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Entrevista de Ernâni Rodrigues Lopes e de António Marta: o processo de
adesão de Portugal às Comunidades (1986)
Source: Imagens do processo de adesão de Portugal à Comunidade Europeia- Lisboa: RTP [Prod.], 1986.
Radiotelevisão Portuguesa, Serviço público de televisão SA, Lisboa. - VIDEO (00:21:44, Couleur, Son
original).
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Last updated: 04/07/2016
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Entrevista de Ernâni Rodrigues Lopes e de António Marta: o processo de adesão de
Portugal às Comunidades (1986)
[Jornalista] 28 de Março de 1977, Portugal pede formalmente a sua adesão à Comunidade Económica
Europeia. Meses antes, este pedido começara a ser preparado com uma ofensiva diplomática. É a altura em
que o Primeiro-Ministro de Portugal efectua uma visita às capitais europeias, preparando o terreno para um
bom acolhimento do pedido português. Enquanto isso, as principais forças políticas tomavam posições
definidas quanto a esta visita e quanto à integração portuguesa no mercado comum.
Neste período pré-negocial, caracterizado pela abertura de alguns dossiers, a primeira mudança significativa
na estratégia negocial portuguesa dá-se em finais de 1979.
[Ernâni Lopes] A decisão tem lugar no começo do segundo semestre de 1979 e a execução, naturalmente,
vai se arrastar pelos meses seguintes. E é precisamente nesta altura – que vai de meados de 1979, decisão
tomada, execução nos finais de 1979 e ao longo de 1980 – que se faz essa mudança de uma estratégia de
frente estreita para uma estratégia de frente larga. E com que efeitos? Primeiro que tudo, envolver no quadro
de negociação praticamente todos os ministérios porque muitos deles, até pela força das coisas, não estavam
envolvidos na negociação daquele grupo muito restrito de capítulos.
[Jornalista] 1980 é um ano de nova ofensiva diplomática. O Primeiro-Ministro português tenta nas várias
capitais europeias acelerar o processo português. Em Bruxelas, a frente negocial é uma vez mais alargada
com a abertura de quatro novos dossiers. A Comunidade Europeia adopta então um esquema de ajudas de
pré-adesão a Portugal.
Um ano depois, e apesar da mudança do chefe de Governo, os contactos internacionais iriam manter-se. Mas
este esforço só iria ser recompensado bastante mais tarde. Dificuldades internas da CEE, principalmente no
campo agrícola e financeiro, obrigavam a Comunidade a abandonar o diálogo activo com os países
candidatos.
O Presidente francês, Giscard d’Estaing, propunha mesmo uma pausa nas negociações. Para Giscard, a
prioridade era resolver os problemas internos da CEE. 1980-1982, tornava-se assim num período de
estagnação das negociações.
[Ernâni Lopes] Encontrar a posição comum ao tempo de nove Estados, mais tarde seriam dez com a Grécia,
mas encontrar uma posição comum de nove Estados que fosse a posição que a presidência em exercício
apresentaria a Portugal, e à Espanha também, como posição comum dos diversos Estados-Membros,
portanto como posição comunitária, foi difícil nesta altura, como seria difícil mais tarde. E isto está
relacionado com aquele aspecto que ficou conhecido como a pausa proposta pelo Presidente da República
Francesa, o senhor Giscard d’Estaing.
Uma pausa de reflexão para ver com cuidado, para ver com atenção os problemas internos da Comunidade
porque a Comunidade já tinha problemas, a Comunidade tinha problemas nessa altura, continuou a ter
problemas e continuará a ter porque a Comunidade é um organismo vivo, em que diferentes Estados se
associam para procurar resolver melhor em comum os seus problemas. Portanto a este período de Junho de
1980 a Janeiro de 1982, em que há uma clara estagnação do processo negocial, segue-se um novo período,
de Janeiro de 1982 ao Outono de 1982, à volta disso, em que há o primeiro grande surto de resultados.
[Jornalista] Este primeiro surto de resultados concretos seria interrompido em 1983. Agricultura e
Orçamento continuavam a ser os grandes problemas comunitários. A Cimeira de Stuttgart, em Junho de
1983, é considerada um dos momentos decisivos do processo de adesão de Portugal. A Alemanha Federal, o
membro mais rico da Comunidade Europeia, declara-se na disposição de contribuir com mais dinheiro para
o orçamento comunitário, mas só o fará a partir do momento em que Portugal e Espanha entrem na
Comunidade. Esta posição alemã daria um impulso decisivo às negociações.
[Ernâni Lopes] O aspecto de negociação a nível ministerial ganha uma posição óbvia, que eu diria
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automática, e volta a ter reuniões suplentes em termos de carácter intercalar. Ora bem, é neste período – de
inícios de 1984 a Março de 1985 – de finalização que, por um lado, em termos políticos, é assinado em
Dublin o chamado constat d’accord, que teve um papel importante não só no sentido de manter o momento
político das negociações, como de dar uma antevisão da irreversibilidade da negociação que na altura foi um
aspecto particularmente útil, como permitiu – até por força desse impulso político e na sequência das
evoluções internas na Comunidade, designadamente na sequência da Cimeira de Stuttgart –, permitiu
concluir os últimos capítulos, naturalmente os capítulos mais pesados e os capítulos mais difíceis.
[Jornalista] Bruxelas, Março de 1985: Portugal e a CEE estão finalmente à beira de conseguirem um acordo
final. Os últimos cinco dossiers estavam perto da conclusão. Subitamente, há quem ponha a circular a
informação de que Portugal estaria a dificultar o Acordo, apresentando à última hora novas exigências.
[Ernâni Lopes] Jamais nós mudámos de posição face à CEE. Mantivemos a posição desde o início, tal e qual
tinha sido definida e progressivamente elaborada, com certeza, com melhorias de elaboração da posição,
mas não com alteração da posição de base. E nunca no final, nestes últimos…se quiser…durante a
presidência italiana, para simplificar as coisas – estamos agora de facto entre Janeiro e Março, nas últimas
negociações em termos de Conselho de ministros –, nós não apresentámos um único problema novo.
Portanto, aquela referência que fez de que de repente os Portugueses apareceram numa posição duríssima e
numa posição que estava tudo a ver se conseguia perceber, é tão simplesmente esta realidade elementar e
simples: Portugal tinha uma posição, tinha essa posição perfeitamente definida, tinha essa posição
estruturada em termos técnicos – e aqui de novo a temática, que o Dr. António Marta tinha posto, da alta
qualidade e do enorme espírito de serviço e dedicação dos técnicos portugueses em equipa – e essa posição,
que estava estruturada e que estava definida foi mantida até ao fim. É claro que essa posição feria outros
interesses. E são esses interesses que fizeram esse tipo de reacção. Agora, não houve qualquer elemento
novo, houve a continuidade e houve a manutenção com firmeza das posições portuguesas até ao final.
[António Marta] Também há um elemento às vezes, enfim, que é engraçado nestas coisas: é que a máquina
da outra parte que está a negociar, de vez em quando, intoxica a opinião pública que está ali no edifício para
ter determinados efeitos.
[Jornalista] 29 de Março, às três horas da madrugada, em Bruxelas, era finalmente obtido o Acordo,
precisamente oito anos e três horas depois do pedido formal de adesão.
[António Marta] Eu diria que me parece que nós agora não deveríamos ficar todos à volta do Tratado a ver o
que foi bem negociado, o que foi mal negociado, porque negociado já está e foi o melhor possível. Mas nós
agora devíamos era aproveitar tudo o que está negociado para tirar todas as virtualidades.
[José Arantes] Senhor Ministro, ainda há bem pouco tempo, muitas pessoas e alguns responsáveis
comunitários punham sérias dúvidas sobre a possibilidade de Portugal atingir um acordo com êxito para a
adesão. Recordo, por exemplo, a posição do próprio Presidente da Comissão Europeia, Gaston Thorn, que
via com dúvidas muito fortes, muito firmes a possibilidade de Portugal vir a integrar o mercado comum.
Como é que foi possível ultrapassar este cenário de pessimismo?
[Ernâni Lopes] Bem, primeiro que tudo e como disse, eram cenários. Não houve exactamente uma posição
clara, uma posição inequívoca ou, muito menos, uma posição de vontade política de que o alargamento da
Comunidade não se concretizasse, antes pelo contrário. Simplesmente, o que havia, e era evidente que
estava lá esse problema, havia grandes dificuldades sobretudo no quadro interno da Comunidade. E eu aí
gostaria de salientar o papel determinante que tiveram no andamento das negociações as dificuldades
internas da Comunidade. Havia dificuldades internas da Comunidade que levavam a ter alguma dificuldade
em que instâncias comunitárias pudessem acreditar no andamento das negociações.
Também uma vez ou outra – e já vamos a esse ponto se estiverem de acordo –, uma vez ou outra também
havia uma imaginação do lado comunitário de que porventura do lado português haveria dificuldades
técnicas em corresponder. Esses espectros de imaginação nunca se concretizaram porque os técnicos
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portugueses tiveram ao longo de todo este processo uma permanente capacidade de resposta e mais do que
de resposta, frequentemente tomaram iniciativa.
[António Perez de Metelo] Comparando este processo de negociações com o grego, que durou três anos e
meio, chegamos aqui a uma periodicidade quase do dobro, digamos assim. E já vimos pela exposição
sucinta feita pelo Senhor Ministro que houve, digamos assim, duas pausas. Quer dizer, este aumento de
período negocial deve-se basicamente às dificuldades internas da CEE, que os Gregos por exemplo não
encontraram?
[António Marta] Não, acho que, como sabe, na sua génese o processo grego estava ligado ao português e ao
espanhol. Houve uma tentativa, que resultou, de desligar o processo grego do espanhol e do português,
porque senão a Grécia estava agora também a preparar-se para assinar o Tratado no dia 12. É um facto
também que a Grécia pediu a sua adesão dois ou três anos antes de Portugal e da Espanha. Claro que esta
cronologia, em termos da Comunidade, perde significado porque os processos são longos. Os Gregos
tiveram algumas dificuldades. No entanto, talvez as dificuldades da Comunidade fossem menores do que
agora e portanto foi possível superá-las mais rapidamente.
[António Perez de Metelo] Mas agora à distância, e com toda a franqueza, acha que é imputável à
administração portuguesa algum atraso neste processo?
[António Marta] Eu devo dizer-lhe que das coisas mais gratas que recordo durante estes sete anos foi, com
uma falta de condições grande às vezes, com muito menor infra-estrutura, a maneira como os técnicos
portugueses se comportaram porque acho que não deixaram nada a perder relativamente aos técnicos da
Comunidade. E não se pode comparar a preparação e as infra-estruturas de cada uma das partes. Isso foi-nos
revelado por várias vezes, mesmo dentro da Comissão, fazendo um elogio aos técnicos e à maneira como
apanharam os problemas e defenderam as posições portuguesas.
[José Arantes] O papel das pessoas tem sido aliás um tema muito pouco realçado nas negociações. Da sua
experiência pessoal, selecciona alguma personalidade ou algumas personalidades que tiveram influência
directa no êxito do nosso processo, não só da parte nacional, mas também da parte comunitária?
[António Marta] Da parte nacional, eu diria que foi uma equipa e que, felizmente, essa equipa se manteve
coesa. Portanto, acho que um processo desta natureza é impossível ser imputado a uma pessoa. Só uma
equipa é que o conseguia fazer porque são todos os domínios – económicos, sociais, etc., – que estão em
causa, portanto, é impossível uma pessoa ser capaz de fazer isso. A equipa que nós tivemos, é uma equipa
muito jovem em muitos casos, mas altamente empenhada, que não tinha horas para dormir, para jantar, etc.
Isso conseguiu fazer com que Portugal nunca atrasasse as negociações, como o Senhor Ministro disse, e
tomasse a iniciativa muitas vezes quando essa iniciativa era favorável.
Do lado comunitário, nós tivemos da parte da Comissão compreensão dos problemas portugueses, e a
Comissão é importante na medida em que é o órgão técnico que depois apoia ou não os Estados-Membros. E
houve realmente uma presidência que já foi aqui focada também, que foi a presidência belga, que deu o
primeiro impulso de resultados. E é evidente que a presidência italiana mostrou uma eficácia espantosa…
[António Perez de Metelo] Portanto, esta última, a da onda final de negociações?
[António Marta] Esta última. Uma eficácia espantosa e uma habilidade consensual que acho que é de notar.
[Ernâni Lopes] E aí eu gostava, António, acho que vale a pena referir – porque vem muito na linha do que
acaba de ser dito – certamente o papel decisivo que teve a presidência italiana nesta parte final. Mas é justo e
é razoável que, falando da presidência italiana, se ponha em particular relevo a actuação pessoal, directa do
ministro Andreotti e o trabalho absolutamente de primeira classe que foi feito pelo chefe da representação
italiana, o representante permanente italiano nas Comunidades, o Embaixador Calamia, que era o nosso
interlocutor permanente e que teve um trabalho de primeiríssima ordem e de grande influência no acerto das
posições nestes últimos praticamente cinco meses.
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[António Perez de Metelo] Em Bruxelas, era bem visível, bem mais visível o trabalho dos lobbys
económicos espanhóis junto da sua delegação do que em relação à delegação portuguesa. Considera mesmo
assim que houve uma boa articulação com os interesses económicos?
[Ernâni Lopes] Eu considero que porventura os lobbys portugueses trabalham melhor porque trabalham sem
se ver tanto. É a impressão que me dá esse seu comentário, que é um comentário que qualquer pessoa que
passasse por Bruxelas poderia fazer. Eu acrescentava este porque várias vezes, naturalmente nas viagens que
fazíamos e geralmente nós os dois à ida e à volta para Bruxelas – frequentemente vínhamos no avião da
quarta-feira que, por razões de horários da TAP, não vai directo de Bruxelas a Lisboa, passa pelo Porto –, no
avião em que nós voltávamos, voltavam também os representantes das empresas. E jamais se queixaram de
não estar informados. Jamais se queixaram de não saber o que se estava a passar. E mais: ajudaram-nos
muito na negociação.
[António Marta] Este ponto era muito importante.
[Ernâni Lopes] Era isso mesmo. É que nós fomos ajudados discretamente. E é assim que se deve trabalhar.
Discretamente fomos ajudados na negociação pelos sindicatos em matérias de assuntos sociais. E não é
preciso estar a dizê-lo antes, pode-se dizer depois. E foi importante por exemplo para resolver a cláusula, a
celebérrima cláusula do Luxemburgo que Portugal recusou liminarmente quando foi formulada e que eu tive
a oportunidade, como Embaixador, de vinte e quatro horas depois dela ser apresentada – acompanhando o
então secretário de Estado da Integração Europeia, integrado na visita do Primeiro-Ministro da altura ao
Luxemburgo – de ter dito que Portugal não aceita esta cláusula por preço nenhum – passava-se isto em 1982
ou 1983, não lhe posso precisar agora –, vinte e quatro horas depois dela ser apresentada.
E como viu foi dos últimos pontos a ser tratados em matéria de assuntos sociais e aí tivemos um apoio e uma
ajuda efectiva em termos da UGT, que não tinha de ser publicitada, mas que aconteceu e mutatis mutandis
em vários outros capítulos, capítulos de zonas sensíveis. Precisamente a acção dos agentes económicos
interessados nesses capítulos, a acção não só junto da delegação portuguesa e dos respectivos ministérios
antes de chegar ao quadro global da negociação, mas também a acção em instituições comunitárias foram
elementos de primeira importância para os resultados que se obtiveram.
[José Arantes] Senhor Ministro, o processo de integração europeia de Portugal é visto por muitos como
desequilibrado, isto porque dizem que as autoridades portuguesas privilegiaram o ângulo da negociação em
detrimento do ângulo interno, o ângulo da adaptação das estruturas internas à integração. Concorda com esta
visão?
[Ernâni Lopes] Concordo com pôr o problema porque o problema realmente existe, mas não concordo com a
solução que lhe é dada nessa interpretação. Primeiro que tudo e desde logo, em qualquer adesão – e isto é
verdade ou foi verdade mesmo para os seis países do Tratado original –, o problema imediato e dominante é
o problema da negociação da própria constituição da Comunidade na altura ou da negociação da adesão. E é
esse problema que condiciona todo o resto porque sem ele o outro não se poria.
Também é verdade – e daí o parecer-me que se justifica que o problema seja posto –, também é verdade que
é indispensável acompanhar o Acto de negociação da Adesão daquilo que é o essencial que vem a seguir,
que é a integração propriamente dita, o chamado “pós-adesão”. Não creio que algum país tenha feito um
exercício de carácter global de preparação maciça antes de ter a adesão negociada e a adesão prestes a entrar
em vigor. Portugal e a Espanha, nessa matéria, têm uma ligeiríssima desvantagem, que é uma desvantagem
mas que é suprível, que é aquela que resulta do facto do chamado “período intercalar” ser particularmente
curto nos casos português e espanhol.
O período intercalar é o período que medeia entre a assinatura do Acordo e a entrada em vigor do Acordo.
Normalmente, o caso grego foi cerca de dois anos; noutros casos poderia ser normalmente um ano, ano e
meio; nos casos português e espanhol, será de cerca de sete, oito meses. Isso significa que teremos de fazer
um esforço acrescido em termos de ajustamento para o “pós-adesão”.
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[António Perez de Metelo] Qual foi, no vosso entender, o momento mais difícil, mais dramático destas
negociações e, ao mesmo tempo, o contrário? Qual terá sido o momento em que, enfim, tiveram noção de
que se tinha chegado a resultados importantes, a um momento, se quiser, mais exaltante?
[Ernâni Lopes] […] Eu posso dar, da minha experiência pessoal e é isso que nos está a pedir, portanto não
tem nada de técnico, nem de político, nem nada disso, é uma questão de vivência… Primeiro que tudo,
momentos empolgantes e emocionantes, já lá vamos. Mas houve momentos em que as coisas correram
normalmente, enfim, quando se fechou o primeiro pacote, talvez, que eu referi há pouco. Mas dois
momentos que me ficaram particularmente vincados foram a decisão a nível interno português sobre os
têxteis, portanto no segundo pacote, e a discussão sobre os têxteis com a Comunidade e mais claramente a
discussão muito dura, muito difícil sobre pescas, agora nesta fase final, digamos até Março deste ano.
Quando me fala em momentos empolgantes, eu devo dizer-lhe que, pessoalmente, não sou muito dado a esse
tipo de abordagem à vida, tento manter uma certa atitude de equilíbrio e de bom senso, mas para tentar
reconduzir-me aos padrões que suscita e aos padrões que propôs, eu diria que por uma espécie de equilíbrio
e uma espécie de reacção automática, os momentos porventura com algum carácter empolgante são aqueles
em que os problemas mais difíceis ficam resolvidos. E de facto quando nós resolvemos o problema das
pescas, foi um momento porventura empolgante, mas isso é o menos. Foi certamente um momento
fundamental para o futuro próximo da vida dos Portugueses e da presença de Portugal na Comunidade. E
isso tem alguma importância, como pode imaginar.
[António Marta] Eu diria que naquela noite do 29 de Março foi realmente um momento importante.
Simplesmente, eu estava com uma reserva ainda porque sabia que havia ainda muitas outras coisas a fazer
até termos o texto do Tratado. E como sabe, muitas vezes, uma pequena palavra, uma vírgula mal colocada,
etc., pode tirar o significado ao acordo político alcançado. Por outro lado, o acordo político alcançado foi
extremamente importante em termos políticos, portanto era um acordo político, as negociações estavam
terminadas, mas sabia-se que do ponto de vista técnico, havia ainda muitas coisas a acertar que não podiam
ser uma negociação propriamente porque as negociações estavam acabadas.
Aí, mais uma vez, a presidência italiana teve uma sabedoria grande de conduzir as coisas, mas eu devo
dizer-lhe que respirei fundo no passado dia 7, às cinco ou seis da manhã, depois de três noites em que de
parte a parte ninguém se deitou, quando finalmente podemos dar, a Comunidade por um lado, Portugal por
outro e a Espanha por outro, o seu acordo formal a uma redacção que contemplava as posições portuguesas.
[António Perez de Metelo] E que, no fundo, representa a finalização já dos actos que estão a ser…
[António Marta] Exacto. Representa a finalização daquilo que vai ser inscrito no Tratado e nos Actos de
Adesão, mas também lhe devo dizer que houve três ou quatro problemas que foram uma verdadeira
negociação nessas três noites e que Portugal conseguiu, de uma forma muito vincada, traduzir nos interesses
que mantinha sempre ao longo de todo este período.
[António Perez de Metelo] Muito obrigado.
[António Marta] Muito obrigado também.
[Ernâni Lopes] Muito obrigado.
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