Canal de Interatividade em TV Digital

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Canal de Interatividade em TV Digital
Canal de Interatividade em TV Digital
Marcus Aurélio Ribeiro Manhães, Pei Jen Shieh, Amilton da Costa Lamas*
e Pedro Eduardo de Oliveira Macedo
Este trabalho conceitua o Canal de Interatividade e apresenta uma arquitetura para este no âmbito do Sistema
Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD), bem como apresenta um estudo de caso para o uso da tecnologia
802.11 no Canal de Retorno. Destacando os objetivos de inclusões digital e social, preconizados no Decreto
Presidencial 4.901, de 26 de novembro de 2003, que instituiu o Projeto SBTVD, considera a importância da
interatividade entre usuários e emissoras/programadoras, possibilitando o desenvolvimento de novos serviços
de interesse público e privado.
Palavras-chave: Televisão digital terrestre. Canal de interatividade. Rede ad hoc.
1.
Introdução
O Decreto Presidencial 4.901 de 26 de
novembro de 2003 instituiu o Projeto do Sistema
Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD), com o
objetivo principal de implantar uma plataforma
tecnológica digital baseada em televisão que
promova a inclusão social por meio do acesso à
informação, isto é, que promova a valorização
humana pelo exercício da cidadania [1]. A escolha
dessa estratégia derivou do fato de 90% das
residências brasileiras possuírem um aparelho de
televisão. Trata-se da tecnologia mais difundida
no país, após o rádio. Nesse sentido, o SBTVD
será a porta de entrada para o mundo da
informação para uma parte significativa da
população brasileira, ainda sem acesso aos
serviços digitais. Considerando uma arquitetura
tradicional para o sistema de TV Digital onde, de
um lado encontra-se o radiodifusor que distribui a
informação e de outro temos os usuários que
consomem essa informação, observa-se que a
interatividade será estabelecida somente se
tivermos um meio de comunicação ligando
fazendo o caminho inverso. Logo, para que se
cumpra a meta acima citada, é fundamental que a
plataforma tecnológica permita a interatividade,
ofertando ferramentas que construam o meio de
comunicação entre os usuários e um sistema de
provimento de serviços e aplicações. Dito de outro
modo, a TV Digital deve possuir um Canal de
Interatividade.
*
2.
Canal de Interatividade
Canal de Interatividade é um sistema que
possibilita a cada usuário, individualmente,
interagir com o SBTVD, encaminhando ou
recebendo informações e solicitações para os
provedores de serviço e aplicações disponibilizadas pela plataforma. Segundo a recomendação
J110 do ITU-T [2], o Canal de Interatividade é
composto por um Canal de Retorno ou caminho
interativo de retorno que serve de meio de
comunicação no sentido do usuário para o
provedor de serviço e por um caminho interativo
direto que consiste num canal individual no sentido
do provedor de serviço para o usuário. É nesse
Canal de Interatividade que toda e qualquer
funcionalidade necessária ao estabelecimento da
comunicação e transporte de informação relativa
à interatividade ocorre. No caso do SBTVD, o
papel de provedor de serviço será desempenhado
pelas emissoras/programadoras. Portanto, o Canal
de Interatividade deverá ser constituído pela
interconexão das redes de televisão com as redes
de telecomunicações, resultando nos dois
caminhos de comunicação: o caminho interativo
direto ou Canal de Descida e o caminho interativo
de retorno ou Canal de Retorno.
O Canal de Descida é constituído pelos canais
de radiodifusão, podendo a comunicação ser na
forma Broadcast (ponto-multiponto) – aberta e
disponível a todos os usuários – ou Unicast (pontoa-ponto) – individualizada.
Autor a quem a correspondência deve ser dirigida: [email protected].
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Figura 1 Diagrama simplificado do Canal Interatividade
O Canal de Retorno é composto por qualquer
combinação de tecnologias de redes de acesso
de telecomunicações, desde que estabeleça a
comunicação no sentido dos usuários para o
provedor de serviço ou aplicação.
Com a implementação do Canal de
Interatividade, a comunicação poderá ocorrer no
sentido emissoras/programadoras para usuário(i) e
usuário para emissoras/programadoras, por meio
da integração das redes de televisão com as redes
de telecomunicações, como ilustra a Figura 1.
3.
Requisitos do SBTVD
Para realizar o seu papel na inclusão digital
e social, o SBTVD deverá prover serviços e
aplicações que façam uso da interatividade,
podendo assim contribuir para a otimização e
modernização dos programas de governo e de
prestação de serviços públicos. Uma análise do
Decreto Presidencial mostra que baixo custo,
acesso à Internet e uma rede de educação a
distância são atributos requeridos. A constituição
do Canal de Interatividade é determinante para que
o SBTVD alcance esses objetivos com sucesso.
Entretanto, as reais possibilidades de atendimento
a tais expectativas estão sujeitas a fatores limitantes,
como a limitação gráfica dos monitores
empregados nos televisores, que impediriam a
visualização adequada de grande parte dos
conteúdos atualmente disponíveis na Internet,
necessitando adaptação.
A grande questão a ser respondida para o
Canal de Interatividade, no contexto do SBTVD,
não é tecnológica, mas de custo e abrangência
da solução das redes de telecomunicações que
sustentarão o Canal de Retorno. Muitas das
tecnologias existentes atenderiam perfeitamente às
demandas técnicas. No entanto, para a efetivação
das inclusões digital e social no País, é necessário
que o Canal de Retorno esteja disponível a baixo
custo para a maior parte da população, inclusive
em regiões onde não existem, atualmente, nem os
meios de comunicação mais básicos, como a
telefonia fixa. A solução de Canal de Retorno
deverá ser adequada para cada contexto em
particular,
considerando-se
aspectos
populacionais, geofísicos, morfológicos, técnicos
e socioeconômicos. Além disso, considera-se
importante desenvolver múltiplas soluções, para
estimular a competitividade entre fornecedores de
serviço de Canal de Retorno.
Essas mesmas exigências devem ser
colocadas aos serviços e aplicações para atender
às necessidades essenciais da sociedade brasileira
em suas características genéricas e específicas.
Para atender tal diversidade de cenários, de
aplicações e de serviços, o sistema deverá ser
concebido de forma flexível. Desse modo, será
necessária a coexistência de diferentes redes e
provedores de serviços e/ou conteúdo para o Canal
de Interatividade. A concepção do sistema deverá
partir do atendimento à população de baixa renda,
em condições mínimas satisfatórias de
desempenho, até atingir níveis muito mais
elaborados para usuários diferenciados,
considerando não somente as características
técnicas (taxas de transmissão, QoS, etc.), mas
principalmente a função social do Canal de
Interatividade.
(i) No modelo convencional de televisão, a denominação aplicável seria ‘telespectador’. Nesta nova concepção de televisão, o
telespectador passa a ser um sujeito ativo que utiliza serviços com os quais interage, por isso utilizamos o termo ‘usuário’.
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De modo geral, os requisitos – técnicos e
não técnicos – demandam identificar as diferentes
tecnologias possíveis de serem empregadas, tanto
as já consagradas como as que necessitariam de
desenvolvimento. A diversidade e a convergência
de redes e tecnologias irão requerer soluções de
interconexão e de gerenciamento, além de
soluções para problemas de interferências, internos
a cada sistema e aqueles entre sistemas distintos.
Surgirão, ainda, outras questões sérias, tais como
alocação de espectro, protocolos de acesso,
segurança da informação, controle de tráfego e
dimensionamento de rede. Todas essas questões
deverão ser analisadas e respondidas para a
especificação e implantação do SBTVD.
broadcast e para reduzir o tempo de conexão do
Canal de Retorno, que tem capacidade
dependente da solução tecnológica adotada e do
tráfego local. Esse raciocínio deverá ser aplicado
diretamente àqueles serviços e aplicações que
exigem sua efetivação em tempo real (síncronos).
Naqueles serviços e aplicações que possibilitarem
transmissão/recepção de informações em outros
momentos (assíncronos), os desenvolvedores
deverão considerar o armazenamento de
informações para serem carreadas em momentos
mais propícios, por exemplo, em horários de menor
tráfego ou menor tarifa associada ao Canal de
Retorno.
6.
4.
O SBTVD deverá possibilitar ao usuário a
escolha e a utilização do meio de telecomunicação
que lhe for mais conveniente para o Canal de
Retorno, assim como deverá prover meios
alternativos nas localidades não servidas
atualmente por nenhum meio de telecomunicação.
Essa condição determina que a URD(ii) seja flexível
e modular, de forma que qualquer meio de
comunicação possa ser aplicável. Além disso, a
URD deverá disponibilizar uma interface universal,
criteriosamente definida para admitir todas as
soluções de rede aplicáveis como solução de Canal
de Retorno.
As funcionalidades da URD deverão ser
desenvolvidas de modo a simplificar as operações
relativas aos comandos da TV e dos dispositivos
de interatividade, facilitando também a inserção
de dispositivos externos à URD para a Interface
Humano-Computador (IHC) e a conexão com
diferentes redes de telecomunicações.
5.
Modelo de Referência
Unidade Receptora-Decodificadora (URD)
Serviços e Aplicações
No desenvolvimento de aplicações e
serviços, é necessário considerar o custo de
utilização do Canal de Retorno. O sucesso dos
serviços interativos estará comprometido se a sua
utilização implicar um custo muito elevado para
as condições socioeconômicas da maior parte da
população brasileira. Os desenvolvedores de
Serviços, Aplicações e Conteúdo (SAC) deverão,
sempre que possível, otimizar a utilização dos
recursos de transmissão de informações, para
reduzir a ocupação de dados no canal de
Nos países em que atualmente existem
sistemas de TV Digital, não houve uma
preocupação maior com o Canal de Interatividade.
Nesses países, a maioria das pessoas tem acesso
a serviços Internet de banda larga, de modo que
aqueles sistemas de TV simplesmente utilizam os
meios de comunicação de dados já existentes para
o Canal de Retorno. O padrão europeu especifica
um Canal de Retorno via radiofreqüência (RF) para
o sistema de TV Digital terrestre, o DVB-RCT. No
entanto, parece que não houve implementação
prática deste padrão, em razão da dificuldade de
alocação de canais de RF em contraste à
disponibilidade de outros meios.
Como já mencionado, o caso brasileiro é
atípico, pois o SBTVD propõe uma concepção
diferente para o sistema de TV Digital, ao lhe atribuir
uma forte função social como agente de inclusões
digital e social, tendo um importante caráter
educativo, de saúde e de prestação de serviços
públicos – além de sua função de entretenimento.
Assim, o Canal de Interatividade no SBTVD não
deve ser visto como um simples Canal de Retorno,
tal qual ocorre em outros países, mas
principalmente deve ser entendido como um meio
de comunicação para a promoção das inclusões
digital e social, de forma que as pessoas possam
efetivamente interagir com o sistema de TV,
usufruindo serviços de utilidade pública, sociais e
educativos.
É sob essa ótica social que deve ser
construído o Canal de Interatividade para o país.
Devem ser precisamente analisadas as tecnologias
disponíveis e passíveis de serem utilizadas para a
implementação do Canal de Retorno no SBTVD(iii).
(ii) Aparelho capaz de receber os sinais de Televisão Digital, provenientes do ar ou de outro meio físico, com a função de sintonizar
e decodificar os sinais, de modo a possibilitar a sua reprodução por meio de televisores.
(iii) A RFP de Canal de Interatividade demanda o estudo das tecnologias de telecomunicações existentes e o desenvolvimento de
novas tecnologias (intrabanda e ad hoc).
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Tabela 1 Redes e Tecnologias aplicáveis
Figura 2 Arquitetura do Sistema de Canal de Interatividade
Especialmente nos últimos anos, ocorreu um
grande avanço nas redes de telecomunicações,
surgindo diversas alternativas tecnológicas que
permitem o tráfego de voz, dados e imagens, com
altas taxas de transmissão.
O SBTVD não deve, a priori, descartar
nenhuma alternativa tecnológica, considerando
inclusive um Canal de Retorno wireless na faixa de
radiofreqüências destinada à própria televisão, seja
em VHF ou UHF. Pelo contrário, para realizar a sua
função social, deve utilizar todas as alternativas
possíveis e de modo complementar, atendendo à
diversidade de cenários existentes no país. Desse
modo, deve-se pensar numa “rede” de Canal de
Interatividade com múltiplas tecnologias e
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provedores, possibilitando aos usuários do SBTVD
a escolha do meio que irão utilizar como Canal de
Retorno.
Dentre as redes e tecnologias de
telecomunicações disponíveis, destacamos, no
quadro a seguir, algumas que já poderiam ser
aplicadas.
A formulação de um Modelo de Referência
Geral para o Canal de Interatividade deverá
considerar todas as suas implicações, requisitos e
formas de implementação, baseando-se em
tecnologias, contingências e necessidades.
Adicionalmente, os modelos de negócio deverão
ser estruturados para subsidiar aqueles serviços de
interesse público. Novamente, ressaltamos que as
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demandas de inclusões digital e social associadas
ao SBTVD dependem da constituição efetiva do
Canal de Interatividade.
A Figura 2 representa a complexidade do
SBTVD com a existência do Canal de Interatividade
e Canal de Retorno estabelecido através de
múltiplas soluções tecnológicas em redes
complementares, que, de forma sintetizada,
evidencia redes, atores e usuários.
7.
Estudo de Caso: Caminho de Retorno
com Tecnologia 802.11b e Arquitetura de
Rede Ad Hoc
7.1. Arquitetura Ad Hoc
Redes ad hoc sem fio são redes que não
necessitam de infra-estrutura, nem de controle
central, podendo ser implantadas rapidamente e
com baixo custo. Além disso, podem se
autoreconfigurar, em termos de rotas, caso haja
alguma modificação na rede.
Nas redes ad hoc não há número predefinido
de nós (terminais), nem uma definição exata da
posição desses terminais. Os terminais comunicamse via rádio e são responsáveis pela função de
roteamento, possibilitando a comunicação em
cenários multihop, além da comunicação ponto-aponto (um hop).
Os terminais são, basicamente, roteadores
fixos (ou móveis) e hosts associados. Estão
conectados por enlaces sem fio, podendo se
desligar (ou se alterar aleatoriamente), o que não
deve impedir a conectividade da rede
(autoconfigurável). Os terminais cooperam entre si
para encaminhar os pacotes de dados uns aos
outros por encaminhamento direto (quando fonte
e destino estiverem dentro da área de cobertura)
ou via outros terminais (daí o nome multihop).
Essas redes apresentam-se como uma boa
solução para cenários em que a rede fixa não está
disponível, ou onde é necessária a implantação
rápida de serviços de telecomunicações, como em
cenários de catástrofes. Além disso, por sua
facilidade de implantação, seu custo menor e sua
escalabilidade, trata-se também de uma solução
atrativa para o serviço de caminho de retorno do
Canal de Interatividade do sistema de TV Digital,
dado que o número de usuários desse sistema é
variável no tempo e no espaço e a topologia ad
hoc consegue se adaptar a essa condição.
7.1.1.Caminho de Retorno na Topologia Ad
Hoc – Premissas e Considerações
Neste caso específico e para o exercício neste
artigo, algumas premissas são colocadas [3]:
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• Não há transmissão de voz.
• Todos os terminais são iguais, inclusive o
gateway.
• Há um gateway por Provedora/Emissora.
• Não há comunicação entre terminais, mas
somente para os gateways.
Um primeiro aspecto de desempenho a ser
considerado é que a topologia ad hoc só começa
a ser eficiente ou funcional a partir da existência
de um certo número de terminais e, além disso, é
importante que os terminais estejam próximos dos
gateways.
Tendo em vista essas premissas, há um fluxo
de informação dos terminais para os gateways,
sendo estes, portanto, um dos principais fatores
limitantes em termos de vazão máxima e por
terminal. Além disso, os terminais mais próximos
dos gateways são mais carregados por tráfego
externo (não do próprio terminal), atuando
principalmente como roteadores.
Por outro lado, quanto mais distantes os
terminais estiverem dos gateways, menores as taxas
disponíveis para estes. Assim, no sentido de se
otimizar o desempenho da rede, deve haver um
planejamento adequado que leve em conta o
compromisso existente entre a taxa mínima
necessária para cada terminal realizar os serviços
que estiverem ao seu dispor pelas provedoras/
emissoras e o número de terminais na rede, além
de suas distâncias dos gateways em termos de
hops.
Existem artigos na literatura especializada
em que foram feitas análises teóricas no sentido
de se obterem estimativas do valor da vazão de
cada terminal participante de uma comunicação
fim-a-fim específica, em função do número de hops
existentes. Não existe consenso a respeito, mas
podem ser citados dois trabalhos nos quais a
variação da vazão num terminal num enlace com
“n” hops pode ser expressa analiticamente por:
• v[bps] = f{1/n} em [4]
• v[bps] = f{1/√n} em [5]
O planejamento inicial pode ser realizado
baseando-se em alguma dessas expressões,
levando-se em conta as condições de contorno
utilizadas nos estudos que melhor se adaptarem
às situações reais.
Outro aspecto a ser considerado, em termos
de desempenho do sistema, é a latência de cada
transmissão fim-a-fim, isto é, o atraso entre a
requisição feita no transmissor do usuário e a sua
recepção no gateway da provedora/emissora.
Como, por premissa, não há transmissão de voz
(serviço muito sensível ao atraso) e como as tabelas
de roteamento dos protocolos que compõem as
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rotas são atualizadas a cada segundo, não se
espera que a latência seja um fator muito
importante no aspecto desempenho.
Um aspecto final não menos importante no
planejamento e desempenho desse tipo de rede é
o alcance de propagação de cada terminal, isto
é, a área de cobertura de seu sinal de RF. Este é
dependente da freqüência de operação do
terminal, do ambiente de propagação e da
tecnologia de transmissão utilizada no terminal.
Esses fatores determinam as distâncias mínimas e
máximas entre terminais (residências), fornecendo
limites importantes no planejamento da rede.
7.2. Tecnologia 802.11
Para implementação do módulo rádio nas
redes ad hoc sem fio, o padrão IEEE 802.11 é uma
boa opção e tem sido muito utilizado tanto na
implementação de testbeds como na implementação
de redes comerciais. Isso ocorre em virtude da
simplicidade desse padrão e da facilidade de
implantação e de operação dos dispositivos, além
de seu preço baixo devido à grande escala mundial
e ao fato de o padrão apresentar o modo de acesso
Distributed Coordination Function (DCF), o qual
possibilita a operação em modo ad hoc (chamado
Independent no padrão).
O padrão 802.11b é uma extensão do padrão
IEEE 802.11 e opera em taxas de transmissão de
1 Mbps, 2 Mbps, 5,5 Mbps e 11 Mbps. Além disso,
o padrão opera na faixa de 2,4 GHz em canais de
20 MHz e tem uma potência máxima de 100mW
(20dBm), sem considerar o ganho da antena
transmissora.
As técnicas de modulação empregadas são:
Differential Binary Phase Shift Keying (DBPSK) para
taxas de 1 Mbps e Differential Quadrature Phase
Shift Keying (DQPSK) para taxas de transmissão
de 2 Mbps, 5,5 Mbps e 11 Mbps.
Para o espalhamento espectral, utiliza a
técnica Direct Sequence Spread Spectrum (DSSS)
e emprega a seqüência de Barker para taxas de
transmissão de 1 Mbps e 2 Mbps e a seqüência
Complementary Code Keying (CCK) para taxas de
5,5 Mbps e 11 Mbps. A seqüência CCK, em vez de
mapear um código para um bit como faz a seqüência
de Barker, faz o mapeamento de cada palavra do
código em 2 ou 6 bits, de acordo com a taxa utilizada, resultando em um total de 4 bits por símbolo
para 5,5 Mbps, e 8 bits por símbolo para 11 Mbps.
Com essas características de camada física,
esta tecnologia tem alcance limitado, da ordem
de centenas de metros (~400m), o que é mais
apropriado para ambientes indoor. Esse alcance é
válido para as taxas menores, em que a modulação
é mais robusta aos fatores perniciosos do canal
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sem fio. Além disso, na freqüência de 2,4 GHz,
existe a forte necessidade de se ter visada direta
(pelo menos óptica) em cada enlace (hop) para
haver maior probabilidade de conectividade. Sua
perda de penetração também é alta nesta
freqüência, fato que desencoraja seu uso em
ambientes urbanos densos (muitos prédios).
Esse alcance pode ser aumentado se a
tecnologia puder operar em freqüências de RF mais
baixas, menores do que 700 MHz, por exemplo.
Neste caso, quanto menor a freqüência, maior será
o alcance, não apenas pelo aspecto da
propagação, mas também pelo aspecto
regulatório, pois nestas freqüências é permitido se
transmitir com potências maiores. Nestes casos
(~500 MHz), os alcances poderiam chegar às
unidades dos quilômetros (~5 km), o que seria
atraente para os cenários rurais.
O padrão IEEE 802.11 especifica o
mecanismo de acesso ao meio (Medium Access
Control – MAC) e a camada física (modulação,
etapa de RF, etc.). No modo DCF, os terminais
competem pelo uso do canal de forma distribuída.
O mecanismo de acesso ao meio utilizado nesse
modo é o Carrier Sensing Multiple Access with
Collision Avoidance (CSMA/CA), que utiliza a troca
de mensagens Request-to-Send/Clear-to-Send
(RTS/CTS) para minimizar o problema do terminal
escondido e exposto.
Como foi visto, um dos parâmetros utilizados
para avaliar o desempenho de uma rede ad hoc
sem fio é a vazão fim-a-fim, que depende
principalmente da largura de banda (do canal) do
enlace rádio e do mecanismo de acesso ao meio
(seu gasto de banda) empregado.
Embora a largura de banda de cada canal e
o mecanismo de controle de acesso do padrão
802.11 não possam ser alterados, esse padrão
apresenta alguns parâmetros sistêmicos que podem
ser ajustados para melhorar o desempenho da rede.
Entre esses parâmetros está o limiar para
envio de mensagens RTS/CTS (RTS Threshold).
Dessa forma, para avaliar o comportamento da
vazão de uma rede ad hoc sem fio multihop e a
influência do parâmetro RTS Threshold na vazão
da rede, foi implementado um testbed em ambiente
indoor, no qual foram realizadas algumas medidas,
considerando diferentes topologias de rede em
ambiente multihop.
7.3. Testes e resultados
7.3.1.Vazão da rede ad hoc em ambiente
multihop
O objetivo desse teste é determinar a vazão
da rede ad hoc sem fio num ambiente multihop,
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verificando a influência do mecanismo de controle
de acesso do padrão 802.11b (CSMA/CA),
mantendo-se o parâmetro RTS Threshold em seu
valor máximo (ou desligado).
O procedimento de teste consistiu em
configurar um terminal ad hoc como servidor e
outro como cliente, gerando tráfego UDP com taxa
de transmissão igual a 11 Mbps e tamanho de
pacote igual a 1.470 bytes, por um período de
tempo de um minuto [6].
Na Tabela 2, são apresentados os valores
máximos de vazão da rede (Mbps) ad hoc sem fio
em função do número de hops empregado em
cada teste, sem RTS.
Tabela 2 Vazão em função da topologia (sem RTS)
7.3.1.1. Influência do parâmetro RTS
Threshold da placa WLAN na vazão
da rede ad hoc em ambiente multihop
O objetivo desse teste é determinar a vazão
da rede ad hoc sem fio num ambiente multihop (de
1 a 5 hops), verificando a influência do mecanismo
de controle de acesso do padrão 802.11b (CSMA/
CA), variando-se o valor do parâmetro RTS
Threshold. O mesmo procedimento de teste
anterior foi seguido e os resultados são exibidos
nas Tabelas 3 e 4.
Tabela 3 Vazão em função dos valores de RTS
Threshold para topologia de 1 hop
Analisando-se os resultados apresentados,
observa-se que a vazão máxima é obtida quando
o parâmetro RTS Threshold está configurado em
2.311. Isso ocorre porque o pacote de dados a
ser transmitido apresenta 1.490 bytes (1.470 mais
o cabeçalho IP) e é menor que o RTS Threshold
(2.311) e, nesse caso, o mecanismo RTS/CTS não
é ativado. Para valores do RTS Threshold menores
que o tamanho do pacote, o mecanismo RTS/CTS
é ativado e a vazão diminui devido ao aumento na
quantidade de troca de mensagens de controle.
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Tabela 4 Vazão em função dos valores de RTS
Threshold para topologia de 2 hops
Para as topologias com 3, 4 e 5 hops
ocorreram interrupções na comunicação entre os
terminais. Assim, diminuiu-se a taxa de transmissão
até que não houvesse interrupção na comunicação.
Nesse caso, a vazão foi praticamente a mesma com
e sem o mecanismo RTS/CTS habilitado, pois
havia banda suficiente para a transmissão das
mensagens de controle.
Analisando-se os resultados dos testes
realizados no testbed da rede ad hoc sem fio, constata-se que o parâmetro do padrão IEEE 802.11b,
RTS Threshold influencia a vazão da rede ad hoc.
Observa-se também que, à medida que se
aumenta o número de hops na rede ad hoc sem
fio, a vazão desta é diminuída. Isso é ocasionado
pelo mecanismo de acesso ao meio do padrão
802.11b (CSMA/CA), utilizado nos protótipos dos
terminais ad hoc.
8.
Conclusão
Podemos identificar alguns pontos muito
importantes para o sucesso do SBTVD.
Primeiramente, torna-se bastante simples afirmar
que a solução de Canal de Interatividade não está
comprometida com a escolha de um padrão de
transmissão da TV Digital propriamente dito. Desse
modo, adotando-se qualquer um dos padrões
comerciais, ou mesmo construindo um padrão
totalmente inovador, será possível implementar uma
solução de Canal de Interatividade. À luz dos
cenários representativos de cadeia de valor,
somente num cenário Incremental a solução de
Canal de Interatividade não seria demandada.
Deve-se considerar, ainda, que este será um
sistema complexo, com uma grande multiplicidade
de redes e de serviços, que terá, certamente,
exigências adicionais de gerência de redes,
envolvendo integração, interconexão e segurança.
A implementação e efetivação de tal sistema de
Canal de Interatividade será um grande desafio e
um requisito imprescindível para o sucesso dos
objetivos sociais do SBTVD, diferenciando-o de
qualquer outro sistema implantado no mundo. O
SBTVD não será caracterizado pelo padrão, mas
pela sua finalidade social, indo muito além de
melhorar a recepção de imagem para um
telespectador passivo.
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Canal de Interatividade em TV Digital
Para finalizar, apresentamos um pequeno
exemplo de uma rede ad hoc funcionando com
tecnologia 802.11b e de como seu desempenho
em cenários específicos pode ser variado de
acordo com o valor de alguns parâmetros
sistêmicos. Essa solução permite que o canal de
retorno seja estabelecido via uma tecnologia
madura, de fácil incorporação no sistema com um
9.
ônus mínimo para o consumidor e introduz a
portabilidade dos terminais, destituindo a rigidez
das soluções fixas. O uso de uma solução ad hoc
também torna desnecessário o lançamento de uma
rede cabeada o que importante para regiões
densamente povoadas onde as adaptações da
estrutura física de telecomunicações é bastante
cara.
Referências
[1] BRASIL. Decreto Presidencial número 4.901, 26/
11/2003.
[2] ITU. Basic principles for a worldwide common
family of systems for the provision of interactive
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Hoc Sem Fio, suportada pelo FUNTTEL.
Abstract
This paper describes the Interactive Channel and a possible architecture for the Brazilian Digital Television
System (SBTVD). It also presents a case study of 802.11 as a possible solution for the return channel. The
present study highlights the requirements of the Presidential Decree of November 26, 2003 and demonstrates
the importance of interactivity on achieving the goals proposed.
Key words: Digital terrestrial television. Interactive channel. Ad hoc networks.
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