Setembro - Nosso Lar
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Setembro - Nosso Lar
N e s t aE d i ç ã o FidelidadESPÍRITA - SETEMBRO DE 2003 04 EDITORIAL Oração da Casa Espírita Gustavo Marcondes / psic. Clayton Levi Reprodução CHICO 05 RECORDANDO Razão e Necessidade XAVIER E OS FATOS BÍBLICOS 06 ARQUEOLOGIA A Torre de Babel - Prof. Friedrich Regette O PRECONCEITO 10 AINDA O Demônio no Couro - Teddy Nilson Reprodução BUSCA DA PAZ 12 EM O Manifesto de Sevilha sobre a Violência BÍBLICAS 15 CURIOSIDADES Você Sabia ... - Julieta Closer 16 REFLEXÃO Tentações: Diabos ou nós mesmos? Reprodução Prof. Dra. Hebe Laghi de Souza 20 CAPA Caos, complexidade e a infuência dos Espíritos sobre os fenômenos da Natureza Dr. Alexandre Fontes da Fonseca Reprodução COMIGO 27 ACONTECEU Sonho Esclarecedor - José Antônio da Silva Xavier 28 ENTENDENDO Estupro e Aborto na Visão Espírita Dr. Ricardo di Bernardi SPIRITE 30 REVUE A ciência da concordância dos números e a fatalidade - Allan Kardec Reprodução VINHA DE LUZ 35 Vê, pois - Emmanuel / psic. Chico Xavier Reprodução EDITORIAL Diretor Presidente Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” Departamento Doutrinário Equipe Editorial Adriana Persiani Julieta Closer Leandro Camargo Lino Bittencourt Ricardo R. Escodelário Sandro Cosso Senhor, Jornalista Responsável Renata Levantesi Mtb 28.765 Revisão Ortográfica Rosemary C. Cabral Departamento Comercial Adriana Levantesi Rogério Gonçalves Administração Viviam B. S. Gonçalves Expedição Mara Cristina Edição Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” Departamento Editorial Diagramação e Ilustrações Adriana Persiani Alessandra Persiani Capa Octano Design Fotolito Rip Editores Gráficos Associados Apoio Cultural Braga Produtos Adesivos Alvorada Gráfica & Editora Impressão Alvorada Gráfica & Editora Assinaturas Anual Número Avulso R$ 45,00 R$ 4,50 Para o exterior Anual Oração da Casa Espírita Em meio às diversas instituições que te buscam servir no mundo, me apresento, com alegria, rogando tua bênção. Ampara, no âmbito de minha atuação, os dirigentes encarnados, que constituem o meu cérebro. Apóia os cooperadores diversos, que representam os meus braços. Faze com que o Evangelho, significando meu coração, pulse amor incessante, irrigando todos os meus departamentos com a força da caridade. Ajuda-me a ser fiel à Codificação Espírita, que se apresenta como minha consciência. Que não falte, aos cooperadores, as energias que lhes garantam a perseverança nos deveres assumidos. Inspira-os nos momentos em que te buscam através da prece. Auxilia-os a perceber que posso ser a escola de almas para os que buscam conhecimentos novos, bem como o pronto-socorro do espírito, para os necessitados de alívio e consolação. Fortalece-me, a fim de que não me deixe contaminar pelos agentes negativos do personalismo, da vaidade e do orgulho. Orienta-me no caminho da humanidade e do amor, para que consiga ser fiel onde quer que me coloques. Abençoa-nos a todos e, se porventura não puder ser a escola aprimorada, nem o hospital sofisticado no campo do espírito, permite que seja ao menos como aquela Casa do Caminho que, na velha Jerusalém, abrigou os irmãos em humanidade, revelando tua presença iluminada. US$ 35,00 Correspondência R: Dr. Arnaldo de Carvalho, 555 - apto 51 Gustavo Marcondes Bonfim - CEP 13070-090 Campinas - SP - Brasil Fone/Fax (19) 3233.5596 FidelidadESPÍRITA é uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar”. CNPJ: 01.990.042/0001-80 Inscr. Estadual: 244.933.991.112 Internet E-mail: [email protected] Mensagem recebida pelo médium Clayton Levi Em reunião da noite de 20/04/95 no Centro Espírita “Allan Kardec” de Campinas/ SP Recordando Chico Xavier Razão e NECESSIDADE M uita gente procurava o Chico em seu emprego e isso começou a causar-lhe problemas. Certa vez, uma senhora em adiantado estado de perturbação foi procurá-lo. O chefe não queria que ele atendesse ninguém em seu ambiente de trabalho e foi dito à senhora que o Chico estava em casa. Para lá se dirigiu ela, sendo informada de que o Chico estava trabalhando. Voltou novamente ao emprego e disseram que o nosso amigo saíra a serviço. Ela resmungou qualquer palavrão e se foi. À noite, quando as portas do Centro se abriram, ela avançou sobre ele e deu-lhe inúmeros bofetões no rosto. Quando acabou de desabafar através da agressão, falou com voz nervosa e trêmula. - Está pensando que tenho tempo para andar atrás de você para cima e para baixo? E, agora, já para aquela sala que você vai me dar um passe... cachorro... A senhora sentou-se numa Setembro 2003 cadeira e ficou esperando. O Chico começou a pensar: - Senhor Jesus, para se transmitir um passe precisamos estar calmos, com o coração voltado para o amor ao próximo. O Senhor sabe todas as coisas e sabe que não estou com raiva dela, mas ela me deixou num estado meio diferente. Ajude-me Senhor. Então, o Espírito de Emmanuel lhe aparece e diz: - Para ajudá-la, é preciso alcançar-lhe o coração. Converse com ela. E o Chico, para a irmã em sofrimento: - Minha irmã, a senhora me perdoe ser uma pessoa tão ocupada. Não pude atendê-la em meu emprego porque meu chefe não permite. A senhora compreende... estou ali para servir à empresa, que me paga. Não posso perder aquele serviço porque tenho muitos irmãos para ajudar. Foi conversando... conversando, e a mulher se acalmando, para, em seguida, começar a chorar. O Chico, então, trans- FidelidadESPÍRITA mitiu-lhe o passe e ela foi devolvida à razão. Depois de sua saída, o médium perguntou ao Espírito de Emmanuel: - Emmanuel, eu não estou com a razão? A resposta foi esta jóia de caridade cristã: - Você está com a razão, mas ela está com a necessidade. No outro dia, quando o Chico chegou ao serviço, estava com o rosto inchado. Seu chefe indagou o que ocorrera. - Bati na porta. Ele então olhou-o por sobre os óculos e perguntou novamente: - Mas... dos dois lados? Fonte: Chico, de Francisco. Editora Cultura Espírita União. 4ª edição. Pag. 52. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 05 ARQUEOLOGIA E OS FATOS BÍBLICOS A Tor Prof. Friedrich Regette1 - Beirut/Líbano Tradução de Marlene Adorni A história da Torre de Babel, que nos relata o Antigo Testamento,2 é uma das mais fascinantes de todos os tempos. O livro sagrado nos fala, em poucos versículos, dos esforços dos homens para construir uma grande torre que chegasse até o céu, da cólera de Deus ante tamanha arrogância e do singular castigo que lhes infringiu. O relato é vivo e matizado de uma clara moral: “Todo mundo se servia de uma mesma língua e das mesmas palavras. Como os homens emigrassem para o oriente, encontraram um vale na terra de Senaar e aí se estabeleceram. Disseram um ao outro: ‘Vinde! Façamos tijolos e cozamo-los ao fogo!’ O tijolo lhes serviu de pedra e o betume de argamassa. Disseram: ‘Vinde! Construamos uma cidade e uma torre cujo ápice penetre nos céus! Faça- 1 Professor de arquitetura da Universidade Americana de Beirut. 2 Gênesis XI 1/9. Reprodução 06 FidelidadESPÍRITA uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 r e de Babel mo-nos um nome e não sejamos dispersos sobre a terra!’ Ora Iahweh desceu para ver a cidade e a torre que os homens tinham construído. E Iahweh disse: ‘Eis que todos constituem um só povo e falam uma só língua. Isso é o começo de suas iniciativas! Agora, nenhum desígnio será irrealizável para eles. Vinde! Desçamos! Confundamos a sua linguagem para que não mais se entendam uns aos outros.’ Iahweh os dispersou dali por toda a face da Terra e eles cessaram de construir a cidade. Deu-se-lhe por isso o nome de Babel, pois foi lá que Iahweh confundiu a linguagem de todos os habitantes da Terra e foi lá que ele os dispersou sobre toda a face da Terra.” Obviamente, a moral da história é que o homem deve manter-se em seu lugar e não aspirar a igualar a obra divina. Porém, através dos séculos, o tema dessa história - a do homem construtor que desafia a Deus criador - tem sido diversamente interpretado segundo as épocas. Na Idade Média, dominava o elemento moral: o orgulho precede a caída. Entretanto, no Renascimento, época cheia de energia e segura de si mesma, a história da Torre de Babel serviu de pretexto para exaltar o ingê- Setembro 2003 nuo e a audácia do homem. E, na era da conquista do espaço e da fissão nuclear, poderia muito bem expressar uma renovada dúvida no que toca aos resultados últimos das empresas humanas. A história da torre bíblica é uma das que mais tem alimentado a imaginação dos artistas. Desde os piedosos artesãos que, para edificação dos camponeses alfabetos, esculpiam ingênuas versões nos muros das catedrais, até os gênios transbordantes de imaginação como Brueghel, que pintavam formosos quadros para deleite do mundo, o tema tem sido constantemente matéria de invenção e de variações. Talvez se refletisse nela a ambição humana, sempre renovada de erigir construções tão altas quanto possível e com pretensão de eternidade, talvez encarnasse a misteriosa imagem de milhares de trabalhadores que de repente começassem a falar estranhas e incompreensíveis línguas. Por essa ou aquela razão, o fato é que o tema de Babel excitava a imaginação artística, dando lugar a quase tantas representações da torre quantos foram os artistas que se empenharam em pintá-la. Uns viam nela uma espécie de prefiguração da torre inclinada de Pizza. Outros a viam como uma FidelidadESPÍRITA enorme pilha de blocos de pedra superpostos em forma escalonada. Outros, como gigantesco “bolo de casamento”. Só alguns se ativeram às descrições subsistentes da torre, tal como era realmente. Uma reportagem de Heródoto Uma dessas descrições tem sua origem na tentativa que Alexandre Magno fez com vistas a reconstruir a torre, cujas ruínas havia descoberto. Uns 10 mil trabalhadores desenterraram a alvenaria, porém, com a morte de Alexandre no ano de 322 a.C., abandonou-se o projeto. Outra descrição, ainda mais antiga, nos oferece Heródoto, o historiador grego que visitou a Babilônia no ano 460 a.C., referindo-se ao que havia visto: “No meio do templo, havia-se construído uma grande torre, de 1 estádio 3de comprimento e outro tanto de largura. Sobre essa torre descansava outra e sobre esta uma terceira e assim sucessivamente, o que fazia um total de oito torres superpostas. As oito torres podiam ser escaladas graças a uma es- 3 Cerca de 190 metros. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 07 cada em espiral reconstruída na parte exterior. À meia altura aproximadamente, havia assentos para que pudessem sentar-se e descansar quem empreendesse a ascensão. Dentro da torre havia um grande templo e nesse templo, um leito ricamente adornado e junto a ele uma mesa de ouro. Não existe nenhum ídolo. Ninguém passa ali à noite, salvo uma mulher do país designada pelo deus mesmo. Os sacerdotes me disseram que o deus descia, às vezes, ao templo para reunir-se com ela... porém, isso é algo que não posso crer”. Uma descrição tão detalhada como essa poderia induzir-nos a crer que a existência real e concreta da Torre de Babel não oferece a menor dúvida. Porém, como durante mais de 20 séculos a Babilônia não passou de apenas um nome, uma vaga lenda esplendorosa e uns quantos montículos de terra na Mesopotâmia, os historiadores sérios seguiam considerando essa história como uma simples, embora bela, fábula. Até que em 1854, o Ministério das Relações Exteriores britânico informou ao seu Cônsul em Baçora, senhor J. E. Taylor, de que o British Museum desejava que alguém se encarregasse de buscar antigas ruínas no sul da Mesopotâmia. Taylor aceitou o encargo e, ao escavar os montículos sem particularidade alguma da região, descobriu a parte superior de uma grande estrutura de ladrilho feita pela mão do homem e alguns cilindros de argila nos quais se relatava em caracteres cuneiformes, a história do monumento. Ainda que essas descobertas tivessem escassa ressonância, abriram o caminho de uma expedição realizada no decênio de 1920- 08 FidelidadESPÍRITA 30 sob os auspícios do British Museum e da Universidade de Pensilvânia, durante a qual Sir Leonard Wooley desenterrou a famosa cidade de Ur, na Caldéia, pátria de Abraão e descobriu as provas de que os relatos acerca da antiga Babilônia não eram meras fábulas, senão história. E uma história que foi magnífica enquanto durou, que não teve rival quanto ao brilho e ao refinamento da civilização, se excetua a do antigo Egito. Iniciou-se essa história no 4º milênio antes da nossa era, quando o povo não semita, os sumérios, desceu das montanhas da Pérsia e se instalou nas férteis planícies situadas entre o Tigre e o Eufrates. Os sumérios edificaram cidades, inventaram a escrita cuneiforme, quiçá também a roda, canalizaram as águas do Eufrates graças a um notável sistema de regos e construíram grandes torres de ladrilho. De sua civilização se derivou, com o tempo, a civilização babilônica, cujo centro foi, durante séculos de esplendor da Mesopotâmia, Babilônia, “a glória dos Reinos”. Em todos os sentidos era a Babilônia uma cidade magnífica. Construída ao largo das ribeiras do Eufrates, a urbe mesopotâmica era uma grande metrópole com amplas avenidas, altos edifícios, numerosos templos e grandes muralhas; milhares de mercadores, soldados, sacerdotes e camponeses penetravam nela pela soberba porta de Ishtar. Mais adiante das muralhas, os férteis trigais, as plantações de árvores frutíferas e as pequenas hortas se estendiam até quase o horizonte. E dominando-os com seu desdenhoso esplendor, velando sobre a ampla planície dos seus 100 metros de altura, se erguia a grande torre, aquela que os judeus da Antigüidade, deportados à Babilônia, onde 70 anos, dariam o nome universalmente conhecido de Torre de Babel. Ao escavar os restos da Babilônia, os arqueólogos descobriram que, em todas as cidades antigas de importância, situadas entre os dois rios, existiam restos de edifícios em forma de torre, chamados Ziggurat Descobriram, igualmenZiggurat. te, figuras de torres formando escadarias gravadas em séculos amuletos, cilindros e baixo-relevo, ao lado de textos escritos em caracteres cuneiformes com os nomes e dimensões dessas torres. Por fim, perto da aldeia de Hilleh, no Irak, desenterraram os alicerces de uma torre particularmente descomunal. Eram de ladrilhos cozidos e abarcavam uma superfície de 280 metros quadrados. Em textos encontrados nas ruínas Etemenanki davam-se o nome de Etemenanki, “a casa da Fundação do Céu e da Lua”. Os textos diziam também que havia sido restaurada em 625 a.C, sob o reinado de Nabupolasar, e mencionavam os ladrilhos cozidos, os regueiros de betume, o conselho dos deuses babilônicos e, uns 60 anos depois, a leva de servos estrangeiros ordenada pelo famoso Nabucodonosor, para proseguir a sua restauração. Tudo concordava. Tratava-se indubitavelmente da Torre de Babel. E essa torre, ainda que talvez maior e mais importante, não era mais que uma das ziggurat erigidas nas planícies mesopotâmicas. Uma vez mais, os arqueólogos haviam confirmado o relato da Bíblia e dado ao menos uma possível explicação da amálgama que a Bíblia faz entre os dois temas, aparentemente independentes: a construção de uma torre e a diver- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 Ziggurat Reprodução sidade das línguas utilizadas pelos homens. Parece que durante milhares de anos, os ziggurat formaram parte integrante das cidades mesopotâmicas, distinguindo-se entre si pelos detalhes, como as catedrais européias, porém, sendo essencialmente semelhantes: grandes blocos cúbicos, com terraços em escadarias e escadas monumentais, que conduziam aos andares superiores, de onde se subia, por uma escada em espiral, até a última plataforma, sobre a qual se erguia um templo ou um santuário. Os ziggurat mesopotâmicos recordavam inevitavelmente aos exploradores essas outras maravilhas da engenharia antiga que são as pirâmides do Egito. Porém, enquanto essas eram tumbas construídas pelos diversos monarcas para que servissem de abrigo a seus restos mortais e lhes proporcionassem as desejadas comodidades em sua vida de ultratumba, os ziggurat eram, manifestamente, lugares de culto, ampliados, restaurados e embelezados de geração em geração. E por que, se perguntavam os arqueólogos, um trabalho tão tremendo para dar-lhe Setembro 2003 essa forma? A julgar pelos dados que possuímos, a resposta mais verossímil é a seguinte: Os sumérios, que procediam de um país montanhoso, representavam quase sempre, seus deuses instalados no cume das montanhas. Em suas obras de arte, muitos dos animais representados, são animais de montanha. Quando emigraram para as planícies, não mudaram de religião, porém, na falta de montanhas naturais, criaram outras com material de que dispunham: os ladrilhos de argila. Assim, pois, longe de desafiar a Deus como acreditavam os hebreus, o que os sumérios e seus sucessores faziam do alto de suas ziggurat, era adorar seus deuses e oferecer-lhes uma espécie de pedestal entre o céu e a Terra, com a esperança de que se decidissem a descer entre eles e a permanecer em seu novo assento. A respeito da segunda parte da história, a decisão de Deus de “confundir” suas línguas, há uma teoria segundo a qual os judeus cativos confundiram o nome de Babilônia, Bab-ili Bab-ili, que significa “porta de Deus”, com a palavra hebréia balal balal, que significa “con- FidelidadESPÍRITA fusão”, o que, em uma história de confusão das línguas não deixa de constituir uma ironia. Segundo outra teoria, como eram muitas as nações que haviam atravessado as planícies da Mesopotâmia, a população da Babilônia estava formada por homens de raças diversas, descendentes dos primeiros habitantes da região, de escravos e deportados e, talvez, também mercadores e representantes diplomáticos das tribos vizinhas, todos os quais falavam línguas e dialetos distintos. Para os ingênuos judeus, nômades que, expulsos de suas terras de pastoreio, haviam percorrido 1.300 Km e acabaram instalando-se na populosa cidade, essa diversidade de línguas, inquietante e misteriosa exigia uma explicação. Assim, acostumados como estavam, a explicar teologicamente todo fenômeno humano, concluíram que a confusão de línguas tinha sua origem na maldição lançada por Deus contra os babilônios por haver criado religiões estranhas e construído torres que desafiavam o céu. Em todo caso, isso foi o que eles contaram. E essa é a razão de que, desde sempre, Babel haja sido uma advertência ao homem para que limite seu orgulho e refreie sua ambição. Fonte: Revista El Correio da UNESCO. agosto/setembro de 1970. ACAL nº 26, abril de 1995. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 09 AINDA O PRECONCEITO O DEMÔNIO no Couro Falta de equilíbrio emocional, ignorância e a ação de Espíritos menos esclarecidos podem causar perturbações ante os fenômenos mediúnicos Teddy Nilson - Campinas/SP E stávamos comemorando o encerramento do Curso Estudos sobre Mediunidade, quando, surpresos, observamos a chegada de uma aluna 10 FidelidadESPÍRITA acompanhada por seu marido. Senhora simples, semi-alfabetizada e de difícil compreensão. Encantou-se com o Espiritismo sem poder alcançar seu real objetivo, por esse motivo, discordava de seu marido, adepto de outra crença religiosa. Ele, por sua vez, considerava a mediunidade dela, como verdadeiro “conluio com o demônio"; ainda mais que, dizia ele, “a mediunidade fora proibida por Moisés”. Os desentendimentos cresciam e com eles as discussões e ofensas. Sendo assim, nos olhava com ar crítico e receoso, esperando ver o “tinhoso" a qualquer momento ao nosso lado. No final da confraternização, pudemos compreender o motivo de sua visita, pois ao se despedir, referindo-se à mediunidade da esposa nos falou em tom autoritário e zombeteiro: - A senhora que detém tanto poder, retire o demônio do couro (corpo) dela, para que eu não precise retirá-lo lá em casa com meu chicote. ENTENDENDO Não são raras as vezes em que comparecem à Casa Espírita, pessoas pedindo para que a faculdade mediúnica seja retirada. Os motivos são muitos e variados: medo, preconceito, falta de tempo e a proibição de Moisés. A esta proibição que, por comodismo ou ignorância, muita gente se apega. Moisés, nos tempos bíblicos, proibiu a prática mediúnica porque ela estava sendo utilizada para adivinhações, interesses egoístas, materiais e mesquinhos, misturando-se com práticas mágicas e até sacrifícios humanos (Deut 18:9/13). Nesse sentido, o Espiritismo, também, não aprova o uso da mediunidade, isto é, o uso incorreto. Moisés desejava que seu povo a utilizasse com objetivo superior e não daquela forma uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 agressiva e perigosa. A sua proibição não representava a condenação da mediunidade em si mesma, visava apenas a reprimir os abusos, pois ele mesmo continuou usando sua faculdade mediúnica para receber as instruções que os bons Espíritos lhe vinham dar em nome de Deus. Após aproximadamente 1300 anos, com a Humanidade melhor preparada, Jesus veio à Terra e ensinou aos discípulos a prática da mediunidade, da mesma forma que o Espiritismo nos ensina, isto é, com objetivo nobre, superior. Para aqueles que não acreditam na possibilidade dos Espíritos se comunicarem com os encarnados, dizemos: “Se não fosse possível, Moisés não precisaria proibir". Se as pessoas que rejeitam a mediunidade, procurassem informações a seu respeito, com certeza sofreriam bem menos, sentindo-se mais tranqüilas e seguras diante dos fenômenos. Se nos aplicarmos ao estudo, entenderemos que o corpo espiritual (perispírito) do futuro médium passa por determinadas alterações e transformações no mundo espiritual antes do seu reencarne. Como ele, o perispírito representa a fôrma do corpo físico e está presente desde o momento da concepção, amolda-o passando para ele todo esse preparo para que em época oportuna, a mediunidade se manifeste. Por ser faculdade natural, não há como retirá-la, o médium já nasce com ela e é por esse motivo que dizemos que ela tem raízes no corpo físico. Setembro 2003 A mediunidade também não é doença, nem leva à perturbação. Aqueles que se perturbam ante os fenômenos, é por sua falta de equilíbrio emocional, por sua ignorância do que seja a mediunidade, ou porque está sob a ação de Espíritos menos esclarecidos. O médium poderá substituir a mediunidade por outra atividade? Poderá, pois possui liberdade de ação, mas nem por isso deixará de ser médium, seus canais mediúnicos continuarão abertos recebendo os estímulos do plano espiritual. Para dirimirmos dúvidas, medo, preconceito, superstições, o melhor, mesmo, é estudarmos, nos evangelizarmos. As Casas Espíritas idôneas, possuem métodos simples e seguros, instrutores capacitados para conduzir o desenvolvimento mediúnico. Desenvolver a mediunidade, é aprender como utilizá-la de forma positiva. Esses métodos são seguros porque têm por base o Evangelho de Jesus, sublime roteiro para quem deseja ser útil a si mesmo e ao próximo. Teddy Nilson é querida e respeitável companheira que trabalha na área da educação mediúnica há mais de 30 anos. Dedicada e estudiosa dirige, juntamente com sua filha Rosa, o curso Estudos sobre Mediunidade do Centro Espírita "Allan Kardec". Seus apontamentos guardam, sempre, absoluta FidelidadESPÍRITA. Para saber mais, consulte: 1) KARDEC, Allan. O Livros dos Médiuns. Cap. I e II da 1ª Parte e XIV, XVII e XVIII da 2ª Parte. Ed. FEB; 2) KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. Da Proibição de Evocar os Mortos, cap. XI. Ed. FEB. FidelidadESPÍRITA Dúvidas sobre os artigos publicados, críticas, sugestões? Entre em contato com redação R: Luiz Silverio, 120 Vila Marieta - CEP 13043-630 Campinas - SP - Brasil Fone/Fax (19) 3233.5596 E-mail: [email protected] Cartas e mensagens devem trazer o nome e endereço do autor. A redação poderá, em razão do espaço e clareza, publicar apenas uma síntese das cartas. assinaturas R: Dr. Arnaldo de Carvalho, 555 apto 51 - Bonfim - CEP 13070-090 Campinas - SP - Brasil Fone/Fax (19) 3233.5596 E-mail: [email protected] uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 11 EM BUSCA DA PAZ O Manifesto de Posteriormente A creditando ser nossa responsabilidade como pesquisadores de diversas disciplinas tratar da questão da violência e da guerra, reconhecendo que a ciência é um produto cultural humano que não pode ser definitivo nem exaustivo, e gratos pelo apoio das autoridades de Sevilha e dos representantes da UNESCO espanhola, nós, abaixo assinados, professores do mundo todo e autoridades nos ramos científicos pertinentes, nos reunimos e chegamos a este Manifesto sobre a Violência. Nele questionamos certos, assim chamados, achados da biologia que têm sido usados, até mesmo por algumas de nossas especialidades, para justificar a violência e a guerra. Pelo fato desses ditos “achados" terem provocado uma atmosfera de pessimismo em nosso tempo, propomos que a rejeição aberta e ponderada dessas descobertas equivocadas poderá contribuir significativamente para o Ano Internacional da Paz. O mau uso de teorias e informações científicas para justificar a violência não é algo novo, e vem ocorrendo desde o advento da moderna ciência. Por exemplo, a teoria da evolução foi usada não só para justificar a guerra, mas também o genocídio, o colonialismo e a supressão dos mais fracos. Nosso ponto de vista é exposto 12 FidelidadESPÍRITA aqui na forma de cinco proposições. Temos consciência de que há outros aspectos sobre a violência e a guerra que também poderiam ser abordadas produtivamente do ponto de vista de nossas disciplinas, porém, restringimo-nos àquilo que consideramos um primeiro passo de importância fundamental. É CIENTIFICAMENTE INCORRETO dizer que herdamos uma tendência a fazer guerra de nossos ancestrais animais. Embora lutas ocorram em todo o reino animal, apenas alguns poucos casos de luta destrutiva intra-espécies entre grupos organizados já foram descritos em espécies que vivem no seu ambiente natural, e nenhum destes casos envolve o uso de ferramentas construídas para serem armas. O comportamento predatório de alimentar-se de outras espécies não pode ser equiparado com violência intra-espécies. A guerra é um fenômeno especificamente humano e não ocorre em outros animais. O fato de que a guerra mudou tão radicalmente ao longo do tempo indica que é um produto cultural. O elo da guerra com a biologia se estabelece fundamentalmente através da linguagem, que possibilita a coordenação de grupos, a transmissão da tecnologia e o uso de ferramentas. A guerra é biologi- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 Sevilha sobre a Violência adotado pela UNESCO na 25ª sessão da Conferência geral em 1989 camente possível, mas não inevitável, como demonstrado pela variação de sua natureza e freqüência dentro do tempo e do espaço. Há culturas que não se envolveram na guerra durante séculos, e há culturas que estiveram em guerra freqüentemente em alguns períodos e não em outros. É CIENTIFICAMENTE INCORRETO dizer que a guerra, ou qualquer outro comportamento violento, é geneticamente programado na natureza humana. Embora os genes estejam envolvidos em todos os níveis do funcionamento cerebral, eles oferecem um potencial de desenvolvimento que só pode ser concretizado em conjunto com o meio ecológico e social. Embora a predisposição individual para ser afetado pela experiência seja variável, é a interação entre o potencial genético e as condições do crescimento que determinam a personalidade. Exceção feita a raras patologias, os genes não produzem indivíduos necessariamente predispostos à violência. Tampouco determinam o oposto. Embora os genes estejam co-envolvidos no estabelecimento de nossas capacidades comportamentais, eles não determinam o resultado por si sós. É CIENTIFICAMENTE INCORRETO dizer que no curso da evolu- Setembro 2003 ção humana houve uma seleção de comportamentos agressivos mais do que de outros tipos de comportamento. Em todas as espécies que foram bem estudadas, o status dentro do grupo é atingido pela habilidade de cooperar e preencher certas funções sociais relevantes à estrutura daquele grupo. A “dominância" envolve laços e afiliações sociais, não sendo meramente uma questão de possuir e usar maior força física, embora envolva comportamentos agressivos. Em casos em que a seleção genética de comportamentos agressivos foi instituída artificialmente em animais, conseguiu-se produzir rapidamente espécimes hiper-agressivos, o que demonstra que em condições naturais a agressividade não foi prioritariamente selecionada, visto que não produziu o mesmo efeito. Quando estes animais hiper-agressivos produzidos em laboratório são introduzidos no grupo social, eles desagregam a estrutura social, ou então são expulsos. A violência não está em nosso legado evolutivo, nem em nossos genes. É CIENTIFICAMENTE INCORRETO dizer que os humanos têm um “cérebro violento". Embora tenhamos o aparato nervoso para agir violentamente, essa reação não é automaticamente ativada por estímulos internos ou externos. FidelidadESPÍRITA Como os primatas superiores, e diferente de outros animais, nossos processos neurais superiores filtram tais estímulos antes que possam agir em resposta. A forma como agimos é determinada pelo modo como fomos condicionados e socializados. Não há nada em nossa neurofisiologia que nos obrigue a reagir violentamente. É CIENTIFICAMENTE INCORRETO dizer que a guerra é causada por “instintos" ou por qualquer motivação isolada. O surgimento da guerra moderna foi uma história que nos levou da supremacia de fatores emocionais e motivacionais, por vezes chamados “instintos", até a supremacia dos fatores cognitivos. A guerra moderna envolve o uso institucional de características pessoais como a obediência, a sugestionabilidade, o idealismo, habilidades sociais como a linguagem, o uso de raciocínios como o cálculo de custos, planejamento e processamento de informações. A tecnologia da guerra moderna vem exacerbando tendências relacionadas à violência, tanto no treinamento de combatentes em si como também na preparação de apoio à guerra por parte da população em geral. Como resultado dessa exacerbação, tais tendências muitas vezes são tidas erroneamente como causa ao invés de conseqüências uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 13 A paz está Sevilha, 16 de maio de 1986 David Adams, Psicologia, Wesleyan University, Middletown, CT., Estados Unidos. S. A. Barnett, Etologia, The Australian National University, Canberra, Austrália. N. P. Bechtereva, Neurofisiologia, Institute for Experimental Medicine of Academy of Medical Sciences of the USSR, Leningrado, Rússia. Bonnie Frank Carter, Psicologia, Albert Einstein Medical Center, Philadelphia (PA), Estados Unidos. José M. Rodriguez Delgado, Neurofisiologia, Centro de Estudios Neurobiologicos, Madri, Espanha. José Luis Diaz, Etologia, Instituto Mexicano de Psiquiatria, México D.F., México. Andrzej Eliasz, Psicologia das Diferenças Individuais, Polish Academy of Sciences, Varsóvia, Polônia. Santiago Genovés, Antropologia Biológica, Instituto de Estudios Antropologicos, México D.F., México. Benson E. Ginsburg, Genética do Comportamento, University of Connecticut, Storrs, CT., Estados Unidos. Jo Groebel, Psicologia Social, Erziehungswissenschaftliche Hochschule, Landau, Alemanha. Samir-Kumar Ghosh, Sociologia, In-dian Institute of Human Sciences, Calcutá, Índia. Robert Hinde, Comportamento Animal, Cambridge University, Cambridge, Reino Unido. Richard E. Leakey, Antropologia Física, National Museums of Kenya, Nairobi, Quênia. Taha H. Malasi, Psiquiatria, Kuwait University, Kuwait. J. Martin Ramirez, Psicobiologia, Universidad de Sevilla, Spain. Federico Mayor Zaragoza, Bioquímica, Universidad Autonoma, Madrid, Spain. Diana L. Mendoza, Ethology, Universidad de Sevilla, Spain. Ashis Nandy, Psicologia Política, Centre for the Study of Developing Societies, Delhi, Índia. John Paul Scott, Comportamento Animal, Bowling Green State University, Bowling Green, OH., Estados Unidos. Riitta Wahlstrom, Psicologia, University of Jyväskylä, Finland. Visão Espírita da influência da matéria sobre a Mente L .E. 370 - Pode-se induzir, da influência dos órgãos uma relação entre o desenvolvimento dos órgãos cerebrais e o das faculdades morais e intelectuais? R: Não confundais o efeito com a causa. O Espírito tem sempre as faculdades que lhes são próprias. Assim, não são os órgãos que lhe dão as faculdades, mas as faculdades que impulsionam o desenvolvimento dos órgãos. L.E. 370(a) - De acordo com isso, a diversidade das aptidões entre os homens decorre unicamente do estado do Espírito? R: Unicamente não é o termo exato. As qualidades do Espírito, que pode ser mais ou menos adiantado, constituem o princípio, mas é necessário ter em conta a influência da ma- 14 FidelidadESPÍRITA téria, que entrava mais ou menos o exercício dessas faculdades. Comentário de Kardec O Espírito, ao se encarnar, traz certas predisposições, e se admitirmos para cada uma delas um órgão correspondente no cérebro, o desenvolvimento desses órgãos será um efeito e não uma causa. Se as faculdades tivessem os seus princípios nos órgãos o homem seria uma máquina, sem livre-arbítrio e sem a responsabilidade de seus atos. Teríamos de admitir que os maiores gênios, sábios, poetas, artistas, não são gênios senão porque o acaso lhes deu órgãos especiais. De onde se segue que, sem esses órgãos, eles não seriam gênios, e que o último dos imbecis poderia ter sido um Newton, um Vigílio ou um Rafael, se houvesse sido provido de certos órgãos. Suposição que se torna ainda mais absurda, quando aplicada às qualidades morais. Assim, segundo esse sistema, São Vicente de Paulo, dotado pela Natureza de tal órgão, poderia ter sido um celerado, e não faltaria ao maior celerado, mais do que um órgão para ser um Vicente de Paulo. Admiti, ao contrário, que os órgãos especiais, se é que existem, são conseqüentes e se desenvolvem pelo exercício das faculdades, como os músculos pelo movimento, e nada tereis de irracional. Tomemos uma comparação trivial por bem se aplicar ao caso. Através de certos sinais fisionômicos reconhecereis o homem dado à bebida; são esses sinais que o fazem bêbado ou é o vício da embriaguez que produz os sinais? Pode-se dizer que os órgãos recebem a marca das faculdades. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 ASSINARAM ESSE MANIFESTO: do processo. Concluímos que a biologia não condena a Humanidade à guerra, e que a Humanidade pode ser libertada da opressão do pessimismo biológico e empoderada com confiança para realizar as transformações necessárias nesse Ano Internacional da Paz e nos anos que se seguirão. Embora essas tarefas sejam primordialmente institucionais e coletivas, dependem também da consciência individual dos participantes, para quem pessimismo ou otimismo são fatores cruciais. Assim como “as guerras começam na mente dos homens", a paz também começa na nossa mente. A mesma espécie que inventou a guerra é capaz de inventar a paz. A responsabilidade é de cada um de nós. em nossas mãos CURIOSIDADES BÍBLICAS Você Sabia... Julieta Closer - Campinas/SP O Calendário Judaico, cuja tábua dos meses e estações, elaborada pelo Prof. John Davis, da Princeton University, nos indica que ELUL correspondia ao nosso mês de setembro ( Ne 6:15 - início de outubro cf Bíblia de Jerusalém ). Se lá era a estação das colheitas de azeitonas, dos figos e das uvas, aqui, para nós, é o mês das manhãs ensolaradas, dos belos entardeceres, é o início da primavera, trazendo todo o arco-íris na suavidade das pétalas das flores que cobrem todo o nosso hemisfério. Será que a Bíblia nos conta algo sobre as flores ? Vejamos: F lores de amendoeira - matizadas de rosa e branco (no hebraico, amendoeira significa acordar. A amendoeira é nativa dos planaltos da Palestina. Há diversas referências a essa árvore e suas flores nos textos bíblicos. (Ex. 25:33; Ex. 25:34-35; Nm. 17:23) . F lor do campo - o salmista revela que Deus é amor e explica como são os dias do homem sobre a Terra: “O homem!... seus dias são como a relva: ele floresce como a flor do campo; roça-lhe um vento e já desaparece, e ninguém mais reconhece o seu lugar”. (Salmos 103:15-16) . F lor do narciso - o profeta exalta o triunfo de Jerusalém: “Alegremse o deserto e a terra seca, rejubile-se a estepe e floresça; como o narciso cubra-se de flores, sim, rejubile-se com grande júbilo e exulte”. (I 35:1-2). F lor do lírio - o profeta Oséias conclama Israel a retornar a Iahweh: “Eu serei como o orvalho para Israel, ele florescerá como o lírio, lançará suas raizes como o cedro do Líbano”. (Os 14:6). F lor da videira - e o profeta Oséias continua a clamar a Israel: “Voltarão a sentar-se à minha sombra; farão reviver o trigo, florescerão como videira, sua lembrança será como a do vinho do Líbano. (Os 14:8). F lor da primavera - no seu falso raciocínio o ímpio diz: “Inebriemonos com o melhor vinho e com perfumes, não deixemos passar a flor da primavera”. (Livro da Sabedoria 2:7). Setembro 2003 FidelidadESPÍRITA F lores de bronze (lírios) - foram fundidas nos capitéis que encimavam as colunas do palácio de Salomão, para o ornamentarem e isso foi feito pelo bronzista Hiram. (1 Reis 7:19). Fonte: 1) Bíblia de Jerusalém - Sociedade Bíblica Católica Internacional e Paulus, 1985; 2) Pequena Enciclopédia Bíblica - Orlando Boyer, 7ª edição, 1978; 3) Dicionário Bíblico Universal - Buckland, Ed. Vida, 3ª edição, 1982; 4) A Bíblia Sagrada - Sociedade Bíblica do Brasil, 1971. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 15 REFLEXÃO Tentações “Vigiai e orai para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade está pronto, mas a carne é fraca”. Mt 26: 41 Profa. Dra. Hebe Laghi de Souza - Campinas/ SP Exclusivo para FidelidadESPIRITA T odos aprendemos, em algum tempo de nossas vidas, que as coisas ruins enraizadas em nosso espírito têm como causa as tentações demoníacas contra as quais não nos alertamos o suficiente para podermos rejeitá-las. Dessa forma, a causa primária de todas as maldades que assolam a Humanidade teriam origem à sua própria submissão as artimanhas de satã. Para muitas religiões tradicionalistas fundamentadas nos textos bíblicos o mal foi derivado do primeiro pecado cometido no jardim do Edem quando Adão e Eva, dos quais descenderam todos os seres humanos, envolvidos pelas palavras tentadoras da serpen1 te desobedeceram ao Criador comendo do fruto proibido. Expulsos do paraíso, foram castigados devendo manter a sobrevivência com duros trabalhos numa terra que se tornou de sofrimentos. 2 16 FidelidadESPÍRITA Com o primeiro pecado o mal se instaura no coração do homem marcando a origem de sua história em toda a comunidade humana. 3Mas os textos sagrados, desde o primeiro livro (Gênese), deixam em suas palavras também a esperança na existência de Deus extremamente bom e perfeito, do qual nasce todo o bem. O ser humano pode salvar-se e vencer o demo tentador por meio de seu relacionamento, de sua obediência e amor ao seu Criador. Ao quebrar tal relacionamento, no qual o homem deve viver, introduz-se nas sombras da confusão e na inversão dos valores morais e religiosos permitindo a invasão do poder das trevas. Certamente, esses ensinamentos têm norteado a Humanidade apontando-lhe uma direção a seguir. Não deixou, porém, de gerar medo que serviu de base para o desenvolvimento de fana- tismos, amargas cadeias que nos aprisionaram durante muito tempo. O pavor do que pudesse ser diabólico foi um princípio gerador de muitos sofrimentos vividos no passado. Na mente de muitos, as figuras aterrorizantes representativas de satã anuviavam um amor mais verdadeiro a Deus que, às vezes, se tornava mais temido do que propriamente amado. A seu tempo, porém, essa crença não deixou de ser um mecanismo limitante para os desvarios humanos constituindo-se em um modo de evoluir. 1 Gênese, 3:1-13. 2 Gênese, 3:17-19. 3 Bíblia, Introdução, resumo do livro Gênese. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 Diabos ou nós mesmos? A origem do mal pela palavra da ciência A teoria da origem das espécies que brotou dos amplos estudos realizados por dois grandes cientistas no século XIX, Charles Darwin e Alfred Russel Wallace, abriu um novo horizonte de conhecimentos sobre o ser humano, especialmente sobre si próprio e sobre o seu temperamento agressivo e egoístico. Uma teoria revolucionária na qual Darwin, no livro que escreveu sobre a origem das espécies, publicado em 1859, apresentou o homem como um ser animal produto de um longo processo de evolução orgânica passando por toda a série de animais, desde os mais simples aos mais complexos até começar seus passos pelos caminhos da Humanidade. Durante a história desse processo, foi mantendo a sobrevivência e se reproduzindo que os organismos puderam continuar criando todas as formas existentes de seres na natureza desde os mais diminutos como vírus e bactérias ao mais complexo sistema biológico e mental como aquele que exibimos. Uma rápida visão do mundo Setembro 2003 animal descerra um panorama maravilhoso no qual pode-se ouvir perfeitamente o doce trinado de uma ave, mas também o urro ameaçador de uma fera agressiva que luta pelo seu território não permitindo a intrusão de estranhos. Foram aqueles seres que se mostraram mais espertos, mais aptos, mais aguerridos e invasivos na posse de alimentos ou de refúgios e os que resistiram aos obstáculos e perigos ao seu redor é que continuaram a transferir para as gerações seguintes o seu material hereditário. Foi assim, que os fatores genéticos que conferiam essas características atravessaram o tempo nos inúmeros tipos de organismos até chegar ao ser humano que hoje somos. Ao olhar da ciência trazemos ainda a selvageria, a audácia e o egoísmo dos seres que nos antecederam na escala evolutiva. Essa mesma ciência considera que não somos produtos apenas dos nossos genes ou do nosso DNA, mas de uma interação desses fatores com o ambiente e, nesse caso da educação que recebemos, da cultura na qual nos desenvolvemos e das condições de vida que possamos ter. As tendências animais portadas pelo ho- FidelidadESPÍRITA mem podem, dentro do saber científico, ser aplainadas pela educação e pelas religiões dentro dos limites de cada nível cultural desenvolvido pelos diferentes povos. Esse pensamento surge de uma visão do homem como ser material, isto é, como apenas carnal despido de qualquer essência espiritual. Desses conhecimentos, porém, emergem questões as quais, ao ver-se o homem como apenas matéria, continuam sem uma resposta mais esclarecedora. Exemplo disso seria como explicar que no meio da violência, no ambiente humilde das favelas haja pessoas de conduta amena e bondosa? Sabemos que na pobreza desses lugares muitas crianças nascem no seio de famílias desestruturadas, nas quais, para sobreviver, as mães muitas vezes se prostituem dentro de suas próprias casas e os pais procuram esquecer o sofrimento no álcool ou nas drogas. Mas, nem sempre suas crianças se tornam violentas podendo se tornar adultos merecedores de respeito pela maneira como tentam superar suas dificuldades no trabalho honesto. Conheço pessoalmente pessoas assim. Por outro lado, como elucidar o fato de existir em boas famílias de aprimorada uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 17 educação e dedicadas aos filhos jovens inescrupulosos e violentos? Se todos somos produto dos mesmos caminhos evolutivos ditados pela ciência, como esclarecer essas diferenças facilmente observáveis nas sociedades modernas? Das páginas do Espiritismo, mas com o olhar na ciência a explicação racional e lógica Dos ensinos espíritas aprendemos que Deus em sua bondade criou-nos a todos iguais, simples e ignorantes. Fizeram parte de sua criação os mundos físicos, materiais para que passando por eles o Espírito, inicialmente como princípio inteligente evoluísse progredindo através do tempo, alcançando a Humanidade para, posteriormente, com seu próprio esforço chegar à angelitude. Enquanto princípio inteligente, adquirimos múltiplas experiências, desenvolvemos todos os instintos e os primórdios da inteligência construindo lentamente as bases para o nosso posterior crescimento como alma humana. Durante as inúmeras passagens que fizemos pelo reino animal não deixamos de acumular e de trazer conosco as tendências que arquivamos em nosso inconsciente espiritual. Os estudos científicos do comportamento animal têm apontado para a sociabilidade de muitos insetos e outros organismos, arriscando, muitas vezes, a vida em prol do benefício comum. Estes são atos puramente instintivos, mas que executados múltiplas ve- 18 FidelidadESPÍRITA O amor deve ser a nossa força, a humildade o nosso lema, a solidariedade o nosso impulso e a caridade verdadeira o sentimento a nortear os nossos passos zes ao longo de sucessivas reencarnações ficam espiritualmente gravadas e transformam-se no homem em tendências para o amor e para o bem de uma forma geral. Por outro lado, esses mesmos estudos têm revelado a agressividade, a esperteza e a malandragem de muitas espécies, que se desenvolveram como um fator de sobrevivência em um mundo competitivo pelos recursos disponíveis. São as tendências egoísticas, bases de todo o mal que o ser humano cria. Os demônios de que ouvimos falar podem ser vistos como símbolo das inclinações selvagens que ainda trazemos Enquanto princípio inteligente o ser humano precisou suprir todas as exigências materiais para a conservação da existência pessoal e da espécie. Esta foi uma condição assídua em todas as formas de vida animal. A constância dessa vivência é que marca cada Espírito com as tendências que terá que desenvolver ou enfrentar ao atravessar o portal da Humanidade. Nesse caso, o mal decorre das nossas próprias imperfeições. No livro A Gênese, no capítulo III, questão 9 Kardec nos ensina que em sua sabedoria Deus não criou a alma perfeita a fim de darlhe a oportunidade de encontrar a perfeição por si mesma e posteriormente de usufruí-la como obra sua adquirindo conhecimentos por si própria. É na busca dessa perfeição que cada ser se defronta consigo e aprende muito sobre si mesmo, aprimora sua consciência e a maneira de usar seu livre arbítrio. Essa é a lei do progresso, um progresso que resulta do nosso trabalho e das lutas que empreendemos em vencer as nossas disposições moralmente pouco desejáveis. Há entre nós diferentes níveis de evolução espiritual que explicam as diferenças de sentimentos individuais, a bondade em alguns e a maldade entre outros. Certamente, a educação e as religiões desempenham um papel de grande importância na lapidação dos instintos e das nossas disposições inferiores, mas não deixam de ter maior força sobre aqueles que já possuem um certo grau de adiantamento espiritual. É dessa forma que podemos responder àquelas questões que fizemos anteriormente. Mas, no mal está o remédio. Os males a que nos achamos expostos, no dizer kardecista são estimulantes para as nossas faculdades físicas e morais e a “dor é o aguilhão que nos impele para frente” e nos induz a procurar meios de evitá-los. Se dermos vazão às nossas tendências, além de criarmos oportunidades para os nossos ma- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 les físicos e morais, também abrimos as portas do coração para a invasão dos Espíritos obsessores que tentam impedir o nosso progresso. Este modo de entender nos ensina que para vencer as tentações do nosso dia-a-dia devemos conhecer os nossos pontos fracos para poder evitá-los e para nos mantermos em alerta contra eles sabendo que fazem parte de nós. Aceitá-los como existentes significa saber que se pelo espírito desejamos progredir, “a carne é fraca”, pelas tendências que trazemos de todo um passado desde a nossa origem. Somente a vigilância consciente e constante sobre os nossos sentimentos e sobre os nossos pensamentos nos levará a manter a mente em níveis mais elevados evitando com maior facilidade a sujeição às tentações das nossas próprias tendências. É desse modo que estaremos também, nos tornando imunes a muitos tipos de obsessões que dificilmente encontrarão em nós um caminho aberto para conseguir nos assediar. Conclusão Os demônios dos quais muitas vezes ouvimos falar existem sim, mas não da forma como apregoados por muitas religiões. Podem ser vistos como um símbolo das inclinações selvagens que ainda trazemos. Não são figuras exterio- As tendências animais portadas pelo homem podem, dentro do saber científico, ser aplainadas pela educação e pelas religiões dentro dos limites de cada nível cultural desenvolvido pelos diferentes povos res, estão dentro de nós. Para vencê-los devemos usar de sinceridade em nossas análises mais íntimas e buscá-los no que encontrarmos de vaidade, orgulho, presunção e outros sentimentos que inutilizam os atos benevolentes efetuados sob a égide destes sentimentos. Como espíritas devemos estar vigilantes contra as maçãs tentadoras freqüentemente apontadas pelos Espíritos ignorantes que incessantemente nos vigiam, principalmente quanto ao exercício da mediunidade, quanto às tarefas de socorro fraterno, de ensino da Doutrina e no convívio com os amigos de jornada envolvidos pelo mesmo ideal. O amor deve ser a nossa força, a humildade o nosso lema, a solidariedade o nosso impulso e a caridade verdadeira o sentimento a nortear os nossos passos. Quando e se por acaso o ufanismo e o desejo de importância pessoal, da admiração excessiva que nos leva a olhar o mundo do alto de um pedestal nos baterem à porta, lembremos que estamos longe da perfeição e que esses sentimentos apenas são um atestado Se todos somos produto dos mesmos caminhos evolutivos ditados pela ciência, como esclarecer essas diferenças facilmente observáveis nas sociedades modernas? Setembro 2003 FidelidadESPÍRITA dos “diabos” ocultos em nosso interior. Mais do que pelas palavras o Espiritismo deve ser praticado, deve ser divulgado pelo exemplo que possamos levar aos nossos semelhantes. Contra as nossas fraquezas não devemos desanimar, mas devemos prosseguir na luta incessante contra as nossas tendências que não devem ser vistas como pontos de humilhações a nos induzir a escondê-las de nós mesmos, mas como um terreno a ser trabalhado em prol de nossa própria evolução. Para saber mais, consulte: 1) A Gênese - Allan Kardec. Cap. 3 questão 5. Ed. FEB; 2) O Homem em Evolução - T. Dobzansky. 1972. Pág. 26; 3) Darwin e Kardec: um diálogo possível. Hebe Laghi de Souza. Pág. 211. CEAK Editora. A articulista é bióloga, com especialidade em genética e doutora em ciências pela USP, onde lecionou em cursos de graduação e pósgraduação. Na Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, além de ministrar aulas, cooperou no desenvolvimento do departamento de Genética e Evolução, tornando-se a responsável pela área de Genética Animal. Na seara espírita sua obra mais recente, publicada pelo CEAK Editora é: Darwin e Kardec um diálogo possível. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 19 CAPA - ESPIRITISMO E CIÊNCIA CAOS, COMPLEXI INFLUÊNCIA D sobre os FENÔMENOS Dr. Alexandre Fontes da Fonseca - São Paulo/SP Instituto de Física da Universidade de São Paulo Exclusivo para FidelidadESPÍRITA A nalisamos, à luz dos conhecimentos atuais da Ciência e da Doutrina Espírita, a questão sobre a ação dos Espíritos nos fenômenos da natureza. Apesar dos Espíritos confirmarem tal influência, esse assunto foi pouco discutido pelo Codificador em razão dos poucos conhecimentos científicos, existentes à época, a respeito de tais fenômenos. Graças ao desenvolvimento das disciplinas científicas conhecidas como Teoria do Caos e Complexidade podemos retomar a questão. Neste artigo, argumentamos que a influência ou ação dos Espíritos num fenômeno natural de larga escala como, por exemplo, uma tempestade, não requer, 20 FidelidadESPÍRITA do ponto de vista físico, uma grande quantidade de energia, em comparação com a magnitude do fenômeno em si. Em termos espíritas, isso significa que não há necessidade de uma grande quantidade de fluido animalizado para realizar-se tal influência, o que a torna um evento perfeitamente possível. Utilizamos os conceitos de Caos e Complexidade para entender como isso pode ser possível. I. Introdução Em A Gênese, capítulo XV, item 45, Kardec apresenta uma passagem evangélica intitulada Tempestade Acalmada [1]. Nessa passagem, Jesus e os discípulos estavam passando de uma margem à outra de um lago, em um barco, quando fortes ventos surgiram e os discípulos, assustados, pediram ajuda ao Mestre. Este, segundo a narrativa evangélica, se dirigiu aos ventos e às ondas apaziguando-os. Jesus, então, aproveita a oportunidade para falar-lhes sobre a fé. Kardec, no item 46 da referência acima e Caibar Schutel [2] comentam a passagem. Kardec, nesse item, admite que não se conhecem os “segredos da Natureza para afirmar se há, ou não, inteligências ocultas que presidem à elementos” Caibar Schuação dos elementos”. tel vai mais além afirmando que “todos os fenômenos sísmicos e uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 DADE e a OS ESPÍRITOS DA NATUREZA atmosféricos são dirigidos por seres inteligentes encarregados das manifestações da Natureza” [2]. Em ambas as citações, os autores afirmam a possibilidade da atuação dos Espíritos sobre o fenômeno de uma tempestade mas, conforme veremos adiante, não existe na literatura espírita nenhuma explicação sobre como seria tal atuação. De todos os fenômenos conhecidos pelo ser humano, de uma maçã que cai ao chão, até os mais belos fenômenos luminosos observados no Universo, temos que lembrar que as leis que estão por trás de cada um deles são leis naturais e, portanto, de origem divina. Ao longo da história, o ser humano tentou compreendê-las através da observação e estudo dos fenômenos naturais que ocor- Setembro 2003 riam. Em 1687, um salto ocorreu na maneira como estudar e entender tais fenômenos. Galileu, em Diálogos Sobre os Dois Sistemas de Mundo e, de modo mais formal, Isaac Newton, em Principia Mathematica Philosophiae Naturalis, inauguraram uma nova maneira de se fazer Ciência ao descreverem, matematicamente, os fenômenos mecânicos da natureza. Esta se desenvolveu rapidamente trazendo luz e progresso a toda a Humanidade. Os conhecimentos científicos consistem na forma pela qual se entendem as leis naturais que regem os fenômenos materiais. Por isso, o uso que vamos fazer de conceitos modernos da Ciência (Teoria do Caos e Complexidade), na tentativa de entender como os Espíritos podem atuar em um de- FidelidadESPÍRITA terminado fenômeno natural, não diminuem em nada o carácter natural tanto dos fenômenos quanto das leis. Neste artigo, portanto, apresentaremos uma forma pela qual os Espíritos poderiam exercer uma ação sobre os fenômenos da Natureza de larga escala, como uma tempestade, baseando-se nos conceitos de Teoria do Caos e Complexidade. É sabido que os fenômenos da atmosfera, em torno dos quais trabalharemos, são sistemas caóticos e complexos [3]. Um sistema é dito caótico [4] quando extremamente sensível a pequenas perturbações. Como exemplo, considere um jogo de bilhar com a mesa cheia de bolas. Se o jogador, ao dar uma tacada, errar um pouco a direção desejada, o resultado fi- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 21 22 FidelidadESPÍRITA Figura 1: Atrator estranho ou borboleta de Lorenz obtida resolvendo-se as equações diferenciais do modelo de Lorenz. x, y e z representam grandezas físicas como temperatura, pressão e velocidade das partículas. Hawking, em seu mais novo livro intitulado O Universo numa Casca de Noz [6], expõe de forma poética este fato ao dizer que: “Uma borboleta batendo as asas em Tóquio pode causar chuva no Central Yorque” Como ele Park de Nova Yorque”. mesmo explica, não é o bater das asas, pura e simplesmente, que gerará a chuva mas a influência deste pequeno movimento sobre outros eventos em outros lugares é que pode levar, por fim, a influenciar o clima. É por esta razão que a atmosfera é um sistema de difícil previsão e faz com que, pelo menos uma vez por semana, consultemos a Meteorologia sobre as condições do tempo.2 Para realizar previsões no tempo, a Meteorologia se utiliza de ferramentas teóricas para calcular, com alguma precisão, o comportamento do clima a partir de um dado conjunto de medidas atmosféricas obtidas experimentalmente. Edward N. Lorenz propôs o primeiro modelo teórico [7] para a dinâmica da atmosfera, conhecido como o Modelo de Lorenz Lorenz. A figu- Reprodução nal, que é o movimento das bolas, será completamente diferente daquele previsto se a tacada fosse correta, e não apenas um pouco diferente, como se poderia pensar. Este tipo de dinâmica, sensível às condições iniciais, é chamada de caótica. Como consequência, perde-se, efetivamente, o poder de prever o que vai acontecer após a tacada se o jogador não tiver total certeza de qual será a sua direção. Um sistema é dito complexo [5] quando o seu comportamento é rico em possibilidades inesperadas e diversificadas, mesmo que sua estrutura não seja complicada, isto é, composta de muitas partes interligadas entre si. A vida é um dos melhores exemplos de complexidade. As características do ser vivo mais simples, como uma ameba, exibem qualidades inesperadas e diversificadas. Apesar da vantagem da velocidade, nossos computadores, por exemplo, são menos complexos do que o ‘cérebro' de uma minhoca [6]. Se considerarmos que os gases que compõem a atmosfera são formados por partículas, aproximadamente, esféricas, podemos imaginar que milhares delas estão a todo momento se chocando como no jogo de bilhar acima exemplificado. A atmosfera, portanto, é um sistema que apresenta comportamento caótico e complexo por ser extremamente sensível a relativamente pequenas perturbações1 e por se manifestar em uma grande variedade de situações conhecidas como tempestades, tufões, ventos, frentes frias e quentes, etc. O grande físico Stephen ra 1 (acima) mostra um exemplo do chamado atrator estranho ou borboleta de Lorenz que é uma solução das equações obtidas com o seu modelo. Lorenz também demonstrou, em um artigo de 1982 [8], que existe um limite para a previsibilidade de sistemas atmosféricos em largas escalas, que é em torno de 2 semanas. Isto quer dizer que não podemos confiar nas previsões do tempo feitas após este intervalo. Enfatizamos, portanto, que existe um limite para o conhecimento que o ser humano atingiu com relação a este problema. Essa infor- 1 A palavra "perturbação" aqui deve ser entendida como alguma pequena influência que gera uma pequena alteração num determinado sistema. 2 Ainda sim, nos surpreendemos com as variações! uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 mação será importante na discussão sobre a capacidade dos Espíritos de realizarem melhores cálculos e previsões. Este artigo está organizado da seguinte forma. Na seção II exporemos tudo o que encontramos nas obras básicas de Allan Kardec sobre a ação dos Espíritos acerca dos fenômenos da Natureza. Lembraremos algumas idéias básicas sobre fenômenos de efeitos físicos, já que qualquer atuação dos Espíritos sobre os fenômenos da Natureza pertence a esta classe de efeitos. Na seção III III, mostraremos que essa atuação é perfeitamente plausível e requer pouco fluido animalizado. Finalmente, na seção IV nós resumimos os resultados apresentando as principais conclusões. II. O que diz o Espiritismo Além das citações feitas do livro A Gênese e do livro de Caibar Schutel a respeito de uma passagem evangélica onde Jesus “controla” uma tempestade, as questões de 536 a 540 de O Livro dos Espíritos [9] falam sobre o assunto. Existe, ainda, uma pequena menção ao tema na Revista Espírita de setembro de 1859 [10], intitulada As Tempestades que não acrescenta em nada o conteúdo presente nas questões de 536 a 540 acima citadas. Por isso, vamos nos ater, apenas, a O Livro dos Espíritos. Transcreveremos algumas destas questões, grifando aquilo que acharmos importante para a discussão proposta neste artigo. A primeira questão que Setembro 2003 nos interessa é a de número 536a: “536-a: Esses fenômenos (da Natureza) sempre visam ao homem? Algumas vezes têm uma razão de ser diretamente relacionada ao homem, mas freqüentemente não têm outro objetivo que o restabelecimento do equilíbrio e da harmonia das forças físicas da Natureza.” “536-b: Concebemos perfeitamente que a vontade de Deus seja a causa primária, (...); mas como sabemos que os Espíritos podem agir sobre a matéria e que eles são os agentes da vontade de Deus, perguntamos se alguns dentre eles não exerceriam uma influência sobre os elementos para os agitar, acalmar ou dirigir. Mas é evidente; isso não pode ser de outra maneira. Deus não se entrega a uma ação direta sobre a Natureza, mas tem seus agentes dedicados, em todos os graus da escala dos mundos.” “537-a (...), poderia então haver Espíritos habitando o interior da Terra e presidindo aos fenômenos geológicos ? Esses Espíritos não habitam precisamente a Terra, mas presidem e dirigem os fenômenos, segundo as suas atribuições. Um dia tereis a explicação de todos esses fenômenos e os compreendereis melhor.” “538: Os Espíritos que presidem aos fenômenos da Natureza FidelidadESPÍRITA formam uma categoria especial no mundo espírita, são seres à parte ou Espíritos que foram encarnados, como nós? Que o serão, ou que o foram.” “538-a: Esses Espíritos pertencem às ordens superiores ou inferiores da hierarquia espírita? Segundo o seu papel for mais ou menos material ou inteligente: uns mandam, outros executam executam;; os que executam as ações materiais são sempre de uma ordem inferior, entre os Espíritos como entre os homens.” “539: Na produção de certos fenômenos, das tempestades, por exemplo, é somente um Espírito que age ou se reúnem em massa? Em massas inumeráveis.” “540: Os Espíritos que agem sobre os fenômenos da Natureza agem com conhecimento de causa, em virtude de seu livre arbítrio, ou por um impulso instintivo e irrefletido? Uns sim; outros não. (...) (sobre os Espíritos mais atrasados) ... Primeiro, executam; mais tarde, quando sua inteligência estiver mais desenvolvida, comandarão e dirigirão as coisas do mundo material; (...)”. Essas questões juntamente com o que nós assinalamos e grifamos, servirão de base para a nossa discussão. De modo a organizarmos os argumentos, vamos enumerar os pontos principais: 1 Os Espíritos são os agentes de uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 23 Deus na execução de seus desígnios. Portanto, são os Espíritos que agem sobre os fenômenos da Natureza quando isso é necessário. 2 Os agentes (os Espíritos) existem em todos os graus da escala evolutiva. Existem, então, os que dirigem, mandam e comandam; e os que executam a ação sobre os fenômenos. Isso significa que os que mandam e dirigem, devem ter capacidade de coordenar, calcular, prever as consequências da atitude a ser tomada pelos que executam a tarefa. 3 Os Espíritos se reúnem em massas para a realização do fenômeno. Antes de passarmos para a seção onde explicaremos como os Espíritos podem controlar os fenômenos da Natureza, vamos rever alguns princípios básicos necessários para que ocorram efeitos físicos. Do capítulo IV da segunda parte de O Livro dos Médiuns [11], retiramos os seguintes princípios: Um Espírito só pode mover um corpo sólido se ele combinar uma porção do fluido universal com o fluido que se desprende do médium apropriado a esses efeitos. Um Espírito pode agir sem que o médium, doador do fluido animalizado, perceba. Um Espírito pode agir tanto sobre a matéria mais densa quan- 24 FidelidadESPÍRITA to sobre o ar ou algum líquido. De posse desses princípios básicos da Doutrina Espírita, podemos analisar a influência dos Espíritos sobre os fenômenos da Natureza sabendo que esses fenômenos são caóticos e complexos. III. Influência dos Espíritos sobre a natureza Como vimos anteriormente, os Espíritos superiores ensinam que são os próprios Espíritos os agentes de Deus nos fenômenos da Natureza. Vimos também que Espíritos superiores (os que dirigem) e inferiores (os que executam) se unem na execução dos desígnios divinos. Vamos, nesta seção mostrar que, diante de um fenômeno de larga escala, como uma tempestade, não é necessário que os Espíritos atuem em cada porção do espaço onde ocorre o fenômeno. Faremos uma estimativa da ordem de grandeza do volume de uma tempestade em uma região do tamanho de uma pequena cidade de modo a percebermos a inviabilidade de se atuar em todo o espaço. Em seguida, discutiremos, com base nos conhecimentos atuais da ciência, uma proposta sobre como os Espíritos poderiam influenciar um fenômeno destes atuando em uma região espacial bem menor. Consideremos uma cidade que ocupe uma área de 100km2 (uma área quadrada de lado igual a 10km). Consideremos um conjunto de nuvens de tempestades que se formem a uma altura3 de 5km. Basta multiplicarmos pela área pa- ra obtermos uma estimativa do volume de espaço onde a tempestade ocorrerá: 100 x 5 = 500km3. 3 Um metro cúbico (1m ) é o volume de uma caixa d'agua de 1.000 litros. Uma unidade de kilômetro 3 cúbico (1km ) equivale a um volume de 1.000.000.000 de metros cúbicos (1 bilhão m3), que equivale à mesma quantidade de caixas d'água de 1.000 litros. São 1.000 bilhões, ou 1 trilhão de litros de 3 volume para cada km de espaço. Imaginemos que um Espírito deseja influenciar ou atuar sobre um litro de água ou ar de modo a produzir, por exemplo, algum movimento. Um litro é um volume de espaço considerável quando pensamos neste tipo de fenômeno. Suponha que um médium seria suficiente para fornecer fluidos necessários para produzir-se tal efeito físico. Imaginemos, agora, que para influenciar uma tempestade inteira seria preciso atuar em mais de 1 trilhão de litros de uma mistura de ar, vapor de água e água líquida. Quantos médiuns seriam necessários para produzir-se um efeito, mesmo que pequenino, em todo esse volume? Imaginemos, ainda, que uma tempestade pode estar ocorrendo em milhares de cidades espalhadas pelo mundo ao mesmo tempo. Lembremos 3 Nuvens de tempestades possuem uma base a 2 ou 3km de altitude e o topo em até 20km[12]. Em nossas estimativas tomamos um valor hipotético de 5km, mas se considerarmos o limite superior de 20km a questão da inviabilidade da influência dos Espíritos fica, apenas, mais evidente. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 Figura 2: Uma tempestade se aproximando de uma cidade. Compare o tamanho do conjunto formado por núvens e chuva com o tamanho dos prédios Reprodução também que para afastar uma tempestade, por exemplo, é preciso não só atuar na região onde ela ocorre mas, nas regiões vizinhas pois elas podem estar enviando frentes frias ou úmidas ou algo do tipo, e é preciso, portanto, atuar nestas regiões também. A figura 2 (acima) nos dá uma idéia da ordem de grandeza de um fenômeno de uma tempestade. Tudo isso nos leva a crer na inviabilidade de se realizar tal influência da maneira descrita acima. Mesmo uma massa inumerável de Espíritos, conforme o ponto número III, atuando sobre todo o espaço seria insuficiente para realizar-se uma influência que culminasse num efeito preciso. Porém, a história é outra se levarmos em consideração a dinâmica dos sistemas formados pela atmosfera. Sabemos que essa dinâmica é caótica, o que significa que tais sistemas são extremamente sensíveis a pequenas perturbações em algumas de suas partes. Isso nos leva a imaginar que, se pudéssemos cal- Setembro 2003 cular com precisão o efeito de cada perturbação imposta numa pequena região do espaço (ou em mais de uma, porém poucas, regiões do espaço), poderíamos controlar e até conduzir o fenômeno total a um resultado desejado. Vimos na seção anterior que os Espíritos superiores comandam a influência sobre os fenômenos. O princípio II nos leva a crer na capacidade destes Espíritos de calcularem e decidirem a melhor atuação. Na introdução comentamos sobre o progresso que a ciência humana já fez neste campo e seus limites. Acreditamos que seja perfeitamente possível aos Espíritos superiores calcular com muito maior precisão os efeitos de uma dada perturbação em uma dada região do espaço. Assim, desde que o sistema é caótico, bastaria aos Espíritos atuarem numa porção de espaço muito pequena, possivelmente bem menor do que 1% do volume total. Apesar de não podermos estimar qual seria esse tamanho (lembremos que a FidelidadESPÍRITA nossa Ciência ainda não consegue fazer isso), podemos afirmar, com toda a certeza, que não seria necessário atuar-se sobre toda a região do espaço. Desta forma, não seria necessária uma grande quantidade de fluido animalizado para que a atuação espiritual ocorresse. Isso, enfim, significa que a influência dos Espíritos sobre os fenômenos da Natureza passa a ser algo perfeitamente viável. IV. Conclusões Na questão número 536 (não transcrita na seção II), Kardec pergunta aos Espíritos se os grandes fenômenos da Natureza, como terremotos e tempestades, possuem um fim providencial e os Espíritos respondem que “Tudo tem uma razão de ser e nada acontece sem a permissão de Deus" Deus". Não foi nosso objetivo, neste artigo, discutir os aspectos morais que levariam aos Espíritos a influenciarem tais fenômenos. No entanto, cabe refletirmos que determinados acontecimentos desta natureza influenciam de maneira muito significativa na evolução dos povos levando ao desenvolvimento tanto moral quanto intelectual de seus indivíduos. No artigo da referência [3], o Dr. Ross N. Hoffman afirma ser possível, num futuro, relativamente, próximo, controlar-se os fenômenos da atmosfera terrestre. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 25 Com base nas Teorias do Caos e no desenvolvimento do que se chama Controle do Caos [3] ele propõe um esquema similar ao que expomos aqui, para o que poderia ser um controle de tais fenômenos. Se a ciência humana já cogita essa possibilidade, podemos dizer que tais conhecimentos já estão desenvolvidos nos planos espirituais superiores. Como vimos na seção III, a união do avanço intelectual dos Espíritos superiores com a natureza caótica e complexa da dinâmica dos fenômenos da natureza permite que entendamos, de modo mais plausível, como a influência dos Espíritos sobre os fenômenos da natureza pode ocorrer. Esta proposta está de acordo com o que os Espíritos disseram na questão de número 537-a, a respeito da explicação e da compreensão destes fenômenos. Ainda resta um ponto que devemos comentar. É sobre a questão do número de Espíritos necessários à influenciação (pontoIII). Esse ponto diz que os Espíritos que atuam nos fenômenos da natureza o fazem em grupos numerosos. Apesar de que, conforme demonstramos, não é necessário agir sobre toda a região do espaço para influenciar uma tempestade, isto não significa que tal influência seja simples e que apenas um Espírito seja necessário. Conforme descrito em Missionários da Luz, cap. 10 [13], um efeito físico como a materialização de uma garganta requer a colaboração de uma grande equipe de Espíritos. Portanto, para se efetuar uma ação 26 FidelidadESPÍRITA Reprodução numa porção do espaço com grande precisão não é de se estranhar que se necessite movimentar um grande número de colaboradores desencarnados. Por fim, lembramos que este trabalho apresenta uma forma pela qual os Espíritos poderiam influenciar os fenômenos da natureza. Não pretendemos que ela seja a única solução ou a solução final para a questão. Apesar de não ser comum pensarmos na Mecânica Quântica como modelo teórico para tais fenômenos, um estudo sobre as possibilidades de sua aplicação ao problema exposto aqui merece atenção. Isso será considerado em uma futura publicação. O autor é Doutor em Física pela UNICAMP e “Post-Doc” no Instituto de Física da USP. Atualmente, o autor é “Post-Doc” no Departamento de Química de Rutgers, The State University of New Jersey, EUA. Agradecimentos O autor agradece a D. Floriza S. A. Chagas, Dr. Alexandre C. Gonçalves, Dra. Hebe M. L de Souza, Sr. Henri Barreto, Dr. Zalmino Zimmermann e ao Prof. Dr. Sílvio S. Chibeni pela leitura crítica deste compuscrito e por valiosas sugestões e incentivos. Referências: 1) A. Kardec, A Gênese. Editora IDE (1992); 2) C. Schutel, Parábolas e Ensinos de Jesus. Casa Editora O Clarim, 12ª edição. 1987; 3) R. N. Hoffman, Bulletin of the American 83 Pág. 241. 2002; Meteorological Society, 83. 4) E. Ott, Chaos in Dynamical Systems. Cambridge University Press. 1993; 5) Y. BarYam, Dynamics of Complex Systems. Perseus Books. 1997; 6) S. Hawking, O Universo Numa casca de Noz. Editora Mandarim. 2ª edição. 2002; 7) E. N. Lorenz, Journal of Atmospheric Sci20 Pág. 130. 1963; ence, 20. 8) E. N. Lorenz, Tellus, 34 34. Pág. 505. 1982; 9) A. Kardec, O Livro dos Espíritos. Editora FEESP. 9ª edição. 1997; 10) A. Kardec., Revista Espírita, Jornal de Estudos Psicológicos, II II, número 8. 1859; 11) A. Kardec, O Livro dos Médiuns. Editora FEESP. 1ª edição. 1984; 2 nú12) M. M. F. Saba, Física na Escola, 2, mero 1. Pág. 19. 2001; 13) A. Luiz, psicografia de F. C. Xavier, Missionários da Luz. Editora FEB. 26ª edição. 1995. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 AComigo CONTECEU Sonho Esclarecedor José Antônio da Silva Xavier - Campinas/SP S omos em quatro irmãos e ficamos órfãos quando ainda éramos crianças e, por esse motivo, fomos criados separados, fazendo com que não tivéssemos uma afinidade de irmão uns com os outros. Quando nos tornamos adultos, acabamos por morar todos perto, vencemos as barreiras impostas pela separação aprendendo a nos conhecer e nos amarmos. Nessa época, tínhamos um sério problema na família. Meu irmão mais novo (BJ) dava sinais de estar envolvido com drogas, suas atitudes eram muito agressivas para quem apenas se embriagava com álcool; quando estava em crise ele quebrava as coisas, saía de casa e retornando mais tarde, quando consciente não lembrava de nada. Nesse período, eu vivia em um cômodo na casa do meu irmão mais velho e já freqüentava o Centro Espírita “Allan kardec” de Campinas/SP e sempre que eu podia, solicitava para que o grupo fizesse uma vibração por ele. Os meus outros dois irmãos não se afinavam com (BJ), dizendo que ele era um “sem vergonha” por agir assim. E eu, pelo contrário, sempre tive uma ligação grande com esse rapaz, mesmo tendo sido criado separado. Setembro 2003 Então, coube a mim o encargo de cuidar do (BJ) e, na minha imaturidade, eu só fazia era orar. Minha cunhada, muito centrada, vendo que ninguém tomava uma posição resolveu chamá-lo e pedir para que ele se internasse numa clínica de tratamento de dependentes de drogas. (BJ) aceitou, pois, a situação a qual ele se encontrava, de certa forma, o obrigava a isso; mas, ele sempre me dizia que não era envolvido com drogas e eu não acreditava assim como todos. Então, ele se internou em uma casa evangélica aqui em Campinas onde minha cunhada havia conseguido uma vaga. Lá, o tratamento era muito severo e isso o desesperava; quando íamos visitá-lo, embora com vontade, ele nunca nos pediu para tirá-lo de lá, até que um dia, na madrugada de sexta para Sábado, eu dormi com a intenção de, no dia seguinte, ir para São Paulo encontrar-me com minha noiva e, durante meu sono acabei por sonhar com (BJ). No sonho, ele apareceu em local semelhante à casa de recuperação e, em total desespero, me dizia: “estou aqui para provar que não estou ligado às drogas, meu problema é apenas com álcool e durante os meus momentos de depressão; não consigo mais ficar aqui, vou FidelidadESPÍRITA sair, me perdoe mais eu tenho que sair daqui". Quando acordei fui tomar meu café e, então, disse para a minha cunhada: “O (BJ) está para chegar" e narrei o sonho, ela riu e disse “virou bruxo realmente" e não acreditou. Fui para São Paulo e ao chegar em frente da casa da minha noiva, à época, ela estava me esperando no portão com uma cara espantada e, embora fizesse quase um mês que não nos víamos, suas primeiras palavras foram: “Ele esta lá, a sua cunhada me ligou e disse que ele chegou assim que você saiu". A partir deste momento, eu realmente acreditei que ele não estava envolvido com drogas, como de fato não estava. Encaminhe para a redação fatos espíritas como esse, absolutamente verídicos. Envie nome, telefone e endereço completos, estando disponível para eventual encontro com a redação. Após análise, publicaremos seu caso na coluna “Aconteceu Comigo”. Ressaltamos, ainda, que as histórias serão, após doação autoral, de propriedade exclusiva dessa revista. Nosso endereço: Rua Luiz Silvério, 120, Vila Marieta, Campinas/SP, CEP 13043-330. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 27 ENTENDENDO Estupro e Aborto na Visão ESPÍRITA Dr. Ricardo di Bernardi - Florianópolis/SC Presidente da Associação Médico-Espírita (AME) e Instituto de Cultura Espírita de Florianópolis Exclusivo para FidelidadESPÍRITA E m diversas oportunidades, quando fizemos palestra sobre reencarnação e aborto, fomos questionados, posteriormente, sobre a dolorosa e delicada circunstância do estupro. Principalmente, ao se propiciar perguntas a nos serem dirigidas por escrito, viabilizava-se este questionamento. Embora o tema seja potencialmente polêmico e desagradável, não há como ignorá-lo no contexto de nossa situação planetária. A grande discussão que se levanta é a legitimidade, ou não, do aborto, quando a gravidez é conseqüente a um ato de violência física. Mais uma vez, nos posicionamos em relação ao aspecto legal da questão nos abstendo de maiores comentários no campo jurídico, pois leis e constituições, os povos já as tiveram inúmeras e tantas outras terão. Nossa abordagem será pelo ângulo transcendental e reencarnacionista considerando que são três Espíritos, no mínimo, envolvidos na tragédia em questão. Igualmente, quanto ao aspecto da ética médica, a qual estamos submetidos por força da profissão que nesta reencarnação exercemos, lembramos ser esta ética diferente 28 FidelidadESPÍRITA em cada país do planeta. Numa escala de zero a 10, teremos todas as notas, conforme a nação e o continente que nos reportamos. Inicialmente, cumpre-nos esclarecer que o livre arbítrio é o maior patrimônio que nós, Espíritos humanos, temos alcançado ao atingirmos a faixa evolutiva pensante. Livre arbítrio que não legitima atitudes, mas oportuniza às criaturas decidirem e se responsabilizarem pelas conseqüências de seus atos. Outra premissa que deveremos estabelecer é aquela da maior ou menor repercussão dos atos perante a lei Universal, em função do nível de esclarecimento que possuímos. Importante, também, salientar que não há atos perversos que tenham sido planejados pela espiritualidade superior. Seria de uma miopia intelectual sem limites, a idéia de que alguém deve reencarnar a fim de ser estuprado. A concepção do Deus punitivo e vingativo já não cabe mais no dicionário dos esclarecimentos sobre a vida espiritual. Deus é a fonte inesgotável de amor. É a lei maior que a tudo preside, uma lei de amor que coordena as leis da natureza. Como conceber a violência físi- ca? Como enquadrar a onipresença divina em situações e sofrimentos que observamos? Deus estaria ausente nessas circunstâncias? Ou estaria presente? Para muitos indivíduos se estivesse presente já seria motivo para não crer na sua existência ou na sua infinita bondade e onisciência. Outra questão importante: Quem é a “vítima”? Cada um de nós ao reencarnar, trouxe todo o seu passado impresso indelevelmente em si mesmo, são os núcleos energéticos que trazemos em nosso inconsciente construídos no passado. Espíritos que somos e pelas inúmeras viagens que percorremos, representadas pelas inúmeras vidas, possuímos no nosso “passaporte”, inúmeros “carimbos” das pousadas onde estagiamos em vidas anteriores. Hoje, a somatória dessas experiências se traduzem em manancial energético que irradia constantemente do nosso interior para a superfície desta vida. Assim, é também a “vítima”. A mulher que hoje se apresenta de forma diferente, traz em seu passado profundas marcas de atitudes prejudiciais a irmãos seus. Atitudes de desequilí- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 brio que são gravadas em si mesma. Algumas participaram intelectualmente de verdadeiras emboscadas visando atingir de maneira dolorosa a intimidade sexual de criaturas; outras foram executoras diretas, pela autoridade de que eram investidas, de crimes nessa área. Enfim, são múltiplas as situações geradoras da desarmonia energética que agora pulsa constantemente nos arquivos vibratórios da nossa personagem nesse drama. Pela lei universal, a sintonia de vibrações, poderá ocorrer em um dado momento dependendo da facilitação criada por atitudes mentais da personagem. Como orientar a vítima? Identificando dois dos protagonistas (a mãe e o filho) falemos acerca da entidade reencarnante. Em certas ocasiões, o ser que mergulha na carne nesta dolorosa circunstância é alguém que vibra na mesma faixa de desequilíbrio. Um Espírito que pelo ódio se imantava magneticamente à aura da mulher como que lhe pedindo contas pelos sofrimentos causados por ela, se vê preso às malhas energéticas do organismo biológico que se forma. O processo obsessivo que vinha se desenvolvendo já o fixara perifericamente à trama perispiritual materna e agora passa a aderir definitivamente naquele organismo feminino. Apesar do momento cruel, a Lei maior pode aproveitar para retirar o perseguidor desta situação adormecendo-o. Acordará, talvez, embalado pelos braços de sua antiga algoz que aprenderá a perdoar e até amar em função do sábio esquecimento do passado. Lembremo-nos, novamente, não foi em hipótese alguma programado o estu- Setembro 2003 pro, nem ele em qualquer circunstância teria justificativa. No entanto, o crime existindo, a espiritualidade sempre fará o máximo para do “mal” poder resultar algum bem. Mas, muitas vezes, a gestante pressionada pelos vínculos familiares opta por interromper a gravidez indesejada. Somos contrários à teatralidade daqueles que exibem recursos chocantes de fragmentos ensangüentados de bebês em formação, jogados nos baldes frios da indiferença humana. A falta de argumento e conhecimento espírita do processo que se desencadeia, é que faz lançar mão desses métodos agressivos de exposição. A visão espiritual da situação dispensa esses recursos dos quais podem se servir outras correntes religiosas que desconhecem a preexistência da alma o mecanismo da reencarnação, etc. O Espírito submetido à violência do aborto sofre intensamente no processo, conforme o seu grau de maturidade espiritual. Perante a Lei divina, sabemos que o Espírito reencarnado não deve receber a agressão arbitrária em face da violência cometida por outro. Violência que gera violência, um ciclo triste que necessita ser rompido com um ato de amor a um entezinho que muitas vezes aspira por uma oportunidade de evolução em nova vida. O aborto provocado gera muitas vezes profundos traumas em todos os envolvidos exacerbando a dolorosa situação cármica da constelação familiar. Ninguém é mãe ou filho de outrem por causalidade. Há, sempre, um mecanismo sábio da lei que visa corrigir ou atenuar sofrimentos. FidelidadESPÍRITA Há, também, Espíritos afins e benfeitores que, visando amparar a futura mãe, optam pelo reencarne na situação surgida. A vítima do estupro, poderá ter ao seu lado toda luz de alguém, que poderá vir a ser o seu arrimo e consolo na velhice. Irmãos cheios de ternura em seu coração, com projetos de dedicação e amparo, aproveitam o momento criado pelo crime para auxiliar, diretamente, na vida material, dando todo seu trabalho afetivo para aquela que amam. Renascem como seu filho. A eliminação da gravidez, através do aborto provocado, nestes casos, irá anular este laborioso auxílio que o Espírito protetor lamentará ter perdido. Pelo exposto, a interrupção da gestação mesmo decorrente de violência, é sempre uma atitude arbitrária que só ampliará o sofrimento dos familiares. Se a mulher for emocionalmente incapaz de atender os requisitos da maternidade, a adoção, preferencialmente por pessoas de vínculos próximos, deverá ser o remédio por nós indicado. Se não houver possibilidades psiquicamente aceitáveis de recepção por parte de familiares, encaminhe-se os trâmites da adoção para quem receberá a criança com o amor necessário ao seu processo redentor e educativo. O tempo se encarregará de cicatrizar os ferimentos da alma. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 29 REVUE SPIRITE A CIÊNCIA DA CONCORDÂNCIA DOS NÚMEROS E A FATALIDADE Reprodução Allan Kardec P or várias vezes nos perguntaram o que pensamos da concordância dos números e se cremos no valor dessa ciência. Nossa resposta é bem simples: até este momento nada pensamos a respeito, porque jamais com ela nos ocupamos. Bem que temos visto alguns casos de concordâncias singulares entre as datas de certos acontecimentos, mas em pequeníssimo número para delas tirar uma conclusão, mesmo aproximada. A bem dizer, não vemos a razão de tal coincidência. Mas, porque não se compreende uma coisa, não é motivo para que ela não exista. A natureza não disse a sua última palavra, e o que hoje é utopia, poderá ser verdade amanhã. Então pode ser que entre os fatos exista uma certa correlação, que não suspeitamos, e que poderia traduzir-se por números. Em todo o caso, não se poderia dar o nome de ciência a um cálculo tão hipotético quanto ao das relações numéricas, no que concerne a sucessão dos acontecimentos. Uma ciência é um conjun- 30 FidelidadESPÍRITA to de fatos bastante numerosos para deles se deduzirem regras, e suscetíveis de demonstração. Ora, no estado atual dos nossos conhecimentos, seria de absoluta impossibilidade dar dos fatos desse gênero uma teoria qualquer, nem nenhuma explicação satisfatória. Não é, pois, ou, se quiser, não é ainda uma ciência, o que não implica a sua negação. Há fatos sobre os quais temos uma opinião pessoal; no caso de que se trata, não temos nenhuma, e se nos inclinássemos para um lado, seria antes para a negativa, até prova em contrário. Baseamo-nos em que o tempo é relativo; não pode ser apreciado em termos de comparação e os pontos de referência estabelecidos na revolução dos outros; e esses termos variam conforme os mundos, porque fora dos mundos o tempo não existe; não há unidade para medir o infinito. Assim, parece não haver uma lei universal de concordância para as datas dos acontecimentos, desde que o côm- puto da duração varia conforme os mundos, a menos que haja, sob esse respeito, uma lei particular para cada mundo, afeta à sua organização como há uma para a duração da vida de seus habitantes. Seguramente, se tal lei existir, um dia será conhecida. O Espiritismo, que assimila todas as verdades, quando estas são constatadas, não irá repelir esta. Mas como, até o presente, essa lei não é atestada, nem por um número suficiente de fatos, nem por uma demonstração categórica, com ela nos devemos preocupar tanto menos quanto ela só nos interessa de maneira muito indireta. Não dissimulamos a importância dessa lei, se é que ela existe, mas como a porta do Espiritismo estará sempre aberta a todas as idéias progressivas, a todas as aquisições da inteligência, ele se ocupa com as necessidades do momento, sem temer ser ultrapassado pelas conquistas do futuro. Tendo sido a questão exposta aos Espíritos num grupo muito sério de província, e por isto mesmo uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 geralmente bem assistido, foi respondido: “Há, certamente, no conjunto dos fenômenos morais, como nos fenômenos físicos, relações baseadas em números. A lei da concordância das datas não é uma quimera; é uma das que vos serão reveladas mais tarde, e vos darão a chave das coisas que vos parecem anomalias. Porque, crede-o bem, a natureza não tem caprichos; ela marcha sempre com precisão e passo seguro. Aliás, esta lei não é tal qual imaginais; para a compreender na sua razão de ser, no seu princípio e na sua utilidade, necessitais adquirir idéias que ainda não tendes, e que virão a seu tempo. Pelo momento, este conhecimento é prematuro, razão por que não vos é dado. Então, seria inútil insistir. Limitai-vos a recolher os fatos; observai sem nada concluir, com receio de vos confundir. Deus sabe dar aos homens o alimento intelectual à medida que estão em estado de o suportar. Trabalhai sobretudo no vosso adiantamento moral, porque é por este que merecereis possuir novas luzes.” Somos da mesma opinião. Pensamos, até, que haveria mais inconvenientes do que vantagens em vulgarizar prematuramente uma crença que, em mãos ignorantes, poderia degenerar em abuso e em práticas supersticiosas, por falta do contra-peso de uma teoria racional. O princípio da concordância das datas é, pois, inteiramente hipotético; mas se nada é ainda permitido afirmar a este respeito, a experiência demonstra que na natureza muitas coisas estão subordinadas a leis numéricas, suscetíveis do mais rigoroso cálculo. Este fato, Setembro 2003 de uma grande importância, talvez possa um dia lançar luz sobre a primeira questão. É assim, por exemplo, que as chances do acaso são submetidas, em seu conjunto, a uma periodicidade de admirável precisão; a maior parte das combinações químicas, para a formação dos corpos compostos, dão-se em proporções definidas, isto é, há um número determinado de moléculas de cada um dos corpos elementares, e uma molécula a mais ou a menos muda completamente a natureza do corpo composto;1 a cristalização se opera sob ângulos de uma abertura constante; em astronomia os movimentos e as forças seguem progressões de um rigor matemático, e a mecânica celeste é tão exata quanto a mecânica terrestre; dá-se o mesmo com a reflexão dos raios luminosos, calóricos e sonoros; é em cálculos positivos que estão estabelecidas as chamas de vida e de mortalidade nos seguros. É certo, pois, que os números estão na natureza e que leis numéricas regem a maior parte dos fenômenos de ordem física. Dá-se o mesmo nos fenômenos de ordem moral e metafísica? É o que seria presunção afirmar, sem dados mais certos do que os que se possuem. Esta questão, aliás, levanta outras que tem a sua importância, e sobre as quais julgamos útil apresentar algumas observações de um ponto de vista geral. Fatalidade e Livre Arbítrio Desde o instante que uma lei numérica rege os nascimentos e a mortalidade das criaturas, não poderia dar-se o mesmo, mas, então, numa escala mais vasta, para as individualidades coletivas, tais como as raças, os povos, as cidades, etc? FidelidadESPÍRITA As fases de sua marcha ascendente, de sua decadência e de seu fim, as revoluções que marcam as etapas do progresso da Humanidade, não estariam sujeitas a uma certa periodicidade? Quanto às unidades numéricas para o cômputo dos períodos humanitários, se não são os dias, nem os anos ou os séculos, poderiam ter por base as gerações, como alguns fatos tenderiam a fazê-lo supor. Aí não está um sistema; é ainda menos uma teoria, mas uma simples hipótese, uma idéia baseada numa probabilidade, e que um dia poderia servir de ponto de partida para idéias mais positivas. Mas, perguntarão, se os acontecimentos que decidem a sorte da Humanidade, de uma nação, de uma tribo, tem vencimentos regulados por uma lei numérica, é a consagração da fatalidade e, então, em que se torne o livre arbítrio do homem? Então o Espiritismo estaria errado, quando diz que nada é fatal, e que o homem é o senhor absoluto de suas ações e de sua sorte? Para responder a esta objeção, há que tomar a questão de mais alto. Digamos, para começar, que o Espiritismo jamais tenha negado a fatalidade de certas coisas e que, ao contrário, sempre a reconheceu. Mas ele diz que essa fatalidade não entrava o livre arbítrio. Eis o que é fácil de demonstrar. Todas as leis que regem o conjunto dos fenômenos da natureza têm conseqüências naturalmente fatais, isto é, inevitáveis, e essa fatalidade é indispensável à manutenção da harmonia universal. O homem que sofre essas conseqüên- 1 Vide A Gênese, cap. X, item 7 e seguintes. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 31 cias, está, pois, submetido à fatalidade, em tudo quanto não depende de sua iniciativa. Assim, por exemplo, deve morrer fatalmente; é a lei comum, à qual não pode subtrairse e, em virtude dessa lei, pode morrer em qualquer idade, quando chegar a sua hora; mas se, voluntariamente, apressa a sua morte, pelo suicídio ou por seus excessos, age em virtude de seu livre arbítrio, porque ninguém pode constrangêlo a o fazer. Deve comer para viver: é a fatalidade; mas se comer além do necessário, pratica um ato de liberdade. Em sua cela, o prisioneiro é livre de mover-se à vontade, no espaço que lhe é concedido; mas as paredes que não pode transpor são para ele a fatalidade que lhe restringe a liberdade. A disciplina é para o soldado uma fatalidade, pois o obriga a atos independentes de sua vontade, mas não é menos livre em suas ações pessoais, pelas quais é responsável. Assim é com o Há mais inconvenientes do que vantagens em vulgarizar prematuramente uma crença que, em mãos ignorantes, pode degenerar em abuso e em práticas supersticiosas, por falta do contra-peso de uma teoria racional. sua discreção, e se não lhes opusessem um freio salutar? O homem pode, pois, ser livre em suas ações, a despeito da fatalidade que preside o conjunto; é livre numa certa medida, no limite necessário para lhe deixar a responsabilidade de seus atos. Se, em virtude desta liberdade, ele perturba a harmonia por um mal que faz, põe um ponto de parada na marcha providencial das coisas, é o primeiro a sofrer por isto, e como as leis da natureza são mais fortes do que ele, acaba sendo arrastado na corrente; então sente a necessidade de reentrar no bem e tudo retoma o seu equilíbrio. De sorte que a volta ao bem é ainda um ato de livre ar- A fatalidade é o freio imposto ao homem por uma vontade superior à sua, e mais sábia que ele, em tudo o que não é deixado à sua iniciativa. homem na natureza. A natureza tem as suas leis fatais, que lhe opõem uma barreira, mas aquém da qual ele pode mover-se à vontade. Porque Deus não deu ao homem uma liberdade completa? Porque Deus é como um pai previdente, que limita a liberdade de seus filhos, na medida de seu raciocínio e do uso que dela podem fazer. Se os homens já se servem tão mal da que lhes é concedida, se não sabem governar-se a si mesmos, que seria se as leis da natureza estivessem à 32 FidelidadESPÍRITA bítrio, posto que provocado provocado, mas não imposto, pela fatalidade. O impulso dado pelas leis da natureza, bem como os limites que elas estabelecem, são sempre bons, porque a natureza é a obra da sabedoria divina. A resistência a essas leis é um ato de liberdade e essa resistência sempre atrai o mal. Sendo o homem livre para observar ou infringir essas leis, no que toca a sua pessoa, é, pois, livre de fazer o bem ou o mal. Se pudesse ser fatalmente levado a fazer o mal, e não podendo essa fatalidade vir senão de um poder a ele superior, Deus seria o primeiro a infringir as suas leis. Quem é aquele a quem muitas vezes aconteceu dizer: “Se eu não tivesse agido como agi em tal circunstância, não estaria na posição em que estou; se tivesse que recomeçar, agiria de outra maneira?" Não era reconhecer que tinha a liberdade de fazer ou não fazer? Que estava livre para fazer melhor, se se apresentasse a ocasião? Ora, Deus, que é mais sábio do que ele, prevendo os erros, nos quais pode cair, o mau uso que pode fazer de sua liberdade, dá-lhe indefinidamente a possibilidade de recomeçar pela sucessão de suas existências corporais, e ele recomeçará até que, instruído pela experiência, não mais erre o caminho. O homem pode, pois, conforme a sua vontade, apressar ou retardar o termo de suas provas, e é nisto que consiste a sua liberdade. Agradeçamos a Deus não nos ter fechado para sempre o caminho da felicidade, decidindo a nossa sorte definitiva após uma existência efêmera, notoriamente insuficiente para chegar ao topo da escada do progresso, e de nos haver dado, pela fatalidade mesma da reencarnação, os meios de adquirir incessantemente, renovando as provas nas quais fracassamos. A fatalidade é absoluta para as leis que regem a matéria, porque a matéria é cega; não existe para o Espírito que, ele próprio, é chamado a reagir sobre a matéria, em virtude de sua liberdade. Se as doutri- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 nas materialistas fossem verdadeiras, seriam a mais formal consagração da fatalidade; porque se o homem fosse apenas matéria, não poderia ter iniciativa. Ora, se lhe concedeis iniciativa, seja no que for, é que ele é livre; e se é livre, é que tem em si algo além da matéria. Sendo o materialismo a negação do princípio espiritual, é, por isso mesmo, a negação da liberdade. E - contradição bizarra! - os próprios materialistas, que proclamam o dogma da fatalidade, são os primeiros a se prevalecer para constituí-lo em título para a sua liberdade; a reivindicá-la como um direito na sua mais absoluta plenitude, junto aos que a comprimem e isto sem suspeitar que é reclamar o privilégio do Espírito, e não da matéria. os números pares e ímpares e com todas as chances ditas duplas. Se, em lugar de duas cores, houver três, haverá um terço de cada; se forem quatro, um quarto, etc. Muitas vezes a mesma cor sai por série de duas, três, quatro, cinco, seis vezes seguidas; num certo número de jogadas, haverá tantas séries de duas vermelhas, quanto de duas pretas, tantas de três vermelhas quanto de três pretas, e assim por diante; mas as jogadas de duas a metade menos numerosas do que as metades de uma; as de três, um terço das de uma; as de quatro, um quarto, etc. tá, pois, submetido a uma lei matemática ou, melhor dito, não há acaso. A irregularidade caprichosa que se manifesta em cada jogada, ou num pequeno número de jogadas, não impede a lei de seguir o seu curso, de onde poder dizer-se que há nessa repartição uma verdadeira fatalidade, que preside ao conjunto, é nula, ou pelo menos inapreciável, para cada jogada isolada. Estendemo-nos um pouco no exemplo dos jogos, porque é um dos mais chocantes e dos mais fáceis de verificar, pela possibilidade de multiplicar os fatos à vontade, Tendo o homem o livre arbítrio, em nada entra a fatalidade em suas ações individuais Acaso ou Lei Divina? Aqui se apresenta outra questão. A fatalidade e a liberdade são dois princípios que parecem excluir-se. A liberdade da ação individual é compatível com a fatalidade das leis que regem o conjunto, e esta ação não vem perturbar a sua harmonia? Alguns exemplos tomados dos mais vulgares fenômenos da ordem material darão a solução do problema evidente. Dissemos que as chances do acaso se equilibram com uma surpreendente regularidade. Com efeito, há um resultado muito conhecido no jogo do vermelho e preto que, a despeito de sua irregularidade de saída a cada lançamento, as cores são em número igual ao cabo de certo número de jogadas; isto é, em cem jogadas, haverá cinqüenta vermelhas e cinqüenta pretas; em mil, quinhentas de uma e quinhentas de outra, com diferença de poucas unidades. Dá-se o mesmo com Setembro 2003 Nos dados, como estes têm seis faces, jogando-o sessenta vezes, chegar-se-á a dez vezes um ponto, dez vezes dois pontos, dez vezes três pontos e assim com os outros. Na antiga loteria de França, havia noventa números colocados numa roda; tiravam-se cinco de cada vez. Os registros de vários anos constataram que cada número havia sido na proporção de um nonagésimo e cada dezena na proporção de um nono. A proporção é tanto mais exata quanto mais considerável o número de jogadas. Em dez ou vinte jogadas por exemplo, pode ser muito desigual, mas o equilíbrio se estabelece à medida que aumenta o número, e isto com uma regularidade matemática. Sendo isto um fato constante, é bem evidente que uma lei numérica preside a essa repartição, quando abandonada a si mesma e que nada vem forçá-la ou entravá-la. O que se chama acaso es- FidelidadESPÍRITA em curto espaço de tempo. E como a lei ressalta do conjunto dos fatos, foi essa multiplicidade que permitiu reconhecê-la, sem o que é provável que ainda se a ignorasse. A mesma lei pode ser observada com precisão nas chances de mortalidade. A morte, que parece ferir indistintamente e às cegas, não segue menos, em seu conjunto, uma marcha regular e constante, segundo a idade. Sabe-se, a propósito, que tantos de um a dez anos, tantos de dez a vinte, tantos de vinte a trinta, e assim por diante; ou então que após um período de dez anos, o número dos sobreviventes será de tantos de um a dez anos, tantos de dez a vinte, etc. Causas acidentais de mortalidade podem momentaneamente perturbar esta ordem, como no jogo a saída de uma longa série da mesma cor rompe o equilíbrio. Mas se, em vez de um período de dez anos ou de um número de mil indivíduos, es- uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP 33 tende-se a observação a cinqüenta anos e a cem mil indivíduos, encontrar-se-á o equilíbrio restabelecido. De acordo com isto é permitido supor que todas as eventualidades que parecem efeito do acaso, na vida individual, como na dos povos e da Humanidade, são regidas por leis numéricas, e que o que falta para as conhecer é poder abarcar de um golpe de vista uma massa bastante considerável de fatos, e um lapso de tempo suficiente. Pela mesma razão nada haveria de absolutamente impossível que o conjunto dos fatos de ordem moral e metafísica fosse igualmente subordinado a uma lei numérica, cujos elementos e as bases, até agora, nos são totalmente desconhecidos. Em todo o caso, vê-se, pelo que precede, que essa lei ou, se se quiser, essa fatalidade do conjunto, de modo algum eliminaria o livre arbítrio. É o que nos tínhamos proposto demonstrar. Não se exercendo o livre arbítrio senão sobre pontos isolados de detalhe, não entravaria a realização da lei geral, quanto a irregularidade da saída de cada número não entrava a repartição proporcional desses mesmos números sobre um certo número de jogadas. O homem exerce o seu livre arbítrio na pequena esfera de sua ação individual; esta pequena esfera pode estar na confusão, sem que isto a impeça de gravitar no conjunto segundo a lei comum, assim como os pequenos remoinhos causados nas águas de um rio, pelos peixes que se agitam, não impedem a massa das águas de seguir o curso forçado que lhes imprime a lei da gravitação. Tendo o homem o livre arbítrio, em nada entra a fatalidade em suas ações individuais; quanto aos acontecimentos da vida privada, 34 FidelidadESPÍRITA A fatalidade é absoluta para as leis que regem a matéria, porque a matéria é cega; não existe para o Espírito que, ele próprio, é chamado a reagir sobre a matéria, em virtude de sua liberdade que por vezes parecem atingi-lo fatalmente, tem duas fontes bem distintas: uns são conseqüência direta de sua conduta na existência presente; muitas pessoas são infelizes, doentes, enfermas por sua falta; muitos acidentes são resultado da imprevidência; ele não pode queixar-se senão de si mesmo e não da fatalidade ou, como se diz, de sua má estrela. Os outros são inteiramente independentes da vida presente e parecem, por isto mesmo, devidos a uma certa fatalidade. Mas, ainda aqui o Espiritismo nos demonstra que essa fatalidade é apenas aparente, e que certas posições penosas da vida têm sua razão de ser na pluralidade das existências. O Espírito as escolheu voluntariamente na erraticidade, antes de sua encarnação, como provações para o seu adiantamento. Elas são, pois, produto do livre arbítrio, e não da fatalidade. Se algumas vezes são impostas, como expiação, por uma vontade superior, é ainda por força das más ações voluntariamente cometidas pelo homem em sua existência precedente, e não como conseqüência de uma lei fatal, pois que ele poderia ter evitado, agindo de outro modo.2 A fatalidade é o freio imposto ao homem por uma vontade superior à sua, e mais sábia que ele, em tudo o que não é deixado à sua iniciativa. Mas ela jamais é um entrave no exercício de seu livre arbítrio, no que toca as suas ações pessoais. Ela não pode impor-lhe nem o mal, nem o bem; desculpar uma ação má qualquer pela fatalidade ou, como se diz muitas vezes, pelo destino, seria abdicar do julgamento de Deus, que lhe deu, para pesar o pró e o contra, a oportunidade ou inoportunidade, as vantagens e os inconvenientes de cada coisa. Se um acontecimento está no destino de um homem, realizar-se-á a despeito de sua vontade, e será sempre para o seu bem; mas as circunstâncias da realização dependem do emprego que ele faça de seu livre arbítrio, e muitas vezes ele pode voltar em seu prejuízo o que deveria ser um bem, se agir com imprevidência e se se deixar arrastar por suas paixões. Ele se engana mais ainda se torna o seu desejo ou os desvios de sua imaginação por seu destino tais são as reflexões que nos sugeriram os três ou quatro pequenos cálculos de concordância de datas, que nos foram apresentados, e sobre os quais nos pediram conselho. Elas eram necessárias para demonstrar que em semelhante matéria, de alguns fatos idênticos, não se podia por uma aplicação geral. Aproveitamo-los para resolver, por novos argumentos, a questão da fatalidade e do livre arbítrio. 2 Vide O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. V, item 1 a 11. Transcrito do Artigo: 1) A ciência da concordância dos números e a fatalidade. Kardec, Allan. Revista Espírita. Julho de 1868. Páginas 193 à 201. Tradução de Júlio Abreu Filho. Ed. Edicel. uma publicação do Centro de Estudos Espíritas “Nosso Lar” - Campinas/SP Setembro 2003 Vê, pois VINHA DE LUZ "Vê, pois, que a luz que há em ti não sejam trevas." Jesus. (Lucas 11:35) Há ciência e há sabedoria, inteligência e conhecimento, intelectualidade e luz espiritual. Geralmente, todo homem de raciocínio fácil é interpretado à conta de mais sábio, no entanto, há que distinguir. O homem não possui ainda qualidades para registrar a verdadeira luz. Daí, a necessidade de prudência e vigilância. Em todos os lugares, há industriosos e entendidos, conhecedores e psicólogos. Muitas vezes, porém, não passam de oportunistas prontos para o golpe do interesse inferior. Quantos escrevem livros abomináveis, espalhando veneno nos corações? Quantos se aproveitam do rótulo da própria caridade visando extrair vantagens à ambição? Não bastam o engenho e a habilidade. Não satisfaz a simples visão psicológica. É preciso luz divina. Há homens que, num instante, apreendem toda a extensão dum campo, conhecem-lhe a terra, identificam-lhe o valor. Há, todavia, poucos homens que se apercebem de tudo isso e se disponham a suar por ele, amando-o antes de explorá-lo, dando-lhe compreensão antes da exigência. Nem sempre a luz reside onde a opinião comum pretende observá-la. Sagacidade não chega a ser elevação, e o poder expressivo apenas é respeitável e sagrado quando se torna ação construtiva com a luz divina. Raciocina, pois, sobre a própria vida. Vê, com clareza, se a pretensa claridade que há em ti não é sombra de cegueira Espiritual. Emmanuel psic. Chico Xavier Vinha de Luz III. Cap. 33. Ed. FEB.