização in vitro .
A resistência à vancomicina entre isolados
clínicos de ECNs foi relatada pela primeira vez em
1987. Desde aquela época, ao menos cinco outros
casos de ECNs clinicamente relevantes
apresentaram suscetibilidade diminuída à
vancomicina. Entre as amostras de ECNs
provenientes de hemocultura de pacientes
hospitalizados utilizadas neste trabalho não
se observou resistência a esta droga (4).
GRÁFICO 3
Resistência de amostras hospitalares de estafilococos
coagulase-negativa à cefoxitina (37oC/48h)
42
36
no de amostras
GRÁFICO 1
Resistência de ECNs isolados de hemoculturas à penicilina e
cefalosporinas
36
34
30
33
33
31
27
24
26
18
19
12
6
0
0,5
1
4
8
16
32
64
128
Cefoxitina μg/ml
GRÁFICO 4
Resistência aos antimicrobianos entre amostras de ECNs
isoladas de hemoculturas
100
83,3
100
80
N = 36
80,5
60
%
40
47,2
33,3
22,2
50
20
19,4
11,1
0
0
25
0
Oxacilina
28
52,7
Cefoxitina
Oxacilina + Cefoxitina
NOV.DEZ., 2007
M
ac
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lfo
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a
gli
co
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eo
Gl
ico
pe
pt
íde
o
%
no de amostras
75
72,2
VOL. 93 • N.os 5/6
Resistência aos Antimicrobianos em Estafilococos Coagulase-negativa Isolados de Hemocultura
Conclusões
Os resultados deste trabalho revelam um perfil de
alta resistência às drogas do grupo betalactâmico entre
as amostras de hemocultura empregadas. Tal padrão
pode sugerir que os ECNs hospitalares tenham
importante papel na difusibilidade do gene mecA
entre espécies do gênero Staphylococcus, inclusive
S. aureus.
A heterogeneidade de expressão do gene mecA
dificulta a sua detecção por métodos fenotípicos.
O emprego da cefoxitina, em substituição à oxacilina,
para detecção de resistência às drogas betalactâmicas
parece ser uma opção adequada, visto que 97,3% das
amostras de ECNs utilizadas mostraram-se resistentes
a este antibiótico, contra 72,3% de resistência à
oxacilina, bem como para a confirmação da presença
do gene mecA detectado pela técnica de PCR.
A elevada resistência aos antimicrobianos entre as
amostras de ECNs estudadas indica a necessidade do
emprego de procedimentos que dificultem a
colonização do hospedeiro como medida preventiva,
visto que se constata o risco potencial de a
antibioticoterapia ser ineficaz e de transferência
da resistência para outras bactérias.
A aplicação de técnicas eficazes de assepsia,
anti-sepsia e desinfecção é recurso
NOV./DEZ., 2007
economicamente viável e eficiente na redução da
velocidade de propagação das linhagens de ECNs
multirresistentes.
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ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
PROF. DR. JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA TÓRTORA
Universidade Gama Filho
Instituto de Pesquisas Biomédicas Gonzaga da Gama Filho
Rua Manoel Vitorino, 553 — Piedade
20740-280 — Rio de Janeiro-RJ.
E-mails: [email protected] e [email protected]
VOL. 93 • N.os 5/6
29
Avaliação Clínica do Tratamento Cirúrgico da Hiperidrose
CIRURGIA
Avaliação Clínica do Tratamento
Cirúrgico da Hiperidrose
FLAVIO NUNES FIALHO NETO
SUMMARY
Aluno de graduação da Faculdade de Medicina da UFF.
NATALIA PARISI SEVERINO
Aluna de graduação da Faculdade de Medicina da UFF.
OMAR MOTÉ ABOU MOURAD
Professor assistente da Disciplina de Cirurgia Torácica da Faculdade
de Medicina da UFF.
ÂNGELO MESQUITA JÚDICE
Cirurgião torácico do HCN.
FILIPE MOREIRA DE ANDRADE
Médico residente de Cirurgia Geral do HGB.
LUIZ FELIPPE JÚDICE
Professor titular de Cirurgia Torácica da Faculdade de Medicina da UFF.
RESUMO
Contexto: A hiperidrose consiste em uma disfunção simpática que acomete 0,6% a 1% da população mundial. Essa produção excessiva de suor afeta significativamente a qualidade de vida
desses pacientes. Objetivo: Aplicar um questionário aos pacientes operados de hiperidrose para comparar a qualidade de vida
desses pacientes antes e após a cirurgia. Além disso, identificar
os diferentes tipos de hiperidrose e os possíveis efeitos colaterais
ou complicações pós-operatórias. Métodos: Foi feita uma análise
retrospectiva dos prontuários de 30 pacientes (21 mulheres e nove
homens) submetidos à simpatectomia por videotoracoscopia no
Hospital Universitário Antônio Pedro, no Hospital Santa Cruz e no
Hospital de Clínicas Niterói, entre os anos de 2001 a 2005. Resultado: A cirurgia foi bem-sucedida em 86,6% dos casos. Em 13,3%
dos pacientes houve recorrência de hiperidrose axilar. Destes, um
foi reoperado, não obtendo, no entanto, o resultado esperado.
Houve somente uma complicação cirúrgica e 86,6% dos pacientes afirmaram ter melhora em sua qualidade de vida. Conclusão:
A pesquisa pode comprovar que a simpatectomia por videotoracoscopia é capaz de promover melhorias na qualidade de vida da
maioria dos pacientes operados.
Unitermos: Hiperidrose; simpatectomia; qualidade de vida.
Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia Geral e Especializada da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF).
30
NOV./DEZ., 2007
Context: Hyperhidrosis consists of a dysfunction of the
sympathetic nervous system that affects approximately 0.6%
to 1% of the world population. This excessive production of
sweat significantly alters the standard and quality of living of
these patients. Goal: To apply a survey to patients having
undergone surgery for hyperhidrosis and to compare the quality
and standard of living of these patients before and after surgery.
Moreover, to identify the various types of hyperhidrosis and the
possible side effects and(or) post-operative complications.
Methods: A retrospective analysis of the medical records was
conducted of 30 patients (21 women versus nine men) who had
undergone videotoracoscopic sympathectomy at three general
hospitals, between the years of 2001 and 2005. Results: This
surgery was successful in 86.6% of cases. In about 13.3% of
patients, there were recurrence of clinical symptoms (axillary
hyperhidrosis). Of these, one patient had been submitted to
surgery for a second time, without, however, achieving the
desired results. There was only one operative complication and
86.6% of patients reported substantial improvement of their
overall quality of life. Conclusions: This study was able to
conclude that toracoscopic sympathectomy can promote
improvements in quality of life in the vast majority of patients
undergoing this type of surgical procedure.
Keywords: Hyperhidrosis; sympathectomy; quality of life.
Introdução
A produção de suor é regulada pelo sistema nervoso
autônomo e tem como objetivo o controle da
temperatura corpórea. No entanto, 0,6% a 1% da
população mundial possui uma disfunção do sistema
nervoso autônomo simpático, que pode se caracterizar
pela hiperatividade das glândulas sudoríparas em
situações como estresse emocional, elevadas
temperaturas ambientais ou mesmo sem qualquer
motivo aparente. Esta condição, que se manifesta sob a
forma de uma sudorese excessiva em regiões do corpo
como face, palma da mão, planta do pé, dorso e axila, é
chamada de hiperidrose.
Apesar de não se tratar de uma doença grave, quanto
ao risco de vida, a hiperidrose é extremamente
desconfortável, sendo responsável por situações de
estresse, insegurança, constrangimento e problemas nos
convívios social, afetivo e profissional. Por se tratar de
uma doença que envolve problemas psicológicos e
sociais, o estudo desse tema e seu conhecimento são de
grande utilidade para a população em geral.
VOL. 93 • N.os 5/6
Avaliação Clínica do Tratamento Cirúrgico da Hiperidrose
A hiperidrose palmar causa
para cada uma dessas, segundo
dificuldade para escrever,
a classificação: excelente = 1,
realizar trabalhos manuais,
muito boa = 2, boa = 3,
praticar esportes, dirigir
ruim = 4, muito ruim = 5.
hiperidrose é uma condição
automóveis, digitar textos e, no
A análise estatística baseou-se
que se manifesta sob a forma de
contato social, como, por
no teste estatístico de
sudorese excessiva em regiões do
exemplo, ao apertar as mãos.
Kolmogorov e Smirnov, para
corpo como face, palma da mão,
A sudorese plantar, além de
verificar a distribuição
causar desconforto, dificulta
gaussiana, e no teste pareado,
planta do pé, dorso e axila
o uso de sandálias e o andar
para verificar a correlação entre
descalço. A hiperidrose axilar
este conceito (nota), dado pelos
priva o indivíduo do uso de
pacientes antes e depois do
roupas de tecido sintético
tratamento cirúrgico para
e(ou) coloridas. A hiperidrose
hiperidrose. Desta forma,
craniofacial normalmente torna a pessoa constrangida,
pode-se verificar o nível de aceitação e qualidade de
pelo fato de a face ser uma região de difícil disfarce.
vida dos pacientes. Foi considerado um p ≤ 0,05 como
Em 1990, com a introdução da videotoracoscopia, a
significativo (3).
cirurgia para correção de hiperidrose tornou-se mais
Resultados
segura e pouco invasiva (1). Apesar de raras, algumas
complicações ainda podem ocorrer: síndrome de
A cirurgia foi bem-sucedida em 26 (86,6%)
Horner; paralisia radial; hemotórax; quilotórax; nevralgia
pacientes. A recorrência de hiperidrose axilar ocorreu
intercostal; enfisema subcutâneo; pneumotórax residual;
em quatro casos (13,3%). Um único paciente foi
lesão do parênquima pulmonar e do plexo braquial; e
reoperado para correção dessa hiperidrose axilar
infecção da ferida operatória. Alguns pacientes podem
recorrente. Três pacientes (10%) se arrependeram de
vir a apresentar hiperidrose compensatória, que
terem sido operados, devido à sudorese compensatória
corresponde a um aumento da sudorese em outras
excessiva, e três pacientes afirmaram não possuir
partes do corpo. Isto provavelmente representa uma
sudorese compensatória. Só houve complicação
resposta termorreguladora do organismo. Como afirma
cirúrgica em dois pacientes, que apresentaram
Dumont et al. (2), em seu estudo sobre a simpatectomia
toracoscópica para o tratamento de hiperidrose, os
pneumotórax residual, sem necessidade de tratamento
pacientes deveriam ser mais bem informados sobre a
adicional.
possível ocorrência de sudorese compensatória, uma
Dos 30 pacientes operados, 17 apresentavam
vez que esta atinge uma parcela significativa dos
hiperidrose palmar e plantar; sete hiperidrose axilar,
pacientes operados.
palmar e plantar; três somente hiperidrose axilar; dois
O objetivo do presente estudo foi analisar os casos
hiperidrose axilar e palmar; e um hiperidrose facial,
de simpatectomia-cervicotorácica minimamente invasiva
palmar, plantar e axilar.
no Hospital Universitário Antônio Pedro, no Hospital
O nível de secção ou cauterização da cadeia
Santa Cruz e no Hospital de Clínicas Niterói,
simpática variou entre os pacientes. Nas hiperidroses
identificando os diferentes tipos de hiperidrose
palmar e plantar, a cirurgia ocorreu na cadeia simpática
e os possíveis efeitos colaterais ou complicações
na altura de T3 ou T3/T4. Para pacientes com hiperidrose
pós-operatórias. Além disso, foi realizada uma análise
somente axilar ou axilar e palmar seccionou-se a
comparativa da qualidade de vida dos pacientes antes e
cadeia simpática ao nível da terceira e quarta costelas.
depois da cirurgia, com o intuito de aprimorar as
Já em pacientes com hiperidrose palmar, plantar
técnicas cirúrgicas e os resultados obtidos.
e axilar, T3/T4 ou T2/T3/T4 foram seccionados
ou cauterizados. Todas as cirurgias para a correção de
Materiais e métodos
hiperidrose facial e axilar ou de hiperidrose facial, axilar,
palmar e plantar foram realizadas ao nível da segunda,
Foi feita uma análise retrospectiva dos prontuários
terceira e quarta costelas. Na secção de T5, realizada
de 30 pacientes operados de hiperidrose pela técnica
em um único caso, tentou-se corrigir uma hiperidrose
de simpatectomia por videotoracoscopia, sendo sete
axilar persistente à primeira cirurgia.
pacientes do Hospital Universitário Antônio Pedro, 16 do
No geral, a qualidade de vida desses pacientes
Hospital Santa Cruz e sete do Hospital de Clínicas Niterói,
melhorou após a cirurgia. A maioria dos homens
nos anos de 2001 a 2005. Foram analisados: idade, sexo,
(44,4%) deu nota 3 (boa) para a sua qualidade de vida
tipo de hiperidrose, nível de secção ou cauterização da
no pós-operatório, enquanto que apenas 9,5% das
cadeia simpática, aspecto final da cicatriz, ocorrência e
mulheres deram esta mesma nota. No entanto, as
região corporal da sudorese compensatória e possíveis
notas 1 e 2 (excelente e muito boa, respectivamente)
complicações pós-cirúrgicas. As idades dos pacientes
tiveram maior prevalência entre as mulheres após a
variavam de 16 a 49 anos, sendo 21 mulheres e nove
correção da hiperidrose, correspondendo a 42,8% cada
homens.
uma. Já entre os homens, estas mesmas notas, 1 e 2,
Com o objetivo de comparar o bem-estar e a
foram dadas por 33,3% e 22,2%, respectivamente.
qualidade de vida dos pacientes antes e depois da
Uma das mulheres relatou queda na qualidade de vida,
cirurgia, foi aplicado um questionário composto por
devido à sudorese compensatória acentuada, e dois
13 perguntas. Neste questionário foram avaliados os
homens e uma mulher afirmaram não ter ocorrido
aspectos funcional, social, pessoal, profissional, geral,
qualquer mudança, pois para estes houve apenas a
vestuário e emocional. Esses aspectos apresentavam
transferência da sudorese de uma parte do corpo para
subdivisões, cabendo aos pacientes atribuir uma nota
outra.
A
32
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
Avaliação Clínica do Tratamento Cirúrgico da Hiperidrose
GRÁFICO 1
Avaliação da qualidade de vida antes e depois da cirurgia, segundo a
classificação: 1: excelente; 2: muito boa; 3. boa; 4: ruim; 5: muito ruim
GRÁFICO 3 (A)
Avaliação dos pacientes do sexo feminino
Avaliação dos pacientes do sexo feminino para cirurgia de hiperidrose
12
10
4
Antes da cirurgia
8
6
Depois da cirurgia
4
2
0
1
2
3
4
5
Conceito (nota)
No de pacientes
14
Nota
A participação no estudo foi de 21 pacientes do sexo
feminino e nove pacientes do sexo masculino com idades
variando de 16 a 49 anos (média: 25 anos). Não houve
diferença estatisticamente significativa para o gênero
sexual.
p = 0,0001
3
2
1
0
Pré-cirúrgico
Pós-cirúrgico
GRÁFICO 3 (B)
Avaliação dos pacientes do sexo masculino
Avaliação dos pacientes do sexo masculino para cirurgia de hiperidrose
Faixa etária dos pacientes submetidos a cirurgia de hiperidrose
p ≤ 0,75
30
4
Conceito (nota)
GRÁFICO 2
Avaliação da faixa etária dos pacientes submetidos a cirurgia de
hiperidrose
2
1
0
Pré-cirúrgico
20
Pós-cirúrgico
15
10
GRÁFICO 3 (C)
Número total de indivíduos avaliados para a cirurgia de hiperidrose
5
Avaliação dos pacientes para cirurgia de hiperidrose
Feminino
Masculino
4
TABELA
Avaliação da qualidade de vida dos pacientes (média ± SD) do sexo
feminino e masculino para cirurgia de hiperidrose antes e após a
cirurgia (excelente: 1, muito bom: 2, bom: 3, ruim: 4, muito ruim: 5)
Sexo
Faixa etária
Feminino
Masculino
Total
* 25,8 ± 6,8
** 25 ± 4,7
Pré-cirúrgico Pós-cirúrgico
3,95 ± 0.74
3,66 ± 0.70
3,87 ± 0.73
1,80 ± 0.98
2,11 ± 0.92
1,87 ± 0.97
p
N
0,0001
0,0001
0,0001
21
9
30
Conceito (nota)
Idade (anos)
25
p = 0,0001
3
p = 0,0001
3
2
1
0
Pré-cirúrgico
Pós-cirúrgico
* Idade mínima = 16; máxima = 49.
** Idade mínima = 16; máxima = 33.
Discussão
Conforme a Tabela e Gráfico 3 (A-C), o conceito em
nota foi 3,8 (SD ± 0,73) para a qualidade de vida que
todos os pacientes envolvidos no estudo apresentavam
antes do tratamento cirúrgico, onde, a nota mais alta foi
3,95 (SD ± 0,74) para o sexo feminino e 3,66 (SD ± 0,70)
para o sexo masculino. Após o tratamento cirúrgico para
hiperidrose, todos os pacientes apresentaram melhora
estatisticamente significativa.
A maioria dos pacientes considera que o aspecto final
da cicatriz ficou muito bom ou excelente. Somente dois
pacientes declararam não estarem satisfeitos, pois
apresentaram formação de quelóide.
De acordo com os resultados do questionário, 86,6%
dos pacientes ficaram satisfeitos. Um alto grau de
satisfação também foi reportado por outros autores
— 90%, Dumont et al. (2); 86%, Campos et al. (4).
Como citado anteriormente, dois pacientes (6,6%)
apresentaram pneumotórax residual pós-operatório,
tratados conservadoramente. Nos estudos de Dumont
et al. (2), Rex et al. (5) e Zacherl et al. (6) verificou-se que
7,25%, 1% e 2,2% dos pacientes operados apresentaram
tal complicação pós-cirúrgica, respectivamente. Nenhuma
outra complicação foi observada no presente estudo;
diferentemente de outros trabalhos analisados, nos quais
se observou a ocorrência da síndrome de Horner
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
37
Avaliação Clínica do Tratamento Cirúrgico da Hiperidrose
Avaliação Clínica do Tratamento Cirúrgico da Hiperidrose
[0,7% (7), 0,54% (1), 0,4% (6), 1,9% (5)], hemotórax
[0,4% (7), 0,4% (1), 0,3% (6), 0,6% (5)], quilotórax
(0,13%) ou nevralgia intercostal (0,8%) (5). No entanto, o
número de pacientes acometidos por essas complicações
é baixo quando se leva em conta a amostra total
analisada.
Nesta pesquisa, constatou-se que 90% dos pacientes
apresentaram hiperidrose compensatória. Em outros
estudos, tais como os de Fredmann et al. (8), Dumont et
al. (2), Sayeed et al. (9), Leão et al. (1), Rex et al. (5) e
Zacherl et al. (6), observou-se a ocorrência de
hiperidrose compensatória em 90%, 87%, 81%, 70%,
59,8% e 67,2% dos pacientes, respectivamente. Isto
comprova que a percentagem de pacientes com
hiperidrose compensatória relatada em nosso estudo está
dentro dos padrões observados.
Assim como Campos et al. (4) observaram em sua
pesquisa, o presente estudo verificou que a maioria dos
pacientes considera que as modificações mais
significativas ocorreram em relação aos aspectos funcional
e social. Isto comprova que a hiperidrose afeta de forma
bastante negativa as atividades diárias dos pacientes, bem
como o seu convívio com familiares e amigos.
Conclusão
Neste estudo, observou-se que a maioria dos pacientes
operados de hiperidrose obteve melhoria em sua qualidade
de vida. No entanto, apesar de as técnicas cirúrgicas já
estarem bastante evoluídas e os casos de complicações
pós-operatórias serem cada vez mais raros, a sudorese
compensatória ainda é um grande agravante no que diz
respeito à qualidade de vida desses pacientes. Neste
contexto, nota-se a necessidade da realização de
estudos que, através de novos métodos, diminuam
a incidência de sudorese compensatória, bem como de
ajudar os pacientes a avaliarem de forma mais consciente
a relação custo-benefício da cirurgia.
Agradecimento
Agradecemos ao Professor Márcio Antônio Babinski
pela substancial contribuição na análise estatística dos
dados contidos neste texto.
REFERÊNCIAS
1. LEÃO, L.E.V.; OLIVEIRA, R. et al. — Role of video-assisted thoracoscopic sympathectomy
in the treatment of primary hyperhidrosis. Med. J., 121: 191-7, 2003.
2. DUMONT, P.; DENOYER, A. & ROBIN, P. — Long-term results of thoracoscopic sympathectomy for hyperhidrosis. Ann. Thorac. Surg., 78: 1801-7, 2004.
3. VIEIRA, S. — Introdução à Bioestatística. 5. ed., Rio de Janeiro, Campus, 2001. p. 2-7.
4. CAMPOS, J.R.M.; KAUFFMAN, P. & WEREBE, E.C. — Quality of life, before and after sympathectomy: report on 378 operated patients. Ann. Thorac. Surg., 76: 886-91, 2003.
5. REX, L.O.; DROTT, C. et al. — The boras experience of endoscopic thoracic sympathicotomy for palmar, axillary, facial hyperhidrosis and facial blushing. Eur. J. Surg.,
580(Suppl.): 23-6, 1998.
6. ZACHERL, J. HUBER, E.R. & IMHOF, M. — Long-term results of 630 thoracoscopic sympathicotomies for primary hyperhidrosis: the Vienna experience. Eur. J. Surg., 580(Suppl.):
43-6, 1998.
7. DUARTE, J.B.V. & KUX PETER — Improvements in vídeo-endoscopic sympathicotomy for
the treatment of palmar, axillary, facial and palmar-plantar hyperhidrosis. Eur. J. Surg.,
580(Suppl.): 9-11, 1998.
8. FREDMANN, B.; ZOHAR, E. et al. — Video-assisted transthoracic sympathectomy in the
treatment of primary hyperhidrosis: friend or foe? Surg. Laparosc. Endosc. Percutan.
Tech., 4: 226-9, 2000.
9. SAYEED, R.A. & NYAMEKYE, I. — Quality of life after transthoracic endoscopic sympathectomy for upper limb hyperhidrosis. Eur. J. Surg., 580(Suppl.): 39-42, 1998.
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
PROF. LUIZ FELIPPE JÚDICE
Rua da Conceição, 188/Sala 903-B — Centro
24020-083 — Niterói-RJ
E-mail: [email protected]
38
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
Revalidação do Título de Especialista
Garantia de Qualidade no Atendimento?
MATÉRIA ESPECIAL
Revalidação do Título
de Especialista
Garantia de Qualidade no Atendimento?
RESUMO
FABIO BISCEGLI JATENE
Professor titular da Disciplina de Cirurgia
Torácica do Departamento de
Cardiopneumologia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo.
Diretor do Serviço de Cirurgia Torácica do
Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo.
ROSANGELA MONTEIRO
Doutora em Ciências na área de Cirurgia
Torácica e Cardiovascular da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo.
Bióloga-chefe do Serviço de Cirurgia Torácica
do Instituto do Coração do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo.
WANDERLEY MARQUES
BERNARDO
Doutor em Ciências na área de Cirurgia
Torácica e Cardiovascular da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo.
Cirurgião torácico. Coordenador do
Programa Diretrizes da Associação Médica
Brasileira.
ALDEMIR HUMBERTO SOARES
Médico radiologista. Diretor do Serviço de
Radiologia do Hospital do Servidor Público
Estadual. Primeiro secretário da Associação
Médica Brasileira.
NOV./DEZ.
Neste artigo os autores discutem aspectos relacionados à
revalidação do título de especialista, destacando a sua
importância e fazendo um breve histórico do processo em
nosso País.
SUMMARY
In this article, the authors discuss aspects related to the
revalidation of specialist’s title, standing out its importance
and doing a brief report of the process in our country.
No passado, a manutenção da competência e a
atualização não eram problemáticas, pois o conhecimento
relevante, não só na Medicina como na maioria das áreas,
crescia lentamente. Entretanto, nos últimos anos, graças
ao grande avanço tecnológico e ao investimento na
realização de pesquisa básica e aplicada, algumas áreas
têm apresentado um crescimento estrondoso de sua
produção científica. Áreas como a Engenharia e
a Medicina, nos últimos 20 anos, apresentaram
crescimento de 8,5 e 7,6 vezes, respectivamente, em sua
produção científica. Assim, podemos considerar que o
conhecimento dobra a cada três anos e a maioria das
técnicas torna-se obsoleta entre cinco e sete anos.
Outro aspecto a ser considerado é que os pacientes
estão cada vez melhor informados e a imprensa leiga e a
Internet disponibilizam grande quantidade de informações
sobre novas drogas e procedimentos, não se satisfazendo
com decisões e condutas médicas que não venham
acompanhadas de maior detalhamento.
Dentro deste contexto, fica claro que sem um
programa de educação ativa nenhum médico pode se
manter atualizado por mais do que alguns anos após
a sua formação. Embora exista um consenso quanto
à necessidade de estudo e aperfeiçoamento
constantes, este processo não é tão simples, pois
envolve, dentre outros aspectos, disponibilidade de
tempo e investimento financeiro. Na sua maioria, os
médicos têm pouco tempo para estudar, em função
de sua árdua jornada de trabalho, que, muitas vezes,
inclui plantões e vínculos empregatícios em vários
hospitais. Além disso, após a formação, a atualização
é obtida sobretudo pela participação em cursos,
simpósios e congressos, os quais apresentam custo
elevado, pois envolvem não apenas o pagamento de
inscrições, mas também despesas com passagem,
VOL. 93 • N.o 5/6
41
MATÉRIA ESPECIAL
O
hospedagem e manutenção
Acreditação para elaborar
em centros distantes da sua
normas e regulamentos para
principal objetivo da revalidação
residência.
este fim, além de coordenar a
do título de especialista é assegurar
O principal objetivo da
emissão dos Certificados de
à sociedade que o médico mantém
revalidação do título de
Revalidação.
atuais — e em nível suficiente —
especialista é assegurar à
Esta resolução foi seguida
o conhecimento e o treinamento
sociedade que o médico
por outras duas — nos 1772/05
previamente adquiridos
e 1785/06 — que
mantém atuais — e em nível
normatizaram e
suficiente — o conhecimento e
estabeleceram diretrizes e
o treinamento previamente
critérios para o processo de
adquiridos. Além disso, objetiva
recertificação, instituindo o
melhorar a prática médica,
Certificado de Atualização Profissional.
promovendo treinamento, atualização e orientação. Em
A Comissão Nacional de Acreditação é atualmente
última análise, a recertificação pode ser empregada para
composta por um membro da diretoria da Associação Médica
detectar performances inadequadas e para dar
Brasileira, um da diretoria do Conselho Federal de Medicina
credibilidade aos especialistas junto à sociedade. Assim,
e dois delegados de cada entidade, sendo comissão
a revalidação do título de especialista é um processo
permanente e que determina as regras gerais, normas e
dinâmico, que avalia a performance do profissional e seu
regulamentos do processo de certificação. Esta comissão
desempenho, atualização no conhecimento, atividade na
tem como atribuições: determinar a proporcionalidade dos
especialidade e relação médico-paciente.
eventos e atividades que somarão créditos; avaliar e autorizar
Em vários países, a recertificação está vinculada a um
cursos e eventos submetidos para certificação; emitir
sistema de acreditação por educação médica continuada.
parecer à comissão organizadora dos eventos, em caso de
Os programas de educação médica continuada são
reprovação, justificando a decisão ou sugerindo modificações;
mundialmente reconhecidos como eficientes para a
verificar se os cursos e eventos integrantes do processo
atualização do profissional, mantendo suas competências
cumprem os programas propostos; controlar a certificação do
científicas. O especialista que tem o seu título de
candidato junto à Sociedade de Especialidade; esclarecer
especialista revalidado é mais valorizado por seus
eventuais dúvidas sobre o processo.
pacientes e no mercado de trabalho, pois pode comprovar
O sistema de revalidação está baseado em
o seu aprimoramento constante frente à evolução da
créditos, no total de 100, que devem ser acumulados
Medicina. Ademais, em alguns países, têm sido
em até cinco anos. Caso não sejam acumulados 100
concedidos incentivos para o desenvolvimento
créditos, haverá a opção de prova para obtenção do
profissional, com adoção de planos de carreira e de
certificado de atualização profissional. Os créditos
vencimentos. Na Bélgica, o incentivo é dado sob a forma
poderão ser obtidos com freqüência a congressos
financeira, com aumento salarial de 4% para os
nacionais, jornadas regionais e estaduais ou
profissionais que se submeterem ao processo de
programas de educação continuada, publicações
recertificação; em contrapartida, na Noruega, os médicos
científicas e títulos acadêmicos, entre outros.
que não se recertificarem são “punidos”, com perda de
É importante que se tenha um processo de revalidação
20% em seus honorários. Itália, Portugal e Luxemburgo,
efetivo, eficiente e defensável, que não seja complexo e
por exemplo, pressionam os profissionais a participarem
que onere o menos possível ao médico. Com vistas
do processo por meio de mecanismos que tornam
à democratização do processo, é importante que os
obrigatória a recertificação para estabelecimento de
créditos possam ser obtidos em eventos desenvolvidos
contratos com seguradoras e hospitais. Outra forma de
no Estado ou região geográfica de domicílio do médico,
incentivo à recertificação — adotada por alguns países —
sem grandes deslocamentos, e ainda por educação a
consiste na publicação de listas de médicos que
distância, inclusive com o recurso da Internet e de canal
atenderam às exigências dos programas locais, as quais
de TV para o acompanhamento de cursos dentro da sua
são disponibilizadas para a população.
residência ou consultório.
Previamente ao ano 2004, no Brasil, o processo de
A AMB e o CFM têm apoiado e participado
revalidação do título de especialista já vinha sendo
ativamente destas iniciativas, por meio de suas
realizado por algumas sociedades de especialidade,
diretorias, suas federadas e conselhos regionais.
entretanto não era unificado, nem padronizado, sem
Também fica claro que o papel das Sociedades de
critérios para avaliação uniformes.
Especialidade será fundamental para o sucesso deste
Dentro deste contexto, a Associação Médica Brasileira
processo, tornando-o efetivo, transparente e, sobretudo,
(AMB), em parceria com as Sociedades de Especialidade,
acessível à toda comunidade médica.
propôs a normatização da revalidação do título de
Este processo certamente sofrerá adequações ao
especialista e dos certificados de área de atuação.
longo dos próximos anos, sendo progressivamente
Na ocasião, foram discutidos alguns temas sobre a
refinado e adaptado à realidade de nosso País, mas a
revalidação do título: a) definição dos títulos a serem
recertificação parece ser um movimento irreversível, que
revalidados; b) obrigatoriedade de adesão das Sociedades
representa a expressão da responsabilidade e o respeito
de Especialidade ao processo; c) sistema a ser
dos médicos com os seus pacientes.
empregado para acúmulo de créditos e tempo limite
para tal; d) validade dos títulos previamente obtidos.
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Esta iniciativa culminou na Resolução do Conselho
PROF. FABIO BISCEGLI JATENE
Federal de Medicina (CFM) nº 1755/04, publicada no
Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Diário Oficial da União, em 14 de dezembro de 2004. Esta
Universidade de São Paulo — Serviço de Cirurgia Torácica
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 — 5º andar — Bloco II — Sala 7
portaria instituiu a revalidação dos títulos de especialistas
04503-000 — São Paulo-SP
E-mail: [email protected]
e de áreas de atuação e criou a Comissão Nacional de
42
NOV./DEZ.
VOL. 93 • N.o 5/6
CURSO DE ATUALIZAÇÃO EM
CARDIOLOGIA
CURSO DE ATUALIZAÇÃO EM
CARDIOLOGIA
AULAS
1. Hipertensão Arterial Sistêmica
2. Angina Estável Crônica
3. Terapêutica da Insuficiência Cardíaca — Atuação Inicial
4. Avaliação Pré-operatória do Paciente Cardiopata
5. Tromboembolia Pulmonar — Diagnóstico
6. Dislipidemia
7. Pericardite
8. Arritmias para Conduta Clínica
COORDENADOR
Dr. Hans Fernando
Rocha Dohmann
44
9. Miocardite Aguda
10. Angina Estável Aguda
NOV./DEZ., 2007
VOL. 93 • N.os 5/6
8 Arritmias para Conduta Clínica
Introdução
8 Arritmias
para Conduta
A
Clínica
arritmologia é uma área da Cardiologia em franca expansão. O melhor conhecimento dos mecanismos
envolvidos na gênese e na perpetuação das principais
arritmias cardíacas associado ao avanço tecnológico
atual tem proporcionado grandes avanços no tratamento destes pacientes nas suas mais variadas formas de apresentação.
Classicamente as arritmias dividem-se em dois grandes
grupos: bradiarritmias e taquiarritmias.
As arritmias supraventriculares de maior importância clínica são: 1. extra-sístoles supraventriculares; e 2. taquicardia
paroxística supraventricular (taquicardia reentrante nodal,
taquicardia reentrante atrioventricular, taquicardia atrial, flutter/
fibrilação atrial).
As arritmias ventriculares dividem-se em: polimórficas (extra-sístole ventricular, taquicardia ventricular polimórfica, flutter/
fibrilação ventricular); e monomórficas (extra-sístole ventricular,
taquicardia ventricular monomórfica sustentada).
Neste artigo serão abordadas as características eletrocardiográficas e clínicas associadas às principais taquiarritmias
encontradas na prática clínica diária.
LUIZ EDUARDO CAMANHO
FERNANDA FERREIRA
IEDA PRATA
PAULO MALDONADO
ANGELINA CAMILETTI
EDUARDO SAAD
Do Hospital Pró-Cardíaco — Rio de Janeiro.
Aspectos clínicos gerais
A principal manifestação clínica das taquiarritmias em geral
é o sintoma de palpitação, que, por definição, é a percepção
dos batimentos cardíacos. Esses batimentos podem ser rápidos, precoces ou irregulares e podem ser percebidos no tórax
e na região epigástrica ou cervical.
A alta prevalência desse sintoma na prática clínica e seus
inúmeros significados tornam este tema de extrema importância na prática médica diária. Em um estudo retrospectivo
(1), foi demonstrado que não há diferenças nas taxas de
morbidade e mortalidade nos pacientes com palpitações em
relação ao grupo-controle. As palpitações podem ser secundárias a arritmias cardíacas, doenças cardíacas não-arrítmicas,
condições clínicas variadas, causas psiquiátricas ou uso de
medicações e(ou) drogas ilícitas (Tabela 1) (2).
RESUMO
As arritmias cardíacas apresentam grande prevalência na
prática clínica diária e, desta forma, o diagnóstico correto é
fundamental para a instituição da terapia adequada. O reconhecimento dos principais sinais e sintomas clínicos associados à interpretação criteriosa do eletrocardiograma são peças
determinantes do sucesso terapêutico. Neste artigo serão
abordadas as principais arritmias supraventriculares e ventriculares, no que diz respeito à sua apresentação clínica, critérios eletrocardiográficos, conduta imediata e em longo prazo.
Vale enfatizar que a arritmologia atual oferece inúmeras opções terapêuticas efetivas e curativas para a grande maioria
dos pacientes.
SUMMARY
Cardiac arrythmias are very common in daily clinical practice; a precise diagnosis is key for an adequate therapeutic strategy. The recognition of the main clinical signs and symptoms
associated with a detailed eletrocardiographic evaluation are
the main tools used for evaluation. In this article, we review
the most common supraventricular and ventricular arrythmias,
focusing on the clinical presentation, ECG patterns and therapeutic options. It is important to emphasize that contemporary
cardiac electrophysiology offers several therapeutic strategies
that represent an effective curative alternative for patients with
cardiac arrhythmias.
NOV./DEZ., 2007
TABELA 1
Etiologia da palpitação
Arritmias
Drogas e medicações
Condições clínicas
Taquicardia atrial
Broncodilatadores
Hipertireoidismo
Flutter atrial
Descongestionantes
Hipoglicemia/
atividade física
Fibrilação atrial
Antiarrítmicos
Hipocalemia/hipoxia
Taquicardia reentrante nodal
Suplementos nutricionais Doença pulmonar
Wolff-Parkinson-White
Hormônios tireoidianos
Febre/anemia
Taquicardia ventricular
Cocaína/nicotina
Feocromocitoma
Extra-sístole atrial
Anfetaminas
Desidratação/choque
Extra-sístole ventricular
Álcool/cafeína
Hipovolemia
Disfunção sinusal
Antitussígenos
Síndrome vasovagal
Causas cardíacas não-arrítmicas
Causas psiquiátricas
Cardiopatia congênita
TMP*
Ansiedade
ICC/doença valvar
Prolapso da valva mitral
Distúrbio do pânico
Cardiomiopatia hipertrófica
Pericardite
* TMP: Taquicardia mediada pelo marcapasso.
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CARDIOLOGIA
Outros sintomas freqüentemente associados são: tonteira,
pré-síncope, síncope, sudorese fria, sensação de morte iminente e poliúria.
A magnitude e a exuberância dos sintomas estão relacionadas a diversos fatores: presença ou não de cardiopatia estrutural, estado volêmico, tônus adrenérgico, posição corporal e
mecanismo da arritmia.
De modo geral, as arritmias que ocorrem na ausência de
cardiopatia estrutural apresentam prognóstico favorável e raramente associam-se à morte súbita. De modo inverso, as
arritmias, principalmente as ventriculares, que ocorrem em
portadores de cardiopatia de base, geralmente estão associadas com um risco substancial de morte súbita.
Alguns dados relevantes obtidos durante a anamnese desta população podem ser bastante úteis, tais como: características do início e término das crises; fatores externos relacionados ou deflagradores; sintomas clínicos associados como, por
exemplo, síncope ou pré-síncope; história prévia de internação
hospitalar relacionada à arritmia e às medicações utilizadas.
Arritmias supraventriculares
Classicamente são aquelas que ocorrem acima do tronco
do feixe de His.
Extra-sístole supraventricular
Extra-sístole é qualquer batimento precoce, isto é, se inscreve antes do momento em que deveria ocorrer o batimento
normal. As extra-sístoles supraventriculares dividem-se em
atriais e juncionais, na dependência do local de origem. Em
termos práticos, a expressão clínica de ambas é idêntica, não
havendo nenhuma diferença em relação ao seu foco de origem (Fig. 1).
FIGURA 1 — Extra-sístole atrial em paciente assintomático.
A sua prevalência aumenta com o avançar da idade e ocorre
em 4% a 14% dos fetos e em 100% dos indivíduos acima dos
90 anos. O método diagnóstico de escolha é o Holter de 24
horas e a terapêutica específica com betabloqueador ou drogas antiarrítmicas está indicada apenas para os pacientes sintomáticos.
FIGURA 2 — Taquicardia reentrante nodal (observa-se a onda r‘ terminal em V1).
Taquicardia reentrante atrioventricular (TRAV) — É o segundo
mecanismo mais comum de TPSV com RR regular. Esta
taquicardia também recebe o nome de taquicardia ortodrômica,
e diz respeito a um mecanismo reentrante relacionado à presença de uma via acessória.
As vias acessórias são feixes musculares de condução rápida que conectam eletricamente o átrio ao ventrículo, e podem
ser manifestas ou ocultas. Quando a via acessória é manifesta
observa-se ao ECG um intervalo PR curto e QRS largo com
espessamento da sua porção inicial (onda delta). A denominação síndrome de Wolff-Parkinson-White é reservada para os
pacientes que têm pré-excitação (onda delta) associada a crises de taquiarritmia.
Durante a TRAV, o ECG exibe padrão de QRS estreito, RR
regular e FC entre 140 e 240bpm. A condução anterógrada é
feita pelo sistema normal de condução e a retrógrada se faz
através da via acessória. Neste tipo de TPSV é freqüente o
achado de alternância elétrica (Fig. 3).
Taquicardia paroxística supraventricular
Taquicardia reentrante nodal (TRN) — É a TPSV com RR regular
mais comum na prática clínica, correspondendo a 60% dos
casos de TPSV que são admitidos no setor de emergência.
Acomete preferencialmente o sexo feminino entre a terceira
e quinta décadas. O sintoma clássico é o batimento em fúrcula
esternal e é a TPSV que mais freqüentemente se associa com
síncope. A grande maioria dos pacientes não apresenta
cardiopatia estrutural. O circuito da arritmia localiza-se predominantemente no nódulo atrioventricular (NAV), através de duas
vias distintas, uma com condução rápida e outra com condução lenta.
O ECG durante a taquicardia evidencia RR regular e ausência de onda P retrógrada, com FC que varia de 140 a 240bpm.
Na derivação V1 é comum o achado de uma pseudo-onda r’
(terminal), que corresponde a onda P retrógrada que inscrevese no final do complexo QRS (Fig. 2) (1).
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FIGURA 3 — Taquicardia reentrante atrioventricular (relacionada à
presença de via acessória). Observa-se a alternância elétrica, sugestiva deste mecanismo.
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Taquicardia atrial — É uma taquiarritmia supraventricular que
comumente ocorre em portadores de cardiopatia estrutural. O
mecanismo eletrofisiológico pode ser reentrante ou automático. A freqüência atrial varia entre 120 e 250bpm, e ao ECG
pode-se observar onda P de morfologia diversa da onda P
sinusal com a presença de linha isoelétrica entre elas. Esta
última característica auxilia no diagnóstico eletrocardiográfico
diferencial com flutter atrial (Fig. 4).
Apesar de o risco de embolização dos pacientes com FlA
ser inferior aos pacientes portadores de fibrilação atrial (2,2%
versus 5%-7%), as medidas terapêuticas preventivas de fenômenos embólicos devem ser sempre adotadas quando planejase a reversão desta arritmia.
Fibrilação atrial — A fibrilação atrial (FA) é a arritmia sustentada
mais comum no coração humano. Sua prevalência aumenta
substancialmente com o avançar da idade e a sua presença está
associada a uma menor taxa de sobrevida em longo prazo.
O diagnóstico eletrocardiográfico deve ser feito nas derivações do plano inferior, onde observamos ausência de onda P,
RR irregular e ondulação da linha de base (Fig. 6). O NAV não
participa do circuito da arritmia, e da mesma forma que no
flutter e na taquicardia atrial, esta estrutura atua apenas como
um modulador da resposta ventricular.
FIGURA 4 — Taquicardia atrial.
É importante salientar que ao contrário das taquicardias citadas anteriormente (TRN/TRAV), nesta situação o NAV não
participa do circuito da arritmia e, desta forma, atua apenas
controlando a resposta ventricular (2, 3).
“Flutter” atrial — O flutter atrial (FlA) típico é uma
macroreentrada ao redor do átrio direito que utiliza o istmo
cavo-tricuspídeo (região entre a valva tricúspide e a veia cava
infeiror) como região perpetuadora do circuito. A freqüência
atrial varia entre 250 e 350bpm e ao ECG observa-se o típico
aspecto serrilhado (ondas F). Estas ondas são negativas nas
derivações do plano inferior (D2, D3 e aVF) e positivas em V1
(Fig. 5). De forma similar à taquicardia atrial, ocorre predominantemente em portadores de cardiopatia estrutural, congênita
ou adquirida, como, por exemplo, o cor pulmonale crônico.
FIGURA 6 — Fibrilação atrial com alta resposta ventricular.
Atualmente, classifica-se nas seguintes formas: paroxística,
persistente e permanente (ou crônica).
Diante de paciente portador de FA, três desafios clínicos se
impõem: 1. controle dos sintomas (palpitação); 2. prevenção
de fenômenos tromboembólicos; e 3. controle da resposta
ventricular (forma permanente) com prevenção de taquicardiomiopatia.
A prevenção de tromboembolismo deve ser sempre realizada baseando-se nos fatores de risco já estabelecidos (baixo,
moderado ou elevado risco) (Tabela 2). O emprego de AAS ou
varfarina é mandatório em todos os casos. Quando a opção
terapêutica for anticoagulação plena é fundamental a manutenção do INR entre 2,0 e 3,0 (4).
Abordagem aguda das taquicardias supraventriculares
FIGURA 5 — “Flutter” atrial típico. Observa-se o aspecto serrilhado
(ondas F negativas em DII, DIII e aVF, e positivas em V1).
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Diante de um paciente com surto de TPSV sustentado são
fundamentais três estratégias: 1. definir o estado hemodinâmico; 2. realizar ECG de 12 derivações, sempre que possível; e 3. tentar caracterizar o mecanismo da TPSV.
A definição hemodinâmica do paciente é fundamental, uma
vez que a presença de sinais e sintomas de baixo débito cardíaco (sudorese fria, palidez cutaneomucosa, hipotensão arterial, diminuição do nível de consciência ou síncope) tornam a
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TABELA 2
Estratificação de risco para eventos tromboembólicos e terapia
antitrombótica recomendada
Fatores de risco
Baixo
Moderado
Elevado
Sexo feminino
Idade ≥ 75 anos
AVE prévio, AIT ou embolia
Idade 65 a 74 anos
Hipertensão
Estenose mitral
Doença arterial coronária
Insuficiência cardíaca
Válvula cardíaca protética
Tireotoxicose
Fração ejeção ≤ 35%
Diabetes meIlitus
Categoria de risco
Terapia recomendada
Fatores de risco menores
Aspirina 81 a 325mg/dia
Um fator de risco moderado
Aspirina 81 a 325mg/dia ou varfarina
(INR — 2 a 3)
Qualquer fator de risco elevado ou
mais que um fator de risco
moderado
Varfarina (INR — 2 a 3)
cardioversão elétrica sincronizada como terapia de escolha,
independente do mecanismo relacionado.
Caso não haja sintomas de instabilidade hemodinâmica, a
realização de manobras vagais (manobra de Valsalva, compressão do seio carotídeo e imersão facial em água fria — crianças
abaixo de um ano) devem ser tentadas para reversão da arritmia.
Vale ressaltar as principais contra-indicações à realização de
compressão do seio carotídeo: sopro carotídeo, IAM ou AVC
nos últimos três meses e intoxicação digitálica.
Quando o NAV não participa do circuito da taquiarritmia
(taquicardia/flutter atrial; fibrilação atrial), estas manobras podem apenas aumentar o grau de bloqueio AV, porém, não sendo possível revertê-las.
Caso estas medidas falhem, está indicada a utilização de
fármacos intravenosos, sendo a adenosina a droga de escolha
em tais situações (6, 12 ou 18mg, IV). Deve-se ter cautela quanto
a sua utilização em pacientes asmáticos. A outra opção seria a
utilização de bloqueadores dos canais de cálcio nãodiidropiridínicos (verapamil/diltiazem).
A taxa de sucesso de reversão de TRN e TRAV com
adenosina é bastante elevada (em torno de 95%), e a mesma
é uma droga muito segura pelo seu curto tempo de ação (5).
Nos casos de taquicardia atrial e flutter atrial, a terapia de
escolha é a cardioversão elétrica sincronizada (100J). Nos casos de fibrilação atrial, a cardioversão química é mais eficaz
nos primeiros sete dias do início da arritmia. A partir de então,
deve-se optar pela cardioversão elétrica sincronizada com carga inicial elevada (360J monofásico ou 200J bifásico).
Diante de todo paciente portador de fibrilação atrial sustentada e sintomática, a medida terapêutica inicial deve ser sempre o controle da resposta ventricular através da utilização de
drogas bloqueadoras do NAV (betabloqueador, antagonista de
cálcio ou digital). A reversão específica da taquiarritmia deve
ser realizada somente depois de adotadas todas as medidas
profiláticas de fenômenos tromboembólicos.
FIGURA 7 — Extra-sístoles ventriculares monomórficas registradas
durante gravação de Holter 24 horas.
de cardiopatia apresenta prognóstico favorável (sem relação
com doença isquêmica) e, geralmente, ocorre por automatismo
anormal, proveniente do trato de saída do ventrículo direito ou
esquerdo. O tratamento específico está indicado apenas nos
pacientes sintomáticos e independe da freqüência da atividade
extra-sistólica. A terapia farmacológica inicial são os
betabloqueadores. Outras drogas, tais como bloqueadores do
canal de cálcio, drogas antiarrítmicas das classes IC (propafenona) ou III (amiodarona ou sotalol), podem ser também utilizadas. A ablação por cateter está indicada nos pacientes sintomáticos, refratários à terapêutica medicamentosa e que apresentem disfunção ventricular secundária à arritmia. Esta
metodologia apresenta excelentes índices de sucesso, com
baixas taxas de complicações.
Taquicardia ventricular
As taquicardias ventriculares podem ser classificadas de
acordo a manifestação clínica em: hemodinamicamente estáveis (assintomáticas ou palpitações leves) ou instáveis (présíncope ou síncope). De acordo com a apresentação
eletrocardiográfica dividem-se em: não-sustentada (três ou
mais batimentos, terminando espontaneamente em menos
de 30 segundos) ou sustentada (TV com duração maior que 30
segundos); monomórficas (uma única morfologia de QRS) ou
polimórficas (várias morfologias de QRS). Podem ocorrer em
pacientes com coração estruturalmente normal (6) ou com
doença cardíaca estrutural (Tabela 3).
TABELA 3
Etiologia da taquicardia ventricular
Doença cardíaca estrutural
Coração normal
Doença coronariana crônica
Síndromes genéticas
Doença de Chagas
Síndrome do QT longo congênito
Miocardiopatia hipertrófica
Síndrome do QT curto
Miocardiopatia dilatada
Síndrome de Brugada
TV catecolaminérgica-dependente
Miocardiopatia valvar
Verapamil-sensível: TV fascicular
Displasia arritmogênica do
ventrículo direito
TV monomórfica repetitiva (Gallavardin)
Relacionada a drogas
Drogas antiarrítmicas
Antibióticos (eritromicina, quinolonas, sulfas)
Arritmias ventriculares
Anticonvulsivantes e antidepressivos
(amitriptilina, haloperidol)
Extra-sístole ventricular
Distúrbios eletrolíticos
Potássio
Trata-se de batimento precoce oriundo de qualquer região
de ambos os ventrículos (Fig. 7). Apresentam-se de forma isolada, pareada, monomórfica ou polimórfica e podem estar associadas ou não à cardiopatia estrutural de base. Na ausência
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Magnésio
Isquemia miocárdica
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Taquicardia ventricular monomórfica sustentada (TVMS) — Trata-se de taquicardia com QRS largo (> 0,12s) com padrão de
BRD (quando originam-se do ventrículo esquerdo) ou BRE,
quando originam-se no ventrículo direito (Fig. 8). O diagnóstico diferencial deve ser feito com as taquicardias
supraventriculares com condução aberrante, utilizando-se os
critérios de Brugada (Fig. 9). As taquicardias ventriculares
monomórficas geralmente estão associadas a anormalidades
cardíacas estruturais, como cardiopatia isquêmica, chagásica
ou dilatada idiopática. Apresenta prognóstico favorável quan-
FIGURA 8 — Taquicardia ventricular monomórfica sustentada.
do origina-se no trato de saída do ventrículo direito (QRS positivo em DII, DIII e aVF) e podem ser tratadas com drogas
(betabloqueador ou bloqueador do canal de cálcio) ou com
ablação por cateter, sendo esta a modalidade terapêutica de
escolha. Na presença de cardiopatia estrutural, a TVMS representa um marcador de elevado risco de morte súbita e devem
ser imediatamente tratada (7). Se houver instabilidade
hemodinâmica, a cardioversão elétrica imediata com 360J ou
200J bifásico deverá ser realizada. Se o paciente encontra-se
estável poderá ser utilizada amiodarona, procainamida ou
cardioversão elétrica. Nunca utilizar bloqueadores do canal de
cálcio (verapamil ou diltiazem). Anormalidades eletrolíticas e
isquemia devem ser corrigidas. Após reversão aguda da TV,
está indicado o implante de CDI, na grande maioria dos casos.
A ablação por cateter é uma opção terapêutica nos casos de TV
incessante ou episódios freqüentes sintomáticos em pacientes portadores de CDI.
Taquicardia ventricular polimórfica — Está associada à fase
aguda do infarto do miocárdio (ver adiante), síndromes genéticas e síndrome do QT longo. O torsades de pointes trata-se de
uma TV polimórfica onde ocorre torção das pontas do QRS ao
redor de uma linha isoelétrica, geralmente relacionada à presença de intervalo QT longo (Fig. 10). A principal causa de QT
longo é o adquirido e secundário a drogas (antiarrítmicos em
geral, antibióticos, haloperidol, entre outras). Trata-se de uma
arritmia bradicardia-dependente, com alta taxa de letalidade
em que o tratamento deve ser imediatamente instituído
(cardioversão elétrica, correção de distúrbios eletrolíticos, reposição venosa de magnésio e implante de marcapasso provisório). As taquicardias ventriculares polimórficas associadas a
síndromes genéticas estão associadas a alto risco de morte
súbita arrítmica e deverão ser tratadas com implante de
cardiodesfibrilador após tratamento agudo.
Ausência do padrão RS nas derivações precordiais
Sim
Não
FIGURA 10 — “Torsades de pointes” secundário à intoxicação por
quinidina.
TV
Intervalo início da onda R e o nadir de S > 100ms em uma
derivação precordial
Sim
Não
TV
Presença de dissociação atrioventricular
Sim
Não
TV
Critérios morfológicos para TV em V1-V2 e V6
BRD
V6: R/S > 1
BRE
As arritmias relacionadas a síndromes coronarianas agudas são extra-sístoles ventriculares, taquicardia ventricular
não-sustentada, ritmo idioventricular acelerado, taquicardia
ventricular e fibrilação ventricular (Fig. 11) (8). O uso de
betabloqueadores pode diminuir a incidência destas
arritmias (9). A ocorrência de fibrilação ventricular ou
taquicardia ventricular instável nas primeiras 48 horas do
infarto agudo do miocárdio pode chegar a 20% (7, 10) e está
associada a um aumento na mortalidade hospitalar, porém
sem aumento da mortalidade em longo prazo. O tratamento
deve constar de desfibrilação imediata com choque de 360J
monofásico ou 200J bifásico e utilização de amiodarona
V1: R > 30ms
RS > 70ms, entalhe onda S
FIGURA 9 — Critérios de Brugada para diagnóstico diferencial das
taquicardias com QRS largo.
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Arritmias ventriculares relacionadas à síndrome coronariana
aguda
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FIGURA 11 — Fibrilação ventricular na fase aguda de infarto do miocárdio
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(300mg em bolus ) ou lidocaína (1mg/kg em bolus )
endovenosas, seguido de dose de manutenção. O ritmo
idioventricular acelerado (três ou mais complexos
ventriculares com freqüência entre 60 e 100bpm) está associado à reperfusão miocárdica e não deverá ser tratado.
As extra-sístoles ventriculares e a taquicardia ventricular nãosustentada assintomática e sem repercussão hemodinâmica
não têm indicação de tratamento específico.
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ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
DR. LUIZ EDUARDO CAMANHO
Hospital Pró-Cardíaco — Setor de Arritmia Método Invasivo
Rua General Polidoro, 192 — Botafogo
22280-000 — Rio de Janeiro-RJ
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