Cabo Verde tem espaço fiscal e social para continuar a
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Cabo Verde tem espaço fiscal e social para continuar a
SEXTA-FEIRA, 7 DE NOVEMBRO DE 2008 • ANO XVIII • N° 865 • SEMANÁRIO • PREÇO: 100$00 DIRECTORA: FILOMENA SILVA DIRECTORA: FILOMENA SILVA CRISTINA DUARTE, MINISTRA DAS FINANÇAS Cabo Verde tem espaço fiscal e social para continuar a crescer Cifrão A vitória do sonho americano In Suplemento ACTUALIDADE A BOLHA Promoção nas Forças Armadas ACTUALIDADE Febre de dinheiro ataca Mindelo Pág. 4 Pág. 15 Governo injecta dinheiro na TACV Pág. 2 2 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 ACTUALIDADE BURACO NAS CONTAS DA TACV Governo autoriza um empréstimo de 500 mil contos O ministro do Estado das Infra-estruturas e Transportes, Manuel Inocêncio Sousa, garantiu ao A Semana que o governo vai autorizar um empréstimo à TACV no valor de 500 mil contos, para ajudá-la a resolver os problemas de tesouraria. Este montante vai cobrir um rombo nas contas apresentadas ao Conselho de Administração da TACV e que, segundo a mesma fonte, não constava do relatório que entretanto lhes foi entregue pela administração de Gilles Fillatreault. Foi, aliás, esse montante que o PCA solicitou ao governo, em jeito de apoio de emergência, para solucionar os problemas mais candentes que a empresa está a enfrentar, e que, inclusive podem fazer perigar as operações da companhia aérea de bandeira. O estranho é que apanhado no meio desta “turbulência” financeira que diz desconhecer, o actual PCA da TACV, António Neves, tenha resolvido partir por três semanas de férias no Brasil, isso quando não leva nem seis meses na companhia. CONSTÂNÇA DE PINA O governo de José Maria Neves, através do Ministério das Infra-estruturas e Transportes (MIT), vai autorizar um empréstimo no valor de 500 mil contos à TACV, para ajudar a empresa a sair do atolo financeiro em que se encontra e que está a comprometer actividade da nossa companhia aérea de bandeira. A informação foi confirmada ao A Semana por Manuel Inocêncio Sousa. A medida, que é uma resposta ao pedido de socorro do CA da TACV, vai encontrar o seu presidente, António Neves, fora do país. Este, ao que conseguimos apurar, está de férias no Brasil até o final deste mês de Novembro, data em que, espera, o governo já terá liberado o dinheiro que tanto aguarda para fazer face aos graves problemas de caixa que têm condicionado o normal funcionamento da companhia aérea. Sobre as férias fora de horas do PCA da TACV, uma fonte A Semana mostrou alguma estranheza quanto mais não seja porque este seria o pior momento para Neves abandonar o barco. Aliás, há apenas quatro meses que assumiu a presidência da empresa, que volta a passar por uma das cíclicas crises financeiras. “É curioso que o PCA tenha resolvido ir de férias numa altura em que a empresa enfrenta dificuldades por causa de voos deficitários, inclusive na sua linha mais rentável que é Lisboa, e tem dificuldades para pagar o salário. Penso que Neves utilizou este expediente para pressionar o governo e levá-lo a liberar os 500 mil contos. Aliás, ele ameaçou parar a TACV em Dezembro, caso o governo não atendesse ao seu pedido”, assevera a referida fonte. Manuel Inocêncio, que tutela a área dos transportes, desdramatiza esta questão e lembra que as férias do PCA dependem apenas do Conselho de Administração da TACV que preside, órgão este que goza de autonomia administrativa e financeira. Por outras palavras, as férias deste administrador não precisam ser autorizadas pelo governo. Compromissos financeiros Enquanto isso, os salários dos trabalhadores da TACV, que começaram a ser pagos na semana passada, foram liquidados na totalidade esta semana, o que a empresa fez com recursos e meios próprios. Mas a situação está longe de ser estável. É que, dizem as nossas fontes, os montantes destinados aos salários são exíguos diante dos enormes compromissos com o aluguer dos aviões e a compra semanal de combustíveis que devem ser respeitados. A administração exige, por isso, os 500 mil contos para fazer face a esses compromissos. “Como se não bastasse, a parte operacional da empresa não é das melhores. Um exemplo são os voos de Lisboa, uma das linhas mais rentáveis da empresa, que está deficitária, situação que nem as campanhas promocionais estão a conseguir inverter”. Estes debitam ainda as responsabilidades pelo funcionamento deficiente do departamento operacional da TACV e à má gestão dos novos timoneiros da companhia aérea nacional, encabeçados por António Neves. É que os administradores, frisam as nossas fontes, ao invés de aproveitarem os quadros mais experientes, fecharam-se nos seus gabinetes, tomando decisões não muito correctas em áreas que desconhecem. “Preferem cuidar dos lanches dos pilotos, com fatias de bolo a mais e a menos, ou as quatro sucrinhas, em vez de tentarem fazer grandes negócios e traçarem linhas estratégicas para os novos tempos da companhia”, pontua uma fonte. E essa postura já rendeu alguns dissabores, com os directores de vendas para a Europa, África e América a colocarem os cargos à disposição da nova administração. “Por exemplo, Mário Almeida, que é apontado por muitos como o próximo delegado da TACV em Lisboa, em substituição de Eunice Barbosa, foi um dos primeiros a colocar o cargo à disposição. Ele, que é muito experiente naquilo que faz, foi desautorizado por pessoas que não entendem nada de rotas, nem de vendas e muito menos de aviação civil. Por isso não acredito que ele aceite ir para Lisboa”, aponta outra fonte. Felizmente, a solução para parte dos problemas da TACV parece agora mais próxima com o anúncio feito pela tutela de um empréstimo no valor de 500 mil contos. Mas há quem defenda que a TACV terá de encontrar soluções que passam, por exemplo, por uma gestão nova e digna dos tempos modernos para que não precise recorrer ao governo sempre que a situação se apertar. “A gestão da TACV não pode ser feita à moda antiga, onde o Estado está ao estender de mão para tirar a empresa do aperto. Não, os gestores têm de dar provas de serem competentes para o lugar porque basta de injectar dinheiro na empresa porque está entregue a gente que não entendo e nada de como é gerir uma empresa aérea. Esta administração terá de encontrar soluções que passam, por exemplo, por novas rotas. O problema é como viabilizar essas rotas, se neste momento nem sequer possui responsáveis de vendas com experiência para os seus principais mercados”, concluem uma das nossas fontes. Tentamos falar com a TACV mas, apesar das muitas insistências, até ao fecho deste jornal ninguém da Administração se disponibilizou a responder às nossas questões. 4 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 ACTUALIDADE A marcha das promoções nas Forças Armadas A ascensão na carreira de “forma normal” dos tenentescoronéis Jorge Paulo Moreira e Fernando Carvalho Pereira ao posto de coronel constitui a novidade principal das novas promoções feitas nas Forças Armadas. O despacho de ontem, 6, do Chefe de EstadoMaior, coronel Antero Matos, entra imediatamente em vigor e abrange mais 21 outros militares nas classes de oficiais e sargentos. ALÍRIO DIAS DE PINA J orge Paulo Moreira e Fernando Carvalho desempenham, neste momento, as funções de comandante da Guarda Nacional e Guarda Costeira, respectivamente. Esses dois oficiais passam agora a ser os militares mais graduados na hierarquia das FA, depois do Chefe de Estado-Maior das FA. “A promoção desses tenentes-coronéis a posto de coronel vem na sequência da reforma das Forças Armadas, que aumentou o número de coronéis no quadro de pessoal das FA. Trata-se de uma promoção na carreira que decorreu, pela primeira vez, de forma normal a esse nível, permanecendo os promovidos em funções nas FA”, fundamenta Antero Matos. O despacho também contempla a promoção, por método de escolha, de mais 21 militares nas classes de oficiais e sargento. De majores para tenentes-coronéis, foram promovidos Arsénio Gomes (director do Planeamento Estratégico do CEMFA), Didier Andrade (director do serviços de saúde), Carlos Nascimento Rodrigues (comandante Iª Região Militar de S.Vicente) e Eloy Gomes (comandante da III Região Militar). Este encontra-se em formação na Espanha desde Agosto deste ano. Outros sete capitães ascenderam à categoria de major. São eles: António Vaz, Carlos Dupret de Melo, Armindo Sá Nogueira Miranda, Arlindo Lima, Domingos Rocha, Mário Almeida e Octávio Tavares. A nível de sargentosajudantes, quatro dos quais passaram para o posto de sargento-mor: José Augusto Cabral, Jorge Rodrigues, António Barros e Carlos Varela. Mas as promoções não ficam por aí. Seis sargentosajudantes transitaram para a categoria de sargento-chefe. São eles Teotónio Mendes, Celestino Barros, João Baptista Andrade, Francisco Lopes, Frutuoso de Pina e Cesário Dupret. O tenente-coronel Antero Matos acaba, entretanto, de regressar da Guiné Conakry, onde participou na XXIII Reunião do Comité dos Chefes de Estado-maior da CEDEAO. E uma das decisões saídas dessa cimeira é de que a cidade da Praia deve acolher, no primeiro trimestre de 2009, a próxima reunião desse organismo. Cabo Verde deverá, por outro lado, receber, em Abril, a reunião anual dos Chefes de Estado-maior General dos países da CPLP. Autarcas de Santiago conseguem consenso que não há na ANMCV Os autarcas do PAICV e MpD alcançaram o acordo necessário para eleger uma direcção plural na Associação dos Municípios de Santiago. O edil do Tarrafal, João Domingos (MpD), assumiu a presidência da AMS enquanto o presidente da Câmara de Santa Cruz, Orlando Sanches (PAICV), de Santa Cruz, é o novo vice-presidente dos autarcas da ilha maior. Assim, a AMS conseguiu o que faltou no Congresso do passado mês de Agosto da Associação Nacional dos Municípios de Cabo Verde (ANMCV) em que só o MpD e o grupo independente do Sal integraram as listas dos órgãos directivos dessa entidade. Todos os autarcas expressam que vingou a ideia de partilha do poder no Congresso do último fim-de-semana da Associação dos Municípios de Santiago. Nessa mesma linha de partilha, o pre- sidente da Câmara de São Lourenço dos Órgãos, Victor Baessa (PAICV), foi eleito para presidir a mesa da Assembleia-Geral. Os autarcas de Santiago mostram-se, aliás, satisfeitos com esse harmonizar de posições na direcção plural, com representantes das duas forças autárquicas na ilha, MpD e PAICV. E para fomentar esse clima de harmonia, João Domingos, que substitui Felisberto Vieira resultado de uma liderança do conselho directivo, disse que vai continuar o trabalho do seu antecessor para “cimentar a integração regional da ilha maior de Cabo Verde e promover um desenvolvimento equilibrado dos nove Municípios de Santiago”. Ficou patente que nesse congresso não houve postura radical de nenhuma das partes, pois os autarcas respeitaram “a norma” segundo a qual um partido preside um órgão e a força política adversária comanda o outro. “Os autarcas de Santiago evidenciaram mais maturidade política na hora de eleger esta lista consensual, mesmo porque a pessoa eleita para a presidência do Conselho Directivo (João Domingos) não permitiu nenhuma interferência grosseira do seu partido neste processo”, analisa Orlando Sanches, vicepresidente do AMS. Sanches acredita que a AMS demonstrou “uma postura totalmente diferente da do congresso da ANMCV que teve lugar em Agosto”, no qual o MpD fez valer o discurso de que governava a maioria das autarquias de Cabo Verde, portanto deveria assumir as presidências tanto do conselho directivo como do conselho geral. Mais, o autarca de Santa Cruz entende que a AMS deu um exemplo de “democracia” que a ANMCV deve seguir para evitar a situação de quase ruptura que se vive na entidade que representa todos os 22 municípios. De resto, o nosso interlocutor reitera que os autarcas deveriam aproveitar esse momento para avançar com a proposta de organizar um novo congresso electivo na ANMCV, onde se retomaria a tradição de partilha de poder, existente desde a criação dessa entidade. É que, se os autarcas do PAICV e do MpD não harmonizarem posições, a ANMCV corre o risco de se fragmentar em duas associações com pouca expressão política para discutir o reforço do poder municipal, a revisão das leis das finanças locais ou a proposta de cooperação descentralizada. JAM Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 ACTUALIDADE 5 A Agência de Cooperação Espanhola (AECID) é uma das principiais entidades financiadoras de um projecto quadrienal para capacitar as centrais sindicais dos países da costa ocidental africana. O pacote assinado com a UNTC-CS arranca na segunda quinzena deste mês e inclui a montagem de três centros informáticos e dois estudos sobre a precariedade laboral e Salário Mínimo Nacional (SMN). Espanha financia estudos sobre Salário Minímo Nacional O programa será executado com o apoio financeiro da Fundação Paz e Solidariedade Serafin Aliaga, que é uma parceira das Comisiones Obreras de Espanha, a organização sindical com a qual a UNTC-CS celebrou o convénio em apreço. Este visa reforçar a capacidade das estruturas das centrais sindicais fazendo com que defendam melhor os direitos e interesses da classe trabalhadora. A primeira fase do projecto está avaliada em cerca de seis mil contos. A mesma começa a partir da segunda quinzena deste mês com um primeiro curso de formação destinado a 25 dirigentes sindicais das ilhas de Santiago, Fogo, Maio e Brava. O mesmo prossegue em Dezembro com três outras sessões para capacitar formadores de S.Vicente, Sal e Santo Antão. Isso sem contar com três cursos de monitores e outros tantos sobre técnicas de negociações colectivas. Estes últimos estão previstos para o segundo semestre de 2009. O secretário-geral adjunto da maior central sindical nacional destaca que os dois estudos a serem realizados devem estar prontos até Março de 2009. “Os dois estudos sobre a precariedade sindical e Salário Mínimo Nacional devem ficar concluídos até Março de 2009. Com eles, a UNTC-CS pretende contribuir para a efectiva implementação do Salário Mínimo Nacional em Cabo Verde. Eles vão ajudar-nos a compreender o impacto dos contratos de trabalho nas condições de vida e de trabalho dos cabo-verdianos”. Julião Varela salienta que, no âmbito do mesmo projecto, a UNTC-CS vai também instalar três centros informáticos, na Praia, S. Vicente e Sal. “Estes centros terão como tarefa fundamental auxiliar os formadores sindicais nos domínios das novas tecnologias de comunicação, além de formar os associados da UNTC-CS nessa área”. O convénio assinado entre a UNTC-CS e as Comisiones Obreras de Espanha contempla ainda formação para mulheres sindicalistas, que devem focar questões de género, liderança, higiene, segurança e saúde no trabalho. ADP 8 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 OPINIÃO ONÉSIMO SILVEIRA O REGIONALISMO E O “GONGOM” É óbvio, para qualquer estudioso da Ciência Política, que o Estado que recebemos a 5 de Julho de 1975 tinha de ser, por força das circunstâncias, internas e externas, um Estado rigidamente centralizador. O imperativo histórico retiravanos, por outro lado, a possibilidade de agir com total autonomia na gestação da nossa primeira Constituição. Isso quer dizer que não dispúnhamos de espaço político autónomo, nem tão pouco de meios técnicos e políticos que nos permitissem superar, in limine, o problema essencial da relação entre o país legal e o país real. Sobre o mito da unicidade do Estado Colonial apusemos o selo do monolitismo ideológico, tal como a esmagadora maioria dos países africanos saídos da refrega pela emancipação política e social. O partido único surgiu, pois, como a ferramenta ideal para assegurar a badalada constitucionalidade da unicidade do Estado Cabo-Verdiano. O regime de partido único e as doutrinas políticas que serviam de traves mestras para o seu exercício e legitimação não poderiam evitar, sem fazer o seu próprio hara kiri na praça pública, a transferência e partilha de poder da autoridade central para as ilhas/regiões do País. À imagem do Partido, o poder era também monolítico e indivisível. Dentro deste quadro político e filosófico, a um tempo redutor e asfixiante, o regionalismo seria um acto de sacrilégio tanto político como ideológico, uma vez que postulava afrontosamente a extinção da unidade nacional, tão duramente conquistada. O dogma da unicidade era espada desembainhada contra moinhos de vento. Porque, do ponto de vista histórico, Cabo Verde não precisava então, nem agora, de intervenções Quixotescas para defender a sua estratificada unidade nacional, feita e plasmada durante séculos, e que consiste no somatório das ilhas/regiões com especificidades sócio-culturais próprias. A unidade que se impunha e se impõe ainda defender passa pela defesa da integridade territorial, pelos interesses próprios de cada ilha/região. Como Nação nascemos regionalizados, como Estado estamos condenados a defender o regionalismo geográfico e cultural que dá personalidade própria e nome de baptismo a cada ilha. Mas para o Estado centralizador e burocrático, o regionalismo é um “gongom” que ameaça fragmentar uma nação como a caboverdiana, feita contra a maré da história e cimentada no sacrifício multissecular de todos os nossos progenitores. A História brindou-nos com um quadro regional que o Estado deve preservar e defender. Os Governos, porém, vêm-se socorrendo de subterfúgios financeiros e outros para se furtarem à sua responsabilidade de respeitar a entidade histórico-cultural e linguística que é a ilha/região. A rigidez da A fragmentação do poder aconteceu, mas não a fragmentação da nação e a realidade regional que lhe está subjacente. centralização, mais do que a falta de recursos financeiros e técnico-políticos, constitui em si uma montanha artificial de constrangimentos, aparentemente intransponíveis. Os Governos, porém, só momentaneamente conseguem perturbar o curso da História, que é, ao fim ao cabo, o principal motor do destino temporal das nações. Tal como determinou o advento da filosofia monolítica do poder, a História iria, também, por conjugação de circunstâncias tanto internas como externas, determinar a falência do regime que trazia em si o ADN do momento político da sua gestação. A linguagem dialéctica do breve percurso histórico -de 1975 a 1991-, acabou falando mais alto que o discurso de todos os actores políticos que emprestaram o seu talento e a sua visão, e até mesmo o seu sacrifício pessoal, à causa da independência de Cabo Verde. A fragmentação do poder aconteceu, mas não a fragmentação da nação e a realidade regional que lhe está subjacente. O primeiro sinal de tomada de consciência de uma nova realidade política foi transmitida à nação pelo próprio partido no poder, o qual, ao legislar sobre a criação dos municípios reconhecia a necessidade de partilhar o poder com a ilha/região, sem no entanto assinalar a questão regional. Esta continuava a pairar como sombra maléfica no horizonte políticoideológico cabo-verdiano. A 2ª. República, ao constitucionalizar o Estado de Direito Democrático, criou um novo ordenamento que atribuía, ainda que por implicação lógica, isto é, mais pelo espírito que pela letra, um espaço saliente à questão regional. No sistema político, económico e social preconizado pela Constituição da lavra do MPD, cada ilha é constituída por uma ou várias comunidades locais, que definem a identidade e a natureza dos seus próprios interesses. A dimensão e o carácter do fenómeno regional revelar-se-á, assim, em maior ou menor extensão através do processo de descentralização, apresentado como divisa do sistema democrático. Nesse novo contexto político, a regionalização é uma forma activa de descentralização democrática da administração pública, erigida como princípio superior da organização do poder político. Neste quadro, normativo e programático, a descentralização deve ser tida pela administração pública como o processo, por excelência, que assegura a realização do interesse colectivo. O Programa do Governo de Abril de 1996, no apogeu do consulado do Primeiro-ministro Carlos Veiga, representa um marco histórico no tratamento da questão regional pelo Poder Central. Depois de preconizar o incentivo e o apoio ao associativismo intermunicipal, como instrumentos susceptíveis de gerar formas superiores de organização autárquica, o Programa do Governo, num voo de elevada inspiração político-administrativa, deixava implícita a existência do fenómeno regional e assumia, no âmbito do planeamento, o desenvolvimento de planos regionais centrados na entidade ilha/região, e na dinamização do Conselho para os Assuntos Regionais. Este conselho, baptizado de “verdadeiro fórum nacional democrático de reflexão e apreciação sobre as questões de relevante interesse nacional” foi, infelizmente, um nado morto que não dispôs nem de tempo nem de oportunidade para encarar de frente o “gongom” do regionalismo. De forma surpreendente, Carlos Veiga se recusou a transpor as fronteiras da mera conceptualização regional e embarcou num programa de alargamento do poder centralizado mediante a criação da figura do Governador Civil, que não deixaria de contribuir para a sua queda e derrota na sua primeira corrida à Presidência da República. O actual Governo de José Maria Neves já buliu também na questão regional, tendo, neste contexto, proposto a apresentação da regionalização administrativa. Porque, até ao momento, não dispomos de dados que nos permitam uma análise valorativa, avançamos cautelosamente a hipótese seguinte: tendo como pressuposto os “grandes” investimentos técnico-políticos e técnico-financeiros que uma regionalização política certamente acarreta, o actual Primeiro Ministro terá decido enveredar pelo caminho da prudência, evitando, desse modo, as consequências negativas que poderiam resultar da assunção imediata de um programa de regionalização política, com partilha de poderes e responsabilidades com a ilha/região. Perguntamos: a regionalização administrativa, conceitualizada pelo actual Governo, constituiria uma barreira ou um passo em frente rumo ao regionalismo político? Fugir à regionalização política não constituiria uma maneira subtil de querer driblar o “gongom”?. A constituição arquipelágica do nosso País leva o comum dos cidadãos a pensar, até mesmo a intuir, que a regionalização é imperativo de democracia, já que esta além de política é também representativa, económica e social. O quadro da evolução histórica e cultural de cada ilha aponta para especificidades que enformam a nossa nação, feita de ilhas/regiões e diasporizada. São essas especificidades que impõem, por seu turno, uma conceptualização inequívoca do regionalismo como condição para a sua constitucionalização. Só desta forma seremos capazes de reduzir as assimetrias e as conflitualidades que se vão acumulando entre o país legal e o país real. Neste momento existe uma janela única de oportunidade para fazer avançar a questão do regionalismo em Cabo Verde. À proposta de regionalização administrativa do Governo, Carlos Veiga vêm assinalando a necessidade de autarquias supramunicipais fazendo renascer um aspecto de grande importância do Programa do Governo de 1996, altura em que se encontrava à frente do Executivo. A essas duas iniciativas, a de José Maria Neves e de Carlos Veiga, junta-se ainda a do Presidente do MpD, Eng. Jorge Santos, que, embora sem entrar em particulares, propugna a integração da questão regional no programa do seu partido para as legislativas de 2011. Ao fazer avançar a causa do regionalismo, outra coisa não fazemos senão levar o nosso regime democrático a aproximar-se, territorial e culturalmente, da sua base social, eliminando desse modo as discrepâncias alienantes que actuam como elemento perturbador do nosso sistema político. Havendo vontade política, as pedras dos recursos se transformarão em pão da realidade. Porque a República fundamenta-se na virtude, e o medo é a cara do despotismo, o que não acontece felizmente em Cabo Verde. O que equivale a dizer que os representantes do povo nunca deviam temer o povo que representam. O equacionamento da questão regional, reforça a unidade da nação cabo-verdiana e não se compraz com o centralismo burocrático. É, pelo contrário, mais um selo de ousadia que colocamos no futuro de Cabo Verde e na nossa Democracia. Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 ACTUALIDADE Será 9 Facto da semana Orçamento da Câmara de São Filipe ultrapassa os 600 mil contos A proposta de orçamento do município de São Filipe para o ano económico de 2009 ultrapassa os 600 mil contos. A mesma deverá ser submetida no final deste mês à Assembleia Municipal para aprovação. Este representa um aumento de mais de a 24 por cento em relação ao orçamento de 2008. Um programa vasto que cobre todos os sectores de vocação municipal, e onde a juventude e o ambiente surgem elementos estratégicos do desenvolvimento. Caso a proposta venha a ser aprovada pelos eleitos municipais, a maior fatia do orçamento vai para o sector de investimento, o orçamento passa de 483 mil 840 contos (2008) para mais de 600 mil contos no próximo ano. Segundo o presidente da Câmara de São Filipe, Eugénio Veiga, o plano de actividades e o orçamento vão priorizar a conclusão das obras iniciadas. Prevê também uma forte intervenção no sector cultural. Mobilização de meios para valorizar as potencialidades da ilha e do município são outros eixos de intervenção. A possibilidade de transferir mediante a justa compensação do património municipal de energia, as receitas mobilizadas junto de parceiros da cooperação descentralizada para a execução do projecto de extensão da rede de água de Inhuco a Campanas de Cima, e a construção de mais moradias sociais no concelho são outras especialidades deste novo orçamento para o município de São Filipe e que saiu reforçado em mais 100 mil contos. Aconteceu Praia acolheu workshops sobre micro-finanças A Federação das Associações Cabo-verdianas que operam na Área de Micro-Finanças, FAM-F e a Planet Finance Brasil em Cabo Verde realizaram na passa terça-feira, dois workshops, um sobre “Microfinanças como Política de Inclusão Socio-económica e de Redução da Pobreza” e outro que versava sobre “O Desafio das Microfinanças na Busca do Equilíbrio entre o Social e o Económico”. Os workshops aconteceram na cidade da Praia. Os workshops foram utilizados para divulgar conceitos de Microfinanças tais como: “Políticas de Inclusão socioeconómica destinada à camada mais carenciada”; “o papel de cada interveniente e os factores de sucesso e de fracasso de uma política governamental”; e “os desafios para as Instituições de Microfinanças na busca da sustentabilidade”.A palestrante foi a brasileira Silvana Parente, especializada em Políticas Públicas, Desenvolvimento Económico Local e Combate à Pobre Não houve fumo branco para a reforma da justiça O debate sobre a reforma da Justiça no Parlamento acabou mal. Os deputados do PAICV e do MpD não se entenderam durante a sessão plenária e perderam, assim, a oportunidade de aprovar um pacote legislativo que pretendia reorganizar o sistema judiciário: dotar o país de mais e melhores tribunais para reduzir a morosidade da justiça, consolidar a independência dos juízes, alargar o Supremo Tribunal da Justiça de cinco para sete magistrados. Os argumentos do governo de que era “urgente” aprovar esse pacote legislativo porque só ele podia dar uma resposta ao “grave problema” de morosidade da justiça em Cabo Verde não convenceram o partido ventoinha. Os deputados do MpD primeiro condicionaram a aprovação da reforma a um encontro entre o líder daquele partido, Jorge Santos, e o presidente do PAICV, José Maria Neves; depois, talvez temendo ficar mal na fotografia, defenderam a ideia de que as propostas de lei não podiam avançar sem uma revisão constitucional. Ao longo do debate, as bancadas dos dois maiores partidos mantiveram posições irredutíveis: o PAICV acusava o partido ventoinha de bloquear a reforma, enquanto o MpD ripostava dizendo que o governo, encima dos joelhos, apresentou um diploma com “muitas deficiências”. E assim não houve diálogo possível, e o MpD inviabilizou a primeira proposta de lei: os 23 deputados ventoinhas presentes na sala abstiveram-se e os votos favoráveis de 37 parlamentares do PAICV e do deputado da UCID, Lídio Silva, não foram suficientes para alcançar os dois terços necessários para aprovar a proposta (eram precisos 41 votos a favor). Face a este “bloqueio” inicial, o governo retirou da agenda os estatutos dos magistrados judiciais e do Ministério Público. O executivo de José Maria Neves entendeu que depois do primeiro chumbo não fazia sentido debater as restantes propostas de lei, mesmo porque são diplomas complementares. Certamente, poucos cabo-verdianos compreenderão por que motivo a bancada do MpD “bloqueou” a reforma da justiça quando todos, principalmente os políticos dos partidos da oposição, criticam a morosidade dos tribunais e /ou realçam a urgência que é consolidar a independência dos juízes, alargar o Supremo Tribunal de Justiça e acelerar a realização da justiça. Os políticos criticam os magistrados, mas na hora que tiveram a hipótese de legislar para reorganizar todo o sector, os interesses partidários falaram mais alto. Mas, quem já disse que lógica dos políticos nem sempre ou quase nunca coincide com a perspectiva do cidadão comum? Na verdade, tanto o governo como a bancada do PAICV admitiram que os diplomas apresentam “algumas imper- feições” porém, salientou o deputado da UCID, Lídio Silva, eram questões ultrapassáveis durante o debate na especialidade. De nada valeram os argumentos da parte do governo, da bancada tambarina ou da própria UCID de que o importante era dotar Cabo Verde e os cabo-verdianos de uma melhor justiça. Desse jogo de empurra-empurra, a única coisa positiva a ressaltar é o facto de deputados de ambas as bancadas admitirem discutir a revisão constitucional já no primeiro semestre de 2009. Uma revisão que poderá, entre outras coisas, flexibilizar a organização do sector de justiça e fazer avançar o processo de composição do tribunal constitucional. Mas quem vai mais acreditar no timing dos políticos, se esse timing subverte a própria lógica da vida democrática? Sim, porque ainda Cabo Verde vive em dois tempos, o tempo das partidas e dos seus interesses em presença. E nunca o tempo de um país que para avançar e ser efectivamente um “Estado democrático e de Direito” deve responder ao calendário do cidadão que elegeram os políticos, as bancadas e que sustenta um parlamento para o servir. Agora, os observadores esperam que, refeitos das divergências que levaram ao chumbo do pacote legislativo referente à reforma da justiça, a proposta de revisão da Constituição não seja mais uma forma de empurrar com a barriga mais uma urgência de Cabo Verde. 10 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 OPINIÃO ANTÓNIO NEVES CORRERIA DESENFREADA E TOPADAS S egundo as circunstâncias, começar certas actividades cedo ou tarde demais tanto pode ser bom como mau. Em relação aos estudos, é ponto assente que a criança deve começar cedo, desde que os pais tenham em conta normas pré-estabelecidas; no atletismo, a maratona, por exemplo, tem um tempo certo para o sprint, a fim de evitar que o cansaço faça com que o atleta não atinja o seu objectivo de vitória. Estou a lembrar-me de dois casos políticos que encaixam bem nestas reflexões. Ao carregar no acelerador a desoras, fruto de excessiva ansiedade de chegar ao poder, um ex-líder do MpD e candidato a PM deitou tudo a perder. Arrancou cedo com uma bombástica denúncia, a bradar que estava em preparação uma onda de fraude eleitoral generalizada, quando chegou ao momento da verdade o homem já estava sem canelas. Foi derrotado sem apelo nem agravo, o seu colega candidato a PR apanhou por tabela. E depois foi o que se viu: os dois chamaram a “polícia”! O outro caso, ainda fresco na memória dos sanvicentinos e não só, é o do candidato de última hora. Estou a falar das últimas eleições autárquicas, em que esse candidato retardatário chegou a atingir o topo do top. Caiu de pára-quedas no xadrez das eleições em S.Vicente já depois da hora da ceia, dizendo (com fingida humildade), que se contentaria com um cargo de vereador, mas convencidíssimo de que a vitória era “favas contadas”. O resto é conhecido: tentou forçar entrada na frente da fila porque não podia sujeitar a colocar-se no rabo. O “amo”, que não estava para meias-medidas, nem sequer quis ouvir as razões do atraso. Passou-lhe uma guia de marcha atrás, com o averbamento de voltar, se bem entender e Deus quiser, nos próximos quadriénios. Na política partidária ou se movimenta de cronómetro em punho ou se deita tudo a perder. Exemplos é o que não falta, visto que alguns políticos tão depressa se metem à frente da carroça ou avançam a passos de caracol. Nessa actividade, aliás, as coisas acontecem quase sempre às avessas: mete-se pressa lá onde se exija muita calma e reflexão, para logo de seguida carregar no freio quando se deveria acelerar. Os importantes Diplomas inadiáveis que estão em discussão, dos quais o sobre funcionamento dos tribunais acaba de se travado no Parlamento pelo “senhor consenso”, é um exemplo de como não se O “assassinato” político de Felisberto Vieira, ex-presidente da CMP, está, como é óbvio, a cargo do seu sucessor Ulisses Correia e Silva. Tudo indica que o melhor que Cutisse fez nesses primeiros 5 meses do mandato foi aproveitar as mínimas oportunidades para denegrir o trabalho feito por Filú... deve utilizar os “pedais”. Como diz o slogan: quem pode, pode, e neste caso o MpD é que pode! Quando estão em causa importantes questões de regime, em que são necessários dois terços dos votos dos Deputados para a sua aprovação, aparece o líder da minoria a exigir (soa à chantagem!) que ou o PM se descubra (tirar o chapéu) perante ele ou não haverá acordo parlamentar, é porque está de cabeça perdida, julga que pode tudo (o tal “quero posso e mando”) ou então precisa acertar o cronómetro! Com tanta experiência que existe por aí, os nossos políticos continuam avessos em extrair ilações. Actuam como quem entra num negócio de alto risco sem um plano de viabilidade, o que é tão perigoso quanto deitar dinheiro de solda. Só assim se entende o ataque cruzado do MpD em todas as frentes, a desperdiçar munições em correrias, desenfreadamente, por atalhos escorregadios em época das chuvas, sujeito a apanhar topadas. Na ânsia de testarem as suas chances quanto antes, os ventoinhas instalaram cedo a sua diabólica estratégia de “assalto” ao poder, posta à vista de todos os que querem ver. Os métodos utilizados, uma espécie de desatino, quanto a mim são reprováveis. Pergunto-me, como é que do task force que pôs o plano em marcha, onde sobressai um cariz de puro desespero e que consiste em atacar em todas as frentes, de forma indiscriminada, ninguém foi capaz de chamar os colegas à razão? O que ressalta logo do suposto plano - oxalá seja vã! - é a tentativa de liquidação política, de uma assentada, de alguns dos mais eminentes potenciais candidatos tambarinas com brindes de corrupção. Um facto que nem aos distraídos passa despercebido, embora se assemelha a um autêntico trabalho laboratorial. Nesse âmbito, li uma entrevista que mais parece obra de principiante que, sem ter ainda passado pela dura experiência da praxe, tem já a pretensão de dar nome aos bois. Talvez devido a minha ignorância em matéria de currais não consegui descortinar, em várias respostas confusas, qual o nome dado aos animais. Dizer que “José Maria Neves está politicamente sem ideias e que fugiu ao debate com Jorge Santos”, é dose cavalar capaz de adormecer qualquer manada! Por outro lado, o entrevistado diz: “Mas temos um Governo que não se preocupa como nós, e pensa que, só pelo facto de fazer uma estrada asfaltada, já está a promover o desenvolvimento. Não está! É nesse aspecto que eu digo que o Governo não está a conseguir fazer a tal questão política nas pessoas, nos empresários, nos cidadãos, porque, efectivamente, esses podem agora potencializar as políticas” (o sublinhado é meu). Não há dúvidas de que as várias passagens como esta, das quais tenho dúvidas se entendi alguma coisa, em vez de dar nome espantam os bois. Em relação a JM Neves, candidato nato e de peso indiscutível no xadrez político nacional, em qualquer das frentes em 2011, Jorge Santos já esgotou os adjectivos pejorativos com que tem vindo a qualificá-lo. O estrondoso alarido sobre a incineradora e lixo tóxico, vindo de um aspirante a PM (e da forma como veio), ilustra bem até que ponto o desejo desmedido de atingir o poder pode levar. Porque uma coisa é solicitar que seja dado um esclarecimento público à si e à sociedade, outra bem diferente é o grande alvoroço provocado, deliberadamente. Bradar, numa assembleia alargada de militantes do seu partido, na presença de órgãos de comunicação social, incluindo a televisão, que o Governo tem estado a negociar a incineração de lixo tóxico importado em duas localidades da ilha de Santiago, pautando tudo pelo seu compêndio de corrupção (JS adoptou esse slogan no início da sua liderança e parece que tenciona levá-lo até ao fim), pode transmitir uma espécie de irracionalidade que ultrapassa a mais elementar falta de sentido de Estado. É desse modo que o MpD pretende eliminar potenciais candidatos, ganhadores? O “assassinato” político de Felisberto Vieira, ex-presidente da CMP, está, como é óbvio, a cargo do seu sucessor Ulisses Correia e Silva. Tudo indica que o melhor que Cutisse fez nesses primeiros 5 meses do mandato foi aproveitar as mínimas oportunidades para denegrir o trabalho feito por Filú, através de palavras e actos administrativos, tais como demissões e transferência de trabalhadores camarários, confiscação de terrenos cedidos pela anterior Câmara acusação de corrupção, etc. Porém, como diz o nosso povo que tem sempre razão, “cada catchôrre tem sê sexta-fêra”! Os ataques cerrados do MpD aos altos dirigentes do PAICV, acompanhados de toda a espécie de acusações, numa altura em que os partidos começam a inventariar os seus generais para futuros combates, podem ser tudo, menos coincidência! Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 AGENDA POLÍTICA 11 PAICV vai criar região política especial da Praia O PAICV na Praia vai ser reestruturado segundo uma “região política especial”, cuja Comissão Política Regional será eleita, de forma directa, em Janeiro de 2009. Junto das bases conhece-se já alguma movimentação para mudar a liderança de José Maria de Pina. ALÍRIO DIAS DE PINA S eis meses depois da derrota sofrida nas autárquicas de Maio, o PAICV na Praia volta a dar sinal de vida. Bastante criticado pela sua última prestação naquele pleito o Sector Autónomo está à procura de uma nova forma de organização na capital, algo que poderá passar pela criação de uma “região política especial”. “Estamos a reflectir para reestruturar o distrito metropolitano da Praia como uma região política especial, que será dividida em mais dois sectores. Estes abrigarão zonas distintas de intervenção e terão as suas respectivas estruturas e direcções”, perspectiva o primeiro secretário concelhio cessante. José Maria de Pina lembra que o figurino em debate tem em conta o estatuto especial a ser adoptado para a Praia e o estabelecido nos estatutos do PAICV aprovados no último congresso ordinário. “Mas seja qual fôr o figurino a ser adoptado para a região política especial da Praia, ele terá que ter o aval da cúpula do partido”, afirma. Pina salienta, outrossim, que a prioridade neste momento é terminar os trabalhos internos para reorganizar o PAICV na Praia, um processo que deve culminar com o término do recenseamento dos membros iniciado a 25 de Outubro e vai até 10 de Dezembro próximo. “Depois disso vamos realizar, provavelmente em Janeiro de 2009, a eleição directa do presidente, da Comissão Política Regional e demais órgãos dirigentes. Serão também eleitas as direcções dos sectores, estas em conferências a serem realizadas para o efeito”. Responsabilizado pela prestação do PAICV na Praia durante as autárquicas de Maio, José Maria de Pina reafirma que não será candidato a um próximo mandato, da mesma forma que garante que não faltarão pessoas com grande capacidade para dirigir o partido na Praia. E um grupo de activistas já está a movimentar-se junto das bases no sentido de con- tribuir para o surgimento de uma alternativa a José Maria de Pina. “O grupo existe e está a trabalhar desde a última conferência, que elegeu, sem o seu acordo, a actual equipa de José Maria de Pina”. O referido grupo, soube A Semana, integra os críticos da actual equipa dirigente do sector, como Nuno Duarte, Celestina Mascarenhas, entre outros membros do Sector Urbano da Praia. “Essa equipa está trabalhar para conseguir um líder forte para a capital, tendo em conta a derrota sofrida pelo PAICV nas autárquicas de Maio deste ano e ainda preparar o partido para as eleições legislativas e presidenciais que se aproximam”, deixa escapar um dos envolvidos no processo. Este assegura que o grupo conta com o apoio político do ex-edil da Praia, Felisberto Vieira, que não será, no entanto, candidato à liderança da futura Comissão Política Regional da Praia. 12 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 CORREIO DAS ILHAS O fantasma das offshore Por: Catarina Abreu C abo Verde foi o epicentro de um terramoto financeiro em Portugal, que levou à nacionalização do BPN devido a um rombo de 700 milhões de euros, provenientes de operações financeiras “duvidosas”. Metade desse dinheiro (cerca de 360 milhões de euros) passou pelo nosso arquipélago, através do Banco Insular, uma instituição financeira internacional (IFI) instalada na Praia em 1997 e que é controlada pelo BPN (antes pertencia à Sociedade Luso de Negócios) desde o início deste ano. O escândalo, querendo ou não, beliscou a imagem do país e fez mais uma vez surgir o fantasma das offshore entre nós pois, afinal, Cabo Verde corresponde ao estereótipo de paraíso fiscal: ilhas onde vigoram os incentivos fiscais para este género de IFI. Mas é exactamente este género de “carimbo” que a revisão da lei de branqueamento de capitais, aprovada pelo Conselho de Ministros na semana passada e que será levada ao Parlamento brevemente, quer combater. Em entrevista ao A Semana (ver suplemento), Cristina Duarte, ministra das Finanças, afirma que “o processo de construção e afirmação de praça financeira internacional tem dois grandes pilares: o pilar da credibilidade e o pilar da competitividade fiscal. Nós sempre dissemos que não queríamos que Cabo Verde fosse um paraíso fi scal”, afi rma categoricamente a governante. Nesse sentido, este pacote legislativo vai “tornar a malha mais estreita”, fazendo com que Cabo Verde seja menos permeável à lavagem de dinheiro. O bem e o mal Offshore. A expressão remete-nos logo para a ideia de paraísos fiscais onde se branqueia dinheiro, o que em nada abona a favor do bom-nome do país. Este é o lado mau. Contudo, são esses offshore que estão na base de grandes infra-estruturas em Cabo Verde, por serem, elas, as IFI, que detêm capacidade financeira para “bancar” estes projectos, nomeadamente os ligados à imobiliária turística, estradas e aeroportos. Mas antes de chegarmos ao papel dos IFI na nossa ecomomia emergente, é necessário clarificar conceitos. Em Cabo Verde já não se usa o termo “offshore” na nomenclatura institucional, devido ao seu estigma negativo, explica João Fidalgo, director do departamento de supervisão das instituições financeiras do BCV. “O que existe no nosso país são instituições financeiras internacionais (IFI)”, afirma. Cabo Verde tem 13 IFI, quase todas de origem portuguesa: Banco Insular, Banco Fiduciário Internacional, Banco Internacional Trading, Banco Português de Negócios, Montepio Geral Cabo Verde, Aurigest, “Banco Espírito Santo - sucursal financeira exterior CV”, Caixa de Crédito Agrícola Mútuo - sucursal financeira exterior CV, Banco Privado Internacional, Eurofin, Banco Internacional de Investimentos e o Banco Sul Atlântico (o único angolano, ligado ao BAI). E agora estão mais dois na calha: o Atlantic International Bank, de Gualberto do Rosário, e o Ecobank (ambos ancorados na costa ocidental de África). Existem três modalidades para se constituir uma instituição deste género em Cabo Verde: as controladas (que são participadas maioritariamente por uma outra instituiçãomãe, geralmente sedeada noutro país), as sociedades autónomas (que são constituídas em território nacional e obedecem ao direito cabo-verdiano) e as sucursais (que são representações). Para que as IFI se fixem no nosso país têm que ser autorizadas pelo Banco de Cabo Verde e pelo Ministério das Finanças. Dentro dos critérios de avaliação destas entidades está a sua composição dos accionistas. Pelo menos 15% do capital social tem que pertencer a um sócio sedeado num país da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). É que passando pelo crivo desta organização, que tem regras fiscais assertivas, a nova instituição fica mais credível. Se esta for a situação, o capital mínimo obrigatório do banco exigido pela jurisprudência cabo-verdiana é de 150 mil contos. Caso contrário, o capital social dobra. As IFI são também obrigadas a um investimento nos títulos do tesouro cabo-verdiano num mínimo de 50 mil euros. Quem supervisiona estas instituições é o BCV, entidade reguladora fi nanceira em Cabo Verde, através de questionários, inspecções dos registos contabilísticos e dos procedimentos, e a troca de informações com as autoridades de supervisão dos países de origem destes bancos. Exemplo disso foi a estreita colaboração entre os bancos centrais de Cabo Verde e Portugal nas investigações à contabilidade do BPN/Banco Insular. Fidalgo explica que “até 2017, Cabo Verde prevê incentivos fiscais para as IFI o que faz com que as aplicações financeiras sejam mais rentáveis”. Para este responsável, “Cabo Verde só tem a ganhar em termos de emprego e de infra-estruturação, já que estas instituições financiam muitos dos projectos no nosso país. Por exemplo, o BES financiou o Aeroporto da Boa Vista e a Caixa de Crédito Agrícola Mutuo está por trás de várias obras nos municípios cabo-verdianos”. A Tecnicil, uma das maiores empresas imobiliárias do país, é um dos principais clientes do Banco Insular. Aquele responsável do BCV salvaguarda, contudo, que o “segredo” para controlar as operações das offshore e fazer com que estas não manchem a imagem do país está no Banco Central, cujo trabalho de supervisão deve assegurar que todas as leis sejam rigorosamente cumpridas. O facto de o BCV ter alertado, desde Março, o Banco de Portugal para a situação do BPN é algo que só joga a seu favor. Outro dos problemas da existência das offshore é a eventual concorrência desleal que estas fazem aos bancos comerciais. É que as IFI têm muito menos obrigações fiscais e custos com o pessoal que os bancos comerciais que torna menos competitivos. João Real Pereira, presidente do Conselho de Administração do BCA, em entrevista ao CIFRÃO no ano passado, já alertava para essa concorrência “desleal” aos bancos on shore feita por operadores que estão colocados fora da Cabo Verde, os offshore, que como as IFI, andam a competir com os bancos instalados no país na hora de oferecer financiamento às empresas cabo-verdianas. O caso do Insular Um buraco de 700 milhões de euros levou a que o Estado português declarasse a nacionalização do Banco Português de Ne- Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 CORREIO DAS ILHAS ANTÓNIO LUDGERO CORREIA 13 LUDGERO CORREIA UMA ESTÓRIA DE CEGOS, SURDOS E MUDOS “ A coisa mais fraca de todas as coisas fracas é uma virtude que não tenha sido ainda testada no fogo.” MARK TWAIN S gócios, para salvar a instituição “e proteger os interesses dos clientes desse banco”. Mas nesse buraco que só agora vem a público cerca de 360 milhões de euros terão passado pelo Banco Insular, offshore do BPN, através de operações “questionáveis que não estavam contabilizadas em lugar nenhum”. Em comunicado o Banco Insular, que pertence ao grupo BPN desde o início deste ano, diz que “foi inteiramente alheio às aludidas operações irregulares, que ignorava totalmente”. Acrescenta ainda que “nacionalização do BPN resulta para o Banco Insular um acentuado reforço da sua solidez, pois se dissipam quaisquer riscos de incumprimento das suas obrigações”. O governador do Banco de Cabo Verde, Carlos Burgo, foi chamado esta semana ao Parlamento para explicações. empre acreditei que sendo o Mercado cego, surdo e mudo aos problemas que os seus próprios processos geram, competia ao Estado estar de olho vivo, ouvidos abertos e de megafone na mão, para evitar o caos social que pudesse advir do autismo do Mercado, rei e senhor. Mas em boa verdade, o senhor Mercado só é insensível aos problemas dos outros. Agora é vê-lo, perante o precipício que se abriu à sua frente, e atento aos clamores dos seus pares, gritando a plenos pulmões por ajuda. De quem? Do Estado. O senhor Estado, aquele mesmo senhor que, fanático pelas virtualidades da economia de mercado, fez orelhas moucas às tropelias do mercado e às súplicas das suas vítimas. Afinal, esta é uma estória de cegos, surdos, mudos e paralíticos que afinal vêem, escutam, berram e se movimentam... quando lhes convém. O mercado, arrogante e auto-suficiente, acreditando que pode tudo, e que agora se prova ter sido inconsequente; e o Estado, crédulo e irresponsável, que abdicou de grande parte da sua autoridade em favor do Mercado. Resultado: uma grande salgalhada. E para salvar o Mercado, o Estado lança agora mão de soluções que abomina e que vem condenando há décadas. Mas o mais chocante é saber que quem vai pagar a factura é o Zé Povinho - o único que nunca viu a cor do dinheiro volatilizado. Eu até compreendo o comportamento do mercado. É típico: qualquer besta, deixada com as rédeas soltas, toma o freio nos dentes e sai correndo desembestado. Até à exaustão... se antes não lhe aparecer um precipício pela frente. E a culpa não é, obviamente, da besta, mas daquele a quem competia manter as rédeas firmes e regular o freio. No caso, o senhor Estado. A propalada, e unanimemente apoiada, saída do Estado da economia, tinha a ver com o papel de operador que vinha desempenhando (de forma insatisfatória, diga-se em abono da verdade) e com algumas soluções administrativas que impunha à economia (contranatura, portanto). O dever e a obrigação de garantir que o mercado não se transformaria numa selva, onde imperaria a lei do mais forte, mantinham-se intactos. Diria mesmo que, em consideração aos mais fracos, a vigilância devia ser tomada muito a sério. E não foi. Falhou muita coisa na passagem do Estado operador e interventor ao Estado Regulador. Não me atrevo a escalpelizar a passagem ao nível global, mas, à luz da curta experiência cabo-verdiana, sempre podem ser tiradas algumas ilações. Uma autoridade reguladora, para ser ágil, eficaz e efectiva, precisa escorar-se em, pelo menos, três bases: um quadro normativo moderno e claro; um quadro de competências amplas e inequívocas, capazes de outorgarem aos reguladores os necessários poder e autoridade; um corpo de reguladores capazes de se assumirem como verdadeiros magistrados (no sentido mais nobre do termo). Um investimento em benchmarking, mormente para quem esteja ensaiando os primeiros passos, pode também ser decisivo. Mas as bases têm de funcionar cumulativamente. De nada serve, por exemplo, ter-se um quadro normativo claro e um quadro de competências amplas (amovibilidade garantida e tudo) se o regulador se revelar canhestro, tímido, burocrata ou simplesmente cobarde. Daria cabo de tudo. Por outro lado, também de nada serviria recrutar uns nec plus ultra para a regulação, se o quadro de competências for restrito e castrador. Pode acontecer ainda, depois de uma boa experiência de benchmarking, o regulador se meter a reproduzir, acriticamente, o que viu ser feito lá fora, com consequências imprevistas. E põe-se ainda a questão do modelo da regulação em si: Vital Moreira manifestou, há coisa de três meses, numa Conferência na Cidade da Praia, algumas reservas em relação à regulação do sector financeiro pelo Banco Central. O BC não deixa de ser um banco, uma instituição financeira, o que poderia dar azo a algum corporativismo. E há indícios preocupantes: (i) não escapa aos mais avisados que há por aqui um banco comercial que é «mais igual» que os outros e que dita regras para os demais; (ii) apesar de se ter feito um escarcéu dos diabos, durante muito tempo as agências de viagens seguiram ditando a taxa de conversão do dólar a aplicar no cálculo dos preços dos bilhetes (o dólar rolava ladeira abaixo, mas nas agências a cotação do dólar mantinha-se colada à do Euro); (iii) pessoalmente, denunciei um modelo de declaração que um banco da praça dá aos clientes (e aos seus avalistas e fiadores) a assinar que é um verdadeiro atentado à liberdade dos visados, mas a autoridade reguladora não tugiu nem mugiu; (iv) meio mundo reclamou já da famigerada taxa de expediente (400$00, mínimo) que se debita para cobrar um juro de 7$00, mas o regulador continua quedo e mudo; questiona-se que, com o nível das tecnologias de informação e comunicação de hoje e da plataforma (a mesma) onde os bancos comerciais se movimentam, só se possa movimentar uma conta a débito 24 horas depois, em caso de depósito em numerário, e 48 horas depois, no que ao cheque diz respeito (a compensação garante a boa cobrança já no final do dia), mas o regulador permanece cego. Escutam-se queixas de que as seguradoras aproveitam (quando não inventam) mil pretextos para pagarem menores prémios (ou não pagarem) e a autoridade reguladora mantém um silêncio confrangedor; a lei diz que as seguradoras têm direito de regresso em relação aos prémios que pagam quando o condutor que provocar o acidente age com dolo; e vão as seguradoras de dar o significado que lhes convém ao conceito de «dolo», exigindo pagamentos indevidos (esquecendo ou fingindo não saber que o Código Penal define quando é que se considera haver «dolo»), e o regulador... cego, surdo e mudo. Enfim, um mundo de «pequenas coisas» que clamam pela intervenção da autoridade reguladora do sector e que ficam em águas de bacalhau. Alguém acredita que não haverá também «grandes coisas» sendo objecto do mesmo laissez faire, laissez passer? Até que um dia a casa venha abaixo. E será então chegado o momento de fazer as vítimas pagarem pelos seus algozes. Como vem acontecendo por esse mundo afora, nesta crise provocada. A Regulação, sendo uma questão séria, como tal deveria ser tratada. E, verdade seja dita, se tomarmos o caso cabo-verdiano como paradigma, o cenário é desolador. E se a presente crise servir para fazer as coisas entrarem nos carris (chez nous et partout), então terá valido a pena. Apesar dos pesares. 14 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 CORREIO DAS ILHAS Pouco se fala da emigração clandestina a partir de Cabo Verde, mas ela existe. Várias são as pessoas, sobretudo do interior de Santiago, que já conseguiram fintar a Polícia para chegar ao estrangeiro. Mas, nem sempre os ventos correm de feição e esta semana um homem foi preso no Aeroporto da Praia quando tentava embarcar para Las Palmas, com um passaporte falso, pertencente a um português. Cabo-verdiano preso com Passaporte Falso O suspeito, um jovem de 24 anos, foi detido em fl agrante delito na sala de embarque de voos internacionais do Aeroporto da Praia, na posse de um passaporte falso, que pertencia a um cidadão português, que entretanto o terá dado como extraviado em meados de Fevereiro deste ano, soube A Semana. Este caso traz à baila o problema da emigração clandestina em Cabo Verde, um fenómeno arreigado neste arquipélago marcado por séculos de emigração. Conforme o apurado, o suspeito já tinha feito o " ", passado a fronteira e estava prestes a viajar para as Canárias. E, pelo que se sabe, este não é o único caso a ser apanhado pelas malhas da polícia de fronteiras. De acordo com o apurado por este semanário, vários cabo-verdianos terão embarcado ilegalmente para a Europa servindo-se deste esquema, passaportes de outrem em que só se muda de fotografia. Aliás, exemplo disso o esquema das mulheres presas nas Canárias por acusação de tráfico humano quando levavam com elas uma dezena de jovens e crianças que tentavam entrar fraudulentamente na Europa. Suspeita-se, inclusive, da existência de uma rede para este tipo de actividades que conta, para isso, com "bases de apoio" dentro de consulados na Praia. Uma fonte deste jornal conta que tem irmãos e vários primos em Portugal que conseguiram embarcar por esta via com a ajuda de um intermediário. “Essa pessoa é paga para conseguir passaportes e vistos. O interessado só tem que comprar a passagem”, afirma. O valor desta operação varia entre 150 e 600 contos. Mas, como lá onde há esquema há também quem o consiga furar, este processo integra as pessoas pobres, na sua maioria oriundas do interior de Santiago, que entregam o que têm e o que não têm para uma entrada na Europa e que depois ficam a ver navios. Depois há quem lhe falta até o que comer. Uma outra fonte conta que pagou 200 contos a um “charlatão”, para conseguir um visto para Portugal. E, com ele, mais dez outras pessoas também entregaram dinheiro ao referido charlatão. “Ele desapareceu com o nosso dinheiro e nunca mais vimos nem o nosso passaporte. Mais tarde ele foi preso, acusado de burla, mas hoje está solto”, disse. Aliás, o referido indivíduo é reincidente neste tipo de crime. Estes exemplos servem para chamar a atenção das autoridades cabo-verdianas quanto a este tipo de ilícito que, embora raro, continua a existir em Cabo Verde. Além disso, o país corre o risco de “enviar” pessoas – sobretudo as mulheres que são as mais vulneráveis – para serem exploradas sexualmente ou para serem utilizadas em trabalhos cujas condições estão muito próximas da escravatura. Isso quando não são usados como correios de droga e outros tipos de crimes. A pobreza, o desemprego, bem como a ausência de educação e de acesso aos recursos, constituem as causas subjacentes ao tráfico de seres humanos, um problema combatido pelas Nações Unidas que o considera um autêntico flagelo do nosso tempo. É evidente que se, por um lado, algumas pessoas estão dispostas a assumir o risco de cair nas mãos de traficantes para melhorarem as suas condições de vida, por outro, existe nos países industrializados uma tendência preocupante para a utilização de mão-deobra barata e clandestina, bem como para a exploração de mulheres e crianças para fins de prostituição e pornografia. No que a Cabo Verde diz respeito, as autoridades contam pôr um travão a fenómenos do género com a adopção de novos documentos de identificação com padrões europeus de segurança, conforme o previsto pelo acordo de Parceria Especial com a União Europeia. Até porque não são apenas os nacionais cabo-verdianos a recorrerem a passaportes estrangeiros para poder emigrar. São vários os casos de estrangeiros que têm usado documentos cabo-verdianos falsos para chegarem à Europa e a outras partes do mundo. Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 CORREIO DAS ILHAS 15 JOGO DA BOLHA CRIA EUFORIA NO MINDELO Dinheiro fermentado A cidade do Mindelo está a ser invadida pela febre do “Jogo da Bolha”. Ninguém sabe dizer quem lançou essa novidade mas o certo é que já conseguiu contaminar muita gente. Todos querem ganhar uma pipa de massa em tempo recorde. Se o barco bater na areia, logo se vê. KIM-ZÉ BRITO G anhar dinheiro fácil em tempo recorde, esta é a grande atracção do chamado Jogo da Bolha, uma novidade lançada nas últimas semanas na cidade do Mindelo e que já entrou em força em vários circuitos sociais e empresariais. Na rua, supermercados, cafés, serviços públicos e empresas toda a gente fala deste fenómeno que anda a fazer a delícia de muitos bolsos. Contam-se histórias de apostadores que já receberam mais de mil contos de uma assentada e até de um indivíduo que correu a comprar um carro zero quilómetro com o Prémio. Especulação ou não, o Jogo da Bolha – ou da Bola – está a produzir uma grande euforia em S. Vicente, graças ao seu poder de mobilizar dinheiro e permitir aos felizardos multiplicarem o valor investido. “Este jogo já ganhou muitos adeptos. Há vários grupos, por isso muita gente está a ser convidada a entrar no circuito. O jogo tem as suas próprias regras. Uma delas é que cada apostador deve angariar mais dois convidados para poder seguir o seu caminho até o centro da bolha e receber o prémio”, explica Maria Almeida, uma das adeptas desta espécie de totocaixa. Se tudo correr como planeado, Almeida deverá receber o seu rico dinheirinho esta semana: cento e quarenta contos, contra a entrega de um total de trinta mil escudos, em três parcelas de dez. Depois logo se vê. “Pois é, jogo ê intentod”, diz no seu bom crioulo mindelense. Outras pessoas estão a aguardar com ansiedade o dia grande. Muitas tiveram de pedir dinheiro emprestado para poderem também petiscar esse peixe. Por isso cruzam os dedos para tudo dar certo. “Hoje participei na primeira reunião e fiquei mais descansada. O grupo tem só gente de confiança”, relata outra moça, sob anonimato. Antes, confessa, estava cheia de medo, com receio das coisas darem para o torto e ficar sem o dinheiro das compras. A reunião, marcada via telemóvel, aconteceu em casa de um dos premiados. Catorze pessoas puxaram dos dez contos e meteram nas mãos do seleccionado. Uma imagem cobiçada por cada um dos presentes. “A coisa está a seguir tão bem que já estamos a pensar em criar uma célula fixa”, adianta a nossa fonte, que anda entretanto desesperada para conseguir mais dois apostadores até esta sexta-feira. Se falhar, a sua vez pode ficar comprometida. Outros avançam no círculo. Procuram-se “convidados” O problema é que começam a faltar “convidados” na praça. Já são tantos os grupos de jogos que muita gente anda desesperada à cata de parceiros. “Muitas pessoas já estão comprometidas, umas têm medo de entrar, outras não têm dinheiro ou acham que o valor é alto. Mas quem entra tem de batalhar para conseguir os dois convidados, de qualquer jeito”, diz uma funcionária da Câmara de S. Vicente. Na sua percepção, o jogo tem alguma dose de segurança pelo simples facto de ninguém querer desistir após ter feito a primeira, segunda ou terceira entregas. Empresários, estudantes, técnicos profissionais, todos estão vidrados no Jogo da Bolha. Cada um entra no grupo que mais se coaduna com a sua capacidade financeira. Ou seja, há Bolha de 5, 10, até cem contos. Quem pode entra numa de 100, outro mais cauteloso e mais modesto nas ambições pode optar por uma célula de 5. Ainda ninguém reclamou de fraude mas há quem preveja um final turbulento para este jogo, tal como aconteceu noutras paragens, incluindo Portugal. Após fazer as contas, o agente da PN Cirilo Cidário alerta os incautos pelas possibilidades que há de não colocarem a mão na massa. Este estudante de Direito apoia-se num quadro para mostrar a relação entre as rodadas, a quantidade de apostadores, o número das pessoas que saem em cada volta e a entrada dos jogadores para a rodada seguinte. O quadro revela que, por cada apostador que sai entram mais quinze indivíduos. À décima volta, por exemplo, estão 7680 pessoas na roda, saem 496 premiados e entram 8192 pessoas. “Alguém ficará cheio de dinheiro sugado indevidamente do bolso de outras pessoas. No final, será um Deus nos acuda”, alerta o policial. Por enquanto ninguém reclamou de nada. Mesmo assim, a Judiciária mostra-se atenta ao desenvolvimento deste fenómeno. Mas, segundo André Semedo, coordenador da PJ, a polícia só deverá agir no caso de alguém apresentar uma queixa, quem sabe por burla. “Quem joga deve estar a saber que corre riscos. Não há jogo sem riscos. Aliás, é por isso que muita gente não entra”, diz Mário Soares, que acha descabido alguém ir apresentar queixa às autoridades por burla ou outra coisa. De qualquer jeito, há grupos que andam a jogar pelo seguro: formaram células fixas para garantir que ninguém venha a sair com as mãos a abanar. “Não há dúvidas que é um jogo ilegal, que comporta uma fuga ao fisco”, diz um jurista contactado por este jornal. Apesar desta advertência, a delegação das Finanças em S. Vicente parece não acreditar na possibilidade dessa instituição cobrar algo dos apostadores. Como diz Graciano Reis, as Finanças não podem cobrar impostos de jogos ilícitos. Regras do jogo O Jogo da Bolha já andou a Europa e outras paragens. Como qualquer aposta, encerra os seus riscos mas quem entra quer só ver o lado positivo: multiplicar o dinheiro sem nenhum esforço. A primeira regra é que funciona com dinheiro vivo, sem recibos, cheques ou outras confusões. Os premiados recebem a soma durante uma reunião da respectiva célula. Cada apostador leva o dinheiro devido e anuncia mais dois “convidados”, que passam a pertencer a uma nova célula. O objectivo é caminhar para o centro da “bolha”. Por isso, quem recebe a sua grana tem de sair para dar lugar a outro jogador. O Jogo começa com 15 apostadores, mas podem ser multiplicados infinitamente para atrair mais pessoas. Um líder e mais seis pessoas constituem o núcleo central. Convidam outras oito pessoas, que pagam ao líder uma quantia previamente estipulada. Todos querem, na verdade, atingir a posição do líder. Quando o primeiro recebe, o apostador seguinte sobe um degrau na hierarquia. Agora já não paga mas também ainda não recebe. Fica encarregue de trazer “convidados”. Quando isso acontece, sabe que no jogo seguinte será ele a receber o dinheiro dos ‘novatos’. Chega finalmente ao centro da ‘bolha’. Desde que começou a jogar, já se juntaram ao esquema mais 24 pessoas. Recebe o seu rico dinheiro e abandona o jogo. Se quiser continuar, vai ter que ir para o final da bicha. 16 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 CORREIO DAS ILHAS Turistas angolanos saboreiam Sal Cerca de 60 turistas angolanos estiveram na semana passada na ilha do Sal. Chegaram na quinta-feira e regressaram na segunda-feira seguinte. A operação, organizada pela TAAG, foi a primeira de uma série que essa companhia aérea de Angola conta promover, chamando, contudo, a atenção que cabe às agências de viagens a promoção deste tipo de turismo. “Um sucesso” é o balanço que o delegado da TAAG no Sal, Henrique Batalha, faz da primeira vinda de turistas angolanos a Cabo Verde através de uma promoção feita em Angola por aquela companhia em associação com uma agência de viagens. Nesta primeira experiência estiveram no Sal 55 turistas angolanos, na sua maioria jovens quadros, funcionários, empresários, etc. Maugrado o “sucesso” responsável da TAAG na ilha do Sal faz realça que não é missão da sua empresa promover a vinda de turistas. “O nosso ‘business’ é transportar com segurança e pontualidade os passageiros. As agências, em Cabo Verde e em Angola, devem sair da letargia em que se encontram, limitando-se a vender bilhetes aos locais. Elas precisam despertar para esta oportunidade de negócios dadas as oportunidades que existem e podem ser exploradas”, afirma. São os casos dos festivais e outros momentos que jogam a favor de Cabo Verde, aponta. Concluída a primeira vinda de turistas angolanos a Cabo Verde, Henrique Batalha adianta que a TAAG já tem em preparação dois outros voos, um deles por altura do “revellion”. “Entretanto, antes disso, poderá haver um outro voo do género. Os 55 passageiros que estiveram em Cabo Verde adoraram, saíram daqui maravilhados, houve um entrosamento muito grande entre eles e as pessoas aqui do Sal”. Ou seja, conclui aquela fonte, “este é um bom início ao qual agora é preciso dar continuidade”. NOVAS ADEGAS NA CHÃ DAS CALDEIRAS São inauguradas esta sexta-feira, 7, as novas adegas das cooperativas do vinho do Fogo AGRO – COOP(Chã) e SODADE (Achada Grande). O acto conta com a presença do Presidente da República, Pedro Pires, ministro do Ambiente Desenvolvimento Rural e Recursos Marinhos, José Maria Veiga, e do embaixador da delegação da União Europeia, Joseph Coll. A AGRO-COOP (Associação de Transformação de produtos Agro-Pecuários de Chã das Caldeiras) conta actualmente com 100 associados e produziu este ano mais de 108 mil quilos de uva que depois transformou em vinhos e destilados da marca regista CHÃ. SODADE (Cooperativa de Transformação de produtos Agro-Pecuários de Achada Grande) produziu no ano passado 13 mil garrafas de vinho e para este ano prevê que duplique a sua produção lançando no mercado mais de 26 mil garrafas de vinho. As duas cooperativas de produção do famoso vinho do Fogo recebem apoio técnico da ONG Italiana COSPE, uma iniciativa patrocinada pelo governo de Cabo Verde em parceria financeira com a União Europeia. NMC TAXAS DE JURO Data Tipo Taxa (%) BANCO DE CABO VERDE Oficiais 27-10-2008 Redesconto 7.5 27-10-2008 Cedência de Liquidez 8.25 27-10-2008 Absorção de Liquidez 2.75 2008-10-27 Mercado Monetário Interbancário 7,25 27-10-2008 Taxa Base Anual 3,46 (www.bcv.cv) TAXAS DE CÂMBIO DO DIA 05-11-2008 País Títulos da Dívida Pública 27-10-2008 Bilhetes de Tesouro - 91 dias 3,38 07-10-2008 Obrigações de Tesouro - 6 anos 5,31 Data Emissão Tipo Prazo (Dias) Taxa 2008-10-30 TIM 90 5,438 300.000.000,00 2008-10-23 TIM 90 5,313 300.000.000,00 2008-11-03 TRM 14 5,250 1.000.000.000,00 2008-10-27 TRM 14 5,250 800.000.000,00 MERCADO DE INTERVENÇÃO Montante CANADÁ SUÍÇA DINAMARCA EUROPA INGLATERRA JAPÃO NORUEGA SUÉCIA ESTADOS UNIDOS AMÉRICA SENEGAL ÁFRICA DO SUL Moeda CAD CHF DKK EUR GBP JPY NOK SEK USD XOF ZAR Unid. 1 100 100 1 1 100 100 100 1 100 1 Compra Venda 73,690 7.372,652 1.480,115 110,265 136,400 86,521 1.286,572 1.112,607 85,909 16,810 8,624 73,831 7.385,428 1.482,804 110,265 136,703 86,648 1.289,262 1.115,464 86,111 16,810 8,826 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 CORREIO DAS ILHAS 17 Falta água na Boa Vista A falta de água na Boa Vista está a deixar a população revoltada. Consta que a empresa responsável por abastecer a ilha, a Águas e Energias da Boa Vista, está agora a canalisar toda a sua produção para o recéminaugurado Hotel Riu Karamboa. E, assim, a crise de água tomou conta da ilha, porquanto a Electra só fornece a uma parte da população dado que não tem capacidade para abarcar toda a ilha. Há famílias que já passaram mais de oito meses sem ver uma gota de água a pingar nas suas torneiras. SILVIA FREDERICO H á quase um mês que a população da Boa Vista está a braços com a falta de água. A Semana tentou saber o que estará na origem desta ruptura junto das Águas e Energia da Boa Vista, mas não conseguiu obter qualquer informação, mesmo depois de duas semanas de insistência. Tudo indica que a causa dessa crise seja o Hotel Riu Karamboa porque, segundo apurou este semanário, toda a produção está a ser canalisada para a nova unidade hoteleira da ilha das dunas. A Ceu, o hotel Venta Club e a AEB já não vendem água a particulares. Esta crise está a reflectir-se não só nas famílias como também no comércio e outros serviços. Restaurantes, bares, lavandarias, escolas e jardins infantis, instituições públicas e privadas estão a reclamar da falta de água. Alguns já enumeram alguns prejuízos devido à ruptura do líquido precioso. Nas últimas semanas, as famílias boavistenses estavam a desenrascar-se com a água da lagoa que, por não ser tratada, não serve para cozinhar e muito menos para beber. Mas agora nem isso. A procura é tanta que a fonte está a secar. Nesses dias quem consegue uma ou duas toneladas de água são pessoas que têm uma cunha junto dos funcionários daquelas três instituições. Quem não tiver “conections” tem de contentar-se em carregar garrafões de água, arranjados em casas de familiares e amigos. Ou então, toca a comprar água engarrafada, o que não está ao alcance de todos os bolsos. O mais revoltante, reclamam os moradores de Sal Rei, é que a AEB foi criada, justamente, para resolver o problema de falta de água na ilha. “Mas não, preferem dar conforto aos turistas, de que aos próprios habitantes desta ilha”, contesta um dos prejudicados. “Enquanto a população sofre, o hotel mantém um chafariz ornamental a funcionar 24h por dia”, acrescenta outro morador não menos indignado. A população diz ainda não entender por que razão um hotel com capacidade para receber 2000 hóspedes não tem unidade própria de abastecimento de água e energia. É que, soube A Semana, através de fontes fiéis, antes mesmo de o hotel estar pronto, a sua administração assinou um acordo com a Águas e Energias da Boa Vista em que esta se compromete a satisfazer todas as necessidades em água do Riu Karamboa. Porém, nem o Karamboa escapou à crise. Esta semana, faltou água no hotel durante mais de uma hora. Sobre esta questão, A Semana abordou o primeiro-ministro, José Maria Neves, aquando da sua estada na ilha, para a inauguração do Riu Karamboa. Perguntado se achava normal que uma empresa criada para resolver o problema de água na Boa Vista deixasse de cumprir a sua missão para fornecer água a um hotel privado, o chefe do executivo não deu uma resposta concreta sobre esta crise. Limitou-se a garantir que a Boa Vista não terá problemas de água nos próximos tempos, com a abertura de uma nova unidade de produção de água da AEB, perto do Hotel Riu Karamboa. Electra em extinção Uma outra unidade de produção está a ser construida na zona da Electra. No entanto, a sua montagem está parada até que a outra unidade entre em total funcionamento. A partir daí todas as unidades de produção de água da Electra serão transferidas para Águas e Energia da Boa Vista, que passa a gerir todo o abastecimento de água e luz eléctrica em toda a ilha. A Electra vai sair da Boa Vista, mas terá participação na gerência da AEB. De acordo com uma fonte da Electra, dentro em breve, a AEB vai alargar a sua rede de água domiciliária a toda Sal Rei. Esta mesma fonte afecta à Electra garante que a nova empresa terá capacidade para levar água a todos os lares e serviços daquela vila. A Semana tentou falar com o responsável da Electra na ilha das dunas, mas tal não foi possível até o fecho desta edição. De referir também que os povoados do interior da ilha são abastecidas pelo através Instituto Nacional de Gestão dos Recursos Hidrícos (INGRH), e não pela Electra. 18 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 DIVULGAÇÃO AFROBARÓMETRO REVELA: O Estado da Justiça segundo o Cidadão Comum N uma república democrática, os controlos institucionais de abuso do poder pelos órgãos do Estado são de duas espécies: o horizontal, ligado ao mecanismo da separação de poderes; e o vertical centrado na soberania popular. Na verdade, a democracia é o regime político no qual ninguém, nem mesmo o povo soberano, exerce um poder sem controlos. Este só pode ser exercido, legitimamente, no quadro da Constituição. O poder judiciário é um dos três poderes do estado moderno na sua teoria da separação de poderes. É exercido pelos juízes e possui a capacidade e a prerrogativa de julgar de acordo com as regras constitucionais e as leis criadas pelo poder legislativo em determinado país(i). Para poder desempenhar as suas funções com isenção, o poder judiciário dispõe de princípios e garantias previstas na nossa Constituição(ii). E é justamente ao poder judiciário que incumbe a magna função de interpretar os limites constitucionais dentro dos quais há-de ser exercida a soberania popular. O poder judiciário tem a obrigação de julgar quaisquer conflitos que possam surgir no país, aplicando as Leis, julgando de maneira imparcial e isenta todas as situações e pessoas nelas envolvidas. A justiça encontra-se no topo da agenda política do momento. O debate surgido com a abertura do ano judicial, o debate parlamentar sobre a organização e funcionamento dos tribunais, o estatuto dos magistrados judiciais e do Ministério Público, as opiniões da Ordem dos Advogados, a problemática na constituição do Supremo Tribunal de Justiça, entre outros, mostraram que ainda este debate restringe-se aos profissionais do sector ou aos políticos com responsabilidade directa na matéria. Este debate seria certamente mais profícuo se fosse alargado ao cidadão comum que é, ao fim e ao cabo, quem mais sofre com a qualidade da nossa justiça. O objectivo deste artigo é divulgar a percepção do cidadão comum sobre o actual estado da justiça, com recurso aos dados do Afrobarómetro, a única fonte existente sobre determinados parâmetros que poderão contribuir para enriquecer esse debate. De forma genérica, a confiança nas instituições sofreu uma diminuição em 2008, depois de ter aumentado entre 2002 e 2005. Acresce ainda que os cabo-verdianos tendem a confiar mais nas instituições não eleitas do que nas eleitas. No sector da justiça em particular, a situação é de deterioração dos níveis de confiança entre 2005 e 2008, passando de 66% para 50%, a proporção dos cabo-verdianos que afirmam confiar ou confiar muito nos tribunais. Em Santo Antão e em São Vicente é onde os níveis de confiança nos tribunais são mais elevados, em que mais de 2/3 confiam nos tribunais. Em Santiago, esses níveis baixam de forma sensível, para apenas 4 em cada 10 a confiarem nessa instituição. No entanto, comparativamente com outras instituições, os níveis de confiança nos tribunais são mais elevados. Essa diminuição do nível de confiança está relacionada com vários factores. No entanto, algumas pistas podem ser dadas pelos dados recolhidos. Por exemplo, os resultados mostram que cerca de 51% dos cabo-verdianos crêem que as pessoas são tratadas de forma desigual perante a lei, especialmente em São Vicente e na Praia (54%). Em Santo Antão apenas 30% partilham dessa opinião. Numa análise por faixa etária, são os jovens (18 a 34 anos) que são mais críticos, onde 58% tendem a crer que a desigualdade de tratamento perante a lei é uma realidade. Esta percepção tende a diminuir com a idade, sendo de 31% para os indivíduos com 55 anos e mais. Acresce ainda que cerca de 1\3 dos indivíduos acreditam que frequentemente as pessoas comuns infringem a lei e ficam impunes. Esta percepção negativa é mais agravada em São Vicente (51%) e menos grave em Santo Antão (8%). Por outro lado, segundo os cabo-verdianos, embora os tribunais estejam entre as instituições menos corruptas do país, a percepção sobre os níveis de corrupção tende a aumentar ligeiramente entre 2002 e 2008, de 6% para 10% (a proporção daqueles que consideram que a maioria ou todos os funcionários do sector estão envolvidos em actos de corrupção). Ainda assim, esses níveis são considerados baixos e são mesmo os mais baixos entre todas as instituições monitoradas. Esses dados não abordam muitas outras questões que poderiam explicar o sentimento sobre o funcionamento da justiça, como por exemplo, a satisfação com o funcionamento dos tribunais, a morosidade processual, etc. No entanto, lançam novas questões sobre o debate. i Montesquieu, C., O Espírito das Leis, 1748. ii O poder judiciário em Cabo Verde é regulado pela Constituição nos seus artigos 221 a 251. Afrobarómetro/Afrosondagem Proporção Daqueles que Confiam nas Instituições (2008) Instituições S. Antão S. Vicente Int. Santiago Praia Fogo Total Partidos da Oposição 34% 51% 35% 34% 42% 38% Partido no Poder 36% 53% 35% 37% 50% 40% CN Eleições 37% 63% 39% 38% 54% Assembleia Nacional 46% 63% 37% 39% 53% 45% Executivo Camarário 60% 63% 37% 36% 48% 45% Presidente da República 39% 65% 37% 42% 53% 45% Primeiro-Ministro 45% 59% 39% 42% 53% 45% Polícia 70% 63% 33% 36% 54% 46% Tribunais Judiciais 75% 68% 38% 39% 64% 50% 44% 20 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 OPINIÃO Ainda o Clube de Golfe de São Vicente JOÃO LIZARDO * E m reacção à nota de opinião publicado na edição do ASemana nº 863 pelo Sr. Aristides Lima e Silva intitulado “Quem foi enganado e por quem” faremos aqui alguns comentários. Se estivermos a trabalhar pela lógica do negociante dou ao Sr. Aristides Lima e Silva toda a razão do mundo. De facto, o seu pensamento está dirigido pela dicotomia de alguém ganha e o outro perde. Alguém engana o próximo e o enganador é o lider. Não é essa a nossa lógica nem do pensamento contemporâneo. Uma negociação comercial “ultrapassa a antiga visão unilateral de nós versus eles”. O Clube de Golfe de São Vicente através da sua Direcção foi mandatada para estabelecer uma parceria com a CONSOLVE, visando a sustentabilidade do Clube e sendo assim conjugamos os nossos pontos fortes e fracos com a oportunidade inerente, combatendo assim as ameças evidentes, (cego não é aquele que não vê mas aquele que não quer ver). Encontrámos parceiros ideiais SECTOR para estabelecer uma relação de longo prazo para o benefício de ambos. A deliberação da Assembleia geral que aprovou a parceria foi realizada mediante voto secreto por setenta e cinco por cento dos sócios presentes e mandatou à Direcção para entabular negociações com vista à materialização dessa deliberação que consiste em: 1. Aprovar a proposta apresentada pelo Grupo Consolve Serviços e Gestão Limitada, que consiste em desenvolver e realizar uma parceria com o Clube de Golfe de S. Vicente, visando a infraestruturação dos terrenos do Clube, construção de um campo de golfe relvado de dezoito buracos e Clube House, desenvolvimento turístico a realizar por uma sociedade anónima a constituir entre o Clube e a Consolve; 2. Como consequência e em execução da deliberação anterior, a assembleia geral mandatou a Direcção do Clube para celebrar e assinar um acordo de parceria e contrato de constituição de sociedade anónima em que o Clube subscreve quinze por cento do capital social que realiza com a transmissão de parte do imóvel da sua propriedade, outorgar os referidos contratos nos termos e cláusulas convenientes em cumprimento da proposta apresentada e aprovada pela Assembleia-geral. Há registo sonoro inclusive sobre essa deliberação e não adianta o Sr. Aristides Lima e Silva lançar farpas sobre a conduta do Presidente da Assembleia-Geral ou do Presidente da Direcção, porque isso é brincar com a inteligência dos sócios que estiveram na Assembleia até o seu encerramento (01:30 horas da madrugada). Se o Sr. e o seu grupo saíram da sala antes do termo da reunião é da vossa inteira e exclusiva responsabilidade. Trata-se de uma parceria que traz benefícios para ambas as partes, para São Vicente e Cabo DO LOTO Concurso Nº2008/44 de 02 de Novembro de 2008 TOTOLOTO JOKER Números Extraídos: 1 - 13 - 15 - 23 - 35 - 38 Número Premiado: 241797 1.° Prémio........4.490.894,50..........0…........(JACKPOT) 1.° Prémio........5.421.116,50...........0........(JACKPOT) 2.° Prémio........514.239,20..............1….....514.239 2.° Prémio........365.381,00 ...........12.....….30.448 3.° Prémio........130.674,75..............4.........32.668 3.° Prémio........548.071,50.............279........1.964 4.° Prémio........217.791,25..............37........5.886 Previsão para esta semana (Concurso nº 45 de 09-11-08) TOTOLOTO JOKER 5 500 000$00 5 900 000$00 Pode ser esta a semana da sua sorte. jogue! Verde em geral pois, o Clube com os parcos recursos que dispõe não tem sequer meios para sua mínima sustentação a começar pela casa do guarda caindo aos pedaços. Certamente os verdadeiros sócios amantes do Clube gostariam um dia de ter para si e gerações futuras, um campo de golfe relvado e um bom Clube House para a prática do golfe e uma sã convivência entre os membros. E têm essa possibilidade e oportunidade soberana ao recorrer a uma parceria séria, responsável e benéfica, pois, para além da prática do golfe poderá vir a ter dividendos futuros para a realização de muitas outras actividades, desportivas, sociais e culturais, inclusive financiar outras modalidades desportivas. Evidentemente que a cidade de Mindelo ao dispor de um campo de golfe relvado e de padrões internacionais no seu seio, ganhará estatuto de cidade nobre e verdadeira amiga do ambiente à altura e dimensão das grandes cidades do mundo. Talvez interesses escusos, tacanhez ou miopia possam levar alguém a ser contra o projecto turístico a ser desenvolvido no Clube de Golfe de São Vicente. Como homem modesto que sou, mas com os pés bem assentes no chão lhe divido o mundo em dois: o conhecimento por um lado e a imaginação por outro lado. Assim o que nos falta em conhecimento sobra em imaginação e vice-versa. Na realidade ao ser mandatado para concretizar o projecto de negociação de um contrato de parceria de tamanha envergadura com o grupo Consolve acima referido, não o poderíamos fazer sem a cumplicidade dos restantes membros da direcção que são solidários e nem podia deixar de ter assistência técnica e jurídica pois, não estava a negociar nada que eu eventualmente tivesse herdado dos meus pais. Na sua inoportuna intervenção fala do Cartório Notarial de Santa Cruz e diz que nada consta. Repito: “cego não é aquele que não vê mas aquele que não quer ver”. Diz a dado passo da sua intervenção que “nenhuma das contrapartidas ficou salvaguardada no contrato de sociedade” mas omite deliberadamente a existência do contrato de parceria cuja escritura também foi feita naquele concelho (assim como o poderíamos ter feito em qualquer outro concelho do país ou consulado no exterior) em que ficam salguardadas todas as contrapartidas do Clube de Golfe (direito a receber da Sociedade Mindelgolf um campo de golfe relvado de 18 buracos de padrões internacionais e um Clube House construídos numa ára de 70 hectares e que constitui propriedade privada do Clube de Golfe de São Vicente, projectos orçados em setecentos milhões de escudos, manutenção técnica desse campo durante dois anos, propriedade sobre 15% das acções da sociedade Mindelgolf independentemente do aumento de capital social, remodelação do actual Clube House para servir de museu do Clube e, ainda, uma cláusula de reversão caso os projectos não se venham a concretizar) vide cláusulas 2ª à 6ª do contrato de parceria. Paradoxalmente esta mesma pessoa com a sua organização informal não nos deixou prestar esclarecimentos aos sócios sobre o mesmo assunto. * No documento recentemente posto a circular pela Direcção do Clube, foi publicado uma nota da Câmara Municipal de São Vicente datada de 13 de Dezembro de 2007, que literalmente expropria o Clube de Golfe e lhe deixa com 40 hectares de terrenos, o Sr. Aristides Lima e Silva não faz nenhum comentário ou menção a respeito. Porquê? * O Sr. Aristides Lima e Silva prometeu durante uma Assembleia-Geral pagar o levantamento topográfico dos terrenos do Clube de Golfe de São Vicente na época orçado em 2.000.000$00. Porquê essa promessa? * O Sr. Aristides Lima hoje frequenta determinadas casas no Dji Dsal e Monte Sossego paga as quotas dos supostos amigos que desconhecia por completo quando era o grande Senhor Aristides do JBC. Porquê? * O Sr. Aristides Lima e Silva coloca a Direcção do Clube de Golfe no tribunal só porque esta direcção está literalmente a cumprir com o seu programa eleitoral, isto é, com os compromissos com os seus associados. Porquê? * O Sr. Aristides Lima e Silva não comenta o facto da venda dos terrenos do Clube de Golfe feito a terceiros principalmente por intermediários alheios à Camara Municipal e não nos diz porquê. E vem nos agredir dizendo que somos Dr. entre aspas e tantos outros insultos insustentáveis, quando este com a experiência e sabedoria que tem nos poderia ajudar com as suas ideias e sujestões. O tempo urge e não podemos esperar por mais 68 anos para apresentarmos um projecto (desde 1940 temos a responsabilidade de fazer de acordo com o despacho do então Governador de Cabo Verde) que seja suficientemente estruturante para a Ilha de São Vicente. O Sr. Aristides Lima e Silva tem que dizer aos sócios do Clube de Golfe e à sociedade Mindelense as suas verdadeiras motivações e deixa de atirar pedras para o telhado do vizinho. * Presidente da Direccção do Clube de Golfe de S.Vicente Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 21 >> DIREITO DE RESPOSTA Aeroporto Internacional do Fogo Delegada do Porto Novo reage a utente DIREITO DE RESPOSTA exercido na sequência do vosso artigo “Porto Novo: Utente contesta delegada de saúde” da edição nº 864 de 31 Outubro de 2008 Não querendo cair na tentação de fazer uma defesa exclusiva da minha integridade profissional e pessoal, não poderia deixar passar em claro o referido artigo sem proceder a alguns esclarecimentos, bem como a reparos apropriados. Em primeiro lugar referir que o artigo além de descrever de forma incorrecta o sucedido no dia 28 de Outubro de 2008 dando como verídica a versão do utente, comete uma inverdade ao afirmar que me escusei a prestar esclarecimentos quando abordada pela autora do texto em questão. Tais esclarecimentos foram apenas remetidos por mim para um outro dia, porque no momento estaria a decorrer uma supervisão ao programa de HIV tutelada pelo Ministério da Saúde. Não mais contactada - presumo que os “timings” editoriais ou a vontade individual prevaleceram - refuto assim qualquer má fé ou falta de interesse no esclarecimento devido, imputada a mim. Pretendendo apenas esclarecer os utentes da real situação do Serviço de Imagiologia (Raios-X) do Centro, nunca o seu funcionamento esteve em causa nem os utentes foram defraudados e privados dos seus exames. Havendo apenas um agendamento diferenciado entre urgências e exames marcados. No que toca ao seu operador (Enf. Caetano), bem como de todos os colaboradores desta Instituição, nunca foram nem serão negligenciados quer na sua saúde quer nas condições diárias de trabalho. Mais esclareço, que a aquisição de um equipamento de digitalização automática para a revelação radiográfica, será uma realidade a bem curto prazo, e que o serviço estará optimizado em breve. Quanto à utente queixosa, apenas referir que os factos sucedidos não foram como descritos, e que se a sua intenção era primariamente ser atendida e realizar o seu exame, tem de saber respeitar para ser respeitada e posteriormente poder exigir o atendimento - já que nenhum ser humano é obrigado a servir quem o insulta... Finalmente, no que toca ao colocar em causa a minha capacidade profissional bem como a minha formação pessoal, apenas poderei dizer que o meu trabalho diário à frente da Delegacia de Saúde a servir a população de Porto Novo é, e será sempre a resposta, a quem de uma forma ignóbil age pensando que a verdade e a razão estão na ponta da sua língua ou da sua caneta... Atentamente e de uma forma cordial, subscrevo-me Dra. Emília Castro Monteiro Delegada de Saúde do Concelho de Porto Novo Porto Novo, 05 Novembro 2008 A ESCOLA GRANDE DA PRAIA A Escola Grande tem um historial ignorado, ou esquecido, por muitos! Ainda hoje, não obstante a sua degradação, externa e interna, presta serviço àqueles que se servem das suas instalações. Por ela passaram milhares de meninos e meninas em idade escolar, hoje professores (as), funcionários(as), enfermeiros(as), carpinteiros, médicos(as), juristas, enfim pessoas que iniciaram os seus estudos naquele estabelecimento oficial. Esse histórico edifício merece carinho, cuidados! Olhando para a sua fachada interroga-se? Como foi possível deixar chegar à degradação tão valioso património? A minha resposta é esta: desinteresse. Ninguém poderá negar o óbvio! O seu visual diz tudo. Por isso é que se comenta, se critica na Esplanada do Café Sofia, a negligência de quem tem a responsabilidade de mandar reparar aquele edifício. Há largos anos que está assim! O seu estado é deplorável! A Escola Grande está escavacada, suja, feia, porca, com a porta principal fechada, janelas com vidros partidos, enfim uma lástima. Tornou-se num local vulgar, desvalorizado. Aí se vende artesanato africano e mais coisas, aliadas ao “show” do barulho de tambores que os ocupantes daquele espaço fazem. Mais: nessa porta principal, dois ou mais pregos colocados em toda a sua largura, seguram um fio que mostra o produto para a venda. Para envergonhar esse património, do outro lado está a actual Reitoria da Universidade de Cabo Verde. Esta tem um passado tão simples como isto: fora, tempos idos, Central Eléctrica e depósito de combustível. Aproveitado o espaço, trabalhado, virou Centro de Estudos no tempo colonial e pós-independência, Ministério dos Negócios Estrangeiros e agora Reitoria da Universidade. Remodelada, pintada a rigor e com gosto, hoje dignifica aquela Instituição de Ensino Superior. Um gesto louvável. A mesma sorte não teve a nossa ESCOLA GRANDE. Em meu nome e no de outros outros tantos alunos que por lá passaram, apelamos a quem de direito, para ao menos mandar reparar a fachada daquele património, tão nobre, quanto valioso. Que seja um arranjo de verdade, com gosto, e não um “lava-rosto” “pâ chamata’’. Que seja muito breve! DEUS TÂ DJUDA. Feito isso, mudará, externamente, o visual dessa histórica Escola. Assim ela não se sentirá diminuida, envergonhada, ante o edifício da Reitoria da Universidade, seu vizinho. Será pedir muito? SOFACHE Uma necessidade a médio prazo F oi inaugurado no passado dia 25 de Setembro (2008) o novo aeroporto de São Vicente embora ainda não esteja certificado para receber aviões de longo curso, o que se prevê para breve. Com a sua certificação pela autoridade aeronáutica como Aeroporto Internacional, Cabo Verde passará a contar com quatro aeroportos habilitados a receber voos internacionais. Pela ordem cronológica, as ilhas de Sal, Santiago, Boa Vista e por último São Vicente ganharam uma infraestrutura considerada alavanca do processo de desenvolvimento económico e social, e agora porque não perguntar qual será a próxima ilha a ser contemplada com um aeroporto internacional. A ilha do Fogo neste contexto surge como favorita por várias e fundadas razões. Esta ilha tem sido desde 1975 bastante penalizada em termos de investimentos públicos e agora nessa onda de aeroportos internacionais não pode mais uma vez ser preterida em relação a qualquer outra ilha. Pode até parecer uma utopia falar de um aeroporto com capacidade para receber aviões de longo curso em São Filipe. Contudo, aprofundando o assunto chega-se a conclusão de que é uma necessidade previsível a médio prazo no contexto do desenvolvimento do trafego aéreo de e para Cabo Verde. Há cerca de 10 anos atrás eram operados apenas dois voos semanais entre Cabo Verde e Portugal. Com a abertura do novo aeroporto internacional da Praia, em 2004, o fluxo de tráfego conheceu um crescimento exponencial e hoje são operados mais de trinta voos semanais entre Cabo Verde e Portugal, em aviões cuja capacidade média rodam os 200 passageiros. Ora pode-se basear neste caso concreto para desenvolver um raciocínio lógico e projectar as perspectivas de desenvolvimento do tráfego para a ilha do Fogo. É do conhecimento de todos, e as estatísticas confirmam, que a maior comunidade cabo-verdiana da diáspora é a dos Estados Unidos da América, sendo que a maioria dos seus integrantes têm origem nas ilhas do Fogo ou da Brava. Uma das expectativas dos imigrantes indocumentados nos EUA é que com a vitoria de Barak Obama nas presidências de 04 de Novembro próximo o novo e primeiro Presidente Afro-Americano poderá, eventualmente fazer aprovar uma lei visando a legalização e, por conseguinte, a regularização de milhões de imigrantes “ilegais” que vivem e trabalham actualmente nos Estados Unidos da América. A possibilidade de obter a documentação de residência, a tal “green card” com certeza irá fazer triplicar o número oficial de cabo-verdianos residentes nos EUA que, por conseguinte poderão viajar normalmente para Cabo Verde. Esta circunstância irá sem dúvida criar condições favoráveis que viabilizem voos diários entre Boston e São Filipe. Efectivamente o potencial de tráfego do mercado norte-americano é de longe superior ao do mercado português, seja em termos de tráfego étnico, seja a nível do tráfego turístico e de negócios. Diria mesmo que EUA representa um mercado de futuro para a Transportadora Nacional que, segundo consta, vai iniciar duas frequências semanais com perspectiva de um terceiro voo no período de Verão. Noventa por cento do tráfego transportado nesses voos tem como destino a ilha do Fogo e a vizinha Brava. Se alguns anos atrás os passageiros tinham que se sujeitar aos incómodos nos aeroportos do Sal e da Praia, hoje já viajam directamente para a Praia de onde fazem a ligação doméstica para São Filipe. Embora em menor escala, os constrangimentos ainda persistem, particularmente no que toca ao transporte de bagagens entre Praia e São Filipe. Com vôos diários para Boston e sabendo que o destino principal dos passageiros tem sido São Filipe na ilha do Fogo, não faz sentido manter a escala de ligação na Praia com todos os inconvenientes já conhecidos de todos. Actualmente, o tráfego por via aérea para a ilha do Fogo ronda os 40 mil passageiros/ano. Quase cinquenta por cento desse tráfego tem origem nos EUA. E esse fluxo poderá atingir o dobro com a melhoria das condições aeroportuárias e entrada em cena da concorrência na actividade de transporte aéreo. A ilha do Fogo reúne todas as potencialidade para ter um aeroporto internacional. Que a ilha possui um grande potencial turístico não é novidade para ninguém. Apreciar a imponência do vulcão é uma experiência extraordinária e deleitosa particularmente para um turista dos Países Baixos onde não existe qualquer tipo de elevação orográfica. Componentes do panorama turístico tais como tracking, alpinismo, pesca desportiva, festejos populares, música e danças típicas do Fogo são vectores de desenvolvimento do potencial turístico da ilha que no futuro poderão potenciar o fluxo do tráfego turístico para esta ilha. A vertente do tráfego de negócios também pode ser desenvolvida se forem criadas condições que contribuam para atração desse segmento de tráfego, e a infra-estrutura aeroportuária afigura-se como um dos requisitos de peso. Não se pode esperar que primeiro cheguem os grandes investimentos para depois então investir em infra-estruturas aeroportuárias, a lógica é inversa. Foi assim que aconteceu em todas as ilhas. A primeira instalação turística de Cabo Verde nasceu na ilha do Sal onde havia um aeroporto internacional. Pode-se afirmar que investimentos de maior expressão obedecem a esta lógica: primeiro infra-estrutura básica de acesso à ilha, depois então investimentos de vulto. O caso da ilha de Boa Vista é um exemplo interessante. E os grandes investimentos acabam sempre por estimular fluxos de bens e pessoas que demandam preferencialmente o transporte aéreo. Carlos Monteiro [email protected] 22 Asemana, Sexta-feira, 7 de Novembro de 2008 SAÚDE O ftalmologia, odontologia e dermatologia. Estas são as áreas que os médicos da Association Echanges France Cap-Vert, em parceria com a Câmara de Ribeira Brava, escolheram para efectuar consultas nos diversos povoados na ilha de S. Nicolau. Durante seis dias, a equipa médica percorreu as localidades de Estância de Brás, Preguiça, Juncalinho e Fajã, onde os principais beneficiados foram crianças e pessoas carenciadas. O vereador Carlos Gomes, da Câmara da Ribeira Brava, fala numa boa afluência. “A população desses povoados, que nem sempre podem se deslocar à vila para fazer uma consulta, mormente quando ela é paga, recebeu muito bem os médicos da Association Echanges France CapVert. Desta vez os médicos privilegiaram as áreas de oftalmologia, odontologia e dermatologia”, indica este autarca da Ribeira Brava. Esta associação, que desde 1991 visita regularmente Cabo Verde, chegou a São Nicolau a partir de 1996 onde vai de forma esporádica mas, segundo Carlos Gomes, pretende voltar todos os anos para dar consultas na ilha, inclusive pensa ampliar o seu raio de acção para a ginecologia e medicina escolar. Fotos: Carlos Gomes Médicos franceses fazem consultas em S. Nicolau CP SHELL “ENTRA” NO AEROPORTO DA BOA VISTA FORNECIMENTO DE JET A1 Os aviões que escalam o Aeroporto Internacional da Boa Vista (AIBV) passam a dispor do serviço de abastecimento de combustível da Shell Cabo Verde. Esta petrolífera adquiriu um auto-tanque e dois camiões “Bowsers”, de 18,5 metros cúbicos cada, os quais começaram a operar na referida pista no dia 29 de Outubro do corrente ano. Para suportar esta iniciativa, foram construídos dois depósitos, um dos quais já se encontra em funcionamento e o outro em fase de pintura. A Shell Cabo Verde consegue assim ultrapassar o constrangimento que obrigava os aviões a voarem para a Ilha das Dunas com combustível suficiente para garantirem o regresso aos aeroportos dotados de meios de abastecimento. Esta aposta vem comprovar a importância alcançada pelo AIBV, cujo movimento de aeronaves e de passageiros vem registando um crescimento continuado. O aeroporto da Boa Vista foi inaugurado a 31 de Outubro do ano passado e no decurso deste curto período de tempo, segundo dados do suplemento económico Cifrão, já transitaram, por esse aeroporto, cerca de 75 mil passageiros. Deste total, 31 mil são viajantes internacionais, a maioria de origem europeia, o que comprova a crescente procura desse destino turístico. Refira-se que a construção dessa infraestrutura aeroportuária tem vindo também a estimular a actividade das companhias aéreas nacionais e internacionais e prevêse o aumento do número de operadoras a partir do mês de Novembro. O sucesso do funcionamento do AIBV já levou à aprovação do seu Master Plan, que contempla a ampliação do terminal e da plataforma de estacionamento de aeronaves, iluminação da pista e a construção de um terminal de carga. Com este investimento, a Shell Cabo Verde, pretende continuar a contribuir para o crescimento deste importante empreendimento e para o desenvolvimento da Ilha da Boa Vista.