Açúcar e cárie - Idea Odontologia

Transcrição

Açúcar e cárie - Idea Odontologia
Açúcar e cárie: uma relação perigosa?
Por Lúcia Seixas,
jornalista do Medcenter.com
Páscoa é tempo de chocolate, balas e bombons. Alimentos que os
dentistas querem manter distantes de seus pacientes.
No Brasil, as preocupações se justificam ainda mais por conta das nossas disparidades. Ao
mesmo tempo em que somos um dos dez países com maior prevalência de cárie, somos
também o segundo produtor mundial de balas, caramelos e confeitos.
Mas há dados ainda mais alarmantes relacionados com a saúde oral dos brasileiros, como
lembra o professor Urubatan Medeiros, coordenador da pós-graduação da Faculdade de
Odontologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Segundo estimativas, cada brasileiro
consome cerca de 60 kg de açúcar por ano, o que equivale a um quilo a cada semana. "É
impossível não relacionar o alto consumo de açúcar com a precariedade da saúde oral no
Brasil", diz ele.
A opinião do prof. Urubatan, unânime entre os dentistas, não é a mesma daquela que vem
sendo divulgada pelo Internacional Office of Cocoa, Chocolate and Sugar Confectionery
(IOCCC), representado na América Latina pela Associação Brasileira da Indústria de
Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicap), com sede em São Paulo. Segundo
o IOCCC, que tem sede em Bruxelas, na Bélgica, não há evidência científica para afirmar que
balas e doces sejam a causa principal da cárie dentária.
Para confirmar essa posição no Brasil, a Abicap traduz e divulga alguns trabalhos científicos
sobre o assunto realizados em outros países. Um deles, sobre a cárie dentária, relata
conclusões de pesquisas e estudos epidemiológicos recentes realizados no Reino Unido,
Estados Unidos, Espanha e Nova Zelândia. Esses estudos demonstraram que tanto em
crianças quanto em adultos, o total de todos os fatores alimentares examinados (quantidade de
carboidratos, tipo e freqüência), era responsável por apenas um aumento muito pequeno da
incidência da cárie. Os fatores alimentares, embora estatisticamente significativos, eram
clinicamente insignificantes, pois eram anulados pelos efeitos do flúor e programas de higiene
oral.
Em função disso, os profissionais da área de Odontologia começaram a mudar suas
orientações aos pacientes, segundo o artigo. A antiga recomendação de evitar comer
guloseimas foi perdendo o sentido, à medida em que estudos verificaram que no mesmo
período em que a incidência de cárie havia diminuído, o consumo de açúcar havia aumentado
ou se mantido igual.
O artigo cita, inclusive, um modelo experimental desenvolvido nos Estados Unidos e nos
Países Baixos, que simula o que ocorre na boca humana, alternando períodos de
desmineralização e remineralização. O modelo foi utilizado para imitar as experiências de
ingestão de alimentos pelos seres humanos ao longo de um período de 24 horas e demonstrou
o poder do flúor em neutralizar o efeitos dos lanches freqüentes. Quando o flúor foi usado duas
vezes ao dia, houve menos perda mineral, em seguida a dez ataques, do que ocorreu em
seguida a três ataques na ausência do flúor.
Realidades diferentes
A informação de que em alguns países ocorreu aumento do consumo de açúcares sem o
respectivo aumento de ocorrência de lesões cariosas é reconhecida pelos dentistas brasileiros.
No entanto, esses resultados foram conquistados às custas de programas preventivos rígidos,
que ainda não existem no Brasil. Alguns destes programas começam na gestação e
acompanham o indivíduo até a idade de 19 anos, como lembra a dra. Sonia Harari, professora
do Departamento de Odontologia Preventiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
"Os programas envolvem visitas freqüentes ao dentista, de acordo com o risco individual,
higienização, aplicações de flúor e retardamento da introdução de açúcares. Na Suécia, por
exemplo, o programa resultou em três gerações livres da cárie", diz Sonia, que é ainda
pesquisadora da Unigranrio.
A relação entre consumo de açúcares e cavidades cariosas é também muito bem documentada
na literatura científica, inclusive em interessantes estudos realizados na época da II Guerra
Mundial, que comparam a saúde oral de alguns povos antes e depois do contato com a
alimentação "civilizada".
"Uma recente tese de mestrado da UFF, realizada pela prof. Luciana Bastos, mostrou que em
Bom Jesus, cidade fluminense de economia canavieira, os escolares de 6 a 12 anos
apresentam um CPO-D de 6,5 contra 2,1 ou 1,6 de outras regiões do Estado do Rio de
Janeiro", conta a dra. Sonia.
São, portanto, muito diferentes as realidades do Brasil e dos países citados pelos artigos do
IOCCC e ainda há muito o que fazer até que consumo de açúcar deixe de ser um fator
importante para a prevalência da doença cárie entre nós. Como é impossível negar a
importância do açúcar na nossa cultura, o ideal é enfatizar as recomendações de higiene oral,
na Páscoa e em todos os eventos que envolvem maior consumo de açúcar.
"As mães devem ser orientadas a escovar os dentes das crianças não apenas depois, mas
também antes de comer doces, para desorganizar a placa bacteriana. Outra recomendação
importante é evitar esses alimentos até três horas antes de dormir, para não favorecer a
doença cárie", diz a dra. Sonia.