“A coisa mais incompreensível a respeito do

Transcrição

“A coisa mais incompreensível a respeito do
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS
DEPARTAMENTO DE FÍSICA
MONOGRAFIA PARA LICENCIATURA EM FÍSICA
MARCOS FERNANDO SOARES ALVES
ATUALIZAÇÃO CURRICULAR E CIÊNCIA CONTEMPORÂNEA:
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DAS PARTÍCULAS
ELEMENTARES NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Maringá-PR
2008
MARCOS FERNANDO SOARES ALVES
ATUALIZAÇÃO CURRICULAR E CIÊNCIA CONTEMPORÂNEA:
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DAS PARTÍCULAS
ELEMENTARES NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Monografia apresentada ao Departamento de
Física da Universidade Estadual de Maringá
como requisito parcial para a aprovação na
disciplina de Monografia para Licenciatura em
Física.
Orientador: Prof. Dr. Luciano Gonsalves Costa.
Maringá-PR
2008
DEDICATÓRIA
____________________________________________________________
Dedico este trabalho aos meus pais,
aos meus irmãos, aos familiares e
amigos que sempre me apoiaram e me
incentivaram a seguir nos estudos.
ii
AGRADECIMENTOS
____________________________________________________________
Primeiramente agradeço a Deus, que me concedeu a oportunidade de viver a fim de
conquistar mais esta etapa. A Ele que me deu força, coragem e persistência para vencer todos
os obstáculos durante os anos do curso.
À minha família, pois sem ela não teria chegado até aqui. À minha mãe que sempre
acreditou em mim e me incentivou na busca dos meus sonhos, fazendo o possível e o
impossível para me ajudar a alcançá-los, mesmo com todas as dificuldades que enfrentamos
ao longo desses anos. Ao meu pai pelo apoio e compreensão. A vocês que me ensinaram a ser
um cidadão de bem, honesto e batalhador.
À minha irmã pelas palavras de apoio durante os momentos mais difíceis e cansativos
dessa caminhada e por ter estado sempre ao meu lado. Ao meu pequeno irmão, pelo carinho e
amor, que foi também o responsável por me dar motivação para que continuasse em frente.
Aos meus tios, Milton, Marta, Paula, Cidinha, aos primos, Cláudia e Dimas, e a todos os
meus familiares pelo apoio e incentivo.
Aos amigos, Jorge, Fábio, Marcelo, Rogério, Robson, Jeferson, pela amizade, pelas
conversas e ensinamentos durante todo o curso.
Ao Prof. Dr. Luciano Gonsalves Costa, pela orientação e ajuda prestada durante a
realização desse trabalho.
Aos professores do Departamento de Física da Universidade Estadual de Maringá,
fundamentais para minha formação.
E a todos aqueles que de uma forma ou de outra, me ensinaram a ser como sou e
contribuíram para que pudesse chegar até aqui.
iii
“A coisa mais incompreensível a respeito do Universo é que ele é compreensível.”
Albert Einstein
iv
RESUMO
____________________________________________________________
Este trabalho consiste numa revisão bibliográfica acerca da Física de Partículas, assunto hoje,
tão veiculado pela mídia. A sua constituição segue um caráter cronológico desta área da
ciência, iniciando com os pensamentos filosóficos acerca da origem do Universo e os
elementos
fundamentais
da
matéria;
passando
pelos
modelos
atômicos
e
seus
desdobramentos; as pesquisas em raios cósmicos; o desenvolvimento e a utilização dos
aceleradores de partículas; as teorias e suas confirmações ao longo da história da Física de
Partículas; a busca incessante pela simetria; temas interessantes como o Projeto Manhattan; as
classes pelas quais são organizadas as partículas, e por fim o Modelo Padrão. A Física de
Partículas, assim como toda a ciência, mostra-se como um produto inacabado fruto da
capacidade humana. Por isto é importante que o histórico do seu desenvolvimento seja
conhecido para que seja possível compreender também, o desenvolvimento da humanidade. O
que se propõe neste trabalho, é apresentar a Física não como disciplina exata e imutável, mas
sim, como uma Ciência em constante progresso. A Física teve de “evoluir” para explicar
certos fenômenos que teorias existentes não davam conta de explicar, porém, nada disto é de
conhecimento dos alunos do Ensino Médio, que aprendem a Física de 1600 a 1850
aproximadamente. É aceitável que o currículo deste nível de ensino também deva evoluir para
que os indivíduos formados pela Escola possam compreender melhor o mundo que os cercam.
Esta área da Física, como tópico da Física Moderna e Contemporânea a ser inserida no Ensino
Médio, é parte de estudos de diversos pesquisadores de ensino de Física no país e no exterior,
o que buscam é desenvolver metodologias de aplicação, que por sinal, na literatura
especializada, há poucos trabalhos neste sentido. Tendo em vista esses fatos, procurou-se
neste trabalho apresentar o conhecimento gerado por estes pesquisadores em relação ao tema
para o nível médio de ensino. Tanto as pesquisas em Física de Partículas quanto os estudos
acerca da inserção do tópico no Ensino Médio, são assuntos que exigirão muito trabalho.
Portanto, no decorrer desta monografia são apontadas justificativas para contribuir com o
processo educacional e incentivar os professores deste nível de ensino a se encorajarem e
aceitarem o desafio de abordarem tópicos atuais da Física em sala de aula.
Palavras-chave: Física de Partículas; Física Moderna e Contemporânea; Ensino Médio.
v
ABSTRACT
____________________________________________________________
This report consists in a literature review on Particle Physics, a subject today, greatly reported
by the media. Its formation follows a chronological character of this area of science, starting
with the philosophical thoughts about the origin of the universe and the basic elements of
matter, going through atomic models and its outspreads; the research on cosmic rays; the
development and use of particle accelerators; the theories and their confirmations over the
history of Particle Physics; the incessant search for symmetry; interesting topics such as the
Manhattan Project; the classes in which particles are organized, and finally the Standard
Model. The Particle Physics, as well as all the science, shows itself as an unfinished product
resulting from human capability. Thus, it is important that the history of its development is
known so that it is also possible to understand the development of humanity. What is
proposed in this paper is to present the physics discipline not as exact and immutable, but as a
Science in constant progress. Physics had to "evolve" to explain some phenomena that
existing theories couldn’t explain, however, none of this is acknowledged by High School
students, who learn the physics from the 1600 to 1850, approximately. It is acceptable that the
curriculum at this level of education must also evolve so that the individuals trained by the
School can better understand the world surrounding them. This area of physics, as a topic of
Modern and Contemporary Physics to be introduced in high school, is part of studies of
several researchers of physics teaching in the country and abroad. What they seek is to
develop methodologies for implementation, by the way, in literature, there is little work in
this direction. Bearing these facts in mind, this work tried to present the knowledge generated
by these researchers regarding the subject to High School education. The researches on
Particle Physics, such as the studies concerning the topic's inclusion in the High School, are
matters that will require much work. Therefore, during this monograph, are pointed out
reasons to contribute to the educational process and to encourage teachers of this level of
education to encourage and accept the challenge of approaching current topics of Physics in
the classroom.
Keywords: Particle Physics; Modern and Contemporary Physics; High School.
vi
SUMÁRIO
____________________________________________________________
DEDICATÓRIA............................................................................................................... ii
AGRADECIMENTOS .................................................................................................... iii
RESUMO ......................................................................................................................... v
ABSTRACT .................................................................................................................... vi
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 1
Capítulo I
Física de Partículas Elementares: uma revisão bibliográfica..................................... 3
1 – O pensamento humano sobre os constituintes da matéria ......................................... 3
1.1 – Os filósofos gregos ............................................................................................. 3
1.2 – A concepção do Universo fora da Grécia ........................................................... 5
2 – Um breve histórico das descobertas realizadas até a década de 1930 ....................... 6
2.1 – O desenvolvimento das idéias atomistas ............................................................ 6
2.2 – Raios-X e a radioatividade .................................................................................. 8
2.3 – A descoberta das partículas constituintes do átomo e os modelos atômicos ...... 9
2.4 – O desenvolvimento da Mecânica Quântica ........................................................ 11
2.4.1 – O Princípio da Exclusão de Pauli ................................................................ 11
3 – Novas descobertas e algumas curiosidades ............................................................... 12
3.1 – O Neutrino .......................................................................................................... 12
3.2 – O Pósitron ........................................................................................................... 12
3.3 – O Nêutron ........................................................................................................... 13
3.4 – As interações fundamentais ................................................................................ 14
3.4.1 – Força gravitacional ...................................................................................... 15
3.4.2 – Força eletromagnética .................................................................................. 15
3.4.3 – Força forte .................................................................................................... 15
3.4.4 – Força fraca ................................................................................................... 16
3.5 – Os múons, os píons e a estabilidade do núcleo ................................................... 16
3.6 – O Projeto Manhattan ........................................................................................... 18
vii
3.7 – Os aceleradores de Partículas ............................................................................. 19
3.7.1 – O gigante Europeu: LHC ............................................................................. 21
3.8 – Criação e aniquilamento de partículas ................................................................ 23
3.9 – Inúmeras outras descobertas ............................................................................... 23
3.10 – “Velhas e novas” leis de conservação e outras propriedades das partículas..... 25
3.10.1 – Conservação de energia ............................................................................. 25
3.10.2 – Conservação do momentum ....................................................................... 25
3.10.3 – Conservação da carga elétrica .................................................................... 26
3.10.4 – Conservação do número bariônico ............................................................ 26
3.10.5 – Conservação do número leptônico ............................................................. 27
3.10.6 – Regra da estranheza ................................................................................... 27
3.11 – As partículas “verdadeiramente” elementares: os quarks ................................. 28
4 - As partículas estão organizadas em grupos semelhantes ........................................... 31
4.1 – Os quarks e os léptons ........................................................................................ 31
4.2 – As partículas mediadoras .................................................................................... 32
4.3 – Os bárions e os mésons ....................................................................................... 35
4.4 – O Modelo Padrão ................................................................................................ 36
Capítulo II
O Ensino de Física de Partículas na Educação Básica ............................................... 38
1 – O conhecimento acerca da Física de Partículas ..................................................... 38
2 – A legislação e o currículo escolar .......................................................................... 44
3 – A Física de Partículas no livro didático: exemplificação ...................................... 46
4 – Justificativas da escolha do tema “Partículas Elementares” .................................. 48
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 52
REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 55
viii
INTRODUÇÃO
Uma das indagações que sempre rodeou o pensamento humano, até os dias de hoje, é
sobre a origem do Universo e seus constituintes fundamentais. As primeiras preocupações
documentadas dos homens eram encontrar o elemento fundamental da natureza (BASSALO,
1980b). As discussões acerca de quais seriam os “tijolos” básicos que compõem o Universo,
iniciou-se com os filósofos gregos, denominados pré-socráticos. Foram estes filósofos,
chamados de físicos gregos por Almeida (1983), quem introduziram o conceito de átomo,
descrevendo a matéria como indivisível. A idéia do átomo como ente indivisível permaneceu
até o começo do século XIX, e começou a mudar com as idéias de John Dalton, com o
chamado atomismo científico. No entanto, foi em 1897 que o átomo foi “dividido” pelo físico
inglês Joseph John Thomson, descobrindo assim o elétron, a primeira partícula elementar. A
procura pelos elementos fundamentais do Universo, ou seja, as partículas elementares, fez
surgir uma importante área da Física contemporânea: a Física de Partículas (atualmente, é
mais empregado o termo Física de Altas Energias).
No intuito de explicar a constituição do átomo, em 1898, Thomson propõe um modelo
conhecido como “pudim de passas”, no entanto, este, tornou-se inconsistente e outros
modelos foram, ao longo do tempo, sugeridos para dar lugar ao anterior, até chegar ao modelo
atômico aceito atualmente. As buscas por partículas constituintes do átomo e as tentativas de
explicar sua estabilidade colaboraram com o desenvolvimento da ciência e da Física de
Partículas, foi a partir dessas investigações que novas teorias e novas partículas foram sendo
sugeridas teoricamente, experimentalmente verificadas e descobertas ao longo da história da
ciência.
Como destaca Maddox (1999), por várias vezes, os cientistas pensaram haver
encontrado partículas realmente elementares, até que novas descobertas mostravam que
estavam enganados. Atualmente é aceito que os quarks e os elétrons são as partículas
verdadeiramente elementares. Intuitivamente, elementar é toda partícula que tem um único
constituinte (ABDALLA, 2005). As descobertas de partículas se davam a partir das pesquisas
em raios cósmicos, até que começou-se a desenvolver a partir da década de 1930 os
aceleradores de partículas, propiciando assim, que em pouco tempo, muitas outras partículas
fossem detectadas experimentalmente.
A Física Moderna precisou de mais de um século para descobrir, compreender e
organizar “todas” as partículas fundamentais. Hoje o modelo que classifica as partículas
1
elementares é denominado Modelo Padrão, que descreve a matéria através dos quarks, dos
léptons, das partículas mediadoras (bósons) e das interações fundamentais da natureza (força
eletromagnética, força gravitacional, força fraca e força forte).
A ciência e a tecnologia sempre andaram de mãos dadas, uma área constantemente
contribui para o desenvolvimento da outra. Neste mundo contemporâneo do qual fazemos
parte, é fundamental conhecermos os aspectos científicos da tecnologia que há ao nosso redor.
E, nesse sentido, é preciso reconhecer a Física como tendo papel importante para este
progresso. Os avanços tecnológicos têm despertado a atenção dos jovens, que passam também
a dar mais atenção a temas relacionados à ciência de uma forma geral, e é na Escola que ele
deve satisfazer tais curiosidades, no entanto, ela não tem proporcionado este caminho. Uma
das funções da Escola é transmitir o conhecimento gerado pela humanidade (SIQUEIRA,
2006). Percebe-se assim, que o conhecimento transmitido pelo sistema de ensino, em relação
à Física, é apenas o desenvolvido entre 1600 e 1850 aproximadamente, ou seja, o que os
estudantes aprendem é somente a Física Clássica, estando ausentes os conteúdos da Física
Moderna e Contemporânea (TERRAZZAN, 1992).
Para que possa ser dado ao estudante uma formação geral, que permita a ele adquirir
conhecimentos básicos e uma preparação científica como sugerem os Parâmetros que regem o
ensino, a ponto de compreender o mundo tecnológico que os cercam, é essencial que temas da
Física Moderna e Contemporânea (FMC) sejam ensinados no Ensino Médio. É, portanto
necessário que haja uma reformulação no currículo de Física atualmente trabalhado nas
Escolas.
Preocupações acerca da desatualização do currículo escolar têm sido causa de diversas
pesquisas, a nível nacional e internacional, para pesquisadores de ensino de Física. Eles têm
demonstrado a urgência necessidade da inserção de tópicos de FMC no nível médio de ensino,
apresentando resultados e justificativas que apontam para esse caminho.
Neste trabalho são apresentados os conceitos, as teorias, os modelos e as descobertas ao
longo da história da Física de Partículas, a abordagem que é feita trata o tópico apenas
qualitativamente, ou seja, procura levar a compreensão desta área sem a necessidade do uso
da linguagem Matemática. Isso com o intuito de que seja possível perceber o
desenvolvimento da Física como fruto da capacidade humana. Descreve-se ainda, as
pesquisas e o conhecimento gerado pelos pesquisadores de ensino de Física a respeito da
FMC, e os trabalhos realizados para que tópicos como este faça realmente parte do currículo
do Ensino Médio.
2
Capítulo I
Física de Partículas Elementares: uma revisão bibliográfica
1 - O pensamento humano sobre os constituintes da Matéria
1.1 – Os filósofos gregos
O homem como ser racional sempre se questionou a respeito de como as coisas eram
formadas. O desenvolvimento humano parte das indagações dos pensadores antigos, muitas
vezes as respostas a tais questões vinham da criação de mitos e de deuses. Na antiguidade os
mitos e a religião faziam parte da civilização de todos os povos, e eram os responsáveis pela
explicação da origem das coisas e do Universo. Quando mito e religião são colocados à prova
gerando dúvidas, surge então a filosofia no intuito de dar explicações sem usar mitos, porém,
em tais explicações não os excluem por completo. As principais contribuições filosóficas a
respeito de como as coisas eram formadas vieram da Grécia. Com os pré-socráticos 1 surgiram
as primeiras buscas a respeito dos elementos fundamentais do universo. Segundo Bassalo
(1980b), as primeiras preocupações documentadas dos homens eram encontrar o elemento
fundamental da natureza. Aproximadamente no século VI a.C., alguns filósofos pré-socráticos
da cidade de Mileto: Tales (624 - 546 a.C), Anaximandro (610 - ~546 a.C.) e Anaxímenes
(570 - ~500 a.C.), defendiam a idéia de que as coisas se originavam do arche (em grego, que
significa “princípio”), dele as coisas surgiam e a ele retornariam. Mas, discordavam em
relação à quantidade e ao tipo de elemento. Tales afirmava que esse elemento fundamental era
a água, já que todos os seres vivos se originam e precisam da umidade. Anaximandro
considerava ser o apeiron (em grego, que significa infinito; indefinido; ilimitado) o elemento
constituinte do Universo, as coisas viriam e retornariam do apeiron. Já Anaxímenes
acreditava que o elemento primordial era o ar, ao se tornar mais rarefeito, se transformaria em
fogo; mais denso, se transformaria em nuvens, e em seguida água (por compressão), terra e
rochas. Para Xenófanes da Jônia (~570 - ~460 a.C.) era a terra. O elemento primordial para
Heráclito de Éfeso (~540 - ~580 a.C.) era o fogo. Anaxágoras (~500 - ~428 a.C) “acreditava
ser o Universo decorrente da ação de uma razão abstrata sobre as sementes (homeomerias),
que seriam as matérias primas constituintes de todas as espécies imagináveis” (BASSALO,
1
Os pré-socráticos foram os filósofos anteriores a Sócrates. Muitos dos documentos escritos por estes
pensadores não foram guardados e o que se sabe sobre eles é de forma indireta, sendo aquilo que foi contado por
autores posteriores a estes.
3
1980b, p. 70), assim ele antecipou a idéia atomística do Universo. Observa-se que todos os
filósofos aqui citados, acreditavam que somente um elemento era o responsável por formar
todas as coisas, essa corrente filosófica é conhecida como “monismo”, e é expressa pela
afirmação: “o todo é o um” (ALMEIDA, 1983).
No entanto, de acordo com Almeida (1983), o monismo encontrou dificuldades para
manter-se aceito, começaram a surgir indagações a respeito de como determinados materiais
poderiam se originar da água como é o caso, por exemplo, da poeira. E assim, muitos
filósofos resolveram deixar de lado o monismo e “concentrar-se” no pluralismo limitado, em
que a matéria é composta de um pequeno número de elementos, ao invés de apenas um
elemento fundamental.
O primeiro filósofo grego a considerar a matéria sendo formada por mais de um
elemento foi Empédocles de Akragas (~490 - ~430 a.C.), para ele tudo se originava da água,
do fogo, da terra e do ar, elementos chamados de “raízes”. Segundo Empédocles essas
“raízes” estariam em constante movimento e se combinariam de forma alternada para formar
as coisas. Eram intermediadas por duas forças divinas: unidas pelo amor ou a amizade e
separadas pelo ódio ou inimizade. As raízes de Empédocles seriam governadas pela
insonomia: seriam iguais, nenhuma mais importante que a outra, nenhuma mais primitiva,
todas seriam eternas e imutáveis (CAULLIRAUX, 2005). Já para Aristóteles de Estagira
(~348 - ~322 a.C.), os elementos fundamentais e essenciais eram o frio, o quente, o úmido e o
seco que, unidos dois a dois, formariam os elementos de Empédocles. Porém, esses elementos
formariam apenas as coisas da terra e da lua, o espaço celeste seria formado pelo éter. Essa
corrente filosófica foi denominada de pluralismo.
A idéia de que a matéria é formada por um único elemento retorna com os filósofos
atomistas. Leucipo de Mileto (~460 - ~370 a.C.) e Demócrito de Abdera (~470 - ~380 a. C.)
defendiam a idéia de que o Universo era formado por átomos (em grego, indivisível) e que se
movimentavam no vazio ou vácuo. Para eles estes átomos poderiam ser de vários tipos, ao se
unirem formariam a matéria e ao se separarem, a matéria seria destruída. Porém, esses átomos
continuariam a existir se reunindo posteriormente a outros átomos, podendo formar até novos
mundos. Outros importantes atomistas foram Epicuro de Samos (~341 - ~270 a.C.) e Lucrécio
de Roma (~98 - ~55 a.C.). Epicuro acreditava que os átomos não podiam ser divididos em
partes menores por nenhum meio, ainda que eles possuíssem estrutura. Ele ainda propõe
princípios de que existem corpos materiais e o vazio, para ele a existência da matéria é
assegurada pelas nossas sensações. Já o vazio não é possível sentir ou ver, mas existe, se só
4
existisse matéria, se tudo estivesse cheio, não haveria como algo se mover no espaço.
Lucrécio concebia os átomos como infinitos em números e que possuíam diferentes formas e
tamanhos, as partículas semelhantes se uniriam para formar aquilo que conhecemos
juntamente com o vazio.
De acordo com Almeida (1983), as principais características da teoria atômica grega
podem ser encontradas em um poema composto em 57 a.C. por Lucrécio Carus (95 - 55 a.C.),
denominado “De Rerum Natura”, que sumarizando são:
Átomos são extremamente pequenos, indivisíveis, partículas imutáveis que não
podem ser criadas nem destruídas; embora construam algumas substâncias comuns,
átomos diferem em forma, tamanho e peso; o espaço entre os átomos é vazio (um
vácuo); os átomos ficam juntos em corpos por ligações mecânicas e assim produzem
a variedade infinita do mundo material; a densidade de um corpo é uma relação
inversa da quantidade de espaço vazio entre os átomos; átomos estão em movimento
perpétuo que persiste por ele mesmo (Ibid., p. 57).
Segundo Martins (1994), a filosofia atomista rompe com a visão de mundo que era
aceita na época, tirando o homem e a terra do centro do universo 2. Acaba também por agregar
uma filosofia materialista até mesmo nas bases religiosas, já que os atomistas afirmavam que
a alma era também constituída de átomos, caso contrário ela não poderia agir sobre o corpo e
nem sofrer efeitos do corpo. Para estes, já não havia mais o porquê ter medo dos mitos sobre
os deuses, pois tudo ocorre apenas pela união e separação dos átomos, tudo é produzido de
um modo natural.
1.2 – A concepção do Universo fora da Grécia
Não se pode pensar que apenas os gregos buscavam respostas sobre a constituição do
Universo. Na Índia, os hindus tinham a concepção de que os elementos primordiais se
ligavam aos sentidos: ar-tato, fogo-visão, água-paladar e éter-audição. Segundo Bassalo
(1980b), Kanada (filósofo hindu) acreditava que além dos quatro elementos gregos, eram
necessários outros quatro: tempo, espaço, alma e manas (o qual transmitia os sentidos à alma).
Observa-se o caráter religioso deste povo, afirmando que a alma também era um elemento,
pois, todo ser vivo possuía uma alma. Já na China, Tsou Yen (360-260 a.C.), tinha como
elementos básicos a água, a madeira, o fogo, o metal e a terra.
2
Foi a partir de Copérnico (1543), com a substituição do sistema geocêntrico pelo heliocêntrico, que o homem
deixou de estar no centro do Universo. Não encontramos evidências de que Copérnico seguia a filosofia
atomista.
5
2 – Um breve histórico das descobertas realizadas até a década de 1930
2.1 – O desenvolvimento das idéias atomistas
Durante o período medieval as idéias atomistas não foram aceitas e ficaram
praticamente abandonadas. Já no início da era moderna os pensadores começam a ousar e a
dar mais valor nas Ciências Naturais, com os trabalhos de Copérnico (1473-1543), Galileu
(1564-1642) e Newton (1642-1727). Segundo Ostermann (1999), particularmente Newton
aceita o atomismo sem questionar a origem ou a composição do átomo, preocupando-se na
interação que há pela qual matéria atrai matéria.
A concepção da matéria formada apenas por uma partícula indivisível: o átomo,
inicialmente como resultado especulativo, permaneceu da Grécia Antiga até o final do século
XVIII e início do século XIX quando surgiu o atomismo científico (BASSALO, 1980b). Foi o
químico inglês John Dalton (1766-1844) quem primeiro utilizou a palavra átomo para
fundamentar uma teoria científica3. Para ele os átomos eram esferas maciças, invisíveis e
neutras e, para um mesmo elemento, eram idênticos em massa, forma e outras propriedades,
podendo reunir vários átomos a fim de formar um átomo composto. Foi também Dalton quem
elaborou o primeiro modelo científico. Mas, foi em 1897 que o físico inglês Joseph John
Thomson (1856-1940) quem “separou” o átomo, pois ao descobrir o elétron a primeira
partícula elementar encontrada, concluiu que o átomo não era indivisível.
De acordo com Siqueira (2006), o primeiro a distinguir átomo de molécula foi o
filósofo e matemático francês Pierre Gassendi (1592-1655) no livro que publicou em 1647.
Ainda segundo Siqueira (2006), a distinção oficial foi estabelecida no 1º Congresso
Internacional de Química, em 04 de setembro de 1860. Porém, alguns autores parecem
discordar desta afirmação. Muitos foram os trabalhos que contribuíram para o
estabelecimento dos conceitos dos átomos e moléculas, em relação a isto, “a situação estava
longe de uma solução mesmo em 1860 durante o congresso de Química realizado em
Karlsruhe – provavelmente a primeira conferência internacional realizada” (CASTILHO,
2003, p. 364). Para Gassendi os átomos, nos corpos, se reúnem em grupos denominado de
moléculas (diminutivo do latim moles, que significa massa ou quantidade de matéria) e, ainda,
parecia propor que o átomo seria uma parte real da substância, porém, invisível e indivisível.
A primeira tabela periódica foi editada em 1789 e elaborada pelo químico francês
Antoine Lauren Lavoisier (1743-1794) contendo 30 elementos, este trabalho também foi
3
Em 1808, John Dalton publica New Systems of Chemical Philosophy iniciando o atomismo científico.
6
importante para o desenvolvimento dos conceitos que envolviam o átomo e as moléculas.
Para esta finalidade, foram ainda importantes os trabalhos de outros cientistas como o
químico francês Joseph Louis Gay-Lussac (1778-1850), ao propor em 1809, a lei segundo a
qual a combinação de gases era decorrente de uma proporção múltipla entre os volumes e não
entre os pesos dos componentes. E do físico italiano Amedeo Avogadro (1776-1856), em
1811, ao formular a hipótese de que nas mesmas condições de pressão, temperatura, volumes
iguais de gases contém o mesmo número de moléculas; isto se deu ao fazer a distinção entre
átomos e moléculas (conjunto de átomos).
As hipóteses de Avogadro não foram levadas em conta pelos maiores químicos da
época. No entanto, em 1858 utilizando a lei de Gay-Lussac e a hipótese de Avogadro, o
químico italiano Stanislao Canizarro (1826-1910) estabeleceu a tabela dos pesos atômicos e
moléculas de diversos gases, levando com isso os químicos a procurarem uma relação entre os
pesos atômicos e as propriedades físico-químicas dos elementos (BASSALO, 1980b).
Foi em 1869 que o químico russo Dimitri Ivanovich Mendeleev 4 (1834-1907), e o
químico alemão Julius Lothar Meyer (1830-1895) em 1870, independentemente, chegaram à
classificação periódica dos elementos, listando-os do mais leve, hidrogênio, até o elemento
mais pesado conhecido da época, o urânio. Essa tabela continha no total 63 elementos5 e
relacionava o peso atômico com suas propriedades. Através da tabela periódica e da
semelhança que os elementos apresentavam entre si, Mendeleev pode prever a existência de
outros elementos químicos, sendo estes descobertos posteriormente.
Além das hipóteses levantadas sobre o que eram os átomos, as moléculas e das
tentativas de organizarem os elementos, também havia cientistas interessados em descobrir o
tamanho dos átomos. Em 1866, Johan Joseph Loschmidt (1821-1895) calculou o diâmetro da
“molécula do ar” como sendo em torno de milionésimo de milímetro. Já em 1870, o físico
irlandês Lord Willian Thonsom Kelvin (1824-1907) avaliou a molécula do hidrogênio como
medindo aproximadamente 6 × 10-8 cm; neste mesmo ano van der Waals (1837-1923)
encontrou um valor semelhante. Por volta de 1880 o tamanho da molécula de hidrogênio e das
demais componentes do ar situava-se em torno de 1 a 2 × 10 -8 cm, tomando os valores aceitos
hoje (2,0 × 10
-8
cm para o diâmetro efetivo do átomo de hidrogênio, 0,7 × 10
-8
cm para a
distância entre os núcleos numa molécula de hidrogênio), os valores encontrados são
razoáveis.
4
Alguns autores escrevem Mendeleiev.
Hoje, a tabela atômica possui mais de 100 elementos químicos, dispostos em linhas e colunas e separados por
grupos ou famílias.
5
7
Os trabalhos dos químicos e o desenvolvimento desta Ciência auxiliaram as
investigações sobre os átomos. Mas, até o final do século XIX os átomos são considerados
elementos sem estrutura (OSTERMANN, 1999). Somente com o desenvolvimento da
eletricidade, com os trabalhos do físico francês André Marie Ampère (1775-1836), do físico
dinamarquês Hans Christian Oersted (1777-1851), entre outros, que a indivisibilidade do
átomo passa a ser encarada como não sendo verdadeira. Para Oersted era apenas uma questão
de tempo mostrar que o átomo tinha carga elétrica como constituinte.
2.2 – Raios-X e a radioatividade
Foram os estudos relacionados à Radioatividade que contribuíram para a consolidação
da Teoria Atômica e para a compreensão da estrutura do átomo. Em 1895, o físico alemão
Wilhelm Konrad Röntgen (1845-1923) realizando uma experiência com tubo de raios
catódicos6 percebeu uma cintilação no anteparo, constatando que os raios eram provenientes
do tubo, mas não eram os raios catódicos. A estes chamou de raios-X, pelo fato de
desconhecer a natureza destes raios, sendo este mistério desvendado dezesseis anos depois por
Max von Laue (1879-1960).
O físico francês Antoine Henri Becquerel (1852-1908), em 1896, descobriu a
radioatividade ao procurar compreender a natureza dos raios-X; a radioatividade foi
denominada por ele de “raios urânicos”. A denominação radioatividade surgiu pelas
investigações do casal Marya Sklodowska Curie (1867-1934) e Pierre Curie (1859-1906), que
conhecendo os resultados de Becquerel, em 1897, conseguiram isolar os primeiros elementos
naturais radioativos, tais como o Rádio e o Polônio. Também neste ano o físico inglês Ernest
Rutherford (1871-1937) mostrou que a radiação de urânio que Becquerel observou era
constituída de partículas alfa e partículas beta. Dois anos depois, Becquerel mostrou que as
partículas beta eram carregadas negativamente. Já a partícula alfa era o núcleo de Hélio, fato
mostrado em 1909 por Rutherford e pelo químico inglês Thomas Royd (1884-1955). A
radiação gama foi descoberta em 1900, pelo físico francês Paul Ulrich Villard (1860-1934).
6
Os raios catódicos foram descobertos no ano de 1859, pelos físicos alemães Heinrich Geissler (1814-1879) e
Julius Pluecker (1801-1868). Esses raios são originários do eletrodo negativo nos tubos de descarga gasosa.
8
2.3 – A descoberta das partículas constituintes do átomo e os modelos atômicos
As indagações feitas para explicar o átomo, sua estrutura, seus constituintes e sua
estabilidade, geraram uma verdadeira revolução na Física. Entre 1895 a 1905 obtiveram-se
grandes avanços nesta Ciência, como a descoberta da radiação, dos raios-X, do elétron e do
próton. O interesse pelos constituintes da matéria iniciado pelos pré-socráticos continuam até
os dias de hoje, e cada hipótese desenvolvida foi fundamental para que se obtivesse um
modelo cada vez melhor e que respondesse o maior número de questões possíveis.
O uso de tubos de raios catódicos em experimentos permitiu a constatação de diversos
fatos. As descobertas das partículas subatômicas, constituintes do átomo, iniciaram-se com
Thomson. Ao fazer experiências com tubos de raios catódicos, mostrou, em 1897, que os
raios catódicos eram defletidos por um campo elétrico e ao determinar a razão carga-massa 7,
concluiu que a unidade de carga das partículas era negativa, denominado de elétrons. Com
isso, Thomson obteve a primeira evidência experimental de que os elétrons são constituintes
do átomo (OSTERMANN, 1999). Para explicar como era então o átomo, em 1898, Thomson
propôs um modelo conhecido como “pudim de ameixas”. Nesse modelo, os átomos não são
mais indivisíveis, mas formados por uma massa de carga positiva, em forma de esfera, e nela
os elétrons são homogeneamente distribuídos.
Segundo Bassalo (1980a), em 1895, o físico francês Jean Baptiste Perrin (1870-1942),
estudando os raios canais observados pelo físico alemão Eugene Goldstein (1850-1930),
evidenciou experimentalmente a existência de partículas carregadas positivamente. Mais
tarde, em 1904, às partículas positivas foi dado o nome de próton (SILVA e NATTI, 2007).
O modelo proposto por Thomson não levava em conta o próton como sendo
constituinte do átomo, se tornando dessa maneira incompleto. Em 1911, baseado em
resultados experimentais8, Rutherford propôs um átomo neutro. O modelo por ele proposto
seria como um sistema planetário em miniatura (BASSALO, 1980a), idéia esta que havia sido
defendida por outros cientistas, como o físico japonês Hantaro Nagaoka, em 1904. Nesse
modelo o núcleo atômico deveria ser muito denso, concentrando praticamente toda a massa
do átomo, e formado por cargas positivas; os elétrons estariam distribuídos ao redor do núcleo
girando em orbitas circulares (em raios da ordem de dez mil vezes o raio nuclear). O átomo de
7
A carga elétrica e a massa do elétron só foram definitivamente determinadas pelo físico norte-americano Robert
Andrews Millikan (1863-1953), em experiências realizadas de 1909-1911. O experimento utilizado por ele é
conhecido como “gotas de Millikan”.
8
Rutherford juntamente com outros cientistas, analisava os fenômenos relacionados à passagem das partículas
alfa através da matéria, percebendo que as partículas alfa sofriam grandes desvios ao atravessar a matéria.
9
Rutherford ocupa um grande volume quando comparado ao núcleo, que concentra quase toda
a matéria, sendo assim praticamente vazio. Porém, o modelo de Rutherford não estava
totalmente de acordo com os conceitos físicos já conhecidos na época. Esse modelo
“desobedecia” a teoria da eletrodinâmica clássica formada pelo físico escocês James Clerk
Maxwell (1831-1879), pela qual cargas elétricas aceleradas irradiam energia, cargas elétricas
de mesmo sinal se repelem e cargas de sinal contrário se atraem. Então, devida a órbita
seguida pelos elétrons no átomo e a aceleração centrípeta que os mantém nessa órbita,
perderiam energia por irradiação e tenderiam a cair no núcleo (BASSALO, 1980a). E ainda, o
núcleo era composto de partículas positivas e extremamente denso. Dessa maneira, deveria
haver uma força de repulsão eletrostática. Enfim, o átomo de Rutherford não era estável.
Em 1913 o físico dinamarquês Niels Henrik David Bohr (1885-1962), constatou que a
concepção quântica de Planck era a base de toda a Física Atômica (LOPES, 2004). Foi ele
quem explicou a estabilidade do átomo de Rutherford. Bohr postulou que os elétrons só
poderiam descrever um número discreto de órbitas circulares (estados de energia), sob
influência da atração coulombiana entre o elétron e o próton, e se movendo em órbitas
permitidas não emitem energia, apesar de estarem constantemente acelerados (EISBERG e
RESNICK, 1979). No intuito de manter a energia total constante, o elétron pode “saltar” de
uma orbita a outra emitindo ou absorvendo radiação. O átomo de Bohr pode absorver apenas
quantidades discretas de energia da radiação eletromagnética incidente (EISBERG e
RESNICK, 1979).
De acordo com Lopes (2005), Bohr utilizou-se da idéia de quantização da energia
proposta por Planck em 1900, no estudo da radiação de corpo negro, e também das
concepções de Einstein, em 1905, no qual a luz se propaga concentrada em corpúsculos com
energia proporcional à sua freqüência (E = h ν, onde h é denominada constante de Planck e
possui um valor aproximado de 6,63×10-34 joule.s), os fótons ou quanta de luz (“pacotes” de
energia).
Bohr conseguiu explicar a estabilidade do átomo, porém, algumas questões a respeito
da estabilidade do núcleo começaram a inquietar os físicos da época. Segundo Bassalo
(1980a), antes mesmo da década de 1920 havia alguns cientistas que acreditavam que no
interior do núcleo existiam elétrons “grudados” aos prótons, dessa maneira, os elétrons
neutralizariam os prótons impedindo a repulsão coulombiana entre eles. Devido ao fato da
energia eletrostática de ligação entre prótons e elétrons ser insuficiente, esta idéia era
inconsistente. Poderia então, o átomo ter mais constituintes em sua estrutura além do próton e
10
do elétron, pelo qual fosse possível explicar a estabilidade do núcleo? “Por volta de 1920,
havia a suspeita de que um objeto neutro (com a mesma massa do próton) fazia também parte
do átomo” (OSTERMANN, 1999, p. 420). Fato esse evidenciado em 1932 com a descoberta
do nêutron. A estabilidade do núcleo só foi explicada em 1935 com a teoria das forças
nucleares desenvolvida pelo físico japonês Hideki Yukawa (1907-1981).
2.4 – O desenvolvimento da Mecânica Quântica
Segundo Lopes (2004), entre 1913 a 1925, busca-se aperfeiçoar as teorias de Bohr e
estendê-la a todos os sistemas atômicos. O próprio Bohr afirmava freqüentemente que suas
idéias tinham caráter provisório e que as concepções Físicas da época necessitavam de uma
reforma para que fosse possível a construção de uma mecânica atômica consistente.
A mecânica quântica nasce diante da incapacidade da Física Clássica em explicar certos
fenômenos físicos, tais como a estabilidade atômica. De acordo com Ostermann (1999), o
aprofundamento das idéias de Bohr sobre a quantização da energia dos elétrons nos átomos
culmina, a partir de 1928, na chamada Teoria Quântica Moderna. No entanto, a teoria
quântica deu seus primeiros passos com Planck, em 1900.
A formulação da Mecânica Quântica surge com as investigações dos físicos Werner
Karl Heisenberg (1901-1976), Erwin Schrödinger (1887-1961), Louis De Broglie (18921987), entre outros. Esta área da Física envolve uma série de conceitos e equações
matemáticas, que não caberiam ser colocadas neste trabalho, mas há algumas conseqüências
que merecem ser mencionadas: foi o desenvolvimento desta teoria que proporcionou uma
compreensão mais profunda, por exemplo, da dualidade onda-partícula, das propriedades das
partículas elementares e da estrutura atômica.
2.4.1 – O Princípio de Exclusão de Pauli
Proposto pelo físico norte americano Wolfgang Pauli Junior (1900-1958) em 1925, o
Princípio da Exclusão de Pauli afirma que dois elétrons não podem ocupar o mesmo estado de
energia. Ele acrescentou aos três números quânticos (n, l, e m) decorrentes da teoria de BohrSommerfeld, um quarto número quântico, chamado de spin. Portanto, de acordo com Pauli,
dois elétrons só poderiam coexistir em um mesmo subnível energético, se tivessem ao menos
um dos quatro números quânticos diferentes. Dessa maneira, a estrutura atômica dos
11
elementos ficou perfeitamente explicada (BASSALO, 1980a). Mais tarde, o spin foi
interpretado como um momento angular intrínseco, podendo ser atribuídos a ele valores
inteiros e semi-inteiros. O Principio de Pauli foi importante para as descobertas de outras
partículas, pois muitas das partículas arranjadas no Modelo Padrão9 obedecem a este
princípio.
3 – Novas descobertas e algumas curiosidades
3.1 – O Neutrino
Na década de 1920, um problema atormentava os físicos. No decaimento beta (β) os
elétrons emitidos dos núcleos atômicos não assumiam valores bem definidos como era o
esperado, ao contrário, a energia emitida desses elétrons podia variar de zero até altos valores.
Neste decaimento, o número total de prótons não é conservado, e nem o número de nêutrons.
Isto levava a pensar que a conservação da energia não seria válida para todos os casos. “Em
um ato de ‘desespero’, Bohr sugeriu que as conservações de energia e momento linear, não
seriam válidas para o mundo microscópico” (SIQUEIRA, 2006, p. 41-42).
Para tentar explicar este problema, Pauli em 1931, sugeriu a existência de uma partícula
sem carga, com massa praticamente nula e fracamente interagente com a matéria, essa
partícula seria emitida juntamente com o elétron no decaimento β. Com estas propriedades as
partículas propostas por Pauli dificilmente seriam detectadas, e seriam as responsáveis por
carregar a energia faltante ao elétron, não sendo assim necessário alterar os teoremas da
conservação de energia. Em 1931, o físico italiano Enrico Fermi (1901-1954) chamou esta
partícula de neutrino (em italiano, pequeno nêutron), sendo representada por ν. A existência
do neutrino foi totalmente aceito por volta da década de 1950, pelo fato de que se observou
que a energia só era conservada no decaimento β se considerasse o neutrino fazendo parte do
processo. Após árduo trabalho, a descoberta experimental do neutrino só ocorreu em 1956 no
reator nuclear Savannah River, na Carolina do Sul, Estados Unidos.
3.2 – O Pósitron
A descoberta do pósitron está associada à idéia de que para cada partícula (matéria) há
uma antipartícula (antimatéria) associada, possuindo a mesma massa e carga elétrica contrária
9
O Modelo Padrão que ainda será apresentado neste trabalho, consiste na organização das partículas
elementares. Esse modelo é formado por seis quarks, seis léptons e as partículas mediadoras.
12
à da partícula.
Em 1928, o físico inglês Paul Adrien Maurice Dirac (1902-1984), ao generalizar a
equação de Schrödinger sob a luz da relatividade restrita de Einstein, estabeleceu uma nova
equação que é conhecida como “equação de Dirac”. Com essa equação ele demonstrou que
havia a possibilidade de existirem na natureza partículas idênticas aos elétrons, mas com
carga elétrica positiva, que Dirac chamou de antielétron (BASSALO, 1981). Dirac chegou a
pensar que tais partículas poderiam corresponder aos prótons, mas como a massa não era
semelhante, abandonou essa idéia. Então, o físico norte-americano Jacob Robert Oppenheimer
(1904-1967) mostrou que esta partícula não poderia ser o próton e, em 1931, o matemático
alemão Hermann Klaus Hugo Weyl (1885-1955) mostrou que, tendo em vista as propriedades
de simetria de Dirac, tal partícula deveria ter a mesma massa do elétron. Em agosto de 1932, o
físico norte-americano Carl David Anderson (1905-1991) estudando a trajetória das partículas
cósmicas em uma câmara de Wilson, que emergiam de uma placa de chumbo (colocada na
câmara para frear as partículas, a fim de que pudessem ser observadas), percebeu que a
trajetória era idêntica à do elétron com curvatura oposta. Desse modo, Anderson evidenciou
as previsões teóricas feitas por Dirac sobre as antipartículas, no qual Anderson chamou de
pósitron. Essa foi a primeira partícula elementar descoberta que não “pertencia” ao núcleo
(SIQUEIRA, 2006). As previsões teóricas de Dirac e a descoberta do antielétron, o pósitron,
levaram os físicos da época a procurarem outras antipartículas, como o antipróton e o
antinêutron. Sendo que a descoberta dessas antipartículas só foi possível após o
desenvolvimento da tecnologia dos aceleradores de partículas.
3.3 – O Nêutron
A teoria atômica já havia dado grandes passos, mas existiam algumas concepções que
ainda não agradavam alguns físicos da época, como o fato de se pensar o núcleo atômico
sendo formado apenas, por partículas de carga positiva, a estrutura nuclear deveria ser descrita
melhor. Assim, em 1920, Rutherford ao apresentar os resultados de seus experimentos,
sugeriu a existência de uma partícula neutra como constituinte do átomo. Essas partículas, não
poderiam ser verificadas experimentalmente através do uso de campos elétricos e magnéticos,
uma vez que são neutras. Foram as experiências feitas por Walther Wilhelm Georg Frank
Bothe (1891-1957), Herbert Z. Becker (1887-1955), e pelo casal Joliot-Curie, que permitiu
observarem que o bombardeio de berílio por partículas alfa emitia uma radiação muito
13
penetrante. Porém, segundo Bassalo (1980b), essas radiações penetrantes não foram muito
bem interpretadas por nenhum dos responsáveis pelas observações. Coube então ao físico
inglês James Chadwick (1891-1974), em 1932, após repetir as observações, a interpretação de
tal radiação como sendo uma partícula neutra, com massa aproximadamente igual a do próton,
chamando-a de nêutron.
A hipótese de que o nêutron, assim como o próton, fosse também um constituinte do
núcleo foi formulada em 1932 por Heisenberg e, independentemente, no mesmo ano, pelo
físico russo Dimitrij Iwanenko (BASSALO, 1980a). A descoberta do nêutron como partícula
constituinte do núcleo, contribuiu para fundamentar a descrição nuclear, agora o núcleo é
descrito por prótons e nêutrons, formando a massa e a carga do núcleo. Mas, sendo o núcleo
composto por prótons e nêutrons como explicar sua estabilidade? Surge então a hipótese da
existência de uma nova interação (nuclear ou forte) para explicar por que o núcleo não
“explode” (OSTERMANN, 1999).
3.4 – As interações fundamentais
Antes de dar continuidade às novas descobertas e caminhar para a explicação da
interação que existe entre o núcleo, que impede assim o seu rompimento, é necessário
entender as interações fundamentais conhecidas como: força nuclear forte e força nuclear
fraca. No entanto, anteriores a estas, já se sabiam da existência de duas interações
fundamentais: a força gravitacional e a força eletromagnética. Pode-se descrever a força como
sendo o resultado da interação entre corpos, podendo variar seu estado inicial, ou seja, o
estado de movimento do corpo. Atualmente, entende-se que, “[...] as forças são transmitidas
pela troca de partículas mediadoras”10 (OSTERMANN, 1999). Dessa maneira, são quatro as
interações fundamentais da natureza e cada uma delas possui suas respectivas partículas
mediadoras, são elas: força gravitacional, onde o gráviton é a sua partícula mediadora; força
eletromagnética, tendo o fóton como mediador; força forte, que possui a partícula mediadora
chamada de glúon; e força fraca, que têm as partículas W+, W- e Z0 como mediadoras.
Um dos grandes desejos da Física é construir uma teoria unificada de todas as
interações fundamentais da natureza, denominada de Teoria Unificada, que explicaria todos
os fenômenos em termos de uma única interação fundamental. Um passo importante já foi
10
As partículas mediadoras são aquelas trocadas durante a interação. No decorrer do trabalho essas denominações
ficarão mais claras.
14
dado neste sentido pela unificação das interações eletromagnética e fraca, chamada de força
eletrofraca11.
3.4.1 – Força gravitacional
Qualquer corpo que possua massa sofre a ação da força gravitacional; como ao seu
redor é criado um campo gravitacional, eles se atraem mutuamente. No Universo é esta a
força que rege todos os movimentos dos corpos celestes, e quanto maior a distância entre os
corpos, menor é a intensidade da interação gravitacional entre eles, pois, essa intensidade
diminui com a distância. Sua ação é relevante apenas para corpos de massa muito grande, pois
sua intensidade é baixa. A força gravitacional tem ação a distância e teoricamente possui uma
partícula mediadora chamada de gráviton. Porém, de todas as partículas mediadoras esta é a
única que ainda não foi detectada experimentalmente (MOREIRA, 2004).
3.4.2 – Força eletromagnética
A força eletromagnética envolve corpos com cargas elétricas e, assim como a força
gravitacional, tem ação a distância. É ela, a interação responsável por elétrons (partículas com
carga negativa) girarem ao redor do núcleo atômico (positivo), permitindo assim, que os
átomos sejam formados. A partícula mediadora da força eletromagnética, denominada de
fóton, não possui carga e nem massa.
3.4.3 – Força forte
Segundo Bassalo (1981), em 1935 Yukawa sugeriu que os núcleons (nome coletivo
para prótons e nêutrons) se ligassem ao núcleo por uma nova força da natureza, porém de
curto alcance e muito forte e que seria análoga à força eletromagnética; essa nova força ficou
conhecida como interação forte. A força forte ou força nuclear forte é a mais forte no âmbito
das partículas elementares e mantém juntos prótons e nêutrons no núcleo atômico
(MOREIRA, 2004). Como sugerido por Yukawa, a atuação desta força é de curto alcance
(restrita a dimensões de 10-15 m), com distâncias menores que o raio do núcleo atômico.
11
Neste trabalho não será apresentado o conceito desta teoria, eletrofraca, ficando apenas citado a sua existência.
15
De acordo com Ostermann (1999), o núcleo só é estável pela ação da força forte, pois
se não fosse assim, a força eletromagnética de repulsão que age entre os prótons no interior do
núcleo, causaria seu rompimento. A partícula mediadora da força forte é o glúon.
3.4.4 – Força fraca
A força fraca ou força nuclear fraca é assim denominada porque é fraca em intensidade
se comparada à forte (OSTERMANN, 1999). Esta força atua também dentro do núcleo e é
responsável pelo decaimento β. As partículas mediadoras da força fraca são: W+, W- e Z0.
Estas partículas mediadoras possuem massa quase cem vezes maior que a massa do próton,
limitando assim a ação da força fraca, que é da ordem de 10-17 m.
A intensidade relativa a cada força fundamental pode ser determinada, e possuem os
seguintes valores:
A intensidade relativa das quatro forças é indicada pela força aproximada, em
newtons, entre dois prótons colocados a uma distância de 10-15 metros entre si. Eles
têm de ficar assim próximos, para que as forças fraca e forte (indireta), que têm
alcance muito restrito, tenham a possibilidade de mostrar sua intensidade:
gravidade, 10-34; força fraca, 10-10; força eletromagnética, 10; força forte, 103
(SILVER, 2003, p. 599).
3.5 – Os múons, os píons e a estabilidade do núcleo
Em 1935, Yukawa tentou explicar as forças que mantinham o núcleo atômico coeso,
sabendo que os fótons eram as partículas mediadoras da interação eletromagnética. Por
analogia, imaginou que as forças nucleares também deveriam ser mediadas por uma partícula
até então desconhecida, porém, diferentemente do fóton estas deveriam possuir massa e carga
elétrica. Yukawa chegou a estimá-la como sendo da ordem de 200 vezes a massa do elétron12
(BASSALO, 1981). A estas partículas foi dado o nome de méson (em grego, intermediária), e
que, segundo Yukawa, se apresentariam em três formas: positivo, negativo e neutro.
A primeira evidência sobre a existência de partículas com esta massa se deu em 1936,
com os físicos norte-americanos Anderson e Seth Henry Neddermeyer (1907-1988), através
de estudos com raios cósmicos. A partícula observada por eles possuíam uma massa
intermediária entre a do próton e a do nêutron, conforme previsto por Yukawa. Porém, estas
12
A massa de repouso do elétron é de 0,5 MeV/c². Portanto, Yukawa previa que a massa dos píons seria da
ordem de 100 MeV/c².
16
partículas não eram exatamente as previstas por Yukawa, e foi sugerido que deveriam existir
duas espécies de mésons, os de Anderson e os de Yukawa (BASSALO, 1981). O méson
descoberto por Anderson foi chamado de méson (μ) que mais tarde passou a ser conhecido
como múon sendo representado por μ. O méson μ ou múon possui duas cargas elétricas
possíveis (μ+ e μ-).
A partícula mediadora da interação nuclear entre prótons e nêutrons prevista por
Yukawa foi descoberta em 1947 pelo físico brasileiro Cesare Mansueto Giulio Lattes (19242005) e pelo físico inglês Cecil Frank Powell (1903-1969), ao fazerem observações sobre
raios cósmicos com emulsões nucleares fotográficas expostas a 5220 metros de altitude no
Laboratório de Física Cósmica em Chacaltaya, próximo a La Paz na Bolívia; detectaram
rastros que concluíram serem os mésons (π) de Yukawa. Hoje, estas partículas são chamadas
de píon e são representadas por π.
Segundo Moreira (2007), os mésons π+ e π– foram produzidos em aceleradores de
partículas em 1948 na Universidade de Berkeley, e o méson π0 foi produzido em 1950
também com experimentos de colisões de partículas em aceleradores.
Os píons são partículas instáveis, sendo assim, “vivem” por um pequeno intervalo de
tempo e posteriormente decaem em outras partículas. Os píons com carga positiva (+1) e
negativa (-1) possuem um tempo de vida em torno de 10-8 segundos, e o píon neutro da ordem
de 10-16 segundos.
De acordo com Ostermann (1999), os píons agem no sentido de intermediarem a troca
de partículas entre os núcleons, não sendo os verdadeiros mediadores da força forte entre os
prótons e os nêutrons; as partículas mediadoras são os glúons. E é por isto que atualmente a
força forte é subdividida em fundamental e residual.
A hipótese de Yukawa previa que a partícula mediadora (píon) poderia ser emitida por
um nêutron e absorvido por um próton, ou vice e versa, fazendo assim com que o nêutron e o
próton exercessem força um sobre o outro, a chamada força forte (MOREIRA, 2004). De
acordo com Eisberg e Resnick (1979), Yukawa propôs que um núcleon freqüentemente
emitisse uma partícula (o píon), e a troca desta partícula entre os núcleos daria origem a força
nuclear. As descobertas experimentais a partir das hipóteses levantadas por Yukawa permitiu
a verificação de sua teoria, e também de que a força nuclear (forte) seria então a responsável
pela estabilidade do núcleo.
17
3.6 – O Projeto Manhattan
Menos de uma década após a descoberta do nêutron, Chadwick estava em Washington
tentando convencer os Estados Unidos a iniciarem o Projeto Manhattan (MADDOX, 1999). O
Projeto foi instituído em 1943 e centralizado no Laboratório de Los Alamos, no Novo
México, marcando assim a ação norte-americana no desenvolvimento da bomba atômica.
Mas, até este período as teorias acumuladas para o desenvolvimento da bomba nuclear já
estavam bem desenvolvidas, principalmente com a descoberta da fissão nuclear em 1939 e a
produção por Bohr da água pesada (como um estimulador radioativo), podendo, assim,
acelerar a reação em cadeia do Urânio. Os estudos sobre a separação do
235
U (Urânio 235)
iniciou-se em 1939 e, juntamente com o Plutônio, o Urânio era o principal elemento de
pesquisa para a bomba.
A investida dos Estados Unidos na corrida da bomba atômica se deve ao fato dos
supostos rumores de que os laboratórios alemães, sabendo dos resultados relacionados à fissão
do núcleo de urânio, avançavam para a produção desta arma (LOPES, 2004), e também o
ataque japonês às frotas navais norte-americanas atracadas em Pearl Harbour (oceano
Pacífico) no ano de 1941. A Alemanha ao invadir a Noruega, em 1940, ganhou um trunfo,
pois, apoderou-se da única planta para a fabricação da água pesada, fundamental para o
processo nuclear. Alguns cientistas germânicos fugindo da perseguição nazista foram para a
Grã-Bretanha e para os Estados Unidos. Os britânicos, por sua vez, possuíam estoques de
água pesada, porém perceberam que não possuíam materiais suficientes para a fabricação de
uma bomba, dessa maneira concordaram em dividir sua experiência com os Estados Unidos.
E dessa forma deu-se origem ao ultra-secreto Projeto Manhattan, que contou também com a
colaboração do Canadá. O físico norte-americano Julius Robert Oppenheimer (1904-1967),
foi quem liderou a parte científica deste projeto.
Os Laboratórios de Los Alamos projetaram dois tipos de bombas, uma de Urânio e
outra de Plutônio, respectivamente chamadas de Litlle Boy e Fat Man. Apenas a de Plutônio
teve que ser testada antes do lançamento, pois tinham dúvidas a respeito do disparo. O local
escolhido para o teste foi Alamogordo, no Novo México (EUA) e aconteceu no dia 15 de
junho de 1945.
A bomba causaria um impacto gigantesco apenas por dividir o núcleo atômico. Quando
atingido por um nêutron, o núcleo do átomo de
235
U se parte e libera um fluxo de energia de
enormes proporções, além de mais nêutrons. Estes por sua vez, bombardeiam outros núcleos
18
atômicos, iniciando uma reação em cadeia que gera em pouco tempo uma grande quantidade
de energia. Uma quantidade específica de
235
U, conhecida como "massa crítica", é necessária
para engatilhar a reação. No interior da bomba, o urânio é mantido separado em duas partes
reunidas apenas no momento da detonação para formar a "massa crítica" e gerar a explosão.
Em 06 de junho de 1945 a Alemanha havia se rendido, faltava então forçar a rendição
japonesa. Não existiam dúvidas sobre o sucesso nas explosões das bombas construídas, deu-se
assim o início na escolha das cidades a serem “exterminadas”. Recomendou-se que “a bomba
atômica deveria ser utilizada contra o Japão, contra um alvo duplo, isto é, constituído de
instalação ou fabrica militar rodeada de casas ou edifícios susceptíveis de ser danificados”
(LOPES, 2004, p. 188). As cidades escolhidas foram Hiroshima e Nagasaki. Hiroshima
recebeu a Litlle Boy em 06 de agosto de 1945 e três dias depois, Nagasaki foi destruída pela
Fat Man. Na semana seguinte às explosões, o Japão rendeu-se. Os danos causados por estas
duas bombas nas cidades japonesas não merecem serem citados neste trabalho.
A bomba atômica lançada pelos Estados Unidos continha material físsil
(aproximadamente 10 kg de 235U ou aproximadamente 6 kg de 239Pu), dispostos em recipientes
com formato afunilado e acima desse material foi colocado trinitrotolueno (dinamite, TNT).
No centro do artefato existe uma fonte de nêutrons. Quando as dinamites são detonadas,
empurram as massas subcríticas de 235U ou 239Pu que são pouco compactadas para o centro do
artefato, comprimindo-as e tornando-as críticas. Como estarão dessa maneira próximas da
fonte de nêutrons, inicia-se a reação em cadeia.
Logo após a explosão e sabendo do grande “cogumelo de fogo” surgido com a
detonação, disse Openheimer: “Transformei-me na morte, no despedaçador de mundos”
(LOPES, 2004, p. 188).
3.7 – Os aceleradores de Partículas
Até aqui já eram conhecidas as seguintes partículas: elétrons, prótons, nêutrons,
neutrinos, pósitrons, múons e píons. No entanto, à medida que continuaram as pesquisas com
raios cósmicos e aceleradores de partículas, o número de partículas proliferou. Foram a
construção e os avanços tecnológicos dos aceleradores de partículas13 que permitiram a
13
De acordo com Caruso e Oguri (1997, apud Siqueira, 2006) os tubos de raios catódicos são considerados os
primeiros aceleradores de partículas. O tubo de raios catódicos é um aparato que produz descargas elétricas
através de gases.
19
detecção de diversas partículas propostas teoricamente, algumas delas elementares e outras
não. É por meio destas engenhosidades que os pesquisadores se empenham em encontrar
partículas previstas teoricamente, mas que até o momento não foram detectadas
experimentalmente. Portanto, o homem contemporâneo, assim como os pré-socráticos, busca
respostas para a constituição do Universo. Ao longo dos séculos surgiram muitas indagações e
diversas respostas vêm sendo sugeridas e confirmadas ao longo do tempo, no entanto, como
dito anteriormente, há perguntas ainda sem respostas, mas que podem não tardar a surgir.
Apesar dos raios cósmicos terem propiciado o desenvolvimento da Física de Partículas
e a descoberta de matéria, tais como os pósitrons e os múons, e bombardearem a terra com
dezenas destes corpúsculos a cada segundo, eles não permitiam o pleno controle das
partículas incidentes. Então, viu-se a necessidade de construir equipamentos capazes de
permitir a colisão de matéria de forma controlada, pois se sabia que ao colidir matéria com
força suficiente era possível desfragmentá-la, gerando assim novas partículas. Maddox (1999)
relata o inicio deste empreendimento humano:
Na década de 1930, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, os cientistas
começaram a projetar máquinas capazes de acelerar partículas, tanto elétrons como
prótons, e usá-las para bombardear os núcleos de átomos, induzindo transformações
nucleares (Ibid., p. 69).
Um acelerador é um tubo de vácuo, no qual é possível acelerar uma variedade de
projéteis (partículas) a velocidades altíssimas, muito próximas à velocidade da luz (c), e
depois levadas a colidirem frontalmente com outras que se movimentam na direção oposta.
Viajando a velocidades tão altas é necessário levar em conta a teoria da relatividade, assim as
partículas possuem um significativo aumento de massa.
Os aceleradores podem ser lineares e circulares. O primeiro acelerador linear
empregado na investigação do núcleo foi o multiplicador de voltagem construído em 1930;
com este equipamento conseguiram acelerar prótons.
O primeiro acelerador circular construído foi o cíclotron (acelerador de prótons) em
1932, em Berkeley, Califórnia. Neste acelerador os projéteis são acelerados por um campo
elétrico, e após adquirir a energia necessária, ele é dirigido para o alvo que se quer
bombardear. O cíclotron foi desenvolvido pelos físicos norte-americanos Ernest Orlando
Lawrence (1901-1958) e Milton Stanley Livingston (1905-1986) e foi capaz de produzir
prótons de 4 Mev.
20
Segundo Bassalo (1983), quando no cíclotron eram utilizados elétrons na aceleração,
surgia uma grande dificuldade: à medida que a velocidade dos elétrons aumentava a massa
destas partículas também aumentavam, conforme indica a teoria da relatividade, fazendo com
que a sua freqüência ficasse defasada em relação à freqüência do campo elétrico oscilante.
Para resolver este problema construiu-se em 1940 o betatron, nele os elétrons eram acelerados
em uma trajetória circular fixa, e o aumento da massa relativística era compensado pela
variação do campo magnético. Mas o betatron, devido ao efeito relativístico, possuía
limitações. Então, em 1947 construiu-se o primeiro sincrocicloton aplicando um princípio
conhecido como estabilizador de fase14.
Nas décadas posteriores à construção dos primeiros aceleradores de partículas, a
tecnologia progrediu de forma considerável. Hoje em dia existem aceleradores de partículas
em diversos países. O incentivo às construções destes equipamentos se deu principalmente a
partir do final da Segunda Guerra Mundial, gerado pela competição científica entre países
como os EUA, a União Soviética (Rússia), países da Europa e o Japão. O Brasil também
possui um acelerador de partículas localizado no Laboratório Nacional de Luz Síncroton
(LNLS), em Campinas (SP), sendo este o único do gênero na América Latina.
A construção de tais máquinas cada vez mais potentes são extremamente dispendiosas.
Segundo Maddox (1999), em 1995 o congresso norte-americano não aprovou verbas de nove
bilhões de dólares para que se desse continuidade na construção de um acelerador de
partículas denominado Superconducting Super-Collider (SSC) no Texas, este que seria o
maior acelerador do mundo deveria ter um túnel circular de 86 quilômetros de circunferência.
Hoje, o maior acelerador de partículas e já em fase de acabamento é o chamado Large
Hadron Collider (LHC), localizado na fronteira entre a Suíça e a França onde está o
laboratório que abriga o Centro Europeu de Pesquisas Nucleares mais conhecido pela sigla
CERN.
3.7.1 – O gigante Europeu: LHC
Após quase duas décadas de planejamento o LHC iniciou suas atividades experimentais
no dia 10 de setembro de 2008 apenas para validação de todos os sistemas que o compõem,
pois os testes efetivos se darão a partir de 2009. Os físicos irão recriar as condições
14
Princípio segundo o qual a freqüência de um campo elétrico oscilante em um ciclotron era sincronizada com a
freqüência da partícula acelerada em uma dada órbita.
21
imediatamente após o big bang (explosão que supostamente deu origem ao universo) através
da colisão frontal de matéria com alta energia. A cada segundo, um feixe de prótons, viajando
com velocidade próxima à da luz no vácuo (c ≅ 3×108 m/s), irá atravessar outro feixe com as
mesmas características vindo em direção oposta, produzindo assim diversas outras partículas.
Para se ter idéia da grandiosidade desta máquina, o LHC será dez vezes mais energético que o
Tévatron, maior acelerador de prótons em atividade do mundo, localizado no Laboratório
Fermi (Fermilab) nos Estados Unidos. E ainda poderá funcionar com cerca de 100 vezes mais
prótons circulando no anel que o Fermilab.
Quando as partículas (prótons) atingirem o máximo de energia, a cada segundo
completarão mais de 11 mil voltas no anel de 27 quilômetros. Para que atinjam tamanha
energia são usados imãs supercondutores que fazem com que o feixe de prótons siga a
trajetória circular do anel. Esses equipamentos funcionam bem a baixas temperaturas e para
isso serão resfriados a 271,25ºC negativos.
O LHC possui aproximadamente 27 quilômetros de circunferência e está a 100 metros
abaixo da superfície. É dotado de diversos detectores para que no momento da colisão possam
“capturar” e selecionar as informações de que os físicos tanto almejam. Os detectores são:
Alice, LHCb, Atlas e CMS. De todos os detectores o Atlas é o maior e, assim como o CMS, a
sua construção se deu para determinar a existência (ou não) do bóson de Higgs, além de terem
outras finalidades.
Este complexo instrumento científico é um projeto com colaboração internacional,
fazem parte 20 países-membros todos da Europa, 8 países-observadores e ainda diversos
países colaboradores, entre eles o Brasil. Para a sua execução, iniciada em 1993, já foram
consumidos em torno de US$ 6 bilhões. Terá valido a pena ter gasto um valor tão grande
assim nesta área da Física? Há discordâncias nesta questão, mas o que resta é aguardar os
resultados que ele poderá fornecer. Pode-se verificar que alguns autores parecem acreditar
numa resposta afirmativa, como é o caso:
A utilidade do conhecimento é difícil de ser aferida, mas não há notícia de país que
tenha ficado mais pobre por conhecer demais (ESCOBAR e SHELLARD,
1999, p. 31).
Como resposta a este questionamento, outro autor descreve:
Muitos cientistas sentem que a ciência deveria ser útil, se possível. Eu sou um
destes, mas o espírito deste livro, acredito, é consistente com aqueles cientistas, de
que também sou um, que consideram a ciência como uma busca que não necessita
22
justificação prática. A física de partículas sem dúvida produziu algumas das idéias
mais imaginativas e sutis da ciência, e o espetáculo das partículas elementares sendo
“domadas” é um exemplo magnífico de intuição física, conhecimento matemático e
grandes saltos da imaginação [...] (SILVER, 2003, p. 603).
Um dos principais objetivos desta máquina é verificar a existência do bóson de Higgs,
que foi proposta pelo físico inglês Peter Higgs (1929-) em 1964. Esta é a partícula que
explicaria a massa dos chamados bósons mediadores (W± e Z0) (ABDALLA, 2005), cujas
propriedades estão previstas no Modelo Padrão.
Outra questão que caberá ao LHC dar respostas é o que aconteceu com a antimatéria
criada a partir do big bang. No início do universo a antimatéria foi criada juntamente com a
matéria em quantidades iguais, porém a matéria parece ter sido favorecida pela natureza.
Toda partícula (matéria) possui sua antipartícula (antimatéria) e que ao se encontrarem são
aniquiladas, sobrando apenas energia. É provável que esta aniquilação tivesse impedido que
os seres vivos e todas as outras coisas existissem. Então, o que aconteceu com a antimatéria?
3.8 – Criação e aniquilamento de partículas
A simetria entre partícula e antipartícula é uma das verdades da Física atual. Sabe-se
hoje, que para cada partícula existe uma antipartícula de massa idêntica e carga contrária, de
spin igual e estranheza15 oposta (SIQUEIRA, 2006). Quando um par matéria/antimatéria se
encontra em uma reação, elas são aniquiladas mutuamente em forma de energia. Segundo
Ostermann (1999), um exemplo de aniquilamento é a do par próton-antipróton:
p + p → Energia
É possível criar par partícula-antipartícula a partir de energia. De acordo com
Ostermann (1999), um exemplo de criação de um elétron-pósitron a partir de energia é o
seguinte:
Energia → e+ + e–
3.9 – Inúmeras outras descobertas
Com o advento e o progresso de máquinas capazes de acelerar matéria, um “rio” de
descobertas surge na Física de Partículas. Segundo Abdalla (2005), a década de 1950 é
15
A estranheza é uma propriedade das partículas e os valores atribuídos a esta regra são: ±3, ±2, ±1 ou 0.
23
marcada pelo número espantoso de novas partículas, eis algumas que surgiram nesta época:
Κ+, Ʌ, Κ0, Δ++, Ξ– , Σ+, p , no entanto, nenhuma delas elementar.
As partículas Ʌ, chamadas de híperons (super, em grego), foram produzidas em 1952
ao conseguir acelerar prótons com energia da ordem de 1 GeV. Estas partículas já haviam
sido detectadas nos raios cósmicos, pois perceberam que os raios cósmicos carregavam além
de píons e múons outras partículas mais pesadas que os núcleons (SIQUEIRA, 2006).
De acordo com Siqueira (2006), os híperons possuem como característica o fato de que
seu decaimento resulta sempre num próton ou nêutron, por exemplo, Ʌ → p + π–. Entretanto,
o decaimento desta partícula violava alguns princípios da Mecânica Quântica, segundo o qual
se uma partícula é formada facilmente ela também é facilmente desintegrada. A partícula era
facilmente produzida, mas seu decaimento era lento. Este fato foi explicado por Pais e
Nishijama, ao mostrarem que os dois processos, produção e decaimento, são distintos. A
produção depende da força forte e o decaimento depende da força fraca.
Em 1962, cientistas observaram as primeiras evidências do neutrino do múon (νμ), fato
que mostrava a existência de mais de um tipo de neutrino (ABDALLA, 2005). Em
experimentos realizados utilizando o acelerador Alternating Gradient Synchrotron (AGS),
dos decaimentos dos píons (mésons π) surgiam múons e neutrinos.
De acordo com Ostermann (1999), algumas das possibilidades de decaimentos dos
píons positivos podem ser as seguintes:
π+ → μ+ + ν
π+ → e+ + ν.
Os neutrinos que aparecem nestas reações não são os mesmos. No primeiro decaimento
apresentado, o neutrino produzido juntamente com o múon positivo é o neutrino do múon. Já
o do outro decaimento é o neutrino do elétron (ν e). Porém, aparentemente não é possível saber
se estes neutrinos são diferentes, apenas que ao interagirem com um nêutron, o elétron com
seu neutrino e o múon com seu neutrino não se misturam. Por exemplo:
n + νμ → μ– + p e nunca, n + νμ → e– + p
n + νe → e– + p e nunca, n + νe → μ– + p
Alguns anos mais tarde, em 1975, no acelerador linear da Universidade de Stanford,
nos Estados Unidos, foi encontrado o “primo gordo” do elétron e do múon, a partícula tau (τ),
24
possuindo massa duas vezes maior que a do próton e podendo ter carga positiva ou negativa.
A partícula tau também tem um neutrino, o neutrino do tau (ν τ). Como se sabe a cada partícula
está associado sua correspondente antipartícula (simbolizada por uma barra acima do símbolo
da partícula), assim os neutrinos também possuem os seus antineutrinos: ν e, ν
μ
e ν τ.
3.10 – “Velhas e novas” leis de conservação e outras propriedades das partículas
Nos processos que envolvem as partículas são observadas algumas leis de conservação,
que podem restringir tais processos e explicar porque determinadas coisas acontecem e outras
não. São elas: conservação de energia, conservação do momentum ou da quantidade de
movimento e conservação da carga elétrica.
A partir da década de 1950, com os aceleradores de partículas foi possível descobrir
diversas novas partículas e na tentativa de explicar porque determinadas reações ocorrem e
outras não, os cientistas propuseram novas propriedades das partículas e definiram suas regras
de conservação. São elas: conservação do número bariônico, conservação do número
leptônico e regra da estranheza.
3.10.1 – Conservação de energia
A energia total das partículas antes do decaimento deve ser igual à energia total após o
processo. A energia total manifesta-se na forma de energia cinética e da energia de repouso da
partícula (dada por E = m0c², onde m0 é a massa de repouso da partícula).
3.10.2 – Conservação do momentum
Em qualquer processo físico, o momentum total de um sistema de partículas deve
permanecer o mesmo. O momentum de uma partícula é dado pelo produto de sua massa por
sua velocidade, desde que esta velocidade seja muito menor que a da luz. Se num decaimento
uma partícula decai em duas outras, considerando que o momentum total inicial seja zero, as
partículas criadas devem emergir em sentidos opostos a fim de que o momentum total se
conserve (OSTERMANN, 1999). Foi esta conservação que alguns cientistas por um
momento, acreditaram que não seria válida para todos os processos físicos, pois o decaimento
25
β aparentemente desobedecia esta lei, fato este que foi satisfeito postulando a existência do
neutrino.
3.10.3 – Conservação da carga elétrica
A carga elétrica das partículas também deve se conservar. Se num processo as
partículas iniciais possuírem carga elétrica total igual a zero, independente de quantas
partículas serão criadas, a soma da carga total, ao final também deve ser igual a zero.
3.10.4 – Conservação do número bariônico
Esta regra está relacionada ao número de prótons, nêutrons e outras partículas que
pertencem à classe dos bárions. Todos os bárions possuem um valor igual a 1 ou -1, o
chamado número bariônico. E todos os que não são bárions possuem um número bariônico
igual a zero. Portanto, o número total de bárions deve permanecer constante e uma reação só
poderá ocorrer se houver conservação do número bariônico. O número bariônico da
antipartícula possui um valor oposto ao da sua partícula associada. Na tabela 1 é apresentado
o número bariônico de alguns bárions.
Bárion
Próton
Antipróton
Nêutron
Antinêutron
Lambda
Sigma Mais
Antisigma Mais
Sigma Zero
Antisigma Zero
Sigma Menos
Ksi Zero
Antiksi Zero
Ksi Menos
Antiksi Mais
Ômega Menos
Ksi Estrela Zero
Símbolo Estranheza Carga
P
0
+1
0
-1
p
N
0
0
0
0
n
0
Ʌ
-1
0
Σ+
-1
+1
+
+1
+1
Σ
0
Σ
-1
0
0
+1
0
Σ
–
Σ
-1
-1
Ξ0
-2
0
0
+2
0
Ξ
–
Ξ
-2
-1
+
+2
+1
Ξ
Ω–
-3
-1
Ξ*0
-2
0
Nº Bariônico
+1
-1
+1
-1
+1
+1
-1
+1
-1
+1
+1
-1
+1
-1
+1
+1
Tabela 1: Algumas propriedades e o número bariônico de alguns bárions. Adaptado de Ostermann (1999).
26
3.10.5 – Conservação do número leptônico
A classe de partículas chamadas de léptons é caracterizada pelos chamados números
leptônicos, todos os léptons possuem um valor igual a 1 ou -1, e todos os que não são léptons
possuem um número leptônico igual a zero. São eles: número leptônico do elétron (L e),
número leptônico do múon (Lμ) e número leptônico do tau (Lτ). Esta nova quantidade também
deve ser conservada nas reações. Na tabela 2 é apresentado o número leptônico dos léptons e
antiléptons.
Lépton
Elétron
Anti-elétron
Neutrino do elétron
Antineutrino do Elétron
Múon
Antimúon
Neutrino do Múon
Antineutrino do Múon
Tau
Antitau
Neutrino do tau
Antineutrino do tau
Símbolo
e–
e+
νe
ν e
μ–
μ+
νμ
ν μ
τ–
τ+
ντ
ν τ
Le
1
-1
1
-1
0
0
0
0
0
0
0
0
Lμ
0
0
0
0
1
-1
1
-1
0
0
0
0
Lτ
0
0
0
0
0
0
0
0
1
-1
1
-1
Tabela 2: Número leptônico dos léptons. Adaptado de Lopes (2004).
3.10.6 – Regra da estranheza
Os cientistas começaram a observar que determinadas reações que deveriam ocorrer por
obedecer todas as regras de conservação até então conhecidas, simplesmente não aconteciam.
Então, era provável que estas reações desobedeciam a outra regra de conservação ainda
desconhecida. Na década de 1950 estudando este tipo de reação, os físicos atribuíram às
partículas uma nova propriedade chamada de regra da estranheza. As partículas devem
obedecer a esta regra nas interações forte e eletromagnética. Caso a estranheza não seja
conservada em uma reação, esta reação está ocorrendo sob a ação da interação fraca. Os
valores possíveis de estranheza de uma partícula são: +3, +2, +1, 0, -1, -2 ou -3. Na tabela 1
acima, são apresentados alguns valores de estranheza para os bárions, observe que todas as
antipartículas possuem valores de estranheza opostos aos de suas partículas associadas.
27
3.11 – As partículas “verdadeiramente” elementares: os quarks
Seriam as partículas constituintes do átomo fundamentais? Por muito tempo acreditouse que as partículas constituintes dos átomos: prótons, elétrons e nêutrons, seriam partículas
elementares, ou seja, não seriam formadas por nenhuma outra partícula. No entanto, em 1964
Murray Gell-Mann (1929-) e George Zweig (1937-) independentemente, propuseram a
hipótese do quark (OSTERMANN, 1999). Estas seriam partículas ainda mais fundamentais
que as constituintes do átomo. “Hoje aceita-se que os quarks, assim como os elétrons, são as
partículas verdadeiramente elementares da matéria, uma espécie de tijolos básicos para a
construção de toda a matéria, inclusive dos nêutrons e prótons” (MOREIRA, 2007, p. 6).
A teoria que levantou a hipótese dos quarks previa a existência de três tipos: quark up
(u), quark down (d) e quark strange (s), também chamados de sabores, além dos antiquarks:
anti-up ( u ), anti-down ( d ) e anti-strange ( s ). A carga elétrica dessas novas partículas seriam
fracionárias (± 1/3e, ± 2/3e). As propriedades relacionadas a estes quarks foram estabelecidas
a fim de descrever as partículas já conhecidas, entendendo dessa maneira a composição dos
hádrons16. Os prótons e os nêutrons são formados pelos quarks mais abundantes da natureza,
os quarks up e down. O próton é formado por dois quarks up e um down (uud), já o nêutron é
formado por dois quarks down e um up (ddu). Dessa forma, os quarks em maior número, são
também os responsáveis por formar a matéria.
[...] para formar a matéria ordinária que nos rodeia precisamos apenas e tão
somente da primeira família estável – o elétron (com seu neutrino sempre à sua
volta) e os quarks up e down, que são os formadores básicos dos prótons e nêutrons!
(ABDALLA, 2005, p. 44).
As teorias que cercavam a idéia dos quarks não eram “bem vistas” pelos físicos da
época, pois, suas propriedades eram consideradas estranhas. Esta teoria previa a existência de
uma partícula formada por três quarks strange (sss) denominada ômega menos (Ω–), e em
pouco tempo mais tarde esta partícula foi encontrada, que fez com que a teoria dos quarks
ganhasse credibilidade e atraísse o interesse e a atenção dos físicos. No entanto, o modelo de
Gell-Mann apresentava um problema teórico, aparentemente, violava o Princípio de Exclusão
de Pauli, segundo o qual é proibido que duas partículas iguais ocupem o mesmo estado de
energia. Os quarks possuem spin ½ e, assim, devem obedecer ao Princípio de Exclusão: dois
16
A palavra hádron vem do grego que significa “grosso” ou “pesado”. Esta classe das partículas são as que
interagem via força forte residual, são exemplo os prótons, os nêutrons e os píons.
28
ou mais quarks não podem ocupar o mesmo estado se possuírem sabores idênticos, portanto,
a partícula Ω– formada por três quarks s não poderia existir. Então, como solucionar este
problema? No mesmo ano, 1964, os físicos Yoichiro Nambu 17 (1921-) e Moo-Young Han
(1934-) propuseram um novo número quântico, propriedade que foi chamada de cor
(ABDALLA, 2005). Dessa maneira, os quarks viriam em três sabores diferentes e também
em três cores distintas (vermelho, verde e azul). Assim, os quarks não mais estariam no
mesmo estado de energia. A propriedade cor é similar à carga elétrica, porém ocorrem em três
variedades e não em duas como a carga elétrica. De acordo com Ostermann (1999), quarks
carregam cargas coloridas positivas, e os antiquarks carregam as correspondentes cargas
coloridas, no entanto, negativas. O número quântico cor foi proposto para resolver o
problema do Princípio de Exclusão, no entanto, além desta, há outra razão para tal hipótese:
Apesar de o número quântico cor ter sido proposto para resolver o problema do
Princípio de Exclusão de Pauli, a razão mais profunda da necessidade desse número
quântico extra consiste no fato de a força forte que inter-relaciona os quarks ser
mediada pela cor. Em outras palavras, a força entre os quarks tem sua origem na
cor. A cor é uma espécie de carga que origina a força forte, da mesma forma que a
carga elétrica é fonte da interação eletromagnética (ABDALLA, 2005, p. 42).
Na Física de Partículas busca-se freqüentemente a simetria ou, então, respostas para as
assimetrias entre as partículas. Nesse sentido, à medida que léptons iam sendo detectados,
fazia-se a seguinte pergunta: Por que então, não existir outro quark também? E, por questões
de simetria, outros quarks foram propostos e posteriormente detectados. Desta nova leva de
quarks, o primeiro a ser proposto foi o denominado quark charm (c), descoberto em 1974. No
ano de 1977, pesquisadores do Fermilab anunciaram o descobrimento do quark botton (b),
este era um quark maior que qualquer outra partícula já descoberta (ABDALLA, 2005). No
início da década de 1980, questionavam a existência de um sexto quark, denominado de top
(t), o mais massivo de todos que só foi encontrado em 1995 também no Fermilab (por equipe
de pesquisadores que incluam cientistas brasileiros).
A partir das propostas de Gell-Mann e Zweig, se passaram mais de trinta anos até
encontrar o quark top, completando assim uma simetria entre os léptons (elétron, neutrino do
elétron, múon, neutrino do múon, tau e neutrino do tau) e os quarks (up, down, strange,
charme, botton e top), cada um possuindo a sua correspondente antipartícula.
17
Prêmio Nobel de Física 2008, devido à “descoberta do mecanismo de quebra espontânea de simetria na física
subatômica”.
29
As partículas elementares (quarks) são “separadas” por gerações. A primeira geração
consiste nos quarks up e down, que constituem a matéria estável do Universo. A segunda
geração é formada por partículas mais instáveis e por quarks mais pesados: strange e charm.
A terceira e última geração consistem nos quarks botton e top, sendo ainda mais pesados que
os das outras gerações. De acordo com Silva e Natti (2007), não há evidências para que
possam existir outros sabores de quarks.
Os quarks apesar de serem fundamentais nunca foram detectados como partículas
livres, só existem em estados ligados formando outras partículas. Aparentemente, os quarks
estão sempre confinados em partículas chamadas hádrons (MOREIRA, 2004).
Os constituintes da matéria são então formados pelos elétrons e pelos quarks up e
down. A figura 1 abaixo representa a estrutura atômica aceita nos dias de hoje.
Figura 1: Representação de um átomo (de acordo com Ostermann, 1999).
Como apresentado, os quarks são partículas “verdadeiramente” elementares. No
entanto, serão estes os constituintes últimos da matéria?
Quem teria razão: DEMÓCRITO ou ANAXÁGORAS? Serão as partículas
quark/antiquark os “átomos” de Demócrito, isto é, a série de partículas
fundamentais constituintes da matéria seria limitada inferiormente, ou os quarks
serão sementes, no sentido de Anaxágoras e, portanto, existirão outras sementes
dentro dos quarks, que conterão outras sementes, “ad infinitum”? (BASSALO,
1983, p. 37).
Ostermann (1999, p. 417), afirma que, “implícita na hipótese dos quarks está a idéia de
que estes são primordiais, invisíveis, isto é, os átomos de Demócrito”. O que resta, é aguardar
30
que as investidas da Física de Partículas no novo acelerador de partículas (LHC) possa então
contribuir na busca de respostas às questões como esta.
4 – As partículas estão organizadas em grupos semelhantes
É numerosa a quantidade de partículas descobertas até o momento, portanto estas
partículas devem estar organizadas por características que as assemelham, separadas em
classes de partículas.
As partículas podem ser classificadas em bósons e férmions. Os bósons possuem spin
inteiro, portanto, não obedecem ao Princípio de Exclusão de Pauli, já os férmions possuem
spin semi-inteiro, assim obedecem ao Princípio de Exclusão. Na classificação das partículas
constituintes da matéria, quarks e léptons são férmions e as partículas mediadoras são bósons.
A seguir serão apresentadas as classes das partículas e as interações fundamentais
importantes no Modelo Padrão, e diversas figuras que poderão facilitar a compreensão destas
classificações. As descrições das classes de partículas bem como as figuras mostradas, em
grande parte, foram baseadas e extraídas do trabalho de Ostermann e Cavalcanti (1999), em
que elaboram um material didático em forma de pôster para o Ensino Médio, no intuito de
contribuir para a renovação do currículo neste nível de ensino e também o de divulgar a Física
de Partículas.
4.1 – Os quarks e os léptons
As partículas fundamentais são classificadas de acordo com a figura 2 abaixo. Nesta
figura são agrupados os quarks e os léptons (constituintes fundamentais do Universo)
juntamente com algumas de suas propriedades. Os léptons não têm carga cor, possuem carga
elétrica inteira e podem existir como partículas livres, ao contrário dos quarks. Estas
partículas não sofrem ação da força nuclear forte, no entanto, se interagem por meio das
interações: eletromagnética e fraca. Já os neutrinos, por não possuírem carga elétrica,
interagem apenas fracamente. A cada lépton está associado um antilépton (ver tabela 2
acima).
Os quarks são partículas que interagem por meio das interações eletromagnéticas, fraca
e forte, e possuem carga elétrica fracionária. Existem seis tipos ou sabores de quarks: u, d, s,
c, b e t, e podem se apresentar em três cores distintas: vermelho, verde e azul, desta maneira
31
haveria dezoito quarks diferentes, porém a cada quark está associado um antiquark ( u , d , s ,
c , b e t ), aumentando o número total de quarks e antiquarks para trinta e seis. Os quarks
formam os hádrons, que se dividem em bárions (formados por três quarks) e mésons
(formados por um par quark-antiquark). Como possuem spin semi-inteiro, estas partículas são
classificadas como férmions (OSTERMANN e CAVALCANTI, Ibid.).
Figura 2: Tabela de quarks e léptons (OSTERMANN e CAVALCANTI, 1999).
Estas partículas são ainda “classificadas” por gerações. A primeira geração que
constituem a matéria estável do Universo corresponde às duas primeiras linhas da figura 2. A
segunda geração corresponde a terceira e quarta linha desta mesma figura, estas são partículas
mais instáveis e pesadas que as da primeira geração. As últimas duas linhas referem-se à
terceira geração, que são ainda mais pesados que as anteriores.
4.2 – As partículas mediadoras
As forças fundamentais conhecidas na natureza são quatro: força gravitacional, força
eletromagnética, força fraca e força forte. Na tentativa de unir todas as forças fundamentais e
devido aos aspectos semelhantes, a força eletromagnética e fraca foram unidas em um só
fenômeno chamado de força eletrofraca. As interações das forças fundamentais se dão pela
troca de partículas mediadoras.
32
A interação entre o elétron e o núcleo atômico é uma interação eletromagnética. Os
quarks se atraem via força forte. A interação fraca é a responsável por todas as reações que
envolvem neutrinos. A interação gravitacional atua sobre todos os corpos que possuem massa,
porém no domínio das partículas elementares, sua atuação é irrelevante. O fóton é a partícula
mediadora da força eletromagnética, este mediador não possui carga elétrica ou massa. Os
mediadores da força forte são os glúons. O gráviton é a partícula mediadora da interação
gravitacional. Já as partículas W+, W– e Z0 são as mediadoras da interação fraca e
diferentemente dos fótons possuem massa (em torno de 80 GeV/c²), estas partículas atuam
apenas nas dimensões nucleares. As partículas mediadoras são chamadas bósons, dentre elas
apenas o mediador da força gravitacional, o gráviton, ainda não foi encontrado
experimentalmente.
A figura 3 abaixo apresenta as partículas mediadoras das interações fundamentais da
natureza, bem como algumas de suas características.
Figura 3: Tabela das partículas mediadoras (OSTERMANN e CAVALCANTI, 1999).
Na figura 4 é apresentado algumas propriedades das interações fundamentais. Observase nesta figura que a força forte é dividida em duas: a força forte fundamental e a força forte
residual, apesar de citadas neste trabalho elas ainda não foram definidas. A interação forte
fundamental ou força forte fundamental ocorre entre os quarks, atuando sobre a carga cor que
33
interagem pela troca de glúons. Apenas as partículas que possuem esta propriedade (cor) é
que interagem via força forte.
A interação forte residual ou força forte residual ocorre entre os hádrons e a interação se
dá pela troca de mésons (ver figura 7). Esta força atua de forma atrativa entre os núcleons,
para todas as combinações de prótons e nêutrons, ou seja, um núcleon atrai outro núcleon.
Apesar de os prótons e nêutrons serem formados por quarks que possuem a propriedade cor,
tanto os prótons quanto os nêutrons são neutros em carga de cor.
Figura 4: Propriedades das interações fundamentais (OSTERMANN e CAVALCANTI, 1999).
A seguir na figura 5 é apresentado um mapa conceitual que simplifica o que foi
demonstrado até agora.
34
Figura 5: Mapa conceitual das partículas mediadoras e interações fundamentais.
Disponível em: http://www.if.ufrgs.br/mpef/Hipermidia/Mutzenberg/arq/tr00.pdf
4.3 – Os bárions e os mésons
Os bárions e os mésons são partículas classificadas como hádrons. Na figura 6 é
apresentado alguns exemplos de bárions, as partículas e suas correspondentes antipartículas, e
ainda algumas propriedades de cada um. Bárions possuem spin fracionário e obedecem ao
Princípio de Exclusão, já os mésons não obedecem e possuem spin inteiro.
Figura 6: Tabela dos bárions (OSTERMANN e CAVALCANTI, 1999).
35
Cada bárion é formado por três quarks e cada antibárion é formado por três antiquarks.
Os bárions estão unidos pela interação forte, através da troca de glúons. Desta classe os mais
comuns são os nêutrons e os prótons.
Já na figura 7 são apresentados alguns exemplos de mésons e antimésons, que são
formados por um par quark-antiquark. Devido às várias possibilidades de combinações entre
os quarks (combinações de três quarks ou de pares quark-antiquark), o número de hádrons é
grande.
Figura 7: Tabela dos mésons (OSTERMANN e CAVALCANTI, 1999).
4.4 – O Modelo Padrão
Depois de tantas buscas por partículas anteriormente desconhecidas e nos estudos de
suas interações, a partir do final da década de 1980 foi possível criar um modelo que
apresentasse os grupos de partículas, denominado de Modelo Padrão. Este modelo descreve a
matéria através dos férmions (quarks e léptons) e dos bósons, e permite uma descrição mais
clara entre as forças nuclear forte e fraca. Neste trabalho, antecipou-se as descrições sobre o
Modelo Padrão ao descrever os quarks, os léptons, as classes em que estão organizadas as
partículas e as suas diversas propriedades.
As assimetrias que haviam entre os quarks diante dos léptons, foram apresentadas como
inquietantes devido à falta de coerência no modelo, o que levou os físicos a saírem em busca
das “peças faltantes”. Chega-se assim ao Modelo Padrão como ele é conhecido hoje. Existem
36
seis quarks e seis léptons, denominados férmions, e os chamados bósons que são as partículas
mediadoras das interações fundamentais da natureza.
Em seguida, apresenta-se uma tabela esquemática do Modelo Padrão, lembre-se que
cada um dos quarks e léptons da tabela 3 possuem um antiquark e um antilépton associado.
De acordo com Ostermann (1999), os quarks se interagem com as quatro forças fundamentais,
já os léptons não se interagem com a força forte (figura 5).
Tabela 3: Esquema do Modelo Padrão.
Apesar do modelo mostrado na tabela acima ser um excelente referencial teórico, ele
apresenta algumas dificuldades, como o fato de não terem sido descobertos o gráviton e o
bóson de Higgs, ambas previstas pelo modelo. No entanto, ainda resta muito trabalho para os
físicos de partículas, que agora “recebem” ajuda extra com o início do funcionamento do
LHC. Com este novo acelerador será possível testar a verdadeira eficiência do Modelo
Padrão, pois um dos objetos da construção do LHC é encontrar o bóson de Higgs, claro, se ele
realmente existir. Além do bóson de Higgs, há outros problemas a serem enfrentados pelo
Modelo Padrão, tais como:
O Modelo Padrão resiste aos testes experimentais há mais de 30 anos. Mas apesar
de todo o seu sucesso, nem tudo esta explicado. Ele não responde a diversas
perguntas fundamentais: por que as partículas têm massas numa certa hierarquia?
Qual seria o mecanismo que privilegia a matéria suprimindo a antimatéria? Como
incluir a força gravitacional, que é a quarta interação fundamental, de forma a
atribuir o status de partícula ao quantum de interação gravitacional (gráviton)?
(ABDALLA, 2005, p. 44).
37
Capítulo II
O Ensino da Física de Partículas na Educação Básica
1 – O conhecimento acerca da Física de Partículas
É notável nas Escolas de Ensino Médio que seus currículos estão bastante defasados em
relação ao desenvolvimento da Ciência. Particularmente, a Física que é ensinada nas Escolas
tem seus tópicos concentrados em Mecânica,
Termologia,
Ótica Geométrica e
Eletromagnetismo, ou seja, é ensinado apenas a Física desenvolvida aproximadamente entre
1600 e 1850 (TERRAZZAN, 1992). E, dificilmente os professores conseguem cumprir tudo o
que está no currículo. Neste sentido, parece ser contraditório querer atualizar o currículo do
Ensino Médio inserindo tópicos de Física Moderna e Contemporânea (FMC), já que nem
aspectos básicos da Física Clássica são trabalhados neste nível de ensino, devido à extensão
dos conteúdos e ao reduzido número de aulas semanais desta disciplina. No entanto,
Terrazzan (1992, p. 210-211) adverte: “devemos lembrar a impossibilidade de se vivenciar e
participar plenamente do mundo tecnológico atual sem um mínimo de conhecimentos básicos
dos desenvolvimentos mais recentes da Física”. Ele ainda argumenta: “O que não podemos é
esperar a entrada do século XXI para iniciarmos a discussão nas escolas da Física do século
XX [...] é fundamental que ensinamos a Física do século XX antes que ele acabe”. No
entanto, visto que já se iniciou o século XXI, não se nota nenhuma mudança concreta quanto
a inserção de tópicos da FMC no currículo do Ensino Médio no país.
A fim de situar-se nos períodos, de acordo com Sanches (2006), a Física Clássica, vai
dos trabalhos de Galileu até o final do século XIX; a Física Moderna, entre o final do século
XIX até meados da década de vinte do século XX. E a partir desse momento, as etapas que
abrangem os estudos derivados dessa Ciência é a Física Contemporânea.
Discussões acerca da preocupação de uma reformulação do currículo escolar e a
inserção de tópicos de FMC iniciaram-se desde a década de oitenta:
Nos Estados Unidos e, provavelmente em nível internacional, a preocupação com o
ensino de FMC nas escolas e nos cursos universitários introdutórios começou, ou
intensificou-se, com a “Conferência sobre o Ensino de Física Moderna”, realizada
no Fermi National Accelerator Laboratory, Batavia, Illinois, em abril de 1986, na
qual, aproximadamente, 100 professores interagiram com cerca de 15 físicos. O
objetivo específico da conferência era promover a abordagem de tópicos de
pesquisa em Física, em especial Física de Partículas e Cosmologia, no ensino médio
38
e em curso introdutórios de graduação
(AUBRECHT, 1986 apud
OSTERMANN, 2000, p. 24)
São numerosos os trabalhos referentes a estudos em que apontam a necessidade de
atualização do currículo do Ensino Médio, tanto a nível nacional quanto internacional. De
acordo com Ostermann (2000), em alguns países desenvolvidos o currículo secundário já
sofreu mudanças. Segundo ela, a etapa de ‘‘levantamento de justificativas’’ para a inserção da
FMC já foi superada e seus sistemas escolares contemplam nos currículos o tratamento de
tópicos modernos.
No país, existem diversos pesquisadores preocupados com o assunto. Numa revisão de
literatura realizada por Ostermann (2000), sobre a linha de pesquisa “Física Moderna e
Contemporânea no Ensino Médio” em que consulta e analisa as publicações em diversos
meios, tais como: revistas, dissertações, teses, internet, entre outros, a autora verifica que há
uma concentração das publicações na forma de divulgação ou como bibliografia de consulta
para os professores do Ensino Médio a respeito da FMC, no entanto, percebe que existe uma
escassez de trabalhos que apresentam propostas testadas em sala de aula. Entre as publicações
mais recentes de divulgação ou material de consulta pode-se citar18: Ostermann, 1999;
Ostermann e Cavalcanti, 1999; Ostermann e Cavalcanti, 2001; Moreira, 2004; Abdalla, 2005.
Em relação às propostas testadas em sala de aula de aula, Ostermann (2000) encontra apenas
onze trabalhos: nove direcionados à mecânica quântica, um sobre armas nucleares e outro
sobre raios cósmicos. Além disso, é útil citar os trabalhos de: Ostermann e Cavalcanti, 2001;
Borges, 2005; Siqueira, 2006; em que os autores trabalham em sala de aula assuntos como:
supercondutividade e Física de partículas; relatividade restrita; raios-X e Física de partículas,
respectivamente.
Ao separar a FMC por temas, Ostermann (2000) verifica que os temas de divulgação
científica ou bibliografia de consulta que mais aparecem na literatura são: relatividade,
partículas elementares e mecânica quântica. No entanto, é possível observar em seu trabalho
que grande parte das bibliografias de Física de partículas encontram-se em inglês19, o que
pode dificultar o seu acesso.
Buscou-se na presente monografia, separar alguns materiais de divulgação publicados
sobre Física de partículas em determinadas revistas nacionais de ensino de Física. Esses textos
de apoio são direcionados, de certa forma, a professores do nível médio e apresentam o tema
18
Os trabalhos apresentados a seguir dizem respeito apenas às publicações sobre Física de Partículas.
Foram citados anteriormente alguns trabalhos de pesquisadores brasileiros. Portanto, estas referências
encontram-se em português e de fácil acesso.
19
39
usando uma linguagem bastante simples de forma que o texto seja compreensível e,
sobretudo, abrangem bem o tema a qual propõem tratar. Estas publicações certamente vêm
contribuir para com àqueles que, conscientes das necessidades expressas pelo mundo atual,
desejam imprimir mudanças no cenário do ensino no Brasil. Abaixo é descrito brevemente o
conteúdo de tais publicações:
Ostermann (1999) elabora um texto para professores do Ensino Médio sobre partículas
elementares. Nele a autora faz uma abordagem qualitativa bem completa sobre o tema em
questão, indo desde os primórdios, átomos e seus modelos ao longo da história da ciência,
incluindo um histórico dos pensamentos dos primeiros filósofos gregos acerca dos
constituintes da matéria e do Universo; passando pelas partículas descobertas ao longo das
décadas a partir dos raios cósmicos e mais recentemente dos aceleradores de partículas,
citando as leis e conceitos que regem as partículas elementares; chegando então, ao Modelo
Padrão que no final do trabalho possui um resumo na forma de tabela.
Ostermann e Cavalcanti (1999) apresentam um material explicativo de um pôster que
elaboram, e que também é incluso neste trabalho, afim de que seja utilizado como material
didático auxiliando assim, na formação inicial e continuada de professores, a incorporação na
Escola, de tópicos atuais de Física: partículas elementares e interações fundamentais. Nele, os
autores dividem o pôster em setores e tabelas, e a cada nova tabela que “surge” no trabalho,
explicam os conceitos físicos envolvidos. Não trazem no material, conteúdos históricos,
apenas apresentam as partículas, suas diferentes classes e as interações pelas quais se
envolvem.
Moreira (2004) através de seu texto, procura transmitir de forma clara e acessível uma
visão introdutória sobre partículas elementares e interações fundamentais. Assim, inicia seus
argumentos pelas primeiras partículas, aquelas que formam o átomo e a partir delas introduz
as demais como constituintes destas. Afirma que os quarks são, possivelmente, os
constituintes últimos da matéria. Porém, para se ter idéia sobre a constituição da matéria,
também é necessário que se leve em conta as interações entre as partículas e os bósons, o que
trata de forma bem compreensível. Cita aspectos dos sabores dos quarks e léptons, e ainda a
carga cor que os quarks possuem. Ao final, apresenta um mapa conceitual para partículas
elementares e outro para as interações fundamentais.
Abdalla (2005) trata sobre o discreto charme das partículas elementares, com este título
bastante sugestivo e com uma forma divertida através de ilustrações, o texto leva o leitor a
perceber que as partículas não necessariamente são “bolinhas”, mas sim, podem apresentar-se
40
de formas distintas. O contexto histórico é apresentado numa seqüência cronológica,
detalhando os fatos das descobertas. E nesse sentido, vai aos poucos montando o Modelo
Padrão. Traz também, as indagações e propostas teóricas dos físicos ao longo das décadas e o
sucesso (ou não) obtido por cada um ao propor suas teorias e modelos. Ao fim deste artigo,
informa qual é um dos objetivos da construção do LHC no CERN: a busca pelo bóson de
Higgs e a importância para o Modelo Padrão em identificar tal partícula. Logo no início, antes
de aprofundar no texto, a autora faz algumas exigências: que o leitor leia cuidadosamente os
trabalhos de Ostermann (2001) e Moreira (2004), pois alguns termos e conceitos utilizados
em seu texto estão explicados nos trabalhos sugeridos.
Embora os trabalhos aqui citados e os apresentados por Ostermann (2000) levarem ao
preenchimento de uma importante lacuna em relação a materiais disponíveis para serem
utilizados no ensino, há muitas áreas que ainda são pouco exploradas nas publicações,
somando-se ao fato de que não existe consenso sobre quais tópicos de FMC devem ser
abordados no Ensino Médio. Procurando identificar quais seriam os tópicos mais indicados
para serem abordados neste nível de ensino, Ostermann e Moreira (1998) fazem um
levantamento completo através da técnica Delphi20, obtendo o seguinte resultado: efeito
fotoelétrico, átomo de Bohr, leis de conservação, radioatividade, forças fundamentais,
dualidade onda-partícula, fissão e fusão nuclear, origem do Universo, raios-X, metais e
isolantes, semicondutores, laser, supercondutores, partículas elementares, relatividade restrita,
Big Bang, estrutura molecular e fibras ópticas. Nota-se então que Física de Partículas,
segundo este estudo, é um tópico relevante de FMC a ser inserido na elaboração de um novo
currículo para o Ensino Médio.
A partir dos dados obtidos pela técnica Delphi, os autores separaram dois tópicos para
aplicação em sala de aula, supercondutores e partículas elementares. Neste trabalho tratar-se-á
apenas dos resultados apresentados sobre Física de partículas. A aplicação do tópico ocorreu
em uma escola particular e em uma escola da rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul,
atingindo 126 alunos entre 14 e 17 anos das três séries do Ensino Médio, e foi trabalhado em
sala de aula por acadêmicos de licenciatura da disciplina de Prática de Ensino de Física da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ao final do estágio, os professores
20
A técnica Delphi consiste na elaboração de um questionário inicial enviado a um grupo respondente, seguido
de sua reelaboração e reenvio do questionário após o retorno das respostas. Durante o processo é garantido a
cada respondente a oportunidade de reavaliar suas respostas originais tendo como base o exame das respostas do
grupo. Procura-se assim, “permitir que um grupo de indivíduos, como um todo, enfrente um problema
complexo” (OSTERMANN, 1999 apud SANCHES, 2006).
41
(estagiários) afirmaram que tinham intenção de inserir, em suas futuras aulas, tópicos atuais
de Física. Quanto ao aluno do Ensino Médio, os autores ressaltam:
[...] a experiência mostrou que não é só possível motivá-lo e despertar sua
curiosidade científica com tópicos de FMC como também ele pode aprender
conceitos físicos nessa área. No grupo das “partículas”, por exemplo, ao término das
aulas, 39% dos alunos mencionaram os quarks e os léptons como as porções
menores que formam toda a matéria do Universo (contra 0%, ao início das aulas).
Ao final, 57% perceberam que só existem quatro interações fundamentais na
natureza. Esses são apenas exemplos dos resultados obtidos. Com eles pudemos
concluir que houve uma familiarização com o tema [...] (Ostermann e Moreira,
2001, p. 144).
Ostermann e Moreira (2001) apontaram neste trabalho, a viabilidade de ensinar tópicos
atuais da Física para estudantes do Ensino Médio, mostrando que é um engano dizer que os
alunos não possuem capacidade para aprender tais temas, pois não foram encontrados
obstáculos de natureza cognitiva e os de pré-requisitos foram superados. Os autores afirmam
que se houveram dificuldades de aprendizagem por parte dos estudantes do ensino básico, não
foram muito diferentes das usualmente encontradas com conteúdos da Física Clássica. Mas
adverte, se a intenção é implementar estes temas nas Escolas, é fundamental preparar
adequadamente os futuros professores e também bons materiais para serem utilizados como
fontes.
Outro trabalho que relata a aplicação do tema Física de Partículas em sala de aula é o de
Siqueira (2006), executando sua proposta em duas Escolas públicas estaduais de São Paulo.
Este autor descreve uma proposta didática pedagógica iniciada com o tema radiações, assim
escolhido por estar, segundo ele, bem próximo dos alunos e despertar algum tipo de interesse
neles, principalmente ao tratar de raios-X. Após definir os temas a serem abordados, montouse uma seqüência de aulas, que privilegiava as partículas elementares e suas interações. A
partir daí, relacionados ao tema, elaborou-se diversas atividades didáticas para serem
executadas pelos alunos durante a pesquisa. Ao final do curso, analisando os resultados
obtidos com os alunos, o autor assegura:
Podemos constatar que houve uma mudança na maneira deles olharem o trabalho
científico e a própria ciência, mostrando que começaram a compreender que a
ciência é um empreendimento humano e muito dinâmico. Para isso, procuramos
mostrar, no curso, a evolução ocorrida no conceito de átomo e perguntamos se eles
haviam notado e se achavam que essas mudanças iriam parar. As respostas de todos
os alunos foram idênticas, todos acreditavam que não [...] (SIQUEIRA, 2006, p.
149).
42
Siqueira (2006) relata que houve uma mudança no interesse, no comportamento e na
presença dos alunos em sala de aula, tendo em vista que ao final do curso haviam mais alunos
presentes nas aulas do que no início. E chega à mesma conclusão de Ostermann e Moreira
(2001), de que é possível levar a proposta do curso sobre Física de Partículas para estudantes
do Ensino Médio, e que obstáculos sempre existirão, mas, podem ser superados.
A Física de partículas é uma área da Ciência que utiliza uma linguagem Matemática
sofisticada para descrever muitos de seus conceitos. Porém, as propostas de Ostermann e
Moreira (2001) e Siqueira (2006) aqui apresentadas, não utilizaram a Matemática pertinente
para desenvolverem seus trabalhos, os fenômenos que foram abordados tiveram apenas o
caráter qualitativo mostrados. Terrazzan (1992) defende a idéia de que é necessário refletir o
desenvolvimento desses tópicos, porém, com poucas exigências Matemáticas.
Na revisão bibliográfica realizada por Ostermann (2000), a autora comenta a análise
feita em alguns livros-didáticos de Física para o Ensino Médio e constata que em alguns deles
há uma iniciativa de ensinar FMC a alunos do nível médio. Porém, destaca que o livro-texto
possivelmente mais utilizado nas escolas gaúchas (Bonjorno, 1993) não apresenta nenhum
tópico de FMC. Nesta mesma linha, Sanches (2006) analisa doze livros didáticos
freqüentemente mais utilizados na rede pública de ensino e, da mesma forma, evidencia que
alguns autores apresentam uma iniciativa em inserir tópicos de FMC, no entanto, não
contextualizam os temas de forma adequada e geralmente os tópicos abordados estão
inseridos nos livros como seções especiais, o que devido à falta de tempo são os primeiros a
serem excluídos por estarem tachados como “leitura complementar”. E ressalta que
possivelmente o livro mais adotado nas escolas paranaenses (Bonjorno et al, 2001), além de
algumas fotos e uma frase de Einstein, não apresenta nenhum tópico de FMC.
Nos dois trabalhos citados acima, são apresentados diversos livros com diferentes
tópicos de FMC, e alguns deles são muito bem avaliados pelas autoras, entretanto, é possível
observar que o tema Física de Partículas é pouco abordado nos livros analisados, e quando é
feito é de forma compartimentada, por exemplo, Paraná (2002)21 trata apenas dos quarks,
assim nem é possível que o leitor entenda que os constituintes “últimos” da matéria são os
quarks, e também os léptons.
Dessa forma pode-se verificar que há muito que fazer, tentativas existem, mas a
abordagem ainda é inadequada. Os professores não se encontram preparados para aplicarem
temas atuais da Física em sala de aula e listam uma série de dificuldades para uma mudança
21
Este autor faz parte dos doze livros analisados por Sanches (2006).
43
curricular, mas, concordam que o currículo de Física precisa passar por uma revisão inserindo
nele tópicos de FMC (SANCHES, 2006).
2 – A legislação e o currículo escolar
Há aproximadamente duas décadas, vem sendo discutido entre professores e educadores
a necessidade de ocorrer uma mudança no currículo do Ensino Médio no país, inserindo nele
tópicos de FMC. Ao longo deste período novas propostas educacionais têm surgido, a fim de
estabelecer um “novo Ensino Médio”. Durante muitos anos esse nível de ensino vinha sendo
considerado uma preparação para a Universidade, tendo como objetivo a aprovação no
vestibular (KAWAMURA e HOSOUME, 2003). Porém, a escola média deve formar
cidadãos, independente da escolha que façam, ou seja, se optam por carreira universitária ou
não. As idéias educacionais que vinham sendo debatidas foram transcritas num documento
legal: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)22. Segundo consta na LDB, o
currículo do Ensino Médio “destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do
significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da
sociedade e da cultura [...]” (Art. 36, inciso I). E que ao concluir este nível de ensino, o
educando deve estar apto a demonstrar o “domínio dos princípios científicos e tecnológicos
que presidem a produção moderna” (Art. 36, § 1º, inciso I).
Este nível de ensino deve então proporcionar uma formação que permita ao educando a
aquisição de conhecimentos básicos e preparação científica, propõe-se assim, uma formação
geral no intuito de “assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da
cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores” (LDB,
Art. 22).
No que se refere ao ensino de Física, a LDB apresenta uma necessidade de
reformulação e atualização do currículo no Ensino Médio, assunto tão debatido por
pesquisadores na área de ensino de Física no Brasil. Como apresentado anteriormente,
aparecem nos livros didáticos de Física uma iniciativa de atualização, embora não tão
adequada. Com isso, os livros-textos ainda apresentam ausência de muitos conhecimentos
necessários para a compreensão do mundo contemporâneo (KAWAMURA e HOSOUME,
2003). Segundo estes autores, para que os jovens saiam preparados para exercerem a
cidadania, os temas atuais do mundo contemporâneo deverão necessariamente passar a
22
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
44
estarem presentes na escola média, ou seja, tópicos atuais de Física devem fazer parte do
currículo. De acordo com Menezes (2000), as mudanças devem ocorrer, mas, gradualmente.
É claro que precisa ser cautelosa a sinalização para a inclusão desses novos
conteúdos, seja pelos desafios didáticos que implica, encontrando professores
despreparados e textos escolares desguarnecidos, seja porque as próprias
universidades, ainda por algum tempo, continuarão a solicitar os velhos conteúdos
em seus vestibulares. Será preciso algum tempo para que a mensagem seja primeiro
compreendida e, mais tarde, aceita (MENEZES, 2000, p. 8).
Outros fatores que contribuem para uma reformulação do ensino adotado no Brasil, é
que os currículos das escolas brasileiras são pobres e excluem a Física desenvolvida a partir
do século XX (OSTERMANN e RICCI, 2002 apud BORGES, 2005). Dessa forma, o PCN+
orienta que:
“a Física deve vir a ser reconhecida como um processo cuja construção ocorreu ao
longo da história da humanidade, impregnado de contribuições culturais,
econômicas e sociais, que vem resultando no desenvolvimento de diferentes
tecnologias e, por sua vez, por elas sendo impulsionado” (BRASIL, 2002).
E ainda observa que aspectos da Física atual são indispensáveis aos jovens por permitir a eles
uma compreensão mais abrangente sobre como se constitui a matéria tão presente nos
utensílios tecnológicos, devendo essa compreensão passar pelas interações no núcleo dos
átomos e os modelos propostos pela ciência para um mundo povoado de partículas. Além
disso, ao propor o que chama de Temas Estruturantes, associa matéria e radiação indicando
assim, ser esse tema capaz de propiciar a compreensão do mundo material microscópico.
“Defendendo” a idéia da inserção de temas da FMC no Ensino Médio e visando a
alfabetização científica da sociedade em geral, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)
sugerem uma possibilidade metodológica dentro do enfoque Ciência, Tecnologia e Sociedade
(CTS), que é a Aprendizagem Centrada em Eventos (ACE) no qual utiliza os fatos de
divulgação na mídia para promover a exploração dos pilares Ciência e Tecnologia. E na
Física, os temas transmitidos pela mídia geralmente estão atrelados à FMC, por exemplo,
recentemente a mídia deu bastante ênfase à inauguração do LHC no CERN, citando dessa
forma os aceleradores de partículas e os objetivos que tinham tal empreendimento humano.
Tópicos contemporâneos como este da Física, segundo os PCNs, devem ser tratados em sala
de aula.
Em suas propostas, os PCNs não apresentam metodologias específicas para a Física,
mas sim, recomendações gerais para o ensino de Ciências, incentivando mudanças pela qual
deve propor os professores a partir da compreensão desses Parâmetros e desenvolvam
45
caminhos a serem trilhados com a escola da qual fazem parte, estando de acordo com cada
realidade. E ressalta a importância de ensinar as mudanças ocorridas nas últimas décadas e
seu significado no desenvolvimento das sociedades (MENEZES, 2000). Para compensar a
inexistência de metodologias a serem seguidas na inserção da FMC no Ensino Médio é que
diversos pesquisadores tem trabalhado em propor maneiras didáticas e elaborado materiais
adequados à proposta deste novo ensino.
3 – A Física de Partículas no livro didático: exemplificação
No trabalho realizado por Sanches (2006), a autora analisa 12 livros didáticos
freqüentemente mais usados no ensino de Física nas escolas. Para esta análise, ela leva em
consideração o quanto o autor aborda e também, a forma que os temas da FMC são tratados
nestes livros. Tendo em vista o fato de que os livros textos são geralmente uma das únicas
fontes de consulta pelo professor na preparação das aulas para o Ensino Médio e os resultados
levantados por Sanches (2006), resolveu-se escolher um dos autores estudados por Sanches,
para que fosse feita um “checape” em relação aos exercícios abordados pelo autor do livro
didático. Escolheu-se, ao acaso, o livro: Física Ciência e Tecnologia23. Este livro é composto
por cinco unidades, onde os conteúdos são separados por capítulos, num total de dezenove, a
última destas unidades é denominada Física Moderna que contém três capítulos (17 Relatividade Especial; 18 - Física Quântica; 19 - Física Nuclear). Nos capítulos 18 e 19, os
autores tratam de tópicos como: o modelo atômico de Bohr, o átomo de hidrogênio, o núcleo
atômico, as forças fundamentais da Natureza e partículas fundamentais da matériaantimatéria. A obra é composta por 665 páginas, destas, apenas 67 são dedicadas aos
conceitos da FMC, ou seja, 10,0% do total, e, se levar em conta apenas o tópico Física de
Partículas e suas interações fundamentais, este número cai para 5 páginas incompletas
(aproximadamente 0,7% da obra).
Os livros didáticos utilizados no Ensino Médio são geralmente “recheados” de
exercícios para serem resolvidos, sendo estes elaborados, em sua grande maioria, mediante a
apresentação de fórmulas e aspirando para que o aprendizado ocorra pela memorização dos
conceitos por parte do estudante (Ibid.). A grande quantidade de exercícios propostos nos
livros textos tem um objetivo específico: “preparar” o aluno para enfrentar o vestibular.
Muitos são os autores que criticam o excesso de exercícios e a forma de abordagem nos livros
23
Autores: Nicolau Gilberto Ferraro, Paulo César Martins Penteado, Paulo Antonio de Toledo Soares e Carlos
Magno Azinaro Torres. Editora Moderna. São Paulo, 2001.
46
do nível médio de ensino, no entanto, cabe lembrar que a utilização de exercícios em sala de
aula é de extrema importância, pois, é através deles que o estudante desenvolve e consolida
habilidades (PEDUZZI, 1997), além disso, o estudante também pode aprender a teoria
resolvendo problemas (KUHN, 1987 apud PEDUZZI, 1997). Na resolução de exercícios é
necessário que o indivíduo tenha um conhecimento sobre o conteúdo específico, porém, não é
correto afirmar que o aluno só deve começar a resolver os problemas24 depois de dominar a
teoria (PEDUZZI, 1997). Neste contexto, segundo Costa e Moreira (1997), é necessário que a
prática de resolução de problemas seja repensada pelos envolvidos no processo ensinoaprendizagem, já que este é um recurso indispensável no ensino da Ciência e, em particular,
da Física.
Ao tratar do livro que se escolheu para ser analisado neste trabalho, Sanches (2006) faz
uma crítica aos exercícios apresentados, pois os considera apenas como aplicação de algumas
equações, tornando-os assim muito matemáticos. No conteúdo de interesse: Partículas e forças
fundamentais, os exercícios abordados no livro em questão possuem caráter conceitual.
Abaixo são mostrados três e únicos exercícios sobre o tópico, abordado no livro:
Exercício 18, p. 651: Assinale verdadeiro (V) ou falso (F) para as afirmativas seguintes:
a) Todos os bárions são hádrons.
b) Existem hádrons que não são bárions.
c) Os mésons são partículas elementares.
d) Os mésons são partículas de spin ½.
e) Os quarks e antiquarks têm spin ½.
f) Os quarks e antiquarks têm cargas elétricas ±
e
2.e
e±
.
3
3
g) A antipartícula do próton é o pósitron.
h) Elétrons, fótons e neutrinos são léptons.
i) Os léptons são formados por 3 quarks.
j) Quarks e léptons são partículas elementares.
Exercício 19, p. 651: Um processo de aniquilação de matéria, ou, equivalentemente, de
conversão de massa de repouso em energia, ocorre na interação entre um elétron (de massa m
24
Pode-se dizer, que um problema é caracterizado quando o indivíduo ao tentar resolvê-lo, não é levado à
solução de uma forma imediata ou automática, geralmente o processo requer reflexão e tomada de decisões sobre
uma determinada seqüência de etapas a seguir. Em um exercício, por outro lado, o que se observa é o uso de
rotinas automatizadas, ou seja, para sua resolução não são exigidos conhecimentos ou habilidades novas, por já
serem pelo indivíduo conhecidas.
47
e carga − e ) e um pósitron (de mesma massa m e carga + e ). Como conseqüência desse
processo, o elétron e o pósitron são aniquilados, e, em seu lugar, são criados dois fótons gama
(γ), que se deslocam em sentidos opostos. O processo de aniquilação descrito pode ser
representado por
e− + e+ → γ + γ
Pode-se dizer que as grandezas físicas que se conservam nesse processo são
a) A massa de repouso, a carga elétrica e a energia.
b) A massa de repouso, a energia e o momento linear.
c) A carga elétrica, o momento linear e a energia.
d) A carga elétrica, a massa de repouso e o momento linear.
Exercício 20, p. 651: As combinações quark/antiquark das partículas A e B são: A
( sd ) e B ( uds ).
a) Qual a carga de cada partícula?
b) Qual a categoria das partículas A e B (méson ou bárion)?
Percebe-se nos exercícios aqui apresentados que, apesar de serem poucos, visam uma
abordagem apenas conceitual. É notável que, assim como os demais livros do nível médio de
ensino, este também apresenta inúmeros exercícios, talvez com o intuito de “treinar” o aluno
para o vestibular, no entanto, observa-se poucos que referem-se à FMC. Concluiu-se isto
devido ao fato de que a grande quantidade de exercícios e problemas propostos estão
relacionados aos tópicos que são cobrados nos vestibulares de todo o país e, como a FMC
apenas recentemente passou a integrar o rol de conteúdos para as provas de seleção das
Universidades, os exercícios nesta área, como era de se esperar, ainda são em número
insuficiente.
4 – Justificações da escolha do tema “Partículas Elementares”
Apesar de, no decorrer deste capítulo, já ter sido apresentado argumentos relevantes
sobre a importância da inserção da FMC no Ensino Médio, nesta parte do trabalho dar-se-á
ênfase em um tópico específico: Física de partículas, mostrando dessa maneira, o seu valor
para a formação dos jovens neste nível de ensino.
48
Em um documento da UNESCO (2005) intitulado “Ensino de Ciências: o futuro em
risco” é citado que o desenvolvimento científico e tecnológico de um país está diretamente
relacionado com o conhecimento produzido. Relatando ainda que as diferenças entre avanço e
atraso reside, em grande parte, na Escola capaz de preparar a população para tempos mais
exigentes, e que uma formação escolar que contemple conhecimentos científicos e
tecnológicos refletem numa melhora na vida das pessoas. Segundo a UNESCO, da mesma
forma como diz a LDB, esta educação é importante na formação da cidadania, pois permite às
pessoas terem oportunidade de discutir, questionar, resolver problemas e criar soluções, bem
como compreender o mundo que as cercam. De acordo com o que consta, uma educação
voltada para a ciência e tecnologia é ainda fundamental não apenas por proporcionar à
população a capacidade de desfrutar dos conhecimentos científicos e tecnológicos, mas para
despertar vocações, a fim de criar estes conhecimentos.
Há de fato interesse em atrair jovens para a carreira científica, pois serão eles os futuros
pesquisadores e professores de Física (OSTERMANN, 2000). No entanto, deve-se levar em
consideração o fato de que, dos estudantes que concluem o Ensino Médio, uma minoria
seguem cursos universitários, e destes, poucos partem para a área de ciências e uma parte
muito menor terá o curso de Física como meta. Portanto, de acordo com Terrazzan (1992),
para um grande contingente destes alunos a Física ensinada na Escola será seu único e último
contato formal com esta Ciência. Esta disciplina destina-se então, segundo o PCN, “àqueles
que não serão físicos e terão na escola uma das poucas oportunidades de acesso formal a este
conhecimento”.
Em virtude do mundo globalizado e contemporâneo no qual fazemos parte, é
fundamental que haja uma reformulação, e não exclusão, no conteúdo da Física ensinada na
Escola, ou seja, é urgente a inserção de temas atuais da Física. Mas, por que o tópico Física de
partículas? A escolha baseia-se na atualidade do assunto. Devido aos meios de comunicação,
mais do que nunca, o tema faz parte da realidade dos alunos e além do mais, seus conceitos e
descobertas são aplicados em diversos aparatos tecnológicos presentes no dia-a-dia dos
alunos, tais como: a geração de energia nuclear, radiografia, ressonância magnética, e outros
equipamentos modernos. Neste sentido, o cotidiano dos alunos é uma boa justificativa para a
escolha do tópico.
[...] O cotidiano vivido pelos estudantes assume papel fundamental na definição da
forma de abordagem dos conteúdos previamente definidos como relevantes. O
cotidiano a que nos referimos inclui não só aspectos derivados do sistema produtivo
e da realidade geral em que vivemos, mas também a satisfação e curiosidade natural
49
inerente ao ser humano, que o impulsiona na busca do conhecimento, e a satisfação
das solicitações incentivadas pelos meios de comunicação (TERRAZZAN,
1992, p. 213).
Nesse sentido, a abordagem de temas como este, permite “despertar a curiosidade dos
estudantes e ajudá-los a reconhecer a Física como um empreendimento humano e, portanto,
mais próxima a eles” (OSTERMANN, 2000, p. 24). E também por entusiasmar o aluno, já
que ele pode estar aprendendo na Escola o que viu na TV, leu em revistas, jornais ou na
internet, e encorajá-lo a querer saber os atuais e futuros desafios enfrentados pela Física
(OSTERMANN e CAVALCANTI, 2001). Dessa maneira é possível criar no aluno, uma
visão de mundo atual e que o leve a questionar e querer conhecer mais, isso mediante um
ensino contextualizado e vinculado com a realidade do estudante.
Em um levantamento feito com estudantes universitários para saber o que os levou a
escolher Física como carreira, Stannard (1990) revela que a causa de tal escolha é temas
modernos como: partículas elementares, relatividade restrita, teoria quântica e astrofísica.
Como a esta área da Física se enquadra o estudo dos constituintes da matéria, o
conhecimento acerca da Física de Partículas pode direcionar o estudante a questionamentos
filosóficos, a respeito da origem do Universo, formação e os meios seguidos para existir o
Universo hoje e tantas outras indagações que cercaram e ainda rondam o pensamento
humano. Assim, de acordo com Siqueira (2006), encontra-se na literatura autores que
defendem que a Física de Partículas deveria ser abordagem prioritária no nível médio,
apontando um deles e os motivos que considera para que esta área da Física esteja presente no
Ensino Médio:
Os conhecimentos dessa área, possibilitam ao estudante um certo aprofundamento
dos estudos de Cosmologia, levando-o a uma visão mais racional do mundo em que
vivemos, a discussões mais equilibradas sobre a origem e o fim do Universo,
colaborando para afastamento das crendices e superstições, muito comuns entre os
jovens.
O assunto pode ser tratado historicamente, com apresentação das diversas teorias
que se sucederam, levando os alunos a perceberem que os conhecimentos científicos
não são verdades absolutas (aspecto importante da visão atualizada das ciências).
O sucesso das pesquisas nesta área, altamente dependentes das tecnologias
avançadas, que possibilitaram várias descobertas, evidenciaram a interdependência
entre o desenvolvimento dos conhecimentos científicos e tecnológicos, sem
priorização de um deles.
São tópicos fundamentais e sua aprendizagem facilita a compreensão, com maior
profundidade, de muitos outros assuntos, tanto no campo da Física, quanto no de
outras ciências (química, biologia, geologia, etc.) (ALVARENGA, 2000 apud
SIQUEIRA, 2006, p. 13-14).
50
Ao estudar as partículas elementares, o estudante percebe que a Física pode ir muito
além do que imagina, e que pode estar tão próxima quanto jamais pensou, através da matéria
que é formada todas as coisas. A Física de partículas permite ao aluno perceber que este
conhecimento é dinâmico e que desde suas primeiras investigações, as buscas por partículas
verdadeiramente elementares jamais parou no tempo, pois permanecem vivas, rompendo
assim, com a idéia de que a Física por ser uma Ciência Exata está terminada, de que ela é
aquilo que aprendem em sala de aula, ou seja, a Física até 1850. Nesse sentido, a Física de
partículas mostra como surgem os modelos, as teorias, os conceitos e a importância destes
para descrever e entender o mundo físico que nos cercam. No entanto, apesar de serem
fundamentais nas teorias científicas, os modelos não são discutidos em sala de aula e nem
abordados nos livros didáticos, e isso torna a Física de partículas um conteúdo adequado para
mostrar o processo científico de validação de teorias (SIQUEIRA, 2006).
Como visto, motivos não faltam para a defesa de que tópicos como este sejam inseridos
no currículo no Ensino Médio. Há muito ainda o que argumentar e fazer para que mudanças
venham a ocorrer e que se concretize o que almejam tantos pesquisadores de Ensino de Física
no país. E na tentativa de mostrar a beleza e a importância da Física de Partículas ao longo da
História da Ciência é que se propôs este trabalho.
51
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta monografia, assim como foi apontado na introdução, é possível perceber a Física
de Partículas como um empreendimento humano, fruto do trabalho e empenho de diversos
colaboradores ao longo da história da humanidade, que, indagados sobre a constituição do
Universo, foram além e encontraram muitas respostas para algumas questões, que por sinal,
ainda cercam o pensamento do homem.
A partir do levantamento bibliográfico realizado neste trabalho, não há dúvidas sobre a
importância e a possibilidade da inserção de tópicos de Física Moderna e Contemporânea no
currículo do Ensino Médio. É notável a preocupação de pesquisadores e educadores de Física
do país e do mundo em trabalharem para que, a Física ensinada na Escola, assim como a
ciência, a tecnologia e a própria humanidade, possa também evoluir. Ao longo deste trabalho,
foram apontados inúmeros pesquisadores que têm se dedicado na elaboração de materiais
sobre Física de Partículas, os quais podem servir de apoio aos professores de Física do nível
básico. Foi mostrado ainda que, apesar de poucas, existem pesquisas que apresentam
resultados satisfatórios de aplicação e metodologias para o ensino de Física de Partículas no
Ensino Médio, concluindo a viabilidade da abordagem do tópico em sala de aula, superando
as idéias iniciais de que os alunos necessitam de pré-requisitos para compreenderem tais
temas e que teriam dificuldades na compreensão, sendo apresentado que as dificuldades
encontradas por eles, não foram diferentes das demonstradas com assuntos relacionados à
Física Clássica.
As pesquisas feitas na literatura, possibilitou verificar que nas últimas décadas,
evidencia-se que há uma tentativa, por parte de diversos autores de livros didáticos, na
inserção de temas da FMC no nível médio. Os autores de livros textos têm percebido a
urgência necessidade em ensinar temas atuais da Física na Escola, no entanto, a abordagem
feita nestes livros, conforme levantamento, é realizada de forma inadequada e insuficiente,
pois geralmente os tópicos modernos e contemporâneos da Física são apresentados apenas
como leitura complementar, ficando a mercê do tempo para serem tratados em sala de aula.
Ao analisar o livro didático do ponto de vista da abordagem do tema FMC com os
respectivos exercícios propostos pelos autores, nota-se que, comparativamente aos exercícios
dos temas da Física Clássica, que por sinal, é praticamente a única cobrada nos vestibulares,
são em número bastante reduzidos.
52
Nos estudos para a elaboração deste trabalho, verificou-se ainda que a dificuldade para
a implementação de temas da FMC nas aulas de Física do nível médio de ensino, passa pela
formação dos professores, muitos não se encontram preparados para aplicarem tópicos atuais
em suas aulas. Portanto, para que seja possível verificar uma nova realidade no currículo da
Física ensinada nas Escolas, além da elaboração de materiais de apoio para uso dos
professores, é necessário fornecer a estes, professores atuantes, uma formação continuada
adequada e àqueles que ainda cursam licenciatura em Física, é necessário fornecer uma
formação inicial que o prepare para que sinta-se capacitado a aplicar temas da FMC em suas
futuras aulas. Só assim será possível que uma real atualização ocorra no currículo do Ensino
Médio e que esta seja de qualidade.
Nós, professores, não devemos esperar que este século termine para que temas da FMC
sejam abordados nas aulas do nível médio de ensino, é necessário agirmos para que mudanças
realmente aconteçam na vida daqueles que somos responsáveis em educar. Vivemos num
mundo tecnológico, onde, dia-a-dia, ciência e tecnologia dão saltos em evolução melhorando
a vida das pessoas. Neste sentido, é urgente apresentar aos alunos que o ensino escolar é útil
e, particularmente a Física, é extremamente importante para compreender os fenômenos que
ocorrem no mundo que os cercam. Para o aluno, não há nada mais fascinante do que perceber
e compreender que os mecanismos tecnológicos são frutos da ciência e que por ela podem ser
explicados.
A Física de Partículas pode parecer um pouco complicada e muito conceitual, porém,
como observado, é possível aplicá-la e obter bons resultados quando abordada em sala de
aula, desde que entendida sem o formalismo matemático empregado nesta área da Física.
Aqui, não propomos nenhuma nova metodologia ou, uma forma diferenciada de aplicação, a
análise realizada serviu para chamar a atenção, como afirma Terrazzan (1992), para a pobreza
do currículo do Ensino Médio executado em nosso país.
A revisão bibliográfica que foi realizada permitiu elaborar um texto bastante completo
do ponto de vista conceitual sobre a Física de Partículas, isto foi necessário para que fosse
possível compreender o mundo das partículas e então discorrer sobre a viabilidade e as
vantagens de se inserir este tópico na Escola básica. Tendo em vista esta revisão, faz com que
este trabalho possa ser utilizado como um material de apoio, onde seja possível conhecer um
pouco mais sobre o desenvolvimento e os desafios da Física de Partículas.
Foi muito valoroso para mim, estudar e compreender um pouco mais do mundo da
Física de Partículas, pois, apesar dos pesquisadores de ensino de Física no país, apontarem
53
para uma necessária reformulação do currículo do nível médio, nas próprias Universidades,
aquelas que têm por função a formação dos profissionais que exercerão atividades no
magistério, muitos temas da FMC não são abordados em cursos de Licenciatura em Física,
principalmente tópicos como Física de Partículas. Portanto, as Universidades devem também,
proporcionar uma formação adequada para que os futuros professores sejam instigados a
(re)pensarem o currículo que serão por eles aplicados em sala de aula do nível básico. Por
último, vale lembrar que o estudo feito para a elaboração desta monografia, serviu como
alicerce na construção dos degraus posteriores a este, pois, a Física está em constante
progresso e este trabalho, apenas começando...
54
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