Linguagens em diálogos: sobre os métodos de

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Linguagens em diálogos: sobre os métodos de
ENGRUPEDança 2013
ISSN 2359-3806
Linguagens em diálogos: sobre os métodos de ensino de balé
Dialogic language: on the methods of teaching of ballet
Caroline Konzen Castro (CEFET-MG)
Resumo: Este artigo tem como objetivo fazer uma pesquisa bibliográfica sobre o
processo de legitimação dos métodos de balé clássico e traçar um diálogo entre as
especificidades e diferenças destes métodos.
Palavras-chave: Balé Clássico, Métodos de Balé, Ensino.
Abstract: This article purpose to research about the legitimation process of classical ballet
methods and to correlate the specificities and differences of these methods.
Keywords: Classical Ballet. Methods of Ballet. Teaching.
Introdução
Escrever sobre as metodologias de ensino de balé é um modo prazeroso de refletir
mais profundamente sobre a minha prática docente. Além disso, tem a finalidade de
investigar, historicamente, sobre o que tem sido feito em relação ao ensino de balé.
Devido às diversidades nacionais e culturais em que a arte do balé foi desenvolvida, ela
adquiriu diferentes abordagens e particularidades próprias a cada Escola/método.
Sabe-se que a linguagem do balé clássico é tradicional, pautada em um alfabeto de
movimentos que já foi fixado e formalizado há muitos anos atrás na Europa. Em todo o
mundo o ensino de balé é pautado em um sistema de movimentos que possui uma rotina
a ser praticada em sala de aula. Dessa forma, seu sistema de atividades artísticas é
baseado nas normas da legibilidade teatral próprias do balé clássico.
Sobre a codificação e o registro do ordenamento próprio de uma aula de balé têmse, atualmente, vários métodos legitimados tais como:

A Escola Francesa fundada pelo rei Luis XIV (1643-1715).

A Escola Dinamarquesa ou o Método Bournonville, fundado pelo professor e
coreógrafo August Bournonville (1805-1879).

A Escola Italiana ou Método Cecchetti, fundado pelo professor Enrico
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Cecchetti (1850-1928).

A Escola Inglesa ou Método Royal Academy of Dance (R.A.D.) fundado pelo
editor da revista “Dancing Times” Philip Richardson (1875-1963).

A Escola Russa ou Método Vaganova, fundado pela professora Agrippina
Vaganova (1879-1951).

A Escola Americana ou o Método Balanchine, fundado pelo professor e
coreógrafo George Balanchine (1904-1983).

A Escola Cubana ou o Método Cubano, fundado pelos bailarinos Alicia
Alonso (1920-) e Fernando Alonso (1914-2013).
Dessa forma, existem sete métodos legitimados de ensino de balé, que possuem
suas especificidades, corpus de análise deste artigo.
A Acadèmie Royale de la Danse (A Academia Real de dança)
A Academia Real de Dança foi a primeira instituição oficial de ensino de dança que
se tem registro. Foi fundada em 1661, em Paris, pelo rei da França Luiz XIV (1638-1715)
com o objetivo de iniciar a profissionalização de bailarinos. Era dirigida pelo mestre de
danças francês Pierre Beauchamps. Segundo Caminada (l999) ela era composta por
treze maestros de dança da corporação medieval, em que estavam também agrupados os
músicos. A partir da criação da Academia Real de Dança os profissionais de ambos os
sexos passaram a substituir os cortesãos. Pouco se sabe sobre o funcionamento da
iniciativa, mas sabe-se que ela cumpriu um papel de importância, pois foi a primeira
iniciativa de a profissão de bailarinos se organizar e receber a sanção do Estado.
A Academia Real de Dança foi transformada na Acadèmie Royale de Musique et
Danse (Academia Real de Música e Dança), em 1672, futura Ópera de Paris. Sobre a
Escola Oficial de Dança nos diz Caminada:
À Escola de Dança coube sistematizar o ensino do ballet desenvolvendo
um esquema básico e rígido de posições de cabeça, tronco, braços e
pernas, sob a orientação de Beauchamps e com a colaboração de Bocan,
de Louis Pécourt e de Jean Balon (...) (CAMINADA, 1999, p. 105).
Assim, se iniciou a sistematização da técnica do balé com os principais mestres de
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dança da época, em especial Pierre Beauchamps, pois ele elaborou as cinco posições
dos pés e definiu a base do academicismo clássico em idioma francês. Um dos seus
ensinamentos foi manter intactos os termos técnicos criados por ele. Esta sistematização
do vocabulário do balé em francês tornou possível a preservação do sistema e a
execução do mesmo por bailarinos de todo o mundo. A escola teve grande importância
por privilegiar o início da sistematização dos princípios do balé e por valorizar a
pedagogia.
Beauchamps nasceu provavelmente em 1631 e morreu em 1719, em Versailles,
França. Foi herdeiro da longa tradição dos mestres italianos e ele quem fixou a nova
tradição da dança francesa nobre (MICHAUT, p.17). Sabe-se que a dança clássica
nasceu na Corte, primeiramente na Itália, no final do século XIV. A primeira menção, na
história da dança, de um balé organizado se deu em Tortona, Itália, para celebrar o
casamento do Duque de Milão, Galeazzo Sforza, com Isabella de Aragão, em 1489, com
composição musical e coreográfica do mestre italiano Bergonzio di Botta. Segundo
Werner e Tomazzoni:
“Nesse espetáculo, composto em comemoração ao casamento do Duque
de Milão e Isabella de Aragão, havia personagens como Jasão, Diana,
Mercúrio, Atlante, Teseu, Hebe, além de outras personagens míticas que
dançavam enquanto serviam o banquete aos convidados”. (WERNER;
TOMAZZONI, 2009, p.82).
Dessa forma, o balé, nesta época, representava a antiguidade clássica,
expressando as estórias e personagens relacionadas à mitologia. A dança era executada
como entretenimento de corte, dançava-se em banquetes, servindo os pratos aos
convidados e em festas magníficas. Pouco se sabe sobre o ensinamento coreográfico das
danças nesta época, mas tem-se o registro do primeiro tratado de dança, o De arti
saltandi et choreas ducendi (A arte de dançar e dirigir coros), entre 1435 e 1436, escrito
pelo mestre de dança italiano Domenico de Piacenza (CAMINADA, 1999, p. 81).
Nele, o autor introduzia a primeira classificação sistemática dos
movimentos do corpo, doze ao todo, sendo considerados nove naturais,
evidenciando o que o corpo normalmente executa, e três acidentais, que
se referia ao que era complementar e acidental (CAMINADA, 2009, p. 81).
Sabe-se que esta foi a primeira tentativa registrada, que se tem notícia, de se
sistematizar os movimentos do corpo. Porém, não havia ainda uma sistematização dos
movimentos do balé, o qual só viria a ocorrer com Beauchamps.
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Da Itália o balé migrou para a França em decorrência do casamento da nobre
italiana Catarina de Médici com o duque de Orleans, futuro rei Henrique II da França, em
1533. A rainha levou para Paris o maestro de danças Balthasar de Beaujoyeux. Segundo
Caminada (1999), coube a ele a primeira definição de balé: “um arranjo geométrico de
muitas pessoas juntas, sob a variada harmonia de diversos instrumentos” (p. 86). O balé
até então era definido como uma arquitetura geométrica em forma de dança, composta
por passos e figuras elaborados em consonância com a música.
Este mestre coreografou o primeiro balé a ser apresentado com esse nome: o
Ballet Comique de la Reine (Balé Cômico da Rainha), em 1581. Este balé foi encenado na
França, em comemoração ao casamento de Marguerite de Vaudemont, sobrinha da
rainha, com o duque de Joyeuse. O tema deste balé se baseou na Antiguidade Clássica,
o comique do título não se referia a engraçado e sim a não existência de componentes
trágicos, não provocava piedade e tinha um fim feliz. Segundo Monteiro (1998), toda a
audiência dança para finalizar o espetáculo, sendo este momento final do espetáculo, a
incorporação do baile. O coreógrafo Beaujoyeux convergiu neste espetáculo a síntese
entre a música, poesia e dança, utilizando para isso instrumentos musicais, cantos,
poesia, dança e efeitos cênicos.
Dessa forma o Ballet Comique de la Reine deu início ao gênero denominado “Balés
de Corte”, caracterizados por estarem presentes nos eventos sociais da corte, como parte
dos divertimentos da mesma. Representou um salto qualitativo em relação ao que vinha
sendo produzido até então, pois integrou as danças das antigas festas e bailes num todo
dramático mais estruturado (MONTEIRO, 1998, p. 39). Além disso, preocupa-se com a
constituição de um enredo e a unidade dramática do balé como um todo. Porém, ainda
era uma arte estilizada, praticada por amadores – o rei e sua corte - e poucos
profissionais, todos exclusivamente pertencentes à elite da corte. Era um divertimento de
nobres para nobres.
Constata-se que a produção do Ballet Comique de la Reine foi realizada antes da
criação de uma instituição de ensino formal de balé, ou seja, nesta época o amadorismo
prevalecia nas apresentações de dança. Além disso, esta encenação, assim como as
encenações dos balés de corte eram codificações do baile, ampliadas com fabulosidades.
Nas palavras de Marianna Monteiro, “(...) O dançarino profissional executava os mesmos
passos que o amador, a diferença é que no balé, ao contrário do baile, nobres e
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profissionais participavam de uma composição que, na verdade, integrava cenicamente a
dança a um conjunto de outras artes (...)”
No entanto, o ano de 1626 fez surgir um novo gênero de balé, o chamado Ballet à
Entrée, em que os bailarinos profissionais substituíram os nobres nos trechos de solos de
dança, pois havia a necessidade de agradar ao público. Este gênero era composto por
espetáculos com partes interdependentes: “(...) essa forma consistia numa série de
entradas de grupos independentes interconectados, de forma superficial, por temas
mitológicos ou dramáticos que, em alguns casos, englobavam toda a situação” (tradução
nossa). Além disso, “consistia em números encenados de teatro com interlúdios de dança,
sendo, portanto, o precursor dos ballets narrativos do Rei Luís XIV, o Rei Sol” (SILVA,
2007: 23). Assim, a dança ainda estava vinculada às encenações teatrais nos Ballet à
Entrée.
Nesta época o palco oblíquo foi inventado para se ver melhor as habilidades
técnicas dos dançarinos e os balés passaram a ser encenados em casas de espetáculos.
Assim, este novo gênero valorizou a profissionalização da dança e a iniciação do
desenvolvimento da técnica clássica, que se deu com a própria nobreza, ensinada por
maestros como Bocan e principalmente Beauchamps.
O balé começou aí o seu processo de libertação do amadorismo, em
busca de adquirir o status de arte de verdade. Com a morte de Luís XIII,
em 1643, durante um certo tempo nenhum ballet foi encenado na corte
francesa; poucos anos depois, com o novo soberano Luís XIV, fatos
decisivos tiveram lugar, colocando definitivamente o ballet, como uma arte,
e uma arte de profissionais (CAMINADA, 1999, p.92).
Neste contexto, foi inaugurada a Academia Real de dança e, posteriormente, a
Academia Real de Música e Dança, dirigida por Lully, bailarino e compositor de balés.
Lully, com a colaboração de Quinault – dramaturgo francês – criam o balé “Le
Triomphe de l’Amour” em 1680, dançado em 1681. Este balé contou com a presença de
bailarinas pela primeira vez encenando em teatro público e da primeira bailarina
profissional no papel feminino principal: La Fontaine – formada pela Academia Real de
Dança. Foi a primeira vez que uma mulher dançou em um teatro público, por isso a data
marca a ascensão da participação feminina no balé.
Nesta época, o desenvolvimento da técnica clássica ainda se desenvolvia com a
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própria nobreza, ensinada por maestros como Bocan, Beauchamps, Pécourt e Jean
Balon, que sistematizaram o ensino de balé.
No século XVII, foram estabelecidas as cinco posições básicas dos pés,
por Pierre Beauchamps (1639-1705), estas, semelhantes às posições dos
pés na esgrima, voltados os dedos para fora, chamado de “en dehors” (em
francês). A intenção desta rotação das pernas e pés era a de que permitiria
aos bailarinos movimentarem-se, rapidamente, em qualquer direção com
segurança, tal qual o esgrimista. (AMARAL, 2009: 3).
Tal como o citado, a literatura sobre o assunto lega a Beauchamps a criação das
posições dos pés. A justificativa para a rotação das pernas e posição dos pés serem para
fora apresenta como sendo um facilitador para a agilidade dos movimentos dos bailarinos.
Luis XIV, no fim de seu reinado, criou a companhia permanente de dança da Ópera
de Paris, composta por dez bailarinos e dez bailarinas, e fixou salários. Além disso,
instituiu a gratuidade do ensino na escola oficial e abriu ao público os teatros do Palais
Royal e do Petit Bourbon (CAMINADA, 1999: 108). Estas foram o início de grandes
conquistas para a história do balé, pela criação de uma companhia oficial de dança que
apresentasse mulheres, já que antes elas eram proibidas; o estabelecimento de salários
fixos aos bailarinos, valorizando a profissão; a gratuidade do ensino foi o início de uma
maior acessibilidade do aprendizado do balé, assim como a abertura do Palais Royal e do
Petit Bourbon ao público.
Dessa forma se iniciou a formação do método francês de ensino de balé. “Essa
fase de uma arte que já completara um século pode ser denominada “clássica”, no
sentido de que seu desenvolvimento foi inteiramente voltado para o domínio dessa
técnica virtuosística e racional (...)” (CAMINADA, 1999: 116). Por isso o balé é chamado
de clássico, devido a longa tradição e tempo de desenvolvimento da mesma.
Mesmo na época do Romantismo, em que os acontecimentos políticos e sociais
ocorridos na França, diminuindo os recursos econômicos para a escola, ela mantinha uma
metodologia uniforme e concreta com os melhores professores da Europa.
A Escola Dinamarquesa ou o Método Bournonville
A escola dinamarquesa se iniciou com Vicenzo Galeotti (1733-1816), bailarino
italiano que estudou com Noverre e com Gasparo Angiolini. Segundo Caminada (1999) a
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escola dinamarquesa se destacou nas presenças dos seguidores de Galeotti - Antoine
Bournonville (1760- 1843) e Auguste Bournonville, pai e filho, respectivamente. Além
disso, Bournounville, filho, estudou com Auguste Vestris, professor francês, considerado
um dos mestres mais admirados da história da dança. Visto que o método foi
desenvolvido por pai e filho, constata-se que a Escola Dinamarquesa de Balé recebeu
influencia do método francês e italiano.
Sobre a fundação da escola, por Antoine Bournonville, na Royal Danish Theatre,
Grenser (2006, p.8) diz: “Em 1916 ele foi nomeado diretor de dança na Royal Danish
Theatre, onde ele fundou uma escola para treinar o corpo de balé, desenvolvendo um
currículo que seguiu o modelo da Royal Ballet em Estocolmo” (tradução nossa). Ele foi
primeiro bailarino Royal Opera em Estocolmo, levando influencias deste local para o seu
método de ensino.
Entre 1816 e 1879 os Bournounville incrementaram de características próprias o
método de ensino, o qual destaca a dança masculina, técnica e expressivamente.
Ele
elaborou um estilo peculiar com o objetivo de preparar bailarinos para dançarem os seus
balés. Segundo Ocaña (2008), o elemento mais inovador da sua técnica tem a ver com a
utilização do espaço e os épaulés (movimento de ombros que formam uma pose
graciosa). Ele estabeleceu uma nova colocação da perna de suporte nas posições
espaciais croisé e effacé. Foi diretor do Ballet Real da Dinamarca (Royal Danish Ballet)
por cerca de cinquenta anos, formando bailarinos e mestres. Coreografou muitos balés,
que possuem a característica de possuírem uma grande proporção de allegros e
variações rápidas. Suas aulas eram dotadas de musicalidade, ele mesmo tocava violino
em suas aulas e exigia de seus alunos uma preparação integral.
Uma das principais características do trabalho coreográfico de Bournonville é que,
em uma época em que a figura feminina reinava nos palcos do balé, Bournonville
destacava a figura masculina em seus balés. Seus principais balés são: La Sylphide,
Napoli, Konservatoriet e Festival de Flores em Genzano.
A Escola Italiana ou Método Cecchetti
A Itália, inventora do ballet, manteve por séculos uma tradição de dança
virtuosística e de cunho popular. Inúmeros foram os bailarinos que
passaram por sua história e por seus palcos, nas cidades de Milão,
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Nápoles, Veneza, Florença e Turim, onde os balés exploravam temas
republicanos.
(CAMINADA, 1999, p. 130)
A Itália seguiu a sua tradição na dança e produziu grandes mestres que originaram
a chamada Escola Italiana de Balé, representada principalmente por Carlo Blasis (17951878) e por Enrico Cecchetti (1850-1928), ambos são professores a artistas italianos.
Carlo Blasis nasceu em 1797, em Nápoles. Estudou com Jean Dauberval, coreógrafo de
“La Fille Mal Gardée”, o mais antigo dos balés de repertórios a possuir personagens reais
e não deuses, ninfas e fadas, como nos balés anteriores. Este balé caracterizou o préromantismo. O trabalho de Dauberval incluiu os estudos de Noverre, que se preocupava
principalmente com a expressividade cênica dos bailarinos. Blasis se apresentou pela
primeira vez em Marselha, aos doze anos. Posteriormente dançou em Milão, onde
trabalhou com Salvatori Viganò (1769-1821), criador do gênero coreográfico denominado
Choreodrama, caracterizado por explorar a pantomima na dança. Esta nova forma de
dança italiana se iniciou no século XIX com Viganò, que a estruturou numa relação
balanceada da mímica no balé e do balé na mímica. Atingiu etapas que concluíram um
processo de desenvolvimento que havia começado sessenta anos antes por Gasparo
Angiolini (1731-1803) e Jean Georges Noverre, os “criadores” do “ballet d’action”
(POESIO, 1998: 3). Viganò trabalhou com os gestos pantomímicos respondendo a música
e integrando-os à ação dançada, favorecendo os movimentos expressivos e rítmicos.
Blasis apreendeu os ensinamentos de Viganò e incorporou muitas de suas ideias.
Blasis lançou o seu primeiro tratado de dança em 1820, o Traité élémentaire,
théoriqueet pratique de lárt de ladanse, o qual inovou o método de ensino de balé da
época, pois ele desenvolveu princípios e elementos importantes, que foram incorporados
ao ensino do balé e que até então não haviam sido trabalhados. Segundo Caminada
(1999:131), dentre os princípios desenvolvidos neste tratado estão: o porte, a harmonia e
coordenação dos braços; a correspondência dos exercícios, a sua característica
perpendicular e vertical; o plié, as piruetas, o equilíbrio dos arabesques; as poses, que
devem sustentar a expressividade e a vivacidade; o adagio; o alegro; etc. Para Blasis o
adágio representa o ápice da arte do bailarino, pois nele se desenvolvem principalmente
as suas capacidades trágicas.
Blasis era conhecedor da anatomia humana e com base nisso desenvolveu um
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estudo que favorecia o corpo do bailarino. Em 1828 escreveu The code of Terpsichore
complementando seu tratado. Nesta obra ele propôs mudanças nas normas do balé de
até então como: a introdução da prática do balé na barra, como parte fundamental no
treinamento dos exercícios iniciais da aula; o estudo da anatomia humana e a utilização
destes estudos na técnica de dança, como por exemplo, a rotação externa da
coxofemoral, denominada no balé em dehors, foi desenvolvida por Blasis (AGUIAR,
2008:12). Além disso, frisou sobre a importância de se escolher um bom mestre para se
estudar dança, pois segundo ele, o sucesso ou o fracasso nos estudos depende
sobretudo sobre a maneira na qual eles estão começando. Também “teorizou sobre o
sapato de ponta, transformando-se, segundo vários autores, no principal pedagogo do
Romantismo” (CAMINADA, 1999: 131).
Devido as revoluções de 1848 e as guerras de unificação da Itália, Blasis não
conseguiu se manter no cargo na Itália e foi trabalhar, em 1850, em Varsóvia e Moscou,
levando para o leste europeu o seu estilo próprio (SANTOS, 2011, 24). Com a saída de
Blasis o balé começou a declinar na Itália, mas continuou a desenvolver na Rússia.
Assim como Blasis, Enrico Cecchetti migrou para a Rússia a fim de ensinar na
Escola de Ballet Imperial de São Petersburgo. Ele continuou a tradição do seu professor
Giovanni Lepri, com quem estudou em Florença, assim como a tradição de Carlo Blasis,
com quem Lepri estudou em Milão. Sendo assim, pelo fato de os professores de Cecchetti
terem sido treinados por Carlo Blasis, sua teoria acabou sendo fortemente influenciada
pela teoria de Blasis.
Durante a carreira de Cecchetti como bailarino ele criou e performou um gênero
denominado caractère, que consistia em uma combinação desafiadora de ação e virtuose
que expressavam uma particular função dramática dentro da sua performance (POESIO;
Bennett, 2000). Ainda de acordo com Poesio e Bennett, quando Cecchetti foi convidado
pela primeira vez para dar aulas na Escola de Ballet Imperial de São Petersburgo, em
1836, foi como professor de mímica e não de professor de balé. Ele treinou muitas
gerações de bailarinos para o uso correto da linguagem italiana da mímica no balé.
Seu método ficou famoso pelo fato de possuir uma técnica difícil, como por
exemplo, os trinta e dois fouetés, criado por ele. Ele tinha planos de aulas organizados
para cada dia na semana, o que fez com que seus alunos não quisessem perder suas
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aulas nem para a turnê dos Ballets Russes de Diaghilev. Este fato ocasionou o seu
contrato como mestre de balé e mímica da Escola de Ballet Imperial de São Petersburgo.
Um dos registros mais completos sobre a metodologia de Cecchetti está presente
na obra de Cyril Beaumont e Stanislas Idzikowsky: A Manual os the Theory and Practica
os Classical Theatrical Dance (Méthode Cecchetti). Esta obra se baseia nas suas aulas
durante o período que ele ensinou em Londres, de 1918 a 1923 (POESIO; Bennett, 2000).
A Escola Inglesa ou Método Royal Academyof Dance (R.A.D.)
“Londres iniciou sua tradição de ballet com a figura de John Weaver, que pode ser
considerado o criador da pantomima e da escola de dança inglesas” (CAMINADA, 1999:
129). John Weaver (1673-1760) continuou a linhagem desenvolvida por Noverre, de juntar
pantomima a passos de dança, o qual é chamado balé de ação. Ele se dedicou a explorar
a verossimilhança e a imitação da natureza em seus balés e organizou performances de
danças narrativas místicas.
No campo da escrita da dança, nos lembra os autores Goff e Thorp (1991) que
Weaver foi responsável pela tradução, para o inglês, em 1706, do tratado de dança
escrito por Feuillet (“Chorégraphie”). Este tratado era similar ao sistema de notação em
dança que Beauchamp desenvolveu, mas não publicou. A obra traduzida, que se
denominou “Orchesography”, explica as direções, movimentos e passos de dança, e
contêm indicações rítmicas. Foi publicada com o objetivo de tornar acessível o sistema
Beauchamp-Feuillet aos bailarinos ingleses.
Dessa forma, a importância de John Weaver para o desenvolvimento da dança na
Inglaterra está no fato de ele ter sido professor de dança em Londres, onde tentou reviver
a antiga pantomima e difundir os ensinamentos de Beauchamp, através do seu livro
“Orchesography”.
No século XIX floresciam escolas de dança na Inglaterra, porém sem o padrão de
ensino elas passaram a serem questionadas. Muitos professores tinham pouca formação
naquela época. Conforme Mitchell (2001), Philip Richardson, o editor da revista The
Dancing Times publicou um artigo nesta revista, em 1932, dizendo que os motivos da má
qualidade do ensino de dança na Inglaterra, de até então, se devia ao fato de não
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existirem nenhuma escola estatal antecedente naquele local. As escolas estatais eram
referencias, principalmente em relação à sanção proporcionada pelo estado para a
subsistência dos professores. Segundo esta mesma autora, apesar de não haver uma
Escola Real de Dança na Inglaterra, lá havia duas escolas recomendadas: a escola de
Lucia Cormani e a escola de Edouard Espinosa, aberta em 1908. Cormani e Espinosa
foram bailarinos respeitados no final do século XIX e precocemente se tornaram
professores. Mitchell (2001) diz que ambas as escolas adquiriram mérito devido ao status
obtidos pelos bailarinos em suas apresentações teatrais e, por esta razão, pode-se inferir
que os parâmetros para se avaliar a qualidade de ensino da época estava presente na
dança executante das bailarinas e não na metodologia de ensino por elas adotada como
professoras.
Na concepção de Mitchell (2001), Espinosa inventou um currículo denominado
“Operatic Dancing” para a sua escola e, através deste currículo ele ensinou os seus
alunos. Segundo Orrick (2002) o termo “operatic” era usado, nesta época, com o sentido
de “clássico”. Para obter reconhecimento, Espinosa pediu que fosse publicado um artigo
na revista The Dancing Times promovendo o seu programa de ensino de dança e
sugerindo que todos os professores adotassem o seu programa como um manual de
ensino. Esta publicação de 1916 trouxe uma importante repercussão, pois fez com que a
bailarina e professora Adeline Genèe, juntamente com os professores Cormani e Ninette
de Valois, parabenizassem a The Dancing Times pela revelação do professor não
qualificado e sugerissem que o professor devesse ser testado sobre os entendimentos do
referido manual. Esta sugestão foi de grande importância para o desenvolvimento da
qualidade do ensino de balé, pois a partir de então, foi estimulado que houvesse uma
avaliação para que os professores provassem credibilidade. Até que, em 1920, a ideia
vingou quando um pequeno grupo de entusiastas se reuniu e fundou a The Association of
Operalic Dancing of Great Britain (MITCHELL, 2001). Philip Richardson, o editor da
revista The Dancing Times, foi de fundamental importância para a formação desta
sociedade, pois através de seus escritos, em sua própria revista, ele proporcionou espaço
para que a associação fosse ouvida e ganhasse força para lutar pela elevação do status
do professor de dança (MITCHELL, 2001).
Richardson também organizou encontros em que podiam participar professores de
dança, bailarinos e amantes da dança. Nestes encontros eram discutidas questões
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significativas em relação a carreira de professor, contribuindo para o engajamento da
classe da dança. Com o objetivo de fazer algo para melhorar o ensino de dança no país a
associação decidiu formar um comitê composto por cinco personalidades: Miss Phyllis
Bedells, Madame Lucia Cormani, Mr. Edouard Espinosa, Madame Adeline Genée e
Madame Tamara Karsavina (MITCHELL, 2001).
De acordo com Mitchell (2001), cada uma das personalidades do comitê eram
bailarinos e professores de prestígio e representavam as cinco escolas tradicionais de
balé. Da página 12 de sua dissertação, transcrevo de quais escolas originou cada um
deles: “Genéee e Karsavina eram frutos da Danish-French Bournonville School e Imperial
Russian School of Petrograd, respectivamente. Espinosa foi treinado pela escola francesa
e Cormani veio da La Scala Milan. A representação inglesa, Bedells, que foi treinado na
Inglaterra (...)” (tradução nossa). Assim, desta mistura de métodos de balé criou-se as
bases da The Association of Operatic Dancing of Great Britain.
Segundo Mitchell (2001), a primeira iniciativa da associação foi adaptar os
fundamentos do currículo de Espinosa e publicar, a partir destas adaptações, um novo
currículo, que demarcaria a técnica inglesa de dança acadêmica. Esta decisão foi de
fundamental importância para o legado desta técnica de dança, pois a multiplicidade de
nacionalidades dos membros da associação fez necessária uma definição em relação à
nomenclatura dos passos que seria utilizada. Dessa forma, a preocupação do comitê
ainda estava restrita a termos técnicos e não à qualidade dos movimentos a serem
ensinados. Até que, de acordo com Mitchell (2001), após a publicação deste novo
currículo, houve uma reunião em que foi aprovado que, a partir de então, os membros da
The Association of Operatic Dancing of Great Britain (AOD) só poderiam ser aceitos após
comprovarem a compreensão da técnica em um nível elementar. A comprovação seria por
meio de um exame, no qual haveria a demonstração física do plano de estudos presente
no novo currículo. Esta decisão foi considerável para se melhorar a qualidade do ensino
de dança na Inglaterra.
Diante disso, foram realizados exames em formato de aula aos candidatos.
Conforme Mitchell (2001), os primeiros exames da associação foram realizados em 1921
e mediam o nível de capacidade dos candidatos para executarem os movimentos. Se a
execução fossa satisfatória aos examinadores, o candidato poderia fazer parte da AOD e
seria autorizada a sua atuação docente. Assim, percebe-se que a avaliação de
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professores era dada pelo nível executante dos candidatos e não por sua metodologia de
ensino. Este pensamento só foi modificado em 1928, quando o comitê da OAD propôs
que houvesse duas avaliações para os candidatos - uma de formação de executantes e
outra de formação de professores. Mitchell (2001) menciona que a proposta foi colocada
em prática em 1932, em que se iniciou o exame para avaliar a capacidade do professor
para transmitir os ensinamentos aos alunos, sua habilidade para organizar os diversos
passos numa aula e uma prova escrita sobre a teoria do que seria ensinado. Este novo
exame foi um marco para o início da evolução da carreira de professores, pois ele
avaliava tanto os conhecimentos teóricos quanto a metodologia de ensino do professor.
Em 1923 teve início exames de entrada para crianças, ampliando os objetivos da
AOD - que anteriormente eram o de melhorar o ensino de dança para a apresentação no
palco - para aprimorar o ensino de dança para a formação da criança. Esta significante
mudança trouxe desenvolvimento na escola inglesa em relação à metodologia de ensino
de dança para crianças.
Em 1928, a AOD conseguiu, por intermédio da presidente da associação, Genée,
patrocínio da rainha Mary. Esta conquista proporcionou valorização a dança por parte do
Estado, que passou a financiá-la. A visibilidade da dança passou a ser maior na Inglaterra.
Mitchell (2001) afirma que em 1936 o rei George V mudou o nome da AOD para
The Royal Academy of Dancing. Esta mudança mostra a importância que o Estado dava à
dança, pois ele viu a necessidade de ela fazer parte de uma Escola Real de Dança.
Observa-se que, atualmente, existem parcerias entre a Royal Academy of Dance e
as universidades. De acordo com Giersdorf “...a Royal Academy of Dance tem
condições de oferecer ensino da mais qualidade através de uma parceria com a
Universidade de Surrey, e a Universidade de Kent valida a London Contemporary Dance
Schoolno The Place, a um grau academico” (GIERSDORF, 2009, p. 40).
A Escola Russa ou Método Vaganova
Chistyakova, no livro Basic Principles of Classical Ballet (1969) afirma que o
Método Vaganova é o desenvolvimento e o prosseguimento da escola russa de ballet, a
Russian School of Ballet. Esta escola foi fundada por Akim Volynsky, importante crítico de
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balé na Rússia. O início da carreira de Agrippina Vaganova como professora nesta escola
foi em 1918. De acordo com Krasovskaya, em 1920 Vaganova começou a ensinar na
Imperial Ballet School, no Teatro Maryinsky. Esta escola foi fundada em 1738, em São
Petersburgo, pela imperatriz Anna Ivanovna (1693-1740) e recebeu a influência de
mestres italianos e franceses que foram lá ensinar como Carlo Blasis, Jean Baptiste
Landré, Angiolini. Devido à saída de muitos experientes professores destas escolas para
o oeste, Vaganova assumiu as suas classes, formando, aos os primeiros bailarinos
soviéticos como Marina Semenova, em 1925; Olga Iodan, em 1926 e Galina Ulanova, em
1928. Em 1927 Vaganova se tornou diretora artística desta escola.
Em 1934 Vaganova publica o livro Basic Principles of Classical Ballet. Esta
publicação foi de grande importância para o desenvolvimento da pesquisa em dança, pois
é a publicação da codificação de seu método de ensino. Além disso, incentivou publicação
de outras obras relacionadas ao ensino de balé como por exemplo, o livro Classical
Training Methodology, de N. Tarasov’s, A. Chekrygin’s and V. Moritz’s, em 1940. Basic
Principles of Classical Ballet já foi traduzido para vários idiomas, demonstrando o legado
mundial deste método.
A Escola Americana ou o Método Balanchine
Balanchine (1904-1983) nasceu em São Petersburgo, Rússia. Ele era filho de um
compositor e desde criança foi introduzido à música. Aos cinco anos começou a ter aulas
de piano e aos nove anos ele foi aceito na escola de balé da Imperial Theater School, de
São Petersburgo. Ainda adolescente ele se iniciou no trabalho coreográfico. Sua primeira
peça foi um pas de deux que se chamou La Nuit.
Balanchine foi para os Estados Unidos, em 1933, com o objetivo de criar uma
compania de balé clássico. Chegando lá, ele se chocou com a qualidade das escolas,
pois os professores que observou não eram capacitados para darem aulas. Logo ele
concluiu que, para formar uma companhia de balé, ele precisava estabelecer uma escola
para formar os seus futuros bailarinos.
Assim, em 1933 foi fundada por Kirstein, empresário americano, a primeira escola
americana de balé, em Hartford. A escolha do local foi decidida devido ao preço ser mais
barato. Balanchine ministrou aulas nesta escola e desenvolveu um programa de ensino
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com o objetivo de formar bailarinos para a sua companhia. Segundo Wallace (2005, p.5)
todas as pessoas que desejavam fazer as aulas de Balanchine eram bem vindas, de
todas as idades e corpos.
Logo depois, Kirstein decidiu por mudar a escola para Nova York, pois lá haviam
dançarinos com mais potencial. Já em 1934 a escola começou a funcionar em Manhattan.
De acordo com Wallace (2005, p. 6), ao se mudarem para Nova York, Balanchine criou
seu primeiro balé na América, para estudantes dançarem. O balé se chamou Serenade.
Como Balanchine ainda não tinha uma companhia de dança profissional, apenas
estudantes, o balé foi dançado pela primeira vez por estes estudantes. Este pequeno
grupo foi nomeado por Balanchine de School of American Ballet, o American Ballet.
O American Ballet começou a dançar bastante por Nova York e nos trabalhos que
Balanchine coreografava para o Metropolitan Opera. Aos poucos os estudantes do
American Ballet School se tornaram bailarinos profissionais. Até que em 1936 Kirstein
fundou o Ballet Caravan, tendo Balanchine como coreógrafo. O Ballet Caravan era uma
companhia composta por bailarinos profissionais e o American Ballet era uma companhia
composta por estudantes. De acordo com Wallace (2005, p. 7), em 1941 a Metropolitan
Opera precisava de uma companhia de Balé, por isso as duas companhias se
transformaram no American Ballet Caravan. Porém, com a saída de Kirstein para serviço
militar esta companhia se dissolveu.
Com a volta de Kirstein em 1946, foi criada por ele uma pequena companhia
chamada Ballet Society, para dançar os novos trabalhos de Balanchine (WALLACE, 2005,
p. 7). Após dois anos esta companhia, juntamente com a School of American Ballet
formaram o New York City Ballet.
A Escola Cubana ou o Método Cubano
A ideia de se criar a primeira instituição de ensino de balé em Cuba surgiu em uma
das reuniões da Sociedad Pro-Arte Musical de La Habana, a pedido de Natalia Aróstegui,
esposa do então consul de Cuba em Nova York, Don Pablo Suárez. Assim, em 30 de
junho de 1931 surgiu a Escuela de Ballet de Pro-Arte Musical, que contava com o apoio
da burguesia habanera.
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De acordo com Cabrera (2011, p. 19), o professor russo Nicolai Yavorski foi
nomeado diretor da escola. Suas aulas eram realizadas no Teatro Auditorium.
Participavam alunas meninas e jovens, filhas de associados da instituição e outras
pertencentes a famílias de médios recursos. O autor diz que este professor dirigia
bravamente a escola de balé, amava as suas alunas e era querido por elas, e contribuiu
para despertar nelas a vocação pela dança. Após seis meses de escola o maestro
organizou a primeira apresentação de suas alunas, o que causou novidade nas atividades
da Pró-Arte (CABRERA, 2011, p.21).
Conforme Cabrera (2001, p. 20), Yavorski dirigia bravamente a escola e era muito
querido por suas alunas, o que contribuiu para despertar a vocação pela arte na maioria
delas. Ele investia muito em suas alunas, principalmente nas alunas humildes e com
notável potencial, como por exemplo, Alicia Martínes, a famosa Alicia Alonso. A escola não
contava ainda com a presença masculina no seu corpo discente, até que, em 1933,
ingressou na escola o primeiro aluno de Yavorski, Alberto Alonso. Ele logo ganhou papel
de destaque na escola, apresentando, juntamente com as alunas, obras de destaque
como Príncipe Igor e Coppélia.
Em 1935, dois de seus alunos, Delfina Péres Gurri e Alberto Alonso partiram para a
Europa, acompanhados de Yavorski, para se integrarem ao Ballets Russes de Monte
Carlo. Foi assim que “...a escola de Ballet de Pro-Arte possibilitou o surgimento dos
primeiros profissionais cubanos da dança acadêmica” (tradução nossa). Nota-se que em
poucos anos a escola já foi capaz de exportar dois profissionais para uma companhia de
renome, como o Ballets Russes de Monte Carlo, criada pelo Coronel Wassily de Basil e
René Blum, em 1932.
Ao regressar desta viagem, o professor Yavorski encontrou mais rapazes em sua
escola, inclusive o prodígio Fernando Alonso, irmão de Alberto Alonso. Ele coreografou
uma sonata de Bethoven, Claro de luna, para o talentoso Fernando Alonso e Alicia,
marcando a estréia cênica deste em 1936. (CABRERA, 2011, p.23)
Um ano depois, Yavorski preparou para Alícia a sua versão de O Lago dos Cisnes,
o qual ela dançou com Emile Laurens, bailarino profissional do Ballets Russes de Monte
Carlo. A apresentação foi um sucesso e provou o profissionalismo de Alicia, mas a ProArte não oferecia oportunidades profissionais, por isso ela e Fernando Alonso partiram
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para os Estados Unidos.
Com a saída de seus talentos, o professor não mais obtinha o êxito de antes em
seus espetáculos. Em 1938, renunciou de seu cargo, devido a contradições com a escola
e foi substituído por George Milenoff, professor búlgaro que estudou dança clássica com o
mestre russo Nicolai Legat. Milenoff ampliou o número de alunos e se vinculou a um
grupo de criadores cubanos que desejavam desenvolver a atividade teatral no país.
(CABRERA, 2011, p.25)
Em 1940, o Ballet de Pro-Arte estreou uma apresentação de balé com música do
compositor cubano Eduardo Sánchez de Fuentes. O espetáculo se chamou Dioné e
contou com o suporte de Alicia Alonso, que dançou junto aos bailarinos cubanos. O balé
não podia deixar de ser um sucesso! A presença de Alicia prova que, apesar de ela
participar na época de uma companhia profissional americana, o Ballet Caravan, não
perde contato com sua pátria.
Alicia e Fernando Alonso tentaram formar uma companhia de dança em Cuba, mas
logo perceberam que necessitavam primeiramente formar bailarinos com características
artísticas próximas às deles. Assim formaram, em 1950, a Academia de Ballet Alicia
Alonso, tendo como critério a seleção daquilo que mais valorizavam dentro do repertório
de experiências que tiveram com professores russos, italianos e ingleses. De acordo com
Pedro Simón (1973), a partir desses critérios esses profissionais procuraram criar um
método que se adaptasse aos cubanos, levando em consideração o clima, a constituição
física e o caráter cubanos:
Toda uma gama de escolas e estilos coreográficos foram estudados com
um sentido crítico e seletivo por Alicia e Fernando Alonso, que souberam
transformá-los e enriquecê-los para criar uma nova modalidade estilística,
estreitamente vinculada as condições do bailarino cubano, suas
necessidades expressivas e sua forma peculiar de conceber a beleza
dentro da dança (SIMÓN, 1973, p. 53).
Dessa forma, o método cubano de ensino foi sendo formado com a peculiaridade
de adaptar os métodos do balé clássico às características próprias ao povo cubano. Foi a
primeira escola de ensino profissional de balé em Cuba. O balé lá foi ensinado de uma
forma distinta das outras escolas. Apesar disso, Simón (1973) lembra que há uma
proximidade com a escola italiana, pela agilidade dos movimentos dos pés; a limpeza
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técnica se aproxima do método inglês; e a espontaneidade do método francês. Além
disso, há uma identificação com a dança norte-americana, pelo uso de alguns recursos da
dança moderna.
Conclusão
Com esta pesquisa foi possível perceber que os métodos de balé refletem
particularidades de suas culturas. São métodos que valorizam o tipo corporal dos locais
em que eles foram desenvolvidos. Assim, mesmo pertencendo ao grande grupo “Dança
Clássica” possuem especificidades próprias, que se diferenciam e se relacionam. Dessa
forma, são métodos que contribuem para a diversidade dentro do sistema da dança
clássica.
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