ÍTALO RAMOS CONCEIÇÃO 2008_1 - Cirurgia Veterinária

Transcrição

ÍTALO RAMOS CONCEIÇÃO 2008_1 - Cirurgia Veterinária
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
ESCOLA DE MEDICINA VETERINÁRIA
DEPARTAMENTO PATOLOGIA E CLINICAS
ÍTALO RAMOS CONCEIÇÃO
ALOTRIOFAGIA - MANIFESTAÇÃO DE TRANSTORNO OBSESSIVOCOMPULSIVO EM UM CÃO: RELATO DE CASO.
SALVADOR
2008
ÍTALO RAMOS CONCEIÇÃO
ALOTRIOFAGIA - MANIFESTAÇÃO DE TRANSTORNO OBSESSIVOCOMPULSIVO EM UM CÃO: RELATO DE CASO.
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Medicina Veterinária,
Escola de Medicina Veterinária,
Universidade Federal da Bahia, como
requisito parcial para obtenção do grau
de Médico Veterinário
Orientador: Prof. Dr. João Moreira da Costa Neto
Salvador
Semestre 1/2008
Ramos Conceição, Ítalo, 1980 Alotriofagia - manifestação de Transtorno Obsessivo-Compulsivo em
um cão - Relato De Caso/Ítalo Ramos Conceição.
- 2008.
37f.
Orientador: João Moreira da Costa Neto
Trabalho de conclusão de curso (graduação) –
Universidade Federal da Bahia, Curso de Medicina Veterinária,
2008.
1 . Comportamento animal. 2 . Compulsão alimentar. 3 . Canino. I
.Ramos Conceição,Ítalo. II . Universidade Federal da Bahia. .
Escola de Medicina Veterinária. III . Alotriofagia: manifestação de
Transtorno Obsessivo-Compulsivo em um cão - Relato De Caso.
Termo de Aprovação
ÍTALO RAMOS CONCEIÇÃO
ALOTRIOFAGIA: MANIFESTAÇÃO DE TRANSTORNO OBSESSIVOCOMPULSIVO EM UM CÃO - RELATO DE CASO.
Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Medico
Veterinário, Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora:
Banca Examinadora:
Prof. Dr. João Moreira da Costa Neto
Prsidente da Banca
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
Apresentada em: ____ / ____ / ____
DEDICATÓRIAS
“Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor;
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;
Onde houver discórdia, que eu leve a união;
Onde houver dúvida, que eu leve a fé;
Onde houver erro, que eu leve a verdade;
Onde houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois, é dando que se recebe,
é perdoando que se é perdoado,
e é morrendo que se vive para a vida eterna.”
Oração de São Francisco de Assis.
Dedico a Deus, meus pais (Maria e Milton), minha irmã (Kelly), a meu
professor (Dr. João Moreira), por todo apoio e dedicação em todos os
meus momentos.
A todos meus pacientes e seus proprietários que sempre, de alguma
maneira, deram-me lições que em livro didático algum poderia aprender:
amor a profissão, respeito, persistência e serenidade.
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS
“Quando nascemos, dão-nos o livro da vida, mas estas páginas estão
em branco, e cabe a nós preenchê-las. Não é obrigatório seguir as
indicações alheias.
Quando somos pequenos, os pais e a sociedade escrevem por nós os
primeiros capítulos, e pode acontecer que não gostemos muito deles.
Mas nada nos obriga a continuar a história no estilo em que foi
começada.
Por isso, viremos hoje uma nova página, agarremos a caneta e
comecemos a escrever a nossa história. Afinal de contas, só se vive
uma vez“.
Lucien Auger
Ao Prof. Dr. João Moreira da Costa Neto por ter aceitado ser o meu orientador,
pela oportunidade, por toda dedicação, paciência, compreensão, ensinamentos, pelo
espírito científico e humanitário, apoio em todos os momentos, pela confiança e
papel fundamental na minha formação acadêmica;
A Prof.ª MS. Simone de Aquino Viegas por todo carinho, dedicação e muita força
em todos os momentos;
Prof. Dr. Maria Emilia Bavia que mais que ninguém acreditou no meu potencial;
A MV. Flávia Carolina Souza de Oliveira por sempre ter estado ao meu lado em
alguns do melhores e piores momentos dessa caminhada.
“Amigo é coisa para se guardar
debaixo de sete chaves, dentro do coração
assim falava à canção que na América ouvi
Mas quem cantava chorou, ao ver seu amigo partir
Mas quem ficou, no pensamento voou
Com seu canto que o outro lembrou
e quem voou, no pensamento ficou
com a lembrança que o outro cantou.
Amigo é coisa para se guardar
no lado esquerdo do peito
mesmo que o tempo e a distância
digam não, mesmo esquecendo a canção
o que importa é ouvir a voz que vem do coração
Pois seja o que vier, venha o que vier
qualquer dia amigo eu volto a te encontrar
qualquer dia amigo a gente vai se encontrar”
Milton Nascimento
A todos os amigos da graduação que passaram por todos os momentos de
angústia, luta, perseverança e companheirismo: Marcus Felipe, Gisele Nunes,
Milena Pinto, Aílton Silva e tantos que aqui não cabem.
Aos estagiários “rasos” do centro cirúrgico: os anjos da guarda sem asas das
horas mais difíceis.
Aos funcionários do Hospital Veterinário da Universidade Federal da Bahia,
que fizeram com que a dia-a-dia fosse infinitamente mais prazeroso .
A toda equipe da biblioteca da EMV-UFBA, por toda ajuda prestada.
MUITO OBRIGADO!
RESUMO
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) é um distúrbio comportamental
importante em humanos, caracterizado pela presença de obsessões e compulsões.
Em cães e gatos é freqüentemente reconhecido pelo comportamento ritualístico e
estereotipado, porém outras manifestações comportamentais são relacionadas. A
alotriofagia, dentre estas, mostra-se a mais nociva para a saúde animal. O presente
trabalho relata um caso de TOC caracterizado por alotriofagia em canino da raça
Bull Terrier, macho de 11 meses de idade, no qual foram encontrados 2,250 quilos
de diversos utensílios domésticos compartimentalizados no estômago. A anamnese,
com ênfase nos hábitos cotidianos do paciente e a exclusão de outros diagnósticos
diferenciais nos permitiu concluir se tratar de TOC.
Palavras-Chaves: Comportamento animal; compulsão alimentar; corpo estranho;
canino.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Imagem fotográfica mostrando aspecto do animal no pré-operatório.Em A
animal em estação vista lateral esquerda. Em B vista ventral, C vista
dorsal. D e E Vista lateral esquerda e direita respectivamente com o cão
na posição sentado. Em todas as vistas não se evidenciava quaisquer
alterações na conformação abdominal..
Figura 2 - Raio x da região abdominal com ênfase em área estomacal resultando em
imagem homogênea linceolar.
Figura 3 – Ultrassonografia da região epi/mesogástrica mostrando sombra acústica
compatível com presença de corpo estranho.
Figura 4 - Sequência fotográfica demonstrando procedimento cirúrgico para
laparotomia exploratória e gastrotomia no canino Bull Terrier macho,
com diagnóstico de corpo estranho gástrico. Em A, com a cavidade
peritoneal acessada, foi possível observar o estômago bastante dilatado,
ocupando grande parte da cavidade. Em B e C estômago exposto,
isolado por compressas, delimitando em sua curvatura maior, através da
apreensão de pinças de Allis, a área da incisão. Em D compartimento
gástrico aberto, observando-se grande quantidade de múltiplos materiais
de natureza estranha, compactados e ocupando todo o corpo do
estômago. Em E e F após a retirada dos mesmos o estômago foi
fechado empregando-se poliglactina 910 (Vicril) número 2-0 em dupla
camada, com suturas de Shimidien e Cushing.
.
Figura 5 – Material encontrado dentro do estômago – presença de diversos
fragmentos de utensílios domésticos dos mais variados formatos e
tamanhos.
LISTA DE ABREVIATURAS
TOC
Transtorno Obsessivo-Compulsivo
ISRS
Inibidores seletivos de receptação da serotonina
Fig.
Figura
PVPI
Iodopovidona
LISTA DE SÍMBOLOS
%
Porcentagem
mg
Miligrama
kg
Kilograma
g
Gramas
cm
Centímetro
ml
Mililitro
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ____________________________________11
2. REVISÃO DE LITERATURA _________________________12
3. RELATO DE CASO ________________________________20
4. DISCUSSÃO _____________________________________28
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS __________________________31
REFERÊNCIAS ___________________________________32
ANEXOS:
• Anexo 1 ____________________________________36
• Anexo 2 ____________________________________37
1. INTRODUÇÃO
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo, ou TOC como é mais conhecido, é uma
doença por anos estudada em humanos e seu protocolo de tratamento já é bem
estabelecido (EILAM et. al, 2006, GONZALES,1999, GRAEFF, 2001).
Os transtornos comportamentais figuram na atualidade como uma das
maiores causas de dificuldade na interação entre animais de companhia e seus
proprietários e, muitas vezes, levam ao abandono e eutanásia dos mesmos por falta
de conhecimento das possibilidades terapêuticas. Isso se torna um agravante no
Brasil que possui uma população de 29 milhões de cães e 9 milhões de gatos, que
quando abandonados tornam-se uma grande problema de zoonose (MOONFANELLI, 1999, NESTLÉ, 2005).
Dentre as várias faces da doença podem ser citadas a dermatite por
lambedura acral, a síndrome da perseguição da cauda e a alotriofagia como umas
das mais frequentes manifestações de TOC em animais de companhia, sendo que a
última citada pode levar a sérias injúrias para a saúde do animal pela ingestão de
corpo estranho e sendo seu tratamento na maioria das vezes cirúrgico (WILLARD,
2006, OVERALL e DUNHAM, 2002).
Por vezes a correção desses distúrbios se faz por mudanças no manejo ora
da alimentação ora da rotina do paciente como aumento da frequência dos
exercícios físicos, mudança de habitat e uso de técnicas de psicologia animal.
Pela relativa raridade do achado o presente trabalho pretende encorajar clínicos e
cirurgiões para a suspeita diagnóstica, fundamentada no caso clínico aqui descrito e
numa revisão dos principais trabalhos da literatura.
2. REVISÃO DE LITERATURA
O transtorno obsessivo-compulsivo, ou TOC como é frequentemente
conhecido, é um distúrbio comportamental mais estudado em humanos e que é
caracterizado pela presença de obsessões e compulsões. Em humanos, as
obsessões caracterizam-se por idéias, pensamentos, imagens ou impulsos
repetitivos e persistentes que são vivenciados como intrusivos e provocam
ansiedade. Já as compulsões são pensamentos conscientes e repetitivos que visam
reduzir a ansiedade e afastar as obsessões. Em geral, o indivíduo realiza uma
compulsão para minimizar o sofrimento advindo de um episódio de obsessão
(GONZALES, 1999).
As obsessões mais frequentes são a preocupação com a sujeira ou
secreções corporais, preocupação com simetria e escrupulosidade. As principais
compulsões envolvem lavar as mãos, verificar portas, ordenação e arrumação,
contagem e colecionismo (GONZALES, 1999, GRAEFF, 2001).
A prevalência da doença em humanos gira em torno dos 2% a 3% (duas
vezes mais que a esquizofrenia) com prevalência anual de 1,5%. Os sintomas
geralmente aparecem na infância ou na adolescência em um terço a metade dos
casos, sendo a distribuição entre os sexos semelhantes, com leve tendência a uma
maior casuística no sexo feminino (EILAM et al., 2006, GONZALES, 1999).
Em adolescentes, um exemplo da manifestação do TOC é a Tricotilofagia,
que consiste na ingestão de fragmentos de fios de cabelo, e sua extensão além do
piloro é denominada de síndrome de Rapunzel. Neste caso a doença atinge mais as
mulheres que os homens (PEREIRA, 2004). Embora classicamente seja atribuída a
distúrbios psiquiátricos de base, nem sempre a psicopatia subjacente é óbvia e,
considerando a pequena freqüência da doença, há dificuldades quanto a suspeita
diagnóstica correta, em especial com relação à diferenciação com neoplasias
malignas, considerando pacientes que apresentam massa abdominal palpável e
emagrecimento severo com anorexia associada (JESUS e NOVELLI, 2005,
RODRIGUES, CRUZ e VIANNA,1999).
A teoria mais aceita da fisiopatogenia do TOC foi formulada por Judith
Rapoport, adotando a perspectiva da psicologia evolutiva. Baseando-se em Charles
Darwin, essa orientação teórica postula que as características comportamentais dos
animais estão sujeitas à seleção natural da mesma forma que as anatômicas e
fisiológicas. Constatando que as compulsões mais freqüentes são as de limpeza
(cleaning) e de conferir se portas e janelas estão fechadas (checking), Rapoport
levantou a hipótese de que tais manifestações seriam exageros de rotinas de
autolimpeza (self grooming) e de conferir demarcações territoriais, respectivamente.
Estas foram adquiridas por numerosas espécies devido ao valor adaptativo para
prevenir doenças e garantir espaço vital necessário para alimentação e reprodução.
Na expressão da autora, a compulsão de lavar repetidamente as mãos nada mais
seria do que um grooming gone wild, ou seja, uma exacerbação do comportamento
de autolimpeza (GRAEFF, 2001).
A concepção sobre a gênese do TOC levou à busca de comportamentos com
características compulsivas em animais, sendo que dois deles chamaram logo a
atenção. O primeiro é o hábito dos cães, sobretudo os da raça Labrador, de lamber
excessivamente as patas, o que acarreta ferimentos graves. Essa condição é
denominada dermatite acral. O segundo é o comportamento, que ocorre em certas
aves submetidas ao cativeiro, de remover incessantemente as penas com o bico. Se
tais comportamentos guardam homologia com o transtorno compulsivo, isto é,
compartilham do mesmo substrato neurobiológico, deveriam ser igualmente
suscetíveis aos inibidores seletivos de receptação da serotonina (ISRS). Tal
predição foi confirmada em ensaios farmacológicos controlados, e resultaram em
tratamento de escolha para essas afecções. Provavelmente este é o único exemplo
de tratamento veterinário que derivou de uma teoria sobre a fisiopatogenia de um
transtorno
psiquiátrico
do
ser
humano
(GRAEFF,
2001,
LANDSBERG
e
ACKERMAN, 2000).
Beta-endorfinas, dopamina e serotonina têm sido associadas principalmente à
terapêutica baseadas em evidências de resposta (LUESCHER, 2000). Drogas
dopaminérgicas,
tais
como
as
anfetaminas
podem
provocar
estereótipos
(HARTGRAVES & RANDALL, 1986) e antagonistas da dopamina como haloperidol
pode resultar na supressão de estereótipos (IGLAUER e RASIM, 1993, KENNES et
al., 1988). Outra possibilidade é a de que distúrbios compulsivos são mediados
através de receptores opiáceos desde antagonistas opiáceos (drogas que bloqueiam
receptores centrais de
endorfina), como a naltrexona ter sido bem sucedido na
redução "estereótipos" em alguns casos (BROWN et al., 1987, DODMAN et. al.,
1987, DODMAN et. al., 1988, WHITE, 1990). Em um relato, no entanto, naloxona foi
associada ao aumento do prurido em um cão. Além disso, as drogas que fornecem
uma fonte exógena de opiáceos como hydrocodona também foram notificados para
ser eficaz no tratamento da dermatite por lambedura acral (SCHWARTZ, 1993).
A depleção da serotonina também foi sugerida a ser um mecanismo pelo qual
os estereótipos são induzidos (BRIGNAC, 1992). Com base em modelos humanos
para o tratamento de distúrbios obsessivo-compulsivo, drogas que inibem a
serotonina parecem ser mais eficazes no tratamento de muitos casos de cães e
gatos distúrbios compulsivos. Em um estudo sobre o efeito dos bloqueadores
seletivos da serotonina em dermatite acral por lambedura, a melhora foi visto com
clomipramina (43%), fluoxetina (39%) e sertralina (21%) em comparação com o
placebo, desipramina (um antidepressivo tri cíclico noradrenérgico) e fenfluramina
(um agente liberador de serotonina) (MERTENS e DODMAN,1996). A clomipramina
também demonstrou ser eficaz no tratamento de distúrbios compulsivos canino
incluindo correr atrás da cauda (n = 17) e dermatite acral por lambedura (n = 12) em
um estudo de dupla ocultação controlados com placebo. Os autores concluíram que
a mudança do comportamento também foi necessário no tratamnto do transtorno
compulsivo canino, já que a terapia a base de clomipramina por si só, durante 4
semanas não foi responsiva (HEWSON et. al., 1998). Em 12 terriers perseguidores
compulsivos de cauda, 75% foram notificados ter melhorado com administração de
clomipramina, em conjugação com a gestão comportamental, enquanto vários
estudos demonstraram melhoria na dermatite acral por lambedura em doses
variando de 1 mg / kg / dia a 3 mg / kg. Um mês ou mais poderá ser exigido antes
que qualquer melhoria sela vista nestes casos (MERTENS e DODMAN, 1996,
PETERSON, 1996)
Estimativas recentes indicam que entre seis e quinze milhões de cães e gatos
são eutanaziados todos os anos nos Estados Unidos em abrigos, sendo que menos
de cinco por cento dos casos possuem alguma indicação médica. Os outros casos
se enquadram nos cães que sofrem de algum tipo de transtorno comportamental, o
qual os proprietários hora não conseguem identificar, ou muito menos, procuram
orientação para tratamento específico (MOON-FANELLI, 1999).
O TOC em cães e gatos é normalmente reconhecido por causa do componente
compulsivo
(comportamento
ritualístico
e estereotipado).
O
comportamento
obsessivo compulsivo em caninos pode ser caracterizado por correr em círculos
(incluindo correr atrás da própria cauda), lambedura acral, lambedura dos flancos
(particularmente em Pinschers), corrida pela cerca, mordedura em moscas,
automutilação, vocalização, agressão e alotriofagia. Em felinos observa-se
automutilação, correr atrás da cauda, lambedura de tecido ou lã (*OVERALL &
DUNHAM, 2002). O comportamento compulsivo não é prazeroso, é apenas redutor
de ansiedade (TELHADO et. al., 2004 apud FOGLE, 1992).
Tipos específicos de comportamento compulsivo são relatados com mais
freqüência em certas raças sugerindo uma predisposição genética. Por exemplo,
perseguir a cauda ocorre em uma variedade de raças, mas parecem ser, os terrier e
raças pastoreiras, mais susceptíveis, particularmente Bull Terriers e Pastores
Alemães. A perseguição compulsiva da cauda em cães é uma condição debilitante e
muitos cães foram sacrificados para este distúrbio comportamental (MOONFANELLI, 1999).
O desenvolvimento do comportamento de perseguir a cauda difere entre
indivíduos variando de um acesso súbito a um início gradual. Para alguns cães, o
aparecimento do comportamento de perseguir a cauda ocorre subitamente sem
causa aparente. Para os outros cães, o início é súbito, mas coincide com a
exposição aos fatores psicológicos, fisiológicos ou ambientais identificáveis e ainda
relativamente benignos, interpretados como crescente ansiedade. Outros cães
mostram um início gradual normalmente associado a parâmetros também
identificáveis. Esses cães mostram escalas diárias ocasionais de perseguição de
cauda, que varia de gradualmente leve a proporções clínicas. O aparecimento da
perseguição da cauda tipicamente ocorre entre 6-16 meses de idade, embora possa
apresentar em qualquer idade. O intervalo de idade de início é de três meses a dez
anos de idade (MOON-FANELLI, 1999).
Nos cães, a lambedura desponta como o distúrbio comportamental mais
frequente dos distúrbios comportamentais. Lamber-se além do necessário para a
higienização já caracteriza uma alteração no comportamento que interfere em outras
atividades ou funções (MERCK, 2001). Porém dentre todas as manifestações do
transtorno obsessivo compulsivo, a perversão do apetite, ou alotriofagia, mostra-se a
mais nociva para a saúde do animal.
A alotriofagia é caracterizada pela ingestão de outras substancias que não o
alimento normal e varia do habito de lambedura e mordedura à ingestão de objetos e
utensílios domésticos. Na maioria dos casos deve-se a deficiências nutritivas, ou de
volume ou mais especificamente de fibras, ou ainda de nutrientes individuais, em
particular sal, cobalto ou fósforo. A falta de atividade no caso de animais confinados
em ambientes pequenos quase sempre resulta no desenvolvimento de alotriofagia.
O tipo de alotriofagia pode ser definido da seguinte maneira: osteofagia, como a
mastigação de ossos; infantofagia, o habito de comer os filhotes; coprofagia,
ingestão de fezes. Outros tipos incluem o habito de morder madeira, casca de
árvores, comer materiais putrefatos,o canibalismo e o apetite pelo sal, que leva os
animais a lamberem a própria pelagem, mastigar couro e ingerir terra, bem como
beber urina. (BLOOD e RADOSTITS, 1991).
Em equinos, alotriofagia caracteriza-se pela ingesta de areia, cascalho e pode
resultar em impactação do trato digestório inferior. Animais em baias normalmente
apresentam o comportamento de ficar parado na frente da baia/observando o
exterior, o que revela uma grande curiosidade e a necessidade de contato dos
cavalos com outros animais e seres humanos, talvez para diminuir o tédio e
amenizar o estresse do confinamento (REZENDE et. al. 2006).
Os bovinos apresentam razões diferentes para o desenvolvimento da
patologia. Enquanto no equino a alotriofagia está mais ligada a um comportamento
ritualístico (MERCK, 2001), no bovino está intimamente relacionada com a
deficiência do manejo alimentar (MORAES, 2001). A deficiência de fósforo (P) é um
estado predominante em bovinos alimentados em pastagens, A deficiência de
fósforo causa raquitismo, nos animais em crescimento e osteomalácia nos adultos,
sendo mais comum em vacas com as necessidades nutricionais aumentadas em
função da gestação e lactação, o que os leva, além dessas manifestações, ao
apetite depravado (MORAES, 2001, TIMM, 2001, TOKARNIA, DÖBEREINER e
MORAES, 1988).
Caninos e felinos, além dos transtornos comportamentais, têm como fatores
para o desenvolvimento do quadro a presença de doença predisponente à anemia,
má digestão e má absorção; o confinamento em ambientes de terra sem distração
adequada ou enriquecimento ambiental; o desmame precoce de felinos de raças
orientais com uso de dietas de baixa digestibilidade e sem acesso às presas ou
gramas (TILLEY e SMITH JR., 2003).
A alotriofagia pode ter sérias consequências nos animais, e principalmente
em cães e gatos, tais como intoxicações, e botulismo; corpos estranhos alojados nas
vias digestivas ou acúmulos de lã, fibras ou areia podem acarretar obstruções; a
ingestão de objetos pontiagudos pode provocar perfuração esofágica ou entérica
(BLOOD & RADOSTITS, 1991, FROES et. al, 2007).
Os corpos estranhos provocam sinais clínicos devido à irritação mecânica ou
por obstrução do trânsito (BICHARD e SHERDING, 1998). Muitos desses pacientes
permanecem totalmente assintomáticos por um longo período de tempo, vindo
apresentar sintomatologia clínica apenas quando da obstrução pilórica. Deve-se
notar que em gatos o ato de vomitar bolas de pêlo é uma comum consequência de
seu comportamento higiênico. Estes não possuem motilidade interdigestiva
significativa e por isso seus pelos muito raramente prosseguem para o estômago
(HALL, 2001, FROES et. al, 2007). Existem casos em que independente da natureza
ou conformação do corpo estranho, esses permanecem principalmente na porção
gástrica do trato digestório, ora pela impossibilidade do estômago em promover a
passagem do material (CUNNINGHAM, 1993), ora por hipertrofia da musculatura lisa
do intestino (DIANA et. al, 2003).
Para auxiliar no diagnóstico de corpo estranho, são utilizadas radiografias
simples convencionais e ultra-sonografia, podendo ainda ser utilizada, quando
disponível, tomografia computadorizada e ressonância magnética. (VENTER, 2005).
A endoscopia pode ser usada como instrumento de identificação de corpo
estranho, e além de localizá-lo ainda pode remover de forma não invasiva, com
pinças-cesto ou pinças-garra, tornando-se essencial a correção de possíveis
distúrbios eletrolíticos e ácido-base antes de qualquer procedimento anestésico
(BICHARD e SHERDING, 1998).
Nos casos em que a remoção não invasiva não se faz possível, a remoção
cirúrgica faz-se necessária, pois muitas vezes a presença de corpo estranho –
principalmente os entéricos – representa um grande risco à saúde do paciente
(WILLARD, 2006).
Pela relativa raridade do achado o presente trabalho pretende encorajar
clínicos e cirurgiões para a suspeita diagnóstica, fundamentada no caso clínico aqui
descrito e numa revisão dos principais trabalhos da literatura.
3. RELATO DE CASO
Um canino da raça Bull Terrier, macho de 11 meses de idade, habitando
ambiente intradomiciliar e sem contactantes, foi encaminhado ao setor cirúrgico no
Hospital de Medicina Veterinária da Universidade Federal da Bahia com queixa de
entumecimento e aumento do volume abdominal. A proprietária relatou que o
paciente possuía hábito de mastigar objetos domiciliares e que por vezes os
deglutia. Havia notado somente um discreto crescimento na região abdominal
(melhor visto quando deitado) com o passar do tempo. Muito embora os episódios
fossem algo rotineiro, não foi dada a devida atenção pelo fato da dona não observar
alterações fisiológicas, muito menos recrudescimento da mesma. Ainda segundo a
proprietária o paciente sempre apresentou normofagia, normodipsia, ausência de
emese, diarréia e perda de peso. Somando-se a isso o animal permanecia boa parte
do tempo sem contato direto com seus donos.
No exame clínico ficou constatado que o paciente seguia a risca os protocolos
de vacinação, vermifugação e possuía dieta composta de ração super premium na
quantidade indicada referente à idade, porte e peso. Ao exame físico, na inspeção
com o animal em estação, não se evidenciava quaisquer alterações na conformação
abdominal, apenas um abaulamento na parede lateral esquerda ou direita quando
no respectivo decúbito. O paciente apresentava-se ativo (Fig. 1), sem nenhum sinal
de desconforto gástrico e respiratório. À palpação evidenciou-se presença de uma
massa de consistência firme, de formato oval, medindo em média 20cm em seu
maior eixo, pouco maleável, crepitante e com ausência de dor em qualquer
graduação ou nível topográfico.
Figura 1 - Imagem fotográfica mostrando aspecto do animal no préoperatório. Em A animal em estação vista lateral esquerda. Em B vista
ventral, C vista dorsal. D e E Vista lateral esquerda e direita
respectivamente com o cão na posição sentado. Em toda as vistas não se
evidenciava quaisquer alterações na conformação abdominal.
O exame radiológico em incidência latero-lateral esquerda da região
abdominal com ênfase da área estomacal, após revelação, demonstrou uma
dilatação do estômago medindo 14,5cm por 17cm nos seus eixos dorso-ventral e
cranio-caudal com densidade homogênia linceolar assemelhando-se a uma
radiografia contrastada com sulfato de bário, e com pequenas áreas de densidade
do ar, compatível com presença de corpo estranho de densidade maior que um. A
densidade homogênea concentrava-se na área central do estômago, possuindo a
periferia ventral imagem semelhante a nuvens (Fig. 2).
O exame ultrassonográfico mostrou distensão de cavidade gástrica por
material radiopaco, de imagem hiperecoica, produtora de sombreamento acústico,
com pequenos fragmentos em sua estrutura, sugerindo presença de corpo estranho
(Fig. 3). As imagens não mostraram comprometimento do trato digestório inferior.
Fígado, baço, pâncreas, rins e bexiga apresentaram-se normais ao ultra-som e não
houve evidencia de efusão peritoneal.
Figura 2 – Raio x da região abdominal com ênfase em área estomacal resultando em
imagem homogênea linceolar.
Figura 3 – Ultrassonografia da região epi/mesogástrica mostrando sombra acústica
compatível com presença de corpo estranho.
Após o resultados dos exames hematológicos (hemograma com contagem de
plaquetas, leucograma (Anexo 1) e bioquímica sérica: uréia, creatinina, fosfatase
alcalina e ALT (Anexo 2) - os quais não mostraram nenhuma alteração relevante foi marcado o procedimento de laparotomia exploratória.
Considerando-se a cirurgia do tipo contaminada, sessenta minutos antes do
procedimento cirúrgico o animal foi medicado com enrofloxacina1 na dose de
5mg/kg, via intravenosa e flunexin meglumine2 na dose de 1,1mg/kg por via
intramuscular. A medicação pré-anestésica consistiu da associação de cloridrato de
acepromazina3
0,05mg/kg,
meperidina4
4mg/kg
e
xilazina5
0,5mg/kg
via
intramuscular. Em seguida o animal foi induzido com propofol6 na dose de 5 mg/kg
por via intravenosa e a manutenção anestésica foi mantida com isoflurano7, em
circuito semi-aberto. Os parâmetros de frequência cardíaca e respiratória,
capnografia, oximetria de pulso, pressão arterial e traçado eletrocardiográfico foram
monitorados, mantendo-se dentro dos padrões de normalidade durante todo o
procedimento cirúrgico.
Com o animal em decúbito dorsal foi realizada a assepsia do local da cirurgia
com álcool etílico a 98% e iodopovidona8 (PVPI), foram colocados os panos de
campo e feita à incisão de pele pré-retro umbilical, divusionamento do tecido celular
subcutâneo e identificação da linha alba. Após a colocação dos panos acessórios, a
cavidade abdominal foi acessada e inspecionada observando-se dilatação e
deslocamento caudal do estômago, podendo-se verificar através da palpação do
mesmo presença de materiais de natureza estranha múltiplos e compactados
1
Baytril 150mg – Bayer S.A.
Banamine Injetável – Shering Plough S.A.
3
Acepram 1% - Univet S.A.
4
Dolatina – Sanof-Aventis
5
Ropum – Shering Plough S.A.
6
Diprivam 10mg - Astrazeneca
7
Forane 100mg/ml - Abbott
8
Laboriodine – Glicolabor Ind.
2
(Fig.4B). Os segmentos intestinais apresentavam-se normais com motilidade e
vascularização características. Após inspeção da cavidade abdominal o estômago
foi exposto, isolado por compressas, delimitando-se em sua curvatura maior, através
da apreensão de pinças de Allis, a área da incisão (Fig. 4C). Com o compartimento
gástrico aberto, observou-se grande quantidade de múltiplos materiais de natureza
estranha, que se encontravam compactados e ocupando todo o corpo do estômago
(Fig. 4D). Após a retirada dos mesmos o estômago foi fechado empregando-se
poliglactina 910 (Vicril) número 2-0 em dupla camada, com suturas de Shimidien e
Cushing (Fig. 4F). Após a omentopexia no local da incisão foi fechada a cavidade
conforme técnica padrão. Confirmou-se a suspeita de corpo estranho com a
presença de diversos utensílios domésticos que totalizaram o peso de 2.250g (Fig.
5).
Figura 4 – Sequência fotográfiaca demonstrando procedimento cirúrgico
para laparotomia exploratória e gastrotomia no canino Bull Terrier macho,
com diagnóstico de corpo estranho gástrico. Em A, com a cavidade
peritoneal acessada, foi possível observar o estômago bastante dilatado,
ocupando grande parte da cavidade. Em B e C estômago exposto, isolado
por compressas, delimitando em sua curvatura maior, através da apreensão
de pinças de Allis, a área da incisão. Em D compartimento gástrico aberto,
observando-se grande quantidade de múltiplos materiais de natureza
estranha, compactados e ocupando todo o corpo do estômago. Em E e F
após a retirada dos mesmos o estômago foi fechado empregando-se
poliglactina 910 (Vicril) número 2-0 em dupla camada, com suturas de
Shimidien e Cushing.
Figura 5 – Material encontrado dentro do estômago – presença de diversos fragmentos
de utensílios domésticos dos mais variados formatos e tamanhos.
Pouco tempo após o término da cirurgia o paciente recobrou suas funções
sensoriais e encontrava-se bem. Foi indicado à proprietária que a o animal fosse
internado por três dias recebendo alimentação parenteral exclusiva e que após o
período de internamento fosse oferecida alimentação pastosa, solidificando-a
gradativamente até o 13° dia, quando este deveria estar se alimentando de dieta
totalmente sólida. Concomitante à prescrição dietética foi feita antibióticoterapia e
uso de analgésico.
Algum tempo após a cirurgia e mediante uma análise mais profunda do
histórico comportamental, juntamente com a inspeção do ambiente em que vive e
sua rotina, o paciente foi diagnosticado como portador de transtorno compulsivo e
sua dona esclarecida da possibilidade tratamento halopático e de mudança na rotina
do paciente.
4. DISCUSSÃO
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo é mais comum em seres humanos como
visto nos estudos de Gonzales (1999), Graeff (2001) e Eilam et. al. (2006). Em cães
e gatos, são representativos, visto a quantidade de animais eutanasiados sem
respaldo clínico, segundo Moon-Fanelli (1999). Por consequência a relativa raridade
do achado no presente trabalho justificou a descrição literária, visou encorajar
clínicos e cirurgiões para a suspeita diagnóstica, fundamentada no relato clínico e
numa revisão dos principais trabalhos da literatura.
A minuciosa anamnese, com ênfase numa investigação ampla dos hábitos
cotidianos do paciente e a exclusão do diagnóstico diferencial de enfermidades
fisiológicas foi fundamental e nos permitiu concluir que o mesmo sofria de TOC,
caracterizado pela destruição e deglutição de utensílios domésticos de forma
compulsiva para alívio da ansiedade como relatado por Telhado et. al. (2004).
Os achados corroboram cos as afirmações de Tilley e Smith Jr. (2003), uma
vez que o paciente recebia alimentação de excelente qualidade, em quantidade
adequada, e os protocolos profiláticos para endoparasitos e para cobertura vacinal
eram seguidos a risca. Porém a depravação do apetite como TOC parece estar mais
relacionada com a falta de estímulo adequado, visto que este permanecia a maior
parte do tempo sem contato direto com os donos, configurando déficit de atenção,
além da falta de enriquecimento ambiental, uma vez que as alternativas de
entretenimento pousavam sobre ambientes com utensílios domésticos e não em
objetos corretamente direcionados para este fim. Observa-se também o fato de que
o animal era submetido a
repreensões constantes sem alternativas de
compensação (termo para gratificação quando repreendido).
Reveste-se de importância o fato do paciente possuir 2.250g de matéria não
alimentar no estômago, não apresentar nenhum tipo de sintomatologia clínica e este
ter sido um achado eventual. Acreditamos que, a localização e a natureza dos
corpos estranhos e sua manifestação assintomática, poderiam posteriormente,
desencadear graves lesões do sistema digestório, como obstruções intraluminais
e/ou lesões traumáticas murais em segmentos no estômago e principalmente no
intestino delgado.
É controverso o fato da não observância de quaisquer manifestações clínicas
patognomônicas de alterações do digestório, uma vez que na investigação das
origens do TOC, o déficit de atenção foi implicado. Ha de se conjecturar que esta
situação seria limitante para qualquer tipo de observação. Porém, a inobservância
de sintomas e/ou manifestações foi creditada pela ausência de alterações sistêmicas
observadas no exame clinico.
Podemos
supor
que
o
quadro
assintomático
deva-se
pela
compartimentalização dos corpos estranhos no corpo gástrico, explicado pela
dificuldade de trituração e separação de suas partículas para passagem pelo piloro,
aliado ao ato de que a tensão aumentada nesta área, segundo Cunnigham (1992),
exerce pouco efeito no transporte de material sólido e pode explicar a cronicidade do
quadro.
Outra possibilidade seria para explicar a retenção dos corpos estranhos no
estômago seria a provável presença de hipertrofia da musculatura lisa do intestino
em sua fase inicial, como relatado por Diana et. al. (2003).
Após o tratamento cirúrgico a proprietária foi orientada a dar início a tentativa
de correção ou manejo do distúrbio, tendo como base o tratamento comportamental
estipulado no trabalho de Overall e Dunham (2002). A primeira fase consistiu na
mudança do manejo de sua rotina diária com aumento do tempo de contato do
paciente com seus donos, aumento dos exercícios físicos (passeios diários com
tempos variando de 10 a 30 minutos duas veses ao dia) e restrição do contato do
paciente com objetos que anteriormente eram usados em seus acessos
compulsivos. Muito embora a proprietária seguisse o tratamento comportamental
preconizado, este não mostrou bons resultados visto que o paciente, atualmente,
ainda mantém o comportamento alotriofágico.
Neste caso, em que o manejo comportamental não apresenta a eficácia
esperada, o tratamento preconizado é químico assim como descrito nos trabalhos de
Mertens e Dodman (1996), Peterson (1996) e Overall e Dunham (2005) com o uso
de bloqueadores seletivos da serotonina tais como a clomipramina (1- 2mg/kg BID/48 semanas), a fluoxetina (1mg/kg SID/8 semanas e a sertralina (1mg/kg/SID/8
semanas) que apresentaram resultado significativo tanto na diminuição da
frequência quanto na intensidade dos acessos comportamentais.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a inserção dos animais de companhia e a tendência de humanização
dos mesmos, com consequente limitação da expressão de suas características
ritualísticas naturais, os transtornos comportamentais tendem a se manifestar de
forma cada vez mais frequente e com maior intensidade.
Alotriofagia apresenta-se com uma das mais nocivas manifestações do TOC,
sendo de extrema importância a elucidação diagnóstica precoce para a
implementação de técnicas terapêuticas adequadas para abolição do transtorno.
A gênese do Transtorno Obsessivo-Compulsivo em animais, à exemplo do
que acontece nos homens, necessita de maiores estudos para sua compreensão,
elucidação e instituição de métodos terapêuticos eficazes, visando minimizar os
altos índices de eutanásia.
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ANEXOS
ANEXO 1
ANEXO 2

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