uma Palestra Voltada aos Jovens e Adultos do IF Farroupilha
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uma Palestra Voltada aos Jovens e Adultos do IF Farroupilha
SEXUALIDADE E JUVENTUDE UMA PALESTRA VOLTADA AOS JOVENS E ADULTOS DO IF FARROUPILHA - CA Cintia Müller Leal, Docente EBTT Instituto Federal Farroupilha, Câmpus Alegrete Resumo A palestra expositiva-interativa foi voltada a jovens e adultos do IF Farroupilha - CA e trouxe perguntas, informações e reflexões acerca da sexualidade humana, buscando suprir uma forte demanda de informações sobre sexo. A palestra questionou se o sexo era uma coisa boa. A reação dos jovens confirmou o que a mídia afirma: sexo é uma atividade agradável, porém um estudo realizado com 2.000 jovens diz o contrário: sexo não é uma atividade agradável. Foram abordados aspetos anatômicos-fisiológicos da sexualidade humana, a formação da identidade sexual, a diferença entre sexo total/parcial e suas consequências sociais, violência contra a mulher, a origem dos saberes do jovem sobre sexo. O público fez perguntas escritas e orais, respondidas ao final da palestra. Palavras-chave: Sexualidade; jovens; identidade sexual. Introdução Por que uma palestra sobre sexualidade para a juventude? Não parece um tema desgastado, previsível e sem novidades? Afinal, a “gurizada” tem acesso a qualquer tipo de informação, inclusive as informações relacionadas ao sexo, disponíveis na web. Será assim mesmo? A escolha do tema sexualidade na palestra apresentada aos jovens e adultos do Instituto Federal Farroupilha - Câmpus Alegrete (IFFCA), em 28 de junho de 2013, buscou suprir uma importante demanda dos alunos desta Instituição. Os Parâmetros Curriculares Nacionais preveem que a Escola intervenha pedagogicamente informando e problematizando questões relacionadas à sexualidade como os valores, crenças e tabus, preparando os jovens para o exercício de sua sexualidade de forma responsável e prazerosa (PCN, 1997). Na busca de suprir uma parcela dessa demanda dos jovens de nossa Instituição como também de pôr em prática uma das importantes funções da Educação – a construção e o exercício da cidadania, essa palestra foi construída. Durante o ano de 2011, foi realizada uma pesquisa que buscou traçar um perfil e o imaginário dos alunos do IFFCA relativos à Sexualidade, DSTs, Drogadição e Expectativas de Vida. Um dos resultados que mais chamou a atenção foi a ausência da Escola no papel de orientador, informador nas questões da sexualidade. Pensando nessa necessidade local, procurei dar à palestra, uma abordagem técnica-informativa assim como também um viés psicossocial da sexualidade humana, pensando num público-alvo heterogêneo: jovens com nenhuma ou pouca experiência sexual, mas também àqueles com vida sexual ativa – levando em conta a precocidade do início da vida sexual destes jovens. O que entendemos por juventude é uma construção cultural. Assim como o que entendemos como criança, adulto, idoso é uma invenção humana. Claro que o aspecto biológico é imperativo: o crescimento, o desenvolvimento, a maturidade sexual são inevitáveis, visto que somos animais e todo animal passa pelo ciclo vital. Porém a ideia de adolescente/jovem é algo bastante recente. A partir da Era Industrial (século XIX), o Estado toma para si as várias dimensões da proteção do indivíduo incluindo, sobretudo, a educação. E é nesse contexto que surge a Escola na forma que conhecemos: obrigatória e universal. A partir desse momento, ocorre a cristalização social das idades da vida (Peralva, 1997). A palestra também teve alcance aos adultos presentes: colegas professores, técnico-administrativos e acadêmicos deste Instituto. A essência da palestra foi informar e esclarecer pontos desconhecidos da função sexual humana, a relação possível (mas não compulsória) entre sexo e prazer, as diferenças e semelhanças entre a sexualidade masculina e feminina, buscou discutir a origem das crenças que jovens e adultos têm a respeito do sexo, da condição de gênero, de orientação sexual e o que estas crenças têm a ver com a realidade dessas pessoas, procurando despertar um olhar crítico ao que “sabemos” sobre sexo. A partir dessa reflexão dos conceitos que jovens e adultos têm acerca da sexualidade, procurei sugerir ao público o exercício de uma sexualidade saudável, pautada no amor-próprio, no respeito ao outro, na responsabilidade das ações e acima de tudo, na importância dos relacionamentos. Pois o exercício da sexualidade só traz prazer e felicidade quando acontece com envolvimento emocional. A palestra A palestra começou pela pergunta: Sexo é uma coisa boa? O auditório entrou em polvorosa, gritos, assovios, todos afirmando que sexo era uma coisa boa. Alguns mais empolgados gritavam “é a melhor coisa que existe!” Eu esperava essa reação depois da pergunta, e prossegui na exposição dos slides mostrando algumas representações que encontramos em revistas jovens, revistas adultas, tanto masculinas quanto femininas, nas novelas, filmes, best sellers. Todos mostram o sexo como algo fantástico, maravilhoso, prazeroso. A mídia coloca o sexo de uma forma totalmente positiva e a população compra essa ideia, tanto os adultos quanto os jovens. A revista Yes Teen diz: “O que fazer quando todas as suas amigas já beijaram e você não?” A revista MEN’S HEALTH diz: “Faça sexo como um rockstar! (dicas quentes de Slash e cia)” ; “Seduza sua amiga! (pule o papo de brother)”; “ 7 dicas para adiar seu casamento”. A revista NOVA COSMOPOLITAN diz: “Orgasmo para iniciadas! Tão profundo, tão intenso, tããão demorado que você vai fazer city tour no paraíso.” Estas manchetes e chamadas nas capas das revistas revelam uma visão fútil e vulgar do sexo, a pressão social para que o jovem comece a vida sexual, a preponderância da quantidade de sexo em relação à qualidade, demonstrando a coisificação do ser humano, onde o outro é apenas um objeto e como tal é para ser usado, entretanto o sexo é algo que se faz com outra pessoa num contexto íntimo, mas em nenhum momento se enfatiza os relacionamentos e sim a oportunidade de fazer sexo. Outra observação feita quando avaliamos as mensagens nas revistas é a aversão (especialmente dos homens) ao casamento, entendido por muitos como clausura, a impossibilidade da amizade entre homem e mulher, dentre outras falácias. A seguir mencionei uma pesquisa acadêmica realizada com jovens brasileiros entre 15 e 25 anos, onde era proposto um questionário semiestruturado, com perguntas abertas, de modo a despistar o objetivo da pesquisa. A amostragem foi de 2.000 jovens. Uma das perguntas desta pesquisa era a seguinte: Você é um garoto de 17 anos que está numa festa. Entra na festa uma garota muito bonita e você se sente atraído por ela. Num determinado momento da festa a garota chega em você. Você a beija ou não? Responda sim ou não e justifique: (observação: ela já beijou 10 garotos nessa festa). Resposta da maioria dos jovens: beijar eu beijava, mas ia dar um nojo danado! Esta resposta revela duas coisas importantes sobre a sexualidade do adolescente: a ambiguidade das consequências do ato, pois ele daria o beijo – e beijar uma garota bonita deveria ser algo prazeroso – mas teria nojo – e nojo é o contrário do prazer, é um desprazer! Outra coisa que se revela pela resposta é a necessidade de afirmação da masculinidade frente a seus pares. Ele provavelmente beijaria a garota em função dos outros, não por vontade dele. Afinal, porque ele faria algo que lhe causasse nojo senão para demonstrar sua masculinidade? O que os homens, especialmente os jovens, pensam de um homem que nega uma mulher que se oferece? Uma sombria dúvida a respeito da sua masculinidade iria pairar sobre ele. Após a tabulação destes resultados da pesquisa junto aos jovens, a resposta à pergunta – Sexo é uma atividade agradável? – foi surpreendente. Para os jovens, sexo não é uma atividade agradável. Essa revelação surpreende a todos, foge completamente da crença geral, fugiu da minha crença pessoal, mas é uma afirmação com embasamento científico. Vejamos onde começa o desencontro entre o que o jovem acredita a respeito do sexo e o que o sexo é, de fato, para o jovem. Primeiro, pergunto ao público: de onde vem o conhecimento sobre sexo? Da escola, dos amigos, da família, da pornografia da web, das revistas, dos mangás e animes? As fontes que suprem o jovem de informações são confiáveis, são indicadas? Que visão, que ideia passam aos jovens? Conforme dados da pesquisa de BRITO DA SILVA, 2011, os amigos e amigas são os grandes “orientadores” quando o assunto é sexualidade, embora as meninas declaram que a mãe também as orienta, tanto quanto os amigos. Já para os meninos, além dos amigos aparece a internet e o pai como fontes de informação sobre sexo. Um dado surpreendente é a ausência da escola, na figura do professor, no papel de orientador quanto à sexualidade. Se pensarmos que esses amigos – os mais importantes orientadores em matéria de sexualidade – são também jovens deste mesmo meio, talvez alguns meses mais velhos e com alguma experiência, percebemos as informações não provém de uma fonte capacitada para orientar a respeito da sexualidade. E se imaginarmos que muitos dos informantes também gostariam de se autopromover, contando vantagens, peripécias sexuais mais imaginadas do que vividas, podemos entender a visão distorcida que acaba se formando no imaginário de nossos garotos e garotas, prestes a começar ou já começado a vida sexual. Sigo a palestra convidando o público a conhecer um pouco mais sobre algo pouco estudado e pouco ensinado na escola e também na academia: a Função Sexual. Diferente de outras funções do corpo humano, que são amplamente estudadas e divulgadas, a função sexual é pouco trabalhada na escola. As aulas de Biologia trabalham com algum detalhe acerca dos sistemas reprodutores masculino e feminino, a gametogênese, a embriologia, a gravidez, os métodos contraceptivos, as DSTs. Porém a função sexual é praticamente ignorada. A Função Sexual humana compreende 4 etapas: 1) Excitação: a fase inicial do sexo, que consiste na ereção masculina e na lubrificação feminina; 2) Platô: o intercurso do sexo, o sexo propriamente dito; 3) Orgasmo: um reflexo muscular local, desencadeado por um determinado número de estímulos. Perceba-se o seguinte, estes estímulos que provocam orgasmo, podem ser estímulos prazerosos ou dolorosos. Por exemplo, se for aplicado um choque elétrico numa região específica da medula espinhal, a pessoa tem orgasmo. Nos enforcamentos, a pressão exercida na garganta desencadeava um orgasmo no condenado. Os espasmos que o corpo sofre nesse instante, é um orgasmo. 4) Prazer: sensações agradáveis que ocorrem no cérebro, numa parte chamada Circuito de Papez, também conhecida como Centro do Prazer, que compreende 4 componentes (formação hipocampal/corpo mamilar/núcleo anterior do tálamo/giro do cíngulo). Muitas pessoas pensam que o orgasmo é sinônimo de prazer, mas orgasmo e prazer são coisas diferentes. Orgasmo é um reflexo muscular local, tendo ou não prazer. E o prazer então? O prazer é um fenômeno cerebral. Esta parte da palestra causou um desassossego nas pessoas, ao saber que algo cruel e sádico como enforcar ou torturar alguém pode causar um orgasmo. Esse conhecimento foi usado por torturadores para humilhar e degradar presos políticos na ditadura militar no Brasil. Pense nessa cena, um algoz torturando uma pessoa indefesa, infligindo-a estímulos dolorosos até que ele tenha um orgasmo... “Ah, você gostou? Então vamos continuar...” O público demonstrou desconforto, as pessoas começaram a falar, espantadas, incrédulas, assustadas até. Quando a exaltação do público amenizou, convidei-os a analisar os sistemas reprodutores masculino e feminino, sob um caráter basicamente informativo: enfatizei que os genitais de homens e mulheres apesar de serem tão diferentes, têm a mesma origem embrionária, o útero da mulher corresponde à próstata do homem, que a glande do pênis é equivalente ao clitóris, que o saco escrotal tem a mesma origem dos grandes lábios da vulva. Falei que o corpo modelo do ser humano é o corpo da mulher, assim como o de qualquer mamífero. Isso também desacomodou o público, pois a cultura ainda é muito machista, especialmente na Fronteira Oeste do RS. E quando falei que o corpo básico dos animais é o da fêmea, provavelmente desapontei o macho que se imaginava o modelo. É a Biologia contrariando a Bíblia, demonstrando através de provas embriológicas que Eva “veio antes” de Adão. Depois de alguns esclarecimentos quanto à anatomia e fisiologia dos genitais humanos, passamos a analisar a parte cerebral. Neste ponto da palestra, o assunto foi prazer. O que é um prazer? Comer, ouvir música, jogar futebol são prazeres? Isso depende da pessoa. Para uma pessoa anoréxica, comer é uma tortura. Para amantes de música clássica, ouvir rock pesado é uma tortura. Um ato só é prazeroso quando estimula o centro do prazer. E para quem pensa que prazer é algo supérfluo, saiba que se a pessoa tiver uma lesão no centro do prazer ela não sentirá mais prazer e isso leva à morte. A ausência de prazer causa déficit imunológico, problemas circulatórios dentre outras complicações. Podemos concluir então que sentir prazer é importante para a saúde! Considerando a região cerebral responsável pelo prazer, 92% dela responde pelo prazer sexual e 8% da área é dedicada aos outros prazeres. Quando o Circuito de Papez é 100% estimulado, ele entra em estado refratário efetivo. Nesse estado, o Circuito de Papez para de receber estímulos e passa a enviar estímulos a outras regiões cerebrais: Lobo Ociptal: quando recebe estímulos do centro do prazer, a pessoa enxerga melhor as cores, melhora a nitidez da visão. Homúnculo de Penfield: região sensorial, melhora a percepção da realidade, a sensibilidade fica aflorada. Lobo Frontal: região responsável pelo raciocínio, cognição. Quando essa parte do cérebro recebe estímulos do centro do prazer, ficamos mais ágeis no raciocínio, resolvemos problemas mais rapidamente, melhoramos o acesso à memória, aumentamos o rendimento intelectual. Quando um escritor, um artista entra nesse estado, eles têm o chamado “surto criativo”, um período de intensa produção, de abundante criatividade. Lobo Temporal: quando estimulado, aumenta a harmonia, que é o que diferencia música de ruído. Quando sentimos prazer, os ruídos do cotidiano “parecem música”! Sistema Límbico: é o centro das emoções em nosso cérebro. Quando estimulado pelo Circuito de Papez, a pessoa tem redução da dor, diminui também a depressão, a tristeza, a angústia, a mágoa e aumentam as sensações de alegria, felicidade, o indivíduo consegue entrar em estado de relaxamento profundo. Tálamo/ Hipotálamo/ Tronco cerebral: responsáveis pelo funcionamento de nossas funções vegetativas. Quando estimulados pelo centro do prazer, ocorre uma melhora geral do desempenho orgânico, ou seja, nossos sistemas de órgãos funcionam melhor. Após todas essas informações a respeito das consequências do prazer para nosso corpo, percebemos que quando o Circuito de Papez estimula essas diversas partes do cérebro, ocorre uma melhora de rendimento em todas as áreas, ou seja, quando sentimos prazer o mundo fica mais bonito e a gente fica mais saudável, inteligente e feliz! Contudo, essa estimulação só acontece quando 100% do Circuito de Papez é acionado. Aí cabe uma pergunta: o que é necessário para acionar 100% do Circuito de Papez? Primeiro devemos falar dos circuitos neuronais que chegam ao Centro do Prazer. Ao mapearem estes circuitos, os pesquisadores concluíram que 50% provém de estímulos físicos (táteis, olfativos, sonoros, visuais) enquanto os outros 50% dos estímulos são emoções. Concluímos que sexo sem envolvimento emocional pode desencadear orgasmo, mas não dispara o prazer. Este sexo que provoca orgasmo sem desencadear o prazer é chamado sexo parcial enquanto o sexo que é feito com envolvimento emocional, provoca orgasmo e prazer e é chamado sexo total. Uma relação sexual casual, com alguém que você não conhece, será sexo parcial, aquele que causa orgasmo, mas não dispara o prazer nem suas consequências sobre nosso organismo. Quando temos uma relação sexual com alguém que estamos apaixonados, alguém que amamos, será considerado sexo total e teremos orgasmo, prazer e suas maravilhosas consequências, que podem perdurar por até 48 horas. Consideramos o segundo caso, o de um casal apaixonado que entra em estado inicial do sexo (excitação), ocorre um aumento da tensão sexual e a relação acontece: o organismo de ambos acelera os batimentos cardíacos, aumenta a frequência respiratória, aumenta a temperatura corporal, e após o orgasmo e o prazer, o corpo dos dois entra em estado de tensão sexual zero que equivale a um estado de relaxamento total. Considerando o primeiro caso, de uma relação sexual onde os parceiros não se conhecem nem tem nenhum envolvimento afetivo, o sexo acontece também e há um aumento da tensão sexual, ocorre orgasmo, mas o nível de tensão sexual não cai a zero, não há um relaxamento total, pois o sexo foi parcial. Sobra uma tensão residual que vai aumentando a cada sexo parcial que esse indivíduo faz. (fig.1). Fig. 1 - Níveis de tensão sexual Altos níveis de tensão sexual faz a pessoa estar constantemente buscando sexo, e não importa o quão hábil é seu parceiro de cama, esse tipo de sexo nunca irá satisfazer, pois é sexo parcial. O relaxamento total só acontece se houver prazer, que é alcançado no sexo com envolvimento afetivo. Quanto maior o número de relações sexuais parciais, maior é o nível da tensão sexual e isso tem graves consequências sociais. Um homem com alto nível de tensão sexual (fig. 2) é incapaz de estabelecer múltiplas relações afetivas (filial, paternal, fraternal, conjugal), pois toda pessoa é potencialmente um parceiro sexual. Isso também leva à erotização das crianças, à pedofilia e ao abuso. Além disso, muitas vezes se observa um aumento do nível de violência e brutalidade contra outros homens. Esse indivíduo não abraça nem toca outro homem por medo de sentir atração por ele, então ao invés de abraçar ou tocar um amigo, ele age com violência contra ele. A homofobia se enquadra também aí: um homem altamente intolerante/violento aos gays, é muitas vezes um homem com medo de sentirse atraído por outros homens, tal é seu nível de tensão sexual. Questionei a plateia: “vocês conhecem aqueles homens mais velhos - e pode ser até na família de vocês – que ninguém deixa ficar sozinho com as crianças? Que é melhor não deixar sentarem no colo... Pois lhes digo, muitos desses homens viveram uma vida de sexo parcial, o sexo sem amor, o sexo que não sacia o desejo, do mesmo modo que a água do mar nunca poderá matar a sede.” As pessoas da plateia acenavam afirmativamente com a cabeça, respondendo-me “conheço”. As conversas paralelas intensificaram, as pessoas trocando histórias, “o velho tarado que morava na casa da esquina”, “o cara que passeava devagarinho de carro do lado da pracinha, devorando com os olhos os meninos que jogavam na quadra” , histórias que muitos de nós têm para contar. Fig. 2 – Níveis de tensão sexual Estes altos níveis de tensão sexual em muitos homens acaba causando uma grande influência na formação da identidade sexual feminina. Se analisarmos segundo uma perspectiva freudiana, a identidade feminina se dá no contato com o pai e a identidade sexual masculina, no contato com a mãe. Pense num homem de meia-idade, com alto nível de tensão sexual acumulada, cuja filha está na adolescência, transformando-se em mulher. Se ele for um homem decente, acabará evitando cada vez mais, o contato físico que antes era tão comum, quando ela não tinha um corpo atraente, de mulher. E nesse momento em que a garota, formando sua identidade sexual feminina, busca o toque, o afeto, o contato com o pai , este se retrai visivelmente. O que essa menina pensa e conclui? “Meu pai não gosta de mim porque sou mulher. Ser mulher é ruim.”. Essa rejeição muitas vezes deixa marcas para o resto da vida. Essas futuras mulheres buscarão em seus relacionamentos o “pai”. São mulheres de personalidade submissa, capazes de suportar situações indizíveis por um pequeno instante de afeto. Quem já ouviu histórias em que a mulher é traída pelo marido, sofre violência verbal, violência física mas basta o marido violento pedir desculpas, prometer não mais agredi-la, alegar ciúmes ou uma desculpa qualquer e essa mulher volta a morar sob o mesmo teto e partilhar da mesma cama e a história repetir-se outra e outra vez? De que modo muitas dessas histórias acabam? Reflitam, lembrem. Já na formação da identidade sexual masculina, essa carência afetiva não ocorre de modo tão frequente, pois as mães raramente evitam o contato e as demonstrações de afeto para com seus filhos homens, independente da idade. Isso faz com que os homens adultos, quando vão encontrar uma companheira, uma esposa, não buscam o afeto de suas mães, pois o tiveram quando crianças, adolescentes e até adultos. Os homens vivem os relacionamentos de um modo mais saudável que as mulheres, pois não buscam na companheira, um afeto negado de suas mães, buscam o amor de uma mulher. A sexualidade masculina e feminina também difere em relação a outros aspectos, como por exemplo, o anatômico. Enquanto o menino enxerga e conhece seus genitais desde cedo, a menina já não consegue. Portanto o desconhecimento acerca do próprio corpo é mais pronunciado nas meninas do que nos meninos. E pensemos juntos, será importante conhecer o próprio corpo para desenvolver a sexualidade? Outro aspecto em que homens e mulheres diferem consideravelmente: as diferenças neurológicas ligadas a função sexual. Enquanto no homem, 100% dos neurônios que chegam ao centro do prazer provém das zonas erógenas, na mulher 50% destes neurônios originamse de zonas erógenas e os outros 50% partem do útero, órgão relacionado à reprodução a não ao prazer. Esta inervação do útero está relacionada ao parto. O que isso significa? Que para abastecer o Circuito de Papez com estímulos físicos, o homem consegue atingir o orgasmo em um tempo médio de 10 minutos, enquanto a mulher, por ter a metade dos neurônios que levam estímulos ao Circuito de Papez, ela demora o dobro do tempo. Isso acaba gerando um descompasso na relação sexual em muitos casais, onde o homem termina antes de sua companheira alcançar seu orgasmo. Os aspectos socioculturais também afetam diretamente a sexualidade. Vivemos numa sociedade Ocidental judaico-cristã patriarcal, fomos modelados numa cultura onde o homem é mais valorizado que a mulher, onde o sexo é considerado algo feio, sujo, errado, uma prática reprimida até o casamento. Uma sociedade que ainda tem muita dificuldade em aceitar a diversidade sexual, de credo, de cor etc. Entretanto também vivemos um momento de modernidade líquida (Bauman, 2004), onde absolutamente tudo é movediço e incerto: as profissões, as carreiras, o emprego, os códigos sociais, a economia, a política e até as relações interpessoais são efêmeras. Viktor Frankl, psiquiatra austríaco afirmou na primeira metade do século XX que a causa dos transtornos mentais no futuro não será a repressão e sim a falta de sentido da vida. Esse vazio existencial leva à coisificação do ser humano, o outro é um objeto para meu usufruto. Um dos símbolos dessa coisificação é a prática extremamente difundida entre os jovens do “ficar”. O que é o “ficar” e o que significa namorar? A diferença básica é o grau de compromisso, enquanto ficar não pressupõe qualquer compromisso o namorar envolve uma responsabilidade, um contrato, um compromisso. Os jovens em suas festas, que são consideradas boas quando estão cheias de gente, ambiente escuro, música alta, onde fica impossível conversar, conhecer o outro, a grande agitação disfarça a falta de assunto, as pessoas ficam desobrigadas a se mostrar, a se comunicar. O que se faz então? Vão para trás da pilastra e beijam na boca, sem muito papo, muitas vezes sem nem saber o nome do outro. Esse “ficar” é essencialmente um encontro sexual sem compromisso, onde um usa o outro de modo consensual. E o que deveria ser uma oportunidade para desenvolver a afetividade, a autoestima e a autossatisfação, acaba sendo virando um ranking, onde o sucesso da noite é medido pela quantidade de gente com quem se “ficou”. Importante destacar que esse comportamento é aceito para garotos e condenado para garotas. Lembre da pergunta feita pela pesquisa: “a garota linda já beijou dez garotos na festa, você a beijaria? Beijar eu beijava, mas ia dar um nojo danado”. A coisificação do ser humano desde cedo, na iniciação sexual dos jovens, acaba levando a uma dificuldade de aprender a se relacionar, dificuldade em se comunicar, em mostrar-se para o outro. O isolamento e a solidão se pronunciam, a vida fica vazia, sem sentido e tantos recorrem ao abuso do álcool, das drogas e não raro o suicídio. Considerações Finais Todo esse panorama descrito anteriormente mais o resultado da pesquisa de opinião dos jovens a respeito do sexo nos leva a concluir: sexo sem amor não só não dá prazer como também faz mal à saúde! E o que fazer para que o sexo seja algo bom? O autoconhecimento, tanto físico quanto emocional, a autoestima, o respeito ao outro e a cumplicidade, o envolvimento emocional, a constante revisão de nossos conceitos, refletir a origem desses conceitos, reavaliar constantemente nosso comportamento e ter responsabilidade com nossos atos, pensar que sempre teremos que lidar com as consequências deles. Encerro a palestra deixando a dica: amem, respeitem (-se), envolvam-se e sejam felizes e responsáveis! Se essa conversa informativa e reflexiva que tivemos na tarde do dia 28 de junho de 2013, tiver servido para despertar e/ou informar alguns jovens e adultos do IFFCA a respeito da sexualidade, acredito que a Escola, como Instituição também responsável pela formação de cidadãos, tenha cumprido um pouco mais o seu papel. Referências BAUMAN, Z. Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos. Ed. Zahar, 2004 BRITO DA SILVA, E.G. Sexualidade, DSTS, drogadição e expectativas de vida: uma caracterização do perfil e do imaginário dos alunos do IF Farroupilha, Câmpus Alegrete. Relatório Final (versão 2011/1). FRANKL, V. E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. Petrópolis: Editora Vozes, 1991 PCN. Apresentação dos Temas Transversais. Ética. MEC/SEF,1997 PERALVA, A. T. A juventude como modelo cultural. REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO Nº 5,1997 REVISTA MEN’S HEALTH, Nº 77, Editora Abril, 2012 REVISTA NOVA COSMOPOLITAN, Ano 38, Nº4. Editora Abril, 2010 REVISTA VIP, Edição de dezembro, Editora Abril, 2008 REVISTA YES TEEN, Ano 4, Nº39. Editora On Line, 2011