Copa das Confederações e Jornada Mundial da Juventude Católica
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Copa das Confederações e Jornada Mundial da Juventude Católica
ESPECIAL RIO 2017 — Reportagem um olho na bola, outro na missa por Lívia Neder Recém-inaugurado, o Centro Integrado de Comando e Controle do Estado vai centralizar o monitoramento pablo jacob Copa das Confederações e Jornada Mundial da Juventude Católica, um evento de logística mais complexa que a dos Jogos Olímpicos, são os primeiros testes para a capacidade de organização do Rio. Transporte é o maior desafio, agora e em 2016 T ransporte público lotado, engarrafamentos, insegurança nas ruas, imagina na Copa... A Copa já está aí — não a do Mundo, mas a das Confederações — e o bordão pode ser colocado à prova a partir do dia 16, na primeira das três partidas que serão realizadas no Maracanã pelo torneio. No dia 23 de julho, começa a Jornada Mundial da Juventude Católica (JMJ), com a participação do Papa Francisco em primeira visita internacional, e o Rio terá novamente a chance de mostrar como está se preparando para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Com características e proporções diferentes, os primeiros eventos podem ser considerados testes e trazem desafios peculiares ao poder público. A maior preocupação é com o evento religioso, que mudará a rotina da população, principalmente no que diz respeito à mobilidade urbana. Enquanto a Copa das Confederações, que ocorre em outras cinco cidades-sede pelo Brasil, tem um público estimado em 50 mil pessoas no Rio, a JMJ, com expectativa de público de 1,5 milhão de pessoas, prevê logística maior do que nas Olimpíadas. Antevendo transtornos para a população, o prefeito Eduardo Paes pede a colaboração dos cariocas, apelando para que tenham paciência durante a JMJ. Para minimizar impactos, decretou quatro feriados durante o evento católico — dia 23 de julho, a partir das 16h; 25 e 26; e no encerramento, dia 29, até o meiodia. Os feriados excluem atividades como comércio de rua, shoppings, bares, restaurantes, centros comerciais, estabelecimentos culturais e pontos turísticos “para que a cidade não pare”. Já na Copa das Confederações, acredita que a cidade funcionará normalmente. — A Jornada não é um evento trivial. Com relação à logística, à imprevisibilidade e à quantidade de pessoas reunidas num mesmo lugar, esse evento tem uma complexidade maior do que as Olimpíadas. No caso da Copa das Confederações, assim como na Copa do Mundo, é diferente, já que serão jogos concentrados num estádio da cidade, com uma lotação previsível de pessoas. O Rio já tem uma experiência acumulada com eventos realizados como o réveillon e o carnaval, mas vamos ter na Jornada certamente uma semana de transtornos para o morador. É uma honra para o Rio receber a Jornada, a primeira visita do Papa em país estrangeiro, sendo o primeiro Papa da América do Sul. Isso exigirá de todos os cariocas algum sacrifício — diz o prefeito. Consultor em turismo e o coordenador geral dos cursos de Turismo e Hotelaria e do MBA em Turismo da UniverCidade, Bayard Boiteux ressalta que nesses dois meses os olhos do mundo estarão voltados para o Rio, por meio da imprensa internacional. Ele destaca que a cidade terá oportunidade única para identificar pontos positivos e negativos em grandes eventos, adotando alternativas imediatas e soluções de médio e longo prazos. Boiteux lembra, arraste as imagens Estação do metrô de Botafogo lotada: especialista alerta para a baixa capacidade dos transportes de massa pedro kirilos ainda, que um grande evento só é bom para a cidade quando é bom para a população anfitriã. — Temos que aproveitar esse momento para mostrar ao mundo o quanto o Rio está preparado para receber os grandes eventos que propôs realizar. Aos poucos a cidade vai se estruturando, mas ainda existem pontos que preocupam, como a longa distância que os peregrinos vão percorrer a pé para chegar a Guaratiba, na Jornada. São cerca de 13 quilômetros. Fiz uma pesquisa e não vi casos semelhantes em cidades pelo mundo que realizaram o evento. Sempre são escolhidos lugares centrais. A falta de sinalização e de centros de atendimentos ao turista pela cidade também é um problema. Existem muitos investimentos em infraestrutura, obras, mas é preciso dar atenção às coisas simples de serem executadas — pondera. Na Copa das Confederações, o trânsito terá modificações apenas no entorno do Maracanã, segundo o planejamento da Rio Eventos. A empresa da prefeitura criada para organizar a cidade no calendário desses grandes eventos informa que o esquema será o mesmo feito no amistoso Brasil x Inglaterra de 2 de junho, e afirma que se trata de uma operação normal, talvez um pouco pior na final, dia 30. Serão 13 pontos de interdição de vias. A proibição de vagas de estacionamento nas ruas começa nos dias anteriores às partidas, e o objetivo é conscientizar as pessoas a utilizar os transportes de alta capacidade para ir ao estádio. Com uma logística bem mais complexa, o plano de mobilidade da JMJ prevê a instalação de três pontos de acesso fora do município para controlar a entrada dos cerca de 20 mil ônibus fretados pelos peregrinos. Os coletivos serão adesivados antes de chegar ao Rio nas cidades fluminenses de Casimiro de Abreu e Petrópolis, e no interior de São Paulo, em Cachoeira Paulista. E estarão proibidos de circular no Rio entre 19 e 30 de julho, exceto nas rotas definidas para desembarque dos peregrinos, que serão conectadas ao transporte público. Depois do desembarque, os veículos serão deslocados para bolsões de estacionamento em Paciência e no Recreio dos Bandeirantes. Para se ter uma ideia da quantidade de ônibus fretados, a frota carioca é de 9 mil ônibus. — Na Jornada, o desafio é mitigar os transtornos. Pedimos que a população evite sair de carro nesses dias. Nenhum lugar do mundo está preparado para receber um evento desse tamanho sem que haja transtornos. Em Madri, a cidade parou. Aqui, não, nosso desafio é manter a cidade funcionando, manter o carioca no maior conforto possível e ainda assim receber o evento — explica o presidente da Rio Eventos, Leonardo Maciel. Engenheiro de Transportes da Coppe/UFRJ, Fernando MacDowell acredita que o sistema de transportes da cidade está aquém do desejável para o calendário de grandes eventos. O especialista, ex-diretor do Metrô Rio, afirma que faltaram planejamentos e investimentos nos transportes de massa. — Lamentavelmente, capacidade nós não temos. Aí vem a prefeitura e decreta feriados, que trazem prejuízos para a economia local. Para nós, isso é uma derrota. A Linha 1 foi projetada para trens a cada 90 segundos, transportando quase 60 mil pessoas por hora. Hoje, os intervalos levam cerca de quatro minutos, e os trens transportam apenas 25 mil pessoas. Se no horário do rush não dá conta, imagina com essa expectativa de turistas que a cidade receberá. Vamos ser julgados, estamos sendo vistos pelo mundo inteiro. Os estádios, locais de eventos, tudo bem, ficam prontos, mas e os acessos, os congestionamentos, sistemas de sinalização inteligente? — questiona MacDowell. Os atos centrais da JMJ acontecerão na Praia de Copacabana, nos dias 23, 25 e 26 de julho, e em Guaratiba, dias 27 e 28. Com exceção da missa de abertura do dia 23, realizada pelo arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani Tempesta, o Papa Francisco estará presente nos outros quatro eventos. Para o deslocamento até Copacabana, a Rio Eventos acredita que 60% do público irão de ônibus, 10%, de metrô e 30%, por outros meios, provavelmente caminhando. Já para Guaratiba, serão três rotas de caminhada, partindo dos pontos finais de linhas de ônibus e trem, no Recreio, em Santa Cruz e em Campo Grande. Durante a JMJ, operações de trânsito serão realizadas nos locais dos atos religiosos e em áreas da cidade como o entorno dos aeroportos e da rodoviária. Perto da data do evento, a prefeitura anunciará esquemas especiais de venda de bilhetes de metrô e trens. Como foram decretados feriados, há previsão de remanejamento de linhas de ônibus para os locais que receberão os eventos. Para articular a participação de todos os órgãos de segurança num planejamento geral, o governo federal criou a Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, do Ministério da Justiça. No Rio, a base para essa articulação será o Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) do estado. Recém-inaugurado na Cidade Nova, próximo ao Sambódromo, o espaço reunirá representantes de todas as esferas de segurança. Na Copa das Confederações e na JMJ, serão destacados para as áreas de eventos da cidade cerca de 16 mil homens, somando as polícias Federal, Rodoviária Federal, Civil e Militar, além de guardas municipais, agentes de trânsito, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil. Esse efetivo contará com um reforço de mais 1.600 homens da Força Nacional de Segurança Pública. Diferentemente de eventos como a Rio+20, não serão vistos militares das Forças Armadas fazendo policiamento ostensivo nas ruas. Aos homens de Exército, Marinha e Aeronáutica, caberão o patrulhamento aéreo e marítimo e a atuação contra o terrorismo. Diretor de Operações da secretaria extraordinária, José Monteiro destaca que o Rio é a cidade que mais receberá policiamento nos grandes eventos. Como principal legado para a segurança pública, além da aquisição de equipamentos de alta tecnologia, ele ressalta que pela primeira vez todos os órgãos atuarão dentro de um planejamento estratégico, conversando entre si, em um centro integrado, e tendo consciência cada um do seu papel. — Chegou a hora de partirmos para a operação. Esse é um trabalho que iniciamos há bastante tempo. Fizemos um planejamento geral, um plano tático, que detalha as atividades e o papel das instituições em cada ação, e agora, por último, fechamos a parte operacional, que trata dos efetivos referentes a cada uma das atividades — detalha Monteiro. Um dos maiores problemas constatados na última JMJ, realizada há dois anos em Madri, foi o excesso de lixo nos locais de eventos. Somente no local da vigília foram contabilizadas cinco latinhas por pessoa. Para os eventos de grande concentração de público, como missa de abertura, Cerimônia de Acolhida e Via Sacra, em Copacabana, e a Vigília dos Jovens e Missa de Envio, em Guaratiba, a Comlurb montou um esquema especial, prometendo manter áreas e seus acessos limpos, antes, durante e depois das cerimônias. Serão mobilizados, ao todo, 4.471 garis, 14 equipamentos (minivarredeiras e minipás), 121 caminhões compactadores, 60 caminhões basculantes, 13 lava-jatos, 54 caminhões pipa d’água, 61 varredeiras, oito tratores de praia, 13 pás mecânicas e 3.730 contêineres. Especialista em gestão de resíduos sólidos urbanos, a professora de engenharia ambiental Kátia Dantas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), acredita que a logística montada pela Comlurb será suficiente para atender à demanda da Jornada, mas ressalta que deveria existir por parte da empresa municipal uma preocupação com a destinação final desse resíduo excedente que será produzido na cidade ao longo do evento. — Acho que o número de pessoas e equipamentos é suficiente, eles estão com uma previsão bem estruturada, e a Comlurb nesse ponto é muito operacional. A questão é o destino do lixo, esse impacto para o meio ambiente. Eles não assumem um compromisso com a reciclagem — diz. Imagina na jornada Hospedagem solidária para receber peregrinos A pesar da visibilidade, a Copa das Confederações e a Jornada Mundial da Juventude Católica (JMJ) não impulsionaram significativamente o mercado hoteleiro. Segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Hotéis do Rio de Janeiro (ABIH-RJ), a rede da cidade está com ocupação de 60% dos 33 mil quartos disponíveis nos dois eventos. A estimativa do setor é chegar a 70% de ocupação. Vale ressaltar que para a JMJ a organização estima que a maior parte dos peregrinos conte com a hospedagem solidária. — Na Jornada, apesar do grande público previsto, já é esperada a baixa ocupação dos hotéis. Em Madri a ocupação também foi baixa, já que a maioria das pessoas optou pela hospedagem solidária. Com relação à Copa das Confederações, acreditamos que a procura não foi maior por causa da crise econômica na Europa e nos Estados Unidos. As reservas internacionais já foram feitas, esperamos, agora, as reservas do mercado nacional, que, tradicionalmente, acabam sendo na última hora — prevê Alfredo Lopes, presidente da ABIH-RJ. Apostando no sucesso da hospedagem solidária, Dom Antonio Augusto Dias Duarte, bispo auxiliar do Rio de Janeiro e vice-presidente do Instituto Jornada Mundial da Juventude, afirma estar confiante na infraestrutura montada pelo poder público para o evento. Para atuar em toda a Jornada, o Comitê Organizador Local conta com 60 mil voluntários. — O espírito da Jornada, de solidariedade, coincide com o espírito dos brasileiros. Já estamos com 250 mil jovens, de 160 países, inscritos, que ficarão hospedados em escolas, clubes e casas de família, mas a expectativa é que boa parte das inscrições seja feita nesse último mês. Há um fator novo, um Papa latino-americano. Isso desperta ainda mais o interesse de pessoas dos países vizinhos — lembra o bispo. Além das famílias e escolas públicas, colégios particulares também abrirão as portas para hospedar peregrinos. É o caso do Teresiano, na Gávea, que receberá um grupo de cem jovens de países da América do Sul, como Chile, Uruguai, Argentina e Bolívia. As voluntárias Flávia e Rosangela acertam os detalhes para receber cem peregrinos no Colégio Teresiano laura marques — Queremos mostrar não apenas as belezas do Rio para os visitantes, mas nosso trabalho social. Temos um grupo de dez pessoas que está organizando essa hospedagem e outras 30, divididas entre funcionários, alunos, familiares, que farão um sistema de rodízio para recebê-los e acompanhá-los. O fundamental nessa acolhida é entender que fazemos parte de um mesmo projeto de vida — diz Rosangela Tardelli, coordenadora do colégio. A organização da JMJ ainda está cadastrando famílias e instituições interessadas em abrir as portas para acolher peregrinos. É preciso somente um local para a higiene pessoal e um espaço para que o jovem possa estender o próprio colchonete. Não será necessário aprender outro idioma. • [email protected]