FESTAS E TRADIçõES ESTUDANTIS EM
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FESTAS E TRADIçõES ESTUDANTIS EM
Festas e tradições estudantis em Coimbra comentário do filme Banhada pelas águas do Mondego, Coimbra, 100 000 habitantes, capital do distrito, importante centro industrial e comercial, é sobretudo conhecida pela sua Universidade que perpetua tradições académicas seculares. A universidade ergue-se sobre a mais alta colina da cidade e ocupa o antigo castelo medieval. A fachada data da fundação em 1290 pelo rei Dom Dinis. Entra-se no átrio pela Porta Férrea e o traje dos estudantes capa e batina pretas - é uma recordação do hábito eclesiástico do século xv. Este estudante acaba de assistir à última aula e os colegas arrancam-lhe todas as roupas, derradeira provocação antes da entrada na vida profissional. Outra cena estranha ocorre no mercado Dom Pedro… Roubamse nabos… Por que razão? Para dar de comer aos caloiros, estudantes do primeiro ano, que desfilam mascarados, ridicularizados durante todo o percurso da rua Ferreira Borges no dia da Latada no mês de novembro. É a festa das latas de conserva que obstruem o caminho até ao rio onde os caloiros vão ser batizados com um penico pelo padrinho ou pela madrinha. Primeira prova do curso universitário ao longo do qual se devem submeter ao Código da Praxe - conjunto de leis que regulam a vida académica e cuja leitura nos permite compreender melhor algumas destas cenas estranhas. Mas para se apreciar o ambiente de Coimbra é preciso viver com os 19 000 estudantes a grande semana universitária. Vamos tentar, através de algumas imagens rápidas, extrair os momentos mais marcantes que os verdadeiros atores da festa nos explicarão em seguida. Durante sete dias e sete noites, em todos os lugares representativos da cidade, vão ocorrer manifestações cuja diversidade testemunha dos gostos ecléticos e comportamentos sociais, por vezes contraditórios, dos estudantes. No dia do cortejo, diante dum público afável, os estudantes que arvoram os símbolos do seu sucesso universitário e social, desfilam a pé ou em cima de carros floridos com as cores das faculdades respetivas. Anteriormente, na praça da Sé Nova, teve lugar um dos momentos fortes da semana : a Queima das Fitas*. Ritual importante para alguns, celebrado alegremente pelos outros. Todas as noites, no parque da cidade, as noites musicais propõem espectáculos aos quais assiste uma vasta multidão. E no entanto, no dia seguinte de manhã, nas margens do Mondego, têm lugar os encontros desportivos exigindo que se esteja em certa forma. Depois de alguns números muito sérios, o humor leva a melhor a partir da segunda parte do Sarau, no teatro Gil Vicente. Durante a Garraiada, nas arenas da Figueira da Foz, os estudantes podem demonstrar outras facetas dos seus talentos. Também fazem prova de solidariedade através da venda das pastas a favor dos orfanatos da cidade, ou ainda dum certo formalismo quando a presença da hierarquia ou das famílias o exige, na altura do Baile de gala*, por exemplo. Mas o momento de maior emoção, reunindo todas as gerações à volta do fado, é a Serenata Monumental no largo da Sé Velha. Negro e colorido, jorra um grito, sinal da reunião, testemunho brilhante das tradições académicas de Coimbra. António Nogueira (1) A capa e a batina* é a veste que usam os estudantes de Coimbra. A Praxe*: os direitos e os deveres desta academia que segue a história da própria Universidade. O caloiro* quando vem para Coimbra, não é ninguém ; não tem rigorosamente direito nenhum. É um animal, está abaixo de cão, e na Queima das Fitas, o caloiro perde os chifres, os cornos como se diz em português. O quartanista* é aquele que faz a festa. A festa da Queima das fitas é a festa dos quartanistas, aqueles que colocaram o grêlo aqui, na via latina. Aqui no Paço das Escolas. O padrinho lhe colocou o grêlo na pasta e na Queima, é este grêlo que vão queimar, por isso vão fazer a queima das fitas e largar as fitas largas. Os cartolados* : aqueles que transportam a cartola e a bengala são os finalistas aqueles que, provavelmente em Junho, vão acabar os seus cursos em Coimbra. Alegria de acabar o curso, tristeza de largar Coimbra. As cores*, alegria da cor na festa : –o amarelo de Medicina, –o azul claro e branco de Engenharia, –o azul claro de Ciências, –o azul escuro de Letras, –o vermelho de Direito, –o vermelho e branco de Economia, –o roxo de Farmácia, –o cor de laranja de Psicologia. São as cores das diversas faculdades. As hierarquias essas, estão definidas, mas a festa é grande. António Paulo Lopes (1) Pois é, a Queima é realmente uma festa incomparável. Eu penso que não há na Europa, nem no mundo, uma festa com tanta alegria, uma festa de estudantes, de noite, de capas e batinas, de grande confusão, de felicidade, de bebedeira, de convívio… Enfim, só vivendo é que se poderá ter uma ideia real do que isto é. Evidentemente que isto, às vezes traz até alguns problemas, porque nem sempre as pessoas se portam muito bem, sob a influência do álcool ; mas o espírito, não há dúvida que é um espírito são, um espírito que as pessoas partilham com todo o mundo e que é extraordinário. * Ver páginas 3 e 4 do documento de apresentação. 1 Maria Filomena Capucho (1) Eu, em relação à Queima das Fitas*, sinto-me distante, uma distância que vem talvez do facto de nunca ter vivido uma Queima das Fitas. No fundo, na Queima, assusta-me um pouco toda aquela perda de dignidade, as grandes bebedeiras durante o cortejo, no fim da Garraiada*. Assusta-me todo o aspeto escatológico, pouco digno, grosseiro talvez, do Sarau*, das piadas baixas. António Paulo Lopes (2) Mas os professores é que são chatos. Carrascos! Então, nós deitamos evidentemente todos os dias tarde e a más horas, e às oito da manhã temos que ir às aulas. Isto, não pode ser, pois é! É por isso, que eles durante o cortejo da Queima, têm milhares de bocas nos carros para lhes moer o juízo, que é para ver se eles atinam e se lembram dos anos em que estiveram a fazer a festa como nós… Maria Filomena Capucho (2) Há coisas positivas na Queima também. Não tudo é negativo. A venda das pastas* por exemplo. Se calhar é quase um dos únicos momentos durante o ano inteiro em que os estudantes se juntam com a população da cidade, em que as famílias participam na festa dos estudantes e se juntam num fim que socialmente é positivo : ajudar os desfavorecidos. Há outros momentos que sinto terrivelmente contraditórios : o Baile de Gala, chiquíssimo, para uma elite, em que as pessoas tentam mostrar, se calhar, o dinheiro que não têm… António Paulo Lopes (3) Bem, é evidente que uma festa como esta, não se faz num só dia. Isto tem uma preparação muito longa, muito aturada, em que é preciso realmente que haja uma grande entreajuda entre os próprios estudantes ; sempre que esta festa é totalmente organizada pelos estudantes da Universidade. Mais concretamente, por uma comissão formada por estudantes, chamada Comissão da Queima das Fitas* que tem a seu cargo a organização desta festa enorme. Ao fim e ao cabo, tudo isto coordenado pela Comissão Central da Queima das Fitas*, que tem um trabalho de organização bastante complicado, e que lhes rouba muito tempo, desde a montagem dos palcos, a contactar os eletricistas, os grupos, as seguranças para os espectáculos, para os convívios, são muitas horas perdidas, e alguns dos nossos colegas que fazem parte desta comissão, porventura perdem o ano ; mas penso que foi por uma boa causa. António Nogueira (2) O Fado* de Coimbra está sempre presente em qualquer festa da Academia. Ou abre, ou fecha, ou durante, o Fado de Coimbra está sempre presente. A Queima das Fitas, realiza-se normalmente em Maio ; no princípio, no meio, no fim, mas normalmente no início de Maio. O Fado de Coimbra, evidentemente é uma componente principal da festa da Academia. Aliás, a Queima das Fitas inicia-se com a Serenata Monumental*, aquilo que pode ser considerado como o maior espectáculo da canção de Coimbra. É a nossa noite mítica, a nossa noite especial. Há uma questão muito polémica na Canção de Coimbra, que é a questão dos aplausos. As pessoas normalmente não batem palmas ao intérprete. Quando o fado é interpretado, no final, normalmente não existem aplausos. E perguntam-nos sempre porquê? E eu explico, a razão é só uma. É óbvio que um grupo que está a fazer uma serenata, numa rua à meia-noite, com certeza absoluta, que as pessoas que estão a ouvir, não vão, no final de um fado, aplaudir exatamente esse fado. É óbvio que não! Por outro lado, a Serenata Monumental, istó é, o grande espectáculo do fado de Coimbra que é a Serenata na Sé Velha na Queima das Fitas, que envolve milhares de pessoas, em que os intérpretes estão nas escadas da Sé Velha a cantar, é óbvio que estão perante un monumento histórico e acima de tudo, un monumento religioso, e, obviamente por uma questão de respeito as pessoas não aplaudem esse espectáculo. Quem sobe à Sé Velha, sente o peso das pedras do monumento. Eu não subo as escadas da Sé Velha. Só subo as escadas da Sé Velha para cantar. Recuso-me a subir as escadas da Sé Velha que não seja para cantar. É evidente que todos os organismos e as secções desportivas e culturais da Associação Académica de Coimbra* tomam parte na organização, digamos paralela, mas todas elas têm um papel ativo, como por exemplo as secções desportivas como o Judo, como a Ginástica, como o Remo ; especialmente o Remo que faz da festa da Queima das Fitas, o ponto alto da sua atividade do ano, em que fazem uma regata no rio Mondego. No meio disto tudo, há uma coisa que dá muito trabalho a todos os estudantes, precisamente aos que vão no carro : é a preparação do cortejo ; o cortejo da Queima das Fitas é composto por cento e tal carros, que são feitos basicamente de flores de papel. Cada carro leva 15 000, 20 000 flores e estas flores têm que ser feitas à mão, e fazem todos os irmãos, os primos, os sobrinhos, os caloiros, quem vier, todos fazem flores para os carros, porque é preciso. 2