Visualizar/Abrir - Portal Barcos do Brasil

Transcrição

Visualizar/Abrir - Portal Barcos do Brasil
•
Prêmio Sílvio Romero 1973
o pescador
artesanal .·
.. dosul
Alex VieiraE""K
Libris
o
Pescador
Artesanal
do
Sul
f
Lilian Argentina 8. Marques
Presidente da República Federativa do Brasil:
João Baptista de Figueiredo
Ministro da Educação e Cultura
Eduardo Portella
Secretário de Assuntos Culturais
Márcio Tavares d'Amaral
o
Fundação Nacional de Arte - FUNARTE
Presidente: José Cândido de Carvalho
Diretor.::Executivo: Roberto Parreira
Pescador
Artesanal
do
Sul
Instituto Nacional do Folclore
Diretor: Bráulio do Nascimento
PRÊMIO SÍLVIO ROMERO - 1973
DESENHOS: CARMEN CORUCCIO CANDIA
MARQUES, Lilian Argentina B. O pescador artesanal do Sul. Desenhos: Carmen Coruccio Candia . Rio de Janeiro. MEC - SEAC-FUNARTE . Instituto
Nacional do Folclore . 1980. 75 p . il. mus . Bibliografia .
Prêm1o Silvio Romero 1973.
1. Pesca- Aspectos folclóricos. 2. Artesanato da pesca. I. Título.
CDU 7.067.26(81)
Ministério da Educação e Cultura
Secretaria de Assuntos Culturais
· Fundação Nacional de Arte-FUNARTE
Instituto Nacional do Folclore
"Meia-noite bateu
os pescadores
Vão cantando ao luar soltar as redes ...
- Cabeças alvas ao cambar da vida
Faces tostadas ao final mormaço... "
Lobo da Costa
Aos pescadores da minha terra, entre os quais passei a
maior parte da vida, ofereço este trabalho.
SUMÁRIO
-Aspectos da região ...............................................................
9
Povoamento .......................................................................... 13
Área pesqueira do litoral do Rio Grande do Sul
e seu valor folclórico ............................................. ... . 15
Artes da pesca artesanal ...................................................... 19
Embarcações ........................................................................ 45
Preparo do peixe para salga ................................................ 51
Cozinha praieira .................................................................... 53
Linguagem ............................................................................ 55
Mitos e lendas do litoral sul-rio-grandense .......................... 63
Medicina popular ................................................................... 65
Festas ............................ .. ...................................................... 69
Músicas e danças ................. ................................................ 71
Bibliografia ............................................................................. 75
ASPECTOS DA REGIÃO
A costa do Rio Grande do Sul estende-se do rio Mampituba, divisa
com o Estado de Santa Catarina, ao arroio Chuí, limite extremo sul do Brasil, com
a República Oriental do Uruguai, quase em linha reta, de N.O. para S.O., numa
extensão de 622km.
Sem acidentes, não oferecendo o abrigo de enseadas, baixa e perigosa, é considerada como o cemitério de embarcações que, não raro, aí encalham. O porto de Rio Grande é o único ancoradouro e situa-se no canal que liga a
lagoa dos Patos ao oceano. A barra do Tramandaí é móvel e sujeita ao fechamento por areias. A abertura da barra "a pulso" pelos pescadores foi durante largos anos um acontecimento marcante, que envolvia toda a comunidade do antigo vilarejo. O único ponto rochoso da costa é em Torres onde, junto .ao mar, se
erguem três colossais rochedos basálticos, denominados "as Torres".
A faixa litorânea é arenosa, apresentando uma linha de dunas ou cômoros movediços, que se deslocam sob a ação do vento que varre constantemente a região: o "nordestão" morno, "suli" ou minuano (pampeiro) frio. e a
"lestada", que provoca as grandes ressacas.
As águas do mar são muito fortes, formando ondas imensas e ruidosas. Nas tempestades de inverno, o mar avança sobre as dunas e o ruído é tanto
que, à beira-mar, é preciso que se fale bastante alto para que se ouça. O nevoei~o
é constante, de junho a setembro; a "cerração só se alivanta no ponto du meiodia". Na vastidão nua dos claros areais, onde o tuco-tuco (tipo de roedor) .faz as
suas tocas, apenas viceja a macega. A oeste dos cômoros, há zonas de banhadais tomados pela tiririca e aguapés, onde se aninham marrequinhas d'água. Há
também grandes extensões de "chape-chape"- terreno úmido e limoso- verdadeiro paraíso de batráquios. Em alguns pontos, próximos às dunas, há sumidouros, onde a água borbulha ao menor peso e racha-se o chão em pequenas
crateras. Com o trabalho do Serviço de Fixação de Dunas, muitos banhados e
"chape-chapes" foram recuperados e vários tipos de árvores foram aí plantadas
para proteção aos ventos, evitando, assim, o soterramento das casas mais próximas do mar. Por toda a costa se estende um colar de lagoas. A maior delas é a
lagoa dos Patos (300km de comprimento por 70km de largura), que se liga, pelo
canal de São Gonçalo, à lagoa Mirim (178km de comprimento e 54km de largura).
Esta última e a Mangueira (120km de comprimento e de 2 a 6km de largura) interessam ao Município de Santa Vitória do Palmar, cujo porto é na lagoa Mirim.
Ainda ao sul do Rio Grande encontram-se as lagoas: Caiuvá, Flores, Nicola e
Jacaré.
9
As lagoas da Reserva, dos Gateados, do Sumidouro, das Mostardas,
de São Simão e do Rincão comunicam-se com a dos Patos por sangrado~ro~. A
lagoa do Peixe, em Mostardas, comunica-se com o oceano por barra nao f1xa,
que fecha em determinadas épocas.
. _
Seguem-se, pela beira da costa rur:no ao n.orte, as la.goa~ do R1ncao,
dos Veados, do Capão do Ponche, do Papaga1o, da C1nza, da F1gue1r~, do Retovado, da Tapera, da Ch?rqueada, do Q~intão, do ~in~eiro, do Capao Alto, da
Porteira, do Rincão das Eguas, da CerqUinha, da C1dre1ra, da Fortaleza, d? Manuel Nunes, da Dona Antônia, do Firmiano, do Armazém, de Tramanda1 , das
Pombas, dos Veados, do Passo Fundo, do Sangradouro, da Traíra, do Cac?n.de,
do Lessa das Malvas, da Palmita, da Pinguela, dos Quadros, ltapeva, Custod1as,
índios, J~ão Pedro, Banhado, Pesqueiro, Forno, Jacaré .. Violão e Torre_s.
As do sistema do norte: ltapeva, Quadros, Pinguela, Armazem e outras menores, intercomunicam-se por sangradouros ou canais (como o d~ bar~a
do João Pedro, barra do Caconde) e foram, até bem poucos anos, o me~o ma1s
fácil de comunicação entre Tramandaí, Osório, Maquiné e Torres. O cam1n~o da
praia dependia do mar e do .~ento. Era feito, .em grande parte, sobre este1ra_s e
precisava contar com a habilidade do motonsta que cost~asse a parte re~em­
molhada pelas ondas, sem se deixar apanhar por elas. Hav1a uma companh1~ de
navegação lacustre, que encerrou suas ~tividad~s no tr~nspo~e de passage1r~s
quando do surgimento das estrada~ intenores. A1nd~ hoje cont1nua a navegaçao
cargueira. Aportam em Tramanda1 chatas, cargue1ros e barcos, transportando
animais, lenha, batata-doce, aipim e outros produtos agrícolas.
Junto ao sistema lacustre, o terreno cobre-se de pastagens e apresenta capões esparsos, de mataria baixa, onde se encontram: a capororoca, a
acácia, a curticeira, o bambu, o araçá, a aroeira, o coqueiro jirivá, a palma de butiá, a arumbeva, a pita, o maricá, a unha-de-gato, a pitangueira, a ba~an13:-do­
mato. As árvores de maior porte são: o jacarandá, a timbaúva e as figueirasbravas, cujos galhos retorcidos e as copas aparad~s .diz~m de s.u~ luta ~o.m o~
ventos. Em suas raizeiras vetustas, enrolam-se os 1ta1mbes, os c1pos e vanos tipos de orquídeas. Aí vicejam as samambaias, os W~vatás e ~ma quantida~e
enorme de plantas medicinais, que o homem da reg1ao aproveita para os chas
caseiros: carqueja, mentruz, baleeira, arnica, catinga-de-mulata, lín.gua-de-v~ca,
hortelã-brava, urtiga, carrapicho, erva-de-passarinho, douradinha, salsaparnlha,
erva-cidreira, sabugueirinho-do-campo, capim-de-porco, quebra-t_udo.
..
Nos capões e caponetes, aninham-se variedades de P?~saros (beljé3:flor, sabiá, saíra, sanhaço, pintassilgo, tico-tico, chopim, anu, canam~. bem-te~vl,
araponga, joão-barreiro) e aves de rapina (carancho, chimango, coruja, cabure e
gaviões).
Às margens das lagoas, a vegetação é mais exuberante e a fa~na
mais rica. Aí se encontram a capivara, a preá, o ratão-do-banhado, o.gamba, ?
quati e variedade de tatus. Pelos campos, encontram-se lebres, a perd~z, o. p~rdl­
gão, a codorna, o quero-quero, Bandos de coleiras, garças, socos, jOO~s­
grandes, maçaricos, frangos-d'água, galinholas, narcejas, marrecas.e m8:rreco.es
voejam sobre as ilhotas flutuantes de aguapés floridos, onde se a_mo1tam jaca.res.
As lagoas que se intercomunicam com o oceano sao as pretendas
para a pesca. "É na áqua salobra qui us pêxe chóco i outros disó~o:"*
A orla marítima interessa aos municípios de: Torres, Osono, Trama~­
daí, Mostardas, São José do Norte, Rio Grande e Santa Vitória do Palmar. R10
Grande é o polarizador da atividade pesqueira. Embora nenhum destes municípios se dedique exclusivamente à pesca, em alguns deles ela é mais intensa. Os
pescadores agrupam-se em colônias. Focalizamos neste estudo os municípios
da orla marítima onde há sede de Colônia:
Rio Grande- Colônia Z-1 -1.400 pescadores.
São José do Norte- Colônia Z-2- 1.105 pescadores.
Torres- Colônia Z-7- 381 pescadores.
Tramandaí- Colônia Z-6- 270 pescadores.
Obs.: Os dados acima foram obtidos na SUDEPE- Aqência de Porto Alegre.
Há grande quantidade de pescadores não colonizados, como também existem elementos que não fazem da pesca ocupação exclusiva e possuem
carteira de Colônia. Daí, a dificuldade de um cômputo exato do grupo em estudo.
Segundo monografia do I.B.G.E. sobre o Município de Torres, em 1970 havia 480
pescadores colonizados e 377 não colonizados (sendo 22 deles menores de 18
anos).
Em Torres a pesca se realiza em alto mar (ilha dos Lobos -1 .500m
da orla- rochas), na lagoa e no rio. O peixe é transportado para a ilha em barcos
ou canoas a motor. Em 1970, a produção do pescado atingiu a 679 toneladas. As
artes mais empregadas são: redes de arrasto, de espera, tarrafas e espinhéis. Os
pescadores de rio também empregam a taipa - tipo de armadilha.
Em Tramandaí, a pesca realiza-se na costa do mar, na lagoa. Ocamarão é apanhado no sangradouro (Ponte do Camarão). Utilizam-se canoas à
vela e a motor de popa. Também pescam a pé, empregando redes de espera,
arrastão de areia, tarrafa, espinhei e fisgas.
Em São José do Norte, a pesca é mais intensa no canal. Empregam
arrastões, redes de espera, saco de camarão e cocas. Usam canoas à vela, botes e caíques.
Em Rio Grande, a pesca é feita tanto no canal como no mar. Utilizam
as mesmas artes de São José do Norte. Para o mar, o pescador artesanal usa a
canoa "cabrita", a remo de voga.
Em 1969, foram desembarcadas em Rio Grande 26.034 toneladas de
pescado, capturado na parte sul da lagoa dos Patos e linha litorânea, por pescadores artesanais (segundo Boletim da SUDEPE).
• N. E. Em todas as transcrições de linguagem popular foi mantido o critério da Autora.
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POVOAMENTO
Baseados nos sambaquis, que "ocorrem ao longo de todo o litoral, de
600 km, sendo mais freqüentes no setor norte, entre Cidreira e Torres" (Rambo,
1957:36), onde foi encontrado farto materiallítico e cerâmico, historiadores informam da existência de tribos indígenas na região. Ao que tudo indica, os acampamentos índios não se fixavam no litoral, senão para suprirem-se de alimentos provindos do mar.
Segundo Fernando Paula Cidade (1966) : "Para os viajantes do começo do século XVIII, que penetrassem no Rio Grande do Sul, vindos do sudoeste de Santa Catarina, os primeiros contatos com os silvícolas haviam de ser
tomados logo que deixassem a orla marítima e infletissem para oeste, rumo ao
estuário do Guaíba." Há porém notícias de minuanos e charruas na região, entre
as lagoas Mirim e Mangueira, onde há "sítios" demarcados por estudiosos da
região.
A primeira informação a respeito do trânsito do homem branco pelo
litoral é de 1703, referida no Roteiro de Domingos Filgueira, que palmilhou a orla
marítima, partindo da Colônia do Sacramento, baluarte mais meridional da Coroa
Portuguesa, rumo a Laguna.
A notícia das "vacarias", a necessidade de vigiar a embocadura do
Rio Grande e firmar a posição portuguesa no Prata, tornou imperiosa a ligação
entre laguna e a praça da Colônia fundada em 1680 por Manuel Lobo. Em 1676,
já as terras do sul, à margem esquerda do estuário do Prata, haviam sido doadas
aos Viscondes de Asseca. Mas só em 1725, Brito Peixoto, capitão-mor de Laguna, recebia a incumbência de reconhecer a r.egião.
A incursão oficial verificou-se em outubro do mesmo ano, com a chamada frota de João Magalhães, que transpõe o litoral e levanta um arranchamento na atual São José do Norte e cria um posto militar em Tramandaí, onde
Brito Peixoto obtivera algumas sesmarias. Inicia-se o trânsito pelo litoral; descem
os lagunenses. Mais tarde, este caminho seria substituído pela Estrada dos Conventos, obra iniciada por Sousa Faria em 1728 e concluída por Cristóvão Pereira.
Em 1732, Manuel de Figueiredo recebe, nos campos de Tramandaí,
a sesmaria da Barragem das Conchas. Com a fundação de Rio Grande, em
1737, consolida-se a ocupação do litoral. Surgem as fazendas na zona do campo
e os arraiais.
.
Em 1738, cria-se a Fazenda Real do Bujuru. Com a chegada dos casaJ~ açorianos, em 1752, intensifica-se o povoamento. Muitos localizam-se na
BuJuru e outros, na Freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Estreito (1765)
e na de Nossa Senhora da Conceição do Arroio (Osório).
Para o sul de Rio Grande, região de ricas pastagens, Silva Paes, após
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elevar o baluarte de Sant'Ana, prossegue sua marcha dividindo sua gente em
duas colunas: uma marchando por terra e outra navegando pela lagoa Mirim,
indo alcançar o arroio São Miguel, ponto em que os dois grupos fizeram junção.
Esta estreita faixa de terra, entre o oceano Atlântico e a lagoa Mirim, encontrou-a
Silva Paes "coalhada de gado vacum e cavalos" (Anselmo Amaral, 1973). No
Chuí, deixa uma guarnição de Dragões e levanta, mais ao sul, o forte de São Miguel.
A demarcação de limites (1752) traz mais milicianos ao litoral sul. Os
conflitos entre Portugal e Espanha (1761) refletiram-se no continente. D. Pedro
Ceballos (1762), após ter tomado a Colônia do Sacramento e as fortalezas de
São Miguel e Santa Teresa, avança sobre a Vila Rio Grande. Caiu assim a região
extremo sul sob o dpmínio espanhol. Em conseqüência desta ocupação, os retirantes, do lado português, abrigam-se em São José do Norte e criam mais ao
norte, junto à lagoa do Peixe, a Freguesia de São Luís de Mostardas (1773).
Em 1776, forças portuguesas reconquistam Rio Grande e dois pontos
avançados: Albardão e Tahim. O Tratado de Santo lldefonso (1776) considera o
território compreendido entre o Tahim e o Chuí como campo neutro, e que só é
reconquistado pelas forças da Província em 1801 e é dividido em sesmarias, que
hoje constituem o Município de Santa Vitória do Palmar.
Torres, embora constantemente transitada, somente começa a ser
povoada em 1809, quando D. Diogo de Sousa aí instala uma guarnição militar.
Muita gente desceu para estas bandas do sul, engrossando os contingentes já
fixados. Ainda hoje a migração no litoral é constante, especialmente de catarinenses, que se dedicam à pesca. O desenvolvimento turístico vem trazendo a certos
agrupamentos aumento populacional. As colônicas de pesca, porém, ocupam
bairros quase que separados do grupo de veranistas ou das "genti qui vem di fora
prá mercá". O grupo pescador é quase totalmente constituído de elemento
branco. Os pretos, vindos com Silva Paes, quando da fundação de Rio Grande; e
os trazidos por João de Magalhães, ao que tudo indica, se teriam dedicado ao
serviço do pastoreio, às charqueadas e ao trabalho da lavoura. Raramente se
encontra um "moreno" (preto) ou "sarará" (mulato) que se dedique à arte pesqueira. A antiga tradição do lusitano, como homem do mar, encontrou ambiente
propício para sua continuidade nestas plagas arenosas do sul.
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ÁREA PESQUEIRA DO LITORAL DO RIO
GRANDE DO SUL E SEU VALOR
FOLCLÓRICO
O possibilismo geofísico determina o condicionamento das zonas e
dos tipos que as caracterizam. Há uma íntima relação entre o homem e o meio. o
prin_:Jeiro como ag~nte mo~ific~dor; e ? se~undo como influenciador regional. Os
fen~":lenos ~atura1s, o pa1sa~1~mo cnam t1pos a eles condicionados. Em função
da f1s1onom1a antropogeograf1ca, o homem fixa seu horizonte de trabalho em
tomo do qual se processa toda a vida do agrupamento.
'
. .
. Mar, vento, are!a são os elementos com que a natureza plasmou a
b1ot1polog1a do homem pra1ano, segregado em uma faixa de terra árida e hostil,
entre as la~~as e o mar. E, se tal fator contribuiu para conservar-lhe quase intactas as trad1çoes, por outro lado proporcionou-lhe, apenas, um eixo de produção
permanente: a pesca.
Em torno deste meio de subsistência, fundamentam-se sua cultura e
o seu primitivismo social.
. A interferência de outras culturas, ou melhor, de outros padrões de
cultura, fo1 ~uase n~la. As ondas móveis, de grupos heterogêneos, que circulam
~m .det~rm1nadas epocas, dentro do agrupamento pesqueiro, não provocaram
1nte1raçao cultural. Quando muito, interferiram sobre o fator moda na indumentária social. O turista não se integra no grupo, nem se entrosa a el~. O elemento
pesqueiro é ~ero espectador das massas que afluem, anualmente, ao mar
durante o verao. O qu.e .se observa, quanto a esses contatos esporádicos, é que
eles provoca~ no pra1e1ro um acentuado complexo de inferioridade, redundando
numa desconfiança constante em relação aos seus semelhantes· e numa descrença sobre a valorização moral de seu "eixo de produção".
'
. M~smo em relação aos elementos estranhos ao grupo, que se fixem,
por mot1vos d1versos, em sua área, a aceitação é difícil; mas quando os aceitam,
demonstram grande afabilidade.
, . O pescador é muito habilidoso e, mesmo sem o conhecimento de outras ~ecn1cas de trabalho, durante as épocas de penúria, é um tipo "faz-tudo", biscateia o que lhe aparece.
Sua existência é simples e difícil. É dado ao nomadismo praian'o isto
é, descer e su.bir? litoral em busca de melhores ganhos ou de "melhor cardu~e".
A 1n~ustria extrativa da pesca, no Rio Grande do Sul, vem-se desen~lvendo.~um s1~~ema de grupo ou "parelhas" onde o patrão é o dono das "artes
pesca ou. do barco palamentado". Em torno do chefe da parelha se congregam .os proe1ros, elem~~tos q~e nada possuem de seu. O proeiro poderia ser
=derado como o pana do litoral, pela falta de estabilidade a que está confi. Geralmen~e o chefe da "parelha", grupo de trinta e poucos homens, é resPCJnsável pela alimentação do grupo, quando em acampamento. Os lucros são
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distribuídos sob percentual, cabendo ao dono da "parelha" a parte maior.
Os agrupamentos pesqueiros são fixos somente quando o litoral
oferece uma barra de rio, como é o caso de Torres e Tramandaí. Em São José do
Norte, a colônia pesqueira se fixou no canal do Rio Grande. O próprio grupo sediado no Cassino também pesca no canal, embora faça lances no "mar grosso".
Não obstante a sua luta titânica com o elemento- o mar- o praiano
não é um destemido em face a outras calamidades; guerra, revolução, são termos que apavoram mais do que um maremoto. E o mar tem sido benigno com
estes pseudofilhos de Netuno. Raramente os traga. E, se tal acontece, não há
revolta contra o formidável.
Ele é o sustento; ele é o que tange as cordas de sua sensibilidade, é o
gigante que lhe dá a concepção de largueza, amplidão, do todo, de Deus.
O praieiro se vê senhor, "abaixo dos poder di Deus", da imensa praia
desnuda, onde as ondas se desmancham ora em suaves marulhos, ora em loucas marolas que vão lamber o sopé das dunas. Esta impressão de liberdade, de
dono de si mesmo, que ele sente, como humanizador desta paisagem adusta,
nota-se quando o encontramos junto ao mar, na faina da pesca.
Geralmente, esguio de porte, resiste com facilidade ao penoso trabalho da pesca rudimentar, continuando nele até idade avançada.
Longevo, mas sem preocupações pelo amanhã, vive o presente,
adaptando-se, conformado, àquilo que o meio lhe possibilita. A idade, quando ele
sabe se impor, lhe dá uma espécie de liderança familiar que se impõe dentro da
grande rede, do entrelaçamento dos troncos genealógicos. Um tio mais velho e
experiente tem mais voz ativa do que um pai mais novo e inexperiente.
O litorâneo é melancólico e negativista, dado a arroubos de pouca
duração. Mesmo que acomodado às adversidades da vida miserável que leva,
paradoxalmente é um revoltado e com facilidade de encolerizar-se mas só "de
boca pra fora". É dotado de imaginação vivaz e surpreendente do imitativo, mas o
espírito de iniciativa é tolhido pela indolência de que é portador. Essa indolência
se manifesta especialmente no canto, na dança e na música de ritmo arrastado. É
dado a festas e bailes onde exterioriza com exuberância suas manifestaçôes.
?uas reações, geralmente, são paradoxais: ri ou chora com a maior
facilidade. E inclinado a dramatizações e dotado de espírito satírico e astucioso.
Temente a Deus e aos seus santos padroeiros, São Pedro e Nossa
Senhora dos Navegantes, entretanto é supersticioso. Receia o sobrenatural; crê
em mitos; usa "bentos", talismãs. Utiliza-se de "rezas" especiais para afastamento dos "mau spritu" e do "mau olhadu". Teme os "mau agôro" e uma série de
coisas "qui não presta dizê ou fazê"; protege sua casa com "registo" de santos.
Utiliza-se da medicina rústica e " mágica ": " chapoeiradas " ,
"xaropadas", "sinapismos", "ungüento" ou "unto", "garrafadas", benzeduras e
simpatias. Só recorre a um médico quando o empirismo já foi tentado.
No campo da sabença popular, tem um conhecimento que foge a
nossa observação- sabe se o tempo está bom para a pescaria, pelo vento, pela
lua, pelas marés e pela própria água. Prevê os fenômenos meteorológicos como:
chuva, vento, seca, etc. A lua, as "barras" do dia ou do entardecer parecem estar
intimamente ligadas com tais observações. "Circo em redori da lua, trais chuva. "
"Mudô u vento, mudô u tempo." Dizem que o vento nunca sopra dias pares; "se
passa de dos, vai pros treis dia, si passá di quatro, vai pros cinco".
A casa do pescador é simples. Geralmente feita de tábuas, coberta de
telhas de barro ou de esteiras de ti ri rica; já são raras as casas inteiramente desta
palha, como era de uso há alguns anos atrás. Os apetrechos de pesca são guar16
dados junto à casa, em rancho de tiri rica. Poucos se dedicam a possuir horta ou
jardim, mas apreciam folhagens em latas.
O mobiliário e utensílios domésticos são, também, simples. Ainda
usam "fogão de lenha" e o "fogão de chapa".
As mulheres são muito trabalhadeiras e fazem toda a sorte de serviços, auxiliam na confecção de redes, escalam peixes, descascam o camarão.
Habilidosas, fazem crochê, que chamam de "renda de agulha"; algumas tecem
mantas de trapos e confeccionam colchas de retalhos. Raramente se encontra
quem se dedique à renda de bilro. Muitas trabalham com palha, fazendo bolsas,
bandejas, cestos, etc., que vendem durante o verão.
A alimentação do pescador é à base de peixe, marisco, farinha de
mandioca, feijão, café e bananas. A cachaça é ingerida por homens, mulheres e
adolescentes, pura ou com açúcar e limão, ou, ainda, em infusão com butiá (fruto
do butiazeiro).
Andam descalços, quando para o trabalho, ou usam tamancos ou
"chinelos de dedos". Os homens, para a pesca, arregaçam as calças ou usam
calção. Geralmente, sobre os casacos ou "camisão" (feito de baixeiros de lã bruta
à moda poncho, que lhes cobre o peito e as costas), usam cinto de corda. Na
cabeça é variável o uso do chapéu com meia aba, o boné, o gorro de lã, o
"suesse" (chapéu de oleado) e a manta.
As mulheres usam a indumentária comum, sendo que as mais idosas
continuam com a saia de "corredor" (franzida na cintura com um cadarço ou
cinto) e a bata (tipo de blusa com pinças). Entre o elemento feminino, é generalizado o uso do lenço à cabeça. Nos casos de luto, ainda vigora o preto para as
mulHeres; para os homens, o "fumo" no chapéu ou lapela. Se o falecido é muito
"chegado" (pai, mãe, esposa) , o homem usa camisa preta e deixa crescer a
barba. Usam ainda o costume de "coberta d'alma", que consiste em dar um traje
novo e completo para um vivo, em homenagem ao falecido para que este entre
"bem no céu". Até bem pouco, as "incelências" eram cantadas no cemitério e,
nelas, pediam à Virgem ou a determinados Santos que dessem ao morto o
"passuporte" para ingressar no céu. Em quase todos os agrupamentos, logo que
faleça alguém, é dado o sinal, pelo sino da igreja ou capela- ao sinal, denominam "dobre do sino". Perdura, ainda, em alguns agrupamentos, o uso debandeirinhas coloridas, de papel de seda, na "cova" ou na "catacumba" (túmulos) de
"anjos"- crianças de menos de sete anos. As "mortalhas" dos "anjos" são feitas
de seda brilhante com galões prateados. Se a criança morta não foi batizada, dizem que vai "pro limbo" . Os recém-nascidos são envoltos em "baeta" ou
"cubertori", e usam "barrete" na cabeça. Muitos morrem do "mal dois sete dia".
..
As parturientes são submetidas a inúmeras simpatias para
despachar": soprar em uma garrafa; pôr o chapéu do marido na cabeça, enquanto a "comadre" (parteira) reza para a Nossa Senhora do Bom Parto.
..
. Muitos meninos não são "registados", "prá não servi u guvernu". A
freq~ênc1a às escolas também não é fácil, pois o "rapaiz, filhu hôme" ou "a rapariga, filha mulhé" não tem registro "prá si matriculá".
_
Na adolescência, freqüentam assiduamente os "balhes". Os rapazes
sa~ dados às serenatas. Apreciam cantar em dueto, sendo uma voz uma terça
8Cima da outra, e "tirá verso".
Quando uma moça fica noiva, "esta pidida". O casamento é "as
bôda:·. A moça quando não foi "robada", isto é, se não fugiu de casa, vai em traje
nupaal: vestido comprido, branco, véu, "girnalda e boquêr". Quem "dá os dôce
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das f)ôcJa" é o padrinho. A noiva leva "os apronti" (enxoval) e a mobília. O noivo
"entra só cum u corpu".
O linguajar do praieiro é completamente diverso do ~tili~ado no resto
do estado. A fala é ligeira, de som alto, agudo, e cantado nos f1na1s de fr~se. O
vocabulário da região é vasto. Há grande semelhança de costumes e de_hn~ua­
gem, vocábulos e expressões, entre os nossos pescadores e os da Ence1ra e
ilhas Terceira e de São Jorge (Portugal).
ARTES DA PESCA ARTESANAL
A pesca tradicional, no Rio Grande do Sul, se processa de duas
formas: pesca a pé e pesca embarcado.
Na pesca a pé, são utilizadas as seguintes artes para a captura: redes
retangulares e circulares, espinhéis, linhas de varejo e de cana, fisgas, armadilhas.
Na pesca de barco são empregadas: redes retangulares e circulares
e arpões e espinhéis com fateixas.
Em relação ao local de utilização destas artes podemos colocá-las:
MAR
barra afora
arrastões ou rede de arrasto
arpões
beira da costa
tarrafa
espinhéis
linhas de varejo
tresmalho
redes de emalh::~r
{
redes de espera
sacos
cocas
{
redes de cerco
costa do rio
{
espinhéis poitados
linhas de varejo
linhas de cana ou caniço
fisgas
estreitos
{
boca de barra
e canais
RIOS
rede de espera
rede de encontro
espinhéis de correr
armadilhas
19
ARPÃO E FISGAS
LAGOAS
de ponta
de garfo
de gancho
arrastão
redes de cerco
redes de espera
sacos e cocas
espinhéis
A sabedoria popular nos dá importantes ensinamentos:
a) cada arte de pesca ou aparelho requer local adequado;
b) a cheia e a vazante influem sobre o aproveitamento das artes;
c) para cada pescado há um tipo peculiar de artes;
d) há época determinada para a captura de cada tipo de pescado.
As redes, em geral, podem ser classificadas em: retangulares e circu lares.
de arrasto
REDES
RETANGULARES
de espera
de cerco
{
arrastão pequeno e grande ou
temo de praia ou de costa
"picaré" e "manjubá"
{
feiticeira ou trP.smalho com calão
ou singelas andainas com fateixas
{
ala, temos de emalhar
singelas com "costura"
ARMADILHAS
As mais comuns {
CONFECÇÃO DE REDES
Para a confecção de redes utilizam-se, como instrumentos, uma agulha e um malheiro.
A agulha pode ser feita de madeira, em especial, de cutia, taauara e
até mesmo de barbatana de baleia.
O malheiro consiste num tipo de pequena régua de madeira, que
serve para dar a dimensão desejada à malha.
A malha dá sempre o dobro da largura do malheiro.
Em relação à malha, depende do tipo de peixe a ser capturado.
malha grande
malheiro Bem
malheiro 6cm
tarrafa
REDES
CIRCULARES
covos ou "juquiá"
taipas ou "mangueiras"
cercas
captura
= 16cm de malha
= 12cm de malha
viola, anchova grande
miraguaia, cação
=
=
bagre
tainha
malha média
saco de camarão
cocas
{
grande
malheiro 4cm
malheiro 3,5cm
pequena (tipo jereré)
malha pequena
~alheiro
~alheiro
3cm
= 6cm de malha
1,Sem
= 3cm de malha
malhas menores de ~çm ou
ede fina de 12mm
ESPINHÉIS E LINHAS
fixo
flutuante
de pandorga
Bem de malha
?em de malha
peixe-rei
sardinha
camarão
=
tam ho Tanto a agulha como o malheiro são de fabricação caseira, variando o
8
Linhas
20
{
devarejo
de caniço
an de ambos conforme a dimensão da malha a ser tecida. Como já ficou
XJl<>sto, as malhas podem ser classificadas pelo seu tamanho: pequenas, mée gr~es. A malha para redes, destinadas à captura de peixes de maior
e, é feita com dois nós, pois oferece maior resistência no "malhá".
21
Nas redes circulares e nos "copo" de redes de arrasto, é necessário o
aumento de número de malhas, isto é, crescentes. O crescente é o duplo ponto
de filé numa só malha.
Os fios empregados para a confecção de redes são: náilon (dizem
nalho), barbante (linha ursa), "fio de jerva" (planta da família das palmáceas) ou
''tucum" (fibra de folhas de certa palma).
A rede é iniciada em uma laçada de fio, que se prende a um prego ou
argola, fixos em parede ou qualquer outro local, que ofereça resistência.
As redes, depois de prontas, sofrem um processo a que se dão os
nomes: "encascá", "encarcá" ou simplesmente "carcá a rêdi". Dizem que, além
de ficar mais resistente, a rede fica furta-cor e "engana u pêxe". Há dois processos de "encarcá" a rede:
1.0 - Submetê-la a fervura em tintura da casca do "mangue" (outros
dão o nome de "molhe" ou "noguera" às ditas cascas). Neste processo de tintura
quente, a imersão não deve ser prolongada.
2. 0 - A rede fica durante 24 horas imersa na dita infusão fria.
Depois do processo de "encarcá", a rede é posta a secar. Para o conserto das redes há caixas especiais, com o material necessário: agulhas, malheiros, fios de todos os tipos. A tralha das redes de pequeno porte é feita de corda de
"barrigueira" ou "piolas". Outros cabos, sisgas, talhas mais grossas, bem como
fieiras e arpoeiras são torcidas com o auxílio de fusos rudimentares. O quadro de
carretéis é outro tipo rudimentar de torcer fios.
BÓIAS: As bóias usadas mais freqüentemente são as de cortiça. Encontram-se, também, bóias feitas de porongos (família das cucurbitáceas) e de
estiropor, "matéria" como dizem os pescadores.
CHUMBADAS OU PESOS: Encontram-se de chumbo propriamente
dito, de sacos de areia e de pedras a que denominam "peita" ou "pioveiro".
A "fateixa" ou "garatéia" é um tipo de "âncora de terra" de ferro e pesa
geralmente 18 quilos. Há localidades em que a garatéia é feita de arame e considerada como âncora de areia e o "fateixo" ou "fateixa" é âncora de ferro. Ambas
têm o mesmo feitio.
AGULHA
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bundinha
BOlAS
cabo ou sls;a
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/
/
E
PESOS
tralha ou orpoelro
cortiço
REDES RETANGULARES
De forma geral, todos os tipos ae reae têm comprimento e largura que
podem ser variáveis. Comumente, chama-se rede ao pano retangular, tecido de
malha. As redes simples não têm crescentes no "côpo". Dá-se o nome de "côpo"
ou "corpo" à parte central da rede, onde o pescado malha. Na parte de cima da
rede, passa uma corda, a tralha, que.segura as pontas das malhas e as bóias. Ao
ato da execução do referido, diz-se "entrai há". Na parte inferior da redeJvai outra
corda que "entralha" as malhas e prende a chumbada ou outro peso qualquer,
como, por exemplo, saquinhos de areia ou "peitas" (pedras). Esta corda que
mantém a rede esticada varia de denominação, conforme a localidade. Em São
José do Norte, Rio Grande, Santa Vitória do Palmar (lagoa Mirim), dizem tralha.
Em Tramandaí e Torres, tralha e arpoeira.
Obs.: Em outras localidades do estado, encontramos as denominações de talão e maromba.
ARRASTÃO: O arrastão é também chamado de rede de arrasto,
de "picaré" ou de ''temo de costa". Seria mais apropriado dizer que o temo de
costa é um conjunto de redes costuradas umas às outras, sendo a do centro com
22
tralha Inferior
23
"cOpo". O arrastão é rede de mar afora ou meio de costa. É usado, também, na
lagoa dos Patos. A rede de arrastão do pescador "folk" vai de 60 a 80 metros de
comprimento. Esta rede é formada das seguintes partes: "côpo" ou corpo, encontro e subencontro. A parte central desta rede, o "côpo", é mais alta e ensacao
peixe.
Obs.: Segundo D. lnácia Gonçalves da Rosa, de São José do Norte,
assim se confecciona na rede o "côpo": "se enfia as 50 malha da artura nu
cordão; na sigunda carrêra dá um crescente i vai aumentandu di déiz in déiz malha, até 5 braça, daí cumeça a diminuí até ficá nas 50 malha, entralha cum as
corda nu sintidu contrariu du ticidu; bóta bóia in cima i chumbada in baxo in
disincontru".
Na parte superior da rede são entralhadas as bóias ou cortiças. Na
parte inferior, os pesos, no caso, sacos de areia. Os saquinhos são feitos de lona.
Nas pontas das redes ficam os cabos. Dizem encarar o cabo ao ato de passar a
corda, tralha ou sisga pelas malhas inferiores ou superiores e prendê-las ao cabo,
a que alguns dão também o nome de sisga.
Observa-se que a nomenclatura das várias partes das artes de pesca
varia de localidade para localidade, e ocorre, até, que tenham, em um mesmo
agrupamento pesqueiro, várias denominações.
O ato de largar a rede chama-se "lancear". São precisos de 1O a 12
homens para este trabalho, com o arrastão. O temo de costa é colocado sobre o
paneiro da ré. A canoa vai a voga de 4 remos e com 6 homens. Um cabo fica
preso na terra. A canoa avaQça, mar adentro de 100 a 500 metros, e depois segue paralelamente à costa. A medida que a canoa avança, as redes vão sendo
soltas pelos proeiros. O rolo de redes (temo) é desenrolado até o fim, momento
em que a canoa retoma à terra, trazendo a outra ponta do cabo. Desta forma, a
embarcação descreveu um semicírculo. Então é que se realiza o cerco, isto é,
são puxados os dois cabos da rede. O peixe fica no "côpo" da rede. A rede é
arrastada a pulso pelos pescadores, que chamam a isto "puxar o lance". O arrastão também pode ser utilizado como rede de espera, preso às andainas (paus).
Há arrastões pequenos também chamados rede de calão, que são puxados por
duas varas, amarradas pelos lados, porém sem "côpo". São redes simples, o processo é que é de arrasto. Geralmente têm de 4 a 6 braças de comprimento e são
arrastados por duas pessoas de cada lado.
Obs.: O arrastão pequeno é a mesma "manjubá", usada no rio Jacuí.
REDES DE ESPERA: Várias denominações regionais são dadas às
redes de espera: singela, de malhá, "menjoada". Em relação ao capturado
chamam-se: rede "di tainha", "di bagri", "caçoeira", etc. Sua denominação generalizada baseia-se em ser ela colocada à espera do pescado, seja amarrada
em calões ou andai nas, seja presa a fateixas ou garatéias de ferro, que a mantêm
estendida. A rede de espera é de forma retangular, com bóias na parte superior e
pesos na parte inferior. O pano é simples, variando apenas o tamanho da malha.
A rede de espera singela tem um só pano. As malhas geralmente são de duas
polegadas e meia. As redes de espera são colocadas em canais, rios, lagoas.
Arma-se com paus que levam o nome de calões e "andainas" (dependendo da
região), ou com garatéias ou fateixas. No mar, somente com fateixas. Quando a
rede é armada com fateixas, colocam bóias grandes, as vigias, acima das mesmas e sobre os dois cantos superiores da rede. O lançamento é feito assim: jogam na água uma fateixa com a bóia respectiva, após a rede e depois a outra
fateixa. Quando a rede é colocada em andai nas, estas são tão altas (8 a 1o
24
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25
metros) que marcam de longe a sua localização. As andainas são colocadas de
distância a distância, conforme o comprimento da rede.
No litoral nordeste, Torres e Tramandaí, dizem calão às estacas da
espera. Em São José do Norte, Rio Gran.de e Santa Vitória do Palmar, "andanas"
ou "andainas". Nestas localidades o calão é um pau menor que serve para abrir
as mangas do saco de camarão.
REDE CAÇOE IRA: Tem 60 braças de comprimento por 5 metros de
altura. A malha é de palmo e meio. E rede qe espera com fateixas.
MENJOADA: Jem um só pano. E colocada em calões. A malha é de
duas polegadas e meia. E própria para bagre e savelha ..
REDE FEITICEIRA OU DE TRESMALHO: E uma rede de espera
confeccionada com três panos de malhas diferentes, entralhados numa só tralha.
O pano de malha mais fina fica no centro. Como as demais redes, é provida de
bóias na parte superior e de pesos na parte inferior. Geralmente é fixada em canais, lagoas e nos baixios, por meio de calões ou andainas. No mar é colocada
com fateix~s. O peixe fica preso ou "malhado" na rede central que é de malhas
menores. E muito usada em Tramandaí, onde o rio-lagoa oferece locais excelentes para a sua utilização.
REDES DE CERCO: Também cramadas de "emalhar", nome genérico dado às redes que malham o "pêxe". E retangular, singela, com bóias em
cima e sacos de areia na parte inferior. Geralmente é um conjunto ou temo de
redes emendadas.
A maneira do lance é que transforma o nome deste tipo comum de
rede. Com redes emendadas, num cerco a pé se diz: rede de ala. A rede vai techando-se e cerca o pescado. O cerco embarcado é feito da seguinte forma: um
grupo de canoeiros cerca com redes um determinado local, as redes se emendam naturalmente, com a aproximação de uma canoa da outra. Geralmente, isto
se faz quando há uma "manta" ou cardume. Cercado o cardume, os proeiros batem com os remos na água, junto à borda da canoa e vão fechando o cerco. O
peixe é, após, retirado com auxílio de jererés, pequenas cocas. O restante fica
"malhado" nas redes. O cerco é próprio para captura de tainhas.
REDES CIRCULARES
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As redes circulares são feitas por meio de crescentes. Uma das mais
conhecidas é a tarrafa. Para iniciar sua confecção, amarra-se uma laçada de cordão a um prego ou argola, devidamente preso na parede. Na laçada, se iniciam
os primeiros pontos, que serão presos, ao término do trabalho, por uma fieira
(corda mais ou menos grossa feita de fios torcidos). O círculo da rede vai aumentando com os crescentes. Os crescentes são feitos, uns abaixo dos outros, na
mesma faixa (sentido vertical). O funil da tarrafa chama-se "pano morto", pois aí o
peixe não "malha". O arremate da tarrafa é o "rufo", feito com dois nós em cada
malha, para reforçar a parte que apanha o pescado. O "rufo" é preso em forma de
bolsa por cordões chamados "tensos", pelo lado interno do "pano". Na extremidade do "rufo", pelo lado externo, se entralham os chumbos, pequenos tubos por
onde passa um cordão torcido.
Há pescadores que não gostam de tarrafear. Preferem trabalhar
"dibaxu da quebra" (no dizer de Joaquim Camilo, de Cassino, praia do Rio
Grande). Acham que a tarrafa não dá rendimento.
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27
SACO DE CAMARÃO: É feito de malha miúda e composto de:
"cOpo", "boca", "mangas" e "funil". O saco tem cinco braças de funil, seis de
boca. Na parte superior da boca vão entralhadas as bóias e na parte inferior, a
chumbada. As extremidades laterais da boca formam as mangas, que consistem
num prolongamento de redes singelas. Na parte inferior e superior das mangas
há argolas onde se fixam os calões que mantêm aberta a boca do saco. Na ponta
do funil, há outra argola onde é presa uma corda ou arpoeira de 4 braças. A outra
ponta desta corda fica amarrada no escoteiro (argola presa ao casco do barco).
Alguns tipos de saco são providos de arcos de arame grosso que mantêm
aberto o funil. Destes arcos, partem duas arpoeiras cruzadas, que se prendem na
tralha superior da boca. A finalidade destas cordas é dar maior resistência ao
saco e facilitar a retirada do mesmo. A colocação do saco é feita da seguinte
maneira: em cada lado das mangas colocam-se os calões, que poderão ser armados em andainas fixas ou simplesmente entre duas canoas, preso pelos remos que, no caso, substituirão os calões. Com o auxílio de outro remo, a argola
do "funil" é empurrada para o fundo da água, ficando a ponta superior da arpoeira
presa ao barco. A boca do saco, aberta com as esporas, deixa entrar o camarão
"só na correnteza duma auga". Diz Júlio Camilo: "si dá inchente nu canal nãum si
culhi nada. A nôte qui dá reboju, deu inchenti, a auga enchi, aí nãum si pesca. Dá
u vasante si pesca."
Para recolher o saco de camarão puxa-se o cordão do funil para o
barco. No caso do uso em andainas, o saco permanece durante a noite preso a
elas e é retirado na manhã imediata.
Em São José do Norte, já se encontram sacos que têm apenas o funil
tecido à mão. O resto do corpo é feito de tela, fabricada especialmente para redes, e que se adquire em fardos. Este tipo de saco é desprovido de mangas e
armado pela boca e,m calões ou "andanas".
COCA: E um saco de malha sem mangas e sem funil. Na ponta do
saco há uma arpoeira, provida de bóia. As cocas grandes têm 6 metros de comprimento. Na boca há u111a entralha. Armam-se da mesma forma que o saco de
camarão sem mangas. E usada em São José do Norte.
COCA PEQUENA: Em Tramandaí dá-se o nome de coca a um saco
pequeno de malha, com arpoeira na extremidade. A boca da coca é entralhada
em arame grosso que a conserva sempre aberta. Há oocas tipo jereré, providas
de cabo, que são utilizadas por meninos para apanharem camarôes, ou pelos
pescadores, nos lances de cerco, para apanharem pequenos peixes.
Obs.: A pesca de camarôes com coca pequena e tarrafas é feita à
noite l m o auxílio de fachos.
TARRAFA
rufo
ESPINHÉIS E LINHAS
Uma das artes mais empregadas pelo pesca'dor, a pé, é o espinhei. É
composto de linha e anzóis. Há linhas ü~ mil metros de comprimento, suportando
300 anzóis. Os tipos de espinhéis diferem. Para mar, beira de costa, não se usam
bóias nem "peitas". Pode ser colocado no mar de 4 formas:
1) um nadador leva a ponta do fio, presa ao calão, até a coroa e, aí,
fixa-o; a outra extremidade do espinhei é presa em estaca, na praia;
2) uma ponta do espinhei fica na praia e a outra é levada mar adentro
com o auxílio de uma grande pandorga (pipa, papagaio);
28
29
SACO
COM
MANGAS
SACO DE CAMARÃO COM ARGOLAS NO FUNIL
corda
arco
aro o ta
30
1
aroota
~ corda
boca
para andanas
31
SACO DE CAMARÃO
Manga do saco de camarão. São José do Norte.
Saco de camarão sem mangas. São José do Norte.
tela de fardo
bóias
boca
32
33
ESPINHÉIS
COCA
bóia
calão~­
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coroa
madre
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soltadelra ou espera
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praia · . · .· · · ·. ··
COCA
PEQUENA
ESPINHÉIS
COM
POITA
corda
JERERÉ
arpoeira
34
I
arame
~
poita/
t
poita
35
ESPINHÉIS PARA RIO E LAGOA
~madre
soltadeira _______.
3) o espinhei é jogado na água, tendo nas extremidades fateixas com
bóias de vigia;
4) ficam em terra presas as duas pontas em fateixas ou calões, a
onda leva a madre para o fundo. Esta maneira exige constante vigilância.
Um espinhei consta de duas partes principais: a espera ou soltadeira
e a madre. A soltadeira é o pedaço de fio que fica entre a madre e a estaca, ou
fateixa de terra. A madre é a parte do fio onde são empatados os anzóis. Conforme o porte do peixe a ser capturado. é o tamanho do anzol e a resistência do fio
do espinhei. Há espinhéis, os fixos, que exigem corticeira acima dos empates. Os
anzóis sâo colocados de palmo em palmo.
No caso de espinhei para rio, de 100 em 100 metros de linha, colocase uma "poita" presa por corda de mais ou menos 30 metros "di fundura". Sobre a
linha da "poita", ficam bóias de porongo que impedem o espinhei de cair totalmente no fundo.
LINHA DE VAREJO: É atirada à água por meio de "varejá", o chumbo
ou "poita". Há linhas de varejo em cuja extremidade colocam-se 3 anzóis, em
forma de garatéia.
garatéla ___,
FISGAS
e...._ bóia de vigia
r.
OOZOIS
/
FATEIXA
fateixa de terra
GARATÉIA OU ÂNCORA DE AREIA
As fisgas sâo instrumentos pontiagudos, de ferro, utilizadas na captura do linguado e do bagre, quando este se acha preso em taipa. Há fisgas com
arpoeira, corda presa à argola da mesma. A outra ponta da corda prende-se ao
braço ou mão do pescador. Há fisgas de um ou até três ganchos e outras tipo
garfo.
PESCA DE BALEIA COM ARPÃO: Cassino (informação de Júlio Joaquim Camilo da Silva, chefe da parelha- praia do Cassino)- "qué dizê qui uma
baleia vai ali, i vai uma embarcação cum um ferro cum dilamite, intão, a genti carrega cum banana (de dinamite), intão a genti pega uma caxa di fósfo i amarra
num páu aondi tá fencadu aquele dilamite, intão si êle vai, a baleia tá qui, du ladu,
comparação, ela vai aqui du ladu, intão nóiz vêmu quandu ela faiz um arcu, anssim dá cabeça qui ela quebra nu mari. lntão, a genti acendi aqueli instupim qui
tem, cum fosfo i leva in cima dela, prá interrá aqueli ferru qui tem dôs (2) metro di
ferru. Tem aicasião qui si mata cum ferru só; i tem casiãos qui si leva treis, quatru
ferru prá matá ela. A lêngua dela quandu é bem gorda, dá quatru, cincu tonél (de
óleo). Aquela cami muitio si aproveitia prá muê, prá fazê u memu óleo. lntão a
genti passa a mão naqueli toicinhu daquela baleia i tira fora, corta. Dáquasi mil
metru quandu ela tá gorda."
ARMADILHAS
.
As mais comuns no Rio Grande do Sul são covas ou juquiás, jiquis_,
curra1s e taipas. Destas, a única usada no litoral é a "taipa de madeira" (Torres). E
um tipo de curral feito no rio; trancada a comporta que dá entrada e saída ao peixe, capturam-no com fisga "e arpuêra nu braçu, a fisga é cum treis ganchu". Outro tipo também usado em Torres é o seguinte: "si faiz us pesqueru di taquara
tramada di ramu, daí si bota lá drento um ingodi prus pêxe."
37
LINHAS
....F
-
DE VAREJO
------rTT.,.........!:=:=--- anzóis
~--___.~--pauzinho
L
CANIÇO OU VARA DE PESCAR
"----------------
linha
.
linha de
GARFO
E
FISGAS
chumbo ----.
tris anzóis
~
empatados~
madeira
arpoe ira
~
LINHA "OI FUNOU"
chumb~------~~~J~J~J---------------=:>
anzóis
C
cruzeta]
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empate
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FACHOS
ARPÃO
anzol
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--ferro
..___corda ou arpoelro
39
38
OUTROS IMPLEMENTOS DE PESCA
TRAMANDAÍ
FACHO: É usado na pesca noturna, especialmente de linguado e camarão. Em Tramandaí o facho é feito de uma lata amarrada a um cabo por meio
de arames. O combustível é banha ou óleo de peixe e também óleo queimado. A
mecha é de pano. Em São José do Norte, no lampião de fachiar, "a pomboca
fonciona cum carbureto".
Sabedoria popular, em relação à pesca:
malha grande
Pescados que se apanham
na tarrafa
TORRES
Nessa praia, utilizam redes de arrasto, tarrafas, espinhéis, coca, fisgas e caniços. A pesca de mar é feita de preferência na ilha dos Lobos (grupo de
rochas), para onde se deslocam em canoas e barco a motor. No rio, pescam de
canoa.
Peixes que se apanham
de espinhei
SABEDORIA POPULAR EM RELAÇÃO À PESCA (TORRES)
Peixe
cação
mango na
espinhei
savelha, tainha, papa-terra
Peixes que se apanham
em linha de varejo
tainha
rede e anzol, arrastão
carne fresca no anzol
Peixe que se apanha
de fisga
,bagre
rede, arrastão, anzol e es- no anzol: carne fresca, o próprio ovo fervido e " ferradô"
pinhel "com ferradô"
limpo sem isca
tainha
espinhei
robalo
rede de malhão ou com
vara
corvina
com linhão, espinhei
malha pequena
ou fina
{camarão
barra adentro
{
corvina
bagre
{
costa da praia
{
papa-terra
viola
{
arra!a (ra~a), corvina
caçao, mrraguaa
viola e bagre
Isca
Material de captura
"engodo" de "bola di farinha di
milho feita polenta, graxa di
gadu, banana madura, moela
di galinha , carne di
passarinho"
tainha
sardinha
papa-terra
savelha
peixe-rei
-(linguado
'
LINHAS
Peixes
papa-terra
corvina
viola
miraguaia
cação
bagre
N. 0 do anzol
Iscas
marisco e tatuíra
marisco e tatuíra
marisco e tatuíra
siri ou marisco
qualquer peixe, de preferência a tainha
marisco, tatuíra, o próprio ovo,
caramujo do mar
12 e 13
9
6
3e4
1e2
7e8
CALENDÁRIO PESQUEIRO (TRAMANDAÍ)
marisco descascado e tatuíra
tubarão
espinhei com 3 anzóis em peixe
cada empate
papa-terra
espinhei
bagre
(no rio)
taipa de madeira e com
fisga
linguado
(de canoa no rio)
facheando com fisga
savelha
Pescado
tainha
bagre
miraguaia
corvina
papa-terra
viola
sardinha
peixe-rei
linguado
camarão
Época
anualmente
setembro a 15 de dezembro
junho a novembro
qualquer época do ano
anualmente
anualmente
maio a dezembro
maio a dezembro
anualmente
janeiro a abril
Observações
melhor em maio
fevereiro interditado
preferência verão
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CALENDÁRIO PESQUEIRO (SÃO JOSÉ DO NORTE)
Pescado
Época
tainha
maio a junho
bagre
pescadinha
agosto até setembro
novembro
corvina
setembro a outubro
papa-terra
linguado
miraguaia
burriquete
cação
camarão
sempre
sempre
setembro a novembro
de outubro a janeiro
janeiro a março
ORGANIZAÇÃO DO GRUPO DE PESCA
(CASSINO- RIO GRANDE)
Observações
corrida: entram em maio
saem em junho
novembro interditado (choca)
maior quantidade na lagoa
dos Patos
novembro a dezembro,
desova ou "arreada"
mais no inverno
mais no inverno
entra na lagoa para desovar
em setembro
migra para o mar em março
Um grupo de pescadores, comandado por um chefe, chama-se
"parelha". A parelha do seu Júlio Camilo é composta de 28 homens- entre eles
muitoS jovens de 14 a 17 anos. Todos com carteira das Colônias.
Observamos, pelo.prefixo das Colônias, que há troca freqüente de locaHzaçAo entre os proeiros. Não se conservam muito tempo em uma parelha.
Embora a vida tormentosa, os proeiros estavam "porfiando" ao som
de uma acordeona "gaita pianada" e violão. O rancho que abriga a parelha é bastante exíguo para número tão elevado de pessoas. Ao longo das paredes, existem tarimbas, tipo de beliche rústico, com cobertores ralos. De baixo dos beliches, o material pesqueiro: rede picaré, sisgas e cabos. No forro do galpão, sobre
umas tábuas, os remos de voga e cordames. O espaço vago entre os beliches é
de 1,50m mais ou menos por 6 a 7m de comprimento. Aí neste corredor, os rapazotes dançavam uns com os outros, aguardando a hora do "rancho". Junto a este
rancho, há outro menor, que serve de cozinha. Aí o "cozinheiro" preparava um
feijAo e peixe a ser comido com pirão de água.
SABENÇAS- da área pesqueira:
"Dus pêxe a gente fala: cola, cadera, cerru i cabeça."
"A bagra entra na barra, na água doce. In nover:nbr~ ~ d~ze~bro pôey
ôvo. O bagri pega u ôvo na bôca e fica na água salobra, t~e1s me1s: Ja_n~r<;>. !everero i março, sem cumê. Arreia us filhu e acompéi!lha ~s f1lhu ao r:nan. Eh s1~ur~ u
ôvo nu céu da bôca. O papu dêli fica arroxado d1 con. O passad1u du bagn é ovo
gôro. o bagri perfilha di 50 a 60 bagrinho na bôca deli. lnquanto us filhu não sabi
nadá êli não larga êlis da bôca. Depois u bagri arrei~ us filhu." .
•
"A raia chóca in cima d'água, na tona d água e perf1lha us ovo na
bôca."
"A mangona só produiz 6 filhote i c.~~ us ôvo na ~-"
,
"A tainha, o produti dentro dela, sa11 va1 prá escama, a1 chóca.
"Us pêxe mas comum da água doei é: tainha, bagri, cabeçu~u •. car~.
taraíra, jundiá, linguadu. U pêxe da água sargada não si cria n~ ~gua_dOC?I: D1~po1s
deli tá criadu êli acompanha a água sargada, si a água é doei d1 ma1s eh va1 prá
salobra."
"lnxova chóca, nãum é boa prá cumê."
"Na maré inchente não si pesca u camarão, só na vazante."
"O cardume fica tudu junto até a desóva."
"Quando u bagri macho tá na chóca disapareci, as bagra proeuru o
alimento prá êli."
,
"Pêxe di água sargada não si cria in água doei, só na salobra.
"A savelha é qui tem mais ispinha. 1' '
"A Iuiz chama u camarão."
"A corrida du ~xe é prá êlis perfilha."
Rebentação: "É a ondia grandi qui quebra. Nóis cantemo a 3.• rebentação di fora prá dentro, us veronistas conti di dentro prá fora."
42
43
EMBARCAÇÕES
CANOA CABRITA (CASSINO - RIO GRANDE)
Parelha de Júlio Joaquim Camilo da Silva.
Nome da canoa- "São Pedro".
"A canoa é di um pau só. É dirrubado u pau di 20 braça di roda. U pau
taqui, farqueja inté êli fica em quatorze, mas a mesma roda. lntão êsse P.au quitá
qui, ficô nessa casca, dispois di cavado dá oitcho cintimo, déiz cintimo. E cavado
cum machadu premera, dispois tem a inchó prá pudê cava. U pau fica ôco pur
dentro mas a roda é a mema.
As· madera meió é cerno, timbuva, figuêra. U pinho já é uma madera
mas pesada prá nóiz, pru mar grosso." A borda da canoa é feita de outra madeira
que se coloca depois do fundo já escavado. Na parte escavada são colocadas as
cavernas, 1/2 semi-arcos de madeira que encostam até a "bordadura tantu dum
lado comu du ôtro". Essa canoa tem cinco cavernas. Acima das cavernas ficam
os banco~ parafusados pelas "tamancas". A proa é a frente do barco, a que corta
a água. E mais fina do que a popa. Boçarda é a parte mais larga da canoa
"cabrita", que fica perto da proa. A ponta mais alta da proa é o "bequi". Logo abaixo do "bequi" há um tipo de paneiro pequeno, recortado, que é o "espelho". Abaixo do "espelho" fica o pàneiro da proa. Após o "espelho", é que a canoa começa
a alargar e forma a boçarda que tem "5 palmus i seis dedus di bôca". Entre um
banco e outro ficam as toleteiras, lugar onde encostam os remos de voga. A
"castanha" é uma caixa de madeira que segura a toleteira, pedaço mais resistente de pau onde se fixa a "forqueta", que é uma braçadeira de ferro, para encaixar o cabo do remo. Este tem 24 palmos.
Próximo à popa, há um paneiro grande que se chama "ré". hiá mais
seis paneiros pequenos, que se tiram e botam no fundo do barco e que servem
como assoalho.
"Isso é paneru qui si faiz incima das caverna, pur inzenplo: ais veis
nóis iscurrega nuis banco, i prá não si pisá, si tais us paneru di madera di pinhu qui
si tira i bota, prá si lavare in baxo, nu costadu i tudu du bóti. Si u naviu chegô; matô
pêxe; lavô, botô us paneru namema hora. Pôca demora êli qué saí, ôtra veis pru
mari, êli tem obrigativo ditá prontu." Na ré, vai a palamenta do barco: redes, etc.
Na borda da ré, há uma argola, "escoteiro", que é para prender as cordas. Essa
canoa tem, de proa à popa, 40 palmos de comprimento. Para largar a canoa no
mar, utilizam 1Orolos de madeira que vão em baixo da canoa. Empurram a pulso.
Para tirar água do barco, usam a "batedera", tipo de colher de madeira.
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CANOA CABRITA A REMO DE VOGA - CASSINO
BOTE- LAGOA MIRIM
beque
forqueta
'
proa
mura
espelho-~~
castelo
paneiro
oblto\
'
'
toletelra
.
. .·
· ..
·.. : ·. .·
popa visto de frente ._ .
popa
DETALHES
/ forquilha ou forqueta
carlinga
costado
quilha
~~~~~~ toletelra
castanho
46
47
CANOA À VELA (TRAMANDAÍ)
CANOA A VELA
É feita de um pau só, escavado. Possui um paneiro na proa, cana do
leme na popa. Tem de um a dois bancos. O mastro fica no quarto anterior da
canoa e é fixado em um cepo denominado "piripau". A vela é trapezóide e se abre
com o auxílio da verga e da escota. A verga geralmente é de bambu. A corda,
chamada escota, prende-se ao escoteiro, argola colocada no costado da canoa.
Usam também a retranca, pau que abre a parte inferior da vela. Usam remo de
pá, com 12 palmos de comprimento e palmo e meio na pá
CAÍCO: Nas lagoas e baixios, os pescadores utilizam-se do caíco,
que é feito de tábuas e tem fundo raso e chato. Os menores medem de 4,40m de
comprimento, com um pontal de 0,50m. Alguns são providos de forqueta, para
remo de voga, outr9s possuem vela, ficando o mastro no quarto anterior.
BOTE: E constituído por quilha (pedaço de madeira que fica na parte
de baixo e vai da popa à proa), onde se encaixam as cavernas. O costado é feito
de tábua. O bote em estudo possui 16 cavernas recobertas por um só paneiro,
que faz as vezes de assoalho. O barco mede 8m de comprimento por 2m de largura. O mastro fica encaixado na carlinga, sobre a qual há um banco "di nome
traquête". Na ponta do mastro há uma verga, presa pela "ostaga". "A verga vai nu
pano. A corda qui alivanta u pano é a mesma ostaga. A qui abre u pano é a mura.
A escota controla u ventu, guverna a vela." Na proa há um tipo de paneiro, que
chamam de castelo. "lncima du castelu fica a obita." A abita é uma argola onde se
amarra a corda da ãncora. Na popa, no lado externo, fica a saia do leme, que é
manobrada pela cana, na ré da embarcação. Os lados do barco têm o nome de
"costados", a beirada ou rebordo superior, de "borda" ou "bordume".
TRAMAHDAÍ
mastro-----..
-cana do
leme
proa-
-popa
per i pau
escoteiro
\ saia do leme
REMO DE Pa
<(<'··· :'(:'::::;:::::
. :.
=="·::::::"·==
· '.. · ' ·:·!.·.
:::::
"'~'
-· H5
:::=:'"""==
···
12
-------------------
PALMOS
------------
REMO DE PA'
1.50m
48
49
PREPARO DO PEIXE PARA SALGA
As tainhas, pescadinhas, são "escamadas" e abertas pela barriga,
cortam o rabo e a cabeça fora.
O corpo assim aberto transforma-se em "manta". A "manta" é cortada em "lanhos", isto é, pequenos talhos para melhor penetrar o sal.
Lavam o pescado em salmoura, outros só põem sal. E, assim, são
prensados entre duas tábuas pra "estilá". Daí, o peixe vai ser submetido ao sol,
posto no ''veral" (varas).
O bagre é também descabeçado e escalado.
"Só qui si abri êli nais coistas prá tirá ais tripa deli."
Há quem coloque peixes "embalçados": depois da salmoura são empilhados em cesto de taquara para escorrer.
O camarão é colocado em balaios, que são emergidos em caldeirão,
ou mesmo tonel, de água fervente. A fervura leva de 20 a 15 minutos e os toma
vennelhos. Depois, é o balaio passado em água fria. O camarão é salgado, com
ou sem casca, e encaixotado. O camarão cru é posto no gelo.
Mariscos- passam pela fervura para abrir a casca. São retirados da
concha, salgados e postos a secar.
Para apanhar mariscos, há quem use pá, fazendo buracos na areia
da praia. Outros cavoucam com as próprias mãos. Onde a água sobe em borbulhas, há mariscos. Conhece-se o arrancador de mariscos ou o "marisqueiro"
pelas mãos: as unhas ficam como roídas. Os mariscos são colocados em balaios.
51
COZINHA PRAIEIRA
O pescado e o marisco são a base alimentar. Os peixes são preparados de variadíssimas formas, dependendo da espécie.
Da tainha, bagre, linguado, podem ser retirados filés ou cortados em
postas. O bagre se presta mais para ensopados. A tainha é ótima para escabeche, embora o pescador "folk" não utilize muito este tipo de preparo.
A viola, como tem a carne "desfienta", é própria para bolinhos.
Os mariscos são aproveitados, refogados, logo após recolhidos, e
mesmo depois de secos.
.
Peixe ensopado- só fervido com sal e "ervas de cheiro": salsa, louro. E comido com pirão de farinha de mandioca cozida no mesmo caldo do peixe.
A cabeça do bagre é muito utilizada para este prato.
Peixe frito - as gorduras dos próprios peixes são aproveitadas para
fritura (ex. tainha gorda). O peixe é cortado em postas, passado pela farinha de
mandioca ou trigo, antes de fritar. Comem com pirão de água fria e também com
café.
Peixe assado - retiram-se apenas as vísceras e conservam-se as
escamas. O peixe é grelhado sobre brasas, enrolado em folha de bananeira ou
sem esta mesmo. Quando está pronto, o "couro" se desprende da carne com
facilidade. Comem com pirão de água fria.
Alguns peixes são usados nos ensopados quando já secos. Do camarão também fazem sopa. O siri não é apreciado; é mais aproveitado na feitura
de pastéis ou casquinhas para vender aos veranistas.
Os pescadores dão preferência, depois do peixe, aos mariscos, em
especial o "maçambique", que é comida do pobre.
O marisco e o "maçambique" (tipo de marisco pequeno) são fervidos
e retirados da casca que os abriga. Limpam-se, retirando o aparelho digestivo e
abrindo as trombas ("perna" do marisco) onde há areia, que, desta forma, pode
ser retirada. São refogados ligeiramente. O "maçambique" é misturado à farinha
de mandioca, resultando uma farofa de cor amarelo forte.
As ovas de tainha, fritas, são outro prato apreciado. Os outros tipos de
pratos à base do pescado, como: "à doré", "escabeche", "à milanesa", etc., são
mais da cozinha hoteleira.
O camarão é usado frito ou refogado, com pirão ou arroz. (A farinha
de mandioca é de mais uso do que o arroz.)
DOÇARIA: Usam mais os "doces de panela": batata-doce, banana,
rapadurinhas de amendoim, etc. A maior quantidade de açúcar que ingerem é na
cachaça.
53
BEBIDAS: A caninha ou cachaça é tomada por todos, inclusive crianças.
LINGUAGEM
Cachaça com butiá e com limão, adoçada com açúcar, é o comum. O
café não falta na mesa do pescador. Observa-se que o chimarrão não é tomado
por pescadores, salvo raras exceções.
A banana é uma das frutas mais apreciadas, tanto crua como frita ou
assada.
O praieiro utiliza termos de sabor português. Por exemplo: rapariga, é
comum para designar uma moça ou menina. Este termo não é empregado no
resto do estado, onde tem sentido pejorativo.
Os apelidos ou alcunhas são muito usados. Muitas pessoas são conhecidas apenas por eles. Certa ocasião, uma carta ficou exposta durante longo
tempo em uma venda (armazém, empório) por não relacionarem o nome, nela
indicado, com o apelido da pessoa a quem era dirigida.
Certas alcunhas prevalecem para a família toda e se conservam através das gerações. Os nomes de família, masculinos, vão para o feminino, quando
se referem a mulher: "as Coelha", "as Fermina". Os homens, geralmente, são
designados pelo nome da mãe: "o João da Nica", "o Pedro da Rosinha".
Os diminutivos são irregulares: João - Janguinho; Joaquina Quinota; Antônia- Nicuta; Maria- Mariquinhas; Manuel - Manequinha; Domingos - Mingote. Outros não têm nada que se relacione com o nome ou o
sobrenome: Donguinha, Nelinho, Picuxa, Filinho.
O tratamento entre pessoas íntimas ou da mesma idade é "tu"; entre
pessoas pouco íntimas é "você". Dos filhos para os pais, avós, tios mais velhos é:
senhor e senhora. O artigo sempre vem designando o nome e este, muitas vezes,
é substituído por substantivo equivalente: "o meu João, não tá"; "a muié, tá
marcando"; "o pai, qué café?" A variação comigo não é usada: "o cunhado, vai
mais eu"; " fui na banca, mais a Juana". O número não concorda com o
substantivo: "os papele"; "o rapaiz quebrô treis pir" (pires) . A palavra "pôco"
(pouco), junto a adjetivo, indica aumento: "esti dôce é pôco bem" (ótimo, muito
bom) ; "a lagoa é pôco funda" (muito funda) . Os verbos, no futuro , não são
empregados: ex .: "vô dizê " . Empregam muitos arcaísmos. Exemplos:
"conhoçudo" (conhecido); "dous" (dois); "sassenta" (sessenta) ; "mais de cento
de pêxe" (mais de cem ... ); "a tristeza chegô a fim" (chegou ao fim); "a fantasma"
(o fantasma); "quero aquel ali" (aquele); "pregunta" (pergunta) ; "mandadeiro"
(mensageiro); "rancoura" (com rancor, contrariado); "pera que" (porque ou por
causa de); "nem nenhuma vai" (dupla negação); "se aproximou-xe" (xe como
reflexivo); "alhur" (alhures) ; "amodi" (a fim de).
.
Formas verbais arcaicas: "não culhe nada"; "não pide isso"; "não
d1gues"; "hai muitia genti"; "poendo ôvo".
Empregam muitos ditos e expressões peculiares: "pelas chagas du
nosso Senhô Jesuis"; "Nossa S'ora nus cubra cum seu santu mantu"; "vaiei-me
~is"; "Deus ti sarve"; "ai Jesuis"; "vaiei-me rica mãe"; "cruzes" (exclamativo) ;
tescunjuro" (quando se referem a coisas do diabo); "lavado" (admiração ou sinal
de crítica, também é saudação- "lovado meu padrinho"); "abençoada ou
54
55
abençoadinho" (sinal de gratidão); "fazendo bôca di bagri" (recusar-se _ou O":Jiti~~
se); "fazendo bôca di si~ " (sil.~nciar); "é coisa ~?i.da" (ex~~era~a\"bo!a sentldu
(prestar atenção); "pego a ... (começou a ... ); s1. ~ando ~sa1u), bot~ .~ogo nas
canela" (correu); "matá u bicho" (tomar algo e~ JSJum: c~fe, cacha~), ~nd~ n~
linguado" (pescar linguado); "and~ -f~chiand<;> (~~scar h.ng~ad.~); mata ~~x~.
(pescar); "aí quitá u busili" (ponto d1f1c1l); "a co1sa ta 1ncard1da (~1f1culd~.de), .f~>l o
mari" (pescar no mar); "foi a lagoa" (pescar na lagoa); "pescorre a red1 (venf1caf.
se o peixe "malhô"); "apersigui a~ r~rigas" (pr~ur.a~ narnorad~~.; "deu a ~
(morreu)· "bateu cum a cola na cerca (morreu); estico as canela (morreu), nao
morreu foi matado" (homicídio); "tá mais prá lá du qui prá cá" (mal de sa~de); "tá
cum u pé na cova" (muito doente, de~engan~?o); "al~ibera sêc~:· (sem d1nhe1r~) ;
"botô as barba di môlho (prevemu-se); mostro as unha (mostrou mas
intençôes); "não mostra us denti" (sisudo); "no pórre" , "no fôgo", "gambá"
(bêbado); "deu no pé" (fugiu); "atirô verdi. prá ~lhê ma~.uru" (pergunta C<?~ se.~
gundas intenções); "de más tenção" (mal1nt~nc1<;>~~do); deu c.uns ~~rro ~.~gua
(saiu-se mal); "não gava a canoa .s~m cru~~ u nu. (~ao ~ntec1par J~lzo), barcu
paradu não ganha freti" (sinal de at1v1dade); e bagn m1udu (pouca C?l~ o~. po~co
caso); "batendo a costêra" (andar.d~ cas~ em cas~ propalan?o n<;>!l.~la~); b~to a
língua di fóra" (exaustão); "nariz d1 folha" (1ntro":l~t1do) ;, m~!le mUie .. e bendito o
fruti" (homem que se intromete em assunt?.fem1n1no); mUI~ m~chu Jmulherqu~
se intromete em assunto masculino); falá na gramática ou mstudado
(pessoa que estudou); "metê a culié" (intrometer-se em assunto alheio); "gal?
capão" ou "mijando no pé" (homem decrépito); "é ma~ di intuit~" (pessoa ~e ma
índole); "é a força du pêxe" (referindo-se a pes~a sad1a o~ a at1tu~.e ~preclá~el),:
"quebram us pratu" (desaver-se); "deu hnha (dar c~nf~ança); ~a1~ na red1
(deixar-se levar); "mordeu a isca" (crer em promessa); ca1u nu 1ngôdo (crer ~m
promessa); "emborcô a canoa" (perder a situação); "canoa furada" (co1sa
enganosa); "escamô-se" (fugiu do assunto); "mostrô as escâm~" (desmasc~rou­
se); "os nove ondia" (veranistas procedentes de. zona rural); n~ retr~nca (na
expectativa); "arre droga" (exclamação de contraneda~e ou de satisfaça~ em ~a.~
ber que alguém foi castigado); "tá qui é um bôto" (multo gordo); "rabo d1 arra1a
(surra); "tomô na cabeça" (desiludir-se, levar um golpe moral); "barb~do, só
camarão" (negar auxílio ou apoio a homem); "saiu rabiando" (sair contranado ou
com volteios); "ismilinguido" (magro, fraco); "tô acoqu.iado" (a~atid~); "tá. n~
inguçu" (assunto ou negócio sem solução ou sem mov1mento); o co1sa ~1m
(diabo); "bicho passamento" (diabo); "genti mitrada" (pessoa muito sabida);
"bruaca", "lampreia" (mulher safada); "a bôca da noiti" (anoitecer); "as barra do
dia" (amanhecer); "tá uma marafunda" (complicado, embaraçado); "cor dum
encarnado" (cor vermelha); "genti di fóra" (estranhas à terra).
LINGUAGEM ESCRITA
O pasquim aparece, já com menos freqüência do que há anos passados. O "pão por Deus", bela mensagem que se enviava em outubro, aos parentes
e amigos, consta apenas como expressão popular: "O fulano, nem q~e tu peça
pão pu r Deus". Isto indica que a pessoa não cederá, mesmo que se 1m piore .. ,
O costume do "pão por Deus" foi introduzido por catarinenses, mas Ja
não é de uso.
56
VOCABULÁRIO PRAIEIRO
Acachapado - meio doente, cansado ou desanimado.
Acampamento - local onde as "parelhas" se acampam com seus ranchos, casas, etc.
Aditá - presumir, quase adivinhar.
Afreventádu - com muita pressa, fazer uma atividade ou trabalho (as
obrigações) às pressas, sair ligeiro.
Aguia - peça de madeira para tecer redes, que substitui a naveta de filé.
Amódi- de modo.
Amulá - esticar ou estender a vela com a mura.
Andanas - tipo de calão bem alto, andainas.
Apiançado - com tosse ou asma.
Ar- golpe de ar, que provoca doenças, dizem: "ramo de ar".
Ardídu - rançoso ou podre.
Arpão - instrumento em forma de flecha, para apanhar o cação e a baleia.
Arpoeira- corda de rede.
Arrastão - rede de arrasto.
Arriá- deixar, largar.
Assoberbá as água - subir na onda ou derramar por fervura.
Baderna - briga.
Bagre- peixe (Tachysurus barbus).
Saita - muito grande.
Banca- local onde se vende e se compra peixe.
Banco do mastro- banco que fica acima do peripau.
Bãnzu- louco, doido.
Batedora - colher para retirar água do barco.
Bater a costera- gente que não tem o que fazer e anda de casa em casa, conversando, geralmente, coisas "sem fundamento".
Beque- parte mais alta da proa de canoa "cabrita".
Bicha- verme. Também usado para referir-se a certo tipo de brincos Qóia).
Bixiga ou varíola - varíola.
Bóia- empregado também como comida, ou porongo ou cortiça, que se coloca
na rede para fazê-la flutuar.
Bôju - lado ou costado da canoa.
Bolina - correr o barco contra o vento.
Bordume ou borda - beirado da canoa.
Bote - embarcação feita de tábuas.
Brincadores- os brincantes do bumba-meu-boi, ou boizinho.
Budega- venda, armazém.
Buriquete - miraguaia pequena.
Bussarda- boca da canoa, parte mais larga.
Buteco - botequim.
Cabo - corda grossa que liga a fateixa à rede ou puxa a rede de arrastão.
Ca~era - os rins, parte mais larga do peixe.
Ca1co - pequeno barco de fundo chato, feito de tábuas.
Calão- pau que fixa a rede de espera ou o espinhei, ou segura a canoa.
Cana do leme- pau que movimenta o leme.
Candiêru - lampião rústico para pesca noturna.
Canela- perna.
Caniço - arte de pesca de vara.
57
Canoa- embarcação feita de um só pau (monoxila) ou construída por pranchões.
Capuera - cestas de cipó para prender galinhas.
Carlinga ou carlinda - tipo de peripau que suporta o mastro.
Carrínhu - maxilar.
Castanha- pedaço de pau, onde se firmam toleteira e forqueta.
Castelo - paneiro da proa.
.
.
Cataplasma- emplasto de farinha de mandioca, posto com aze1te em folhas de
mamona.
Catapora - varicela.
Catinguero - o que leva o saco para juntar o peixe, geralmente em pesca de
_
linguado.
.
Caverna - arco que faz a armação 1ntema da em~arcaçao.
, .
,
Cêrru- espinha dorsal de peixe e de pessoa, tambem chamado f1o du lombo .
Chafurdádu - desorganizado.
Chapuerada - chá feito com várias ervas.
Chata- embarcação de fundo chato.
Cobrêru ou cobrelo - erupção cutânea ou feridas.
Coca- saco de malha para apanhar peixes e camarão e rede em funil para camarão.
Coisa osca - situação difícil.
Cola- do peixe, cauda.
Combro- cômoro, duna.
Constipádu - resfriado.
Copo - pano de arrastão, parte central onde a rede cresce.
Coroa - baixio, junto à costa, onde o mar "quebra".
Corrida de tainha - migração de tainha.
Corríscu - relâmpago.
Costeira - costa da lagoa.
Cucurútu - alto da cabeça ou elevação de terra.
Curtiça- bóia de corticeira.
Deleriado - doido.
Derradêru - último.
Destemperádu - diarréia.
Deu a casca- morreu.
Di já hoje- ainda pouco, recém.
Diariada - muitos dias.
Dibáxu da quebra - trabalho rude.
Difrúçu - resfriado.
Discabeçá - tirar a cabeça do peixe.
Disova- postura do peixe.
Divárdi - à toa.
, .
, .
. _
Divereda - logo em seguida.
Écia - local onde se coloca o caixão mortuano ou o propno ca1xao.
Em popa - correr o barco a favor do vento.
Embalçar - pôr o peixe na salga.
.
,
.
Empáti- corda dobrada e torcida que une o anzol ao espinhei, tambem d1to para
referir-se à prisão de ventre.
Encarcá - ferver ou deixar a rede em tintura do "mangue".
Enchente - preamar.
Encontro - parte do arrastão onde se emendam as redes.
58
Escalá- retirar as vísceras do peixe.
Escota- corda que governa a vela.
Escoteiro - argola da escota.
Espêlhu - pequeno paneiro recortado que fica na proa.
Espiá a fatexa- ancorar.
Espinhei- cem anzóis (ou mais) ou "ferrador" presos à corda, utilizados para
pesca.
Estilá- deixar a água do peixe escorrer.
Fachear- pescar linguado.
Facho - tocha para pesca noturna.
Farrancho - farra, barulho de gente.
Fatexa - âncora pequena.
Feiticeira - rede com três panos e malhas diferentes, a menor no centro, tresmalho.
Férru máxu - âncora da chacreira.
Fisga- instrumento pontiagudo para apanhar linguado.
Forqueta- gancho de ferro que encaixa o remo.
Funil- parte afunilada do saco de camarões.
Garatéia - espécie de âncora para a areia.
Garfo - tipo de fisga com três dentes.
Garrão - calcanhar.
Guela - garganta.
Hê, hê-não.
lmagotada- em magotes.
Imundícia na boca - afta.
lncelência- terço cantado de corpo presente.
lndeix - filho mais novo.
lngodo- isca.
lnquizilado.- ficar contrariado.
lnriba- em cima.
lnticádu- atentado pelo diabo ou pelos maus "sprítu".
lntralhá ou incalá- colocar a chumbada ou as bóias na rede, a tralha.
lnxume- inchação.
lsguedeiádu ou isguripádu - despenteado.
lsguritádu - perdido.
Jereré - peneira de malha para apanhar siri ou transportar peixe.
Jerva- palmácea que produz fios com que se confeccionam as redes.
Jururu- triste.
ladino- esperto.
lagamar- lugar entre bancos de areia.
lançá- vomitar.
Lance- ato de apanhar um cardume.
lanceá - apanhar o peixe com redes.
lancha - embarcação feita de pedaços de madeira.
lanhá- dar cortes nas mantas de peixes.
~ - parte do barco que serve para o dirigir.
'-VYUU- vagaroso.
~da- tempestade que vem do leste.
Ülha de varejo - linha de pescar que se atira na água, sem o auxílio de vara.
~bique- tipo de marisco pequeno, de cor cinza.
~W~CM:J du côrpu- útero.
59
Malha- peixe que cai na rede.
Malhão- rede de um só pano e de malha grande; panos externos dé! feiticeira.
Malheiro - pauzinho que mede o tamanho da malha.
Malineza- malvadez.
Mangas- parte do saco de camarão.
Mangue- casca de planta, cuja tintura "encarca" a rede .
Manobrá- dirigir a embarcação.
Manta- cardume de peixes, posta de peixe.
Mar grosso -fora da rebentação, mar adentro.
Maravalha - barulho, farra.
Maré enchente- preamar.
Maré vazante- baixa-mar.
Mastaréu - parte do mastro que fica acima da verga.
Mastro - pau que segura a vela.
Mau sprítu -espírito maléfico.
Mema cosa- mesma coisa.
Mercar- vender.
Minguádu - magro, pouco ou pequeno.
Mistério- muito grande.
Mitrado - pessoa muito esperta.
Muitia força- muito, quantidade (muitia força di água- di pêxe).
Mura - corda que estende a vela.
Nascida- tumor.
Negação - sem vontade, preguiça.
Nhan, nhan - sim.
Nordestão- vento nordeste forte.
Ostago - cabo que levanta e segura a verga junto ao mastro.
Palamenta - equipamento do barco.
Pamparra- muito, grande quantidade.
Pandorga- pipa, papagaio de papel, pessoa irresponsável.
Panero - assoalho móvel do barco ou pequenos bancos de proa ou popa.
Pano- vela da canoa ou pano de rede.
Pano morto - parte superior da tarrafa, onde o peixe "não malha".
Pão pu r Deus- troca de versos onde se pede um presente (época: outubro- já
caindo em desuso).
Parelha- grupo de pescadores com chefe.
Pensão - preocupação.
Perau - lugar fundo.
Peripau- pedaço de madeira que segura o mastro, no fundo da embarcação; o
mesmo que carlinga.
Pianso- bronquite ou peito chiando.
Pichirica- tipo de candeeiro, cujo combustível é banha ou óleo de peixe.
Poita - pedra atada a uma corda utilizada como âncora para fixar a canoa ou
como pesos para redes de espera.
Pomboca - um tipo de facho.
Popa - parte posterior da embarcação.
Potoca - mentira.
Presa - dentes caninos.
Proa - parte anterior da embarcação.
Proeiro - pescador que não possui material e trabalha por conta dos outros.
Quebrádu- rendido.
60
Quilha - pau que fica no fundo do barco, onde só encaixam as cavernas.
Rabiá - fugir, tirar o corpo fora.
Rabicho- corda que liga a "fatexa" ao calão.
Ramo de ar- tipo de espasmo, doença.
Rancho - casa de palha.
Ré - parte do barco que fica sobre a popa.
Rebardaria- anarquia, desordem.
Rebáti - febre do leite humano.
Rebojo- vento nas velas, sopro de vento.
Rede de ala - rede de encontro e cerco para rio.
Rede de círculo- para lances de um só pano.
Rede de espera - rede fina de um só pano.
Rede grossa- para bagre.
Remo de pá- tipo de remo pequeno, para remar de pé.
Remo de voga - tipo de remo grande, para remar sentado.
Ressolha - brilho que o cardume provoca na água.
Retranca - verga debaixo da vela.
Revirado - farofa.
Ruano - pessoa ruiva.
Rufo - parte da tarrafa que embolsa o peixe.
Saco de camarão - rede com funil.
Saia - parte larga do leme.
Samburá - balaio para juntar iscas.
Sanapismo - emplasto que se põe nos pés.
Sangradô - canal que liga lagoas.
Sapo, sapinho - afta.
Sarâmpu - rubéola.
Sarga - lugar onde salgam o peixe.
Sartei - cair fora, não aceitar.
Sarvar - ato de saudação.
Si aprecatá- tomar cuidado, prevenir-se.
Sisga - tralha grossa dos cabos.
Soltadera - parte do espinhei que fica entre a madre e a garatéia de terra.
Sombra - sombrinha, guarda-sol.
Sorda- caldo, sopa.
Subencontro - parte do arrastão.
Suesse- chapéu "curado" impermeabilizado com óleo de linhaça.
Súli - vento do sul.
Tamanca- suporte do banco do barco.
Tanso- tolo.
Tarrafa- rede redonda com arpoeira e chumbada.
Teleco, esmaiô- desmaiar, perder as forças.
Tenso- parte da tarrafa, cordel que segura o rufo.
Terno- conjunto de redes, também dito a grupo de cantores.
Tirá verso - trovar.
Tiriça ou tiricia - icterícia.
Toletera- peça de ferro que mantém a forqueta.
Tosse cumprida ou braba- coqueluche.
Tralha - corda que se passa entre as malhas da rede, tanto na parte superior
como na inferior.
Traquete - banco da carlinga.
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Trasantonte - antes de ontem, ontem.
Unhero - panarício.
Ursa- úlcera.
vará- atravessar.
.
Varal _ varas onde secam o pe1xe.
Vazá- baixar a água.
vazante- baixa-mar.
Verga- vara que segura a vela.
Vigia_ bóia da "fatexa" que segura a rede.
Visão - fantasma.
Voga - pares de remadores. _
Xerga ou xergão - manta de la bruta.
Zipla- erisipela.
MITOS E LENDAS
DO LITORAL SUL-RIO-GRANDENSE
Os mitos mais conhecidos são: a sereia, o "sprito perdido"
(fogo-fátuo), o lobisomem (em forma de cão), a bruxa e o minhocão (Tramandaí),
em torno dos quais não foram tecidas lendas propriamente ditas, mas apenas
"causos". Cada um conta como, ele ou alguém conhecido, viu "a coisa".
A sereia está muito desacreditada como mito. Com o surgimento de
"terrêros de cabôcos" e com eles a imagem de lemanjá feita sereia, já ninguém
crê nos enfeitiçamentos do canto daquela figura mitológica.
O fogo-fátuo é considerado como um espírito perdido que aparece
"nus lugar invisive aquela tocha di fogo" - a cabeça do "spritu máu" é de fogo.
Os compadres que se casam, quando morrem, seus espíritos se batem e lançam
fogo no ar.
O lobisomem pode ser qualquer homem, geralmente os solteirões ou
viúvos que morem sós, são os mais "apersiguidus di sê lobishôme". Conhecemos vários que eram tidos como tais. E por mais que insistíssemos, não conseguimos desmanchar a imagem popular a respeito da inveracidade. No dizer do
povo, o dito lobisomem, às sextas-feiras, no "ponto da meia-noite", "vira cachorro,
cresce as prêsa, lá neli, i sai di quatru pé pelos escuru, apersiguindu as pessoa".
Torna-se imaterial, com a propriedade de aparecer e desaparecer; atravessa a
água sem molhar-se e até transpõe paredes. Seu local predileto de aparição é a
encruzilhada. Ele "teim parti cum u coisa ruim". "Us mais danosu, come galinha i
assusta us otro cachorro." Dizem que o lobisomem é "ganoso" por aves.
A bruxa não é, necessariamente, como em outras localidades, a sétima filha de sexo feminino. É escolhida entre as mulheres solteironas ou viúvas,
que vivam afastadas do convívio popular. Tem as me3mas propriedades de lobisomem, quanto a tornar-se visível e invisível. Transforma-se em "barbuleta
preta". Só em olhar uma criança, já põe "quebrantu" ou suga-lhe o sangue. A
criança embruxada definha dia a dia. Vai "esmagrecendo", ficando
"empalamada", "ismilinguida". Geralmente a bruxa tem pendores para benzimantos, mas serve somente para os adultos. Quando se deseja saber quem é a
bruxa que está "inticandu" uma criança, se coloca a sua roupinha no pilão e pilase. Logo a bruxa aparecerá na porta ou na janela, "daí ela tá discuberta". Há rezas para afastar as bruxas.
O minhocão é um bicho descomunal que aparece sob várias formas,
na lagoa do Armazém. Alguns dizem tratar-se de uma serpente gigantesca, com
olhos de fogo verde. Outros dizem ser uma cobra preta, com pêlos na cabeça e
língua de fogo. Ainda há quem diga que é invisível, mas muito grande, o que se
percebe pelo bufo e rabanadas que dá Além de apavorar, virar barcos, dizem
que come porcos e galinhas. O porquê do nome minhocão ignora-se.
63
LENDAS
Geralmente envolvem Nossa Senhora e os habitantes das águas. O
espírito religioso herdado dos ilhéus açorianos manifesta-se na ficção ~as lendas
praieiras do Sul. São envolvidos, nas vári~s yersões d~stas lendas, o linguado, a
savelha e o siri. Por vezes aparecem os tres JUntos. O linguado e a savelha representam os "maus peixes" e o siri aparece como o "bonzinho".
LENDA DO SIRI: "Nossa Sinhora foi passiá na bera du riu, quis atravessá êli, i ficô muitio tristi di tê di molhá uis péis. Veiu u siri i si ofreceu-si prá yará.~
Santinha, im riba du casquinhu deli. lntaum, êli varô ela prá ôtra banda. Da1, u s1n
ficô cum u desenhu, dela, nu cascu."
LENDA DO SIRI E LINGUADO: "Um dia Nossa Sinhora foi passiá na
bera du mari. Ficô muitio tempo passiando i si alembrô-se qui ti~ha qui vort~ prá
casa dela. lntaum, ela priguntô pru lingu~du, qui ~ava. du.rmmdu na !Je.n.nha
d'água: ô linguadu, a maré enchi ô vaza? U llnguadu, 1n ~e1z ~~ ~rrespon~e d1neto,
franziu a bôca deli i arremedô a Nossa Sinhora. Pu r cast1gu, f1co cum a bôca tort~,
puruque dantis êli era bunitu. Daí, apareceu u siri i si ~fere~eu-si prá ~ará a ~~n!l­
nha, in riba du casquinhu deli. I quandu u linguadu qUis sa1 du lugá qUI ~~va, ell ~1u
quitava bem chatinho i cum a bôca, deli, torta, prum ladu só. lntaum, ell chamo u
siri i dissi: vem vê só u qui ela mi feiz. Daí, u siri mostrô, pru linguadu, u desenhu du
corpo da Nossa Sinhora nu casquinhu deli."
LENDA DO SIRI, LINGUADO E SAVELHA: "Nossa S'óra, dexô u mininu Jesuis drumindu i foi juntá uns gravetu, na, bera du.riu,_prá ~~~ ~ogo prá i~­
quentá a casa dela, quitava muitio friu. NossaS óra c~m1~ho mUitlo 1s~ perdeu-~'·
já tava bruscu i ela priguntô pru linguadu: qui hora sao llnguadu? U llnguadu, 1n
veiz di arrespondê, arremedô a Santinha. Ficô tortc;> na mema horinha. ~ savelha, quitava lá pertu, não arrespondeu i deu uma ga1tada pur ~eposta. ~a1 a Nossa S'óra si agravosi, i atirô u fexi di gravetu inriba da savelha 1d1ss~ pra ~avelha;
cada di uma varinha dessa é prá sê uma ispinha nu teu corpu. U Siri, qUI tava ali
pertu, veiu i disse ais hora prá Nossa S'óra. Entonce ela abençuô êli, i dexô u
desenhu di dela, nu casquinhu deli."
' Em Torres, há lenda sobre piratas que teriam enterrado seus tesouros
nas fumas e que ali aparecem à noite. Em ~oda a áre~ há lugar~~ asso~.brados
onde aparecem luzes, vultos e ouvem-se gntos, mas sao apenas causos contados em versão pessoal.
MEDICINA POPULAR
A água benta, a própria água pura, as ervas, continuam sendo elemento de cura, ligado às crendices do grupo pesqueiro. Infusões de ervas são
usadas para "esburrifá" sobre os pacientes. Quando colocadas em garrafas com
"arco", transformam-se em essências curativas; são fervidas "cum nánuscada i
mér di abeilia" para "charopadas" ou "garrafadas".
Ervas mais usadas: "arrudi fêma", "arrudi macho", "guiné", "cipó
milome", "alecrim", "pata di vaca", "quebra tudi", "pueju", "trevo", "mastruis",
"baliera", "alevanti", "doradinha", "marcéla", "sabiguerinho", "capim di porco",
"guacu". O azeite doce também é "santo remeidu" passado com "pena di galinha
preta" nas "ziplas". O "sanapismo nuis péis é otro santo remeidu", "si faiz êli di
pirão di farinha di mandióca ou di arrois cuzidu sem banha i sem sali". Certas
"garrafadas", além das ervas, levam, na fervura, um prego enferrujado, cravo,
canela, erva doce; são ótimas para os "empalamados" (pálidos). Há
"chapueradas" fortes "qui cura quarqué inquietação ruim, reumatismu i tudas
duença".
Rosário, tesoura, faca são implementas que o benzedor utiliza. Também agulhas novas e pano "virgi" no caso de "rendidura, quebradu". Os bentos,
as simpatias são usados e as "medidas di santo".
"Pedras" de cabeça da corvina, postas num "breve" e colocadas ao
pescoço do "apiançado", "sára". Criança "inticada" pelas bruxas, se "pila a camisa do anjo nu pilão" ou coloca a tesoura aberta, debaixo do travesseiro da criança.
Para o "papo", medir o pescoço, com uma fita, e oferecê-la para o
santo da devoção; o mesmo para "estômago caído".
ORAÇÕES CATÓLICAS
Ave-maria, Pai-nosso, Credo, são muito utilizados para benzimentos.
Para "raio de sol" (insolação), rezam 3 Ave-marias, 3 Pais-nossos e
um Credo: põem um copo d'água, coberto por pano, "emborcadu na cabeça" do
paciente, "saindu as borbulha, sai o raio di soli". Quando o tempo está mau, prenunciando temporal, queimam palmas bentas para afugentar o raio e o trovão.
As promessas, a serem pagas nas procissões de santos, também
são de uso do elemento praieiro. Oferendas de velas, flores ou fitas são feitas aos
santos e colocadas nos seus altares, nas capelas ou nas próprias casas na frente
"du rigistu du santu".
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65
REZAS E BENZEDURAS- FÓRMULAS
RAMO DI AR- "Eu ti benzu, do ari mortu, ari vivu, ari du sol, ari da
lua ari das estrela, ari do mêo dia, ari da meia noiti e o ari da Ave Maria."
'
CONTRA "RAMO DI AR" (dor de cabeça ou espasmos) - "Fulano
eu ti benzu in nomi di Deus Pai, nomi di Deus Filhu, nomi di Deus Spritu Santu, si
tens quebranti, inveje, olhadu, flatu ô flatolência, ô malancolia, arl di sangui, arl di
istrêla, arl da luna, arl di difunti, arl di ispasma ou arl di instropesia, ô arl friu, ô arl
mortu, qualquer mal qui tivé nesti corpu, qui seje arritiradu cum u nomi di Deus i da
Virgi Maria." Colocam um copo com água em cima da cabeça do paciente. O
copo é coberto com um pano (lenço) branco. A benzedura é feita com um galho
de ramo verde.
BICHEIRA- "Essas são as treis palavra verdadera que seje Nosso
Senhor servidu de cai us bicho dessa bichera: di 9 in 9, di oitcho in oitcho, di seti in
seti, di seis in seis, di cincu in cincu, di quatru in quatru, di treis in treis, di dos in
dos, di um in um, qui caia tudu i não fiqui ninhum. In nomi di Deus i da Virgi Maria."
DOR DE DENTE - "São Pedru subiu u céu cum dedu nu denti. Jesuis Cristu perguntô: U qui tu tem Pedru? Dori di denti mi atromenta, si for bichu
qui morra, si for ~angui qui si ispalhi, in nomi di Deus i da Virgi Maria."
COBRERU - Benzedeira: "Qui é qui eu cortu? Cobreru bradu. lssu
mêmo eu cortu in nomi di Deus i da Virgi Maria, qui é qui cortu?"
Doente: "A cabeça, o mêo e o rabu."
" U qui é qui cortu? Cobreru brabu. Corto a cabeça, u meio i u rabu.
Sequi i ti suma cobreru, furmiguero, imizadi, mal compostu di fulano com u nomi di
Deus i da Virgi Maria."
,
_
SAPINHO OU IMUNDICIA DAS BOCA DAIS CRIANÇA - Benze
três vezes, cortando simbolicamente com faca ou tesoura um capim ou talo de
mamoeiro.
PEITO ARRUINADO- "Jesuis saiu a caminhá, chegô a casa de um
hôme bom i mulhé má. A mulhé má feiz a cama na lama, sára-ti mama."
PARA REBATI (inchação do peito de mulher que amamenta)"Hômi mansu, mulhé braba, casa barrida i aguada, fizem a cama di palha, trabisseru di albada (badana, arreios), pur ondi entrô essi mali, pur aí mêmo saia."
VENTRE VIRADO - "la Jesuis, Jusé, pelo caminho, Jusé ficou pa
trais. ·Jesuis disse: anda Jusé. Não posso Senhor. Qui tem Jusé? Ventre virado.
Então anda Jusé, qui us teus ventri sararão como sarô as minha cincu chaga. Em
nomi di Deus i da Virgi Maria." (Galho de arruda com água benta- 3 vezes)
RENDIDURA- "Qui é qui eu coso? Cami quebrada, ne.rvu tortu, ossu rindidu. Isso mêmo eu coso in nomi di Deus i da Virgi Maria."
BENZEDURAS
RENDIDO - "U qui é qui coso? Cami quebrada, nervu torto, vei~
aberta, ôssu rindidu. lssu mêmo eu côso cum u nomi di Deus, di Santu A!onsu •. d1
São Virtuoso. Cami quebrada tomá a sará, nervu tortu toma a seu lugá, ossu ~n:
didu torna a colá· veia aberta torna a fechá, i todo mali há di ti curá cum nom1 d1
Deu~ i da Virgi M~ria." O benzimento é dito enquant? o benzedor vai costuran.d~
com agulha e linha um Pedaço de pano bran<.;O, que e costurado durante os 9 d1a:>
da benzedura. No fim dos 9 benzimentos, tira a agulha do pano e coloca-o na
fumaça.
66
ZIPLA OU ZIRIPELA (erisipela)- "Vinha São Pedru i São Paulo di
Roma, incontrô cum Jesuis Cristu. Jesuis Cristu pr~untô: qui é gui ai lá? Zipla,
zipela, sinhô, quitá acabandu cum tudu. Vorta P~ru 1P~ulu , benz1 c~":l a erv~ du
monti, cum a água da fonti i u pó da guia, qui u mal t1 sarana, cum n~m1 d1 Deus.I d~
Virgi Maria." (Com água benta, um galho de arruda "dentru dum p1r branco, wg1
-pires branco novo).
PARA ENGASGADO OU AFOGADO- "São Marcus, São Luicas,
São Mateu, vai pidi prá Deus, ispinhu o osso qui tivé nessi pescoço, qui disafogui,
sub ô desça pelu amor di Deus."
_
.
CONTRA HEMORRAGIAS "DI SANGUI" .....- "São Marcus, Sao LUIcas São Mateu cortandu trigu in campu seus, cortou-si Luicas, disse Mateu: sangui Põinti nais v~ia comu Jasuis Cristu te~i .na cêa. (~eia). S~ngui põ~-ti n~ ~rtar.
Sangui, põe-ti in ti, comu Jesuis teve in SI, 1n nom1 d1 Deus 1da V1rg~ Mana.
.
CONTRA MORDIDURA DI COBRA - "São Bento na agua ~nta. I
Jesuis Cristu nu artar, cobra o bichu pecemento (peçonhento) que arrede qUI nó1~
queremu passá. São Bentu mi livri da cobra e todu bichu pecemento cum u nom1
di Deus i da Virgi Maria. Amém."
.
. .
PARA A CHUVA- "Santa Clara, clariai, Santa Est1a, est1a1, Santo
Antônio, manda o sol prá en~ugá os meu lençol." . . .
. . . . .
_
CHUVA E TROVOES- "São Antonho, p1qU1n1nhu, SI v1st1u 1SI car~.
seu cordão di ôro, pegô, seu caminho, camin~ô. Ondi vai S~o A~tonho? Vô nu nu
di Jordão. Abrandai essa tormenta, qui não ca1a nenhum grao. M1nha arma maga:
nifa (alma magnífica), cá nu céu levai iscrita cUm treis cal i di água benta, abrandai
essa tromenta. In nomi di Deus i da Virgi Maria."
..
CONTRA AS BRUXAS- "Fulano eu tincomendu a Deus Padn 1aus
dozi patriarcu e a São Marcu, qui ti livri di todus us de"!loinus: mais ~iq~enu, m~i?­
ral bruxa bruxa bruxa feiticera: freo na bôca, antroho nus olho, gnlhao nus pe1s,
ne~ta ca~a não tem inÚada, nem nesta cumarca toda, in nomi di Deus i da Virgi
Maria."
_
. _
CONTRA AIS ATENTAÇAO- "Ais palavra arretornada" (repet1çao
da reza acrescentando sempre um elemento que vai de um a doze). .
_
"Custódiu sim, amigu meu. Custódiu sim, amigu não. ~us~ód1u quera
sê salvu pela graça di Deus aisim qui dizei-mi ais treze palavra, d1tas 1ar~etorn~­
das. Digas tu qui eu memas sei. Uma a casa santa in J~resalém, ond1 Jesu~s
Cristu padeceu pu r nóis amém. Duas- são as duas taub1nhas au amadu Ju~e .
ondi Jesuis Cristu botô seus sagradus pé. Ais treis, são as treis pessoa da santlssima trindade. Ais quatru, são uis quatru vangelista. Ais ci~cu, s~o ~is cinc~ cha~a
di nossu Sinhor Cristu. Ais seis, são uis seis filhu bentu qUI ando alem ond1 Jesu1s
Cristu padeceu pur nóis amém. Ais seti, são us seti sacrament~. Ais oitc~u . são
ais oitchu venturança. Ais novi, são uis novi meis qui Nossa S1nhora tev1 u ~e~
bentu filhu nu seu sagradu ventu. Uis déiz, são uis déiz mandamentu da le1 d1
Deus. Ais onzi são ais onzi mili virgi. Uis dozi, são uis dozi apóstu. Trezi rain-o tem
u soli, trezi rai~-o tem alun-a, arrebenta-ti diabo, qui a arma (alma) não é tua."
67
FESTAS
A festa mais esperada e mais concorrida é a de igreja- a do Santo
Padroeiro.
Ao término de uma festa, são sorteados ou escolhidos os novos festeiros. Muitos deles se preocupam, com grande antecedência, com os preparativos, para melhor brilhantismo do acontecimento. Uma das primeiras providências é o peditório. Um grupo de senhoras ou moças sai com a bandeira do Santo,
em visitação às casas da localidade. Além do cofre de donativos, levam um papel
almaço, onde serão anotadas as ofertas para o leilão. São aceitos até gêneros
alimentícios, como farinha, açúcar, ovos, etc., com os quais outro grupo prepara
quitutes. O festeiro escolhe 9 casais- os noveneiros - que, por sua vez, enviam
envelopes para uma série de pessoas amigas, que deverão pôr, ali, seu óbolo e
entregá-lo na igreja, durante a novena. Os noveneiros deverão providenciar sobre o coral da igreja, ou sobre banda, enfim, dar um caráter solene ao dia que lhes
está confiado. Entram na igreja com a bandeira do Santo e a colocam no devido
lugar. Em algumas localidades, onde não é possível o comparecimento do padre
em todas as novenas, esta manifestação é feita através do "terço", que é rezado
por "capelão" ou capelôa", pessoa "intindida nas rezas".
A festa divide-se em duas partes: religiosa, com as novenas, procissão, missa, e a profano-religiosa, com fincação ou levantamento de mastro, leilões, quermesse e baile. O levantamento do mastro é feito pelo festeiro e auxiliares (em algumas localidades- o alferes) com acompanhamento de banda de
música. O mastro é colocado na praça ou junto à igreja. Consiste em um pau
bastante alto, onde, no topo, se coloca o quadro de madeira que vai manter o
"registro" do Santo. A festa tem a duração de três dias, às vezes prolonga-se
mais com o baile do festeiro novo. No primeiro dia da festa, o festeiro "velho", com
a banda, vai buscar o festeiro "novo". Geralmente, este oferece alguma bebida
aos visitantes. Daí segue o grupo, com a banda em função, para a igreja. Terminado o ofício religioso, vão todos, sempre com a banda a tocar, para o salão de
festas- geralmente hotel- quando não há casa paroquial ou clube. Durante a
tard~, realiza-se a procissão. À frente, a cruz levada e escoltada por meninotessac_nstãos- ou por adultos. Seguem os andores ou o andor, conforme o número
de Imagens escolhidas para o dia, entre filas de fiéis. Surge aí o folclórico na
forma de vestimentas de pagar promessas, como: "anjinhos", "santinhos" e
Qente que vai descalça ou mulheres idosas com os cabelos soltos, etc. A banda
encerra o cortejo. O sino bate e é lançado estrondoso foguetório. Os salões de
f~. o baile (dito "balhi" por muitos que conservam tradicionalmente a pronúncia
das Ilhas portuguesas) - são enfeitados com bandeirinhas, tiras de papel cref.'O"l· taquareiras ou outros "verdes", que resistam ao tempo como: "aspalgo",
São João", etc.
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A banda instala-se em estrado. O leiloeiro tem recanto escolhido. Utilizam .vári.?s. tipo~. de " caça-n,íqueis": cadeia, telegrama, pescaria, " tudo
premiado , nfas, f1t1nhas, etc. Ha rapazes gaiatos que já conservam, por baixo da
lapela, ?Oieção de cores de fitinhas, para não serem molestados, no baile. A fitinha é t1po de t~a que se paga para poder dançar. São vendidas, em leilão, as
ofertas. que v~nam desde estatuetas, panos bordados, galinha assada, garrafas
de beb1da, ate massas, doces em forma de braços, de animais ou pessoas, e que
for~m o~ertados como promessas. Vendem-se votos para a rainha da festa. À
me1a-no1te, rufam os tambores e o clarinetista dá o toque tradicional da "marca
das damas". Há uma correria geral, as damas escolhem os pares, ou melhor 0
par. Nestes bailes, há os "apartadores", isto é, quando dançam, moças com ~o­
ças, os "apartadores" chegam junto a elas, em plena dança, batem palmas e
a~ moças deverá~ "s~ ap~rtar·: e dançar com os rapazes que bateram as palmas.
Nao s~ pode dar carao , 1sto e, recusar ao moço que venha solicitar dança. Muitas bngas, "rebaldarias" ou "badernas" têm-se dado por esse motivo.
.
A arra~cação ou baixada do mastro é feita na segunda-feira, pelo festelr? novo, ~ue fo1 sorteado diante da iweja, no final da procissão de domingo.
Mwtos!este~ros novos promovem na no1te de segunda-feira um bailareco, que se
toma tao an1mado quanto os anteriores.
_ DOMIN~UEIRA: É a reunião dançante, domingos à tarde, que se re.
aliza nao só em saloes, como em casas particulares.
FESTA DOS NAVEGANTES: Toda a orla marítima festeja o dia de
Nossa Senhora dos Navegantes, com procissão "por água". Nela, há acompanhamento de embarcações, devidamente ornamentadas. Esta festa, como as
outras, obedece às mesmas normas: novenas, procissão, festejos populares.
..
_ PROME~S~S RELIGIOSO-PROFANAS: Além das promessas de
part1c.1paçao em proc1ssoes, das oferendas de massas aos leilões ainda há outros t1pos de promessas - fitas às imagens, velas enfeitadas e 'mesa de ino1centes.
MESA DE INOCENTES: A promessa consiste em oferecer uma
mesa de doces a 7 crianças com menos de 7 anos.
,
~ERN~ DE REIS: M~it? raro, já com tendência ao desaparecimento,
~ outr~ .man1festaçao profan?-rellg1osa. Circulam na época natalina e cantam os
r~ses . Embora se denomine. terno, o número de componentes ultrapassa a
t~es. Há? mestre cantador, do1s contramestres, e o tipe ou tiple, que canta uma
01!ava act~a dos co!"'trame~tres, que cantam uma terça abaixo da voz do mestre.
Nao há traJe especial. Os Instrumentos mais em uso são: violão, acordeona e
tambor. Os grupos demandam ensaio. Alguns mestres são autores da letra cantada pelo temo. Além do Temo de Reis, são cantados Temos de Santos como é
o caso do de "Santa Barbra".
'
MÚSICAS E DANÇAS
Observa-se na nossa música praieira a influência catarinense, especialmente na "canturias", das duplas e trios, tão ao gosto do pescador.
Encontramos algumas cantigas populares ligadas às danças tradicionais como: Cana-verde, Chegadinho, Caranguejo e Riachão.
As modinhas já estão em vias de extinção. Encontram-se, ainda, os
"tiradores de verso", espécie de repentismo.
Os instrumentos mais populares são: o acordeom (dito gaita de
"ponto" ou gaita "pianada"), o ~iolão e o pandeiro.
..
..
O antigo tambor do litoral, acompanhamento dos ternos de reses e
do auto do Boizinho, ainda aparece nos bailarecos de alguns awupamentos.
As danças mais apreciadas nos bailes "de festa" cont1nuam sendo as
"vaneras", os "vanerões", os "chotes" e os "limpa-bancos".
O auto do Boizinho esteve presente em toda a área, durante largo
tempo, por influência da migração catarinense. .
, .
A função que exercia em certas localidades era ec~n~m1~a. Apresentavam-no em hotéis, solicitando contribuição monetária à ass1stenc1a. O arrecadado era dividido entre os participantes da "brincadeira". Com o passar do tempo,
a penetração no meio turístico foi se tornando difícil.
Não houve o devido incentivo para tais grupos, que foram se desmembrando, até se desfazerem por completo.
_
Do grupo de Tramandaí, que fez suas últimas apresentaçoes em
1968, restam os "bichos" guardados em um humilde clube de futeb?l. .
Acompanhavam o auto, para maior brilho, as danças: Jard1ne1ra, Paude-Fita e Fieira.
·
CANTIGAS DE RODA (encontradas na área pesqueira):
1
Você gosta de mim, oh (fulana)
Eu também de você, oh (fulana)
Vou falais com seus pai, oh (fulana)
Para casá com você, oh (fulana).
Si eles disseres qui sim, oh (fulana)
Tratarei dus papeli, oh (fulana)
Si eles disseres qui não, oh (fulana)
Morrerei di paxão, oh (fulana).
71
70
Roda, roda, roda
Pé, pé, pé
Abraçareis quem quizé.
2
Bati qui ti bati na cazinha du beija-flôr
Bati qui ti bati na cazinha du meu amor.
Oh, Mariquinha, oh, Mariquinha
Entrarais na roda i ficarais sozinha.
Eu sozinha não fico, nem hei di ficá
Vo buscá a Rosa para ser meu par.
3
A moda da carochinha
E uma moda singular
Quem bota u juelho in terra
Faiz u povo se ademirar.
O' (fulana)
O' (fulana)
O' (fulana)
O' (fulana)
sacode a saia
alivanta us braçu
tem dó de mim
mi dá um abraçu.
4
La vem u seu Chiquinhu, todo requebradu
Parece um buneco, desingonçado
Eli pula, eli dança, eli sacode a pança.
5
A canoa virô, .pu r dexar ela virá
Foi pur causa da (fulana)
Qui não sobe remá
Si eu fosse um peixinho
I subesse nadá
Buscava a (fulana)
Lá das onda du mar.
Nois semu filha dum rei
I neta dum barão
Nois tudu s'iscondemu
Lá di baxu dum porão
Porão, sabão.
7
·Encontrei as treis Maria
lscondida nu fogão
Vi a dona Helena
Agarrada nu portão
C'uns ólho arregalado
Paricia um ladrão.
Esquidão lê-lê
Esquidão lá-lá
SERENATAS: Há dois tipos de serenata: a romântica e a "surpresa".
A romântica cabe aos enamorados que cantam toda sorte de músicas
conforme a situação. Uma das canções mais populares, para atingir o coração
das "raparigas", é a que diz:
Abri a porta ou a janela
venha ver.quem é que está
E aqueli desprezado
Qui não deixa di ti amá
ou
Qui hoje vem aqui cantá.
As "surpresas" ou "assaltos" são quando os cantores são apenas
amigos que vão brindar alguém conhecido.
Chegam à porta e cantam, oferecen<;io músicas às pessoas da casa e
só param de cantar quando a porta é aberta. E obrigação dos homenageados
convidá-los a entrar e oferecer bebida, café ou qualquer iguaria.
COntinuam a cantar e tocar dentro de casa.
6
Sinhora dona Candia
Cuberta di ôro i prata
Discubra u seu rosto
Queru vê a sua graça.
Qui anju são esti
Qui tantu mi arrodeia
É di noiti é di dia
Padri nosso, Avi Maria.
72
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CARANGUEJO
Cantiga popular
Caranguejo não é pêxe
Caranguejo pêxe é
Çaranguejo está na tóca
A espera da maré
No fundô do mar tem pêxe
Na beirá tem camarão
Nas ondá do teu cabelo
Navegá meu coração
A maré qui enche e vaza
Dêxa a praia discuberta
Vai o hôme, fica a fama
Não hai coisinha mais certa.
repete a mesma
melodia a uma
só voz.
BIBLIOGRAFIA
AMARAL, Anselmo. 1973. Os campos Neutrais. Porto Alegre, Grafislik.
CIDADE, F. de Paula. 1966. Dois ensaios de História. Rio de Janeiro, SEDE.
(Col. General Benício, 48.)
FERREIRA FILHO, Arthur. 1960. História Geral do Rio Grande do Sul. 2.• ed.
Pôrto Alegre, Globo.
FORTES, João Borges. 1940. Rio Grande de São Pedro. Rio de Janeiro, Gráficos Bloch. (Col. Biblioteca Militar, v. 37.)
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Sul. 4.• ed. Porto Alegre, Globo.
MEIRA, Carlos Costa. S.d. A pesca no Rio Grande do Sul. Porto Alegre, SUDEPE.
MENDONÇA, Eisa Brunilde Ramos. 1960-1961. Ilha de São Jorge. Boletim do
Instituto Histórico da Ilha Terceira, nos. 19 e 20.
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Recolhida em Tramandaí.
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rua Flack, 165- Riachuelo- tel.: 201·7399
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