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ATERRAMENTO Sistema de aterramento e proteção contra raios utilizando ferragens do concreto armado Galeno Lemos Gomes, da Galeno Gomes Engenharia Consultoria e Treinamento A O grande número de ferros das fundações e das estruturas prémoldadas provê aterramento eficiente e gaiola de Faraday, que protege e atenua campos eletromagnéticos internos, diminui forças eletromotrizes induzidas nos circuitos da instalação e minimiza interferências prejudiciais a pessoas e equipamentos. Este artigo descreve a técnica, seus conceitos e os cuidados necessários, com exemplos de casos reais. primeira utilização conhecida Centrais Elétricas possui desde 1965 di- (ANSI-C2)-NEC incluiu pela pridas armaduras (ferragens) do retrizes para a utilização das armaduras meira vez especificações para eletrodos concreto armado no aterramen- das fundações como eletrodos de aterra- de aterramento embutidos nas funto data da Segunda Guerra Mundial, mento. Em 1979 foi publicada a norma dações. Também o “Green Book” mais precisamente de 1941, em um sis- alemã (caderno 35 da VDE) sobre a in- (ANSI/IEEE Standard 142-1982), que tema idealizado pelo engenheiro Herb clusão do sistema de aterramento nas trata especificamente de aterramento, Ufer para os depósitos de bombas da fundações dos edifícios residenciais. ressalta em várias seções as vantagens base aérea Davis Monthan, em Tucson, Em fins da década de 70, as recomen- de se utilizarem as armaduras do conno Arizona, EUA. Os objetivos desse dações americanas incluíram sistemas creto das fundações como eletrodos de sistema eram proteger contra descargas de aterramento com condutores embu- aterramento. Podemos então dizer que os aterraatmosféricas e eletricidade estática, esta tidos em concreto, sendo que em 1978 última causada por vento e tempestades o “National Electrical Safety Code” mentos utilizando as armaduras das funde areia. Anos mais tarde, Ufer reinspecionou as instalações e concluiu que eletrodos de aterramento utilizando armaduras do concreto promoviam uma menor e mais consistente resistência de aterramento que as próprias hastes, especialmente em regiões com valores altos de resistividade. Devido a esta antiga utilização, o uso das armaduras e/ou cabos e hastes inseridos nas fundações e baldrames de concreto é freqüentemente chamado de “aterramento Ufer.” Fig. 1 – Microohmímetro microprocessado em ligação Kelvin, utilizado para efetuar medições da A União Alemã das resistência elétrica de contato (o exemplo da foto é o modelo MPK 254, da Megabrás) 54 EM ABRIL, 2007 Fig. 2 – Conexão de cabo de aterramento de 50 mm2 com armadura de baldrame, utilizando solda exotérmica dações como eletrodos de aterramento, e a proteção contra descargas atmosféricas pelo método gaiola de Faraday utilizando as estruturas metálicas (telhas e/ou seus suportes metálicos) e as armaduras do concreto, são prática mundialmente consagradas há aproximadamente 65 anos. Isso foi inclusive reconhecido por importantes normas e recomendações publicadas ao longo desse período, como as normas brasileiras NBR 5419 e NBR 5410, a norma internacional IEC 61024-1-2 e os documentos estrangeiros ASE 4022, ANSI/IEEE std.142, BS 6651, entre outros. As vantagens, descritas não só nas publicações mencionadas mas também resumidas a seguir, encorajam cada vez mais essa prática, tanto em edificações novas quanto nas já existentes. Fig. 3 – Barra de equalização local (BEL) interligada ao baldrame Vantagens da utilização das armaduras do concreto Fundações Uma vez que o concreto sob o nível do solo mantém sempre um certo grau de umidade, seu valor de resistividade é baixo, geralmente muito menor do que o valor da resistividade do próprio solo onde está sendo construída a edificação ou estrutura. Os valores típicos do concreto nessas condições variam de 30 a 500 Ωm. O uso das ferragens da fundação também diminui as variações de tensão durante a dissipação das correntes associadas às descargas atmosféricas para o solo, com conseqüente diminuição das diferenças de potencial de passo e de toque, além reduzir a impedância do sis- Fig. 4 – Placas metálicas interligadas às ferragens dos pré-moldados para interligar estruturas, com pontos de acesso para futuras medições de continuidade elétrica tema de aterramento e facilitar muito o cumprimento dos preceitos de eqüipotencialização das instalações elétricas (freqüência industrial), em concordância com a NBR 5410/04. Pilares, vigas e lajes Com o uso das armações do concreto destes elementos, diminuem-se os campos eletromagnéticos internos à edificação, reduzindo as forças eletromotrizes induzidas nos circuitos ali existentes, e, em conseqüência, as interferências prejudiciais a pessoas e equipamentos eletrônicos sensíveis, como os de tecnologia da informação (ETIs). Além disso, conceitos ultrapassados, como sistemas de aterramento independentes e seccionamento para medição da resistência de aterramento, Fig. 5 – Interligações feitas com solda exotérmica entre as diversas estruturas pré-moldadas, para garantir a continuidade elétrica e formar a gaiola de Faraday. ABRIL, 2007 EM 55 ATERRAMENTO Fig. 6 – Armaduras das fundações preparadas para a interligação das ferragens dos pilares passam a não existir quando aplicado o método da gaiola de Faraday utilizando as armaduras dos pilares, vigas e fundações para a composição do sistema de proteção contra descargas atmosféricas diretas. Cuidados e restrições Como premissa básica inicial para se utilizarem as armaduras do concreto para os fins citados, deve-se garantir continuidade elétrica entre os pontos extremos da armadura, de modo que possa ser comprovado, por meio de medições com instrumento adequado, um valor de resistência de contato elétrico menor ou no máximo igual a 1 Ω. Cabe observar que essa medição deve ser realizada com instrumento adequado, sendo vedada, pelas normas vigentes, a utilização multímetros convencionais. Deve-se, portanto, utilizar um miliohmímetro ou microohmímetro de quatro terminais (configuração Kelvin), como o da figura 1. As escalas do instrumento devem ter valor de corrente injetada que atenda à exigência expressa no item E2 do Anexo E da NBR 5419/05, qual seja, o de se fazer circular uma cor- Fig. 7 – A gaiola de Faraday é formada pela enorme quantidade de ferragens das estruturas pré-moldadas rente, com valor de no mínimo 1 A ou superior, entre os pontos extremos da tos por cabos de cobre deve ser execuarmadura sob ensaio. O processo de tada com o uso de solda exotérmica medição está descrito na íntegra nesse (figura 2) ou solda elétrica com eletrodos específicos. Na figura 3 são vistas anexo E2 da NBR 5419/05. Caso seja necessária a execução de barras de equalização locais (BEL) essolda entre as armaduras para garantir trategicamente localizadas, cujo aterraa continuidade, deve-ser utilizar solda mento é feito diretamente dos eletrodos elétrica com cordão duplo de no míni- horizontais inseridos nos baldrames. mo 3 mm de diâmetro e 50 mm com- Cabe alertar que não deve ser utilizada solda exotérmica dos ferros para a primento. O recobrimento (proteção) das ar- construção estrutural das armaduras. Quando utilizadas para fins de maduras eventualmente expostas durante a instalação deve ser feito com equalização e/ou aterramento em instaconcreto de, no mínimo, 25 mm de es- lações de baixa tensão, as armaduras pessura. As armaduras não deverão do concreto não podem substituir os ficar sob hipótese nenhuma em contato condutores de proteção (PE) sob com o solo, para evitar corrosão. hipótese nenhuma. Também não se deve permitir a cirImersas no concreto, elas estarão protegidas por ausência de eletrólito e de aeração. A interligação das armaduras aos sistemas de aterramento compos- Fig. 8 – Ligação do microohomímetro ao ponto 8 indicado na figura 9, para medição da continuidade elétrica do conjunto 58 EM ABRIL, 2007 Fig. 9 – Esquema de medição nos pilares da usina a gás (neste caso, ponto 8 em série com 7–6–5–4–3–2–1) ATERRAMENTO permitida a utilização das armaduras componentes de estruturas prémoldadas protendidas como componentes de sistemas de proteção contra descargas atmosféricas. Execução do sistema Como foi dito acima, devem-se prever, durante o projeto das estruturas pré-moldadas, pontos acessíveis, interligados com as demais armaduras constituintes dessas estruturas. Esses pontos devem ser disFig. 10 – Geradores de 925 kW a gás da usina citada, com ponibilizados exaterramento interligado às armaduras da suas bases ternamente aos diversos componenculação de correntes de defeito (curto- tes pré-moldados, possibilitando que circuito) com duração elevada pelas ar- estes sejam interligados (normalmente maduras, pois isso pode causar danos por solda exotérmica) após sua montagem final, de modo a formar uma às próprias ferragens e ao concreto. Em estruturas pré-moldadas, as ar- gaiola de Faraday. Normalmente esses maduras podem ser também utilizadas pontos acessíveis são constituídos por como descidas naturais e aterramento, placas metálicas específicas ou condudesde que tomados os seguintes cuida- tores de cobre, para que as interligações entre pilares, vigas e armaduras dos: • prever essa utilização já no projeto das fundações possam ser feitas dudas estruturas, possibilitando, assim, rante a construção (figuras 4, 5 e 6). Nota: devem ser deixados também que sejam deixadas placas específicas ou condutores de cobre acessíveis para pontos de acesso, estrategicamente esas devidas interligações entre os pi- colhidos, destinados à execução de fulares e vigas, após a montagem. Essas turas medições de continuidade elétriinterligações devem preferencialmente ca (ver figura 4), como determinado no ser feitas com solda exotérmica (ver Anexo E da NBR 5419/05. Após a montagem das estruturas, figuras 4 e 5); e • durante a montagem das estruturas devem ser executadas as mencionadas pré-moldadas, providenciar as neces- medições de continuidade elétrica dessárias interligações das armaduras das critas na NBR 5419/05. Devem ser fundações (cálices) com as armaduras feitas várias medições, basicamente dos pré-moldados (placas ou cabos de conforme o esquema ilustrado nas ficobre citados), de modo a garantir a guras 8 e 9. Como dito acima, o valor continuidade elétrica entre captores e medido tem de ser menor ou, no máxidescidas naturais e os cálices. Este é mo, igual a 1 Ω. um ponto de extrema importância, que no entanto costuma ser posto em Exemplo Em uma usina de geração elétrica a segundo plano ou mesmo esquecido. Por fim, cabe ressaltar que não é biogás (figura 8), após a montagem, 60 EM ABRIL, 2007 ATERRAMENTO mΩ. [Nota: os valores de continuidade elétrica obtidos na prática, por meio de medições, normalmente são bem menores do que o valor máximo de 1 Ω permitido pela NBR 5419/ 05, mesmo em Fig. 11 – Abrigo ferroviário (house) com sistema de captação edificações com via armaduras e malha de referência de sinal (MRS) interligada com as ferragens do piso, para gerar diversos pavium plano de referência de terra o mais equalizado possível, mentos.] para os ETIs Para o aterramento dos geforam medidos os valores de resistên- radores da usina a gás citada foram uticia de contato listados abaixo — o pon- lizadas as armaduras das bases como to de referência fixo é o número 8 eletrodos de aterramento complementares à malha de dissipação (figura (N.8) da figura 9: • N.8 em série com os pontos de in- 10), pois o concreto enterrado possuía um valor de resistividade bem menor terligação 1–2–3–4–5–6–7: 2,89 mΩ; • N.8 em série com os pontos do que a resistividade do local da instalação. 9–10–11: 2,46 mΩ; • N.8 em série com 1–2–3–4–5–6–7– Estudos de casos 20–19–18: 2,91 mΩ; • N.8 com barra de aterramento exterAbrigo (house) ferroviário na: 2,34 mΩ; e Nos abrigos ferroviários, onde • N.8 com um ponto do SPDA externo geralmente se necessita de um plano de no telhado: 2,95 mΩ. Outras configurações e posiciona- referência para os ETIs e de uma dissimentos do microohmímetro foram em- pação eficiente das correntes associapregados, com o objetivo de obter das às descargas atmosféricas, também certeza absoluta quanto à perfeita con- é possível aplicar a técnica de utilizatinuidade elétrica dos diversos setores ção das ferragens das colunas e lajes interligados. Em todos os casos, foram para formar uma gaiola de Faraday e as medidos valores menores do que 2,95 armaduras das fundações como aterra- mento, conforme pode ser basicamente visto na figura 11, que mostra uma haste de captação do caso-exemplo. No caso aqui referido, uma malha de referência de sinal (MRS) foi devidamente projetada e instalada, com o objetivo de obter um plano de referência de terra o mais constante possível para os equipamentos sensíveis. A MRS foi embutida no piso, para evitar roubo e vandalismo. Cabe observar que, quando se utilizam ferros específicos (dedicados) para captação das correntes dos raios, esses ferros devem ser instalados na periferia das colunas e interligados com os demais ferros estruturais constituintes desta. Centro de processamento de dados Em CPDs é ainda mais justificado obter-se uma referência de sinal constante, o que normalmente é realizado com uma MRS convenientemente dimensionada para equalizar freqüências em uma larga faixa. A malha deve ser interligada à barra de equalização local (BEL), e esta ser interligada às armaduras das fundações dos pilares (de preferência nos pilares centrais), que no caso aqui relatado são utilizadas como eletrodos de aterramento complementares. A figura 13 mostra não só a interligação da BEL às armaduras do pilar como também ao aterramento de dissipação formado por fita de cobre nu de 50 x 1 mm2. Os neutros dos transformadores separadores instalados no am- ATERRAMENTO to dos condutores utilizados são de suma importância para a obtenção de uma baixa impedância, sobretudo quando se almeja um sistema eficiente para dissipação de sinais impulsivos. Em se tratando de aterramentos, cabe observar que, para ondas impulsivas de corrente Fig. 12 – Abrigo (house) ferroviário semipronto — na parte (descarga de resuperior, instalam-se fitas de cobre para captação torno de um raio), e sob o ponto de biente onde se encontram os ETIs são vista da dissipação, na primeira fase da também vistos interligados à BEL, por onda irá predominar a impedância de impulso, na segunda fase a indutância meio de cabos isolados de 25 mm2. A MRS, vista nas figuras 13 e 14, e, na terceira fase (cauda da onda), a deve ser projetada de maneira que as resistência. Com base na figura 15, podemos diferenças de potencial entre vários de seus pontos sejam minimizadas para dizer que, na prática, para tais tipos de uma larga faixa de freqüência de opera- aterramento, devemos procurar obter ção e possíveis interferências, que vão baixos valores de indutância e resistêndesde corrente contínua até freqüências cia, e valores elevados de condutância de 30 MHz. Isso pode ser obtido pela e capacitância. Isso é basicamente conaplicação da teoria de comunicação de seguido modificando-se o formato, o ondas conduzidas, segundo a qual não comprimento e a configuração dos existirão diferenças de potencial signi- condutores de aterramento — por ficativas ao logo de um condutor cujo exemplo com a utilização de fita de cocomprimento for menor do que 1/20 do bre nu de comprimento convenientecomprimento de onda da freqüência que mente dimensionado. O uso de condutores em forma de fise deseja equalizar. ta (figura 16) nos sistemas de aterramento aumenta a capacitância, reUso de condutores em forma de fita A configuração dos sistemas de ater- duzindo concomitantemente a indutânramento, seu comprimento e o forma- cia e, conseqüentemente, a impedância Fig. 13 – CPD com BEL, MRS e armaduras da fundação do pilar interligados (componentes do sistema de aterramento utilizado) 64 EM ABRIL, 2007 ATERRAMENTO Fig. 14 – Malha de referência de sinal em um CPD final do condutor. Quando as fitas estiverem enterradas, como é o caso dos aterramentos de um SPDA, a condutância pode ser aumentada efetuando-se o tratamento do solo com produtos não-lixiviáveis, normalmente à base de bentonita. Esses materiais devem obrigatoriamente ter um valor bastante baixo de resistividade, para que possam atuar no volume de influência do eletrodo de aterramento, principalmente próximo à superfície Fig. 15 – Circuito equivalente aproximado de um condutor horizontal de aterramento de contato deste como o solo, diminuindo-lhe a impedância. Edificações com estrutura metálica Vimos aqui anteriormente que se deve preparar a estrutura, isto é, executar o projeto prevendo a utilização das armaduras do concreto da edificação como descidas naturais e as das fundações como parte do sistema de aterramento. Esse procedimento não só re- sultará em maior eficiência técnica como também econômica, tendo como “subproduto” a atenuação dos campos eletromagnéticos internamente, atuando como blindagem (a qual pode, em certos casos, ser aumentada com a utilização de outros materiais, tais como telas e/ou chapas metálicas convenientemente especificadas e instaladas nas paredes, pisos e tetos). Existem, porém, edificações cuja infra-estrutura básica é toda constituí- Fig. 16 – Uso de fitas de cobre nu em sistemas de aterramento da de perfis metálicos, como por exemplo a mostrada na figura 17. Nesses casos, com muito mais razão, todos os conceitos aqui descritos podem e devem ser aplicados, desse modo tirando proveito das vantagens técnicas oferecidas por esse tipo de gaiola de Faraday natural. É preciso tomar cuidados especiais para que eventuais descargas atmosféricas laterais possam ser captadas e conduzidas à terra pelas estruturas metálicas. Para isso, devem ser instalados captores específicos convenientemente localizados e interligados às estruturas, evitando a quebra da alvenaria de acabamento lateral da edificação. Uma observação importantíssima deve ser feita, mesmo neste caso em que praticamente toda a estrutura da edificação é metálica: em hipótese nenhuma pode ser eliminado o condutor de proteção (PE), o qual Fig. 17 – Exemplo utilização de estrutura totalmente deve ser passado metálica como descidas naturais e para atenuação dos junto com as fases campos eletromagnéticos externos dos diversos circuitos. Jamais a estrutura metálica fonte de alimentação da instalação. Conforme determina a norma de instadeve ser usada como condutor PE. Também é terminantemente vedado lações de baixa tensão, deve-se passar o aproveitamento da estrutura me- um condutor de cobre específico para a tálica da edificação como neutro de função de neutro, com isolação na cor tomadas ou função similar. O neutro azul. do sistema de distribuição de baixa tensão deve ser ligado ao aterramento soTrabalho apresentado no Enie 2006 – XI mente na origem da instalação, junto Encontro Nacional de Instalações Elétricas (6 a com o aterramento do transformador 8 de junho de 2006, São Paulo, SP).
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