DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO
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DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO
PAULO AFFONSO LEME MACHADO DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 12- edição, . revista, atualizada e ampliada 2004 .MALHEIROS 5V5EDITORES DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO © Paulo Affonso Leme Machado 1* edição, 1982; 2'1 edição, 1989; 3a edição, 1991; í~ 4a edição, 1992; 5a edição, 1995; 6'1 edição, 1996; 7a edição, Ia tiragem, 1998; 03.1998; 2a tiragem, 02.1999; 8a edição, 2000; 91 edição, Ia tiragem, 01.2001; 2a tiragem, 07.2001; IO1 edição, 02.2002; II'1 edição 03.2003. ISBN 85-7420-563-X Direitos reservados desta edição por MALHEIROS EDITORES LTDA. Rua Paes de Araújo, 29 - conjunto 171 CEP 04531-940 - São Paulo - SP Tel: (Oxxll) 3078-7205 Fax: (Oxxll) 3168-5495 URL www.malheiroseditores.com.br e-mail: malheiroseditores @ zaz. com. br Editoração Eletrônica Letra por Letra Studio Capa Nadia Basso Impresso no Brasil Printed in Brazil 03- 2004 À memória de meu pai, Anthero deAlckmin Machado — generoso e perseverante —, agradecendo suas imorredouras lições de amor à vida. À memória de José Geraldo Rodrigues deAlckmin, José Pedro Galvão de Souza e Mário Calazans Machado, agradecendo os seus ensinamentos, que continuam a orientar a minha atuação profissional. : À memória de minha sogra Leonor e de meu sogro Antônio Marrocos de Araújo, o qual me transmitiu grande vibração pela História e Literatura Regional Brasileira. • A Laís, minha primeira leitora, meu afetuoso reconhecimento. A Elza, Laís, Maria Rita e Maria Regina • minha gratidão pelo constante incentivo aos meus trabalhos jurídico-ambientais. Aó Gabriel e à Luiza, vendo neles representantes das futuras gerações, para as quais ' devemos conservar o meio ambiente. V:1 '" ,5 ,, -h PLANO ÜA OBRA Título I - PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL > Capítulo Único Título II - CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE > Capítulo I - Competência ambiental da União e dos Estados • Capítulo II - Constituição Federal e meio ambiente Título III - SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Capítulo 1 - Introdução i« " Capítulo II - Sistema Nacional do Meio Ambiente Título IV - INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Capítulo I - Novos procedimentos administrativos ' ,• Capítulo II - Zoneamento ambiental Capítulo III — Zoneamento industrial nas áreas críticas' de poluição V Capítulo IV - Estudo Prévio de Impacto Ambiental ' ' • Capítulo V - Licenciamento Ambiental Capítulo VI - Auditoria Ambiental Capítulo VII - Das infrações administrativas ambientais Capítulo VIII - Financiamento - Meio Ambiente e desenvolvimento sustentável Título V-RESPONSABILIDADE CIVIL, REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO E MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL Capítulo I - Responsabilidade civil e reparação do dano ecológico * Capítulo II - Meios processuais para a defesa ambiental Título VI - MUNICÍPIO - URBANISMO E MEIO AMBIENTE Capítulo I - Município e Meio Ambiente - Aspectos jurídicos Capítulo II - Parcelamento do solo urbano Capítulo III - Proteção das praças e dos espaços livres Título VII - RECURSOS HÍDRICOS - LEI 9,433/97 Capítulo Único Título VIU-ASPECTOS JURÍDICOS DA POLUIÇÃO , ., Capítulo I - Conceito de poluição Capítulo II - Poluição atmosférica - Aspectos penais DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Capítulo III - Poluição atmosférica - Aspectos administrativos e civis Capítulo IV - Poluição por resíduos sólidos Capítulo V - Poluição por rejeitos perigosos r. n t Capítulo VI - Poluição por agrotóxicos Capítulo Vil - Poluição sonora Capítulo VIII - Exploração mineral Capítulo IX-Crimes ambientais-A Lei 9.605, de 12.2.fô%&* (>'-**v .ivTítulo IX - ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - FLORESTAS E FAUNA - ASPECTOS JURÍDICOS <* Capítulo I - Áreas de preservação permanente nas Constituições Estaduais -1989 Capítulo II - Áreas de preservação permanente e o Código Florestal Capítulo III - Reserva Legal Florestal <' • Capítulo IV- Fauna ' . Título X - SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃJO DA NATUREZA " v.y r "-n v.vÁ ' Capítulo I - Conceituação das unidades de conservação Capítulo II - Aspectos jurídicos relativos às unidades de conservação .} Título XI- PREVENÇÃO E RESPONSABILIDADE ) PELO DANO NUCLEAR 1 Capítulo I - Prevenção do dano nuclear - Uma das faces da responsabilidade Capítulo II - Medidas preventivas específicas do dano nuclear 'tàv Capítulo III - Direito de informação, prevenção do dano nuclear e intervenção das associações Capítulo IV - Administração Pública nuclear e prevenção do dano nuclear Capítulo V-Rejeitos radioativos: Lei 10.308, de 20.11.2001 Tftufa XII - PROTEÇÃO DA ZONA COSTEIRA -ASPECTOS JURÍDICOS Capítulo Único Título XIII - TOMBAMENTO - INSTRUMENTO JURÍDICO DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO NATURAL E CULTURAL Capítulo Único Título XIV - ENGENHARIA GENÉTICA E MEIO AMBIENTE ' - ASPECTOS JURÍDICOS Capítulo Único Título XV- COMÉRCIO INTERNACIONAL, MERCOSUL E DIREITO .', AMBIENTAL INTERNACIONAL ' *u'! ' Capítulo I - Comércio Internacional e Meio Ambiente Capitulou- mercosul e Direito Ambiental Internacional .'il •<.'.'!• .1 ..-.• A:i..*.'i- Oi ÍJ>..l: : i ' .1' "• - <). .'„..' _ < i -, f< "> .1 'i i ''i . • , l '|-"UaI 'ti}.' i.' •; I'. h' . 'i i, • >Y> ' M TITULO I - PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL Capítulo Único - PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL......47 1. Princípio do direito à sadia qualidade de vida.......................................47 2. Princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais 2.1 O acesso aos recursos naturais.......................................................49 2.2 A eqüidade no acesso aos recursos naturais...................................50 2.3 A eqüidade no acesso aos recursos naturais e as futuras gerações .... 51 2.4 O acesso aos recursos naturais, as convenções internacionais e os Direitos nacionais...........................................................................51 3. Princípios usuário-pagador e poluidor-pagador.....................................53 4. Princípio da precaução 4.1 A prevenção e a introdução do princípio da precaução no Direito Ambiental...........................................................................55 4.2 Princípio da precaução na Declaração do Rio de Janeiro/92..........57 4.3 O Brasil e o princípio da precaução nas convenções internacionais.................................................................................59 4.4 O princípio da precaução na jurisprudência 4.4.1 O princípio da precaução e as radiações nucleares..............60 4.4.2 O princípio da precaução e a captura e caça ou a extinção de habitais de animais em perigo de extinção.....................61 4.4.3 O princípio da precaução e a Engenharia Genética.............62 4.5 Intervenção do Poder Público aplicando o princípio da precaução ... 63 4.6 Características do princípio da precaução 4.6.1 Incerteza do dano ambiental................................................64 4.6.2 Tipologia do risco ou da ameaça.........................................65 4.6.3 Da obrigatoriedade do controle do risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente...................................65 4.6.4 O custo das medidas de prevenção......................................66 4.6.5 Implementação imediata das medidas de prevenção: o nãoadiamento .....................................................................67 8 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 4.6.6 O princípio da precaução e os princípios constitucionais da Administração Pública brasileira.....................................68 4.6.7 A inversão do ônus da prova................................................69 4.7 A Lei 9.605/98 e a incriminação da ausência de precaução...........70 4.8 O Estudo de Impacto Ambiental e a aplicação do princípio da precaução: diagnóstico do risco ambiental....................................70 5. Princípio da prevenção..........................................................................73 6. Princípio da reparação ..........................................................................75 7. Princípio da informação.........................................................................76 8. Princípio da participação 8.1 Introdução......................................................................................80 8.2 Organizações não-governamentais (ongs)......................................81 8.3 Participação na formação das decisões administrativas.................84 8.4 Participação nos recursos administrativos e nos julgamentos administrativos...............................................................................85 8.5 Participação no século XXI e instituição do plebiscito ambiental.....85 8.6 Participação nas ações judiciais ambientais...................................86 9. Princípio da obrigatoriedade da intervenção do Poder Público.............88 9.1 As Constituições Nacionais e a intervenção dos Estados...............88 9.2 Função gestora dos Estados: meio ambiente como bem de uso comum do povo..............................................................................90 9.3 Novas idéias de gestão ambiental: eficiência e prestação de contas... 91 9.4 Governança ambiental....................................................................92 TITULO II - CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE Capítulo I - COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 1. Direito estrangeiro.................................................................................94 1.1 Espanha..........................................................................................94 1.2 Bélgica...........................................................................................95 2. Direito brasileiro e Comparado 2.1 Introdução......................................................................................96 2.2 Uma nova concepção de federalismo.............................................96 2.3 A norma geral como limite da legislação federal ambiental..........97 2.4 Competência suplementar dos Estados em matéria ambiental.......98 2.5 A competência ambiental comum na Constituição Federal de .VA ., 1988 . . .. .„.,<•.,:> ,. -,.r. '•'"'' SUMÁRIO ' O: ' 9 2.5.1 A implementação da legislação ambiental...........................99 2.5.2 Inconstitucionalidade de alguns artigos da Resolução 237/97conama..................................................................100 2.6 Estabelecimento de normas de cooperação institucional.............102 2.7 mercosul e cooperação ambiental................................................105 Capítulo II - CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 1. Introdução............................................................................................107 2. Afirmação de um direito ao meio ambiente 2.1 Direito subjetivo e direito de titularidade coletiva.......................108 2.2 O Supremo Tribunal Federal e o conceito do direito ao meio ambiente.......................................................................................110 2.3 Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado................ 111 2.4 Direito ao meio ambiente como bem de uso comum do povo.....111 2.5 Direito ao meio ambiente como bem essencial à sadia qualidade de vida.........................................................................112 3. O Poder Público, a coletividade e a responsabilidade ambiental entre gerações 3.1 O Poder Público, a coletividade e o meio ambiente..................... 113 3.2 As presentes e futuras gerações -A responsabilidade ambiental entre gerações..............................................................115 4. Direito à ação judicial: ação popular ambiental e ação civil pública ambiental .............................................................................................116 4.1 A ação popular ambiental na Constituição.................................. 116 4.2 A ação civil pública ambiental na Constituição e o Ministério Público.........................................................................................119 5. As espécies, os ecossistemas e o patrimônio genético 5.1 Do dever do Poder Público de preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e dos ecossistemas.......................................................................120 5.2 Do dever do Poder Público de preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético.......................................................................................121 6. O risco ambiental.................................................................................122 7. Interdição das práticas que submetam os animais a crueldade e interpretação da expressão "na forma da lei"....................................... 123 8. A valorização da prevenção através do Estudo Prévio de Impacto AmbientalEPiA.....................................................................................125 10 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 8.1 Caráter prévio do eia..................................................................125 8.2 O Estudo deve ser exigido "sem qualquer exceção"...................126 8.3 O epia e o direito à informação...................................................126 9. As áreas protegidas 9.1 A alteração e a supressão dos espaços protegidos somente através de lei...............................................................................127 9.2 Proibição de qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justificam a proteção dos espaços territoriais......................................................................129 9.3 Áreas protegidas e patrimônio nacional.....................................129 10. O controle da energia nuclear..............................................................130 11. A obrigação de reparar o dano ambiental............................................131 12. O direito à educação ambiental............................................................131 13. O desenvolvimento e o meio ambiente 13.1 Os princípios da atividade econômica brasileira........................132 13.2 Desenvolvimento ambiental e desenvolvimento sustentado.......133 13.3 A função social da propriedade e o meio ambiente.................... 134 TÍTULO III - SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Capítulo I - INTRODUÇÃO 1. Nomenclatura da disciplina jurídica....................................................136 2. Conceito de Direito Ambiental............................................................ 137 3. Conceito de meio ambiente na legislação 3.1 Legislação federal.......................................................................140 3.2 Legislação dos Estados...............................................................140 ?. Capítulo II - SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 1. A colegialidade nos órgãos ambientais................................................142 2. Competência dos organismos colegiados ambientais brasileiros 2.1 Conselho de Governo 2.1.1 Competência e composição do Conselho de Governo ... 143 2.1.2 Câmara de Políticas dos Recursos Naturais................... 143 2.2 Os Conselhos ambientais no Ministério do Meio Ambiente......144 2.2.1 Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA............. 145 2.2.2 Comitê do Fundo Nacional do Meio Ambiente.............. 147 2.2.3 Conselho Nacional da Amazônia Legal......................... 148 ,: , SUMARIO 11 2.2.4 Conselho de Gestão do Patrimônio Genético.................149 2.3 Conselhos ambientais nos Estados 2.3.1 Constituições dos Estados..............................................149 2.3.2 Legislação dos Estados...................................................151 3. Composição dos organismos colegiados ambientais brasileiros 3.1 Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA.........................152 3.2 Organismos estaduais 3.2.1 Constituições dos Estados..............................................153 3.2.2 Legislação dos Estados...................................................154 4. O meio ambiente na Administração Federal 4.1 Ministério do Meio Ambiente 4.1.1 Competência do Ministério............................................155 4.1.2 Órgãos do Ministério do Meio Ambiente....................... 155 4.2 A transversalidade do tema "meio ambiente" nos Ministérios ... 156 4.3 O quadro funcional da Administração ambiental....................... 157 4.4 iBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis 4.4.1 Finalidade e estrutura do ibama......................................160 4.4.2 O ibama e a instituição de licenças: a atividade petrolífera 160 TITULO IV - INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Capítulo I - NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 1. 2. 3. 4. 1. 2. 3. 4. Ação administrativa no tempo.............................................................163 Direito à publicidade ambiental 2.1 Objetivos.................................................................................... 164 2.2 Experiência estrangeira..............................................................166 2.3 Experiência brasileira................................................................. 167 Direito à informação ambiental...........................................................170 Fase conciliatória................................................................................. 172 Capítulo II - ZONEAMENTO AMBIENTAL Zoneamento e desenvolvimento planejado.......................................... 175 Zoneamento ambiental e segurança nacional....................................... 176 Zoneamento ambiental na experiência estrangeira.............................. 177 Zoneamento, urbanismo e poluição..................................................... 178 12 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 5. Elaboração do zoneamento: participação do público 5.1 Experiência estrangeira................................................................179 5.2 Experiência brasileira...................................................................182 6. Elaboração do zoneamento municipal.................................................183 7. Zoneamento ambiental, direito adquirido, revogação e anulação........183 8. Zoneamento ambiental e direito de propriedade..................................187 ,.. Capítulo III - ZONEAMENTO INDUSTRIAL .-;.,. NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO 1. Introdução............................................................................................190 2. Proposta da Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente: Estudo de Impacto...............................................................................191 3. Campo de incidência das disposições legais........................................192 4. Esquema de zoneamento urbano e sua criação por lei......................... 192 5. O Município e as regiões metropolitanas.............................................193 6. Os Estados e o zoneamento industrial.................................................194 7. A União e a implantação de zonas industriais..................................... 195 8. Critérios para estabelecer os padrões ambientais.................................196 9. As zonas instituídas pela lei 9.1 A implantação da zona e a vigência da lei................................. 197 9.2 Características das zonas industriais 9.2.1 Zona de uso estritamente industrial................................198 9.2.2 Zona de uso predominantemente industrial.................... 199 9.2.3 Zona de uso diversificado...............................................200 9.2.4 Zona de reserva ambiental..............................................200 10. Relocalização de indústrias poluidoras................................................200 Capítulo IV - ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 1. Previsão na Constituição Federal.........................................................202 2. Previsão nas Constituições Estaduais..................................................202 3. Previsão em convenções e declarações internacionais 3.1 Convenção deEspoo....................................................................203 3.2 Declaração do Rio de Janeiro/92..................................................204 4. Planejamento público - Redação dos atos administrativos federais e Estudo de Impacto Ambiental...........................................................205 5. Financiamento de obras ou atividades e epia.......................................206 6. Função e natureza jurídica do epia.......................................................207 7. Competência do conama para estabelecer normas gerais sobre o Estudo de Impacto Ambiental..............................................................208 ; ;-';!:-: SUMÁRIO '- •" 13 8. Competência dos Estados e Municípios e Estudo de Impacto Ambiental............................................................................................209 9. Abrangência do Estudo de Impacto Ambiental 9.1 Relação de atividades no Direito brasileiro e no Direito Comparado..............................................................................209 9.2 Obrigatoriedade da exigência do Estudo de Impacto Ambiental nos casos especificados na legislação brasileira......................212 10. Conteúdo do Estudo de Impacto Ambiental 10.1 Estudo de Impacto Ambiental-EPiA e Relatório de Impacto AmbientalRiMA........................................................................214 10.2 Área de influência do projeto...................................................214 10.3 Planos e programas governamentais - Zoneamento ambiental... 216 10.4 Alternativas..............................................................................216 10.5 Descrição inicial do local.........................................................218 10.6 Identificação e avaliação dos impactos ambientais do projeto .... 219 10.7 Medidas para corrigir os impactos ambientais desfavoráveis... 220 10.8 Impactos desfavoráveis e previsão no orçamento.....................221 10.9 Medidas compensatórias..........................................................222 10.10 Medidas preventivas de riscos maiores e catástrofes................225 10.11 Distribuição dos ônus e benefícios sociais do projeto..............226 10.12 Análise do desenvolvimento sustentado...................................227 10.13 Análise jurídica do projeto.......................................................227 11.0 proponente do projeto ou empreendedor.........................................228 12. Os consultores do estudo e a responsabilidade civil e penal do empreendedor......................................................................................229 13. Participação do público........................................................................231 13.1 Pedido do proponente do projeto e comunicação pela imprensa...................................................................................234 13.2 Acesso ao epia/rima e sigilo 13.2.1 Sigilo..........................................................................234 13.2.2 Acesso ao epia/rima....................................................235 13.2.3 Acesso ao epia/rima integral.......................................236 13.3 Fase de comentários 13.3.1 Conceito - Quem pode comentar - Reabertura da fase de comentários....................................................237 : 13.3.2 Comunicação da abertura da fase de comentários......237 ' 13.3.3 Duração da fase de comentários.................................238 13.4 Audiência Pública 13.4.1 Introdução..................................................................240 : 13.4.2 Finalidade da Audiência Pública................................240 13.4.3 Convocação da Audiência Pública.............................241 14 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 13.4.4 Edital de recebimento do epia/rima............................242 13.4.5 Designação da Audiência Pública - Data e local.......242 13.4.6 Direção e procedimento da audiência........................243 13.4.7 Ata da audiência e juntada de documentação.............244 13.4.8 A decisão do órgão licenciador e a Audiência Pública........................................................................245 13.4.9 Legislação comparada................................................245 14. O órgão público ambiental e o epia 14.1 Relação do órgão público com o proponente do projeto.........247 14.2 Relação do órgão público ambiental com os técnicos habilitados...............................................................................247 14.3 Relação do órgão público ambiental com o público................248 14.4 Licença Prévia e epia...............................................................248 14.5 O órgão público ambiental e os outros órgãos públicos no procedimento do epia...............................................................249 14.6 A decisão do órgão público ambiental.....................................249 14.7 Responsabilidade criminal dos servidores públicos e epia.......250 14.8 Indispensabilidade do epia e procedimentos preliminares.......251 14.9 Dos prazos para os órgãos públicos ambientais.......................253 15. Monitoramento e programa de acompanhamento................................254 16. As licitações e o epia............................................................................255 .Í.Cl Capítulo V - LICENCIAMENTO AMBIENTAL 1(| o , , 1. Utilização dos termos "licença" e "autorização".................................257 2. Licenciamento ambiental e competência constitucional......................258 3. A instituição do licenciamento ambiental............................................259 4. O licenciamento ambiental e o ibama 4.1 Quadro do licenciamento obrigatório pelo ibama.........................260 4.2 Licenciamento ambiental supletivo pelo ibama............................261 4.3 Licenciamento ambiental pelo ibama e interesse nacional e regional........................................................................................261 5. Licenciamento ambiental estadual e legislação federal.......................262 6. Licenciamento ambiental e zoneamento ambiental.............................263 7. Licenciamento ambiental e padrões de qualidade................................263 8. Licenciamento ambiental e normas de emissão...................................263 9. Licenciamento ambiental: prazo de validade, decadência e revogação ... 264 10. Licenciamento ambiental e financiamento por instituições oficiais........266 11. Tipos de licenciamento ambiental........................................................266 12. Licenciamento ambiental e controle da poluição. Tecnologia apropriada............................................................................................268 SUMARIO 15 13. Licenciamento ambiental e unidade do licenciamento........................268 14. Licenciamento ambiental e crime - Descumprimento das normas legais e regulamentares........................................................................269 15. Dos funcionários públicos e dos crimes contra a Administração ambiental.............................................................................................271 16. Do crime de deixar de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental.............................................................................................273 17. Do crime de impedir ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público.................................................................................................274 18. O licenciamento ambiental e o Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais .. 274 19. O licenciamento ambiental de petróleo, gás natural e amianto 19.1 Exploração e produção de petróleo e de gás natural -A Agência Nacional de PetróleoANP............................................275 19.2 Extração, industrialização, comércio e transporte de asbesto/amianto.........................................................................277 Capítulo VI -AUDITORIA AMBIENTAL ;,, ,.,.„. !< :'.> 1. Nomenclatura.......................................................................................280 2. Conceito de auditoria ambiental .........................................................280 3. A auditoria ambiental e o desenvolvimento sustentável......................282 4. Abrangência da auditoria.....................................................................283 5. Conteúdo da auditoria ambiental 5.1 Direito brasileiro..........................................................................283 5.2 Direito Comparado.......................................................................285 6. Estudo de Impacto Ambiental-EiA e auditoria ambiental.....................286 7. Licenciamento e auditoria ambiental...................................................287 8. Monitoramento e auditoria ambiental..................................................287 9. Inspeção e auditoria ambiental............................................................288 10. O órgão público ambiental e a auditoria..............................................288 11. Auditor ambiental 11.1 Conceito de auditor...................................................................289 11.2 Capacitação do auditor..............................................................289 11.3 A independência dos auditores 11.3.1 A independência dos auditores na auditoria ambiental pública..........................................................................289 11.3.2 Das auditorias ambientais independentes e a Lei 9.966, de 28.4.2000.................................................................290 ' 11.3.3 A independência dos auditores na auditoria ambiental "p. ...... privada..........................................................................290 16 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 11.4 Responsabilidade dos auditores.................................................291 12. Periodicidade da auditoria ambiental...................................................292 13. Documentação da auditoria ambiental.................................................292 14. Publicidade e/ou confidencialidade da auditoria ambiental.................293 15. A auditoria ambiental e as organizações não-governamentais.............294 16. Ação civil pública e auditoria ambiental..............................................294 Capítulo Vn - DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 1. Introdução............................................................................................296 2. Multa 2.1 Introdução....................................................................................298 2.2 O dolo e a negligência na multa simples......................................299 2.3 As multas e a reparação do dano..................................................300 3. Perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público e/ou perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito.......................301 4. Suspensão das atividades.....................................................................301 4.1 Suspensão de atividades licenciadas............................................301 4.2 Suspensão de atividades não autorizadas.....................................302 5. Redução das atividades........................................................................302 6. Sanções administrativas ambientais em nível federal..........................303 6.1 Apreensão..................................................................................303 6.2 Apresamento de embarcação.....................................................305 6.3 Cassação de matrícula...............................................................305 6.4 Caducidade de autorização de pesquisa.....................................305 6.5 Caducidade da concessão de lavra.............................................306 6.6 Cancelamento do registro..........................................................306 6.7 Demolição de obra.....................................................................306 6.8 Embargo....................................................................................307 6.9 Interdição..................................................................................307 6.10 Multa.........................................................................................308 7. Poder de polícia ambiental 7.1 Conceito.......................................................................................308 7.2 Quem pode exercer o poder de polícia ambiental........................309 7.3 Contra quem pode ser exercido o poder de polícia ambiental......310 Capítulo VIII - FINANCIAMENTO - MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 1. Financiamento e meio ambiente .........................................................312 ;•.• SUMÁRIO .-, ,..2. Conselho Monetário Nacional.......................................................*,.... 312 3. Banco Central do Brasil.......................................................................313 4. As instituições financeiras públicas federais e o licenciamento ambiental.............................................................................................314 5. As instituições financeiras públicas federais e as normas do conama.....316 6. Co-responsabilidades das instituições financeiras pelos danos ambientais............................................................................................317 7. As instituições financiadoras e a prevenção do dano ambiental..........318 8. A ação civil pública e o controle judicial dos financiamentos.............319 TÍTULO V - RESPONSABILIDADE CIVIL, REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO E MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL Capítulo I - RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 1. Histórico da utilização do termo "responsável"...................................321 2. Conceito de dano ecológico 2.1 Direito Comparado 2.1.1 Conceito de dano ecológico na Convenção de Lugano (Conselho da Europa)........................................................323 2.1.2 Alemanha...........................................................................323 2.1.3 Itália...................................................................................324 2.1.4 Grécia.................................................................................325 2.2 Direito brasileiro..........................................................................325 3. Responsabilidade objetiva 3.1 Direito brasileiro..........................................................................325 3.2 Direito Comparado.......................................................................327 4. Responsabilidade de prevenir..............................................................330 5. Dano residual, licença e co-responsabilidade do órgão público ambiental.............................................................................................331 6. Relação de causalidade........................................................................333 7. Obrigação de restauração, reparação e recuperação do meio ambiente... 338 8. Prevenir e restaurar: obrigações não antagônicas................................341 9. Responsabilidade civil e licenciamento ambiental..............................342 10. Responsabilidade civil e caso fortuito e força maior...........................343 11 • Reparação do dano ecológico e seguro................................................345 12. Fundo para a reparação do dano ecológico..........................................347 17 18 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Capítulo II - MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL .... 348 1. Ação popular.......................................................................................349 2. A participação do Ministério Público: inquérito civil, as recomendações do Ministério Público e o compromisso de ajustamento de conduta 2.1 O inquérito civil...........................................................................350 2.2 As recomendações do Ministério Público....................................352 2.3 O compromisso de ajustamento da conduta.................................353 3. Ação civil pública................................................................................355 3.1 Conceito e objetivos.....................................................................356 3.2 Autores da ação civil pública.......................................................357 3.3 O Ministério Público na ação civil pública..................................357 3.4 Condenação em dinheiro e o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.........................................................................................358 TÍTULO VI - MUNICÍPIO - URBANISMO E MEIO AMBIENTE Capítulo I - MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 1. A União e o Município........................................................................360 2. Repartição das competências...............................................................363 3. Interesse local do Município e sistema de competências.....................363 4. O Poder Judiciário e a repartição de competências..............................365 5. Plebiscito, referendo e iniciativa popular e atuação dos munícipes no meio ambiente......................................................................................366 6. O Município e a aplicação das legislações federal e estadual ambiental ... 367 7. A ordem urbanística.............................................................................367 8. Procedimentos administrativos e intervenção do Município 8.1. Plano diretor e Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) 8.1.1 Conceito do plano diretor e sua influência.........................368 8.1.2 Plano diretor municipal, e não plano diretor urbanístico ... 369 8.1.3 Conteúdo mínimo do plano diretor....................................369 8.1.4 Diretrizes ambientais, plano diretor e plano da bacia hidrográfica........................................................................370 8.1.5 Obrigatoriedade do plano diretor.......................................371 : 8.2 Declaração de Impacto Ambiental e Estudo Prévio de Impacto Ambiental - Procedimentos de prevenção do dano ambiental 8.2.1 Declaração de Impacto Ambiental.....................................372 BíBLIQ-iTC SUMÁRIO 19 8.2.2 Estudo Prévio de Impacto Ambiental................................373 8.3 Autorização ambiental municipal: publicidade e auditoria 8.3.1 Autorização e licença.........................................................374 8.3.2 Publicidade e auditoria......................................................374 8.3.3 Competência estadual ambiental e invasão da competência municipal......................................................375 8.3.4 Invasão da competência estadual ambiental pelo Município.. 377 8.4 Sanção municipal ambiental........................................................378 9. Município e aspectos setoriais do meio ambiente 9.1 Águas...........................................................................................378 9.2 Agrotóxicos.................................................................................380 9.3 Áreas verdes e praças..................................................................381 9.4 Atmosfera....................................................................................382 9.5 Cultura - Proteção de bens e valores culturais através do tombamento.................................................................................382 9.6 Fauna e zoológicos municipais....................................................382 9.7 Flora............................................................................................384 9.8 Atividades nucleares....................................................................385 9.9 Rejeitos........................................................................................386 9.10 Ruído...........................................................................................387 9.11 Tráfego........................................................................................388 10. Município e defesa do meio ambiente em juízo ..................................389 Capítulo H - PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 1. Exigências urbanísticas obrigatórias para toda a Nação......................390 2. A autonomia municipal e as normas urbanísticas federais ..................391 3. Conceito de loteamento e de desmembramento...................................393 4. Exigências fundamentais para a admissão do parcelamento................394 5. A intervenção dos organismos estaduais encarregados da preservação do meio ambiente e a aprovação dos loteamentos............396 6. Novos requisitos urbanísticos para o loteamento: a melhoria da qualidade de vida.................................................................................398 7. Fixação das diretrizes pelas Prefeituras Municipais ou pelo Distrito Federal.................................................................................................403 8. Execução de obras pelo loteador - Intervenção do Ministério Público e ação da Prefeitura Municipal...............................................404 9. Publicidade do procedimento..............................................................405 10. Impugnação e ação judicial contra a aprovação e o registro do loteamento ...........................................................................................406 20 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ' T Capítulo III - PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 1. Conceito e função das praças...............................................................408 2. Defesa da saúde - Uma das funções da praça e dos espaços livres.....409 3. A praça - Bem de uso comum do povo...............................................409 4. As praças e a legislação de parcelamento do solo urbano...................411 5. A praça e sua destinação......................................................................412 6. Prevalência do interesse "uso comum do povo" sobre outros interesses ..415 7. Ministério Público, associações ambientais e cidadãos na defesa judicial das praças................................................................................417 8. O Poder Judiciário e a defesa das praças e dos espaços livres.............418 TITULO VII - RECURSOS HÍDRICOS - LEI 9.433/97 Capítulo Único - RECURSOS HÍDRICOS 1. Fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos...................420 1.1 Água como bem de domínio público...........................................421 1.1.1 A água é "bem de uso comum do povo"............................421 1.1.2 A água não é bem dominical do Poder Público.................423 1.1.3 A abrangência da dominialidade pública das águas, Código Civil e Código das Águas. A questão da indenização........423 1.1.4 Águas pluviais, dominialidade pública e Código das Águas... 426 1.2 A água como um bem de valor econômico..................................427 ! 1.3 Uso prioritário e uso múltiplo das águas 1.3.1 Uso prioritário....................................................................428 1.3.2 Uso múltiplo das águas......................................................429 1.4 A bacia hidrográfica - A implementação da Política de Recursos Hídricos e a atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos..........................................429 1.5 Gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos.......432 2. Dos objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos 2.1 As águas e o desenvolvimento sustentável...................................433 2.2 Prevenção das enchentes..............................................................434 3. Das diretrizes gerais de ação................................................................435 4. Dos Planos de Recursos Hídricos 4.1 Conceito, prazo de vigência e órgãos competentes......................436 4.2 Abrangência: Plano de bacia hidrográfica, dos Estados e do País ... 437 ' 4.3 Conteúdo......................................................................................438 SUMARIO 21 4.4 Plano de Recursos Hídricos e outorga de direitos de uso de recursos hídricos........................................................................440 4.5 Plano de Recursos Hídricos e cobrança do uso de recursos hídricos......................................................................................440 4.6 Plano de Recursos Hídricos e plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos.......441 4.7 Plano de Recursos Hídricos e licenciamento ambiental............442 4.8 Plano de Recursos Hídricos, publicidade e Audiência Pública.....442 4.9 Plano de Recursos Hídricos e o Plano Nacional de Irrigação.... 443 4.10 Plano de Recursos Hídricos, planejamento e zoneamento ambiental...................................................................................443 5. Enquadramento dos corpos de água e competência para classificação das águas..............................................................................................443 6. Outorga de direitos de uso de recursos hídricos 6.1 Conceito....................................................................................445 6.2 Abrangência da outorga de uso das águas.................................448 6.3 Outorga e reserva hídrica 6.3.1 Reserva hídrica para salvaguarda ambiental...................449 6.3.2 Outorga preventiva para declaração de disponibilidade de água...........................................................................449 6.3.3 Declaração de reserva de disponibilidade hídrica para uso do potencial de energia hidráulica...........................450 6.4 Outorga dos direitos de uso da água e Estudo Prévio de Impacto Ambiental....................................................................451 6.5 Outorga dos direitos de uso de recursos hídricos e licenciamento ambiental............................................................452 6.6 Vinculação, discricionariedade e ônus da prova do requerente.....453 6.7 Publicidade do procedimento de outorga e direito à informação ... 453 6.8 Outorga dos direitos de uso de recursos hídricos e dever de fiscalizar....................................................................................454 6.9 Condições constantes da outorga dos direitos de uso das águas e cobrança do uso............................................................455 6.10 Suspensão da outorga dos direitos de uso de recursos hídricos .... 455 6.11 Outorga do direito de uso das águas e aproveitamento dos potenciais hidrelétricos..............................................................456 6.12 Não exigibilidade da outorga dos direitos de uso das águas......458 6.13 Infrações relativas à outorga......................................................459 6.14 Sistema integrado de outorgas...................................................459 6.15 Delegação da outorga................................................................460 7. Cobrança do uso de recursos hídricos 7.1 Finalidade..................................................................................461 22 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 8. 9. 7.2 Cobrança pelo uso de recursos hídricos e outorga de direitos de uso de recursos hídricos........................................................462 7.3 Cobrança pelo uso de recursos hídricos pelas concessionárias de energia elétrica......................................................................463 7.4 Fixação dos valores a serem cobrados.......................................464 7.5 Ás receitas da cobrança nos rios de domínio da União e a Conta Única do Tesouro Nacional.............................................465 7.6 Aplicação dos valores arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos 7.6.1 Aplicação prioritária na bacia hidrográfica....................466 •' 7.6.2 Critérios de utilização dos valores arrecadados com a <»(:,!."/: cobrança pelo uso de recursos hídricos ......... 7.6.2.1 Financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos de Recursos , '. Hídricos............................................................466 ...... 7.6.2.2 Objeto do financiamento...................................467 7.6.2.3 Os órgãos do Sistema Nacional de -..... ,.,.<.! Gerenciamento de Recursos Hídricos e o limite ! :i{, j{< das despesas de implantação e de custeio '..:...' administrativo...................................................467 7.7 Cobrança pelo uso de recursos hídricos e existência de Plano de Recursos Hídricos.................................................................468 7.8 Natureza jurídica dos valores arrecadados pelo uso dos recursos hídricos........................................................................468 Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos...............................469 Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos 9.1 Introdução..................................................................................471 9.2 Conselho Nacional de Recursos Hídricos 9.2.1 Composição do Conselho Nacional de Recursos Hídricos..........................................................................473 9.2.2 Competência do Conselho Nacional de Recursos Hídricos..........................................................................474 9.3 A Agência Nacional de Aguas-ANA 9.3.1 Conceito.........................................................................478 9.3.2 Competência da ana.......................................................479 9.4 Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos...............................481 9.5 Comitês de Bacia Hidrográfica..................................................482 9.5.1 Diferentes tipos de Comitês...........................................483 9.5.2 Área de atuação dos Comitês de Bacia Hidrográfica.....484 9.5.3 Instituição dos Comitês de Bacia Hidrográfica em rios de domínio da União......................................................485 9.5.4 Composição dos Comitês de Bacia Hidrográfica SUMARIO 23 9.5.4.1 Introdução.............................................................485 9.5.4.2 Os usuários nos Comitês de Bacias Hidrográficas... 487 C 9.5.4.3 Das entidades civis nos Comitês de Bacias T Hidrográficas.........................................................488 D 9.5.5 Competência dos Comitês de Bacias Hidrográficas em rios de domínio da União...................................................489 i., 9.5.6 Autonomia dos Comitês de Bacia Hidrográfica e intervenção do Conselho Nacional de Recursos Hídricos .. 492 9.6 As Agências de Águas 9.6.1 Introdução..........................................................................493 9.6.2 Agências de Águas, Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e autonomia dos Estados.................493 9.6.3 Agências de Águas e o planejamento................................493 9.6.4 Agências de Águas e a informação....................................494 9.6.5 Agências de Águas e atividade financeira.........................494 9.6.6 Controle da atividade financeira das Agências de Águas.... 495 9.6.7 Consórcios intermunicipais de bacias hidrográficas e Agências de Águas............................................................495 9.7 Organizações civis de recursos hídricos.......................................496 TÍTULO VIII-ASPECTOS JURÍDICOS DA POLUIÇÃO Capítulo I - CONCEITO DE POLUIÇÃO -' "' ' 1. Legislação federal................................................................................498 2. Legislação dos Estados........................................................................499 Capítulo II - POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA - ASPECTOS PENAIS 1. Legislação estrangeira..........................................................................501 2. Legislação brasileira: comentários ao art. 38 da Lei das Contravenções Penais 2.1 Provocar emissão.........................................................................503 2.2 Emissão abusiva...........................................................................503 2.3 "Fumaça, vapor ou gás"...............................................................504 Capítulo III - POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA - ASPECTOS ADMINISTRATIVOS E CIVIS i 1. Experiência estrangeira........................................................................507 24 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 1.1 Estados Unidos............................................................................507 1.2 Alemanha.....................................................................................509 1.3 Japão............................................................................................510 1.4 França...........................................................................................511 2. Legislação brasileira e fixação de padrões............................................512 3. Lei 8.723, de 24.10.1993, dispondo sobre a redução de emissão de poluentes por veículos automotores , 1(( 3.1 Destinatários da lei.......................................................................515 3.2 Abrangência.................................................................................515 ,.fí 3.3 Cronograma de implementação para os fabricantes de veículos... 515 3.4 Licença para uso da configuração de veículos ou motor..............516 , ,-. 3.5 A obrigação dos órgãos responsáveis pelos combustíveis e o ;. cronograma de implementação 3.5.1 A obrigação dos órgãos responsáveis pelos combustíveis .... 517 3.5.2 Cronograma de implementação.........................................518 ,. 3.6 Serviços de diagnóstico, regulagem de motores e sistemas de controle de emissões....................................................................519 3.7 Monitoramento da qualidade do ar..............................................519 4. Proteção da camada de ozônio.............................................................520 5. Poluição do ar pela queimada da palha de cana-de-açúcar..................522 Capítulo IV - POLUIÇÃO POR RESÍDUOS SÓLIDOS 1. Introdução............................................................................................525 2. Conceito de resíduo sólido..................................................................526 3. Normas administrativas gerais sobre coleta, transporte e disposição de resíduos sólidos...............................................................................526 4. Formas de destino final dos resíduos sólidos.......................................528 4.1 Depósito a céu aberto...................................................................528 4.2 Depósito em aterro sanitário 4.2.1 Conceito.............................................................................529 4.2.2 Escolha do local.................................................................530 4.3 Incineração...................................................................................531 4.4 Transformação do resíduo sólido em composto...........................532 4.5 Reciclagem e recuperação de energia...........................................532 4.6 As baterias e as pilhas. A Resolução conama 257/99...................533 4.7 Proibição de importação de pneu usado.......................................533 5. Atuação da União, dos Estados e dos Municípios...............................534 6. Punição dos atos poluidores por lançamento e destinação inadequada dos resíduos sólidos 6.1 Punição administrativa.................................................................535 6.2 Punição penal...............................................................................535 SUMARIO 25 Capítulo V - POLUIÇÃO POR REJEITOS PERIGOSOS !• 1. Conceito de rejeito perigoso................................................................538 2. Tratamento do rejeito no lugar em que ele foi gerado.........................540 3. O registro como forma de gestão e controle dos rejeitos perigosos - Tutela penal e administrativa............................................................541 4. O manifesto como forma de controle dos rejeitos perigosos...............543 5. Zoneamento e condições dos locais aptos para a eliminação dos rejeitos perigosos.................................................................................543 6. Sistema de autorização concernente a rejeitos perigosos -Revogação da autorização e intervenção judicial................................544 7. Responsabilidade pelos danos ambientais e rejeitos perigosos ...........547 8. Movimento transfronteiriço de rejeitos perigosos e Direito Internacional e Comparado..................................................................548 9. Movimento transfronteiriço de rejeitos e o Direito brasileiro..............552 9.1 Tipos de resíduos.......................................................................552 9.2 Proibição ou autorização de importação de resíduos 9.2.1 Importação de resíduos perigosos..................................553 9.2.2 Importação de resíduos "não-inertes" ............................554 9.3 Infrações e resíduos...................................................................555 Capítulo VI - POLUIÇÃO POR AGROTÓXICOS ' *"C 1. Agrotóxicos - Constituição Federal e Constituições Estaduais:.....;.... 556 2. Conceito de agrotóxicos, seus componentes e afins...............„....:...... 557 3. Das competências administrativas 3.1 Competências dos Ministérios.......................................V........... 558 3.2 Comitê Técnico de Assessoramento para Agrotóxicos.............. 560 4. Registro de agrotóxicos 4.1 Conceito....................................................................................561 4.2 Competência para registrar o agrotóxico...................................561 4.3 Avaliação técnico-científica e registro.......................................562 4.4 Publicidade prévia do pedido de registro..................................563 4.5 Direito à informação e procedimento de registro......................564 4.6 Autorização para uso emergencial e necessidade de registro .... 565 4.7 Pedido de registro e ônus da prova do registrante.....................566 4.8 Condições para registro de agrotóxicos novos e com inovações .. 567 4.9 Registro de produto equivalente................................................569 4.10 Proibições de registro e informações e provas a serem apresentadas pelo registrante.....................................................570 4.11 Reavaliação do registro de agrotóxicos que têm como componentes os organoclorados................................................572 26 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 4.12 Reavaliação do registro. Auditoria ambiental e a legislação estadual de agrotóxicos.............................................................572 4.13 Organismos internacionais e registro.........................................573 4.14 Registro. Embalagem e rótulo...................................................574 4.15 Prazos de tramitação do procedimento de registro e inexistência de registro por decurso do prazo............................574 4.16 Decisão da Administração Pública no procedimento de registro e responsabilidade do servidor público........................576 4.17 Análise do produto após o registro............................................577 4.18 Impugnação do registro 4.18.1 Legitimidade para impugnar administrativamente........577 ' 4.18.2 Conteúdo da impugnação: descumprimento de requisitos formais do procedimento..............................578 4.18.3 Argüição sobre o mérito do pedido de registro.............578 4.19 Infração administrativa pela ausência de registro......................579 4.20 Ações judiciais e registro de agrotóxico....................................579 5. Registro especial para pesquisa e experimentação 5.1 Conceito....................................................................................580 5.2 Quem pode requerer registro especial.......................................580 5.3 Responsabilidade da pesquisa e da experimentação..................580 5.4 Órgãos competentes para conceder o registro especial..............581 5.5 Os Estados e o registro especial................................................581 5.6 Destinação dos produtos agrícolas e dos restos de cultura -Responsabilidade civil e penal...............................................581 5.7 Estudo de Impacto Ambiental e localização de área para destinação final dos produtos agrícolas e restos de cultura.......582 v 5.8 Controle da Administração sobre a pesquisa e experimentação com agrotóxicos..............................................583 6. Produção de agrotóxicos 6.1 Registro da empresa - Autorização...........................................583 6.2 Competência para fiscalização..................................................583 7. Importação de agrotóxicos 7.1 Registro do agrotóxico..............................................................584 7.2 Registro da empresa..................................................................585 v 7.3 Restrições à importação e Constituições Estaduais...................585 7.4 Mercosul e livre circulação de substâncias ativas e/ou suas formulações de produtos fítossanitários....................................585 8. Exportação...........................................................................................586 9. Comercialização de agrotóxicos 9.1 Conceito....................................................................................587 9.2 Comercialização e obrigação da receita do produto..................587 SUMARIO 27 9.3 Exceção à necessidade de receita..............................................587 9.4 Venda de agrotóxico a usuário - Necessidade de receita...........588 9.5 Registro da empresa de comercialização - Sanções..................589 9.6 Obrigação de conservar cópia da receita...................................589 9.7 Venda de agrotóxico e receituário.............................................590 10. Transporte de agrotóxicos 10.1 Agrotóxico: produto perigoso para transporte...........................590 10.2 Transporte de agrotóxico em embalagem apropriada................590 10.3 Proibições de transporte rodoviário - Responsabilidade pela carga...........................................................................................591 10.4 Receita e transporte de agrotóxico.............................................592 10.5 Itinerário do veículo transportador de agrotóxico......................592 10.6 Procedimentos em caso de emergência, acidente ou avaria - Responsabilidade civil............................................................593 10.7 Responsabilidade penal e transporte de agrotóxico...................593 11. Usuário de agrotóxicos 11.1 Introdução..................................................................................594 11.2 Responsabilidade civil do usuário de agrotóxico......................594 11.3 Responsabilidade penal do usuário de agrotóxico.....................596 12. Prestador de serviço na aplicação de agrotóxico 12.1 Conceito....................................................................................596 12.2 Registro do prestador de serviço ...............................................597 12.3 Obrigação de autocontrole na prestação de serviços.................597 12.4 Responsabilidade civil do prestador de serviço.........................598 12.5 Responsabilidade penal do prestador de serviço.......................598 13. Empregador 13.1 Das obrigações específicas do empregador...............................599 13.2 Responsabilidade penal do empregador....................................599 14. Análise global da responsabilidade civil na Lei de Agrotóxicos.........600 15. Armazenagem de agrotóxicos..............................................................601 16. Embalagens de agrotóxicos: deveres do usuário, das empresas produtoras e comercializadoras............................................................602 16.1 Do usuário de agrotóxicos, seus componentes e afins...............602 16.2 As empresas produtoras e comercializadoras de agrotóxicos, seus componentes e afins...........................................................603 16.2.1 Da diferença do conceito de empresas produtoras e comercializadoras de agrotóxicos e do conceito de comerciante...................................................................603 16.2.2 A extensão da responsabilidade do produtor do................. agrotóxico, seus componentes e afins...........................604 16.3 Da destinação das embalagens ..................................................605 28 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 17. Receituário de agrotóxicos 17.1 Conteúdo da receita - Legislação federal e estadual.................605 '17.2 Especificidade da receita e diagnóstico.....................................606 •: 17.3 Conteúdo da receita e manejo integrado de pragas....................607 íj 17.4 Conteúdo da receita: quantidade total de agrotóxico e dosagens de aplicação...............................................................................607 :;.; 17.5 Conteúdo da receita: intervalo de segurança........,....................608 r 17.6 Advertência quanto às precauções de uso, primeiros socorros e proteção ao meio ambiente.....................................................609 ; i." 17.7 Receita - Armazenamento de agrotóxico e época de aplicação.... 609 ?, 17.8 Caráter público da receita .........................................................610 17.9 Responsabilidade civil do profissional......................................610 17.10 Responsabilidade penal do profissional....................................611 .v, Capítulo VII - POLUIÇÃO SONORA '., :, 1. Conceito de ruído................................................................................614 2. Poluição sonora e avaliação fisiológica...............................................615 3. Efeitos do ruído...................................................................................615 4. Normas de emissão e de imissão do som 4.1 Direito Comparado.......................................................................616 4.2 A Resolução 1/90-conama...........................................................618 5. Planejamento ambiental e zoneamento ambiental 5.1 Direito alemão..............................................................................619 5.2 Direito norte-americano...............................................................620 5.3 Direito japonês.............................................................................621 5.4 Direito brasileiro..........................................................................621 6. Estudo de Impacto Ambiental e ruído..................................................622 7. Licenciamento ambiental e ruído.........................................................623 8. Monitoramento e auditoria ambiental do ruído...................................624 9. Responsabilidade pelo ruído 9.1 Responsabilidade pelos produtos . 9.1.1 Direito brasileiro................................................................625 ••':'.''. 9.1.2 Direito da União Européia.................................................628 9.1.3 Direito norte-americano.....................................................628 9.1.4 Direito grego......................................................................629 9.2 Responsabilidade pelo exercício de atividades e pela construção de obras 9.2.1 Direito brasileiro................................................................629 9.2.2 Direito Comparado............................................................630 9.2.3 Utilização dos aeroportos - Experiência francesa.............631 10i Ação civil pública e ruído....................................................................631 SUMÁRIO Capítulo Vffl - EXPLORAÇÃO MMERAL 29 1. Introdução 1.1 Impactos ambientais e mineração..............................................633 1.2 Danos ambientais prováveis da mineração................................633 2. Depósito mineral e/ou jazida -Lavra e lavra garimpeira 2.1 Conceito de jazida.....................................................................634 2.2 Conceito de lavra.......................................................................634 2.3 Conceito de lavra garimpeira ou garimpagem...........................634 3. A legislação ambiental - Impedimentos e/ou restrições da exploração mineral 3.1 A Constituição Federal e a vedação de exploração mineral......635 3.2 Parques nacionais, estaduais e municipais.................................635 3.3 Reservas biológicas...................................................................636 3.4 Estações ecológicas...................................................................636 3.5 Áreas de Proteção Ambiental (apas)..........................................637 3.6 Áreas tombadas.........................................................................638 3.7 Áreas de Preservação Permanente.............................................638 3.8 Reservas Legais Florestais.........................................................639 3.9 Cavidades naturais subterrâneas................................................640 4. Competência para legislar sobre jazidas e minas e competência para legislar sobre o meio ambiente............................................................640 5. Princípio da precaução e do desenvolvimento sustentável - As empresas mineradoras e o dnpm 5.1 O princípio da precaução...........................................................641 5.2 O princípio do desenvolvimento sustentado..............................641 6. O dnpm e sua atuação ambiental .........................................................642 7. Exploração mineral e deveres ambientais............................................643 7.1 Dever ambiental na pesquisa mineral........................................643 7.2 Dever ambiental do concessionário da lavra.............................644 7.3 Dever ambiental do permissionário da lavra garimpeira...........644 8. Estudo de Impacto Ambiental e exploração mineral 8.1 Introdução..................................................................................645 8.2 eia e a classe dos minerais.........................................................645 9. O dnpm e o conama - Necessidade de normas de automonitoramento, auditoria e inspeção - Dever de informar............................................647 10. Licenciamento ambiental e autorização de pesquisa mineral..............648 11 • Licenciamento ambiental e exploração mineral H.l Análise do Decreto 97.507/89...................................................649 11.2 Licenciamento ambiental de lavra garimpeira...........................650 11.3 Licença ambiental para exploração mineral -A Lei 7.805/89 eas Resoluções 9/90 e 10/90-conama ......................................651 30 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 12. Competência comum de registro, acompanhamento e fiscalização.....652 13. Crime e exploração mineral.................................................................652 14. Sanções administrativas.......................................................................653 15. Dever de recuperar o meio ambiente degradado pela exploração de recursos minerais.................................................................................654 ;;,• Capítulo IX - CRIMES AMBIENTAIS . -> 'i -A LEI 9.605, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1998 ç 1. Introdução............................................................................................658 2. Aplicação de penas restritivas de direitos às pessoas físicas > 2.1 Introdução....................................................................................659 2.2 Prestação de serviços à comunidade............................................659 2.3 Interdição temporária de direitos..................................................661 i 2.4 Suspensão parcial ou total de atividades......................................661 .; 2.5 Prestação pecuniária.....................................................................661 : 2.6 Recolhimento domiciliar..............................................................662 1. Responsabilidade penal da pessoa jurídica -' 3.1 Direito brasileiro rrs ... 3.1.1 Introdução..........................................................................662 ; 3.1.2 A Constituição Federal e a responsabilidade penal da 5* • pessoa jurídica...................................................................663 3.1.3 Reparação e sanção............................................................665 3.1.4 A tipificação do comportamento da pessoa jurídica -• - Interesse ou benefício da entidade..................................665 ' ' 3.1.5 Abrangência da responsabilidade penal: pessoa jurídica de Direito Privado e de Direito Público.............................667 '' 3.1.6 Das penas aplicáveis às pessoas jurídicas..........................668 '' 3.1.6.1 Pena de multa cominada à pessoa jurídica...........668 3.1.6.2 Pena de restrição de direitos cominada à •»')•* pessoa jurídica.....................................................669 3.1.6.2.1 Suspensão parcial ou total de atividades.. 669 3.1.6.2.2 Interdição temporária de ;; estabelecimento, obra ou atividade......670 3.1.6.2.3 Proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.......670 3.1.6.3 Pena de prestação de serviços à comunidade cominada à pessoa jurídica..................................671 <3.1.7 As pessoas físicas autoras, co-autoras ou partícipes e a responsabilidade penal das pessoas jurídicas.....................671 SUMARIO 31 3.2 Responsabilidade penal da pessoa jurídica no Direito Comparado 3.2.1 Congresso da Associação Internacional de Direito Penal.....672 3.2.2 Noruega.............................................................................672 3.2.3 Portugal..............................................................................672 3.2.4 França................................................................................673 3.2.5 Canadá...............................................................................675 3.2.6 Venezuela...........................................................................676 3.2.7 Conselho da Europa...........................................................676 4. Do crime de poluição...........................................................................677 4.1 Crimes contra o meio ambiente, leis e regulamentos...................677 4.2 Crime de poluição 4.2.1 Art. 54, caput, e seu § 1B, da Lei 9.605/98: incriminação de todas as formas de poluição..........................................679 4.2.2 Crime qualificado de poluição...........................................681 4.2.2.1 Art. 54, § 2a, I - Proteção de áreas urbanas e rurais para ocupação humana...............................682 4.2.2.2 Art. 54, § 2°, II - Poluição atmosférica qualificada............................................................682 4.2.2.3 Art. 54, § 2a, III - Poluição hídrica qualificada ... 682 4.2.2.4 Art. 54, § 2U, IV - Proteção do uso das praias.....683 4.2.2.5 Art. 54, § 2a, V - Lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas.........................................683 4.2.3 Criminalização da ausência de medidas de precaução.......684 4.3 Criminalidade na exploração mineral 4.3.1 Pesquisa, lavra e extração de recursos minerais.................684 4.3.2 Deixar de recuperar a área pesquisada ou explorada: art. 55, parágrafo único............................................................686 4.4 Produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde e criminalidade (art. 56 da Lei 9.605/98)........................................687 4.4.1 Produto ou substância tóxica em relação à saúde humana ou ao meio ambiente .........................................................687 4.4.2 Produto ou substância perigosa em relação à saúde humana ou ao meio ambiente............................................687 4.4.3 Produto ou substância nociva à saúde humana ou ao meio ambiente.............................................................................688 4.4.4 Abandono de agrotóxicos, de substâncias perigosas e de substâncias nocivas à saúde...............................................688 4.4.5 Utilização de agrotóxicos, de substâncias perigosas e de substâncias nocivas à saúde...............................................689 4.4.6 Permanência do art. 16 da Lei 7.802/89 ............................689 32 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 4.4.7 Substância nuclear ou radioativa........................................689 4.5 Disseminação de doenças, pragas e espécies...............................691 5. Juizado Especial Criminal e crime ambiental......................................692 TÍTULO IX - ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - FLORESTAS E FAUNA -ASPECTOS JURÍDICOS Capítulo I - ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS-1989.................694 Capítulo II - ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E O CÓDIGO FLORESTAL 1. Introdução 1 1.1 As florestas, o interesse comum e o uso nocivo da propriedade .. 697 '.': 1.2 Área de preservação permanente-app e floresta de preservação ' permanente...................................................................................698 1.3 Conceito de florestas de preservação permanente........................698 2. A existência das apps e das florestas ou demais formas de vegetação de preservação permanente..................................................................699 3. A supressão de vegetação em apps.......................................................700 3.1 A Constituição Federal, os espaços territoriais especialmente protegidos e as apps......................................................................700 3.2 Supressão de vegetação em apps e o Código Florestal.................701 3.2.1 A supressão da vegetação nas apps, utilidade pública e interesse social...................................................................701 3.2.2 A supressão da vegetação nas apps, o epia e o procedimento administrativo próprio...........................702 3.2.3 Supressão da app urbana....................................................703 3.3 Supressão da vegetação e publicidade.........................................704 4. Reservatório artificial e app..................................................................705 5. Demarcação e averbação das apps........................................................705 6. Competência constitucional - Ação da União, dos Estados e dos Municípios...........................................................................................705 7. O direito de propriedade, função social da propriedade, a lei, a app e O CONAMA 7.1 Direito de propriedade.................................................................706 7.2 Função social da propriedade e lei...............................................706 7.3 A app e o conama..........................................................................708 SUMARIO 33 g Destinação do solo - Criação de florestas de preservação permanente e reflorestamento..............................................................709 9. Utilização das florestas de preservação permanente............................710 10. Florestas de preservação permanente e indenização............................711 11 Tutela penal das florestas de preservação permanente e crimes florestais...............................................................................................713 12. Infrações administrativas referentes às florestas de preservação permanente...........................................................................................716 Capítulo III - RESERVA LEGAL FLORESTAL .'•? -' 1. Conceito e abrangência........................................................................717 2. Reserva Legal Florestal e sua relação com outros espaços territoriais protegidos............................................................................................718 3. A Constituição Federal e a Reserva Legal Florestal 3.1 A Reserva Legal Florestal é espaço territorialmente protegido, na acepção do art. 225, § Ia, III, da CF........................................719 3.2 A Reserva Legal Florestal e a legislação dos Estados..................719 4. O poder de polícia concernente à Reserva Legal Florestal..................719 5. Área da Reserva...................................................................................720 6. Localização da Reserva........................................................................720 7. Características da Reserva Legal Florestal 7.1 Inalterabilidade relativa da destinação.........................................721 7.2 Regime de manejo florestal sustentável.......................................722 7.3 Gratuidade da constituição da Reserva Legal Florestal................723 7.4 Averbação da Reserva Legal Florestal no Registro de Imóveis 7.4.1 Legislação federal..............................................................723 7.4.2 Legislação estadual............................................................724 7.5 Medição e demarcação da Reserva Legal Florestal......................724 7.6 Isenção de imposto territorial rural sobre a Reserva Legal Florestal.......................................................................................725 8. Redução ou ampliação da Reserva Legal Florestal pela Administração Pública.........................................................................725 9. Infrações administrativas.....................................................................726 10. Ações judiciais e a Reserva Legal Florestal.........................................727 Capítulo IV - FAUNA . , • 1. Conceito de fauna silvestre..................................................................728 2. Competência para legislar sobre fauna................................................729 3. A fauna e os modos de aquisição da propriedade móvel no Direito anterior.................................................................................................729 34 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 4. A fauna silvestre como bem público....................................................731 5. A caça 5.1 A caça e a conservação da fauna silvestre.................................734 5.2 Modalidades de caça.................................................................736 5.2.1 Caça profissional............................................................736 5.2.2 Caça de controle.............................................................737 5.2.3 Caça amadorista.............................................................738 5.2.4 Caça de subsistência.......................................................739 5.2.5 Caça científica................................................................739 6. A intervenção do Poder Público na caça..............................................740 7. Avaliações preliminares para abertura da caça e Estudo de Impacto Ambiental...............................................................................741 8. Proibições específicas de caça.............................................................742 9. A caça e a propriedade privada............................................................743 10. A caça e a destruição do "habitat" - Reparação de danos...................744 11. Crimes contra a fauna..........................................................................745 12. Comércio da fauna silvestre 12.1 Comércio ilegal.........................................................................750 12.2 Comércio legal...........................................................................754 12.3 Comércio internacional.............................................................755 TITULO X — SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA Capítulo I — CONCEITUAÇÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO...759 1. Unidades de Proteção Integral.............................................................759 2. Unidades de Uso Sustentável...............................................................760 Capítulo II—ASPECTOS JURÍDICOS RELATIVOS ÀS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 1. Procedimento de criação, de alteração e de supressão das unidades de conservação 1.1 Criação das unidades de conservação........................................762 1.2 A desafetação da unidade de conservação e a modificação de seus limites................................................................................763 2. Compensação do dano ambiental e unidades de conservação 2.1 Compensação Ambiental...........................................................764 SUMARIO 35 3. 4. 5. 6. 7. 2.2 Obrigação do empreendedor de apoiar as unidades de proteção e o Estudo de Impacto Ambiental................................................765 2.3 Pagamento a ser efetuado pelo empreendedor.............................766 2.4 Do cálculo do pagamento a ser efetuado pelo empreendedor......768 2.5 Abrangência do dever jurídico de compensar na Lei 9.985/2000 ... 769 2.6 Possibilidade de o empreendedor ser proprietário e mantenedor de uma unidade de conservação...................................................771 2.7 Compensação e população tradicional.........................................772 Plano de Manejo e unidades de conservação 3.1 Conceito.......................................................................................772 3.2 Conteúdo do Plano de Manejo: parte vinculada e parte discricionária................................................................................773 3.3 Plano de Manejo e participação pública.......................................774 3.4 Plano de Manejo, o Estudo de Impacto Ambiental e o princípio da precaução.................................................................................774 3.5 Plano de Manejo e defesa nacional 3.5.1 Plano de Manejo de unidades de conservação situadas fora da faixa de fronteira e as ações militares e policiais ... 775 3.5.2 Plano de Manejo das unidades de conservação situadas na faixa de fronteira...........................................................776 Direito de propriedade, zonas de amortecimento e corredores ecológicos............................................................................................778 Direitos e deveres da população tradicional das unidades de conservação 5.1 Direitos da população tradicional.................................................781 5.2 Deveres da população tradicional ................................................783 A pesquisa científica nas unidades de conservação.............................783 6.1 Objetivos da pesquisa nas unidades de conservação....................784 6.2 A autorização para a pesquisa científica nas unidades de conservação..................................................................................784 6.3 Responsabilidade criminal dos pesquisadores e dos administradores das unidades de conservação..............................785 O acesso do público às unidades de conservação 7-1 A regulamentação do acesso público...........................................786 7.2 Dos direitos dos visitantes e dos deveres do Poder Público e das pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.............................787 Da gestão das unidades de conservação o- O princípio da autonomia dos entes políticos federados e o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza..........787 8-2 A gestão do Sistema Nacional de Unidades de Conservação -snuc e os órgãos competentes.....................................................788 36 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 8.3 A gestão das unidades de conservação e os recursos financeiros .... 790 ' •" • 8.4 A gestão das unidades de conservação e as organizações da ""'• sociedade civil de interesse público.............................................790 8.4.1 As organizações da sociedade civil de interesse público ' '' (oscips) e o Ministério da Justiça.......................................791 '" 8.4.2 Unidade de conservação, oscip, contrato de parceria e licitação..............................................................................792 7' 8.4.3 O Decreto 4.340/2002: gestão compartilhada e insuficiência da regulamentação 8.4.3.1 Gestão compartilhada............................................792 8.4.3.2 A insuficiência do Decreto 4.340/2002 quanto às oscips.................................................................793 8.4.4 O controle público das organizações sociais civis de '' interesse público e responsabilidade civil..........................794 8.4.5 As organizações sociais civis de interesse público teriam poder de polícia nas unidades de conservação?.................795 9. Proteção penal das unidades de conservação.......................................795 10. Conclusão............................................................................................797 TITULO XI - PREVENÇÃO E RESPONSABILIDADE PELO DANO NUCLEAR Capítulo I - PREVENÇÃO DO DANO NUCLEAR - UMA DAS FACES DA RESPONSABILIDADE........................798 Capítulo II - MEDIDAS PREVENTIVAS ESPECÍFICAS DO DANO NUCLEAR 1. Introdução............................................................................................802 2. Medição das radiações.........................................................................802 2.1 Medida das radiações e controle da poluição nuclear pelos Estados e Municípios...................................................................805 3. Notificação do público.........................................................................805 4. Zoneamento da área adjacente à instalação nuclear 4.1 Experiência estrangeira................................................................806 4.2 Direito brasileiro 4.2.1 Experiência brasileira e poder de autorizar atracação de navios nucleares - Uso da ação civil pública.....................807 4.2.2 Zoneamento nuclear e competência federal e municipal ... 808 4.2.3 A estação ecológica como entorno da usina nuclear..........809 SUMARIO Capítulo III - DIREITO DE INFORMAÇÃO, PREVENÇÃO DO DANO NUCLEAR E INTERVENÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES..... 37 812 Capítulo IV -ADMINISTRAÇÃO PUBLICA NUCLEAR E PREVENÇÃO DO DANO NUCLEAR 1. Experiência estrangeira 1.1 Espanha........................................................................................815 1.2 França...........................................................................................815 1.3 Estados Unidos da América.........................................................816 2. Experiência brasileira 2.1 Fiscalização e fomento da energia nuclear: atividades a serem separadas......................................................................................818 2.2 Composição da cnen - Necessidade de reformulação..................819 2.3 Poder de polícia nuclear: licenciamento e suspensão da licença.. 819 2.4 Poder de polícia nuclear: autorização e suspensão da operação das instalações nucleares..............................................................820 2.5 Normas de segurança nuclear e de segurança radioativa..............821 2.5.1 Instalação nuclear..............................................................822 2.5.2 A supervisão técnica independente em usinas núcleo-elétricas e outras instalações: forma inovadora de cooperação privada na fiscalização...................................822 2.6 O Sistema de Proteção ao Programa Nuclear - Intervenção da União e situação de emergência...................................................824 2.7 Medicina, Odontologia e radioproteção 2.7.1 Legislação básica...............................................................826 2.7.2 Princípios da radioproteção...............................................827 2.7.3 Medicina Nuclear...............................................................829 2.7.4 Direito à informação na radioproteção...............................830 2.8 Atribuições da cnen e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária concernentes à radiação ionizante e a competência dos Estados e dos Municípios......................................................830 2.9 Conclusões...................................................................................831 Capítulo V - REJEITOS RADIOATIVOS: LEI 10.308, DE 20.11.2001 1- Introdução............................................................................................833 2- Conceito de rejeito radioativo..............................................................834 3- Responsabilidade civil e rejeitos radioativos 3.1 Responsabilidade civil sem culpa.................................................836 3.2 Responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente por rejeitos radioativos.................................................................837 4- Tipos de depósitos de rejeitos radioativos...............................................838 38 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 4.1 Depósitos provisórios...................................................................838 4.2 Depósitos iniciais 4.2.1 Introdução..........................................................................839 4.2.2 Atividade geradora do rejeito radioativo, depósito inicial e responsabilidade civil......................................................839 4.3 Depósitos intermediários e depósitos finais.................................840 5. Seleção de locais para depósitos de rejeitos radioativos 5.1 Seleção de locais para depósitos iniciais......................................840 5.2 Seleção de depósitos intermediários e finais................................841 5.3 Seleção dos locais para depósitos e plano diretor dos Municípios .. 842 6. Descomissionamento e fechamento dos depósitos de rejeitos radioativos 6.1 Descomissionamento....................................................................842 6.2 Fechamento do depósito radioativo..............................................843 7. Licença ambiental dos depósitos: controle indispensável....................843 8. As proibições expressas na Lei 10.308/2001.......................................844 9. Os Estados e os Municípios e os rejeitos radioativos..........................845 9.1 Os Estados e a responsabilidade pela guarda dos depósitos provisórios: possível inconstitucionalidade..................................845 9.2 Os Municípios e a compensação financeira pelos depósitos de rejeitos radioativos........................................................................846 10. Gestão dos rejeitos radioativos segundo a Convenção Comum sobre a Segurança do Combustível Usado e sobre a Segurança da Gestão dos Rejeitos Radioativos......................................................................847 11. A informação na gestão dos rejeitos radioativos..................................847 11.1 Informação na seleção dos locais para depósitos de rejeitos radioativos....................................................................................848 11.2 Informação durante a gestão dos depósitos de rejeitos radioativos....................................................................................848 11.3 Informação anual ao Congresso Nacional...................................849 12. A CNEN-Comissão Nacional de Energia Nuclear e seus poderes..........849 TITULO XII - PROTEÇÃO DA ZONA COSTEIRA -ASPECTOS JURÍDICOS Capítulo Único - PROTEÇÃO DA ZONA COSTEIRA ' . ' -ASPECTOS JURÍDICOS '.. ' 1. Introdução............................................................................................851 2. O litoral nas Constituições Estaduais de 1989.....................................851 SUMARIO 39 2.1 Áreas de preservação permanente litorâneas.............................852 2.2 Autorização 2.2.1 Alagoas ..........................................................................852 2.2.2 Maranhão .......................................................................852 2.2.3 Piauí...............................................................................852 2.2.4 Rio de Janeiro.................................................................853 2.2.5 São Paulo........................................................................853 2.3 Autorização pelo órgão estadual competente e homologação pela Assembléia Legislativa.......................................................853 2.4 Gerenciamento costeiro estadual obrigatório ............................853 2.5 Obrigatoriedade de combater a poluição...................................854 2.6 Comportamentos específicos 2.6.1 Esgotos...........................................................................854 2.6.2 Lixo....................................'............................................854 2.6.3 Gabaritos para construções.............................................854 3. Zona costeira........................................................................................855 4. Praias - Conceito - Uso e acesso 4.1 Conceito.....................................................................................858 4.2 Uso.............................................................................................859 4.3 Acesso........................................................................................859 5. Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (pngc) e competência da União...............................................................................................861 5.1 Ausência de plano e utilização da Zona Costeira......................861 5.2 Planejamento e Zona Costeira...................................................861 5.3 Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro - Inovação da Lei 7.661/88 - Conteúdo e elaboração do plano 5.3.1 Inovação.........................................................................862 5.3.2 Conteúdo........................................................................862 5.3.3 Elaboração......................................................................863 "• Relacionamento federal, estadual e municipal na gestão da Zona Costeira........................................................................'................................864 7- Estudo de Impacto Ambiental na Zona Costeira..................................864 °- Licenciamento e sanção do descumprimento das condições da licença .. 866 9- Responsabilidade civil na Zona Costeira.............................................866 10. Comunicação ao conama das sentenças condenatórias e Ministério Público.................................................................................................866 Gestão de resíduos nos portos, instalações portuárias e plataformas e poluição causada por descarga de óleo ou de substâncias nocivas ou perigosas - A Lei 9.986/2000.........................................................867 11.1 Das obrigações ambientais e das infrações dos portos organizados, instalações portuárias e plataformas '• ! v 40 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ,(-, 11.1.1 Dos conceitos e das competências................................867 11.1.2 Das instalações de recebimento e tratamento dos , . resíduos e dos meios destinados ao combate à poluição... 868 ,.-,-. 11.1.3 Dos planos de emergência............................................869 11.1.4 O manual de procedimento interno...............................870 11.1.5 Das auditorias ambientais independentes.....................870 ,- 11.2 O risco e a classificação das substâncias nocivas ou perigosas.....871 11.3 Da descarga de óleo, substâncias nocivas e perigosas e lixo.....872 12. A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e a '.. Proteção do Meio Ambiente................................................................873 TITULO XIII - TOMBAMENTO - INSTRUMENTO JURÍDICO DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO NATURAL E CULTURAL Capítulo Único - TOMBAMENTO - INSTRUMENTO JURÍDICO ; DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO NATURAL E CULTURAL 1. Conceito de tombamento.....................................................................875 2. Conceito de patrimônio cultural..........................................................876 2.1 Legislação Comparada..............................................................878 3. Proteção do patrimônio cultural nas Constituições Estaduais 3.1 Instituição do tombamento pelas Constituições Estaduais........880 3.2 Proteção especial a etnias..........................................................880 3.3 Alteração e/ou supressão da proteção........................................881 3.4 O tombamento como forma de proteção do patrimônio cultural .. 881 3.5 Os Conselhos como órgãos de proteção do patrimônio cultural 3.5.1 Competência dos Conselhos.........................................881 3.5.2 Composição dos Conselhos..........................................882 : 3.6 Fundo Estadual de Cultura........................................................883 3.7 Criação de incentivos.................................................................884 4. Tombamento e o planejamento nacional, estadual e municipal...........884 5. A vizinhança como área protegida.......................................................886 6. Poder de polícia do patrimônio e atividade privada.............................889 7. Estrutura dos organismos administrativos de proteção do patrimônio e participação social.............................................................................889 8. Previsão constitucional - Competência concorrente - Análise crítica.....891 9. Desconcentração e tombamento..........................................................893 10. Natureza jurídica do bem tombado 10.1 Bem tombado de propriedade privada.......................................894 SUMARIO 41 10.1.1 Limitação ao direito da propriedade.............................894 10.1.2 Servidão administrativa................................................895 10.1.3 Domínio eminente do Estado.......................................895 10.1.4 Bem cultural como bem imaterial.................................896 10.1.5 Propriedade com função social.....................................896 10.1.6 Bem de interesse público..............................................896 10.2 Bem tombado de propriedade pública.......................................897 11 Co-responsabilidade da Administração em conservar o bem tombado ... 898 12. Espécies de tombamento......................................................................899 13. Instituição do tombamento: por lei e por ato do Poder Executivo 13.1 Instituição por lei.......................................................................900 13.2 Instituição por ato do Poder Executivo......................................901 14. Processo do tombamento.....................................................................903 15. Tombamento provisório.......................................................................906 16. Área de proteção ambiental e tombamento..........................................907 17. Parques e tombamento.........................................................................909 18. Tombamento e áreas especiais e locais de interesse turístico...............909 19. Autorização para realizar obras...........................................................909 20. Direito de preferência diante de alienação onerosa..............................912 21. A indenização e o tombamento............................................................914 22. Sanções administrativas.......................................................................918 22.1 Multa.........................................................................................919 22.2 Demolição.................................................................................920 22.3 Sanção reparatória: restauração da coisa tombada.....................921 22.4 Embargo e interdição.................................................................922 23. Crimes..................................................................................................922 24. Participação do público na defesa judicial do patrimônio...................925 25. Proteção internacional do patrimônio cultural e natural 25.1 Introdução..................................................................................927 25.2 Tombamento internacional?.......................................................927 25.3 Significado da inclusão na lista do patrimônio mundial............928 26. Conclusões...........................................................................................929 TITULO XIV - ENGENHARIA GENÉTICA E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS Capítulo Único - ENGENHARIA GENÉTICA E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS IURÍDICOS 42 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 2. Riscos da Engenharia Genética............................................................933 3. Utilização da Engenharia Genética......................................................935 4. Antecedentes da legislação brasileira - Direito Comparado................936 5. A Lei 8.974, de 5.1.1995 -Linhas gerais............................................936 6. Finalidade da lei...................................................................................937 7. Abrangência da Lei 8.974/95 7.1 Atividades e projetos.................................................................938 7.2 Exercício das atividades de Engenharia Genética somente por .:. pessoas jurídicas........................................................................938 7.3 Vedação do exercício da Engenharia Genética para as pessoas físicas - Duvidosa constitucionalidade.....................................939 8. Atividades não abrangidas pela Lei 8.974/95......................................941 9. Competências constitucionais da União, dos Estados e dos Municípios com relação à Engenharia Genética..................................941 10. Ministérios e órgãos competentes no plano federal.............................943 11. Registro e autorizações 11.1 Introdução..................................................................................946 11.2 Do registro de produtos contendo ogm e a aplicação das normas sobre agrotóxicos.......................................................................946 1 '•' 11.3 Das autorizações........................................................................947 •'•' ' 11.3.1 Da autorização para funcionamento de laboratório, '''''•' instituição ou empresa relacionada a ogm.....................948 11.3.2 Da autorização para entrada no País de qualquer produto contendo ogm ou derivado de ogm ..................949 11.3.3 Da autorização para liberação ou descarte de ogm no meio ambiente..............................................................951 12. Cadastramento, Estudo de Impacto Ambiental, Análise de Risco e monitoramento.....................................................................................953 13. Comissão Técnica Nacional de Biossegurança-CTNBio........................954 13.1 Competência da ctnbío..............................................................955 13.1.1 Competência para estabelecer normas..........................955 13.1.2 Competência para emitir cqb........................................956 13.1.3 Competência para emitir pareceres...............................956 13.1.4 Competência para exigir Estudo de Impacto Ambiental e Avaliação de Risco...................................957 . 13.2 Composição da ctnbío...............................................................960 -..-. 13.2.1 Os cientistas na ctnbío.................................................961 13.2.2 Os representantes do Governo na ctnbío......................962 13.2.3 Os conselheiros da ctnbío que exerçam representação de associações...............................................................963 13.3 Publicidade nas reuniões da ctnbío...........................................965 ;:"-. --. : SUMÁRIO -" ' 43 13.4 A Instrução Normativa-crNBio 19, de 19.4.2000, e a Audiênóia Pública.....................................................................................,.966 13.4.1 Audiência Pública: convocação só com decisão da ' .-. própria ctnbío...............................................................967 13.4.2 A audiência da ctnbío não é pública: é uma audiência seletiva..........................................................................968 14. Comissão Setorial Específica 14.1 Composição da Comissão Setorial Específica...........................969 14.2 Competência da Comissão Setorial Específica e ctnbío............969 15. Certificado de Qualidade em Biossegurança-CQB 15.1 Criação pela Lei 8.974/95 .........................................................970 15.2 O cqb e a cmio...........................................................................971 15.3 O conteúdo do requerimento para obtenção do cqb..................971 15.4 Dos prazos para a obtenção do cqb...........................................972 15.5 As vistorias e o cqb ...................................................................973 16. Comissão Interna de Biossegurança-cmio 16.1 Introdução..................................................................................974 16.2 Composição da cibío.................................................................975 16.3 Competência da cibío 16.3.1 Informação...................................................................976 16.3.2 Inspeção.......................................................................976 16.3.3 Monitoramento............................................................976 16.3.4 Avaliação de propostas e seu encaminhamento à ctnbío..........................................................................977 16.3.5 Identificação e análise dos riscos e sua gestão.............977 16.3.6 Dever da cibío de informar os riscos e infração...........977 16.3.7 Criação de normas.......................................................978 16.3.8 Documentação a ser conservada..................................978 16.3.9 Inadequação da cibío para fazer requerimento para a obtenção do cqb...........................................................979 16.3.10 Relacionamento da cibío com o pesquisador principal .. 979 17- O pesquisador principal de cada projeto..............................................980 18. Informação e ogm 18.1 Informação prévia ao julgamento do pedido 18.1.1 Direito brasileiro..........................................................982 18.1.2 Direito Comparado......................................................983 8.2 Informação posterior ao julgamento do pedido.........................985 18.3 Publicidade como regra geral e sigilo como exceção nos julgamentos da ctnbío...............................................................985 '9- Rotulagem nos produtos oriundos da Biotecnologia...........................986 °- Responsabilidade penal na Lei 8.974/95 .............................................988 44 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 20.1 Crime de manipulação genética de células germinais f» humanas.....................................................................................988 20.2 Crime de intervenção em material genético humano "in vivo" .... 989 20.3 Crime de produção, armazenamento ou manipulação de embriões humanos destinados a servirem como material ';, biológico disponível..................................................................991 20.4 Crime de intervenção "in vivo" em material genético de : animais......................................................................................992 - 20.5 Crime de liberação ou descarte no meio ambiente de ogm em desacordo com as normas estabelecidas pela ctnbío e f •• constantes da regulamentação desta Lei....................................993 20.6 Aumento de pena em razão de inobservância de regra técnica de profissão...................................................................994 21. Responsabilidade penal da pessoa jurídica e ogm................................995 22. Infrações e penalidades administrativas...............................................996 23. Responsabilidade civil objetiva e ogm.................................................998 24. Financiamento das atividades ligadas a ogm e co-responsabilidade .... 999 25. Normas para o trabalho em contenção com ogms.............................. 1000 26. Ação civil pública e ogm.................................................................... 1001 27. mercosul - Comércio internacional e ogm........................................1002 28. Clonagem - Problemas jurídicos ... 28.1 A dignidade humana................................................................ 1003 28.2 O clone....................................................................................1005 , 28.3 Discussão jurídica do clone na espécie humana......................1005 TITULO XV- COMERCIO INTERNACIONAL, MERCOSUL E DIREITO AMBIENTAL INTERNACIONAL '' .;;•, Capítulo I - COMERCIO INTERNACIONAL E MEIO AMBIENTE 1. Introdução.........................................................................................1009 2. O comércio internacional e o gatt/omc............................................1010 Capítulo II - MERCOSUL E DIREITO AMBIENTAL INTERNACIONAL 1. Das finalidades do Mercado Comum do SuI-mercosul.....................1012 2. Responsabilidade ambiental dos Estados e soberania........................ 1013 SUMÁRIO 45 3. As Constituições nacionais dos Estados-Partes e o meio ambiente ... 1015 4. O Federalismo e o mercosul.............................................................. 1015 5. Acordo-Quadro sobre Meio Ambiente do mercosul.......................... 1018 5.1 Os princípios no Acordo ambiental.......................................... 1018 5.2 A cooperação no Acordo ambiental: sociedade civil e governos...................................................................................1019 5.3 Áreas temáticas........................................................................1020 6. O meio ambiente nos acordos bilaterais entre os membros do mercosul............................................................................................1020 7. Procedimentos administrativos de prevenção do dano ambiental nacional transfronteiriço 7.1 Estudo de Impacto Ambiental..................................................1021 7.2 Monitoramento ambiental........................................................1022 7.3 Avaliação e institucionalização do controle ambiental contínuo...................................................................................1023 8. Aplicação interna das normas emanadas dos órgãos do mercosul.....1024 9. Solução de controvérsias e acesso à Justiça no mercosul 9.1 Solução de controvérsias 9.1.1 As controvérsias e a estrutura do Protocolo de Olivos .. 1027 9.1.2 Jurisdição dos Tribunais do mercosul........................... 1028 9.1.3 Reclamações de particulares...................;......................1029 9.2 Acesso ao Poder Judiciário no mercosul.................................1030 10. Normas jurídico-ambientais comunitárias e o sistema da Comunidade EuropéiaCE........................................................................................1031 10.1 As diferentes normas jurídicas da ce........................................1032 10.2 O conteúdo das normas: "nível de proteção elevado".............. 1033 10.3 Os Estados-membros podem ter normas mais severas que as da ce?....................................................................................... 1033 11. Normas jurídico-ambientais comunitárias e o sistema do nafta........1034 Bibliografia...............................................................................................1037 índice alfabético-remissivo.......................................................................1057 os '• -"fi irr. n,,li H/Ii'ji )"1f ;t úf Tf O, i'f'iíí>'.' h •>! ,< ii "r ü '• vi I. ' /'i' , , ' r - „ í*íf'í •j II > • }f i l' l ,i :.iyi ( • ' i .1 • c / i n m..' •'-;<); M" ";'.i|'/i Ji ,'.llf ' J li > 1' I it TITULO I PRINCÍPIOS QERAIS DO DIREmMíBIElfFL (.1 .,, /.' o. Capítulo Único PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL "Princípio" é, aqui, utilizado como alicerce ou fundamento do Direito. Alguns princípios aqui expostos têm apoio em declarações internacionais, o que, como assevera Maurice Kanto, "cresce a potencialidade de seus princípios tornarem-se normas costumeiras, quando não se transformarem em normas jurídicas oriundas de convenções".1 Os princípios aqui abordados estão formando e orientando a geração e a implementação do Direito Ambiental. 1- Princípio do direito à sadia qualidade de vida As Constituições escritas inseriram o "direito à vida" no cabeçalho dos direitos individuais. No século XX deu-se um passo a mais ao se formular o conceito do "direito à qualidade de vida". A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, na Declaração de Estocolmo/72, salientou que o homem tem direito fundamen-,,a "'" a<equadas condições de vida, em um meio ambiente de qualidade ••• (Princípio 1). A Conferência das Nações Unidas sobre MeioAmbiente e Desenvolvimento, na Declaração Rio de Janeiro/92, afirmou que os seres humanos "têm direito a uma vida saudável" (Princípio 1). 1. Les nouveaux príncipes du Droit International de l'Environnement", Revue unchque de VEnviwnnement l/l 1-30, Limoges, sfde, 1993. ... ... , ......... 48 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O Instituto de Direito Internacional, na sessão de Estrasburgo, em 4.9.97, afirmou que "todo ser humano tem o direito de viver em um ambiente sadio".2 A tendência preponderante dos membros do Instituto foi a de considerar o direito a um meio ambiente sadio como um direito individual de gestão coletiva.3 Não basta viver ou conservar a vida. É justo buscar e conseguir a "qualidade de vida". A Organização das Nações Unidas-oNU anualmente faz uma classificação dos países em que a qualidade de vida é medida, pelo menos, em três fatores: saúde, educação e produto interno bruto. "A qualidade de vida é um elemento finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no conceito de nível de vida".4 A saúde dos seres humanos não existe somente numa contraposição a não ter doenças diagnosticadas no presente. Leva-se em conta o estado dos elementos da Natureza - águas, solo, ar, flora, fauna e paisagem para se aquilatar se esses elementos estão em estado de sanidade e de seu uso advenham saúde ou doenças e incômodos para os seres humanos. Essa ótica influenciou a maioria dos países, e em suas Constituições passou a existir a afirmação do direito a um ambiente sadio.5 O Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos prevê, em seu art. 11, que: "1. Toda pessoa tem direito de viver em meio ambiente sadio e a dispor dos serviços públicos básicos. 2. Os Estados 2. Annuaire de VInstituí de Droit International, Session de Strasbourg, v. 67, II, Paris, Éditions A. Pedone, 1998, p. 478. Um questionário, preparatório dessa Sessão, fora distribuído aos sócios do Instituto em janeiro/92. 3. Luigi F. Bravo, Relator da Oitava Comissão (Meio Ambiente), Annuaire de 1'Institut de Droit International, Session de Milan, v. 65, II, Paris, Éditions A. Pedone, 1993, p. 303. 4. Fernando López Ramón, "El Derecho Ambiental como Derecho de Ia función pública de protección de los recursos naturales", Ctiadernos de Derecho Judicial XXVIII/ 125-147, 1994. 5. África do Sul (Constituição de 1996, art. 24); Angola (Constituição de 1992, art. 24); Argentina (Reforma da Constituição em 1994, art. 41); Azerbarjão (Constituição de 1995, art. 39); Bélgica (Constituição de 1994, art. 23, 4); Bulgária (Constituição de 1991, art. 55); Cabo Verde (Constituição de 1992, art. 70); Colômbia (Constituição de 1991, art. 79); Congo (Constituição de 1992, art. 46); Croácia (Constituição de 1990, art. 69); Equador (Constituição de 1998, art. 23, 4); Eslovênia (Constituição de 1995, art. 72); Finlândia (Reforma da Constituição em 1999, art. 20); Macedônia (Constituição de 1991, art. 43); Mali (Constituição de 1992, art. 15); Moldávia (Constituição de 1994, art. 37); Nicarágua (Constituição de 1987, art. 60); Paraguai (Constituição de 1992, art. 72); Portugal (Constituição de 1976, art. 66, 1); Seychelles (Constituição de 1993, art. 38); Tailândia (Constituição de 1997, art. 56); Uganda (Constituição de 1995, art. 39) e Venezuela (Constituição de 1999, art. 127). PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 49 Partes promoverão a proteção, preservação e melhoramento do meio ambiente".6 O Tribunal Europeu de Direitos Humanos, com sede em Estrasburgo, decidiu, em 9.12.94, no caso López Ostra, que "atentados graves contra o meio ambiente podem afetar o bem-estar de um pessoa e privá-la do gozo de seu domicílio, prejudicando sua vida privada e familiar".7 2. Princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais 2.1 O acesso aos recursos naturais ' Os bens que integram o meio ambiente planetário, como água, ar e solo, devem satisfazer as necessidades comuns de todos os habitantes da Terra. As necessidades comuns dos seres humanos podem passar tanto pelo uso como pelo não uso do meio ambiente. Desde que utilizável o meio ambiente, adequado pensar-se em um meio ambiente como "bem de uso comum do povo". É necessário alargar-se esse conceito com relação àquele empregado pelo Direito Romano. O Direito Ambiental tem a tarefa de estabelecer normas que indiquem como verificar as necessidades de uso dos recursos ambientais. Não basta a vontade de usar esses bens ou a possibilidade tecnológica de explorá-los. É preciso estabelecer a razoabilidade dessa utilização, devendo-se, quando a utilização não seja razoável ou necessária, negar o uso, mesmo que os bens não sejam atualmente escassos. "Es un derecho individual ai uso y disfrute de una cosa de titularidad común: usus in res communis".* 6. Decreto 3.321, de 30.12.99, promulga o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, "Protocolo de São Salvador", concluído em 17.11.88, em São Salvador/El Salvador (DOU 31.12.99, pp. 12-15). 7. "Los hechos dei caso López Ostra pueden ser resumidos destacando Ia producción, por una depuradora de propiedad privada construída en Lorca (Murcia), de moléstias y perjuicios (emanaciones de gas, olores pestilentes y contaminación), que alectaron especialmente a Ia vivienda de Ia demandante, situada a 12 metros de Ia depuradora. El Tribunal establece Ia responsabilidad de Ias autoridades espanolas por talta de reacción y aun por colaboración con Ia empresa privada, puesto que ei Município no adoptó Ias medidas adecuadas para ei cese de Ia actividad" (Fernando López Ramón, Deiechos fundamentales, subjetivos y colectivos ai médio ambiente", Civitas - Revista Espanoht de Derecho Administrativo 95/347-364, julho-setembro/97). 8. Demetrio Loperena Rota, El Derecho ai Médio Ambiente Adecuado, Madri, Editorial Civitas, 1996. 50 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O acesso dos seres humanos à natureza supõe a aceitação do Princípio 1 da Declaração do Rio de Janeiro/92, que diz: "Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva em harmonia com a natureza". O homem não é a única preocupação do desenvolvimento sustentável. A preocupação com a natureza deve também integrar o desenvolvimento sustentável. Nem sempre o homem há de ocupar o centro da política ambiental, ainda que comumente ele busque um lugar prioritário. Haverá casos em que para se conservar a vida humana ou para colocar em prática a "harmonia com a natureza" será preciso conservar a vida dos animais e das plantas em áreas declaradas inacessíveis ao próprio homem. Parece paradoxal chegar-se a essa solução do impedimento do acesso humano, que, a final de contas, deve ser decidida pelo próprio homem. A Declaração de Estocolmo/72, tratou também da matéria em seu Princípio 5: "Os recursos não renováveis do Globo devem ser explorados de tal modo que não haja risco de serem exauridos e que as vantagens extraídas de sua utilização sejam partilhadas a toda a humanidade". "A querela concernente às finalidades antropocêntricas ou ecocên-tricas da proteção do meio ambiente obscureceram um pouco a evolução para conceitos globais e de longo termo, os quais deveriam necessariamente conduzir ao reconhecimento das convergências com a proteção da saúde humana."9 Dependerá da legislação de cada país o regime de propriedade dos bens ambientais. Conforme for essa legislação, encontraremos ou não o acesso eqüitativo aos recursos naturais. 2.2 A eqüidade no acesso aos recursos naturais ' ' '' A eqüidade deve orientar a fruição ou o uso da água, do ar e do solo. A eqüidade dará oportunidades iguais diante de casos iguais ou semelhantes. Dentre as formas de acesso aos bens ambientais destaquem-se pelo menos três: acesso visando ao consumo do bem (captação de água, caça, pesca), acesso causando poluição (acesso à água ou ao ar para lança9. Alexandre Kiss, "Législation sanitaire et environnement. La législation sanitaire à 1'aube du XXI1-'Siècle", Recueil International de Législation Sanitaire 49/204, n. 1, 1998. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 51 mento de poluentes; acesso ao ar para a emissão de sons) e acesso para a contemplação da paisagem. Uma ordem hierárquica no acesso aos bens ambientais observará a proximidade ou vizinhança dos usuários com relação aos bens. Podemos dizer que a prioridade no uso dos bens deve percorrer uma escala que vai do local ao planetário, passando pela região, pelo pais e pela comunidade de países. A prioridade do uso dos bens ambientais não implica exclusividade de uso. Os usuários prováveis ou simplesmente os que desejam usar os bens e não os usam precisam provar suas necessidades atuais. Os usuários só poderão usar os bens ambientais na proporção de suas necessidades presentes, e não futuras. Pode contrariar o uso eqüitativo dos bens ambientais negar-se o acesso a usuários potenciais somente com o argumento de ser reservado o uso desses bens para o próprio usuário atual. É necessário, também, constatar a existência de tecnologia que permita o uso imediato dos bens ambientais. 2.3 A eqüidade no acesso aos recursos naturais e as futuras gerações A reserva dos bens ambientais, com a sua não utilização atual, passaria a ser eqüitativa se fosse demonstrado que ela estaria sendo feita para evitar o esgotamento dos recursos, com a guarda desses bens para as gerações futuras. A eqüidade no acesso aos recursos ambientais deve ser enfocada não só com relação à localização espacial dos usuários atuais, como em relação aos usuários potenciais das gerações vindouras. Um posicionamento equânime não é fácil de ser encontrado, exigindo considerações de ordem ética, científica e econômica das gerações atuais e uma avaliação prospectiva das necessidades futuras, nem sempre possíveis de serem conhecidas e medidas no presente. 4 O acesso aos recursos naturais, as convenções internacionais ' e os Direitos nacionais '"' " A Convenção para a Proteção e Utilização dos Cursos de Água Transfronteiriços e dos Lagos Internacionais, de Helsinque, 1992,10 em suas disposições gerais, preconiza que "os recursos hídricos são geridos 10. Em 2 de dezembro de 1998 já contava com 23 ratificações. 52 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO & de modo a responder às necessidades da geração atual sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades" (art. 2Ü, 5, c). A Convenção sobre os Usos dos Cursos de Água Internacionais para Fins Distintos da Navegação" diz em seu art. 5.1: "Os Estados do curso de água utilizam, em seus territórios respectivos, o curso de água internacional de modo eqüitativo e razoável. Em particular, um curso de água internacional será utilizado e valorizado pelos Estados do curso de água com o objetivo de chegar-se à utilização e às vantagens ótimas e duráveis - levando-se em conta os interesses dos Estados do curso de água respectivos compatíveis com as exigências de uma proteção adequada do curso de água". Quanto ao acesso aos recursos genéticos, diz a Convenção da Diversidade Biológica, em seu art. 15.7 "Cada Parte Contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas, conforme o caso e em conformidade, mediante o mecanismo financeiro estabelecido nos arts. 20 e 21, para compartilhar de forma justa e eqüitativa os resultados da pesquisa e do desenvolvimento de recursos genéticos e os benefícios derivados de sua utilização comercial e de outra natureza com a Parte Contratante provedora desses recursos. Essa partilha deve dar-se de comum acordo". Podemos ver em legislações nacionais a busca de facilitação do acesso ao uso de determinado bem ambiental. A Lei brasileira 9.433/97 diz em seu art. 11: "O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água". A Constituição do Estado da Baviera (Alemanha), em seu art. 141, 3 (modificado em 1984), prevê: "A fruição da beleza da natureza e a recreação na natureza livre, em particular o acesso aos bosques e às pastagens de montanha, à navegação da água, e a apropriação dos frutos selvagens dos bosques, na medida dos usos locais, são garantidas a todos. No exercício deste direito, cada um está obrigado a tratar a natureza e a paisagem com respeito. O Estado e os Municípios são autorizados e obrigados a garantir ao público o acesso às montanhas, aos lagos, aos rios e a outras belezas da paisagem, e em todos os casos, ainda que através de limitação do direito de propriedade, assim como construir caminhos e parques de recreação".12 11. Aberta à adesão, pela onu, aos 25 de maio de 1997. 12. Beniamino Caravita, Diritto Pubblico deli'Ambiente, Bolonha, II Mulino, 1990, pp. 13 e 14. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 53 3, Princípios usuário-pagador e poluidor-pagador O uso dos recursos naturais pode ser gratuito como pode ser pago. A raridade do recurso, o uso poluidor e a necessidade de prevenir catástrofes, entre outras coisas, podem levar à cobrança do uso dos recursos naturais. A valorização econômica dos recursos naturais não pode ser admitida para excluir faixas da população de baixa renda. No Brasil, a Lei 6.938, de 31.8.1981, diz que a Política Nacional do Meio Ambiente visará "à imposição, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos" e "à imposição ao poluidor e ao predador" da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados" (art. 4Ü, VII). "Em matéria de proteção do meio ambiente, o princípio usuário-pagador significa que o utilizador do recurso deve suportar o conjunto dos custos destinados a tornar possível a utilização do recurso e os custos advindos de sua própria utilização. Este princípio tem por objetivo fazer com que estes custos não sejam suportados nem pelos Poderes Públicos, nem por terceiros, mas pelo utilizador. De outro lado, o princípio não justifica a imposição de taxas que tenham por efeito aumentar o preço do recurso ao ponto de ultrapassar seu custo real, após levarem-se em conta as externalidades e a raridade".'3 O princípio usuário-pagador contém também o princípio poluidor-pagador, isto é, aquele que obriga o poluidor a pagar a poluição que pode ser causada ou que já foi causada. O uso gratuito dos recursos naturais tem representado um enriquecimento ilegítimo do usuário, pois a comunidade que não usa do recurso ou que o utiliza em menor escala fica onerada. O poluidor que usa gratuitamente o meio ambiente para nele lançar os poluentes invade a propriedade pessoal de todos os outros que não poluem, confiscando o direito de propriedade alheia. Guilherme Cano - um dos pioneiros do Direito Ambiental na Amé-nca Latina - afirma: "Quem causa a deterioração paga os custos exigidos para prevenir ou corrigir. É óbvio que quem assim é onerado redistribuirá esses custos entre os compradores de seus produtos (se é uma indústria, onerando-a nos preços), ou os usuários de seus serviços (por exemplo, uma Municipalidade, em relação a seus serviços de rede 13. Henri Smets, Le Príncipe Utilisateur-Payeurpour Ia Gestion Durable des Ressources Naturelles, gep/upp, doe 1998. . .. ... ,, 54 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO de esgotos, aumentando suas tarifas). A eqüidade dessa alternativa reside em que não pagam aqueles que não contribuíram para a deterioração ou não se beneficiaram dessa deterioração".14 Ludwig Krámer, comentando a inclusão do princípio no Tratado da Comunidade Européia, diz que "a coletividade não deve suportar o custo das medidas necessárias para assegurar o respeito da regulamentação ambiental em vigor ou para evitar os atentados contra o meio ambiente".15 Acrescenta que esse custo deve ser um ônus do fabricante ou do utilizador do produto poluente, que poderá repassá-lo aos utilizadores posteriores. "É conhecido o custo do controle e do pessoal que deve realizar o controle, como também é conhecida a ineficácia das sanções pecuniárias. A tributação antipoluição é paga sem possibilidade de transação, incentiva a introdução de tecnologia menos poluidora e avançada, minimiza o custo administrativo e o tempo da aplicação das sanções; enfim, é mais transparente".16 O princípio usuário-pagador não é uma punição, pois mesmo não existindo qualquer ilicitude no comportamento do pagador ele pode ser implementado. Assim, para tornar obrigatório o pagamento pelo uso do recurso ou pela sua poluição não há necessidade de ser provado que o usuário e o poluidor estão cometendo faltas ou infrações. O órgão que pretenda receber o pagamento deve provar o efetivo uso do recurso ambiental ou a sua poluição A existência de autorização administrativa para poluir, segundo as normas de emissão regularmente fixadas, não isenta o poluidor de pagar pela poluição por ele efetuada. Temos que diferenciar dois momentos da aplicação do princípio "poluidor-pagador" ou "predadorpagador": um momento é o da fixação das tarifas ou preços e/ou da exigência de investimento na prevenção do uso do recurso natural, e outro momento é o da responsabilização residual ou integral do poluidor. Com muita acuidade, diz Cristiane Derani: "O custo a ser imputado ao poluidor não está exclusivamente vinculado à imediata reparação do dano. O verdadeiro custo está numa atuação preventiva".17 O pagamento efetuado pelo poluidor ou pelo predador não lhes confere qualquer direito a poluir. 14. "Introducción ai tema de los aspectos jurídicos dei principio contaminador-pagador", in El Principio Contaminado!'-Pagador — Aspectos Jurídicos de su Adopción en América, Buenos Aires, Editorial Fraterna, 1983, 191 pp. 15. "Le príncipe du pollueur-payeur (Verrursacher) en Droit Communautaire", in AménagementEnvironnement, Ed. Story-Scientia, 1991, pp. 3-13. 16. Gerelli, Ambiente-Sviluppo — II Convegno di Milano, Roma, Ministero deli'Ambiente, 1989, 167 pp. 17. Direito Ambiental Econômico, São Paulo, Max Limonad, 1997, 297 pp. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 55 O investimento efetuado para prevenir o dano ou o pagamento do tributo, da tarifa ou do preço público não isentam o poluidor ou predador de ter examinada e aferida sua responsabilidade residual para reparar o dano. "O poluidor-que-deve-pagar é aquele que tem o poder de controle (inclusive poder tecnológico e econômico) sobre as condições que levam à ocorrência da poluição, podendo, portanto, preveni-las ou tomar precauções para evitar que ocorram" - salienta Maria Alexandra de Souza Aragão.18 No caso do consumo de um produto, havendo poluidor direto e poluidor indireto, afirma a jurista portuguesa que, tendo sido a produção poluente, "o poluidor-que-deve-pagar é quem efetivamente cria e controla as condições em que a poluição se produz, que neste caso é o produtor". .; -:~-jd! >>: •>; 4. Princípio da precaução 4.1 A prevenção e a introdução do princípio da precaução no Direito Ambiental Prevenir a degradação do meio ambiente no plano nacional e internacional é concepção que passou a ser aceita no mundo jurídico especialmente nas últimas três décadas. Não se inventaram todas as regras de proteção ao ambiente humano e natural nesse período. A preocupação com a higiene urbana, um certo controle sobre as florestas e a caça já datam de séculos. Inovou-se no tratamento jurídico dessas questões, procurando interligá-las e sistematizá-las, evitando-se a fragmentação e até o antagonismo de leis, decretos e portarias. A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente no Brasil (Lei 6.938, de 31.8.1981) inseriu como objetivos dessa política pública a compa-tibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico e a preservação dos recursos ambientais, com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente (art. 4Q, I e VI). Entre os instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente colocou-se a "avaliação dos impactos ambientais" (art. 9-, III). A prevenção passa a ter fundamento no Direito Positivo nessa lei pioneira na América Latina. Incontestável tornou-se a 18.0 Princípio do Poluidor Pagador - Pedra Angular da Política Comunitária do Ambiente, Coimbra, Coimbra Editora, 1997, p. 139. 56 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO obrigação de prevenir ou evitar o dano ambiental quando o mesmo pudesse ser detectado antecipadamente. Contudo, no Brasil, em 1981, ainda não havíamos chegado expressamente a introduzir o princípio da precaução. O princípio da precaução (vorsorgeprinzip) está presente no Direito alemão desde os anos 70, ao lado do princípio da cooperação e do princípio poluidor-pagador. Eckard Rehbinder acentua que "a Política Ambiental não se limita à eliminação ou redução da poluição já existente ou iminente (proteção contra o perigo), mas faz com que a poluição seja combatida desde o início (proteção contra o simples risco) e que o recurso natural seja desfrutado sobre a base de um rendimento duradouro".19 Gerd Winter diferencia perigo ambiental de risco ambiental. Diz que, "se os perigos são geralmente proibidos, o mesmo não acontece com os riscos. Os riscos não podem ser excluídos, porque sempre permanece a probabilidade de um dano menor. Os riscos podem ser minimizados. Se a legislação proíbe ações perigosas, mas possibilita a mitigação dos riscos, aplica-se o 'princípio da precaução', o qual requer a redução da extensão, da freqüência ou da incerteza do dano".2" Os riscos são "reais e irreais ao mesmo tempo. De um lado, existem ameaças e destruições que são já bem reais: a poluição ou a morte das águas, a desaparição de florestas, a existência de novas doenças etc. Do outro lado, a verdadeira força social do argumento do risco reside justamente nos perigos que se projetam para o futuro. Na sociedade do risco, o passado perde sua função determinante para o presente. É o futuro que vem substituí-lo e é, então, alguma coisa de inexistente, de construído, que se torna a 'causa' da experiência e da ação no presente" - assinala Ulrich Beck.21 "O princípio da precaução é atualmente uma referência indispensável em todos as abordagens relativas aos riscos" -afirma Michel Prieur.22 A implementação do princípio da precaução não tem por finalidade imobilizar as atividades humanas. Não se trata da precaução que tudo impede ou que em tudo vê catástrofes ou males. O princípio da precaução visa à durabilidade da sadia qualidade de vida das gerações humanas e à continuidade da natureza existente no planeta. 19. Ambiente. Economia. Diritto, Rimini, Maggioli Editore, 1988, pp. 205-221. 20. European Environmental Law - A Comparative Perspective, Aldershot, Dartmouth Publishing Co., 1996, p. 41. 21. La Société du Risque — Sur Ia vaie d'une Aittre Modernité, trad. do Alemão, Paris, Alto-Aubier, 2001, p. 61. 22. Droit de VEnvironnement, 4l ed., Paris, Dalloz, 2001, p. 145. . , ... PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL -87 4.2 Princípio da precaução > < "' na Declaração do Rio de Janeiro/92 ; A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, reunida no Rio de Janeiro em 1992, votou, por unanimidade, a chamada "Declaração do Rio de Janeiro", com 27 princípios. O Princípio 15 diz: "De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental".23 O Princípio 15 utiliza expressões como "precaução" e "ameaça de danos sérios e irreversíveis", que merecem conceituação, como, também, a pesquisa dos termos empregados em diferentes línguas. Precaução é "cautela antecipada", do Latim precautio-onis.24 "Precaution: 1. An action taken in advance to protect against possible failure or danger; a safeguard. 2. Caution practiced in advance; forethought; circums-pection."23 "Précaution: Action de prendre garde. Disposition prise par prévoyance pour éviter un mal. Circonspection, ménagement, pruden-ce."26 "Precaución: Reserva, cautela para evitar o prevenir los inconvenientes, dificultades o danos que pueden temerse."27 "Precauzione: 23. Tradução não-oficial, conforme publicada como anexo, apud Ministério das Relações Exteriores, Divisão do Meio Ambiente, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Relatório da Delegação Brasileira, 1992, Fundação Alexandre de Gusmão-FUNAG/Instituto de Pesquisa de Pesquisa de Relações Interna-cionais-ipRi, Coleção Relações Internacionais, n. 16 (cit. por Guido Fernando Silva Soares, As Responsabilidades no Direito Internacional do Meio Ambiente, Campinas, Komedi Editores, 1995,598 pp.). O texto em Inglês diz: "In order to protect the environment, the preeautionary approach shall be widely appiied by States according of their capabilities. Where there are threats of serious or irreversible damage, lack of full scientific certainty shall not be used as a reason for postponing cost-effective measures to prevent envi-ronmental degradation". 24. Antônio G. Cunha, Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1982. No mesmo sentido: Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Ia ed., 7a impr., Rio de Janeiro, Nova Fronteira, s/d.; Antônio M. Silva, Diccionário da Língua Portugueza, t. II, Lisboa, Typographia de Joaquim Germano de Sousa Neves, 1878. 25. The American Heritage Dictionary of the English Language, Nova York, American Heritage Publishing Co., 1970. 26. Petit Larousse lllustré. Paris, Librairie Larousse, 1978. ,. . _. ' eal Academia Espanola, Diccionário de Ia Leneua Espanola, Madri, Edito-"alEspasaCalpe, impr. 1997. 58 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Atto e comportamento diretto ad evitare un pericolo imminente o possibile."28 Não há divergência de conceituação nas cinco línguas mencionadas: a precaução caracteriza-se pela ação antecipada diante do risco ou do perigo. "O mundo da precaução é um mundo onde há a interrogação, onde os saberes são colocados em questão. No mundo da precaução há uma dupla fonte de incerteza: o perigo ele mesmo considerado e a ausência de conhecimentos científicos sobre o perigo. A precaução visa a gerir a espera da informação. Ela nasce da diferença temporal entre a necessidade imediata de ação e o momento onde nossos conhecimentos científicos vão modificar-se."29 A versão em língua portuguesa da Declaração do Rio de Janeiro/ 92 deve ter tomado por base o texto em inglês quando escreveu "ameaça" de danos. Em inglês empregou-se threat. Na versão francesa empregouse risque;30 e na versão espanhola, peligro.31 Os termos "precaução" e "prevenção" guardam semelhanças nas definições dos dicionários consultados. Contudo, há características próprias para o princípio da precaução, conforme o texto da Declaração do Rio de Janeiro/92 e de convenções internacionais que mencionaremos abaixo. A Declaração do Rio de Janeiro/92 foi menos exigente em relação à Carta Mundial da Natureza, oriunda da Resolução 37/7, de 1982, da Assembléia Geral das Nações Unidas, como notaTullio Scovazzi. Afirma também que, "diante das atividades humanas, dois comportamentos são tomados: ou se privilegia a prevenção do risco - se eu não sei que coisa sucederá, não devo agir; ou se privilegia (de modo francamente excessivo) o risco e a aquisição de conhecimento a qualquer preço - se eu não sei que coisa acontecerá, posso agir, e, dessa forma, no final, saberei o que fiz". Acrescenta o acatado internacionalista: "Um desenvolvimento muito interessante do moderno Direito Internacional do Meio Ambiente está representado no princípio da precaução. Este princípio não se apresenta como uma genérica exortação à precaução com o fim II 28. Giacomo Devotto e Gian Cario Oli, Vocabulário delia Lingua Italiana, Florenca, Felice Le Monnier, 1979 (13a reimpr. 1994). . 29. Nicolas Treich e Gremaq, Université de Toulouse (France), "Vers une théorie économique de Ia précaution?", texto colhido na Internet, tendo sido atualizado aos 28 de abril de 1997. 30. Revue Juridique de 1'Environnement 1/112, Limoges, 1993. 31. Ramón Martin Mateo, Tratado de Derecho Ambiental, t. II, Madri, Editorial Trivium, 1992, p. 770. princípios gerais do direito ambiental 59 de proteger o ambiente. Ao invés, ele tem um significado mais específico, querendo fornecer indicação sobre as decisões a tomar nos casos em que os efeitos sobre o meio ambiente de uma determinada atividade não sejam ainda plenamente conhecidos sob o plano científico".32 As declarações internacionais, ainda que oriundas das Nações Unidas, não são transpostas automaticamente para o Direito interno dos países, pois não passam pelo procedimento de ratificação perante o Poder Legislativo. Diferentemente, as convenções ou tratados passam a ser obrigatórios no Direito interno após sua ratificação e entrada em vigor. 4.3 O Brasil e o princípio da precaução : nas convenções internacionais , ...u: ', . .' Duas convenções internacionais assinadas, ratificadas e promulgadas pelo Brasil inseriram o "princípio da precaução". A Convenção da Diversidade Biológica33 diz, entre os considerandos de seu "Preâmbulo": "Observando também que, quando exista ameaça de sensível redução ou perda de diversidade biológica, a falta de plena certeza científica não deve ser usada como razão para postergar medidas para evitar ou minimizar essa ameaça ...".34 A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima35 diz em seu art. 3Ü: "Princípios 3. As Partes devem adotar medidas de precaução para prever, evitar ou minimizar as causas da mudança do clima e mitigar seus efeitos negativos. Quando surgirem ameaças de danos sérios ou irreversíveis, a falta de plena certeza científica não deve ser usada como razão para postergar essas medidas, levando em conta que as políticas e medidas adotadas para enfrentar a mudança do clima devem ser eficazes em função dos custos, de modo a assegurar benefícios mundiais ao menor custo possível".36 Vemos que as duas Convenções mencionadas diferem na redação do princípio da precaução. . • Sul principio piecauzionale nell Diritto Internazionale deli' Ambiente",Rivista Dhilto Internazionale LXXV/699-705, fase. 3, Milão, Giuffrè Editore, 1992. 33. Assinada no Rio de Janeiro em 5 de junho de 1992, ratificada pelo Congresso acionai pelo Decreto Legislativo 2, de 3.2.1994, tendo entrado em vigor para o Brasil em 29 de maio de 1994. 34. Decreto 2.519, de 16.3.98, promulgando a Convenção (DOU 17.3.98). N . 35: Assinada em Nova York em 9 de maio de 1992, ratificada pelo Congresso de maio d° DeC'et° Leãislativo 1, de 3.2.1994, passou a vigorar para o Brasil em 29 36. Decreto 2.652, de 1.7.1998, promulgando a Convenção (DOU 2.7.1998). 60 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Na Convenção da Diversidade Biológica, basta haver ameaça de sensível redução de diversidade biológica ou ameaça sensível de perda de diversidade biológica. Não se exigiu que a ameaça fosse de dano sério ou irreversível, como na Convenção de Mudança do Clima. A exigência fundamental para a conservação da diversidade biológica é a conservação in situ dos ecossistemas e dos habitais naturais e a manutenção de populações viáveis de espécies no seu meio natural. A Convenção da Mudança do Clima preconiza que as medidas adotadas para enfrentar a mudança do clima devem ser eficazes em função dos custos. A Convenção da Diversidade Biológica silencia acerca dos custos das medidas. As duas Convenções apontam, da mesma forma, as finalidades do emprego do princípio da precaução: evitar ou minimizar os danos ao meio ambiente. Do mesmo modo, as duas Convenções são aplicáveis quando houver incerteza científica diante da ameaça de redução ou de perda da diversidade biológica ou ameaça de danos causadores de mudança do clima. É interessante trazer ao conhecimento uma convenção de que o Brasil não faz parte, mas que conceitua o princípio da precaução. Trata-se da Convenção de Paris para a Proteção do Meio Marinho do Atlântico Nordeste de 22 de setembro de 1992. Para essa Convenção, em consonância com o princípio de precaução, "medidas de prevenção devem ser tomadas quando existam motivos razoáveis de se inquietar do fato de a introdução, no meio marinho, de substâncias ou energia, direta ou indiretamente, poder acarretar riscos para a saúde humana, prejuízo aos recursos biológicos e aos ecossistemas marinhos, representar atentado contra os valores de lazer ou entravar outras utilizações legítimas do mar, mesmo se não existam provas indicando relação de causalidade entre as causas e os efeitos".37 4.4 O princípio da precaução na jurisprudência ' * •-> 4.4.1 O princípio da precaução e as radiações nucleares ' '" , . Na vizinhança da usina nuclear Krümmel, perto de Hamburgo, na Alemanha, foi constada a doença conhecida como leucemia. Quando 37. Apud Chantal Cans, "Grande et petite histoire des príncipes généraux du Droit de l'Environnement dans Ia Loi du 2 février 1995", Revuç Juridique de VEnvironnement 2, 1995. <•-, .....••..... :• PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 61 nova e suplementar autorização foi solicitada, uma pessoa, vivendo a 20km, apresentou queixa dizendo que foi atingida pela doença referida, provavelmente, pela radiação da usina nuclear. A Administração Pública contestou, afirmando que os limites e condições de funcionamento da instalação nuclear tinham sido cumpridos. O Tribunal Administrativo de Schleswig-Holstein rejeitou a queixa. Houve recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, que deu provimento ao recurso. O Supremo Tribunal determinou que a Administração Pública constatasse se a radiação da usina nuclear estava ou não nos limites da "precaução" exigida pela Lei de Energia Atômica. Se as novas descobertas científicas indicarem que as normas fixadas anteriormente não são mais suficientes, aAdministração deve fixar padrões de precaução mais altos. A investigação e a ponderação dos riscos é tarefa da Administração.38 4.4.2 O princípio da precaução e a captura e caça ou a extinção de habitais de animais em perigo de extinção Na Austrália, pediu-se autorização para a captura e caça de espécies em extinção.39 O Juiz J. Stein decidiu que "o princípio de precaução é uma avaliação de bom senso e ela sempre foi aplicada pelos que tomam as decisões nas circunstâncias apropriadas, antes de o princípio ser descoberto. O princípio está voltado para a prevenção de prejuízo ambiental sério ou irreversível nas situações de incerteza. A premissa é de que, onde exista incerteza ou ignorância concernente à natureza ou extensão do prejuízo ambiental (se isto resulta de políticas, decisões ou atividades), os que decidem devem ser cautelosos". A autorização foi negada, afirmando o Juiz que o princípio da precaução deveria ser aplicado, pois no caso havia "escassez de conhecimentos científicos sobre a população das espécies, sobre o habitai e sobre os impactos". "O Juiz, ao fazer a aplicação do princípio da precaução, enfatizou a insuficiente análise das rãs no Estudo de Impacto Ambiental."40 3%-famdesverwalhmgsgericht, 21.8.1996 {BverwG 11 C 9.95), apuei Wybe Th. ouma, "The precautionary principie", T.M.C. Asser Institute, The Hague, Netherlands W artigo consta da Internet, no arquivo Principie of Precaution, sendo que seu autor o 4 19o0U' de forma semelhante. no Iceland Legal Journal, Úlfjótur 49/417-430, ns. 3 e (1999 "Leatch w. National Parks and Wildlife Service and Shoalhaven City Council Th D ' LC?ERA 270 at 281-285 Stein J. of Land and Environment Court", apuelWybe br>ir ,Uma' he precautionary principie", cit. As espécies em questão são the yellowecl Süder and the giant burrowing. Revi, / 'ler'ne Giraud, "Le Droit et le príncipe de precaution: leçons d'Australie", le Jundique de 1'Environnemenl 1/21-36, Limoges, sfde, 1997. 62 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Nos EUA, a Suprema Corte decidiu impedir a continuidade da construção de uma hidrelétrica porque poderia haver a destruição do habitai do molusco snail darter. Disse o Tribunal: "O valor desse patrimônio genético é incalculável (...) É interesse da humanidade limitar as perdas das variações genéticas. A razão é simples: aí se encontram as chaves dos enigmas que somos incapazes de resolver e elas podem fornecer as respostas às questões que nós não aprendemos a colocar. O mais simples egocentrismo nos ensina a sermos prudentes".41 4.4.3 O princípio da precaução e a Engenharia Genética Na França, o Conselho de Estado42 concedeu medida liminar (sursis à exécution) em processo movido pela Association Greenpeace France contra a empresa Norvartis, suspendendo a portaria do Ministro da Agricultura de 5 de fevereiro de 1998 que permitia o cultivo do "milho transgênico" ou obtido através de manipulação genética. O Tribunal francês acolheu a argumentação de que o processo estava incompleto no referente "à avaliação de impacto sobre a saúde pública do gene de resistência à ampicilina contido nas variedades de milho transgênico", como, também, o não-respeito ao "princípio da precaução", enunciado no art. L. 200-1 do Código Rural. A ex-Ministra do Meio Ambiente, jurista Corinne Lepage, afirmou que o posicionamento do Conselho de Estado "ultrapassa o caso do milho transgênico, pois o princípio deverá ser aplicado para todos os organismos geneticamente modificados (ogms)".43 O art. L. 200-1 do Código Rural, mencionado no julgado, diz que o princípio da precaução é aquele "segundo o qual a ausência de certeza, levando em conta os conhecimentos científicos e técnicos do momento, não deve retardar a adoção de medidas efetivas e proporcionais visando a prevenir o risco de danos graves e irreversíveis ao meio ambiente, a um custo economicamente aceitável". Martine Remond-Gouillod, comentando a referida decisão, afirma: "Longe de paralisar o progresso, a precaução disciplina a inovação, 41. Paulo A. L. Machado, Estudos de Direito Ambiental, São Paulo, Malheiros Editores, 1994, p. 98. A decisão da Suprema Corte norte-americana é a "Tenessee Valley Authorithy vs. Hill, 98, S.Ct 2279 (1978)". 42. Seção contenciosa do Conselho de Estado da França (julgamento 194.348, relator M. Derepas, leitura do julgado em 25.9.98 ). V. jornal O Estado de S. Paulo, ed. 26.9.1998. / 43. Jornal Le Figuro, ed. 26-27.9.1998, p. 10. princípios gerais do direito ambiental 63 assegurando-lhe um lugar legítimo em nossa civilização tecnológica. A precaução ensina a resistir à pressão da conjuntura imediata, podendo extrair-se da decisão do Conselho de Estado a seguinte mensagem: pode ser urgente esperar".44 No Brasil intentou-se medida cautelar, ajuizada45 pelo Instituto Brasileiro de Defesa do ConsumidoriDEC contra a União Federal, Monsanto do Brasil Ltda. e Monsoy Ltda., visando a impedir a autorização para qualquer pedido de plantio da soja transgênica round up ready antes que se proceda à devida regulamentação da matéria e ao prévio Estudo de Impacto Ambiental. O parecer do Ministério Público Federal é da autoria do Dr. Aurélio Veiga Rios. O Juiz Federal titular da 6a Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, Antônio Souza Prudente, decidiu,46 entre outras medidas, que: 1) as empresas rés, Monsanto do Brasil Ltda. e Monsoy Ltda., apresentem Estudo Prévio de Impacto Ambiental como condição indispensável para o plantio, em escala comercial, da soja round up ready; 2) ficam impedidas as referidas empresas de comercializar as sementes da soja geneticamente modificada até que sejam regulamentadas e definidas, pelo Poder Público competente, as normas de biossegurança e de rotulagem de ogms; 3) sejam intimados, pessoalmente, os Sr. Ministros da Agricultura, da Ciência e Tecnologia, do Meio Ambiente e da Saúde, para que não expeçam qualquer autorização às promovidas antes de serem cumpridas as determinações judiciais, ficando suspensas as autorizações que, porventura, tenham sido expedidas nesse sentido. O Juiz acolheu expressamente o princípio da precaução. O Tribunal Regional Federal da Ia Região, com sede em Brasília, em erudito e independente julgamento manteve a decisão de primeira instância, sendo Relatora a Juíza Assusete Magalhães, participando os Juizes Jirair Aram Meguerian e Carlos Fernando Mathias.47 Intervenção do Poder Público aplicando o princípio da precaução O Governo da França, com relação à alimentação e à fabricação de a imentos destinados aos animais das espécies cuja carne ou produtos jam destinados ao consumo humano, suspendeu a fabricação e a utili44. "Les ogms au ConseiS d'État", Gazette áu Palais 22-23.1.1999, pp. 13 e 14. Advogadas Andréa Lazzarini Salazar e Flávia Lefèvre Guimarães. 46. Brasília (DF), 18 de junho de 1999. 47- Processo n. AC 2000.01.00.014661-1-DF (no Tribunal),]. 8.8.2000. 64 ' DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO zação das "farinhas de carne, farinhas de osso, farinha de carne com ossos e todas as proteínas de origem animal, com exceção das proteínas oriundas do leite e de ovos e o uso das gorduras oriundas da transformação de ossos destinados à produção de gelatina".48 O Governo solicitara o parecer da Agência Francesa de Segurança Sanitária Alimentar, em 31.10.2000, sobre os riscos eventualmente ligados ao uso dessas farinhas. Antes da apresentação do referido parecer, aos 14.11.2000, foram determinadas por ele "medidas de precaução".49 Há indícios de que o uso dessas farinhas provoque o surgimento de "encefalopatia espongiforme bovina", chamada vulgarmente de "doença da vaca louca". A ingestão pelos seres humanos de carne oriunda de animal atacado por essa doença tem provocado o surgimento da moléstia chamada "Creutzfeldt-Jakob".5" Na incerteza científica, e mesmo tendo de fazer grandes despesas na apreensão das farinhas animais e sua posterior incineração, o Governo francês foi levado a proceder à interdição referida, na tentativa de evitar a propagação da moléstia e a generalização do pânico. 4.6 Características do princípio da precaução ' ' 4.6.1 Incerteza do dano ambiental . ,. , José Juste Ruiz acentua que, "durante muito tempo, os instrumentos jurídicos internacionais limitavam-se a enunciar que as medidas ambientais a serem adotadas deveriam basear-se em posições científicas, supondo que este tributo à Ciência bastava para assegurar a idoneidade dos resultados. Esta filosofia inspirou a maioria dos convênios internacionais celebrados até o final da década de 80, momento em que o pensamento sobre a matéria começou a mudar para uma atitude mais cautelosa e também mais severa, que levasse em conta as incertezas científicas e os danos às vezes irreversíveis que poderiam decorrer de atuação fundada em premissas científicas, que logo poderiam mostrar-se errôneas".51 48. Le Journal Officiel - Lois et Décrets n. 264, 15.11.2000, p. 18.081. 49. Le Journal Officiel, cit. 50. A doença "Creutzfeldt-Jakob" é geralmente mortal. É urna doença cerebral, transmissível, sem ser contagiosa, de longa incubação, mas de desenvolvimento rápido quando os sinais clínicos aparecem. De 1985 a 2000 já morreram 80 pessoas na Inglaterra, com essa doença. ('"La vache folie': le mea-culpa britanmque", Le Monde eléctro-nique, ed. 27.10.2000). 51. Derecho Internacional dei Médio Ambiente, Madri, McGraw Hill, 1999, 479 pp. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 65 A primeira questão versa sobre a existência do risco ou da probabilidade de dano ao ser humano e à natureza. Há certeza científica ou há incerteza científica do risco ambiental? Há ou não unanimidade no posicionamento dos especialistas? Devem, portanto, ser inventariadas as opiniões nacionais e estrangeiras sobre a matéria. Chegou-se a uma posição de certeza de que não há perigo ambiental? A existência de certeza necessita ser demonstrada, porque vai afastar uma fase de avaliação posterior. Em caso de certeza do dano ambiental, este deve ser prevenido, como preconiza o princípio da prevenção. Em caso de dúvida ou de incerteza, também se deve agir prevenindo. Essa é a grande inovação do princípio da precaução. A dúvida científica, expressa com argumentos razoáveis, não dispensa a prevenção. "O princípio da precaução consiste em dizer que não somente somos responsáveis sobre o que nós sabemos, sobre o que nós deveríamos ter sabido, mas, também, sobre o de que nós deveríamos duvidar" -assinala o jurista Jean-Marc Lavieille.52 Aplica-se o princípio da precaução ainda quando existe a incerteza, não se aguardando que esta se torne certeza. 4.6.2 Tipologia do risco ou da ameaça O risco ou o perigo serão analisados conforme o setor que puder ser atingido pela atividade ou obra projetada. Por exemplo, como já se mencionou, a Convenção da Diversidade Biológica não exige que a ameaça seja "séria ou irreversível", mas que a ameaça seja "sensível", quanto à possível redução ou perda da diversidade biológica. Ameaça sensível é aquela revestida de perceptibilidade ou aquela considerável ou apreciável. A Convenção-Quadro sobre a Mudança do Clima refere-se à ameaça de danos "sérios ou irreversíveis". A seriedade no dano possível é medida pela sua importância ou gravidade. A irreversibilidade no dano potencial pode ser entendida como a impossibilidade de volta ao estado ou condição anterior (constatado o dano, não se recupera o bem atingido). d-3 Da obrigatoriedade do controle do risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente atejna risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente não é dej Que Possa ser relegada pelo Poder Público. A Constituição Fe-d. foi. expressa no art. 225, § P. Para assegurar a efetividade desse re>to, incumbe ao Poder Público: "V - controlar a produção, a co52. Droit lutem ational de l 'Envimnnement, cit. 66 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO mercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente". A Constituição Federal manda que o Poder Público não se omita no exame das técnicas e métodos utilizados nas atividades humanas que ensejem risco para a saúde humana e o meio ambiente. O inciso V do § Ia necessita ser levado em conta, juntamente com o próprio enunciado do art. 225 CF, onde o meio ambiente é considerado "essencial à sadia qualidade de vida". Controlar o risco é não aceitar qualquer risco. Há riscos inaceitáveis, como aquele que coloca em perigo os valores constitucionais protegidos, como o meio ambiente ecologicamente equilibrado, os processos ecológicos essenciais, o manejo ecológico das espécies e ecossistemas, a diversidade e a integridade do patrimônio biológico incluído o genético - e a função ecológica da fauna e da flora. 4.6.4 O custo das medidas de prevenção • ., A terceira questão a ser enfrentada é o custo das medidas de prevenção em relação ao país, à região ou ao local. A Convenção-Quadro sobre a Mudança do Clima preconiza que "as políticas e medidas adotadas para enfrentar a mudança do clima devem ser eficazes em função dos custos, de modo a assegurar benefícios mundiais ao menor custo possível". A lei francesa também aponta que as medidas de prevenção, aplicadas em razão do princípio da precaução, devam ser tomadas "a um custo economicamente aceitável". O Reino Unido tem adotado a abordagem "bat" (Best Available Technology" - melhor tecnologia disponível), inserida na Lei de Proteção do Meio Ambiente de 1990 (seção 7, § 4), se bem que balizada pelas considerações de custo (Best Available Technology not entailing excessive cost).53 O custo excessivo deve ser ponderado de acordo com a realidade econômica de cada país, pois a responsabilidade ambiental é comum a todos os países, mas diferenciada. Os Profs. Alexandre-Charles Kiss e Dinah Shelton, do cnrs-Estrasburgo e da Universidade de Santa Clara, respectivamente, salientam que "as opiniões dos cientistas e dos economistas são freqüentemente divergentes na matéria, especialmente quando se trata de avaliar os danos evitados e aqueles que ficam sob a responsabilidade das gerações futuras, como, por exemplo, no caso do aumento possível do número de câncer, devido ao empobrecimento da camada de ozônio".54 53. G. Winter, ob. cit., p. 41. 54. Traité de Droit Européen de 1'Envirormement, Paris, Éditions Frison-Roche. 1995, 554 pp. ..-....- ...-,. .-.„.;.; .:,-: .,;- •........„.;,.,..•..... PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 67 Cristiane Derani cita o entendimento do Prof. Gerd Winter, de que compartilho inteiramente: "A participação do Poder Público não se dírecionaria exatamente à identificação e posterior afastamento dos riscos de determinada atividade. À pergunta 'causaria A um dano?' seria contraposta a indagação 'precisamos áeA? Não é o risco, cuja identificação torna-se escorregadia no campo político e técnicocientífico, causado por uma atividade que deve provocar alterações no desenvolvimento linear da atividade econômica. Porém, o esclarecimento da razão final do que se produz seria o ponto de partida de uma política que tenha em vista o bem-estar de uma comunidade. No questionamento sobre a própria razão de existir de uma determinada atividade colocar-se-ia o início da prática do princípio da precaução".55 4.6.5 Implementação imediata das medidas de prevenção: . ."'. o não-adiamento Os documentos internacionais citados entendem que as medidas de prevenção não devem ser "postergadas" (Declaração do Rio de Janeiro/92, Convenção da Diversidade Biológica e ConvençãoQuadro sobre a Mudança do Clima). "Postergar" é adiar, é deixar para depois, é não fazer agora, é esperar acontecer. A precaução age no presente para não se ter que chorar e lastimar no futuro. A precaução não só deve estar presente para impedir o prejuízo ambiental, mesmo incerto, que possa resultar das ações ou omissões humanas, como deve atuar para a prevenção oportuna desse prejuízo. Evita-se o dano ambiental, através da prevenção no tempo certo. O princípio da precaução, para ser aplicado efetivamente, tem que suplantar a pressa, a precipitação, a improvisação, a rapidez insensata e a vontade de resultado imediato. Não é fácil superar esses comportamentos, porque eles estão corroendo a sociedade contemporânea. Olhan-o-se o mundo das Bolsas, aquilata-se o quanto a "cultura do risco" on amina os setores financeiros e os governos, jogando, na maior parte ezes, com os bens alheios. O princípio da precaução não significa prostração diante do medo, não elimina a audácia saudável, mas se da el na busca da segurança do meio ambiente e da continuidade dos H necess'a<e do adiamento das medidas de precaução em acordeve semimstratlV0s ou em acordos efetuados pelo Ministério Público er exaustivamente provada pelo órgão público ambiental ou pelo 5S-Direito Ambiental Econômico, cit. ! '•' ' 68 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO próprio Ministério Público. Na dúvida, opta-se pela solução que proteja imediatamente o ser humano e conserve o meio ambiente (in dúbiopro salute ou in dúbio pro natura). 4.6.6 O princípio da precaução e os princípios constitucionais , da Administração Pública brasileira O princípio da precaução, abraçado pelo Brasil com a adesão, ratificação e promulgação das Convenções internacionais mencionadas, com a adoção do art. 225 da CF e com o advento do art. 54, § 3fl, da Lei 9.605, de 12.2.1998, deverá ser implementado pela Administração Pública, no cumprimento dos princípios expostos no art. 37, caput, da CF. "Em sede de formulação e implementação de políticas ambientais, não basta afastar a possibilidade concreta de dano ambiental, é preciso que tais políticas orientem-se no sentido de não estabelecerem situações das quais venha surgir a probabilidade dessa espécie dano" - afirma Afrânio Nardy.56 Contraria a moralidade e a legalidade administrativas o adiamento de medidas de precaução que devam ser tomadas imediatamente. Violam o princípio da publicidade e o da impessoalidade administrativas os acordos e/ou licenciamentos em que o cronograma da execução de projetos ou a execução de obras não são apresentados previamente ao público, possibilitando que os setores interessados possam participar do procedimento das decisões.57 "O princípio da precaução entra no domínio do direito público que se chama 'poder de polícia' da administração. O Estado, que, tradicionalmente, se encarrega da salubridade, da tranqüilidade, da segurança, pode e deve para este fim tomar medidas que contradigam, reduzam, limitem, suspendam algumas das liberdades do homem e do cidadão: expressão, manifestação, comércio, grandes empresas. O princípio da precaução estende este poder de polícia. Em nome desse princípio, o Estado pode suspender uma grande liberdade, ainda mesmo que ele não possa apoiar sua decisão em uma certeza científica", afirma François Ewald.58 56. José Adércio Leite Sampaio, Chris Wold e Afrânio José Fonseca Nardy, Princípios de Direito Ambiental, Belo Horizonte, Del Rey, 2003, p. 174. 57. Ao aplicar-se a Medida Provisória 2.163-41, de 23.8.2001, poderemos encontrar a concessão de prazos administrativos sem a devida motivação, o que provocará adiamento da implementação de medidas de prevenção e de precaução. Cresce a necessidade de o Ministério Público, as pessoas e as associações ambientais fiscalizarem esses acordos e buscarem junto ao Poder Judiciário a anulação das ilegalidades cometidas. 58."Laprécaution, uneresponsabilitédeLÉtat", LeMonde-édiüon électronique. 10.3.2000. . .....-........ . PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 69 Acrescenta o autor, que o legislador, segundo a lógica do balanço custo-vantagem, abre a possibilidade para a interposição de recurso por excesso de poder (desde que as disposições tomadas pela administração tenham sido desproporcionais). Ao aplicar o princípio da precaução, "os governos encarregam-se de organizar a repartição da carga dos riscos tecnológicos, tanto no espaço como no tempo. Numa sociedade moderna, o Estado será julgado pela sua capacidade de gerir os riscos".59 Deixa de buscar eficiência a Administração Pública que, não procurando prever danos para o ser humano e o meio ambiente, omite-se no exigir e no praticar medidas de precaução, ocasionando prejuízos, pelos quais será co-responsável. 4.6.7 A inversão do ônus da prova "Em certos casos, em face da incerteza científica, a relação de causalidade é presumida com o objetivo de evitar a ocorrência de dano. Então, uma aplicação estrita do princípio da precaução inverte o ônus normal da prova e impõe ao autor potencial provar, com anterioridade, que sua ação não causará danos ao meio ambiente" — ensinam Alexandre Kiss e Dinah Shelton.60 Citam o exemplo da Lei alemã sobre Responsabilidade Ambiental (v., neste livro, o Tít. V, Cap. I, item 6, "Relação de causalidade"). No Brasil, pela Lei de Política Nacional do Meio Ambiente aplica-se a responsabilidade civil objetiva (art. 14, § Ia). Jean Malafosse diz que "a dúvida aproveita ao 'poluído'. O princípio da precaução traduz-se por uma inversão do ônus da prova em proveito da proteção do meio ambiente".61 Cita Christian Huglo, que afirrna: Quando a prova da inocuidade de uma substância não é demonstrada.,é necessário abster-se de agir".62 Sérgio Marchisiso afirma que "o Principio da precaução emergiu nos últimos anos como um instrumento e política ambiental baseado na inversão do ônus da prova: para não °tar medida preventiva ou corretiva é necessário demonstrar que cerCnir 9' FranÇ°is Ewald e Kessler, "Les noces du risque et de Ia politique", Le Débat, uall>mard, n. 109, mars/avnl 2000 60- Ob. cit., p. 42. de 'mal msis a ''exécution de 1'arrêté ministériel introduisant en France trois variétés 23 l2lQQSaenetlqUement m°difié'", JCP-La Semaine Juridique-Édition Générale n. 52, '998, pp. 2.2732.276. Juris-Classeur de VEnvironnement 3/1, setembro de 1997. . lVJ...... 70 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ta atividade não danifica seriamente o ambiente e que essa atividade não causa dano irreversível".63 "A inversão do ônus da prova tem como conseqüência que os empreendedores de um projeto devem necessariamente implementar as medidas de proteção do meio ambiente, salvo se trouxerem a prova de que os limites do risco e da incerteza não foram ultrapassados" — afirma Cathérine Giraud. Essa autora cita D. Freestone, "que focaliza o procedimento de justificação prévia (prior justification procedure) como uma expressão da inversão do ônus da prova. Aplicado ao problema específico da imersão dos rejeitos industriais no mar do Norte, este procedimento exige a prova de que nenhum efeito nefasto será causado ao meio ambiente, como condição para a expedição da autorização de imersão".64 4.7A Lei9.605/98 e a incriminação •.-.••... da ausência de precaução t. . » . . , .. . A Lei 9.605, de 12.2.1998, diz, no art. 54: "Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa". O § 32 do referido art. 54 diz: "Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível" (v., neste livro, Tít. VIII, Cap. IX, item 4.2.3). A conceituação de "medidas de precaução" não é dada pela lei penal, devendo-se procurá-la nos entendimentos referidos nos textos internacionais, aqui interpretados, e na doutrina. Não se trata de outro tipo de precaução senão aquele inserido no princípio ora estudado, tanto que as medidas a serem exigidas serão cabíveis "em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível". 4.8 O Estudo de Impacto Ambiental e a aplicação do princípio da precaução: diagnóstico do risco ambiental A aplicação do princípio da precaução relaciona-se intensamente com a avaliação prévia das atividades humanas. O "Estudo de Impacto 63. "Gli atti di Rio nel Diritto Internazionale", Rivista di Dirittn Internazionale 3/ 581-621, Milão, Giuffrè Editore, 1992. 64. Cathérine Giraud. "Le Droit et le príncipe de precaution: leçons d'Australie". Revue Juridique de 1'Envimnnement cit., p. 33. princípios gerais do direito ambiental 71 Ambiental" insere na sua metodologia a prevenção e a precaução da deeradação ambiental. Diagnosticado o risco, pondera-se sobre os meios de evitar o prejuízo. Aí entra o exame da oportunidade do emprego dos meios de prevenção. A Declaração do Rio de Janeiro/92 preconizou também o referido Estudo de Impacto Ambiental, dizendo no Princípio 17: "A avaliação de impacto ambiental, como instrumento nacional, deve ser empreendida para atividades planejadas que possam vir a ter impacto negativo considerável sobre o meio ambiente, e que dependam de uma decisão de uma autoridade nacional competente". Na Austrália, as recomendações do Relatório Young de 199365 contêm mecanismos de aplicação do princípio de precaução. "O instrumento especial proposto é o Estudo de Impacto Ambiental. Este instrumento deverá, segundo o relatório, ser adaptado e conter uma etapa de fiscalização mais importante, como, da mesma forma, os padrões a serem respeitados devem ser mais estritos, levando-se em conta os fenômenos da irreversibilidade."66 O Brasil já havia adotado em sua legislação esse instrumento jurídico de prevenção do dano ambiental. A CF/88 diz no § l2 do art. 225: "Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: ... IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, Estudo Prévio de Impacto Ambiental, a que se dará publicidade". Nesse estudo avaliam-se todas as obras e todas as atividades que possam causar degradação significativa ao meio ambiente. A palavra potencialmente"67 abrange não só o dano de que não se duvida, como o dano incerto e o dano provável. "A implementação do princípio de precaução pode ser olhada como exigências que os Estados incorporam, entre outras, no planejamento e na legislação, através do procedimento do estudo de impacto ambiental", afirma Catherine Tinker.68 . ' ounS> "For °ur children's children: some praticai implications of inter-Co eiatlonal equity and the precaucionary principie", Resource Assesment Commission mmonwelth of Austrália, occasional publication 6, november 1993. Revi Cathérine Giraud, "Le Droit et le príncipe de précaution: leçons d'Australie", ue Jundique de 1'Environnement cit., p. 33. gua P ' Auréll° Buarque de Holanda Ferreira, ob. cit.; e Dicionário Brasileiro da LínlTeSa' M'rador Internacional, 1976. '«nment I r resP°nsability and the precautionary principie", Internationa! Envi-1996 and Policy< Edited by David Freestone and Ellem Hey, Kluwer Press, 72 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A Resolução 1/86-conama diz que o Estudo de Impacto Ambiental desenvolverá "a análise dos impactos ambientais do projeto e de suas alternativas, através de identificação, previsão da magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos relevantes, discriminando: ... os impactos positivos e negativos (benéficos e adversos), diretos e indiretos, imediatos e a médio e longo prazo; temporários e permanentes; seu grau de reversibilidade; suas propriedades cumulativas e sinérgicas; a distribuição dos ônus e benefícios sociais" (art. 6e, II). Determinar o grau de perigo, ou seja, apontar a extensão ou a magnitude do impacto, é uma das tarefas do Estudo de Impacto Ambiental, como se vê da regulamentação acima referida. É também objeto da avaliação o grau de reversibilidade do impacto ou sua irreversibilidade. Como se constata, a legislação do Estudo de Impacto Ambiental contempla, também, uma avaliação de risco. É preciso ressaltar a necessidade de os consultores do Estudo de Impacto Ambiental serem "competentes e independentes para avaliar os riscos".69 Falando da "crise da perícia", diz Axel Kahn: "Assiste-se, às vezes, ao fenômeno singular e humano da confusão entre perícia e promoção da técnica examinada, pela razão de que os peritos (ou especialistas), sendo experientes no terreno que examinam, são levados, às vezes, a defendê-lo em vez de avaliar verdadeiramente".70 No caso da aplicação do princípio da precaução, é imprescindível que se use um procedimento de prévia avaliação, diante da incerteza do dano, sendo este procedimento o já referido Estudo Prévio de Impacto Ambiental. Outras análises, por mais aprofundadas que sejam, não podem substituir esse procedimento. Decidiu o egrégio TRF da 5a Região, com sede em Pernambuco, que "o Relatório de Viabilidade Ambiental não é idôneo e suficiente para substituir o Estudo de Impacto Ambiental e respectivo relatório".71 Muito acertada a decisão judicial, pois a multiplicidade de procedimentos não só geraria confusão, como enfraqueceria as garantias jurídicas de seriedade, de amplitude e de publicidade já inseridas no Estudo de Impacto Ambiental. A prática dos princípios da informação ampla e da participação ininterrupta das pessoas e organizações sociais no processo das deci69. Conférence de Citoyens sur 1'Utilisation des ogms en Agriculture et dans l'Alimentation, Office Parlemantaire d'Évaluation des Choix Scientifiques et Téchno-logiques, Paris, Communiqués à Ia Presse, 20-21.6.1998. 70. "Le progrès de Ia Génétique", Fuluribles 27.9.1997, p. 5. 71. Ap. cível 5.173.820-CE, rei. Juiz José Delgado, j. 2.8.1994, DJU 23.9.1994. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 73 ões dos aparelhos burocráticos é que alicerça e torna possível viabilizar jmpjementação da prevenção e da precaução para a defesa do ser humano e do meio ambiente. 5. Princípio da prevenção :;,*.. • O dever jurídico de evitar a consumação de danos ao meio ambiente vem sendo salientado em convenções, declarações e sentenças de tribunais internacionais, como na maioria das legislações internacionais. A Convenção de Basiléia sobre o Controle de Movimentos Trans-fronteiriços de Resíduos Perigosos e seu Depósito, de 1989, expressa seu posicionamento de prevenção do dano, dizendo em seu "Preâmbulo": "As Partes da presente Convenção", "atentas também ao fato de que a maneira mais eficaz de proteger a saúde humana e o meio ambiente dos perigos que esses resíduos representam é a redução ao mínimo de sua geração em termos de quantidade e/ou potencial de seus riscos" e "determinadas a proteger, por meio de um controle rigoroso, a saúde humana e o meio ambiente contra os efeitos adversos que podem resultar da geração e administração de resíduos perigosos e outros resíduos ...".72 Nas obrigações gerais constantes do art. 4a, item 2, estatui que cada Parte deverá tomar medidas adequadas para assegurar que as pessoas envolvidas na administração de resíduos perigosos tomem medidas necessárias para evitar a poluição por resíduos perigosos e outros resíduos (alínea c). A Convenção da Diversidade Biológica73 diz em seu "Preâmbulo" que 'é vital prever, prevenir e combater na origem as causas da sensível redução ou perda da diversidade biológica". O Tratado de Maastricht sobre a União Européia indica como princípios da Política Ambiental, entre outros, o "da ação preventiva, baseada na correção prioritariamente na origem".74 A Corte não perde de vista que, no domínio da proteção do meio ambiente, a vigilância e a prevenção impõem-se em razão do caráter reqüentemente irreversível dos prejuízos causados ao meio ambiente e °s limites inerentes aos mecanismos de reparação deste tipo de dano" sentenciou a Corte Internacional de Justiça no processo GabcikovoiNagymaros (Hungria/Eslováquia).75 ............ 72- DOU 20.7.1993, Seção 1. '"".'. 73-OOC/17.3.1998, Seção 1. "...,..,-..., ..... '...', v 74- Kiss e Shelton, ob. cit. ''' -V í'. 'j:-" >>,.,:. 75-Decisão de 25 de setembro de 1997, § 140. : : , :,!,:,:„ 'i'< ' 74 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Essas Convenções apontam para a necessidade de prever, prevenir e evitar na origem as transformações prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente. Todos esses comportamentos dependem de uma atitude do ser humano de estar atento ao seu meio ambiente e não agir sem prévia avaliação das conseqüências. O Direito Positivo internacional e nacional irá traduzindo, em cada época, através de procedimentos específicos, a dimensão do cuidado que se tem com o presente e o futuro de toda forma de vida no planeta. "Prevenir" em Português, prevenir em Francês, prevenir em Espanhol, prevenire em Italiano e to prevent em Inglês - todos têm a mesma raiz latina, praevenire, e têm a mesma significação: agir antecipadamente. Contudo, para que haja ação é preciso que se forme o conhecimento do que prevenir. Com razão, o biologista francês Jean Dausset -prêmio Nobel de Medicina de 1980 - afirma que "para prevenir é preciso predizer".76 Sem informação organizada e sem pesquisa não há prevenção. Por isso, "divido em cinco itens a aplicação do princípio da prevenção: 1B) identificação e inventário das espécies animais e vegetais de um território, quanto à conservação da natureza e identificação das fontes contaminantes das águas e do mar, quanto ao controle da poluição; 2a) identificação e inventário dos ecossistemas, com a elaboração de um mapa ecológico; 3-) planejamentos ambiental e econômico integrados; 42) ordenamento territorial ambiental para a valorização das áreas de acordo com a sua aptidão; e 52) Estudo de Impacto Ambiental".77 No Brasil, quando a Lei 6.938/81 diz, em seu art. 2-, que em sua Política Nacional do Meio Ambiente observará como princípios a "proteção dos ecossistemas, com a preservação das áreas representativas", e "a proteção de áreas ameaçadas de degradação", está indicando especificamente onde aplicar-se o princípio da prevenção. Não seria possível proteger sem aplicar medidas de prevenção. Os meios a serem utilizados na prevenção podem variar conforme o desenvolvimento de um país ou das opções tecnológicas. O Princípio 8 da Declaração do Rio de Janeiro/92 diz: "A fim de conseguir-se um desenvolvimento sustentado e uma qualidade de vida mais elevada para todos os povos, os Estados devem reduzir e eliminar os modos de produção e de consumo não viáveis e promover políticas demográficas apro76. AuxFmntières de Ia Vie: Paroles d'Éthique, Lenoir, N. Paris, La Documentation Française, 1991. 77. Paulo A. L. Machado, Estudos de Direito Ambiental, p. 36. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 75 ri fidas".78 A prevenção empregada no sentido de previdência é "uma chance para a sobrevivência .'" A prevenção não é estática; e, assim, tem-se que atualizar e fazer valiações, para p0Cjer influenciar a formulação das novas políticas ambientais, das ações dos empreendedores e das atividades da Administração Pública, dos legisladores e do Judiciário. ,. , %-v:,.A . , •.. 6. Princípio da reparação .,•• A Declaração do Rio de Janeiro/92 diz em seu Princípio 13 que: "Os Estados deverão desenvolver legislação nacional relativa à responsabilidade e à indenização das vítimas da poluição e outros danos ambientais. Os Estados deverão cooperar, da mesma forma, de maneira rápida e mais decidida, na elaboração das novas normas internacionais sobre responsabilidade e indenização por efeitos adversos advindos dos danos ambientais causados por atividades realizadas dentro de sua jurisdição ou sob seu controle, em zonas situadas fora de sua jurisdição". A Declaração do Rio de Janeiro/92 é tímida em relação ao regime da reparação, pois se limita a preconizar "indenização às vítimas". O Direito Ambiental Internacional tem que evoluir no sentido da obtenção da "reparação" ao meio ambiente danificado. No derramamento de 230.000t oriundo do naufrágio do navio Amoco-Cadiz, nas costas da Bretanha (França), em 1976, a empresa norte-americana Amoco foi condenada, por um Tribunal americano, a pagar as despesas de restauração do litoral e dos portos, as despesas da Administração Pública, mas os danos ocorridos com a biomassa não foram indenizados.80 Contudo, as legislações nacionais exigem medidas de restauração de terras degradadas ou a reintrodução de espécies em vias de extinção.81 Já no "Preâmbulo" da Declaração de Estocolmo, n. 7, consta: "Ating'r tal fim, em relação ao meio ambiente, exigirá a aceitação de respona dades por parte de cidadãos e comunidade, e por empresas e insti•Çoes, em todos os níveis, participando todos de maneira justa nos esrorços comuns".82 neiam aU'° tachado, Maria Regina Machado e Marcos Perrotti, "Direito do pla-mento familiar", RT 749/46-59, São Paulo, Ed. RT, março de 1998. ean-Marc Lavieille, Droit International de 1'Environnement, cit. m- Kiss e Shelton, ob. cit. 82 r'SS C Shelton (°b- cit-) citam a Alemanha como exemplo. '- . Jf ° F- S. Soares, As Responsabilidades no Direito Internacional do Meio Ê'Lampmas,Komedi Editores, 1995. ... .., x ...v_v ?,,. , . 76 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Ocorrendo o dano ao meio ambiente, surge a discussão jurídica da obrigação de reparação desse dano no plano internacional. Dependerá da existência de convenção onde esteja prevista a responsabilidade objetiva ou sem culpa ou a responsabilidade subjetiva ou por culpa. A Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas está estudando a possibilidade de os Estados poderem chegar a incorrer em responsabilidade pelas conseqüências prejudiciais de atos não proibidos pelo Direito Internacional (responsabilidade por danos causados, ainda que sem ato ilícito).83 Jean-Marc Lavieille relaciona algumas Convenções que acolheram a responsabilidade objetiva: "Convenção de Bamako (1991, art. 42, alínea 3), responsabilidade objetiva e ilimitada em relação aos rejeitos perigosos; Convenção de Paris (1960, art. 3Ü) e Convenção de Viena (1963, art. 42), sobre a responsabilidade no domínio da energia nuclear, prevendo uma responsabilidade imputada automaticamente ao explorador; Convenção de Bruxelas (1969, art. 3Ü, alínea 1), sobre a responsabilidade civil por danos devidos à poluição por hidrocarbonetos, imputando-se a responsabilidade ao proprietário do navio".84 José Juste Ruiz assevera que, "quaisquer que sejam as dificuldades que experimenta o estabelecimento da responsabilidade internacional dos Estados na esfera do meio ambiente, não cabem dúvidas de que as regras de Direito Internacional existentes na matéria são também aplicáveis mutatis mutandis neste âmbito particular. O princípio mesmo da responsabilidade e reparação dos danos ambientais constitui, sem dúvida, um dos princípios reconhecidos no Direito Internacional do Meio Ambiente".85 No Direito interno, o Brasil adotou na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) a responsabilidade objetiva ambiental, tendo a Constituição brasileira de 1988 considerado imprescindível a obrigação de reparação dos danos causados ao meio ambiente (v. Tít. V, Cap. I, deste livro). 7. Princípio da informação : í , ' ;, ., A Declaração do Rio de Janeiro/92, em uma das frases do Princípio 10, afirma que, "no nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham 83. Guido F. S. Soares, ob. cit.; e José Juste Ruiz, ob. cit. 84. Dmit International de 1'Envimnnement, Paris, Ellipses, 1998. 85. Derecho Internacional dei Médio Ambiente, cit. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 77 autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades". Adequado procurar-se a dimensão da informação sobre meio ambiente. A Convenção sobre o Acesso à Informação, a Participação do Público no Processo Decisório e o Acesso à Justiça em Matéria de Meio Ambiente86 prevê, no art. 2Ü, item 3: "A expressão 'informações sobre meio ambiente' designa toda informação disponível sob forma escrita, visual, oral ou eletrônica ou sob qualquer outra forma material, sobre: a) o estado do meio ambiente, tais como o ar e a atmosfera, as águas, o solo, as terras, a paisagem e os sítios naturais, a diversidade biológica e seus componentes, compreendidos os ogms, e a interação desses elementos; b) fatores tais como as substâncias, a energia, o ruído e as radiações e atividades ou medidas, compreendidas as medidas administrativas, acordos relativos ao meio ambiente, políticas, leis, planos e programas que tenham, ou possam ter, incidência sobre os elementos do meio ambiente concernente à alínea a, supramencionada, e a análise custo/ benefício e outras análises e hipóteses econômicas utilizadas no processo decisório em matéria de meio ambiente; c) o estado de saúde do homem, sua segurança e suas condições de vida, assim como o estado dos sítios culturais e das construções na medida onde são, ou possam ser, alterados pelo estado dos elementos do meio ambiente ou, através desses elementos, pelos fatores, atividades e medidas visadas na alínea b, supramencionada". A Ia Conferência Européia sobre Meio Ambiente e Saúde, realizada em Frankfurt (1989), sugeriu à Comunidade Econômica Européia uma Carta Européia do Meio Ambiente e da Saúde prevendo que "cada pessoa tem o direito de beneficiar-se de um meio ambiente permitindo a realização do nível o mais elevado possível de saúde e de bem-estar; de ser informado e consultado sobre os planos, decisões e atividades suscetíveis de afetar ao mesmo tempo o meio ambiente e a saúde; de participar no processo de tomada das decisões".87 A Declaração de Limoges coloca em relevo a informação como ase indispensável do procedimento de autorização ambiental.88 c . ,Aarnus (Dinamarca), 25 de junho de 1998. A Convenção foi preparada pelo Çõeslf h Po'íticas de Meio Ambiente da Comissão Econômica para a Europa das Namdas. Entrou em vigor em 30 de outubro de 2001. in /{e , il- "Waddington, "La Charte Européenne de l'Environnement et de Ia Santé", ueu International de Législation Sanitaire, v. 41, n. 3, 1990, pp. 594-597. fõetí/e n- araÇao e Limoges, Recomendações da Reunião Mundial das Associa-cês no~lrell0 Ambiental, publicação da Universidade de Limoges em Espanhol, Fran-' b es> p°rtuguês e Japonês, 1991. 78 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Como mostram esses documentos internacionais, há ligação inegável entre meio ambiente e direito de ser informado. Desde já, temos que reconhecer que vivemos em todo o mundo, principalmente após a década de 60, a era das comunicações. A todo momento temos a impressão de estarmos sendo informados. Dizemos "a impressão" pois, muitas vezes, a informação recebida não é capaz de ser eficaz ou produzir os resultados devidos. A informação serve para o processo de educação de cada pessoa e da comunidade. Mas a informação visa, também, a dar chance à pessoa informada de tomar posição ou pronunciar-se sobre a matéria informada. Como já salientaram os juristas da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, os dados ambientais devem ser publicados. A publicidade está ligada à informação. O segredo, ao contrário, distancia e/ou elimina a informação. Contudo, tanto no exercício da política como na prática empresarial, o culto do segredo tem sido apontado como um instrumento de sucesso. Daí, não é de surpreender a resistência de governos e de empresários em transmitir as informações ambientais. No âmbito do Direito Internacional já se consolida o costume de troca de informações ambientais entre os países. Neste Continente, a Convenção para a Proteção da Flora, da Fauna e das Belezas Panorâmicas Naturais dos Países da América, de 1940, previu o intercâmbio científico em seu art. 6a. O Tratado da Antártica, de 1959, preconiza a troca de observações e de resultados científicos obtidos, que serão colocados livremente à disposição. Nota-se avanço nessa livre disponibilidade dos informes científicos, idéia que retomaremos nesta exposição. O Tratado de Cooperação Amazônica, de 1978, prevê em seu art. VII: "Tendo em vista a necessidade de que o aproveitamento da flora e da fauna da Amazônia seja racionalmente planejado, a fim de manter o equilíbrio ecológico da região e preservar as espécies, as Partes Contratantes decidem: a) promover a pesquisa científica e o intercâmbio de informações e de pessoal técnico entre as entidades competentes dos respectivos países, a fim de ampliar os conhecimentos sobre os recursos da flora e da fauna de seus territórios amazônicos e prevenir e controlar as enfermidades nesses territórios; b) estabelecer um sistema regular de troca adequada de informações sobre as medidas conservacionistas que cada Estado tenha adotado ou adote em seus territórios amazônicos, as quais serão matéria de um relatório anual por cada país". O Tratado de Cooperação Amazônica menciona, no referido art. VII, que a troca de informações deve estar inserida em "um sistema regular" e que haja a apresentação de um relatório. Um dos grandes PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 79 empecilhos ao fluxo das informações ambientais é que os relatórios e/ ou informes são passados somente entre os governos ou seus órgãos especializados em meio ambiente, ficando a informação mofando nos arquivos. Temos a salientar a ação do informe provindo dos organismos internacionais sobre o Direito interno dos países. O Brasil, na Lei de Agrotóxicos (Lei 7.802/89) e sua regulamentação de 1990, valorizou as informações que os organismos internacionais de alimentação (fao), meio ambiente (pnuma) e saúde (oms) transmitirem, obrigando imediatamente os órgãos competentes a proceder à avaliação técnica do produto e tomando medidas como proibição ou suspensão do uso, cancelamento ou suspensão do registro, restrição à comercialização, proibição da importação. Com o surgimento da catástrofe de Chernobyl, em 1986, é que os países resolveram assinar a Convenção sobre Pronta Notificação de Acidente Nuclear.89 À época, muitos países, notadamente europeus, dificultaram o repasse de informações sobre os perigos da radiação, expondo suas populações ao risco de contágio. De outro lado, anotem-se as dificuldades que estão sendo colocadas por certos países para a ratificação da Convenção da Basiléia, que trata da transferência de rejeitos perigosos, com sua nefasta "exportação" e "importação" para os países pobres ou em via de desenvolvimento. Nessa Convenção é inequívoca a importância da informação. O Fórum de Siena, preparatório da reunião das Nações Unidas de 1992, salienta a necessidade de a informação ser fornecida, também, a entidades locais.90 A Comunidade Européia criou, em 1990, a Agência Européia, compreendendo uma rede de informação e de observação para o meio ambiente.91 Interessa indicar que uma das finalidades dessa Agência é a de fornecer à Comunidade e aos Estados-membros "informações objetivas, fiáveis e comparáveis ao nível europeu", como, também, "registrar, colecionar e avaliar os dados sobre o estado do meio ambiente, redigir relatórios periciais sobre a qualidade e a sensibilidade do meio ambien-assim como as pressões que ele sofre no território da comunidade; ornecer, para a avaliação dos dados ambientais, critérios uniformes para 89 Decreto 9, de 15.1.91 (Brasil). abril de)"i'qgor»m &°bK Direit0 internacional do Meio Ambiente (Siena, Itália, 17-21 de 803-808 ' '" Recueií International de Législation Sanitaire, v. 41, n. 4, 1990, pp. de75 199,?gulament0 d° Conselho da Comunidade Econômica Européia n. 1.210/90, 56T-571 ' '" Remeíl Interncaional de Législation Sanitaire, v. 41, n. 3. 1990, pp. 80 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO aplicar em todos os Estados-membros". Quando se procura impulsionar o mercosul, é o momento necessário para, entre outras preocupações ambientais, instituir uma Agência de Informação Ambiental. A informação ambiental não tem o fim exclusivo de formar a opinião pública. Valioso formar a consciência ambiental, mas com canais próprios, administrativos e judiciais, para manifestar-se. O grande destinatário da informação - o povo, em todos os seus segmentos, incluindo o científico nãogovernamental - tem o que dizer e opinar. As informações ambientais recebidas pelos órgãos públicos devem ser transmitidas à sociedade civil, excetuando-se as matérias que envolvam comprovadamente segredo industrial ou do Estado. A informação ambiental deve ser transmitida sistematicamente, e não só nos chamados acidentes ambientais. A informação ambiental deve ser transmitida de forma a possibilitar tempo suficiente aos informados para analisarem a matéria e poderem agir diante da Administração Pública e do Poder Judiciário. A informação ambiental deve ser prevista nas convenções internacionais de forma a atingir não somente as pessoas do país onde se produza o dano ao ambiente, como também atingir as pessoas de países vizinhos que possam sofrer as conseqüências do dano ambiental. O monitoramento das informações ambientais deve ser levado a efeito não só pelo Poder Público, mas também pelas organizações não-governamentais, que, para esse fim, merecem receber auxílio científico e financeiro. Os métodos e recursos da Informática devem ser utilizados para a informação e o monitoramento ambientais, insistindo-se na cooperação internacional, de forma a que os países subdesenvolvidos e em desenvolvimento possam implementar esses procedimentos. A não-informação de eventos significativamente danosos ao meio ambiente por parte dos Estados merece ser considerada crime internacional. 8. Princípio da participação • 8.1 Introdução A participação popular, visando à conservação do meio ambiente, insere-se num quadro mais amplo da participação diante dos interesses difusos e coletivos da sociedade. É uma das notas características da segunda metade do século XX. O voto popular, em escrutínio secreto, passou a não satisfazer totalmente o eleitor. A ausência de um conjunto de obrigações dos eleitos, princípios gerais do direito ambiental 81 previamente fixadas, tem levado as cidadãs e os cidadãos a pleitear uma participação contínua e mais próxima dos órgãos de decisão em matéria de meio ambiente. O tema já passou a ser objeto das Constituições. A Finlândia modificou sua Constituição em 1995, passando a dispor no art. 14, a: "Cada um é responsável pela natureza, pela biodiversidade e pelo meio ambiente Os Poderes Públicos devem garantir a cada um o direito a um meio ambiente sadio, assim como a possibilidade de influenciar na tomada de decisões sobre as questões relativas a seu meio ambiente". A Declaração do Rio de Janeiro, da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, de 1992, em seu art. 10 diz: "O melhor modo de tratar as questões do meio ambiente é assegurando a participação de todos os cidadãos interessados, no nível pertinente". No nível nacional, cada pessoa deve ter a "possibilidade de participar no processo de tomada de decisões". Contudo, temos que reconhecer que "são indissociáveis 'informação/participação', pois é evidente que a 'participação' dos ignorantes é um álibi ou uma idiotice", como assinala Gerard Monédiaire.92 "O Direito Ambiental faz os cidadãos saírem de um estatuto passivo de beneficiários, fazendo-os partilhar da responsabilidade na gestão dos interesses da coletividade inteira."1-13 8.2 Organizações não-governamentais-ongs ''' A participação dos indivíduos e das associações na formulação e na execução da política ambiental foi uma nota marcante dos últimos vinte e cinco anos. Os sindicatos, desde o início do século XX, passaram a estruturar a participação dos trabalhadores. A atuação dos sindicatos foi decisiva para a defesa da dignidade dos trabalhadores. A participação para a proteÇao do meio ambiente não tem a mesma característica. Não se trata da e esa de uma classe profissional, mas de interesses que transcendem profissões e concernem a diversos segmentos sociais. 92 "À A propôs de Ia décision publique en matière d'environnement", in Les ms de Ia Régulation Juridique, v. 5, Paris, Recherches etTravaux du RED&S les Sciences de rHomme/Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, Problema,- eXandre"Charles Kiss, "La mise en oeuvre du Droit de 1'Environnement. ''/íownie-c6,6' m°yens". in 2' Conférence Ewopéenne "Environnement et Droits de 82 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO As associações ambientais, ao terem como metas a valorização da água, do ar, do solo, da fauna, da flora e do próprio homem, tratam de interesses difusos, que não só dizem respeito a cada um de seus associados, mas também a um número indeterminado de pessoas. A Declaração Rio/92 deu um passo significativo ao dizer que "o melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados, em vários níveis". No Princípio 10 abre-se um grande espectro na participação. Contudo, o princípio não chega a explicitar um duplo caráter da participação: dos cidadãos edas associações. A Convenção de Aarhus,94 ao conceituar "público interessado", afirma que, para os fins da definição, as organizações não-governamen-tais são consideradas como tendo interesse em participar do processo decisório ambiental, desde que atuem em prol da proteção do meio ambiente e preencham as condições exigidas pelo Direito interno dos países (art. 2, 5). Os indivíduos isolados, por mais competentes que sejam, não conseguem ser ouvidos facilmente pelos governos e pelas empresas. Os partidos políticos e os parlamentos não podem ser considerados os únicos canais das reivindicações ambientais. As ongs não têm por fim o enfraquecimento da democracia representativa. As ongs não são - e não devem ser — concorrentes dos Poderes Executivo e Legislativo, mas intervém de forma complementar, contribuindo para instaurar e manter o Estado Ecológico de Direito. Há matérias que interessam o meio ambiente que devem permanecer reservadas para o Poder Legislativo. A participação dos cidadãos e das associações não merece ser entendida como uma desconfiança contra os integrantes da Administração Pública, sejam eles funcionários públicos ou pessoas exercendo cargos em caráter transitório ou em comissão. Essa participação também não é substitutiva da atuação do Poder Público. A proteção dos interesses difusos deve levar a uma nova forma participativa de atuação dos órgãos públicos, desde que não seja matéria especificamente de segurança dos Estados. Não podem as ongs ser transformadas em massa-de-manobra dos governos e das empresas privadas e públicas.. Por isso, é essencial que essas entidades sejam independentes, não sendo nem criadas pelos governos, nem por eles manipuladas.95 Disse a. Agenda 21: "As organizações 94. "La Convention cTAarhus", Revue Juridique de 1'Environnement n. especial, Limoges, 1999, p. 92. 95. A Constituição do Brasil de 1988 preceitua que "é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar" (art. 5-, XVII); "a criação de associa- princípios gerais do direito ambiental 83 njjO.governamentais desempenham um papel fundamental na modelagem e implementação da democracia participativa. A natureza do papel independente desempenhado pelas organizações exige uma participação eenuína; portanto, a independência é um atributo essencial dessas organizações e constitui condição prévia para a participação genuína" (item 27, § l).96 Passou-se a enxergar como útil e legítima a participação das associações ambientais ou das organizações não-governamentais na própria estrutura governamental. A Declaração de Johannesburg/2002, em seu item 23, afirma: "O desenvolvimento sustentado supõe uma perspectiva de longo prazo e uma larga participação na elaboração das políticas, na tomada de decisões e na implementação em todos os níveis. Como parceiros sociais, nós continuaremos na ação em prol de parcerias estáveis, que reúnam os principais grupos interessados, respeitando sua independência, tendo cada um importante papel a desempenhar".97 Essa atuação da comunidade, através das associações, não mostrou ainda toda sua vitalidade. Em alguns órgãos colegiados a participação do público é numericamente ínfima, não dando às associações a menor chance de influir no processo decisório. Nesse caso as associações passam a ter papel mais de fiscal do processo decisório do que de participantes da tomada de decisão, evitando, pelo menos, que esse processo fique fechado pelo segredo. As associações ambientais ou ongs serão eficazes se tiverem credibilidade moral, pluralidade e idoneidade na sua composição, e se procurarem autenticamente os fins estatutários. Desvirtuamentos eventuais -como, por exemplo, agirem como "testas-de-ferro" de interesses espúrios ou atuarem como empresas, objetivando a obtenção de lucro financeiro - terão que ser corrigidos prontamente. Se as ongs utilizarem dinheiro público, deverão ser fiscalizadas pelos Tribunais de Contas. A participação cívica na conservação do meio ambiente não é um Processo político já terminado. Os fundamentos foram bem-lançados em todo o mundo, mas o edifício da participação tem muitos setores Para serem concluídos. Aponto três áreas: * As ongs devem poder participar da tarefa pública de inspeção e es°n"oramento das fontes poluidoras. Não basta o Poder Público executar unçao - que deve continuar a ser sua obrigação - de forma solitáinterfer" .orma a 'e'. a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a encia estatal em seu funcionamento" (art. 5", XVIII). 2001 p 68U'd° S Soares' Digito Internacional do Meio Ambiente, São Paulo, Atlas, 97 "Ti U>* and P ;16 °hannesburg Declaration on Sustainable Development", Enviwnmental outy J2-5, setembro/2002 (trad. do autor). 84 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ria. Chegou o momento de haver participação numa parte do exercício do poder de polícia, derrubando-se preconceitos não razoáveis. É saudável aceitar-se a colaboração cívica das pessoas e das ongs na parte que não implicar atuação no campo da segurança nacional ou quebra do sigilo legalmente protegido. • As ongs devem poder agir como assistentes do Ministério Público no processo penal. A defesa dos interesses difusos precisa ser alargada no campo penal, e a atuação das ongs, desde o inquérito policial, poderia diminuir a impunidade penal nos crimes ambientais. • O acesso das ongs aos tribunais foi um dos grandes sucessos da renovação processual do final do século XX. Mas neste novo século é preciso tornar esse acesso ao processo judicial mais amplo, para que seja eficiente. Não basta a intervenção do Ministério Público, que, mesmo revelando-se de grande utilidade, não é suficiente. Muitas ongs não têm recursos para contratar advogados. Temos que evoluir no sentido de que o Poder Público conceda os benefícios da assistência judiciária às ongs carentes, para que possam estar em juízo para defender os direitos fundamentais da vida humana e da sobrevivência das espécies. 8.3 Participação na formação das decisões administrativas Interessa apontar experiências de países em que as decisões administrativas ambientais passaram das mãos de um só funcionário, ou de uma comissão de funcionários públicos, para conselhos, em que a chamada "sociedade civil" ou as "organizações não-governamentais" tivessem voz e voto. O Prof. Gomes Canotilho afirma que "em primeiro lugar, o princípio democrático acolhe os mais importantes postulados da teoria democrática - órgãos representativos, eleições periódicas, pluralismo partidário, separação de poderes. Em segundo lugar, o princípio democrático implica democracia participativa, isto é, estruturação de processos que ofereçam aos cidadãos efetivas possibilidades de aprender a democracia, participar nos processos de decisão, exercer controle crítico na divergência de opiniões, produzir inputs políticos democráticos".98 Generalizou-se a implantação de conselhos com poderes consultivos não só nas matérias já costumeiras em meio ambiente, como nas mais recentes, tais os "organismos geneticamente modificados-OGMs". Outros países passaram a organizar conselhos com poderes consultivos e deliberativos nas mais variadas matérias ambientais. 98. José J. G. Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 2" ed.. Coimbra, Livraria Almedina, 1998. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 85 A prática registra que em alguns países são as próprias organiza-ões não-governamentais que elegem seus representantes para esses conselhos, sem que os governos interfiram nessa eleição. A questão não é isenta de dificuldades. Na maioria dos conselhos, governos - sejam eles de natureza central, regional ou municipal têm a maioria dos votos. Assim, as organizações não-governamentais, ainda que possam apresentar seus argumentos nas discussões, podem ficar vencidas, dando legitimidade, contudo, às decisões tomadas. "Discussões e debates públicos, permitidos pelas liberdades políticas e pelos direitos civis, também, podem desempenhar um papel fundamental na formação de valores. Até mesmo a identificação das necessidades é influenciada pela natureza da participação e do diálogo públicos. A discussão pública mais bem fundamentada e menos marginalizada sobre as questões ambientais pode ser não apenas benéfica ao meio ambiente, como também importante para a saúde e o funcionamento do próprio sistema democrático", afirma o Prêmio Nobel de Economia Amartya Sem." 8.4 Participação nos recursos administrativos • e nos julgamentos administrativos ' < ' A participação na interposição de recursos administrativos é fundamental para que haja possibilidade de os interessados baterem às portas da própria Administração, para que ela reveja seus atos irregulares. O recurso administrativo enseja a conciliação e a correção do ato administrativo ambiental, evitando-se que seja interposta ação judicial. A Lei 7.802/89 - sobre agrotóxicos - dá legitimidade às associações de defesa do meio ambiente e do consumidor para impugnar o registro de pesticidas ou pedir o cancelamento do registro já efetuado. A participação individual e coletiva nas ações judiciais em defesa do meio ambiente - fato marcante do final do século XX - é tratada no "tYC. II, deste livro. ... ;, ..,,„• , „ ,-.. 8-5 Participação no século XXI , . • ,>; , .,*,.--. .. v--. . e mstituição do plebiscito ambiental . ' .•: * ':'/ - .:.• 'ntrod S_assoc'aÇões de defesa do meio ambiente sempre reclamaram a çao do referendo de iniciativa popular em nível locai com o fim 99 r~) 186. ' uesenv"lvimento como Liberdade, Sã São Paulo, Companhia das Letras, 2000, p. 86 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO de levar os poderes locais a instaurar um debate democrático sobre as opções de ordenamento do meio ambiente de um Município. Essa reivindicação choca-se com a posição dos eleitos locais, inquietos de serem despojados de seus poderes."100 A Itália e a Suécia usaram a consulta popular, principalmente sobre a política nuclear, modificando o uso de reatores nucleares e, até, proibindo a construção de novas unidades. No Brasil, diz a CF, em seu art. 14: "A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular". Se a manifestação popular, com poder decisório, no plano regional e nacional, não deve ser banalizada, nem por isso deve ser excluída. Não basta pretender-se o alargamento da participação popular, pois é necessário que as regras dessa participação sejam estabelecidas de forma a permitir o emprego dos mesmos recursos financeiros na propaganda dos diversos pontos de vista. A consulta direta às populações em matéria ambiental que diga respeito aos interesses das gerações presentes e futuras merece ser corporificada pelo legislador brasileiro. 8.6 Participação nas ações judiciais ambientais A Convenção de Aarhus, já mencionada, coloca especial relevância sobre o acesso à Justiça para a obtenção de informações, insistindo que os procedimentos devem oferecer recursos "suficientes e efetivos", aí incluído o mandado de injunção, devendo ser "objetivos, eqüitativos e rápidos, sem que o custo seja proibitivo". Preconiza a implementação de mecanismos apropriados de assistência para eliminar ou reduzir os obstáculos financeiros que entravam o acesso à Justiça.'01 A Declaração do Rio de Janeiro/92 afirma que: " Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que diz respeito a compensação e reparação de danos".102 A possibilidade de as pessoas e de as associações agirem perante o Poder Judiciário é um dos pilares do Direito Ambiental. Para que isso se 100. M. Prieur, Droit de VEnviroimement, 4a ed., Paris, Dalloz, 2001, p. 126. 101. Ait. 92, §§ 1-5. 102. Princípio 10 (o período tem quatro frases, sendo essa parte a quarta frase). PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 87 tornasse realidade foi necessária a aceitação do conceito de que a defesa do meio ambiente envolve interesses difusos ou coletivos. Os EUA103 começaram a abertura do acesso popular para a defesa do ambiente. Entre outros países, na América do Sul, o Brasil, com a ação civil pública, e a Colômbia104 têm registrado um avanço no acesso aos tribunais. Na Europa, Áustria,105 Luxemburgo106 e Portugal107 avançaram em tornar mais acessível a Justiça nas questões ambientais. A Convenção Nórdica sobre a Proteção do Meio Ambiente108 prevê que "quem está sendo, ou possa ser, vítima de danos decorrentes de uma atividade prejudicial ao meio ambiente praticada em um outro Estado contratante tem o direito de instaurar um procedimento diante de umajurisdição ou órgão administrativo apropriado nesse país, concernente à licítude dessa atividade, pedindo especialmente que providências sejam tomadas para evitar que os danos sejam produzidos, como interpor recurso da decisão tomada pela jurisdição ou pelo órgão administrativo, na mesma medida e nas mesmas condições que uma pessoa jurídica do Estado onde essa atividade é exercida" (art. 3). O acesso de qualquer pessoa para a defesa do meio ambiente diante dos tribunais de um outro país ainda não se implantou na maioria das 103. Roger Findley, "Descentralização da proteção do meio ambiente nos Estados Unidos: políticas e problemas", Revista de Direito Ambiental 2/7-13, São Paulo, Ed. RT, abril-junho de 1996. 104. "Acciones populares para Ia protección de los derechos e intereses colectivos relacionados con ei ambiente", art. 88 da Constituição Política da Colômbia de 1991. 105. O Fundo Mundial da Natureza interveio em processo de construção de uma barragem no rio Danúbio, em razão de danos a uma velha floresta. O Governo abandonou o projeto após as decisões da Alta Corte de Justiça tomadas em janeiro de 1985 e em setembro de 1986 (apud Kiss e Shelton, Traité de Droit Européen de UEnvironnement, cit.). 106. Em Luxemburgo, de acordo com a Lei de 10 de agosto de 1992, as associações ambientais podem agir judicialmente com referência a eliminação de rejeitos, posição da atmosfera, poluição sonora e pesca (apud Kiss e Shelton, Traité de Droit Européen de VEnvironnement, cit.). 107. Na Lei de Bases do Ambiente (Lei 11/87) consta a rubrica "Direito a uma .ust>Ça acessível e pronta", dizendo o art. 44: "É assegurado aos cidadãos o direito à nÇao de preparos nos processos em que pretendam obter reparação de perdas e danos ergentes de fatos ilícitos que violem regras constantes da presente Lei e de diplomas co a lefu'arnentem> desde que o valor da causa não exceda o da alçada do Tribunal da aica . As associações de defesa do ambiente passaram a ter legitimidade para proOu a?Oes necessárias à prevenção ou cessação de ato ou omissões de entidade públicas criü 1V tiue degradem o ambiente, e poderão constituir-se assistentes nos processos Cns(art7 el0/87) m0 iq Convenção assinada por Dinamarca, Finlândia, Noruega e Suécia (Estocol-' ly de f 0 iq Convenção assinad ' ly de fevereiro de 1974). 88 . DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO convenções internacionais,109 pois a maior parte dos tribunais internacionais - como a Corte Internacional de Justiça das Nações Unidas (Haia) - só permite que um processo seja instaurado por um dos países que aceitam sua jurisdição, vedando a participação dos cidadãos. Há, portanto, um caminho longo a ser percorrido para a consolidação do direito de acesso aos tribunais, tanto nas legislações nacionais como no Direito Internacional. 9. Princípio da obrigatoriedade da intervenção do Poder Público "Deve ser confiada às instituições nacionais competentes a tarefa de planificar, administrar e controlar a utilização dos recursos ambientais dos Estados, com o fim de melhorar a qualidade do meio ambiente" (Declaração de Estocolmo/72). A Declaração do Rio de Janeiro/92, em seus 27 princípios, menciona pelo menos vinte vezes o termo "Estados", dizendo no Princípio 11: "Os Estados deverão promulgar leis eficazes sobre o meio ambiente". A gestão do meio ambiente não é matéria que diga respeito somente à sociedade civil, ou uma relação entre poluidores e vítimas da poluição. Os países, tanto no Direito interno como no Direito internacional, têm que intervir ou atuar. ,; 9.1 As Constituições Nacionais e a intervenção dos Estados Qual deva ser a dimensão dessa atuação, ou em que condições ela deve ser efetuada, é assunto que vem sendo objeto de atenção das Constituições Nacionais,110 do Direito nacional infraconstitucional e das conferências internacionais. 109. Antônio A. C. Trindade, "O acesso direto à Justiça Internacional", Correio Braziliense 6.8.2001 ("Caderno Direito & Justiça"), em que aponta a entrada em vigor, em 17 de junho de 2001, do Regulamento de 24.11.2000, podendo os demandantes em todas as etapas do procedimento recorrer à Corte Interamericana dos Direitos Humanos. 1 Q. Argentina (reforma constitucional de 1994, art. 41, segunda frase): "Las autoridades proveerán a Ia protección de este derecho, a Ia utilización racional de los recursos naturales, a Ia preservación dei patrimônio natural y cultural y de Ia diversidad biológica, y a Ia información y educación ambientales". Brasil (CF de 1988, art. 225, § l2): "Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 89 A atuação do Poder Público nos anos 1980-2000 registrou mudan-aS sensíveis nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Houve a rTminuição da presença estatal no setor da produção, por exemplo, nas hidroelétricas e nas telecomunicações. Mas não se instaurou um Estado ausente, em que só as relações de mercado fixariam as regras. O Poder Público passa a ter as chamadas "agências reguladoras", onde continuará obrigado a controlar a utilização dos recursos ambientais. III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, Estudo Prévio de Impacto Ambiental, a que se dará publicidade; V controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade". Cabo Verde (Constituição de 1992, art. 70, § 22): "O Estado e os Municípios, com a colaboração das associações de defesa do meio ambiente, adotarão políticas de defesa e de preservação do meio ambiente e velarão pela utilização de todos os recursos naturais". Chile (Constituição de 1980, art. 19, 8): "É dever do Estado velar para que este direito não seja afetado e tutelar a preservação da natureza". Colômbia (Constituição de 1991, art. 79): "É dever do Estado proteger a diversidade e a integridade do ambiente, conservar as áreas de especial importância ecológica". Croácia (Resolução de 22.12.1990, promulgando a Constituição, art. 69): "A República deve garantir aos cidadãos o direito ao meio ambiente sadio". Cuba (texto adotado aos 12.7.1992, art. 27): O Estado protege o meio ambiente e os recursos naturais do país". Equador (reforma da Constituição em 1983, art. 19): "É dever do Estado velar para que este direito não seja afetado e tutelar a preservação da natureza". Eslováquia (texto adotado aos 3.9.2002, ar' 4)- "O Estado fiscaliza o bom uso econômico dos recursos naturais, o equilíbrio ecológico e a proteção eficaz do meio ambiente". Espanha (Constituição de 1978, art. L°S Poderes Públicos velarán por Ia utilización racional de todos los recursos C°n e' fin de Prote§er y mejorar Ia calidad de Ia vida y defender y restaurar ei g nat 96Q110 ambiente' aPoyándose en Ia mdispensable solidaridad colectiva". Finlândia (Lei • de 17.7.1995, modificando a Constituição, art. 14a): "Os Poderes Públicos devem infiamir a °ada Um ° d'reit0 a um me'° ambiente sadio assim como a possibilidade de moTr'" a tomada de decisões sobre questões relativas a seu meio ambiente". Guate-nais" stituiÇao de 1985, art. 64): "O Estado fomentará a criação de parques nacio-PiosetS?VaS 6 refLlgios naturais, os quais serão inalienáveis". "O Estado, os Municí-mento ° •°S| °S llabÍtantes do território nacional estão obrigados a propiciar o desenvolvi-lha o eQ01 economico e tecnológico que previna a contaminação do ambiente e mante-Presentese'f° eCOlÓgÍC0"- Gukma (Constituição de 1980, art. 36): "No interesse das sos rnineraisUtUlaS-SeiaÇÕeS' ° Estado Protegerá e fará uso racional da terra, dos recur-Para conserv &- aqül'feros' assim como da fauna e da flora, e tomará medidas adequadas 25.2.1992 art e,melorar ° mel° ambiente". Mali (Constituição da República, texto de • 5). A proteção, a defesa do ambiente e a promoção da qualidade da 90 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 9.2 Função gestora dos Estados: meio ambiente como bem de uso comum do povo A inovação está na qualidade e na quantidade de medidas decon-trole. O Poder Público passa a figurar não como proprietário dos bens ambientais - águas, ar e solo, fauna e florestas, patrimônio histórico -, mas como um gestor111 ou gerente,112 que administra bens que não são dele e, por isso, deve explicar convincentemente sua gestão. A aceitavida são dever de todos e do Estado". Paraguai (Constituição de 1992, art. 6e): "El Estado también fomentará Ia investigación de los factores de población y sus vínculos con ei desarrollo económico-social, con Ia preservación dei médio ambiente y con Ia calidad de vida de los habitantes". Polônia (Constituição de 2.4.1997): "Art. 5a. A República da Polônia protege a soberania e a inviolabilidade de seu território, garante as liberdades e os direitos humanos e do cidadão como a segurança da população, preserva o patrimônio nacional e assegura a proteção do meio ambiente, segundo um princípio de desenvolvimento equilibrado". Portugal (Constituição de 1976, reformada em 1989, arts. 9a, "e", e 66-2): "São tarefas fundamentais do Estado: (...) e) proteger e valorizar o patrimônio cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território"; "2. Incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e por apelo e apoio a iniciativas populares: a) prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão; b) ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma conecta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-económico e paisagens biológicas equilibradas; c) criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou artístico; d) promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica". Seychelles (Constituição de 21.6.1993, art. 38): "O Estado reconhece a todas as pessoas o direito de viver em um ambiente limpo, sadio e ecologicamente equilibrado". Suíça (Constituição de 18.4.1999). "Art. 74.1 A Confederação legisla sobre a proteção do ser humano e de seu meio ambiente natural contra os atos danosos ou incômodos. 2. Ela age para prevenir esses atos. As despesas de prevenção e de reparação serão de responsabilidade daqueles que os causam. 3. A execução das disposições federais incumbe aos Cantões, na medida em que esta não for reservada à Confederação, pela lei". Vietnã (texto adotado aos 15.4.1992, art. 29): "Os órgãos do Estado, as unidades das Forças Armadas, as organizações econômicas e sociais e os indivíduos têm o dever de executar os regulamentos do Estado relativos ao uso racional dos recursos naturais e à proteção do meio ambiente". 111. A expressão "gestor" é encontrada com a mesma grafia em Espanhol: "Gestor: El que, sin tener mandato para ello, cuida de bienes, negócios o intereses ajenos, en pro de aquel a quien pertenecen" (Diccionario de Ia Lengua Espanola, Real Academia Espanola, cit., p. 1.038). 1 12. Em Francês - gérant ~ "qui administre pour autrui" (Dictionnaire Universel de Poche, cit., p. 248). PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL 91 ção prestar dessa concepção jurídica vai conduzir o Poder Público a ter que contas sobre a utilização dos bens "de uso comum do povo".1 9 3 Novas idéias de gestão ambiental: -..'-.. "'.'" eficiência e prestação de contas ' .] .:',./ ,;::.;;r A Declaração de Johannesburg/2002 afirma: "Para conseguirmos nossos objetivos de desenvolvimento sustentado temos necessidade de instituições internacionais e multilaterais mais efetivas, democráticas e que prestem contas"."4 Três idéias passam a nortear a matéria: eficiência, democracia e prestação de contas.U5 Os Estados passam a ter responsabilidade em exercer um controle que dê bons resultados, e devem ser responsáveis pela ineficiência na implementação de sua legislação. A co-responsabilidade dos Estados deverá atingir seus agentes políticos e funcionários, para evitar que os custos da ineficiência ou das infrações recaiam sobre a população contribuinte, e não sobre os autores dos danos ambientais. A democracia na gestão ambiental abre espaço para a efetividade da participação. A prestação de contas, que já se vê introduzida no mundo anglo-saxão, pela expressão accountable,u(l deverá ser traduzida pela aplicação dos princípios da motivação convincente, ampla e contínua, publicidade, razoabilidade e proporcionalidade. 113. V. o Direito Romano sobre a matéria neste livro, Tít. VI (Município - Urbanismo e Meio Ambiente), Cap. III ("Proteção das Praças e dos Espaços Livres"), item 3 ( A praça - Bem de uso comum do povo"). 114. "28.To achieve our goals of sustainable development, we need more effective, etnocratic and accountable international and multilateral institutions" ("The annesburg Declaration on Sustainable Development", Envinmmental Law and Policy, "- p- 236 - trad. do autor). Ewa p concepção de accountability não é isenta de contradições, como assinala crátT ei"e' apontand° como exemplo a tensão entre os princípios gerenciais e demo-Ção'Co°d na accountablllty'- "A perspectiva gerencial enfatiza a eficiência da organiza-aberto eS,empenho; e a liberdade; a perspectiva democrática valoriza o processo devido, -rê'tlm0" ("Public management in the United Kingdom: efficiency and ility" Politi M aco âCco gement in the United Kingdo Politiques et Management Public 19-3/122, 2001). "igman âCcomtable'- 0 with the duty of having to give an explanation; 2) responsible" 2) capab|1 lctwnc"'y rfContemporary English, cit., p. 7). "Accountable: ) answerable; LangUag being explained" (The American Heritage Dictionary of the English 92 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO " 9.4 Governança ambiental "';'' '''"' Após a Conferência das Nações Unidas de 1992, no Rio de Janeiro, tomou forma a teoria da governança111 ambiental, que procura incorporar algumas das idéias aqui expostas.1'8 Afirma Gerard Monediaire que "coexistem duas concepções sobre governança (algumas vezes qualificada de 'boa governança'): a primeira visa essencialmente ao reforço do Liberalismo econômico pela retirada do Estado, e a segunda constata o funcionamento contraprodutivo dos sistemas institucionais oriundos da Modernidade, para enxergar modalidade da evolução desses sistemas, numa perspectiva de definição de políticas territoriais coerentes".119 Não entendo que a teoria da governança ambiental implique necessariamente a retirada do Poder Público, mas ocasionará a adoção de uma gestão compartilhada com a sociedade civil no concernente às responsabilidades ambientais. O êxito ou o fracasso dessa concepção dependerão da real implementação dos novos instrumentos jurídico-institucionais de gestão. "Os Estados devem ainda cooperar de forma explícita e determinada para o desenvolvimento de normas de Direito Internacional Ambiental relativas à responsabilidade e indenização por efeitos adversos de danos ambientais causados, em áreas fora da sua jurisdição, por atividades dentro de sua jurisdição ou seu controle."120 A Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas vem trabalhando no tema da responsabilidade internacional dos Estados. Interessa colocar em relevo o projeto, adotado provisoriamente naCDIem 1994e 1995, relativo às atividades não proibidas pelo Direito Internacional e realizadas no território ou sob a jurisdição e controle de um Estado. Estão abrangidas as ativida117. "Governança - s.f. administração, governo" (Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, cit., v. 1, p. 878). 118. "Os capitais não virão e as instituições não prosperarão onde a boa governança estiver ausente (...) assim como o Estado de Direito, a luta contra a corrupção, a gestão econômica, a transparência, a possibilidade de verificar as contas, uma maior participação, processos de decisão baseados em uma ciência sadia e nos direitos humanos. Estes aspectos da governança contribuem para o crescimento econômico, para melhores condições de vida, para a igualdade social e para uma gestão ambiental responsável" ("U.S. Department of State", maio/2002, apud François Bernard, La Pauvreté Durable, Paris, Éditions du Félin, 2002, p. 29). 119. "De Ia gouvernance proclamée à Ia gouvernance institutionnalisé: biens communs et territoires", Taller - Gestión de los Recursos Hídricos y Governanza Ambiental, Montevidéu, Faculdade de Direito da Universidade da República Oriental do Uruguai, 23-24.11.2002 (documento não publicado). 120. Declaração Rio de Janeiro/92, Princípio 13, segunda frase. ':'" princípios gerais do direito ambiental 93 des que comportam risco de causar um dano transfronteiriço significati-v0 '21 Caminha-se para um regime mais estrito de responsabilidade, que obrigará o Estado a reparar, em qualquer caso, os danos ecológicos derivados de atividades perigosas.122 Os Estados têm o papel de guardiães da vida, da liberdade, da saúde e do meio ambiente. Garantir a liberdade responsável: liberdade para empreender, liberdade para descobrir e aperfeiçoar tecnologias, liberdade para produzir e comercializar, sem arbitrariedades ou omissões dos Estados, liberdade que mantém a saúde dos seres humanos e a sanidade do meio ambiente. A liberdade que engrandece a humanidade e o meio ambiente exige um Estado de Direito, em que existam normas, estruturas, laboratórios, pesquisas e funcionários, independentes e capazes. As gerações presentes querem ver os Estados também como protetores do meio ambiente para as gerações que não podem falar ou protestar. Os Estados precisam ser os curadores dos interesses das gerações futuras. Então, não será utopia um Estado de Bem-Estar Ecológico, fundado na eqüidade. , • Pissillo Mazzeschi, "Le Nazione Uniti e Ia codificazione delia responsabilità „ r danno arnbientale", Rivista Giuridica deli'Ambiente, Milão, Giuffrè Editore, 1996, PP- 371-386. I osé R- Ruiz, Derecho Internacional dei Médio Ambiente, Madri, Ciências Jl"-idicas/McGraw-Hm, 1999. „•.,-;-.,-,•,. , -. ; , ,: ...,..;. ..-:.,..... „ . .... TITULOU CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE Capítulo I - COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS. Capitulo II CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE. Capítulo I COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 1. Direito estrangeiro Citaremos recentes decisões judiciais referentes a questões ambientais em dois países em que se reserva para o Estado a função de estabelecer as normas gerais ambientais. 1.1 Espanha O art. 149.1.23 reserva, com exclusividade, ao Estado a "legislação sobre os princípios da proteção do ambiente, sem prejuízo do poder das Comunidades Autônomas de estabelecer regras adicionais de proteção". O Prof. Tomás-Ramon Fernandez acentua que os princípios ge- COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 95 rais "desempenham o papel, a serviço dos interesses superiores da Nação inteira, de um comum denominador normativo, um minimum de uniformidade de cada regulamentação, a partir do qual o poder legislativo territorial poderá procurar a via que julgue a mais correta, levadas em conta circunstâncias especiais de seu território regional e singularidades e especificidades dos problemas particulares que ele deve resolver". Acrescenta o Professor espanhol, que é também Conselheiro no Conselho de Estado: "a Constituição quis adicionar, indo além do simples desenvolvimento dos princípios gerais, permitindo às Comunidades Autônomas elaborarem regras novas para melhorar e reforçar o nível de proteção. Essas regras adicionais podem traduzir-se no estabelecimento de medidas mais rigorosas contra a poluição de restrições mais severas para o uso de veículos, de limitações mais fortes para certas indústrias ou para as atividades turísticas, etc. Tudo o que reforça o regime geral é, em princípio, possível, pois a Constituição fala de uma proteção adicional. Somente é interdito às Comunidades Autônomas de serem menos exigentes ou de enfraquecerem os padrões fixados pelo Estado".1 c 1.2 Bélgica Menciona-se a decisão da Corte de Arbitragem 47, de 25.2.1988, que visou à anulação parcial de decreto da região Wallonne de 7.10.1985, sobre a proteção das águas de superfície contra a poluição. Foram relatores os Juizes J. Sarot e L. P. Suetens (este último ministrou Curso de Direito Ambiental Belga no II Curso Internacional de Direito Comparado do Meio Ambiente, realizado pela Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente, em Salvador, Estado da Bahia, 1981). O Conselho de Ministros Belga argumentou no recurso interposto "que a competência atribuída às regiões em matéria de proteção do ambiente deve ser exercida respeitando-se as normas legais gerais e setoriais, e que, em outros termos, esta disposição não concede às regiões senão o poder de adotar normas mais severas que as normas elaboradas pelo legislador nacional e não o poder de ab-rogar estas últimas". A Corte de Arbitragem entendeu que normas "gerais" compreendem normas que sao aplicáveis a todos os setores da atividade e que normas "setoriais" Oesignam aquelas que só se aplicam a um ou diversos setores de atividade determinada. O Tribunal anulou o art. 70 do decreto da região Wallonne. 1- "Environnement dans Ia Consütution espagnole et dans Ia doctrine du Tribunal onstitutionnel", in Revue Juridique de V Environnement 3/197-95, de 1984. ...... 96 .-.<:<:,'•;--'* DIREITO AMBIENTALÃKÂSILEIRO -''* v 2. Direito brasileiro e Comparado , t > ..r, > h 2./ Introdução ' A Constituição de 1988 pela primeira vez no Brasil insere o tema "meio ambiente" em sua concepção unitária. Não foi a primeira Constituição da América Latina a fazê-lo, tendo sido precedida pelas Constituições do Equador e do Peru de 1979, Chile e Guiana de 1980, Honduras de 1982, Panamá de 1983, Guatemala de 1985, Haiti e Nicarágua de 1987. Nossos ancestrais na Europa - Portugal e Espanha inovaram em 1976 e 1978 - introduzindo o tema nas Constituições. A Constituição brasileira garante o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida. Além disso, conceitua o meio ambiente como "bem de uso comum do povo" e, dessa forma, não pode ser apropriado e é extracomércio. Voltamos, assim, o nosso olhar para o Direito Romano, base de nossa legislação. 2.2 Uma nova concepção de federalismo - -: O meio ambiente - assim especificamente denominado pela Constituição — está previsto como sendo de competência da União, dos Estados e do Distrito Federal, de forma concorrente (art. 24). Como competência comum para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estão previstos a proteção do meio ambiente e o combate à poluição em quaisquer de suas formas (art. 23). O termo ou a noção de competência concorrente já fora utilizado na Constituição de 1934 (art. 10). A concorrência enseja a possibilidade de iniciativa na área da legislação ambiental para os Estados e para o Distrito Federal, se a União se mantiver inerte. A competência concorrente poderá exercer-se não só quanto à elaboração de leis, mas de decretos, resoluções e portarias. Para atender às peculiaridades próprias, os Estados poderão exercer a competência legislativa plena, desde que não exista "lei federal sobre normas gerais" (art. 24, § 3Ü). Essa competência chamada "plena", entretanto, sofre dupla limitação - qualitativa e temporal: a norma estadual não pode exorbitar da peculiaridade ou do interesse próprio do Estado e terá que se ajustar ao disposto em norma federal ambiental superveniente. No Direito Comparado vemos que a Alemanha passou a prever, em 1972, na reforma da Constituição de 1949, a competência concorrente COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 97 no concernente à poluição do ar e do ruído e no referente à eliminação de rejeitos (art. 74, n. 24). 2 3 A norma geral como limite da legislação federal ambiental As Constituições brasileiras de 1946 (art. 5Ü, XV) e de 1967 (art. 8fl, XVII) previram o estabelecimento de "normas gerais pela União" sobre determinadas matérias. Assim, também, a EC 1/69 (art. 8Ü, XVII). Não previam, contudo, normas gerais sobre meio ambiente, pois o tema nelas não estava incluído especificamente com essa nomenclatura. A expressão "norma geral" foi também utilizada pela Constituição da Alemanha de 1949 no sentido de que poderia ser editada pela Federação para a "caça, proteção de sítios naturais e de paisagens, regime de águas" (art. 75). A Lei italiana 394, de 8.7.1986, prevê, dentro das competências do Ministério do Meio Ambiente, propor ao Conselho de Ministros "norma geral de direção e de coordenação para a gestão das áreas protegidas de caráter geral e local" (art. 52, 3). A Constituição da Espanha de 1978 traça a repartição de competências entre o Estado (poder central) e as Comunidades Autônomas nos arts. 148 e 149 especialmente. O art. 149-1 diz: "O Estado tem competência exclusiva sobre as seguintes matérias: (...) 23a) Legislação básica sobre proteção do meio ambiente, sem prejuízo das Comunidades Autônomas de estabelecer normas adicionais de proteção". A Constituição brasileira não conceitua norma geral. Resta à doutrina e à jurisprudência essa tarefa. A norma geral visa à aplicação da mesma regra em um determinado espaço territorial. A norma geral federal ambiental, ou em outra matéria de competência concorrente, não precisa necessariamente abranger todo o território brasileiro. Uma nor-ma geral ambiental federal poderá dispor, por exemplo, sobre as áreas Previstas no art. 225, § 4Ü - Floresta Amazônica Brasileira, Serra do Mar, Mata Atlântica, Pantanal e Zona Costeira. A norma geral pode abranger somente um ecossistema, uma bacia hidrográfica ou somente Uma espécie vegetal ou animal. A União está obrigada a inserir na norma geral o conteúdo dos acordos, tratados ou convenções internacionais já ratificados, deposita-os e promulgados pelo Brasil, como, evidentemente, guardar fidelida-de à Constituição em vigor. _ Na Alemanha a regra constitucional difere quanto à forma de altera-Çao da concorrência legislativa dos Estados (Lãnder). >.. ; ,..... 98 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO No sistema alemão, a Federação pode legislar no domínio da competência concorrente, "quando aparece a necessidade de regulamentação legislativa federal: "1) porque uma questão não pode ser regulamentada eficazmente pela legislação nos diferentes Estados (Lander); "2) porque a regulamentação de uma questão por uma lei de um Estado (Land) poderia afetar os interesses de outros Estados (Lander) ou da coletividade; "3) porque a proteção da unidade jurídica ou econômica e especialmente a manutenção da homogeneidade das condições de vida além das fronteiras de um Estado (Land) exigem tal medida." Assim, na Alemanha, na matéria de combate à poluição do ar e do ruído como na matéria relativa à eliminação de rejeitos (matérias de competência concorrente), se ocorre uma das três hipóteses mencionadas, a Federação alemã pode editar uma regra ambiental sobre normas gerais. 2.4 Competência suplementar dos Estados em matéria ambiental Diz o art. 24, § 2-, da CF: "A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados". Suplemento é o que supre, a "parte que se ajunta a um todo para ampliá-lo ou para aperfeiçoá-lo. O que serve para suprir qualquer falta".2 Assim, não se suplementa a legislação que não exista. Portanto, quando a competência da pessoa de Direito Público interno for somente suplementar a legislação de outro ente, se inexistirem normas, não existirá o poder supletório. Não se suplementa uma regra jurídica simplesmente pela vontade de os Estados inovarem diante da legislação federal. A capacidade suplementaria está condicionada à necessidade de aperfeiçoar a legislação federal ou diante da constatação de lacunas ou de imperfeições da norma geral federal. Nossas anteriores Constituições mostram essa tradição jurídica. A Constituição de 1934 dizia: "As leis estaduais, nestes casos, poderão, atendendo às peculiaridades locais, suprir as lacunas ou deficiências da legislação federal, sem dispensar as exigências desta" (art. 5a, § 3Ü). A CF/37 é no mesmo sentido em seu art. 18. 2. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Ia ed., 7a reimpr., Rio de Janeiro, Nova Fronteira, s/d. ..-.. ,. ... COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 99 A Constituição de 1967, ao prever a competência dos Estados para ieeislar supletivamente, indica que a lei federal deve ser respeitada (art. g2 § 22). A EC 1/69 é no mesmo sentido em seu art. 82, parágrafo único. Ressalte-se que não se pode suplementar um texto legal para descumpri-lo ou para deturpar sua intenção, isto é, para desviar-se da mens legis ambiental federal. 2.5 A competência ambiental comum na Constituição Federal de 1988 2.5.1 A implementação da legislação ambiental A Constituição Federal de 1988 inovou na técnica legislativa, tratando em artigos diferentes a competência para legislar e a competência para administrar. Vejamos as matérias incluídas no campo ambiental pelo art. 23: "É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: ... III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;... VI — proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII - preservar as florestas, a fauna e a flora; ... XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios". No art. 23, a CF faz uma lista de atividades que devem merecer a atenção do Poder Público. O modo como cada entidade vai efetivamente atuar em cada matéria dependerá da organização administrativa de cada órgão público federal, estadual e municipal. O art. 23 merece ser colocado em prática em concordância com o art. 18 da mesma CF, que etermina: "A organização político-administrativa da República Fede-raüva do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição". __ A autonomia não significa desunião dos entes federados. Também "ao deve produzir conflito e dispersão de esforços. Mas a autonomia ,Ve ensejar que o Município tenha ou possa ter sistemas de atuação tnmistrativa não semelhantes ou desiguais aos vigentes nos Estados. , tstados, por sua vez, poderão ter, também, sua organização admis ratiya ambiental diferente do Governo Federal. Assim, as normas ls federais ambientais não podem ferir a autonomia dos Estados e 100 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO dos Municípios, exigindo dos mesmos uma estrutura administrativa ambiental idêntica à praticada no âmbito federal. A competência dos Estados para legislar, quando a União já editou uma norma geral, pressupõe uma obediência à norma federal, se editada de acordo com a Constituição Federal. Situa-se no campo da hierarquia das normas e faz parte de um sistema chamado de "fidelidade federal". Não é a mesma situação perante a implementação administrativa da lei (art. 23 da CF), onde não há hierarquia nas atuações das diferentes Administrações Públicas. A Administração Pública federal ambiental não está num plano hierárquico superior ao da Administração Pública ambiental estadual, nem esta situa-se em plano superior ao da Administração Pública ambiental municipal. As atribuições e obrigações dos Estados e dos Municípios só a Constituição Federal pode estabelecer. O arcabouço do país tem que estar estruturado na lei maior que é a Constituição. Se leis ordinárias, se decretos, portarias ou resoluções, por mais bem intencionados que sejam, começarem a criar direitos e obrigações para os entes federados, subvertem-se totalmente os fundamentos da Federação. Leis infraconstitucionais não podem repartir ou atribuir competências, a não ser que a própria Constituição Federal tenha previsto essa situação, como o fez explicitamente no art. 22, parágrafo único, quando previu que a competência comum estabelecendo normas de cooperação será objeto de lei complementar. 2.5.2 Inconstitucionalidade de alguns artigos > •. • '. ', -da Resolução 237/97-conama >.' • > .->• O Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA, através da Resolução 237/97,3 procurou partilhar a competência ambiental administrativa, dispondo sobre o licenciamento ambiental a ser feito pelo ibama (art. 4Ü), estabeleceu as competências dos Estados e do Distrito Federal (art. 5Ü), determinou a área de competência dos Municípios (art. 6a) e estabeleceu que "os empreendimentos e atividades serão licenciados em um nível de competência" (art. 7U). Sobre a atuação do conama em matéria de licenciamento há o preceito do art. 8Ü, I, da Lei 6.938/81, que diz que compete ao conama "estabelecer, mediante proposta do ibama, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, a sei" 3. Resolução 237, de 19.12.1997, DOU 22.12.1997, Seção 1, p. 30.841. COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 101 •oncedido pelos Estados e supervisionado pelo ibama". O inciso é claro ern sua redação, mostrando que instituir "normas e critérios para o licenciamento" não se confunde com atribuir competência para os entes federativos licenciarem. Tanto é que o mencionado art. 8Ü liga a instituição das normas e critérios com o licenciamento "a ser concedido pelos Estados". Da mesma forma o art. 10, caput, da mencionada lei indica nue o licenciamento será feito pelo "órgão estadual competente". Uma resolução federal não pode alterar uma lei federal. Sob todos os ângulos em que se vejam esses quatros artigos, constata-se invasão de competência e quebra de hierarquia administrativa, acarretando o vício de inconstitucionalidade e ilegalidade dos arts. 4Ü a 1- da resolução inquinada. Nesse sentido o posicionamento dos juristas Francisco Thomaz van Acker4 e Filippe Augusto Vieira de Andrade.5 A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente - Lei 6.938/81 -procurou inserir em todo o território nacional o sistema de licenciamento ambiental. Esse sistema já existia em alguns Estados da Federação. Gradativamente conseguiu-se implantar o mesmo sistema em todo o Brasil, ainda que isso tenha demandado um grande esforço dos Estados, pois não houve um programa de auxílio financeiro da União para com os Estados. De outro lado, a Lei 6.938/81 previu uma suplementação administrativa em sentido inverso do que estamos acostumados: se os Estados não intervierem adequadamente, a União deverá intervir para fazer os que os Estados não fizerem no campo ambiental. Não se trata de sujeitar os Estados ao poder revisional ou de homologação da União. O controle da aplicação da legislação federal de normas gerais ambientais é diferente do exercício da competência ambiental comum. O controle da implementação das normas gerais ambientais só pode ser feito pela União através de ação judicial, procurando anular o ato administrativo estadual acusado de invasão da competência federal u escumprimento das normas gerais federais. Deixando de lado a busca nas soluÇões judiciais, a União tem a possibilidade de não fazer convê- °S stad°s e Municípios que descumprirem as normas federai Nr p q p ao se pode negar que o controle efetivo da implementação das 4 "R estabelece J.eVes.consideraÇões sobre a Resolução 237, de 19.12.1997, do Conama, que 1 Cntf'0S para lii d Dii Abil 8/ 165-169 a ?"0S Para ° ''cenciamento ambiental", Revista de Direito Ambiental 8/ 5 "Re° Sa° Paul0' Ed- RT- outubro-dezembro de 1997. de '"constifucio a° C°NAMA 237- de 19.12.1997: um ato normativo inválido pela eiva (-°ngresso de «J1 de e de ilegalidade", Promotoria de Justiça - Meio Ambiente, 2a dos Giupos Es ei° Ambiente do Ministério Público de São Paulo. 32 Encontro Anual do Estado dp o?e°'ais de Promotores de Justiça do Meio Ambiente, Ministério Público ue o Paulo, 1998, pp.63-80. 102 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO normas gerais federais pelos Estados e pelos Municípios é uma tarefa difícil, dado o número de questões abrangidas e a vastidão do território nacional. Na redução das situações de conflito no licenciamento ambiental merece ser utilizado o "princípio da subsidiariedade". Nesse sentido, aborda o tema, de forma percuciente, Paulo José Leite Farias.6 Quem deve resolver o problema inicialmente é quem está perto dele. No quadro das pessoas de Direito Público é o Município que deve ter competência administrativa prioritária para controlar e fiscalizar as questões ambientais. Contudo, sem embargo de meu entusiasmo pela atuação dos Municípios nesse campo, assinalo que não é matéria fácil essa municipalização do licenciamento ambiental, pois muitos deles não têm recursos financeiros e alguns deles usarão de forma ineficiente o controle ambiental, querendo aumentar a receita ou o emprego, com sacrifício da sanidade do ambiente. A implementação da política ambiental não pode desconhecer a dimensão dos ecossistemas, principalmente os aquáticos, que não estão contidos só nos Municípios. 2.6 Estabelecimento de normas '' i , f . . de cooperação institucional , <v ,,>., v O art. 23 da CF, em seu parágrafo único, dispõe: "Lei complementar fixará normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional". A lei complementar tem como característica necessitar da aprovação da maioria absoluta da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, conforme prevê o art. 69 da CF. Visando à cooperação entre a União e os Estados, a Constituição Federal de 1967 estabelecia: "A União poderá celebrar convênios com os Estados para a execução, por funcionários estaduais, de suas leis, serviços ou decisões" (art. 8e, § lü). "Cooperar" significa "operar ou obrar simultaneamente; trabalhar em comum; colaborar. 2. Ajudar, auxiliar, colaborar".7 "Cooperate: 1-To work together toward a common end or purpose. 2. To practice 6. Competência Federativa e Proteção Ambiental, Porto Alegre, Sérgio Antôm0 Fabris Editor, 1999. 7. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, ob. cit. COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 103 conomic cooperation".8 "Coopérer - agir conjointement avec quelqu'un".9 A cooperação há de ter duas finalidades indeclináveis - o equilíbrio do desenvolvimento e o equilíbrio do bem-estar em âmbito nacional Portanto, é uma das tarefas da lei complementar criar instrumentos nue evitem que um Estado da Federação ou um Município possam des-cumprir a legislação ambiental ao atrair investimentos, praticando um desenvolvimento não sustentado. O trabalho no meio ambiente já vem sendo feito conjuntamente pelos órgãos federais e estaduais com a formulação do siSNAMA-Sistema Nacional do Meio Ambiente, concebido pela Lei de Política Nacional do Meio Ambiente de 1981. O conama, onde têm assento permanente todos os Estados da Federação, é um fórum de encontro quadrimestral de discussão da política de meio ambiente. Se possível as reuniões desse colegiado mereceriam ter maior duração para que a política regional de meio ambiente fosse discutida, como, também, para que se incluísse na pauta de trabalhos uma avaliação periódica e concreta dos resultados obtidos com a implementação das políticas públicas ambientais. Na normatização das ações administrativas, a lei complementar poderia prever uma troca permanente e sistemática da informação ambiental. Esse intercâmbio de informações abrangeria os pedidos de licenciamento em tramitação em cada órgão, os Estudos Prévios de Impacto Ambiental em elaboração e a serem elaborados (inclusive as audiências públicas realizadas e a serem realizadas), as auditorias ambientais realizadas e em processo de realização e as sanções administrativas aplicadas. O fornecimento recíproco dessas informações tornaria realidade o ai"t- 9a da Lei 6.938/81, que, ao dispor sobre os instrumentos da política nacional do meio ambiente, afirma, no inc. XI, "a garantia da prestação e informações relativas ao meio ambiente, obrigando-se o Poder Púllco a produzi-las, quando inexistentes". Inf - 'nf°rmaÇ°es corporificariam o siSNAMA-Sistema Nacional de fo Çao Ambiental. A coleta, a organização e a transmissão dos in-p e amWentais necessitam de uma efetiva cooperação financeira da a União, para que possam abranger todo o território nacional. ca ~ °m a informação produzida evitar-seia a duplicação ou a triplias ações administrativas em muitos licenciamentos administraQ --p. American lf,Alnencan Heritage Dictionary ofThe English Language, William Morris, 9 p Henta§e Publishing Co., Nova York, 1970. Cht Ulmue lüustré, Paris, Librairie Larousse, 1978. • •' 104 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO tivos, pelo desconhecimento recíproco das atividades dos órgãos ambientais. Note-se que a ignorância das múltiplas atividades dos órgãos ambientais dos entes federados age negativamente, provocando desesperança da coletividade e desconfiança nos próprios escalões administrativos. Nas diretrizes para a elaboração da lei orçamentária para o exercício de 1997 (Lei 9.293, de 15.7.1996), constam no Anexo 8 - Meio Ambiente -, como prioridades, "aprimorar o sistema de informação ambiental, com a implantação de sistema de monitoramento, e melhorar os níveis de eficiência dos órgãos federais, estaduais e municipais em gestão do meio ambiente".10 A lei complementar, com base no art. 23, parágrafo único, da CF, deve ter como fundamento a mútua ajuda dos entes federados. Dessa forma, essa lei não visa, e não pode visar, à diminuição da autonomia desses entes, despojando-os de prerrogativas e de iniciativas que consti-tucionalmente possuem, ainda que não as exerçam, por falta de meios ou de conscientização política. A lei complementar não pode, pois, especificar quais os tipos de licenças ambientais a serem fornecidas pelos Estados e pelos Municípios. Não é função da lei federal mencionada estabelecer prazos para os procedimentos administrativos estaduais e municipais, pois essa matéria integra a organização administrativa autônoma desses entes. Outra vertente do intercâmbio de informações está na cooperação dos órgãos financiadores oficiais com os órgãos ambientais. O art. 12 da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, a que o "Protocolo Verde" deu ênfase, para operar com a eficiência desejada, necessita de sistemática troca de informações entre os órgãos de meio ambiente e os bancos. A implementação dessas medidas merece ser contemplada na lei complementar pretendida. A União poderá limitar-se em sua atuação ao elaborar a lei complementar do art. 23 da CF, pois se trata de uma lei federal e, assim, decidirá em causa própria. Exemplifique-se com a norma contida no art. 14,1, da Lei 6.938/81, vedando-se a cobrança de multa se a mesma já tiver sido aplicada pelos Estados, Distrito Federal ou pelos Municípios. A Lei 7.797/89, que criou o Fundo Nacional de Meio Ambiente, já previu como aplicações prioritárias dos recursos financeiros os projetos das áreas de controle ambiental e desenvolvimento institucional (art5U). Existem Estados na Federação brasileira que precisam, de forma 10. DOU 16.7.1996, p. 13.069. COMPETÊNCIA AMBIENTAL DA UNIÃO E DOS ESTADOS 105 se permanente, de auxílio financeiro para a contratação de consultoria ecializada, para que possam bem examinar os Estudos de Impacto Ambiental e fazer monitoramentos ambientais. Sem que se dispense a álise minuciosa da aplicação do dinheiro público, há necessidade de ntir-se um fiux0 permanente de verbas para esses setores institucio-ais sob pena de ficar paralisada a atividade administrativa essencial no meio ambiente dos Estados carentes. A lei complementar precisa interessar-se em fornecer diretrizes sobre a forma de as empresas públicas e privadas retribuírem as atividades governamentais de fiscalização no setor ambiental. O perigo da simultaneidade de competências para a implementação do controle ambiental é que todos os entes federados ficaram competentes, mas nenhum deles tem assumido especificamente a melhoria da qualidade das águas, do ar e do solo e nenhuma instância governamental se responsabiliza pela conservação das florestas e da fauna. 2.7 mercosul e cooperação ambiental ,. . ,.;j >n!'-•••;-> A cooperação no Direito Internacional tem sido apontada como sendo o início da solução de muitos problemas que assolam o planeta Terra. Percorrendo-se a Declaração Rio/92 constatam-se várias formas indicadas para a cooperação ambiental. Na América do Sul estamos vivendo o começo da estruturação do relacionamento integrado dos países do Cone Sul, visando, preliminarmente, à integração econômica. A isenção de entraves alfandegários pressupõe uma evolução jurídica harmônica de diversas áreas, entre as quais a do meio ambiente. Devemos olhar os passos seguidos pela União Européia. Passaram-se 40 anos e chegaram os paísesmembros a afirmar no Tratado de aastricht, que a melhoria do meio ambiente é prioridade e que os da-s ambientais devem ser corrigidos na sua fonte geradora. A evolução ireito Ambiental no mercosul haverá de observar o quadro geral de uiçoes semelhantes, como a União Européia, apressando a imple-n ação de soluções benéficas para a saúde do ambiente. experiência européia de união entre países com regime unitário e ão d 1 rat'V0 desPerta a atenção para a responsabilidade na elabo-Instânc.a leglslação ambiental. A Corte de Justiça de Luxemburgo -diretiv 1Ciaria da União Européia -já decidiu que os efeitos das dades sComunitarias atingem os Estadosmembros em todas as entiNoiw°entra''Zaí'aS' seJam elas Províncias ou Municípios, tina o s' RC0SUL do's países têm regime federativo: o Brasil e a Argen-«tema brasileiro já foi aqui tratado. : .,, ..,. 106 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A República Argentina reformou sua Constituição em 1994. O art. 41, § Ia, diz: "Todos los habitantes gozan dei derecho de un ambiente sano, equilibrado, apto para ei desarrollo humano y para que Ias actividades productivas satisfagan Ias necesidades presentes, sin comprometer Ias generaciones futuras y tienen ei deber de preservalo. El dano ambiental generará prioritariamente Ia obligación de recomponer, según Io establezca Ia ley". O § 3a deste artigo determina: "Corresponde a Ia Nación de dictar Ias normas que contengan los presupuestos mínimos de protección y a Ias Províncias, Ias necesarias para complementadas, sin que aquéllas alteren Ias jurisdicciones locales". Há uma inovação na regra constitucional da Argentina que é preciso apontar - a possibilidade de o Governo nacional elaborar normas fundamentais para o meio ambiente, o que antes era tarefa das Províncias. Comenta o Prof. Jorge Atílio Franza, da Universidade de Buenos Aires: "O Congresso da Nação tem a faculdade primitiva de estabelecer os pressupostos mínimos de proteção ambiental, o que implica em que em todo o país haverá uma proteção ambiental mínima e em cada província uma igual ou maior. As Legislaturas provinciais poderão elevar os pressupostos mínimos de proteção, porém, não podem baixá-los".11 Como se assinala, o poder legiferante ambiental, na Argentina, caminhou da periferia para o centro, dando-se espaço para que o poder central possa uniformizar as normas ambientais fundamentais. No mercosul, o Protocolo de Ouro Preto de 1994, que veio aperfeiçoar o Tratado de Assunção de 1991, afirma, em seu art. 25, que o progresso da integração leva à harmonização das legislações dos países integrantes.12 Para que essa integração no plano jurídico-ambiental possa acontecer, não se impede que a descentralização administrativa aconteça e que a desconcentração de poder atue na implementação da legislação. Contudo, a procura da semelhança de institutos jurídicos está a indicar que as instâncias centrais ou federais de cada país têm um papel insubstituível na unificação das normas gerais ambientais. A omissão desses níveis de poder levaria a uma pulverização das normas, com a possibilidade de conflitos, o que dificultaria a integração pretendida no Mercado Comum do Sul. 11. Jorge A. Franza, Manual de Derecho Ambiental, lu ed., v. 1, Buenos Aires, Ediciones Jurídicas, 1995. 12. Protocolo de Ouro Preto, assinado em Ouro Preto, Brasil, em 17 de dezembro de 1994, promulgado pelo Decreto 1.901, de 9.5.1996, DOU 10.5.1996. Capítulo II CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 1. Introdução A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a primeira Constituição Brasileira em que a expressão "meio ambiente" é mencionada. A Emenda Constitucional 1/1969 utiliza - pela primeira vez em um texto constitucional - a expressão "ecológico", dizendo seu art. 172: "A lei regulará, mediante prévio levantamento ecológico, o aproveitamento agrícola de terras sujeitas a intempéries e calamidades. O mau uso da terra impedirá o proprietário de receber incentivos e auxílios do Governo". É já um sinal promissor que antes da Conferência de Estocolmo/72 o Poder Público procurasse criar um sistema de avaliação prévia relacionada à ecologia e instituísse como princípio o bom uso da terra, inclusive proibindo, na própria Constituição, o recebimento de incentivos e auxílios para aqueles que degradassem o solo. A Constituição atual não incluiu o texto citado. Em 1985, ainda que com um sistema de eleição indireta, é eleito m Presidente civil. Passa-se a preparar uma nova Constituição. Reúnema Assembléia de notáveis, onde a questão do meio ambiente é • an ac*a- A sociedade civil, através de suas organizações, faz seminán°S por todo o país. A Sociedade Brasileira de Direito do MeioAmbiente dosnesrno ano de 1985 organizou seminários nas principais Capitais (Est dStados e um Curso de Direito Ambiental na cidade de Salvador res ° a Bahia), com o comparecimento de uma quinzena de professonal r range'ros' preparando um texto a ser proposto à Assembléia Nacio-dl Constituinte. inserida 'Sp°sições sobre meio ambiente na Constituição de 1988 estão social")S Cm diversos títulos e capítulos. O Título VIII ("Da Ordem c°ntém em SEU CaP'tul° VI, trata do meio ambiente, no art. 225, que seis parágrafos. ' . 108 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 2. Afirmação de um direito ao meio ambiente ; . 2. / Direito subjetivo e direito de titularidade coletiva "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impon-do-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações" (art. 225, caput, da CF). Todos1 têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O direito ao meio ambiente equilibrado é de cada um, como pessoa humana, independentemente de sua nacionalidade, raça, sexo, idade, estado de saúde, profissão, renda ou residência. O uso do pronome indefinido — "todos" - alarga a abrangência da norma jurídica, pois, não particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evita que se exclua quem quer que seja. "O meio ambiente é um bem coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo."2 O direito ao meio ambiente é de cada pessoa, mas não só dela, sendo ao mesmo tempo "transindividual".3 Por isso, o direito ao meio ambiente entra na categoria de interesse difuso, não se esgotando numa só pessoa, mas se espraiando para uma coletividade indeterminada. Enquadra-se o direito ao meio ambiente na "problemática dos novos direitos, sobretudo a sua característica de 'direito de maior dimensão', que contém seja uma dimensão subjetiva como coletiva, que tem relação com um conjunto de utilidades" — assevera o Prof. Domenico Amirante.4 A locução "todos têm direito" cria um direito subjetivo, oponível erga omnes, que é completado pelo direito ao exercício da ação popular ambiental5 (art. 52, LXXIII, da CF). 1. A mesma palavra "todos" foi utilizada pela Constituição de Portugal de 1976 (com a Emenda Constitucional 1/1989), art. 66a-l, e pela Constituição da Espanha de 1978, art. 45-1. 2. Raul Canosa Usera, "Aspectos constitucionales dei Derecho Ambiental", Revista de Estúdios Políticos 94/79, Madri, Centro de Estúdios Constitucionales, 1996. 3. "Um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado representa um bem e interesse transindividual, garantido constitucionalmente a todos, estando acima de interesses privados" (TRF-4a Região, 4a T., Ap. em Ação Civil Pública 1998.04.01.009684-2-SC, rei. Juiz Federal Joel Ilan Paciornik, DJU 16.4.2003, in Interesse Público 19/288. 2003). 4. "Ambiente e principi costituzionali ne) Diritto Comparato", Diritto Ambientale e Costituzione. A Cura di Domenico Amirante, Milão, Franco Angeli, 2000, p. 15. 5. V. item 5.1. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 109 "Após a entrada em vigência da Carta de 1988, não se pode mais pensar em tutela ambiental restrita a um único bem. Assim é porque o bem jurídico ambiente é complexo. O meio ambiente é uma totalidade e só assim pode ser compreendido e estudado" - assinala Paulo de Bessa Antunes.6 No Direito Comparado, citamos comentários referentes a duas Constituições - de Portugal e da Espanha nas quais os constituintes brasileiros, em parte, se inspiraram. "Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender"; "Incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e por apelo e apoio a iniciativas populares: a) prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão, b) ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correta localização das atividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-econômico e paisagens biologicamente equilibradas; c) criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da Natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou artístico; d) promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica" (art. 66a-1 e 2 da Constituição de Portugal). Jorge Miranda afirma: "Considerando um pouco mais os direitos atinentes ao ambiente: a) enquanto reconduzíveis a direitos, liberdades e garantias ou a direitos de natureza análoga, são direitos de autonomia ou de defesa das pessoas perante os poderes, públicos e sociais, que os condicionam ou envolvem; avulta neles uma estrutura negativa — embora não sem incidências positivas -, visto que têm por contrapartida o respeito, a abstenção, o non facere; o seu objeto é a conservação do ambiente e consiste na pretensão de cada pessoa a não ter afetado hoje, ja, o ambiente em que vive e, para tanto, na pretensão de obter os indispensáveis meios de garantia".7 Todos tienen ei derecho a disfrutar de un médio ambiente adecuado P ra ei desarollo de Ia persona, así como ei deber de conservado" (art. 5-l da Constituição da Espanha). Escobar Roca afirma que há "doble caracter dei médio ambiente: Pod ° e,cno subjetivo y como mandato de actuación, dirigido a los eres Públicos".8 Luís Pomed Sanches assevera que "ei derecho sub1 UlreUo Ambiental, 4a ed., Rio de Janeiro, Lumen Júris, 2000, p. 46. 'nstituto N .OnstituiÇ5° e o Direito do Ambiente", in Direito do Ambiente, Lisboa, 8 Clonal de Administração-iNA, 1994, pp. 353-365. ut- Por Raul Canosa Usera, ob. cit, p. 81. 110 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO '/.': jetivo ai médio ambiente adecuado se configura antes que nada como un derecho de goce oponible erga omnes, como expresamente se deduce dei establecimiento, en ei mismo art. 45-1 Constitución, de un deber general de conservación de ese médio ambiente, correlato necesario dei derecho subjetivo".9 A universalização dos direitos individuais, sociais e difusos é uma das características da Constituição de 1988. A concepção é também usada para a "saúde" (art. 196) e para a "educação" (art. 205), como um "direito de todos". O caput do art. 225 é antropocêntrico. "É um direito fundamental da pessoa humana, como forma de preservar a 'vida e a dignidade das pessoas' - núcleo essencial dos direitos fundamentais, pois ninguém contesta que o quadro da destruição ambiental no mundo compromete a possibilidade de uma existência digna para a Humanidade e põe em risco a própria vida humana" - assevera Álvaro L. V. Mirra.10 A Declaração da Conferência do Rio de Janeiro/92 ratificou esse posicionamento ao colocar, no seu Princípio 1: "Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável". Nos parágrafos do art. 225 equilibra-se o antropocentrismo com o biocentrismo (nos §§ 42 e 5- e nos incisos I, II, III e VII do § lü), havendo a preocupação de harmonizar e integrar seres humanos e biota. 2.2 O Supremo Tribunal Federal e o conceito do direito ao meio ambiente -oo O Supremo Tribunal Federal, através do voto do Min. Celso de Mello (relator), conceituou o direito ao meio ambiente "como um típico direito de terceira geração que assiste, de modo subjetivamente indeterminado, a todo o gênero humano, circunstância essa que justifica a especial obrigação - que incumbe ao Estado e à própria coletividade - de defendê-lo e de preservá-lo em benefício das presentes e futuras gerações"." 9. "El derecho ai médio ambiente. Nuevos escenarios y nuevos colectivos de los derechos humanos", Revista Aragonesa de Administración Pública 1998, Zaragoza, p. 583. 10. "Fundamentos do Direito Ambiental no Brasil", RT 706/7-29, São Paulo, Ed. RT, agosto/1994. 11. MS 22.164-0-SP, j. 30.10.1995, DJU 17.11.1995. V. JoséAdércio L. Sampaio, A Constituição Reinventada pela Jurisdição Constitucional, Belo Horizonte, Del Rey, 2002, p. 701. , . ( , •,, ,.,,, ,, . CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 111 2 3 Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado Equilíbrio ecológico "é o estado de equilíbrio entre os diversos fatores que formam um ecossistema ou habitai, suas cadeias tróficas, vegetação, clima, microorganismos, solo, ar, água, que pode ser desestabilizado pela ação humana, seja por poluição ambiental, por eliminação ou introdução de espécies animais e vegetais".12 Na Natureza "cada espécie vê suas ambições limitadas por aqueles que as devoram, pela falta de nutrição ou pelos incômodos meteorológicos. Todo o paraíso terrestre funciona como uma estufa munida de um termostato: ele oscila, em cada um de seus parâmetros, entre dois limites próximos".13 O equilíbrio ecológico não significa uma permanente inalterabili-dade das condições naturais. Contudo, a harmonia ou a proporção e a sanidade entre os vários elementos que compõem a ecologia - populações, comunidades, ecossistemas e a biosfera14 — hão de ser buscadas intensamente pelo Poder Público, pela coletividade e por todas as pessoas. 2.4 Direito ao meio ambiente como bem de uso comum do povo Nas Institutas de Justiniano consta: "Et quidem naturali iure com-munia sunt omnium haec: aêr et aqua profuens et maré et per hoc litora maris" ("Por direito natural são comuns todas as coisas seguintes: o ar, a água corrente, o mar e o seu litoral").15 O Código Civil Brasileiro de 1916 já havia inserido a noção de bem de uso comum do povo" (art. 66,1), com a inclusão de no mínimo 12. Gilberto Giovanetti e Madalena Lacerda, Melhoramentos Dicionário de Geografia, São Paulo, Melhoramentos, 1996, p. 70, «puí/Roxana Borges, Função Ambiental da Propriedade Rural, São Paulo, LTr, 1999, p. 213. rei ' qu'ílbrio ec"lógico "é o equilíbrio da Natureza; estado em que as populações inta lvas de espécies diferentes permanecem mais ou menos constantes, mediadas pelas ações das diferentes espécies" (Dicionário de Ecologia e Ciências Ambientais, São auio, Melhoramentos, 1998, p. 194). Pari "eni"i Friedel, "Les grandes lois de Ia biosphère", Encyclopédie de VÉcologie, ' Llbiairie Larousse, 1977, p. 23. ]4. Eugene Odum, Ecologia, 2a ed., São Paulo/Brasíla, Pioneira/iNL, 1975, p. 24. Direit „ xandre Correia, Gaetano Sciascia e Alexandre Augusto Correia, Manual de " Komano, 2a ed., v. II, São Paulo, Saraiva, 1955, pp. 358-359. ... . . :;. 112 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO os seguintes bens: mares, rios, estradas, ruas e praças.16 As praias foram também incluídas nessa categoria pela Lei 7.661/1988. A Constituição, em seu art. 225, deu uma nova dimensão ao conceito de meio ambiente como bem de uso comum do povo. Não elimina o conceito antigo, mas o amplia. Insere a função social e a função ambiental da propriedade (arts. 5a, XXIII, e 170, m e VI) como bases da gestão do meio ambiente, ultrapassando o conceito de propriedade privada e pública. O Poder Público passa a figurar não como proprietário de bens ambientais — das águas17 e da fauna18 -, mas como um gestor19 ou gerente,20 que administra bens que não são dele e, por isso, deve explicar convincentemente sua gestão. A aceitação dessa concepção jurídica vai conduzir o Poder Público a melhor informar, a alargar a participação da sociedade civil na gestão dos bens ambientais e a ter que prestar contas sobre a utilização dos bens "de uso comum do povo", concretizando um "Estado Democrático e Ecológico de Direito" (arts. lü, 170 e 225). 2.5 Direito ao meio ambiente como bem essencial à sadia qualidade de vida A sadia qualidade de vida só pode ser conseguida e mantida se o meio ambiente estiver ecologicamente equilibrado. Ter uma sadia qualidade de vida é ter um meio ambiente não-poluído.21 Além de ter afirmado o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a Constituição faz um vínculo desse direito com a qualidade de vida. Os constituintes poderiam ter criado somente um direito ao meio ambiente sadio - isso já seria meritório. Mas foram além. 16. O Código Civil vigente-Lei 10.406, de 10.1.2002-repete o mesmo conceito (art. 99,1). 17. Lei 9.433/1997, art. P, I. 18. Lei 5.197/1967, art. Ia. 19. A expressão "gestor" é encontrada com a mesma grafia em Espanhol: "Gestor. El que, sin tener mandato para ello, cuida bienes, negócios o intereses ajenos, en pio de aquel a quien pertenecen" (Diccionario de Ia Lengua Espanola, 21a ed., 1.1, Madri, Rea' Academia Espanola/Editorial Espasa Calpe, 1997, p. 1.038). 20. "Gérant — qui administre pour autrui" (Dictionnaire Universel de Poche, cit-p. 248). 21. A poluição está conceituada no art. 3C, III, da Lei 6.939, de 31.8.1981 -Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, tendo sido este artigo recepcionado pela ConstiW ção de 1988. Não só os seres humanos devem ser protegidos da poluição, como a Natureza, conforme a referida lei e a própria Constituição. * CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 113 O direito à vida foi sempre assegurado como direito fundamental nas Constituições Brasileiras. Na Constituição de 1988 há um avanço. Resguarda-se a dignidade da pessoa humana (art. Ia, III) e é feita a introdução do direito à sadia qualidade de vida. São conceitos que precisam de normas e de políticas públicas para serem dimensionados completamente. Contudo, seus alicerces estão fincados constitucionalmente para a construção de uma sociedade política ecologicamente democrática e de direito. A saúde dos seres humanos não existe somente numa contraposição a não ter doenças diagnosticadas no presente. Leva-se em conta o estado dos elementos da Natureza - águas, solo, ar, flora, fauna e paisagem para aquilatar se esses elementos estão em estado de sanidade e se de seu uso advêm saúde ou doenças e incômodos para os seres humanos. "A qualidade de vida é um elemento finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no conceito de nível de vida."22 Essa ótica influenciou a maioria dos países, e em suas Constituições passou a existir a afirmação do direito a um ambiente sadio.23 O Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos prevê, em seu art. 11, que: "1. Toda pessoa tem direito de viver em meio ambiente sadio e a dispor dos serviços públicos básicos. 2. Os Estados-Partes promoverão a proteção, preservação e melhoramento do meio ambiente".24 3. O Poder Público, a coletividade e a responsabilidade ambiental entre gerações 1 O Poder Público, a coletividade e u meio ambiente de A ConstituiÇão de 1988 impôs ao Poder Público e à coletividade o er de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futu-ras gerações. Pública de einando°Pez Ramón, "El Derecho Ambiental como Derecho de Ia función I25-I47 ggCCl6n de los recursos naturales", Cuademos de Derecho Judicial XXVIII/ 24 n nncipio do direito à sadia qualidade de vida", Tít. I, Cap. Único, item 1. Ame|icana To 3'321' de 30.12.1999 (promulga o Protocolo Adicional à Convenção 'Urais ~ "pro° le Dlre'tos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e CulSalvador doím, de Sa° Salvador", concluído em 17.11.1988, em São Salvador, El ÜOt/31.12.1999,pp. 12-15). 114 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O texto emprega figuras genéricas - "Poder Público" e "coletividade" — como sendo aquelas obrigadas a preservar e defender o meio ambiente. "Poder Público" não significa só o Poder Executivo, mas abrange o Poder Legislativo e o Poder Judiciário, tanto que no art. 2- esses três Poderes constam como "Poderes da União". Os constituintes engajam os três Poderes da República na missão de preservação e defesa do meio ambiente, agindo eles com independência e harmonia recíproca. Não vejo como figura de retórica esse envolvimento de todo o Poder Público no problema ambiental, pois o legislador infraconstitucional tem elaborado leis para combater a omissão dos integrantes do Poder Público, tanto no campo civil como criminal. À "coletividade"25 cabe também o dever de defender e preservar o meio ambiente. Entendo que os constituintes fizeram um chamamento à ação dos grupos sociais em prol do meio ambiente. O termo abrange a "sociedade civil" (expressão acolhida na Constituição - art. 58, II), não integrando formalmente o Poder Público, compreendendo as organizações não-governamentais (ongs), constituídas em associações e fundações,26 e as organizações da sociedade civil de interesse público.27 A Constituição Federal poderia ter feito menção de forma mais clara à participação da coletividade.28 A ação da coletividade,29 diferentemente da do Poder Público, em geral é facultativa, ainda que no caso das organizações da sociedade civil de interesse público, quando houverem celebrado contratos de parceria com o Poder Público, poderão ser compelidas a cumprir os deveres desses contratos. "Progresso imensamente maior foi a coletividade conquistar a posição de poder dividir com o Estado as responsabilidades ambientais. O triunfo do particular foi trazer a si parcela do exercício da função ambiental" - no entender de Antônio Herman V. Benjamin.30 A presença e a atuação da sociedade civil na defesa do meio ambiente revela-se como uma das marcas inconfundíveis do novo Direito Ambiental. 25. "Grupo mais ou menos extenso de indivíduos que possuem interesses comuns; agrupamento, agremiação" (Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa). "2. Conjunto, agrupamento, agremiação. 3. Sociol. Sociedade" (Dicionário Aurélio - Século XXI). 26. Conforme o Código Civil (arts. 53-69). 27. Lei 9.790, de 23.4.1999. 28. Treze Estados inseriram o direito de participação da sociedade civil nos Conselhos Ambientais. 29. Para as "comunidades" indígenas a Constituição deu legitimidade para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses (art. 232). 30. "Função ambiental", inAntônio Herman V. Benjamin (coord.), Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão, São Paulo, Ed. RT, 1993, p. 51. . , . CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 115 Ao valorizar-se somente o conceito de "coletividade" olvida-se do oapel a ser desempenhado pelas pessoas de per si. O texto constitucional poderia ter acentuado o dever dos indivíduos na defesa e preservação do meio ambiente. A Constituição foi bem-formulada ao terem sido colocados conjuntamente o Poder Público e a coletividade como agentes fundamentais na ação defensora e preservadora do meio ambiente. Não é papel isolado do Estado cuidar sozinho do meio ambiente, pois essa tarefa não pode ser eficientemente executada sem a cooperação do corpo social. O Poder Público e a coletividade deverão defender e preservar o meio ambiente desejado pela Constituição, e não qualquer meio ambiente. O meio ambiente a ser defendido e preservado é aquele ecologicamente equilibrado. Portanto, descumprem a Constituição tanto o Poder Público como a coletividade quando permitem ou possibilitam o desequilíbrio do meio ambiente. > 3.2 As presentes e futuras gerações '. — A responsabilidade ambiental entre gerações A Constituição estabelece as presentes e futuras gerações como destinatárias da defesa e da preservação do meio ambiente. O relacionamento das gerações com o meio ambiente não poderá ser levado a efeito de forma separada, como se a presença humana no planeta não fosse uma cadeia de elos sucessivos. O art. 225 consagra a ética da solidariedade entre as gerações, pois as gerações presentes não podem usar o meio ambiente fabricando a escassez e a debilidade para as gerações vindouras. Uma geração deve tentar ser solidária entre todos os que a compõem. A Constituição da Espanha (1978) afirma que os Poderes Públicos devem defender e restaurar o meio ambiente, "apoyándose en Ia indispensable solidaridad colectiva".31 A continuidade da vida no planeta pede que esta solidariedade não fique represada na mesma geração, mas ultrapasse a própria geração, levando em conta as gerações que virão aPos. O princípio cria um novo tipo de responsabilidade jurídica: a res-P°nsabilidade ambiental entre gerações. A continuidade na boa gestão do meio ambiente traduz o que se ama de "desenvolvimento sustentado". Esse conceito encontra sua mais arnpla elaboração no art. 170 da CF, ainda que tenha seu fundamento art- 225. "O gênero humano tem perfeitamente os meios de assumir 3l.Art.45-2. ;,-•-.•;, ., . . . .-j; •. - - -. .. .--..- .".:.; -• - -.v.,-- v. 116 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO o desenvolvimento sustentado, respondendo às necessidades do presen- j te, sem comprometer a possibilidade para as gerações futuras de vir a satisfazer as suas necessidades."32 O princípio da responsabilidade ambiental entre gerações "refere-se a um conceito de economia que conserva o recurso sem esgotá-lo, orientando-se para uma série de princípios. O dano ambiental das emissões e dos lançamentos de rejeitos não deve superar a absorção da parte do próprio meio ambiente. O consumo dos recursos não-renováveis deve-se limitar a um nível mínimo. Grandes riscos ambientais, que possam prejudicar outros recursos, devem ser reduzidos numa medida calculá-vel e submetida a contrato de seguro. Esta norma geral, já exigida pela geração atual, causa enormes problemas à ordenação atual da sociedade industrial, orientada para o crescimento contínuo" - afirma o Prof. Hel-muth Shultze-Fielitz.33 A inserção de um princípio — abrangente e prospectivo — como a responsabilidade ambiental entre gerações pode ser motivo de crítica, pela dificuldade de sua implementação. A razoabilidade e a proporcionalidade hão de ajudar na fundamentação dos atos legislativos, administrativos e jurisdicionais, para evitar arbitrariedades. Não se pode negar o merecimento de um mandamento constitucional que não permitirá mais a ausência de um balanceamento dos interesses das gerações, onde num prato da balança estará a geração dos que, por não poderem falar ou votar, nem por isso são menos amados ou menos importantes. 4. Direito à ação judicial: ação popular ambiental e ação civil pública ambiental Se não houvesse direito ao processo judicial ambiental, o art. 225 da CF ficaria morto, ou restaria como uma idéia digna mas sem concre-tude. 4.1 A ação popular ambiental na Constituição A Constituição previu no art. 5Ü, LXXIII: "Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao 32. Notre Avenir à Tom. La Commission Mondiale sur V'Enviwnnement et !e Développement, Montreal, Les Éditions du Fleuve, 1987, p. 10. 33. Helmuth Shultze-Fielitz, "LaprotezionedeH'ambiente nel DirittoCostituzionale Tedesco", in Diritto Ambientale e Costituzione. A Cura di Domenico Amirante, Milão-Franco Angeli, 2000, pp. 78-79. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 117 trimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à morali-K Je acjministrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultu-1 ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência". Esta ação judicial, antiga no Brasil, que já data da Constituição do Império, passa a proteger constitucionalmente o "meio ambiente" na Constituição de 1988. "A diferença primordial da tutela jurisdicional subjetiva, via ação popular, das demais de índole individualista está no fato de que esta última funda-se num interesse próprio", e no caso da ação popular "o ressarcimento não se faz em prol do indivíduo, mas sim indiretamente em favor da coletividade, por se tratar de um bem indivisível e de conotação social."34 Qualquer cidadão está legitimado para propor ação popular ambiental. A Constituição de 1988 não define o que é cidadão, mas emprega o termo "cidadania" por diversas vezes. O art. lü diz que a República constitui-se em "Estado Democrático de Direito", tendo cinco fundamentos: "I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V o pluralismo político". A educação visa ao pleno desenvolvimento da pessoa e a "seu preparo para a cidadania" (art. 205); às Comissões do Congresso Nacional e suas Casas caberá "solicitar depoimento de qualquer autoridade ou cidadão" (art. 58, § 2a); qualquer cidadão é parte legítima, na forma da lei, para denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União (art. 74, § 2U); conceder-se-á mandado de injunção sempre que a norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direi-os e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à cidadania (art. 5Ü, LXXI); e não será objeto de delegação a legislação sobre cionahdade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais" (art. 68, II). Cumpre destacar que o art. 5U, LXXIII, que trata da ação popular, o referiu a expressão "na forma da lei". A ação popular é de "aplicadirei'to edÍata" (art 5ü' § lü)' Pois se trata de uma norma definidora de a le °,?arant'a fundamental. Quando o constituinte quis que pudesse ressal ã° infraconstitucional dispor também sobre a matéria ele o Ui3 V?U' como se vê nos casos de denúncias ao Tribunal de Contas da u (art 74; § Rev>na de°iT R' M- Leite' "A?5° Popular - Um ex "euo Ambiental 17/128, São Paulo, Ed. exercício da cidadania ambiental?", RT, janeiro-março/2000. 118 3' DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A cidadania não se limita somente ao exercício dos direitos políticos, pois senão o constituinte não teria empregado explicitamente as expressões "cidadania, direitos políticos e eleitorais" (art. 68, II). Vejo a cidadania como ação participativa onde há interesse público ou interesse social. Ser cidadão é sair de sua vida meramente privada e interessar-se pela sociedade de que faz parte e ter direitos e deveres para nela influenciar e decidir. No caso da cidadania ecológica participa-se em defesa de um interesse difuso, tratando-se de "exigir cuidado público da vida".35 Por isso, a Constituição de 1988 é chamada de "Constitui-ção-cidadã". Ser cidadão já não é só ser eleitor ou poder ser eleito para cargos ou funções eletivos. É mais: é, entre outros direitos, poder integrar órgãos públicos como o Conselho da República (art. 89, VII) ou falar perante as Comissões do Congresso Nacional (art. 58, § 2Ü), onde não se exigirá a apresentação de título de eleitor para o exercício da cidadania. Não é nenhum excesso entender que todos os habitantes do País, brasileiros e estrangeiros (art. 5Ü, caput), estão legitimados a utilizar a "ação popular" ambiental. "A cidadania foi ampliada no sentido de estender ao estrangeiro o direito subjetivo fundamental à ação popular ambiental, desde que esteja residindo no País. Apesar da não-regulamenta-ção deste direito do estrangeiro, crê-se plausível a sua existência e vigência no sistema jurídico brasileiro, considerando a sua imediata aplicabilidade, nos termos da Lei Fundamental" - afirma José Rubens Morato Leite.36 A lei infraconstítucional,37 ao exigir a apresentação do título de eleitor, não merece ser aplicada, pois não foi recepcionada, nesse aspecto, pela atual Constituição. Celso Fiorillo, Marcelo Rodrigues e Rosa Nery asseveram: "A Constituição não recepcionou o conceito infraconstitu-cional, no exato sentido de que forneceu o seu próprio conceito".38 Estamos fiéis à nossa primeira Constituição, quando se empregou a expressão "qualquer do povo". A Constituição teve a audácia dos tempos propícios ao maior acolhimento das liberdades e das garantias fundamentais. O meio ambiente, o patrimônio público, a moralidade administrativa, o patrimônio histórico 35. Luís Alberto Warat, "Ecocidadania e Direito -Alguns aspectos da modernidade, sua decadência e transformação", apud Paulo J. L. Farias, Competência Federativa e Proteção Ambiental, Porto Alegre, Sérgio Antônio Fabris Editor, 1999, p. 258. 36. Ob. cit., p. 132. 37. Lei 4.717, de 29.6.1965. 38. Direito Processual Ambiental Brasileiro, Belo Horizonte, Del Rey, 1996, p. 225. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 119 e cultural, apelam para a participação, em juízo, de todas as pessoas, sem que os autores da ação judicial tenham que pagar custas judiciais ou responsabilizar-se financeiramente pela improcedência do processo. 4.2 A ação civil pública ambiental na Constituição . l '" e o Ministério Público A Constituição considerou como "função institucional do Ministério Público" promover "a ação civil pública para a proteção do meio ambiente" (art. 129, III). A ação civil pública foi instituída pela Lei 7.347, de 24.7.1985.39 "A competência do Ministério Público para iniciar a ação civil em juízo é criação brasileira. Na maioria dos países ela não é admitida. A solução brasileira passa certamente por dois fatores. O primeiro é a estrutura administrativa existente e as garantias dadas pela Constituição Federal ao Ministério Público. O segundo é o ainda recente processo de democratização que afeta o País, fazendo com que somente agora, e aos poucos, se exercitem os direitos de cidadania" — afirma Wladimir Passos de Freitas.40 O meio ambiente passou a ter no delineamento constitucional do Ministério Público um robusto suporte, confirmando a legislação infra-constitucional anterior. O Ministério Público41 é definido como "a Instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis" (art. 127). 39. Nessa lei, o Ministério Público, a União, os Estados, Municípios, autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista e associações ambientais sao legitimados para propor a ação cautelar e a ação principal. Antes da Lei 7.347/1985, "f7ei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/1981) houvera previsto que: Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de sponsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente". V. Paulo A. L. achado, "A implementação da ação civil pública no Brasil", in Funções Institucionais " Mintério Público, São Paulo, Saraiva, 2001, pp. 371-388. 40. A Constituirão Federal e a Efetividade das Normas Ambientais, 2â ed., São Paulo, Ed. RT, 2002, p. 38. tui _ 4' ° Ministério Público está presente nas Constituições Brasileiras desde a Consti-dor r" de 1891> qUe' Sem mencionar ° nome da Instituição, preceitua como o Procura-sam eial dS RePublica será indicado (art. 58, § 2-). A Instituição passa a constar expres-ção T6 C°m° "Ministélio Público" na Constituição de 1934 (arts. 95-98); na Constitui-e '937 (art. 99); na Constituição de 1946 (arts. 125-128 onde a seleção por 120 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Ganha muito o meio ambiente em ter como um dos atores da ação civil pública um Ministério Público bem preparado, munido de poderes para uma atuação eficiente e independente. O inquérito civil, atribuição constitucional do Ministério Público, servirá para uma apurada colheita de provas para embasar a ação judicial. Aponte-se que essa Instituição vem propondo uma grande quantidade de ações civis públicas ambientais em que no pólo passivo estão os Governos Federal ou Estaduais, além de poderosas empresas públicas ou privadas. O Ministério Público, que guardou o monopólio da ação penal pública (art. 129,1), não pretendeu monopolizar a ação civil pública ambiental, uma vez que sua legitimação para as ações civis previstas nesse artigo não impede a de terceiros (art. 129, § Ia). 5. As espécies, os ecossistemas e o patrimônio genético > 5.7 Do dever do Poder Público de preservar e restaurar " ' os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e dos ecossistemas Para a efetividade do direito assegurado no art. 225, caput, da CF, incumbe ao Poder Público "preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais" (art. 225, § P, I). José Afonso da Silva ressalta a dificuldade jurídica e científica da interpretação desse inciso, apresentando o conceito da União Internacional de Conservação da Natureza, que afirma que "os processos ecológicos essenciais sao os governados, sustentados ou intensamente afetados pelos ecossistemas, sendo indispensáveis à produção de alimentos, à saúde e outros aspectos da sobrevivência humana e do :esenvolvimento humano r0 termo "restaurar" aplica-se a um processo e -arece, portanto permitir uma dinâmica de restabelecimento. Comenta1 do essa disposiconcurso e a estabilidade de seus membros já sao apresentadas 1967 (arts. 137-139); e na Emenda Constitucional 1/1969 (arts. 9-A Constituição de 1988 consolida as garantias constitucional; co, aprofunda os alicerces de sua autonomia funcional e adminisü: independência, inclusive pelo mandato do Procurador-Geral da • Procuradores-Gerais da Justiça dos Estados. 42. Direito Ambiental Constitucional, 4a ed., São Paulo, Mall: p. 90. na Constituição de 96). :o Ministério Públi::va e aperfeiçoa sua ;pública como dos sitos Editores, 2002, CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 121 ção da Constituição, Myriam Fritz-Legendre diz que ela "traduz a idéia de reencontrar a dinâmica do que existia anteriomente".43 Cabe também ao Poder Público "prover o manejo ecológico das espécies e dos ecossistemas" (art. 225, § lü, I). Pode-se entender por "manejo ecológico a utilização dos recursos naturais pelo homem, baseada em princípios e métodos que preservam a integridade dos ecossistemas, com redução da interferência humana nos mecanismos de auto-regulação dos seres vivos e do meio físico".44 5.2 Do dever do Poder Público de preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa „,. f, e manipulação de material genético A Constituição, na ordem dos seus valores, colocou com prioridade o patrimônio45 genético do País. Patrimônio genético pode ser entendido como o conjunto de material genético, aí compreendido todo o material de origem vegetal, animal, microbiana ou outra que contenha unidades funcionais de hereditariedade, com valor real ou potencial, que possa ser importante para as gerações presentes e futuras.46 Diante dessa obrigação constitucional de ser preservada a diversidade genética no País, parecem-me inconstitucionais as atividades e obras que possam extinguir uma espécie ou ecossistema, pois constituem a fonte dessa diversidade. "Outro aspecto de grande importância é a estrutura em espécies do ecossistema. A estrutura em espécies não inclui somente o número e 43. "Biodiversité et irreversibilité", Revue Juridique de VEnvironneinent, número especial -"Irreversibilité", Limoges, Société Française pour le Droit de l'Environnement, ll»8,pp. 79-100. 44. Maria da Graça Krieger, Ana Maria B. Maciel, João Carlos C. Rocha, Maria ose B. Finatto e Cleci Regina Bevilácqua (orgs.), Dicionário de Direito Ambiental: e">ünologia das Leis do Meio Ambiente, Porto Alegre/Brasília, ur-Rs/Procuradoria-Geral da República, 1998. 45. "1. Herança paterna. 2. Bens de família. (...) 4. Bem, ou conjunto de bens urais ou naturais, de valor reconhecido para determinada localidade, região, país, ou a Humanidade, e que, ao se tornar(em) protegido(s), deve(m) ser preservado(s) Para o usufruto de todos os cidadãos" (Dicionário Aurélio - Século XXI). 46. Para a elaboração desse conceito levei em conta as definições de "material £ f,lco e e "recursos genéticos" constantes do art. 2a da Convenção da Diversidade °g"Ca' Conforme ° Decret0 2-519, de 16.3.1998 (DOU 17.3.1999), e o sentido do patrimônio" como uma relação econômica e espiritual entre as diversas gerações. 122 " DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO tipos de espécies presentes, porém a diversidade das espécies, isto é, a relação entre as espécies e número de indivíduos ou biomassa e a dispersão (arranjo espacial) dos indivíduos de cada espécie, que estão presentes na comunidade."47 Acrescenta Eugene Odum: "O homem deve pensar mais em termos de controle e utilização da Natureza, e não em termos de extermínio total, exceto no caso de algumas espécies que são parasitas diretos ou competidores. Conservação do ecossistema em lugar da conservação desta ou daquela espécie. Enquanto não tivermos uma evidência realmente científica que indique o contrário, é claramente do nosso interesse preservar a extraordinária diversificação representada por alguns táxons que se desenvolveram durante a evolução da biosfera através de milhões de anos. A diversidade de formas de vida deveria ser encarada como um tesouro nacional e internacional".48 Não basta permitir a perpetuidade das espécies e dos ecossistemas, mas a Constituição ordena que o Poder Público zele pela integridade desse patrimônio. Assim, a redução voluntária dos territórios em que vivem normalmente as espécies, por atividades e obras, ocasionando acasalamentos que provoquem degenerescência da espécie, agride o dever da conservação íntegra do patrimônio genético. A Constituição determina ao Poder Público "fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético". Entendo que o art. 225, § 1-, II, não consagra qualquer monopólio das pessoas jurídicas para fazer pesquisa ou manipulação genética,49 ainda que a Lei 8.974/1995, sobre Engenharia Genética, tenha tomado essa posição. • •• >í. 6. O risco ambiental O risco para a vida, a qualidade de vida, a fauna e a flora - enfim, o risco para o meio ambiente - foi objeto de um posicionamento de vanguarda dos constituintes de 1988. O Poder Público precisa prevenir na origem os problemas de poluição e de degradação da Natureza. Entre a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios está a de "combater a poluição em qualquer de suas formas" (art. 23,VI), competindo à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre o "controle da poluição" (art. 24, VI). 7.3, 47. Eugene Odum, ob. cit., p. 30. 48. Ob. cit., p. 61. 49. V. Tít. XIV, "Engenharia Genética e meio ambiente -Aspectos jurídicos", item CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 123 A Constituição incorporou a metodologia das medidas liminares, 'indicando o periculum in mora como um dos critérios para antecipar a cão administrativa eficiente para proteger o homem e a biota. Se a onstituição não mencionou expressamente o princípio da precaução (nue manda prevenir mesmo na incerteza do risco), é inegável que a semente desse princípio está contida no art. 225, § 1Q, V e VII, ao obrigar à prevenção do risco do dano ambiental. O risco na produção (da energia nuclear, por exemplo), na comercialização, no emprego de técnicas (como a biotecnologia) e de substâncias (como agrotóxicos), tem que ser controlado pelo Poder Público (art.225, §12,V). As práticas que provoquem a extinção das espécies (como represa-mento das águas em grandes áreas ou uso incontrolado de queimadas) devem ser vedadas. Analisando a Constituição Brasileira, Myriam FritzLegendre afirma que "o termo 'extinção' parece traduzir a idéia de irre-versibilidade".50 Quando se chega a uma situação irreversível é porque nada há mais para fazer - e, por isso, a Constituição diz, sem rodeios, que é preciso proibir as práticas que põem risco a existência da fauna e da flora, que, inegavelmente, têm função ecológica (art. 225, § Ia, VII). Diante das situações de risco previstas na Constituição, o Poder Público e a coletividade têm o dever de exigir medidas eficazes e rápidas na manutenção de toda forma de vida, não só a humana. 7. Interdição das práticas que submetam os animais a crueldade e interpretação da expressão "na forma da lei" Diz a Constituição: "Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) VII proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade". No art. 225 foram empregadas, em algumas de suas normas, duas "lologias: a primeira, "através de lei" (§ l2, III) ou "em lei federal" l§ 6ü); e a segunda, "na forma da lei" (§§ Ia, IV e VII, 2« e 4fl). on aPucaÇão da interdição de prática cruel contra os animais deu r unidade ao Supremo Tribunal Federal de interpretar a expressão na forma da lei". da r ISSC ° 'n' Francisco Rezek: "Atentei, de início, na interpretação constitucional, à qualificativa 'na forma da lei'. Imaginei uma esPecial . lVers'té et irreversibilité", Revue Juridique de 1'Environnement, número 124 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO possível crítica à ação onde se dissesse que da própria Carta da República não se tira diretamente um comando que obrigue a autoridade catarinense a agir como pretendem as Instituições recorrentes, porque isso deveria ser feito na forma da lei. Ora, a ação é dirigida ao Estado, e, portanto, ao legislador também. Ao Estado como expressão do Poder Público. O que se quer é que o Estado, se necessário, produza, justamente para honrar esse 'na forma da lei', o regramento normativo capaz de coibir a prática considerada inconsistente com a Norma Fundamental. Não vi, assim, nenhuma espécie de falha no encadeamento normativo. Pode-se, efetivamente, invocar o inciso VII do § lfi do art. 225 da Carta para, em ação civil pública, compelir o Poder Público a, legislando ou apenas agindo administrativamente, conforme lhe pareça apropriado, coibir toda prática que submeta animais a tratamento cruel". A interpretação da Corte Constitucional Brasileira não deixa uma norma constitucional inerte e sem possibilidade de ser aplicada se a legislação infraconstitucional não lhe der forma. Omitindo-se a legislação ordinária ou a Administração Pública, importa é o conteúdo da norma constitucional, que é auto-aplicável. Crueldade é "a característica ou condição do que é cruel; prazer em derramar sangue, causar dor".51 A Constituição teve o mérito de focalizar o tema e de proibir a crueldade contra os animais. O texto constitucional fala em "práticas" - o que quer dizer que há atos cruéis que acabam tornando-se hábitos, muitas vezes chamados erroneamente de manifestações culturais. "Percebe-se o equívoco que muitas vezes acontece, consistente em acobertar perversidades ou violências sob o manto antropocentrista, sustentado no valor cultural ou recreativo que possa representar determinada atividade humana em relação aos animais" - aponta Edis Milaré.52 O Supremo Tribunal Federal julgou procedente ação civil pública movida contra o Estado de Santa Catarina para que este procedesse "à proibição da denominada festa da farra do boi por atos e medidas formais e práticas, como obrigação de fazer".53 O mesmo Tribunal suspendeu cautelarmente lei do Estado do Rio de Janeiro que permitia competição entre aves combatentes (rinhas, brigas de galos).54 .... ., '.' 5. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. ''' 52. Direito do Ambiente, 2a ed., São Paulo, Ed. RT, 2001, p. 251. 53. 2a T, RE 153.531-8-SC, rei. design. Min. Francisco Rezek, rei. para o acórdão Min. Marco Aurélio, j. 3.6.1997, m.v., DJU 13.10.1998. 54. Pleno, ADIn 1.858-6-RJ, rei. Min. Carlos Velloso, j. 3.9.1998, v.u., 22.9.2000. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 125 g A valorização da prevenção através ' do Estudo Prévio de Impacto Ambiental-EPiA A Constituição preceitua que: "Para assegurar a efetividade desse d'rei to {ao meio ambiente ecologicamente equilibrado) incumbe ao Poder Público: IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, Estudo Prévio de Impacto Ambiental, a que se dará publicidade" (art. 225, § Ia, IV). A Constituição Brasileira foi a primeira a inserir o Estudo de Impacto Ambiental-EiA. "O disposto no art. 225 da Constituição Federal encerra, sem sombra de dúvidas, normas-objetivo determinantes dos fins a serem perseguidos pelo Estado e pela sociedade, em matéria ambiental, para a indução e direção de comportamentos, por meio de políticas públicas, possibilitando, destarte, seja efetivada a ênfase na prevenção do dano ambiental" — aponta Paulo José Leite Farias.55 Três pontos podem ser destacados no mandamento constitucional: 8. ] Caráter prévio do eia O Estudo Prévio de Impacto Ambiental deve ser anterior ao licenciamento ambiental da obra ou da atividade. Esse Estudo não pode ser concomitante e nem posterior à implantação da obra ou à realização da atividade. A Constituição criou especificamente esse instituto jurídico, que tem uma diferença com o instituto já existente - o Estudo de Impac-o Ambiental-EiA. O texto constitucional inseriu o termo "Prévio" para si uar, sem nenhuma dúvida, o momento temporal em que ele deverá ser utilizado. Visa a evitar uma prevenção falsa ou deturpada, quando o preendimento já iniciou sua implantação ou quando os planos de arnh'1Zacã° foram elaborados sem o eia. A implementação da legislação se ICn aP°s a Constituição revelou a argúcia dos constituintes, pois avnrm tentado escapar, de muitas formas, da obrigação de elaborar a aval'ação ambiental. Serex- a"tei"ioridade da exigência do eia não afasta a possibilidade de a apre§1 a' renovacao ou na revisão dos licenciamentos ambientais, previst enta,Ção de um novo Estudo. Na essência, é o mesmo Estudo Pe a Constituição; somente não se trata do primeiro Estudo, pabri ris Cla Fedemtiva e Proteção Ambiental, Porto Alegre, Sérgio Antônio 126 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO isto é, ck atividad n';6fior a implantação do empreendimentÇK0iv<do início da '<';> 8.2 O Es, '«o deve ser exigido sem qualquer exceção A G suieita " íl1stituição empregou o termo Não é uma faculdade "exigir 'sericionariedade da Administração. em um .'"'emo Tribunal Federal,56 em medida liminar, posicionou-se t,,;õ j " emblemático sobre o epia. Tratava-se do exame da ConSti-lUIÇdO U(; I • . caso de ' ta°° "e anta Catarina, que previa a dispensa do epia no '"•is de florestamento ou reflorestamento para fins empresariais. restricã '" ° Re'ator' Min. Urnar Galvão: "Em tese, a norma impõe ria o se Judicial à tutela do meio ambiente, razão pela qual contra-exieênc' a norma constitucional que, sem qualquer exceção, fixa a dade n .('c Estudo Prévio de Impacto Ambiental, a que se dará publici- ' 'l instalaÇao de obra ou atividade que seja potencialmente causado instalaÇao de obra ou atividade que seja potencialmente significativa degradação do meio ambiente". forma d r''lcmo Tribunal Federal57 voltou a julgar o mesmo caso, de direta na 'l'tva' dando pela procedência do pedido formulado na ação tuicão do VCcarar a mconst'tucionalidade do § 32 do art. 182 da Consti-'tado de Santa Catarina. Durai ii mais doi esse Ju'gament0 expuseram seus votos, além do Relator, "litros Juizes. 225 S ia /* Min. Sepúlveda Pertence: "A Constituição Federal, no art. Rima co ' 'exigiu'o Estudo Prévio de Impacto Ambiental, chamado seguinte 'llorrna absoluta. Não pode a Constituição Estadual, por conpetência' -?Vcetuar ou dispensar essa regra, ainda que, dentro de sua com-, Eletiva, pudesse criar formas mais rígidas de controle. Não l'x flexíveis ou permissivas". 8.3 O epia direito à informação tituicão n~ II1 como uma de suas características a publicidade.58 ACons-aboliu o segredo industrial e comercial; contudo, afasta do 56. ADI.. 57. ADl 58. "Púi. o, doqi nário Elétron "..086-7-SC/Medida Liminar, j. 1.8.1994. '. ,. '"','.'."" .086-7-SCJ. 7.6.2001, vx.,DJU 10.8.2001. -o + -i- + -dade, prov. por infl. do Fr. publicité (1694), 'caráter do que e •,ão é mantido secreto, propriedade do que é conhecid©',(1829)" (Dici"' Houaiss da Língua Portuguesa). *- .: .''.': ; CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 127 cedimento do epia o que for coberto por sigilo. Por isso é que a pró-P . Constituição, ao usar a expressão "a que se dará publicidade", está Jj. en£jo que nada há de secreto nesse Estudo, sendo todo seu conteúdo não uma parte - acessível ao público. Não há epia meio sigiloso e meio público. Dar publicidade ao Estudo transcende o conceito de possibilitar a leitura do Estudo ao público, pois passa a ser dever do Poder Público levar o teor do Estudo ao conhecimento público. Deixar o Estudo à disposição do público não é cumprir o preceito constitucional, pois -salvo melhor juízo — o sentido da expressão "dará publicidade" é publicar- ainda que em resumo - o Estudo de Impacto em órgão de comunicação adequado. A audiência pública no epia, ainda que não prevista expressamente pela Constituição, implicitamente está contida no texto constitucional, pois dar publicidade é partilhar a informação, por todos os meios eficazes e disponíveis. 9. As áreas protegidas 9.1 A alteração e a supressão dos espaços protegidos ' somente através de lei , ', Diz a Constituição Federal: "Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) III — definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justificam sua proteção" (art. 225, § Ia). A Constituição inova profundamente na proteção dos espaços ter-onais, como, por exemplo, unidades de conservação, áreas de preservação permanente-APPs e reservas legais florestais. Poderão essas áreas r criadas por lei, decreto, portaria ou resolução. A tutela constitucio-to n?° 6St '™'taca a nomes ou regimes jurídicos de cada espaço terri-que s P°1S qualcluer esPaÇO entra na órbita do art. 225, § Ia, III, desde se reconheça que ele deva ser especialmente protegido. SUDI lnciso em análise é auto-aplicável, não demandando legislação inserentar Para ser implementado, sublinhando-se que nele não está são n a a exPressao "na forma da lei". Ainda que contivesse tal expres' Qe™ Por isso retiraria sua força abrangente.59 tTn toda constitucional preceitua que o Poder Público deve definir, as Unidades da Federação, espaços territoriais e seus componen59. v o v°to do Min. Francisco Rezek no caso "farra do boi". 128 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO tes a serem especialmente protegidos. Definir60 os espaços territoriais compreende localizá-los. Aí começa a proteção constitucional, não se esperando que se implantem quaisquer acessórios, como cercas ou casas de guardas. Não se pode ter a ilusão de que esses espaços tornaram-se perenes pelo sistema constitucional ora introduzido; mas, sendo a alteração e a supressão somente através de lei, abrem-se tempo e oportunidade para que os interesses pró-meio ambiente se façam presentes perante os parlamentares. Como se sabe, o procedimento de elaboração dos atos do Poder Executivo não prevê um debate público e um lapso de tempo antes da sua edição. Não se quer sobrecarregar o Poder Legislativo, mas, sem uma intensa participação democrática, as áreas protegidas serão mutiladas e deturpadas ao sabor do imediatismo e de soluções demagógicas, às vezes intituladas como de interesse social ou de interesse público. A norma constitucional não abriu qualquer exceção à modificação dos espaços territoriais; e, assim, mesmo uma pequena alteração só pode ser feita por lei. A Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente propôs essa inovação aos constituintes e buscou inspiração na Convenção Africana sobre a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais." A Constituição Federal no aspecto aqui tratado já foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal.62 Foi deferida medida cau-telar suspendendo decreto do Governador do Estado de São Paulo. O decreto paulista63 possibilitava a modificação de parque estadual somente com epia, sem que houvesse lei autorizando a modificação. Oportuno citar-se o voto do Relator, Min. Moreira Alves: "Tendo em vista que possibilidade de danos ecológicos é de difícil reparação e, por vezes, de reparação impossível, está presente no caso o requisito do periculum in mora, que, aliado à relevância jurídica da questão, justificam a concessão da liminar". 60. Paulo A. L. Machado, Estudos de Direito Ambiental, São Paulo, Malheiros Editores, 1994, p. 131. 61. Adotada em 15 de setembro de 1968 e em vigor em 9 de outubro de 1969 0n Alexandre Charles Kiss (editor), Recueil des Traités Multilatéraux Relatifs à Ia Protecti'»1 de VEnvironnement, Nairóbi/Programme des Nations Unies pourl'Environnement, 1982. pp. 23 e 199). 62. ADIn 73-0-SP (reqte.: Procurador-Geral da República; reqdo.: Governador d° Estado de São Paulo), rei. Min. Moreira Alves, j. 9.8.1989, v.u., DJU 15.9.1989. 63. Decreto 29.762, de 20.3.1989, que acrescentou parágrafo único ao art. 24 d° Regulamento aprovado pelo Decreto 25.341, de 4.6.1986 (o qual dispõe sobre parque estaduais). ... CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 129 a 2 Proibição de qualquer utilização que comprometa /'í-il a integridade dos atributos que justificam >'a proteção dos espaços territoriais : -'"'. ' A utilização dessas unidades de conservação e/ou áreas de proteção ambiental só poderá ser feita de modo que não comprometa a totalidade dos atributos que justificam a proteção desses espaços. A Constituição foi explícita ao vedar toda forma de utilização que fira qualquer atributo do espaço territorial protegido. E vemos que foi necessária a previsão constitucional, pois recentemente tentou-se transformar uma via interna de comunicação do Parque Nacional de Iguaçu em estrada de rodagem, tendo a tentativa - apoiada por forças poderosas - sido obstada pelo Poder Judiciário, através de ação civil pública. Ao dizer a Constituição "vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justificam sua proteção", a dimensão da vedação de utilização não ficou unificada para todos os tipos de unidades de conservação. Conforme for o tipo de unidade de conservação haverá uma justificativa para sua proteção. As características de cada tipo de unidade de conservação é que farão surgir o regime de proteção para esse espaço territorial, ficando proibida "qualquer utilização" que comprometa a integridade64 das referidas características ou atributos. Veda-se a utilização para não fragmentar a proteção do espaço e para não debilitar os "componentes" do espaço (fauna, flora, águas, ar, solo, subsolo, paisagem) - isto é, a unidade de conservação fica integralmente protegida conforme seu tipo legal. Não se protege um ou outro atributo, mas todos ao mesmo tempo e em conjunto. Areas protegidas e patrimônio nacional , , 'j_ A FlorestaAmazônica Brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, ri anal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, rerna utl"zaÇão far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegu,„. Preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recur0S "durais" (art. 225, § 4»). l'rQue d °nstltu'Ção quis enfocar algumas partes do território para insisVaÇão H Vam SCr utzac*as dentro de condições que assegurem a presermeio ambiente. Há de se reconhecer que são áreas frágeis e 64 "i qualqUer diniijfy1 ? estado ou característica daquilo que está inteiro, que não sofreu °niíSue.ia) Çao; Plen"ude, inteireza" (Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua 130 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO possuidoras de expressiva diversidade biológica. Houve omissão no texro constitucional, pois se deixou de incluir o cerrado e a caatinga. O texto é pedagógico no dizer que essas áreas integram o "patrimônio nacional", indicando que os regionalismos não se devem sobrepor aos interesses ambientais nacionais. O § 42, em exame, não torna permissiva a legislação ambiental nas áreas não contempladas no texto. O Supremo Tribunal Federal entende que essas áreas não se transformaram em bens da União por serem chamadas de "patrimônio nacional". Além disso, "não impede a utilização, pelos próprios particulares, dos recursos naturais existentes naquelas áreas que estejam sujeitas ao domínio privado, desde que observadas as prescrições legais e respeitadas as condições necessárias à preservação ambiental".65 10. O controle da energia nuclear • • 1 A Constituição teve uma atenção especial para tratar da matéria. Inovou, dizendo que "toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos" (art. 21, XXIII, "a"), vetando, portanto, qualquer atividade nuclear militar. Entrou na matéria de responsabilidade civil por danos nucleares, para afirmar que "independe da existência de culpa" (art. 21, XXIII, "c"). O traço marcante no texto constitucional é o controle da energia nuclear pelo Congresso Nacional. Assim, toda atividade nuclear só será admitida mediante a aprovação do Congresso Nacional (art. 21, XXIII, "a"), e é da competência exclusiva do Congresso Nacional "aprovar iniciativas do Poder Executivo referentes a atividades nucleares" (art. 49, XIV). Sobre a localização das usinas nucleares, o parágrafo que encerra o art. 225 diz: "As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o quê não poderão ser instaladas" (§ 6a). É, portanto, condição indispensável para a instalação de usina nuclear que sua localização seja definida em lei federal. São duas etapas diferentes: escolha do local para situar a usina e, depois, o licenciamento da mesma. Nem toda atividade nuclear ficou submetida à prévia fiscalização do Congresso Nacional (só a usina nuclear), pois "aprovar as iniciativas nucleares do Poder Executivo" é uma competência do Parlamento exercida a posteriori. Mas já é um avanço enorme o poder que passou a tef o Congresso Nacional, pois pode vetar as iniciativas nucleares do Podef 65. Ia T, RE 300.244-9-SC, rei. Min. Moreira Alves, j. 20.11.2001, v.u., 19.12.2001. . .. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 131 cutivo, no uso de sua competência "exclusiva", isto é, não sujeita à nção do'Presidente da República. li A obrigação de reparar o dano ambiental A Constituição agasalha os princípios da restauração, recupera-~o e reparação do meio ambiente no art. 225. Em seu § Ia, I, aponta a brigação de "restaurar os processos ecológicos essenciais". "Esta disposição traduz a idéia de reencontrar a dinâmica que existia antes."66 No § 3a do art. 225 consta a obrigação de reparar o dano causado ao meio ambiente. Acentua este parágrafo que a obrigação de reparar é independente da aplicação de sanções penais e administrativas. O Direito Ambiental, na Constituição, valorizou a prevenção mas não esqueceu da reparação. De tal magnitude estava a degradação causada pela exploração dos recursos minerais, que a Constituição Federal precisou entrar especificamente na aplicação do princípio da reparação. Diz o § 2- do art. 225: 'Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei". A recuperação do meio ambiente passou, constitucionalmente, a fazer parte do processo de exploração de recursos minerais. Nenhum órgão público poderá autorizar qualquer pesquisa ou lavra mineral em que não esteja prevista a recuperação ambiental. Diante da obrigação do § 2Ü do art. 225, a legislação infraconstitucional não poderá ser complacente ou omissa com os que deixarem de efetuar a referida recuperação. 12. O direito à educação ambiental , .. A Constituição diz que incumbe ao Poder Público "promover a 'u?-a° ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização Publica para a preservação do meio ambiente" (art. 225, § Ia, VI). da Uas at'v'dades estão preconizadas pela Constituição: promoção Reaçã bil p p ç p Rç ambiental e promoção da conscientização pública. inse ' romover a educação ambiental em todos os níveis de ensino" é n° esr a tr.ansm'ssao dos conhecimentos sobre meio ambiente no ensi-if anzac!0noção de níveis de ensino é fornecida pela legislação nStltUCÍOna:fl7 educacão básica (educação infantil, ensino funda-e ensino médio) e educação superior. vironnemmm Fntz~Lege«dre, "Biodiversité et irreversibilité", Revue Juridique de nem, número especial, cit, p. 99 e Dlretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394, de 20.12.1996). 132 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A Lei 9.795/1999 dispôs sobre a educação ambiental e instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental. Entre seus principieis básicos está a "concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o sócio-econômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade". Como um dos objetivos da lei está o incentivo à participação individual e coletiva. Não se criou a disciplina "Educação Ambiental" no currículo de ensino (art. 10, § 2a) - o que acredito mereça ser objeto de mais reflexão. .-::, _ 13. O desenvolvimento e o meio ambiente : 13.1 Os princípios da atividade econômica brasileira t '". , A Constituição propõe como objetivos da República Federativa do Brasil: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização; reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor e idade (art. 3a). Esses objetivos corpo-rificam um ideal de felicidade. No Título VII ("Da Ordem Econômica e Financeira") são apresentados os princípios gerais da atividade econômica. "Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País". "Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei." Os constituintes de 1988 foram sábios em fazer essa junção de princípios para tentar bem conduzir o País e formar uma sociedade "livre, justa e solidária". No início, no meio e no fim do art. 170 estão colocadas a idéias da livre iniciativa, da livre concorrência e do livre exercício de qualque1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 133 tividade econômica. O Poder Público não existe para subjugar a liberdade profissional e empresarial das pessoas físicas e jurídicas. De outro lado o Poder Público não poderá ficar omisso ou indiferente diante do uso do meio ambiente, do tratamento do consumidor, da busca do emprego e da redução das desigualdades frente à liberdade profissional e empresarial. Os nove princípios não têm uma ordem de importância. A receita de uma sociedade feliz não está contida só nesses princípios, pois também, em outras partes da Constituição, outros princípios podem ser extraídos. Mas esses princípios representam o mínimo que o constituinte indica para uma "existência digna". Muitas vezes todos os princípios funcionarão em uníssono, e algumas vezes haverá tensão, dissonância e até enfrentamento. No desenrolar da vida cotidiana, as pessoas, as empresas e os governos terão que se perguntar, em procedimentos como o licenciamento ambiental ou outras formas de autorização: cada um desses nove princípios está sendo observado? ;,,.,.. . 13.2 Desenvolvimento ambiental e desenvolvimento sustentado A defesa do meio ambiente é uma dessas questões que obrigatoriamente devem constar da agenda econômica pública e privada. A defesa do meio ambiente não é uma questão de gosto, de ideologia e de moda, mas um fator que a Carta Maior manda levar em conta. A defesa do meio ambiente passa a fazer parte do desenvolvimento nacional (arts. 170 e 32).68 Pretende-se um desenvolvimento ambiental, um desenvolvimento econômico, um desenvolvimento social. É preciso egra-los no que se passou a chamar de desenvolvimento sustentado. O evolu " h ° onav'des ensina que os direitos de terceira geração representam uma ram ele°d E an°S "a este'ra da concretização dos direitos fundamentais: "Emergi-te. à co a' ao sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambienta/ To»"' Ha?ã° 6 a° Patrimonio comum da Humanidade" (Curso de Direito ConstituAn ' S3° Paulo> Malheiros Editores, 2000, p. 523). Ções entre h" er fa'a em direitos de "terceira dimensão", apontando duas poside solidaried ,Outrinadores brasileiros: a) interpretação abrangente acerca dos direitos direitos relativ °U fraternidade (Lafer, Bonavides, Bedin, Sarlet), aqui incluindo os ç5° específica°S a° desenvolvimento, meio ambiente e qualidade de vida; e b) interpreta-c°letiva e difu acerca de direitos transindividuais (Oliveira Jr.) - direitos de titularidade çSo aos fundam*' °S qUa'S Diveit0 Ambiental e Direito do Consumidor ("Introdu-e J°sé R. M L T* de Uma te°lia geral dos 'novos' direitos", in Antônio C. Wolkmer 1 e (°rgs.), Oí "Novos" Direitos no Brasil, São Paulo, Saraiva, 2003, p. 9). 134 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO conceito de desenvolvimento sustentado foi desfraldado pela onu através de sua Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento.69 Nessa integração das diversas formas de desenvolvimento, a adequada gestão da propriedade privada e da propriedade pública tem um peso relevante. A Constituição dá uma fórmula para o uso da propriedade: a sua "função social". 13.3 A função social da propriedade e o meio ambiente .,.-_« Pelo menos oito vezes a expressão "função social" está presente na Constituição: arts. 5a, XXIII; 170, III; 173, § P, I; 182, caput; 182, § 2a; 184, caput; 185, parágrafo único; e 186, II. A expressão "função social da propriedade" foi inserida pela primeira vez na Constituição Federal de 1967 (art. 157, III). O Prof. Léon Duguit já utilizara, em 1920, a expressão "a propriedade é função social indispensável" à sociedade. A solidariedade conduz a esta concepção da propriedade-função social.70 "Não existe um conflito entre o direito de propriedade e a proteção jurídica do meio ambiente. Os direitos de propriedade e do meio ambiente, desde que se tenha uma compreensão sistemática do ordenamento jurídico brasileiro, são compatíveis" - afirma Roxana Cardoso B. Borges.71 Registro a determinação da Constituição de que a Administração indireta (empresas públicas e sociedades de economia mista e suas subsidiárias - como, por exemplo, Petrobrás, Banco do Brasil) coloque no seu estatuto jurídico "sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade" (173, § Ia, I). Juntam-se, aí, função social e fiscalização pela sociedade. Cristiane Derani assevera que "a realiza69. A Assembléia-Geral das Nações Unidas, em 1983, constituiu essa Comissão, que foi presidida pela Dra. Gro Harlem Brundtland (Médica. Foi Ministra do Meio Ambiente e Primeira-Ministra da Noruega e, depois, Diretora-Geral da Organização Mundial da Saúde-OMs). A Comissão foi integrada por 23 membros, um dos quais ° brasileiro Prof. Dr. Paulo Nogueira Neto. Visitou diversos países, entre eles o Brasil, tendo ouvido a sociedade civil e os Poderes Públicos em duas sessões: em São Paulo e em Brasília (onde tive a oportunidade de fazer uma exposição) (Notre Avenir à Tom- Commission Mondiale sur VEnvironnement et le Développement, Montreal, Les EditionS du Fleuve, 1987, p. 444). 70. Léon Duguit, "Les transformations générales du Droit Prive depuis le Cod Napoleón", 2a ed., Paris, FelixAlcan, 1920, apuí/CyrilleCousin, "La doctrine solidai'8'6 de Léon Duguit", in Droit ProspectifRevue de Ia Recherche Juridique 4/1.931-1-9°"' Presses Universitaires D'Aix-Marseille, 2001. 71. Função Ambiental da Propriedade Rural, São Paulo, LTr, 1999, p. 204. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E MEIO AMBIENTE 135 "o do princípio da função social da propriedade reformula uma prática H «torcida de ação social traduzida na privatização dos lucros e na socia-lização das perdas".72 "Reconhecer que a propriedade tem, também, uma função social é "o tratar a propriedade como um ente isolado na sociedade. Afirmar a propriedade tem uma função social não é transformá-la em vítima da sociedade. A fruição da propriedade não pode legitimar a emissão de ooluentes que vão invadir a propriedade de outros indivíduos. O conteúdo da propriedade não reside num só elemento. Há o elemento individual, que possibilita o gozo e o lucro para o proprietário. Mas outros elementos aelutinam-se a esse: além do fator social, há o componente ambiental."73 Ao tratar da "política agrária e fundiária e da reforma agrária", diz a Constituição: "Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social" (art. 184, caput). "A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: (...) II - utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente" (art. 186). O Supremo Tribunal Federal, através do voto do Min. Celso de Mello, afirmou: "A defesa da integridade do meio ambiente, quando venha este a constituir objeto de atividade predatória, pode justificar atividade estatal veiculadora de medidas - como a desapropriação-san-Ção - que atinjam o próprio direito de propriedade".74 A função social da propriedade é um princípio que, de forma ope-rante e contínua, emite sua mensagem para os juizes,75 legisladores76 e orgãos daAdministração, além de ser dirigido aos próprios proprietários. • Direito Ambiental Econômico, São Paulo, Max Limonad, 1997, p. 250. _> 74 mU'° A' L' Machado> Estudos de Direito Ambiental, cit., p. 127. 75S22.164-0-SP,j. 30.10.1995, DJU 17.11.1995. Costeiro de lQPss m° Tribunal Federal aplicou o princípio, antes da Lei de Gerenciamento CorTêa, j. 12 j* ,' para Sarantir o livre acesso às praias: RE 94.253-SP, rei. Min. Oscar Pl°- criou a con° S'Stenia Nacional das Unidades de Conservação, aplicando o princíUando o empreTnd"Saçã" ambiental, estipulando um percentual mínimo a ser pago código Civj[ " ™ent0 tIver potencialidade de causar significativo impacto ambiental. ° a tríPlice flnalid , lnc°iporou a letra e o espírito dos arts. 5a e 170 da CF, acentuanaQe da propriedade - econômica, social e ambiental (art. 1.228). >. /->, y 1 TITULO III SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Capítulo I - INTRODUÇÃO. Capítulo II-SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. . . Capítulo I INTRODUÇÃO 1. Nomenclatura ',.,<,' da disciplina jurídica Direito do Meio Ambiente, ou Direito do Ambiente, ou Direito Ambiental - são as expressões utilizadas. Acentuam autores portugueses que a expressão "meio ambiente", embora seja "bem sonante", não é, contudo, a mais correta, isto porque envolve em si mesma um pleonasmo. O que acontece é que "ambiente" e "meio" são sinônimos, porque "meio" é precisamente aquilo que envolve, ou seja, o "ambiente". A questão, contudo, "tem reduzido interesse, pois que é mais formal do que de conteúdo".1 Ramón Martin Mateo afirma que "aqui se utiliza decididamente a rubrica Derecho Ambiental em vez de Derecho dei Médio Ambiente, desembaraçando-se de uma prática lingüística pouco ortodoxa que utiliza cumulativa1. Rita Mota Campos, Sebastião Costa Pereira, Fernando Azevedo e Silva Moreiia e João Corrêa, O Direito do Ambiente, p. 13. INTRODUÇÃO 137 ente expressões sinônimas ou ao menos redundantes, em que incide o próprio legislador".2 Não queremos empregar exclusivamente o termo "ambiente", ainda aue tenhamos preferência pela sua utilização. Respeitamos o emprego da expressão "meio ambiente", que a própria Constituição Federal utilizou. O termo "ambiente" tem origem latina - ambiens, entis: que rodeia.3 Entre seus significados encontramos "meio em que vivemos".4 A expressão "ambiente" é encontrada em Italiano - "ambiente che va intorno, che circonda";5 em Francês - "ambiant: qui entoure" ou "envi-ronnement: ce qui entoure; ensemble des éléments naturels et artificieis oü se deroule Ia vie humaine".6 Em Inglês: "environment: something that surrounds; the combination of externai or extrinsic physical condi-tions that affect and influence the growth and development of orgamsms 2. Conceito de Direito Ambiental No Brasil procuraram conceituar a nova disciplina jurídica com o nome de "Direito Ecológico" os Profs. Sérgio Ferraz (1972) e Diogo de Figueiredo Moreira Neto (1975). O primeiro denominou "Direito Ecológico ao conjunto de técnicas, regras e instrumentos jurídicos organi-camente estruturados, para assegurar um comportamento que não atente contra a sanidade mínima do meio ambiente".8 O segundo conceituou Direito Ecológico "como conjunto de técnicas, regras e instrumentos jurídicos sistematizados e informados por princípios apropriados, que tenham por fim a disciplina do comportamento relacionado ao meio ambiente".9 Como se vê, os dois ilustres Autores delimitam a disciplina 2- Derecho Ambiental, 1977, p. 71. José Cretella Júnior e Geraldo de Ulhôa Cintra, Dicionário Latino-Português. p 77. fi. -Toninha, Dicionário Português-Latino, Porto, Ed. Domingos Barreira, 1939, p.2 m"nário Brasileiro da Língua Portuguesa, Melhoramentos de São Paulo, 1975, e 53 2 ar ° Parlagreco, Dizionario Portoghese-haliano, Italiano-Portoghese, pp. 22 8 Es'ado 9 le»o U 7 Th" UlrOUSSe Ilustré- Librairie Larousse, 1978, pp. 37 e 381. 8 uDe America>i Heritage Dictionary of the English Language, ¥ ed., p. 438. do nreit°,Ecológ1co; perspectivas e sugestões", Revista da Consultoria Geral do ° Urande do Sul 2/44, 1972, n. 4. de Figueiredo Moreira Neto, Introdução ao Direito Ecológico e ao Di- 138 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ao ambiente, como nota o Prof. Ramón Martin Mateo.10 Parece-nos que a denominação "Direito do Ambiente" abarcará o que se pretende proteger e normatizar. A questão da denominação da disciplina não é idêntica em outros países. O Prof. chileno Rafael Valenzuela Fuenzalida denomina-a Derecho dei Entorno e a conceitua como "o conjunto de normas jurídicas, cuja vigência prática se traduz ou é suscetível de se traduzir em efeitos ambientais estimáveis, benéficos ou prejudiciais, seja ou não que a motivação de ditas normas jurídicas haja reconhecido uma inspiração fundamentada em considerações de índole ecológica"." Em obra pioneira na França, Lamarque, Constantin, Pacteau e Macrez dão como denominação do livro Direito de Proteção à Natureza e do Ambiente}1 O Prof. Michel Despax prefere a denominação "Direito do Ambiente", pois o conceito de "ambiente" é mais amplo do que "natureza". "Seria algo arbitrário restringir o campo de estudo, limitan-do-o aos elementos naturais tais, como exemplo, a água e o ar que o homem encontrou sobre a Terra, com exclusão, dessa forma, de tudo aquilo que ele mesmo construiu ou remodelou."13 Entre nós, o Prof. Tycho Brahe Fernandes Neto conceitua Direito Ambiental como o "conjunto de normas e princípios editados objetivando a manutenção de um perfeito equilíbrio nas relações do homem com o meio ambiente".14 Acentua o referido jurista que a expressão "Direito Ambiental" é mais ampla do que Direito Ecológico. Por essa razão a nossa preferência pela primeira das denominações referidas. O tempo haverá de consagrar uma definição. Importante, presentemente, é o conteúdo dessa nova disciplina jurídica. O Prof. William H. Rodgers Júnior, do Centro de Direito da Universidade da Geórgia/EUA, assinala que o Direito do Ambiente tem um vasto campo, sendo o "Direito da economia doméstica planetária", "protegendo o planeta e sua população das atividades que transtornam a Terra e sua capacidade de manutenção da vida".15 O Prof. Michel Prieur, da Universidade de Limoges, França, e Diretor do Centro de Direito Ambiental, de forma apropriada acentua: "o 10. Ob. cit., p. 72. 11. "EI Derecho dei Entorno y su ensenanza", Revista de Derecho de Ia Universidad Católica de Valparaiso 1/224, 1977. 12. Droit de Ia Protection de Ia Nature et de l'Environnement. ,;:_ 13. Droit de VEnvironnement. . >• ' '' 14. Direito Ambiental Uma Necessidade, p. 15. . ú ;'•! -;í; •:-. 15. Environmental Law, p. 1. •'• : INTRODUÇÃO 139 njreito do Ambiente, constituído por um conjunto de regras jurídicas elativas à proteção da natureza e à luta contra as poluições. Ele se define portanto, em primeiro lugar pelo seu objeto. Mas é um Direito tendo urna finalidade, um objetivo: nosso ambiente está ameaçado, o Direito deve poder vir em seu socorro, imaginando sistemas de prevenção ou de reparação adaptados a uma melhor defesa contra as agressões da sociedade moderna. Então o Direito do Ambiente, mais do que a descrição do Direito existente, é um Direito portador de uma mensagem, um Direito do futuro e da antecipação, graças ao qual o homem e a natureza encontrarão um relacionamento harmonioso e equilibrado". Ressalta o acatado jurista: "Na medida em que o ambiente é a expressão de uma visão global das intenções e das relações dos seres vivos entre eles e com seu meio, não é surpreendente que o Direito do Ambiente seja um Direito de caráter horizontal, que recubra os diferentes ramos clássicos do Direito (Direito Civil, Direito Administrativo, Direito Penal, Direito Internacional), e um Direito de interações, que se encontra disperso nas várias regulamentações. Mais do que um novo ramo do Direito com seu próprio corpo de regras, o Direito do Ambiente tende a penetrar todos os sistemas jurídicos existentes para os orientar num sentido ambientalista".16 "El derecho ambiental tiene por objeto ei estúdio de Ias relaciones dei hombre con Ia naturaleza, y en este sentido es posible que supere Ias puras obligaciones personales y aun ei principio de los derechos reales, según ei cual existe en relación a los bienes una obligación pasivamente universal de respetar a sus titulares de domínio" assinala o prof. Eduardo Pigretti, da Universidade de Buenos Aires.17 "El derecho ambiental, es un derecho de tracto sucesivo que ha tenido que dejar atrás ei conser-vacionismo o ei proteccionismo para tomar una visión más amplia ai jgual que ha tenido que tomar distancia o subsumir a otras ramas como a agraria", afirma Ramón Ojeda Mestre, professor na Universidade Na-c'onal do México.18 I _ Direito Ambiental é um Direito sistematizador, que faz a articu-V o da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos ementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos as ambientais e sua abordagem antagônica. Não se trata mais de Um 're'to as águas, um Direito da atmosfera, um Direito do urn direito florestal, um Direito da fauna ou um Direito da biodi6-Droitdel'Environneme Der, erecho Ambiental y Desarrollo Sustentable, México, Editora Laguna, 2000. Derecho Ambiental, Buenos Aires, Ediciones Depalma, 1993. 140 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO versidade. O Direito Ambiental não ignora o que cada matéria tem de específico, mas busca interligar estes temas com a argamassa da identidade dos instrumentos jurídicos de prevenção e de reparação, de informação, de monitoramento e de participação. O Direito Ambiental passou a constar da lista de disciplinas exigidas no Exame Nacional de Cursos, para avaliação dos cursos de graduação em Direito.19 Destaca-se na portaria ser um "tema transversal", porque o Direito Ambiental, na sua estruturação, busca elementos em todos os ramos do Direito, não se fechando em si mesmo. 3. Conceito de meio ambiente na legislação 3.1 Legislação federal Nota-se a ausência de definição legal e/ou regular de meio ambiente até o advento da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente.20 Conceituou-se meio ambiente como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas" (art. 3a, I). Destarte, o meio ambiente é considerado como "um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo" (art. 2C, I). A definição federal é ampla, pois vai atingir tudo aquilo que permite a vida, que a abriga e rege. No entendimento de Odum estão abrangidos as comunidades, os ecossistemas e a biosfera.21 pi ' 3.2 Legislação dos Estados A legislação fluminense considerou como meio ambiente "todas as águas interiores ou costeiras, superficiais ou subterrâneas, o ar e o solo" (art. -, parágrafo único, do Decreto-lei 134/75). Em Alagoas dis-pôs-se que "compõem o meio ambiente os recursos hídricos, a atmosfera, o solo, o subsolo, a flora e a fauna, sem exclusão do ser humano' 19. Portaria 3.816, de 24.12.2002, art. 4a, "q" (DOU 26.12.2002, p. 24). 20. V. a excelente monografia Legislação Ambiental do Brasil - Subsídios para a História do Direito Ambiental, de Ann Helen Wainer, "Prefácio" do eminente jurista José de Aguiar Dias, l3 ed., Rio de Janeiro, Forense, 1991. 21. Ecologia, p. 24. . -.. •. . INTRODUÇÃO 141 ( r[ 3a da Lei 4.090/79). Em Santa Catarina conceituou-se meio ambiente orno a "interação de fatores físicos, químicos e biológicos que condi-ionam a existência de seres vivos e de recursos naturais e culturais" Cart 2a, I, da Lei 5.793/80). Em Minas Gerais "meio ambiente é o espaço onde se desenvolvem as atividades humanas e a vida dos animais e vegetais" (art. lü, parágrafo único, da Lei 7.772/80). Na Bahia "ambiente é tudo o que envolve e condiciona o homem, constituindo o seu mundo, e dá suporte material para a sua vida biopsicossocial" (art. 2E da Lei 3 858, de 3.11.1980). No Maranhão "meio ambiente é o espaço físico composto dos elementos naturais (solo, água, e ar), obedecidos os limites deste Estado" (art. 2-, parágrafo único, a, da Lei 4.154/80). No Rio Grande do Sul é o "conjunto de elementos águas interiores ou costeiras, superficiais ou subterrâneas, ar, solo, subsolo, flora e fauna —, as comunidades humanas, o resultado do relacionamento dos seres vivos entre si e com os elementos nos quais se desenvolvem e desempenham as suas atividades" (art. 3a, II, da Lei 7.488, de 14.1.1981). A maioria das conceituações estaduais não limita o campo ambiental ao homem, mas a todas as formas de vida, antecipando assim a definição federal. "Trata-se do homem (com seus problemas) ou de qualquer outro animal, ou vegetal; uma espécie viva insere-se em um tecido de coações entre os seres que ocupam o meio que os acolhe e este mesmo meio. Deverá submeter-se, portanto, às mesmas exigências, se quiser sobreviver."22 22. ' Dussart> "Conceitos e unidades em ecologia". Enciclopédia de Ecologia. l! ' > ' , Capítulo II SISTEMA NACIONAL DO MEIÚ AMBIENTE /. A colegialidade nos órgãos ambientais Um colegiado para poder funcionar bem depende primeiramente da clareza com que suas finalidades são definidas e, portanto, do dimensionamento de sua competência. Se for deliberativo ou se for somente consultivo, variará a força dos pronunciamentos do órgão. O critério de escolha dos componentes do colegiado, os requisitos prévios dessa opção e composição, a duração do mandato, o processamento das votações, a freqüência das reuniões e o modo de convocá-las, entre outros dados, mostram a possibilidade de eficiência de um órgão coletivo. Importa saber se as deliberações do colegiado são públicas no decorrer da sessão ou se, após a deliberação ou a manifestação consultiva, os votos serão tornados públicos. Disso dependerá a possibilidade de os administrados se inteirarem da maneira como as decisões foram tomadas e terem oportunidade de elogiar ou criticar o posicionamento dos que devem zelar pelos seus interesses. A periodicidade regular das reuniões será ou não sinal de eficiência do organismo, pois a fluência das matérias com rapidez evitará a confirmação do pensamento popular de que quando se quer resolver um assunto, atribui-se a matéria para a responsabilidade de uma só pessoa, e quando se pretende procrastinar, confere-se a responsabilidade da solução a um colegiado. E preciso evitarem-se alguns obstáculos ao bom funcionamento do órgão colegiado como: 1) as questões a serem debatidas já vêm com soluções imutáveis, tornando inócuo o debate; 2) ausência de obrigação de freqüência dos componentes dos órgãos, causando posterior reaça° de insurgência contra as decisões tomadas, ainda que de forma sub-reptícia; 3) diluição da responsabilidade pessoal do membro do colegiad0 ante a decisão coletiva (defeito que se remove tornando obrigatório ° pronunciamento de cada um e a motivação de seu voto); 4) ordens "° SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 143 ,. pceparadas de forma superficial e apressada, sem que enviem as atérias, com a necessária antecedência, aos componentes do órgão. Os colegiados visam na pureza de sua conceituação a inventariar opiniões de setores que têm interesse na matéria a ser tratada. Colhem-se idéias e informações, confrontando-se as mesmas em busca da formação de uma posição comum ou, pelo menos, uma posição majoritária. O Prof. Morris Shaefer salienta a vantagem de uma larga participação no organismo colegiado dizendo que "as pessoas se sentem mais incorporadas à decisão finalmente adotada, mesmo se a escolha realizada pela instância responsável não é aquela da preferência da maioria dos participantes. Considera-se igualmente que a tomada de decisão participativa é um antídoto contra a apatia dos agentes da organização".1 2. Competência dos organismos colegiados ambientais brasileiros 2.1 Conselho de Governo 2.1.1 Competência e composição do Çorrselho de Governo ► O Conselho de Governo tem por competência assessorar o Presidente da República na formulação de diretrizes da ação governamental.2 O Conselho de Governo pode atuar em dois níveis: o Conselho de Governo e as Câmaras do Conselho de Governo. •]-2 Câmara de Políticas dos Recursos Naturais Câniaras do Conselho de Governo têm a finalidade de formular cas setoriais cujo escopo ultrapasse as competências de ico Minitério, e são criadas por ato do Poder Executivo. eT 1>696' de 13-111995 (D0U 14.11.1995), criou a Calmara t° dos Recursos Naturais, do Conselho de Governo. Essa m Por objetivo "formular as políticas públicas e diretrizes 2- A com""'"'?"'"" deS ProSrammes de VEnvironnement, p. 28. S1?a2 Conselho consta do m'1- 7C- caPut< daLei 10-683, de 28.5.2003 urn ú cas nico Ministé 144 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO relacionadas com os recursos naturais e coordenar sua implementação" (art. lü). A composição da Câmara de Políticas dos Recursos Naturais e do Comitê Executivo da mesma Câmara difere profundamente do conama-Conselho Nacional do Meio Ambiente, pois a Câmara e seu Comitê Executivo são integrados exclusivamente por representantes de órgãos do Governo Federal. Assim, nem a sociedade civil e nem os Estados terão voz e voto nesses dois colegiados. Dupla é a competência da Câmara: formular políticas públicas e diretrizes relacionadas com os recursos naturais. A tarefa de traçar as linhas das políticas públicas dos recursos naturais está ligada à estruturação da estratégia e ao plano de governo. Antes de debater os assuntos com a Comunidade no foro do conama, não é nocivo o debate e o ajustamento das ações envolvendo os recursos naturais no interior do próprio governo federal. Será nocivo, contudo, esse colegiado se pretender alijar e menosprezar o conama que, desde 1984, presta eficiente serviço ao Brasil, com reconhecimento internacional. Saliente-se que as competências estabelecidas no art. 8Ü da Lei 6.938/81 não sofreram qualquer alteração. Ao definir as políticas públicas dos recursos naturais, evidentemente, a Câmara está vinculada às regras constitucionais, notadamente as normas do meio ambiente (art. 225), da saúde (arts. 196-200), da política urbana (arts. 182-183), agrícola, fundiária e da reforma agrária (arts. 184-191). Dentro da competência da União, será importante o pronunciamento da Câmara sobre os planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico (art. 21, IX, da CF) e do aproveitamento energético dos cursos d'água (art. 21, XII, b, da CF). No âmbito desta Câmara foi criada a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Brasileira.3 í 2.2 Os Conselhos ambientais no Ministério do Meio Ambiente Quatro Conselhos integram o Ministério do Meio Ambiente: Cofl' selho Nacional do Meio Ambiente, Conselho Nacional da Amazônia Legal, Conselho Nacional de Recursos Hídricos4 e Comitê do Fundo Nacional do Meio Ambiente.5 3. Decreto (não numerado) de 3.2.2004 {DOU 4.2.2004, p. 4). 4. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é tratado no Tít. VII, Cap. Únic°5. Medida Provisória 2.216-37, de 31.8.2001. .....- SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 145 o 2 1 Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA Em 1973 era criada a SEMA-Secretaria Especial do Meio Ambiente 6 pelo Decreto federal 73.030, de 30 de outubro. No art. 3a foi instituído o Conselho Consultivo do Meio Ambiente (ccma), com nove membros serem nomeados pelo Presidente da República, por proposição do Ministro do Interior. Contudo, esse Conselho foi extinto na prática. Com a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, cria-se o coNAMA-Conselho Nacional do Meio Ambiente. Interessa no momento focalizar a competência dos organismos ambientais, tanto federal como dos Estados. Como instrumentos da política do meio ambiente foram propostos: o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental, o zoneamento ambiental, a avaliação de impactos ambientais, o licenciamento e a revisão de atividade efetiva ou potencialmente poluidora, os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia voltados para a melhoria da qualidade ambiental, a criação de Estados ecológicos e áreas de proteção ambiental, sistema nacional de informações sobre o ambiente, cadastro técnico federal das atividades e instrumentos de defesa ambiental e penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da delegação ambiental. A Lei 8.028/90, ao dar nova redação ao art. 6Ü da Lei 6.938/81, deu a seguinte redação para o art. 62, II: "Órgão Consultivo e Deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA, com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de polí-ícas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e de-erar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões compa-sad'1S C°m ° me'° am':)'ente ecologicamente equilibrado e essencial à la Cidade de vida". A redação da Lei 8.028/90 somente substituiu "Conselho Superior do Meio Ambiente", que fora criado 89> P°r "Conselh° Governo". ama- apontar 1ue estao bem marcadas as competências do no e as de d' ,md°"S? entre as de assessoramento do Conselho de Gover-de 1984 ess aÇâ°' Exercendo Ja a última função desde 5 de junho nao foi a SSC COnse1]10 tem 0 uma atuação digna de elogios. Se maior Q reuni~atUaÇã°' atrilDUa"se ao restrito número de suas reuniões '«es ordinárias ao ano) e a brevidade de seus encontros. apuulo, n. 47 "O mej0 ambiente na Administração Federal". 146 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O estabelecimento de normas e critérios para o licenciamento, como, também, o estabelecimento de padrões de controle do ambiente é competência do conama, consoante o art. 8B, I, da Lei 6.938/81. Esse artigo diz que a competência do colegiado é "estabelecer, mediante proposta do ibama ...". No art. 8a, V, há também a mesma expressão. Acreditamos que esses dois incisos que compõem o total de sete incisos acerca da competência do conama não visam a manietar o referido Conselho. Assim, não fica vedado aos componentes do Conselho propor normas e critérios para o licenciamento diferentes daqueles propostos pelo ibama, como, também, em relação a perda e restrição de benefícios fiscais. O ibama opinará sobre as proposições, e, então, o conama cumprirá uma de suas atribuições, deliberando. Entender-se o contrário seria fazer o Conselho caudatário do órgão de execução. O art. 8a, II, da Lei 6.938/81 teve sua redação modificada pelo art. 35 da Lei 8.028/90, passando a constar: "determinar, quando julgar necessário, a realização de estudo das alternativas e das possíveis conseqüências ambientais de projetos públicos ou privados, requisitando aos órgãos federais, estaduais e municipais, bem assim a entidades privadas, as informações indispensáveis para a apreciação dos Estudos de Impacto Ambiental, e respectivos relatórios, no caso de obras ou atividades de significativa degradação ambiental, especialmente nas áreas consideradas patrimônio nacional". Desde o início de suas atividades o conama teve a competência de determinar a realização de Estudo de Impacto Ambiental e, portanto, de apreciá-lo após sua elaboração. Entretanto, é de ser acentuado que essa competência não exclui a mesma competência dos órgãos estaduais e municipais e nem invade as atribuições dos colegiados estaduais. Nos casos de licenciamento federal, com a prévia elaboração de Estudo de Impacto, competente é também o conama para apreciar esse estudo e, inclusive, em todos os casos, converter o julgamento em diligência para complementação de dados. Temos que fazer reparo à constitucionalidade do art. 8a, VI, da Lei 6.938/81, quando dá atribuição ao conama de "estabelecer, privativamente, normas e padrões nacionais de controle da poluição por veículos automotores, aeronaves e embarcações, mediante audiência dos ministérios competentes". O conama não tem a atribuição dessas normas e padrões de forma privativa. O conama, pelo art. 24, § Ia, da CF, tem competência para estabelecer normas e padrões gerais, que, entretanto, poderão ser suplementados pelos Estados, conforme o art. 24, § 2a, da mesma CF. Como acentuou o Juiz Anthony Kennedy, da Suprema Corte dos EUA: "Respeitar a Constituição tem um preço. Nós pagamos o preço, SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 147 igum frustração, alguma irritação quando vemos os direitos constitucionais terem força".7 -A competência do conama não foi atingida pelo disposto no art. 25 das Disposições Constitucionais Transitórias. Diz o caput do art. 25: "Ficam revogados, a partir de 180 dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que tange a: I - ação normativa; II - alocação ou transferência de recursos de qualquer espécie". É necessário verificar as competências assinaladas pela Constituição ao Congresso Nacional e as competências do conama previstas no art. 8Ü da Lei 6.938, de 31.8.1981, pois somente foram abrangidos os órgãos do Poder Executivo que estivessem exercendo funções que a Constituição reservou para o Congresso Nacional. As atribuições do Congresso Nacional estão inseridas no Tít. IV, Cap. I - Do Poder Legislativo, Seção II, arts. 48 e 49. Constata-se que nenhuma das atribuições do Congresso Nacional são exercidas pelo conama. Aliás, a matéria que tem uma clara conotação ambiental - "iniciativas do Poder Executivo referente a atividades nucleares" (art. 49, XIV, da CF) - é atribuição do CNEN-Conselho Nacional de Energia Nuclear. Portanto, inobstante meu grande apreço ao Prof. Toshio Mukai, que pensa diferentemente,8 entendo que o art. 25 das Disposições Constitucionais Transitórias não revogou as resoluções do conama. 2-2.2 Comitê do Fundo Nacional do Meio Ambiente O Fundo Nacional do Meio Ambiente tem como objetivo desenvolver os projetos que visem o uso racional e sustentável de recursos faturais, incluindo a manutenção, melhoria ou recuperação da qualidae ambiental no sentido de elevar a qualidade de vida da população. Foi lr>stituído pela Lei 7.797, de 10.7.1989. consideradas prioritárias as aplicações de recursos financei-em projetos nas seguintes áreas: unidades de conservação; pesqui- "eli li d bil j projetos nas seguintes áreas: unidades de conservação; p t "envolvimento tecnológico; educação ambiental; manejo nsao florestal; desenvolvimento institucional; controle ambiental; e exg; ç ; j ; desenvolvimento institucional; controle ambiental; aprog' Foíha de S. Paulo, ed. 21.8.1990, pp. 4-9. * shio Mukai, Direito Ambiental Sistematizado, Rio de Janeiro, Forense Limaria, 1992, p. 94.......... 148 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO veitamento econômico racional e sustentável da flora e fauna nativas. Sem prejuízo das ações de âmbito nacional, será dada prioridade a projetos que tenham sua área de atuação na Amazônia Legal. O Decreto 3.524, de 26.6.2000, regulamentou o Fundo Nacional do Meio Ambiente. Criou um Conselho Deliberativo composto por 13 pessoas, sendo 1 do Ministério do Planejamento e Orçamento, 3 do IBAMA, 3 do Ministério do Meio Ambiente, 1 representante da abema-Associação Brasileira de Entidades do Meio Ambiente e 5 de ongs ambientalistas, na proporção de 1 representante para cada região geográfica do país. 2.2.3 Conselho Nacional da Amazônia Legal !;; O Conselho Nacional da Amazônia Legal foi regulamentado pelo Decreto 964, de 22.10.1993 (DO£/25.10.1993). Estranhamente, não há uma representação permanente da sociedade civil nesse colegiado, ficando a critério do Presidente da República convidar "lideranças regionais e representantes dos meios acadêmicos e científicos ligados à questão amazônica". Fica, assim, empobrecido esse Conselho, pois ganharia se tivesse a contínua colaboração de associações ambientais, indígenas e científicas. A conservação do meio ambiente na Amazônia Legal merece a estruturação de organismos administrativos ágeis e que promovam a integração das ações entre os governos dos Estados e a sociedade civil. O desmatamento, a fauna, a diversidade biológica e a ordenação territorial no espaço amazônico brasileiro e seus aspectos transfronteiriços haverão de ser objeto de uma atuação constante e revigorada desse segmento ministerial. O zoneamento ecológico-econômico, antes coordenado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (que foi extinta), passou a ser competência não exclusiva do Ministério do Meio Ambiente, pois essa competência será exercida em conjunto com os Ministérios da Agricultura e Abastecimento, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e da Integração Nacional.9 Falta, ainda, ao Ministério em exame uma ramificação de execução para os assuntos amazônicos, como o ibama, que tem como atribuição o meio ambiente.10 9. Medida Provisória 2.216-37, de 31.8.2001, modificando a Lei 9.649. de 27.5.19 (art. 14, XII,/, e § 7a). 10. V. Portaria 313, de 24.11.1994, do Ministro de Estado, e a Resolução 1, 17.11.1994 (DOU 28.11.1994, pp. 18.028-18.040), com o Anexo - Política i Integrada para a Amazônia Legal. • SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 149 9 9 4 Conselho de Gestão do Patrimônio Genético .; O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético foi criado pela Me-H'da Provisória 2.186-16, de 23.8.2001, tendo caráter deliberativo e normativo. As principais competências desse Conselho são: coordenar a implementação de políticas para a gestão do patrimônio genético; estabelecer: normas técnicas; critérios para as autorizações de acesso e de messa de recursos genéticos; diretrizes para elaboração do Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios; critérios para a criação de base de dados para o registro de informação sobre conhecimento tradicional associado; deliberar sobre: autorização de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético, mediante anuência prévia de seu titular; autorização de acesso a conhecimento tradicional associado, mediante anuência prévia de seu titular; dar anuência aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios." O Conselho é composto de representantes de órgãos e de entidades da Administração Pública Federal e é presidido por representante do Ministério do Meio Ambiente. « 2.3 Conselhos ambientais nos Estados 2.3.1 Constituições dos Estados No Estado do Amazonas, competirá ao Conselho Estadual do Meio mbiente, Ciência e Tecnologia autorizar a derrubada de seringueiras e ShÍ- nativas' de ProPriedade pública ou privada (art. 232, § 2", , análise do depósito de rejeitos radioativos, lixo atômico, resí- lndustriais tóxicos e corrosivos (art. 233, § 22, da CE); expedição normas para regulamentar os sistemas de controle da poluição, de e J9 e de redução de riscos e acidentes ecológicos (art. 233, caput, Estud a ' ' estarjelecer outras exigências para a elaboração do 23s vi j ImPacto Ambiental, além das constantes dos incs. I a V (art. do de u'' parecer conclusivo" sobre a implantação no Estatal radi aS ener§'a nuclear, instalação e armazenamento de mate-ivo e implantação de unidades de grande porte, geradoras de aos c"nhecimeni!ífir'emÍ Shimada Kishi> Tulela Jurídica do Acesso à Biodiversidade e a Faculdacie de D' '.'onah no Brasil, Dissertação de Mestrado, Curso de Mestrado weito da Universidade Metodista de Piracicaba, novembro/2003. 150 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO energia hidroelétrica (art. 235, § lü, da CE); gerir o fundo criado pelo art. 238 da Constituição. No Estado da Bahia, competirá ao Conselho Estadual do Meio Ambiente formular a política do meio ambiente (arts. 212, caput, e art. 213, § l2, da CE,. No Estado do Ceará compete ao Conselho Estadual do Meio Ambiente-COEMA apreciar o Estudo Prévio de Impacto Ambiental referente a obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente ou que comporte risco para a vida ou a qualidade de vida (art. 264, caput, e seu § 22), sendo que a obra ou a atividade somente poderá ser licitada, aprovada ou executada se obtiver parecer favorável do conselho (art. 264, § 2a, da CE). No Estado de Mato Grosso, compete ao Conselho Estadual do Meio Ambiente aprovar qualquer projeto público ou privado que implique impacto ambiental; definir e coordenar a implantação dos espaços territoriais escolhidos para serem especialmente protegidos; apreciar os Estudos Prévios de Impacto Ambiental; avaliar e propor normas de proteção e conservação do meio ambiente (art. 267, I a IV, da CE). No Estado de Mato Grosso do Sul competirá ao "Conselho Estadual de Controle Ambiental" a deliberação e a formulação da política estadual de proteção ao meio ambiente (art. 226 da CE). No Estado de Minas Gerais, competirá ao órgão colegiado estabelecer normas regulamentares e técnicas, padrões e demais medidas de caráter operacional para a proteção do meio ambiente e controle da utilização racional dos recursos ambientais (art. 214, § lfi, IX, da CE). A Constituição do Estado do Pará criou "conselho específico, com atuação colegiada" que inclui entre suas competências: a) acompanhar, avaliar, controlar e fiscalizar o meio ambiente; b) opinar, obrigatoriamente, sobre a política estadual do meio ambiente, oferecendo subsídios à definição de mecanismos e medidas que permitam a utilização atual e futura dos recursos hídricos, minerais, pedológicos, florestais e fau-nísticos, bem como o controle da qualidade da água, do ar e do solo, como suporte do desenvolvimento econômico; c) assessorar o Poder Público em matérias e questões relativas ao meio ambiente; d) emitir parecer prévio sobre projetos públicos ou privados, que apresentem aspectos potencialmente poluidores ou causadores de significativa degradação do meio ambiente, como tal caracterizados na lei" (art. 255 da CE). Na Paraíba, o Conselho é competente para a "conservação e prote' ção dos componentes ecológicos e o controle da qualidade do mei° ambiente" (art. 230 da CE). No Estado de Pernambuco, o Conselh0 Estadual de Meio Ambiente - órgão colegiado e deliberativo - é f SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 151 ado da definição da Política Estadual do Meio Ambiente (art. 208). nf Estados do Rio de Janeiro (art. 258, § lü, XXII, da CE) e de Sergipe rt 232, § 7a, da CE) criaram o Conselho Estadual do Meio Ambiente, a xando para a lei ordinária estabelecer a competência. Em São Paulo, apesar de não estarem definidas na Constituição as ibuições Q çonseiho Estadual do Meio Ambiente e terem as mesmas sido remetidas para serem definidas em lei, ficou consignado que o órgão é "normativo e recursal" (art. 193, parágrafo único, a, da CE). Rondônia criou o Conselho Estadual de Política Ambiental, cujas atribuições serão definidas em lei (art. 229 da CE). O Estado do Paraná não explicitou na Constituição Estadual a criação de um órgão colegiado, mas no art. 207, § l2,1, da CE, apontou que o Poder Público deve estabelecer a política estadual do meio ambiente, com a colaboração de representantes de entidades ecológicas, de empresários e das universidades. Treze Estados optaram por inserir nas suas Constituições os órgãos colegiados de meio ambiente. É realmente significativo o avanço do Direito Ambiental, através de uma concepção participada de Administração Pública. Espera-se de outros Estados, que não colocaram o colegiado em suas constituições, que suas legislações ordinárias o façam sem demora. 1 '!<>'" -, ;jy • ' -iO 2.3.2 Legislação dos Estados ':'•' ; /M)' . . > .•j.';(.i..Sem pretender apresentar uma lista exaustiva de todos os Estados rasileiros, examinamos algumas legislações estaduais onde foram insi uidos órgãos colegiados para tratar dos assuntos ligados ao ambiente, ividimos o setor de competência e procuramos comparar os poderes d°s órgãos. Est j°ram estudadas as legislações dos seguintes órgãos: Conselho 3 uQal de Proteção AmbientalCEPRAM - Alagoas (Lei 3.989, de (Lei 3 «s ' Consemo Estadual de Proteção Ambiental-CEPRAM Bahia Minas r de 3111980); Comissão de Política Ambiental-COPAM -da SUpereraiS {Lei 7'772'de 8-91980); Conselho de Proteção Ambiental Sos Hí Tmtendência de Administração do Meio Ambiente e dos Recur-22.10 l97olOS da Paraíba-suDEMA - Paraíba (Decreto 8.246, de Jar>eiro rn Comissao Estadual de Controle Ambiental-CECA - Rio de do Mei9 AeC[et0"lei 134' de 16.6.1975); Comissão Especial de Defesa 2311-1977? pnte'CEDEAM - Rio Grande do Norte (Decreto 7.242, de (Decret0 7 7onselho de Tecnologia e Meio Ambiente - Santa Catarina '•/55, de 1.6.1979). 152 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Há semelhança de competência no que tange à atuação dos organismos na formação dos programas ambientais e na fixação de normas para a proteção do ambiente (no Rio de Janeiro, as normas são propostas pela Fundação Estadual do Meio Ambiente-FEEMA), aprovadas ou não pela ceca e propostas para o Secretário de Estado de Obras e Serviços Públicos. A competência para licenciamento e suspensão das atividades poluidoras ou potencialmente poluidoras já apresenta marcante diferença nos vários órgãos colegiados. Esses poderes estão expressos nos Estados de Alagoas (art. 6Q, IX e VI), Bahia (art. Ia, IV e III), Minas Gerais (art. 5", IX). No Estado do Rio de Janeiro, o Decreto-lei 134/75 dá poderes para a ceca autorizar a operação de instalações ou atividades potencialmente poluidoras (art. 4a, II). Entretanto, o Regimento Interno da ceca entra no terreno do decreto-lei e corta poderes do plenário da ceca, atribuindo somente poderes residuais para a Comissão, enfeixando o Presidente os principais poderes de licenciamento. Parece-nos que o Regimento feriu o texto e o espírito do Decreto-lei 134/75. Nos Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Santa Catarina os entes colegiados não têm competência para licenciar e para suspender o licenciamento. Alguns desses órgãos têm o poder de polícia expresso de modo genérico, sendo que no Estado de Alagoas explicitamente previu-se no Decreto 4.302, de 4.6.1980, que o Conselho poderá requisitar força policial com o fim de permitir o livre exercício de suas atribuições e competência em todo o Estado, prevendo, ainda, outras ações contidas no poder de polícia da Administração ambiental. 3. Composição dos organismos colegiados ambientais brasileiros 3.1 Conselho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA O Decreto federal 99.274/90 foi alterado pelo Decreto 3.942,de 27.9.2001 (DOU de 28.9.2001), dando-se nova composição aocoNAMA: todos os Ministérios e Secretarias da Presidência da República passam a ter representantes; os Municípios terão 8 lugares, as entidades de trabalhadores e da sociedade civil, 21 representantes, as entidades empresariais, 8 representantes; e um membro honorário indicado pelo Plenário-Integram também o Plenário, sem direito a voto, um representante do Ministério Público Federal, um representante dos Ministérios Públicos Estaduais e um representante da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 153 A alteração eleva a dois representantes de entidades ambientalistas região. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência passa a ndicar um representante. Haverá um representante do Centro Nacional le Desenvolvimento Sustentável das Populações Tradicionais e um representante da comunidade indígena indicado pelo Conselho de Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil. Oportuna a inclusão no conama de um representante do Conselho Nacional de Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, mas não me parece adequada sua classificação no mesmo inciso VIII - representantes de entidades de trabalhadores e da sociedade civil. 3.2 Organismos estaduais '• Jl' 5.2.1 Constituições dos Esladios Prevêem a participação da sociedade civil, sem discriminar a forma e o número de representantes, os Estados de Minas Gerais (art. 214, § l2, IX, da CE), Rio de Janeiro (art. 258, § l2, XXII, da CE) e Sergipe (art. 232, § 72). Deixam para a lei definir a composição do colegiado não mencionando a participação da sociedade civil os Estados do Amazonas (arts. 232, § 2a, 233, §§ 2a e 72, 235, § l2, e 238 da CE), Mato Grosso do Sul - que fixa a composição em nove membros (art. 226 da CE) -, São Paulo (art. 193, parágrafo único, a, da CE) e Rondônia (art. 229 da CE). Estabelece composição paritária entre os representantes dos órgãos públicos e os representantes das associações civis, sem apontar quais sao as associações ou a origem profissional das mesmas: Estado de Pernambuco (art. 208 da CE). , _ A composição do colegiado é tripartite entre os representantes dos °rgãos públicos, associações ambientais e outros segmentos da sociepe civil: Bahia (art. 213, § l2, da CE), Mato Grosso (art. 267 da CE) e waíba (art. 230 da CE). O Estado do Pará textualmente diz que a sociejWe civil será majoritária no conselho (art. 255, VIII, da CE), sendo os Estados da Bahia, Mato Grosso e da Paraíba não o afirmam exter a!nente; entretanto, com a tripartição dos membros - sendo um soc' d C rnernkros do governo - por conseqüência, é dada a maioria à será c C'VÍ1" Estado da Paraíba indica que um terço do conselho cOnl mP°sto por "entidades cujas atividades estejam associadas ao de En C a,mk'ental e um terço de representantes do Conselho Regional senharia, Arquitetura e Agronomia da Paraíba" (art. 230). 154 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O Estado do Ceará não estabelece a proporção entre os componentes do conselho, mas indica que a "participação da comunidade" é garantida através das entidades representativas de classe de profissionais de nível superior de Engenharia, Arquitetura, Agronomia, Biologia, Medicina e Direito" (art. 264, § 22, da CE). O fato de a maioria dos Estados ter feito a escolha de um sistema de administração ambiental com a participação de organizações não-governamentais está a mostrar a presença de uma concepção em que o governo não tem necessariamente a chave da solução dos problemas do meio ambiente. Entretanto, é preciso encorajar o sistema tripartite, pois, do contrário, haverá sempre a possibilidade de farsa participativa, em que as associações ambientais e outros segmentos da sociedade civil têm lugar nos órgãos colegiados, mas serão sempre minori a. A tripartição do colegiado possibilitará a presença de organismos "neutros" ou imparciais, como as corporações profissionais (oab, crea etc), Ministério Público e as universidades. Saliente-se, por fim, que será tarefa da legislação ordinária tornar concretamente possível a participação dos segmentos da sociedade civil, assegurando-lhes diárias e pagamento de passagens, pois, caso contrário, só poderão participar segmentos escolhidos segundo sua auto-suficiência financeira. 3.2.2 Legislação dos Estados Nas legislações analisadas, vamos encontrar Estados que compuseram seus órgãos colegiados somente com representantes de setores governamentais, como a Paraíba e o Rio de Janeiro. Outros Estados deixaram à livre designação do governo a escolha de outros componentes, que poderiam ou não pertencer ao quadro oficial como o Rio Grande do Norte e Santa Catarina. Outros Estados, de forma expressa, como Alagoas, Bahia e Minas Gerais previram a presença, respectivamente, de cinco, quatro e sete representantes de entidades não governamentais (conservando, contudo, o governo a maioria de votos). A idéia do órgão colegiado, como já foi dito, merece elogios. Parte do pressuposto que a decisão não será monocrática e sem discussão-Entretanto, só com a participação de pessoas e entidades situadas fora dos quadros oficiais, é que se vitaliza um órgão colegiado administrai" vo. Doutra forma será a monótona repetição de uma mesma linha p0'1' tico-administrativa, numa afinação que desconhece outros pontos oe vista, com prejuízos contínuos para os interesses do ambiente e da sau- SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 155 humana. É evidente que o poder de decisão sempre permanecerá aqueles que estejam ocupando os postos estatais, mas não se dei-á de pelo menos, ouvir e ponderar conceitos independentes, que derão ser diferentes ou os mesmos, o que. então, confirmaria a adequação da política ambiental oficial. d O meio ambiente na Administração Federal ' 4J Ministério do Meio Ambiente , . . 4.1.1 Competência do Ministério "'',"' ' São assuntos que constituem a área de competência do Ministério do Meio Ambiente: a) política nacional do meio ambiente e dos recursos hídricos; b) política de preservação, conservação e utilização sustentável de ecossistemas, e biodiversidade e florestas; c) proposição de estratégias, mecanismos e instrumentos econômicos e sociais para a melhoria da qualidade ambiental e do uso sustentável dos recursos naturais; d) políticas para integração do meio ambiente e produção; e) políticas e programas ambientais para aAmazôniaLegal; f) zoneamento ecoló-gico-econômico.12 4.1.2 Órgãos do Ministério do Meio Ambiente Integram a estrutura básica do Ministério: o Conselho Nacional do Meio Ambiente; o Conselho Nacional da Amazônia Legal; o Conselho Racional dos Recursos Hídricos; o Conselho de Gestão do Patrimônio enético; o Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente.13 te- s a° °r?aos específicos singulares do Ministério do Meio Ambien-Secrecretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos; Hídn6 6 diversidade e Florestas; Secretaria de Recursos Secr °s' decretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável e ar'a de Coordenação da Amazônia.14 RePúbliCaeeid1083' de 28.2.2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da 13 a,ed°s Ministérios e dá outras providências (art. 27, XV). 4 683' de 28-2-2003, art. 29, XV. •De creto 2.972, de 26.2.1999. J" ')' 156 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Um superministério do meio ambiente não foi criado no Brasil e isso não é desejável para a eficaz administração ambiental. Em reunião promovida em Madri, em 1983, salientávamos que "nas questões ambientais não se podem criar oportunidades para uma Administração monolítica - fechada em si mesma - com unidade de canais de comunicação e de decisão, dando-se portanto oportunidade a erros de inoperância ou de ações mal concebidas ou mal executadas". Citávamos a seguinte opinião: "A redundância é geralmente definida como superposição inútil ou o que os reformadores da Administração americana chamam de duplicação. Contudo, a redundância é meio de proporcionar mecanismos de funcionamento seguro para manter o sistema operando, na suposição de que erros ocorrerão e de que a contínua operação de uma máquina ou de uma organização requer outros canais por onde passem as comunicações e vários fatores que possam agir sobre assuntos, quer estejam juntos ou separados".15 4.2 A transversaudade do tema "meio ambiente" nos Ministérios Ministérios que atuam em temas que interessam ao meio ambiente:16 a) Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - defesa sanitária animal e vegetal; proteção, conservação e manejo do solo voltados ao processo produtivo agrícola e pecuário; meteorologia e climatologia;17 b) Ministério das Cidades - política do desenvolvimento urbano; saneamento ambiental, planejamento, regulação, normatização e gestão da aplicação de recursos em políticas de saneamento básico e ambiental; participação na formulação das diretrizes gerais para conservação dos sistemas urbanos de água, bem como para a adoção das bacias hidrográficas como unidades básicas de planejamento e gestão do saneamento;18 c) Ministério da Ciência e Tecnologia - política nacional de biossegurança; política nuclear;19 d) Ministério das Comunicações -política nacional de telecomunicações (por exemplo: telefones celulares);20 e) Ministério da Cultura — política nacional de cultura; proteção do patrimônio histórico e cultural;21 f) Ministério da Defesa - apoio no 15. P. A. L. Machado, "Sistema orgânico para a gestão ambiental", Revista d" Serviço Público 4, vol. 111/69-82, Brasília, 1983. 16. Lei 10.683, de 28.2.2003, art. 27. 17. Lei 10.683, de 28.2.2003, art. 27,1. 18. Lei 10.683, de 28.2.2003, art. 27, III. -».-<>, 19. Lei 10.683, de 28.2.2003, art. 27, IV. ' 20. Lei ]0.683, de 28.2.2003, art. 27, V. 21. Lei 10.683, de 28.2.2003, art. 27, VI. '• . > • ' SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 157 bate a delitos ambientais;22 g) Ministério do Desenvolvimento Agrá-° _ promoção do desenvolvimento sustentável do segmento rural cons-rl j-jo pelos agricultores familiares;23 h) Ministério do Desenvolvimen-1 Indústria e Comércio Exterior - propriedade intelectual e transfe-A> cia de tecnologia; metrologia, normalização e qualidade industrial;24 .. Ministério da Integração Nacional - defesa civil; obras contra as sede infra-estrutura hídrica; formulação e condução da política nacional de irrigação; ordenação territorial;25 j) Ministério da Justiça - defesa dos direitos do consumidor; ouvidoria-geral do consumidor;26 k) Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - política e diretrizes para modernização do Estado;27 1) Ministério das Relações Exteriores -política internacional; participação nas negociações comerciais, econômicas, técnicas e culturais com governos e entidades estrangeiras; programas de cooperação internacional;28 m) Ministério da Saúde - saúde ambiental.29 4.3 O quadro funcional da Administração ambiental c : De inegável oportunidade a lição de Michel Crozier, que se tem destacado como um dos Mestres da Ciência da Administração. Afirma que: "É uma experiência de sua tarefa que o funcionário descubra o significado de sua ação. Diga-se o que quiser, ele é realmente sensível. A alienação do funcionário, eixo da máquina, corresponde à do administrado, manipulado pela organização. Nem a alienação, nem a manipulação são conseqüências necessárias da racionalização, ainda menos sinais de crise da civilização. Procedem de um sistema onde o funcionamento tende a despojar de sua dimensão humana a tarefa e as relações que a acompanham. Para reencontrar essa dimensão essencial é preciso que as tarefas sejam repensadas em função das relações humanas sobre quais se fundamentam. Ora, essas relações são de natureza muito ersa e exigem um tipo de independência, de sustentação e de sanções trad entes' se§und° ° caso. Tomamos, a princípio, as tarefas mais 'cionais, as quais poderíamos chamar de tarefas de magistratura no 22. Lei 23. Lei 24. Lei 25. Lei 26. Lei 27. Ui 2S. Lei 29. Lei '0.683, de 28.2.2003, art. 27, VIL •0.683, de 28.2.2003, art. 27, VIII. !0.683, de 28.2.2003, art. 27, IX. 10683, de 28.2.2003, art. 27, XIII. '0.683,de28.2.2003,art. 27, XIV. 10-683, de 28.2.2003, art. 27, XVII. 0683, de 28.2.2003, art. 27, XIX 10-683, de 28.2.2003, art. 27, XX. 158 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO sentido mais amplo possível, isto é, aquelas onde dominam a aplicação e a interpretação de normas jurídicas ou de regulamentos impessoais. Elas ultrapassam bastante a função judicial do Estado. Uma boa parte das tarefas atribuídas aos organismos fazendários são desta ordem. Não desejaríamos que um fiscal de tributos tivesse espírito de empresa, nem que um exator fosse pago em razão das rendas recebidas; nós queremos, antes de tudo, que esses funcionários sejam justos, eqüitativos, humanos. Isso significa que sua independência deve ser assegurada, que eles devem ser protegidos, tanto de seus superiores como dos administrados. Aceitaríamos prazerosamente não ter um acesso fácil até eles, se soubermos que este é o preço a pagar para interditar todo favoritismo, toda pressão, toda chantagem. Para tais funções, o sistema de estratifi-cação e de centralização é urna solução, que tem certos inconvenientes, mas que não é mau. Muitos empregos possuem - em grau maior ou menor - essas características: as funções de controle e de inspeção das legislações do trabalho, da saúde, do meio ambiente".30 Não é desinteressante afirmar que para outros tipos de tarefas o especialista citado preconiza "contrato com duração limitada", para tornar mais flexível e rentável a administração. O assunto versado não é estranho à matéria de preservação do meio ambiente. Tem-se procurado delegar o exercício do poder de polícia ambiental a empresas públicas. Não se nega que essa modalidade da Administração indireta possa ser operosa no domínio da pesquisa e da transferência de tecnologia ambientais. A Reforma Administrativa implantada pelo Decreto-lei 200/67, que previu a empresa pública (pessoa de Direito Privado), não teve em mira enfraquecer a função pública ou o servidor público. Pelo contrário, objetivava uma política de valorização e dignificação do servidor público, aumento de produtividade, profissionalização, aperfeiçoamento do servidor, inclusive através do fortalecimento do mérito para ingresso na função pública (art. 94 do Decreto-lei 200/67). Na realidade, a ausência de paridade na retribuição entre o pessoal da Administração direta frente o pessoal da Administração indireta tem sido responsável pelo desestímulo e pela evasão de valores. A contratação, nos termos da legislação trabalhista, na Administração direta e na autarquia, só era possível para atender às "exigências de trabalho técnico" (art. 96 do decreto-lei referido). Não é irrelevante, portanto, saber se quem decide conservar ou não os recursos naturais é pessoa investida de estabilidade e de independência em sua função. Rafael Bielsa assim se expressou sobre a função 30. On ne Change pas Ia Societé par Décret, pp. 100-102. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 159 'blica: "O funcionário, qualquer que seja sua esfera, representa o Es-do Desde o presidente da Nação, o juiz de um tribunal até o agente de olícia, o mais modesto desta esfera, são funcionários. Ao contrário, o Pmpregado público pode ser um homem de ilustração, com altos títulos rofissionais, com vencimentos equivalentes aos de um magistrado e, ainda superior ao dele, com vencimentos dez vezes superiores aos de urn funcionário, como são os assessores jurídicos, financeiros etc, e também pode ser um escrevente. Porém a diferença principal é esta - o empregado não representa o Estado, não exterioriza a autoridade nem a vontade do Estado". "O funcionário representa o Estado como ente público e nessa representação pode ser funcionário de autoridade e funcionário de gestão; a dupla função depende da função que realiza. Quando ordena, decreta, manda, é de autoridade; quando negocia e contrata em nome do Estado é funcionário de gestão." "O funcionário de autoridade realiza funções essenciais do Estado, cuja continuidade deve-se assegurar a todo o custo."31 Para a preservação dos recursos naturais renováveis, para a agilização de uma política ambiental que atenda ao mesmo tempo aos interesses econômicos como ecológicos, sem atividades predatórias de pessoas ou de grupos nacionais ou internacionais, é mister que haja continuidade nessas funções essenciais do Estado, como assinala Bielsa. Acentua André de Laubadère que "a ação da polícia administrativa é revestida sempre na forma de prescrição unilateral. Polícia e contrato são noções que se excluem". "Portanto, o poder de polícia não pode ser concedido a um particular e a Administração não pode se despojar de suas responsabilidades neste domínio."32 A propósito, a competência de polícia, como ensina Caio Tácito, "dependerá sempre de determinação legal específica ou genérica, não podendo ser presumida ou deduzida Por analogia ou extensão".33 Ressalta o relatório da fao (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) que "é indispensável que a máquina administrativa se baseie num sistema jurídico capaz de tratar eficazmente as mfrações do código de conservação da natureza". Para isso, faz, entre °utras, a seguinte recomendação: "o desempenho dessas funções deve er confiado a agentes que tenham a condição jurídica de funcionários Administração Pública".34 31- La Función Pública, pp. 191 e 192. 32- Traité de Droit Administratif, 6a ed., p. 566. 33 Direito Administrativo, p. 144. Macio i ""'''" sobre Ia Legislación sobre Fauna y Flora Silvestre y Parques n<»ies en América Latina, Roma, 1971. 160 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Não é suficiente somente conceder garantia de estabilidade ao funcionário público. Seria ilusória essa garantia jurídica se o quadro do pessoal e a estrutura administrativa fossem insuficientes em relação à quantidade, à qualidade e à remuneração. n/o .>> 4.4 ÍBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente •"" ''' '• e dos Recursos Naturais Renováveis ;nro > ohsí í ..- .<".: fflí; Y.W- 'jí. .!/4.4.1 Finalidade e estrutura do ibama ,,V::. .„!..,J-Jt O ibama foi criado pela Lei 7.735, de 22.2.1989. A Lei 8.028/90 deu nova redação ao art. 2Ü da Lei 7.735. A Medida Provisória 1.911-12/99 (atual Medida Provisória 2.216-37) deu a seguinte redação ao mencionado art. 2o: "É criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-iBAMA, entidade autárquica de regime especial, dotada de personalidade jurídica de Direito Público, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de executar as políticas nacionais de meio ambiente referentes às atribuições federais permanentes relativas à preservação, à conservação e ao uso sustentável dos recursos ambientais e sua fiscalização e controle, bem como apoiar o Ministério do Meio Ambiente na execução da Política Nacional de Recursos Hídricos e na execução das ações supletivas da União, de conformidade com a legislação em vigor e as diretrizes daquele Ministério". Essa autarquia ambiental surgiu da fusão de quatro organismos administrativos: a sema (Secretaria Especial do Meio Ambiente), o ibdf (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal), a sudepe (Superintendência do Desenvolvimento da Pesca) e a sudhevea (Superintendência da Borracha). Ao ibama foi atribuída especificamente por lei a tarefa de fazer proposições ao conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente). O regimento do Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal faz a substituição do ibama pelo Ministério nessa atribuição perante o conama. Quanto ao mérito da medida não se coloca qualquer reparo, mas quanto à forma, a via legislativa seria o modo correto de revogar-se a lei. 4.4.2 O ibama e a instituição de licenças: a atividade petrolífera Pela Portaria Normativa 101, de 23.9.1993, o ibama criou tipos de licença para exploração, perfuração e produção de petróleo e gás natural, assim como instituiu instrumentos para serem utilizados no licen- SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE 161 ciamento, como o "Estudo de Viabilidade Ambiental" e o "Relatório de Avaliação Ambiental". O Estudo de Viabilidade Ambiental-EVA é elaborado pelo empreendedor, contendo plano de desenvolvimento da produção para a pesquisa pretendida, com avaliação ambiental e indicação das medidas de controle a serem adotadas; o Relatório de Avaliação Arnbiental-RAA é elaborado pelo empreendedor, contendo diagnóstico ambiental da área onde já se encontra implantada a atividade, descrição de novos empreendimentos ou ampliações, identificação e avaliação de impacto ambiental e medidas mitigadoras a serem adotadas, considerando a introdução de outros empreendimentos. O Decreto 97.946, de 11.7.1989, em seu art. l2, ao referir-se às finalidades do ibama, nos seus 17 incisos, não mencionou a competência dessa instituição para criar licenças, autorizações e permissões. Diz o inc. IX que o ibama pode licenciar os segmentos produtivos que utilizam matérias-primas oriundas da exploração de recursos naturais e borracha. Licenciar não é evidentemente criar licenças. O inciso que pode dar margem a discussão é o de n. XIII - "promover e disciplinar a utilização dos recursos naturais renováveis e dos produtos e subprodutos decorrentes de sua exploração". A utilização do termo "disciplinar" poderia induzir o intérprete da norma jurídica a pensar que o ibama, ao disciplinar a utilização dos recursos naturais, pudesse chegar até a criação de licenças e autorizações. Na apropriada interpretação da competência do ibama temos que nos socorrer primeiramente do art. 170, parágrafo único, da CF, que diz: "É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei". A regra é a de que não se precisa de licença ou autorização para o exercício de qualquer atividade econômica. A intervenção do Poder Público, portanto, do ibama, é exceção que deve sw prevista "em lei". Já há uma lei sobre a matéria, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), que em seu art. 10 prevê Çue "a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimento e de atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideraos efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio 'cenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema acionai do Meio Ambiente-siSNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio mbiente e Recursos Naturais Renováveis-IBAMA, em caráter supletivo, m Prejuízo de outras licenças exigíveis". e Assim, baseado no art. 10 da Lei 6.938/81, cujo texto encontra-se De ri rmoma com o citado art. 170, parágrafo único, da CF, o ibama declarar os tipos ou modalidades de estabelecimentos e atividades 162 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO utilizadores de recursos ambientais que precisarão de licenças ou de autorizações para construção, instalação, ampliação e funcionamento Dessa forma, o ibama não estaria criando a licença ou a autorização, mas aplicando concretamente o art. 10, que, de outro modo, ficaria inaplicável tanto pelo ibama como pelos órgãos estaduais de meio ambiente. Contudo, o ibama não tem competência para criar as normas de licenciamento, pois tal competência foi expressamente concedida pela lei mencionada-Lei 6.938/81 - ao CONAMA-Conselho Nacional do Meio Ambiente (art. 8Q, I - estabelecer, mediante proposta do ibama, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, a ser concedido pelos Estados e supervisionado pelo ibama). O Decreto 97.946, de 11.7.1989, em seu art. Ia, II, e o Decreto 78, de 5.4.1991, Anexo I, art. Ia, II, seguem, como deveriam seguir, a posição da Lei 6.938/81. A questão em análise não é de interesse meramente acadêmico. Ao invadir competência do conama, o ibama ignora um colegiado de representação nacional, integrado, inclusive, por associações não-governamentais. O que é mais grave: admite utilizar para a licença de instalação o RAA-Relatório de Avaliação Ambiental, em lugar do Estudo de Impacto Ambiental. A instituição dos novos instrumentos - Estudo de Viabilidade Ambiental e Relatório de Avaliação Ambiental -permite a destruição dos elementos-chave da prevenção do dano ambiental, consubstanciados - de forma regrada - no Estudo Prévio de Impacto Ambiental, notadamente, não se prevendo as audiências públicas nesses novos instrumentos. A Portaria Normativa 101, de 23.9.1993, do ibama é ilegal e merece ser revista administrativamente, ou anulada judicialmente. TITULO IV INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Capítulo 1- NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS. Capítulo II - ZONEAMENTO AMBIENTAL. Capítulo III - ZONEAMENTO INDUSTRIAL NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO. Capítulo IV - ESTUDO DE IMPA CTO AMBIENTAL. Capítulo V-LICENCIAMENTO AMBIENTAL. Capítulo VI -AUDITORIA AMBIENTAL. Capítulo VII - DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS. Capítulo VIII - FINANCIAMENTO -MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTA VEL Capítulo I NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 7 A — •çao administrativa no tempo la, Introdução do aperfeiçoamento legislativo pode custar "ao legis-estã rtlUlto trabalho, especialmente porque os interesses econômicos W.,- f,111 P°sição de resistência ou em conluio com os poderes públicos tjp0 ' Matiza o Prof. italiano M. S. Giannini que "resistência desse meiu re Se enconra e se encontrará, e a reflexão sobre os aconteci-UlI1a m !a °"a ensina que, quando há resistência para a adoção de que cje a' cria-se e consolida-se um convencimento difuso ao ponto Vando- a nin8uem está disposto a aceitar uma realidade material pri-__ essa medida". Continua apontando que hoje a licença de cons-e out°rgada se a repartição de higiene dá assentimento aos truÇão SSa 164 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO planos para execução dos esgotos e a licença de habitação se a mesma repartição controlou a boa execução dos projetos. Para chegar a estas normas, de certo modo aperfeiçoadas, foi necessário passar-se através de fase intermediária, para vencer a resistência dos proprietários das casas e das áreas, não dispostos a suportar o custo da construção de tais projetos.1 O referido Professor de Direito Administrativo da Universidade de Roma aponta a ineficiência dos organismos administrativos na luta contra a poluição, oriunda sobretudo da imprevisão, gerada pela ignorância, mais do que pela leviandade e corrupção. "Muitos órgãos da Administração sanitária consideravam verdadeiramente uma vantagem o fato de que um estabelecimento industrial pudesse utilizar-se de um curso d'água para lançar seus resíduos; de que um apartamento novo pudesse estar servido de um coletor de resíduos, que fosse despejado num rio ou similar.2 O jurista mencionado aponta, também, como causa do crescimento da poluição a imprecisão das prescrições no momento em que eram deferidas as licenças de funcionamento do estabelecimento. 2. Direito à publicidade ambiental _._______,,.____*.,—.«... 2.1 Objetivos . •'... ; Tem sido valorizada como eficiente técnica ambiental a divulgação preliminar dos projetos que possam trazer danos ao ambiente. Esse aspecto do procedimento administrativo vem revelar uma maior integração da comunidade com a Administração, possibilitando uma contínua e não episódica troca de informações. Não só os integrantes da Administração são chamados a opinar e a refletir, mas também os que possam ser atingidos pela decisão. A publicidade prévia não retira da Administração seu poder de decisão. Pelo contrário, faz com que ela possa comunicar-se não só com quem está pretendendo construir, instalar-se e realizar uma determinada atividade, mas também com aqueles que possam sofrer as conseqüên' cias da pretensão. Dessa forma, a Administração não se vê direcionada só num sentido, mas pode decidir avaliando as alternativas. 1. "Ambiente - Saggio sui diversi suoi aspetti giuridici", Rivista Trimestral* Diritto Pubblico, 1973, pp. 28-29. 2. "Difesa deli'ambiente e dei patrimônio naturale e culturale", Rivista Trimesti" de Diritto Pubblico, 1971, p. 1.128. leji A NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 165 A adoção do princípio da publicidade coloca em prática o art. 19 Declaração Universal dos Direitos do Homem, que proclama o direi, receber informações e opiniões e de divulgá-las, sem limitação de f° tciras. O Prof. René Ariel Dotti salienta que o direito de conhecer inegável raiz nos direitos naturais da pessoa humana.3 Um cidadão que fem a oportunidade de participar do processo laborativo da decisãò/e que não é afrontado pela Administração com o fato consumado, tem grande boa vontade para aceitar e acomodar-se à decisão. De outro lado, a participação pública no processo elaborativo da decisão pode reduzir muito o potencial de conflito, que de outra forma existiria, desde que a participação do público tenha sido em tempo oportuno e efetiva.4 A execução desse procedimento não é destituída de empecilhos. Entre estes cumpre superar a lentidão ou a excessiva brevidade e a possibilidade de formas tumultuárias e falsas de participação. Não é sem valor a experiência de países estrangeiros, mas precisamos corporificar formas de participação que atendam às necessidades de nossas raízes culturais e de nosso desenvolvimento. De outro lado, seria ilusório esperar que todo cidadão viesse manifestar-se a tempo: sempre haverá o inerte. Em países onde a divulgação prévia dos fatos que interessam ao ambiente foi conseguida, isso foi obra relevante dos juizes e da própria legislação. "Os juizes que introduziram essa mutação devem ter percebido em relação a uma sociedade como a atual, industrializada e urbanizada - onde o cidadão depende sempre mais do outro para a sa-tistação das próprias necessidades e onde o Estado desempenha um pa-Pel sempre maior como 'benfeitor' (serviço social, assistência e previer>cia, casa, transporte, educação) e como 'administrador' - que novos ecanismos eram e são solicitados com o fim de tornar a burocracia esponsável no confronto com os próprios cidadãos."5 um vul§aÇão possibilita a manifestação do público, significando que COmo .ue consulta dos interessados antes da decisão. Saliente-se Legi í rnanestaÇão dos interessados não visa marginalizar o Poder naijZa ,~1V0' Ue interferirá normalmente na elaboração das leis e na ca-Çao de protestos e de reivindicações globais. -Çao da Vida Privada e Liberdade de Informação, p. 173. nüing, Public Participation in Enviromnenlal Decision-Making. Trends mal Policy and Law, p. 134. yse, "Recenti sviluppi dei Diritto Amministrativo negli Stati Uniti ma Trimestrale di Diritto Pubblico, 1976, pp. 475-478. 166 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O Prof. Alexandre Charles Kiss enfatiza as qualidades de uma eficaz consulta do público, colocando entre elas a duração suficiente, a escolha devida da época de consulta (evitando-se épocas de férias coletivas), possibilidade de consulta da documentação fora das horas de trabalho dos interessados; o lugar onde se desenrola a consulta deve ser aquele onde se pretende localizar o estabelecimento potencialmente poluidor.6 Insistimos que a publicação prévia dos projetos não institucionaliza por si só um regime jurídico de consulta da Administração Pública, mas é um passo significativo para que os prováveis prejudicados possam defender os seus interesses pessoais como os da comunidade no tocante aos danos ambientais previsíveis. ., ., „ „ ,,,. .. 2.2 Experiência estrangeira il <»!."..,' As formas de expressão das opiniões dos interessados varia em diversos países. Nos EUA, o Clean Air Act, emendado em 1970, e o Federal Water Pollution Act, emendado em 1972, prevêem a informação do público: as agências solicitam as propostas do público para as regulamentações, estabelecimento de padrões etc. indicando quando as audiências públicas se realizarão. O relacionamento da Administração ambiental com o público supõe da parte daquela uma dose de humildade e de boa vontade, pois não se trata de um contato de técnicos em nível científico. Muitas dúvidas e temores poderão ser dissipados. Importa na divulgação do conhecimento científico sobre as causas e os efeitos da poluição, dos controles possíveis e adequados e da realidade ecológica. Esse relacionamento se fará por ocasião dos Estudos de Impacto Ambiental, quando necessários. A legislação da Alemanha difere da anterior na Lei Federal da Proteção contra as Emissões de 1974, pois não existe uma audiência, isto é, um contato físico entre a Administração e o público, mas a comunicação se faz por escrito. Diz o art. 10, § 3Ü, dessa lei: "Quando os documentos estiverem completos, a autoridade competente é obrigada a apresentar o projeto ao conhecimento do público no jornal oficial de publicações como nos jornais locais difundidos na zona de influência do lugar da implantação do estabelecimento. O pedido assim como os documentos previstos no § 2- deverão ser acessíveis ao público para consulta durante dois meses a contar da publicação; durante este prazo as Li 6. "Le controle d'activités préjudiciables à Penvironnement par des regimes d'autorisation prealable ou de déclaration", Trends in Environmental Policy, cit., PP-88-89. ..... . . . •.............. NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 167 cões poderão ser formuladas com referência ao projeto perante a ° ridade, por escrito ou para ser reduzida a escrita na repartição. Ex-a. ncj0-se o prazo, todas as objeções que não se fundamentem sobre P1 los particulares de Direito Privado serão excluídas". A França instituiu sistema de consulta prévia para a outorga de torízação para a instalação de estabelecimentos insalubres e perigo-os em 1917 (enquête de commodo et incommodo). A Lei 76-663, de 196 1976, relativa às instalações classificadas para a proteção do meio ambiente, em seu art. 5a exige a enquête publique relativa às incidências eventuais do projeto para comodidade da vizinhança, para a saúde, segurança e higiene públicas, para a agricultura, para a proteção do meio ambiente e da natureza, para a proteção das paisagens e dos monumentos. A Assembléia Geral das Nações Unidas, aos 28 de outubro de 1982, adotou a "Carta Mundial da Natureza" que diz em seu item 18: "Todo o planejamento compreenderá, entre seus elementos essenciais, a elaboração de estratégias de conservação da natureza, o estabelecimento de inventários dos ecossistemas e a avaliação dos efeitos das políticas e atividades projetadas; todos estes elementos serão trazidos ao conhecimento do público pelos meios apropriados e de forma tempestiva, para que o público possa efetivamente ser consultado e participar das decisões". 2.3 Experiência brasileira As Constituições de 1989 da maioria dos Estados brasileiros previram o direito à informação ambiental por parte das pessoas, como o dever do Poder Público de prestar essa informação. Previram o acesso à informação ambiental, de um modo amplo: ES (art. 186, parágrafo único, VII ~ "garantir a todos acesso às informações sobre as fontes e cau-sas da Poluição e da degradação ambiental"); GO (art. 127, § l2 "assegurar ° direito à informação veraz e atualizada em tudo o que disser geuSrPeit0 à qua)idade do meio ambiente"); MG (art. 214, § 1Q, II - "asserar' na forma da lei, o livre acesso às informações básicas sobre o tod'° amk'ente)' PA (art. 253: "é assegurada a participação popular em as decisões relacionadas ao meio ambiente e o direito à informatod as matéria' na forma da L 258' § ]B' XnI ~ "gara matéria' na forma da lei); (arL 258' § ]' XnI Caus nt'r ° acesso dos interessados às informações sobre as fontes e nar à de§radacao ambiental"); RO (art. 219, VIII - "... e proporcio-um at m.unidade a informação das questões ambientais orientadas por dade") lrnento cultural lógico das relações entre a natureza e a socieinfortn _ (art- HO, V- "garantia de acesso aos interessados em voes sobre fontes e causas da poluição e da degradação am- 168 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO biental). O Estado do Paraná prevê a informação no art. 207, § Ia ("Cabe ao Poder Público, na forma da lei, para assegurar a efetividade desse direito:... IX - informar a população sobre os níveis de poluição e situações de risco e desequilíbrio ecológico"). Outros Estados não só garantem o acesso à informação ambiental, como determinam que a informação seja prestada sistematicamente (AM, art. 239; BA, art. 214, II; MT, art. 263, parágrafo único, VI; RJ, art. 258,' § P, XIV; RN, art. 150, § 10; SC, art. 182, VIII; SE, art. 232, § Ia, XI)'. Alguns Estados garantem também seja informada a população sobre o resultado das ações de monitoramento, chamadas também de monitorias, e das atividades de auditoria ambiental: AM, art. 239; MT, art. 263, parágrafo único, VI; RJ, art. 279 - estabelecendo a obrigação de divulgação semestral da monitoragem da água servida à população; SP, art. 193,V;eSE, art. 232, § P, XII. Especificam outros elementos da informação a ser transmitida: AM ("níveis e comprometimentos da qualidade do meio ambiente, as situações de risco e a presença de substâncias danosas à saúde e à vida" art. 239); BA (acrescentando ao texto do Amazonas, presença de "substâncias danosas à saúde nos alimentos, água, ar e solo e as situações de riscos de acidente" - art. 214, II); MA (no mesmo sentido das Constituições indicadas, acrescentando que a informação deva versar também sobre a presença de substâncias danosas encontradiças na água potável, nos rios e nos mares - art. 241, IX); MT (explicitando que a informação deva abranger a presença de substâncias danosas à saúde na água potável e nos alimentos - art. 263, parágrafo único, VI); RJ (idêntico dispositivo ao de Mato Grosso - art. 258, § l2, XIV); RN (a informação deverá abranger "os níveis de poluição, situações de risco e desequilíbrio ecológico para a população" - art. 150, § 10); SC (a informação devendo abranger a presença de substâncias danosas à saúde na água, no ar, no solo e nos alimentos - art. 182, VIII); SP (a informação devendo abarcar a "presença de substâncias potencialmente nocivas à saúde, na água potável e nos alimentos" - art. 193, V) e SE (devendo a informação abranger a presença "de substâncias potencialmente danosas à saúde na água potável, nas praias, nos balneários e nos alimentos" - art-232, § P, XI). A inclusão da matéria nas Constituições Estaduais apontadas revela não só a impossibilidade de se deixar de informar, como define, sem reticências, os deveres dos órgãos públicos ambientais no transmitir a informação. Descumpridos esses deveres, utilizável é a ação civil públ1' ca visando o cumprimento da obrigação de fazer. A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) preyê no art. 10, § 1": "Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a re$' NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 169 tiva concessão serão publicados no jornal oficial do Estado bem como um periódico regional ou local de grande circulação". A inserção i co naráerafo nasceu de sugestão da Sociedade Brasileira de Direito desse p<"a& , ° ,. . , i/jejo Ambiente, quando se discutia na sema o anteprojeto. É um passo legal de alto significado. Os interessados em geral e, rincipalmente, os que possam ser atingidos pelos efeitos do licenciamento têm possibilidade de conhecer com anterioridade. Não é um conhecimento para gerar somente uma contemplação do nue vai vir ou para possibilitar uma expectativa. É um conhecimento nue traz em si uma oportunidade de manifestação ativa ou omissiva. Por isso, por via de decreto o dispositivo legal merece ser completado, asse-surando-se um prazo mínimo para que os interesses possam manifestar-se. Caso contrário, essa publicação prévia que possibilite um imediato posicionamento da Administração retira a eficácia da divulgação. Portugal seguiu a inovação brasileira e inseriu em sua Lei de Bases do Ambiente (Lei 11/87) que "os licenciamentos abrangidos pelo disposto no n. 1, a sua renovação e a respectiva concessão serão publicados num periódico regional ou local" (art. 33, 5). É de ser colocado em destaque o parágrafo único, art. 41 do Decreto 21.228, de 10.3.1981, do Estado de Minas Gerais: "As deliberações da Comissão de Política Ambiental constituem complemento deste Regulamento, nos termos da Lei 7.772, de 8.9.1980, e terão seu processo deliberativo fixado em norma específica que incluirá nas suas disposições a admissão de audiências públicas de representantes da comunidade e de órgãos e entidades de Direito Público e Privado, em prazo não inferior a 30 dias para cada caso específico". Esse tipo de consulta prévia que preconizávamos em artigo naRevis« «05 Tribunais1 merece ser adotado em todos os Estados e Municípios. orno se vê no dispositivo de Minas Gerais não só as entidades privadas erão manifestar-se. Os próprios órgãos públicos de outros setores dU até e outras órbitas (federal ou municipal) poderão ter oportunidade entrar em contato com a Administração ambiental. Instituiu-se uma a rornia de comunicação administrativa - a verbal - sem marginalie a comunicação escrita e de forma procedimentalmente organizade c •°rma utüização desse tipo de comunicação só nos momentos rja se ambiental não daria bons resultados, pois muitas opiniões visornente carregadas de emotividade ou de oportunismo. n0 par. odiê° de Defesa Ambiental do Município de Piracicaba previu agrafo único do art. 39 que "o pedido de licença será publicado controle da poluição e o Decreto-lei 1.413/75", RT525/36. São Paulo, 1979. 170 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO no Diário Oficial do Município e em jornal local de circulação diária, por duas vezes, com intervalo de 10 dias no mínimo. A partir da data dessa última publicação, as associações ambientais ou outras associações, com personalidade jurídica, ou qualquer cidadão terão o prazo de 30 dias para formular suas observações perante o Prefeito Municipal". 3. Direito à informação ambiental O art. 62, § 3Ü, da Lei 6.938/81 dispôs: "Os órgãos central, setoriais, seccionais e locais mencionados deverão fornecer os resultados das análises efetuadas e sua fundamentação, quando solicitados por pessoa legitimamente interessada". Preconizávamos essa disposição legal, salientando que "o direito de informação é pedra basilar para o exercício de uma política do meio ambiente independente e atuante. De nada valeriam as medidas de precaução no momento da instalação de uma fábrica potencialmente poluidora se, após, no decorrer de suas atividades, fossem sonegados ao público os dados relativos aos despejos por ela efetuados".8 O direito à informação acerca das atividades fiscalizatórias do Poder Público foi consagrado em lei, através de anteprojeto da Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente. Essa sugestão veio a se converter em emendas propostas pelo Sen. Passos Porto e Deps. federais Adhemar Ghisi, Adhemar Santillo, Horácio Ortiz, José Frejat e Walter Silva. Constou da justificativa das emendas: "O controle da poluição ambiental ganhará em dinamismo e seriedade se os dados colhidos pelos organismos públicos não ficarem restritos aos meios administrativos. Com a medida proposta, cria-se oportunidade para as vítimas da poluição e também aos poluidores de tomarem conhecimento das análises levadas a efeito e de debaterem as conclusões com os responsáveis pelos órgãos de defesa do meio ambiente, melhorando o nível de informação dos que têm competência para decidir sobre esses temas. Os dados poderão servir, eventualmente, para embasar ações judiciais daqueles que entenderem tenham sido vulnerados seus direitos" . O relator do projeto na Comissão Mista do Congresso Nacional, Sen. Milton Cabral, acrescentou ao texto das emendas dos parlamentares referidos a parte final "quando solicitados por pessoa legitimamente 8. Ob. cit., p. 37. NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 171 teressada". O acréscimo foi motivado pelo receio de que muitos poderiam solicitar a mesma informação, não havendo "condições de atender àqueles que realmente necessitam dessa providência". Vê-se, pois, e a modificação introduzida não visou impedir ou dificultar a informação, mas ordená-la. Todo cidadão, em princípio, é pessoa legitimamente interessada na aualidade do meio ambiente, que é patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo (art. 2a, I, da Lei 6.938/81). Como regra geral, a Administração Pública não tem o que ocultar e, por isso, a não ser que ela prove a ilegitimidade do solici-tante, não poderá negar a informação. No enfoque da observância do direito da informação ambiental é preciso recordar-se que a Administração existe para servir o administrado e não este àquela. O texto legal foi feliz em se limitar à referência a "pessoa". Assim, tanto podem solicitar a informação a pessoa física como a pessoa jurídica, isto é, tanto a empresa que foi fiscalizada como a associação que vise à conservação e/ou à preservação dos recursos naturais ou à melhoria da qualidade de vida. O art. 5a, XXXIII, da CF preceitua: "Todos têm direito de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado". A Lei 9.051, de 18.5.1995, veio complementar a Constituição, estatuindo em seu art. Ia: "As certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações, requeridas aos órgãos da Administração centralizada ou autárquica, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às fundações públicas da União, dos Estados, do Distrito ederal e dos Municípios deverão ser expedidas no prazo improrrogável > ,'as> contado do registro do pedido no órgão expedidor". No art. esta previsto que "nos requerimentos que objetivam a obtenção das nidões a que se refere esta Lei, deverão os interessados fazer constar sclarecimentos relativos aos fins e razões do pedido". ta, " e' 9.051/95 fulmina a errônea distorção do decreto regulamen-3a J Pon'tica nacional do meio ambiente, notadamente, no art. 16, § ress ret0 99.274, de 6.6.1990. Quem solicitar informação, de inte-arn, . Particular ou de interesse geral ou coletivo (como é a matéria inte nta')> não tem necessidade de comprovar a legitimidade de seu 2g ,sse- Basta constarem os esclarecimentos relativos aos fins e ra-ser j p° Pecndo. Há uma presunção de veracidade a favor de quem quer rmado. Se a Administração Pública - direta ou indireta - duvi- 172 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO dar dos fins e das razões constantes do pedido - a ela caberá ônus de provar a sua falsidade ou inexatidão.9 A Lei 10.650, de 16.4.2003,i0 dispôs sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente-siSNAMA. Qualquer indivíduo, independentemente de comprovação de interesse específico, terá acesso às informações ambientais, mediante requerimento escrito. Nesse requerimento o requerente deverá assumir a obrigação de não utilizar as informações colhidas para fins comerciais. * 4. Fase conciliatória t> i >." f A conciliação dos interessados é valiosa como fase procedimental tanto para licenciar uma atividade como para puni-la. Dois componentes devem ser ponderados: quem participa do entendimento e em que plano é possível o entendimento. Afirma o Prof. Alexandre-Charles Kiss: "O procedimento de autorização proveniente de uma consulta efetiva do público permite transpareçam a oposição dos interesses econômicos e ecológicos, cabendo à autoridade pública arbitrá-los. No caso em que a Administração já se entendeu com o proponente do projeto em questão, existe o perigo de que os representantes oficiais sejam tentados a defender, antes de tudo, o compromisso que tenham elaborado e que ainda constitua uma ponte comum com o empresário interessado contra o público, o elemento mais fraco das três partes presentes. Por conseguinte, um excessivo entendimento entre os industriais que devem sofrer fiscalização e controle e os organismos que devem fazê-la pode esvaziar de seu conteúdo essas funções essenciais para a salvaguarda do meio ambiente".11 É de se tirar uma clara lição: a Administração precisa ser interlocu-tora dos dois lados interessados ou em confronto. Dessa forma, não e eficaz nem ético que só se negocie ou se comunique com o empresárioDevem estar presentes as vítimas em potencial e as associações ambientais com representatividade. Ordenando-se essa fase, de modo a L 9. V. Helita B. Custódio, "Direito Ambiental e relevância da informação", 67/58-66, ano 18, janeiromarço de 1994, e Decreto 2.134, de 24.1.1997 ( 27.1.1997), que regulamenta o art. 23 da Lei 8.159, de 8.1.1991, que dispõe sobre » categoria dos documentos públicos sigilosos e o acesso a eles, e dá outras providênciaS' 10. DOU 17.4.2003, p. 1. 11. Ob. cit., p. 93. " '' .......... j NOVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS 173 tar-se morosidade e tumulto, poder-se-á chegar, algumas vezes, a 6 lucões conciliatórias. Contudo, não se deve pensar que diante de toH s as questões se chegará à situação que agrade a todas as partes: nessa casião, superada a fase da consulta e da conciliação, a Administração decidirá. Para que sua decisão seja realmente independente é preciso que nas fases anteriores todas as partes tenham tido a oportunidade de ser ouvidas e de tomar conhecimento de todos os pontos de vista acaso divergentes. Dada a composição do conama (que se espera passe a ser imitado em todos os Estados e Municípios), pode o mesmo operar como agente catalisador das vontades antagônicas, mesmo porque caberá a esse órgão, entre outras funções, "homologar acordos visando à transformação de penalidades pecuniárias na obrigação de executar medidas de interesse para a proteção ambiental" (art. 8Ü, IV, da Lei 6.938/81). Ltt f!|, Capítulo II ZONEAMENTO AMBIENTAL Vi,. KO .•; i.D;-,v: :"S,': . . ú 1. Zoneamento e desenvolvimento planejado '' V1, J !l O zoneamento deve ser a conseqüência do planejamento. Um planejamento mal-estruturado, malfundamentado, poderá ensejar um zoneamento incorreto e inadequado. O Professor de Direito Ambiental da Universidade da Flórida, Julien Juergensmeyer, assinala que um plano abrangente deve ser sempre o pré-requisito do zoneamento e de outras atuações do poder de polícia através do controle do uso do solo.' No Brasil não se há de perder de vista a organização federal do país. A Constituição Federal de 1946 previa um Plano Nacional de Via-ção.2 A Constituição de 1967 e a Emenda de 1969 passaram a prever plano nacional e regional de desenvolvimento (art. 8Ü, V e XIV) e plano nacional de saúde (art. 8Ü, XIV), como competência da União. Os Municípios e os Estados também poderiam ter seus planos de desenvolvimento, mas não poderiam colidir ou mesmo descumprir os planos nacionais. Themístocles Cavalcanti afirmava: "O não cumprimento pelos Estados das medidas e dos planos econômicos e financeiros cujas diretrizes tenham sido fixadas pela União é motivo para intervenção federal (art. 10, V, c)".3 As decisões sobre zoneamento ambiental podem ser tomadas em nível municipal, "mas a maioria delas deve operar sobre um território muito mais extenso, dentro do qual hão de conjugar-se as correspondentes opções. Como mínimo será o espaço regional o âmbito significativo para os pronunciamentos ambientais básicos, porém em muitos casos terá que se levar em conta todo o espaço nacional e, inclusive, apa' recerão implicações supranacionais".4 1. "State and local and use planning and control in the agricultural context", S"u Dakota Law Review 25/465, summer 1980. 2. Art. 5a, X. 3. Estudos sobre a Constituição de 1967 e sua Emenda n. 1, 2a ed., p. 9. 4. R. Martin Mateo, ob. cit., p. 177. < ZONEAMENTO AMBIENTAL 175 Os planos de desenvolvimento devem conter, também, a previsão conservação e recuperação dos recursos naturais. O II Plano Nacio-1 de Desenvolvimento Econômico salientou a necessidade de uma lítica ambiental em três áreas principais: meio ambiente na área urba-a o levantamento e a defesa do patrimônio de recursos da natureza e defesa e promoção da saúde humana. "Nesse quadro terão particular significação as políticas de uso de solo, urbano e rural, dentro do zoneamento racional". O Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico traça, também, normas para o zoneamento industrial ao estabelecer uma política de localização industrial. Diz o mencionado II pnd: "Política de localização industrial, considerando especificamente os aspectos de poluição, e voltada, por exemplo para: 1) disciplinar a ocupação industrial segundo a intensidade da ação poluidora das indústrias, desincentivando a implantação das indústrias com maior potencial de ação poluidora nas áreas críticas e intermediárias; 2) disciplinar a ampliação de estabelecimentos industriais atualmente localizados em áreas críticas e intermediárias, de forma que sua expansão não aumente a intensidade de sua ação poluidora; 3) incentivar a transferência para fora da cidade de fábricas mais poluidoras em funcionamento". OIII pnd, através do II Plano Básico de Desenvolvimento Científico eTecnológico (II pbdct- 1980-1985), estabeleceu como metas "aperfeiçoar e acelerar o zoneamento econômico-ecológico, considerando o uso do solo segundo a sua capacidade" e "identificar áreas que devem ser preservadas como reservas naturais, perpetuando seu potencial genético".5 Os zoneamentos a serem estabelecidos tanto a nível federal como s adual e municipal deverão cumprir os objetivos do plano nacional. A °ntranedade às finalidades mencionadas vicia o conteúdo do zoneamento e pode ser argüida judicialmente. nr C°nstiltluicão Federal de 1988 (art. 21, IX) atribuiu competência la° P "lb àUnr ll ( , ) p n ~la° Para "elaborar e executar planos nacionais e regionais de orde- ° terr't°r'° e de desenvolvimento econômico e social". No deTít VlTr soc'a devemos inserir o meio ambiente, que faz parte do Planos e ~ Da Ordem Social- Destarte, como prevê o art. 165, § 4Ü, "os ição ?rarnas nacionais, regionais e setoriais previstos nesta Constuição ? , g p aPreciad Se™° e'aorad°s em consonância com o Plano plurianual e Cas e usinS ° Con§resso Nacional". Por exemplo, usinas hidrelétri-nucleares vão acarretar "despesas de capital" e dependem 5'DeCret0 federal 85.118, de 3.9.1980. 176 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO de um programa "de duração continuada" (art. 165, § lü, da CF) e, portanto, deverão estar inseridas no plano plurianual. Acresce notar que -quanto às usinas nucleares -já há previsão expressa do art. 225, § 6-, da CF. Note-se, também, que o legislador federal, antes de votar o plano plurianual localizando instalações de "obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente", deverá exigir o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (art. 225, § l2, IV, da CF), harmonizando e integrando todos os dispositivos da Constituição, pois seria um contra-senso exigir-se o estudo de impacto, depois que o plano já houvesse autorizado a instalação (a menos que houvesse ressalva da necessidade do estudo). A Portaria Interministerial 29/816 considerou a necessidade de "instituir zoneamento agro-hídrico da região, como parte do zoneamento ecológico-econômico do Nordeste" e nesse sentido foi previsto "um conjunto de ações na região semi-árida do Nordeste" entre a sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) e a ceane (Coordenadoría Especial para Assuntos do Nordeste), a primeira na área do então Ministério do Interior (hoje na área do Ministério do Planejamento) e a segunda no da Agricultura. 2. Zoneamento ambiental e segurança nacional No planejamento nacional inclui-se a persecução dos objetivos nacionais permanentes, matéria que interessa, também, à política da segurança nacional. O desenvolvimento com preocupação ecológica deve entrosar-se com as estratégias de segurança da nação, pois viver em segurança não implica necessariamente antinomia com viver saudavelmente e em harmonia com a natureza. A Constituição Federal de 1988 mudou a competência de um organismo relacionado com a segurança nacional. Anteriormente, era chamado de "Conselho de Segurança Nacional" (art. 87 da EC 1/69), passando, agora, a denominar-se "Conselho de Defesa Nacional" (art. 91 da CF/88). Atualmente, esse organismo tem a atribuição de "acompanhar", "estudar", "opinar" e "propor", conforme dispõe o art. 91, § lfl> em seus quatro incisos, e desta forma o Conselho de Defesa Nacional não tem mais as funções de "dar" "assentimento prévio", "modificar ou cassar", "conceder", "autorizar", conforme previa o art. 89 da EC 1/69iá 6. DOU 20.2.1981, p. 3.613. ! " ZONEAMENTO AMBIENTAL 177 Importante continuarem as funções do Conselho de Defesa na ta-fa de assessorar o Presidente da República, pois passou a ser órgão de onsulta, e não mais de deliberação, acerca dos assuntos relacionados om a "soberania nacional e defesa do Estado Democrático". O zoneamento ambiental, contudo, não é da competência exclusiva do Presidente da República, podendo o Congresso Nacional legislar sobre a matéria sem nenhuma restrição. Salutar será, contudo, um intercâmbio de idéias e de experiências acerca de matérias ambientais e de segurança nacional, quando apresentarem áreas de mútua interferência, principalmente porque no Conselho de Defesa Nacional têm assento os Presidentes da Câmara Federal e do Senado Federal. Como, é óbvio, o posicionamento dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal no Conselho de Defesa Nacional não vincula nenhuma das casas do Poder Legislativo, que poderá divergir total ou parcialmente das posições assumidas pelos mencionados presidentes. Eticamente, se o regimento interno das casas do Congresso Nacional não dispuser expressamente, impedidos estarão os presidentes da Câmara de Deputados e do Senado Federal de exercerem a presidência na votação dos assuntos sobre os quais tiverem opinado no Conselho de Defesa Nacional. ,,,„,! 3. Zoneamento ambiental na experiência estrangeira O zoneamento consiste em dividir o território em parcelas nas quais se autorizam determinadas atividades ou interdita-se, de modo absoluto ou relativo, o exercício de outras atividades. Ainda que o zoneamento nao constitua, por si só, a solução de todos os problemas ambientais é um significativo passo. Nesse sentido o Prof. espanhol Tomás Ramón rernandez Rodriguez acentua "que todas essas técnicas de distanciamento e de medidas corretas (sobretudo a técnica de distanciamento) consagradas pelos preceitos do Regulamento de 1961 a propósito das a lvidades incômodas, nocivas, insalubres ou perigosas são técnicas já uPeradas e que devem dar lugar às técnicas de planificação, concreta-ente, o zoneamento, a qualificação do solo, a determinação das stinações, a imposição dos usos lícitos, que constituem o objetivo ProPrio do plano".7 N p _exPeriência de várias nações mostra ser vantajoso o zoneamento. lQa pã~Bretanha, já em 1956, o Clean Air Act permitia à autoridade declarar, total ou parcialmente, seu setor "zona controlada de fuMédio-Ambiente Urbano y Ias Vecinidades Industriales, p. 160. i 178 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO maça". O Decreto 63-963, de 1963, na França, criou zonas de proteção especial tendo em conta a importância e a estrutura da população, a concentração ponderável e qualitativa das partículas no ar, a concentração de anidrido sulfuroso ou outro gás tóxico no ar; a absorção dos raios solares pela atmosfera, influências climatológicas locais e variação no tempo desses elementos. O Japão - na Lei 132, de 1967 estabeleceu a possibilidade de ser disciplinado o uso do solo nas áreas onde a poluição ambiental seja séria ou possa vir a sê-lo. Na Alemanha, pela Lei federal de 15 de março de 1974, é previsto um regime jurídico para as zonas particularmente expostas à poluição e que são aquelas onde se registra ou se prevê poluição do ar que, em razão de sua freqüência e duração, sua forte concentração e o perigo da aparição simultânea de diversos tipos de poluição, possam suscitar efeitos particularmente nocivos ao meio ambiente. 4. Zoneamento, urbanismo e poluição ; ., ,• ,:/;. O Direito Urbanístico preocupa-se com o desenvolvimento da cidade para assegurar, através do emprego de todos os recursos técnicos disponíveis, vida condigna para toda a população. Não trata somente do melhoramento viário e higiênico, como em outros tempos. A legislação urbanística deve cogitar das exigências globais da comunidade, procurando impedir a criação de áreas de sub-habitação. A cidade não pode fechar-se em si mesma, pensando, assim, resolver todos os seus problemas. "A cidade não é senão uma parte de um conjunto econômico, social e político constituindo a região".8 E com o "regionalismo se vai difundindo um novo sentimento de desenvolvimento, que refuta o discurso meramente estatístico, e afirma o direito ao desenvolvimento in locus".9 Entre os vários campos abrangidos pelo Direito Urbanístico destaca-se o do zoneamento urbano. As diversas partes do território urbano são destinadas funcional e racionalmente a determinadas ocupações. Como acentua Le Corbusier, "o zoneamento é uma operação feita no plano da cidade com o fim de atribuir a cada função e a cada indivíduo seu justo lugar. Tem por base a discriminação necessária entre as diversas atividades humanas reclamando cada uma um espaço particular..."-'" 8. Le Corbusier, La Charte d'Athènes, p. 19. 9. Mário cTErme, "Ecologia e urbanística per una convergenza operativa", Ecologia e Urbanística, p. 121. 10. Ob. cit., p. 39. ZONEAMENTO AMBIENTAL 179 O desenvolvimento urbano merece ser redimensionado, devendo rtjr especialmente de dois pontos: "o homem visto concretamente como lembro de uma comunidade local e o território na sua realidade de nibiente ecológico, redescobrindo-se nele seus valores específicos, promovendo-o, além de utilizá-lo"." O bem-estar da população, principalmente no concernente à sua saúde, tranqüilidade, trabalho adequado, segurança, lazer e cultura dos valores espirituais, é o fim primacial da divisão de uma cidade em zonas. O respeitado arquiteto Le Corbusier afirma: "Se a força das coisas diferencia a habitação rica da habitação modesta, não se tem o direito de transgredir regras, que deveriam ser sagradas, reservando-se só aos favorecidos pela fortuna o benefício das condições necessárias a uma vida sã e ordenada. É preciso possibilitar, por uma legislação implacável, uma certa qualidade de bem-estar a cada um, independentemente da questão de dinheiro. É preciso interditar para sempre, por uma estrita regulamentação urbana, que famílias inteiras sejam privadas de luz, de ar e de espaço".12 E nós acrescentamos que é preciso interditar as contínuas e degeneradoras agressões provocadas pelos poluentes, que atingem não só os moradores de zonas mistas, como as zonas residenciais adjacentes às zonas industriais. Daí a necessidade premente de serem criadas regras jurídicas gerais para o ordenamento do zoneamento eco-lógico-econômico. 5. Elaboração do zoneamento: participação do público 5.V Experiência estrangeira Na França devem ser citados os "esquemas de ordenamento e de urbanismo" (sdau), os planos de ocupação do solo (pos) e as zonas de rnbiente protegido que se enquadram numa planificação onde o público é consultado. Como consta do art. L-123-3, os planos de ocupação solo são submetidos à consulta pública (enquête publique), tendo o antes publicados, inclusive constando o parecer dos conselhos municipais interessados. útil- a Slstema jurídico francês de consulta pública é de longa data cid h °-tCm mr'tos irrecusáveis. Sua grande vantagem é dar publiúltim reVia s 'nter>Ções concretas da Administração. Ainda que no rnomento o ato administrativo não traduza as opiniões dos cida'lMáriod'Erme>ob.cit.,p. 121. 1Z- Ob. cit., p. 40. 180 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO dãos, este método pode evitar o fato consumado ou o recurso posterior aos tribunais".13 Numa diretriz do Primeiro-Ministro francês, de 14 de maio de 1976, consta: "a informação do público encontra seus fundamentos na necessidade de explicar e de fazer compreender as razões que conduziram os poderes públicos a conservar este ou aquele projeto. A informação se impõe, também, para obter dos habitantes interessados o máximo de reações e de proposições suscetíveis de esclarecer a autoridade pública diante da escolha ou início de um projeto". Na Alemanha, o procedimento utilizado para a adoção de planos concernentes ao meio ambiente tem a participação do público, através dos interessados, associações, ou aqueles que queiram fazer objeções, num período de discussão à procura de um acordo amigável.14 Nos EUA, é praticada com intensidade a consulta ao público antes da outorga de um plano de zoneamento, a ponto, como se vê de um julgado na Suprema Corte da Flórida, de ter sido anulado o regulamento por insuficiência de tempo na consulta.15 Na Suíça, a Lei federal de 22 de junho de 1979, sobre ordenamento do território, dispôs em seu art. 4fi sobre "informação e participação": "§ lü - as autoridades encarregadas do ordenamento do território informarão a população sobre os planos que a presente Lei prevê; a implementação sobre os objetivos que eles visam e sobre a tramitação do procedimento; § 2- - as autoridades devem velar para que a população possa participar de maneira adequada do estabelecimento dos planos; § 3Ü - os planos previstos pela presente lei podem ser consultados". Interessante compulsar o comentário dos artigos dessa lei contido na mensagem ao Parlamento assinada pelo Presidente da Confederação Suíça Ritschard e pelo Chanceler Huber aos 27 de fevereiro de 1978. Sobre o § Ia do art. 4U, consta: o § l2 obriga as autoridades que assumem funções em matéria de ordenamento (Confederação, cantões e comunas ou outros organismos responsáveis) de informar o público sobre os fins visados pelo ordenamento. É necessário que a opinião pública tenha conhecimento do desenvolvimento dos estudos do ordenamento, das diversas etapas da elaboração dos planos, das decisões incidentes e de sua dimensão. É, pois, indispensável fornecer a tempo informações sobre o curso dos trabalhos que exigem ordenamento que podem, às ve13. Minha tese Forêts de Protection, p. 44. 14. Steiger-Kimminich, Law and Practice of Pollution Contrai in lhe Federa* Republic of Germany, p. 86. 15. Julien Juergensmeyer, Florida Land Use Restrictions, D. & S. Publishers Inc-Cap. 4, p. 15. ZONEAMENTO AMBIENTAL 181 se estender por longos períodos. Uma informação bem concebida ' £ causa do ordenamento; é conveniente abrir amplamente a dis-ussão sobre os interesses públicos e privados em presença, freqüentemente em oposição. Acerca do § 2- do art. 4U, diz a mensagem: "Diferentemente da oublicidade, uma boa informação procura o diálogo. Encoraja aqueles a auem é dirigida a trazer sua própria contribuição. Tende a criar condições nas quais decisões objetivas possam ser tomadas". Quanto ao § 3Ü do referido art. 4Ü, o mesmo tem a significação de permitir a cada um tomar conhecimento dos planos diretores e dos planos de afetação. No último decênio, houve uma visível mutação do comportamento da autoridade administrativa quanto à participação dos portadores de interesses coletivos, assinala o Prof. Massimo Severo Giannini. "Passou-se de uma posição de não hostilizar para uma posição mais aberta, em que tal participação é bem aceita e muitas vezes ainda solicitada. As razões dessa nova posição são diversas: há sempre uma maior afirmação de um costume democrático, mas a principal razão é certamente de ordem tecnológica: a autoridade administrativa se deu conta que se coloca em melhor condição de administrar, se ela recebe os pontos de vista dos portadores de interesse coletivo" ... do que se recebesse somente os pontos de vista das repartições administrativas. Acentua o Professor italiano que a Administração terá sempre meio de verificar ou fazer verificar a fundamentação da contribuição recebida.16 Em Portugal apresentou-se um projeto governamental sobre o "Código de Processo AdministrativoGracioso",17 em que consta do art. 72: 1- Na elaboração de planos de ação administrativa, designadamente pianos de ordenamento do território, de desenvolvimento regional e de urbanização, proceder-se-á sempre à afixação de editais e à publicação e anúncios de onde constem as áreas abrangidas e as principais carac-. ristlcas das ações projetadas, de modo a permitir a intervenção dos Cessados; 2. A Administração reconhecerá sempre a legitimidade, es casos, às associações de interessados que se queiram pronunciar re os Plar>os de ação administrativa em elaboração e pode recusar a deD clPaÇã° individual dos interessados, restringindo a legitimidade para r no processo a associações já existentes ou constituídas expressa-mente para o efeito". ®>ritto P a tllte'a degli interessi colletivi nei procedimenti amministrativi", Rivista di i7 «cessuale 29/560, II Série, Pádua, CEDAM, 1974. eparata do Boletim do Ministério da Justiça, Lisboa, 1981, n. 301. 182 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 5.2 Experiência brasileira O zoneamento será fruto de uma decisão só do Poder Executivo ou de uma decisão conjunta do Poder Executivo e do Poder Legislativo. É uma questão realmente importante, pois, conforme a via adotada darse-á ensejo ou não à discussão prévia da matéria, o conhecimento das intenções da Administração e dos diferentes grupos e segmentos sociais. Normas jurídicas não foram ainda estabelecidas a nível federal e estadual, estabelecendo qual deva ser o procedimento da União e dos Estados para estabelecerem o zoneamento em que essas pessoas públicas intervenham. Entretanto, a nível municipal, pode-se ter uma visão de conjunto através das Leis Orgânicas municipais; há Municípios que explicitamente prevêem o zoneamento regulado através de lei e aqueles que admitem seja a matéria objeto apenas de decreto do prefeito municipal. Há outros, em que a legislação, ainda, exige quorum qualificado das câmaras municipais para, com a sanção do prefeito, dispor sobre os planos de desenvolvimento municipais. Entendemos nesses casos que o zoneamento está contido no planejamento mencionado. A lei de zoneamento pode conter os critérios gerais, as características e os requisitos para a criação de um tipo de zona, a maneira de se estabelecer a intermediação de uma zona a outra, os usos permitidos e as proibições. Hely Lopes Meirelles afirma: "O zoneamento, no seu aspecto programático e normativo, é objeto de lei, mas na sua fase executiva - em cumprimento da lei - é objeto de decreto".1* Nada impede, contudo, que a câmara municipal resolva fixar ela mesma as zonas. Silenciando sobre a individualização das zonas, não é legal que o prefeito o faça por decreto. A iniciativa da lei de zoneamento tanto pode ser do prefeito municipal como da câmara municipal, assim como a posterior modificação. Normalmente o zoneamento não deverá conter disposição sobre a matéria financeira, mas se contiver, então, a iniciativa da lei caberá com exclusividade ao prefeito municipal. Salientamos a importância do zoneamento passar por um debate aberto e amplo, o que não deve significar morosidade e confusão. O concerto das vontades individuais, em que de todos os setores - inclusive as associações ambientais - poderão expressar seus pontos de vista, contribuirá para que o desenvolvimento local se faça sem agressão aos recursos naturais. 18. Direito Municipal Brasileiro, p. 417. ZONEAMENTO AMBIENTAL 183 pto plano federal, a Lei 7.566, de 19.12.1986, autorizando a cria-- do Fundo para o Desenvolvimento Integrado do Vale do Rio Doce, f 7 zoneamento ambiental, pois no seu art. 4a diz: "Fica vedada a insta-.a g0 de indústrias poluentes no Vale do Rio Doce. Parágrafo único: ós a publicação desta lei, as empresas já instaladas no Vale do Rio Doce têm prazo de 120 dias para a instalação de equipamento antipoluente, de forma a evitar qualquer tipo de poluição ambiental". Ainda que se possa criticar o prazo exíguo dado às empresas já instaladas e a pretensão de se atingir a poluição zero, não se pode deixar de apontar que o tratamento global da poluição numa determinada zona -como a do Vale do Rio Doce - é uma experiência a ser levada em prática como já se vem fazendo no Estado de São Paulo, através do zoneamento ecológico das bacias do rio Piracicaba, do rio Pardo e do rio Moji-Guaçu. As apas (Áreas de Proteção Ambiental) - conforme a Lei 6.902/81 - podem ser eficazmente utilizadas como instrumentos de zoneamento ambiental a nível federal (como já se iniciou), estadual e municipal. 6. Elaboração do zoneamento municipal Preferimos chamar esse tipo de zoneamento de municipal e não simplesmente urbano, porque a divisão do território não se restringe ao perímetro urbano. Se não ficar obrigatória para os Municípios a elaboração dos planos de zoneamento e a sua revisão, os interesses ambientais continuarão ao sabor das improvisações e das atitudes precipitadas de muitos administradores, causando inclusive maiores ônus financeiros aos Municípios com posteriores indenizações e até desapropriações. A CF/88, em seu art. 182, § Ia, passou a obrigar os Municípios com mais de vinte mil habitantes a terem plano diretor. O texto constitu'onal não menciona expressamente que esse plano tenha que conter o °neamento da cidade, mas implicitamente pode admitir que o oneamento está contido na "ordenação da cidade" (art. 182, § 2Ü), que (arf6 VlSar ° "Peno desenvolvimento das funções sociais da cidade" da hcaPut}- Inventariar e diagnosticar qual a vocação ecológica qua' l erentes areas ou espaços de uma cidade, quais os seus usos e dir-Pf aS mitaÇões ao uso desses espaços será o mínimo que um plano etor deverá conter. eantento ambiental, direito adquirido, revogação e anulação d°> o a!l0rma constitucional que a "lei não prejudicará o direito adquiri-0 jurídico perfeito e a coisa julgada". .. , ,........ - 184 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Visualizar situações concretas acerca da ocorrência dessa garantia constitucional é importante para que não se turve o quadro jurídico, com prejuízo seja para o indivíduo seja para a sociedade. No exercício das atividades industriais, comerciais e agrícolas há empreendimentos que necessitam do prévio controle do Poder Público. Essa intervenção pode ocorrer sob forma de autorizações, de permissões e de licenças de instalação, de construção, de funcionamento e de ampliação. No momento da instalação de uma atividade, o Poder Público irá aplicar os ordenamentos legais existentes, ou constantes de um plano, para deferir ou não a instalação. Poderá ocorrer que a área onde se vai localizar o empreendimento seja do próprio Poder Público ou do particular. O consentimento para a instalação não é jungido à imutabilidade das condições de funcionamento. Contudo, o advento da lei ou ato administrativo novo que determine a mudança de localização deve ser examinado frente a possibilidade da existência do direito adquirido do proprietário de ali permanecer. Suponhamos que ao se instalar em um local, nada houvesse de impeditivo para o funcionamento de determinada atividade. Após a instalação, modificam-se as regras jurídicas de funcionamento. Temos que distinguir as situações de instalação e de funcionamento. Sistemas de funcionamento, tipos de aparelhos, que dizem de perto às condições de salubridade, higiene e segurança são mutáveis e não entram na situação de direitos adquiridos. As novas normas "não são retroativas, mas também incidem desde logo: as leis que exigem autorização administrativa para certo fato ou ato, bem como as que a dispensam, ou a modificam; as leis de Direito Público relativas à propriedade e ao seu exercício (construções perigosas, higiene, medidas necessárias à defesa nacional, servidões públicas); as leis concernentes ao exercício das profissões ...'V9 Acrescenta o respeitado jurista: "A cada passo se diz que as normas de Direito Público - administrativo, processual e de organização judiciária - são retroativas e contra elas não se podem invocar direitos adquiridos. Ora, o que em verdade acontece é que tais normas, nos casos examinados, não precisam retroagir, nem ofender direitos adquiridos para que incidam desde logo. O efeito que se lhes reconhece é normal, o efeito do presente, o efeito imediato, pronto, inconfundível com o efeito no passado, o efeito retroativo que é anormal".2'1 19. Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1946, 4a ed., p. 407. 20. Ob. cit., p. 405. ZONEAMENTO AMBIENTAL 185 jsluma zona industrial que viesse a ser transformada em zona resi-ncial, poder-se-ia obrigar as indústrias a limitações em suas ativida-i s? Temos que constatar se as indústrias estavam ou não obedecendo . normas de emissão e demais exigências das autoridades competen-a s No caso em que a indústria estivesse cumprindo exatamente as normas legais e regulamentares, nenhuma sanção se lhe poderia impor. Daí, ortanto, inexistindo situação ilegal e não tendo havido vício na concessão da licença, não seria caso de qualquer anulação. Entendendo, contudo o Poder Público que não mais conviria a presença da indústria, questiona-se sobre a possibilidade de o Poder Público revogar o ato administrativo que consentiu na instalação, na zona referida: parece-nos possível a revogação, desde que o Poder Público desaproprie a indústria.21 Raciocinando sobre o mesmo fato analisado, suponha-se que o Poder Público não pretenda nem a mudança nem o fechamento da indústria, mas edite novas normas para seu funcionamento e a indústria não se adapte às novas exigências. Nesse caso, a indústria passa a agir ilicitamente e passível, portanto, de sanções. Daí, terá o Poder Público a possibilidade não de revogar, mas de anular o ato administrativo anterior. Assim agindo, o Poder Público não terá que pagar qualquer indenização. Os administrativistas pátrios não divergem no sentido de afirmar que nada existe a ressarcir diante da anulação. "O uso irregular não pode ser fonte de direito e não configura direito adquirido".22 Não há direito adquirido de poluir.23 Na França, acentua Jean La-marque: "O Direito Administrativo francês do Meio Ambiente consagra um princípio extremamente importante: uma autorização administrativa, como uma permissão de construir ou um ato de autorização de abertura de um estabelecimento classificado, é sempre outorgado sob reserva dos direitos de terceiros. Esta última autorização, em particular, não c"a um "direito adquirido de poluir".24 P Prof. José Afonso da Silva assinala, com brilhantismo: Os demais usos, salvo o institucional que se sujeita a regime pecur> dependem de licença de localização e funcionamento, que é renoel Periodicamente, geralmente por um ano, mas pode ser por dois ou nQais em certos casos. Essa licença é um instrumento de controle, fundado amado poder de polícia, de tal sorte que sempre fica a questão de p. 435 mesmo sentido, Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, cit., - RT 516/59, 1978, e 526/84, 1979. N • Nosso artigo "Urbanismo e poluição", KT 469/35, 1974. o artigo Urbanismo e poluição, KT 469/35, 1974. ux d a?P"n trancais, Droit Public, La Proíection du Voisinage el I 'Environnement, e ' Association HenriCapitan, p. 402. 186 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO saber se existe o direito subjetivo ao uso em determinada zona, se há o direito subjetivo à continuidade e permanência da atividade nessa zona e, conseqüentemente, se ocorre em favor de seu titular o direito de renovação da licença. Pode-se, a esse propósito, afirmar, cremos, que direito a essa renovação, sempre, não há de aferir-se, porque, se não, não teria sentido a exigência de licença de tempo em tempo. Se se trata de uma exigência regular, legal, legítima, então o interessado somente poderá ter o direito à sua renovação quando o uso esteja conforme às determinações legais para o local, ou, então, quando, estando desconforme, por superveniência de lei modificadora do zoneamento, seja tolerado por força de dispositivo seu expresso. Fora daí se admite apenas que o titular do uso, que ficou desconforme, terá o direito adquirido de permanecer no seu exercício enquanto perdurar a vigência da licença de localização e funcionamento que, como dissemos, é periódica. Mesmo assim é discutível que lhe caiba esse direito, ainda nesses limites estreitos, pois tal licença não parece absolutamente vinculante ao Poder Público, a ponto de ficar ele vedado de sua cassação, sobrevindo alterações nos pressupostos que autorizam sua outorga. Assim, se sobrevier lei nova que torne proibido, na zona, o uso licenciado, o seu titular não tem o direito adquirido à sua continuidade, mas terá direito subjetivo à renovação da licença se os pressupostos de sua outorga persistirem existindo, sobrevindo, ou não, lei nova. "Em havendo, pois, modificação do zoneamento, milita presunção iuris et de iure (porque não comporta discussão do mérito, nem na via judicial nem na administrativa, para afastar a presunção) de que tal mudança se fizera em atendimento ao interesse coletivo, e é, sem sombra de dúvida, correta a tese de que não se verifica direito adquirido (que é de natureza individual, particular) em prejuízo do interesse coletivo, público. Se, portanto, não houver, na lei superveniente, ressalva de direito ao uso não conforme, que passa a ser tolerado, nos termos já vistos, ao Poder Público municipal cabe a faculdade, se não o dever, de impor a cessação do uso incompatível com o novo zoneamento. Leve-se em conta, para assim se conceber, que não se está tolhendo ao particular o exercício do direito de livre iniciativa, mas restringindo-a no interesse público, pois não se lhe está impedindo, em absoluto, o exercício do üs° implantado, que poderá continuar noutra zona, onde se conforme às regras do novo zoneamento. Como já vimos, o uso é, por natureza, deslo' cável; por conseguinte, seu titular poderá implantá-lo noutro lugar, tal' vez até com maiores vantagens e melhores condições de desenvoW1' mento".25 , , .. 25. Direito Urbanístico Brasileiro, pp. 268 e 269. •-.; ZONEAMENTO AMBIENTAL 187 Afirma o Prof. espanhol T. R. Fernandez Rodriguez que "as licen-de trato sucessivo cujo objetivo é disciplinar uma determinada ativi- de para o futuro (caso das licenças de abertura e funcionamento) são toreadas com um condicionamento implícito consistente em sua su-h rdinação permanente ao interesse público, cuja reaparição, no muda-as circunstâncias iniciais, exige a cessação da atividade como ga-antia do interesse geral". Mais adiante acrescenta: "o legislador não ode tolerar com igual tranqüilidade que continuem congeladas as situações prejudiciais para a saúde e para a convivência citadina por simples respeito aos direitos adquiridos, entre os quais, não pode figurar, em nenhum caso, como é bem evidente, o de prejudicar seriamente a saúde pública em geral, ou a saúde e o patrimônio individual dos vizinhos e dos cidadãos em geral. Ninguém, insisto, tem ou pode adquirir legitimamente o direito de produzir danos a outros ou o de criar situações permanentes de risco para terceiros".26 "O regime de tranqüilidade pública enfrenta o conceito de direitos pessoais, que são projeções de outros direitos, como o de propriedade, e de indústria e comércio, causados por uma atividade, que, se em princípio é lícita, em seu exercício pode ser perturbadora da tranqüilidade, se ruidosa ou incômoda. A tranqüilidade pública tem valor superior à atividade pessoal, que se realiza no interesse individual ou no interesse de grupo de pessoas" - arremata o Prof. argentino Rafael Bielsa.27 Com acerto, acentuava San Tiago Dantas: "No terreno de eqüidade a doutrina em exame (pré-ocupação) se revela monstruosa. Por não ter vizinhança, uma fábrica pode justamente se descuidar de reduzir os incômodos decorrentes de seu funcionamento; seria inadmissível que com isso ela conquistasse o direito de impor aos vizinhos eventuais a s'tuação criada".28 • Zoneamento ambiental e direito de propriedade '' „ est Ki C*'re*t0 de propriedade assegurado pela Constituição brasileira e 170 C Uma relacao da propriedade com a sociedade (arts. 5a, XXIII, Sjm ,' W e VI, ambos da CF/88). A propriedade não fica constando se v esrnente como um direito e uma garantia individual. Dessa forma, qUe ?"* clareza que inexiste juridicamente apoio para a propriedade aa sociedade, que fira os direitos dos outros cidadãos. 27Ob- pit-, pp. 196 e 201. ; ' ',',' ;-v/il-, 28 cf Jurídico de Policia, p. 98. "nflnos de Vizinhança e sua Composição, 2a ed., p. 131. . .. . .,,. 188 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O zoneamento ambiental é um dos aspectos do poder de polícja administrativa,29 que atua com a finalidade de garantir a salubridade, a tranqüilidade, a paz, a saúde, o bem-estar do povo. O zoneamento ao discriminar usos, representa uma limitação do direito dos cidadãos. y propriedade não poderá ser utilizada da maneira desejada unicamente pelo proprietário. A Constituição Federal de 1967 (EC 1/69) dava um exemplo concreto de zoneamento ambiental ao determinar que "a lei regulará, mediante prévio levantamento ecológico, o aproveitamento agrícola de terras sujeitas a intempéries e calamidades. O mau uso da terra impedirá o proprietário de receber incentivos e auxílios do Governo". Vê-se, portanto, que a conservação das terras não diz respeito somente à vontade do proprietário. A Constituição, inclusive, dá, ao Poder Público, o inegável direito de classificar o bom uso da propriedade e o seu mau uso. A CF, nos arts. 182, § 22, e 186, não esperou a lei ordinária, mas ela mesma previu o preenchimento, ou não, da função social da propriedade. A Lei 6.225, de 14.7.1975, dispôs sobre a discriminação, pelo Ministério da Agricultura, de regiões para a execução obrigatória de planos de proteção do solo e de combate à erosão. A lei deu o prazo de seis meses a serem iniciados efetivamente os trabalhos e de dois anos para a conclusão, contados da data em que a medida for obrigatória, no caso dos proprietários rurais que explorem diretamente a propriedade. No caso dos arrendatários de terras o prazo de conclusão será de um ano. 0 Decreto 77.775, de 8.7.1976, regulamentou a mencionada lei. Os prazos referidos passaram a ser contados da data em que a discriminação de terras for estabelecida pelo Ministério da Agricultura. O pedido de financiamento onde for exigida a execução de planos de proteção ao solo e de combate à erosão somente será concedido se for acompanhado de certificado de engenheiro agrônomo que declare o andamento dos trabalhos, quando se tratar de terras já cultivadas ou a execução de tais trabalhos, no caso de terras inexploradas. A lei e o regulamento deixaram de prever quais as normas indica' doras da discriminação de terras para serem executados trabalhos <Je proteção do solo e de combate à erosão. Previu, somente, a colheita das indicações dos pareceres dos órgãos estaduais. Poderá ocorrer, entretanto, hipótese inversa das mencionadas, e que o Poder Público, dizendo-se fundamentado no interesse da saiio ambiental, pretenda atingir primacialmente a propriedade, seja nega do-lhe a possibilidade de ser utilizada, seja modificando constanterns i I 29. «7517/129, 1978. ZONEAMENTO AMBIENTAL 189 condições de sua utilização, de forma a tomar inviável o sucesso t£ Vvidade econômica desenvolvida. Parece-nos que assiste direito ao . r público de limitar o uso da propriedade (por exemplo: obrigar a * ° ervar árvores num determinado trecho da propriedade, determinar C° lantio dessa ou daquela essência florestal, de impedir determinados cultivos). O Código Florestal30 considera expressamente uso nocivo da pro-iedade as ações ou omissões na utilização e exploração das florestas ue contrariem o próprio Código. Essa limitação não se confunde, contudo com inutilização da propriedade privada ou com sua transformação èm propriedade pública. Tornando-se a propriedade privada de todo imprestável para ser utilizada, surge o direito do particular a ser indenizado pelo Poder Público. Cabe ao Poder Público mostrar a exeqüibilidade tecnológica das medidas que propõe para o controle da poluição. Será uma atividade caprichosa e arbitrária da Administração se, também, sem fundamento científico plausível, a todo instante, mudar as normas de emissão ou outras exigências, acarretando contínuas e imprevisíveis mudanças financeiras na vida de uma empresa. Saliente-se a prudência da legislação inglesa que estabelece um mínimo temporal para a validade da vigência das medidas antipoluentes (art. 38, § Ia, da Lei de Controle da Poluição, de 1974, com as exceções do § 32). A jurisprudência norte-americana não considera desvio de poder no emprego das restrições de zoneamento, quando resulte claro que as medidas estão sendo tomadas para promoção da saúde, da segurança ou da moral da comunidade.31 ../Ti "... fgensmeyer, Florida Land Use Restrictions, cil, p. 15. " :;i' '" á Ti . A !> ,• u v Capítulo ZONEAMENTO INDUSTRIAL NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO 1. Introdução , A lei que dispõe sobre as diretrizes básicas para zoneamento industrial foi discutida e votada em regime de urgência, em sessão conjunta do Congresso Nacional. No dia 12 de maio de 1980 o Presidente da República enviava a Mensagem 50/80, com Exposição de Motivos assinada pelo Ministro do Interior e pelo Ministro-Chefe da Secretaria do Planejamento, tendo o projeto de lei tomado o n. 7/80. Já no dia 2 de julho de 1980 a lei era sancionada sob o n. 6.803 e publicada no DOU de 3.7.1980. Antes de analisarmos a tramitação do projeto e o surgimento da emenda substitutiva, deve-se salientar que é a primeira lei importante em matéria ambiental. Isto é, representa a primeira vez que o Congresso Nacional foi chamado a opinar, a formular seus pontos de vista e a votar em problema ambiental. Até então tivemos a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente pelo Decreto 73.030/73. Após, surgiram o Decreto-lei 1.413/75 e o Decreto 76.389/75. Dessa forma se constata que é a primeira manifestação conjunta Executivo e Legislativo federais no campo ambiental. O interesse pela preservação do meio ambiente começava a encontrar ressonância nos setores da Administração Pública e do Congresso. Coloque-se em relevo que na lei sobre parcelamento do solo urbano (Lei 6.766/79) partiu do Congresso Nacional a iniciativa de se exigir como um dos requisitos fundamentais que a parcela a ser loteada ou desmembrada não se situe em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção. O projeto de lei sobre zoneamento industrial, antes de ser votado em plenário, foi objeto de exame por uma comissão mista do Congresso Nacional. Ao projeto governamental foram apresentadas 17 emendas, ONEAMENTO INDUSTRIAL NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO 191 uais 8 propunham a introdução do Estudo de Impacto, tendo a osta partido da Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente, tí ve o acolhimento em parte da proposição da sociedade referida e a vação de outra emenda prescrevendo fossem os esquemas de eamento urbano aprovados por lei, sendo de autoria do Dep. Antônio Russo. 2 Proposta da Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente: ' Estudo de Impacto Essa Sociedade, com sede em Piracicaba, agiu conjuntamente com a Universidade Metodista de Piracicaba. Foram as únicas entidades a se manifestarem perante o Congresso Nacional. A emenda aditiva proposta era do seguinte teor: "Para a criação de zonas de uso industrial, de uso diversificado e de reserva ambiental e para a implantação de indústrias situadas fora dos limites fixados para as zonas de uso industrial serão realizados Estudos de Impacto. "Parágrafo único. O Estudo de Impacto compreenderá um relatório detalhado sobre o estado inicial do lugar e de seu meio ambiente; as razões que motivaram a sua escolha; as modificações que o projeto acarretará, inclusive os comprometimentos irreversíveis dos recursos naturais; as medidas propostas para suprimir, reduzir e, se possível, compensar as conseqüências prejudiciais para o meio ambiente; o relacionamento entre os usos locais e regionais, a curto prazo, do meio ambiente e a manutenção e a melhoria da produtividade, a longo prazo; as alternativas propostas. O Estudo de Impacto será acessível ao público, sem quaisquer ônus para a consulta pelos interessados." A Lei de Zoneamento Industrial acolheu parcialmente o Estudo de impacto em seu art. 10, §§ 22 3a: § 2U. Caberá exclusivamente a União, ouvidos os governos esta-Ual e municipal interessados, aprovar a delimitação e autorizar a im-antaÇão de zonas de uso estritamente industrial que se destinem à locação de pólos petroquímicos, cloroquímicos, carboquímicos, bem instalações nucleares e outras definidas em lei. § 3a. Além dos estudos normalmente exigíveis para o estabeleci-n o de zoneamento urbano, a aprovação das zonas a que se refere o cje ara° anterior será precedida de estudos especiais de alternativas e sol laÇão de impacto, que permitam estabelecer a confiabilidade da lu?ao a ser adotada." 192 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO : A matéria será comentada em outro tópico do estudo.1 > 3. Campo de incidência das disposições legais As zonas destinadas à instalação de indústrias nas áreas críticas de poluição devem seguir os novos preceitos legais. Essas áreas foram mencionadas no art. 4Ü do Decreto-lei 1.413/75 e para elas foi prevista a obrigatoriedade de "esquema de zoneamento urbano". Contudo, somente o Decreto 76.389/75 estabeleceu as áreas críticas de poluição a saber: as regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, região de Cubatão e de Volta Redonda, bacias hidrográficas do médio e baixo Tietê, do Paraíba do Sul, do rio Jacuí e estuário do Guaíba, todas as bacias hidrográficas de Pernambuco e região Sul do Estado de Santa Catarina. Deveria ter sido aproveitada a edição da nova lei para se preverem normas para outras áreas que não as em estado crítico de poluição. Tentar reparar os males da poluição será muito menos eficaz do que procurar preveni-los nas áreas ainda não intensamente poluídas e para isso a legislação ainda não forneceu válidos instrumentos. 4. Esquema de zoneamento urbano e sua criação por lei As zonas destinadas à instalação de indústrias serão definidas em esquema de zoneamento urbano aprovado por lei (art. lü). A estruturação do zoneamento será fruto da decisão do Poder Executivo e do Legislativo. O art. 11 explicita a idéia ao dizer que compete aos Municípios: "I - instituir esquema de zoneamento urbano, sem prejuízo do disposto nesta Lei". "Zonear" vai significar, em parte, indicar onde se vão localizar as indústrias. Competirá ao Município dizer o local das indústrias e das zonas de reserva ambiental. Contudo, a lei fala em esquema de zoneamento. Localizar as indústrias não eqüivale a criar zonas industriais, porque a lei reservou aos governos estaduais aprovar a delimitação> a classificação e a implantação de zonas estrita e predominantemente m' dustriais. Institui-se, assim, o poder de tutela estadual ou federal sobre a ação municipal de zoneamento industrial. Não será admissível a intervenção direta da União ou dos Estaü°s para fazer o esquema de zoneamento urbano. Entretanto, a lei reservo 1. V. Cap. IV, seguinte. oneamento industrial nas áreas críticas de poluição 193 ssibilidade de ação indireta dos Estados para todos os tipos de zondustriais, pois de nada valerá o Município indicar o local, se não " ver a aprovação da delimitação em fase posterior. Admissível é um planejamento global da realidade ambiental dos V tados pelos seus próprios governos. O que não se pode acolher em f ce da nova lei e da Constituição Federal é o monopólio dos organisestaduais para fiscalizar o cumprimento dos padrões e normas de roteção ambiental como se poderá entender do disposto no art. 10, III, da Lei 6.803/80. O art. 11, II, atribuiu também competência para os Municípios baixarem normas locais de combate à poluição e controle ambiental. >• »<?>- *> >' 5. O Município e as regiões metropolitanas '' ' ' Questão a ser enfrentada é saber se nas regiões metropolitanas o Município perde a competência para baixar normas locais de combate à poluição e controle ambiental. A Lei Complementar 14/73 estabeleceu a competência do Conselho Deliberativo de promover a elaboração do plano de desenvolvimento integrado da região metropolitana e a programação dos serviços comuns (art. 3Ü, I). É classificado como de interesse metropolitano o controle da poluição ambiental, na forma do que dispuser a lei federal (art. 5a, VI). Como se vê na composição do Conselho Deliberativo da região metropolitana - composto de cinco membros - os governos dos Estados têm a maioria do colegiado, pois nomearão livremente três membros, sendo o quarto indicado pelo prefeito da Capital e o quinto pelos demais integrantes da região metropolitana. Salientou Eros Roberto Grau que "o zoneamento industrial, ex-Pressão do controle de uso do solo metropolitano, na vigência da EC 1/ continua, ainda, a ser matéria de competência municipal".2 O referijunsta comentando a competência das regiões metropolitanas acerca a Controle da poluição ambiental "justifica a exigência de lei federal rifeis ara a terminação de normas de aproveitamento de recursos se v °f-' V'St° ue' com re'aÇã° ao controle da poluição ambiental não ca a reserva de competência privativa".3 gS n'Cl'pi°s não perdem sua faixa de iniciativa para os organis-estores das regiões metropolitanas: concorrentemente poderão 3 e g_loes metropolitanas - Uma necessária revisão de concepção", RT 521/33. egtoe.s metropolitanas Regime Jurídico, José Bushatsky Editor, pp. 179 e 180. 194 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO baixar normas ambientais e fiscalizar o seu cumprimento (no que está inserido o poder de sancionar administrativamente os infratores). Ha_ vendo, contudo, prescrição ambiental editada pela região metropolita. na, com ela não poderá colidir a norma municipal. Aprovar a delimitação, classificação e implantação das zonas estritamente e predominantemente industriais passou a ser competência dos conselhos deliberativos das regiões metropolitanas e não, portanto, das Secretarias de Negócios Metropolitanos que tivessem anteriormente essa incumbência (art. 10 § Ia, da Lei 6.803/80). Esse o sentido do art. 25, § 3% da CF/88. i 6. Os Estados e o zoneamento industrial a Foram catalogados diversos tipos de intervenção dos Estados coni referência aos diversos tipos de zonas. A lei não foi feliz e o dispositivo se ressente de duvidosa constitucio-nalidade ao afirmar em seu art. 10 (caput): "caberá aos governos estaduais", isto porque privilegia um dos poderes do Estado - o Executivo estadual - para intervir com exclusividade. Ora, a matéria foi tratada no âmbito federal, com o advento da Lei 6.803/80, pelos Poderes Executivo e Legislativo; também, na esfera estadual deveria sê-lo. A definição dos padrões de emissão, por exemplo, merece ser deixada para os órgãos técnicos, mas não se pode impedir que o Legislativo intervenha validamente na fixação dos objetivos de qualidade e definição dos tipos de estabelecimentos industriais que poderão ser implantados em cada uma das zonas industriais, como se reservou aos governos estaduais fazer (art. 10, II). A criação de zonas de uso diversificado não dependerá de prévia aprovação dos Estados, pois esta tarefa só lhes ficou reservada com referência a zonas de uso estritamente e predominantemente industrial (art. 10,1) e zonas de reserva ambiental. Foram dadas aos governos estaduais as incumbências de "instalar e manter, nas zonas estrita e predominantemente industriais e nas zonas de uso diversificado, serviços permanentes de segurança e prevenção de acidentes danosos ao meio ambiente" (art. 10, III). Muitas vezes não será suficiente o governo do Estado determinar a redução da atividade poluidora, pois será necessária a sua suspensão, ainda que temporária. A incumbência dos Estados em instalar e manter serviços de segU' rança e prevenção de acidentes prejudiciais ao meio ambiente se reveste de duas características marcantes: são serviços permanentes e não tenr porários e não se retira, com justeza, o direito de os Estados cobrarem 7ONEAMENTO INDUSTRIAL NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO 195 ou preços públicos das indústrias, pelos serviços prestados nas industriais. Aos Estados foi dada a incumbência de "administrar as zonas in-striais de sua responsabilidade direta ou quando esta responsabilida-, correr de convênios com a União". Não restou bem esclarecida is serão as zonas de responsabilidade direta dos Estados, pois a lei ão as apontou. Além disso, não se previu no novo diploma legal a maneira como os Estados chegariam a assumir esse tipo de administração ou se desapropriariam áreas para implantar tais zonas. A participação societária dos Estados em indústrias, através de empresas públicas ou de sociedades de economia mista e a presença exclusiva desse tipo de indústrias em determinadas zonas poderia ensejar essa forma de administração. Contudo, a administração de zonas industriais pelos Estados não pode significar a possibilidade de se criarem áreas imunes à obediência das leis municipais. 7. A União e a implantação de zonas industriais ' A criação de zona estritamente industrial com objetivo de localizar pólos petroquímicos, cloroquímicos, carboquímicos e instalações nucleares dependerá de prévia aprovação da União. O § 2a do art. 10 inicia dizendo: "Caberá exclusivamente à União, ouvidos os governos estadual e municipal interessados, aprovar a delimitação e autorizar a implantação de zonas ...". Parece-me que o parágrafo tem uma expressão em excesso e que poderá conduzir a equívocos: a ouvida prévia do governo municipal. Esse dispositivo da Lei 6.803 parece querer introduzir uma mera consulta ao Município, isto é, a tomada de um parecer prévio que não vincula a União. Assim, o Município poderá opinar contra e a União ecidir a favor. Contudo, da mesma forma a que já me referi no concernente ao licenciamento pelos Estados, também aqui não poderá er a União quem na linha decisória profira a última decisão. A pessoa direito Público interno que há de dizer a última palavra sobre a imtação e delimitação dos locais para a instalação dos pólos petro4 micos, cloroquímicos, carboquímicos e instalações nucleares será o 'cípio. Se a União tiver desaprovado o projeto, o Município não erá aprovar. Contudo, se a União tiver aprovado, o Município conva o direito de desaprovar. Fora desse raciocínio jurídico será banir tr rVX~° a Constituição Federal mandamento constitucional com uma 'Ção de quase quinhentos anos de brasilidade - o municipalismo e bUa autonomia. ,. ,„...... . , ., 196 >:!• UDIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO '-' »'/ ;-8. Critérios para estabelecer os padrões ambientais Nos padrões ambientais, temos que distinguir os padrões de emissão e os padrões de qualidade do meio ambiente. Os padrões de emissão vão fornecer os valores máximos de lançamento de poluentes per-mi tidos. Os padrões de qualidade vão indicar as condições de normalidade da água, do ar e do solo. A lei valoriza a sema (Secretaria Especial do Meio Ambiente),4 dando-lhe a tarefa de fixar normas e padrões ambientais (art. 9Ü). Os organismos estaduais e municipais têm a possibilidade também de estabelecer disposições ambientais, desde que não impliquem a derrogação do preceituado pela sema. Essas normas e padrões vão ser fundamentais para licenciar os estabelecimentos industriais como para a classificação dos níveis de saturação (arts. 5a e 62). A lei não dá parâmetros concretos de emissão ou de qualidade. Agiu acertadamente. É tarefa que deve ser reservada para os órgãos técnicos, o que lhes possibilita maior profundidade e exatidão científica na fixação dos índices. Considerando-se a constante modificação do conhecimento humano, seria muito rígida a previsão desses padrões por lei, pois dificultaria uma rápida reformulação. Coloque-se em relevo, contudo, que o estabelecimento dos padrões de emissão e de qualidade ambiental não deve ser fruto de resoluções de um grupo fechado de tecnocratas, estabelecendo-se a ambientocracia ou a ecocracia. Sugere-se, portanto, a formação na sema,5 nos organismos estaduais e municipais, de comissão composta por pessoas de notória e irrefutável idoneidade moral e científica, representando instituições culturais e de pesquisa e associações ambientais representativas, para o fim de opinar na elaboração de normas e padrões ambientais. A sema, ao fixar as normas e padrões ambientais, haverá de ter presente as regras existentes nos organismos internacionais e levará em conta a diversidade das regiões brasileiras (art. 32 do Decreto federal 76.389/75), evitando provocar danosa competição econômica entre pai' ses e regiões. A lei fornece algumas características dos processos de produça0 que devem ser analisados para a fixação dos parâmetros ambientais-emissão de gases, vapores, ruídos, vibrações e radiações; riscos de s* plosão, incêndios, vazamentos danosos e outras situações de emergen cia; volume e qualidade de insumos básicos, de pessoal e de tráfcg 4. V. Tít. III, Cap. II, item 4, "O meio ambiente na Administração Federal"5. V. Tít. III, Cap. II, item 4, "O meio ambiente na Administração Federal"I 70NEAMENTO INDUSTRIAL NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO 197 ados; os padrões de uso e ocupação do solo; a disponibilidade nas £e, de energia elétrica, águas, esgoto, comunicações e horários de atividade. ç As zonas instituídas pela lei o 1A implantação da zona e a vigência da lei As zonas destinadas à instalação são classificadas em: zona de uso estritamente industrial, zona de uso predominantemente industrial e zona de uso diversificado. Na zona de reserva ambiental será vedada a localização de estabelecimentos industriais. Reveste-se de importância jurídica a existência de claros requisitos para a instituição de zonas industriais nas áreas críticas de poluição porque, caso inexistam as zonas, não poderão ser criadas. É o caso de se inquirir: a lei condicionou os novos licenciamentos de indústrias à implantação do zoneamento? A resposta não vem mencionada com clareza na lei. Confrontem-se os arts. 8a e 10, § 42. Diz o art. 8Ü: "A implantação de indústrias que, por suas características, devam ter instalações próximas às fontes de matérias-primas situadas fora dos limites fixados para as zonas de uso industrial obedecerá a critérios a serem estabelecidos pelos governos estaduais, observadas as normas contidas nesta Lei e demais dispositivos legais pertinentes". No § 4- do art. 10 consta: "Em casos excepcionais, em que se caracterize o interesse público, o Poder estadual, mediante a exigência de condições convenientes de controle, e ouvidos a sema,6 o Conselho Deliberativo da Região Metropolitana e, quando for o caso, o Município, poderá autorizar a instalação de unida-es industriais fora das zonas de que trata o § l2 do art. l2 desta Lei". roram estabelecidos dois tipos de exceção: as indústrias que por s características devem ter suas instalações próximas às fontes de lar-f ~Pr'ma e indústrias que por interesse público pretendem insta-ção d °Ta aS zonas industriais. A regra geral, portanto, é a implanta-as indústrias nas zonas industriais. e nem Ue nao ficou expresso na lei foi o prazo para a criação das zonas estava alrmou °iue a partir da vigência da lei as zonas industriais tente n Cnaas- A ei federal deixou para a esfera municipal, compecaso' instituir o esquema de zoneamento urbano. Resta esperar 6.V I -p "!. Cap. n, item 4, "O meio ambiente na Administração Federal". 198 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO a rapidez dos Estados e dos Municípios diretamente interessados para que a lei não caia no vazio e fique inaplicada, gerando a descrença nas soluções legais concernentes ao meio ambiente. Quanto às exceções para a aprovação das indústrias fora das zonas industriais acresce notar que são atos administrativos vinculados, isto é, exigem a comprovação do motivo. Não estão na faixa dos atos discricionários. Se a Administração não comprovar que a indústria tenha uma reconhecida característica que a obrigue a ficar próxima da fonte de matéria-prima e que essa fonte de matéria-prima inexista na zona industrial ou próximo a ela, o ato será ilegal e poderá ser anulado judicialmente ou pela própria Administração. Não se poderá, também, invocar um inominado interesse público para se autorizar a instalação de indústrias fora da zona industrial. Este interesse público deverá ser indicado com clareza induvidosa. Dessa forma, evitar-se-á que a exceção se converta em regra. .1 .- I 9.2 Características das zonas industriais 9.2.1 Zona de uso estritamente industrial O art. 2e define as zonas de uso industrial como aquelas destinadas preferencialmente à localização de estabelecimentos industriais cujos resíduos sólidos, líquidos e gasosos, ruídos, vibrações, emanações e radiações possam causar perigo à saúde, ao bem-estar, e à segurança das populações, mesmo depois da aplicação de métodos adequados ao controle e tratamento de efluentes, nos termos da legislação vigente. Não se cria uma zona industrial onde a poluição seja liberada. Essa zona tem como suporte a existência de prejuízos concretos ou potenciais para o bem-estar, a saúde e a segurança da população. Se mesmo com o tratamento os danos continuam, então deve ser implantada a zona de uso estritamente industrial. A lei não comporta dúvida quando afif' ma "mesmo depois da aplicação de métodos adequados de controle e tratamento de efluentes". Insiste-se: não é qualquer tratamento, mas o tratamento adequado. Não se conquista, portanto, na zona de uso estritamente industrial, um direito de poluir para o futuro. Como procure' mostrar no artigo "Urbanismo e poluição - aspectos jurídicos", já cita' do, com referência a situações do passado e do presente, não se pod6 admitir um direito adquirido de poluir. Mesmo na zona estritamente industrial haverá a obrigação de constante adaptação a novos método de combate à poluição. Não se adquirem direitos de permanecer num situação agressora à saúde da população, da fauna e da flora. Não se oneamento industrial nas áreas críticas de poluição 199 . pôr à margem a consideração do ataque dos poluentes na própria P° g uso estritamente industrial sobre as pessoas que trabalham no seu interior. Para a escolha do local na implantação dessa categoria de zona, a nreviu pressupostos indispensáveis: escolha de áreas que apresenelevada capacidade de assimilação de efluentes e proteção ambiental, nção por áreas que favoreçam a instalação de infra-estrutura e serviços básicos necessários ao seu funcionamento e segurança; manutenção, em seu contorno, de anéis verdes capazes de proteger as zonas circun-vizinhas contra possíveis efeitos residuais e acidentes. Será tarefa dos regulamentos estabelecer o detalhamento dos requisitos. A ocorrência ou não dessas características será objeto dos estudos preliminares "normalmente exigíveis para o estabelecimento de zoneamento urbano" (art. 10, § 3a). Além das indústrias, somente poderão operar na zona de uso estritamente industrial "atividades essenciais às suas funções básicas ou atividades que não sofram ou venham a sofrer os efeitos danosos do seu funcionamento". Assim, por exemplo, não poderão existir escolas e áreas residenciais nesse tipo de zona. Questão de interesse jurídico é a responsabilidade pela reparação do dano nessa zona industrial. Havendo ação judicial, em primeiro lugar deverá ser responsabilizado o Poder Público que autorizou a instalação inadequada de atividades não essenciais ou que estão sofrendo os efeitos prejudiciais da poluição. •2-2 Zona de uso predominantemente industrial >. ,, As zonas de uso predominantemente industrial destinam-se prefencialmente à instalação de indústrias cujos processos, submetidos a e odos adequados de controle e tratamento de efluentes, não causam cômodos sensíveis às demais atividades urbanas e nem perturbam o ePouso das populações (art. 3a). to CSta zona> ainda, serão registrados efeitos da poluição. Entretan-fest SS os nao poderão causar "incômodos" apreciáveis ou mani-m as outras atividades urbanas. O repouso noturno da população reeu especial referência. z°na d Ver° ser constatados nos estudos prévios para a implantação da da de " Uso.Ped°minantemente industrial a existência na área escolhi-ra de se °n ÇÕes 9ue favoreçam a instalação adequada de infraestrutu-Psibiiví108 kás'cos necessários a seu funcionamento e segurança e a te?ão arnh dC mstituiÇã°, dentro da zona industrial, de áreas de pro-lental que minimizem os efeitos da poluição". 200 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Ressalte-se que tanto "anéis verdes" como áreas verdes pequenas não constituirão filtros e cortinas aptas a impedir a passagem dos poluentes. Se não se destinarem áreas verdes, não só gramados com0 também a preservação das florestas existentes na região, com extensão suficientemente grande para a depuração dos poluentes, o que teremos são álibis para poluir. 9.2.3 Zona de uso diversificado Nas zonas de uso diversificado as atividades industriais não terão necessidade de uso de métodos especiais de controle, pois serão aquelas atividades que compatibilizam com o meio urbano ou rural, não ocasionando qualquer gravame para a saúde, o bem-estar e a segurança das populações. 9.2.4 Zona de reserva ambiental ; As zonas de reserva ambiental serão constituídas por áreas em que, "por suas características culturais, ecológicas, paisagísticas ou pela necessidade de preservação dos mananciais e proteção de áreas especiais ficará vedada a localização de estabelecimentos industriais". A Lei 6.803/ 80 não definiu o que sejam "áreas especiais". Posteriormente, a Lei 6.902, de 27.4.1981, previu a "área de proteção ambiental" com a possibilidade de serem limitadas ou proibidas: a) a implantação e o funcionamento de indústrias potencialmente poluidoras, capazes de afetar mananciais de água; b) a realização de obras de terraplenagem e a abertura de canais, quando essas iniciativas importarem em sensível alteração das condições ecológicas locais; c) o exercício de atividades capazes de provocar uma acelerada erosão das terras e/ou um acentuado assoreamento das coleções hídricas, d) o exercício de atividades que ameaçam extinguir na área protegida as espécies raras da biota regional. | 10. Relocalização de indústrias poluidoras Não podemos deixar de salientar um valioso meio legal para nuir a poluição: a relocalização da atividade industrial. Mais do que penas de multa e ocasionais suspensões e até a difícil interdição, a tran ferência da atividade poluidora possibilitada pelo art. Ia, § 3U, e incen vada pelo direito de "condições especiais de financiamento" (art- parágrafo único) poderá trazer bons resultados. Não se trata de exp°r MENTO INDUSTRIAL NAS ÁREAS CRÍTICAS DE POLUIÇÃO 201 hlerna ou simplesmente mudar o local cujo ambiente será agredi-0 P1. r_se-á em conta a aplicação dos métodos adequados de controle e mento dos efluentes e os níveis de saturação do local onde funciona dústria e do local para onde se indica a sua transferência. "A atividade econômica não sofrerá paralisação e, de outra parte, nto ao aspecto social, não haverá desemprego, ainda que haja necessi-H de de transferência de residência dos empregados e empregadores ou aocomoção dos mesmos até o novo local."7 "v .. d " iV -i! 1 -I > artigo "Controle da poluição e Decreto-lei 1.413/75", RT 525/38. Capítulo ly ESTUDO PRÉVIO $E IMPACTO AMBIENTAL 1. Previsão na Constituição Federal V. Tít. II, Cap, II, "Constituição Federal e meio ambiente", item 8. 2. Previsão nas Constituições Estaduais Interessante apontar algumas Constituições Estaduais de 1989, que foram além do preceituado pela Constituição Federal. A Constituição do Amazonas diz: O Estudo Prévio de Impacto Ambiental - epia "será parte integrante e obrigatória do processo de licenciamento, além de outras exigências de ordem normativa ou legal, nos casos ..." (art. 235, caput); a do Ceará exige o Estudo Prévio de Impacto Ambiental "para licitação, aprovação ou execução de qualquer obra ou atividade pública ou privada potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente e/ou que comporte risco para a vida e a qualidade de vida' (art. 264, caput); a do Pará prevê que "todo e qualquer plano, programa, projeto, atividade ou obra potencialmente causadora de desequilíbr'0 ecológico ou de significativa degradação do meio ambiente exigirá, na forma da lei, epia, e só será autorizada sua implantação, bem como liberado incentivo, financiamento ou aplicação de recursos públicos, apoS aprovação, na forma da legislação aplicável, pelo órgão técnico de controle ambiental do Estado, ouvido o órgão de atuação eolegiada de qae trata o inc. VIII" (art. 255, § P); as Constituições do Rio Grande do Sul e de Rondônia, nos arts. 251, § l2, V, e 219, VI, incluem as alternativaS no conceito do epia; e, finalmente, a do Paraná diz que o epia será exig1' do "para a construção, instalação, reforma, recuperação, ampliaçã0 operação de atividades ou obras potencialmente causadoras de signif'c tiva degradação do meio ambiente, do qual se dará publicidade" (ar' 207, § Ia, V). ..,...,. ...,. ....: ...... . ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 203 P evisão em convenções e declarações internacionais ; 3 / Convenção de Espoo A Convenção sobre Avaliação de Impacto Ambiental Transfron-iriço foi assinada em Espoo (Finlândia), em 25 de fevereiro de 1991.' O acordo foi adotado no âmbito da Comissão das Nações Unidas para a Europa, tendo entrado em vigor em 10 de setembro de 1997. O "Preâmbulo" salienta a importância de serem considerados os fatores ambientais no começo do procedimento decisório e em todos os escalões administrativos. Dessa forma, melhora-se a qualidade das informações fornecidas aos responsáveis, permitindo-lhes tomar decisões racionais do ponto de vista ambiental, limitando-se o quanto possível o impacto prejudicial das atividades pretendidas. A avaliação de impacto sobre o meio ambiente designa um procedimento nacional, tendo por objeto avaliar o impacto provável de uma atividade proposta sobre o meio ambiente (art. Ia, VI). É um ato de soberania de cada país, e não se criou órgão internacional algum para efetuar esse estudo. Os efeitos transfronteiriços constatados e analisados no procedimento de epia serão objeto de negociações bilaterais ou multilaterais. 0 termo "impacto" designa "qualquer efeito de uma atividade proposta sobre o meio ambiente, notadamente sobre a saúde e a segurança, a flora, a fauna, o solo, o ar, a água, o clima, a paisagem e os monumen-°s históricos ou outras construções ou a interação entre estes fatores" lart. Ia, VII). Impacto transfronteiriço designa qualquer impacto, e não . usrvamente um ™Pact0 de caráter mundial, ocorrendo nos limites uma área que depende da jurisdição de um país, sendo esse impacto em C atividade cuja origem física se situe, no todo ou em parte, area pendendo da jurisdição de outro país (art. Ia, VIII). Posi - ConvenÇão de Espoo trata, no art. 2a, em 10 parágrafos, das dis-Se es §erais. Resumindo essas normas, apontamos: os países engajam-ef1Ca mar' lso'ada ou conjuntamente, todas as medidas apropriadas e leiriç0-S Pata Prevemr> reduzir e combater o impacto ambiental transfron-v'sta a' avaaÇao de impacto ambiental deverá ser efetuada tendo em k'ta ant ' ac*es indicadas no Apêndice II, e essa avaliação deverá ser es da autorização administrativa e do começo da atividade pro1•Ao çâ° em ia . onvenÇao foi ratificada por 37 países, mais a Comunidade Européia (posi-üe agosto de 2001). ... ....... ,.. .,; . :. .... ... 204 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO posta; os países obrigam-se a notificar aos países que poderão sofrer as conseqüências das atividades propostas; procedimento de avaliaçg0 ambiental aberto à participação do público tanto do país que o elabora como do público das áreas dos países que poderão sofrer o impacto ambiental; além de avaliar a atividade proposta concretamente, os paf. ses farão esforços no sentido de aplicar os princípios da avaliação de impacto ambiental nas políticas, planos e programas. Consultas ou negociações entre o país ou os países envolvidos devem ser abertas, tendo por base a avaliação de impacto ambiental elaborada, podendo essas negociações tratar: "a) sobre as soluções de substituição possíveis, aí compreendida a opção 'zero', como medidas que poderiam ser tomadas para atenuar o impacto transfronteiriço prejudicial importante e sobre o procedimento que poderia ser seguido para fiscalizar os efeitos dessas medidas às expensas da parte de origem; b) sobre outras formas de assistência mútua possíveis para reduzir qualquer impacto transfronteiriço prejudicial importante da atividade proposta; e c) sobre qualquer outra questão pertinente relativa à atividade proposta" (art. 52). A decisão definitiva do país (art. 6Ü) onde a atividade proposta será exercida deverá levar devidamente em consideração os resultados da avaliação de impacto ambiental, as observações do público (art.3ü, § 8Ü) e as observações resultantes das consultas ou negociações (art. 5a). Constata-se que a Convenção preconiza uma ampla motivação da decisão a ser tomada, inserindo na documentação a ser examinada não só a própria avaliação ambiental, como a consulta feita ao público e as negociações levadas a efeito entre os países. Ainda que o Brasil não faça parte dessa Convenção, ele não poderá ignorá-la nas relações de vizinhança com os países da América do Sul e com os próprios parceiros do mercosul. O Brasil já inseriu a maior parte das disposições da Convenção em suas normas internas e as vem praticando desde a década de 80. A Convenção de Espoo é um sinal para o Brasil continuar o caminho iniciado e atuar para que os países vizinhos caminhem na mesma direção. 3.2 Declaração do Rio de Janeiro/92 A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente eo"e senvolvimento elaborou a Declaração do Rio de Janeiro, que, em se Princípio 17, afirma: "A avaliação de impacto ambiental, como instr mento nacional, deve ser empreendida para as atividades planejadas 9U possam vir a ter impacto negativo considerável sobre o meio ambísn, ' e que dependam de uma decisão de autoridade nacional competente ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 205 Planejamento público - Redação dos atos administrativos f derais e Estudo de Impacto Ambiental i; A CF determina que lei de iniciativa do Poder Executivo estabelecerá lano plurianual, sendo que essa lei formulará "diretrizes, objetivos e ° etãs da Administração Pública federal para despesas de capital e outras deles decorrentes-.-.." (art. 165,1, § l2). O decreto - que antecedeu à rF-den. 95.733, de 12.2.1988, está inserido na letra e no espírito constitucionais e preconizou que "no planejamento de projetos e obras, de médio e grande porte, executados total ou parcialmente com recursos federais, serão considerados os efeitos de caráter ambiental, cultural e social, que esses empreendimentos possam causar ao meio considerado". O decreto federal ampliou, portanto, o campo de abrangência do planejamento ambiental, não deixando o "efeito ambiental" restrito somente aos casos previstos pela Resolução 1/86-conama. Basta que as obras ou os projetos sejam de médio e/ou de grande porte e que haja "recurso federal" empregado para que o caráter ambiental do efeito deva ser considerado. O decreto não explicita que o "efeito ambiental" deverá ser identificado através do epia, mas essa explicitação não é necessária diante da existência dos outros textos legais (Constituição, lei, decreto e resolução mencionados no corpo deste estudo). Importa salientar a inserção da prevenção do dano ambiental como uma rotina no comportamento da máquina administrativa. Diante do texto do decreto federal, não só obras e projetos federais serão obrigados a considerar o "efeito ambiental", mas os projetos e obras estaduais e mumcipais, que tenham recebido ou irão receber verbas federais. i O Decreto 468, de 6.3.1992 (publicado no DOU 9.3.1992, Seção > PP- í.009-3.011), "estabelece regras para a redação de atos normativos oder Executivo e dispõe sobre a tramitação de documentos sujeitos aprovação do Presidente da República". Esse decreto contém dois Pr °a n° nexo H> é previsto que no procedimento encaminhado ao Probl Cnte a Pública devem ser abordados sete itens: 1) síntese do (jgn ma ou da situação que reclama providências; 2) soluções e provi-vas Contidas no ato normativo ou na medida proposta; 3) alternatijustiflcS entes3S mecudas ou atos propostos; 4) custos; 5) razões que ato ou Urgência; 6) impacto sobre o meio ambiente (sempre que o Dessa f edida possa vir a tê-lo); 7) síntese do parecer do órgão jurídico, sidênrrna passa a constar de todo o procedimento que subir até a to ambie RePut>lica a necessidade de informe escrito sobre o impac-Servidor 5''.cluando o ato ou a medida possa vir a ter esse impacto. O hco diante da probabilidade de impacto ambiental - deve 206 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO fazer a informação. O servidor público - inclusive os Ministros de Esta,' dos e Secretários de Estado passam a ser responsáveis pela análise da possibilidade de efeitos ambientais do ato ou medida que proponham A responsabilidade não se circunscreve ao Ministro do Meio Ambiente mas se espraia por toda a Administração federal direta e indireta. se houve a elaboração do epia, este deverá ser juntado, inclusive com a ata e os documentos da Audiência Pública, quando esta tenha sido realizada. Contudo, mesmo nos casos em que o epia não tenha sido elaborado mas que haja possibilidade de impacto ambiental, ainda que não significativo, deve ser feita "avaliação circunstanciada sobre a extensão dos efeitos (positivos e negativos) sobre o meio ambiente". A não-informa-ção, ou a informação falsa, imprecisa ou omissa torna o servidor público responsável, inclusive para os efeitos do crime do art. 15, § 2a, da Lei 6.938/81. O Chefe do Poder Executivo e sua assessoria direta passam a ter o direito de ser totalmente informados da dimensão ambiental dos atos administrativos de sua competência. Sobre a importância da inserção do epia no planejamento disserta-ram Claude Lambrechts e Michel Prieur: "O inconveniente de um estudo sobre um projeto é que freqüentemente não se pode constatar senão uma situação encontrada, sem ser possível proporem-se verdadeiras alternativas. Poder-se-ia discutir o traçado de uma auto-estrada, com a mudança em alguns quilômetros, mas os inconvenientes ecológicos subsistiram, quando teria sido possível em um estudo mais global em nível do planejamento dos transportes, medir mais adequadamente as influências sobre o ambiente de uma rede de auto-estradas em relação ao desenvolvimento das estradas de ferro ou do aperfeiçoamento da rede rodoviária existente. O mesmo exemplo pode ser dado a propósito da construção de uma central nuclear, cujo impacto local sobre o ambiente não é o problema principal, mas o impacto global do nuclear frente a outras fontes de energia". "Parece, pois, necessário preconizar, de modo indissolúvel, o Estudo de Impacto a nível dos projetos, como a nível dos planejamentos."2 5. Financiamento de obras ou atividades e epia ' ' O Decreto 99.274/90 determinou que "as entidades governai11' s tais de financiamento, ou gestoras de incentivos, condicionarão a s jÜ" 2. Modèle-Cadre Relatif à VImpact sur l'Environnement dans l'Optic[Ue ' -j Aménagement ou d'Une Planification Intégrée du Milieu Naturel, Estrasburgo, ° de 1'Europe, 1980, p. 52. ,,'., ,,. ,,.,., ,, ,.., ..,..,.., . ., ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 207 cessão à comprovação do licenciamento previsto neste Regulamen-C°" (art 23)- Como para licenciar-se, em muitos casos, há necessidade j° ppia os órgãos financiadores (Banco do Brasil S/A, Caixa EconômiFedèral, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico etc.) de-C rão averiguar se o estudo referido foi realizado, ou está sendo realiza-, u jr ser realizado para que o financiamento possa ser concedido. O f nanciamento poderá abranger recursos para a elaboração do próprio epia. A concessão do financiamento e/ou de incentivos em casos em que houve ausência ou irregularidade do Estudo de Impacto, torna essa ação ilegal e passível de anulação pelo Poder Judiciário, desde que haja ação judicial apropriada. O Decreto 99.274, de 6.6.1990, obriga os órgãos federais a comunicar aos órgãos financiadores as infrações de implantação e operação sem licença. A não comunicação pelos servidores públicos sujeita-os à responsabilização funcional (art. 19, § 32). 6. Função e natureza jurídica do epia O Estudo de Impacto Ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente (art. 9a, III, da Lei federal 6.938, de íl-8.1981). As noções de estudo e avaliação se completam através do preceito constitucional e dos preceitos de legislação ordinária (Lei federal 6.803, de 2.7.1980, e com a lei acima referida). As verificações e analises do Estudo de Impacto Ambiental terminam por um juízo de a °r, ou seja, uma avaliação favorável ou desfavorável ao projeto. Não e admite um Estudo de Impacto Ambiental que se abstenha de emitir a aval'ação do projeto. °S ' desde o início da aplicação desse instituto jurídico, salien-arnb'a JUnsPru<nc'a que "o propósito primário da avaliação de impacto fatore é.°brigar as agências federais a dar séria importância aos de q0 am°ientais ao tomar suas decisões discricionárias" (Conselho 697 yTa° do Condado de Monroe, Inc x Volpe - 472 F2d, 693, ZdCirc. 1972). Sões adm' " ° Procecument0 de avaliação não é influenciar as deci-ta'S' em d 1Srat'vas sistematicamente a favor das considerações ambien-ac*virem d nment0 das vantagens econômicas e sociais suscetíveis de Ultla base séri"1 Pr°Jet0"- ° obJetivo é dar "às Administrações Públicas Qe informação, de modo a poder pesar os interesses em 208 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO jogo, quando da tomada de decisão, inclusive aqueles do ambiente, tendo em vista uma finalidade superior", como acentua J. F. Chambault.3 O Estudo de Impacto Ambiental é um procedimento público. Dessa forma não é possível entender-se como tal um estudo privado efetuado por uma equipe multidisciplinar sob encomenda do proponente do projeto, uma vez que é imprescindível a intervenção inicial do órgão público ambiental desde o início do procedimento (arts. 5a, parágrafo único, 6a, parágrafo único, e 11, parágrafo único, todos da Resolução 1/ 86-conama, e Resolução 6/86-conama, modelos 1 e 2). 7. Competência do conama para estabelecer normas gerais sobre o Estudo de Impacto Ambiental A Lei 6.938, de 31.8.1981, estabeleceu em seu art. 82, I, entre as competências do conama, a de estabelecer normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras. As "normas e critérios para o licenciamento" podem ser específicas, se destinadas aos órgãos federais, e gerais, se destinadas aos órgãos estaduais e municipais. Não invade a autonomia dos Estados o estabelecimento dessas normas e critérios pelo conama, pois a "proteção do meio ambiente" é da competência concorrente da União e dos Estados (art. 24, VI, da CF) e à União está reservado o estabelecimento de "normas gerais" (art. 24, § le, da CF). Como assinala com acuidade a Profa. Odete Medauar: "Se a Constituição Federal atribui competência à União para editar normas gerais sobre certa matéria, determina, em decorrência, que tais disposições fixadas em lei federal hão de ser observadas pelos Estados e Municípios, sem que se cogite, no caso, de qualquer interferência ou desrespeito à autonomia dos Estados-membros ou Municípios".4 Estabelecer normas para o licenciamento não se confunde com licenciar. Se a União estivesse chamando a si a tarefa dos Estados, então, poder-se-ia vislumbrar invasão de competência. Entretanto, pode e deve a União valer-se de sua faculdade de ditar normas gerais para todo o país sobre como licenciar, quais os procedimentos fundamentais a serem observados nesse tipo preventivo e corretivo da intervenção dos organismos ambientais não só frente aos particulares, como aos próprios órgãos públicos, que exerçam atividades que degradem ou poS' sam degradar o ambiente. 3. "Les études d'impact et Ia Communauté Européene", in Revue Juridique 1'Enviroimement 4/401-441, 1985. 4. "Relatório de Impacto Ambiental", in O Estado de S. Paulo, ed. 24.6.1988. p29- ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 209 Competência dos Estados e Municípios v>: Estudo de Impacto Ambiental Os Estados e os Municípios não perderam a liberdade de criar nors no concernente ao Estudo de Impacto, diante da existência das nora& federais. Estas normas prevalecem em sua generalidade, mas o camdo Estudo de Impacto Ambiental é amplo e não foi todo preenchido pela norma federal. Espera-se que os Estados e Municípios adaptem a norma federal às suas peculiaridades enriquecendo, assim, a já bem elaborada Resolução 1/86-CONAMA. 9. Abrangência do Estudo de Impacto Ambiental i .•í' 9.1 Relação de atividades no Direito brasileiro ' '"' ' e no Direito Comparado i Compare-se a Resolução 1/86-conama5 com dois documentos do Direito Comparado: a Diretiva 85/337, de 27.6.1985, da Comunidade Européia, e a Convenção de Espoo (Finlândia), de 25.2.1991.6 I - Estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento (Resolução 1/86-conama, art. 2a, I). Construção de auto-estradas e de vias rápidas (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 7; Convenção de Espoo/91, Apêndice I, 7). II - Ferrovias (Resolução 1/86-conama, art. 2-, II). Ferrovias para 0 tráfico a grande distância (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 7; Convenção de Espoo/91, Apêndice 1,7). ,p *" ~ Portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos Resolução 1/86-conama, art. 2a, III). Portos de comércio marítimo, asm corno vias navegáveis e portos de navegação interior permitindo o cesso de navios superiores a 1.350t (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 8; Onvenção de Espoo/91, Apêndice I, 9). de V ~ Aeroportos (Resolução 1/86-conama, art. 2a, IV). Construção r°portos cuja pista de decolagem e de aterrissagem tenha compriEstudo d .stado de Mato Grosso inseriu uma lista de atividades e obras em que o c°mnu 6 Pact0 Ambiental é obrigatório (Código Estadual do Meio Ambiente, Lei mPjernentar36,de21.11.95). Vacoma SSa ConvenÇão foi assinada por 57 países em 25 de fevereiro de 1991 econta-fatificação de 37 países em 11.8.2001. . ,.,..................:._. .... ,....-....,.. 210 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO mento de 2.100m ou mais (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 7; Convenção de Espoo/91, Apêndice I, 7). V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários (Resolução 1/86-conama, art. 22, V). Oleodutos e gasodutos de grande dimensão em uma estrada ou percurso (Convenção de Espoo, Apêndice I, 8). VI - Linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230Kv (Resolução 1/86-conama, art. 2D, VI). VII - Obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10MW, de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d'água, abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, diques (Resolução 1/86-conama, art. 2Ü, VII). Grandes barragens e reservatórios (Convenção de Espoo/91, Apêndice 1,11). VIII - Extração de combustível fóssil (petróleo, xisto carvão) (Resolução 1/86-conama, art. 2Ü, VIII). IX - Extração de minério, inclusive os da classe II, definidos no Código de Mineração (Resolução 1/86conama, art. 2a, IX). X - Aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos (Resolução 1/86conama, art. 2-, X). Instalações de eliminação de resíduos tóxicos e perigosos por incineração, tratamento químico e estocagem na terra (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 9; e Convenção de Espoo/91, Apêndice I, 10). XI - Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10MW (Resolução 1/86-conama, art. 2°, XI). XII - Complexo e unidades industriais e agroindustriais (petroquímicos e cloroquímicos) (Lei 6.803/80, art. 10; e Resolução 1/86-conama, art. 2Ü, XII). Complexos e unidades industriais e agroindustriais (siderúrgicas, destilarias de álcool, hulha e extração e cultivo de recursos hídricos) (Resolução 1/86conama, art. 2-, XII). Instalações químicas integradas (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 6). Usinas integradas de aço (Diretiva 85/ 337-ce, Anexo I, 4). Refinarias de petróleo (à exceção das empresa fabricando unicamente lubrificantes a partir de petróleo bruto) e insta' lações para gaseificação e liqüefação de ao menos 500t de carbono oü de xisto betuminoso por dia (Convenção de Espoo/91, Apêndice I, 0XIII - Distritos industriais e zonas estritamente industriais-ZEi (Re solução 1/86-conama, art. 2a, XIII). XIV - Exploração econômica de madeira ou de lenha em árs acima de lOOha ou menores, quando atingir áreas significativas em t6 ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 211 percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental (Reso-ãcI 1/86-coNAMA, art. 2 XIV). XV - Projetos urbanísticos, acima de lOOha, ou em áreas consideras de relevante interesse ambiental a critério do ibama e dos órgãos nicipais e estaduais competentes (Resolução 1/86-conama, art. 2a, xiv). XVI - Qualquer atividade que utilizar carvão vegetal, derivados ou nrodutos similares, em quantidade superior a lOt por dia (Resolução 1 1/86-conama). XVII - Projetos agropecuários que contemplem áreas acima de 1 OOOha ou menores, nestes casos, quando se tratar de áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental, inclusive áreas de proteção ambiental (Resolução 1 1/86-conama). XVIII - Nos casos de empreendimentos potencialmente lesivos ao patrimônio espeleológico nacional (Resolução 5/87-conama). XIX - Instalações nucleares (Lei 6.803/80). Centrais nucleares e outros reatores nucleares (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 2). A legislação brasileira não prevê expressamente o epia para "instalações destinadas exclusivamente para estocar permanentemente ou para eliminar em caráter definitivo os rejeitos radioativos", como o fazem a Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 3, e a Convenção de Espoo, Apêndice I, 3. Da mesma forma, não consta da legislação brasileira, de forma expressa, a obrigatoriedade do epia para "instalações destinadas à extração do amianto, como a transformação do amianto e de produtos contendo amianto: para os produtos amianto-cimento, uma produção anual de mais de 200t de produtos acabados; para os complementos de fricção, "ma produção anual de mais de 50t de produtos acabados; para as ou-ras utilizações de amianto, uma utilização de mais de 200t por ano", como o fazem a Diretiva 85/337-ce, Anexo 1,5, e a Convenção de Espoo, APendice I, 5. an ara °S traamos de captação de águas subterrâneas (cujo volume celui atla °U ultraPasse 10.000.000m3) e as instalações de papel e Prev °Se' COm Pr°ducao de, pelo menos, 200t secas ao ar por dia, está Apgn .a °"rigatoriamente a realização de epia pela Convenção de Espoo, 8aÇão cfpr(rsentaÇã0 da relação brasileira das atividades em que há obri-C°mPara 1 boraÇão do Estudo Prévio de Impacto Ambiental fazendo a ve nf C°m a ex'stente na Comunidade Européia mostra que não por f] iUer exaêero na exigência feita no Brasil. O rol de atividades m dade educar ambientalmente, para que ninguém se surpreen- 212 .'' •«:/. DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO da em seu planejamento como, também, não haja afrouxamento na prática de um procedimento preventivo, que deve ser exigido de todos que estejam em situação semelhante, evitando concorrência desleal e o incentivo da degradação ambiental. Na França, a ausência de Estudo de Impacto Ambiental obriga o juiz à concessão da suspensão da decisão administrativa atacada em juízo (art. L 122-2 do Código de Meio Ambiente7). A ausência desse estudo deve ser constatada em procedimento de urgência. Essa medida liminar, portanto, não está no campo da discricionariedade judicial. 9.2 Obrigatoriedade da exigência do Estudo de Impacto •«' Ambiental nos casos especificados na legislação brasileira Empreendedores e Administração Pública têm na relação do art. 2fl da Resolução 1/86-conama a indicação constitucional de atividades que podem provocar significativa degradação do meio ambiente (art. 225, § lfl, IV, da CF). Por isso, como muita precisão, afirma o jurista Paulo de Bessa Antunes que "a dispensa, imotivada, ou em fraude à Constituição, do Estudo de Impacto Ambiental deve ser considerada falta grave do servidor que a autorizar. Assim é porque, na hipótese, trata-se de uma violação cabal da Constituição".8 A Resolução 237/97-conama continua a sujeitar todas as atividades especificadas na Lei 6.803/80 e nas Resoluções 1/86, 11/86 e 5/87 à elaboração do Estudo Prévio de Impacto Ambiental. Não seria razoável qualquer interpretação que entendesse que o conama passou a navegar na contramão do caminho do Direito Comparado Ambiental moderno, deixando ao arbítrio dos órgãos públicos determinar ou não esse estudo. Nesse sentido é o art. 3a da Resolução 237/97: "a licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá d6 prévio Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impact0 sobre o Meio Ambiente (eia/rima), ao qual dar-se-á publicidade, garafl' tida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo cotf1 a regulamentação". Quando o parágrafo único desse art. 3Ü diz que "o órgão ambient competente, verificando que a atividade ou empreendimento não e P 7. "Anexe à I'Ordenance n. 2000-914", de 18.9.2000, Journal Officiel de 21-9/2° (anexo ao n. 219). A expressão "fait droit" do art. 122-2 tem o sentido de dever jurio' 8. Direito Ambiental, Rio de Janeiro, Lumen Júris, 1996. ' ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 213 ncialtnente causador de significativa degradação do meio ambiente " temos que perguntar quando e através de que meio é feita e por íém se faz essa "verificação". É conhecida a dificuldade de recursos dos órgãos ambientais brasileiros; e, portanto, eles não têm o número de funcionários para fazer essa verificação prévia em cada pedido de licenciamento (por isso mesmo que já há a lista das atividades). Quem tem o ônus de provar que a atividade que pretende exercer não tem a potencialidade decausar dano significativo é o próprio empreendedor, e não os órgãos públicos ambientais. Ao empreendedor ou proponente do projeto cabem as despesas com a elaboração de epia/rima (art. 17, § 2Ü, do Decreto 99.274, de 6.6.1990). Nesse sentido assinala o magistrado Álvaro Luiz Valery Mirra: "a Resolução 1/86 do conama, na realidade, estabeleceu um mínimo obrigatório, que pode ser ampliado, mas jamais reduzido. Há, como dizem Antônio Herman Benjamin, Paulo Affonso Leme Machado e Sílvia Capelli, verdadeira presunção absoluta de que as atividades previstas na referida resolução são potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente".9 A Resolução 1/86-conama merece apoio ao apontar diversas atividades para cujo licenciamento se fará necessária a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental. E o elogio estende-se pelo fato de essas atividades serem mencionadas exemplificativamente, pois o art. 2a, caput, da resolução mencionada fala em "atividades modificadoras do meio ambiente, tais como ...".A expressão "tais como" merece ser logicamente entendida no sentido de que não só as atividades constantes da lista everão obrigatoriamente ser analisadas pelo Estudo de Impacto Am-•ental, mas outras poderão ser acrescentadas à lista. A expressão "tais orno não pode ser lida, contudo, como uma sugestão para a Administra-ublica cumprir se quiser. Seria eliminar-se o verbo "exigir", que L°meça o inc. IV do § 1" do art. 225 da CF. o H' 6.938/81 já houvera dado à Administração Pública ambiental a]gureito e exigir a elaboração do epia. A vantagem de se arrolarem públas atividades no art. 2B obriga também a própria Administração sem o ' Ue n° PO(e trans'gir> outorgando a licença e/ou autorização ativ'dade °U bem a Lei 6-938/81 ao não distinguir, para fins de eia, a at°, dif Uente Pela natureza da sua emissão ou causa próxima. De enÇa nenhuma há, em termos de devastação ecológica, entre 9 / 6ndes. 1998'0 Ambiental -Aspectos da Legislação Brasileira, São Paulo, ed. Oliveira 214 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO j poluição causada por atividade industrial ou de outra origem, como, pOr exemplo, os grandes projetos agrícolas", como criteriosamente afirma Antônio Herman V. Benjamin.10 '*'•' j: h' • l' 10. Conteúdo do Estudo de Impacto Ambiental 7 j' 10.1 Estudo de Impacto Ambiental-epia e Relatório de Impacto Ambiental-RMA O Estudo de Impacto Ambiental (epia) e o Relatório de Impacto Ambiental (rima) apresentam algumas diferenças. O estudo é de maior abrangência que o relatório e o engloba em si mesmo. O epia compreende o levantamento da literatura científica e legal pertinente, trabalhos de campo, análises de laboratório e a própria redação do relatório. Por isso, diz o art. 9a da Resolução 1/86-conama que o "Relatório de Impacto Ambiental-RiMA refletirá as conclusões do Estudo de Impacto Ambiental", ficando patenteado que o epia precede o rima e é seu alicerce de natureza imprescindível. O relatório transmite - por escrito as atividades totais do epia, importando se acentuar que não se pode criar uma parte transparente das atividades (o rima) e uma parte não transparente das atividades (o epia). Dissociado do epia, o rima perde a validade. O conteúdo do epia e do rima vinculam tanto o órgão público ambiental como a equipe multidisciplinar. No caso em que o órgão público ambiental já seja possuidor de informações que devam estar inseridas no epia e no rima, esses órgãos devem passar essas informações para a equipe multidisciplinar, que procurará confrontar e integrar as informações recebidas com as que ela - equipe - levantar. Do contrário fragmentar-se-ia o epia e o rima ao sabor da Administração Pública, e o público estaria privado de conhecer o rima em sua inteireza, o que viciaria todo o procedimento. Portanto, não é dado ao órgão público dispensar qualquer dos elementos de conteúdo do epia e do rima. 10.2 Área de influência do projeto sr,-;»:. O Estudo de Impacto Ambiental deverá "definirBÍá limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente'afetada pewsimpactos, deno10. "Estudo de Impacto Ambiental e Ministério Público", Anais do VII Congresso Nncifmnl rin Mmistprin Públirn ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 215 da área de influência do projeto, considerando em todos os casos, "vcia hidrográfica na qual se localiza" (art. 5a, III, da Resolução 1/86a ama). A definição da área geográfica a ser estudada não fica ao arbíC° do órgão público ambiental, do proponente do projeto ou da equipe tfl Indisciplinar. A possibilidade de se registrarem impactos significatique vai delimitar a área chamada de influência do projeto. A resolu- ' COntudo, apontou uma referência geográfica inarredável do estudo: bacia hidrográfica na qual se situará o projeto. Poderá a área de influência do projeto transcender não só os limites de um Município, como do Estado federativo. Evidentemente, sendo no interior do território brasileiro, a equipe brasileira movimentar-se-á ampla e livremente, não sendo necessária autorização do órgão administrativo ambiental do Estado referido. Constatando-se, contudo, impactos ambientais noutro Estado da Federação, será prudente que o rima seja participado a esse Estado para que ele possa manifestar-se na fase de comentários ou na Audiência Pública, se for esta promovida. E se os efeitos ultrapassarem as fronteiras do Brasil? Parece-me que para que se proceda ao epia no país vizinho necessário se torna sua autorização. Contudo, observando-se o princípio de cooperação internacional, independentemente de consulta ao Estado vizinho, deve-se informá-lo do conteúdo do rima efetuado no Brasil, quando os impactos ultrapassarem ou puderem ultrapassar as fronteiras políticas. Na legislação estrangeira podemos citar: Colômbia (Decreto 2.811, de 18.12.1974, art. 29: "quando as referidas obras ou atividades possam ter efeitos de caráter internacional nos recursos naturais e demais elementos ambientais, deverá ouvir-se a opinião do Ministério das Relações Exteriores"); Comunidades Econômicas Européias (Diretriz refe-r'da, art. 7Q: "Quando um Estado-membro constata que um projeto suscetível de ter incidências notáveis sobre o ambiente de um outro Estado-membro, ou quando um Estado-membro suscetível de ser notavelmente afetado o solicita, o Estado-membro em cujo território há a pro-Posição de executar o projeto, transmite ao outro Estado-membro, as ntormações recolhidas em virtude do art. 52 ao mesmo tempo que as coloca à disposição de seus próprios súditos. Essas informações servem e fundamento para toda a consulta necessária, no quadro das relações "aterais de dois Estadosmembros, baseadas na reciprocidade e na eciuivalência"). A Convenção México-Guatemala, assinada aos 10 de abril de 1987, em ° título "Convênio entre os Estados Unidos Mexicanos e a Repúblia da Guatemala sobre a Proteção e Melhoramento do Ambiente na c°naFronteiriça". Interessa assinalar o art. 5Ü: "As partes, avaliarão, em ntormidade com suas respectivas leis, regulamentos e políticas nacio- 216 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO nais, projetos que possam ter impactos significativos no ambiente da zona fronteiriça e considerarão as medidas apropriadas para evitar ou mitigar os efeitos adversos". "Art. 8a. As partes facilitarão a entrada de equipamento e de pessoal relacionados com este Convênio, com sujeição às leis e regulamentos do país receptor, e realizarão consultas sobre medição, análise e avaliação de elementos contaminantes na zona fronteiriça." 10.3 Planos e programas governamentais - Zoneamento ambiental i I , A Resolução 1/86-conama determina que o epia deva "considerar os planos e programas governamentais, propostos e em implantação na área de influência do projeto, e sua compatibilidade" (art. 5a, IV). Para dizer da compatibilidade ou não do projeto com os planos e programas governamentais, é preciso que estes sejam também examinados. A incompatibilidade total ou parcial, aparente ou evidente do projeto deverá ser claramente exposta pelo epia. Da mesma forma, enquadra-se na categoria dos planos governamentais o zoneamento ambiental previsto no art. 9a, I, da Lei 6.938/81. Suas diretrizes deverão ser levadas em conta para avaliar-se da compatibilidade do projeto com o zoneamento ambiental proposto ou em implantação. Nesse zoneamento ambiental poderão estar contidas as "áreas de preservação permanente" (art. 6-, I, b). 10.4 Alternativas A Lei 6.803/80 diz: "Caberá exclusivamente à União, ouvidos os governos estadual e municipal interessados, aprovar a delimitação e autorizar a implantação de zonas de uso estritamente industrial que se destinem à localização de pólos petroquímicos, carboquímicos, cloro-químicos, bem como as instalações nucleares e outras definidas em lei" (art. 10, § 22). "Além dos estudos normalmente exigíveis para o estabelecimento de zoneamento urbano, a aprovação das zonas a que se refere o parágrafo anterior será precedida de estudos especiais de alternativas e de avaliações de impacto, que permitam estabelecer a confiabilidade da solução a ser adotada" (art. 10, § 3a). Surge nessa lei a necessidade de que o estudo apresente alternativas. No caso da lei em exame, estudar alternativas eqüivale a estudar a possibilidade de uma outra zona industrial tendo-se em vista a zona indicada no projeto já apresentado. O sentido de alternativas da Lei 6.803/80 deverá influenciar a análise dos ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 217 ,. jomas legais subseqüentes, sendo que o vocábulo empregado significa ue Pel° menos'duas °Pcões devci"ão ser colocadas diante do administrador'pút>lic0 para que a decisão administrativa seja possível. As alternativas analisadas deverão ter razoável viabilidade. Seria falsear o espírito da lei se, para forçar a escolha de um projeto, se apresentasse outra opção manifestamente inexeqüívd. O Decreto federal 99.274/90 prevê que os eias conterão "a descrição da ação proposta e suas alternativas" (art. 17, § l2, b). A Resolução 1/86-conama prevê que o epia obedecerá à diretriz geral de "contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização do projeto, confrontando-as com a hipótese de não executar o projeto" (art. 52,1), repetindo-se que as "alternativas tecnológicas e locacionais" deverão constar do rima (art. 9U, I). Na legislação comparada, podemos citar que os Estados Unidos não só exigem a análise das alternativas (sec. 102-2, C e F nepa/69) devendo-se estudar, desenvolver e descrever as alternativas apropriadas. O Prof. Rodgers Júnior" conceitua a discussão das alternativas como linchpin (elemento central ou de coesão) da avaliação de impacto, devendo essa discussão ser "sóbria, fundamentada e minuciosa" e o Prof. Juergensmeyer12 classifica a discussão das alternativas como o coração da avaliação de impacto ambiental. A Noruega (Lei 6, de 13.3.1981) passou a exigir a avaliação do impacto (konsekvensanalyse) e o estudo de alternativas de localização (art. 14, § 32); Diretriz 85/337-cee (Comunidades Econômicas Européias; de 27.6.1985: prevê no Anexo III que o epia conterá "um esboço das principais soluções de substituição que foram examinadas pelo maitre d'ouvrage e a indicação das principais razões de sua escolha, tendo-se em vista os efeitos sobre o ambiente" (§ 2a); Grécia: através da Lei 1.650/86 estabeleceu no conteúdo do epia o exame das alternativas e a indicação das principais razões que conduziram à escolha da solução apontada (art. 5e, § 1Q, d). No Paraguai, a Lei 294, de 31.12.1993, sobre Avaliação de Impacto Ambiental, dis-Pôs que essa avaliação deverá conter, no mínimo, "uma relação das alternativas técnicas do projeto e de sua localização, assim como a avalia-Ção das circunstâncias que ocorreriam se o projeto não se realizasse" (art. 32, g). A Convenção de Espoo/91 indica, em seu art. 52, que deverão ser analisadas "a) as soluções de substituição possíveis, aí compreendidas as opções 'zero', como medidas que poderiam ser tomadas para atenuar o impacto transfronteitiço prejudicial importante". 11. Environmental Law. 12. D. Hagman e J. C. Juergeoaney jr,an Planning and Land Development u>ntrolLaw.... . .,-... ,,,..,,. 1 li'1 218 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O exame das alternativas tem-se revelado um dos pontos críticos dos eias, a tal ponto que Luiz Enrique Sánchez salienta que "os estudos são encomendados somente quando o projeto está inteiramente defini, do sob o ponto de vista técnico, prejudicando ou mesmo impedindo o estudo das alternativas e fazendo com que os estudos ambientais devam ser elaborados em caráter de urgência. Desta forma, se os mecanismos de controle forem eficazes, os estudos terão que ser complementados ou inteiramente refeitos".13 O exame das alternativas conduzirá os consultores a não se fixarem somente na localização e nos processos de produção propostos pelo requerente do licenciamento, fornecendo a ela não só a possibilidade como o dever de comentar outras soluções para a localização e a operação pretendidas. Para dirimir o conflito na escolha de propostas alternativas, principalmente quando se deverá escolher entre eliminar ou agredir um bem natural, valho-me da respeitada opinião do Prof. Gerd Winter: "Se o projeto destrói bens naturais, é preciso um interesse público para justificar essa destruição. Se o bem natural possui valor extraordinário, o interesse público alegado para sua destruição deve ser igualmente extraordinário".14 A área de influência do projeto deverá ser sempre analisada "considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza" (art. 5a, III, da Resolução 1/86-conama). Dessa forma, as alternativas hão de primeiramente enfocar a área de influência do projeto, podendo resultar satisfatório esse enfoque. Entretanto, a legislação não veda que a equipe multidisciplinar venha propor como alternativa local situado fora da área obrigatoriamente estudada. Poderá ser invalidado o epia/rima quando houver "ausência de eqüidade, uniformidade metodológica e grau de aprofundamento equivalente no estudo das diferentes alternativas locacionais e tecnológicas" (art. 88, II, do Código do Meio Ambiente-RS, Lei 11.520, de 3.8.2000). 10.5 Descrição inicial do local v;! .,. -.: - ;. Importa estudar a área antes da implantação do projeto, abrangendo o estudo do meio físico, biológico (os ecossistemas naturais), e o13. "Os papéis da avaliação de impacto ambiental", in Avaliação de Impacto Ambiental - Situação Atual e Perspectivas, São Paulo, EPUSP, 1993. 14. Alternativen in der administrativen EntscheidungsbildungAuflage, Düsseldorf. Werner, 1997, p. 114. ... l, : ... ... , ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 219 , eConômico. Assim dispõem o Decreto 88.351/83 (art. 18, § Ia, a, a° gnóstico ambiental da área) e o art. 6a da Resolução 1/86-conama. Legislações estrangeiras contemplam, também, a obrigatoriedade A descrever, inventariar e analisar o ambiente antes de o mesmo ser odificado pelo projeto: EUA (Lei de Política Nacional do Ambiente 1969 sec. 102), França (Lei 76-629, de 10.7.1976, art. 2a), Suíça (lei federal de 7.10.1983, art. 9a), Argélia (Lei 83-03, de 5.2.1983, art. 131), Portugal (Lei 11, de 7.4.1987, art. 31). A descrição inicial do local será de grande importância na conclusão do estudo, pois permitirá um mais justo juízo de valor entre as vantagens de autorizar-se ou não o projeto. Se o estudo se detiver só nas modificações que o projeto irá acarretar, deixam-se de ter - no relatório _ os elementos fundamentais de comparação entre o antes e o depois do projeto. 10.6 Identificação e avaliação dos impactos ambientais do projeto O Decreto 99.274/90 (art. 17, § Ia, c) prevê a necessidade de o epia conter a "identificação, análise e previsão dos impactos significativos, positivos e negativos". A Resolução 1/86-conama prevê no art. 5a, II, que o estudo obedecerá às diretrizes gerais de "identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de implantação e operação da atividade", e o art. 6a determina que o estudo abrangerá a análise dos impactos ambientais do projeto através de "identificação, previsão da magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos positivos e negativos (benéficos e adversos), diretos e indiretos, imediatos e a médio e longo prazos, temporários e permanentes; seu grau de reversibilidade; suas propriedades cumulativas e sinergé-ticas" (inc. II). Na legislação estrangeira podemos citar: EUA (lei referida, sec. 102> c, I, II, iv, V); França (lei referida, art. 2a); Noruega (Lei 6, de 13.3.1981, Cap. III, sec. 14); Turquia (Lei 2.872, de 9.8.1983, art. 3a, >' Argélia (lei referida, art. 131); Comunidades Econômicas Européias (art. 5a, 2); Itália (Lei 349, de 8.7.1986, art. 6a, 3, "Especificação dos esiduos líquidos e sólidos, das emissões e imissões poluidoras na at-°sfera e das emissões sonoras produzidas pela obra"); Grécia (lei re-enda, art. 5a, 1, b: "avaliação das principais incidências sobre o ambien-e ); Portugal (lei referida, art. 31, b, "o estudo das modificações que o jpjeto provocará"); México (Lei Geral do Equilíbrio Ecológico e a dr°teção ao Ambiente, 1988, art. 28 "... descrição dos possíveis efeitos q ditas obras ou atividades no ecossistema de que trate, considerando j que q e não serão sujeitos ao aproveitamento"). q , Orijunto de elementos que o formam e não unicamente os recursos e serã ji ") 220 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A Resolução 1/86-conama estabeleceu os diversos impactos que deverão ser estudados e previstos, usando-se evidentemente de todos os conhecimentos científicos existentes no País e fora dele à época da elaboração do relatório. Determina, ainda, a resolução examinada que os impactos devem ser estudados nas "fases de implantação e operação da atividade". Combine-se essa determinação da resolução com a Constituição Federal (art. 225, IV) e observar-se-á que os impactos terão que ser avaliados antes de se licenciar a implantação e antes de se autorizar a operação da atividade. A avaliação dos impactos em diferentes fases foi também prevista na legislação da Província de Córdoba (República Argentina, pela Lei 7.343, de 29.8.1985, art. 49). Os impactos deverão ser avaliados em suas "propriedades cumulativas e sinergéticas". "Sinergismo associação simultânea de dois ou mais fatores que contribuem para uma ação resultante superior àquela obtida individualmente pelos fatores sob as mesmas condições".15 Levando-se em conta os efeitos sinergéticos advindos da execução de uma obra e/ou atividade, o epia terá que, em determinados casos, indicar medidas de alteração do sistema de produção em outras obras e/ou atividades já existentes na área. Isto porque o sinergismo poderá aumentar de tal modo a poluição ou a agressão ao ambiente, que não bastarão medidas a serem executadas pelo requerente da licença e/ou autorização. 10.7 Medidas para corrigir os impactos ambientais desfavoráveis O epia não só identifica e avalia os impactos negativos ao ambiente. Deve indicar e testar as medidas de correção desses impactos. A Resolução 1/86-conama determina que o epia deve fazer a "definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos, entre elas os equipamentos de controle e os sistemas de tratamento de despejos, avaliando a eficiência de cada uma delas" (art. 6e, III). A equipe multidisciplinar deverá apontar os equipamentos de controle que existam no mercado nacional, como em outros países. Muitas vezes, membros da equipe multidisciplinar terão que se deslocar para outros países para verificarem a eficiência desses equipamentos. Avaliar a eficiência não é só re-• produzir o que consta na bibliografia. Além disso, essa avaliação de eficiência deverá levar em conta a área do projeto, pois um mesmo equipamento poderá não ser adequado para localidade diversa de onde foi testado. A administração Pública ambiental não está jungida a adotar os equipamentos ou os sistemas, mas para não exigi-los deverá motivar 15. Glossário de Termos Usuais em Ecologia, publicação ACIESP 24, 1980. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 221 decisão. A expressão "medida mitigadora dos impactos negativos" j Resolução 1/86-coNAMA deve obedecer ao sentido superior da norma Lei 6.803/80 (art. 10, § 3a) quando diz a lei "... avaliações de impac-aue permitam estabelecer a confiabilidade da solução a ser adotada'' Confiabilidade da solução é mais do que mitigar o impacto, é tentar vitar o impacto negativo ou, sendo impossível evitá-lo, é procurar cor-riei-lo, recuperando o ambiente. A recuperação não é uma medida que se possa afastar do epia. Na legislação estrangeira podemos apontar: França (lei referida, art. 2a: o conteúdo do estudo compreende "... medidas indicadas para suprimir, reduzir ..."); Suíça (lei referida, art. 9.2, d: "medidas que permitam reduzir os prejuízos e o custo das mesmas"); Turquia (lei referida: o epia deve "precisar as medidas e os métodos que permitam prevenir os efeitos indesejáveis dos resíduos suscetíveis de provocar poluição", art. 10); Argélia (lei referida, art. 131: o estudo deve conter "as medidas indicadas para prevenir, reduzir as conseqüências prejudiciais para o ambiente"); Comunidades Econômicas Européias (diretriz referida, art. 5a, "descrição das medidas indicadas para evitar e reduzir os efeitos negativos importantes ..."); Província de Córdoba - República Argentina (lei referida, art. 50: "as obras e/ou atividades que degradem ou sejam suscetíveis de degradar o ambiente ... só poderão ser autorizadas se estabeleçam garantias, procedimentos e normas para sua correção". O artigo citado está no capítulo do impacto ambiental); Itália (lei referida, art. 6a: "... descrição dos dispositivos de eliminação ou recuperação dos danos ao ambiente e planos de prevenção dos danos ao ambiente-.."); Grécia (lei referida, art. 5a, c: "descrição das medidas destinadas a prevenir, diminuir ou reparar as incidências negativas sobre o ambiente ); Portugal (lei referida, art. 31, c: "as medidas previstas para supri-n1)r e reduzir ... as eventuais incidências sobre a qualidade do ambien-e ); México (lei referida, art. 32: "... os interessados deverão apresen-,ar Perante a autoridade competente uma manifestação de impacto am-.tental. Esta manifestação deverá ser acompanhada de um estudo do Co a °bra, suas modificações ou das atividades previstas, consisten-nas medidas técnicas preventivas e corretivas para mitigar os efeitos adverso mal...' ao equilíbrio ecológico durante sua execução, operação normPuctos desfavoráveis e previsão no orçamento efejt° Decret0 federal 95.733, de 12.2.1988, prevê que, "identificados s negativos de natureza ambiental, cultural e social, os órgãos e 222 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO entidades federais incluirão, no orçamento de cada projeto ou obra, rjo tações correspondentes, no mínimo, a 1% do mesmo orçamento destj nadas à prevenção ou à correção desses efeitos" (art. lü, parágrafo único). O art. 2- desse decreto diz: "Os projetos e as obras, já em execução ou em planejamento serão revistos para se adaptarem ao disposto tio artigo anterior". As obras e projetos de que trata o mencionado decreto são federais mas podem ser repassadas aos Estados e aos Municípios. O decreto vincula expressamente a "execução de projetos e construção de obras federais que podem causar impactos de natureza ambiental ..." (considerando 1 do decreto) à previsão do mínimo de 1% do orçamento da obra ou projeto. Assim, os danos prováveis ou potenciais devem ser previstos. O dinheiro público é para evitar o dano. Se o dano for inevitável - ou já tiver acontecido - é que se empregará o dinheiro público para a correção do dano. Primeiro previne-se, o que é lógico e acertado, para, depois, se não bem-sucedida a prevenção, passar-se à terapia do dano ambiental. O decreto federal é oportuno, pois não poderá alegar a Administração Pública que não dispõe de dinheiro para a prevenção ambiental. Poderá acontecer que o dinheiro seja insuficiente, mas um mínimo já deve estar previsto. Os administradores públicos que não observarem o citado decreto devem ser responsabilizados civil e criminalmente. Inexistindo a verba para a prevenção e a correção do dano ambiental, nem por isso a Administração Pública se furta à sua responsabilidade objetiva ambiental. 10.9 Medidas compensatórias Entre as "medidas mitigadoras" previstas nos arts. 62, III, e 9a, VI> da Resolução 1/86 compreende-se, também, a compensação do dano ambiental provável. A compensação é uma forma de indenização. Mes' mo que a compensação não fosse prevista no epia, ela é devida pe'° princípio da responsabilidade objetiva ambiental (art. 14, § lfl, da Lel 6.938/81). A Lei 9.985, de 18.7.2000, que "institui o Sistema Nacional de Conservação da Natureza e dá outras providências", posiciona-se clara mente acerca da obrigação16 de compensar os danos ambientais, 16. Anteriormente prevista na Resolução 10, de 3.12.1987, do Conselho do Meio Ambiente-coNAMA, com a modificação operada pela Resolução 2, de 18.4. ,996- ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 223 tes termos: "nos casos de licenciamento ambiental de empreendi- de significativo impacto ambiental, assim considerado pelo ór-1-en mbiental competente, com fundamento em Estudo de Impacto Am-êa0 i e respectivo relatório-EiA/RiMA, o empreendedor é obrigado a k'e r a implantação e manutenção de unidade de conservação do Grude Proteção Integral, de acordo com o disposto neste artigo e no 1 _ ™ i- ** 1 *-m. « ' ' J Í-* 4*4* J £—. *** *-* -* ri w * po O Estudo de Impacto Ambiental é o instrumento necessário para aracterizar que o empreendimento poderá causar significativo impacto ambiental. Aplica-se aqui todo o capítulo sobre esse procedimento administrativo. Toda vez que se deixar de exigir o Estudo de Impacto Ambiental, quando devido, passa a haver um prejuízo potencial para as unidades de conservação da área de influência do projeto. A conceituação final de que o empreendimento está classificado como "empreendimento de significativo impacto ambiental" é do órgão licenciador, com base no anterior epia/rima. Haverá casos em que poderá intervir mais de um órgão licenciador (sem embargo da Resolução 237/1997-conama tentar, inconstitucionalmente, estabelecer um licenciamento único).17 "O eia/rima relativo ao empreendimento apresentará proposta ou projeto ou indicará possíveis alternativas para o atendimento ao disposto nesta Resolução" (art. 4Ü). Medidas de compensação no epia são previstas na legislação estrangeira: França (art. 22 da lei referida); Argélia (art. 131 da lei referida); União Européia (diretriz mencionada, anexo III, 5); Grécia (art. 52, l< c); Portugal (art. 31, c, da lei referida). Os empreendimentos de relevante impacto ambiental estão sujei-Os ao sistema de compensação da Resolução 2/96-conama. A classifica da relevância dos impactos ambientais é do órgão licenciador. lcando-se os princípios fundamentais de "legalidade, impessoalidade, cã p' e' Publicidade e eficiência", a que está sujeita a Administra-pos blica direta, indireta ou fundacional (art. 37, caput, da CF), não é Ver , ao órgão licenciador agir arbitrariamente. Para dispensar o de-eCo .CornPensar os danos causados pela destruição de florestas ou outros teri(j s ernas, é preciso fundamentar exaustivamente. É razoável en-pel0 S<T ue' em todos os casos arrolados no art. 2- da Resolução 1/86, bjp P"° c°nama deva ser examinada a existência de impacto çã0 a re'evante. Na dúvida, com precaução, deve-se optar pela obri-üe compensar. l7-V.Tít 1 ulo X, "Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza". 224 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A fixação dos termos da compensação não é assunto secreto e/0 confidencia] entre órgão público ambiental e empreendedor. Todos 0 cidadãos e as organizações não governamentais têm direito de exigj integral informação sobre os critérios observados na compensação, p0 dendo o conama suspender a execução de projetos que estejam em de. sacordo com a Resolução 2/96, conforme seu art. 7a. O princípio da compensação não significa que tudo possa ser negociado ou objeto de transação em matéria de dano ambiental. Há danos ambientais inegociáveis, pois, de forma vinculada, a legislação obriga a Administração Pública, a coletividade, e cada pessoa, a ter determinado comportamento. Exemplifique-se com a incumbência do Poder Público de "preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético" (art. 225, § Ia, II, da CF). Assim, o epia ao analisar a fauna e a flora, apontará a possibilidade de o projeto causar a extinção de alguma espécie. Ocorrendo essa hipótese, o projeto não poderá ser autorizado e, conseqüentemente, nenhuma compensação é admissível. Relevante citar o Prof. Michel Prieur, Presidente do Centro Internacional de Direito Comparado do Meio Ambiente: "A idéia de 'compensar' as conseqüências prejudiciais é interessante, mas perigosa. A compensação pode ser técnica ou financeira. Pode ser a instalação de uma cortina de árvores para esconder uma fábrica e atenuar o atentado à paisagem, o financiamento de uma represa, de um criadouro de peixes, de uma reserva natural para compensar a destruição de um espaço frágil ecologicamente. Há então uma espécie de comércio, que consiste em oferecer às populações concernentes uma contrapartida, para fazê-la psicologicamente aceitar o projeto. É nisto que a compensação é perigosa. A proteção do ambiente aí raramente encontra seu valor e o procedimento passa a ser mais um meio de comprar o direito de poluir ou de destruir um ecossistema. Dessa forma, poder-se-á justificar qualquer projeto, mesmo aquele que mais destrua o meio natural, porque será sempre possível compensar noutro lugar ou de outra maneira".18 Esse atilado jurista critica a lei francesa de 10 de julho de 1976, que prevê medidas de compensação a serem previstas no epia, afirmando que tal orientação, inspirada em preocupações de ordem econômica, que procura tudo contabilizar, mesmo a natureza, é justamente sentida com0 tendo um objetivo prejudicial, "que faz parte de um engano calculado", conforme o Prof. Jean Untermayer.19 18. Droit de l'Environnement, p. 1.101. 19 Drnit rle l'Fn ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 225 10.10 Medidas preventivas de riscos maiores e catástrofes Catástrofe, segundo o Prof. Steiger, da Universidade de Giessen rFA) é "um acontecimento extraordinário, incontrolado e extremo, que uer uma ação urgente para combatê-lo ou reduzir seus efeitos de-trosos ou muito perigosos para a população, os bens e propriedades /ou o ambiente natural ou construído, manifestando-se subitamente ou desenvolvendo com certa velocidade".20 O Prof. Henri Smets afirma: "A repetição de acidentes graves de poluição, de explosões e de incêndios afetando a vizinhança de instalações industriais é uma certeza, malgrado as declarações tranqüilizadoras e o progresso da ciência. Além disso, tais acidentes podem produzir-se com maior freqüência, pois o ritmo dos grandes sinistros industriais cresceu nos últimos 30 anos". Como impacto negativo direto ou indireto - ainda que a Resolução 1/86-coNAMA não a mencione claramente - está a catástrofe. Há certas atividades ou certas obras que apresentam maior risco que outras. Estaria incompleto o epia que ignorasse a questão. Mencionamos Moati e Lochard.21 A produção e a síntese da informação técnico-científica visando a estimar a amplitude dos riscos, parafraseando a Academia Nacional de Ciências americana (nrc 1983) abordará: "1") identificação do perigo (no sentido da fonte do risco): isto é, a determinação da existência ou não de uma relação entre a exposição a uma substância, um procedimento ou uma atividade e um (ou diversos) prejuízo sanitário ou ambiental específico; 2") avaliação das exposições: isto é, medida da freqüência, da intensidade, das características das exposições das populações humanas (ou dos ecossistemas) aos riscos induzidos pela fonte de perigo; 3Ü) estabelecimento de uma relação dose/ eteito: determinação da relação entre o grau de exposição e a probabilidade de ocorrência entre os efeitos sanitários em questão; 42) estimação do risco: combinação das três etapas precedentes para caracterizar, se Possível de modo quantitativo, a natureza do risco sanitário e ambiental, assim como as incertezas associadas a esta avaliação". Expressamente prevêem a obrigação de constar no epia a probabi-1 ade de acidentes maiores, alguns países, tais como: Noruega (lei rea: sec. 14: "... a poluição que possa ser causada pela atividade sob Ormais condições de operação ou pelo acontecimento de incidentes r, . 2- "Catastrophes naturelles ou technologiques dans les zones frontalières", in Uro"«w«,,n.21il986pp 103.140 c°nn "L'évaluation formalisée et Ia gestion des risques technologiques: entre a'ssance et légitimation", in La Societé Vulnérable, pp. 61-77. 226 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO cuja ocorrência possa ser razoavelmente prevista, como a probabilidacj de tais incidentes"); Suíça (lei referida: "o relatório descreve notada mente: b) o projeto - aí compreendidas as medidas previstas para redu, zir os prejuízos e para o caso de catástrofe", 9.2, B); México (lei referj. da: ao art. 32 já mencionado acrescente-se na parte final "e em caso de acidente"). No caso brasileiro, deve-se inserir a previsão dos riscos somada às medidas previstas ou a prever pelos sistemas federal, estadual e municipal de defesa civil em caso de acidentes, evacuação, hospitalização das vítimas, alojamento das vítimas, alarme ou comunicação do evento etc). 10.11 Distribuição dos ônus e benefícios sociais do projeto O epia não fica isolado de outros estudos que tenham sido efetuados pelo próprio proponente do projeto ou requerente do licenciamento. A viabilidade técnica e econômica do projeto normalmente já foi considerada pelo referido requerente, ainda que o Estudo de Impacto vá indicar novos custos, principalmente no concernente "às medidas mitigadoras de impactos negativos". O epia tem o seu procedimento próprio, mas levará em conta os estudos que o precederam, inclusive no aspecto econômico. No balanceamento dos interesses em jogo na elaboração do projeto, serão identificados os prejuízos e as vantagens que advirão para os diversos segmentos sociais. Por exemplo: o número e a qualidade de empregos a serem criados pelo empreendimento, a distância do projeto da zona de residência dos empregados, a necessidade de migração e/ou de imigração para a mão-de-obra a ser empregada, as condições de sanidade profissional na atividade, a probabilidade de maior ou menor ocorrência de acidentes do trabalho, a possibilidade da utilização de deficientes físicos na atividade, o emprego de reeducandos egressos de penitenciárias, e, quando o projeto for de grande porte, sua influência na distribuição de renda, considerada a região e o próprio país. Importa salientar que no item que prevê esta análise (art. 6Ü, II, da Resolução 1/86-conama), também se determina o estudo dos efeitos a "médio e longo prazos". Um dos efeitos sociais do projeto, dependendo da intensidade com que uma atividade for exercida (p. ex.: a mineração), poderá resultar no exaurimento dos recursos do subsolo, com prejuízo das futuras gerações. Legislação estrangeira: Estados Unidos (lei referida, sec. 102, IV), cumprindo apontar que essa norma legal dá como uma tarefa da nação "cumprir as responsabilidades de cada geração como garantia do ambieri' te para as sucessivas gerações" (sec. 101, b). ....... ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 227 10;7 Análise do desenvolvimento sustentado O princípio do "desenvolvimento sustentável", explicitado nos Prin-' os 3 e 4 da Declaração do Rio de Janeiro/92: "O direito ao desenvolento deve ser exercido de forma tal que responda eqüitativamente às V' cessidades ambientais e de desenvolvimento das gerações presentes e f turas" (n. 3). e "a fim de alcançar o desenvolvimento sustentado a roteção ao meio ambiente deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada de forma isolada". O princípio do desenvolvimento sustentado - que perpassa toda a Declaração do Rio de Janeiro/92 e que foi insistentemente proclamado no Relatório da Comissão Brundtland (1987) - é obrigatório para o Brasil, pois foi acolhido no art. 225, caput, da CF, quando impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Esse direito-dever entre gerações introduz uma nova temática no conteúdo do epia. Após a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 passou a haver necessidade da análise ecológica, social e econômica dos usos, hábitos, procedimentos e necessidades, em seu aspecto prospectivo, levando-se em conta as gerações futuras. A Resolução 1/86-conama explicita a obrigação do estudo a curto, médio e longo prazos do impacto ambiental.22 O estudo prospectivo das gerações não é tarefa isenta de dificuldades. Mas essa análise haverá de considerar o passado, o presente e o futuro de cada recurso ambiental, anotando as variações de uso, a qualidade e a quantidade desses recursos na história humana e ambiental Principalmente no que concerne à área de influência do projeto. O Direito Ambiental, ao exigir essa nova abordagem, passa a incorporar concretamente no procedimento de epia um componente ético em relação às gerações não presentes ou futuras mostrando que não se esta agindo de uma forma comprometida e egoísta em relação à herança ambiental a ser transmitida. •'J Análise jurídica do projeto A legislação federal não expressou com clareza a necessidade de er incluída uma análise jurídica no epia. E um lapso a ser preenchido pelos órgãos públicos ambientais, prin-'Palrnente quando emitirem "termos de referência" para a elaboração 22- P. A. L. Machado, Estudos de Direito Ambiental, p. 166. 228 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO do epia. Contudo, se os referidos termos não forem apresentados órgãos públicos ambientais poderão solicitar a análise jurídica do pro; to, antes de seu pronunciamento final. Dessa forma, um ou mais Adv0 gados passarão a integrar a equipe multidisciplinar. Na "Reunião Mundial das Associações de Direito Ambiental", rea_ lizada em Límoges, França, em 1990, em preparação à Conferência do Rio de Janeiro/92, na Recomendação 6, sobre "Estudos de Impacto Ambiental", foi sugerido que o conteúdo desses estudos contenha "a explicitação do Direito aplicável ao projeto, inclusive as convenções internacionais, apontando-se as regras jurídicas a serem aplicadas para limitar ou reduzir os efeitos do projeto sobre o meio ambiente e a verificação de eventual inexistência de regras jurídicas apropriadas". Podemos citar, como exemplo, no Direito Comparado, a Lei de Bases do Meio Ambiente do Chile, que, no conteúdo do epia, previu "plano de cumprimento da legislação ambiental aplicável" (art. 12, g, da Lei 19.300, de 1.3.1994). No Código de Meio Ambiente do Município de Paulínia/SP (Lei 2.094, de 18.6.1997, Semanário Oficial da Prefeitura Municipal de Paulí-nia de 27.6.1997) constou como diretrizes gerais: "III - apresentar uma análise jurídica do projeto, no qual serão comparadas as aplicações da legislação federal, estadual e municipal pertinentes, inclusive as convenções internacionais cabíveis e que o Brasil tiver ratificado" (art. 9a, § 2e). No Código de Meio Ambiente do Município de Franca/SP (Lei Complementar 9, de 26.11.1996, projeto de autoria do vereador Dr. Joaquim Pereira Ribeiro) consta, também, a obrigação da "análise da situação jurídica do projeto" (art. 16, § Ia) e que a equipe multidisciplinar, além de outros especialistas, deverá estar integrada por um especialista em Direito Ambiental (art. 16, § 2).23 Com a inclusão da análise jurídica mencionada, ficarão mais fáceis a compreensão do epia/rima e o transcorrer da Audiência Pública, possibilitando sejam sanadas, a tempo, possíveis irregularidades no procedimento e a adaptação dos objetivos do projeto ao quadro legal. Acelera-se, inclusive, a marcha do procedimento. 11. O proponente do projeto ou empreendedor Essa denominação foi utilizada no Decreto 88.351/83 (art. 18, § 2Ü). A expressão é mais ampla do que requerente do licenciamento, p°'s lei. 23. O Autor participou como consultor jurídico na elaboração dos anteprojetos de ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 229 todas as atividades explicitadas tanto na Lei 6.803/80, como na flS -0 i/86-coNAMA, independentemente de o empreendedor do pro-*to°não necessitar de licença. Je q EPIA a ser realizado dependerá do projeto apresentado. Assim, se ieto for modificado, o epia deverá, também, abranger a modificação'apresentada. Conforme já foi referido, a legislação estadual poderá encarregar-de ser a responsável por repassar os recursos para a equipe multidisci-linar e, então, o proponente do projeto deverá efetuar o pagamento das despesas à Administração Pública. A Resolução 1/86-conama foi elogiável ao abranger as despesas do "acompanhamento e monitoramento dos impactos" (art. 8a) entre aquelas que "correrão por conta do proponente do projeto". Interessa que a obra e/ou atividade sejam seguidas após o licenciamento, não só pela Administração Pública, como pelo próprio empreendedor. Não pode haver epia sem prévia intervenção do órgão público ambiental. Assim, diante do que dispõem os arts. 5a, parágrafo único, e 6°, parágrafo único, da Resolução 1/86-conama, não pode o proponente do projeto apresentar o rima ao órgão ambiental, sem que este previamente tivesse conhecimento de sua elaboração. 12. Os consultores do estudo e a responsabilidade civil e penal do empreendedor A Resolução 237, de 19.12.1997, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (DOU 22.12.1997, pp. 30.841-30.843), em seu art. 21 revogou os arts. 32 e 7fl da Resolução 1, de 23.1.1986. O art. 7a da Resolução conama 1/86 diz: "O Estudo de Impacto rnbiental será realizado por equipe multidisciplinar habilitada, não ePendente direta ou indiretamente do proponente do projeto e que será sPonsável tecnicamente pelos resultados apresentados". A revogação do aludido art. 1- foi a culminância de uma longa luta conama, de pessoas e de grupos que se insurgiam contra a possibilie de alguma independência na elaboração do epia. Não só grupos est j ' mas entidades paraestatais queriam atribuir a realização do , a seus próprios empregados. p ,, Um grave retrocesso na legislação ambiental brasileira. A indede<j enC'a a eclu'Pe multidisciplinar nunca foi total diante do empreenÇoa r' clUe a contratava e a pagava. Deveria ter sido tentado o seu aperfeimento, e não sua extinção.) ...,-..(,,.. -.,.,, 230 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Com a revogação do art. 7a da Resolução conama 1/86, deve Se aplicado o Decreto 99.274, de 6.6.1990, que diz, em seu art. 17, § 2a. "O Estudo de Impacto Ambiental-EiA será realizado por técnicos habilj tados e constituirá o Relatório de Impacto Ambiental-RiMA, correndo as despesas à conta do proponente do projeto". O estudo será, portanto, realizado por um conglomerado de especialistas. Tratando-se o estudo de documento acessível ao público, evidentemente deve ele primar pela veracidade. A obrigação de estar de acordo com a verdade faz parte do "princípio da moralidade", um dos princípios fundamentais da estrutura administrativa (art. 37, caput, da CF). As opiniões apresentadas pelos especialistas ou "técnicos habilitados" devem constar integralmente no epia, e isto representa "obrigação de relevante interesse ambiental", conforme o art. 68 da Lei 9.605/98. Ninguém tem o direito de censurar as opiniões, propostas ou considerações apresentadas no estudo. A sonegação, ocultação ou mutilação do seu conteúdo pelo empreendedor, ou por qualquer outra pessoa, é causa de nulidade do estudo, que deverá ser refeito. Esses comportamentos tipificam o crime do art. 68 da Lei 9.605/98: "Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interessante ambiental: "Pena - detenção de um mês, e multa. "Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa." Quem elabora o epia deve ter habilitação específica, como manda o Decreto 99.274, de 6.6.1990. Qualquer pessoa pode requerer ao órgão público ambiental que informe qual a habilitação dos técnicos que elaboraram o estudo, como qualquer dos legitimados para a ação civil pública pode pedir judicialmente a nulidade de um estudo de que tenha participado consultor não qualificado. Notório é o prejuízo da intervenção desse consultor desqualificado, e ao empreendedor incumbe provar que sua atuação não acarretou dano à credibilidade e idoneidade do estudoDizia o art. 1- mencionado que a equipe multidisciplinar será "responsável tecnicamente pelos resultados apresentados". A partir de 22 de dezembro de 1997, quando entrou em vigência a Resolução 237/97-conama, quem tem responsabilidade pela elaboração do epia é o empreendedor. No regime da responsabilidade civil objetiva ou sem culpa da Lei 6.938/81 (art. 14, § lü) não interessa apurar se os técnicos agiram com dolo ou com negligência, imperícia ou imprudência na elaboração do estudo. Pelas omissões e erros do Estudo de Impacto e de seu Relatório responde civilmente, de forma direta, o empreendedor ou nrononente dn nrnipfn ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 231 O empreendedor responde criminalmente pela inidoneidade na elaacão do epia ou de qualquer outro documento em que informe à Adistração Pública. Não se duvida de que o epia é relevante, tanto as111 nue a CF o inseriu em seu art. 225, § Ia, IV. O empreendedor tem, S1 gavelmente, o dever legal de cumprir a obrigação de relevante inte'esse ambiental de bem elaborar o epia. Os Estados brasileiros têm o direito de instituir normas legais que disciplinem a equipe multidisciplinar de forma mais exigente do que aquela contida na Resolução do conama. O Estado do Rio Grande do Sul disciplinou a matéria da seguinte forma: "Art. 74. O estudo prévio de impacto ambiental (eia) e o Relatório de Impacto Ambiental (rima), serão realizados por equipe multidisciplinar habilitada, cadastrada no órgão ambiental competente, não dependente direta ou indiretamente do proponente do projeto e que será responsável tecnicamente pelos resultados apresentados, não podendo assumir o compromisso de obter o licenciamento do empreendimento. "§ lü. A empresa executora do eia/rima não poderá prestar serviços ao empreendedor, simultaneamente, quer diretamente, ou por meio de subsidiária ou consorciada, quer como projetista ou executora de obras ou serviços relacionados ao mesmo empreendimento objeto do estudo prévio de impacto ambiental. "§ 22. Não poderão integrar a equipe multidisciplinar executora do eia/rima técnicos que prestem serviços, simultaneamente, ao empreendedor" (Código Estadual do Meio Ambiente24). 13. Participação do público <» ' -' "> »(Hil iA possibilidade de a população comentar o epia foi - desde a concepção deste instrumento de prevenção do dano ambiental - um de seus mais importantes aspectos. Pode não ocorrer efetiva participação do Publico pela ausência de comentários; contudo, não se concebe epia sern a possibilidade de serem emitidas opiniões por pessoas e entidades "lue não sejam o proponente do projeto, a equipe multidisciplinar e a Administração. O público que opina sobre o epia pode ser constituído de nacionais u estrangeiros. Não se exige a cidadania para expressar um ponto de 24 Lei 11.520, de 3.8.2000 (DOE de 4.8.2000). 232 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO vista no procedimento analisado. Cientistas, isto é, pessoas especializadas em determinado ramo do saber, podem estar entre aqueles que querei manifestar-se, pois a ciência, evidentemente, não é domínio exclusivo da equipe multidisciplinar. O Prof. Joseph P. Tomain, comentando o sistema norte-americano onde as agências oficiais estão encarregadas de elaborar o epia, diz: "As agências do Governo não têm ideado soluções para o que agora parecem ser os intratáveis problemas das instalações nucleares tais como a evacuação de emergência, a desativação das instalações e o destino final dos resíduos. A inadequada confiança pública nessa perícia tem parcialmente retirado as garantias cívicas e tornado preclusa a efetiva participação dos cidadãos no processo político". Acrescenta o jurista da Faculdade de Direito de Cincinatti: "embora os peritos possam ajudar a iluminar as informações tecnocientíficas, eles não estão mais bem equipados do que o público para avaliar os valores inerentes às escolhas na política pública".25 "Mesmo se os especialistas são em geral melhores juizes dos riscos, só a participação do público oferece esperanças sérias na criação de um conjunto de cidadãos esclarecidos necessário para uma gestão eficaz dos riscos - a longo termo."26 "A legitimidade das decisões políticas em matéria de ambiente é função não somente de sua pertinência, mas igualmente do processo pelo qual foram tomadas. Aqueles a quem se solicita suportar os riscos, tiveram ocasião de dizer se eles o julgam aceitáveis?"27 "A clareza é o fator chave para o controle da poluição. O medo das causas secretas e o próprio medo estão situados nas raízes das objeções para aprovar o desenvolvimento. Portanto, clareza, publicidade e avaliação pelo público das opiniões dos especialistas nas quais se fundamenta um julgamento equilibrado - são essenciais. Justo não se aceitar que as autoridades adotem a postura 'nós conhecemos mais', afirmando onisciência e marginalizando opiniões como irracionais."28 Na legislação estrangeira podemos mencionar: França (lei referida: art. 2- - Decreto - em Conselho de Estado - "precisará as modalida25. "Law and policy in the activist state: rethinking nuclear regulation", in Rutgers Law Review, v. 38, n. 2, Winter, 1986, pp. 219-238. 26. M. A. Prabhu, comentário do livro Regulating Industrial Risks: Science, Hazards and Public Protection, in Recueil International de Législation Sanitaire, v. 38, n. 4, pp-980-987. 27. T. F. Schrecker, L'Élaboratian des Politiques en Matière de VEnvironnement, p. 124. 28. Lord Nathan, Presidente do Subcomitê da House ofLords para a Comunidade Européia - Instalação do Garner Environmental Law Lecture, Londres, Fencing oul Éden, 1987, p. 29. , , ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 233 de aplicação deste artigo, fixando notadamente as condições nas s o Estudo de Impacto será publicado". O epia faz parte do procedi-to submetido à consulta pública - Decreto de 12.10.1977. Lei de "'Wy 1983 dá novas linhas à consulta pública); Quebec - Canadá (Lei j 1 11.1980 - art. 31.3 - "Após ter recebido o Estudo de Impacto Ambiental, o ministro o torna público e indica - ao proponente do pro-•et0 - empreender a etapa de informação e de consulta pública, prevista oOr regulamento do governo"); Noruega (lei referida - o relatório deve ser público e aberto à inspeção de qualquer pessoa - sec. 15); Suíça (lei referida: art. 9-8: "Cada um pode consultar o Relatório e os resultados do Estudo de Impacto Ambiental..."); Argélia (lei referida: decreto "fixará as condições em que o Estudo de Impacto será tornado público" -art. 131); Comunidades Econômicas Européias (art. 6-2: "Os Estados-membros providenciarão: - para que todo o pedido de autorização, assim como as informações recolhidas nos termos do art. 5U, sejam colocados à disposição do público; - para que seja dada ao público especificado a possibilidade de exprimir sua opinião, antes que o projeto seja encetado; art. 6-3. As modalidades desta informação e desta consulta são definidas pelos Estados-membros, que podem notadamente, em função das características particulares dos projetos ou dos locais concernentes: determinar qual o público especificado; precisar os locais onde as informações poderão ser consultadas; detalhar o modo pelo qual o público poderá ser informado, por exemplo, por cartazes num determinado espaço territorial, publicações nos jornais locais e organização de exposições com planos, desenhos, quadros, gráficos e maquetes etc; determinar o modo como o público deve ser consultado, por exemplo, por consulta pública e/ou soumission écrite, fixar prazos apropriados para as diversas etapas do procedimento, com a finalidade de assegurar uma tomada de decisão em prazos razoáveis"); Itália (lei referida: art. 6-9: qualquer cidadão, em conformidade com a lei em vigor, poderá apresentar, por escrito, ao Ministério do Ambiente, ao Ministério dos Bens ulturais e Ambientais e às regiões interessadas, observações ou pareeres sobre a obra sujeita à avaliação de impacto ambiental ..."); Países a'xos (Lei 211, de 23.4.1986 - sec. 41: "prescreve que o relatório everá ser tornado público, especificando que deverão constar as datas, Orarios e lugar onde o relatório poderá ser inspecionado, bem como "o órgão oficial e o período no qual qualquer pessoa - poderá Presentar comentários escritos"); Grécia (lei referida: art. 5a-2: "O c°nsemo Departamental competente toma conhecimento do estudo v "Cernente às incidências sobre o ambiente, e, antes que ele seja apro°> mforma a todos os cidadãos e seus representantes, visando a que es Oprimam sua opinião. O procedimento de informação será fixado 234 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO por decreto do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e dos Trabalhos Públicos"); México (lei referida: art. 33, primeira parte-"Uma vez apresentada a manifestação de impacto ambiental e satisfeitas as exigências formuladas pela autoridade competente, qualquer pessoa poderá consultar o expediente correspondente"). 13.1 Pedido do proponente do projeto e comunicação pela imprensa O art. 10, § Ia, da Lei federal 6.938, de 31.8.1981, diz: "Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial do Estado, bem como em um periódico regional ou local de grande circulação". A Resolução 6/86-conama dá instruções de como fazer essa publicação e determina que o público tenha notícia acerca da determinação do epia, sendo importante assinalar que os modelos 1 e 2, respectivamente para publicação de requerimento de licença em periódico e em Diário Oficial, inseriram expressamente o seguinte: "(nome da empresa - sigla) torna público que requereu a (nome do órgão onde requereu a licença), a (tipo de licença) para (atividade e local). Foi determinado Estudo de Impacto Ambiental ou não foi determinado Estudo de Impacto Ambiental". O cumprimento tanto da Lei 6.938/81 quanto da Resolução 6/86 é fundamental para revestir o epia de total legalidade. A população tem o direito indubitável de tomar conhecimento acerca de uma atividade pretendida ou de uma obra projetada e se irá ser realizado um epia. A população poderá acompanhar a realização do estudo, impugnar - desde a contratação - a equipe multidisciplinar e, também, tentar preparar-se para a fase de comentários e de Audiência Pública. 13.2 Acesso ao epia/rma e sigilo 13.2.1 Sigilo "' K O Decreto 88.351/83 diz em seu art. 18, § 3a: "Respeitada a matéria de sigilo industrial, assim expressamente caracterizada a pedido <J° interessado, o rima, devidamente fundamentado será acessível ao público". O art. 11 da Resolução 1/86-conama diz, em sua primeira frase-"Respeitado o sigilo industrial, assim solicitado e demonstrado pelo ifl' teressado, o rima será acessível ao público". ... ;. .- ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 235 Ao ser lido o art. 11 da Resolução 1/86-conama, temos que fazer leitura conjugada com o art. 225, § Ia, IV, da Constituição Federal j 1988 que obriga a ampla publicidade não só do rima, como de todo Estudo Prévio de Impacto Ambiental. O segredo industrial é protegido conforme a legislação existente naís. O acesso ao epia/rima não foge à norma geral do segredo industrial e comercial. Há três momentos que se entrecruzam na observância Ho segredo nos documentos existentes no rima: "a invocação do segredo a demonstração de que há a proteção da matéria pelo segredo industrial e a verificação pela Administração Pública ambiental de que a matéria está protegida pelo segredo, com sua decisão de retirar a matéria do acesso ao público". Invocar e demonstrar a ocorrência do segredo são ônus do requerente do licenciamento. A determinação ou não do segredo é matéria sujeita ao controle do Judiciário, que poderá verificar da ocorrência dos motivos e declarar ou não a ilegalidade do ato da Administração ambiental. Na legislação estrangeira registramos: Noruega (lei referida, sec. 14: "a Administração pode ordenar que certas partes do Estudo de Impacto permaneçam confidenciais"); Suíça (lei referida, 9-8: "cada um pode consultar o Relatório e os resultados do Estudo de Impacto Ambiental, a menos que os interesses preponderantes privados ou públicos exijam respeito a segredo; o segredo de fabricação e de negócios é protegido em todos os casos"); Comunidades Econômicas Européias (diretriz referida, art. 10, primeira parte: "as disposições da presente Diretriz não afetam a obrigação das autoridades competentes de respeitarem os limites impostos pelas disposições regulamentares e administrativas nacionais e pelas práticas jurídicas estabelecidas em matéria de segredo de empresa e de segredo comercial, assim como matéria de Proteção ao interesse público"); México (lei referida, art. 33, segunda parte: "os interessados poderão solicitar que se mantenha reservada a n ormação que tenha sido integrada ao expediente, que, sendo publicada, erá afetar direitos de propriedade industrial ou interesses lícitos de natureza mercantil"). l3-2-2 Acesso ao epia/rima art i~> ÍUnament0 constitucional da publicidade do rima está tanto no Qup IV' como no art- 5ü> XXXIV, sob pena de responsabilidade de em negar a informação. sÊgü ,art; ' !> caput, da Resolução 1/86-conama diz acerca do rima -a frase: "Suas cópias permanecerão à disposição dos interessa- 236 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO dos, nos centros de documentação ou bibliotecas da ibama e do órgg0 estadual de controle ambiental correspondente, inclusive no período de análise técnica". Ainda que não esteja escrito nesse artigo, mas decorrente de toda a estrutura da resolução comentada, sendo o epia determinado pelo Município, o epia/rima municipal ficará acessível nas bibliotecas ou centros de comunicação existentes. A fase de comentários do epia/rima só poderá começar após o documento estar acessível ao público, isto é, já depositado num centro de documentação. Para divulgar melhor o rima e torná-lo acessível - em toda acepção do termo - tanto a Administração Federal como estadual poderão depositar o rima em centros de documentação do Município (ou Municípios) onde se pretende implantar o projeto. Essa acessibilidade deverá ser permanente, isto é, nos horários de funcionamento desse centro de documentação. Se a cópia integral do epia/rima (excluída a parte secreta, se houver) for retirada do centro de documentação, suspensa está a acessibilidade. Portanto, incumbe à Administração Pública fornecer cópias aos interessados, ainda que através de pagamento das cópias. Recapitule-se que o proponente do projeto só está obrigado a fornecer cinco cópias do rima à Administração Pública ambiental (art. 8fi da Resolução 1/86-conama). Os órgãos públicos interessados no rima poderão receber cópias desse documento.29 Não há, contudo, obrigação do órgão ambiental transmitir as cópias de forma gratuita e, assim, os outros organismos públicos (Administração direta ou indireta) que quiserem cópias do rima deverão pagá-las. No Uruguai, a Lei 16.466, de 19.1.1994, prevê, entre os requisitos mínimos, que deve conter pedido de autorização ambiental: "o resumo do projeto em termos facilmente compreensíveis que contenha as particularidades essenciais do mesmo, assim como os efeitos que possam decorrer de sua execução" (art. 10, d). Esse resumo deverá ser acessível ao público, que será comunicado através de publicação no Diário Oficial e em outro diário de circulação nacional (art. 13). 13.2.3 Acesso ao epia/rima integral Não existem dois epia/rima - um para a Administração e outro o público. Excluída a parte do segredo industrial e comercial - se houver, for demonstrado e constatado pela Administração - todos os 29. Art. 11, § Ia, da Resolução 1/86-conama. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 237 ntos destinam-se ao público e à Administração. O segredo é a excedo no epia/rima. Esse o sentido aliás do Decreto 88.351/83. O conama, rtanto, não pode legalmente prever dois tipos de comunicação do epia/ ima, como o fez na resolução referente ao Estudo de Impacto Ambiental licenciamento de hidrelétricas. Fere a letra e o espírito da Constituição Federal (art. 225, § Ia, IV) somente houver a apresentação para consulta do RiMA-Relatório de Impacto do Meio Ambiente, com a exclusão das outras partes que compõem o EPiA-Estudo Prévio de Impado Ambiental. 13.3 Fase de comentários 13.3.1 Conceito - Quem pode comentar - Reabertura da fase de comentários I Os comentários podem ser feitos por qualquer pessoa (nacional ou estrangeira), pelas associações ambientais (não se exige — neste caso -um ano de existência legal), por associações que não tenham finalidade ambiental, por sindicatos, universidades, partidos políticos, as tribos indígenas, Ministério Público e organismos da Administração direta e indireta de qualquer esfera (federal, estadual e municipal). O próprio proponente do projeto pode apresentar seus comentários ao epia/rima. Os comentários são escritos. Não têm forma prevista, podendo ser apresentados manuscritos ou datilografados; pode-se exigir recibo de sua entrega ao órgão público ambiental. A fase de comentários pode ser reaberta. Essa reabertura não está prevista na resolução, mas poderá ocorrer legalmente: os comentários estinam-se a discutir o rima devidamente executado e não podem comentar um rima a que faltem elementos previstos na própria Resolução ''W-CONAMA. Nesse caso, a fase de comentários deve ser reaberta até que se pos-comentar o conteúdo do rima e não só apontar a quebra de regularize em seu procedimento. •2 Comunicação da abertura '..• . . da fase de comentários -..-:, eXecu '5 ° art- ! 1, § 2Ü, da Resolução 1/86-conama: 'Ao determinar a Çao do epia e apresentação do rima, o órgão estadual competente 238 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 30 ou o ibama30 ou, quando couber, o Município, determinará prazo recebimento dos comentários a serem feitos pelos órgãos públicos demais interessados ...". Alie-se este artigo da Resolução 1/86 com a Resolução 6/86 e essas duas resoluções com o art. 10, § l2, da Lei 6.938/81: desse entrosamento de diplomas podemos extrair a conclusão de que a Resolução 6/86conama manda que se publique na imprensa oficial e em periódico de grande circulação no local ou na região a notícia de que foi ou não determinado epia. Não há duas publicações para essa intervenção ou ação da Administração. Natural que a Administração aproveite desincumbir-se dessa obrigação legal, também, comunicando pela imprensa a época em que será aberta a fase de comentários. Não há texto expresso que prescreva deva assim agir a Administração (seria oportuno acrescentar-se essa publicação na Resolução 1/86). Mas, desde já, insista-se que a Administração não pode querer agir na sombra e longe da fiscalização da população, pois, como é curial, a Administração deve agir em nome e para o povo. Se não houvesse comunicação pública - pelos meios normais de comunicação social — a fase de comentários seria praticamente inexistente, representando um engodo de participação pública, pois ninguém poderia comentar o que ignora esteja pronto para ser comentado. Como salientam Geesaman e Abrahamson: "O uso sensato da tecnologia alcançável numa sociedade democrática será melhor obtido se baseado nos inputs pluralísticos e nas confrontações abertas dos adversários, do que nos relatórios unilaterais ou julgamentos de instituições monolíticas".31 13.3.3 Duração da fase de comentários A duração da fase de comentários não foi prevista na legislação que trata do epia em nível de norma geral federal. É uma falha que não se pode ocultar e que precisa ser sanada. Como está, fica ao prudente critério da Administração Pública ambiental, que, entretanto, poderá sucumbir a pressões indevidas, mas encontradiças. Nenhum Estudo de Impacto criterioso e não superficial será feito num período menor do que trinta dias (para obras e atividades em regiões 30. V., neste livro, Tít. III, Cap. II, item 4, "O meio ambiente na Administração Federal". 31. Cit. por Speth, "The federal role in technology assessment and control", in Federal Environmental Law. . . ,., , • . ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 239 riorrnente bem estudadas e que não apresentem os projetos maior aI1 nlexidade). Assim, o público que não é composto necessariamente ° especialistas e que não poderá dedicar seu tempo integral à revisão j estudo, necessitará também pelo menos de um período mínimo de 10 dias para examinar e comentar o rima apresentado. O Poder Judiciá-• jnesmo diante do silêncio da legislação, ponderando o dever de publi-idade do epia - mandamento da Constituição (art. 225, IV) -, poderá, com justiça, declarar arbitrário e com desvio de finalidade o ato administrativo que determinar uma fase de comentários menor do que 30 dias. No Estado da Bahia o Decreto 26.687, de 11.2.1982, prevê em seu art. 93, caput: "Para as atividades sujeitas ao Sistema de Licenciamento caberá à cra realizar o Estudo Preliminar do Impacto Ambiental, cujo resultado poderá ser: I - resultado de impacto não significativo; II -resultado de impacto significativo, quando o interessado deverá: a) publicar, através de órgãos de comunicação da imprensa, declaração sobre o projeto que pretenda implantar, requerendo os comentários da comunidade, num prazo de 45 dias, tempo em que colocará o projeto à disposição dos interessados em local e hora claramente divulgados". A regulamentação baiana prevê um tipo especial de comentário, que será realizado antes do epia da equipe multidisciplinar. Portanto, no Estado da Bahia, de forma elogiável, deverão ser levadas a efeito duas fases de comentários: antes do epia e depois deste. Assinale-se que a fixação do período de 45 dias dará chance dos interessados tomarem conhecimento do projeto e de passarem a acompanhar a elaboração do epia. A legislação estrangeira que previu a matéria é nesse sentido: França (lei referida, com a reforma da enquête publique -1983 - há além dos comentários, presença do "comissário-investigador" que recolhe os comentários e os apresenta diante da Administração, com seus próprios comentários); Países Baixos (legislação referida: sec. 41, t), prescreve que o rima deva ser publicado nas condições referidas, notadamente as Mencionadas na sec. 41, u (incluindo as datas, horários e lugar onde o relatório possa ser inspecionado, como também o órgão a que se devem submeter os comentários e o período em que eles podem ser ofereci-r>s). A sec. 41, v, refere que o relatório deve, em qualquer caso, estar lsponível para inspeção por um período de um mês durante as horas de rabalho. A sec. 41, w, prescreve que os comentários escritos podem ser metidos em um Per'°do não menor do que um mês, a partir da data m que o relatório estiver disponível para inspeção. Tais comentários P°dem apenas relatar defeitos no relatório relativos ao cumprimento t5s d'retrizes das sec. 41, j, e 41, k, ou inexatidões que contenha o rela-tid'° °r so''c'taÇão da pessoa que apresenta seu comentário, sua iden-ade poderá ser conservada como confidencial; Itália (legislação refe- 240 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO rida: art. 6-3, última frase: "O anúncio da recepção do relatório deve ser publicado, sob responsabilidade do requerente do licenciamento, em quotidiano de maior difusão na região territorialmente interessada, e também em quotidiano de difusão nacional". O art. 6-9 afirma: "qualquer cidadão, em conformidade com a lei em vigor, pode apresentar sob forma escrita, ao Ministério do Ambiente, ao Ministério para os Bens Culturais e Ambientais e à região interessada, pedidos, observações, pareceres sobre a obra submetida à avaliação de impacto ambiental no prazo de 30 dias do anúncio do relatório do projeto"). No Chile (Lei de Bases do Meio Ambiente, DOU 44.810, 9.3.1994): "A Comissão ordenará que o interessado publique, a suas expensas, no Diário Oficial e em diário ou periódico da capital da região, ou de circulação nacional, um extrato, visado por ela, do Estudo de Impacto Ambiental apresentado. O referido extrato conterá: a) nome da pessoa natural ou jurídica responsável pelo projeto ou atividade; b) localização do lugar ou zona na qual o projeto será executado; c) indicação do tipo de projeto ou atividade; d) montante do investimento estimado; e) principais efeitos ambientais e medidas mitigadoras propostas" (art. 27). As organizaciones ciudadanas e as pessoas naturais, diretamente afetadas, poderão formular observações sobre o epia perante o organismo competente, dispondo de um prazo de 60 dias, contado da publicação do extrato. A Comissão ponderará nos fundamentos de sua resolução as referidas observações, devendo notificar a quem as tenha apresentado. As organizaciones ciudadanas e as pessoas naturais mencionadas poderão recorrer, quando suas observações não tiverem sido devidamente ponderadas na fundamentação da resolução (art. 29). 13.4 Audiência Pública 13.4.1 Introdução 1 A Audiência Pública era prevista na segunda parte do art. 11, § 2fl> da Resolução 1/86-conama. A Resolução 9-conama, de 3.12.1987, publicada no DOU de 5.7.1990, veio disciplinar a matéria. A fase de comentários prevista no art. 11, § 2Ü, da Resolução 1/86-conama fíca mantida. 13.4.2 Finalidade da Audiência Pública Diz o art. Ia da Resolução 9/87 que a Audiência Pública "tem p°r finalidade expor aos interessados o conteúdo do produto em análise" e o do rima (Relatório de Impacto Ambiental), "dirimindo dúvidas e rc" ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 241 lhendo dos presentes as críticas e sugestões a respeito". Conforme se °° do art. 225, § Ia, IV, da CF, darse-á "publicidade" ao Estudo Prévio ve |mpacto Ambíental-EPiA. Assim, a Resolução 9, votada em 1987 e só blicada em 1990, tem que ser entendida à luz da Constituição Federal P. ente. portanto, não só o rima, mas o próprio epia deve ser analisado Audiência Pública. Evidentemente, o que for de sigilo industrial ou omercial, devidamente invocado, provado e deferido pelo órgão licenciador, não constará nem do Estudo de Impacto, nem do relatório mencionado. Há uma dupla caminhada na audiência: o órgão público presta informações ao público e o público passa informações à Administração Pública. A Resolução 9/87 não prevê a exposição da equipe multidisciplinar, como também do proponente do projeto ou empreendedor. Contudo, não estando formalmente proibidos de intervir, a exposição da equipe e a intervenção na discussão do segundo não poderão ser interditadas. O citado Código Estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (Lei 11.530, de 3.8.2000) tornou obrigatória a presença na audiência pública "de representantes dos órgãos licenciadores, da equipe técnica analista e da equipe multidisciplinar autora do eia/rima, sob pena de nulidade" (art. 85, VI). 13.4.3 Convocação da Audiência Pública '" ' A audiência é obrigatória nos Estados cujas legislações assim o Previram. As Constituições dos Estados de Goiás (art. 132, § 32), Maranhão (art. 241, VIII), Mato Grosso (art. 263, parágrafo único, IV), Mato Grosso do Sul (art. 222, § 22, VI), Pernambuco (art. 215) e São aulo (art. 192, § 2S) previram a obrigatoriedade da audiência. Consoante a Resolução 9/87 passa a ser, também, obrigatória a udiência Pública quando requerida "por entidade civil, pelo Ministé-0 Publico ou por 50 ou mais cidadãos". A entidade civil não precisa ter suas finalidades estatutárias necessariamente a defesa do meio am-nte; não se exige prazo de existência da entidade, como não se re-er que a entidade tenha sua sede na área de influência do projeto. O Istei"io Público pode ser Federal e/ou Estadual, como pode ser de U omarca eou instârjcia funcional. A resolução refere-se a "ci- ' senc*0' P°is> de prudência que os requerentes apontem o nú-os SCUS tltu'os de eleitor no pedido. A solicitação apresentada pe-diên Uerentes legitimados vincula o órgão público, tanto que se a au-er 1£| regularmente pedida não for realizada, a "licença concedida não vahdade" (art. 2", § 2a, da Resolução 9/87). ..,„ , *«*,.» 1 242 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 13.4.4 Edital de recebimento do epia/rima > . Tem por objetivo comunicar aos interessados a possibilidade de solicitarem a Audiência Pública. Deve haver o espaço temporal de 45 dias entre a publicação do edital e o encerramento do prazo para apresentação do requerimento. É razoável que se interprete que sejam dias úteis diante do silêncio da resolução. A norma do conama não diz, mas é urna decorrência do princípio constitucional de "dar publicidade" que no período indicado (45 dias), o rima e o epia estarão acessíveis ao público. A regra do art. 2-, § l2, da Resolução 9/87 diz que o edital será veiculado "pela imprensa local". É de se entender que o "local" seja não somente o Município que sediará o projeto, como os Municípios abrangidos pela "área de influência do projeto" como também a bacia hidrográfica, onde se localiza (art. 5a, III, da Resolução 1/86-conama). Assim, a área de influência do projeto ultrapassando o Município sede do projeto, a expressão "imprensa local" atinge as várias localidades influenciadas pelo projeto, nelas devendo ser publicados os editais. Não há razão jurídica de se fazer uma única publicação de edital, quando o escopo da resolução e da Constituição Federal (art. 225, § lu, IV) é abrir a oportunidade de participação para todos os possíveis atingidos pelos efeitos do projeto, que potencialmente causará significativo impacto ambiental. 13.4.5 Designação da Audiência Pública - Data e local A Resolução 9/87 não apontou outro prazo além do prazo de 45 dias referentes à possibilidade de ser pedida a Audiência Pública. Assim, havendo a solicitação regular, nada impede que o órgão público ambiental designe, de imediato a Audiência Pública. Parece-nos que a Resolução 9/87-conama merece ser completada - ou pelo próprio Conselho Nacional do Meio Ambiente, ou pelos Estados, para que seja normatizado o acesso do público ao epia/rima. Poderá não atingir sua autêntica finalidade, uma audiência para a qual não se deu concreta oportunidade de se conhecer - na sua inteireza - o epia. Assim, é preciso que se estabeleçam regras indicando quantos exemplares dos epias/ rimas ficarão disponíveis para consulta, a possibilidade dos exemplares serem ou não retirados para a extração de cópias, o local ou locais e horários de consulta. A ausência desses pormenores pode conduzir ao fracasso da audiência, que lamentavelmente, sempre será tentado pelos que - de modo franco ou sub-reptício - destróem ou querem destruir ° meio ambiente. ......... ... . .. -. .-..;.* ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 243 Io Estado do Rio Grande do Sul, a audiência deverá ser convocada antecedência mínima de 30 dias, sendo o edital publicado no Diá-c. oficial do Estado e em periódicos de grande circulação em todo o Fstado, devendo ser enviada correspondência registrada aos solicitantes , audiência (art. 85 do Código Estadual do Meio Ambiente - Lei 11.520, Se 3.8.2000). A Resolução 9/87 determinou que o solicitante da Audiência Pública - no caso da entidade civil ou o Ministério Público - e os solicitantes em se tratando dos cinqüenta ou mais cidadãos sejam cientificados -por correspondência registrada - da designação da Audiência Pública. Valoriza-se, assim, aqueles que se interessaram em agir pedindo a audiência. Além disso, obrigatória é a publicação "em órgãos da imprensa local" (art. 2a, § 3a, da Resolução 9/87). Na escolha do local da audiência no que tange ao Município, é de se considerar a "localização geográfica dos solicitantes" da audiência e "a complexidade do tema" (art. 2a, § 5a, da Resolução 9/87). A resolução não obrigou o órgão público ambiental a fazer mais do que uma audiência, mas orientou-o, com sabedoria, que estando os solicitantes em locais diferentes ou sendo a matéria complexa haveria utilidade ou seria aconselhável mais de uma audiência. O órgão público tem em suas mãos o poder discricionário, mas não arbitrário, de decidir pela realização de uma ou mais audiências. Mas na opção que fizer, deverá mostrar os motivos de sua decisão e analisar os dois fatores do art. 2-, § 5-, referidos. , ... , 13.4.6 Direção e procedimento da audiência > A direção da audiência caberá ao órgão licenciador (art. 3Ü da Resolução 9/87). Diz o mencionado artigo que "após a exposição objetiva o projeto e do seu respectivo rima", "serão abertas as discussões". Três spectos sobre a exposição: a) a exposição deve ser objetiva. Isto quer 1Zer <lUe o expositor deve ser objetivo ou seja "que expõe as coisas sem curar relacioná-las com os seus sentimentos pessoais".32 Assim, ex-sição objetiva é a que não toma partido do projeto ou que se manifes-ontra o mesmo; é a abordagem imparcial e sem prejulgamento ou siç~ Preconceito; b) a resolução não especifica quem deva fazer a expo-rniuYH da °Sta ue esta taifa seJa cometlda aos membros da equipe nos P'nar ou aos membros do órgão público ambiental. PareceMUe a exposição não possa ser feita por uma das partes interessadas 'cionário Brasileiro da Língua Portuguesa, Mirador Internacional, p. 1.220. 244 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO na decisão favorável, isto é, a exposição perderia a objetividade se fosse feita pelo proponente do projeto ou requerente do licenciamento; c) a exposição deve versar não somente sobre o rima, mas também sobre o epia, como já foi dito anteriormente. As discussões serão abertas com "os interessados presentes". O já citado Código do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (Lei 11.520/2000) consagrou a "garantia de manifestação a todos os interessados devidamente inscritos" e a "garantia de tempo suficiente para manifestação dos interessados que oferecerem aportes técnicos inéditos à discussão" (art. 85, III e IV). Válida a afirmação de Gerard Monédiaire de que duas ocorrências extremas, mas freqüentes, permitem sentir os propósitos no pretendido debate participativo. "Seja a prática um pouco 'terrorista' encontrada em certos Estudos de Impacto, que se caracteriza pela superabundância de dados com pretensão científica, que parece ter, em realidade, o fim de impor silêncio a toda veleidade de objeção, porque oriunda de indivíduos ou grupos que, considerando seus capitais - culturais, escolares e profissionais -, estariam na impossibilidade de enunciar o que seja de aceitável em um terreno arbitrariamente imposto. No lado oposto encontra-se a petição tautológica do gênero 'os abaixo-assinados opõem-se ao projeto x, porque eles são contra'". Arremata dizendo "que não se pode, evidentemente, deixar de fazer a mais extrema reserva sobre a validade racional de um e de outro discurso".33 Aqui não se exige que os interessados portem comprovação de cidadania, isto é, que sejam eleitores. Brasileiros ou estrangeiros, moradores ou não da localidade, poderão participar da discussão. Caberá ao dirigente da audiência ordenar os debates. Entretanto, como a discussão será com "os interessados presentes" não está prevista a hipótese de ser recusada a palavra a um dos presentes. Maiores detalhes sobre o procedimento não só merecerão ser apresentados pelos órgãos ambientais estaduais, como também, pelos colegiados dos Estados. 13.4.7 Ata da audiência e juntada de documentação Diz o art. 4° da Resolução 9/87 que "ao final de cada audiência será lavrada uma ata sucinta". A brevidade ou a concisão da ata não pode prejudicar sua veracidade. A síntese da ata não pode evitar a constatação dos oradores que se pronunciaram e seu posicionamento, como, tam33. "À propôs de Ia décisíon publique en matière d'environnment", Les Transforma-tions de Ia Rélation Juridique, cit. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 245 , não pode ocultar os incidentes acaso ocorridos na sessão, como as terpelações ou protestos efetuados. Todos os documentos serão ane-' ados à ata, devendo os mesmos serem assinados, tanto podendo ser elos seus autores, como pelas pessoas que os entregam à presidência da audiência. A Lei 9.784, de 29.1.1999, que trata do processo administrativo no âmbito da Administração Federal, diz em seu art. 34 que "os resultados da consulta e Audiência Pública e de outros meios de partici-oação de administrados deverão ser apresentados com a indicação do procedimento adotado". Não está previsto na resolução, mas é correntio ou usual que quem recebe a documentação, passe recibo da mesma, o que pode ser feito na cópia da documentação apresentada. A não juntada da documentação pode acarretar a invalidade da ata, seja por via administrativa, seja por via judicial. A ata inverídica ou omissa pode ser regularizada pela via administrativa e/ou judicial. 13.4.8 A decisão do órgão licenciador e a Audiência Pública '' > Diz o art. 5Ü da Resolução 9/87 que "a ata da(s) audiência(s) públi-ca(s) e seus anexos servirão de base, juntamente com o rima, para a análise e parecer final do licenciador, quanto à aprovação ou não do projeto". A Audiência Pública é a última grande etapa do procedimento do Estudo Prévio de Impacto Ambiental. Inserida nesse procedimento com igual valor ao das fases anteriores, é ela, também, base para a "análise e parecer final". A Audiência Pública - devidamente retratada na ata e seus anexos - não poderá ser posta de lado pelo órgão licenciador, como o mesmo deverá pesar os argumentos nela expendidos, como a documentação juntada. Constituirá nulidade do ato administrativo autorizador-que poderá ser invalidada pela instância administrativa superior ou por Vla judicial - quando o mesmo deixar de conter os motivos administrados favoráveis ou desfavoráveis ao conteúdo da ata e de seus anexos. Deve ser frisado que a Audiência Pública poderá ser repetida -sem •niite de vezes - diante da constatação de vícios formais do epia e do 1MA. Sanados esses vícios, terão os interessados oportunidade de contar o mérito ou a fundamentação do epia/rima em outra audiência. •9 Legislação comparada / legislação estrangeira prevê a Audiência Pública para o epia: EUA °nselho de Qualidade Ambiental - Council on Environmental 246 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Quality - baixou diretrizes acerca da implementação da Lei de PolftjCa Ambiental Americana nepa: Diretriz 40 cfr, §§ 1.500 e ss. -1981, con. forme refere o Prof. Thomas J. Schoenbaum.34 O referido Conselho já houvera, em anterior Diretriz (Guidelines 40 cfr), ordenado que os órgãos administrativos deveriam deixar disponível ao público a cópia de Relatório de Impacto 15 dias antes da realização da Audiência Pública);35 Noruega (lei referida, sec. 16: uma reunião pública - concernente às atividades que podem causar maiores problemas de poluição deverá ter lugar, em todos os casos onde a avaliação de impacto ambiental tenha sido submetida. A autoridade ambiental deve organizar a reunião pública, em colaboração com o requerente da licença. A autoridade ambiental e o requerente da licença devem relatar as potenciais conseqüências da atividade na reunião pública, sendo que a reunião deve ser levada a efeito bem antes que a decisão administrativa seja tomada. A reunião não necessitará ser realizada se a atividade não for acarretar séria poluição, ou se a reunião pública tiver finalidade que possa ser coberta por outra legislação, em que se informe suficientemente); Canadá (lei de 1979, na qual se fundamenta o Decreto dors/84-467, de 22.6.1984: art. 11: "havendo efeitos nefastos sobre o ambiente, o projeto será avaliado através de exame público; art. 13: sem embargos dos efeitos do projeto, cada vez que as preocupações do público mostrarem que o exame público é desejável, este será realizado; art. 21: o exame público será realizado por uma "Comissão de Avaliação Ambiental", cujos membros serão nomeados pelo Ministro; art. 27: as audiências de uma comissão são audiências públicas, realizadas de modo informal, seguindo as regras determinadas, mas não judiciárias; art. 29: a comissão deve conceder ao público tempo suficiente para que tome conhecimento das informações que ela recebeu, para que o público possa fazer seus comentários a respeito"); Países Baixos (lei referida, sec. 41, x, traz disposições sobre os comentários orais na Audiência Pública). Na Colômbia, a Lei 99, de 22.12.1993, estabelece, em seu art. 72, as Audiências Públicas Administrativas sobre Decisões Ambientais em tramitação. O Procurador Geral da Nação ou o Delegado para Assuntos Ambientais, o Defensor do Povo, o Ministro do Meio Ambiente, as demais autoridades ambientais, os governadores, os prefeitos e pelo menos 100 pessoas, ou 3 entidades sem objetivo de lucro, poderão solicitar aAudiência Pública. Essa audiência poderá ser realizada antes da expedição da permissão ou licença ambiental, ou para a modificação ou cancelamento da mes34. Environmental Policy Law. 35. R R. Anderson, "The national environmental policy act", in Federal Environnxcn' tal Law. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 247 poderá, também, realizar-se Audiência Pública, durante a execução obra, quando for manifesta a violação das normas ambientais. U O órgão público ambiental e o epia 14 1 Relação do órgão público com o proponente do projeto O proponente do projeto - ou requerente do licenciamento ao dirigir-se ao órgão ambiental para o licenciamento da obra ou atividade pretendida receberá a determinação da elaboração do rima. Como já se assinalou há a obrigação legal da publicação do edital, avisando-se do pedido de licenciamento e se houve a determinação ou não do epia. Os órgãos administrativos ambientais, através de legislação estadual, poderão determinar ao proponente do projeto que pague as despesas do estudo diretamente à própria Administração Pública, repassando ela esses recursos à equipe multidisciplinar. O órgão público ambiental será o canal de comunicação preferencial entre o proponente do projeto de um lado e do outro lado a equipe multidisciplinar e o público. Nada impede, entretanto, que a equipe multidisciplinar e o público se comuniquem diretamente com o proponente do projeto. O órgão público, contudo, tem o poder de requisitar as informações para seu uso próprio ou para transferi-las à equipe multidisciplinar ou ao público. 14.2 Relação do órgão público ambiental v,, , ,. : ...,<v;:,u ' com os técnicos habilitados s;,!,-,; « c-:, i ,", t,-;;'i.'A Resolução 1/86-conama previu nos arts. 5fl, parágrafo único, e ""> parágrafo único, a possibilidade de a Administração ambiental formular diretrizes aos técnicos habilitados, seja individualmente, seja em §rupo. Essa fixação de diretrizes situa-se no início dos trabalhos de equiPe> não existindo, contudo, obstáculo legal para que o órgão ambiental ohcite esclarecimentos posteriores ao estudo ou acrescente diretrizes, esde que não sejam meramente protelatórias da decisão administrativa Ou não razoáveis. j _ O órgão ambiental deverá receber permanente comunicação da re-Çao das pessoas que integram a equipe multidisciplinar. É dever do gao bi q g qp p gao ambiental impugnar a participação de pessoa não habilitada e/ou a° lnscnta no Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos t 248 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO de Defesa Ambiental. O silêncio da Administração ambiental, contudo não convalida a irregularidade. 14.3 Relação do órgão público ambiental com o público ,., O epia somente poderá conseguir êxito em sua missão de prevenção do dano ambiental se a Administração Pública mostrar-se aberta à participação do público nesse procedimento. Além dos mecanismos legais que permitam a participação, há de ser mantido pelos servidores públicos responsáveis pela análise do Estudo de Impacto - a preocupação em conhecer e valorizar os argumentos da população envolvida e atingida pelos possíveis efeitos do projeto - esse posicionamento administrativo irá dimensionar o sucesso ou o fracasso do epia. A fase de comentários e a Audiência Pública caracterizam formalmente o relacionamento da Administração Pública com a população no procedimento do epia. Mas, evidentemente, a resolução do conama e os outros documentos legislativos não podem tudo prever. De nada adiantaria serem previstos comentários que não fossem suficientemente sopesados e respondidos. Seria mera aparência uma Audiência Pública, quando a decisão lá estivesse tomada ou não se permitisse nessa audiência a colheita de elementos de prova, trazidos por pessoas que não pertencessem à equipe multidisciplinar. 14.4 Licença Prévia e epia A "Licença Ambiental Prévia" é uma fase em que a Administração Pública mostra ao requerente suas pretensões, lastreadas estas no seu poder vinculado e no seu poder discricionário. Vinculada está a Administração àquilo que a legislação expressa ou implicitamente já exigir-Além disso, a Administração ambiental poderá acrescentar requisitos que a ciência e o interesse público lhe ditarem. A fase chamada de "Licença Prévia" pode coincidir com o epia, mas normalmente o estudo deverá anteceder a Licença Prévia. A Licença Prévia não gera direitos para o requerente, mesmo que tenha despendido recursos com o planejamento da obra ou da atividade-Trata-se, repita-se, de fase de estudo em que não há engajamento definitivo da Administração Pública com o pedido. Além disso, quando o projeto comportar o epia, qualquer decisão precipitada da Administraçã0 Pública licenciando antes do epia/rima é nula, e a nulidade pode ser pronunciada pela própria Administração Pública ou pelo Judiciário. I ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 249 lá 5 0 órgão público ambiental e os outros órgãos públicos no procedimento do epia -..-.;. piz o art. 11, § Ia, da Resolução 1/86-conama: "Os órgãos públi-que manifestarem interesse, ou tiverem relação direta com o proje-receberão cópia do rima, para conhecimento e manifestação". Nos três níveis de poder podem existir Ministérios, Secretarias de Estado ou órgãos da Administração indireta, que atuem paralelamente ao órgão especificamente ambiental. Não se trata, portanto, de fazer um rima para cada órgão, mas num só procedimento, fazer o inventário das opiniões e dos dados sobre o projeto a licenciar. A resolução não explicou o prazo que será dado aos órgãos públicos para estudarem o rima e para apresentarem sua manifestação. Parece-nos que o órgão público ambiental deverá apontar um prazo razoável para que os órgãos públicos se manifestem, pois dessa forma evitará a procrastinação da decisão final e não dará margem à nulidade da decisão, por impedimento de manifestação. A Resolução 1/86 merece ser alargada nesse parágrafo, para que fique constando a necessidade do envio de uma cópia do rima ao Curador do Meio Ambiente do Ministério Público Estadual e Federal, com a fixação de prazo para manifestação. O Ministério Público preparar-se-á, também, dessa forma para uma possível Audiência Pública ou formulará suas observações por escrito, à guisa de comentários, ou, finalmente, colherá dados para uma ação civil pública. '4.6 A decisão do órgão público ambiental Como já se afirmou, o epia visa principalmente a orientar a decisão a Administração Pública. O Estudo de Impacto, contudo, não afasta o ever da Administração Pública ambiental de verificar a fundamentado desse estudo. Para acolher ou para deixar de acolher as diretrizes do ia o órgão ambiental deverá fundamentar sua decisão. Não se exige u° Or§ão ambiental que faça um Estudo de Impacto paralelo ou um ontra-estudo", mas que verifique em profundidade o Estudo de Im-Pa«o apresentado. do esce notar que o órgão público, e, por via de regresso, os servi-S Públicos responderão objetivamente pelos danos que a decisão 1Strat'Va V'er a causar' mesmo que baseada no epia (a equipe r' como Já se apontou, responderá sob a modalidade sub-ou culposa). A Constituição Federal foi explícita no sentido de 250 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO que "as pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes nessa qualidade causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa" (art. 37, § 6a) Vale reiterar que todo o procedimento do epia flui para a fase de decisão administrativa. Se foi importante ingerir na legislação brasileira a independência da equipe multidisciplinar, importante, é, também, como já se apontou, conseguir-se uma estrutura independente para a Administração Pública ambiental em todos os níveis. Exemplifique-se com o cuidado tido pela lei canadense ao apontar os requisitos para a escolha das pessoas que compõem a "Comissão da Avaliação Ambiental" (lei de 1969 - Decreto dors/84-467, de 2.6.1984). Diz a referida lei (art. 22): "Os membros da Comissão devem: a) fazer provas de objetividade e não estar em situação onde haja risco e conflito de interesses quanto à proposição em estudo; b) estar ao abrigo da ingerência política; c) possuir conhecimentos particulares e experiência relacionada aos efeitos previstos da proposição, sobre os aspectos técnicos, ambiental e social". Ignacy Sachs afirma que o technological assessment nasceu da satisfação com os métodos tradicionais de decisão. Acrescenta que "para isso tem de se ter um órgão que tenha a máxima independência intelectual, do mesmo tipo de independência que tem o juiz, ou seja, o Judiciário, para que as pessoas que façam esse trabalho o façam no melhor de sua consciência profissional".36 14.7 Responsabilidade criminal dos servidores públicos e epia I O art. 15, § 2Ü, da Lei 6.938/81 (com a redação dada pela Lei 7.804/ 89) determina: "Incorre no mesmo crime a autoridade competente que deixar de promover as medidas tendentes a impedir a prática das condutas acima descritas". Uma das condutas a serem tomadas pela autoridade competente é a de que não se exponha a "perigo a incolumidade humana, animal ou vegetal" (art. 15, caput, da lei mencionada). A legislação brasileira, como a legislação da maioria dos países, consagrou o epia como o instrumento, por excelência, da prevenção da degradação ambiental. Incumbe, portanto, ao administrador público, que tenha a responsabilidade de decidir, a obrigação de não se omitir no exigir o epia. Acen36. In Jornal da Tarde, ed. 16.6.1984. • ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 251 que o termo "exigir" é incisivamente utilizado no texto do art. íü , q ys, IV, da CF. Exigir segundo as normas gerais federais (art. 24, § da CF), pois do contrário não haverá Federação, e sim Estados com regras isoladas e estanques. O epia deve ser exigido consoante dispõe o art. 2- da Resolução 1/ «6-conama, que aponta os casos em que não se pode dispensar o estudo todo o Brasil. Destarte, esse artigo usa a expressão "tais como" no mesmo sentido que o CC brasileiro a utilizou, em seu art. 99 - "São bens públicos: I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças". Isto é, tanto o rol de bens citados pelo Código Civil como as atividades e obras incluídas no art. 2a da Resolução 1/86 não esgotam os casos, podendo outros ser incluídos. Contudo, não se deixou ao arbítrio do administrador eximir ou dispensar as atividades e obras mencionadas, que são indubitavelmente obrigatórias. Acentuou a Reunião Mundial das Associações de Direito Ambiental na "Declaração de Limoges/90" que "os comportamentos que possam colocar em perigo o meio ambiente devem ser sancionados penalmente. Não se deve esperar que o meio ambiente seja danificado para só então se utilizar a sanção penal".37 Dessa forma, os servidores públicos, aí compreendidos aqueles em comissão, ou que exerçam cargo, emprego ou função em caráter transitório (art. 327 do CP), merecem ser enquadrados no art. 15, § 2-, da Lei 6.938/81, quando deixarem de exigir o epia cabível. '4.8 Indispensabilidade do epia e procedimentos preliminares As normas federais, estaduais ou municipais poderão prever casos em °iue rotineiramente serão realizados eias. Havendo essa previsão, os a °s dos órgãos públicos ambientais irão obedecer a essas normas, não cabendo a possibilidade de dispensa. , . O epia, conforme estatui o art. 225, § l2, IV, da CF, é o instrumento lco da análise da degradação potencial e significativa do meio ambien' ec°rrente do exercício de atividades ou da instalação de obras. Não Pode contornar o caminho que a Constituição Federal traçou, com i e senso de estratégia ambiental. Não é um formalismo escravizador; o contrário, é o uso da forma como garantia do exercício da liberdae viver num ambiente sadio e de harmonia entre os seres. ' Déclaration de Limoges, Université de Limoges, 1990. .1 ' 252 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO I I O TRF da 5a Região, com sede em Pernambuco, decidiu que elaboração do Estudo, com o Relatório de Impacto Ambiental, constitu' exigência constitucional para licenciamento de atividades potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente. O Relatório de Viabilidade Ambiental não é idôneo e suficiente para substituir 0 Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório".38 O procedimento consagrado pela Constituição Federal é complementado pela legislação infraconstitucional, que organiza uma série de atos e etapas de comportamentos, cujo cumprimento ou descumprimento terão como conseqüência o êxito ou o fracasso do objetivo fundamental da diminuição do dano ambiental. E a alavanca do êxito está na transparência do epia, isto é, na sua "publicidade", conforme as Constituições Federal e Estaduais. O conama elaborou a Resolução 279/2001, publicada no DOU de 29.6.2001, em que criou o RAsRelatório Ambiental Simplificado. O ras, segundo o art. l2, vai abranger linhas de transmissão de energia elétrica, gasodutos e oleodutos, usinas termoelétricas e usinas hidroelétricas "de pequeno potencial de impacto ambiental". Curtíssimos prazos foram fixados para o licenciamento ambiental, como se a proteção ao meio ambiente fosse a causa da dificuldade no fornecimento da energia elétrica... Para disseminar outros estudos ambientais, há os que afirmam que, não se sabendo se o impacto ambiental é significativo ou não, escolhe-se um estudo mais rápido; caso o impacto se mostre relevante, então seria elaborado o epia/rima. O argumento não é convincente. E preciso utilizar, desde o início, uma metodologia que possibilite aprofundado exame da natureza do impacto e um sistema de ampla participação do público, para que não se escondam os aspectos que possam vir a degradar o meio ambiente. O dano potencial não vem carimbado e com traços gritantes, demandando análise meticulosa para identificá-lo, indicar suas conseqüências e apontar, sem subterfúgios, os meios de o impedir ou reduzir. Na dúvida, emprega-se o princípio da precaução e deve-se escolher a metodologia que a Constituição Federal previu: o Estudo Prévio de Impacto Ambiental. O art. 6a da Resolução 279/2001 e o art. 8a, § 3a, da Medida Provisória 2.198-5, de 24.8.2001, são inconstitucionais ao fixarem o prazo de 60 dias para o licenciamento dos empreendimentos referidos. O Estudo Prévio de Impacto Ambiental está inserido na Constituição Federal. Mas, na prática, o texto constitucional vai sendo, dia a dia> solapado pela introdução de procedimentos preliminares que não têm 38. Ap. cível 5.173.820-CE, rei. Juiz José Delgado, j. 2.8.1994, DJU 23.9.1994. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 253 apidamente invalidados judicialmente. Com os astutos golpes desvios a prevenção dos danos ambientais no Brasil vai gradativamente ficando ineficaz, até aniquilar-se. a 9 Dos prazos para os órgãos públicos ambientais "O órgão estadual competente ou o ibamÁ ou, quando couber, o Município terá um prazo para se manifestar de forma conclusiva sobre o rima apresentado. > '; '' "Parágrafo único. O prazo a que se refere o caput deste artigo terá o seu termo inicial na data do recebimento pelo órgão estadual competente, ou pelo ibama, do Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo rima" (art. 10 da Resolução 1/86-conama). O caput do artigo mencionado não tem uma redação apropriada; contudo, pode ser razoavelmente entendida através do conteúdo do parágrafo único. Assim, os órgãos públicos devem ter prazos para manifestar-se sobre o epia e o rima, que o acompanha necessariamente. Esse artigo da resolução do conama não foi implementado pelas Administrações pertinentes. O princípio de que seja fixado um prazo limite para a manifestação ou decisão dos órgãos públicos dinamiza os serviços públicos e contribui positivamente para as atividades econômicas dos administrados.39 Contudo, nem a lei federal ordinária nem o conama têm competência para fixar prazos de licenciamento para Estados e Municípios, pois estariam saindo da generalidade da norma federal para descer a detalhes _ *uncionamento das unidades federativas, o que constitui uma invado de competência. 39. o Chile fixou o prazo de 120 dias para a Comissão Regional ou Nacional do . 5* Ambiente pronunciar-se sobre o eia ou, nesse prazo, solicitar esclarecimentos, Lei 1 qa?Ões e arnpliações desse Estudo (arts. 15 e 16 da Lei de Bases do Meio Ambiente, eu e 9-3.94); e o Paraguai fixou em 90 dias o prazo para que, após o exame do im'Se aProve ou se rejeite o projeto (art. 10 da Lei 294, de 31.12.93, sobre Avaliação de ta] . Ambiental). Nos países do chamado "Primeiro Mundo" o licenciamento ambien-"ti. a° e rapido. Escreveu o Prof. Robert A. Kagan (University of Califórnia, Berkeley): fit.ate d'sP0Sa' company that we studied took 12 years (including three lawsuits) to fegulatory approval for a local landfill facility in Califórnia, compared to five frorn"6"1 yearS inTheNetherlands andEngland, even though there was intenseopposition local rieiglibors and at least one appeal was involved" ("Trying to have it both ways: retion, central control, and adversarial legalism in American environmental '", Ecology Law Quarterly 25/721, n. 4, 1999). 254 I :' DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A aplicação de prazos que obriguem os órgãos públicos a decidir deve levar em conta o número e a qualidade dos servidores públicos atuando nas áreas específicas, frente aos procedimentos a serem exarainados. Não consulta ao interesse público e às necessidades sociais a precipitação e a superficialidade no processo de tomada de decisões. A. existência de prazos deve levar à responsabilização do servidor público omisso e negligente, mas não deve transformar-se, ardilosamente, em "autorização por decurso de prazo", o que contribuiria para o aumento da poluição e da degradação do ambiente e para o alijamento do Poder Público da questão. O decurso do prazo como manifestação de vontade da Administração Pública inverteria a hierarquia dos interesses a preservar e consagraria a supremacia do interesse privado frente à saúde ej ao meio ambiente. 15. Monitoramento e programa de acompanhamento O art. 6a, IV, da Resolução 1/86-conama prevê que o Estudo de Impacto conterá a "elaboração do programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos positivos e negativos, indicando os fatores e parâmetros a serem considerados". Como se vê do texto citado, o epia elaborará o programa de monitoramento, mas não compreende a sua realização, isto porque o monitoramento será feito após o licenciamento. Relevante programar o registro permanente e estruturado dos impactos que o projeto acarretará. O monitoramento, contudo, não esta contido no epia, dada a definição constitucional deste instituto, que deve ser prévio ao licenciamento. O que vier após a licença não faz parte do epia, mas irá servir de base para as posteriores renovações ou não dos licenciamentos. Na legislação estrangeira, citamos a da Itália (lei referida, art. 6fi, ->> em que a avaliação de impacto ambiental deverá conter o "plano o prevenção dos danos ao ambiente e de monitoramento" e a do Chi (Lei de Bases do Meio Ambiente, DOU 34.810, de 9.3.1994, art. 12, ê> A pretexto de que futuras correções poderão ser feitas através monitoramento ou do programa de acompanhamento, não devem sS __ fases posteriores ao licenciamento ser transformadas num salvo-cofl to para a poluição e para a agressão da biota. As medidas corretivas impactos negativos devem ser tomadas antes do licenciamento, se que o monitoramento irá aperfeiçoar as correções e verificar a acleQ ção das medidas tomadas. > . . r',r.';/ ,,..,/ i .... ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL 255 6 licitações e o epia A Lei 8.666, de 21.6.1993, em seu art. 3a, afirma que a licitação tina-se a garantir a observância do princípio constitucional da • C nomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administra- A proposta para oferecer vantagens à Administração não pode con-t r condutas que acarretem danos ao meio ambiente, pois incumbe ao Poder Público preservá-lo e defendê-lo para as presentes e futuras gerações (art. 225, caput, da CF). A Lei de Licitações, felizmente, colocou em seu texto a necessidade de ser considerado o impacto ambiental. Entre os requisitos a serem examinados nos projetos básicos e projetos executivos de obras e serviços, diz textualmente o caput do art. 12 que devem ser "considerados principalmente: ... VII - o impacto ambiental". Na interpretação jurídica leva-se em conta que na lei não há palavras inúteis. A Lei 8.666/93 indica, com clareza, ao empregar o termo "principalmente" que o exame de impacto ambiental é indispensável e não pode ser esquecido ou deixado de lado. A lei não parou no art. 12 na valorização do meio ambiente. Ela estabeleceu que as licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão à seguinte seqüência: I - projeto básico; II -projeto executivo; III - execução das obras e serviços (art. 7Ü, caput). A norma geral é de que cada etapa será obrigatoriamente precedida da conclusão e aprovação pela autoridade competente da etapa anterior. Projeto básico é "o conjunto de elementos necessários e suficienes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviÇo, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado om °ase nas indicações dos estudos técnicos preliminares que assegum a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental d fieniPreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a içao dos métodos e do prazo para a execução", apontando o art. 6-, con mS etamadamente, em seis alíneas, o seu conteúdo. Como se Ser« , a a leitura atenta do texto mencionado, o projeto básico deve res Q Orado com base nas indicações dos estudos técnicos prelimina-imna . assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do Ela ambienta1"-supõe a Orar ° projeto básico com base em um estudo, evidentemente, a nte"orráade desse estudo ao projeto mencionado. Incensurável (j6 C!UC °S estudos sobre o adequado tratamento do impacto am- e V?m ÊStar acabados e aprovados, para que o projeto básico log6 aí30ra° e> depois, apresentado. Relembre-se que essa é a a Lei 8.666/93, que não salta ou queima etapas (art. T1, § Ia). 256 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO No conceito de "projeto básico", transcrito acima, previu a le; necessidade da apresentação de "estudos técnicos preliminares que „ segurem o adequado tratamento do impacto ambiental do empreencf mento". A Lei de Licitações não é, obviamente, uma lei de meio ambiente e, portanto, não é seu papel descer a detalhes sobre o conteúdo desses estudos preliminares. Devemos socorrer-nos da legislação especializa da ou, seja, a legislação ambiental. A Constituição Federal, contudo, foi expressa em exigir a elaboração de epia para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de degradação do meio ambiente (art. 225, § 1B, IV). A Resolução 1/86-coNAMA, ao estabelecer as atividades e obras em que se deve exigir o epia, evidentemente, considerou-as como "potencialmente causadoras de degradação do meio ambiente". Assim, para instruir corretamente o projeto básico da informação adequada sobre impacto ambiental, o procedimento a ser apresentado é o epia. Acentue-se que a referida Resolução 1/86 abrange as estradas de rodagem, com duas ou mais faixas de rolamento; as ferrovias; os portos, aeroportos, oleodutos; obras para exploração de recursos hídricos, entre outras. É elementar, para que o procedimento licitatório busque a probidade administrativa (art. 3da Lei 8.666/93) estejam essas atividades e essas obras com seus aspectos e custos ambientais bem delineados no projeto básico, para que os licitantes não ajam desavisadamente, nem se alegue surpresa, após a contratação das obras e serviços. Destarte, ao tratar do procedimento na Seção IV, a Lei 8.666/93 prevê que o edital conterá, obrigatoriamente, o "local onde poderá ser examinado e adquirido o projeto básico" (art. 40, IV). Não há como apresentar as propostas nos vários tipos de licitação, sem que o projeto básico esteja integralmente à disposição de quem estiver habilitado a licitar. Ressalte-se por fim, que a Administração Pública não pode desconsiderar o edital, pois a ele está amarrada ou "estritamente vinculada" (art. 41, caput). Capítulo V LICENCIAMENTO AMBIENTAL r Utilização dos termos "licença" e "autorização" Licença e autorização - no Direito brasileiro - são vocábulos "empregados sem rigor técnico".1 O emprego na legislação e na doutrina do termo "licenciamento" ambiental não traduz necessariamente a utilização da expressão jurídica licença, em seu rigor técnico. Em matéria ambiental a intervenção do Poder Público tem o sentido principal de prevenção do dano. Aliás, pela Constituição Federal (art. 225, caput) a defesa do meio ambiente pelo Poder Público não é uma faculdade, mas um dever constitucional. Salienta R. Villata que "o escopo de prevenção sempre foi entendido como típico da categoria da autorização".2 M. S. Giannini salienta que "em todo caso ocorre especial autorização se o estabelecimento produz poluição atmosférica ou hídrica".3 A CF utilizou o termo "autorização" em seu Tít. VII - Da Ordem econômica e Financeira, dizendo no art. 170, parágrafo único: "E assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos pre-v'stos em lei". Dessa forma, razoável é concluir que o sistema de 'cenciamento ambiental passa a ser feito pelo sistema de autorizações, conforme entendeu o texto constitucional. Empregarei a expressão "licenciamento ambiental" como equiva-. a "autorização ambiental", mesmo quando o termo utilizado seja s«nplesmente "licença". u TJSP, ao analisar a Lei 6.938/81, julgou com grande perspicácia 4 estão: "O exame dessa lei revela que a licença em tela tem natureza Lretella Júnior, Dicionário de Direito Administrativo. í>. j)-.', utorizzazioni Amministrative ed Iniziativa Econômica Privata, p. 46, cit. por aUua]e ' "Strumenti giuridici per Ia prevenzione dell'inquinamento: situazione e Prospettive", Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico 1/206-231, 1986. • htuuzioni di Diritto Amrninistrativo. 258 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO jurídica de autorização, tanto que o § Ia de seu art. 10 fala em pedido h renovação de licença, indicando, assim, que se trata de autorização, n0 e se fosse juridicamente licença, seria ato definitivo, sem necessidade h renovação". "A alteração é ato precário e não vinculado, sujeito serrm às alterações ditadas pelo interesse público." "Querer o contrário é pOs tular que o Judiciário confira à empresa um cheque em branco, permitindo-lhe que, com base em licenças concedidas anos atrás, cause todae qualquer degradação ambiental."4 Além do art. 10 e seu § lu da Lei 6.938/81, analisado pelo acórdão referido, é de se apontar também a redação do art. 9a, que, ao tratar dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, previu, no inc. IV, "o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras". Assim, tanto o termo "renovação" como o termo "revisão" indicam que a Administração Pública pode intervir periodicamente para controlar a qualidade ambiental da atividade licenciada. Não há na "licença ambiental" o caráter de ato administrativo definitivo; e, portanto, com tranqüilidade, pode-se afirmar que o conceito de "licença", tal como o conhecemos no Direito Administrativo brasileiro, não está presente na expressão "licença ambiental".5 As definições de licença ambiental que não contiverem a possibilidade da renovação e/ou da revisão da licença, diante da Lei 6.938/81, estão incompletas. A revisão não deixa o detentor da licença ambiental ao sabor do capricho do órgão público, pois o mesmo é obrigado a se justificar através da motivação, razoabilidade, proporcionalidade e da legalidade, interesse público, eficiência e ampla defesa, entre outros elementos jurídicos (art. 2fl da Lei 9.784/1999). 2. Licenciamento ambiental e competência constitucional "É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: proteger o meio ambiente e combater a poluição effl qualquer de suas formas" (art. 23, VI, da CF). O art. 23 trata, entre outras matérias, da função administrativa das pessoas jurídicas de Direito 4. TJSP, 7a C, AR de Ação Civil Pública 178.554-1-6, rei. Des. Leite Cintra, ) 12.5.1993 (Revista de Direito Ambiental 1/200-203, janeiro-raarço de 1996). 5. No mesmo sentido: Toshio Mukai, Direito Ambiental Sistematizado, Ri° Janeiro, Forense Universitária, 1992, p. 81; Vladimir Passos de Freitas, Direito AdnúnlS' trativo e Meio Ambiente, Curitiba, Juruá, 1993, p. 63; Paulo de Bessa Antunes, Dire'u' Ambiental, Rio de Janeiro, Lumen Júris, 1996, p. 88; Antônio Inagê de Assis Oliveira, Licenciamento Ambiental, Rio de Janeiro, Iglu Editora, 1999, pp. 37-275. LICENCIAMENTO AMBIENTAL 259 . qUe compõem a República Federativa do Brasil. A competência mesmo tempo, direito e dever dos entes federados. O licenciamento é> af-ental é uma das formas de exercer a competência comum. No exercício da competência comum, a União, os Estados, o Distrito , aj e os Municípios não só utilizam a legislação por eles criada, mo a legislação instituída pelo ente que tenha uma competência constitucional própria e até privativa. A lei federal ordinária não pode retirar dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios poderes que constitucionalmente lhes são atribuídos. Assim, é de se entender que o art. 10 da Lei 6.938/1981 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente) não estabeleceu licenças ambientais exclusivas do iBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis, porque somente uma lei complementar poderia fazê-lo (art. 23, parágrafo único, da CF); e nem a Resolução cona-ma-237/1997 poderia estabelecer um licenciamento único. Enquanto não se elaborar essa lei complementar estabelecendo normas para cooperação entre essas pessoas jurídicas, é válido sustentar que todas elas, ao mesmo tempo, têm competência e interesse de intervir nos licenciamentos ambientais. No federalismo, a Constituição Federal, mais do que nunca, é a fonte das competências, pois caso contrário a cooperação entre os órgãos federados acabaria esfacelada, prevalecendo o mais forte ou o mais estruturado politicamente. 3- A instituição do licenciamento ambiental O exercício das atividades econômicas no Brasil é livre, isto é, mdepende de prévia intervenção do Poder Público. Esse o sistema que r5§e a matéria consoante a CF/88, conforme seu art. 170, parágrafo 5 umco. A intervenção do Poder Público não se rege pelo sistema da pre-ao. A autorização, a licença, a permissão e a aprovação prévia só em existir se previstas em lei. A Constituição, ao dizer "salvo nos "p °S Previstos em lei", obriga à utilização da lei no seu sentido restrito. evisão em lei" e "na forma da lei" têm acepções diferentes. A prilra deve ser entendida conforme sua dimensão estrita e a segunda ece ser interpretada consoante seu sentido lato. Va azoável, portanto, concluir-se que as licenças, autorizações, apro-rá n ÊS Právas e permissões só possam ser criadas por lei ou a lei deve-den[e a a SUa mstitinÇão por outro meio infralegal. O decreto do Presie da República, do Governador do Estado ou do Prefeito Municipal 260 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO somente poderá criar uma licença ambiental se a lei anterior express mente cometer-lhe tal tarefa. Da mesma forma, as licenças ambienta'~ não podem ser instituídas por portaria do IBAMA-Instituto Brasileiro cj Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, pelos órgãos p* blicos ambientais dos Estados e dos Municípios, pelo Conselho Nacio nal do Meio Ambiente-CONAMA ou por outros conselhos. O procedimento do licenciamento ambiental inicial ou de sua renovação é de extrema relevância. A intervenção do Poder Público na vida profissional ou na atividade de uma empresa só é admissível pela Constituição Federal em razão do interesse geral. Portanto, não pode converter-se em mera expedição de alvará, sem outras considerações ou avaliações. Se houver relaxamento da parte do Poder Público o licenciamento ambiental transforma-se numa impostura- de um lado, submete o empresário honesto a uma despesa inócua e, de outro lado, acarreta injustificável prejuízo para um vasto número de pessoas, que é a população que paga tributos. O Poder Público, que arrecada taxa de licenciamento, tem o dever de estruturar o órgão ambiental de tal forma que haja agentes, em quantidade e qualidade adequadas, aptos para licenciar, como também está obrigado a fornecer a seus agentes todos os meios de fazer as análises e verificações necessárias. E necessário que fiquem identificados os agentes públicos que intervieram no licenciamento, para que, ocorrendo negligência, imperícia, imprudência ou dolo dos mesmos, além da responsabilidade civil objetiva da pessoa física ou jurídica licenciada e da Administração Pública, assegure-se o direito de regresso contra os agentes públicos responsáveis (art. 37, § 6a, da CF). 4. O licenciamento ambiental e o ibama 4.1 Quadro do licenciamento obrigatório pelo ibama Menciono algumas intervenções - através de licenças e de autorizações - na área federal: 1) licença para uso da configuração de veículos ou de motor (Lei 8.723/93); 2) autorização para entrada no País de qualquer produto contendo OGM-Organismo Geneticamente Modifica do ou dele derivado (Lei 8.974/95); 3) autorização para funcionamento de empresas que desenvolvam atividades ligadas a ogm (Lei 8.974/95)-4) registro de produtos contendo ogm (Lei 8.974/95); 5) registro de agrotóxicos e seus componentes (Lei 7.802/89). • j LICENCIAMENTO AMBIENTAL 261 AS licenças e autorizações mencionadas não são exclusivas ou prias do ibama ou e outro órgão federal, podendo os Estados, tamV criar seus sistemas administrativos de autorizações, de licenças e eeistros. Nos casos apontados, a intervenção do órgão federal é obritória em razão da legislação citada, mesmo que os Estados venham a £ uorar uma legislação nesse sentido. A duplicidade de autorizações, "e licenças e de registros poderá existir, desde que amparada em lei. 4 2 Licenciamento ambiental supletivo pelo ibama '" O art. 10, caput, da Lei 6.938/81 prevê que o ibama licenciará em caráter supletivo, em relação ao órgão estadual ambiental. A atuação supletiva do ibama, apesar de a lei não indicar os seus parâmetros, deverá ocorrer, principalmente, em duas situações: se o órgão estadual ambiental for inepto ou se o órgão permanecer inerte ou omisso. A ação supletiva do ibama, como do órgão existente ao tempo da elaboração da Lei 6.938/81, asEMASecretaria Especial do Meio Ambiente, justifica-se pela inexistência de quadros funcionais e para possibilitar que os Estados tomassem à frente a gestão ambiental. Essa possibilidade de intervenção do ibama no licenciamento, diante de seu caráter incerto e subjetivo, não está sendo eficaz para a proteção do meio ambiente. ,, 4.3 Licenciamento ambiental pelo ibama •• •.•..> e interesse nacional e regional . Na alteração da Lei 6.938/81 efetuada pela Lei 7.804/89, introduau-se o § 4Ü no art. 10, do seguinte teor: "Compete ao Instituto Brasileiro 0 Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis-iBAMA o licenlamento previsto no caput deste artigo, no caso de atividades e obras 111 significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional". Procurou-se dar um novo aspecto à presença federal no meio am-nte, deixando o caráter geral de supletividade da atuação do ibama. j. ° se está eliminando a intervenção dos Estados e dos Municípios nos nc'amentos de atividades com impacto ambiental de âmbito nacional e regional. em modificação feita pela Lei 7.804/89 respeitou a autonomia dos es derados, mantida essa autonomia pela Lei 6.938/81 ao criar o 262 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Sistema Nacional do Meio Ambiente-sisNAMA. Este sistema não foi nre visto constitucionalmente, diferentemente do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, que foi instituído pela Constitui ção Federal (art. 21, XIX), podendo, assim, alcançar uma outra dirnen. são jurídica em matéria de organização dos entes que o integram. Jf0 sisnama os Estados não estão obrigados a abdicar de suas competências ambientais frente aos órgãos ambientais da União, podendo, contudo voluntariamente aderir a um sistema de cooperação administrativa. Existirão atividades e obras que terão importância ao mesmo tempo para a Nação e para os Estados, e, nesse caso, poderá haver duplicidade de licenciamento. O deferimento ou o indeferimento do licenciamento deverão ser respeitados, aplicando-se, inclusive, as sanções de cada legislação - federal, estadual ou municipal - em caso de desobediência. A amplitude dos conceitos "nacional" e "regional", contudo, tem deixado incerta a atividade licenciadora do ibama. O interesse nacional está claramente delineado nas atividades e obras que sejam levadas a efeito nas áreas do patrimônio nacional enumeradas pela CF no art. 225, § 4fl - "a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira". O interesse regional é encontrado quando o impacto ambiental do projeto possa atingir mais de um Estado ou uma região geográfica. Além dos espaços "nacional" e "regional", os impactos ambientais transfronteiriços precisam ser objeto da atuação do ibama, mas a lei é omissa nesse sentido. 5. Licenciamento ambiental estadual e legislação federal v A intervenção do Poder Público estadual está integrada na matéria da Administração estadual. Entretanto, a legislação federal - no que concerne às normas gerais - é obrigatória para os Estados no procedimento da autorização. Desconhecer ou não aplicar integralmente ou somente aplicar de forma parcial a legislação federal implica para os Estados o dever de eles mesmos anularem a autorização concedida ou de pedir a tutela do Poder Judiciário para decretar a anulação. Não se trata de revogação da autorização, pois a mesma já nasceu viciada. Importa distinguir que a norma geral federal não invade a competência dos Estados ao se fazer presente no procedimento da autorização. A norma federal - por ser genérica - não deverá dizer qual o funcionário ou o órgão incumbido de autorizar (matéria típica da organização autônoma dos Estados), mas poderá dizer validamente quais os critérios a serem observados com relação à proteção do ambiente. LICENCIAMENTO AMBIENTAL 263 j • ertcúttnento ambiental e zoneamento ambiental :i: Como se vê da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, não só r nciamento e a revisã0 do licenciamento de atividades efetiva ou ° renrialmente poluidoras são instrumentos dessa política (art. 9Q, IV), P° também o é o "zoneamento ambiental" (art. 9S, II). Andou bem o legislador em colocar o zoneamento ambiental antes , ijcenciamento, isto porque as regras para o uso do solo e o desenvol-imento de atividades em um espaço territorial merece ser previsto antes do licenciamento. Havendo, portanto, regra que estabeleça zoneamento ambiental para um determinado espaço territorial (exemplos: lei federal para o Vale do Rio Doce, Lei 7.566, de 19.12.1986; lei do Estado de Mato Grosso do Sul, que proíbe instalação de destiladas de álcool no Pantanal, Lei 328, de 25.2.1982; lei do Estado de São Paulo que regula as atividades da Bacia do rio Piracicaba, Lei 2.446, de 12.9.1980), não pode ser contrariada pela concessão da autorização do Poder Público não só Estadual, como Federal e Municipal. 7. Licenciamento ambiental e padrões de qualidade Os padrões de qualidade previstos para o meio receptor - água, ar e solo - devem ser amplamente confrontados com o sistema de produção e efluentes da atividade que pretende obter a autorização. Tomese, por exemplo, a Resolução 20-conama, de 18.6.1986, em que são classificadas as águas doces, salobras e salinas no território brasileiro. Os limites previstos na resolução devem ser constatados no meio receptor ern que se pretende lançar os efluentes da instalação, cuja autorização esta sendo requerida. Não importa que a atividade - por si só - não u'trapasse algum dos limites previstos: se o lançamento da nova carga Poluidora fizer ultrapassar os padrões de qualidade em qualquer das j* meas (exemplo: materiais flutuantes, corantes, coliformes, demanda loquímica de oxigênio, oxigênio dissolvido, turbidez, pH ou teor má-.1Ino de substâncias potencialmente prejudiciais) a atividade deverá ser efeid i d eferida, isto é, o órgão público ambiental não poderá conceder a au-rização ou a licença ambiental. lcenciamento ambiental e normas de emissão co ,normas de emissão condicionam a autorização. O órgão públi-01 tem ° dever legal de examinar o projeto apresentado para lcar se as normas de emissão serão respeitadas. 264 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O requerente da autorização - seja de empresa pública ou parj - cometerá o crime de falsidade ideológica se informar falsamente Administração Pública acerca das emissões. A Administração Pública ambiental tem, contudo, o dever de verj. ficar se os meios de controle da poluição projetados pelo requerente serão eficazes. O dever constitucional do Poder Público em defender o meio ambiente como um "bem essencial à sadia qualidade de vida" (art 225 da CF) veda à referida Administração Pública transigir com o requerente do projeto. Saliente-se que, como aponta o renomado jurista italiano Massimo Severo Giannini, "no procedimento autorizatório a realização do interesse privado se subordina ao interesse público".6 A Administração Pública não é livre para estabelecer qualquer norma de emissão. O estabelecimento de normas que possam causar perigo sensível à saúde da população e ao equilíbrio ecológico pode ser objeto de ação judicial visando a sua anulação. Entretanto, parece-me que, enquanto as normas de emissão estiverem vigentes, o requerente pode fundamentar-se nas mesmas para apresentar seu pedido, e, assim, propor um sistema de controle de poluição. Inexistente norma de emissão para determinado efluente, nem por isso fica o órgão público ambiental livre para deferir qualquer lançamento no ambiente. A Administração Pública segundo o princípio constitucional e a Lei 6.938/81 deve analisar o pedido de autorização no sentido de que se evite - com a maior amplitude - o dano ambiental. 9. Licenciamento ambiental: prazo de validade, decadência e revogação A Lei 6.938/81, ao prever a revisão do licenciamento (art. 9a, IV) -de forma indireta - indicou que a autorização não é por prazo indeterminado. Tanto o requerente da autorização como a Administração Pública têm vantagem na existência de prazo de validade para a autorização. Quem exerce uma atividade fica ciente de que as regras de funcionamento não poderão ser mudadas - a não ser por motivo grave - no espaÇ0 temporal da autorização. O órgão público ambiental por sua vez não fica manietado eternamente a condições de funcionamento de uma atividade que se tenha revelado danosa ao ambiente e que haja possibilidade de correção no momento da nova autorização. Evita-se a tentação de corrupção por parte do órgão público e de outro lado dá-se condição às 6. Ob. cit., p. 311. < LICENCIAMENTO AMBIENTAL 265 resas de poderem programar, sem sobressaltos, seus investimentos 6 matéria de controle ambiental. No mesmo sentido, Paulo de Bessa ern nes: "enquanto uma licença for vigente, a eventual modificação de drões ambientais não pode ser obrigatória"; e "uma vez encerrado o P 0 de validade da licença ambiental, os novos padrões são imediatamente exigíveis".7 A Resolução 237/97-conama (art. 18) estabelece que a licença prévia não pode ter prazo superior a 5 anos, a licença de instalação não oode ter prazo superior a 6 anos e a licença de operação não pode ter prazo superior a 10 anos. Cada ente da Federação estabelecerá, dentro desses limites, os seus prazos.8 Se a autorização impuser alguma condição a ser cumprida pelo requerente e a condição não for observada, ocorre a decadência da autorização como adequadamente salienta F. Salvia, dizendo que "não se trata de revogação, mas de decadência, entrando na categoria que traz sua justificação na inobservância da obrigação por parte do titular da autorização".9 A revogação, entretanto, dá condições para que o órgão público reveja a autorização, ainda no prazo de validade da mesma. A ocorrência de fato grave para a saúde pública ou para o ambiente pode motivar o ato da Administração. Georges Vedei ensina: "A verdadeira solução, mais conforme, portanto, ao princípio segundo o qual não há jamais direito adquirido na manutenção de uma regulamentação, parece encontrar-se nos princípios admitidos em matéria de polícia. Na medida onde a aplicação da nova regulamentação a situações antigas é absolutamente necessária, é que incômodos pessoais ou sacrifícios pecuniários possam ser impostos aos beneficiários de situações individuais, regularmente cnadas, sob o império da antiga regulamentação. A apreciação desta necessidade é matéria concreta. Por exemplo, a revelação do caráter nocivo para a saúde de tal produto químico ou farmacêutico cria uma necessidade, que justifica a aplicação imediata da interdição pronunciada mesmo com a perda de estoques importantes". André de Laubadère z: "as medidas apresentando caráter de autorizações de polícia não sao criadoras de direitos e podem ser ab-rogadas ou modificadas".10 A Resolução 237/97-conama arrolou os fundamentos da suspen-'ao ou do cancelamento da licença expedida: violação ou inadequação 7- Direito Ambiental, Rio de Janeiro, Lumen Júris, 1996, p. 89. 8. A Lei 9.477, de 30.12.1996, do Estado de São Paulo, obriga à renovação lnc)üenal das licenças ambientais (nova redação do art. 5Ü da Lei 997/76). 9- Llnquinamento - Profili Pubblicistici, cit. por P. DelFAnno, ob. cit. 10. G. Vedei, Droit Administratif; e Laubadère, Traité de Droit Administratif. '-*• 266 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO de quaisquer condicionantes ou normas legais: omissão ou falsa descri ção de informações relevantes e superveniência de graves.riscos para a saúde e para o meio ambiente (art. 19). 10. Licenciamento ambiental xe financiamento por instituições oficiais O Decreto 99.274/1990 diz, no art. 19, § 32: "Iniciadas as atividades de implantação e operação, antes da expedição das respectivas li-cenças, os dirigentes dos órgãos seccionais do ibama deverão, sob pena de responsabilidade funcional, comunicar o fato às entidades financiadoras dessas atividades, sem prejuízo da imposição de penalidades, medidas administrativas de interdição, judiciais de embargo, e outras providências cautelares". Abrange, portanto, como norma geral, os órgãos seccionais (nos quais estão incluídos os Estados) (art. 6", IV, da Lei federal 6.938, de 31.8.1981) o dever de comunicar às entidades financiadoras o desrespeito à obrigação de prévio licenciamento. Expressamente alguns Estados previram em suas legislações a obrigação de ser considerado - pelos órgãos financiadores oficiais - o cumprimento das diretrizes legais de prevenção da poluição, notadamente a observância do prévio licenciamento: Mato Grosso (art. 15, parágrafo único, da Lei 4.894, de 25.9.1985), Minas Gerais (art. 13 da Lei 7.772, de 8.9.1980), Pernambuco (Decreto 7.269, de 5.6.1981), São Paulo (art. 16 da Lei 997, de 31.5.1976). 11. Tipos de licenciamento ambiental A Lei 6.938/81 disse em seu art. 8a: "Incluir-se-ão entre as competências do conama: I - estabelecer, mediante proposta do ibama, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, a ser concedido pelos Estados e supervisionado peloiBAMA"As normas e critérios gerais para o licenciamento, estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA, devem dar para todo o país os fundamentos do licenciamento. Essa competência do órgão colegiado federal — no qual estão representados os Estados - é relevante, pois evitará que Estados possam ser menos exigentes que outros no momento da instalação de empresas ou na renovação do licenciamento. A expressão "licenciamento ... supervisionado pelo ibama" merece ser entendida como um tipo de fiscalização, em que o órgão federal LICENCIAMENTO AMBIENTAL 267 hiental poderá comunicar aos Estados ou ao Ministério Público a aIfl rrência de desvios no cumprimento das diretrizes e critérios sobre o °C nciarnento, mas o termo supervisão não deve ser entendido como de revisão por parte dele, pois a autonomia constitucional dos Esdos não lhe permitiria essa atuação. W o Decreto 99.274, de 6.6.1990, que revogou o Decreto 88.351, de i 6 1983, e outros decretos, regulamentou a Lei 6.938, de 31.8.1981, tendo previsto tipos de licenças. Diz o seu art. 19: "O Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as seguintes licenças: I - Licença Prévia (lp), na fase preliminar do planejamento da atividade, contendo requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e operação, observados os planos municipais, estaduais ou federais de uso do solo; II - Licença de Instalação (li), autorizando o início da implantação, de acordo com as especificações constantes do projeto executivo aprovado; III - Licença de Operação (lo), autorizando, após as verificações necessárias, o início da atividade licenciada e o funcionamento de seus equipamentos de controle de poluição, de acordo com o previsto nas Licenças Prévia e de Instalação". Como se vê do decreto federal, houve a previsão de regras gerais sobre os tipos de licenciamento. Os Estados poderão aumentar as modalidades de licenciamento, adicionar exigência para cada fase, não podendo, contudo, exigir menos. Como se vê do inc. III do art. 20 do decreto mencionado, as fases lp e li são antecedentes da lo, isto é, guardam com a última fase um relacionamento que deve estar presente no licenciamento, pois a "licença de operação" vai depender do cumprimento daquilo que foi examinado e deferido nas fases da "licença prévia" e da "licença de instalação". A expressão contida no inc. III do art. 20 -após as verificações necessárias" - mostra que a licença de operação so Poderá ser concedida após a vistoria do órgão público ambiental, na 9ual se constate que as exigências das fases anteriores foram cumpridas. A. Resolução 237/97-conama, ao tratar dos três tipos de licença, pontou a "Licença Prévia (lp), concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade, aprovando sua localização e Or>cepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requi-1 °s básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sUa lmPlementação" (art. 8a, I). Embora o inciso não tenha sido expres-' Podemos entender que só é possível "atestar a viabilidade ambiental" to r°let0 se houver a devida e legal avaliação prévia do próprio proje-Vo Ass'm, se o projeto tiver a potencialidade de causar dano significati-Anílv me*° amente' deverá ser realizado o Estudo Prévio de Impacto lental, antes da outorga da "Licença Prévia", como já foi exposto. Wro lado, só se poderia aprovar a localização do projeto se houves- 268 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO se o devido estudo prévio das alternativas de localização. Se o potencial não for significativo, e tal for adequadamente constatado,, verão ser efetuados os "estudos ambientais" arrolados no art. Ia, resolução mencionada. ,.. 12. Licenciamento ambiental e controle da poluição. Tecnologia apropriada O Poder Público deve exigir o emprego de tecnologia disponível -pelo menos no mercado brasileiro para prevenir a poluição. Esse dever está inserido na Constituição Federal em dois artigos fundamentalmente: no art. 225, caput, quando é afirmado que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado", e no art. 170, caput, quando diz: "a ordem econômica ... tem por fim assegurar a todos existência digna ... observados os seguintes princípios: ... VI - defesa do meio ambiente". Importa que a tecnologia empregada não possa causar prejuízo ao homem e a seu ambiente, não cabendo, contudo, ao Poder Público indicar este ou aquele equipamento antipoluidor. Deixando o Poder Público de cumprir seu dever (art. 225, V, da CF: "controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente"), cabe a propositura de ação popular, para anular a autorização e/ou a licença outorgada ou a interposição de ação civil pública, visando ao cumprimento da obrigação de fazer, isto é, de instalar e operar equipamentos contra a poluição. A liberdade de iniciativa na ordem econômica haverá de visar ao lucro justo e não aquele que traga benefícios somente para o empreendedor, pois a "função social da propriedade" continua a ser um dos pilares da Constituição brasileira de 1988 (art. 170, VI), repetindo as anteriores (EC 1/69, art. 160, III; CF/67, art. 157, III; CF/46, art. 147; CF/37, art. 113-17). 13. Licenciamento ambiental e unidade do licenciamento A Lei 6.938, de 31.8.1981 -Lei de Política Nacional do Meio Ambiente -, em seu art. 10, trata da: construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais. :: -,;, LICENCIAMENTO AMBIENTAL 269 A CF, sete anos após a lei referida, veio em seu art. 225, § Ia, IV, ar a necessidade de ser exigido Estudo Prévio de Impacto Ambiental "instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de a a "instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de S1"tos" "atividades" e "obras". Os textos da Lei Maior e da Lei de a Pa :fjCativa degradação do meio ambiente". Licenciam-se, pois, "estabeS1"mentos", "atividades" e "obras". Os textos da Lei Maior e da Lei de p ./tjca Nacional do Meio Ambiente focalizaram os empreendimentos serem licenciados em seu todo. A interpretação de que o licenciamento ambiental deve abranger a bra como um todo, não devendo ser fragmentado, decorre da lógica do próprio licenciamento. O licenciamento só existe porque a atividade ou a obra podem oferecer potencial ou efetiva degradação ao meio ambiente. A avaliação, a ser feita antes do licenciamento, deve ser a mais ampla possível. A Resolução 01/1986conama indica que o Estudo de Impacto Ambiental deve abranger "a área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza" (art. 5a, III). Fragmentar o licenciamento é subtrair-lhe sua própria força. O estudo global de um projeto, evidentemente, deve conter o estudo de suas partes. Não se licencia máquina por máquina, unidade por unidade, separadamente, em cada licenciamento ambiental inicial. É a razoabilidade, a proporcionalidade e a motivação aplicadas ao ato administrativo. Se o licenciamento for parcelado se perderá o sentido da real dimensão da obra ou do projeto. Licenciar por partes pode representar uma metodologia ineficiente, imprecisa, desfiguradora da realidade, e até imoral: analisando-se o projeto em fatias isoladas, e não sua totalidade ambiental, social e econômica, podendo ficar ocultas as falhas e os danos potenciais, não se poden-0 saber se as soluções parciais propostas serão realmente aceitáveis. 4- Licenciamento ambiental e crime - Descumprimento das normas legais e regulamentares Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qual" er parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços PWencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos °ientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamenarnv? pert'nentes; Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, ou mbas as penas cumulativamente" (art. 60 da Lei 9.605/98). A lei prevê dois instrumentos de intervenção prévia da Administra-rúhlira- a lirpnra e a autorização, cujas características já foram 270 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO examinadas. Um desses atos administrativos poderá ser exigido estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores. A jn cação do rol de estabelecimentos, obras ou serviços deverá constar normas legais ou regulamentares federais, estaduais e municipais. * Sem prévia inclusão em lei ou em regulamento, a Administrar Pública não pode exigir que a pessoa física ou a pessoa jurídica seiT0 licenciadas ou autorizadas. Jm A expressão "em qualquer parte do território nacional" mostra qu não há isenções aos estabelecimentos, obras ou serviços potencialm te poluidores. Assim, todos os estabelecimentos ou obras militares (in clusive das polícias militares) e os estabelecimentos e obras indígenas sujeitos a prévia licença e/ou autorização estão abrangidos pela incrimi nação do art. 60. A lei exige que os estabelecimentos, obras e serviços sejam construídos, reformados, instalados e que funcionem com licenças e/ou autorizações válidas, isto é, não vencidas. Age com inegável dolo eventual quem (pessoa física ou jurídica) continua operando ou funcionando após a expiração do prazo de validade da licença ou da autorização. Entretanto, deixa de haver dolo direto e/ou eventual quando foi solicitada uma nova licença e/ou autorização no tempo hábil e a pessoa peticionária está procurando cumprir as diligências suplementares determinadas pelo órgão público ambiental. O art. 60 tem também uma segunda parte: construir, reformar, ampliar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes. Esta segunda parte do art. 60 criminaliza o descumprimento do conteúdo da autorização e/ou da licença. Caso contrário, a licença e/ou autorização se converteriam em um mero formalismo, numa proteção fictícia do meio ambiente. A autorização e a licença devem emanar "dos órgãos ambientais competentes" (art. 60). Esses órgãos não precisam estar necessariamente inseridos numa secretaria que se denomine "Secretaria do Meio Ambiente". Necessário é que o órgão público tenha competência para tratar de matéria relacionada ao meio ambiente, cujo conceito está expresso no art. 3a, I, da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/ 81): "conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas". Não é preciso que o descumprimento das "normas legais ou regulamentares" cause poluição. Aí se trata do crime do art. 54. O que se LICENCIAMENTO AMBIENTAL 271 irniria no art. 60 é a desobediência às normas administrativas am* • _ _ X n »-»/-t*fvi ci c lí=*frQic omniputaic T-í YíTvmlrAc nnnpm Qf*r onrpcontQ bientais e às normas legais ambientais. Exemplos podem ser apresentadeixar de informar ao órgão competente a qualidade e a quantidade , efluentes emitidos; deixar de relatar os rejeitos produzidos; emitir lançar poluentes em medida que ultrapasse as normas de emissão e de qualidade fixadas; deixar de instalar, de manter e de fazer funcionar dequadamente os sistemas de controle ambiental dos estabelecimentos obras e serviços licenciados e/ou autorizados. O art. 60 abrange o "lançamento em corpos de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final", sem outorga dos direitos de uso dos recursos hídricos" (art. 12, III, da Lei 9.433/97 - Lei de Política Nacional de Recursos Hídricos). Interessa apontar que a outorga é uma autorização (arts. 170-177 do Código de Águas de 1934) e, no plano federal, é da competência da Secretaria de Recursos Hídricos, que integra o Ministério do Meio Ambiente. A Lei 9.605/98 criminalizou o descumprimento das normas legais e regulamentares concernentes ao meio ambiente tentando incentivar a aplicação das normas existentes, tão esquecidas e desprezadas pelos poluidores. Assim, quem deixa de apresentar Estudo Prévio de Impacto Ambiental exigido pelas Leis 6.803/80 e 6.938/81 e pelo Decreto 99.274/ 90, apoiados pelo art. 225,§ Ia, IV, da CF, assume o risco de produzir significativa e potencial poluição, age com dolo eventual e/ou direto, merecendo ser incurso no art. 60. 15. Dos funcionários públicos e dos crimes contra a Administração ambiental "Fazer o funcionário público afirmação falsa ou enganosa, omitir a verdade, sonegar informações ou dados técnico-científicos em procedimentos de autorização ou de licenciamento ambiental: Pena reclusão, de um a três anos, e multa" (art. 66 da Lei 9.605/98). 'Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, oora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego "função pública" - art. 327, caput, do CP. O § le deste artigo equipara uncionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entie Paraestatal. Há duas correntes na jurisprudência: uma que entende eqn-a ecluParaÇão só atinge os empregados de autarquias e outra que m-|Para todos os empregados das autarquias, sociedades de economia fun a' emPresas públicas e fundações instituídas pelo Poder Público a 1Cl°nários públicos. -.,.... 272 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Temos que lembrar que o poder de polícia ambiental é exercido e muitos Estados por entidades paraestatais. Deixar de abrangê-los n incriminação é deixá-los impunes penalmente. O crime do art. 66 tem como centro o procedimento de autorização ou de licenciamento ambiental. Para proteger a lisura e a veracidade desse procedimento é incriminado o funcionário público que dolosamente faz afirmação falsa ou enganosa, omite a verdade, sonega informações ou dados técnico-científicos. "Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público: "Pena — detenção, de um a três anos, e multa. "Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa" (art. 67 da Lei 9.605/98). É abrangido na incriminação não só o funcionário público mais graduado ou de grau hierárquico superior que assina o ato administrativo; mas, em co-autoria, os que opinaram favoravelmente ao pedido contrariando dolosa ou culposamente as normas ambientais. O procedimento penal fará o contraste da conduta do funcionário público com as normas pertinentes, apurando o desacordo existente. Exemplifique-se o caso do funcionário que licencia, autoriza ou emite uma permissão sem exigir o Estudo Prévio de Impacto Ambiental quando a obra ou a atividade tem potencialidade de causar dano significativo ao meio ambiente, ou quando descumpra resoluções de órgãos colegia-dos, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA. Da mesma forma, responsável penalmente será o funcionário público que não realizar a Audiência Pública conforme prevêem as normas ambientais. Na Venezuela, diz o art. 61 da Lei Penal do Ambiente, de 2.1.1992: "0 funcionário público que outorgue as permissões ou autorizações, sem cumprir com o requisito de estudo e avaliação de impacto ambiental, nas atividades para as quais é exigido pelo regulamento sobre a matéria, será sancionado com prisão de 3 a 6 meses e multa de 300 a 600 dias de salário mínimo".11 Diferentemente do art. 60, o art. 67 incrimina mais amplamente a desobediência às normas. No art. 60 exige-se o cumprimento das "normas legais e regulamentares pertinentes". No art. 67 deve-se apurar o cumprimento das normas de qualquer hierarquia, e não só as legais e regulamentares. Por isso, os atos de Conselhos (resoluções, instruções emanadas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, ou ato similares) têm incidência no procedimento autorizativo do Poder Públic° 11. Gaceta Oficial 4.358, extraordinário, dei viernes 3 de enero de 1992. LICENCIAMENTO AMBIENTAL 273 não obedecidos pelo funcionário público, terão repercussão penal piJ sua conduta. Em nosso Continente sul-americano, a Bolívia já passara a incri- ar os funcionários públicos em sua Lei de Meio Ambiente 1.333, de Ív7 4 1992, art. 115: "Quando o funcionário ou servidor público seja utor encobridor ou cúmplice de contravenções ou de faltas tipificadas ela presente Lei e disposições afins, sofrerá o duplo da pena fixada ara a correspondente conduta". Na Venezuela, a Lei Penal do Ambiente de 2.1.1992 prevê que "a condição de funcionário público como sujeito ativo do fato punível em todos aqueles casos em que o tipo não o requeira e sempre que aquele atuar no exercício de suas funções, constitui circunstância agravante genérica da responsabilidade penal" (art. 11). 16. Do crime de deixar de cumprir obrigação , de relevante interesse ambiental "Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental: "Pena - detenção, de um a três anos, e multa. "Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo de multa" (art. 68 da Lei 9.605/98). Atentando-se para as redações de tipos criminais semelhantes como o art. 60 e o art. 68, ambos da Lei 9.605/98, descobrem-se nuanças que os diferenciam. No art. 60 uma das formas de tipificar-se o crime é a contrariedade às normas legais e regulamentares pertinentes. No art. 68 0 agente contraria relevante interesse ambiental, deixando de cumpri-lo. Neste caso, o juiz terá um poder maior de apreciação, pois, além de •nserir na desobediência o que esteja apontado nas leis e nos regulamentos, terá uma margem prudente de apreciação do que constitui "relevante interesse ambiental". Poderão ser sujeitos ativos do crime a pessoa física e a pessoa jurí-lca. Dever legal têm o funcionário público como o agente público Mratual de respeitar o relevante interesse ambiental. O particular tem, também, dever legal de cumprir obrigações de evante interesse ambiental. O empreendedor responde criminalmen-Pela inidoneidade na elaboração do Estudo Prévio de Impacto Ah !ental (epia) ou de qualquer outro documento em que informe à as íistração Pública. Não se duvida de que o epia é relevante, tanto inelr" que a CF o inseriu em seu art. 225, § Ia, IV. O empreendedor tem, f aVe'mente> ° dever legal de cumprir a obrigação de relevante inte- amt>iental de bem elaborar o epia. Aplicável, assim, a Lei 9.605/ m seu art. 68. 274 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Um dos deveres do servidor público é o de promover a apuração d infração administrativa ambiental (art. 70, § 3°, da Lei 9.605/98). q Brasil tem-se caracterizado pela impunidade em todos os campos, a leis não cumprem o seu papel porque falham as pessoas encarregadas de sua execução, inclusive os operadores jurídicos. A apuração da infração administrativa não é facultativa e, assim, a não-apuração deve também ser examinada sob o ângulo do art. 68. No que tange à atividade discricionária da Administração Pública ambiental, o juiz examinará como a mesma e seus agentes se comportam. Sobretudo na parte de fiscalizar o cumprimento das licenças e das autorizações, nem sempre a legislação aponta explicitamente como deve ser feita a fiscalização. Sem cair no arbítrio criticável, o Poder Judiciário examinará as omissões funcionais no realizar monitoramentos e inspeções. A criminalização da omissão dolosa ou culposa fortalecerá todo o sistema de licenças e de autorizações, evitando não só a micropoluição rotineira como as emergências de catástrofes ambientais. 17. Do crime de impedir ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público "Obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público no trato das questões ambientais: Pena detenção, de um a três anos, e multa" (art. 69 da Lei 9.605/98). Impedir, resistir ou criar obstáculos, de qualquer forma, à fiscalização do Poder Público é crime, segundo o art. 69, referido. A ação ou a omissão que dificulte a atividade do servidor público pode apresentar-se de forma muito variada. Quem autoriza somente o acesso parcial a documentos relativos ao meio ambiente ou às instalações comete o crime em exame. O representante do Poder Público está obrigado a identificar-se devidamente para que o agente do crime tenha ciência de que está obstafl-do ou dificultando a ação da Administração. 18. O licenciamento ambiental e o Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais O Cadastro Técnico de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais foi instituído pela Lei 7.804, àc 18.7.1989, que inseriu o inc. XII no art. 9a da Lei 6.938/81. LICENCIAMENTO AMBIENTAL 275 q pecreto 3.179/99 considera infração administrativa "deixar de 0 registro no Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmen-° poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, as pessoas físi-e jurídicas, que se dedicam às atividades potencialmente poluidoras C v extração, produção, transporte e comercialização de produtos poten-almente perigosos ao meio ambiente, assim como de produtos e subprodutos da fauna e flora: multa de R$500,00 a R$20.000,00" (art. 53). A existência do registro federal representa um oportunidade de acompanhamento das atividades potencialmente poluidoras e das atividades utilizadoras da fauna e da flora. O registro não se confunde com a licença ambiental. A ausência de registro não é crime, mas somente ilícito administrativo. O fato de uma atividade estar registrada não lhe confere o direito de ser licenciada e nem lhe confere um atestado de leaalidade. Ainda que o registro não entre no mérito da atividade registrada, os órgãos públicos federais não pode registrar atividade que esteja expressamente proibida pela legislação ambiental. .. 19. O licenciamento ambiental de petróleo, gás natural e amianto 19.1 Exploração e produção de petróleo e de gás natural — A Agência Nacional de Petróleo-ANP A exploração de petróleo e de gás natural, no Brasil, é objeto da Lei 9.478, de 6.8.1997 (DOU 7.8.1997). Nesta lei vemos que consta, como um dos princípios e objetivos da política energética nacional, a Proteção do meio ambiente (art. lü, IV). A CF/88, em seu art. 177, considerou como monopólio da União a Pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros wocarbonetos fluidos, assim como a refinação do petróleo nacional u estrangeiro. A EC 9/95 previu que a União poderá contratar com • mPresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos cs. I a IV do referido art. 177, desde que sejam observadas as condiÇ°es estabelecidas em lei. . A Agência Nacional de Petróleo-ANP é entidade integrante da Ad-.lr»stração federal indireta, submetida ao regime autárquico especial, culando-se ao Ministério de Minas e Energia. Tem como finalidade Promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades Cj °nornjcas integrantes da indústria do petróleo". Entre suas competen esta d i Cj est p p ç ° Petró!eo, dos derivados e do gás natural e de preservação do meio te" (t 8IX) * : Cj j grantes da indústria do petróleo. Entre su te, ,esta a de "fazer cumprir as boas práticas de conservação e uso racio-amk ° Petró!eo, dos derivados e do gás natural e de preservação d amb * i 276 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O processo decisório da anp obedecerá aos princípios da legaliza de, impessoalidade, moralidade e publicidade (art. 17). As sessõe deliberativas da Diretoria da anp que se destinem a resolver pendências entre agentes econômicos, e entre estes e consumidores e usuários de bens e serviços da indústria do petróleo serão públicas, permitida a sua gravação por meios eletrônicos e assegurado aos interessados o direito de delas obter transcrições (art. 18). As iniciativas de projetos de lei ou de alteração de normas administrativas que impliquem afetação de direito dos agentes econômicos ou de consumidores e usuários de bens e serviços da indústria do petróleo serão precedidas de audiência pública, convocada e dirigida pela anp (art. 19). Na solução de conflitos entre agentes econômicos e usuários e consumidores deverão ser procurados, com ênfase, a conciliação e o arbitramento (art. 20). A Lei 9.478/97 pioneiramente valorizou a audiência pública como procedimento para debater projetos de leis ou discutir a alteração de normas administrativas, com repercussão nos direitos dos agentes econômicos, consumidores e usuários. A lei não colocou o mencionado processo decisório como uma possibilidade de escolha da anp, mas como um dever legal. Espera-se que o regimento interno da anp preveja um sistema de publicidade prévia da audiência pública, possibilitando uma efetiva participação dos interessados. Ressalte-se, de outro lado, que as sessões deliberativas da agência, destinadas a resolver pendências entre agentes econômicos e usuários e consumidores, não poderão ser secretas, sendo permitida a gravação das sessões e sua transcrição. As atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e de gás natural serão exercidas mediante contratos de concessão, precedidos de licitação. A outorga da concessão não dispensa o "licenciamento ambiental", conforme o art. 10 da Lei 6.938/81, e a realização do Estudo Prévio de Impacto Ambiental, revestido de publicidade. 0 elogiável processo decisório da anp não substitui os procedimentos de participação do público no Estudo Prévio de Impacto Ambiental e no monitoramento e auditoria ambientais concernentes às atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural. A Lei 9.478/97 estabeleceu definições técnicas, entre as quais destacamos: pesquisa ou exploração é "o conjunto de operações ou atividades destinadas a avaliar áreas, objetivando a descoberta e a identificação de jazidas de petróleo ou de gás natural"; desenvolvimento é o "conjunto de operações e investimentos destinados a viabilizar as atividade de produção de um campo de petróleo ou gás"; e lavra, ou produçã0' e "o conjunto de operações coordenadas de extração de petróleo ou ga' natural de uma jazida e de preparo para sua movimentação". LICENCIAMENTO AMBIENTAL 277 O contrato de concessão deverá estabelecer que o concessionário tara obrigado a "adotar, em todas as suas operações, as medidas neces6'rias para conservação dos reservatórios e de outros recursos naturais, S ra a segurança das pessoas e dos equipamentos e para a proteção do ejo ambiente" (art. 44,1). A lei refere-se a "reservatório" como sendo "configuração geológica dotada de propriedades específicas, armazenadora de petróleo ou gás, associados ou não". O concessionário está obrigado a responsabilizar-se civilmente pelos atos de seus prepostos e a indenizar todos e quaisquer danos decorrentes das atividades de exploração, desenvolvimento e produção contratadas (art. 44, V). O critério para a aplicação da responsabilidade, no que concerne ao meio ambiente, é a responsabilidade sem culpa, como prevê o art. 14, § Ia, da Lei 6.938/81. A Lei 9.478/97, ao determinar que o concessionário adote "as melhores práticas da indústria internacional do petróleo" e obedeça "às normas e procedimentos técnicos e científicos pertinentes" (art. 44, VI), estabeleceu parâmetros de comportamento, inclusive ambiental, que devem ser exigidos pela anp, até mesmo pela via judicial. Em caso de impacto ambiental decorrente de acidente, principalmente em razão de vazamento de gases, erupção de petróleo e gás natural em poços, incêndio, explosão, falhas de equipamentos, o concessionário ou autorizatário deverá notificar a anp no prazo máximo de 12 horas.12 Os projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás serão financiados com a contribuição de intervenção no domínio econômico-ciDE, na forma da lei orçamentária.13 '7-2 Extração, industrialização, comércio V e transporte de asbesto/amianto • tó . A Lei 9.055, de 1.6.1995 (DOU 2.6.1995), proíbe, em todo o terri-no nacional: "I - a extração, produção, industrialização, utilização e ram 12- Portaria 14, de 1.2.2000, da anp (DOU de 2.2.2000). Em janeiro de 2000 vaza-292.000 litros de óleo de duto da Petrobrás, atingindo a Baía da Guanabara. instituíri' A Lei 10336, de 19.12.2001 (DOU 20.12.2001), diz, no art. l2, § ls: "Fica P°rtac~ * a ontr'buição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a im-e áiCo e,a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados Federa] etlllco c°mbustível (cide), a que se referem os arts. 149 e 177 da Constituição • com a redação dada pela Emenda Constitucional 33, de 11.12.2001". Pau]0 j_ Ullherme J. p. Figueiredo, Direito Ambiental e saúde dos trabalhadores, São 278 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO comercialização da actinolita, amosita (asbesto marrom), antofíijta crocidolita (amianto azul) e da tremolita, variedades minerais perten' centes ao grupo dos anfibólios, bem como dos produtos que contenham estas substâncias minerais; II - a pulverização (spray) de todos os tipOs de fibras, tanto de asbesto/amianto da variedade crisotila como daquelas naturais e artificiais referidas no art. 2- desta Lei; III - a venda a granel de fibras em pó, tanto de asbesto/amianto da variedade crisotila como daquelas naturais e artificiais referidas no art. 2Ü desta Lei". Contudo, a mencionada lei não proibiu a extração, industrialização, utilização e comercialização do asbesto/amianto da variedade crisotila (amianto branco).15 No Brasil, alguns Estados legislaram sobre o amianto crisotila. Essa legislação foi apreciada pelo Supremo Tribunal Federal.16 A Comunidade Européia prevê a realização de Estudo de Impacto Ambiental para "instalações destinadas à extração do amianto, como a transformação do amianto e de produtos contendo amianto; para os produtos amianto-cimento, uma produção anual de mais de 200t de produtos acabados; para os complementos de fricção, uma produção anual de mais de 50t de produtos acabados; para as outras utilizações de amianto, uma utilização de mais de 200t por ano" (Diretiva 85/337-ce, Anexo I, 5). A Convenção de Espoo/91 repete a mesma norma. O asbesto é "variedade de anfibólio composta de silicato de cálcio e de magnésio que se apresenta em massas fibrosas incombustíveis e infusíveis, de aplicação comercial, sendo o amianto a sua variedade mais pura".17 O termo amianto é empregado como sinônimo de asbesto (ainda que haja pequena diferença de conceito). A utilização do asbesto tem provocado uma grave doença chamada "asbestose", que é "inflamação crônica do pulmão causada pela prolongada inalação de partículas de asbestos".18 O Conselho Nacional do Meio Ambiente-coNAMA tem-se preocupado com a matéria dada a gravidade para a saúde ambiental do trabalhador. Em 1987 foi emitida a Resolução 7/87. Em 24 de outubro de 15. V. Lei 9.976, de 3.7.2000 (DOU de 4.7.2000), que dispõe sobre a produção de cloro. No art. 22, VII, estabelece um "sistema gerencial do amianto", com diversas obrigações. 16. V. Paulo Affonso Leme Machado, "Federalismo, amianto e meio ambiente . Boletim Científico 9/169-177, Ano II, Escola Superior do Ministério Público da Uniã°> outubro-dezembro/2003. 17. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, cit. 18. The American Heritage Dictionary ofthe English Language, cit. LICENCIAMENTO AMBIENTAL 279 o conama elaborou a Resolução 18/87, que indica os dizeres a rn colocados sobre as peças que contêm amianto (asbestos): "Con-sfre mjanto. Ao cortar ou furar não respire a poeira gerada, pois pode ' gravemente a saúde". ys normas da Lei 9.055/95 não são, por si mesmas, suficientes a proteger a sanidade ambiental nas empresas e a saúde dos que P anipularem produtos com asbesto/amianto. O Brasil não se julgou em ondições de proibir a variedade crisotila (asbesto branco), como outros países estão fazendo, e substituir este material por outro não poluente. A lei reservou função importante na matéria aos sindicatos e aos médicos do trabalho. Acentue-se que os limites de tolerância para exposição dos trabalhadores nos locais de trabalho devem "ser revisados anualmente, procurando-se reduzir ao nível mais baixo que seja razoavelmente exeqüível" (art. 7a, § 2C, da Lei 9.055/95). A partir de 2 de junho de 1996, as empresas que não tenham assinado acordos com os sindicatos sobre a variedade crisotila e as fibras naturais e artificiais de qualquer origem sofreram automaticamente o cancelamento de seu alvará de funcionamento (art. 32, § 3Ü, da Lei 9.055/ 95). A fiscalização pública e privada é que irá implementar a aplicação desta ordem legal. O Decreto 2.350, de 15.10.1997 {DOU 16.10.1997), regulamentou a Lei 9.055/95, criando a Comissão Nacional Permanente do AmiantoCNPA. O número de trabalhadores que contraem asbestose é chocante. Quando não forem obedecidas, rígida e estritamente, as condições de segurança ambiental em tudo o que disser respeito ao amianto branco, 'ica caracterizado o crime de perigo do art. 15 da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, apenado com 1 a 3 anos de reclusão e multa de u0 a 1.000 mvr. Não é preciso esperar-se a manifestação da lesão corporal grave do trabalhador (agravante), para que o crime de perigo fique Plenamente tipificado. 1" li ' A .'1 , Capítulo V/ AUDITORIA AMBIENTAL 1. Nomenclatura* r< ; • , ': ''..'•, / O termo "auditor" é empregado no século XVI e "auditoria" no século XVII.' A expressão vem do Latim auditor, auditoris — ouvinte. "Auditoria - s.f. (auditor + ia) 1. Cargo de auditor. 2. Casa ou tribunal onde o auditor desempenha as suas funções. 3. Função de auditor junto às empresas comerciais."2 Auditoria, segundo a contabilidade, "é o exame analítico e pericial que segue o desenvolvimento das operações contábeis, desde o início até o balanço".3 Em Inglês: "1. An examination of records or accounts to check their accuracy. 2. An adjustment or correction of accounts. 3. An examined and verified account. 4. 'Rare' — an audience or hearing".4 Em Francês: "Audit-de 1'anglais internai auditor - dans une entreprise, personne dont Ia fonction est de s'assurer que les directives de Ia direction sont suivies et que le patrimoine de 1'entreprise est preserve".5 2. Conceito de auditoria ambiental Auditoria ambiental é o procedimento de exame e avaliação periódica ou ocasional do comportamento de uma empresa em relação ao meio ambiente.6 1. Antônio G. da Cunha, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, p. 83. 2. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, Mirador Internacional, p. 222. 3. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionário da Língua Português0-160. 4. The American Heritage Dictionary ofthe English Language, p. 86. 5. Petit Larousse Illustré, p. 82. 6. O Prof. Ramón Martin Mateo salienta em sua obraMieww Instrumentos ia Tutela Ambiental (Editorial Trivium, 1994) que o "caráter voluntário da ecoauditoria> n linha da autoresponsabilidade e autonomia propugnada pelas organizações empresaríal ' '- AUDITORIA AMBIENTAL 281 A auditoria ambiental pode ser pública ou privada, conforme seja de-minada e/ou realizada pelo Poder Público ou pela própria empresa. A auditoria ambiental privada tem sido impulsionada pela "tomada , consciência das vantagens na concorrência, que pode conferir a cer-empresas a adoção de medidas testemunhando sua "consciência ecológica" no plano da estratégia de concorrência, dos novos produtos, novas tecnologias e dos novos sistemas de gestão".7 Além disso, na fusão de sociedades ou na venda de empresas, inclusive estatais, atualmente, passou-se a auditar ambientalmente para a constatação de possível passivo ambiental. "Algumas das maiores corporações transnacionais - ao menos em parte como resposta do choque de Bhopal - agora colocaram em execução auditorias ambientais regulares para assegurar que as exigências dos regulamentos e que as responsabilidades ambientais de longo prazo (como os deveres legais de disposições de rejeitos) sejam acuradamente refletidas nos balanços de suas subsidiárias".8 No sistema jurídico ambiental norte-americano o banco que tenha financiado empresas degradadoras dos solos - tendo o financiamento uma garantia hipotecária —, em caso de insolvência do devedor pode vir a tornar-se proprietário do solo contaminado, passando a ser, também, responsável pela poluição.9 Nesse caso, oportuno o acompanhamento, através de uma auditoria ambiental, da atividade da empresa tomadora de empréstimo. A Diretiva 1.836/93 da Comunidade Econômica Européia define auditoria ambiental como o "instrumento de gestão que inclui a avaliação sistemática, documentada, periódica e objetiva do funcionamento "a organização do sistema de gestão e dos processos de proteção do meio ambiente". ln ? Que tenha um amplo consenso, não é algo indiscutível. O risco ambiental que a 30 de muitas empresas supõe tem uma transcendência social indubitável, não po-aj ° ser deixado ao livre-arbítrio das empresas o cumprimento das normas ambientais, Ordia5ue Possa argumentar-se, em sentido contrário, que para isso existem os recursos sit arios- Ademais, as empresas têm pouca tendência a difundir espontaneamente sua fica Se esta reve'a dados negativos. Em uma pesquisa realizada entre empresas amenão raS' europé'as e japonesas, dois terços das empresas consultadas manifestaram que vni,, Ve r'am informação ambiental que as prejudicasse, reconhecendo 60% que a Olui>tanedade era inadequada". en q '. °en°ít Boivin, "La verification environnementale", in Dévéloppements Récents "'l de 1'Environnement, p. 81. etei H. Sand, Lesson Learned in Global Environmental Governance, p. 33. -- Le ' at"ck Thieffry, "Uopportunité d' une responsabilité communautaire du pollueur artlérica' 'í011-'0115 entre les Étatsmembres et les enseignements de 1'experience lne', Revue Internationale de Droit Compare 1103-123, 1994. 282 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO As diferentes legislações irão dar outras características da audito. ria ambiental, notadamente, sobre as pessoas habilitadas a realizá-la e seu grau de publicidade. 3. A auditoria ambiental e o desenvolvimento sustentável O desenvolvimento sustentável ou sustentado é aquele que visa atingir as gerações presentes e futuras. A novidade do conceito é a introdução das gerações futuras não só como interessadas, mas titulares de direitos em relação ao desenvolvimento. A CF brasileira de 1988 introduziu o conceito no art. 225, caput. Até o advento do conceito do desenvolvimento sustentável, o planejamento econômico, mesmo quando observava uma vertente ambiental, circunscrevia-se a planejar o cronograma - curto, médio e longo prazo - com olhos na geração presente, isto é, na geração que imediatamente iria fruir o desenvolvimento planejado. Para que as gerações futuras possam encontrar recursos ambientais utilizáveis, que não tenham sido esgotados, corrompidos ou poluídos pelas gerações presentes, novos mecanismos de controle ambiental foram concebidos e estão sendo introduzidos nas legislações. "A adoção de novas formas de certificados e de comunicação da informação a terceiros, como, também, a adoção, na gestão interna, de novos sistemas de informação da gestão são inevitáveis e indispensáveis para as empresas que venham a aderir aos princípios do desenvolvimento sustentável ou do desenvolvimento durável. Os conselhos de administração, os gerentes, as partes interessadas e as autoridades regula-mentadoras desejam obter esta informação, que eles querem seja fidedigna e pertinente. Os dirigentes de empresa, sensíveis às transformações, irão querer tomar parte na elaboração dos novos tipos de informação e de comunicação da informação, tanto para a tomada de decisões como para o exame das contas. Esses dirigentes insistirão que se leve devidamente em consideração o aspecto rentabilidade dos sistemas de informação e de comunicação da informação e dos sistemas conexos.'" A Carta Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável da Câmara do Comércio Internacional, divulgada durante a II Conferência Mundial da Indústria sobre a Gestão do Ambiente (wicem II, Paris, 1991 )> em seu Princípio 1 reconhece que a gestão do meio ambiente na empresa é um fator determinante do desenvolvimento sustentável e assinala 10. Benoít Boivin, ob. cit. AUDITORIA AMBIENTAL 283 princípio fundamental - "Cumprimento da regulamentação e in°U ação: aferir o desempenho das ações sobre o ambiente, proceder larmente a auditorias ambientais e avaliar o cumprimento das exir" cia internas da empresa, dos requisitos legais e destes princípios; e, £ r:ocijcamente, fornecer as informações pertinentes ao conselho de rlministração, aos acionistas, ao pessoal, às autoridades e ao público". 4 Abrangência da auditoria No Estado do Rio de Janeiro, devem realizar auditoria ambientais anuais: "I - as refinarias, oleodutos e terminais de petróleo e seus derivados; II - as instalações portuárias; III - as instalações destinadas a estocagem de substâncias tóxicas e perigosas; IV - as instalações de processamento e de disposição final de resíduos tóxicos ou perigosos; V - as unidades de geração de energia elétrica a partir de fontes térmicas e radioativas; VI - as instalações de tratamento e os sistemas de disposição final de esgotos domésticos; VII - as indústrias petroquímicas e siderúrgicas; VIII - as indústrias químicas e metalúrgicas" (art. 5Ü da Lei 1.898, de 26.11.1991). O parágrafo único do referido art. 5a permite que a Comissão Estadual de Controle Ambiental-CECA, por proposição da Fundação Estadual de Meio ambiente-FEEMA, "dispense a auditoria ambiental nas instalações de tratamento e nos sistemas de disposição final de esgotos domésticos; nas indústrias químicas e metalúrgicas". O sistema previsto no Estado do Rio de Janeiro é misto quanto à obrigatoriedade, pois somente as atividades compreendidas nos incs. I a » é que estão obrigadas a realizar auditorias ambientais, não podendo o Orgão ambiental estadual dispensar tal exigência. Quanto às outras atividades licenciadas pelo órgão ambiental, a auditoria ambiental será voluntária, isto é, deixa-se à escolha da empresa. O Estado do Espírito Santo, pela Lei 4.802, de 2.8.1993, publicada "o DOE de 16.8.1993, tem as exigências dos incs. I a VIII da Lei do stado do Rio de Janeiro, acrescentando mais três: "IX - indústrias de Cewlose e papel; X - lixo hospitalar; e XI - mineração". Conteúdo da auditoria ambiental >ireito brasileiro to . Lei 1.898/91 do Estado do Rio de Janeiro estabelece que a audi-ambiental, através de seus estudos e avaliações, determine: "I - os 284 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO níveis efetivos ou potenciais de poluição ou de degradação ambiental provocados por atividades de pessoas físicas ou jurídicas; II - as condi ções de operação e de manutenção dos equipamentos e sistemas de controle da poluição; III - as medidas a serem tomadas para restaurar o meio ambiente e proteger a saúde humana; IV - a capacitação dos responsáveis pela operação e manutenção dos sistemas, rotinas, instalações e equipamentos de proteção do meio ambiente e da saúde dos trabalhadores" (art. l2). A lei fluminense determina que seja considerada não só a poluição encontrada como a potencial. Além da poluição, abrange a degradação ambiental, aí consideradas a fauna e a flora. Portanto, os recursos ambientais utilizados por uma empresa (como, por exemplo, uma fábrica de papel e celulose) serão considerados. Não só as condições de operação dos equipamentos e sistemas de controle da poluição serão analisados, mas, também, as condições de manutenção desses equipamentos e sistemas. A lei do Estado do Rio de Janeiro insere na sua tutela as medidas de reparação ao meio ambiente e à saúde humana, independentemente de qualquer ação judicial exigindo essa reparação. A auditoria ambiental irá constatar o que se faz efetivamente para sanar os danos, inevitáveis ou não, causados à saúde humana e ao meio ambiente, lembrando-se de que vigora o princípio de responsabilidade civil independente de culpa. A auditoria ambiental fluminense e a capixaba, que mencionamos abaixo, não se cingiu ao exame das medidas de prevenção dos danos específicos ao meio ambiente, mas tratando da saúde humana contemplará os sistemas, rotinas, instalações, equipamentos em relação à saúde e à segurança do trabalhador. A formulação de hipóteses de acidentes mostra a higidez do meio profissional não dissociada do meio ambiente interno e externo da empresa. A Lei 4.802, do Estado do Espírito Santo, de 2.8.1993, persegue os mesmos objetivos da lei fluminense, acrescentando finalidades que cumpre destacar (art. 2a): "I - estimar a qualidade do desempenho das funções do gerenciamento ambiental, os sistemas e os equipamentos utili' zados por empresa ou entidade;... IV - verificar o encaminhamento qus está sendo dado às diretrizes e aos padrões da empresa ou entidade, objetivando preservar o meio ambiente e a vida;... VI - propor soluções que permitam minimizar a probabilidade de exposição de operadores e do público a riscos provenientes de acidentes hipotéticos, mas prováveis, e de emissão contínuas que possam afetar direta ou indiretamente sua saúde ou segurança"................,........ .. ., '>!; AUDITORIA AMBIENTAL 285 a Lei 11.520/2000 - Código Estadual do Meio Ambiente do Estado Ri° Grande do Sul -, em seu Cap. XII, "Das Auditorias Am-. ° tais", art. 98, prescreve que, entre os aspectos a serem abordados na J1fTtoria ambiental, seja feita uma comparação com os impactos am-j tajs previstos no eia/rima e os efetivamente constatados, sejam avalia-os impactos ambientais não previstos no eia/rima e seja apresentado ronograma de ações corretivas e preventivas. A Lei 13.448, de 11.1.2002, do Estado do Paraná, determina que devam ser avaliados os riscos de acidentes e planos de contingências nara evacuação e proteção dos trabalhadores e da população situada na área de influência; quando necessário; a avaliação dos efeitos dos poluentes sobre os trabalhadores e a população lindeira, como também a análise de alternativas disponíveis, de processos, sistemas de tratamento e monitoramento, para a redução dos níveis de emissão de poluentes. 5.2 Direito Comparado A Resolução 1.836/93 da então Comunidade Européia-CE (hoje União Européia)," de 29.6.1993, propõe como temas a serem abrangidos na auditoria ambiental: 1) avaliação, controle e redução dos impactos da atividade em questão sobre os diferentes setores do ambiente; 2) gestão, economia e seleção da energia; 3) gestão, economia, seleção e transporte de matérias-primas; gestão e economia da água; 4) redução, reciclagem, reutilização, transporte e eliminação de resíduos; 5) avaliação, controle e redução de ruídos dentro e fora das instalações; 6) sele-Çao dos novos métodos de produção e alteração dos métodos existentes; ') planejamento dos produtos (concepção, embalagem, transporte, utilização e eliminação); 8) comportamento ambiental e práticas dos contrastes, subcontratantes e fornecedores; 9) prevenção e limitação dos acintes de meio ambiente; 10) processos de emergência em caso de aciden-s de meio ambiente; 11) informação e formação do pessoal em questões dentais; 12) informações externas sobre questões ambientais. A norma da ce prevê em seu Anexo I que deverá ser apresentada lista de disposições legislativas, regulamentares e outras de polítiçj- e arnbiente". Dessa forma, necessária a avaliação sob o prisma jurícinl cornPortamento da empresa, mas dentro de um enfoque interdisPla UA, a auditoria ambiental abrange, entre outras matérias: "o ejamento financeiro dos investimentos em matéria ambiental; ubhcada no Jornal da Comunidade Econômica Européia. "• ' 286 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO efetividade financeira da regulamentação ambiental; tomada de conscig cia e motivação dos empregados em matéria ambiental; aquisição e t são de sociedades; antecipação concernente às evoluções legislativas regulamentares federais e locais futuras de meio ambiente".12 Saliem Lepage Jessua que as empresas utilizavam as auditorias no sentido d se premunirem contra as ações judiciais. A norma britânica BS 7.750/92 aconselha que "os procedimentos devem incluir, quando apropriado, considerações sobre: a) emissões controladas e não controladas sobre a atmosfera; b) descargas controladas e não controladas de água; c) dejetos sólidos e outros; d) contaminação da terra; e) uso da terra, água, combustível e energia e outros recursos naturais; f) impacto sonoro, olfativo, de poeira, de vibração e visual; g) efeitos sobre partes específicas do meio ambiente e dos ecossistemas". A referida norma prevê ainda que os procedimentos devem incluir efeitos decorrentes, ou passíveis de decorrerem de: a) condições normais de operação; b) condições anormais de operação; c) incidentes, acidentes e situações potenciais de emergência; d) atividades passadas, atuais e planejadas. A auditoria ambiental analisará, também, a política ambiental e o programa de meio ambiente, quando a empresa explicitamente tiver elaborado esses dois documentos. A inexistência dos mesmos ou estarem em preparação não obsta à realização da auditoria. Oportuno apontarem-se os conceitos desses termos na Diretiva 1 .836/93-ce: "Política de Meio Ambiente" retrata os objetivos e princípios globais de ação de uma empresa em matéria de ambiente, incluindo a observância de todas as disposições regulamentares pertinentes, e "Programa de Meio Ambiente", a descrição dos objetivos e atividades específicas da empresa para assegurar maior proteção do ambiente numa dada instalação industrial, incluindo a descrição das medidas tomadas ou previstas para o cumpri' mento desses objetivos e, se adequado, os prazos para a aplicação de tais medidas. 6. Estudo de Impacto Ambiental-EiA e auditoria ambiental No Brasil, temos dois tipos de Estudo de Impacto Ambiental-EiA-aquele que é prévio à instalação de atividade ou de obra e o estudo exigi0 antes da autorização e/ou licença de funcionamento ou de operação12, Corinne Lepage Jessua, Audit cVEnvironnement, p. 288. ,., i AUDITORIA AMBIENTAL 287 A auditoria ambiental será sempre posterior ao Estudo Prévio de acto Ambiental-EPiA exigido constitucionalmente para a instalação a obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente (art. 225, § Ia, IV, daCF). A auditoria deverá aliar se as orientações contidas no estudo estão sendo observadas e se a métodos de controle ambiental estão sendo eficazes. Diferente é a situação do eia para a concessão de nova autorização /ou licença de funcionamento. Nesse caso, a auditoria ambiental poderá anteceder o eia/rima e lastrear algumas de suas considerações. Os dois institutos jurídicos-ambientais guardam semelhanças, pois os mesmos serão realizados às expensas da empresa e/ou do empreendedor. Quanto à independência dos auditores, comentaremos em tópico posterior. 7. Licenciamento e auditoria ambiental ><!: Para a Licença de Instalação e/ou para a Autorização de Instalação, a fase de auditoria será posterior ao licenciamento. Contudo, para a concessão de Licença de Operação e/ou Autorização de Operação, a auditoria ambiental poderá anteceder essa fase, como também será de grande importância na renovação do licenciamento. A renovação do licenciamento tem-se convertido em uma atividade administrativa sem um engajamento da pessoa física ou jurídica interessada. A auditoria ambiental evitará que esse procedimento seja meramente uma rotina e poderá dar uma outra dimensão na intervenção do órgão público de meio ambiente. No caso da Licença de Instalação e/ou Autorização de Instalação, a auditoria que for empreendida a posteriori deverá verificar o cumprimento das condições constantes do licenciamento. ->•• • Monitoramento e auditoria ambiental í f! *J monitoramento é um procedimento de medição das emissões e lar>çarnento dos efluentes, registrando-se continuadamente ou em riod ta K predeterminados. A elaboração do registro é indispensável para K°,rmaÇã° da própria empresa e do órgão público ambiental, como para o procedimento da auditoria. monitoramento ambiental pode ser realizado pela própria em-amfa' numa ação autofiscalizadora, como pelo próprio órgão público nito1Cnta'' ® fat0 de a empresa ou de o empreendedor realizar o automo-car arnent0' não elimina o dever do órgão público ambiental de verifi- dos dados oriundos desse monitoramento. :-i; s:,-,>-,.-, 288 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO m A auditoria ambiental não pode dispensar o monitoramento ambien tal, pois sem os seus dados dificultase a tal ponto uma idônea avaliará* ambiental, que a auditoria transforma-se numa inspeção ambiental, jst é, avaliará as condições presentes, sem abranger o período anterior, a auditoria ambiental visa analisar as atividades da empresa num determj. nado período anterior de tempo, e se inexistirem dados ambientais vera-zes e amplos, fica prejudicada essa avaliação. Portanto, a empresa qUe não se monitorar regularmente, não está em condições de apresentar como válida uma auditoria ambiental integral. 9. Inspeção e auditoria ambiental A inspeção ambiental caracteriza-se pela sua não periodicidade e por não estar ainda submetida a uma programação vinculante para o órgão público ambiental. Sem a inspeção ambiental fica o Poder Público sem possibilidade de acompanhar e verificar o licenciamento. A inspeção utilizará os dados do monitoramento ambiental, mas, inexistindo esses, procurará levantar dados, ainda que com vistas à realidade do meio ambiente atual, isto é, da época de sua realização. A auditoria ambiental, ao contrário, dependerá do exame e da avaliação de dados coligidos e documentados ao longo do tempo, isto é, abrangendo um determinado período anterior, como, também, a realidade atual do meio ambiente. Interessa apontar a regulamentação fluminense da auditoria ambiental, que, em seu art. 52, afirma: "a apresentação dos resultados da auditoria ambiental não implica a suspensão de qualquer ação fiscalizadora ou das obrigações de controle ambiental das atividades". Portanto,! a auditoria não exime o Poder Público de inspecionar, e se constatar q sua omissão ou inércia fiscalizadora tenha concorrido para a criação de situação de perigo para a incolumidade humana, vegetal ou animal, oü tenha concorrido para causar dano irreversível à fauna, flora e ao meio ambiente, os servidores públicos responderão, inclusive criminalmente, como torna claro o art. 15, § 2a, da Lei 6.938/81, com a alteração dada pela Lei 7.804/89. 10. O órgão público ambiental e a auditoria Nem todas as auditorias ambientais serão obrigatórias em razão o legislação ou determinadas pelo órgão público ambiental. Na raiz da aud1 toria constata-se uma grande liberdade de sua realização, mas encontrai?1 se outros sistemas legais que tornam algumas auditorias obrigatórias- AUDITORIA AMBIENTAL 289 isj0 caso das auditorias obrigatórias, à semelhança do que ocorre s Estudos de Impacto Ambiental, o órgão público ambiental po-/ elaborar um "termo de referência", contendo orientações a serem das em casos concretos ou genericamente no procedimento. SC As auditorias facultativas ou voluntárias não estão sujeitas à inter-cão do órgão público ambiental. Elas têm validade por si mesmas, V-n dependendo de aprovação administrativa. Contudo, na utilização j ssas auditorias, principalmente para a fruição dos benefícios de selos credenciamentos de qualidade, deverão ser seguidas as exigências da legislação. *':ij jj. Auditor ambiental ;,-,:n í, ,t ,; .1 afíioí .; íl» 77.7 Conceito de auditor < «j-jRi/ A Diretiva 1.836/93-ce conceitua auditor como "a pessoa ou equipe, pertencente ou não aos quadros da empresa, agindo em nome do órgão superior da empresa, que disponha, individual ou coletivamente das competências referidas no ponto C do Anexo II e suficientemente independente em relação às atividades que inspeciona para poder formular um juízo objetivo", j j;.>,',<.; .;J>;.'•.:.; 11'.2 Capacitação do auditor t < , •*<• o :•}.#<< :-nr.-< A Diretiva 1 .836/93-ce, no Anexo II, C, diz: "As auditorias de ambiente devem ser executadas por pessoas ou grupo de pessoas com um conhecimento adequado dos setores e áreas sobre os quais incidirá a auditoria, incluindo conhecimento e experiência em matéria de gestão e arnbiente e questões técnicas de ambiente e regulamentares relevan-es e da necessária formação e competências específicas para a conduÇao de auditorias, de modo a poderem atingir os objetos fixados. Os ecursos e o tempo consagrados à auditoria devem ser adequados ao ambito e aos objetivos da auditoria". A independência dos auditores ),'(•;, U3ia• !--:í;' ;-: ; " -1 A independência dos auditores na auditoria aií$>jça|l pública A Lei 1.898/91 do Estado Rio de Janeiro diz: Tft y.. V- "Das auditorias bienais independentes" no item 11.1.5 do Cap. Único do u- v- Resolução 306, de 5.7.2002 (DOU 19.7.2002, Seção 1, p. 75). 290 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO -. I 1 1 iI "Art. 4a. Sempre que julgarem conveniente para assegurar a idone' i dade da auditoria, os órgãos governamentais podem determinar que Se jam conduzidas por equipes técnicas independentes. "§ Ia. Nos casos a que se refere o caput deste artigo as auditorias deverão ser realizadas preferencialmente por instituições sem fins fo. crativos, desde que asseguradas a capacitação técnica, as condições de cumprimento dos prazos e valores globais compatíveis com aqueles propostos por outras equipes técnicas ou pessoas jurídicas." A Lei 11.520/2000 - Código Estadual do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul -, em seu Cap. XII, "Das Auditorias Ambientais", com onze artigos, preceitua: "Art.90. A auditoria ambiental será realizada por equipe multidisciplinar habilitada, cadastrada no órgão ambienta] competente, não dependente direta ou indiretamente do proponente do empreendimento ou atividade e que será responsável tecnicamente pelos resultados apresentados". A independência não é fácil de ser conquistada pelos auditores, mesmo na auditoria ambiental pública, uma vez que são pagos pela pessoa física ou jurídica que vai ser auditada. Como a imparcialidade é fundamental para a credibilidade de todo o procedimento, parece-nos, que, à semelhança do eia, faz-se necessária a realização de Audiência Pública. Dessa forma, o público, nele incluído as associações ambientais e outras organizações não-governamentais, poderão fiscalizar mais de perto todo o procedimento da auditoria ambiental pública. A Diretiva 1.836/93-ce, no citado Anexo II, C, preconiza: "Os auditores devem ser suficientemente independentes em relação às atividades que examinam, para atuarem com objetividade e imparcialidade". Ressalte-se que a Diretiva da Comunidade Econômica Européia criou um auditor externo independente, com o nome de verificador ambiental. Este está sujeito a um regime de credenciamento supranacional, válido em todos os países da ce (hoje União Européia). 11.3.2 Das auditorias ambientais independentes . • e a Lei 9.966, de 28.4.2000 ' " Sobre este assunto, remetemos o leitor para o item 11.1.5 do Cap'* tulo Único do Título XII ("Proteção da Zona Costeira - Aspectos Jur1' dicos"), onde o tema está exposto mais longamente. 11.3.3 A independência dos auditores na auditoria ambiental privada Como já se afirmou, a auditoria ambiental privada é aquela reahza da voluntariamente pela pessoa física ou jurídica auditada. Como se vi AUDITORIA AMBIENTAL 291 róprio conceito de auditor da Diretiva da antiga Comunidade Euro-n° (hoje União Européia), é permitido utilizar-se como auditor pessoa Pe'ncente aos quadros da empresa. Corinne Lepage Jessua acentua que "se o auditor ambiental faz rte da empresa, ele encontrará as dificuldades próprias a todos os au-Htores internos, dificuldades acrescidas na medida em que o meio amhiente ainda é, na maioria dos casos, o parente pobre da empresa. Nes-condições, o auditor interno de meio ambiente corre o risco de não dispor de toda a independência e de todos os poderes de que tem necessidade para executar bem sua missão. Com efeito, no plano hierárquico, o auditor de meio ambiente não deverá estar subordinado a outro diretor ou superior que esteja fora de uma direção de meio ambiente ou de auditoria".14 Para que haja eficácia na auditoria ambiental, recomendou a ce no mencionado Anexo II, C, que "a administração da empresa, no seu mais alto nível, deve apoiar a auditoria". A regulamentação da lei fluminense de auditoria afirma em seu art. 40. "A auditoria ambiental poderá ser realizada por equipe da própria empresa, por firma contratada, de caráter privado ou não, com ou sem fins lucrativos, bem como por auditores autônomos. "Parágrafo único. A empresa que realizar sua própria Auditoria Ambiental não poderá compor sua equipe com técnicos responsáveis pela operação da mesma." "4 Responsabilidade dos auditores '' ; >. . . A responsabilidade civil ambiental é objetiva ou independente de culpa, como prevê o art. 14 da Lei 6.938/81. Essa a responsabilidade do eitlpreendedor ou da empresa, que dela não se isenta pelo fato de sub-nieter-se a uma auditoria. O empreendedor ou a empresa auditada poderá, porém, voltar-se re§ressivamente contra os auditores independentes que a tenham acone'hado com negligência, imperícia, imprudência e/ou dolo. A respon-Sa°ilidade dos auditores independentes inscreve-se no sistema de res-P°nsabilidade subjetiva ou com culpa e, portanto, caberá aos autores da Ção judicial (empreendedor ou empresa auditada) o ônus de provar a Culpa. 14. Ob. cit., p. 147. 292 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Na auditoria ambiental privada, realizada por auditores internos não me parece tranqüila a possibilidade de o empreendedor ou a ernpre! sa voltarem-se regressivãmente contra seus empregados, a não ser e caso de dolo, pois presente está o vínculo de subordinação, inegável na escala hierárquica de qualquer empresa. 12. Periodicidade da auditoria ambiental A auditoria ambiental privada ou pública deve ser repetida em determinados prazos. Não é normalmente episódica, gerada somente por catástrofe ambiental, ainda que possa ser realizada uma auditoria extraordinária. A rotina temporal de uma auditoria prende-se à idéia do acompanhamento das medidas propostas, fazendo com que esse procedimento não fique isolado dentro da cadeia de produção de uma empresa. A Lei 1.898/91 do Estado do Rio de Janeiro, em seu art. 5Ü, caput, estabelece, para as atividades ali previstas, obrigatoriedade de audiência anual. A Lei 848, de 10.4.1992, do Município de São Sebastião/SP, estabelece auditorias ambientais a cada dois anos (art. 3a, § 7a). A lei municipal de Vitória (Lei 3.968, de 15.9.1993) prevê o prazo máximo de dois anos entre as auditorias, sendo que a Lei 4.802/93, do Estado do Espírito Santo, preceitua o prazo máximo de três anos (a lei do Município de Vitória está plenamente dentro da autonomia constitucional do Município). A Lei 13.448, de 11.1.2002, do Estado do Paraná, diz que as auditorias ambientais compulsórias devem ter o intervalo máximo de quatro anos (art. 4Ü). As auditorias ambientais privadas sujeitar-se-ão à política ambiental da empresa e, notadamente, aos prazos de validade dos certificados àe qualidade que lhe forem conferidos. 13. Documentação da auditoria ambiental i!'-''"i »-'-'<• - n; > (i;f.'-'i,; •.-.- ;. A norma britânica BS 7.750/92 sugere no item 4.4, "Efeitos sobre o meio ambiente": "4.4.1 Relatório de especificações legais, regulamentares e outros' a empresa deverá criar e manter procedimentos para registrar todas a especificações legais, regulamentares e outros, pertinentes aos aspect ambientais de suas atividades, produtos e serviços. "4.4.2 Comunicações: a empresa deverá criar e manter proce AUDITORIA AMBIENTAL 293 e externas) de partes interessadas de relevância, relativas aos efeitos ambientais e seu controle"4.4.3 Avaliação e registro dos efeitos sobre o meio ambiente: a oresa deverá criar e manter procedimentos para examinar e avaliar B efeitos sobre o meio ambiente, tanto diretos quanto indiretos, de suas °tvidades, produtos e serviços, como compilar um registro daqueles feitos identificados como importantes." 14. Publicidade e/ou confidencialidade da auditoria ambiental .»/ vi.- f,V A transmissão dos dados da auditoria ambiental ao público pode conter "riscos de perversão de um sistema de publicidade muito exigente ou mal concebido da auditoria. A preocupação com a comunicação e com o marketing não deve sobrepor-se à da análise objetiva e séria do desempenho ambiental, levandose a passar uma borracha nas deficiências e a oferecer uma imagem deformada, porque excessivamente otimista. Não se deverá, outrossim, ocultar os verdadeiros riscos sob pretexto de que fazê-los aparecer na auditoria significaria denunciar o presidente da empresa ou os responsáveis", acentua validamente Corinne Lepage Jessua.15 Acentue-se que nos países da União Européia, como em outros, inclusive no Brasil, não está impedida e/ou desvalorizada a auditoria ambiental confidencial. A empresa pode voluntariamente utilizar-se desse wstrumento de avaliação para fins de auto-orientação, tendo o direito de conservar os dados dessa auditoria em sigilo. Saliento que a confidencialidade abrange o procedimento da auditoria e não os dados constan-es do automonitoramento que a empresa regularmente efetua. A Diretiva 1.836/93-ce somente previu auditorias ambientais vo, "tarias. Entretanto, a adesão das empresas ao sistema de ecogestão cluirá sempre a "prestação de informações ao público na matéria" _. ' 'a> § Ia). Desta forma, na regulamentação da Comunidade Econôca Européia, em especial para a obtenção da "Declaração sobre o ei° Ambiente" a ser emitida pelas empresas, não há auditorias sigiloSas ou confidenciais. aq j auditoria ambiental em que se preconiza a confidencialidade é E>iv a e v'sa ° ajustamento e o aconselhamento interno da empresa. sa é a situação em que a auditoria visa obter a certificação de sua l5.Ob. e loc. cits. 'ÍJ :•• I 294 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO qualidade ambiental. Aí é relevante a participação do público. Ness sentido, é que o Código do Meio Ambiente do Município da Franca/Sb (Lei Complementar 9/96) previu: "Quando as pessoas físicas ou jurí cas realizarem auditorias privadas facultativas, destinadas à obtençL de certificado ou rótulo de qualidade ambiental, o relatório da auditorja será submetido ao procedimento de audiência pública, constante do art 18 deste Código".16 15. A auditoria ambiental e as organizações não-governamentais É mencionada a experiência dos "Amigos da Terra" no Reino Unido, que a nível municipal, desde 1988, têm efetuado auditorias ambientais. Parecem-me possíveis dois tipos de auditoria ambiental realizada por organizações não-governamentaisONGs. O primeiro tipo de auditoria seria realizado em áreas fora do limite da propriedade da empresa auditada, medindo-se os efeitos externos da atividade nas águas, na atmosfera, na biota e no solo. Essa auditoria não exigiria a concordância da empresa; poderia ser feita com sua cooperação ou mesmo com a sua discordância. O segundo tipo de auditoria ambiental seria uma atividade das ongs no interior da empresa auditada, colaborando com o órgão público ambiental, mas com a expressa e indispensável concordância da empresa auditada. Destarte, não é de ser confundida uma visita de uma ong a uma empresa com uma auditoria. Na visita, vê-se e percorre-se aquilo que a empresa quiser livremente mostrar, não havendo um direito formal de inspeção. 16. Ação civil pública e auditoria ambiental ' ; O Ministério Público Federal ou Estadual tem irrefutável direito àe requisitar a vinda do relatório de auditoria ambiental, quando esta tenh' sido realizada em cumprimento de exigência da legislação. Não se traW> portanto, de requisição de auditoria ambiental realizada voluntária o" facultativamente pela empresa, conforme a Lei 7.347/85. 16. O Autor atuou como Consultor Jurídico na preparação do anteprojeto de l* que tramitou na Câmara Municipal de Franca, tendo sido o projeto de autoria do médic Dr. Joaquim Pereira Ribeiro. . . AUDITORIA AMBIENTAL 295 vros casos previstos nas leis estaduais e municipais citadas, se as jas ambientais não forem realizadas, poderá invocar-se o cumpri-to da obrigação de fazer em ação civil pública por todos os legitima-1116 agir nessa ação judicial. Poder-se-á também buscar o cumprimento , hrigacão de não fazer, quando a auditoria for feita por pessoas deradas inidôneas ou que nao preencherem os requisitos da legislação. i > . "i. , Pu ii»í( i,' A >>{ Jl" iT. ii' '>• :i,f <• ' t, ' ! 1 ') ' ,, ~ 1 i ; l ' '* . !• • ! ' 'V { U<' v f '!! H r * J ( IV 'í ...vímO .!' ' I '< f . . , ' Capítulo V// DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 1. Introdução A Lei 9.605, de 12.2.1998, utilizou a competência constitucion da União para elaborar uma norma geral sobre as infrações administrará vas. A matéria está contida no Cap. VI, em sete artigos, do art. 70 ao art. 76. A União tem competência para estabelecer normas gerais em matéria de meio ambiente (art. 24, VI, da CF) e proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico (art. 24, VII, da CF), conforme o art. 24, § Ia, da CF, que diz: "No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais". A Lei 9.605/98, na parte da infração administrativa, pode ser suplementada pelos Estados e Municípios (art. 24, § 2-, da CF). O uso da competência suplementar deve conduzir a modificações que não alterem a finalidade da norma geral federal. Na parte em que a Lei 9.605/98 tratou de Direito Penal não há possibilidade de suplementação, pois no campo do Direito Penal a competência da União é privativa (art. 22,1, da CF). Infração administrativa ambiental é toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente (art. 70, capui). As regras jurídicas devem estar expressas em algum texto, devidamente publicado. O auto de infração ambienta] deverá apontar a regra jurídica violada. "Ao contrário do Di' reito Penal, em que a tipicidade é um dos princípios fundamentais, de corrente do postulado segundo o qual não há crime sem lei que o prevê ja, no Direito Administrativo prevalece a atipicidade; são muito poucas as infrações descritas na lei, como ocorre com o abandono de cargo" " ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro.' 1. Direito Administrativo, 8a ed., São Paulo, Atlas, 1997. DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 297 As infrações administrativas são apuradas em processo administranróprio, segundo o critério de ampla defesa e contraditório, obser-tÍVndo-se as disposições da Lei 9.605/98 e da Lei 9.784/99. Estas dire-Va es da lei são calcadas na Constituição Federal, que diz: "aos litiganem processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são 16 segurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (art. 5a, LV). A Profa. Odete Medauar assinala que integram o direito de ampla defesa: o caráter prévio da defesa; direito de interpor recurso administrativo; a defesa técnica, concretizada na defesa realizada por advogado; direito de informação geral sobre o processo e direito de requerer a produção de provas.2 A lei estabeleceu prazos máximos para a apuração da infração ambiental. Vinte dias para o infrator oferecer defesa ou impugnação contra o auto de infração; 30 dias para a autoridade julgar o auto de infração e 20 dias para o infrator recorrer da decisão condenatória à instância superior, e 5 dias para o pagamento de multa. Como a finalidade do estabelecimento de "prazos máximos" (art. 71, caput) é não permitir o retardamento do processo, parece-nos que Estados e Municípios poderão suplementar a lei para exigir prazos menores, e não maiores. Elogiável o estabelecimento de prazos para a tramitação do processo administrativo ambiental. Até o momento esses processos têm sido demasiadamente lentos. Como não há um "Ministério Público administrativo", a própria Administração é a encarregada de fazê-lo ca-mmhar, inclusive de ofício, isto é, sem requerimento do acusado. No inc. III do art. 71 consta: "vinte dias para o infrator recorrer da ecisão condenatória à instância superior do Sistema Nacional de Meio Ambiente-sisNAMA, ou à Diretoria de Portos e Costas, do Ministério da annha, de acordo com o tipo de autuação". Acreditamos que esse nciso pode levar a interpretações diversas. Pode-se recorrer de uma nÇao administrativa imposta por um órgão estadual de meio ambiente Conselho Nacional de Meio Ambiente, ambos órgãos do sisnama? O 'sterna Nacional do Meio Ambiente não foi instituído pela Constituijls° Federal, mas pela Lei 6.938, de 31.8.1981. Não nos parece que o q NaMa possa ter a mesma amplitude que o Sistema Nacional de Asrenciamento de Recursos Hídricos, previsto pelo art. 21, XIX, da CF. ta ,ComPetências administrativas no federalismo merecem ser interpre18 d estrarnente diante do princípio da "autonomia" constante do art. a CF. A dimensão e a partilha das competências são dadas unica2. D, l>-eito Administrativo Moderno, São Paulo, Ed. RT, 1996. 298 : DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO mente pela Constituição Federal. Assim, parece-nos que o direito de recurso, de que trata o art. 71, III, da Lei 9.605/98, é exercido somente perante as instâncias administrativas de cada unidade da Federação, e não se pode recorrer de uma decisão de um órgão municipal ou estadua] ao conama. A lei em exame apresenta o seguinte rol de sanções para as infrações administrativas: advertência; multa simples; multa diária; apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e da flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; destruição ou inutilização do produto; embargo de obra ou atividade; demolição de obra; suspensão parcial ou total de atividades; restritiva de direitos. Essa enumeração é obrigatória para a União, mas Estados e Municípios podem acrescentar outros tipos de infrações junto à lista apresentada no art. 72 da Lei 9.605/98. Das 10 sanções previstas no art. 72 da Lei 9.605/98 (incs. I a XI ),3 somente a multa simples utilizará o critério da responsabilidade com culpa; e as outras nove sanções, inclusive a multa diária, irão utilizar o critério da responsabilidade sem culpa ou objetiva, continuando a seguir o sistema da Lei 6.938/81, onde não há necessidade de serem afe-ridos o dolo e a negligência do infrator submetido ao processo. 2. Multa . • ... , >; j 2.1 Introdução "A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo: I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinado por órgão competente do sisnama ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha; II -opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do sisnama ou da Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha" (art. 72, § 32, da Lei 9.605/98)-"A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente" (art. 72, § 4a> da Lei 9.605/98). Na esfera federal, o conama tem competência para "homologar acordos visando à transformação de penalidades pecuniárias na obrigação de executar medidas de interesse para a proteção ambiental (art. 8e, IV, da Lei 6.938/81). "A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infra" ção se prolongar no tempo" (art. 72, § 5U, da Lei 9.605/98). A multa 3. O inc. X foi vetado pelo Presidente da República. DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 299 diária é um instrumento importante para não permitir a continuidade da •«fração. Se aplicada a multa simples e houver a permanência do ilícito, multa diária deverá ser cominada. "Os valores arrecadados em pagamento de multas por infração ambiental serão revertidos ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, criado pela Lei 7.797, de 10.7.1989, Fundo Naval, criado pelo Decreto 90 923, de 8.1.1932, fundos estaduais ou municipais de meio ambiente, ou correlatos, conforme dispuser o órgão arrecadador" (art. 73 da Lei 9.605/98). "A multa terá por base a unidade, hectare, metro cúbico, quilogra-ma ou outra medida pertinente, de acordo com o objeto jurídico lesado" (art. 74). É uma inovação que pode permitir a adequação da pena pecuniária à agressão ambiental realizada. "O valor da multa de que trata este Capítulo será fixado no regulamento desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 e o máximo de R$ 50.000.000,00" - art. 75. A fixação do mínimo e do máximo da pena de multa foi essencial para guardar a legalidade dessa sanção. Estados e Municípios poderão fixar limites mínimo e máximo superiores ao da União. "O pagamento de multa imposta pelos Estados, Municípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa federal na mesma hipótese de incidência" (art. 76 da Lei 9.605/98). Os processos administrativos podem correr paralelamente, mas o pagamento da multa nas unidades federadas implica o não-pagamento da multa federal. Esse artigo pode conduzir a favorecimento do réu - pessoa física ou jurídica -, pois as multas pagas nos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios Poderão ser menores do que a cominada pela União. •* O dolo e a negligência na multa simples A Lei 9.605/98 diz, no art. 72, § 32, que "a de multa simples será P Jcada sempre que o agente, por negligência ou dolo ....". O Decreto '9 de 11.9.1999,4 repete a norma em seu art. 2a, § 3a. Ao utilizar as ões "negligência ou dolo", esse parágrafo específico desvia-se aotac*0 na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei em seu art. 14, § lü, representando o § 3a uma volta no tempo desserviço aos objetivos da própria Lei 9.605/98. 6 4- DOU 22.9.1999, Seção 1. 300 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente adotou a responsa bilidade sem culpa ou objetiva (v. Tít. V, Cap. I, item 3, deste livro), nu continua integralmente em vigor quanto à responsabilidade civil p0 danos ao meio ambiente e a terceiros. Hely Lopes Meirelles já ensinava que "a multa administrativa é de natureza objetiva e se torna devida independentemente da ocorrência de culpa ou dolo do infrator".5 Régis Fernandes de Oliveira afirma que "basta a voluntariedade, isto é, o movimento anímico consciente e capaz de produzir efeitos jurídicos. Não há necessidade da demonstração de dolo ou culpa do infrator; basta que, praticando o fato previsto, dê causa a uma ocorrência punida pela lei". Cita julgado do TJSP: "a multa fiscal pode aplicar-se independentemente de dolo ou culpa; o elemento subjetivo é irrelevante".6 A Lei 9.784, de 22.1.1999, não afirma que a Administração deva provar a "negligência ou o dolo" do infrator, mas diz somente que "o órgão competente para a instrução fará constar dos autos os dados necessários à decisão do processo" (art. 29, § lfl); que "cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, sem prejuízo do dever atribuído ao órgão competente para a instrução e do disposto no art. 37 desta Lei". O art. 37 manda a Administração fornecer cópias ou informes quando os fatos alegados versarem sobre matéria que ela tenha em seus registros. A lei referida aplica-se subsidiariamente ao processo das infrações ambientais (art. 69). 2.3 As multas e a reparação do dano lj '' ' uí»-1 A matéria está regrada no art. 60 do Decreto 3.179/99. As multas podem ter sua exigibilidade suspensa se o infrator obrigar-se a realizar medidas para fazer cessar ou corrigir a degradação do meio ambiente. Para isso, deverá ser assinado termo de compromisso perante a autoridade competente. Essa autoridade deverá decidir, motivadamente (art. 2a da Lei 9.784, de 29.1.1999), se o infrator deverá ou não apresentar projeto técnico. Diz o decreto que as multas "podem ter sua exigibilidade suspensa", parecendo-me que não se trata de uma faculdade da Administração conceder a suspensão do pagamento, mas um dever da mesma, desde que o projeto esteja adequado. 5. Direito Administrativo Brasileiro, 24a ed., São Paulo, Malheiros Editores, 199"' p. 178. 6. Infrações e Sanções Administrativas, São Paulo, Ed. RT, 1985. DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 301 Cumpridas as obrigações assumidas pelo infrator, este pagará 10% multa inicialmente cominada. Havendo interrupção do cumprimento , pedidas reparatórias, a multa será paga em correspondência ao dano não reparado. i perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público e/ou perda ou suspensão ' " • de participação em linhas de financiamento * em estabelecimentos oficiais de crédito Caberá às Administrações ambientais da União, dos Estados e dos Municípios propor essas medidas. O art. 14, § 32, previu que na área federal a aplicação dessas medidas será atribuição da autoridade administrativa ou financeira que concedeu os benefícios, cumprindo resolução do conama. A lei foi clara ao conceder ao Conselho Nacional do Meio Ambiente o direito de determinar a aplicação dessas medidas. Trata-se de uma medida de grande alcance na dissuasão da infração ambiental, se os estabelecimentos de crédito da União realmente acatarem as determinações emanadas do órgão colegiado. Parece-nos que o conama só poderá aplicar essas sanções na órbita federal, mesmo que a lei não se tenha pronunciado expressamente. É decorrência do princípio federativo. Nos Estados e nos Municípios, os seus organismos ambientais é que terão competência para propor as medidas punitivas do art. 14, II e III. "*• Suspensão das atividades A suspensão de atividades é a mais forte das medidas punitivas, Porque vai paralisar, fechar ou interditar as referidas atividades. Pode er o caráter de suspensão parcial ou total, e/ou a forma de suspensão temporária ou definitiva. ( Há de se distinguir entre atividade licenciada e não licenciada na dessa sanção. . .,:., ,,,,,.,,.„ 4]o Pensão de atividades licenciadas am i° ~rt' 10 da Lei 6.938/81 previu que "a construção, instalação, de ] laÇão e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras ecursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente polui- 302 a DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO dores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradaçg0 ambiental, dependendo de prévio licenciamento por órgão estadual com. petente, integrante do sisnama, sem prejuízo de outras licenças exigíveis" As penalidades previstas no art. 14 da mesma lei dizem respeito a atividades e estabelecimentos que estejam operando com prévia licença. Houve, pois, um início de atividade da empresa caracterizada pela concordância do Poder Público, que ao licenciá-la verificou a ocorrência das exigências legais. A punição posterior é conseqüência do descumprimento das condições gerais ou específicas da licença. Essa diferenciação é de ser feita, pois diferente é o sistema de suspensão de atividade não licenciada. A relocalização é medida que pode ser prevista num plano de zoneamento, quer municipal, quer estadual ou federal. Ainda que relocalizar (art. 12, parágrafo único, da Lei 6.803/80; art. 4D do Decreto-lei 1.413/75) possa implicar uma suspensão temporária, não quer dizer uma suspensão definitiva. Dá-se uma oportunidade para o estabelecimento poluidor de transferir-se de local. Por isso, haverá um prazo para a relocalização. Dessa forma não se corta abruptamente a atividade produtora. Por isso, parece-nos que a relocalização não está proibida na esfera municipal ou estadual, não sendo a relocalização de competência exclusiva do Presidente da República. Do contrário, seria propor-se o fim do princípio constitucional federativo, anulando-se o direito fundamental do Município modificar o seu zoneamento urbano, matéria de seu "peculiar interesse". «'.Vlüí1.-1' 4.2 Suspensão de atividades não autorizadas to. A infringência do dever de licenciar a atividade acarreta o dever à autoridade ambiental de fechar o estabelecimento faltoso. Neste caso não se trata de infração cometida após o licenciamento. O simples fato de entrar em atividade já deve levar à suspensão das atividades. Não se trata do mesmo tipo de suspensão descrito no item anterior e, portanto, a suspensão pode ser determinada por autoridade municipal ou estadual, ainda que seja definitiva. 5. Redução das atividades O art. 10, § 3U, preceitua: "O órgão estadual do meio ambiente e ° ibama, este em caráter supletivo, poderão, se necessário, e sem prejuíz0 DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 303 oenalidades pecuniárias cabíveis, determinar a redução das ativida-geradoras de poluição, para manter as emissões gasosas, os efluentes -dos e os resíduos sólidos dentro das condições e limites estipulados o licenciamento concedido". Este artigo minora o efeito da proibição de suspender definitiva-ente a atividade por parte da autoridade ambiental dos Estados. A licença não tem necessidade de especificar os limites de emis-ão pois é óbvio que serão aqueles vigentes na ocasião do ato administrativo. O artigo não foi claro acerca da possibilidade de ser exigida a redução de atividades, quando haja mudanças nas normas vigentes ao tempo do licenciamento. Como já salientamos, a autoridade ambiental não pode mudar, por capricho ou ao sabor das pressões, as regras de funcionamento. De outro lado, contudo, a edição dessas regras não as torna imutáveis. Para que não se altere inadvertidamente o sistema de funcionamento do estabelecimento, a licença deve ser concedida por um determinado prazo. Findo o prazo, haverá a revisão da licença. Por isso mesmo constou expressamente da Lei 6.938/81 (art. 9-, IV) o direito do Poder Público de rever o licenciamento. Com a revisão, haverá uma adequação às novas normas e, então, sob a égide de uma nova licença (ou uma licença modificada) é que poderá ocorrer a exigência da redução das atividades em condições e limites diversos do licenciamento inicial. ,..,„,..... 6. Sanções administrativas ambientais em nível federal .,-,> o v. Podemos mencionar como principais penalidades administrativas ambientais: apreensão, apresamento de embarcação, caducidade de autorização de pesquisa, caducidade de concessão de lavra, cassação de rnatrícula, cancelamento de registro, demolição de obra, embargo, interno, multa, perda ou restrição de incentivos fiscais concedidos pelo er Público, perda ou suspensão de participação em estabelecimen-Os de crédito, retenção, suspensão de atividades e suspensão de registro. Procuraremos apontar algumas das sanções referidas e os bens providos, com os textos da legislação. Apreensão ....y.-.-i '.,: : < dü A Lei 9.605/98 contém o Cap. III, que trata da "Apreensão do Pro-0 e do Instrumento de Infração Administrativa ou de Crime". Di o art. 25: 304 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO "Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instru. mentos, lavrando-se os respectivos autos. "§ le. Os animais serão libertados em seu habitai ou entregues a jardins zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas, desde que fiquem sob a responsabilidade de técnicos habilitados. "§ 2a. Tratando-se de produtos perecíveis ou madeiras, serão estes; avaliados e doados a instituições científicas, hospitalares, penais e ou-| trás com fins beneficentes. "§ 3a. Os produtos e subprodutos da fauna não perecíveis serão' destruídos ou doados a instituições científicas, culturais ou educacionais. "§ 4a. Os instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos, garantida a sua descaracterização por meio da reciclagem." O Decreto 3.179, de 21.9.1999, que regulamentou as sanções administrativas ambientais, abriu uma brecha (art. 2a, § 6a, II, a) no acima disposto na Lei 9.605/1998. Indica que os animais apreendidos, na "impossibilidade de atendimento imediato", de libertação em seu habitat natural ou de sua entrega às instituições especificadas, serão entregues em depósito. Não é dito nas mãos de quem será efetuado o depósito, dando-se a chance de o infrator tornar-se o depositário. A impossibilidade de cumprir os objetivos fundamentais legais da apreensão deve ser claramente explicitada pelo funcionário que fizer a apreensão (respondendo o mesmo pela falsidade da informação). A prática do depósito dos animais apreendidos leva à corrupção da Administração Pública e ao incentivo da caça ou aprisionamento ilegais da fauna. 1. Águas: "apreensão do material e das máquinas usadas" em atividades que visem a implantar ou fazer funcionar indústrias potencialmente poluidoras, capazes de afetar mananciais de água, em Áreas de Proteção Ambiental (art. 9Ü, a, e o § 2a desse artigo, da Lei 6.902, de 27.4.1981); "apreensão do material e das máquinas usadas" em atividades capazes de provocar "acentuado assoreamento das coleções hídricas nas Áreas de Proteção Ambiental. 2. Fauna: 2.1) apreensão de petrechos e produtos de pesca, ocorrendo ausência de licença de pesca (art. 19, §§ Ia e 2fl, do Decreto-leI 221, de 28.2.1967); 2.2) apreensão de petrechos e produtos de pesc3 ocorrendo ausência de autorização científica (art. 30 do referido decre' to-lei); 2.3) apreensão de petrechos e produtos de pesca, quando esta ocorrer em desacordo com o determinado pelo ibama,7 com referência » 7. O ibama incorporou a sudepe. DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 305 1 cão das espécies, os tamanhos mínimos e as épocas de proteção (art. seus parágrafos do referido decreto-lei); 2.4) apreensão de petres e produtos de pesca, quando a importação ocorrer sem autorização j irama; 2.5) apreensão de petrechos e produtos de pesca, quando ocorexportação sem autorização do ibama (art. 34 do referido decreto-| :y 2.6) apreensão de petrechos e produtos de pesca, ocorrendo introdução de espécie exótica, sem autorização do ibama (art. 34 do referido decreto-lei); 2.7) apreensão de petrechos e produtos da pesca, ocorrendo esta em lugar proibido (art. 35, a, do referido decreto-lei); 2.8) apreensão de petrechos e produtos da pesca, quando esta ocorrer em lugar que cause embaraço à navegação (art. 35, b, do referido decreto-lei); 2.9) apreensão de petrechos, quando estes forem de uso proibido (art. 39); 2.10) apreensão de petrechos e produtos da pesca, quando a empresa que comercia os animais aquáticos não estiver registrada (art. 52 do referido decreto-lei); 2.11) apreensão de armas, munições, material de caça ou pesca e do produto da infração, quando irregularmente introduzidos nos parques nacionais (arts. 49, II, e 51 do Decreto 84.017, de 21.9.1979); 2.12) apreensão de armas de qualquer tipo, de instrumentos de corte de árvores, de redes de apanha de animais e outros artefatos de captura trazidos ou usados no interior de estações ecológicas (art. 7a, § lü, c,dte, c/c o § 4a, da Lei 6.902, de 27.4.1981); 2.13) apreensão do material que possa ameaçar de extinguir as espécies raras da biota regional nas Áreas de Proteção Ambiental (art. 9Ü, d, c/c o § 2a desse artigo, da Lei 6.902, de 27.4.1981). 6.2 Apresamento de embarcação iG Fauna: apresamento da embarcação estrangeira que exercer ativi-ade de pesca, sem autorização do Ministro do Meio Ambiente. 3 Cassação de matrícula Fauna: os infratores què.reincidirem nas infrações mencionadas °s mcs. 2.1 a 2.10 terão suaçjnatrículas cassadas (art. 64 do Decreto-161 221, de 28.2.1967). ' .', aducidade de autorização de pesquisa -Águas: poluição de águas resultante dos trabalhos de mineração: d«d de caducidade pode ser imposta pelo Ministro de Minas e quando o infrator, embora multado por duas vezes no interva- 306 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Io de um ano, prosseguir no descumprimento das determinações da f; calização" (art. 102, II, do Decreto 62.934, de 2.7.1968,-c/c o art. 54 XI, e XII, do mesmo decreto). '* 2. Ar. poluição do ar resultante dos trabalhos de mineração: mes mo suporte legal que no caso anterior. n 6.5 Caducidade da concessão de lavra 1. Águas: poluição de águas resultante dos trabalhos de mineração-a penalidade de caducidade pode ser imposta pelo Presidente da República, "quando o infrator, embora multado por duas vezes no intervalo de um ano, prosseguir no descumprimento das determinações da fiscalização" (art. 102, II, do Decreto 62.934, de 2.7.1968, c/c o art. 54, XI e XII, do mesmo decreto). 2. Ar: poluição do ar resultante dos trabalhos de mineração: mesmo suporte legal que no caso anterior. 6.6 Cancelamento do registro 1 Flora: cancelamento do registro de pessoa física ou jurídica que, na segunda reincidência, não observar o corte racional de madeira ou abater árvores em número superior ao autorizado no plano de corte (art. 17, IV, do Decreto-lei 289, de 28.2.1967). A penalidade é de competência do iBDF-Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal, atualmente IBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. 6.7 Demolição de obra 1. Entorno de proteção e de ambientação de local turístico: derriO' lição de construção ou remoção de objeto que interfira com os entornos de proteção e ambientação do local de interesse turístico (art. 24, V, da Lei 6.513, de 20.12.1977). Entorno de proteção "é o espaço físico ne' cessário ao acesso do público ao local de interesse turístico e à sua cofí' servação e valorização. Entorno de ambientação é o espaço físico ne' cessário à harmonização do local de interesse turístico com a paisage* em que se situar (art. 4Ü, §§ le e 2a, da lei mencionada). 2. Terrenos de marinha e terrenos marginais e águas litorânea aplica-se a sanção de demolição ou destruição de obra particular, quaf' do a mesma tenha sido feita sem a concordância da Diretoria de PorWs DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 307 ; do Ministério da Marinha (arts. 319 e 320, e seus §§ l2e2e, do 87.648, de 24.9.1982). 0 Embargo ,-,.< ,-,.k,-....., , . ,-., • = A previsão expressa do embargo na legislação abrange não só os bens ambientais (água, ar, fauna, flora e solo), como incide em áreas specificamente protegidas, que passaremos a enumerar. 1. Áreas especiais de interesse turístico e locais de interesse turístico: embargo de obra que acarrete ou possa acarretar a "modificação não autorizada, a destruição, a desfiguração ou o desvirtuamento da feição original, no todo ou em parte" das áreas e dos locais protegidos (art. 24, caput, e seu inc. III, da Lei 6.513, de 20.12.1977). 2. Parques nacionais: embargo compreendendo a "interdição de obras ou iniciativas não expressamente autorizadas ou previstas no Plano de Manejo, ou que não obedeçam às prescrições regulamentares" (arts. 49, III, e 52, caput, do Decreto 84.017, de 21.9.1979). 3. Áreas de Proteção Ambiental (apas): "embargo das iniciativas irregulares" (isto é, aquelas que contrariam o art. 9Ü e suas alíneas a a d, c/c o § 22 do mesmo artigo, da Lei 6.902, de 27.4.1981). 4. Zona de proteção de aeródromos — zoneamento de ruído - zona de proteção de heliportos e zona de proteção e auxílios à navegação aérea: "a autoridade aeronáutica poderá embargar a obra ou construção de qualquer natureza que contrarie os planos básicos ou os específicos de cada aeroporto, ou exigir a eliminação dos obstáculos levantados em desacordo com os referidos planos, posteriormente à sua publicação, P°r conta e risco do infrator, que não poderá reclamar qualquer indenização" (art. 45 do Código Brasileiro de Aeronáutica - Lei 7.565, de 19-12.1986). 6-9lnt( rdição ___ . Voltamos a mencionar os valores protegidos explicitamente: fauna 19 j Ç° da indústria pesqueira que funcionar sem autorização (art. de . ° decreto-lei 221, de 28.2.1967); flora - interdição de serrarias e fr Ust"as Que elaborem madeira sem prévia autorização do ibdf- ,0 Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (art. 17, III, do De--lei 289, de 28.2.1967). 308 <v>' MlfflITO AMBIENTAL BRASILEIRO 6.10 Multa m:í,xí':j:';-<'. 4 .,•;/ '/ '-" i 1. Águas: ' 1.1 Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resull tem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição da flora: multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais), ou multa diária. Incorre nas mesmas multas quem causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade (art. 41 do Decreto 3.179, de 21.9.1999). 1.2 Deixar de comunicar ao órgão ambiental competente, à Capitania dos Portos e à Agência Nacional de Petróleo-ANP, qualquer acidente que possa provocar poluição das águas, ocorrido em portos organizados, instalações portuárias, dutos, navios, plataformas e suas instalações de apoio (arts. 22 e 25 da Lei 9.966/2000): multa de R$ 7.000,00 (sete mil reais) a R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais). 2. Fauna: as infrações estão previstas na seção I do capítulo II do Decreto 3.179, do art. 11 ao art. 24. 3. Flora: as infrações estão previstas na seção II do capítulo II do Decreto 3.179, do art. 25 ao art. 40. 7. Poder de polícia ambiental 7.1 Conceito :íyI:'.O •(> A noção de poder de polícia é uniforme segundo a maioria dos doutrinadores brasileiros e estrangeiros. Além da doutrina temos no Brasil uma definição legal existente no Código Tributário Nacional: "Art. 78. Considera-se poder de polícia a atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos"Poder de polícia ambiental é a atividade da Administração Pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato em razão de interesse público concernente DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 309 úde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da a S dução e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou de Pr s atividades dependentes de concessão, autorização/permissão ou r ença do Poder Público de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza. O poder de polícia age através de "ordens e proibições, mas, e so-hretudo, por meio de normas limitadoras e sancionadoras", ou "pela ordem de polícia, pelo consentimento de polícia, pela fiscalização de polícia e pela sanção de polícia".8 O campo de atuação do poder de polícia originariamente restringia-se à segurança, moralidade e salubridade, expandindo-se atualmente para a defesa da economia e organização social e jurídica "em todas as ordens imagináveis". Analisaremos os meios de atuação do poder de polícia ambiental mais à frente. Duas questões devem ser abordadas: quem pode exercer o poder de polícia e contra quem se pode exercer o poder de polícia. 7.2 Quem pode exercer o poder de polícia ambiental "Traço característico da limitação ou restrição policial é o de ser imposta pelo Poder Público privativamente", afirmou Ruy Cirne Lima. Celso Antônio Bandeira de Mello cita essa opinião. André de Laubadère afirma que "o poder de polícia não pode ser concedido a um particular e que a Administração não pode se despojar de suas responsabilidades neste domínio".9 Os doutrinadores nos levam a pensar a razão do monopólio do Poder Público no que concerne ao exercício do poder de polícia. Parece-nos que não se atenderia aos fins de interesse social se um particular exercesse o poder de polícia com relação a outro particular. Estaríamos praticamente no regime da "justiça pelas próprias mãos", em que facil-ente nos depararíamos com a figura criminosa do exercício arbitrário as Próprias razões, onde os interesses perquiridos não seriam mais os co|etivos, mas os de uma minoria ou de um só. eV °Pes MeireWes, Direito Administrativo Brasileiro, p. 122; e Moreira Neto, So de Direito Administrativo, p. 309. uy Cirne Lima, Princípios de Direito Administrativo, 4a ed., p. 107; Celso Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 11a ed., São Paulo, 592 6lr°S Editores> 1999, p. 562; e Laubadère, Traité de Droit Administratif, 7» ed., p. 310 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O Estado moderno, entretanto, não se resume mais na Administra, ção direta. Os serviços públicos são também exercidos por empresas estatais e entes de cooperação (serviços sociais autônomos e organizações sociais), que vivem ao lado do Estado e por isso eram chamados de "paraestatais". Sabemos que o poder de polícia não se deve confundir com a noção de serviço público. Contudo, não se pode ignorar que aquelas entidades, ditas paraestatais, ainda que tendo regime jurídico de Direito Privado, não são totalmente uma pessoa privada. Por isso Hely Lopes Meirelles assinalava que "o paraestatal não é o estatal, nem é o particular; é o meio-termo entre o público e o privado. Justapõe-se ao Estado, sem o integrar como o autárquico, ou alhear-se como o particular. Tem personalidade privada, mas realiza atividades de interesse público, e, por isso mesmo, os atos de seus dirigentes, revestindo-se de certa autoridade, sujeitam-se a mandado de segurança e à ação popular".10 "São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente-siSNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha" (art. 70, § l2, da Lei 9.605/98). Dessa forma, trazemos a opinião de Charles Debbasch, que afirma: "as autoridades de polícia são aquelas que, em virtude da Constituição ou de disposições legislativas, tenham recebido o poder de editar medidas de polícia administrativa". Nesse sentido, no que concerne o exercício do poder de polícia ambiental, lei expressa poderá atribuí-lo não só à Administração direta como à Administração indireta (empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação). Continuo, contudo, fiel ao entendimento" de que servidores públicos admitidos, sem concurso público de provas e títulos e submetidos à instabilidade na relação de emprego não serão as pessoas que podem agir com maior eficácia para afrontar as pressões políticas e financeiras. 7.3 Contra quem pode ser exercido o poder de polícia ambiental É correntio encontrar-se nos doutrinadores a afirmação de que o poder de polícia destina-se a limitar ou regrar os direitos individuais-Esta questão é pacífica. Contudo, deve ser colocada a questão do exer10. Ob. cit., 18a ed., p. 318. 11. Charles Debbasch, Droit Administratif, 2a ed., p. 238; e Paulo Affonso Machado, "O controle da poluição e o Decreto-lei 1.413, de 14.9.1975", «r 525/32-39, 1979- DAS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS 311 ' o do poder de polícia disciplinando e sancionando a própria pessoa C1°Direito Público e o ente paraestatal. Empresas públicas atualmente utilizam-se de recursos ambientais, m0 por exemplo: aELETROBRÁs ou suas subsidiárias constróem e ope° m hidrelétricas; a petrobrâs faz perfurações de poços petrolíferos no r ar instalando e operando refinarias; a Cia. Siderúrgica Nacional atua Volta Redonda. Ora, daí se constata que não só particulares como ntes paraestatais são poluidores em potencial. Seria injusto tratamento desigual, deixando os possíveis poluidores públicos sem qualquer controle administrativo dos órgãos especializados. Não se pode, contudo, negar a dificuldade do controle através do poder de polícia, perguntando-se: um Ministério poderia controlar outro Ministério? Far-se-ia o controle diretamente pelos escalões inferiores dos Ministérios ou o controle seria a nível de Presidente da República, Governador do Estado ou Prefeito do Município? Do ponto de vista constitucional não vejo obstáculo ao exercício do poder de polícia ambiental realizado pela Administração direta frente à Administração indireta. Analisemos as manifestações do poder de polícia preventivo e sancionatório: licenças, autorizações, permissões e concessões poderão ser colocadas em prática, desde que com suporte em lei, decreto, portaria ou resolução do conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente). As multas poderão ser cominadas, porque as entidades paraestatais estão sujeitas à execução fiscal. A suspensão das linhas de financiamento (art. 82, V, da Lei 6.938, de 31.8.1981), poderá ser aplicada. A apreensão de instrumentos - material e máquinas - usadas irregularmente nas Áreas de Proteção Ambiental também poderá ser feita com o apoio no art. 9a, § 2a, da Lei 6.902, de 27.4.1981. Dificuldade prática, não jurídica, é a de implementar medida de embargo, uma vez que poderia haver necessidade de emprego da força pública (oportuna aí a arbitragem da Chefia do Poder Executivo). Não haverá quebra de autonomia constitucional se um órgão fede-al agir contra um órgão estadual ou este contra aquele, desde que tem sua ação respaldada na legislação: por exemplo, um organismo biental estadual pode multar uma empresa pública federal ou apreen-er~lhe instrumentos. ei In Ponto de vista jurídico, entretanto, parece-nos haver certa difi-da á& n° exercic° d° poder de polícia levado a efeito por um órgão n drninistração direta contra outro da Administração indireta. No pla-vel min'strat'vo os organismos poderiam estar situados no mesmo ní-a çl Uf mvelados na escala hierárquica. Ou se passaria a questão para p0. a 0 Poder Executivo ou o órgão interessado buscaria o apoio do er Judiciário através de ação judicial própria. Capítulo Viu FINANCIAMENTO - MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 1. Financiamento e meio ambiente O dinheiro que financia a produção e o consumo fica atrelado à moralidade e à legalidade dessa produção e desse consumo. A destinação do dinheiro não é, evidentemente, neutra ou destituída de coloração ética. Nem o dinheiro privado nem o dinheiro público podem financiar o crime, em qualquer de suas feições, e, portanto, não podem financiar a poluição e a degradação da natureza. Não é por acaso que a própria Constituição do País deixou expresso que o sistema financeiro nacional deve "servir aos interesses da coletividade" (art. 192, capuf). 2. Conselho Monetário Nacional No Brasil temos, como órgão colegiado decisório da política econômica e financeira, o Conselho Monetário Nacional. Entre suas atribuições, constantes da Lei 4.595, de 31.12.1964, estão: limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, descontos, comissões e qualquer outra forma de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central do Brasil, assegurando taxas favorecidas aos financiamentos que se destinam a promover: recuperação e fertilização do solo, reflorestamento, combate a epizootias e pragas, nas atividades rurais e irrigação (art. 42, IX). Vê-se que tais atividades estão numa área em que os efeitos ambientais das ações humanas podem tanto conservar, como degradar, o meio ambiente. De outro lado, constata-se que a política do Conselho Monetário Nacional deve objetivar "orientar a aplicação dos recursos das instituições financeiras, quer públicas, quer privadas, tendo em vista propiciar, nas diferentes regiões do País, condições favoráveis ao desenvolvimento harmônico da economia nacional" (art. 3U, IV). O desenvolvimento FINANCIAMENTO - MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO 313 mônico da economia nacional tanto passa pela diminuição das desi-Idades regionais (arts. 3a, III, e 43, ambos da CF), como integra o £ teúdo do desenvolvimento sustentável, isto é, aquele que estabelece ° nüidade entre as presentes e as futuras gerações (art. 225 da CF). No mesmo diapasão é o documento assinado pelo Ministro da Fada, Ministro do Planejamento e do Orçamento, Ministro da Agricultura do Abastecimento e da Reforma Agrária e Ministro do Meio Ambiente, endereçado ao Presidente da República, e por este aprovado, aos 14 11.1995 (DOU 16.11.1995, pp. 1.381-1.382). Assinala o texto aludido que "a combinação dos dois sistemas - comando e controle e instrumentos econômicos - é a melhor forma de empreender as correções necessárias, para que o mercado funcione ajustado do ponto de vista social e ambiental. Assim, o papel desempenhado pelo Estado, na área ambiental, não pode ser apenas o daquele que regulamenta e fiscaliza, mas sim o de um Estado que promova e garanta o desenvolvimento sustentável". Enfatize-se que, dos quatro signatários do documento apontado, três têm assento no Conselho Monetário Nacional. Espera-se, portanto, que esse colegiado, como lhe permite o art. 22 da Lei 4.595/64, formule diretrizes para as instituições financeiras na concretização de uma política de crédito que viabilize o desenvolvimento sustentável. Acentue-se que é inegável sinal promissor a publicação da "Carta de Princípios para o Desenvolvimento Sustentável" (DOU 16.11.1995), firmada pelas cinco instituições financeiras públicas federais - Banco do Brasil S/A, Caixa Econômica Federal, Banco do Nordeste do Brasil S/A, Banco da Amazônia S/A, e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Cairá no vazio essa declaração, como no passado caíram no vazio sabias leis, se o Conselho Monetário Nacional deixar de estabelecer a igatoriedade do cumprimento da legislação ambiental para todas as 'nstituições financeiras nacionais (v. DOU 16.11.1995, p. 18.382, item 28). • Banco Central do Brasil '"' /"' • <"' x ° Banc« Central do Brasil - criado pela Lei 4.595/64 - tendo ga-gra 'fmens'onatnento constitucional (art. 192, IV e V, da CF) - é o (art a 'mPementador das diretrizes do Conselho Monetário Nacional l- 9a da Lei 4.595/64). a fls anco Central do Brasil tem a competência privativa de "exercer a !zação das instituições financeiras e aplicar as penalidades pre- 314 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO vistas" (art. 10, caput e inc. VIII). Essa instituição controladora do sis tema financeiro nacional, além de aplicar as normas do Conselho Mone tário Nacional, aplicará toda a legislação já promulgada, e que vier a ser legislada, e que tenha reflexos no sistema financeiro. O Banco Centra] do Brasil não vai reger sua fiscalização somente com as suas próprias regras e as do Conselho Monetário Nacional, agindo de forma isolada dentro do governo. Não obstante seu imenso poder, o Banco Central deverá integrar-se a toda a política traçada pelo Presidente da República, chancelada pelo Congresso Nacional. A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente - Lei 6.938, de 31.8.1981 - dispõe, em seu art. 12, caput: "As entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais condicionarão a aprovação de projetos habilitados a esses benefícios ao licenciamento, na forma desta lei, e ao cumprimento das normas, dos critérios e dos padrões expedidos pelo coNAMA-Conselho Nacional do Meio Ambiente". Essa norma legal é uma das que merecem ser inseridas na atividade de fiscalização do Banco Central do Brasil. ,r 4. As instituições financeiras públicas federais e o licenciamento ambiental O Banco do Brasil S/A, a Caixa Econômica Federal, o Banco do Nordeste do Brasil S/A, o Banco da Amazônia S/A e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, ao inserirem na "Declaração de Princípios para o Desenvolvimento Sustentável" que as "leis e regulamentações ambientais devem ser aplicadas e exigidas, cabendo aos bancos participar de sua divulgação" (Princípio 7"), fazem uma adesão pública ao art. 12 da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente. O chamado "licenciamento ambiental" foi instaurado, como norma geral federal, pela lei referida. Diz o art. 10: "A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambien-te-siSNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis-iBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis". Temos criticado o emprego do termo "licença" para esse tipo ds controle do Poder Público, propugnando pela adoção do vocábulo "autorização". • ...,'!, FINANCIAMENTO - MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO 315 A licença ambiental municipal poderá existir, se prevista em legis-"o própria e de acordo com a competência constitucional dos Muni-Sos(art.30daCF). Cada Administração ambiental - o ibama, os órgãos estaduais de 0 ambiente e, havendo, os órgãos municipais de meio ambiente terá uma faixa de autonomia para licenciar e, dessa forma, não há grau de superioridade no licenciamento. Quantos órgãos intervierem, tantas serão as licenças e/ou autorizações ambientais. Os bancos deverão tomar conhecimento do leque de estabelecimentos e atividades para os quais se exija legalmente o licenciamento, para poderem estar aptos a exigir a apresentação da licença ambiental. O art. 12 da Lei 6.938/81 estatui que a aprovação dos projetos fica condicionada ao licenciamento. Surge um ato administrativo complexo, pois a aprovação do financiamento pelos bancos depende da existência de prévio licenciamento. Não é, portanto, incondicionada essa operação, mas é ato que só adquire sua plenitude legal com a juntada de uma licença ambiental favorável. O Decreto 99.274/90, que regulamentou a Política Nacional do Meio Ambiente, revogando o Decreto 88.351/83, insistiu na mesma orientação, dizendo: "As entidades governamentais de financiamento, ou gestoras de incentivos, condicionarão a sua concessão à comprovação do licenciamento previsto neste Regulamento" (art. 23). O financiamento, em que se analisa a variante ambiental, passa a ensejar um novo tipo de convivência administrativa, colocando em parceria os bancos e os órgãos ambientais. Cada organismo preservará sua identidade funcional e pautará sua conduta, primeiramente, pelas suas Próprias regras. Inegavelmente devem surgir normas que tornarão harmônica e ágil essa convivência. Normalmente a licença ambiental não comportaria condições a se-rem cumpridas posteriormente. Contudo, encontram-se licenças cuja P ena efetividade dependerá de prazos a serem cumpridos pelo requente do licenciamento. Nesse caso, os bancos deverão aguardar que o cumento final dos órgãos ambientais seja expedido. O Decreto federal 99.274, de 6.6.1990 (art. 19), prevê três tipos de Cença: Licença Prévia (lp), Licença de Instalação (li) e Licença de ação (lo). cenca Prévia será concedida na fase preliminar do planeja-fa$t° da Cidade, contendo requisitos básicos a serem atendidos nas cip S 'ocauzação, instalação e operação, observados os planos muni-acord'CStaduais ou federais de uso do solo. A Licença de Instalação é o c° ° ao início da implantação, em consonância com as especificações antes no projeto executivo aprovado. A Licença de Operação con- 316 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO fere o direito de iniciar a atividade e o funcionamento de seus mentos, de acordo com a Licença Prévia e de Instalação. Os bancos deverão analisar qual a licença a ser apresentada para tramitação de cada projeto a ser financiado. Por isso, oportuno o cum primento do Princípio 82 da Carta de Princípios do Desenvolvimento Sustentável: "A execução da política ambiental nos bancos requer a criação e treinamento de equipes específicas dentro de seus quadros", q Banco do Nordeste do Brasil S/A, por exemplo, no ano de 1995, propiciou dois cursos de Direito Ambiental para a especialização de seus quadros e, também, de integrantes de organismos ambientais estaduais Não se oculte um aspecto do licenciamento, que pode dificultar o bom relacionamento das duas áreas administrativas - a financeira e a ambiental: a existência e o cumprimento de prazos para a concessão das licenças. O mencionado Decreto 99.274/90 afirma que "os prazos para a concessão das licenças serão fixados pelo coNAMA-Conselho Nacional do Meio Ambiente, observada a natureza técnica da atividade" (art. 19, § l2). Essa normatização ainda não surgiu, o que pode, em alguns casos, causar retardamentos injustificáveis. 5. As instituições financeiras públicas federais e as normas do conama Os bancos estão jungidos, na concessão dos financiamentos, a verificar "o cumprimento das normas, dos critérios e dos padrões pelo conama" (parte do art. 12, caput, da Lei 6.938/81). Esta parte das incumbências que a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente formulou para os bancos não é isenta de dificuldades, mas, nem por isso, deve ser deixada de lado. O legislador procurou valorizar as normas federais ambientais, n° momento em que elas deverão ser aplicadas pelos órgãos ambientais-Procura-se, assim, o apoio dos bancos oficiais federais para que a legislação federal de meio ambiente seja concretamente implementada nos Estados. Posicionamentos normativos do conama - como as resoluções refc' rentes aos Estudos de Impactos Ambientais e Audiências Públicas " devem ser analisadas pelos especialistas dos bancos, principalmente! quando os órgãos ambientais estaduais tenham dispensado a realizaçã0 desse procedimento. Assim procedendo, os bancos não estarão exercendo nenhuma ingerência na atividade dos órgãos ambientais estaduais, s simplesmente, tomando cautela no campo de sua responsabilidade. pjANCIAMENTO - MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO 317 Buscando a harmonização legislativa, os países do mercosul elaarn também, regras sobre Estudo de Impacto Ambiental. Indiquemb Lei 16.466, de 19.1.1994, do Uruguai, e a Lei 294, de 31.12.1993, Sa Paraguai. Nesta última lei fica estabelecido que "a Declaração de t cacto Ambiental será requisito indispensável nas seguintes tramitações A projeto: a) para a obtenção de créditos ou garantias; b) para a obten- de autorizações de outros organismos públicos; e c) para a obtenção de subsídios e isenções tributárias" (art. 12). 6 Co-responsabilidades das instituições financeiras pelos danos ambientais s, A Lei 8.974, 5.1.1995, trata do uso de técnicas de Engenharia Genética e da liberação, no meio ambiente, de organismos geneticamente modificados. Interessa-nos, aqui, apontar que a referida lei, expressamente, previu a co-responsabilidade dos bancos em casos de financiamento dos projetos de biotecnologia. Diz o art. 2-, § 3a: "As organizações públicas e privadas, nacionais e estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos neste artigo, deverão certificar-se da idoneidade técnico-científíca e da plena adesão dos entes financiados, patrocinados, conveniados ou contratados às normas e mecanismos de salvaguarda previstos nesta Lei, para o quê deverão exigir a apresentação do Certificado de Qualidade em Biossegurança, de que trata o art. «a, inc. XIX, sob pena de tornarem-se co-responsáveis pelos eventuais efeitos advindos do seu descumprimento". Quem financia tem a obrigação de averiguar se o financiado está cumprindo a legislação ambiental, no momento do financiamento. Nese sentido é que a Lei de Engenharia Genética, de 1995, diz que o nanciador deve certificar-se da idoneidade técnico-científíca do ente anciado, como também de sua adesão às normas e mecanismos de Vaguarda definidos nessa lei. Obrigações fundamentais do financiador, gundo a Lei 8.974/95, mas que poderão ser substituídas pela apresen0 do CQB-Certificado de Qualidade em Biossegurança. Se art- 12 da Lei 6.938/81 estabelece a mesma obrigação de exigiraPresentação da licença (no caso da Engenharia Genética é o cqb). pas Lei 8.974/95 dois significativos passos são dados: o primeiro beje z respeito à amplitude da responsabilidade, pois todos os esta§eirolmentOS lnancia(Jores - privados ou públicos, nacionais, estran-Pfivad °U mtemacionais - sao abrangidos. Assim, os bancos oficiais ou Os> brasileiros ou estrangeiros, o BiRD-Banco Interamericano de 318 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Desenvolvimento, organismos internacionais (como o pnuma, fao, a cepal, oms) ou CNPq, finep e instituições congêneres podem figurar com réus ou responsáveis pelo ato de financiar. O segundo passo da Lei 8.974/95 concerne à duração da responsa bilidade, pois financiando-se sem o Certificado de Qualidade em Biossegurança, os órgãos financiadores tornam-se co-responsáveis pe los eventuais danos decorrentes da atividade. O regime jurídico da responsabilidade, em todos os eventos ljga. dos ao meio ambiente, é a responsabilidade objetiva ou responsabilidade sem culpa, por força do art. 14, § Ia, da Lei 6.938/81. Assim, os bancos não poderão tentar eximir-se da co-responsabilidade de se terem omitido, invocando ausência de imprudência, de negligência, de impe-rícia ou de dolo. O nexo causai entre o ato, que provocou ou possa provocar o dano ambiental, no caso dos bancos, é presumido, por força do referido § 3a do art. 2a da Lei 8.974/95. Nos casos da aplicação do art. 12 da Lei 6.938/81, ainda que a co-responsabilidade não esteja expressamente definida nessa lei, parece-nos que ela está implícita. A alocação de recursos do financiador para o financiado, com a transgressão induvidosa da lei, coloca o financiador numa atividade de cooperação ou de co-autoria com o financiado em todos os atos lesivos ambientais que ele fizer, por ação ou omissão. 7. As instituições financiadoras e a prevenção do dano ambiental As entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais "deverão fazer constar dos projetos a realização de obras e aquisição de equipamentos destinados ao controle de degradação ambiental e à melhoria da qualidade do meio ambiente" (art. 12, parágrafo único, da Lei 6.938/81). A recomendação, constante da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, deixa uma margem de opção às instituições financiadoras na prevenção ambiental. Essa opção situa-se na indicação ou aprovação das obras e equipamentos, que já constem ou que devam constar do projeto de financiamento. Nesse exame do projeto há uma parte vinculada na conduta decisória das instituições financeiras, pois elas estão condicionadas a exigir as obras e equipamentos que estejam indicadas no Estudo de Impacto Ambiental e/ou na Licença Ambiental. A lei, contudo, não onera as instituições financeiras com a tarei3 de executarem, sozinhas, o controle ambiental do ente financiado. EsSe controle é primacialmente tarefa dos órgãos públicos ambientais fede' rais, estaduais e municipais. FINANCIAMENTO - MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO 319 . instituições financiadoras, em decorrência dos mandamentos comentados, não podem prosseguir na alocação de recursos fí-al iros, quando o ente financiado deixar de cumprir o cronograma da na°. tação das obras e da instalação dos equipamentos destinados à 'horia da qualidade do meio ambiente. A Lei 9.082, de 25.7.1995, que dispôs sobre as diretrizes para a l boração da Lei Orçamentária de 1996, apontou como uma das prio-6dades e metas da Administração federal "a promoção do desenvolvimento, buscando conciliar as necessidades do crescimento econômico e da modernização tecnológica do setor produtivo com a preservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida nas cidades e no campo, garantindo o atendimento dos compromissos firmados na Agenda 21" (art. 2a, V). A mesma lei estabeleceu linhas para a política de aplicação dos recursos das agências financeiras de fomento, vendo-se que, na concessão de empréstimos e financiamentos, devem ser respeitados como prioridades "a melhoria nas condições de vida das populações mais carentes, através de financiamentos e projetos de investimentos em saneamento básico e desenvolvimento da infra-estrutura, com recursos administrados pela Caixa Econômica Federal" (art. 39,1). Acredita-se que, com a implantação do sistema de auditoria ambiental constante daiso-14.000, os órgãos financiadores e os financiados exercerão um salutar e eficaz autocontrole de suas atividades, com reflexos ambientais. Neste sentido, aplicável é o posicionamento da citada Carta de Princípios para o Desenvolvimento Sustentável: "A gestão ambiental requer a adoção de práticas que antecipem e previnam degradações ao meio ambiente". "A participação dos clientes é imprescindí-Ve' na condução da política ambiental dos bancos" (Princípios 5a e 6Ü). Oi __ • i ação civil pública e o controle judicial dos financiamentos te A ação civil pública, instituída pela Lei 4.347, de 24.7.1985, pode como objeto o cumprimento de obrigação de fazer, o cumprimento °bngação de não fazer e a condenação em dinheiro. Entre os diverge ,lnteresses difusos e coletivos que essa lei tem por finalidade tutelar, la ° rneio ambiente. Mi ,tre as pessoas jurídicas legitimadas para agir encontram-se o am, lstér'° Público, as associações ambientais, e os próprios órgãos mblentais. êuir ° Caso vertente, a ação civil pública pode ser utilizada para consecja e '"formação sobre a observância da legislação ambiental em finannto> quando essa informação estiver coberta pelo sigilo bancário. 320 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A ação civil pública pode ser empregada para tentar obstar a ef vação do financiamento, no caso de não ter sido, ainda, licenciad '" obra ou atividade. a Para reparar o dano, potencial ou efetivamente causado, de ativjd de ou obra que tiver obtido o financiamento sem licenciamento ambientai" a ação civil pública pode ser intentada, visando à condenação em dinhei ro. A condenação irá para o "Fundo de Defesa de Direitos DifuSOs'> federal ou estadual. Conclua-se, pois, ponderando-se que as obrigações das instituições financeiras públicas para com o meio ambiente devem ser estendidas às instituições financeiras privadas, pois não se podem isolar setores do sistema financeiro seja nacional, seja internacional. Por isso, é de ser incorporado à nossa legislação e a nossa prática bancária o Princípio Ia da Carta de Princípios para o Desenvolvimento Sustentável: "A proteção ambiental é um dever de todos os que desejam melhorar a qualidade de vida do planeta e extrapola qualquer tentativa de enquadramento espaço-temporal". i ti • TITULO V RESPONSABILIDADE CIVIL, REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO E MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL '_,;-. >' i Capim/o / - RESPONSABILIDADE CZyiLERgPARAÇhQDO DANp.EÇQ* LOGICO. Capítulo II MEIOS PRQCÉS.SJJAIS.PA#A, A DEFÉjSA AMBIENTAL. '" "" * J '" ' iót Capítulo I RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO ' ';: :. Histórico da utilização do termo "responsável" to , responsabilidade no campo civil é concretizada em cumprimen-em °"rigação de fazer ou de não fazer e no pagamento de condenação ativ'H e'ro' m §era' manifesta-se na aplicação desse dinheiro em .5 ou obra de prevenção ou de reparação do prejuízo. nà0 a termo "responsabilidade" está ausente no Direito Romano. Ele o Prof e°e nas ün§uas européias senão no fim do século XVIII, afirma Michel Villey, da Universidade de Paris.1 Contudo, encontra-se historique sur le mot responsable", La Responsabilité a travers les 322 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO o termo "responsável" depois do século XIII, através dos ter responsam, derivado de respondere. °s A razão de estarmos interessados na origem do vocábulo e no conceito está na necessidade de se saber se a responsabilidade juríj- era ou não ligada à idéia de culpa, isto é, de intenção, de imprudênc' * de negligência ou de imperícia do responsável. "Respondere leva a sponsio, instituição que tinha um lugar centr 1 no Direito Romano arcaico, e a spondere. O sponsor é um devedor homem que, no diálogo da 'estipulação', por uma resposta afirmativa à questão do 'estipulante', futuro credor, engajava-se em alguma presta ção. O responsor era especialmente a caução; em uma segunda troca de palavras, ele se obrigava a 'responder' sobre a dívida principal de outrem." "Quanto ao termo "responsável" (responsabilis) ele não aparece senão na Idade Média", consoante a lição do Prof. Villey. O termo aplica-se à questão ou à petição que é suscetível ou não de uma resposta. Conclui o autor citado que, na origem de "responder" ou "ser responsável", não há, de forma alguma, a culpa. Prossegue o jurista da Universidade de Paris: "O fundamento do regime romano de reparação de danos não é a culpa, mas a defesa de uma justa repartição entre os bens partilhados entre as famílias, isto é, de um justo equilíbrio. Suum cui que tribuere, aequabilitas. Quando intervém uma ruptura deste equilíbrio, um prejuízo contrário ao Direito e à Justiça (damnum injuria datum), entra em jogo a justiça chamada "corretiva", cuja função será reduzir o desequilíbrio". A noção de culpa era utilizada especificamente para os crimes. Por fim, menciono a adequada análise do Professor Villey: "A doutrina do século XIX elabora a teoria da responsabilidade civil, fundada no princípio do art. 1.382 do Código Civil. Esta parte do curso de Direito Privado - inteiramente colocada sob a égide da responsabilidade moral - é um produto acadêmico, um produto de extrava-samento do espírito de sistema, alicerçada sobre o modelo das construções da escola histórica alemã, ressentindo-se da influência da filosoua kantiana".2 Ressalte-se que a existência da responsabilidade por culpa, assinala Geneviève Viney, da Universidade de Paris, "deve-se ao canonistas, para quem a responsabilidade era antes de tudo destinada moralizar as condutas individuais, e não assegurar a reparação do dano 2. Ob. cit. 3. Barbara Pozzo, Danno Ambientale edImputazione delia Responsabilità, Giuffrè Editore, 1986, p. 260. • . ; . . . , INABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 323 Conceito de dano ecológico .t Direito Comparado ; ' i Conceito de dano ecológicos na iCòfivenção de Lugano ; 2' ' (Conselho da Europa)4 ,i./ f-.',;..y-' ;.--.. "Art. 2.7 Dano significa: a) a morte ou lesões corporais; b) qual-perda ou qualquer prejuízo causado a bens outros que a instalação Ia mesma ou os bens que se achem no local da atividade perigosa e situados sob controle de quem a explora; c) qualquer perda ou prejuízo resultante da alteração do meio ambiente, na medida em que não seja considerada como dano no sentido das alíneas aonb acima mencionadas, desde que a reparação a título de alteração do meio ambiente, excetuada a perda de ganhos por esta alteração, seja limitada ao custo das medidas de restauração que tenham sido efetivamente realizadas ou que serão realizadas; d) o custo das medidas de salvaguarda, assim como qualquer perda ou qualquer prejuízo causado por essas medidas, na medida em que a perda ou o dano previstos nas alíneas a a c do presente parágrafo originem-se ou resultem das propriedades de substâncias perigosas, de organismos geneticamente modificados ou de microorganismos, ou originem-se ou resultem de rejeitos". Ressalte-se que a concepção de dano ambiental proposta pela Convenção não vincula o dano com a transgressão de normas administrativas, isto é, não elimina a responsabilização no caso de observância dos padrões oficiais, mas com ocorrência de dano. 2'l-2 Alemanha : . ..; O empreendedor de uma instalação classificada no anexo I é resPonsável pelo dano acarretando morte, lesão corporal, lesão da saúde Prejuízo para um bem causados por impactos sobre o meio ambiente focados a partir da instalação" (art. Ia da Lei de 10.12.1990). "Um .„, resulta de um impacto sobre o meio ambiente se ele é causado por Uostânr-id ' • -i -1 i- res químicas, vibrações, ruídos, pressões, radiações, gas, vapoápi'i » ou outros fenômenos que se difundem no solo, no ar e na sua (art_ 3 g ]!2 fentando a mencionada lei, Detlev von Bretenstein assinala que " é, de certa forma, o meio, a malha intermediária na cadeia enção aberta a adesão aos 21 de junho de 1993. liü 324 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO de causalidade para a realização de um prejuízo dando direito à rena ção. Aparecem os prejuízos bem conhecidos no Direito Ambiental, cOn?~ os meios naturais clássicos que esse Direito é chamado a proteger: sol ° ar e água. Entretanto, stricto sensu, esses elementos não são objetos h proteção definida na Lei de 10 de dezembro de 1990, mas mais um caminho de passagem para a realização de um dano reparável que dev se produzir na vida, na integridade corporal, na saúde humana ou na conservação de uma coisa". O citado autor entende prematuro dar a dimensão do alcance dos efeitos reparatórios da lei.5 O patrimônio a ser protegido mereceu a atilada análise do Prof Rehbinder: "o dano ambiental é, em princípio, um dano sofrido pelo conjunto do meio natural ou por um de seus componentes, levado em conta como patrimônio coletivo independente de suas repercussões sobre pessoas e bens. Mas esta autonomia da definição como dano ambiental não significa uma separação categórica do dano ambiental que sofra o meio natural nos seus elementos inapropriados e inapropriáveis, do dano de poluição a um dos componentes da natureza, que seja infligido aos patrimônios identificáveis dos particulares. Um prejuízo sofrido por um proprietário fundiário, por exemplo um proprietário de uma floresta ou de um terreno, pode ter simultaneamente efeitos prejudiciais econômicos e ambientais. Normalmente, estes efeitos coincidem, e, ao reivindicar a reparação do dano econômico, o proprietário remedia também o dano ambiental, com a condição de que exija a reparação, in natura ou o reembolso das despesas despendidas para a reparação. Não ignoro que tal extensão da noção de dano ambiental enseja questões de difícil coordenação dos bens ambientais apropriados e dos não apropriados, mas este problema pode ser resolvido por uma dupla atribuição ao particular e ao Estado, associados nas regras de litígio. A razão porque prefiro tal solução — que foi aceita pela nova lei alemã sobre responsabilidade por dano ambiental - é o desejo de munir também o particular de meios para a defesa do ambiente".6 2.1.3 Itália '<-; tal Dano ambiental é a lesão (alteração, prejuízo) de um fator ambiem ou ecológico (ar, água, solo, floresta, como também clima etc), com 5. "La loi allemande relative à Ia responsabilité en matière d'environnement: Pie s angulaire du Droit d'Environnement?", Revve Juridique d'Env<ronnement 2, Li'W°& 1993. 6. "Évaluation et réparation du dommage écologique", Rapport Généra'-Dommage Écologique en Droit Interne, Communautaire et Compare, p. 245. gSPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 325 1 consiga-se uma modificação — para pior - da condição de equilí-1U. eCológico do ecossistema local ou abrangente, afirma o Prof. péniamino Caravita.7 2 i .4 Grécia . • >. "Quem - pessoa física ou jurídica - polua ou degrade o meio ambiente é obrigado a pagar uma indenização, salvo se provar que o dano é devido a força maior ou que resulta da ação culpável de terceiro, que tenha agido com dolo" (art. 29 da Lei Fundamental 1.650/86). , 2.2 Direito brasileiro "Para fins de reparação, o dano decorrente de atividade poluente tem como pressuposto básico a própria gravidade do acidente, ocasionando prejuízo patrimonial ou não patrimonial a outrem, independente de se tratar de risco permanente, periódico, ocasional ou relativo", afirma a Profa. Helita Barreira Custódio.8 Todas as alterações ecológicas constituem dano ecológico reparável diante do Direito? Seria excessivo dizer que todas as alterações no meio ambiente vão ocasionar um prejuízo, pois dessa forma estaríamos negando a possibilidade de mudança e de inovação, isto é, estaríamos entendendo que o estado adequado do meio ambiente é o imobilismo, o que é irreal. Contudo, o admitirmos mudanças espontâneas ou até provocadas da natureza, não nos conduz a afirmar que todas essas mudanças são benéficas.9 3- Responsabilidade objetiva 3] Direito brasileiro A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente consagra como um e seus objetivos a "imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados" (art. 4Ü, VII, da Lei 6.938, *3 1-8.1981). Além disso, possibilita o reconhecimento da responsabie d° poluidor em indenizar e/ou reparar os danos causados ao meio 7- Diritto Pubblico deli Ambiente, p. 393. USp Q ResP°nsabüidade Civil por Danos ao Meio Ambiente, tese de Livre-Docência, ' ly83> p. 307. Extra J°Sé R-ubens Morato Leite, Dano Ambiental - Do Individual ao Coletivo Patrimonial, São Paulo, Ed. RT, 2000. 326 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade, independenternem da existência de culpa (art. 14, § lü, da lei referida). A aplicação rj6 penalidade administrativa, prevista nos incs. I, II, III e IV do art. 14 n elide a indenização ou reparação que o Poder Judiciário possa cotnina como se vê sem qualquer dúvida no § lü do aludido art. 14. A Lei de Responsabilidade por Dano Nuclear (art. 4a, caput, da Lej 6.453, de 17.10.1977) e a Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil em Danos Causados por Poluição por Óleo, de 1969, promulgada pelo Decreto 79.347, de 28.3.1977, prevêem a responsabilidade objetiva ou sem culpa. José de Aguiar Dias, em sua magnífica obra Da Responsabilidade Civil, ressalta que a "situação desejável é do equilíbrio, onde impere a conciliação entre os direitos do homem e seus deveres para com os seus semelhantes. O conflito de interesses não é permanente, como quer fazer crer a doutrina extremista, mas ocasional. E quando ele ocorre, então, sem nenhuma dúvida, o que há de prevalecer é o interesse da coletividade". Não se pode aceitar, continua o jurista, "que o direito de um pode prejudicar a outro, pode ultrapassar as raias da normalidade e fazer do seu titular um pequeno monarca absoluto".10 Não se aprecia subjetivamente a conduta do poluidor, mas a ocorrência do resultado prejudicial ao homem e seu ambiente. "A responsabilidade jurídica atualmente orienta-se para os seus objetivos que são aqueles do Direito, a saber, a utilidade social e a justiça em relação às partes em litígio" - assinala Geneviève Viney." A atividade poluente acaba sendo uma apropriação pelo poluidor dos direitos de outrem, pois na realidade a emissão poluente representa um confisco do direito de alguém em respirar ar puro, beber água saudável e viver com tranqüilidade. Por isso, é imperioso que se analisem oportunamente as modalidades de reparação do dano ecológico, pois muitas vezes não basta indenizar, mas fazer cessar a causa do mal, pois um carrinho de dinheiro não substitui o sono recuperador, a saúde dos brônquios, ou a boa formação do feto. A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danifi' car o ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binôm'0 dano/reparação. Não se pergunta a razão da degradação para que haja o dever de indenizar e/ou reparar. A responsabilidade sem culpa tem inci' dência na indenização ou na reparação dos "danos causados ao mei° 10. Ob. cit., pp. 78e79. 11. "Vocabulaire fondamental du Droit. La responsabilité", Archives de Philosop'11 de Droit, Sirey, Paris, 1990. cgpONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 327 hente e aos terceiros afetados por sua atividade" (art. 14, § Ia, da Lei aI-7«/8n Não interessa que tipo de obra ou atividade seja exercida i aue degrada, pois não há necessidade de que ela apresente risco ou Pe csrigOsa. Procura-se quem foi atingido e, se for o meio ambiente e tornem, inicia-se o processo lógico-jurídico da imputação civil obje-° a ambiental. Só depois é que se entrará na fase do estabelecimento do xo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano. É contra o Direienriquecer-se ou ter lucro à custa da degradação do meio ambiente. O art. 927, parágrafo único, do CC de 2002, dispõe: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem". Quanto à primeira parte, em matéria ambiental, já temos aLei 6.938/81, que instituiu a responsabilidade sem culpa. Quanto à segunda parte, quando nos defrontarmos com atividades de risco, cujo regime de responsabilidade não tenha sido especificado em lei, o juiz analisará, caso a caso, ou o Poder Público fará a classificação dessas atividades. "É a responsabilidade pelo risco da atividade."12 Na conceituação do risco aplicam-se os princípios da precaução, da prevenção e da reparação. Repara-se por força do Direito Positivo e, também, por um princípio de Direito Natural, pois não é justo prejudicar nem os outros e nem a si mesmo. Facilita-se a obtenção da prova da responsabilidade, sem se exigir a intenção, a imprudência e a negligência para serem protegidos bens de alto interesse de todos e cuja lesão ou destruição terá conseqüências não só para a geração presente, como para a geração futura. Nenhum dos poderes da República, ninguém, está autorizado, moral e cons-titucionalmente, a concordar ou a praticar uma transação que acarrete a Perda de chance de vida e de saúde das gerações. '••' 12 Direito Comparado i'. ,. >;'' O civilista italiano Trimarchi, em sua obra Rischio e Responsabilità Sgetiva, critica o regime de responsabilidade por culpa ou subjetiva, erri"110 C'ue esse regime "não P°dia satisfazer a exigência de justiça toda uma série de casos, em que o dano era causado pelo exercício atividade industrial". Diz, ainda, que, "quando uma atividade empre. al causa emissão danosa, isto deve ser considerado um custo que lamente é lançado a cargo da sociedade e que deve ser, por esse Hgant 'Nelson Nery Júnior e Rosa M. A. Nery, Novo Código Civil e Legislação Extra-e Anotados, São Paulo, Ed. RT, 2002, p. 302. 1 328 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO F f Li V motivo e sem ulterior indagação sobre a existência de culpa, internais na mesma empresa".13 O jurista norte-americano Calabresi, afirma: "a culpa não nOfl assegurar a obtenção de resultados que a responsabilidade civi] ' prefixar, sendo inadequada seja no terreno da prevenção, seja naquei da reação ao dano".14 e Barbara Pozzo assinala que "ulteriores justificações para a adoçã do critério da responsabilidade objetiva em alguns setores da atividad humana provêm daquela parte da doutrina que se dedicou à análise jus econômica do setor do ilícito civil. Em particular, a corrente de pensamento cujo líder é Calabresi colocou em evidência que, quando a sociedade não desejava evitar o sinistro, uma das funções essenciais da responsabilidade civil deve ser, antes de mais nada, aquela de reduzir o custo dos incidentes, no sentido que se deva tender à máxima redução do número e da gravidade dos sinistros, de um lado, e do custo para evitar os sinistros, de outro lado".15 Boris Starck, na França, assevera que "as contínuas transformações da técnica do direito da responsabilidade têm como objetivo único a maior garantia da segurança corporal e material dos homens vivendo em sociedade. A noção de culpa, sobre a qual se queria fazer uma muralha das responsabilidades humanas, foi submergida pelo fluxo da vaga de acidentes industriais e mecânicos do mundo contemporâneo".16 Na Espanha, Ramón Martin Mateo ensina que "Ia jurisprudência, en todos los países, incentivada por Ia doctrina, a venido ampliando los supuestos de responsabilidad objetiva como consecuencia de Ia introducción de riesgos en ei contexto de Ia civilización industrial, Io que tiene perfecto encaje en ei âmbito dei Derecho Ambiental, haciendo desaparecer Ia culpa o ai menos invirtiendo Ia carga de Ia prueba conio ante Ia trascendencia colectiva y no solo individual de los perjuicios. La propia Constitución espanola sostiene esta evolución ai establecer rotundamente Ia obligación de reparar los danos causados".17 Na Argentina, diz Atílio A. Alterini, Professor na Universidade de Buenos Aires: "... ei dano se refleja sobre un hombre; en definitiva, W 13. Apud Barbara Pozzo, Danno Ambientale edhnputazione delia Responsabü1'1' p. 271. 14. // Costo degli Incidenti - Analisi Economico-Giuridica, apud Pozzo, Dan Ambientale..., cit., p. 272. 15. Barbara Pozzo, Danno Ambientale..., cit., p. 272. 16. Essai d'une Théorie Générale de Ia Responsabilité Civile, Paris, L. Roos Libraire-Éditeur, 1947, p. 68. 17. Manual de Derecho Ambiental, 2a ed., Madri, Editorial Trivium, 1998, P 77- RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 329 hombre detrás de cada dano causado. Al privilegiar ai hombre-victima Un relación ai hombre victimario se considera Ia situación particular c | sOciedad contemporânea, convertida por Ia tecnologia, a Ia par que cinante, en altamente riesgosa; y ai hacerlo, se atiene ai sentir común a 1 hombre de nuestros tiempos".18 Silvia Maureen Williams, afirma: " ei Derecho ha transitado por distintos paradigmas jurídicos, sobre io's cuales se construyó toda una variedad de estructuras teóricas que eularon ja COnducta humana desde Ia primera forma de organización social hasta Ia actualidad, y si bien pensamos que ei Derecho está atravesando por una etapa de transición jurídica, donde ei dano interesa más que Ia culpabilidad y Ia persona de Ia víctima más que Ia dei victimario, dando lugar a un nuevo marco teórico donde prevalece Ia función risarcitoria dei Derecho por encima de Ia sancionatoria, así como una dilución de Ia frontera entre Ia responsabilidad contractual y Ia extra-contratual, y una vigorosa ampliación dei elenco de danos risarcibles junto ai aumento dei número de legitimados activos y pasivos. ...".'9 A França, em seu Código Civil (art. 384), prevê a responsabilidade objetiva do "guardião" de instalação perigosa. Prevista também a responsabilidade dos proprietários de aviões. Na Alemanha previu-se no Bürgerliches Gesetzbuch a responsabilidade objetiva para animais. Contudo, legislações especiais previram a responsabilidade objetiva para o tráfego aéreo e ferroviário, para a poluição das águas (§ 22 Wasser-haushaltsgesetz) e para a construção e operação de instalações nucleares (§ 25 Atomgesetz). A Suécia no 'Ato de Proteção Ambiental" de 1969 (§ 30) introduziu a responsabilidade objetiva quando o incômodo e substancial e não seja razoável tolerar em vista de circunstâncias locais ou de general occurrence in comparable circumstances. O Japão Previu a responsabilidade objetiva da poluição da água (art. 19 da Lei 138/70, emendada pela Lei 84/72), da poluição atmosférica (Lei 97/68, ejnendada pela Lei 65/74) e incidentes provenientes de instalações nucleares (Lei 147/61, emendada pela Lei 53/71). No sistema de Direito ostumeiro (common law), data de 1968 o caso "Rylands v. Fletcher". Os EUA prevê-se a responsabilidade objetiva para instalações nuclea-jes'(Price Anderson Act, de 1957 e Nuclear Installations Act, 1959/ ,„ )' Para rios e portos (Rivers and Harbours Appropriaüon Act, de 9)> para aviões (Civil Aviation Act, de 1949), para animais (Animais 1989 ontornosActiiales de Ia Responsabilidad Civil, Buenos Aires, Abeledo-Perrot, ?ec ' C1P°r Graciela N. M. de Estrella Gutiéirez, La Responsabilidad Civil en Ia Era "gica, 2" ed., Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 1997, p. 24. Buen Riesgo Ambiental y su Regulación. Derecho Internacional y Comparado, A'res, AbeledoPerrot, 1998, p. 35. 330 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Act 1971). A, Grécia acolheu a responsabilidade objetiva (Lei 1.650/» art. 29); e Pprtugal agasalhou-a pela Lei 11/87 (art. 41). 4. Responsabilidade de prevenir Quem cria o perigo, por ele é responsável. O perigo, muitas vezes está associado ao dano; e, dessa forma, não é razoável tratá-los cornple tamente separados. "Perigo: risco, fortuna, ventura, em que alguém está, de sofrer algum dano, perda ou ruína."20 "Perigo: situação, conjuntura ou circunstância que ameaça a existência de uma pessoa ou de uma coisa, risco."21 "Perigo: situação em que está ameaçada a existência ou a integridade de uma pessoa ou de uma coisa, risco, inconveniente."22 A abordagem teórica, mais encontradiça, do tema "responsabilidade civil" tem focalizado somente os danos causados, deixando de tratar da potencialidade de causar o dano. Os danos causados ao meio ambiente encontram grande dificuldade de serem reparados. É a saúde do homem e a sobrevivência das espécies da fauna e da flora que indicam a necessidade de prevenir e evitar o dano. Posicionamento importante sobre responsabilidade passou a ter o Instituto de Direito Internacional, em sua sessão de Estrasburgo, em 1997. Na Comissão de n. 8 diversos temas sobre meio ambiente foram abordados. A responsabilidade em Direito Internacional nos casos de danos ao meio ambiente foi tratada em 32 artigos. O art. 13 tem a rubrica: "Mecanismos preventivos ligados à responsabilidade" - sendo do seguinte teor: "Os regimes em matéria de meio ambiente deverão estabelecer ligações apropriadas entre a função preventiva da responsabilidade e outros mecanismos preventivos, tais como a notificação e a consulta, a troca regular de informações e o emprego intenso das avaliações de impacto sobre o meio ambiente. Eles deverão igualmente tomar em consideração os princípios da precaução, do poluidorpagador e da responsabilidade comum mas diferenciada".23 A própria Lei 7.347/85, embora dizendo "regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por danos causados ao i 20. A. M. Silva, Dicionário da Língua Portuguesa, 7" ed. 21. F. J. C. Aulete, Dicionário da Língua Portuguesa, 2a ed. 22. A. P. Silva, Novo Dicionário Brasileiro Melhoramentos, 6a ed. 23. Annuaire de l'Instituí de Droit International, Session de Sti Paris, Éditions A. Pedone, 1998, p. 500. : ,-. 'ed. v 'rasbourg, v. 67, " 1 RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 331 tVente" (art. le), deixa aberta a possibilidade de ser observada a res-alB «abilidade de prevenir ao ensejar a propositura da ação civil pública P° o "cumprimento da obrigação de fazer ou não-fazer". Assim, "o fa terminará o cumprimento da prestação da atividade devida, sob * na de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível" (art. 11). O Direito Ambiental engloba as duas funções da responsabilidade civil objetiva: a função preventiva procurando, por meios eficazes, evitar o dano - e a função reparadora - tentando reconstituir e/ou indenizar os prejuízos ocorridos. Não é social e ecologicamente adequado deixar-se de valorizar a responsabilidade preventiva, mesmo porque há danos ambientais irreversíveis. 5. Dano residual, licença e co-responsabilidade , do órgão público ambiental Diante da emissão de poluentes que prejudicam a coletividade mas em cuja atividade não se ultrapassam os padrões fixados pelos organismos ambientais, surge a questão: esses gravames são indenizáveis? Quem deve reparar o dano? Equivocadamente poderia supor-se que o Poder Público pudesse ter o direito de consentir na agressão à saúde da população através do controle exercido pelos seus órgãos. A intervenção estatal no domínio ambiental visa preservar a saúde pública e ordenar as atividades produtoras. Não se pode esquecer que muitas vezes o Poder Público, ao baixar normas de emissão e elaborar Padrões de qualidade, age em causa própria, pois ele, Poder Público, ambém exerce algumas atividades iguais às dos particulares (siderur-§>a> petroquímica ...). Dessa forma, nem sempre os parâmetros oficiais sao ajustados à realidade sanitária e ambiental, decorrendo daí, que, esmo em se observando essas normas, as pessoas e a natureza sofrem Pjí Além disso, a existência das normas de emissão e os padrões de 4 alidade representam uma fronteira, além da qual não é lícito passar. as, não se exonera o produtor de verificar por si mesmo se sua ativida-e é ou não prejudicial. ba Banie e E. Gerelli salientaram: "A norma de emissão pode ser fa em s'mPles imperativo tecnológico, sem que isso resulte ipso o ° em um estado do ambiente de modo que não haja mais vítimas. É vel" °a norma baseada na "melhor tecnologia disponível" ou "praticá-cOs ', norrr>a pode ser ainda fixada em função de imperativos econômi-e modo a não onerar excessivamente os poluidores. De fato, pode- 332 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 1 rá encontrar-se uma combinação do imperativo tecnológico e econôrn' co através da aplicação do conceito da "melhor tecnologia disponível economicamente aceitável". Ora, poderá acontecer que este víncu] tecnológico, e sobretudo econômico, possa deixar subsistir uma poluj. ção excessiva do ponto de vista do poluído, causando danos importai), tes. Por estes motivos o ressarcimento pode constituir um complemento indispensável às medidas de prevenção "ainda que as emissões derivem de instalações conformes às autorizações administrativas".24 Para compelir, contudo, o Poder Público a ser prudente e cuidadoso no vigiar, orientar e ordenar a saúde ambiental nos casos em que haja prejuízo para as pessoas, para a propriedade ou para os recursos naturais mesmo com a observância dos padrões oficiais, o Poder Público deve responder solidariamente com o particular. Como acentua Armando H. Dias Cabral: "A propriedade privada não se tomou algo intocável; desde que seu uso se desencontre de sua função social, vale dizer, do interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, à tranqüilidade pública, ao respeito às demais propriedades, à estética urbana e aos direitos individuais ou coletivos, seja ou não por matéria ou energia poluente, o Poder Público tem o dever de limitá-la administrativamente. Não o fazendo, a Administração se torna civilmente responsável por eventuais danos sofridos por terceiros em virtude de sua ação (permitindo o exercício da atividade poluente, em desacordo com a legislação vigorante) ou de sua omissão (negligenciando o policiamento dessas atividades poluentes)".25 No caso é a aplicação do art. 37, § 62, da CF/88 - as pessoas jurídicas de Direito Público responderão por danos que seus funcionários, nessa qualidade, causarem a terceiros. Alguns autores enxergam no enunciado constitucional a teoria objetiva do risco administrativo. Para Hely Lopes Meirelles "só louvores merece a nova diretriz constitucional > que "harmoniza os postulados da responsabilidade civil da Administração com as exigências sociais contemporâneas".26 Diogo de Figueiredo Moreira Neto acentua que "basta à vítima provar o fato - existência e autoria", mas seria "iníquo que o Estado ou seja a comunidade respondesse pela composição de um dano para o qual a vítima concorreu com culpa".27 José Cretella Júnior acentua que se deu um sentido amplíssim0 à ação ou omissão do agente do Estado e afirma que a "Constituiça0 ;} .<-> 24. Economia e Política deli'Ambiente, pp. 194-195. ,.ji 25. "Proteção ambiental", RDP 47-48/84, 1978. .;1(ii 26. Direito Administrativo Brasileiro, cit., p. 588. ..;jij, 27. Curso de Direito Administrativo, p. 477. RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 333 ,eraj de 1946 (art. 194) consagrou a teoria do risco integral, no que . aCOmpanhada pela de 1967 (art. 105) e pela Emenda 1 de 1969 (art. 1(y7)",28 A CF/88, em seu art. 37, § 6a, perfilhou a mesma orientação. Em Direito italiano "a autorização, não diversamente de todo o sto dos procedimentos de tipo autorizatório ou concessório, é sempre oncedida com salvaguarda dos direitos de terceiros, não podendo em nenhum caso ser prejudicada a sua posição jurídica. É princípio pacífico na jurisprudência" (Corte de Cassação de 19.1.1970, n. 104).29 A legislação francesa é expressa, afirmando o art. 8a da Lei 76.663, de 17.7.1976, que "as autorizações são outorgadas sob reserva dos direitos de terceiros" (a lei repetiu, nesse particular, o que já previa a de 1917). O respeito das medidas técnicas e das regras de tráfego aéreo não constituem justificativa para as companhias aéreas responsáveis pelos prejuízos causados pelo ruído das aeronaves (Cass. Civ. 8.5.1968, J. C. R, II. 15.5.1995, comentário M. de Juglart e E. du Pontavice). Na jurisdição repressiva também não se acolhe a argumentação da licitude das atividades poluidoras (Cass. Crim. II abril 1970, D. 1972, 113, comentário de Michel Despax). 6. Relação de causalidade Além da existência do prejuízo, é necessário estabelecer-se a ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora. Quando é somente um foco emissor não existe nenhuma dificuldade jurídica. Quando houver pluralidade de autores do dano ecológico, estabelecer-se o liame causai pode resultar mais difícil, mas não é tarefa impossível. José de Aguiar Dias, com sua habitual clareza salienta: "A indivisi-oilidade do dano, portanto, pode aparecer como conseqüência da dificuldade de fixar o montante do prejuízo atribuível a cada um, operando a fusão dos dois danos num só e único prejuízo. Seria, na verdade, lnJurídico beneficiar os autores do ato ilícito com a incerteza que só eles estão em condições de desfazer e uma vez que não haja outra solução aPaz de atender ao imperativo da reparação ao lesado".30 Num distrito industrial ou num conglomerado de indústrias pode Ser difícil apontarem-se todas as fontes poluidoras que tenham causado Prejuízo. A vítima não está obrigada a processar conjuntamente todos s Poluidores, podendo escolher aquele que lhe convier, chamar à respon28. Curso de Direito Administrativo, 5a ed., p. 106. Uitel "9' Massimo Paradiso, "Inquinamento delle acque interne strumenti privatistici di a ' Rivista Trunestrale di Dintto e Procedura 31/1.434-1.435, 1977. 3°Ob. cit., v. 2, p. 511. ........ ' - 334 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO sabilidade, por exemplo, optando por um poluidor solvente e não pei insolvente.31 Na produção do prejuízo não é preciso que um prodm poluente cause por si só uma determinada doença, como por exemplo asma ou a bronquite. Hão de ser considerados os efeitos sinergétic'Os das emissões, concorrendo conjuntamente para a eclosão da moléstia Na Itália, Cendon e Ziviz, no artigo "Uinversione delFonere del]a prova nel Diritto Civile",32 acentuam que os tribunais estão propensos a ligar o dano - do ponto de vista causai - às atividades ou situações que resultam disciplinadas pelas regras da responsabilidade objetiva. Dj. zem os autores que, em relação à poluição, foi decidido que "diante da violação de um standard previsto em relação ao lançamento de agentes potencialmente polui dores na água de um rio, o dano que seja derivado da alteração da água será ligado, como causa, à mencionada violação". Indicam os autores tratar-se da "App. Gênova de 12.7.1989". Esse enfoque é importante, porque bastou - no caso em tela - a produção de duas provas: descumprimento de uma norma de emissão ou standard e a ocorrência de dano. Não foi preciso que se produzisse uma terceira prova - a de que o descumprimento da norma de emissão ocasionou o dano. Essa terceira prova tornou-se desnecessária, segundo o tribunal italiano, porque é presumida no caso da aplicação concreta da responsabilidade objetiva. Na Alemanha entrou em vigorem Ia de janeiro de 1991 a Lei de 10 de dezembro de 1990 (BGBIA990 I, S. 2.634) sobre responsabilidade civil concernente às atividades perigosas para o meio ambiente. O art. 62, que se divide em quatro parágrafos, prevê a presunção do liame de causalidade:33 "§ l2. Se uma instalação é apta a causar o dano surgido nas circunstâncias de um caso concreto, há presunção de que o dano é causado pela instalação. A aptidão - no caso concreto - será julgada de acordo com a regulamentação da instalação; através das instalações utilizadas, a qualidade e a quantidade de substâncias químicas utilizadas e emitidas, segundo a hora e o lugar da emergência do dano e segundo a impressão de conjunto causada pelo dano e todas as outras circunstâncias, que indicam ou refutam o liame de causalidade. "§ 2-. O § l2 não se aplica se a instalação está em serviço de forma regular. Uma instalação é explorada de forma regular se as obfl31. José de Aguiar Dias, ob. cit., v. 2, p. 514. , | ., 32. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, setembro de 1992. 33. A tradução da lei alemã para o Francês, que utilizei, foi realizada pela jurista Christine Vodt, a quem agradeço a gentileza. pcpONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 335 - s particulares são respeitadas, e isto no caso de ausência de incô-, " (Breitenstein fala na ausência de incidentes).34 s 3a. As obrigações particulares são aquelas que resultam das au. ç5es administrativas, de disposições particulares, de ordens exe-t0 fórias e de normas, as quais tenham por fim impedir impactos sobre o ° io ambiente, que são os mesmos que causaram o dano. "§ 42. Se a autorização, as disposições particulares, as ordens xecutórias ou as normas prevêem controles para a fiscalização de uma obrigação particular, há presunção do respeito da obrigação quando: "1. os controles tenham sido executados no período durante o qual o impacto sobre o meio ambiente apareceu e esses controles não tenham indicado violação da obrigação ou "2. o momento do exercício do direito à indenização ocorra dez anos depois da realização do impacto." "Art. 7a. Exoneração da presunção: "(1) No caso onde diversas instalações estão aptas a causar o dano e uma outra circunstância esteja apta a ser causa do dano no caso concreto, a presunção não se aplica. "(2) No caso onde uma só instalação estivesse apta a ter causado o dano e uma outra circunstância, no caso concreto, esteja apta a ter causado o dano, a presunção não se aplica." As instalações são edifícios imóveis, como fábricas e estoques. Fazem parte da instalação: a) as máquinas, os aparelhos, os veículos e outros equipamentos técnicos móveis; b) os estabelecimentos anexos ligados à instalação por sua localização ou por razão técnica e que possam desempenhar papel significativo na emergência de impactos ambientais (art. 3a, §§ 2a e 3a). O § Ia do art. 6a da lei alemã tem duas frases. A primeira frase diz se uma instalação é apta para causar o dano surgido nas circunstâncias e um caso concreto, há presunção de que o dano é causado pela instado . A lei insere uma noção de "instalação apta a causar dano". Essa Ptidão pode ser antes do cometimento do dano e no momento da ocor-ncia do dano. Na segunda frase são dadas diretrizes para constatar-se Ptidão para produzir dano. Voltando-se para a primeira frase, deve-s repisar a noção de que, havendo aptidão de uma instalação para sadSar ° ano' e este acontecer)do, há presunção de que o dano foi cau-° por essa instalação. A vítima deverá apontar os elementos da apti-Para causar dano, isto é, "regulamento da instalação, quais as instala". '1. Revue Juridique de 1'Environnement, cit. . . . . .., ,; 336 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ções utilizadas, qualidade e quantidade de substâncias químicas i das e emitidas; hora e lugar do evento danoso, o dano no seu ,_ etc". Importa, contudo, anotar que a lei alemã dispensou, para a pr'eUnt° ção de autoria ou presunção de responsabilidade, que fosse estabe]1"1" do o liame de causalidade entre os atos praticados pela instalação C'" dano. Essa "presunção de causalidade" - usando a expressão de Br0 tenstein - não é gratuita, pois "a vítima deve provar as circunstânci" justificando a presunção".35 As provas da vítima são as circunstâncias enumeradas no § a do art. 6a, pois as provas do cumprimento das obrigações particulares do s 3a e as situações do § 4a são provas que incumbem ao empreendedor. Este é que deverá provar que cumpre as normas administrativas. A vítima não poderia ter o ônus dessas provas dentro do regime da responsabilidade sem culpa, pois nada mais são do que provas da prudência e da perícia do empreendedor. Para a formação dessas provas, a lei alemã deu à vítima o direito de informação contido no art. 82, § Ia. O empreendedor deverá informar sobre o equipamento utilizado, a qualidade e quantidade de substâncias utilizadas e emitidas e sobre outros impactos provocados pela instalação, assim como sobre as obrigações particulares do art. 6a, § 3a. Se a informação for incompleta, incorreta, insuficiente ou se não for transmitida em um prazo razoável, a pessoa lesada pode exigir o exame dos documentos do empreendedor (art. 8a, § 3Ü). O direito de informação previsto no § Ia do art. 8a não se aplica se "os negócios são secretos de acordo com normas jurídicas ou se a conservação do segredo é necessária por causa de um interesse preponderante do empreendedor da instalação ou de um terceiro" (§ 2a do art. 8Ü)A lei alemã foi elogiável ao apresentar situações em que se manifesta a presunção de responsabilidade ou de causalidade. Por outro lado, apontando situações em que essa presunção não ocorre, a lei alemã não proibiu a vítima de tentar estabelecer o nexo de causalidade, quando a instalação opere aparentemente de acordo com as normas ambientais fixadas pela Administração Pública. A Convenção sobre Responsabilidade Civil dos Danos Resultantes de Atividades Perigosas para o Meio Ambiente, elaborada sob o patro' cínio do Conselho da Europa, foi aberta para a assinatura dos países integrantes em Lugano, 21 de junho de 1993. Nos seus considerando* diz ser oportuno "estabelecer neste domínio um regime de responsabi' 35. Revue Juridique de 1'Environnement, cit. PONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 337 objetiva, levando em conta o princípio "poluidor-pagador". O ' i n tendo como rubrica a "causalidade", diz: "Quando é apreciada a aft do liame da causalidade entre o acontecimento e o dano ou, no Pr°.a0 jg uma atividade perigosa definida no art. 2fl, § l2, alínea d, Ua esta atividade e o dano, o juiz terá devidamente em conta o risco e° ntado de provocar dano inerente à atividade perigosa". Georges «/' derkehr diz que a interpretação mais evidente do texto é "um convi-feito ao juiz de não ser muito exigente acerca da prova da causalidade de não querer mais do que a probabilidade".36 A Convenção para a Proteção do Meio Marinho do Mar Báltico de 1992 diz em seu art. 32, acerca dos princípios fundamentais e obrigações, que "as partes contratantes aplicam o princípio da precaução, que consiste em tomar medidas preventivas desde quando há fundamento para pensar que as substâncias ou a energia introduzidas, direta ou indiretamente, no meio marinho podem colocar em perigo a saúde humana, prejudicar os recursos biológicos e os ecossistemas marinhos, acarretar danos às qualidades de sítios ou dificultar outras utilizações legítimas do mar, mesmo quando a relação de causalidade entre as causas e os efeitos não estejam estabelecidas".37 No mesmo sentido, a Convenção para a Proteção do Meio Marinho do Atlântico Nordeste, de 1992.38 O Instituto de Direito Internacional, em sua sessão de Estrasburgo, em 1997, entre os diversos temas sobre meio ambiente, tratou da "responsabilidade em Direito Internacional nos casos de danos ao meio ambiente", em 32 artigos. A responsabilidade civil abrange do art. 5a ao art. 8Ü. Interessa-nos, aqui, o art. 72, que diz: "Os regimes em matéria de meio ambiente devem normalmente exigir relação de causalidade entre a ativi-ade empreendida e os danos ocorridos. Esta disposição não prejudica 0 estabelecimento de presunções de causalidade relativas às atividades Perigosas ou relativas a danos acumulados ou duradouros imputáveis nao a urr>a só entidade, mas a um setor ou um tipo de atividade".39 gj „ ' "Le débat sur le fondements de Ia responsabilité en matière de dommage écolo-qo ' "aPP»rt General, Le Dommage Ecologique en Droit Interne, Communautaire et Interrt *~onvenÇão aberta à assinatura em Helsinque (Finlândia), em 9.4.1992, Reciteil 45t n at""lc'l de Législation Sanitaire, Genebra, Organisation Mondiale de Ia Santé, v. lntema ' ConvenÇâo aberta à assinatura em Paris (França), em 22.9.1992, Recueil M, n a'onal de Législation Sanitaire, Genebra, Organisation Mondiale de Ia Santé, v. Paris PM- uaire de 1'lnstitut de Droit International, Session de Strasbourg, v. 67, II, ' aitions A. Pedone, 1998, p. 494. 338 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 7. Obrigação de restauração, reparação e recuperação do meio ambiente Quando, por exemplo, o lançamento de poluentes causa a morte de peixes num rio, seria inadequada uma indenização meramente monetá ria ao proprietário, seja o Poder Público ou o particular. Destarte, seria tarefa difícil estabelecer o montante a pagar. A reparação poderia, no caso, ser uma recomposição efetiva e direta do ambiente prejudicado H. Bocken, em um artigo - "O prejuízo ecológico" -, cita a possibilidade de serem os gravames ecológicos de pequeno espectro fáceis de serem reparados, exemplificando com a obrigação de criarem-se os filhotes de peixe para sua reintrodução em riachos poluídos. A reparação também seria atribuir aos poluidores as despesas de purificação do ambiente agredido.40 Uma das penalidades passíveis de serem aplicadas nas "Áreas de Proteção Ambiental" é a "obrigação de reposição e reconstituição" (art. 9a, § 22, da Lei 6.902, de 27.4.1981). Além disso a Lei 6.938/81 prevê como um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente a "imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados" (art. 4-, VII), "independentemente da existência de culpa" (art. 14, § Ia). A CF/88, com grande acuidade, agasalha os princípios da restauração, recuperação e reparação do meio ambiente no art. 225. Em seu § lfl, I, aponta a obrigação de "restaurar os processos ecológicos essenciais". "Esta disposição traduz a idéia de reencontrar a dinâmica que existia antes."41 No § 3a do art. 225 consta a obrigação de reparar o dano causado ao meio ambiente. Acentua este parágrafo que a obrigação de reparar e independente da aplicação de sanções penais e administrativas. A idéia da finalidade reparatória do Direito Ambiental está, também, explicitada no caso específico da exploração dos recursos minerais, em que a Constituição Federal precisou entrar no campo da aplicação do princípio. Diante da prática abusiva de uma mineração agressora do meio ambiente, diz o § 2a do art. 225: "aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente, r>a forma da lei". Passou-se a exigir a execução do PRAD-Plano de Recupe' ração da Área Degradada. 40. Amenagement du Territoire et Droit Foncier, v. 9, p. 3. ' 41. Myruam Fritz-Legendre, "Biodiversité et irreversibilité", Revue Juridique ' VEnvironnment, n. especial, 1998, p. 99. . .- RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 339 A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, nos objetivos da lírica nacional, inseriu dois comportamentos a serem procurados: preservação e restauração (art. 4a, VI). Não tendo sido eficaz o procedimento preventivo, constata-se a correncia do dano ao meio ambiente. O Direito Ambiental apresenta m novo tipo de comportamento ao efetivar-se a responsabilização jurídica do poluidor ou do agressor dos recursos ambientais. Álvaro Luiz Valery Mirra acentua que no Brasil adotou-se "um sistema que conjuga, ao mesmo tempo e necessariamente, responsabilidade objetiva e reparação integral. Tal orientação, aliás, é rigorosamente correta, como decorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público na proteção do meio ambiente, que impede a adoção de qualquer dispositivo tendente à predeterminação de limites à reparabilidade de danos ambientais. Em suma, no Direito brasileiro vigora a cominação: responsabilidade sem culpa, indenização ilimitada".42 A vítima individual determinada não é desprezada. Continua a poder pedir indenização por perdas e danos. O art. 14, § le, da Lei 6.938/ 1981, diz: "Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade". Portanto, não foi excluído do sistema de responsabilidade civil ambiental a concessão de indenização. Surge, contudo, o ecossistema como vítima social e a solução da ofensa ao direito será diferente. Não se paga, no caso, uma indenização sem destino. A lei brasileira vigente aderiu a este sistema. Diz a Lei 7.347, de 24.7.1985: "Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério ublico e representantes da comunidade, sendo seus recursos destina-os à reconstituição dos bens lesados" (art. 13, caput). A lei que insti-Ulu_a ação civil pública indica o destino do dinheiro oriundo da conde-aÇao - a reconstituição do bem vulnerado. Uma medida compensatória, consistente em substituição por equi-ente em valor pecuniário, não cumpre a função de reconstituir a carac-"stica coletiva do bem. Constata-se não interessar remédios judiciais Slmp'es cornPensaÇão. Medidas desse teor transformam em dinheiro Soc'as de natureza diversa, que não encontram correspondên-nos Parâmetros de mercado. Para cumprir sua função nessa esfera, _66 rinci'Pios fundamentais do Direito Ambiental", Revista de Direito Ambiental •ano 1, São Paulo, Ed. RT, abril-junho de 1996. , . . ,,. 340 ' DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO os mecanismos processuais devem ser compreendidos e aplicados d maneira a conduzir à adoção de soluções capazes de impor condutas, d maneira a evitar o dano ou a reconstituir o bem lesado" - afirma Cario Alberto de Salles.43 Tanto a Constituição Federal, que emprega os termos "restaurar" "recuperar" e "reparar", como a legislação infraconstitucional, que utiljZj termos como "restauração" e reconstituição", estão em harmonia no sentido de indicar um caminho para as pessoas físicas e jurídicas que danificarem o meio ambiente, como para a Administração Pública e para os juizes que intervierem para proteger o meio ambiente. Buscando-se o sentido do termo "reparar" encontramos o de "reconstituição da integridade e da funcionalidade de um objeto".44 Francisco José Marques Sampaio afirma: "não é apenas a agressão à natureza que deve ser objeto de reparação, mas a privação, imposta à coletividade, do equilíbrio ecológico, do bem-estar e da qualidade de vida que aquele recurso ambiental proporciona, em conjunto com os demais. Desse modo, a reparação do dano ambiental deve compreender, também, o período em que a coletividade ficará privada daquele bem e dos efeitos benéficos que ele produzia, por si mesmo e em decorrência de sua interação (art. 3a, I, da Lei 6.938/81). Se a recomposição integral do equilíbrio ecológico, com a reposição da situação anterior ao dano, depender, pelas leis da natureza, de lapso de tempo prolongado, a coletividade tem direito subjetivo a ser indenizada pelo período que mediar entre a ocorrência do dano e a integral reposição da situação anterior".45 O Direito Comparado mostra-nos o Direito italiano na mesma direção do Direito brasileiro. A Lei italiana 349, de 8.7.1986, em seu art. 18, § 82, diz que o "juiz, na sentença condenatória, determina, quando possível, a reconstituição do estado do local, às expensas do responsável". A Suprema Corte de Cassação afirmou, em julgamento de 25 de janeiro de 1989, que a condenação à reconstituição do local às expensas do responsável assume "posição dominante na forma "reparatória", constituindo medida especial a ser adotada, quando seja possível, preferen temente à condenação ao ressarcimento pecuniário".46 43. "Execução judicial em matéria ambiental", Boletim Informativo da Es£< Superior do Ministério Publico de São Paulo 15/8-12, ano 2, outubro de 1998. 44. Vocabulário delia Língua Italiana, Firenze, Le Monnier. 1994. 45. Responsabilidade Civil e Reparação de Danos ao Meio Ambiente, Rio de neiro, Lumen Júris, 1998, p. 107. 46. BenianinoCaravita, Diritto Pubblico deli'Ambiente, Bolonha, II Mulino, 19 "'H RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 341 O Direito Internacional Ambiental indica a mesma direção tomada ela legislação brasileira A Convenção da Diversidade Biológica diz ue na conservação in situ, cada parte contratante "reabilitará e restaura eCOssistemas degradados e promoverá a recuperação das espécies ameaçadas, entre outras coisas, mediante a elaboração de planos e outras estratégias de ordenamento" (art. 8a,/). 8 Prevenir e restaurar: obrigações não antagônicas A Constituição Federal impõe ao Poder e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações (art. 225, caput), estabelecendo que a aplicação de sanções administrativas e penais não elimina o dever de reparar os danos causados (art. 225, § 3a), havendo a incumbência de "preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais" (art. 225, § Ia, I). Preservar é "livrar de algum mal; manter livre de corrupção, perigo ou dano; conservar". Prevenir: é "dispor de maneira que evite (dano, mal); evitar".47 Preservar é prevenir para conservar. Portanto, o binômio constitucional "prevenção-restauração" deve passar a informar e servir de bússola na interpretação de textos legais anteriores e posteriores à Constituição. A luz desse panorama constitucional pode-se interpretar o art. 3a da Lei 7.347/1985, ao dizer que "a ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer", como não colocando alternância nas obrigações de prevenir e de restaurar. O uso da palavra "ou" não pode ser interpretado como uma alternativa de exclusão, isto é, a reparação estaria eliminando a obrigação de ta.zer a prevenção.48 Uma interpretação em dissonância com a Constituição Federal poderia conduzir ao extremo de legitimar o comportamento reparei, mas não tenho que prevenir, e posso continuar ou voltar a poluir". Assim, com grande respeito pelo STJ, que vem julgando intensa-mente pela defesa do meio ambiente, postulo a modificação da linha de -------3. H. Ferreira, Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portu'««, 3" ed., Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999. out *s dicionários mostram que a palavra "ou" pode também ser entendida: "de "co moc'0' Por outra forma; por outra(s) palavra(s)" (Dicionário Aurélio, ob. cit.); (Io Para"ele congiunzioni copulative, può reggere e contrapporre anche proposizioni Ppia o non Io sappia" (Vocabolorio delia língua italiana, ob.cit) ; "denota además jj , _..._.. j . _ . .... --r ' i ín - e1uivalencia, significando "o sea, Io que es Io mismo" (Diccionario de Ia Lengua sP<*nola, ob. cit.). 342 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO raciocínio expendidano REsp 2000/00094-39-0, de 28.3.2000 (Rei. in Garcia Vieira). 9. Responsabilidade civil e licenciamento ambiental A Administração Pública Federal, Estadual ou Municipal não pode ignorar e afastar os bens e valores ambientais protegidos pela Constituição Federal, nem por sua ação (licenciamento ambiental), nem por sua omissão (fiscalização, monitoramento ou auditoria). A Constituição Federal, conforme o art. 225, protege valores como o meio ambiente ecologicamente equilibrado; o meio ambiente como bem essencial à sadia qualidade de vida; os processos ecológicos essenciais; o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; a diversidade do patrimônio genético; a integridade do patrimônio genético; a função ecológica da fauna e da flora. A Administração Pública não pode, intencionalmente, desconsiderar os valores ambientais constitucionais. São valores indisponíveis, que não lhe pertencem. Contudo, como a norma constitucional, na maioria das vezes, não fornece regras específicas para a proteção ambiental, poderemos encontrar na atividade discricionária da Administração Pública diferenças de entendimento ou de percepção. Desse comportamento dos órgãos públicos ambientais, poderão surgir prejuízos contra os seres humanos e o meio ambiente. Esses prejuízos devem ser reparados de acordo com o regime da responsabilidade civil objetiva, conforme o art. 14, § P, da Lei 6.938 de 31.8.1981. A licença ambiental não libera o empreendedor licenciado de seu dever de reparar o dano ambiental. Essa licença, se integralmente regular, retira o caráter de ilicitude administrativa do ato, mas não afasta a responsabilidade civil de reparar. A ausência de ilicitude administrativa irá impedir a própria Administração Pública de sancionar o prejuízo ambiental; mas nem por isso haverá irresponsabilidade civil. A própria Constituição Federal tornou clara a diferença e a independência dos três tipos de responsabilidade - penal, administrativa e civil - ao dizer, no art. 225, § 3": "as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados". A irresponsabilidade administrativa ou penal não acarreta a irresponsabilidade civil. De grande alcance, a inserção dessa orientação na legislação infra-constitucional, como se vê do art. 21 da Lei 9.966, de 29.4.2000: "As cgpONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 343 unstâncias em que a descarga, em águas sob jurisdição nacional, de cf sUbstâncias nocivas ou perigosas, ou misturas que as contenham, j água de lastro e de outros resíduos poluentes for autorizada, não Hsobrigam 0 responsável de reparar os danos causados ao meio ambiente "de indenizar as atividades econômicas e o patrimônio público e priva-H oelos prejuízos decorrentes dessa descarga." 10 Responsabilidade civil e caso fortuito e força maior u "O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir" (art. 393, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro - Lei 10.406, de 10.1.2002, em vigor). O parágrafo único do art. 1.058 do CC de 1916, foi repetido integralmente no novo Código. "Segundo a autorizada lição de Amoldo Medeiros, a noção de caso fortuito ou de força maior decorre de dois elementos: um interno, de caráter objetivo, ou seja, a inevitabilidade do evento; outro externo, ou subjetivo, a ausência de culpa" (apud José de Aguiar Dias). Clóvis Beviláqua, autor do projeto do Código Civil Brasileiro de 1916, cita Huc para explicar que caso fortuito é "o acidente produzido por força física ininteligente, em condições que não podiam ser previstas pelas partes"; e a força maior "é o fato de terceiro, que criou, para a inexecução da obrigação, um obstáculo, que a boa vontade do devedor não pode vencer". Cumpre destacar - segundo José de Aguiar Dias - que a caracterização do caso fortuito ou da força maior, conforme o Código Civil, art. 1-058, parágrafo único, deve ser procurada nos efeitos, e não no fato necessário. "A inevitabilidade e imprevisibilidade são geralmente atribuídas ao último, quando a lei as fixa nos efeitos. Sem dúvida, o fato necessá-no P°de conter, ele também, carga de imprevisão e inevitabilidade. Ela, Porém, não basta à caracterização do caso fortuito ou de força maior."49 Terremotos, raios e inundações constituem exemplos de fatos necesnos que poderão gerar efeitos que, em tese, poderiam afastar a respon'ndade do devedor. Mas é preciso que sejam examinados os casos ncretos para comprovar se os efeitos desses fatos podiam ser evitados e 'Pedidos. Ternos que citar como opinião divergente a de Mário Moacyr Por-1 4ue diz: "Se o dano for causado por um fato da Natureza, como uma Poren José de Aguiar Dias, Da Responsabilidade Civil, 6a ed., v. 2, Rio de Janeiro, 344 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO tempestade, um abalo sísmico etc, a força maior assim manifesta exclui, a toda evidência, o nexo causai entre o prejuízo e a ação / pessoa a quem se atribui a responsabilidade pelo prejuízo".50 Discordando, com apreço, do autor do artigo em questão, apont que há equívoco em se fazer atuar o fato da Natureza como diretamente excludente da responsabilidade, deixando-se de analisar os efeitos do fato da Natureza, para verificar se os mesmos poderiam ou não ser evita-dos ou impedidos (art. 393, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro) É de se diferenciar os critérios de análise dos métodos empregados para se prever e evitar os prejuízos, conforme se aplique a responsabilidade subjetiva e a responsabilidade objetiva. Na responsabilidade subjetiva haverá de ser analisado se o devedor foi diligente, ou não-culposo no prever e no evitar os efeitos do fato necessário. Já, se for aplicada a responsabilidade objetiva, é analisada a ausência de previsão e de tomada de medidas para evitar os efeitos do fato necessário, sem se levar em conta a diligência dos atos do devedor, pois a ocorrência da responsabilidade independe de sua culpa. O possível responsável pelos danos ambientais diante dos fatos da Natureza e de fatos de terceiro deve considerar, pelo menos, um duplo posicionamento psicológico: prever a ocorrência desses fatos e prever seus prováveis efeitos. Como assinala, com acuidade, o jurista português Fernando S. L. Pessoa Jorge, "nem tudo o que é previsível é evitá-vel, e um acontecimento inevitável, mas previsível, não assume o caráter de caso fortuito ou de força maior".51 Estudaremos fatos relacionados ao meio ambiente: - O local onde está instalada uma usina nuclear é atingido por um terremoto. Esse seria o fato necessário, como afirma o art. 393 do Código Civil Brasileiro. Como efeito do terremoto constata-se vazamento radioativo e conseqüente irradiação, lesando e matando pessoas. Não é de se aplicar a isenção de responsabilidade de forma automática. Deverá ser analisada a forma de escolha do local, constatando se houve estudo sísmico da área. Se a área está sujeita, com maior pr°' habilidade que outras áreas, a abalos sísmicos, ao se instalar nessa área o empreendedor não poderá beneficiar-se da excludente de responsabi' lidade. Também deverão ser avaliadas as medidas tomadas para sererfl evitados danos em decorrência de um possível terremoto. Se as nie"' 50. "Pluralidade de causas do dano e redução da indenização - Força maior e o ao meio ambiente", RT 638/9, ano 77, São Paulo, Ed. RT, dezembro de 1988. 51. Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Coimbra, L'v Almedina, 1995, p. 63. gESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 345 necessárias para evitar o vazamento radioativo não foram prevía-nte tomadas, não houve o uso dos meios para evitar ou impedir os feitos nocivos ocorridos. Nesses casos não pode ser reconhecida a li-heração da responsabilidade civil ambiental. - Depósito de vinhoto foi construído nas margens de um curso de água. Houve a queda de um raio sobre o depósito e o mesmo veio a vazar, poluindo as águas e matando os peixes. Temos que verificar a inadequação da escolha do local para situar o depósito, pois previsível a possibilidade de vazamento na hipótese de qualquer anomalia no funcionamento do depósito. Nelson Nery Júnior é mais exigente, dizendo que "se por um fato da Natureza ocorrer derramamento de substância tóxica existente no depósito de uma indústria (força maior), pelo simples fato de existir a atividade há o dever de indenizar".52 Inaplicável, portanto, o art. 393 neste caso, e correta a invocação da responsabilidade civil ambiental. - Proprietário agrícola deposita produtos agrotóxicos em local sujeito a inundações das águas de rio vizinho. Um temporal cai sobre a área, o rio transborda e as águas atingem o depósito de agrotóxicos e esses produtos as contaminam, tornando-as impróprias para o consumo humano. Da mesma forma, como já se argumentou, inaplicável querer-se a irresponsabilidade civil do proprietário agrícola. Trata-se de responsabilidade civil objetiva, conforme o art. 14, § Ia, da Lei 6.938, de 31.8.81. Quem alegar o caso fortuito ou a força maior deve produzir a prova de que era impossível evitar ou impedir os efeitos do fato necessário - terremoto, raio, temporal, enchente. 11- Reparação do dano ecológico e seguro i A existência de um organismo que vá garantir o pagamento da re-Paração do dano poderá influir beneficamente no espírito dos juizes, lvrando-os da preocupação sobre a possibilidade de o poluidor fazer rente às despesas imediatas de indenização. A instituição de um "seguro-poluição" não pode deixar de lado a coniitante preocupação com as medidas de prevenção da poluição, "r entua ° Prof. Mário Bessone, da Universidade de Gênova, que, aiizado um itinerário em direção ao racional desenvolvimento do sis-e ç ernpresarial, a teoria da culpa parece ter exaurido sua função. Na 1 ' Responsabilidade civil por dano ecológico e ação civil pública", Justitia 126/ 346 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO progressão de toda a economia industrial pela forma de concentração monopolística de capital, o papel decisivo compete, de fato, a fatores que privilegiam a teoria da responsabilidade objetiva (no correr do tem. po) associada a esquemas de seguros. Qualquer formulação em termos de culpa arrisca-se a reduzirse a uma proposta anti-histórica, de retorno a modelo de disciplina de mercado objetivamente superado". Salienta que o empenho de indenizar não constitui elemento preponderante no passivo da empresa, pois operando no esquema responsabilidade objetiva/seguro, há "todo um coeficiente de uma estratégia politicamente oportuna como instrumento de aquisição de consenso e eficácia administrativa, considerando-se que uma rápida e larga indenização da generalidade dos prejuízos enfraquece a solicitação coletiva de inovação e controle sobre as instalações mesmas, com objetivo de reduzir-se a potencialidade de dano da empresa. Destarte o modelo responsabilidade objetiva/seguro não vai agravar o orçamento da empresa, pois externa-liza custos, transferido-os à coletividade".53 O seguro-poluição não resolve todos os problemas oriundos da produção do dano ecológico. Tenha-se em vista a limitação das indenizações existentes na lei de responsabilidade civil por dano nuclear e na Convenção Internacional para a Proteção contra a Poluição Proveniente do Óleo. Uma indagação de interesse público é a de saber-se se uma tarifa inapropriada para a cobertura do dano desonera por completo o poluidor. Com acuidade, Giles Martin responde que as vítimas não estão obrigadas a se contentar com uma reparação incompleta, pois por razão de princípio, sustentar o contrário é sustentar que os prejuízos causados por certas atividades ultrapassam a capacidade humana de previsão. Se fosse assim, não haveria outra escolha, segundo o jurista francês, que a de renunciar a correr tais riscos.54 Quanto à indenização e à intervenção de uma garantia coletiva, a consideração do interesse das vítimas é possível pelo prosseguimento da ação, demandando-se garantias suplementares estatais e até internacionais, que substituiriam as seguradoras e resseguradoras quando o montante das indenizações transpusesse um determinado limite. Injurídico é o Poder Público omitir-se em indenizar integralmente, limitando-se através de um teto, aceitando, entretanto, um risco limitado, como se vê no art. V, I, da Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil em Danos Causados por Poluição (Convenção de Bruxelas, 1969, aprovada pelo Decreto Legislativo 74, de 30.9.1976, e promul53. "Disciplina dell'illicito, distribuzione dei richi e 'costo sociale' dei sisterffl risarcimento", Rivista di Diritto e Procedura Civile 2/725-727, 1977. 54. Ob. cit., p. 181. -....-. i di RESPONSABILIDADE CIVIL E REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO 347 da pelo Decreto 79.437, de 28.3.1977) e arts. 9Ü e 14 da Lei 6.453, de f7.lO.l977. 72 fundo para a reparação do dano ecológico Diante da proporção e da intensidade de certas modalidades danosas advindas muitas vezes de autores desconhecidos ou cuja identificação seja difícil, tem-se recorrido à criação de fundos responsáveis pela indenização das vítimas. EUA, Holanda, Japão e França já se utilizam desse instituto jurídico para reparar o dano ecológico.55 Nos EUA, através do Oil-Discharge Prevention and Pollution Control Act - 1970, prevê-se a indenização para perdas econômicas causadas pela poluição por óleo com origem desconhecida. Na Holanda, desde 1970, opera um fundo para indenizar as ofensas causadas pela poluição do ar, quando o poluidor for de difícil identificação, ou a indenização, por outras razões, for de difícil obtenção. NoJapãoaLei 111, de 5.10.1973, emendada pela Lei 85, de 1974, prevê indenização para prejuízos à saúde causados pela poluição. Decreto ministerial prevê as cidades e áreas cobertas pelo fundo. São indenizáveis as seguintes doenças: bronquite crônica, asma, bronquite asmática e enfisema pulmonar, com as seqüelas provenientes dessas doenças. São previstos problemas de reabilitação, de provisão de materiais para tratamento domiciliar. O fundo é mantido através de taxas oriundas das fontes fixas de poluição e pelas taxas de veículos. A Convenção de Bruxelas, de 18 de dezembro de 1971, estabeleceu um fundo para indenizar os prejuízos da poluição marítima por óleo. A Lei Brasileira de Política Nacional do Meio Ambiente poderia er instituído um fundo comum para evitar as incertezas de autoria em Matéria de poluição. Espera-se a iniciativa do legislador nesse sentido. { Ponn 5' Rüd§er Lummert, "<3iaj»gesíneiviltjíáíilit? màègis;Trend", inEnvimnmentat yandUw, cit., p. 251. 'v : ;;v '. •. .-..•.•-• ... ODi Capitulou MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL Forsthoff assinala que a transferência do elemento jurídico da Administração ativa, impregnada de função técnica, ao controle jurisdicional é um dos caracteres menos assinalados, contudo mais típicos, do Estado moderno.1 Assinala Luigi Rovelli que na tutela dos interesses difusos "o juiz assume um papel bem definido, não protagonista nem subalterno, de guardião da atividade programada, seja garantindo a efetivação das medidas administrativas, seja garantindo a legalidade do procedimento administrativo, e de estímulo ao exato e pontual cumprimento (através da incriminação por omissão dos atos de ofício) da parte dos sujeitos do procedimento administrativo".2 Mauro Cappelletti assinala que "ulterior campo de pesquisa e de projeção do movimento pelo acesso à Justiça refere-se àqueles que atualmente recebem a denominação de "interesses difusos". São típicos, aqui, os interesses dos consumidores e os relativos ao ambiente".3 Importa apontar que a Declaração Rio/92, assinada por unanimidade e sem ressalvas, constituindo um dos documentos relevantes da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, diz, na última frase do Princípio 10: "Deve ser proporcionado acesso aos procedimentos judiciais e administrativos, incluindo compensação e reparação". A presença do Poder Judiciário para dirimir os conflitos ambientais, pode-se afirmar sem exagero, é uma das conquistas sociais importantes deste século, abrangendo países desenvolvidos e em desenvolvimento1. Estado de Direito em Transformação, 1973, p. 79, cit. por Luigi Rovelli no artigo "Prospectiva sobre o papel da intervenção judiciária na tutela do ambiente", Rivis' VAmbiente e il Diritto. 2. Ob. cit., p. 523. 3. "Problemas de reforma do processo nas sociedades contemporâneas", RF 3' 118-128. A tradução da conferência é do Prof. J. C. Barbosa Moreira. MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL 349 O acesso ao Judiciário poderá ser percorrido por diversas vias judi• s- o procedimento sumário, o procedimento ordinário, o processo Cl telar e o processo de execução, entre outros. Dada a amplitude que o rv eito Ambiental vai tomando, deixaremos essas matérias para os maais de processo civil, abordando aqui somente a ação popular e a ação "vil pública, na sua acepção constitucional de defesa do meio ambiente. /. Ação popular Esta ação judicial pode ser intentada por qualquer cidadão. Dessa forma, é condição da ação a prova de que o autor está no gozo de seus direitos políticos, isto é, que é eleitor. A Constituição Imperial de 1824 previa a ação popular no art. 157: "Por suborno, peita, peculato e concussão, haverá contra eles ação popular, que poderá ser intentada dentro de ano e dia pelo próprio queixoso, ou por qualquer do povo, guardada a ordem do processo estabelecida na lei". A ação popular - sem utilizar esse nome - tomou a característica de ter como finalidade a "declaração de nulidade ou anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados ou dos Municípios" (art. 113, § 38, da CF/34). A Constituição Federal de 1946 mantém a mesma orientação da de 1934, ampliando a ação para também defender o patrimônio das "entidades autárquicas e das sociedades de economia mista" (art. 141, § 38). A Constituição Federal de 1967 (art. 150, § 31) volta a utilizar expressamente o nome ação popular dizendo "qualquer cidadão será parte legítima para propor ação popular que vise anular atos lesivos ao patrimônio de entidades públicas". A EC 1/69, em seu art- 153, § 31, manteve a mesma redação. A ação popular não teve a utilização desejada, porque a lei ordiná-r'a previa o pagamento de "custas e preparo a final", isto é, sujeitava o Perdedor da ação a ter que pagar as despesas do processo (Lei 4.717/65, I A Constituição Federal de 1988 dá um novo enfoque à ação popui r' dlzendo "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popuque vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de e e ° Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente ,° Patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada a e> isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência". Vê-se que i slituição não alargou a condição de autor para além do cidadão, qu e °utro lado já não vai pesar sobre o autor a possibilidade de ter Pagar as despesas do processo como de ter que pagar o advogado da 1 350 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ;MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL 351 parte contrária. A única dificuldade para a ação ser totalmente popular. que o cidadão ou cidadãos precisam contratar advogado para apresenta a petição inicial, o que seria dispensável se se considerar que o Ministé rio Público "acompanhará a ação, cabendo-lhe apressar a produção <]. prova e promover a responsabilidade civil ou crimina] dos que ne] incidirem, sendo-lhe vedado, em qualquer hipótese, assumir a defes, do ato impugnado ou de seus autores" (art. 62, § 4Ü, da Lei 4.717/65), 2. A participação do Ministério Público: inquérito civil, as recomendações do Ministério Público e o compromisso de ajustamento de conduta 2.1 O inquérito civil íYij O inquérito civil não é um instrumento indispensável para o exercício da ação civil pública em defesa do meio ambiente, mas, inegavelmente, tem auxiliado na preparação dessa ação perante o Judiciário. O inquérito civil constitui procedimento administrativo exclusivo do Ministério Público Federal ou do Ministério Público Estadual. Oi outros legitimados a proporem ações civis públicas, inclusive as organizações não-governamentais, podem coletar provas de outra forma, mas não através do inquérito civil. A Constituição Federal de 1988 consolidou a criação do inquérito civil, feita pela Lei 7.347/85, para a proteção do meio ambiente, entre a! atribuições do Ministério Público (arts. 127 e 129). No campo criminal já existia o "inquérito policial", mas sua presidência é costumeiramente exercida pelos delegados de polícia, e r& pelo Ministério Público. Este pode fiscalizar esse procedimento, detef minar provas a serem coligidas, mas não se ocupa diretamente do inqu6' rito policial. A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público4 diz, em seu ar1 26: "no exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: I — ins taurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrai'' vos pertinentes, e para instruí-los: a) expedir notificações para colh* depoimentos ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimeU1' injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia O vil ou Militar; b) requisitar informações, exames periciais e docurne11 . '•'. .'.;<> i-.c.' !)'<"..' ''' ': 4. Lei 8.625, de 12.2.1993. -.,...:,.-, v. '••>,,-. ],,;, .'.' .,:..•-. , aUtoridades federais, estaduais e municipais, bem como dos ór-t0/ e entidades da Administração direta, indireta ou fundacional, de ga°. er dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos ° nicípi°s"> c) promover inspeções e diligências investigatórias junto * utoridades, órgãos e entidades a que se refere a alínea anterior". A recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispen' is à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério P'blico, passaram a constituir crime, punido com pena de reclusão de a três anos e multa.5 Passou a haver um apoio do Direito Penal para realização do inquérito civil ou da recepção das informações técnicas de quem as detenha. A maior parte das ações civis públicas ambientais, no Brasil, tem passado pela fase prévia do inquérito civil, não obstante possa o procedimento judicial aludido ser intentado sem essa fase preliminar. Como experiência pessoal, aponto que em uma das primeiras ações civis públicas propostas no Brasil o inquérito civil não foi utilizado.6 É competência dos Conselhos Superiores do Ministério Público Federal e dos Estados estabelecer normas internas para autuação dos inquéritos civis, o procedimento das perícias e da tomada dos depoimentos das testemunhas, dos reclamantes e dos reclamados e o prazo de tramitação do inquérito. Não se estabelece o contraditório no inquérito civil, mas a presença dos advogados é um direito desses profissionais e garantia básica do Estado de Direito. Os interessados poderão solicitar cópias dos documentos do inquénto, arcando com as despesas de sua reprodução. A menos que se trate e interesse da segurança nacional ou de sigilo comercial ou industrial, °u de outra matéria protegida por lei, não há razão para a não-publicidade do procedimento. A contribuição das Universidades, principalmente as públicas, si,as nas áreas onde ocorrem os danos ambientais, na elaboração de p ric|as merece ser registrada. Ainda que seja uma obrigação legal e uita,7 a ajuda das Universidades é insuficiente, pois os professores m suas tarefas próprias. sed' 'n'stério Público Federal constituiu um corpo de especialistas, 0 em Brasília, para auxiliar em todo o território nacional na forAn- 10 da Lei 7.347/85. RT, 1987aUl° A- L- Machado, Ação Civil Pública e Tombamento, 2a ed., São Paulo, Ed. 'nstala . ' PP124 e 125 (Ministério Público x Siderúrgica Dedini. O pedido visou à fdo fi'tr°s para evitar a poluição do ar. A empresa concordou com o pedido, 7 ~se ac°rdo em juízo). '"26, §3=, da Lei 8.625/93. 352 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO mação das provas, como na análise das elaboradas por outros espec-listas. Atitude necessária, mas ainda insuficiente, frente ao número h~ solicitações. Para o sucesso do inquérito civil ambiental é preciso n,6 os Ministérios Públicos tenham recursos financeiros para contratar e & pecialistas. O Ministério Público, se não encontrar elementos que indiquem autoria do possível dano ambiental ou não encontrar o mínimo de pr0Va para propor a ação judicial, pode promover o arquivamento do inquérito civil ou dos documentos em seu poder. As razões do arquivamento devem estar fortemente fundamentadas, devendo o Ministério Público, na dúvida, promover a ação judicial. O Ministério Público deve intervir na proteção de "interesses sociais ou individuais indisponíveis",8 entre os quais o meio ambiente;9 e, portanto, ainda que haja dúvida, deve promover a ação judicial, protegendo interesses que não lhe pertencem e dos quais não tem poder de disponibilidade. O arquivamento deve ser obrigatoriamente examinado pelo Conselho Superior do Ministério Público.10 Este órgão é eleito pelos integrantes do Ministério Público de primeira instância. O espírito de corporação e a política eleitoral interna não devem prevalecer sobre o interesse indisponível, na homologação do arquivamento ou na sua rejeição. Neste caso, não haverá constrangimento para o promotor de justiça ou para o procurador da República que promoveram o arquivamento em primeira instância, pois outro membro do Ministério Público será designado para ajuizar a ação, quando o arquivamento for rejeitado. 2.2 As recomendações do Ministério Público A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público instituiu as recomendações" dirigidas aos órgãos públicos, aos concessionários eper' missionários de serviço público estadual ou municipal e às entidades que exerçam outra função delegada do Estado ou do Município, ou executem serviço de relevância pública. As recomendações não têm a rneS' ma natureza das decisões judiciais, mas colocam o recomendado, isto < o órgão ou entidade que as recebe, em posição de inegável ciência d ilegalidade de seu procedimento. Entregues as recomendações, pr°sS guindo o recomendado em sua atividade ou obra, caracteriza-se seu oft 8. Art. 127 da CF. 9. Ait. 129, III, da CF. • • -1 " 10. Art. 92 da Lei 7.347/85. 11. Art. 27, parágrafo único, IV, da Lei 8.625, de 12.2.1993. II MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL 353 mento doloso, com reflexos no campo do Direito Penal ambiental. P°r cornendações ambientais deverão ser imediatamente divulgadas S uem as recebe, como, também, deverão ser respondidas. P° q jyiinistério Público pode expedir recomendações: para a elabora- do Estudo Prévio de Impacto Ambiental ou sua reformulação; para Ça. de local e horário da audiência pública (a simples solicitação do Ministério Público da realização da audiência já a torna obrigatória);12 ara a realização de inspeções em determinados locais ameaçados de terem o meio ambiente danificado ou onde o dano já foi produzido; nara a apuração de infração administrativa contra o meio ambiente; para nue o órgão público ambiental não expeça a licença, a autorização ou a permissão enquanto o inquérito civil não termine. 2.3 O compromisso de ajustamento da conduta Os órgão públicos legitimados para proporem a ação civil pública poderão tomar dos interessados o compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, prevendo-se cominações em caso de não cumprimento. Esse compromisso tem eficácia de título executivo extrajudicial.13 O compromisso de ajustamento às exigências legais surge porque alguém - pessoa física ou jurídica, de Direito Privado ou de Direito Público - não está no presente, ou não estará no futuro, integralmente cumprindo a legislação ambiental. "Ajustar" tem diversas acepções, mas vale aqui mencionar "convencionar", "combinar", "estipular". O termo "ajustamento", se tivesse s'uo empregado pela lei de forma isolada, poderia conduzir à interpretado de que o ajustamento entre os órgãos públicos e os interessados ena Um contrato ou convenção negociada conforme a vontade de ambas partes. Contudo, a lei une dois termos: "ajustamento" e "obrigações Assim, "ajustamento" não significa transigência no cumprimento dia ° §aÇes legais. O Ministério Público não pode fazer concessões da cr "nteresses sociais e individuais indisponíveis" (art. 127, caput, Part 1 sP°r ou renunciar às obrigações legais é inadmissível por °bri °.mistério Público. "É vedada a dispensa, total ou parcial, das vend °eS reclamadas para a efetiva satisfação do interesse lesado, de-a convenção com o responsável restringir-se às condições de cumd°r (Lei Resolução 9/87-conama. 5°' § 6a-da Lei 7.347/85, introduzido pelo art. 113 do Código do Consumi-8 de 11.9.1990). J 354 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO primento das obrigações (modo, tempo, lugar etc), bem como dever ser estipuladas cominações para a hipótese de inadimplemento".14 O ajustamento refere-se "às obrigações legais". Nessas obrigacg incluem-se comportamentos vinculados e discricionários. Nos compOrt s mentos vinculados ou regrados não pode haver opção sobre sua exigj lidade imediata (a não ser que a legislação preveja prazos). Os comp0r. tamentos discricionários irão permitir a análise da Administração ambiental ou do Ministério Público quanto à sua conveniência e oportunidade, desde que a interpretação leve em conta o interesse ambiental O termo "acordo" retrata melhor a finalidade do "compromisso de ajustamento de condutas" do que o termo "transação".15 O parágrafo único do art. 7Ü da Lei de Gerenciamento Costeiro prevê que devam ser comunicados ao Conselho Nacional do Meio Ambiente as sentenças condenatórias e "os acordos judiciais".16 A Lei 9.099/95 emprega também o termo "acordo" (art. 57).17 Ao contrário do termo "transação", parece-me que o termo "acordo" não conduzirá a equívocos de inter14. Ato 2/92 da Procuradoria-Geral da Justiça, Conselho Superior do Ministério Público e da Corregedoria-Geral do Ministério Público do Estado de São Paulo, publicado no DOE 23.7.1992. 15. Transação "é ato jurídico que dirime obrigações litigiosas ou duvidosas mediante concessões recíprocas das partes interessadas" (Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, s/d, 1.499 pp.). No mesmo sentido Devoto & Oli: "Transazione: nel linguaggio giudiziario, contratto che definisce un accordo concluso sulla base di reciproche concessioni delle parti, in un conflito di interessi" (Vocabolorio delia Língua Italiana, OMximpr., Florença, 1994). "Transaction (du Lat. transigere, mener à bonne fin). Accord conclu sur Ia base de concessions reciproques: 'une medíocre transaction est preférable à un bon procès'" (Petit Larousse Illustré, Paris, Librairie Larousse, 1978). "Transaction: the act of transacting or the Üct of being transacted. Transact: 1. Tr.: to do, carry out, perform, manage or conduct (business or affairs, for example). 2. Intr.: to do business with; negotiate" (The American Heritag Dictionary of the English Language, Nova York, American Heritage Publishing Co-. 1970). "Transact: to carry (a piece of business, matter, etc.) through to an agreenient (Longman Dictionary of Contemporary English, Londres, Longoman Group, 1978)16. Rodolfo de Camargo Mancuso emprega as expressões "acordo" e "transaça de forma similar, admitindo o acordo (Ação Civil Pública, 2a ed., Ed. RT, 1992). 17. "Acordo: concordância de sentimentos ou idéias. Composição" (Aure_ Buarque de Holanda Ferreira, ob. cit.). "Acordo: Dir. Traí).: junção, ajuste, combinai*/ concordância de vontades para determinado fim jurídico" (Dicionário Brasile'1"0 Língua Portuguesa, Mirador Internacional, 1976). "Agreernent: 1. The act of agreel."fs 2. The state of being agreed; concord; harmony. 3. An arrangement between par ,y regarding a method of action; covenant; treaty Law: a) A properly executed and le?a ' binding compact. b) The writing or document embodyng this" (The American Her'1 .. Dicitionary of the English Language, cit.). "Accord: pacte, convention, arrangen16 -0 (Petit Larousse Illustré, cit.). "Accordo: reciproca intesa circa Ia defmizione di un neg o Ia composizione di una lite o vertenza" (Vocabolario delia Língua Italiana, cit.)- MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL 355 rZn doís retrata a celebração de um ajuste e não induz a despo-nretavaw' r ,.••,• ~ f ento de direitos indisponíveis em questão. Um acordo que admita o descumprimento expresso ou implícito obrigações legais é nulo, não tendo eficácia. A nulidade pode ser ciarada pelos próprios intervenientes - Ministério Público ou órgão 'blico que tenham assinado o compromisso. O termo de ajustamento pode ser convencionado antes do ajuiza-mento da ação, sem intervenção judicial. Neste caso, o ajustamento não transita em julgado, pois não há homologação judicial, e, dessa forma, não impossibilita a qualquer outro legitimado, que não tenha intervindo no acordo, propor a ação civil pública, sem que para isso tenha que acrescentar provas. O acordo, antes de ser assinado, merece ser tornado público. Um dos pilares fundamentais do Direito Ambiental é a informação ampla, veraz, rápida e institucionalizada. Havendo transparência, os interessados poderão trazer para os órgãos públicos envolvidos outros subsídios ou a opinião de segmentos sociais diversos. Não se conseguiu ainda a publicação prévia do termo de ajustamento de conduta. Mas já se caminhou, de forma expressiva, para o acesso ao conteúdo do termo de ajustamento de conduta-TAC. A Lei 10.650, de 16.4.2003, determina que a lavratura de termos de compromisso de ajustamento de conduta seja publicada no Diário Oficial (art. 4a, IV). Não se trata de publicar um resumo do termo, mas sua integralidade. A divergência de pontos de vista não impedirá o acordo em primei-ra mstância administrativa. A via do recurso à instância administrativa -como o Conselho Superior do Ministério Público -, contudo, não ficará techada aos discordantes. •<, ... 3- Ação civil pública A ação regulada pela Lei 7.347, de 24.7.1985, traz como características: os K Plicitamente visa proteger o meio ambiente, o consumidor e tUrísns e interesses de valor artístico, estético, histórico, paisagístico e Fed lco- Interesses difusos e coletivos, como os rotulou a Constituição eral(art. 129,111). Cürnn Proteção desses interesses e bens far-se-á através de três vias: fa?er nmetlto da obrigação de fazer, cumprimento da obrigação de não condenação em dinheiro. ... .,...- 356 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 3. A ação da Lei 7.347 abriu as portas do Poder Judiciário às s ciações que defendem os bens e interesses apontados no item 1. plano da legitimação foi uma extraordinária transformação. 4. A ação civil pública consagrou uma instituição - o Ministéri Público - valorizando seu papel de autor em prol dos interesses difySo e coletivos. O Ministério Público saiu do exclusivismo das funções de autor no campo criminal e da tarefa de fiscal da lei no terreno cível, para nesta esfera passar a exercer mister de magnitude social. 5. Inova, por fim, essa ação civil no sentido de criar um fundo em que os recursos não advêm do Poder Executivo, mas das condenações judiciais, visando a recomposição dos bens e interesses lesados. Não se trata nessa ação de ressarcir as vítimas pessoais da agressão ambiental, mas de recuperar ou tentar recompor os bens e interesses no seu aspecto supra-individual. Além das inovações no direito de ação e no próprio curso da ação, procurou-se possibilitar a propositura rápida da ação, com a criação do inquérito civil e com a criminalização da não informação do Ministério Público. A ação civil pública pode realmente trazer a melhoria e a restauração dos bens e interesses defendidos, dependendo, contudo, sua eficácia, além da sensibilidade dos juizes e do dinamismo dos promotores e das associações, do espectro das ações propostas. Se a ação ficar como uma operação "apaga incêndios" muito pouco se terá feito, pois não terá peso para mudar a política industrial e agrícola, nem influenciará o planejamento nacional. Ao contrário, se as ações forem propostas de modo amplo e coordenado, poderemos encontrar uma das mais notáveis afirmações de presença social do Poder Judiciário. 3.1 Conceito e objetivos A ação civil pública foi elaborada pela Lei 7.347, de 24.7.1985- ação judicial é denominada "civil" porque tramita perante o juízo civil não criminal. Acentue-se que no Brasil não existem tribunais admm1 trativos. A ação é também chamada "pública" porque defende bens q compõem o patrimônio social e público, assim como os interesses difus e coletivos, como se vê do art. 129, III, da CF/88. As finalidades da ação civil pública são: cumprimento da obn§ ção de fazer, cumprimento da obrigação de não fazer e/ou a condenaÇ em dinheiro. A ação visa a defender o meio ambiente, o consumido direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e p ais»' MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL 357 ? Autores da ação civil pública <% ação principal e a cautelar poderão ser propostas pelo Ministé- público, pela União, pelos Estados e Municípios. Poderão também ° r propostas por autarquia, empresa pública, fundação, sociedade de S onomia mista ou por associação que: I - esteja constituída há pelo enos um ano, nos termos da lei civil; II - inclua, entre suas finalidades •nstitucionais, a proteção do meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico" (art. 5Ü da U 7.347/85). Na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81, art. 14, § Ia) constou que o Ministério Público da União e dos Estados tem legitimidade para propor ação civil por danos causados ao meio ambiente. Nessa lei de 1981, contudo, não se conseguiu aprovar a legitimação das associações, embora tenha sido a idéia aprovada unanimemente no Congresso Nacional, mas vetada pelo Chefe do Poder Executivo. 3.3 O Ministério Público na ação civil pública Para compreender-se o Ministério Público no Brasil é preciso vê-lo como diferente da maioria dos outros países. O grau de sua autonomia poderá ser medido na história constitucional republicana tendo-se em vista três fatores: regime de nomeação e demissão do Procurador Geral da República, regime dos deveres e direitos dos membros do Ministério Público e regime orçamentário. A Constituição Federal de 1891 (primeira da República) prevê que presidente da República "designará dentre os membros do Supremo r'Dunal Federal, o Procurador Geral da República, cujas atribuições se efmiã em lei" (art. 58, § 2a). Nas Constituições Federais de 1934 la)) 1946 art-146) e 1%7 (art- 138 a nomeação do Procura- da República dependia de aprovação do Senado Federal. Es- tres Constituições foram votadas. Já nas duas Constituições outor-s (a de 1937 pelo Presidente da República e a de 1969 pela Junta ° rocurador Geral da República era de livre nomeação do Pre- Uk> a R-ePÚblica. Entretanto, em todas as Constituições Federais ; ° Procurador Geral da República era demissível ad nutum. A sidente C, CO do yr çao Federal de 1988 dá um passo marcante no regime jurídi Pelo j,nist:ér'0 Público: o Procurador Geral da República é nomeado residente da República "dentre os integrantes da carreira, maio-ar»os, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos 358 -'' DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO •"":' membros do Senado Federal, para mandato de 2 anos, permitida a r condução" (art. 128, § Ia). "A destituição do Procurador Geral da Repii* blica, por iniciativa do Presidente da República, deverá ser precedida H ~ autorização da maioria absoluta do Senado Federal" (art. 128, § 2a) As Constituições Federais chegaram a mencionar que os membros do Ministério Público só poderiam perder o cargo em virtude de sentença judiciária ou processo administrativo em que seja facultada ampla defesa (CF/34, art. 95, § 3*; CF/46, art. 127; CF/67, art. 138, § l»; e Ec 1/69, art. 95, § Ia). Entretanto, só com a Constituição Federal de 1988 o Ministério Público conquistou as garantias da vitaliciedade (retirando portanto, a possibilidade de que haja perda do cargo por processo administrativo), inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado, por voto de dois terços de seus membros, assegurada ampla defesa; irredutibilidade de vencimentos (art. 128, I, a, b e c). O regime de concurso público de provas para o ingresso no Ministério Público passou a ser exigido na Constituição Federal de 1946 (art. 127), Constituição Federal de 1967 (art. 138, § Ia), EC 1/69 (art. 95, § Ia), Constituição Federal de 1988 (art. 127, § 2a). Só na Constituição Federal de 1988 consegue o Ministério Público a possibilidade de elaborar sua proposta orçamentária e a possibilidade de propor ao Poder Legislativo a criação e a extinção de seus cargos (art. 127, § 2a). Apresentamos as linhas gerais do Ministério Público, que a partir de 1981 e de forma aperfeiçoada em 1988 ganha a possibilidade de propor ação civil pública para a proteção do ambiente. A atuação do Ministério Público Federal e dos Estados não fica só no momento da apresentação do pedido judicial, mas na preparação desse pedido. A atuação do Ministério Público na ação civil pública fai-por fim, constitucionalizada em 1988 (art. 129, III). Sendo as associações, ou qualquer dos outros entes legitimados no art. 5a da Lei 7.347/85, os autores da ação, o Ministério Público devera intervir como "fiscal da lei" (art. 5a, § le). 3.4 Condenação em dinheiro e o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos "ÍJ A Lei 7.347/85 inovou quanto ao destino da indenização ou multas processuais: não irão para as pessoas vítimas diretas ou idi MEIOS PROCESSUAIS PARA A DEFESA AMBIENTAL 359 ° , mas para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (fdd). orej t° âmbito do Ministério da Justiça, criou-se o Conselho Federal Gestor j Fundo de Direitos Difusos. A prioridade de reparação dos danos hientais ordenada pela Lei 7.347/85 é mantida. Assim, a promoção H atividades e eventos, como o auxílio para projetos de modernização dministrativa dos órgãos públicos (Decreto 1.306, de 9.10.1994, DOU 10 11-1994, Seção 1, p. 16.863) não pode antepor-se à reconstituição aos bens lesados. Cumpre ademais, não ser esquecido o outro Fundo e pOde atender a essas necessidades - o Fundo Nacional do Meio Ambiente. Assinale-se que o art. 13 da Lei 7.347/85 previu a existência de dois fundos - um gerido por um Conselho Federal e outro gerido por Conselhos Estaduais. O dinheiro oriundo das condenações nas ações civis públicas propostas perante a Justiça Federal será objeto da gestão do Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos (cfdd), sendo que os recursos obtidos nas ações propostas perante a Justiça dos Estados irá para os Conselhos Estaduais. Nos Estados em que não houver sido organizado o referido Conselho, "o dinheiro ficará depositado em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária" (art. 13, parágrafo único, da Lei 7.347/85). Ambos os Conselhos deverão ser integrados pelo Ministério Público e por representantes da comunidade. O Conselho Federal é formado por 10 conselheiros, sendo 3 integrantes de entidades civis que atendam aos pressupostos dos incs. I e II do art. 5a da Lei 7.347/85. Não é, portanto, de ser desprezada a atuação fiscalizadora da comunidade que, diante do Poder Executivo, com 6 assentos no Conselho, detém 1/3 de v°tos desse colegiado. < *.< vi >•< i. 1 ,h :t 1 .!-•'!' I < ,1 >t i, f./ TÍTULO VI MUNICÍPIO - URBANISMO E MEIO AMBIENTE Capítulo I - MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE-ASPECTOS JURÍDICOS. Capítulo II PARCELAMENTO DO SOLO URBANO. Capítulo III - PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES. Capítulo I MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 1. A União e o Município A República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal (art. lu da CF). "A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil com' preende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tod° autônomos, nos termos desta Constituição" (art. 18, caput, da CF). "O fundamento de toda ordem federal, 'comunitária', reside no r6' conhecimento de que a sobrevivência das partes constituintes de uflj Federação é, de alguma maneira, a razão de ser da ordem federal -onde decorre uma dupla obrigação: de um lado, para as partes integraI1 tes, no seu próprio interesse, em virtude de um enlightened self-inte?e ' de fazer aquilo que for indispensável para a Federação, para que e possa cumprir seu papel; de outro lado, existe a obrigação para a pr MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS 361 • Federação de velar para o bem daqueles que a compõem, porque, Prl cas0 contrário, a legitimação, a legitimidade da Federação cessaria e eXjstir" - afirma Wahlendorf.1 E sobre a "fidelidade federal" (Bun-, treUe) cita o jurista Alfred Hueck, que conceitua o princípio como nuele que implica "o dever de se abster de causar qualquer prejuízo s interesses da comunidade e aos interesses dos associados, ligados ela finalidade comunitária, como o dever suplementar de promover sses interesses no quadro das atividades resultantes da comunidade". A aliança entre Estados, Municípios e o Distrito Federal, que forma a União, gera um relacionamento de fidelidade entre a União e os Estados, mas, também, entre a União e os Municípios. Encontramos, entre os deveres da União, o de preservar a autonomia municipal (art. 34, VII, c, da CF), devendo intervir nos Estados para assegurar esse princípio institucional, como, entre outros motivos, para assegurar a entrega pelos Estados aos Municípios, das receitas tributárias fixadas na Constituição, com a observância dos prazos fixados em lei (art. 34, V, b, da CF). A União, portanto, deve existir e subsistir através da felicidade dos entes que dela fazem parte. Essa felicidade é constituída de vários elementos, entre os quais a implementação do direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e propício a uma sadia qualidade de vida (art. 255, caput, da CF). É óbvio, mas merece ser salientado: a existência da Federação não pode basear-se na felicidade de alguns A li ' Municípios, construída sobre a infelicidade de outros Municípios, isto é, o desenvolvimento de uma parte da Federação não pode ser conseguido a custa da poluição e da degradação da natureza da outra parte, ainda que seja do menor, do mais pobre e do mais distante dos Municípios. A origem do termo "federalismo" encontra-se na palavra latina J°edus,foederis, significando "aliança".2 Afirma o brilhante jurista argentino Pedro J. Frias que o "federalismo deverá fazer suas provas; que e defenda por si só, pela verdade que contém. Para que isso seja possí-e . e necessário que não se deturpem as tendências à liberdade e à rf1Clpação dentro da comunidade nacional e que o federalismo seja ' ° como um sistema coerente: não só como uma fragmentação do ai' Hf sen° corr>o uma associação de suas competências".3 Quem está a 0> deve somar esforços para a consecução de fins comuns e buscar ? 1Z p con? ° conjunta das aspirações. Examinemos, pois, a repartição de Petências para situar os interesses de cada um dos entes públicos. • Charz-Liebermann von Wahlendorf, Politique, Droit, Raison. 3" DlctU>nnaire Etymologique. federalismo Argentino. Introducción ai Derecho Público Provincial. 362 -' ;.':* DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ''" 2. Repartição das competências ..'-A Constituição Federal previu dois tipos de competência para ]e gislar, com referência a cada um dos membros da Federação: a Unigo tem competência privativa e concorrente; os Estados e o Distrito Fede. ral têm competência concorrente e suplementar; e os Municípios têm competência para legislar sobre assuntos de interesse local e para suplg. mentar a legislação federal e estadual. Acentua o Prof. espanhol Sebástian Martín-Retortillo: "A razão última de distribuição do Poder entre seus distintos níveis, não deve ser outra que a de facilitar seu mais adequado e eficaz exercício. As fórmulas que se adotem, como todas as fórmulas políticas, devem legitimar-se pelos seus rendimentos sociais efetivos (E. Garcia de Enterría). Daí, a necessidade de ser considerado o melhor nível de gestão dos serviços e a maior atenção às necessidades concretas e reais dos cidadãos e da própria sociedade. A determinação dos âmbitos que possam corresponder aos distintos níveis do Poder, assim como a forma em que deve ser exercido, haverá de fundamentar-se, de modo inequívoco, no princípio de como se exercem melhor as competências, que aqueles níveis recebem como atribuições. Junto a isso, deve-se considerar, também, o custo econômico que representa o exercício dessas funções. É algo que se olvida com freqüência".4 A Constituição Federal de 1988, não obstante tenha dado passos significativos em matéria ambiental, no sentido de colocá-la, na sua maioria, no campo da competência concorrente, guardou, ainda, para a União, o monopólio de legislar em alguns setores como águas, energia, jazidas, minas, outros recursos minerais, atividades nucleares de qualquer natureza (art. 22 da CF). Sob o ponto de vista da eficiência legiferante, parece-me difícil que a legislação federal privativa nos setores indicados tenha melhor desempenho do que se fosse inserida na competência concorrente. Da forma como está, os Estados e os Municípios não podem suplementar as deficiências dessas normas federais, como, também, não têm atribuições diretas para adaptar essas normas às suas peculiarida-des regionais e locais. Oportuno retornarmos ao magistério de Sebástian Martín-Retortillo, que afirma sobre a situação européia: "Não estamos diante de sistemas políticos em que o Estado desempenhe agora um papel prioritário e quase exclusivo; um papel que, além disso, permita a outros Poderá 4. "Relación entre los distintos niveles de gobierno", Rivista Trimestrale di Dii'11 Pubblko, pp. 986-988. : --.. . • • > ' -'- ' :- MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 363 'blicos o exercício quase gracioso de um 'poder municipal' de caráter ricamente doméstico e interno. Não; a realidade presente oferece um adro notavelmente distinto. O reconhecimento das distintas instânas políticas conduziu a uma afirmação das competências e funções , mesmas, cada vez mais consistentes. É um dado que se deve ter uito em conta. O Poder Público é crescentemente um poder comparti-á0 e distribuído entre os distintos Poderes Públicos". Acentua que a tendência do momento presente é evitar-se a confrontação entre as instâncias de governo, colocando-se de lado a invasão de competências para praticar-se uma ação participada de poderes concorrentes, segundo a fórmula de um federalismo coordenado. Acrescenta que as relações entre os distintos Poderes devem "estar presididas pela confiança, pela credibilidade no sistema, de forma que se garanta a lealdade ao mesmo".5 Não reivindicamos para o Brasil a debilitação do Estado federal. Entendemos de real importância que a normatização fundamental para o meio ambiente seja feita pela União, através de normas gerais; mas que com isso não se anule o Município, como se fez com o revogado Decreto-lei 1.413/75. Entretanto, "denunciam-se as colocações que identificam a política de descentralização com uma prática democrática, partindo da premissa de que encerra, na realidade, um conteúdo fragmentário, o que contraria a concepção de um projeto global para o país. Entende-se com isto que diretrizes políticas, que têm acenado para possibilidades de estruturação de um poder local, escudado em propostas de autonomia decisória, estariam atendendo, na verdade, a interesses hegemônicos da sociedade". "A argumentação crítica levantada pode encontrar suporte na presença local da grande indústria, que se constitui em fonte praticamente exclusiva de emprego, mas que se subordina inteiramente a decisões vindas de fora."6 • interesse local do Município e sistema de competências De longa data é empregada a expressão "interesse", quanto à ensuração da competência municipal. Antes utilizava-se "peculiar inc ri?,Sse" e a Constituição Federal de 1988 passou a usar "interesse lo(art. 30, I). A Constituição de Portugal de 1976 (com a EC 1/89) Prega o termo "interesse", como se vê do art. 237, 2: "As autarquias Pubhi'ación entre los distintos niveles de gobierno", Rivista Trimestrale di Diritto ílco> pp. 986988. da 4 j '. any Davidovich, "Poder local e Município. Algumas considerações", Revista """útração Pública 27(l):3-4/5-14. „;.,>,* .. _,,,..,,• 364 ..-.".;'.!! DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO locais são pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representaf vos, que visam à prossecução de interesses próprios das populaçõe respectivas" (no Continente as autarquias locais são as Freguesias, 0 Municípios e as Regiões Administrativas).7 A Constituição espanhola de 1978 utiliza, também, a expressão "interesse", em seu art. 137; «q Estado organiza-se territorialmente em Municípios, Províncias e Comunidades Autônomas que se constituam. Todas essas entidades gozam de autonomia para a gestão de seus respectivos interesses". Vejamos o sentido do termo "interesse": "Conveniência, lucro, proveito, vantagem ou utilidade que alguém encontra em alguma coisa".8 "1. Lucro material ou pecuniário; ganho. ... 3. Vantagem, proveito; benefício. 4. Aquilo que convém, que importa, seja em que domínio for.... 13. Jur. Pretensão que se baseia ou pode basear-se em direito".9 "Utilidade, lucro, proveito, vantagem que alguém encontra em qualquer coisa."10 "Importar, convir. Proveito, utilidade, lucro."" Vemos que não há discrepância entre os dicionaristas da língua portuguesa. O "interesse local" não precisa incidir ou compreender, necessariamente, todo o território do Município, mas uma localidade, ou várias localidades, de que se compõe um Município. Foi feliz a expressão usada pela Constituição Federal de 1988. Portanto, pode ser objeto de legislação municipal aquilo que seja da conveniência de um quarteirão, de um bairro, de um subdistrito ou de um distrito. A noção de interesse local não é unívoca. Haverá interesses locais em choque e, muitas vezes, encontraremos o interesse local pelo desenvolvimento econômico não sustentado ou imediatista, em antagonismo com o interesse local, pela conservação do meio ambiente. Celso Bastos,12 José Cretella Júnior,13 Hely Lopes Meirelles,14 dentre outros de nossos publicistas eminentes, manifestam-se no sentido de que o interesse local não se caracteriza pela exclusividade do interesse, mas pela sua predominância. Examinando-se a jurisprudênI i 7. Constituição da República Portuguesa, 2a ed., org. por Calheiros Bomfim, R'° de Janeiro, Editora Destaque, 1993. 8. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, Mirador Internacional/Cia. Me' lhoramentos de São Paulo, 1975, p. 978. 9. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionário da Língua PortuguesCt' 10. Caldas Aulete, Dicionário Contemporâneo do Língua Portuguesa, 1925. 11. Antônio de Moraes Silva, Diccionnário da Língua Portuguesa, 1878. 12. Celso Bastos, "O Município: sua evolução histórica e suas atuais competen cias", Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política 1/54-76. 13. José Cretella Júnior, Comentários à Constituição Brasileira de 1988. 14. Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 365 •„ estrangeira, encontramos julgado do Tribunal Constitucional da c nanha de 2 de fevereiro de 1991 (relator D. Rafael Gómez Ferrer y ivtorant), em que se afirma: "concretizar este interesse em relação a cada matéria não é fácil e, em determinadas ocasiões, só se pode chegar a distribuir a competência sobre a mesma, em função do interesse predominante".15 A União e os Estados também irão legislar com base em seus inte-ses _ interesse nacional ou federal e interesse estadual -, inobstante a divisão de competência entre esses dois entes não tenha expressamente mencionado o termo interesse. Em matéria ambiental, a União irá procurar a vantagem de todo o território nacional ou de ecossistemas específicos (como se menciona no art. 225, § 4Ü, da CF: Floresta Amazônica brasileira, Mata Atlântica, Serra do Mar, Pantanal Mato-Grossense, Zona Costeira) ou de uma ou várias bacias hidrográficas (Lei de Política Agrícola, Lei 8.171/91, art. 20), tanto no que concerne ao exercício da competência privativa, como no exercício da competência para editar normas gerais. Ao procurar a utilidade nacional, não poderá a União prejudicar concretamente o direito dos munícipes à sadia qualidade de vida e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Se tal ocorrer, a disposição federal merecerá ser declarada inconstitucional pelo Poder Judiciário. 4. O Poder Judiciário , e a repartição de competências Acentua, com muita pertinência, o Prof. Luís Roberto Barroso: "A tutela dos interesses ambientais enfatiza certas peculiaridades do federalismo brasileiro, por envolver o exercício de competências político-administrativas comuns e competências legislativas concorrentes entre a União, os Estados e os Municípios. Os balizamentos constitucionais da esfera de atuação de cada entidade nem sempre são objetivamente aferíveis, e caberá ao Judiciário dirimir os conflitos, que se afiguram lnevitáveis".16 , . A. Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasieira a usar a expressão "guarda da Constituição", dizendo que essa 'ssão cabe, precipuamente, ao STF (art. 102, caput). Essa missão, o '-> Luciano Parejo Alfonso, Garantia Institucional y Autonomias Locales. "A Proteção do meio ambiente na Constituição brasileira", in Cadernos de lto Constitucional e Ciência Política 1/115-140. 366 ,<<;•;> DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ;i; mais alto Tribunal do País já a tinha nas anteriores Constituições. Jyja não podemos desprezar a expressão que os constituintes de 1988 qujSe ram inserir. Por mais explícita que fosse uma Constituição, não disperi. saria ela a interpretação dos juizes. Depende, sem dúvida, da fidelidade desses juizes à letra e ao espírito da Constituição a existência do federalismo de coordenação e de cooperação. Com referência às possíveis inconstitucionalidades de leis ou atos normativos municipais, cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão (art. 125, § 2-, da CF). Se o tribunal estadual julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição Federal, caberá recurso extraordinário para o STF (art. 102, III, c), como, também, no caso de entender-se que a decisão contraria dispositivo da Constituição Federal (art. 102, III, a, da CF). De outro lado, se o tribunal dos Estados ou os TRFs contrariem tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência, e/ou julgarem válida lei ou ato de governo local contestado em face da lei federal, poderá ser utilizado o recurso especial perante oSTJ(art. 105, III, da CF). 5. Plebiscito, referendo e iniciativa popular e atuação dos munícipes no meio ambiente Hoje não se discute a necessidade de as pessoas e organizações não governamentais participarem dos procedimentos de tomada de decisão no que diz respeito ao meio ambiente. Os canais antigos de representação e a forma de exercício da atividade da Administração Pública, inclusive municipal, revelaram-se destituídas de eficácia. No Município, contudo, dependendo de sua situação geográfica, sua estrutura social, sua tradição histórica e conjuntura econômica, Vo ocorrer uma grande resistência à participação, principalmente advinda dos chamados "chefes" políticos ou "coronéis". A defesa de interesses mesquinhos na microscopia geopolítica pode ser acirrada ou até exacerbada e, por isso, precisamos socorrer-nos da possibilidade - ainda na° inteiramente estruturada - de exercer o plebiscito, o referendo e a inida' tiva popular para as questões ambientais, como enseja o art. 14,1, H e III, da CF. A promoção da "conscientização pública" (art. 225, § la> da CF) poderá possibilitar o êxito na utilização desses mecanismos d participação pública. ,,,..,,,,,.., ,... .... ;i.,..,., .. ..,.,,..,. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS q Município e a aplicação das legislações federal e estadual ambiental 367 A Constituição Federal foi clara ao atribuir, indistintamente, à União, gstados e ao Distrito Federal a competência para "proteger o meio rnbiente e combater a poluição em qualquer de suas formas" e de "pre-ervar as florestas, a fauna e a flora" (art. 23, VI e VII). Adequado inter-etar-se que> qualquer dos entes públicos mencionados tem competência para aplicar a legislação ambiental, ainda que essa legislação não tenha sido de autoria do ente público que a aplica. Exemplifiquemos: o Município não pode legislar sobre águas, mas pode, e deve, aplicar a legislação federal de águas no ordenamento do território municipal. De outro lado, existem bens ambientais que foram considerados "bens da União" (art. 20 da CF), como, por exemplo, as praias marítimas, as cavidades naturais subterrâneas, os sítios arqueológicos e préhistóricos - que não ficam sujeitos à exclusiva legislação federal. Na utilização desses bens aplica-se o conceito de "bens de uso comum do povo" (art. 225, caput, da CF) e o Município pode estabelecer regras sobre a utilização desses bens federais, como pode tombá-los, ou estabelecer medidas para a proteção dos mencionados bens. Não há competência privativa da União para legislar sobre a maioria dos bens constantes do art. 20 da CF. Dessa forma, a própria União deve sujeitar-se às regras emanadas dela mesma, dos Estados e dos Municípios, conforme os quatro parágrafos do art. 24 e do art. 30,1 e II, ambos da CF. . <- • ü"í 7- A ordem urbanística f 'f !f Estatuto da Cidade cria a expressão "ordem urbanística", que a integrar o conjunto dos valores ou bens a serem defendidos pela civil pública (art. Ia da Lei 7.347/85, com a redação dada pelo art. 3 da Lei 10.257/2001). ao se definiu explicitamente a locução "ordem urbanística". Pare-ãme razoável buscar no § lü do art. ledaLei 10.257/2001 umaorienta- para estabelecer seu conceito. Ordem urbanística é o conjunto de de ordem pública e de interesse social que regulam o uso da bri dade urbana em prol do bem coletivo, da segurança, do equilíambiental e do bem-estar dos cidadãos. na Cj, Ordem urbanística deve significar a institucionalização do justo e- Não é uma "ordem urbanística" como resultado da opressão 368 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ou da ação corruptora de latifundiários ou especuladores imobiliári0s porque aí seria a desordem urbanística gerada pela injustiça. A ordem urbanística há de possibilitar uma nova cidade, em nUe haja alegria de se morar e trabalhar, de se fruir o lazer nos equipamentos comunitários e de se contemplar a paisagem urbana. Para que essa ordem seja factível, entre outros fatores, o nível de emissão sonora precisa, ser adequado e o transporte individual e público deve ser transformado evitando-se a poluição e o estresse dos engarrafamentos. Os grupos sociais e o Ministério Público poderão socorrer-se da ação cautelar para instaurar ou restaurar a ordem urbanística, como lhes faculta o art. 54 da Lei 10.257/2001, que deu nova redação ao art. 4a da Lei 7.347/85. Ao lado da retidão e zelo dos funcionários municipais, a sensibilidade, rapidez e firmeza das decisões dos juizes e tribunais exercerão papel pedagógico eficaz na existência coletiva e individual dos habitantes das cidades. í 8. Procedimentos administrativos e intervenção do Município •. 8.1 Plano diretor e Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) 8.1.1 Conceito do plano diretor e sua influência Plano diretor é um conjunto de normas obrigatórias, elaborado por lei municipal específica, integrando o processo de planejamento municipal, que regula as atividades e os empreendimentos do próprio Poder Público Municipal e das pessoas físicas ou jurídicas, de Direito Privado ou Público, a serem levados a efeito no território municipal. O plano diretor tem uma previsão no art. 182 Constituição Federal-Assim, há um conceito mínimo aí previsto. A existência de planejamento obrigatório é imprescindível para que haja uma ordenação do cresci' mento e da transformação da cidade e do campo. O plano não pode tudo conter e tudo prever, atrofiando toda a capacidade criadora dos munícipeSi mas, de outro lado, a liberdade de iniciativa não deve levar à anarquia que contraria a função social da cidade e torna o indivíduo uma ilhaA Lei 10.257/2001 diz que o plano diretor é "o instrumento básic° da política de desenvolvimento e de expansão urbana" (art. 40). O plano diretor tem prioridade sobre outros planos existentes n Município ou que possam vir a ser instituídos. O termo "diretor" teI dimensão jurídica considerável, pois é um plano criado pela lei Pa MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 369 • jr e para fazer com que as outras leis municipais, decretos e portaanteriores ou posteriores tenham que se ajustar ao plano diretor. O °1ano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual deP incorporar as diretrizes e as prioridades contidas no plano diretor (art. 40, § 12' da Lei 10.257/2001). g i 2 Plano diretor municipal, e não plano diretor urbanístico fíii;fi A Lei 10.257/2001 prevê que "o plano diretor deverá englobar o território do Município como um todo" (§ 2Ü do art. 40). A redação desse parágrafo não diz expressamente que o plano diretor deve abranger ao mesmo tempo a parte urbana e a parte rural, mas está subentendida tal diretriz. Não me parece que a lei tenha sido inconstitucional nesse ponto, pois a norma geral federal tentou indicar meios de se implementar a função social não só da propriedade urbana, como também da propriedade rural. Vejo como uma carência criticável a omissão do Município em se ocupar do planejamento rural de seu território de forma entrelaçada com o plano urbano. Basta refletir-se na necessidade de integrar a moradia de trabalhadores rurais nas zonas urbanas e suburbanas e suas atividades na zona rural; a localização de aterros sanitários para os rejeitos domiciliares; a necessidade da proteção dos mananciais de abastecimento hídrico. Ocorre, contudo, que a estrutura da Lei 10.257/2001 não foi concebida para fazer essa integração "cidade/campo". Desde a denominação da lei - "Estatuto da Cidade" - e até nos títulos do Capítulo II "Dos Instrumentos da Política Urbana" - e do Capítulo IV - "Da Gestão Democrática da Cidade -, como nos próprios conteúdos, constata-se que não sera fácil elaborar um plano diretor integrado, principalmente nos Muni-clPios com a zona rural de grande porte. •3 Conteúdo mínimo do plano diretor >.s <:;.,; , . ,< ;.,, .-;,-*,; >> -,:> r. co A Lei 10.257/2001 diz, em seu art. 42: "O plano diretor deverá a ,. er no mínimo: I - a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser rad ° ° Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, conside-f0 a existência de infra-estrutura e de demanda para a utilização, na 29 art- 52 desta Lei; II - disposições requeridas pelos arts. 25, 28, n C 35 esta Le'; ~ sistema de acompanhamento e controle". ge a a í1 and°-se os artigos mencionados pelo art. 42, vemos que se exi-aljse, no plano diretor, do parcelamento, edificação ou utilização 370 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO compulsórios, o exercício do direito de preempção, a outorga oneroSa do direito de construir, as operações urbanas consorciadas e a transfere cia do direito de construir. Inegavelmente, os institutos jurídicos aludi, dos merecem ser avaliados no plano diretor municipal. Mas a lei federal, ao colocar somente esse conteúdo mínimo, é muito limitada e deixa muito a desejar. Os Municípios deverão acrescentar outras exigências. Contudo, a norma geral federal perdeu uma chance de abrir um leque de pontos básicos para serem examinados em todos os Municípios, principalmente na parte ambiental. E as necessidades ambientais estão visualizadas nas diretrizes gerais do Capítulo I da Lei 10.257/2001. ...... .,, 8.1.4 Diretrizes ambientais, plano diretor • ...'.'.'.['[.[.','.'" ' e plano da bacia hidrográfica .... ' A propriedade urbana e a cidade têm funções sociais, e estas funções serão cumpridas pela política urbana quando, no que diz respeito ao meio ambiente, se observarem as diretrizes gerais de: 1) garantir-se o direito ao saneamento ambiental; 2) realizar-se o planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente; 3) ordenar-se e controlar-se o uso do solo, de forma a evitar a poluição e a degradação ambiental; 4) adotarem-se padrões de produção e consumo de bens e serviços compatíveis com os limites da susten-tabilidade ambiental do Município; 5) proteger-se, preservar-se e recuperar-se o meio ambiente natural e construído e o patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico (art. 2Ü, I, IV, VI, VIU e XII, da Lei 10.257/2001). Ao se elaborar o plano diretor, providências específicas deverão ser inseridas sobre cada um dos aspectos mencionados acima. O Município não planejará olhando somente para sua realidade política, social e econômica, mas haverá de ter em conta o ecossistema em que está inserido, principalmente a bacia e sub-bacia hidrográfica de que faz parte. Seria uma aberração jurídica e ecológica deixar o pla' no diretor municipal de se adaptar às diretrizes do plano da bacia hidrO' gráfica. O Município, como membro do Comitê da Bacia Hidrográfica tem sua oportunidade de opinar e votar para a elaboração do plano da bacia hidrográfica. Portanto, o plano diretor e o plano da bacia hidr°' gráfica vão interagir-se e completar-se. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS 371 i 5 Obrigatoriedade do plano diretor A Lei 10.257/2001 diz, em seu art. 41: "O plano diretor é obrigató-•0 para cidades: I - com mais de 20 mil habitantes; II - integrantes de j5es metropolitanas e aglomerações urbanas; III - onde o Poder Públi-0 Municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4B do art. 182 da Constituição Federal; IV integrantes de áreas de especial interesse turístico; V - inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional". A presença de impacto ambiental regional ou nacional vai indicar a necessidade da intervenção do iBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.17 Razoável entender-se que a previsão acima mencionada no art. 41, V, preenche as finalidades do art. 182, caput, da Constituição Federal. A Lei 10.257/2001, ainda que não existisse o art. 182 referido, elaborou as normas do Estatuto da Cidade com fundamento no art. 24, I, que outorga competência à União para legislar sobre Direito Urbanístico. Dessa forma, a norma geral federal não feriu a autonomia municipal ao incluir os incs. IV e V do art. 41, pois procurou exigir a realização do plano diretor em áreas especiais, tanto no aspecto turístico como no aspecto ambiental.18 Exigir que haja plano diretor não significa que a lei federal tenha indicado todos os posicionamentos a tomar, pois estes permanecem na alçada dos Municípios. O art. 41 simplesmente faz com que não se deixe de utilizar um instrumento que, bem elaborado, será altamente proveitoso para as comunidades municipais. Como exemplos de empreendimentos com significativo impacto ambiental de âmbito regional (inc. V do art. 41) temos as hidroelétricas e as termoelétricas, os depósitos de rejeitos radioativos, os depósitos regionais de rejeitos industriais, as usinas com reator nuclear. No caso dos empreendimentos e atividades que causem ou possam causar impacto ambiental o empreendedor deverá evitar e prevenir os mPactos negativos. Contudo, ocorrendo os impactos, deverá ser efetuada ,ma COrripensação financeira por parte do empreendedor. Diferentemente a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação,19 a Lei 10.257/ "Li : v- Tít. IV, "Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente", Cap. V, enciamemo ambiental", item 3.3. ÍO257 ; mesmo sentido, Toshio Mukai, O Estatuto da Cidade. Anotações à Lei n. •™ 10-7-2001, São Paulo, Saraiva, 2001. Cap jj ' " Tft- X, "Sistema Nacional de Gerenciamento de Unidades de Conservação", spectos jurídicos relativos às unidades de conservação", item 2. 372 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO k. 2001 não se alargou na matéria, dizendo somente que "os recursos técni cos e financeiros para a elaboração do plano diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas" (art. 41, § l2). O empreendedor fica obrigado a contribuir com recursos técnicos e financeiros para a elaboração do plano diretor. Diga-se, brevemente, que o empreendedor não será o elaborador do plano diretor e que o pagamento que for destinado à preparação do plano diretor não elimina e nem minimiza o dever de compensar os danos ambientais. Os recursos referidos estão inseridos entre "as medidas de compensação", não se transformando em uma única medida de compensação. 8.2 Declaração de Impacto Ambiental ' > e Estudo Prévio de Impacto Ambiental '•> — Procedimentos de prevenção do dano ambiental 8.2.1 Declaração de Impacto Ambiental 'll A Lei 848/92, dispôs no Município de São Sebastião-SP/Brasil sobre sua Política Ambiental.20 A lei está dividida em 10 capítulos. O Cap. III trata da "Declaração de Impacto Ambiental", que passo a transcrever: "Art. A-. Nos casos em que não houver perigo e/ou probabilidade de ocorrer significativa degradação do meio ambiente, quem pretender a concessão de autorização emanada do Poder Público Municipal, apresentará Declaração de Impacto Ambiental que, entre outros dados, conterá: "I - análise dos impactos ambientais do projeto: impactos positivos e negativos; impactos diretos e indiretos; impactos imediatos, a médio e longo prazo; distribuição dos ônus e benefícios sociais do projeto; "II - especificação das medidas destinadas a reduzir os impactos negativos, inclusive, se necessário, o tipo, o número e qualidade dos equipamentos de controle e sistemas de tratamento de dejetos, com avaliação da eficiência de cada uma delas, assim como o cronograma de implantação e funcionamento dos equipamentos e sistemas. "§ lü. A Declaração de Impacto Ambiental poderá ser elaborada pelo próprio requerente da autorização, ou por profissional por ele escolhido e que ficará co-responsável pela declaração. "§ 2". A Declaração de Impacto Ambiental ficará à disposição d° público por 30 dias, podendo qualquer pessoa fazer observações escri 20. Elaborei o anteprojeto de lei, com a colaboração do sociólogo ícaro AronoV da Cunha, por solicitação do Prefeito Municipal Paulo Roberto Julião dos Santos-anteprojeto de lei transformou-se na Lei 848/92, com algumas modificações. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 373 s perante o órgão responsável, sendo que as observações deverão ne-ceSsariamente constar do procedimento administrativo de autorização, sob pena e anulação do ato administrativo. "§ 32. Nos casos de parcelamento do solo, além das exigências contidas na legislação federal, estadual e municipal, a Declaração de Impacto Ambiental analisará, também, a qualidade dos terrenos, sob os aspectos de serem alagadiços, sujeitos a inundação, tenham sido aterrados, a declividade, a existência de mata primitiva, as condições geológicas e a vizinhança com áreas onde a poluição impeça condições sanitárias adequadas de vida. "§ 4a. A tipificação dos empreendimentos que se enquadram nesse artigo e o roteiro da Declaração de Impacto Ambiental serão definidos por decreto." Saliento a possibilidade de consulta do procedimento por qualquer pessoa, seja ou não cidadão. Fixou-se um prazo de 30 dias, que não poderá ser mudado pela Administração, a não ser para dilatá-lo, isto é, facilitar a consulta. As observações escritas que forem feitas durante a consulta deverão constar do procedimento, sob pena de anulação do ato administrativo. Ainda que se tenha deixado para regulamentação posterior a tipificação dos empreendimentos, já ficou constando a obrigação para qualquer parcelamento do solo (urbano ou rural), com exigências específicas. O interesse e a fiscalização dos Municípios darão, ou não, vitalidade a esse novo instituto jurídico. 8-2.2 Estudo Prévio de Impacto Ambiental ' ''-' '.", . Avaliar se uma obra, ou uma atividade, poderá causar dano ao homem e ao meio ambiente é um procedimento administrativo, que deve-ria ter sido adotado há muito tempo. Infelizmente, sem embargo de es-tar esse instituto na legislação brasileira desde 1980, sua prática só é recente. Não iremos aqui analisar os fundamentos desse instituto. , Analisar previamente a possibilidade de ocorrer um dano signifi-P'kr° ara ° me'° ambiente deixou de ser uma faculdade para o Poder co' aPós a Constituição Federal de 1988. Se houver necessidade f autor'zaÇao> ou uma licença, do Poder Público, e houver proba- le de prejuízo significativo de degradação ambiental, inafastável evd Prévio de Impacto Ambiental-EPiA. Importa salientar que esse w é ?ara ° Poder Público que licencia ou autoriza. Portanto, se o ClPio autorizar e/ou licenciar uma obra, ou uma atividade, que possa 374 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO provocar dano significativo ao meio ambiente, está obrigado a instaura o procedimento do epia, sob pena de nulidade da autorização ou da ij_ cença. Não há como transferir responsabilidades administrativas. A Constituição Federal fez bem em não atribuir a qualquer dos três níveis de governo a responsabilidade pelo epia. O Poder Público que quiser ou for obrigado a intervir, tem o dever de buscar a prevenção. Os Municípios terão a liberdade de aceitar o epia realizado pela União ou pelo Estado. Essa aceitação poderá ser total ou parcial, o Município poderá designar outros peritos ou consultores para estudar o projeto, como poderá promover audiência pública. Importa acentuar que o Município brasileiro está em atraso com a legislação ambiental, pois poucos introduziram esse instituto em suas legislações. 8.3 Autorização ambiental municipal: publicidade e auditoria 8.3.1 Autorização e licença Utilizando a expressão "autorização ambiental" não estou preconizando a abolição do termo "licença". Entretanto, este conceito merece ser empregado, quando o direito invocado pelo requerente for pré-constituído e for vinculado para a Administração. Sendo o caso de apreciação discricionária pela Administração, correto será empregar-se o conceito de "autorização". Salienta o culto Juiz Vladimir Passos de Freitas que "o termo licença, certamente, não é o mais apropriado, pois pressupõe ato administrativo definitivo e, pelo menos, para a licença prévia, o ato é precário".21 Seria ótimo, mas não totalmente factível, que as regras ambientais fossem vinculadas, isto é, que os direitos dos requerentes estivessem claramente explicitados e que não houvesse margem de opção para a Administração. Dessa forma, tentar-se-ia diminuir a corrupção e a omissão administrativa. Contudo, também, haveria o perigo de uma imobili' zação de legislação diante das inovações científicas ou das abruptas modificações do meio ambiente. 8.3.2 Publicidade e auditoria ' " Salientamos dois componentes interessantes para a eficácia da autorização ambiental: publicidade e auditoria. 21. Vladimir Passos de Freitas, Direito Administrativo e Meio Ambiente. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 375 a publicidade irá permitir aos munícipes informar-se para podefíscalizar. Por isso, na lei do Município de São Sebastião consta: !tc toda atividade e/ou obra autorizada pelo Município deverá ser per«entemente exigida placa, de grande visibilidade, contendo número T nrocesso, data da autorização e, quando houver, as condições para em observadas". "Os pedidos de autorização, sua renovação e a resS ctiva concessão serão publicados onde as publicações oficiais forem feitas" (art. 3«, §§ Ia e 2«). A auditoria irá servir para monitorar o cumprimento e a eficácia da autorização. Na lei do Município de São Sebastião constou: "Para os efeitos do § 6Ü, o órgão ambiental municipal poderá requisitar a cada dois anos, no mínimo, a realização de auditoria, por conta do beneficiário da autorização, no cumprimento do art. 153, XIV, da Lei Orgânica do Município" (art. 3", § 7"). O Código do Meio Ambiente do Município de Paulínia (Lei 1.897, de 31.1.1995)22 preceitua no art. 16, § 32: "A auditoria deverá analisar: I - os níveis efetivos ou potenciais de poluição ou degradação ambiental provocadas por atividades de pessoas físicas ou jurídicas; II - as condições de operação e de manutenção dos equipamentos e sistemas de controle da poluição; III - as medidas a serem tomadas para restaurar o meio ambiente e proteger a saúde humana e a biota; IV - a capacitação dos responsáveis pela operação e manutenção dos sistemas, rotinas, instalações e equipamentos de proteção ao meio ambiente e à saúde do trabalhador". Previu-se, também, que "no caso de negligência, imperí-cia, imprudência, inexatidão, falsidade ou dolo na realização da auditoria, o auditor ficará proibido de exercer sua função no Município". 8-3.3 Competência estadual ambiental e invasão da competência municipal ,, i O art. 23, VI e VII, da CF diz que é competência comum da União, Os Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, proteger o meio ler>te e combater a poluição em qualquer de suas formas, preservar as florestas, a fauna e a flora. Pode-se enfocar a proteção do meio ambiente por dois aspectos: o I Çct0 daelaboração das normas (art. 24, V, VI, VII, VIII e § Ia; art. 25, ' e art. 30,1 e II, todos da CF) e o aspecto da execução dessas nor-s conforme o art. 23 mencionado. sentanH Semanário Oficial, 3.3.1995. O autor colaborou como consultor jurídico, apte-iao o anteprojeto de lei. i 376 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO A Constituição Federal de 1988 pronunciou-se, também, sobre autonomia recíproca da União, dos Estados, do Distrito Federal e do Municípios, dizendo expressamente que esses entes são "autônom0s nos termos desta Constituição" (art. 18). O tema da autonomia municipal foi tratado expressamente por todas as Constituições republicanas do Brasil: art. 15 da EC 1/69; art. 16 da CF/67; art. 28 da CF/46; art. 26 da CF/37; art. 13 da CF/34; e art. 68 da CF/1891. Essas Constituições indicam uma das formas da concretização da autonomia - a organização dos serviços municipais. A Constituição do Império (1824), ainda que não fizesse constar a palavra "autonomia", indicava que "o exercício de suas funções municipais, formação das suas posturas policiais, aplicação de suas rendas, e todas as suas particulares e úteis atribuições serão decretadas por uma lei regulamentar" (art. 169). O acatado jurista Pimenta Bueno, comentando o Direito anterior à República, em sua obra Direito Público Brasileiro, já assinalava que "a população de cada Cidade, Vila ou Município forma, pela natureza das coisas, uma sociedade especial, uma existência particular e própria, uma unidade, uma agregação de indivíduos que faz, sim, parte do Estado, mas que tem seus direitos próprios, suas idéias comuns, suas necessidades análogas e seus interesses idênticos, que demandam regulamentos apropriados à sua índole e especialidades".23 O vocábulo "autonomia" é conceituado como: "1. Faculdade de se governar por si mesmo. 2. Direito ou faculdade de se reger (uma nação) por leis próprias. 3. Liberdade ou independência moral ou intelectual". "Liberte de se gouverner par ses propes lois."25 "1. The condition or quality of being self-governing. 2. Self-government, or the right of self-govern-ment; self-determination; independence."26 A autonomia preconizada pelo referido art. 18 da CF merece ser interpretada no contexto de todos os artigos que tratam da competência-Interessa-nos ver que, com referência ao Município e o meio ambiente, certamente encontraremos normas federais ou estaduais em vigor antes das municipais, devendo estas adaptarem-se àquelas, no sentido de suplementá-las, conforme o art. 30, II, da CF. Áreas de atuação existem, contudo, em que o "interesse local" telTl nítida predominância, por exemplo: autorizar e/ou licenciar a constrü' 23. Pimenta Bueno, Direito Público Brasileiro, p. 316. . ,. ' 24. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Dicionário cit. 25. Petit Larousse Illustré, Paris, Librairie Larousse, 1978. 26. The American Heritage Dictionary ofthe English Language, American Publishing Co., 1970. -,.-.': MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS 377 'o de casas para residências unifamiliares ou multifamiliares, ou apartaÇ tos; autorizar a construção e/ou localização de casas comerciais e/ supermercados; decidir sobre o traçado e a construção de vias públi° s e sobre espaços verdes e/ou praças. Se os Estados, sem outra motiacão comprovada, criassem normas exigindo, também, autorização e/ licenciamento estadual dessas obras, claro está que haveria invasão da competência municipal. Essa quebra da autonomia municipal consistiria em que os Estados, ao duplicar o licenciamento dessas atividades e/ou obras, estariam esvaziando a ação municipal, pois, o licenciamento ambiental estadual, na prática, passaria a ser uma instância executiva superior ou revisora dos atos municipais. Ademais, não se exclua a hipótese de que nos Estados, cujos governos fosse, por exemplo, dirigidos por grupos políticos ou partidários diferentes ou antagônicos dos de um determinado Município, esses Estados poderiam bloquear ou procrastinar todo o licenciamento ou sistema de autorizações municipais. A matéria não é destituída de dificuldades, dada a interpenetração dos interesses estadual e municipal. Suponha-se que ao pretender construir uma via pública, o Município interfira numa área de preservação permanente (por exemplo, a área vocacionada para ter vegetação nas margens dos cursos d'água - art. 2Ü do Código Florestal). Evidentemente, não se aplica somente a legislação municipal para a localização e construção dessa via pública. O mesmo se pode dizer da localização, construção e alteração das praças, mormente se houver árvores declaradas imunes de corte ou apontadas como ameaçadas de extinção. ., ( 8.3.4 Invasão da competência estadual ambiental pelo Município ,. O Juiz Álvaro Luiz Valery Mirra - Mestre em Direito Ambiental Pela Universidade de Estrasburgo -, com a sua habitual precisão jurídica, acentua que "é bastante freqüente, na prática, que os Municípios, ao egislarem em tema de meio ambiente, procurem diminuir o rigor do gislador federal ou estadual e, com isso, ampliar ou facilitar o exercí0 de atividades potencialmente degradadoras do meio ambiente em s territórios, sem o devido respeito às restrições já anteriormente m a ,e!ecidas pelas normas da União e dos Estados. Tais iniciativas das um11C1Paades, porém, devem ser impugnadas por contrariarem os q es constitucionais da competência legislativa dos Municípios".27 de pltlUa ° art'culista relatando o caso concreto ocorrido no Município radópolis, tendo este Município disciplinado a queima da cana-dearnbieritVÍrvaro L-v- Mirra, "Limites e controle dos atos do Poder Público em matéria al ' m Ação Civil Pública, org. Edis Milaré, pp. 28-61. - <— 378 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO açúcar, inserindo disposições menos severas em relação ao previsto legislação estadual. O TJSP julgou inconstitucional a referida lei cipalnaADIn 17.747-0.28 8.4 Sanção municipal ambiental O Município pode criar, através de lei, tipos de infrações ambientais para as quais sejam previstas sanções administrativas. Entre as sanções' conforme a gravidade do caso, seria eficaz prever: multas diárias; arresto e/ou apreensão de produtos, utensílios ou materiais; interdição temporária ou definitiva de estabelecimento; demolição de obras; suspensão e/ou cassação da autorização; imposição da obrigação de fazer ou não fazer, mediante multas diárias para induzir o infrator a mudar o comportamento. O Município, como o Estado, não pode instituir crimes e contravenções, pois essa matéria é da competência legislativa reservada para a União (art. 22,1, da CF). Acentue-se que, assim, os regulamentos municipais não irão fazer parte da tipificação das normas penais em branco, somente tendo incidência, nesse caso, as normas da União. A criação de um "fundo ambiental municipal" possibilitaria o recebimento e a aplicação de recursos especificamente voltados para a recuperação do meio ambiente. O fato de a Lei 7.347/85 ter criado, em seu art. 13, dois fundos (federal e estadual), não impossibilita o Município de criar um fundo para o qual se destinem as multas administrativas (não judiciais) resultantes de penalidades impostas por infrações ambientais. Na dúvida acerca da legalidade da aplicação da sanção, o Município pode utilizar a ação civil pública, quando pretender impor o cumpri' mento da obrigação de fazer ou de não fazer ou a condenação em dinheiro, visando à restauração do dano. Contudo, diante do princípio da executoriedade, o Município tem o direito de aplicar as sanções administrativas, independentemente de decisão judicial. 9. Município e aspectos setoriais do meio ambiente 9.1 Águas /. ,. -jf-, • ..Compete privativamente à União legislar sobre águas (art. 22.1 ' da CF). A primeira vista, ficaria o Município totalmente excluído " 28. Rei. Des. César de Moraes, j. 15.9.1993, .x.,JTJ-Lex 155/253-268. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS 379 'nus de tratar da conservação das águas e da tarefa de tomar medidas 111 a evitar a poluição dos recursos hídricos. Não se pode, contudo, esquecer que a quantidade e a qualidade das ' uas dos rios, ribeirões, riachos, lagos e represas, vão depender da anlementação da política ambiental e da legislação existentes, com 1 ferência, notadamente, ao ordenamento do território do Município. Os efluentes domésticos e industriais são matéria de inegável interesse local. Assim, o Município pode suplementar, mais restritivamente, as normas de emissão federais e estaduais como, também, poderá ter norma autônoma, desde que comprove o interesse local e estejam, a União e o Estado, inertes no campo normativo. Não pode, entretanto, o Município legislar explicitamente sobre o volume dos recursos hídricos e/ou classificação das águas, pois nesse caso estaria invadindo a competência privativa da União. O consórcio de Municípios de uma mesma bacia hidrográfica merece ser incentivado. Entretanto, fica na dependência da vontade de cada Município. Para ser obrigatória a integração de todos os Municípios de uma bacia hidrográfica, ou de uma microbacia, parece-me haver necessidade de expressa previsão na Constituição Federal. A criação de um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos (art. 21, XIX, da CF) não explicita a obrigação para os Municípios de constituir um organismo integrado. De outro lado, é de ser ressaltado que os Municípios têm interesse em consorciar-se ou participar dos Comitês de Bacia Hidrográfica, pois, com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, deverá haver um repasse de verbas para obras de despoluição e contra as secas. Um sistema integrado poderá chegar à administração conjunta °s recursos hídricos, de tal forma que os Municípios que estejam a jusante, ou "águas abaixo", no curso de um rio, poderão co-decidir da 'plantação de obra ou do exercício de atividade potencialmente polui-ra ern localidade situada a montante, ou "águas acima". z~ 7*s Municípios precisam levar em conta, ao longo dos anos, a va-os cursos de água que existam em seus territórios, fazendo o pla-dad mento ordenado de suas atividades e assegurando-se da possibili-fütlje e captação para o abastecimento público e da capacidade atual e Pon í - diluição dos efluentes nos corpos de água. O adensamento das sider aÇ°es urbanas a montante nos cursos de água pode prejudicar con-s'dad enteoconsurno das populações a jusante. Em caso de neces-não h e racionamento hídrico em uma bacia ou sub-bacia hidrográfica, Para 0 !Ve' amda, a edição de normas federais ou estaduais adequadas rriento hnar a cstribuiÇã° de águas para o consumo humano e o sanea-as'co, de forma que possa ser satisfeito o consumo prioritário e 380 >!'.] DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO s,Mr)i/ legal (art. l2 da Lei 9.433/97) das populações de todès!©&Municípj0 dessa bacia hidrográfica. «;,•;?. ; 9.2 Agrotóxicos t;.f>h A Lei federal 7.802/89 tratou da matéria introduzindo um sistema de registro de agrotóxicos e seus componentes, dependente de uma autorização conjunta do Ministério da Agricultura, do Ministério da Saúde e do Ministério do Meio Ambiente. Indaga-se: poderá o Município proibir agrotóxico registrado pelos órgãos federais? O Município tem o direito de procurar averiguar se a autorização federal ocorreu com a estrita observância da própria legislação federal. Não tendo sido cumpridas as exigências da própria legislação federal, o Município pode pedir, administrativamente, a anulação do registro ou, através de ação civil pública, solicitar a concessão e medida liminar de "não fazer", ou promover ação cautelar, com finalidade de impedir, judicialmente, a venda ou aplicação de um determinado agrotóxico em seu território. Outra possibilidade de intervenção do Município está em avaliar as suas condições locais, isto é, o levantamento e a análise da peculiaridade do interesse local. Suponha-se que a cultura agrícola (hortícola, frutífera ou, até, florística, como no Município de Holambra/SP) tenha uma determinada característica que obrigue a adoção de um sistema de proteção ambiental especial. Nesse caso, não seria desarrazoável que uma norma municipal fosse instituída. As normas municipais de zoneamento, de outro lado, devem preocupar-se com a localização dos estabelecimentos que produzam, armazenem, distribuam, vendam ou façam o destino final de agrotóxicos e seus componentes. Um criterioso zoneamento evitará a proximidade desses estabelecimentos de mananciais de água, de hospitais, escolas, casas geriátricas, zonas residenciais e áreas protegidas (parques, jar' dins).29 O Município poderá, também, disciplinar a aplicação de agrotóxic°s e seus componentes nas vias públicas, nos logradouros públicos e prédios afetados ao domínio público municipal. 29. O STJ, no julgamento do RE 29.299-6-RS (PT., rei. Min. Demócrito Reinald<£ j. 28.9.1994, v.u., DJU 10.10.1994), manteve a segurança concedida à empresa Vitav Thyran PM Uniroyal contra ato do Município de Porto Alegre/RS. O Município de' f, to Alegre, pelo Decreto 9.731, de 11.6.1990, proibira o usoeo armazenamento de d' sos princípios ativos de agrotóxicos. O julgado referiu-se expressamente ao posl namento exarado pelo autor (RT 719/269). '.<.nj.,'!.>t ,.,m ,-..,; ...j ,,.,.. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 381 ç 3 Áreas verdes e praças ,', .;;,« O Município está obrigado a zelar pelas áreas verdes e praças que • tituir. jvfíío pode desvirtuar as funções fundamentais desses espaços úblicos de "uso comum do povo". Dessa forma, o Município não pode alienar, doar, dar em comodato, emprestar a particulares ou a entes públicos as áreas verdes e as praças. Esses espaços públicos não podem sofrer alterações que descaracterizem suas finalidades precípuas, que visam o lazer e a saúde da população. Assim, contrariam as finalidades públicas primárias desses espaços a construção de estacionamentos de veículos, autorizações para implantação de bancas de jornais, cabinas telefônicas e bares, ou a autorização de painéis ou de "parques de diversões", mesmo que em caráter temporário. O fechamento desses espaços públicos, com a colocação de grades e de portões, não poderá ser de forma a impedir a freqüência diária da população. Em caso de manifesta necessidade de cobrança de ingressos em espaços públicos, parece-me que o Poder Judiciário pode entrar na análise da adequação dos preços, frente às possibilidades de acesso dos segmentos sociais de baixa renda, evitando o desvio de poder - uma forma de arbitrariedade. A poda de árvores existentes em espaços públicos (praças, áreas verdes, ruas etc.) não pode ser feita imotivadamente, pois a utilização desses bens só pode ser feita de modo que não se "comprometa a integndade dos atributos que justifiquem sua proteção" (art. 225, § le, III, egunda parte, da CF). A ação civil pública ou a ação popular podem ser s rurnentos úteis para tentar-se impedir abusos. Destarte, o corte de Ores, ainda que com objetivo de substituí-las por outras, desde que Possibilidade de significativa degradação do meio ambiente, exige est a 'Za(° e Estudo Prévio de Impacto Ambiental, ainda que não coNJa expressamente arrolada tal hipótese no art. 2Ü da Resolução 1/86-A> ou que não esteja prevista na legislação municipal. lOcai- ra.a cor|servação de uma determinada árvore, por motivo de sua aPlicaH a°' rarate' beleza ou condição de porta-sementes merece ser referido° ° art- 7Ü do Código Florestal (Lei federal 4.771/65). O artigo ato do p jZ C'Ue a "declaração de imune de corte" será feita mediante injCj er Público. O ato, portanto, po O njCj portanto, pode ser um decreto do Prefeito cias est Ou Uma lei votada pela Câmara Municipal ou, até, das instân-Ual ou federal, conforme o grau de interesse. 382 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ; . ü ' 9.4 Atmosfera •v.-A poluição do ar é um campo em que, normalmente, o Municínj0 vincula-se às normas instituídas pela União e pelos Estados. Poderá suplementar essas normas, de forma mais restritiva. Inexistindo regras federais e estaduais, visando o interesse loca], 0 Município pode criar regras sobre a poluição atmosférica. O zoneamento municipal terá a possibilidade de praticar uma política preventiva e/ou restauradora em matéria de poluentes atmosféricos De outro lado, na execução das normas, através de um eficiente sistema de autorização e de fiscalização, é que o Município impedirá a agressão à saúde de seus munícipes cometida através da poluição do ar. Certamente haverá pressões - às vezes enquistadas nos próprios poderes municipais - contra uma política de saúde ambiental, mas esta poderá ser obtida pela perseverante exigência da sociedade civil, do Ministério Público e do Poder Judiciário. 9.5 Cultura — Proteção de bens e valores culturais ' nün através do tombamento "-:' A Constituição Federal dá como uma das competências do Município (art. 30, IX) "promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual". O Município não pode deixar a proteção dos bens e valores históricos e culturais sediados em seu território somente para a ação federal e estadual. Muitas vezes, o Município poderá estar diante de uma grave carência de recursos financeiros para implementar uma ação fiscalizadora. Nem por isso, fica dispensado de legislar, quando se trate de proteger o patrimônio histórico-cultural de interesse predominantemente local. Há diversas formas de proteção do patrimônio histórico-cultural, entre as quais destacamos o tombamento. É importante que o Município disponha de uma legislação própoa em matéria de proteção cultural, inclusive de tombamento. Dessa far" ma, se houver desídia da União ou dos Estados, ou houver diferença entendimentos entre as formas e métodos de conservação do referi10 patrimônio, o Município poderá implementar a sua própria legislaÇa j de proteção. 9.6 Fauna e zoológicos municipais '•'*' A Lei 5.197/67 conceitua fauna silvestre, isto é, não domestica como "propriedade do Estado". Poderíamos ser conduzidos a pen MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 383 a fauna silvestre constitua domínio público federal e que, como tal, Heria ser objeto de apropriação e de disposição, como outros bens 'blicos. Esse raciocínio seria equivocado, pois temos que enfocar a f una como integrando o meio ambiente e, assim, conceituada como "bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida", orno consta do art. 225, caput, da CF. Essa noção de "propriedade do Fstado" surgiu para evitar-se conceituar a fauna silvestre como "coisa de ninguém" ou acessória do solo em que estivesse e, portanto, acessória da propriedade privada em que a fauna fosse encontrada. As normas gerais federais sobre fauna podem ser suplementadas pelas normas municipais, de forma a seguir a finalidade das regras federais, acrescentando-se exigências, mas em nenhum caso podendo abrandá-las. O Município está sujeito a respeitar os "pousos das aves de arriba-ção protegidas por convênios, acordos ou tratados assinados pelo Brasil com outras nações" (art. 18, caput, da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, Lei 6.938/81), que constituem reservas ou estações ecológicas sob responsabilidade do ibama. Não é preciso que essas áreas sejam desapropriadas pela União. Há uma limitação ao direito de propriedade, pela força da lei, do domínio privado ou do domínio público do Município. O interesse local - induvidosamente comprovado - poderá fazer com que o Município restrinja a caça, que tenha sido autorizada pela União ou pelos Estados. A criação e a manutenção de um jardim zoológico por um MunicíPio sujeita-se à Lei 7.173, de 14.12.1983. O Poder Público Federal, isto e, o iBAMA-Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais enováveis, tem a atribuição de registrar o jardim zoológico. As dimen°es dos referidos jardins e suas instalações deverão atender aos interesses s espécies existentes, ou a serem introduzidas, e à proteção e conforto ao Público visitante. ? , registro "representa uma licença de funcionamento para jardim esse ÍC°" <-art" 5ü> Parágrafo únic0' da Lei 7.173/83). Mas, para efetuar ex e§istro, o ibama tem que inspecionar cada alojamento e, então ntj lr ° "habite-se" (art. 8a), não podendo cada alojamento comportar °rni ~° ma'or d° <iüe aquele estabelecido (art. 9a). Ressalte-se, que a crjmSao d° servidor público federal e municipal poderá caracterizar o quaild art 15> § 2fl, da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, dois ° resultar dano irreversível à fauna, sendo cominada a pena de seu artS£:ls anos de reclusão. A Lei da Fauna, Lei 5.197, de 3.1.1967, em 0 diz que as penalidades incidirão sobre os autores, sejam eles: I 384 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO "c) autoridades que por ação ou omissão consentirem na prática do ilegal, ou que cometerem abusos de poder". ° O visitante, ou qualquer outra pessoa, que utilizar, perseguir, de truir, caçar ou apanhar espécime da fauna silvestre em jardim zoológj comete crime punido com a pena de um a três anos de reclusão (art ir? i, c/c o art. 27, § Ia, ambos da Lei 5.197/67, com aredação dadape]aiP: 7.653, de 12.2.1988). Como se vê, o jardim zoológico não é um depósito de animais nara satisfazer a mera curiosidade dos visitantes. Por isso mesmo, a Lei 7.173/ 83, referida, exige a "assistência profissional permanente de, no mjnj. mo, um médico-veterinário e um biologista" ou biólogo (art. 10). Se os animais não receberem tratamento, alojamento e alimentação adequados, os legitimados para a ação civil pública podem - e entre eles o Ministério Público deve - pleitear o cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer. 9.7 Flora Na Constituição anterior à de 1988, a competência para a legislação florestal era exclusiva da União. Mesmo àquela época, o Município tinha competência para legislar sobre a flora urbana. Atualmente, com a Constituição Federal em vigor, pacífica é a competência municipal para legislar sobre a flora como um todo e, portanto, especificamente sobre legislação florestal. Essa legislação, contudo, obedece ao sistema já anunciado, isto é, o Município deve seguir as normas gerais da União. Constatado o interesse local, o Município tem o direito de legislar sobre a flora, mesmo quando a União e os Estados estiverem inertes sobre a matéria. O art. 2-, parágrafo único, do Código Florestal deu um novo enfo£!ue à questão florestal municipal, pois diz: "no caso de áreas urbanas, assif1 entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por 'e municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, efl1 todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos p1 nos e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que s refere este artigo". Desnecessário seria este artigo, diante da obriga que têm os Municípios de respeitar as normas gerais ambientais da Un>a ' Contudo, ao introduzir-se esse parágrafo único no art. 2do i0 Florestal, quis o legislador deixar claro que os planos e leis de uso solo do Município têm que estar em consonância com as normas mencionado art. 2". Isto quer dizer, por exemplo, que um Municíp10' MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS 385 struir uma avenida nas margens de um curso d'água, não pode deiC° de respeitar a faixa de implantação da vegetação de "preservação * rmanente", de acordo com a largura do curso d'água.30 A autonomia P jcipal ambiental entrosa-se, pois, com as normas federais e estaais protetoras do meio ambiente. a 8 Atividades nucleares '"'! , I,". ', . f->K „ ' À semelhança das águas, as atividades nucleares estão reservadas para a legislação da União (art. 22, XXVI, da CF). O dispositivo da Constituição Federal mencionado parece excessivo ao abranger todas as atividades nucleares, e não algumas (como, por exemplo, localização, instalação e funcionamento de reatores nucleares). Não resta, pois, ao Município senão obedecer e procurar adaptar-se ao preceito da Constituição Federal, de modo que a realidade municipal seja levada em conta no planejamento federal da política nuclear. Alguns Municípios inseriram em suas leis orgânicas a proibição de disposição de lixo ou rejeito nuclear em seu território. Parece-me inconstitucional tal tipo de norma municipal. Entendo, contudo, que os Municípios podem e devem fazer levantamentos geológicos, geotécnicos e hidrogeológicos de seu território, localizando os aqüíferos a serem valorizados e conservados e a possibilidade de que a existência de equipamentos de disposição final ou temporária de rejeitos venha comprometer tais aqüíferos. Dessa forma, o Município poderá argumentar perante os Poderes Executivo e Legislativo federais, contra projetos de atividades nucleares em seu território e, no caso de suas ponderações "ao serem ouvidas, buscar a solução do conflito perante o Poder Judiciá-no- Lembremos que diante do princípio da precaução, já tratado neste rabalho, havendo incerteza científica acerca da possibilidade de ocor-er dano ambiental sério e irreversível, incumbirá à União o dever de , evenir o dano ao Município (Princípio 15 da Declaração do Rio de Janeiro/92). Apei 3-' Decisao da 9a Câmara de Direito Público do TJSP, Rei. Des. Rui Cascaldi, na ProteÇ-a° Cível 143.448-5/6-00, em Ação Civil Pública, apelante Associação para a Sp j *a° Ambiental de São Carlosapasc e apelada a Prefeitura Municipal de São Carlos-obras 2000, v.u. Foi dado provimento ao recurso para: "suspender a realização das as *re p eas marginais dos córregos indicados (parte ainda não devastada), até que se rn a necessária aprovação pelas entidades ambientais competentes, das obras em mente ,nt° e de projeto sério de reflorestamento das áreas remanescentes que eventual-Portanto i m 'Ugar as avenida mencionadas; e, com relação às áreas já construídas e, $ 5 Oon naStacias' até 1ue haJa ° efetivo reflorestamento, tudo sob pena de multa de u-°0 por dia" por dia". 386 9.9 Rejeitos DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O planejamento a curto, médio e longo prazos, do uso e da ocuna ção do solo municipal, no que concerne a todos os tipos de rejeitos, é de fundamental importância para a existência de saudável política munici pai ambiental. A previsão da ocupação dos espaços municipais é relevante, evitando-se que zonas residenciais e industriais ocupem áreas que geologi-camente estariam aptas a serem depósitos de rejeitos. O zoneamento a ser feito, evidentemente, incluirá a previsão de zonas intermediárias por causa dos vetores e da poluição do odor. Merece ser trazido à consideração um princípio da Convenção de Basiléia, ou Convenção sobre o controle de movimentos transfronteiriços de resíduos perigosos e seu depósito, em vigor para o Brasil desde 30 de dezembro de 1992,31 a saber: "Convencidos de que os resíduos perigosos e outros resíduos devem, na medida em que seja compatível com uma administração ambientalmente saudável e eficiente, ser depositados no Estado no qual foram gerados". Este princípio merece ser aplicado não só com relação a um país, nas suas relações com outros países, como em relação às regiões, províncias (Estados no Brasil) e Municípios situados em um mesmo país. O princípio acolhido pela Convenção de Basiléia, de 1989 - e em vigor no Brasil - é de que os resíduos (e não só os resíduos perigosos) devem ser depositados no local em que foram gerados. A regra comum e geral é não mandar os resíduos para outra localidade. Portanto, quem produz resíduo em um local, que cuide desse resíduo no mesmo local. O princípio é sábio, pois vai obrigar à reformulação do sistema de produção vigente, pois, atualmente, procura-se ganhar os benefícios da produção, impondo-se a outros que fiquem com o ônus do lixo dessa produçãoA exceção, pois, será enviar o resíduo para ser tratado ou para ser depositado em um outro local, diferente do local onde foi produzido. A União e os Estados não podem impor a um Município que aceite em seu território ser o depósito de lixo ou resíduos produzidos em outros Mu111' cípios. Nas leis complementares que instituírem regiões metrpl' nas, há de ficar bem claro o chamado "interesse comum" (art. 25, § da CF), para que a região metropolitana não se converta em opressão 31. Decreto 875, de 19.7.1993, que promulga o texto da referida Convenção. blicado no DOU 20.7.1993. •,-.-.= '..,... . :-,..,..,. MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE -ASPECTOS JURÍDICOS 387 Município produtor de lixo contra um Município a ser transformado Um depósito de lixo.32 O Município pode, portanto, constitucionalmente, na busca da dea de seu interesse local, impedir que resíduos - perigosos ou não trem em seu território, ou nele sejam depositados ou tratados. Destarte, C Município não tem a disponibilidade de consentir nessas atividades, ern que, antes, promova o devido Estudo Prévio de Impacto Ambiental, dada a potencialidade de significativa degradação ambiental. Para que o Município opte por aceitar o comportamento de exceção - aceitar lixo alheio - ele deverá motivar cabalmente o ato administrativo ou a lei que autorizar tal procedimento, sob pena de uma oportuna decisão judicial impeditiva. O Município tem o direito de exigir que empresas mineradoras -públicas ou privadas - recuperem o meio ambiente degradado (art. 225, § 2-, da CF), abrangendo, inclusive, aqueles que se dedicam à extração de areias. Pioneiramente, a exímia jurista Profa. Helita Barreira Custódio sustentou esta tese, que obteve respaldo do STF no RE 73.876 (Prefeitura Municipal de São Paulo x Antero Saraiva e outros).33 9.10 Ruído •' • A matéria sujeita-se à mesma disciplina que as outras setoriais do meio ambiente. Assim, deve o Município pesquisar a existência de normas federais e estaduais sobre poluição sonora, e, se existirem, exigir o cumprimento das mesmas. Pode o Município não só suplementar essas normas, com outras regras mais restritivas, como, no interesse local, inovar no campo "ormativo da poluição acústica, determinando utilização de materiais Rolantes ou diminuidores do som, construção de muros contra a propa-§aÇão do som. A omissão do Município na formulação de normas urbanísticas e meio ambiente, e na execução estrita dessas normas no que concerne Poluição sonora, pode situar esse ente público na posição de réu de 0 C1vil pública, de ação popular ou de outra ação judicial cabível. 512 das principais indústrias das 39 cidades da região metropolitana" de responsáveis pela geração de mais de 12 milhões de toneladas de lixo Hu,o"í Porano . s tes (ja " sf° representa mais que o dobro do lixo gerado pelos 13,3 milhões de habitan-la regj- ° metroPolitana". "Existem 2.000 pontos de lançamento inadequado de lixo 3° metropolitana" (Folha de S. Paulo, ed. 16.10.1993, Caderno 3, p. 3). Helita Barreira Custódio, Autonomia do Município na Preservação Ambiental. 388 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO Tem ocorrido descaso de Municípios na construção de equiparnent em viadutos ou nas margens de autopistas e, dessa forma, os moradorpS ou pessoas que exercem atividades nas vizinhanças são notórias vftirtla do barulho e da poluição do ar. A poluição sonora dos aeroportos merece a ação articulada da União dos Estados e dos Municípios. Enquanto não for possível diminuir sensivelmente o ruído das aeronaves, incumbe ao Poder Público fazer com que uma parte das taxas coletadas pela administração dos aeroportos seja canalizada para a implantação de insonorização das casas dos que moram nas vizinhanças desses estabelecimentos. Países, como a França, estão levando a efeito essa política de diminuição dos malefícios do barulho nas imediações dos aeroportos. Na elaboração do zoneamento municipal para a localização de casas noturnas, estabelecimentos comerciais de instrumentos sonoros ou vendas de discos ou similares, de indústrias emissoras de ruídos, como de atividades de saúde e de ensino, o Município haverá de ter em vista as normas de emissão de ruído, como as normas de imissão34 de ruído, isto é, o nível de som na sua produção, como na sua recepção. 9.11 Tráfego - :: -.- *'•,.... N ;t" -. . ,--. - .-j-.i . ;' À União cabe legislar privativamente sobre "trânsito" (art. 22, XI, da CF). Contudo, o Município pode legislar sobre o interesse local (art. 30,1, da CF) que indique a necessidade de impedir o acesso de determinados veículos, ou do transporte de determinadas cargas, por locais ou vias públicas específicas. O interesse local poderá motivar a expedição de regras, por leis, por decretos, por portarias ou por resoluções, conforme o caso, sobre a mudança de itinerários, regulamentação de estacionamentos ou estabelecimentos de critérios ou de restrições para a circulação de quaisquer veículos no interesse da saúde e do meio ambiente municipais. De outro lado, aplicando as normas federais e estaduais, o Munici' pio poderá submeter veículo a motor ao controle de poluição. 34. O termo "imissao" nao tem sido muito utilizado no Português corrente, meS' mo na linguagem técnica especializada. Contudo, na linguagem jurídico-ambiental a'e mã é de longa data utilizado. O seu emprego em Português é correto, como expllC Napoleão Mendes de Almeida, em Notas Vernáculas-156: "Imissão - imitir - são pala vras que não devem ser confundidas com as parônimas 'emissão' e 'emitir'. Estas signl ficam, literalmente, mandar para fora, e aquelas, mandar para dentro, fazer entrar, iff duzir" (O Estado de S. Paulo, 12.4.1987, p. 66). : . MUNICÍPIO E MEIO AMBIENTE - ASPECTOS JURÍDICOS ifí Município e defesa do meio ambiente em juízo 389 O Município pode utilizar-se da ação civil pública, como autor, corn o objetivo de buscar dos particulares e de outros Poderes Públicos o cumprimento das obrigações ambientais de fazer e de não fazer, conforme a Lei 7.347/85. Seria valioso que o Município dispusesse de uma Procuradoria especializada em matéria ambiental para orientar juridicamente a Administração Pública no cumprimento de seus deveres específicos, como representá-lo, ativa e passivamente, em juízo.35 ,-íí ..) ir. )! . 35. A Lei 848/92, que dispõe sobre a Política Ambiental do Município de São àet>astião, previu em seu art. 38: __ 'E instituído um cargo de Procurador Jurídico Ambiental, de provimento em co-ssa°. referência XIII, que será responsável por assessorar juridicamente o sistema unicipal de meio ambiente, promover a ação civil pública, isoladamente ou em jjj. cons<5rcio com o Ministério Público, e funcionar como assistente do Ministério Pú-°' etn todas as ações penais ambientais, em que o local da infração seja o Município. Ção d . " O Procurador Jurídico Ambiental terá a função de corregedor da fiscalização d.6 lnteresse ambiental, apurando, quando for o caso e inclusive mediante reclama- comunidade, omissão ou mau cumprimento da lei, propondo a punição cabível. fer .* 2a. O cargo será ocupado por profissional de comprovada especialização, pre-tião nClalmente inscrito na Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de São Sebas-no mínimo há dois anos." . .. . zo So i.r-ivirr, capitulou PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 1. Exigências urbanísticas obrigatórias para toda a Nação É oportuno analisarem-se dois textos legais anteriores para se aquilatar do avanço em matéria urbanística, principalmente no aspecto relativo ao meio ambiente. O Decreto-lei 58, de 10.12.1937, previa somente para aproprieda-de urbana fossem apresentados a planta e o plano de loteamento, que deveriam ser aprovados pela Prefeitura Municipal, "ouvidas, quanto ao que lhes disser respeito, as autoridades sanitárias e militares". A regulamentação desse decreto-lei foi feita pelo Decreto 3.079, de 15.9.1938, que repetia o enunciado, acrescentando: "A Prefeitura e as demais autoridades ouvidas disporão de 90 dias para pronunciar-se, importando o silêncio a aprovação. A impugnação deverá ser fundamentada em disposições de leis, regulamentos ou posturas ou no interesse público". Essas foram as disposições que regeram a matéria até 1967. Não se especificavam as exigências sanitárias a serem observadas em todo o País. Os espaços públicos, na prática, muitas vezes, eram somente as ruas. Deixavam-se de exigir equipamentos urbanos e comunitários, tais como, faixas non aedificandi e locais destinados ao lazer, à saúde, à cultura. Os loteamentos interessavam só ao Direito Civil. A intervenção da Administração Pública era acessória, colocando-se em relevo a compra e venda dos lotes. Procurava-se mais ressalvar o comprador em seus direitos imediatos quanto à propriedade imobiliária, preocupando-se fundamentalmente com os regulamentos do registro da operação no cartório competente. O Decreto-lei 271, de 28.2.1967, já muda a perspectiva do loteamento. O Banco Nacional da Habitação intervém com suas normas g6' rais, ainda que estas não constem nesse decreto-lei, mas que se repofta às mesmas. O estatuto legal mencionado já passa a enxergar o loteamento s° uma ótica publicística. Ainda que de um modo bem genérico, prevê PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 391 de intervenção dos Municípios. Podiam eles "obrigar a subordi-f°r, jos loteamentos às necessidades locais, inclusive, quanto à naf'nação e utilização das áreas, de modo a permitir o desenvolvimenaequado". As Municipalidades podiam recusar a aprovação dos t0 aflientos, "ainda que seja apenas para evitar o excessivo número de ires com o conseqüente aumento de investimento subutilizado em obras j°e infra-estrutura e custeio de serviços". José Osório de Azevedo Júnior, comentando esse decreto-lei, salienta- "o loteamento não pode e não deve ser entendido apenas como um acontecimento jurídico pelo qual se fraciona a propriedade e se criam direitos decorrentes de contratos bilaterais entre o loteador e o adquirente do lote. O loteamento é um fato da mais alta relevância na vida das comunidades e deve ser tratado como um todo, isto é, deve ter um ordenamento jurídico tal que atenda às exigências urbanísticas ou rurais de desenvolvimento da cidade ou da região, da segurança aos compradores e da atividade lucrativa do proprietário".1 2. A autonomia municipal e as normas urbanísticas federais A União e os Estados abstinham-se de legislar e de regulamentar matérias urbanísticas. Possivelmente, uma concepção de autonomia municipal detinha os legisladores no sentido de estabelecerem normas gerais aos Municípios no concernente à disciplina dos loteamentos. Merece um rápido comentário o princípio constitucional da autonomia municipal. Todas as Constituições Republicanas do Brasil consagram o princípio: de 1891 (art. 68); de 1934 (arts. 7a, d, e 13); de 1937 lart26); de 1946 (art. 28); de 1967 (art. 16) e de 1969 (art. 15). A onstituição de 1988 fez algumas inovações: "Art. 29. O Município m ÃSC" P°r 'e' or§ânica, votada em 2 turnos, com o interstício míni-w ,e. 10 dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Con 1ClPa'' Ue a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Ce(. 'tUlÇão, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes pre-iüent • •• X cooperação das associações representativas no planeja-esPec'f11Un'Ca'' ~ iniciativa popular de projetos de lei de interesse de D ,1Co "° Município, da cidade ou bairros, através de manifestação ' 'o menos, 5% do eleitorado". 16 com Varnos ° niunicipalismo brasileiro com as palavras do eminen-dor da primeira Constituição Republicana - João Barbalho: « 388/31. ' .<.-:.i- '... -. 392 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO "É sabido que o Município é uma miniatura da pátria, uma i reduzida dela, sendo nas coisas políticas o primeiro amor do Esse amor, esse afeto ao torrão natal, ao círculo de relações de vb nhança, de contigüidade, de comunhão de interesses, engendra o esnf to de civismo que a autonomia local desenvolve e nobilita; de onde vej a dizer-se que o Município é a escola primária da liberdade".2 As cidades brasileiras, na sua maioria, foram aumentando dia dia. O fenômeno da urbanização não se processou de modo a respeitar a qualidade de vida dos recém-chegados à cidade. Não havia uma norma nacional de Direito Público exigindo um mínimo de condições para a criação de loteamentos. O ordenamento urbanístico ficou ao sabor de improvisações e de pressões locais. Constatava-se a tensão entre o interesse privado e o interesse público, isto é, a posição do loteador e os interesses atuais e futuros da comunidade. A Lei 6.766/79 não colocou à margem o princípio da autonomia municipal e nem poderia fazê-lo, pois seria inconstitucional. O Sen. Otto Lehmann - autor do Projeto 18/77,3 que, com algumas modificações, veio a se transformar em lei - salienta ter o projeto se orientado "no sentido de estabelecer os requisitos urbanísticos mínimos para o loteamento e desmembramento, permitindo aos Estados e Municípios legislar complementarmente, estabelecendo outras exigências para melhor adaptação às peculiaridades regionais e locais". Como exemplo desse entendimento com o legislador, podemos mencionar que matérias atingindo o peculiar interesse daAdministração municipal - prazos para a Administração aprovar ou recusar o loteamento - foram deixados para a legislação municipal. A legislação federal já dera um marcante passo urbanístico com a instituição das regiões metropolitanas (Lei Complementar 14/73). Transcende o interesse particular do Município a estruturação básica de um loteamento. Apontar as mesmas condições mínimas de sanidade para todas as comunidades da Nação é tarefa que se fazia impi' rogável, pois, do contrário, propiciavam-se num mesmo país pontos de convulsão social e locais onde não se mora, não se habita mas se sobre vive a duras penas. De outro lado, a continuação da manifesta diferenÇ de exigências urbanísticas para lotear, concorria para aumentar as &$ gualdades regionais e estimulava a concorrência entre cidades, posSl. litando que poderosos loteadores só investissem onde menos se eX1,'/, se. Não se pode, pois, negar que a Lei 6.766/79 representa um foi*1 vel elenco de normas, que é preciso colocar em prática. 2. Constituição Federal Brasileira, 2a ed, p. 72...-....-•: ,- •-3.0012.3.1977.256. .. - PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 393 ç. lei analisada entrou em vigor na data de sua publicação, isto é, ç j dezembro de 1979. As disposições da nova lei atingem os arnentos projetados como os loteamentos já aprovados. O Prof. Hely T opes Meirelles assevera: "desde que a norma urbanística sobreveio, ulando diversamente o uso do solo naquele local, seus preceitos pas-am a prevalecer sobre as convenções particulares, que não podem im-dir nem contrariar a lei para os futuros usos do solo naquele local. Veja-se bem que a lei não está operando retroativamente, pois que as edificações feitas com observância das restrições convencionais do loteamento são válidas e intocáveis pela superveniente, mas os terrenos vagos e as edificações a partir da vigência da lei regem-se pelos seus dispositivos".4 3. Conceito de loteamento e de desmembramento O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento. O loteamento vai exigir o prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes ou a abertura de novas vias e de novos logradouros públicos. O desmembramento não interfere nem para modificar, aumentar ou criar vias públicas ou logradouros públicos. Basta, portanto, a abertura de uma rua para que se trate de loteamento. Loteamento e desmembramento têm em comum serem uma operação divisória da gleba em lotes destinados a edificação. O loteamento poderá se feito tanto por pessoa privada como por pessoa pública. O art. 44 da Lei 6.766/79 possibilita ao Município, ao Distrito Federal e ao estado expropriar áreas urbanas ou de expansão urbana para loteamento, ernolição, reconstrução e incorporação, ressalvada a preferência dos Apropriados para a aquisição de novas unidades. Assim, podem as pescas públicas lotear ou relotear. Lotear as glebas que já eram de sua Pr°priedade ou expropriar uma gleba já dividida, para tornar a loteá-la. p01 Um destacado impulso nas operações urbanísticas, pois, até agora o er Público estava manietado diante da especulação imobiliária e frente dpnçVaS necessidades do desenvolvimento social e econômico da cida-uPeraram-se as divergências apresentadas na jurisprudência.5 e' 6-766/79 de parcelamento do solo urbano. O parcela- do solo rural, ou seja, "de terras próprias para a lavoura ou pe4 "A s restrições de loteamento e as leis urbanísticas supervenientes", RT 462/27. 5 *TJ%6/ 394 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO cuária", está sujeito à Lei 4.504/64, Decreto-lei 57/66 e Lei 5.172/66 n art. 53 da lei comentada indica que as alterações do solo rural será aprovadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária incra, pelo órgão metropolitano (se o Município nele estiver integrado1) e pela Prefeitura Municipal. A forma de pagamento do imóvel não entra na conceituação de loteamento. Assim, recebido em doação, permutado ou pago o lote à vista ou em prestações sucessivas e periódicas, sujeita-se também o negócio à disciplina da nova lei, diferentemente do Decreto-lei 58/37. 4. Exigências fundamentais para a admissão do parcelamento No momento da apreciação do projeto do loteamento, o Poder Público deverá levar em conta as exigências básicas da lei previstas nos cinco incisos do parágrafo único do art. 3fl. Antes do exame dos requisitos urbanísticos, a Administração deverá examinar o local onde se pretende repartir o domínio do solo. A lei foi clara ao usar as expressões "não será permitido o parcelamento do solo". Assim, sob esse aspecto, a aprovação ou o indeferimento do projeto de loteamento é de natureza vinculada, não podendo a Administração utilizar-se de discricionariedade. "Não será permitido o parcelamento do solo" em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas. Portanto, o terreno encharcado, pantanoso não pode ser loteado. Da mesma forma o terreno sujeito a inundação ou situado à beira de cursos d'água e que periodicamente é invadido pelas cheias não poderá ser loteado. Locais onde as águas pluviais se acumulam, onde não haja escoamento devido, somente poderão ser loteados se corrigida a situação. Evita-se, portanto, agrupar os indivíduos em locais inundáveis, com o conseqüente perigo para a vida e saúde da população e com resultados danosos para a economia dos compradores. Será uma tarefa técnica avaliar, através de laudo motivado, a possibilj' dade ou não de as águas terem escoamento ou de as inundações atingi" rem o local que se pretende urbanizar. Proibido está o parcelamento do solo em terrenos que tenham sid° aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados. Aterrar, no caso, significa encher um local com terra e outras substâncias. Será preciso uma análise sanitária dos materiais empregados no aterro para se saber se são ou não nocivos à saúde públi' ca. Enquanto não tenha sido eliminada a nocividade concreta ou poteü' ciai do local, a Administração não pode autorizar o loteamento. PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 395 Os terrenos com declividade igual ou superior a 30%, salvo se aten-,• jaS exigências específicas das autoridades, não poderão ser loteados. A regra geral impedir-se o loteamento em terrenos com a declividade nCi3nada. Para vencer esse empecilho, as autoridades competentes deverão estabelecer condições especiais que venham a dar segurança ra as construções, fixar diretrizes que evitem a erosão e que possibili-[gfn o trânsito adequado de pedestres e de veículos. A ausência de re-ras para construir ou para lotear em terrenos com a declividade igual ou superior a 30% não enseja a aprovação do pedido, que é uma exceção. Não havendo exigências específicas ou não sendo elas observadas, o pedido deverá ser negado. Não será permitido o parcelamento do solo em terrenos onde as condições geológicas desaconselham a edificação. Ainda que seja oneroso, é preciso fazer um levantamento geológico da gleba a ser parcelada. Evitam-se os prejuízos para os compradores e as ações judiciais de indenização contra os loteadores. Vedado está o parcelamento do solo em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até sua correção. Este dispositivo não constava do projeto inicial proposto no Senado Federal. Possibilitou-se a preservação das condições ambientais e houve um claro posicionamento legal forçando a correção da atividade poluidora. As áreas de preservação ecológica podem abranger as áreas chamadas de interesse especial (art. 13, I) tais como "de proteção aos mananciais ou ao patrimônio cultural, histórico, paisagístico e arqueológico, definidas por legislação estadual ou federal". Entretanto as áreas de preservação ecológica não se reduzem às mencionadas. As florestas de preservação permanente, os parques nacionais, estaduais e municipais, as reservas biológicas, as reservas de caça, as estações ecológicas e as áreas de proteção ambiental6 cujos objetivos transcendem os do art. 13,1, da Lei 6.766/79 estão, também, abrangidos Pela expressão "áreas de preservação ecológica". Onde a poluição impedir condições sanitárias suportáveis será im-Pedido o loteamento. Deverão ser levantados os padrões de qualidade e s Padrões de emissões baixados pelas autoridades federais, estaduais e junicipais. Todo o tipo de poluição está abrangido pela Lei 6.766/79: o uição das águas, da atmosfera e do solo. A poluição sonora também a incluída. Tem-se notado a ausência de zonas intermediárias entre dist: "tos industriais e zonas residenciais. Terrenos adjacentes a esses estações ecológicas e as áreas de proteção ambiental estão previstas na Lei. de 27.4.1981. 396 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO distritos eram loteados proclamando-se até a facilidade de transpOrt para os futuros empregados das indústrias. Omitia-se muitas vezes Poder Público em planejar um verdadeiro cinturão sanitário para evita a propagação das emissões poluentes. Da mesma forma, deverá ser impedido o loteamento em zonas limítrofes a aeroportos, estações rodoviárias, viadutos e elevados (ainda que seja obrigatória a reserva da faiXa de 15m, com a restrição non aedificandi), a menos que se instalem dispositivos evitando-se a poluição acústica, terrível agressora dos moradores das zonas adjacentes. Vale acentuar que a Lei 6.766/79 não deixou ao alvedrio da Administração entender se o terreno é apto ou não para o loteamento e para desmembramento. Protege-se o proprietário do terreno, defende-se o comprador e a comunidade do arbítrio da Administração. A lei não disse textualmente como se fará essa análise preliminar, qual a sua profundidade e seu conteúdo. Essa análise eqüivale a um Estudo de Impacto, ou seja, uma avaliação prévia, evitando-se a constatação dos prejuízos depois que o projeto está em marcha ou até executado. 5. A intervenção dos organismos estaduais encarregados da preservação do meio ambiente e a aprovação dos loteamentos O art. Ia, § lü, do Decreto-lei 58/37 previa a audiência das autoridades sanitárias antes da aprovação do plano e da planta de loteamento. O Código Nacional de Saúde7 prevê que para a aprovação dos projetos de loteamentos de terrenos com o fim de extensão ou formação de núcleos urbanos, será ouvida, "sempre, a autoridade sanitária competente". Os Estados foram legislando sobre o modo de intervir no aspecto sanitário do loteamento. No Estado de São Paulo existem dois decretos que merecem ser citados: Decreto 8.469/76, que permite à cetesb (Cia-de Tecnologia e Saneamento Ambiental) conceder "licença de instalação" para os loteamentos (art. 58,1), e Decreto 13.069/78, que estabelece normas especiais relativas ao saneamento ambiental nos loteamentos urbanos ou para fins urbanos e prevê a intervenção da autoridade sanitária. No Estado de Pernambuco a cprh (Cia. Pernambucana de Conu"0' le de Poluição Ambiental e de Administração de Recursos Hídricos; tem competência para aprovar ou não os projetos "de quaisquer tipos de loteamentos, independentemente do fim a que se destinem" (art. 5fl, ' 7. Art. 34 do Decreto 49.974-A, de 21.1.1961, que regulamentou a Lei 2.312, 3.9.1954. PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 397 Decreto 4.953/78). No Estado do Rio Grande do Sul os loteamentos terras, em áreas urbanas ou rurais, não podem ser iniciados sem a 'via aprovação de seus projetos pela Secretaria de Saúde (art. 54 do Precreto 23.430/74). É de se indagar se com o advento da Lei 6.766/79 continuam ou ão em vigor as normas estaduais acima apontadas. Essa dúvida poderia surgir à primeira análise da Lei, ao se ler o art. 13 e seu inc. I (nova redação dada pela Lei 9.785, de 29.1.1999,8 art. 32): "Aos Estados caberá disciplinar a aprovação pelos Municípios de loteamentos e desmembramentos nas seguintes condições: I - quando localizados em área de interesse especial, tais como as de proteção aos mananciais, ou ao patrimônio cultural, histórico, paisagístico e arqueológico, assim definidas por legislação estadual ou federal". O art. 14 afirma: "Os Estados definirão, por decreto, as áreas de proteção especialmente previstas no inc. I do artigo anterior". Deverão, portanto, os Estados estabelecer, por decreto, as normas a que deverão submeter-se os projetos de loteamento e desmembramento nas áreas previstas no art. 13, observadas as disposições dessa lei. A lei estudada veio possibilitar maior proteção às áreas de interesse especial. Contudo, não deixou desprotegidas as áreas comuns. Nem se poderia entender de outra forma, pois a Lei 6.766/79 estabeleceu exigências fundamentais, principalmente quanto à saúde pública e poluição, que não se destinam a loteamentos especiais, mas a todos os loteamentos. Assim, não estaria afinado com o espírito e o texto da lei, afirmar-se que só nas áreas de interesse especial haverá prévia manifestação das autoridades estaduais. Tenha-se presente a mencionada dispo-slÇão do Código Nacional de Saúde que preconiza a intervenção da autoridade sanitária "para a aprovação de projetos de loteamentos" não fazendo qualquer distinção sobre a modalidade das áreas a lotear. O insigne Carlos Maximiliano ensina: "Para a ab-rogação a incompatibilidade deve ser absoluta e formal, de modo que seja impossível Xecutar a norma recente sem postergar, destruir praticamente a antiga Formula algumas regras para completar a doutrina acerca do em-Pj"e.go do elemento teleológico e é de se destacar a seguinte: "Cumpre 'buir ao texto um sentido tal que resulte a lei haver regulado a espécie avor e não em prejuízo de quem ela evidentemente visa a proteger".10 "atar da apreciação do resultado diz: "dentro da letra expressa pro* °OU 1.2.1999, pp. 5 e 6. • hermenêutica e Aplicação do Direito, 9a ed., p. 358. l0- °b. cit., p. 156. 398 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO cure-se a interpretação que conduza à melhor conseqüência para tividade".11 Parece-nos, portanto, que a Lei 6.766/79 veio exigir mais, e não menos, no tocante à intervenção dos Estados. Além da intervenção em todos os loteamentos, poderão os Estados estabelecer normas a serem observadas para os loteamentos projetados nas áreas de interesse espe. ciai, com observância das "exigências urbanísticas do planejamento municipal". 6. Novos requisitos urbanísticos para o loteamento: a melhoria da qualidade de vida A Lei 6.766/79 previu, além de exigências indispensáveis quanto aos terrenos a serem divididos, outros requisitos visando a uma adequada inserção da gleba na cidade. São normas imperativas dando um mínimo de conforto para o morador, dotando a área loteada de alguns equipamentos urbanos e comunitários. A Lei 9.785/99 insere a noção de "lote" e de "infra-estrutura básica". Lote é o "terreno servido de infra-estrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe" (art. 2-, § 4a). Apesar de o novo parágrafo do art. 2a apontar que as dimensões do lote devam atender "aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal", continuam vigorando as medidas mínimas de 125m2e a frente mínima de 5m, em face do inc. II do art. 4a, que não foi alterado. "Consideram-se infra-estrutura básica os equipamentos urbanos de escoamento de águas pluviais, iluminação pública, redes de esgoto sanitário e abastecimento de água potável, e de energia elétrica pública e domiciliar, e as vias de circulação pavimentadas ou não." Entretanto, a referida Lei 9.785/99 diminuiu as exigências para os parcelamentos situados nas zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse social (zhis), onde deverão existir, no mínimo: "I - vias de circulação; II" escoamento de águas pluviais; III - rede de abastecimento de água p0' tável; e IV - soluções para o esgotamento sanitário e para a energia elétrica domiciliar". Assim, como norma geral exige-se a implantaça0 prévia de rede de abastecimento de água e rede de esgoto sanitário- A exceção para azms-Zona Habitacional de Interesse Social é a exigência de soluções para o "esgotamento sanitário" que não sejam através d6 11. Idem, p. 165. PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 399 rede, como, por exemplo, as fossas sépticas. Omitiu-se a reforma U «lativa em colocar como integrante da infra-estrutura básica a coleta moção do lixo domiciliar. De outro lado, os equipamentos públicos e, educação, de saúde e de lazer não fazem parte obrigatória da infra-estrutura básica. Equipamentos comunitários são os equipamentos públicos de educação, cultura, saúde, lazer e similares (art. 4a, § 2a, da Lei 6.766/79). Equipamento público significa pertencente ao patrimônio público e não privado. Essa distinção há de ser feita, pois poderá haver no loteamento locais destinados, também, à educação, cultura, lazer, atividades desportivas, hospitais, centros de reabilitação, templos, que não integram o chamado equipamento comunitário previsto na lei. De outro modo, fácil seria burlar o sentido do novo texto legal. A conceituação de equipamento comunitário apresentando a expressão "similares" deixou uma simples margem de opção ao legislador municipal e estadual na especificação de seus equipamentos. Equipamentos públicos urbanos são aqueles de abastecimento de água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, rede telefônica e gás canalizado (art. 5Ü, parágrafo único, da Lei 6.766/ 79). Os equipamentos urbanos estão claramente catalogados pela lei federal. As exigências urbanísticas objetivaram dotar o loteamento de proporcionalidade entre áreas públicas e privadas, ensejar uma área mínima do imóvel no loteamento comum, instituir reserva obrigatória de faixa ao longo das águas, rodovias, ferrovias e dutos e, também, obrigar a articulação das novas vias com o sistema viário implantado ou Projetado. As áreas públicas abrangem o sistema de circulação, os equipamentos urbanos e comunitários e os espaços livres de uso público. Segun-0 a redação original da Lei 6.766/79, as áreas públicas não poderiam er inferiores a 35% da gleba loteada, mas essa exigência foi revogada a nova redação do art. 42, § Ia: "A legislação municipal definirá, para a z»na em que se divida o território do Município, os usos permiti-s e os índices de parcelamento do solo, que incluirão, obrigatoriamente, areas mínimas e máximas de lotes e os coeficientes máximos de apro-Veitamento". sah' entando a parte do texto revogado, afirmei que a lei federal ra - nte previu uma área pública mínima a ser reservada. Esta alte-nfv eita pela Lei 9.785/99 enfraqueceu as exigências urbanísticas em cj nacional que contribuíam para a elevação da qualidade de vida nas es- Não acredito que deixar para os Municípios estabelecer livreI 400 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO mente no plano diretor a proporção entre a propriedade privada e a D priedade pública, com referência aos equipamentos urbanos e cornu ~ tários nos loteamentos, vá beneficiar as classes de baixo poder aquis;t-~ vo. As favelas, na maioria dos casos, existem pela omissão crimino dos Poderes Executivo e Legislativo dos Municípios e pela impunidad dos loteadores clandestinos. Caberá aos Municípios estabelecer a proporção entre os espaçOs livres destinados ao público e os equipamentos comunitários e urbanos A transferência dessas áreas públicas para o Município se fará na data do registro do loteamento no Cartório do Registro de Imóveis (art. 22) mas as áreas não poderão ter sua destinação alterada pelo loteador desde a aprovação do loteamento pelos Poderes Públicos competentes. A densidade de ocupação do loteamento é uma limitação ao uso da propriedade. "Com tais limitações o Estado moderno intenta transformar a propriedade-direito na pwpriedade-função, para o pleno atendimento de sua destinação social, através de imposições urbanísticas, sanitárias, de segurança, e outras".12 Essa restrição ao exercício do direito de propriedade pode-se constituir em "áreas reservadas para a execução de planos de urbanização ou para o zoneamento neles prescritos".13 A lei federal não se referiu a um dos elementos característicos da limitação em apreço: sua gratuidade. A ausência da indicação desse caráter, nem por isso lhe desnatura o conceito. O Prof. Gomes-Ferrer, da Universidade de Madri,14 ensina: "A tensão surgida entre os interesses públicos e o interesse privado era suscetível de diversas soluções; e fundamentalmente de duas: de uma parte a socialização da propriedade e, de outra, a subordinação do interesse particular ao público, conservando-se a propriedade privada, porém mu-dando-se seu sentido. A segunda opção política originava-se na consideração de que o direito de propriedade devia ser respeitado, posto que concorrem para sua existência razões de interesse público, para o qual as normas e os planos de urbanismo delimitam o conteúdo desse direito e as faculdades e deveres do proprietário, sem que tal limitação dê lugar a qualquer indenização. Por esta via intermediária, pensou-se obter re' sultados adequados com vista à regulamentação do crescimento da cidade, partindo-se de uma perspectiva econômica, de que a urbanização dos terrenos produzia mais-valia, a qual deveria ficar jungida ao custo da obra urbanizadora necessária para seu nascimento". p. 472. 12. Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, p. 569. 13. Marcello Caetano, Princípios Fundamentais de Direito Administrativo, 14. Las Zonas Verdes y Espacios Libres como Problema Jurídico, pp. 3 e 4. PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 401 Roger Saint-Alary15 ressalta que o "princípio de não indenização da gratuidade reside no caráter de interesse geral do gravame". Os 0 anCeses chamam a essas limitações administrativas de servidões adinistrativas e no caso "servidões de urbanismo". Michel Prieur e Guy riaude Henriot16 salientam que "a noção de utilidade pública está na base de todas as servidões estabelecidas pela Administração sobre as propriedades privadas". Salvia e Teresi, comentando a legislação italiana, fazem a distinção entre urbanização primária e secundária. A primeira é constituída pelas vias, rede hídrica, rede de distribuição de energia elétrica e de gás, iluminação pública e espaços verdes na proximidade e a serviço das habitações. As obras referidas são de responsabilidade integral do proprietário. A urbanização secundária são as obras indispensáveis à vida do bairro, como escolas, igrejas, centro social, cultural e esportivo, ambulatório, mercado, áreas verdes do bairro etc. Essas obras serão de responsabilidade parcial do proprietário do loteamento até uma cota determinada pelo Município.17 Como norma genérica exige-se que o lote tenha uma área mínima de 125 m2 com frente mínima de 5m. Ressalvou-se a possibilidade de a legislação estadual ou municipal determinar maiores exigências. A Lei 6.766/79 poderia ter estabelecido uma densidade máxima de ocupação para área construída em cada lote. Não o fez e essa tarefa foi deixada para os Estados e Municípios. Portanto, no loteamento comum não se poderá admitir menor frente, nem menor área; contudo, o inc. II do art. 4Üconsignou duas exceções: loteamento destinado a urbanização específica e edificação de conjuntos habitacionais de interesse social. A Lei 6.766/ '9 omitiu-se na explicação desses conceitos, os quais deverão ser per-quiridos em legislação complementar federal, estadual ou municipal. Foram previstas duas modalidades de faixas non aedificandi: uma rigatória e a outra facultativa. Ao longo das águas correntes e dorentes e das faixas de domínio público das rodovias, ferrovias e dutos era °brigatória a reserva da faixa não-edificável de 15m de cada lado. outra faixa não-edificável, deixada à iniciativa do Poder Público, que P°derá ou não instituí-la visando a implantação de equipamentos urbas- A Lei 6.766/79 estabeleceu o mínimo a ser reservado com relação !Xa non aedificandi ao longo das águas correntes e dormentes (la' rePresas ou açudes etc). Essa faixa mínima de 15m amplia as exijs- Drnit de la Construction, Ia ed., p. 211. 5- Servitudes de Droit Public et de Droit Prive, p. 36. .;....; V. . Lineamenti di Diritto Urbanístico, p. 83. .. ,; . >.,,.-.vi'.; -1 402 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO gências do Código Florestal (art. 2Ü, a). Não há conflito entre os do' estatutos legais. Pelo Código Florestal poder-se-ia reservar faixa merm do que a de 15m. Entretanto, conforme for a largura dos rios, a faixa ser reservada será maior do que 15m. Com propriedade, trata a matéria Antônio de Pádua Nunes, dizendo: "Como ficarão conciliadas com a existência das margens externas, terrenos reservados a faixa de servi-dão (art. 12 do Código de Águas), que guardam objetivos diferentes? Impondo essa restrição aos proprietários ribeirinhos, o Código Florestal acabou com aqueles objetivos que determinaram a criação dos terrenos reservados. Não se admitem culturas nas margens dos cursos de água".18 Ao longo dos cursos d'água deverão, portanto, ser conservadas ou plantadas as florestas de preservação permanente. A conotação non aedificandi restringe claramente não só as construções particulares como públicas. Não se poderão tolerar ruas e avenidas ao longo dos cursos d'água, das rodovias, ferrovias e dutos. O problema de indenização da faixa non aedificandi é de ser analisado. Já sustentamos em outro estudo, Florestas de Preservação Permanente e o Código Florestal Brasileiro, que não são indenizáveis as florestas de preservação permanente do art. 2- do Código Florestal, criadas pelo só efeito do próprio Código. Entretanto, são indenizáveis as florestas de preservação permanente criadas pelo Poder Público com fundamento no art. 3a do referido Código. Sobre a questão é de se trazer à colação a Súmula 479 do STF: "as margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização". Ruy Cirne Lima acentua: "A inexistência de dano exterior às coisas obscurece, não raro, a diminuição patrimonial decorrente da limitação da propriedade privada, em proveito embora de outra pessoa certa e determinada, como é, aqui, o Estado".19 Maria Sylvia Zanella Di Pietro assevera: "Quando, no entanto, a limitação for apenas no sentido àe regular o exercício da propriedade, mediante normas restritivas de caráter geral, impostas no interesse público, não se justifica a indenização, uma vez que não se trata de restrição imposta a indivíduos determinados, mas a toda uma coletividade: neste caso, o sacrifício, imposto a todos,e compensado por um benefício, também de ordem geral. É o que ocorre com as chamadas limitações administrativas à propriedade privada ( sentido estrito) e também com determinados tipos de servidão que s6 assemelham àquelas limitações, por decorrerem diretamente da lei e I 18. Do Terreno Reservado de 1867 à Faixa Florestal de 1965, p. 41. 19. "Das servidões administrativas", RDP 5/27. ..-.., : PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 403 " idirem sobre toda uma categoria de prédios, como nas servidões 111 reinais aos "os Públicos e nas servidões ao redor dos aeroportos".20 As vias do loteamento deverão articular-se com as vias adjacentes flciais existentes ou projetadas. Com isso evitar-se-ão ruas sem saída e rijjninuição do fluxo de tráfego pelo estreitamento das vias de circulado da gleba loteada. A Administração Pública deverá exigir o entrosa-rnento das vias do loteamento com as vias projetadas. Vias projetadas são aquelas constantes de documentos oficiais das Prefeituras Munici-nais, não havendo imperiosa necessidade de que constem do plano dire-toi do Município. Em caso de recurso administrativo ou judicial, a entidade pública deverá provar a existência do projeto, demonstrando que não se trata de uma mera intenção ou capricho do administrador. Havendo um plano em desenvolvimento, ainda que não publicado, o loteador a ele deverá adaptar-se, dentro do prazo previsto para a manifestação da Administração (art. 16). Do contrário se estimularia a desobediência à lei, através da corrida ao protocolo visando-se a aprovação de loteamentos tão logo se tivesse conhecimento de novos planejamentos oficiais. Os requisitos urbanísticos expostos são inarredáveis, seja por vontade da Administração municipal ou estadual, seja por vontade do loteador ou dos compradores dos lotes. 7. Fixação das diretrizes pelas Prefeituras Municipais ou pelo Distrito Federal Estabeleceu-se a obrigatoriedade da fase de fixação de diretrizes Para a aprovação do loteamento nos Municípios com população igual ou superior a 50.000 habitantes. Essa fase consiste na indicação das dlretrizes nas plantas apresentadas pelo interessado. Serão apontadas Pela Administração: as ruas ou estradas existentes ou projetadas, relacionadas com o loteamento pretendido; o traçado básico do sistema viário Principal; a localização aproximada dos terrenos destinados a equipaento urbano e comunitário e as áreas livres de uso público; as faixas nitarias de terreno necessárias ao escoamento das águas fluviais e as 1Xas não-edificáveis; a zona ou zonas de uso predominante da área, de rdo com os usos compatíveis. É, portanto, a Administração que faz (je 1Vadamente essas demarcações nas plantas e não o loteador. Disso ta rre e para o loteador ficará reservado o direito de estabelecer o nho dos lotes, observada a área mínima referida na lei; dar o traçaservidão Administrativa, p. 72. •-- ' . • •-" < .~ É 404 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO do das ruas não principais; localizar os equipamentos comerciais, obser vada a compatibilidade do uso da área. Para que essa fase não seja observada nos Municípios menores rje 50.000 habitantes é preciso a existência de lei em tal sentido.21 Kfão basta ato do prefeito municipal. Enquanto não houver a dispensa pOr lei, a fase de fixação de diretrizes será obrigatória. Salienta-se que a inexistência da fase de fixação de diretrizes não significa qualquer transigência do Município quanto às exigências fundamentais dos terrenos a serem loteados ou quanto aos requisitos urbanísticos. A ausência dessa fase está a mostrar somente que o loteador poderá ele próprio apontar o traçado das ruas e avenidas, localizar os equipamentos urbanos e comunitários, os espaços livres de uso público, que serão ou não aprovados pela Prefeitura Municipal. A inovação na tramitação do pedido de loteamento é a existência de duas fases administrativas: a primeira com a fixação das diretrizes e a segunda fase - a da aprovação do projeto de loteamento. A fixação das diretrizes para o loteamento se fará pela Prefeitura Municipal tendo em vista não só o seu planejamento como o planejamento estadual (art. 7a). Essas diretrizes não têm por fim abranger todo o Município, mas se destinam concretamente para o loteamento pretendido. Essas orientações não são imutáveis, pois podem ser alteradas dois anos após sua prolação. Isto se harmoniza com o cronograma para a execução das obras no loteamento, que pode ter a duração máxima de quatro anos (arts. 1-, parágrafo único, e 18, V). 8. Execução de obras pelo loteador - Intervenção do Ministério Público e ação da Prefeitura Municipal •„-. Após a aprovação do loteamento o loteador deverá submetê-lo ao Registro Imobiliário no prazo máximo de 180 dias, sob pena de não validade da aprovação, isto é, da sua caducidade. A legislação municipal deverá prever (e se não o fizer aplica-se a lei federal) a execução das obras do loteamento que, incluirão, no min1' mo, as vias de circulação, a demarcação dos lotes, quadras e logradouros públicos e as obras de escoamento das águas pluviais como responsabi' lidade exclusiva do loteador. O Município não poderá aceitar fazer essas obras às suas expensas. Conforme se vê no art. 18, V, a Prefeitura Municipal junto com o ato de aprovação do loteamento expedirá uH1 I L 21. A nova redação do art. 8a dada pela Lei 9.785/99 amplia a dispensa da f das diretrizes para os Municípios "cujo plano diretor contiver diretrizes de urbaniza11 para a zona em que se situe o parcelamento". . l. ;.:: '. . PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 405 rtno de verificação de execução das obras mencionadas ou aprovará cronograma para a execução dessas obras no prazo mínimo de quatro anos, juntando-se obrigatoriamente instrumento de garantia para a execução das obras. A inexecução das obras (quando for concedido o prazo de dois anos) acarretará para o adquirente o dever de suspender o pagamento das prestações restantes e notificar o loteador para regularizar o loteamento. O loteador, também, poderá ser notificado pelo Ministério público ou pela Prefeitura Municipal. Essa notificação não é judicial, mas medida de ordem administrativa. Suspenso o pagamento, o comprador do lote deverá (e não poderá) depositar as prestações devidas junto ao Cartório do Registro de Imóveis competente, sem necessidade da intervenção de advogado. O Cartório mencionado será o responsável pelo depósito em estabelecimento de crédito. Os pagamentos depositados na forma apontada só poderão ser levantados em dois casos: pelo loteador, se comprovar a regularização do loteamento; e/ou pela Prefeitura Municipal, com a execução das obras não realizadas pelo loteador ou com a correção das mesmas. De alta importância a possibilidade da ação administrativa visando evitar "lesão aos padrões de desenvolvimento urbano" e defender "os direitos dos adquirentes dos lotes". De outro lado, a Lei 6.766/79 ensejou à Administração os meios financeiros de realizar essa operação urbanística, dando-lhe o direito de levantar as prestações depositadas a "título de ressarcimento das importâncias despendidas com equipamentos urbanos ou expropriações necessárias". Assim, evita-se o loteamento clandestino e abusivo, pois a Municipalidade é detentora de meios legais, rápidos e eficazes, destinados a corrigir as infrações. Se para a fase inicial de notificação o procedimento não é necessariamente judicial, já para o levantamento das prestações instaurar-se-á processo judicial com as citações devidas e audiência do Ministério Público (art. 38, § 32). A não execução das obras do loteamento caracterizará o crime contra a Administração Pública previsto no art. 50,1, da Lei 6.766/79. Havendo inobservância das determinações constantes do ato administrativo de licença do loteamento o crime será o do inc. II do art. 50. A pena será reclusão de um a quatro anos e multa de cinco a cinqüenta vezes o maior salário mínimo da região. . - , -. • 9icidade do procedimento O fi r acesso do público aos documentos apresentados nas fases de Ção das diretrizes, aprovação e registro do loteamento só realmente 406 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO será levado a efeito, quando houver publicidade. O segredo é uma exce ção na vida administrativa. Sobre a quase totalidade dos atos adminis trativos deve reinar a luz do conhecimento público, que ajuda o administrador a acertar e a errar menos. A Lei 6.766/79 não previu o modo de se dar publicidade às duas fases perante a Administração municipal. Na fase do registro imobiliário está determinada a publicação pela imprensa, por três dias consecutivos. Nas Capitais a publicação se fará no Diário Oficial e num dos jornais de circulação diária. Nos demais Municípios a publicação se fará apenas num dos jornais locais, se houver, ou não havendo, em jornal da região (art. 19, § 3a). O art. 22 do Decreto-lei 58/37 já previa esse tipo de publicação. Perante o Cartório Imobiliário poderá o processo de loteamento e os contratos serem examinados a qualquer tempo e por qualquer pessoa, independentemente do pagamento de custas e emolumentos (art. 24). As leis municipais e estaduais, ao reformularem e adaptarem sua legislação à federal, terão uma ótima oportunidade de introduzir a publicação na imprensa local ou regional também nas fases transcorridas perante as Prefeituras Municipais. Dessa forma, ganhar-se-á tempo, evitando-se que a reclamação ou impugnação ao loteamento se faça somente na fase do registro imobiliário. Doutra parte, abrir-se-á válida ocasião para que os munícipes participem do desenrolar dos negócios públicos. 10. Impugnação e ação judicial contra a aprovação e o registro do loteamento A Lei 6.766/79 previu como se desenvolverá a impugnação na fase do registro. Não o fez com referência às fases do pedido de fixação das diretrizes e de aprovação do projeto de loteamento, restando consultarse a legislação municipal e estadual. O oficial do Registro Imobiliário além dos documentos previstos no art. 18 verificará se houve a "anuência prévia dos Estados" de acordo com a legislação estadual. Se o oficial de Registros de Imóveis entender insuficiente a documentação apresentada, suscitará dúvida pe' rante o juiz competente. Aliás, se registrar o loteamento sem a aprovação dos órgãos competentes, cometerá crime punido com detenção de um a dois anos e multa de 5 a 50 vezes o maior salário mínimo vigente no País, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis (art. 52). Havendo impugnação de terceiros, o oficial intimará o requerente (loteador) e a Prefeitura Municipal. Se não houver manifestação no pra' PARCELAMENTO DO SOLO URBANO 407 acão, , cinco dias, o processo de registro será arquivado, isto é, não será Z° 1'zado o registro do loteamento. Havendo a manifestação dos intima-rea 0 processo será remetido ao juiz competente, que ouvirá o Ministé-público. Quando a matéria não exibir alta indagação, o juiz decidirá Ü nlano ou após instrução sumária. "É o julgamento realizado ou pelo tz Corregedor do Cartório de Registro de Imóveis ou pelo Juiz da V ra dos Registros Públicos." Contudo, sendo a matéria de maior inda-cão, o interessado deverá procurar as "vias ordinárias". Há de se distinguir essa ação judicial daquela prevista no art. 45 da lei enfocada. O que se analisa é a ação destinada a impedir ou a aprovação do loteamento pela Prefeitura Municipal ou o registro no Cartório do Registro de Imóveis. A ação referida no art. 45 pressupõe o loteamento já aprovado e registrado e destinase a impedir construção em desacordo com as restrições legais ou contratuais. É de cogitar-se sobre quais as partes legítimas para impugnar a aprovação do loteamento pela Prefeitura Municipal e que tipo de ação judicial pode ser utilizada. Como já vimos na fase da aprovação do loteamento deverão ser analisados os terrenos em que se pretende implantar o loteamento. Em seguida serão designados os espaços livres de uso público (áreas verdes etc), equipamentos comunitários e urbanos etc. Não houve, ainda, venda de lotes (a menos que se trate de regularização de um loteamento clandestino). Assim, estão presentes o loteador, o Poder Público e os cidadãos. Há um inegável interesse público para os cidadãos em fiscalizar a qualidade do loteamento. A ausência de condições sanitárias e a ação os elementos poluentes terão conseqüências não só sobre os comprazes de lotes, mas sobre toda a comunidade. Por isso, qualquer cida-°> 'ndividualmente, ou através de associações (espera-se a abertura . "ossos Tribunais para esse tipo de ação) poderá propor ação ordiná-e anulação do ato administrativo, quando se configure o desvio da Cidade pública. ob ' acao popular ou ação civil pública se os Municípios não Que ern ° respeito da faixa non aedificandi ou se executarem obras açg H ern ao loteador. Haverá lesão ao bem público, considerando-se a Públi C lncorPoraÇão de áreas indiscutivelmente vocacionadas a serem s ou a serem servientes do interesse público. c'as n ' ,m excelentes qualidades. A prática irá mostrar suas deficiên-ni sPIrito público não só dos loteadores como dos políticos e admirCS vera de prevalecer, apoiado pela lucidez dos juristas e pela e dependência do Poder Judiciário. .'/'.' !'' > Capítulo tu JJ; PROTEÇÃO DAS PRAÇAs E DOS ESPAÇOS LIVRES 1. Conceito e função das praças O Código Civil brasileiro não só utiliza o termo "praça", como classifica o bem como público, definindo sua natureza - bem de uso comum do povo (art. 99,1). No livro Cidade Brasileira, Murilo Marx assinala que "logradouro público por excelência, a praça deve sua existência, sobretudo, aos quadros de nossas igrejas. Se tradicionalmente essa dívida é válida, mais recentemente a praça tem sido confundida com jardim. A praça como tal, para reunião de gente ou para o exercício de um sem-número de atividades diferentes, surgiu entre nós, de maneira marcante e típica, diante de nossas capelas ou igrejas, de conventos ou irmandades religiosas". Mas cumpre também apontar que "praças cívicas" foram implantadas, indicando o autor a importância de três praças - a de Salvador ("reunia a Casa da Câmara e a Cadeia, o paço do Governador da Colônia, a Relação, os negócios da fazenda e a alfândega"), a atual Pra?a XV de Novembro - Rio de Janeiro, e a praça dos Três Poderes em Brasília. Critica, enfim, o desvirtuamento das praças - como a PraÇa Roosevelt de São Paulo -, dizendo que a "área comum é um direito dos cidadãos, um convite aos mais ricos intercâmbios que a vida urban propicia".' Os dicionários registram o termo "praça" como de origem latina platea. Dauzat indica que o termo teria o inicial significado de r larga". Interessante notar que o termo "praça" era usado sem o n° "pública", pois como mostra Antônio Geraldo Cunha "no Portco medieval já se documenta a locução adverbial "em praça" - em put) (século XIV).2 De outro lado, a função sanitária da praça é assir>a 1. Cidade Brasileira, 1980. 2. Dictionnaire Etymologique; e Antônio Geraldo Cunha, Dicionário da Língua Portuguesa. , , .... ... mc' PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 409 Caldas Aulete: "lugar público, grande largo, ordinariamente cerca-H de edifícios para embelezamento de uma cidade, vila, etc, e como eio higiênico para melhor circulação do ar e plantação de árvores".3 2 Defesa da saúde - Uma das funções da praça e dos espaços livres Gomes-Ferrer pondera que "o crescimento das cidades, o surgimento dos subúrbios, a carência de condições sanitárias adequadas para o normal desenvolvimento da vida humana dará lugar à atenção do legislador. Com efeito, uma das razões que dava lugar à deficiência destas condições sanitárias era a falta de espaços livres: por isso a intervenção administrativa se produzirá por razões sanitárias".4 Interessa constatar o aspecto sanitário das praças, pois desde já, antes mesmo da previsão do Direito Urbanístico como matéria federal, a questão já é de competência federal e não somente municipal (art. 24,1, da CF). A EC 1/69 previu que o Direito federal é prevalente no que diga respeito às normas gerais de proteção da saúde. Assim, prevalente sobre o Direito Municipal o que está disposto pelo Código Civil brasileiro e pela Lei de Parcelamento do Solo Urbano sobre praças e espaços livres. Na Constituição de 1988 a defesa da saúde compete — na parte legislativa — de forma concorrente à União e aos Estados (art. 24, XII), mas a prevalência da norma gera! federal foi mantida (art. 24, § 4E). Nas praças, jardins e espaços livres públicos os banheiros deverão ter, pelo menos, um sanitário e um lavatório que atendam às especificações das normas técnicas da Associação Brasileira de Normas TécniCas-ABNT com referência ao acesso de pessoas portadoras de deficiência °u com mobilidade reduzida.5 • 4 praça - Bem de uso comum do povo JNas Institutas de Justiniano encontramos "quae vel in nostro inionio vel extra patrimônio habentur. Quaedam enim naturali iure qu Unia sunt omnium, quedam publica, quaedam universitatis, adn am nunus> pleraque singulorum, quae variis, ex causis cuique nOss ntUr" (referindo-se a coisas "destas, umas podem fazer parte do Patrimônio, outras lhe são estranhas. Pois certas são comuns a y 4 'Ci0'w'10 Contemporâneo da Língua Portuguesa, 22 v. , s conas Verdes y Espacios Libres como Problema Jurídu o. Lei 10.098, de 19.12.2000 (DOU de 20.12.2000, pp. 2 e 3). 410 . DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ;; 'r todos por direito natural, certas são públicas, certas pertencem a uma universidade, certas não têm dono, certas pertencem a particulares, qUe as adquirem por várias causas"). "Et quidem naturali iure communia sunt omnium haec: aêr et aqua profuens et maré et per hoc litora rrtaris" ("por direito natural são comuns todas as coisas seguintes: o ar, a água corrente, o mar e o seu litoral"). "Universitatis sunt, non singulorum veluti quae in civitatibus sunt theatra, stadia et similia et si qua ali sunt communia civitatium" ("pertencem à coletividade, e não a particulares as coisas, por exemplo, de uma cidade, como os teatros, os estádios e quaisquer outras semelhantes e comuns que elas possuam").6 O Código Civil brasileiro previu três tipos de bens públicos: os de uso comum do povo, os de uso especial e os dominicais. Diferenciou-os de modo nítido, pois os dominicais constituem o patrimônio da União, dos Estados ou dos Municípios como objeto de direito pessoal ou real. Os bens de uso especial são destinados ao serviço público. A lei exemplificou os bens de uso comum do povo com a utilização da expressão "tais como". Outros bens poderão ser enquadrados na categoria de bens de uso comum do povo, como o foram os parques nacionais pelo Decreto federal 84.017, de 21.9.1979 (art. lü, § 2a). Entretanto, os bens que estão mencionados no Código Civil não dependem de outra regra federal. As praças aí estão mencionadas, ao lado dos mares, rios, estradas e ruas. Bens como o mar e os rios são destinados já pela natureza para uso comum, outros o são pela vontade humana, em conseqüência da vida em cidades, como as ruas e praças. O bem público "do povo" (art. 99,1, do CC/2002) merece receber tratamento jurídico diverso dos outros bens públicos. Com sabedoria, Paolo Maddalena assevera: "o pertencer e o uso público do bem público tendem a coincidir, quase como na democracia romana; como já se viu o termo publicus indicava seja pertencente ao populus, seja de uso pU" blico". Isto quer dizer, em outros termos, que o ordenamento positivo (no caso verdadeiramente norma constitucional) prevê, não só que a Administração gestione os bens públicos da Coletividade, mas que nao se transforme em proprietária iure privatorum". Massimo S. Giannm acentua que o Estado somente intervém nos bens de uso comum ve çommunes omnium) através do "poder de polícia, com a finalidade que sejam respeitadas as regras de convivência".7 _ , Sobre o papel do Estado na história, válido é trazer-se a reflexão Bertrand de Jouvenel: "vemos o Estado surgir sob a forma de um d 6. A. Correia e outro, Manual de Direito Romano, 2a ed. jtí 7. Paolo Maddalena, Responsabilità Amministrativa, Danno Publico e deli'Ambiente; e Massino S. Giannini, / Beni Publici. ..; .... -. . . .....; ...... PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 411 otismo real-divino. O Estado não tem deveres, todos os deveres cabem os súditos". "Na época republicana da Grécia e de Roma surge um rincípio novo, aquele do bem comum, o Estado administrador de inteesses comuns. Esta é a concepção moderna do Estado".8 d Aspra9as e a legislação de parcelamento do solo urbano O Decreto-lei 58/37 houvera previsto que "a inscrição torna inalienáveis, por qualquer título, as vias de comunicação e os espaços livres constantes do memorial e da planta". Waldemar Loureiro comenta que "o dispositivo encerra medida de maior relevância. Nos lotea-mentos anteriores à vigência do Decreto-lei 58/37, freqüentemente os proprietários, estimulados pela procura de terrenos, diminuíam os espaços reservados para logradouros e ajardinamentos, quando os não suprimiam para acrescer alguns lotes mais à venda. A lei põe termo ao abuso: inscrito o loteamento, as vias de comunicação e os espaços livres constantes do memorial e da planta, tornam-se inalienáveis, por qualquer título (art. 3a), vale dizer, tornam-se bens públicos nos precisos termos dos arts. 66,1 e II, e 67 do Código Civil"9 (arts. 99,1 e II, e 100 do Código de 2002). A Lei 6.766, de 19.12.1979, que dispôs sobre o parcelamento do solo urbano, previu que "os espaços livres de uso comum, as vias e praças, as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo, não poderão ter sua destinação alterada pelo loteador, desde a aprovação do loteamento, salvo as hipóteses de caducidade da licença ou desistência o loteador, sendo neste caso, observadas as exigências do art. 23 desta ei • O art. 22 da lei em exame preceitua: "desde a data do registro do eamento, passam a integrar o domínio do Município as vias e praças, espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equientos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo", ter lnte8ração das praças no domínio municipal se faz no intuito de pra"601 as acmimistre, mas o Município não age como proprietário das dpc s ou lure privatorum, no dizer de Maddalena, mas como gestor utsses bens. dever~ ° se deixa ao Município escolher quais os bens públicos que esPecif S6r re§'strados. O registro em Cartório se fará conforme estiver lcado no "projeto e no memorial descritivo" (art. 22 da Lei 6.766/ 9 HeEstado de s- Paulo, "Suplemento Cultural" 399, ed. 5.3.1988. arts. 99 "íro da Propriedade Imóvel, 6a ed., v. 2 (os artigos citados passaram a ser os l- e 100 do CC brasileiro - Lei 10.406, de 10.1.2002). ' 412 ;!ífv<! DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO 79). A lei federal referida estabeleceu que "as áreas destinadas a te ma de circulação, implantação de equipamento urbano e comunitário bem com os espaços livres de uso público, serão proporcionais à den$j' dade de população prevista para a gleba" (art. 4a, I). Não estabeleceu a norma federal qual a proporção, por exemplo, entre espaços livres destinados ao uso público e a densidade de população prevista para a gleba Deixou para as normas estaduais e municipais essa tarefa. Contudo, nã0 deixou facultativa a existência de praças e de outros espaços livres, a previsão de praças é obrigatória, tanto que deverão elas ser indicadas no desenho apresentado às prefeituras municipais (art. 92, § Ia, IV). Os espaços livres indicam que outros espaços estão ou poderão estar ocupados ou edificados. Catherine de Vilmorin afirma que "o espaço não construído e de utilizações múltiplas no meio urbano tem uma significação com referência às funções urbanas tais como foram definidas pela Carta de Atenas: habitar, trabalhar, recrear-se e circular". Mas, muito mais ampla é a idéia de "espaço aberto", pois nas cidades com risco de crescimento concêntrico do tipo mancha de óleo, é importante manter espaços intersticiais abertos sobre o campo, preservar zonas de descontinuidade e zonas de espaços de "verdadeira natureza".10 5. A praça e sua destinação Os espaços públicos (vias, jardins etc.) não são expropriados pelo Município, mas transferidos gratuitamente pelo proprietário do loteamento; é que o Município tem competência vinculada para gerir essa parte do loteamento. O vínculo legal é aquele constante do memorial descritivo e do desenho apresentado, documentos esses que já haviam sido submetidos à aprovação do próprio Poder Público municipal. Retirou-se de modo expresso o poder dispositivo do loteador sobre as praças, as vias e outros espaços livres de uso comum (art. 17 da Lel 6.766/79) mas, de modo implícito, vedou-se a livre disposição desses bens pelo Município. Este só teria liberdade de escolha, isto é, só poderia agir discricionariamente nas áreas do loteamento que desapropriass e não naquelas que recebeu a título gratuito. Do contrário, estaria Município se transformando em Município-loteador através de verda deiro confisco de áreas, pois receberia as áreas para uma finalidade depois, a seu talante as destinaria para outros fins. Nesse sentido foi o voto do Min. Adhemar Maciel em julgamen no STJ, que decidiu dizendo: "o objetivo da norma jurídica é vedar 10. La Politique des Espaces Verís. PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 413 corporad°r a alteração das áreas destinadas à comunidade. Portanto, ' ão faz sentido, exceto em casos especialíssimos, possibilitar à Admi-"stração fazê-lo. No caso concreto, as áreas foram postas sob a tutela HaAdministração municipal, não com o propósito de confisco, mas como forma de salvaguardar o interesse dos administrados, em face de possíveis interesses especulativos dos incorporadores. Ademais, a importância do patrimônio público deve ser aferida em razão da sua destinação. Assim, os bens de uso comum do povo possuem função ut universi. Constituem um patrimônio social comunitário, um acervo colocado à disposição de todos. Nesse sentido, a desafetação desse patrimônio prejudicaria toda uma comunidade de pessoas, indeterminadas e indefinidas, diminuindo a qualidade de vida do grupo. Não me parece razoável que a própria Administração diminua sensivelmente o patrimônio social da comunidade. Incorre em falácia pensar que a Administração onipotentemente possa fazer, sob a capa da discricionariedade, atos vedados ao particular, se a própria lei impõe a tutela desses interesses".11 O vínculo do bem de uso comum à sua destinação tem como origem o art. 100 do CC: "Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar".12 "A incomerciabilidade consiste na exclusão da esfera de relações jurídicas privadas por inidoneidade não estrutural do bem, mas funcional, em relação com o fim, como afirma Sabino Cassese. Entre os (bens) absolutamente indispensáveis estariam os de uso comum do povo ou de uso especial, que, enquanto vinculados a um interesse público não poderiam ser divertidos para outros fins", ensina Diogo de Figueiredo Moreira Neto. Por isso os juizes da Corte de Cassação da França — Aubry e Rau - afirmaram: "tanto quanto dure a destinação à qual elas estão aretadas, as coisas fazendo parte do domínio público não se tornam 0 jeto de um verdadeiro direito de propriedade. Elas não estão verda-(l. lramente no patrimônio de ninguém e ficam excluídas do comércio". regra da não subtração à destinação ("non sottraibilità alia desti-fat lC-f?' ~ Sar>dulli) é norma imperativa cuja violação dá lugar a um ilícito - é afirmação que se encontra sempre na doutrina", indica Vlcenzo Cerulli Irelli." lare 28-058-SP, recte.: Prefeitura Municipal de Rio Claro, recdos.: Sociedade Pút>licn/<:De de Defesa do Meio Ambiente (adv.: Drs. Hõfling e N. Laiun) e Ministério 0/iP, 13.10.1998. . Lei 10.406, de 10.1.2002. °reira Net""0 Cassese'l Beni Pubblici - Circolazione e Tutela; Diogo de Figueiredo C'W' Frarf- °' Curso de Direito Administrativo, 3a ed.; Aubry e Rau, Cours de Droit íms' 6a ed- v. 2; e Sandulli, Proprietà Pubblica e Diritti Coletivi. . - 414 aa DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO :-í Assim, quando o art. 100 do CC brasileiro entende que os be públicos podem perder a inalienabilidade nos casos e na forma que a 1 prescrever, a alienação ou o comércio dos bens públicos só pode se entendida corretamente se se levar em conta a diferenciação feita pe[0 art. 99 do próprio CC. Essa diferenciação está assentada fundamentalmente na destinação dos bens. Como alienar o mar, os rios, as estradas e as praças (art. 99,1, 0 CC), enquanto estiverem sendo utilizados pelo povo, sem contrariar a própria natureza desses bens de uso comum? Na realidade não só a venda como concessões privatizam os bens, colocando-os exclusivamente a serviço de uns poucos. Por isso, Cretella Júnior salienta como a "inalienabilidade é traço típico dos bens de uso comum do povo e dos bens de uso especial. Diz-se, em outras palavras, que os bens de uso comum do povo e os de uso especial são "peculiarmente inalienáveis" e os dominicais são "peculiarmente alienáveis".14 Existindo a destinação de uso comum do povo, inalienável é o bem dessa categoria. Continua ensinando Pontes de Miranda: "a apropriação da onda como gerador de força é possível, respeitado o Direito Público; só a lei especial, porém, pode permiti-la. Não assim o direito de uso comum do povo e o direito de uso especial: donde só a mudança de classificação para o art. 66, III, permitir a apropriação".15 Acrescenta, ainda, "o titular, no art. 66, I, é o povo" (o artigo citado é do Código Civil de 1916, correspondente ao art. 99 do CC/2002). A apropriação, portanto, dos bens do art. 99,1, só seria possível, segundo o autor "quando houvesse mudança da classificação". Assim, legítimo entender-se que enquanto os bens estiverem "classificados" como bens de uso comum do povo, não pode haver apropriação. Ora, a classificação não é ato arbitrário, nem discricionário - a finalidade do bem público é que a faz. e não a vontade do legislador. Contemporaneamente, pondera Toshio Mukai: "enquanto tal destinação de fato se mantiver, não pode a lei efetivar a desafetação sob pena de cometer lesão ao patrimônio público da comunidade", acrescentais do: "se a simples desafetação legal fosse suficiente para a alienação dos bens de uso comum do povo, seria possível, em tese, a transformça em bens dominicais de todas as ruas, praças, vielas, áreas verdes, etc. d um Município e, portanto, de seu território público todo, com a s quente alienação (possível) do mesmo, o que, evidentemente, seria 14. Direito Administrativo Municipal. 15. Tratado de Direito Privado - Parte Geral, v. 2 (o art. 66 do CC de 1916 tra" formou-se no art. 99 do CC/2002, guardando os mesmos incisos). PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 415 toda a lógica jurídica, sendo mesmo disparate que ninguém, em sã nsciência, poderia admitir".16 Na prática, difícil é encontrar-se o mau c, jnistrador ou o mau legislador agindo com tal clareza no desvirtua8 ento dos bens de uso comum do povo: o grande perigo é a ação a n?o Praz0 ~~ noJe uma Praca> amanhã um espaço livre, depois de alum tempo outra praça, finalizando-se por empobrecer totalmente a comunidade. :•/ ò ó Prevalência do interesse "uso comum do povo" ',.. sobre outros interesses A ausência de planejamento adequado de nossas cidades, a retenção abusiva de lotes urbanos - formandose bancos de lotes -, a alocação imprópria de recursos públicos podem conduzir à escassez de espaços para localizar creches, hospitais, fóruns ou outros tipos de edifícios públicos ou de interesse público. Ora, em algumas cidades brasileiras, a inércia, a complacência ou fraqueza de muitos possibilitou que Municípios desvirtuassem seus espaços livres. Oportuno, pois, trazer a experiência de alguns países, cujos territórios são menores do que o do Brasil e que, se tivessem agido com voracidade e imprevisão, teriam diminuído seus espaços livres. Na Itália, salienta Raffaele Resta, é característica da dominialidade a necessidade e a exclusividade da destinação de um bem a uma fun-Çao pública, sendo evidente que não possa um outro interesse público merecer consideração prevalente sobre o interesse público da destinação".'7 Na Espanha, o julgado 36.464, de 8.5.1969 - do Conselho de Esta-0 ~ afirmou que "suposto exista um destacado interesse público na onservação das previsões do plano de matéria de espaços livres, para esqualificá-]Os será necessário demonstrar - de acordo com a doutrina R por este Tribunal em seu julgado de 19.10.1967 -que exista ContraPos'Ção de fins de interesse geral na manutenção do espaço C consecucao de outro fim de interesse geral. Isto é, que exista t rea' não fictlc'°) entre a consecução dos fins de interesse Púb] corn'C° de ta' f°rma 1ue a realização de um deles seja incompatível consecução do outro; demonstrado esse conflito real dever-se-ão na aUsên . P°ss'bilidade jurídica de desafetação legal de bens de uso comum do povo Urbaní de desafetação de fato", RDP 75/246-249. V., do autor, Direito e Legislação '"'""«taii/.p .302 "mnientario dei Códice Civille delia Proprietà, 4a ed. ...... > 416 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO pesar as razões de interesse geral em conflito e decidir a favor do int resse prevalente. Só no caso de que exista um interesse prevalente ao / conservar os espaços livres é que será procedida sua desqualificação" E a mesma decisão, conforme a citação de Gomez-Ferrer, assinala qUe depois do exame das primeiras razões do interesse geral, cumpre exa' minar "se se cumpriram os requisitos legais de conservação do mínim0 de dez por cento de área verde na zona atualmente afetada pela proposta de transformação de uso". Importa destacar que o Conselho de Estado espanhol não se contenta em que, numa determinada localidade, guarde-se somente o mínimo legal de 10% de área verde, pois exige, ainda exaustiva prova para que se possa modificar a área existente além do mínimo legal. Na França, diz o art. 130-1 do Código de Urbanismo: "os Planos de Ocupação dos Solos (pos) ... podem classificar como espaços arborizados, os bosques, as florestas, parques a serem conservados, protegidos ou a serem criados ...", sendo que a classificação proíbe qualquer mudança de afetação ou ocupação do solo "que possa comprometer a conservação, a proteção ou a criação de áreas verdes". Esclarece Robert Savy que "é possível classificar parques e jardins privados urbanos; não se distingue entre espaços públicos e privados, porque não é jamais supérfluo defender as autoridades públicas contra elas mesmas; não sendo, também, necessário que o terreno esteja plantado ou seja livre quando da classificação, porque o art. 130-1 permite a classificação como espaços arborizados ... a serem criados". Acrescenta, ainda, o professor francês: "não é fácil escapar das exigências resultantes da classificação. Nenhuma derrogação é possível e nem pequenas adaptações "Há um conjunto de disposições que traduz a vontade de assegurar a efetividade das medidas de proteção e de proteger a Administração contra a tentação de que ela poderia experimentar reduzir a dimensão da proteção das áreas verdes".18 No Brasil precisamos valorizar a classificação dos bens de uso comum do povo. Caso contrário, teríamos que inflacionar a aplicação dos instrumentos jurídicos, instituindo um procedimento de tombamento par cada praça. Ora, a praça não deve ser conservada porque é uma paisa gem notável, mas, simplesmente - e basta - porque é uma PraÇaan Constituição do Estado de São Paulo, de 1989, dispôs em seu art. i° ' VII: "as áreas definidas em projeto de loteamento como áreas verdes institucionais não poderão, em qualquer hipótese, ter sua destinaÇa fim e objetivos originalmente estabelecidos, alterados". 18. Droit de 1'Urbanisme, Ia ed. PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 417 Ministério Público, associações ambientais cidadãos na defesa judicial das praças A ação civil pública surgiu em 1985 e já mostrou que é um erícien-instrumento de prevenção e de reparação do dano ambiental. A Lei 7 347, de 24.7.1985, pressupõe - em cada cidade - um Ministério Púhiico adestrado, não omisso, e livre de amarras frente aos interesses locais "pequenos". O promotor de justiça haverá de ser o guardião das oraças e dos espaços livres de uma comunidade. O título de "curador do meio ambiente" não pode ficar como ornamento, pois, o "curador" tem sua origem no século XV como "pessoa que tem, por incumbência legal ou judicial, a função de zelar pelos bens e interesses dos que por si não o possam fazer".19 Ora, o promotor de justiça intervém para defender as praças e espaços livres não porque os cidadãos não o possam fazer, mas pelo vulto do interesse social existente e, também, pela presença de forças poderosas trabalhando contra os bens de uso comum do povo. Para isso, é indispensável que o Ministério Público tenha claras garantias constitucionais. As associações de defesa do ambiente e do patrimônio cultural passam a ter meio de agir perante o Poder Judiciário somente em 1985. Foi um notável avanço do nosso sistema processual, que não pode ficar sem uso. A função de utilidade pública de uma associação é agir e não ficar inerte ou acumpliciada com a destruição ou a mutilação dos bens de uso comum do povo. Tendo a associação a finalidade genérica de proteger o ambiente ou atuar na sua proteção, não se pode negar à entidade o direi-o de propor ação em qualquer parte do território nacional. A lei não mitou a capacidade postulatória das associações, entretanto seus estautos Poderão fazê-lo. A Lei 7.347/85 prestigiou, pois, as associações, as enxergando um meio permanente e estruturado para a proteção os interesses coletivos. lít' cadãos, isto é, os eleitores - no exercício de seus direitos poço ?S ~' P°derã° ingressar em juízo para defender as praças e os espa-p 1Vres. Como é sabido, na ação popular não se tem necessidade de da CF * 1CSã° de interesse individual prejudicado. Pelo art. 5a, LXXIII, é js ' e garantia constitucional que "o autor, salvo comprovada má fé, iDe ° c'e custas judiciais e do ônus da sucumbência". A ação popular, tor a Ser)do julgada improcedente, não acarretará para o cidadão au-ngação de pagar as despesas judiciais, nem os honorários do r". "Y 19 A. Cunha, ob. cit. 418 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO advogado do réu, salvo se o autor tiver agido com comprovada má-f -Merecem elogios aqueles que vierem a utilizar da ação popular para ' defesa dos bens de uso comum do povo, pois a experiência tem de monstrado que é um procedimento pouco utilizado, que exige excepci0 nal coragem (os adversários são poderosos, demanda emprego de tem. po e fica na dependência de encontrar-se advogado). 8. O Poder Judiciário e a defesa das praças e dos espaços livres A independência do juiz e dos tribunais há de ecoar com intensidade na conservação dos bens de uso comum do povo. A sensibilidade social dos juizes há de encaminhar uma nova construção jurisprudencial, abandonando-se o posicionamento de doutrinadores que não ajudaram o povo a viver melhor. Muitas vezes o julgador enfrentará situações difíceis como quando a pretendida desvirtuação dos bens de uso comum destina-se, por exemplo, à construção de casas populares. Não se pode perder a visão de que no caso - só uma parcela da população será beneficiada. Além disso, o espaço livre representa, também, uma escola ao ar livre, onde se aprende a convivência constante - base imprescindível do sistema democrático. Desde tenra idade como até a velhice, contemplar uma flor, andar entre as árvores, ir a um museu e fruir a beleza de um quadro, não podem ser deixados somente para uma minoria. A extinção ou a mutilação dos bens de uso comum conduzirão a essa situação, como salienta o jurista espanhol Martin Mateo: "múltiplos organismos agem à custa de hipotecar gravemente o futuro das cidades criando grupos de edificações des-favoravelmente situados, só resolvendo o problema imediato, sem Vre' ver a satisfação das necessidade mais complexas ...".2U As medidas liminares serão de grande utilidade para evitar a consumação do dano às praças e aos espaços livres. Na ação civil pública< tanto a obrigação de não fazer como a obrigação de fazer representai11 instrumentos valiosos para se tentar obstaculizar o desvio da j como para se procurar reconstruir o bem lesado. Por fim, anoto a sábia lição de Maurice Picard: "O usus r~ era a característica da res publicae e isto se compreendia facilmente-romanos diziam que ninguém poderia adquirir direitos sobre os w publica e que estas coisas estavam extra commercium; para eles isso e 20. Cit. por A. Sanchez Blanco, La Afectación de Bienes ai Domínio Públi* 'co- PROTEÇÃO DAS PRAÇAS E DOS ESPAÇOS LIVRES 419 narantia do Direito Público. Era o pretor que intervinha e que protegia a nteresse de todos contra toda a invasão".21 No Brasil, também se espera ° se necessita que os atuais pretores - os juizes - protejam o "interesse de " contra toda a invasão das praças e dos espaços livres.22 Traité Pratique de Droit Civil Français par Planiol & Ripert, 2J ed., v. 3. ° apda . de P SUa ?1 C- Civi1' P°r unanimidade' na AP- 150.340-1/5 (aptes.: Rioclarense de Defesa do Meio Ambiente-soRiDEMA e Ministério Público, ÍC'pa'idade de Ri° Claro), mencionando o ponto de vista aqui expendido, deu provnÍC'pa'idade de Ri° Claro), mencionando o ponto de vista aqui expendido, c°nstruç~ment0 a aPelaÇao Para obrigar a Municipalidade a indenizar, com referência à de Parcel*0 CaSaS P°Pulares' depositando-se no fundo próprio, e proibir a promoção 'sta" (reimlnt0 do sol° e a realização de obras, serviços e edificações no "Jardim Bela Plante 0 s CamP0S Mello). A Prefeitura Municipal interpôs o REsp 28.05 8-SP s TJ 0 s TJ não conneceu j0 recurso> por votação unânime, em 13.10.1998, re| --> H"c nao conneceu do ator o Min. Adhemar Maciel. TITULOVII .,«,.. , , , RECURSOS HÍDRICOS - LEI 9.433/97 Capítulo Único RECURSOS HÍDRICOS1 1. Fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos A Lei 9.433, de 8.1.1997, publicada no DOU de 9.1.1997, tem como ementa: "Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inc. XIX do art. 21 da Constituição Federal e altera o art. l2 da Lei n. 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei n. 7.990, de 28 de dezembro de 1989". Empregou-se a expressão "recursos hídricos na Constituição Federal. Não nos parece que esta locução deva traduzir necessariamente aproveitamento econômico do bem. Ainda que nao sejam conceitos absolutamente idênticos "águas" e "recursos hídricos > empregaremos estes termos sem específica distinção, pois a lei não o empregou com uma divisão rigorosa. Alguns Estados anteciparam-se à Lei federal 9.433/97, elaboran leis sobre recursos hídricos: São PauloLei 7.663, de 30.12.1991; Ce* -Lei 11.996 de 24.7.1992, Minas Gerais - Lei 11.504, de 20.6.1 Rio Grande do Sul - Lei 10.350, de 10.12.1994; Bahia -Lei 6.855, 12.5.1995, e Rio Grande do Norte -Lei 6.908, de 1.7.1996. 1. Paulo A. L. Machado, Recursos Hídricos - Direito Brasileiro e Interna0 São Paulo, Malheiros Editores, 2002. -. . .„.;,-. -.,,,.., .,„. cio""1- RECURSOS HÍDRICOS 421 i Água como bem de domínio público A Lei 9.433/97 inicia com a afirmação: "A água é um bem de do-io público". Essa declaração do art. l2,1, da lei em exame tem diver- implicações. i 1 1 A água é "bem de uso comum do povo" A água é um dos elementos do meio ambiente. Isto faz com que se aplique à água o enunciado no caput do art. 225 da CF: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo ...". Há diversidade de categorias de bens, pois a água é um bem corpóreo e o meio ambiente é um "bem incorpóreo de domínio público", como salienta a Juíza e Professora Lúcia Valle Figueiredo.2 Antes da promulgação do Código Civil brasileiro de 1916, manifestava-se a doutrina, na pena de José Antônio Pimenta Bueno, em sua obra Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império: "Domínio público — por esta denominação, comumente se indica a parte dos bens nacionais, que é afetada imediatamente ao gozo e serviço comum do povo, como as estradas, canais, rios navegáveis ou boiantes etc.".3 O Código Civil brasileiro, no seu Livro II, trata "Dos Bens". O Cap. Hl versa sobre os "Bens Públicos e Particulares". Diz o art. 99: "São bens públicos: I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; II - os de uso especial, tais como edifí!°s ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da Administra° Federal, Estadual, Territorial ou Municipal, inclusive os de suas arquias; III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pesr£as JUrídicas de Direito Público, como objeto de direito pessoal, ou al' de cada uma dessas entidades". Sjj . orr>o vemos, os "rios" sempre foram classificados, no Direito bra- °' Como bens de uso comum do povo, seguindo-se o Direito Ro-' Como se vê nas Institutas de Justiniano.4 1 3' "rso de Direito Administrativo, p. 479. 4 o10 de Jane'ro, Typografia Imp. e Const. de J. Villeneuve E.C, 1857. decretoú"e"oAdm'nistrativo Tema Água, coord. B. Cabral, Senado Federal, 1997. O utorga do Código das Águas é da lavra do Governo Provisório. A CF/34, no É 422 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O Código das Águas - Decreto 24.643, de 10.7.1934 - ampliOu dominialidade pública das águas. Veja-se a Exposição de Motivos / referido decreto, de autoria do Dr. Alfredo Valladão. ° A dominialidade pública da água, afirmada na Lei 9.433/97, ns transforma o Poder Público federal e estadual em proprietário da ágUa mas torna-o gestor desse bem, no interesse de todos. Como acentua n administrativista italiano Massimo Severo Giannini, "o ente público não é proprietário, senão no sentido puramente formal (tem o poder de autotutela do bem), na substância é um simples gestor do bem de uSo coletivo".5 Salientemos as conseqüências da conceituação da água como "bem de uso comum do povo": o uso da água não pode ser apropriado por uma só pessoa física ou jurídica, com exclusão absoluta dos outros usuários em potencial; o uso da água não pode significar a poluição ou a agressão desse bem; o uso da água não pode esgotar o próprio bem utilizado e a concessão ou a autorização (ou qualquer tipo de outorga) do uso da água deve ser motivada ou fundamentada pelo gestor público. A presença do Poder Público no setor hídrico tem que traduzir um eficiente resultado na política de conservar e recuperar as águas. Nesse sentido o art. 11 da Lei 9.433/97, que diz: "O regime de outorga de direito de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água". O Poder Público não pode agir como um "testa-de-ferro" de interesses de grupos para excluir a maioria dos usuários do acesso qualitativo e quantitativo às águas. Seria um aberrante contra-senso a dominialidade pública "aparente" das águas, para priva-tizá-las, através de concessões e autorizações injustificadas do Governo Federal e dos Governos Estaduais, servindo ao lucro de minorias. Se houver a pretensão de instituir-se um "leilão de águas", coffler' ciando-se o direito de outorga do uso do recurso hídrico, ao mesm0 tempo haverá de ser instituída uma "reserva hídrica" para os usos insiS nificantes e gratuitos e para a conservação do meio ambiente, em esp6 ciai da fauna aquática. O legislador brasileiro agiu bem ao considerar todas as águas domínio público" no sentido de "bem de uso comum do povo". O Pr° art. 18 das Disposições Transitórias, disse: "Ficam aprovados os atos do Governo PT -, sório, interventores federais nos Estados e mais delegados do mesmo Governo e e* j0 da qualquer apreciação judiciária dos mesmos atos e dos seus efeitos". A aprovaça Código das Águas, contudo, não o transformou em lei. 5. Istituzioni di Díritto Amministrativo, Milão, Giuffrè Editore, 1981, p- 561- í;'!í RECURSOS HÍDRICOS .;.-; 423 vfchel Prieur critica o sistema legal francês, dizendo que, "infelizmenpor ter faltado a ousadia de nacionalizar a água, como patrimônio letivo, os múltiplos regimes jurídicos subsistem em sua complexidaj e em sua imbricação, ainda que tenha sido elaborada a Lei das Águas, Je3dejaneirodel992".6 1 1 2 A água não é bem dominical do Poder Público {J O bem dominical é aquele que "integra o patrimônio privado" do Poder Público. O seu traço peculiar é a "alienabilidade", como aponta o Prof. José Cretella Júnior.7 Bem dominical difere, portanto, de bem dominial. Indique-se o art. 18 da Lei 9.433/97 para atestar que a água não faz parte do patrimônio privado do Poder Público, ao dizer: "A outorga não implica a alienação parcial das águas que são inalienáveis, mas o simples direito de uso". A inalienabilidade das águas marca uma de suas características como bem de domínio público. O art. Ia do Decreto 24.643/34 - chamado de Código das Águas -diz que "as águas públicas podem ser de uso comum ou dominicais". Vimos que, com o advento da Constituição Federal (art. 225) e da Lei 9.433/97 (arts. l2 e 18, cits.), essa parte do artigo do decreto de 1934 está revogada (art. 57 da lei mencionada), pois as águas públicas não podem ser dominicais. O Governo Federal e os Governos Estaduais, direta ou indiretamente, não podem tornar-se comerciantes de águas. A Lei 9.433/97 in-roduz o direito de cobrar pelo uso das águas, mas não instaura o direito de venda das águas. •í A abrangência da dominialidade pública das águas, r.ol Código Civil e Código das Águas. A questão da indenização 9 . .rezando a locução "a água é um bem de domínio público", a Lei Nã abrange todo tipo de água, diante da generalidade empregada, a £„ sPecificando qual a água a ser considerada, a água de superfície e dOtrra.su"ten"ânea, a água fluente e a água emergente passaram a ser de nmi° público. 7 n™" de l'Environnement, 3a ed., Paris, Dalloz, 1996. 107. ' lCl°nário de Direito Administrativo, 3a ed., Rio de Janeiro, Forense, 1978, p. 424 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO O Código Civil Brasileiro, do art. 1.288 ao art. 1.296 - a não s no art. 1.290 -, não se refere diretamente ao domínio das águas. Indire tamente, contudo, há reflexos sobre o direito de utilização das águas~ obrigando, em certos casos, a recepção de águas do prédio superior, oi! o direito de recepção de águas por parte de prédio inferior e a utilização de águas pluviais. O Código das Águas - Decreto 24.643/34 - previu o tema "Águas Particulares" em seu Livro I, Tít. I, Cap. III, afirmando em seu art. 8»-"São particulares as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as mesmas não estiverem classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns". Com a entrada em vigor da Lei 9.433/97, pode-se entender que essa disposição do decreto de 1934 contraria a nova lei e, por isso, conforme o seu art. 57, foi revogada. As nascentes situadas em terrenos privados, mesmo passando a ser públicas, poderão ser utilizadas pelos proprietários privados, com a finalidade do "consumo humano e da dessedentação de animais" (art. 1B, III, da Lei 9.433/97), sendo que o regulamento disporá sobre as "derivações e captações" insignificantes, quando é desnecessária a prévia outorga do Poder Público (art. 12, § Ia, II, da lei apontada). O domínio hídrico público deve dar acesso à água àqueles que não sejam proprietários dos terrenos em que as nascentes aflorem, àqueles que não estão em prédios à jusante das nascentes e àqueles que não são ribeirinhos ou lindeiros dos cursos d'água. As águas subterrâneas passam a fazer parte do domínio público em face dos arts Ia, I, 12, II, e 49, caput eme.V, todos da Lei 9.433/97, pois está sujeita a outorga pelo Poder Público a "extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo" e e considerada infração das normas de utilização de recursos hídricos subterrâneos "perfurar poços para extração de água subterrânea ou opera-los sem a devida autorização". As águas subterrâneas integram os bens dos Estados (art. 26,1, da CF). Aqüífero é a "formação porosa (camada ou estrato) de rocha per' meável, areia ou cascalho, capaz de armazenar e fornecer quantidades significativas de água".s Com a referida lei, notadamente o referido art. 12, II, houve a revoga ção do art. 96 do decreto de 1934, que diz: "O dono de qualquer f poderá apropriar-se por meio de poços, galerias etc. das águas que 8. Glossário de Termos Hidrogeológicos, Brasília, dnaee, 1983; e Glosscti10 Termos Usuais em Ecologia, São Paulo, Academia de Ciências do Estado de São Pal 1980. ..•..•.. , . ; RECURSOS HÍDRICOS 425 m debaixo da superfície de seu prédio, contanto que não prejudique roveitamentos existentes nem derive ou desvie de seu curso natural " uas públicas dominicais, públicas de uso comum ou particulares". Mão é mais possível apropriar-se das águas subterrâneas, passando a ser ível usá-las se houver outorga do órgão público e pagamento desse (art. 21,1, da Lei 9.433/97). No Brasil, as nossas Constituições republicanas sempre incluíram as correntes de água em terrenos de domínio da União e os rios que banhem mais de um Estado ou que sirvam de limites com outros países, ou dele provenham, como bens da União (art. 20, II, da CF/34; art. 36, b, da CF/37; art. 34,1, da CF/46; art. 4a da CF/67; art. 4a, II, da EC 1/69; eart. 20, II, da CF/88). Contudo, essas Constituições não colocaram todas as águas como bens públicos federais. Com referência aos bens dos Estados brasileiros, a Constituição Federal de 1988 diferenciou-se das anteriores Constituições, que se limitaram a utilizar os termos "rios" e "lagos" (art. 21, II, da CF/34; art. 37, b, da CF/37; art. 35 da CF/46; art. 5B da CF/67; art. 5a da EC 1/69; art. 5Ü da EC 16/80). A CF/88 em seu art. 26 diz: "Incluem-se entre os bens dos Estados: I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União". A redação ampla do art. 26,1, da CF/88 alarga significativamente o domínio dos recursos hídricos estaduais. A União conservou o que já vinha tendo por força das anteriores Constituições. Não houve qualquer disposição constitucional expressa no sentido de isentar os Estados do dever de indenizar os proprietários das águas particulares, ou seja, "as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, nuando não estiverem classificadas entre as águas comuns de todos, as pgUas Públicas ou as águas comuns" (art. 8a do Decreto 24.643/34 -°digo das Águas). t Tomanik Pompeu afirma que "desaparecem, sem qualquer vanI) I?m Prat'ca> as águas comuns, as particulares e as municipais (art. 26, vist CSta Sa'3er ° ue ° Poc*er Judiciário decidirá a respeito, tendo em con ta £arantia do direito de propriedade, estabelecida no mesmo texto nst«ucional (art. 5a, XXII)".» XVrraZ°a'''dac'e em sustentar-se que ° "direito adquirido" (art. 52, obtere '.da CF) socorre esses proprietários particulares no sentido de mdenizações dos Estados quando estes pretenderem o domínio ecursos Hídricos na Constituição de 1988", RDA 186/10, out./dez. 1991. 426 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO li das águas referidas no art. 8a do Código das Águas.10 Não se pode sim plesmente tentar introduzir no regime jurídico das nascentes privadas sistema da outorga e da cobrança do uso desse recurso específico pe]0 viés da "função social" da propriedade (art. 5a, XXIII, da CF/88). Houve um inegável esvaziamento do direito de propriedade (art. 5a, XXll da CF/88), que acarreta nesse caso a obrigação de indenizar ou de não cobrar a água utilizada. 1.1.4 Águas pluviais, dominialidade pública e Código das Águas Passaremos a transcrever as normas do Decreto 24.643/34 - Código das Águas - sobre águas pluviais. "Art. 102. Consideram-se águas pluviais as que procedem imediatamente das chuvas." "Art. 103. As águas pluviais pertencem ao dono do prédio onde caírem diretamente, podendo o mesmo dispor delas à vontade, salvo existindo direito em contrário. "Parágrafo único. Ao dono do prédio, porém, não é permitido: "I - desperdiçar essas águas em prejuízo dos outros prédios que delas se possam aproveitar, sob pena de indenização aos proprietários dos mesmos; "II - desviar essas águas de seu curso natural para lhes dar outro, sem consentimento expresso dos donos dos prédios que irão recebê-las." "Art. 104. Transpondo o limite do prédio em que caírem, abandonadas pelo proprietário do mesmo, as águas pluviais, no que lhes for aplicável, ficam sujeitas às regras ditadas para as águas comuns e para as águas públicas." "Art. 106. É imprescritível o direito de uso das águas." "Art. 107. São de domínio público de uso comum as águas pluviais que caírem em lugares ou terrenos públicos de uso comum." "Art. 108. A todos é lícito apanhar estas águas. "Parágrafo único. Não se poderão, porém, construir nestes lugari ou terrenos, reservatórios para o aproveitamento das mesmas águas í licença da Administração." 10. Em sentido contrário, Fernando Quadros da Silva, "A gestão dos recU' hídricos após a Lei 9.433, de 8 de janeiro de 1997", in Direito Ambiental em Evoluí org. Vladimir Passos de Freitas, Curitiba, Juruá, 1998. . . -. . . . k RECURSOS HÍDRICOS 427 A Lei 9.433/97 não tratou explicitamente das águas pluviais como tratou das águas subterrâneas. O Código das Águas divide equilibradamente o direito de proprie-, de jas águas pluviais, conforme o lugar em que essas caírem e con-f rme o curso que a natureza ditar para essas águas. Se as águas das chuvas caírem em um terreno privado, ao seu proprietário inicialmente oertencerão. Se caírem em terrenos ou lugares públicos, todos poderão ir apanhar as águas pluviais. Essa apropriação será feita gratuitamente e segundo as necessidades, tanto do proprietário privado como de qualquer do povo. No caso das águas pluviais caídas em terreno privado, o proprietário deste não poderá desperdiçar essas águas, nem desviá-las de seu curso natural. As águas das chuvas têm ligação com as águas superficiais e subterrâneas, mas seu regime jurídico não está necessariamente escravizado ao regime daquelas. A Lei 9.433/97 não modificou as sábias regras de 1934. Essas regras estimulam os proprietários privados a captar as águas das chuvas para as suas necessidades básicas. Não se trata de impermeabilizar toda a propriedade para transformá-la num reservatório pluvial, impedindo-se totalmente a infiltração ou a percolação das águas. Possibilita-se àqueles que não são proprietários privados (ou que tenham propriedades de pequena extensão) dirigirem-se livremente às praças, espaços livres ou outros espaços públicos para coletar as águas procedentes das chuvas. Segue-se o direito natural, valoriza-se a economia doméstica e observa-se a solidariedade nos lugares áridos. 12 A água como um bem de valor econômico Is _ A água é um recurso natural limitado e não ilimitado, como se Clocinou anteriormente no mundo e no Brasil. _ Passa a ser mensurada dentro dos valores da economia. atr "ao P0 e nem deve levar a condutas que permitam que alguém, A v fS Pa8amento de um preço, possa usar a água a seu bel-prazer. serv JlzaÇão econômica da água deve levar em conta o preço da con-?ao, da recuperação e da melhor distribuição desse bem. cfpj „ ria Luíza Machado Granziera salienta que a aplicação do prinHiat] aumenta o leque de possibilidades do Governo para salvaguardar A a(j c_!ais a custo tolerável para as populações carentes não atendidas. 0 a esse princípio deve, entretanto, ser acompanhada por um 428 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO compromisso público transparente de uma locação eqüitativa dos m nanciais disponíveis".11 Nesse sentido, a "cobrança pelo uso dos recursos hídricos objetiv reconhecer a água como um bem econômico e dar ao usuário uma ind' cação de seu real valor" (art. 19, I, da Lei 9.433/97). Acentue-se que a água necessária para as necessidades básicas de cada pessoa, em çmt cada um vá diretamente abastecerse, é uma captação insignificante do ponto de vista econômico, e, portanto, gratuita, consoante a interpretação dos arts. 20 e 12, § l2,1 e II, da Lei 9.433/97. -,,;„, 1.3 Uso prioritário e uso múltiplo das águas 1.3.1 Uso prioritário O'. O princípio geral é o de que "a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas" (art. lü, IV, da Lei 9.433/ 97), mas, em "situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação dos animais" (art. lü, III, da lei mencionada). Presente a escassez de águas, cumpre ao órgão público federal ou estadual responsável pela outorga dos direitos de uso da água suspender parcial ou totalmente as outorgas que prejudiquem o "consumo humano e a dessedentação dos animais", conforme o art. 15, V, da Lei 9.433/97. No consumo humano estará compreendido somente o uso para as necessidade mínimas de cada pessoa, isto é, água para beber, para comer e para a higiene. Não está incluído o uso para o lazer, como piscinas, e nem para a jardinagem. Os animais têm assegurada a sua dessedentação, mas não há prioridade para utilização de água para o abate e o processo de comercialização destes animais. Nesta parte, serão seguidas as normas comuns de racionamento, a serem previstas na regulamentação. Ainda que esteja escrito no caput do art. 15 que a "outorga de direito de uso de recursos hídricos poderá ser suspensa ...", parece-nos que, noí> dois casos mencionados, afasta-se qualquer discricionariedade do or' gão público, devendo o mesmo agir vinculadamente ao princípio aponta do no referido art. 1ü, III. Não agindo a Administração Pública, incurnbH" ao Poder Judiciário agir, através de ação judicial. I 11. Direito de Águas e Meio Ambiente, São Paulo, ícone Editora, 1993. RECURSOS HÍDRICOS 429 , 3 2 Uso múltiplo das águas •: . O uso múltiplo das águas deve ser procurado através do Plano de Recursos Hídricos, quando for abordar as "prioridades para outorga de direitos de uso de recursos hídricos" (art. 7Q, VIII, da Lei 9.433/97). A multiplicidade dos usos é imensa e não está enumerada na sua totalidade pela Lei 9.433/97. Entre os usos mencionados no texto legal temos: o consumo humano, a dessedentação dos animais, o abastecimento público, o lançamento de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final; o aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; o transporte aquaviário. Acrescentem-se outros usos: irrigação, esportes ou lazer, piscicultura. Há vedação legal de ser privilegiado um uso ou somente alguns usos. O estudo da viabilidade ecológica da outorga de vários e concomitantes direitos de uso é matéria imperativa em face do art. Ia, IV, e diante do art. 13, parágrafo único, que afirma: "A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes". Ao Poder Público está explicitamente proibida a outorga de direito de uso que somente possibilite um único uso das águas. Portanto, devem ser anulados, administrativa ou judicialmente, atos de outorga de direito de uso e plano de recursos hídricos que ofendam essas normas legais. Com justeza, ao tratar da integração de estratégias, diz o Prof. espanhol Ramón Martin Mateo: "Exigir-seá por uma parte a atuação sobre massas de água que constituam um sistema comum e, por outra parte, uma regulamentação de abastecimentos, que permita simultâneas °u sucessivas utilizações, descartando em princípio, salvo exceções, a exclusividade e o respeito de direitos prioritários dos concessionários 'idividuais, ainda que estes venham fundamentados em velhos e sóli-d°s critérios normativos".12 lA 4 bacia hidrográfica ~A implementação da Política de Recursos Hídricos e a atuação 0 Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos nio h uas' no brasil, ou são de domínio da União ou são de domíPohV Estados (arts- 20 e 26 da CF)- Entretanto, a implementação da nos ilca.nac'onal e estadual dos recursos hídricos não será embasada lrnites da União ou dos Estados. A aplicação do quadro normativo 1? T 'ratado de Derecho Ambiental, t. II, Madri, Editorial Trivium, 1992. 430 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO hídrico terá como unidade territorial a "bacia hidrográfica", como aponta oart. Ia, V, da Lei 9.433/97. Vemos pelo art. 37 da Lei 9.433/97 que a bacia hidrográfica abrange cursos de água, que são catalogados como "principal" e/ou "tributário". A "bacia hidrográfica", ao abranger os cursos de água, não está necessariamente abrangendo os aqüíferos, ou seja, a "bacia hidrogeo-lógica". A Lei 9.433/97 não definiu "bacia hidrográfica". A implementação da administração dos recursos hídricos através das "bacias hidrográficas" encontra uma séria dificuldade na dupla dominialidade das águas. Por exemplo, se o curso de água principal for federal e os cursos de água tributários forem estaduais, quem administrará a bacia hidrográfica, inclusive efetuando a outorga dos recursos hídricos? A União ou os Estados? O futuro vai dizer se a idéia dessa nova administração hídrica ficou só no terreno da imaginação ou se uma nova descentralização pode ser realizada, com a alteração constitucional da partilha das águas entre União e Estados, para que estas sejam realmente geridas pelos novos organismos hídricos. A "bacia hidrográfica" é definida por glossários científicos como a "área de drenagem de um curso de água ou lago".13"14 A "bacia hidrogeológica" é a unidade fisiográfica ou geológica que contém pelo menos um aqüífero de extensão significativa.15 Antes da Lei 9.433/97, a Lei de Política Agrícola - Lei 8.171/91 -, em seu art. 20, já dispusera preceito que continua em vigor: "As bacias hidrográficas constituem-se em unidades básicas de planejamento do uso, da conservação e da recuperação dos recursos naturais". O art. 37 da Lei 9.433/97 afirma: "Os Comitês de Bacia Hidrográfica terão como área de atuação: I - a totalidade de uma bacia hidrográfica; II - sub-bacia hidrográfica de tributário do curso de água principal da bacia, ou de tributário desse tributário; ou III - grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas". A implementação dessas diretrizes, através dos Comitês de Bacia Hidrográfica, é que vai tornar efetiva a ide*a da "bacia hidrográfica" como unidade territorial básica para efetivação da Política Nacional de Recursos Hídricos. 13. Glossário de Termos Hidrogeológicos, cit., e Glossário de Termos Usucus Ecologia, cit. 14. V. Antônio Eduardo Leão Lanna, Gerenciamento de Bacia Hidrográfica - e pectos Conceituais e Metodológicos, Brasília, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente dos Recursos Naturais Renováveis, 1995. "' ----'> ílo Tprmos Hidrológicos, cit., e Glossário de Termos Usuais ein & RECURSOS HÍDRICOS 431 Os Comitês de Bacia Hidrográfica irão atuar abrangendo umaba-:a hidrográfica, um grupo de bacias hidrográficas contíguas ou através , um conjunto misto — bacia do curso de água principal e duas subhacias hidrográficas. De acordo com o citado art. 37, II, há uma limitação a duas sub-bacias hidrográficas: a primeira sub-bacia - a do "tribu-rário do curso de água principal da bacia" e a segunda sub-bacia constituída pelo "tributário desse tributário". Assim, não importando a magnitude das relações existentes entre tributários e curso de água principal, a lei limitou a criação das sub-bacias. O Professor de Geografia Antônio Teixeira Guerra afirma que a "bacia hidrográfica pode ser principal, secundária e mesmo terciária, segundo certos autores, quando constituída de cursos d'água de menor importância".16 Faltando na lei um glossário de termos técnicos (existente em leis de outros países), encontramo-nos sem uma conceituação de "curso de água principal da bacia". Um curso de água pode ser principal somente considerando-se a microrregião onde ele e seus tributários se encontrem. Ao contrário, se for entendido que curso principal é aquele curso de água que chega até a foz (seja num lago ou no mar), muda-se a interpretação. Na área científica apontam-se pelo menos cinco critérios para a determinação do rio principal, sendo que citaremos um deles - "em cada bifurcação, a partir da desembocadura, optar pelo ligamento de maior magnitude. E um critério prático, em vista do funcionamento hidrológico da bacia".17 Essa questão tem sua importância diante de nos nacionais que vão desaguar em outros rios situados noutros países, chamados "rios transfronteiriços" (art. 39, § 2a, da Lei 9.433/97). A bacia hidrográfica é a unidade territorial em que a gestão normal as águas deve ocorrer. As águas de uma bacia devem beneficiar priorinamente os que moram, vivem e trabalham nessa unidade territorial. ao se fecham as portas para a colaboração hídrica com os que estão a da bacia, tanto que não se vedou que bacias hidrográficas contís pudessem unir-se e integrar um mesmo Comitê de Bacia Hidro-sratica de s ° a bacia hidrográfica a estrada natural das águas, a solidariedade Pratlca primeiramente no interior da bacia, para depois transbor-|*ra f°ra. Contraria a ordem natural das coisas provocar a sede ou de água no interior de uma bacia hidrográfica para derivá-la ou 17 plc""ldrio Geológico-Geomorfolâgico, 6a ed., Rio de Janeiro, IBGE, 1980. %ia" rntoJa Pilizola Júnior, "Conceitos básicos para a classificação de cursos %S ' gua em Revista 5, ano III, Cia. de Pesquisa de Recursos Minerais, agosto de 432 DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO transpô-la para outras regiões. Seria uma autoflagelação, que a étic não preconiza, pois se ama o próximo, amando-se também a si mesm0 As solicitações de derivação e transposição de águas devem Se apreciadas no Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica (art 8a da Lei 9.433/1997) e no Estudo Prévio de Impacto Ambiental-Epu (art. 225, § Ia, IV, da CF e Res. conama-001/1986, art. 2a, VII). 7.5 Gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos "A gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades" (art. Ia, VI, da Lei 9.433/97). A gestão poderá ser totalmente pública ou mista (pública e privada), dependendo da escolha da União, dos Estados, dos Municípios, dos usuários e das organizações cívicas. A gestão dos recursos hídricos, entretanto, não poderá ser totalmente privada, pois os Poderes Públicos Federal e dos Estados, conforme for o domínio desses recursos, deverão exercer o controle dos usos das águas através da outorga dos direitos de uso (arts. 11, 29, II, e 30,1, todos da Lei 9.433/97). Não é de ser confundida a gestão das águas com a competência para legislar sobre as águas. A descentralização recomendada e instaurada pela Lei 9.433/97 foi no domínio da gestão, pois a competência para legislar sobre as águas é matéria concernente à Constituição Federal e continua centralizada nas mãos da União, conforme o art. 22, IV Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre águas (art. 22, parágrafo único, da CF), sendo que até agora não existe tal leiA lei comentada prevê organismos em quatro níveis, tendo na base as "Agências de Água" e os "Comitês de Bacia Hidrográfica" e no ápi' ce o Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Descentralizar vai sign1' ficar que nem o Conselho Nacional e nem os Conselhos de Recurso Hídricos dos Estados e do Distrito Federal vão eles mesmos diretamen te administrar as águas. A gestão ou a administração das águas d6 ficar com as bases mencionadas. Essa descentralização deve ser efetlV da não em termos usuais, mas com a transferência de atribuiçõeS poderes tradicionais da União e dos Estados para os novos ór?a,e hídricos. Além disso, a descentralização deixará de ser verbal ou propaganda eleitoral se for efetivada a cobrança dos usos da águ aplicação do recurso financeiro pelos próprios organismos de cada cia ou sub-bacia hidrográfica. RECURSOS HÍDRICOS 433 O poder da Agência Nacional de Águas-ANA para arrecadar as re-eitas vindas da cobrança pelo uso das águas (art. 42, IX) é uma inova-ão que deixa dúvidas no cumprimento da política de descentralização da eestão dos recursos hídricos. Para evitar obstáculos à necessária distribuição das receitas hídricas, consta da lei que a aplicação das receitas "será feita" por meio das agências de água e só na ausência destas é que esses recursos poderão ir para outras entidades (art. 4Ü, § 6a). A ana "manterá registros que permitam correlacionar as receitas com as bacias hidrográficas em que foram geradas" (art. 21, § Ia). A introdução da gestão participativa do bem público água é inovadora, pois o Poder Público não vai mais ter a maioria de votos nos Comitês da Bacia Hidrográfica (art. 39, § P, da Lei 9.433/97). Para que não se destrua a gestão participativa e nem se torne a mesma ineficaz será preciso que o controle social encontre meios de contínua e organizada informação. 2. Dos objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos 2.1 As águas e o desenvolvimento sustentável Nos incs. I e II do art. 22 da Lei 9.433/97 estão explicitados os princípios do desenvolvimento sustentável dos recursos hídricos. Assim, são objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos: "I - assegurar a atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, ejn padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; II - a utiliza-Çao racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte quaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável". A CF brasileira, em seu art. 225, caput, já houvera oportunamente sendo a obrigação de instaurar-se o desenvolvimento sustentável. O deremrjulo" do Tratado da Bacia do Prata, assinado em Brasília aos 23 nl de 1969, coloca entre seus objetivos assegurar a preservação ra . recursos hídricos "para as futuras gerações, através da utilização ional desses recursos". cürs rf' 9.433/97 demarca concretamente a sustentabilidade dos re-rac;0 jericos em três aspectos: disponibilidade de água, utilização "al e utilização integrada. as ge P°nibilidade de água de boa qualidade, isto é, não poluída, para ia uti°eS Presentes e futuras. Essa a finalidade prioritária, através de 1Za< rac'onal e i