Ensino orientado para a aprendizagem baseada na resolução de

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Ensino orientado para a aprendizagem baseada na resolução de
ENSINO ORIENTADO PARA A APRENDIZAGEM BASEADA NA RESOLUÇÃO DE
PROBLEMAS NA LICENCIATURA EM ENSINO DE FÍSICA E QUÍMICA
Laurinda Leite
Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho
[email protected]
Esmeralda Esteves
Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho
[email protected]
A Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas (ABRP) é um modelo de ensino
recente e que, talvez pela sua novidade, não tem concentrado muito a atenção dos educadores.
Permitindo aos alunos partir do conhecido para o desconhecido, com o objectivo de compreenderem
os princípios científicos que se encontram subjacentes ao problema e de resolverem o mesmo,
propicia-lhes uma maior autonomia na aprendizagem. A resolução de problemas é, assim, um meio,
não só para a realização de aprendizagens, mas também para o desenvolvimento de competências
essenciais para o exercício de uma cidadania activa e sustentada.
O objectivo deste estudo é analisar as opiniões dos alunos sujeitos a um ensino orientado
para a Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas na disciplina de Metodologia do Ensino da
Física e Química do quarto ano da Licenciatura em Ensino de Física e Química na Universidade do
Minho, no módulo “Concepções Alternativas e Mudança Conceptual”.
A análise dos dados obtidos mostra que os alunos gostaram da metodologia adoptada bem
como de pesquisar, embora, neste caso, considerassem excessiva a quantidade de bibliografia que
tiveram de analisar. Os alunos consideraram ter realizado aprendizagens a um nível semelhante aos
outros módulos.
1. Introdução
O desenvolvimento das ciências e da tecnologia constitui uma conquista humana
extraordinária que tem consequências, não só ao nível da qualidade de vida, mas também no
modo como as pessoas comunicam e se relacionam entre si (Garcia, 1999) e ainda na formação
que deve ser facultada aos cidadãos.
A preocupação em tornar a educação em ciências acessível a todos os cidadãos, surgida
em meados do século XX, embora positiva, rapidamente se revelou insuficiente, pois não
conduziu a uma população detentora de conhecimento científico suficiente para compreender e
acompanhar, de forma esclarecida, os debates em torno de questões científicas (Millar &
Osborne, 1998), nem capaz de exercer fundamentada e activamente a sua cidadania ou de tirar
partido dos constantes desenvolvimentos científicos e tecnológicos (Hodson, 1998; Wellington,
2000). Assim, os elevados níveis de literacia científica exigido aos cidadãos bem como o ritmo
acelerado a que o conhecimento científico evolui obrigam a que o papel do professor se altere,
distanciando-se profundamente daquilo que até aqui, mais frequentemente, o caracterizou – a
transmissão de conteúdos científicos – e passando a ser o de criador de contextos de
aprendizagem que permitam aos alunos, não só aprender mas, sobretudo, aprender a aprender,
para que possam manter-se actualizados ao longo de toda a vida. Deslocar a ênfase do ensino
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para a aprendizagem significa efectuar uma revolução que só será bem sucedida se devidamente
acompanhada por uma adequada formação de professores.
Existe um grande consenso entre os responsáveis pela formação de professores de
ciências relativamente à necessidade de incluir e potenciar a Resolução de Problemas na
formação de professores, por se considerar que a Resolução de Problemas é uma actividade
fundamental em ciências (Nieto & Aznar, 1997) e se pretender criar condições para que o
professor de ciências, intencionalmente, promova a resolução de problemas no contexto da sala
de aula. Contudo, os argumentos relacionados com a necessidade de educar para a cidadania e
de preparar para a aprendizagem ao longo da vida apontam para a insuficiência de formar
professores para a Resolução de Problemas e realçam a necessidade de formar os professores
para organizarem Ensino Orientado para a Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas
(González et al., 2003). Por permitir ao aluno, não só aprender a resolver problemas, mas,
sobretudo, aprender ciências resolvendo problemas, este tipo de ensino é considerado adequado
para o desenvolvimento de competências, de diversa natureza, que os alunos, nas suas vidas
pessoais e sociais futuras, necessitam possuir (Hmelo, 2004; Lambros, 2002; Lambros, 2004;
Leite & Afonso, 2001). Esta ideia foi adoptada, quer pelas Orientações Curriculares do 3º ciclo
do Ensino Básico (DEB, 2001) quer pelos Programas do Ensino Secundário (DES, 2001), os
quais consideram que a resolução de problemas deve ser encarada como ponto de partida para a
aprendizagem das ciências por parte dos alunos.
No entanto, embora o conhecimento no campo da Didáctica das Ciências tenha
aumentado consideravelmente nos últimos cinquenta anos, as práticas dos professores
alteraram-se muito pouco (Levy & Puig, 2001; González et al., 2003; Martínez et al., 2001).
Segundo Levy e Puig (2001), a forma como se ensina nas escolas está profundamente
distanciada das propostas curriculares e da investigação em educação. Para alguns autores
(González et al., 2003), esse distanciamento deve-se, pelo menos em parte, ao facto de, nas
disciplinas de Didáctica das Ciências, se defender uma determinada maneira de ensinar, mas se
ensinar de outra forma. Dado que os professores tendem a ensinar do mesmo modo como foram
ensinados na escola e na universidade (Gil & Pessoa, 1994; Pérez, 1992; Martínez et al., 2001),
torna-se urgente a adopção de metodologias de ensino no âmbito das disciplinas de Didáctica
das Ciências coerentes com a forma de ensinar ciências que se deseja fomentar nos futuros
professores. Se se pretende que eles venham a adoptar um ensino orientado para a
Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas, então eles deveriam ser submetidos a
experiências de aprendizagem desse tipo de ensino.
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2. Objectivos do estudo
Assumindo que uma dada metodologia de ensino só produzirá bons resultados de
aprendizagem se os alunos a aceitarem bem e tendo em conta, por um lado, que os alunos da
Licenciatura em Ensino de Física e Química da Universidade do Minho estão habituados a um
ensino centrado no professor e, por outro lado, que o ensino orientado para a Aprendizagem
Baseada na Resolução de Problemas exige uma mudança radical, não só no papel do professor
mas também no do aluno, nesta investigação procurou-se identificar e analisar as opiniões dos
alunos sujeitos a um ensino orientado para a Aprendizagem Baseada na Resolução de
Problemas num dos módulos programáticos de Metodologia do Ensino da Física e Química,
disciplina do quarto ano da referida Licenciatura.
3. Fundamentação teórica
3.1. Da Resolução de Problemas à Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas
À palavra problema são frequentemente associados significados diversos, não se
fazendo, por vezes, a distinção entre exercício e problema. No entanto, no contexto da Didáctica
das Ciências, a palavra problema tem um significado preciso e claramente distinguível do
significado da palavra exercício. Por problema entende-se um enunciado que apresenta um
obstáculo aos sujeitos resolvedores, os quais desconhecem a forma de o ultrapassar, e que pode
ter mais do que uma solução possível ou não ter solução (Dumas-Carré & Goffard, 1997; Lopes,
1994; Neto, 1998; Watts, 1991). Os problemas podem ser resolúveis com base em papel e lápis,
podem requerer a utilização de actividades laboratoriais, de meios informáticos, de trabalhos de
campo, de entrevistas, etc (Leite, 2001). Contrariamente ao que acontece com os problemas, e
embora não exista fronteira bem definida entre problema e exercício, os exercícios não
apresentam um obstáculo ao resolvedor, na medida em que ele sabe, à partida, o que tem a fazer
para encontrar a solução que, por sua vez, é única (Dumas-Carré & Goffard, 1997; Gouveia,
Costa & Lopes, 1994). Os exercícios baseiam-se na repetição e servem para treinar
competências de baixo nível cognitivo (Ramirez et al., 1994; Martínez et al., 1999), enquanto
que os problemas exigem diversificação e servem para desenvolver competências de elevado
nível cognitivo (Watts, 1991; Neto, 1998; Martínez et al., 1999; Lambros, 2004).
Resolver problemas é um processo imprescindível no currículo escolar, pois envolve
activamente os alunos no processo de aprendizagem (Watts, 1991; Duch, 1996; Chang &
Barufaldi, 1999; Gandra, 2001; Leite, 2001; Lopes, 2004; Vasconcelos et al., 2004) e está
intrinsecamente relacionado com o desenvolvimento de competências e experiências cognitivas
e metacognitivas relevantes para a vida quotidiana (Watts, 1991; Nagel, 1996; Vasconcelos et
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al., 2004) e encoraja-os a tomar decisões e a argumentar (Watts, 1991; Lambros, 2002;
Lambros, 2004).
Os problemas podem desempenhar três tipos de funções no contexto dos processos de
ensino e aprendizagem:
ƒ avaliação das aprendizagens dos alunos, sendo para tal utilizados após os processos
de ensino e aprendizagem (Dumas-Carré & Goffard, 1997; Lopes, 1994);
ƒ aprofundamento das aprendizagens dos alunos, sendo neste caso usados durante os
processos de ensino e aprendizagem (Dumas-Carré & Goffard, 1997; Ramirez, J. et
al., 1994; Lopes, 1994);
ƒ ponto de partida para a aprendizagem dos alunos, constituindo o início dos processos
de ensino e aprendizagem (Watts, 1991; Boud & Feletti, 1997; Lambros, 2002;
Lambros, 2004).
Esta última função tem sido associada a contextos que, em língua inglesa, têm sido
designados por Problem-Based Learning (PBL) e consiste na aprendizagem de novos
conhecimentos através da resolução de problemas (Duch, 1996; Boud & Feletti, 1997; Lambros,
2002; Lambros, 2004). No entanto, esta função, mais recente, dos problemas tem originado
alguma ambiguidade conceptual que conduz a diferentes formas de utilização dos problemas e
ao desempenho de diferentes papéis, quer por parte dos professores quer por parte dos alunos.
De facto, como resultado das diversas tentativas de implementar PBL emergiram uma larga
variedade de modelos de ensino baseados em problemas (Savin-Baden & Major, 2004), que vão
desde os centrados no professor (ou seja, desde casos em que o professor resolve problemas
para ensinar) até aos centrados no aluno (ou seja desde casos em que o aluno resolve problemas
para aprender). Um exemplo desses modelos centrados no professor designa-se em inglês por
lecture-based cases (casos baseados em exposições) e consiste na introdução de informação
pelo professor e no posterior recurso a casos problemáticos para demonstrar o conhecimento
previamente apresentado aos alunos. Outro exemplo algo semelhante, em inglês designado por
case-based lecture (exposições baseadas em casos), surge quando os alunos são confrontados
com descrições de casos antes da leccionação pelo professor da informação relevante à luz
desses casos. Um pouco menos centradas no professor do que as anteriores são as situações
modified-case-based (baseadas em casos modificados) em que os alunos são confrontados com
alguma informação sobre um caso e são questionados sobre como querem agir ou proceder,
sendo que, após as suas conclusões, são-lhes fornecidas mais informações sobre o caso.
Finalmente, refira-se que, quando surgem problemas, através de uma entrevista, de uma
simulação, de um extracto de um jornal, de uma revista, etc., e os alunos realizam investigação
para resolver esses problemas, a ênfase passa a estar na aprendizagem, o aluno tem um papel
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activo e o professor “limita-se” a criar contextos problemáticos e a orientar os alunos nas suas
tarefas de pesquisa, análise e síntese de informação. Este último modelo de ensino, designado
por Savin-Baden & Major (2004) por problem-based, tem sido identificado em língua inglesa
por Problem-Based Learning (Chin & Chia, 2004; Evensen & Hmelo, 2000; Hmelo-Silver,
2004; Lambros, 2002; Savin-Baden & Major, 2004; Woods, 1996) e recebeu, em Portugal, a
designação de Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas (Gandra, 2001; Leite &
Afonso, 2001) e o acrónimo ABRP.
Convém também referir que a ABRP apresenta semelhanças mas também diferenças
quando comparada com a Aprendizagem Baseada em Projectos (do inglês Project-Based
Learning). As duas assentam, por um lado, na ideia de participação activa dos alunos no
processo de aprendizagem e, mais concretamente, no pressuposto que os “alunos aprendem
fazendo”, e, por outro lado, no desenvolvimento de competências metacognitivas, relacionadas
com a tomada de consciência pelos alunos das actividades que realizam e das responsabilidades
que devem assumir no processo de aprendizagem (Barron et al., 1998). Em ambos os casos, os
problemas funcionam como estímulo, motivação e ponto de partida para a aprendizagem. No
entanto, a Aprendizagem Baseada em Projectos tem a ver com questões abrangentes e, por
vezes, pouco definidas, ligadas ao dia a dia, que, frequentemente, não garantem uma conexão
entre as actividades realizadas e os conteúdos conceptuais que lhes podem estar subjacentes. Por
seu lado, a ABRP pode envolver o recurso a problemas reais, eventualmente simulados, de
âmbito relativamente restrito, em que as actividades realizadas estão fortemente associadas com
conteúdos, não só conceptuais mas também procedimentais e epistemológicos a adquirir pelos
alunos e que, portanto, permitem preparar os alunos para a Aprendizagem Baseada em Projectos
(Barron et al., 1998) e educar para a cidadania (Lambros, 2002; 2004).
3.2. Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas: Da filosofia às aplicações
didácticas
Centrada no estudante e capaz de fomentar a aprendizagem ao longo da vida (Neufeld
& Barrows, 1974; Hmelo-Silver, 2004), a Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas é
uma das opções educacionais com maiores potencialidades surgida nos últimos trinta anos
(Woods, 1996). Tendo começado por ser introduzida nos currículos das Ciências da Saúde
numa Faculdade de Medicina no Canadá, em 1968, não só como modelo específico de ensino
(Barrows & Tamblyn, 1980; Chin & Chia, 2004) mas também como uma filosofia de ensino,
que requer a reestruturação do currículo tradicional e que pressupõe uma educação
multidisciplinar (Savin-Baden & Major, 2004), a ABRP alargou-se nos últimos dez anos a
vários países e a outros contextos educativos, tendo sido introduzida, não só em disciplinas de
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carácter científico, mas também na formação de diversos profissionais (Chin & Chia, 2004;
Zweekhorst et al., 2000), e em diversos graus de ensino (Lambros, 2002; 2004), nomeadamente
em Portugal (Gandra, 2001).
Tradicionalmente, em contexto de sala de aula, a aprendizagem tende a ocorrer do
abstracto para o concreto, onde em primeiro lugar são introduzidos os conceitos e seguidamente
resolvidos problemas de aplicação. Com o aparecimento da ABRP, o ensino modificou-se e a
posição do professor na sala de aula teve também de sofrer alterações no sentido de propiciar
aos estudantes uma maior autonomia na condução da aprendizagem. Tal como na vida real, no
ensino das ciências orientado para a ABRP, o problema surge em primeiro lugar, ou seja, no
início do processo de aprendizagem (West, 1992; Duch, 1996), conduzindo os alunos do
conhecido para o desconhecido, pois, à medida que resolvem o problema, os alunos vão adquirir
uma compreensão dos princípios científicos que se encontram subjacentes a ele (Barrows &
Tamblyn, 1980; Albanese & Mitchell, 1993; Duch, 1996; Ross, 1997; Butler, 1999; Chang &
Barufaldi, 1999). A resolução dos problemas é, assim, um meio não só para a realização de
aprendizagens conceptuais, mas também para o desenvolvimento integrado de competências
específicas de uma dada área de saber (dos domínios do conhecimento substantivo e processual,
do raciocínio e da comunicação) e de competências gerais (relacionadas com resolução de
problemas, tomada de decisões, aprender a aprender, pesquisa e utilização de informação,
autonomia e criatividade) e, se o processo se realizar em grupo, de competências de
relacionamento interpessoal, nomeadamente, cooperação e tolerância (Leite, 2001; Lambros,
2002; Lambros, 2004). Estas últimas têm um papel decisivo na formação dos alunos para a
cidadania (Savin-Baden, 2000; Barron et al., 1998).
Com base na literatura então disponível, Leite & Afonso (2001) propuseram um modelo
de ensino orientado para a ABRP e que se estrutura numa sequência tetrafásica, que tem início
na selecção do(s) contexto(s) problemático(s), ou seja, o professor começa por identificar um
contexto problemático que seja virtualmente capaz de gerar múltiplos problemas e questões que
motivem e interessem os alunos e organiza um conjunto de materiais de consulta necessários e
adequados ao tipo de problemas que prevê serem colocados pelos alunos (embora os alunos
sejam incentivados a procurar material). O contexto pode basear-se numa situação real,
videogravada ou encenada (Barron et al., 1998) que os alunos observam, não deve incluir
conclusões, mas antes deve apresentar desafios aos alunos. Numa segunda fase, os alunos são
confrontados com o contexto problemático e formulam questões sobre os três aspectos
seguintes: “O que já sei/já me é familiar?”, “O que não sei/não compreendo/nunca ouvi falar?”,
“O que gostaria de saber/aprofundar sobre este assunto?”.
De seguida, os alunos discutem com o professor as questões formuladas, de modo a
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analisarem a sua relevância e interdependência, bem como a cronologia de resolução a adoptar.
Numa fase seguinte (terceira fase), os alunos, em grupo, planificam estratégias de resolução e
identificam tarefas a realizar com vista a solucionar os problemas com os quais se confrontam.
Tentam responder a questões como: “O que é que eu já sei sobre este problema ou sobre esta
questão?”, “O que é que eu necessito saber para resolver eficazmente este problema ou
questão?”, “A que fontes de informação devo recorrer para encontrar soluções?”.
Depois, implementam as estratégias de resolução, de modo a obterem a solução, caso
ela exista. Durante este processo, os alunos acedem a diversos tipos de fontes de informação
(ex: livros, revistas, jornais, Internet, relatórios), recolhem informação junto de pessoas e
entidades diversas (ex: entrevistam entidades públicas, membros da comunidade, etc), efectuam
actividades laboratoriais e saídas de campo, etc. e analisam as informações obtidas. A
implementação de estratégias de resolução é repetida, até que se esgotem todos os problemas
formulados e considerados relevantes para serem tratados. Depois disso, na última fase,
procede-se à síntese e avaliação do processo. Professor e alunos reflectem sobre a validade (ou
não) das soluções encontradas para os problemas, efectuam uma síntese final dos
conhecimentos (conceptuais, procedimentais, atitudinais) obtidos e/ou desenvolvidos e avaliam
todo o processo de resolução, quer em termos de eficácia da aprendizagem, quer em termos de
contributo para o desenvolvimento dos alunos enquanto cidadãos e membros de uma sociedade
em permanente transformação. Procuram, portanto, responder a questões, tais como: “O que é
que eu aprendi de novo?” e “O que ficou por esclarecer?”.
3.3. Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas: Avaliação de algumas
experiências
No que diz respeito a tentativas de avaliação das eventuais vantagens educativas do
ensino orientado para a ABRP, é possível encontrar alguns estudos centrados, quer na
aprendizagem de conhecimentos conceptuais, quer no desenvolvimento de competências de
resolução de problemas, quer em aspectos afectivos, ou seja, em reacções dos alunos ao ensino
orientado para a ABRP. Esses estudos, realizados no Ensino Básico (ex.: Gandra, 2001), no
Ensino Secundário (ex.: West, 1992) e no Ensino Superior (ex.: Savin-Baden, 2000) de um
modo geral, indicam que o ensino orientado para a ABRP produz um efeito positivo nos alunos,
quer em termos da aprendizagem de conceitos, quer em termos de desenvolvimento de
competências de resolução de problemas. Acresce, ainda, que os alunos, pesem embora algumas
dificuldades de adaptação inicial, reagem positivamente ao ensino orientado para a ABRP e
consideram que aprendem mais e melhor através desta metodologia.
No entanto, são mencionadas na literatura algumas dificuldades associadas ao
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desempenho do professor quando tenta implementar este tipo de metodologia de ensino. Essas
dificuldades têm a ver com a monitorização do processo de investigação desenvolvido pelos
alunos, nomeadamente no que respeita à não interferência em demasia na definição e ordenação
das questões /problemas a abordar, no fornecimento adequado de fontes de informação e dados
a utilizar (West, 1992, Lambros, 2004) e no controlo do tempo despendido pelos alunos nas
várias fases do processo (Lambros, 2002; 2004).
Segundo Lambros (2004), os professores apresentam, também, dificuldades
relacionadas com a integração de recursos tradicionalmente valorizados no ensino das ciências
(ex.: actividades laboratoriais) num contexto de ensino orientado para a ABRP, uma vez que,
contrariamente ao modo como geralmente são usados, eles devem agora ser entendidos como
instrumentos de apoio à resolução de problemas e usados à medida que são sentidos como úteis
e necessários pelos alunos. No entanto, de acordo com Lambros (2002; 2004), os professores
que aplicam um ensino orientado para ABRP vêem vantagens nisso. Entre elas destaca-se o
facto de considerarem que a utilização daqueles recursos nesta perspectiva fomenta uma maior
aproximação e interacção entre professor e alunos, permite ao professor partilhar o entusiasmo
dos alunos resultante da descoberta e da consecução das tarefas e consegue influenciar, de
maneira mais significativa, o desenvolvimento pessoal do aluno. Assim, as dificuldades acima
referidas, associadas ao ensino orientado para a ABRP, podem não ser relevantes para
professores que já se tenham iniciado nessa metodologia, mas complicar a iniciação bem
sucedida por parte dos que a tentam pela primeira vez.
4. Metodologia usada na investigação
Neste estudo, um grupo de alunos universitários, futuros professores de Física e
Química, foi submetido a formação, organizada segundo a perspectiva de ensino orientado para
a ABRP, e questionado sobre esse mesmo ensino.
4.1 Amostra
Participaram no estudo 33 estudantes universitários que frequentavam o quarto ano
lectivo da Licenciatura em ensino de Física e Química da Universidade do Minho. Estes alunos
representavam 86% dos estudantes desse ano do curso e encontravam-se acessíveis às autoras,
pois frequentavam a disciplina por elas leccionada e na qual se centrou a investigação. Dado
tratar-se de uma amostra disponível (McMillan & Schumacher, 2001), os resultados obtidos
terão de ser interpretados sem pretensão de generalização.
1758
4.2 Breve caracterização da metodologia de formação
Na disciplina de Metodologia do Ensino da Física e Química, os alunos foram sujeitos a
um ensino orientado para a Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas no módulo
“Concepções Alternativas e Mudança Conceptual”. No ensino e aprendizagem deste módulo
tomou-se como referência o modelo de organização do ensino orientado para a ABRP sugerido
por Leite e Afonso (2001), anteriormente referido. Numa primeira fase, para criar um contexto
problemático, foi construído um texto intitulado Dilemas de professores, que continha um
diálogo entre professores sobre os conhecimentos prévios dos alunos e eventuais interferências e
implicações para os processos de ensino e aprendizagem. Para tornar o diálogo o mais credível
possível, pediu-se, no início da primeira aula desse módulo, a três alunos que encenassem o
texto. Posteriormente, os alunos da turma, em grupos de quatro elementos, formularam as
questões ou problemas que o texto lhes suscitou. Cada grupo apresentou, oralmente, à turma e à
professora, as suas questões. Como era de esperar, algumas questões formuladas por um grupo
foram repetidas por outro(s), pelo que, após análise de todas as questões, por consenso, foram
seleccionadas as questões consideradas pertinentes e não repetidas (ex: O que são concepções
alternativas?, Que concepções alternativas existem e como se detectam?, Como se formam as
concepções alternativas?, Por que são resistentes ao ensino formal das ciências?, Como se pode
mudar as concepções alternativas?). Com a ajuda da professora, este conjunto de questões foi
ordenado, tendo em conta, sempre que necessário, as suas interdependências, e identificando-se,
assim, a sequência de resolução dessas mesmas questões. Na fase seguinte, os grupos
começaram por dividir tarefas entre os seus elementos e iniciaram a pesquisa na bibliografia
(livros, artigos, vídeos e questões sobre assuntos relacionados com a Física e a Química e
respostas dos alunos do ensino básico, secundário e superior a essas mesmas questões)
disponibilizada pelas docentes, embora fossem aconselhados a pesquisar em outras fontes, a fim
de encontrarem respostas para as questões que previamente formularam. Dado que na disciplina
há aulas teóricas, de assistência facultativa, e aulas práticas de assistência obrigatória, a pesquisa
foi, em grande parte, realizada nas aulas teóricas ou em outro horário em que os alunos, que não
podiam participar nas aulas formalmente consideradas teóricas, estivessem disponíveis.
Procurou-se que a apresentação das eventuais soluções para os problemas ocorresse nas aulas
consideradas práticas, uma vez que nestas aulas participavam todos os alunos. No final do
processo de resolução das questões, todos os alunos fizeram uma análise global quer das
actividades realizadas, discutindo as aprendizagens realizadas durante este módulo, quer da
estratégia utilizada no mesmo.
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4.3 Técnica e instrumento de recolha de dados
Tendo em conta os objectivos deste estudo bem como as vantagens e limitações
relativas das diferentes técnicas de recolha de dados (Ghiglione & Matalon, 1997), optou-se
pela técnica de inquérito por questionário, por se considerar que ela permitia aos alunos
expressar as suas ideias mas manter o anonimato e, assim, evitar que eles sentissem essa
expressão como uma ameaça, por pensarem que poderia ter eventuais efeitos na avaliação final
da disciplina. Optou-se por um questionário – Ficha de Análise e Reflexão - composto por
perguntas de escolha múltipla, seguidas de pedido de justificação, e por perguntas de resposta
aberta, de modo a permitir aos respondentes apresentar as suas razões e expressar as suas
opiniões. O questionário foi elaborado pelas autoras e incidia em aspectos relacionados com
pontos fortes e fracos da estratégia, dificuldades sentidas pelos alunos, profundidade de
abordagem dos assuntos e satisfação dos alunos.
A recolha de dados teve lugar no primeiro semestre de 2004/05, quinze dias após a
conclusão da abordagem do módulo em causa, tendo os alunos respondido em situação de
exame ao questionário que foi aplicado por uma das autoras.
4.4. Técnica de análise dos dados
As diferentes opções de resposta incluídas nas questões de escolha múltipla
constituíram as diferentes categorias de resposta. No caso das respostas às questões abertas e
das razões, justificações e sugestões foi necessário elaborar categorias a posteriori, de modo a
reduzir os dados, maximizando a adequação das categorias aos dados obtidos.
Na próxima secção apresentar-se-á o tratamento quantitativo dos dados, baseado no
cálculo de frequências por categoria de resposta, e, sempre que se considerar necessário,
ilustrar-se-á a categorização efectuada com exemplos de respostas apresentadas pelos alunos
envolvidos no estudo. A origem das respostas é identificada pelo número de ordem atribuído a
cada aluno, precedido da letra – A (Aluno).
5. Apresentação dos resultados
Através da Ficha de Análise e Reflexão, foi pedido aos participantes no estudo que
indicassem o aspecto de que mais gostaram bem como o aspecto de que menos gostaram no
conjunto de aulas referentes ao módulo “Concepções Alternativas e Mudança Conceptual”. A
análise dos aspectos de que os alunos gostaram mais (tabela 1), no conjunto de aulas em causa,
revela que estes gostaram do carácter motivador da estratégia e dos recursos utilizados (28
1760
alunos), da maior participação dos alunos nestas aulas (13 alunos), por comparação com as que
tinham decorrido até ao início deste módulo, e de ter trabalhado em grupo (seis alunos).
Tabela 1: Aspectos de que os alunos mais gostaram (f)
(N =33)
Aspecto
Maior participação dos alunos
Estratégia/recursos motivadores
Trabalho de grupo
f
13
28
6
No que diz respeito aos aspectos de que menos gostaram no conjunto de aulas em
questão, verifica-se que sete alunos não mencionaram qualquer aspecto (tabela 2). Dezasseis
alunos indicaram que não gostaram de ter que analisar muitos textos (tabela 2), seis alunos
referenciaram que não gostaram de analisar os textos, porque consideravam os textos maçudos
(dois alunos) ou porque havia alguns textos escritos em língua estrangeira (quatro alunos),
nomeadamente em espanhol, inglês e francês.
Tabela 2: Aspectos de que os alunos menos gostaram (f)
(N =33)
Aspecto
Análise excessiva de textos
Análise de textos em língua estrangeira
Trabalho de grupo
Análise de textos maçudos
Menor abordagem de um tema
Nenhum aspecto
f
16
4
3
2
1
7
Quando questionados sobre se durante a abordagem do módulo em causa aprenderam
algo acerca de comportamentos a adoptar quando forem professores, todos responderam que
sim. De facto, todos referenciaram ter aprendido que será importante, quando forem professores,
detectar e alterar concepções alternativas nos alunos. Apresentam-se, de seguida, alguns
exemplos de respostas que ilustram esta ideia:
“Vou tentar compreender o ponto de vista dos alunos e ter cuidado com aquilo que digo” (A3)
“Só tendo em conta as concepções alternativas dos alunos é que podemos fazer com que elas desapareçam”
(A5)
“O professor deve estar muito atento de modo a verificar as concepções alternativas dos alunos” (A27)
Note-se que as respostas a esta questão centram-se nas aprendizagens realizadas no
âmbito do módulo em causa, não havendo referência à metodologia adoptada para a abordagem
desse módulo.
A tabela 3 apresenta uma análise das aprendizagens que, segundo os alunos, foram
realizadas durante o módulo em causa, relacionadas com comportamentos a adoptar enquanto
alunos.
1761
Tabela 3: Aprendizagens sobre o comportamento como alunos realizadas neste módulo
(N =33)
Tipo de aprendizagem
Consciencialização da existência de CAs
Conhecimento dos factores de persistência das CAs
Aumento da autonomia na aprendizagem
Não responde
f
24
4
4
4
Quatro alunos não responderam a esta questão. Os restantes participantes no estudo
afirmaram ter realizado aprendizagens, sendo que 24 (72,7%) mencionam que apenas durante
esse módulo se consciencializaram da existência de concepções alternativas sobre conceitos do
domínio da Física e da Química, nomeadamente entre alunos do ensino superior. De salientar
que quatro alunos afirmaram ter-se tornado mais autónomos na aprendizagem durante a
abordagem do módulo em análise.
No que respeita à identificação de dificuldades/lacunas na sua formação, constata-se
que 21 alunos reconheceram, durante este módulo, que possuíram lacunas embora apenas 18
tenham explicitado essas lacunas/dificuldades (tabela 4). A maior parte deles (10 alunos)
apercebeu-se que possuía CAs sobre temas de Física e Química e três de que tinham pouca
preparação científica. Três alunos referiram não estarem habituados a ser autónomos e quatro
alunos reconheceram não ter capacidade para inovar.
Tabela 4: Dificuldades/lacunas identificadas pelos alunos na sua formação
(N =21)
Dificuldades/lacunas
Possuir CAs
Possuir pouca preparação científica
Não ser suficientemente autónomo
Não ter capacidade para inovar
não responde
f
10
3
3
4
3
Quando questionados sobre o nível a que consideram que os assuntos foram abordados,
constata-se que a maioria dos participantes neste estudo (24 alunos) considerou ter efectuado
uma abordagem dos conhecimentos do domínio do módulo em causa a um nível normal, ou
seja, semelhante ao dos módulos anteriores (tabela 5).
1762
Tabela 5: Nível de abordagem dos conhecimentos no módulo
(N =33)
Nível
Muito superficial
Superficial
f
Razões
2
Normal
24
Profundo
6
Muito profundo
1
Não assistiram a todas as aulas
Assuntos ficaram percebidos
Gostariam de ter tido tempo para abordar mais assuntos
Não responde
Aprendizagens são importantes para o futuro como docente
Investigação efectuada em várias fontes
Bom funcionamento do grupo de trabalho
Muito bom funcionamento do grupo de trabalho
f
0
2
14
7
5
3
2
1
1
No entanto, a maior parte deles limita-se a justificar com base na ideia de que os
assuntos tratados ficaram percebidos e cinco não justificam o nível de abordagem seleccionado.
De notar, ainda, que sete daqueles alunos mencionaram que “gostariam de ter tido tempo para
abordar mais assuntos”, não por falta de tempo para responder aos problemas formulados no
início do módulo, mas porque gostariam de analisar mais perguntas e respostas de alunos sobre
temas de Física e Química.
Cerca de um quinto dos sujeitos (seis alunos) afirmaram ter aprendido os assuntos a um
nível profundo ou muito profundo (tabela 5). As razões avançadas para justificar tal opinião são
diversas e vão desde considerarem que realizaram aprendizagens importantes para o exercício
das funções docentes até afirmarem que efectuaram pesquisa em várias fontes e a considerarem
que o funcionamento do grupo de trabalho foi bom ou muito bom. Apenas dois alunos
consideraram ter realizado uma abordagem superficial dos assuntos, mas reconheceram que isso
se deveu ao facto de não terem participado em todas as aulas. Devido ao carácter anónimo da
ficha apenas poderemos avançar a hipótese de se tratar de trabalhadores estudantes, que não
frequentam as aulas teóricas (não obrigatórias) da disciplina e que não usaram um horário
alternativo. Nenhum aluno considerou ter realizado aprendizagens a nível muito superficial.
Quando questionados acerca das condições criadas pelas docentes para que os alunos
realizassem as aprendizagens no âmbito deste módulo, verifica-se que a maioria dos
respondentes ficou razoavelmente ou bastante satisfeito com essas condições (tabela 6).
1763
Tabela 6: Satisfação dos alunos relativamente às condições criadas pelas docentes (f)
(N =33)
Nível
Aspecto
Nada
Pouco
Razoável
Bastante
Muito
Motivação dos alunos pelas docentes
0
3
9
19
2
Quantidade de fontes disponibilizadas
0
0
9
19
5
Qualidade das fontes disponibilizadas
0
1
10
20
2
Aulas dedicadas ao assunto
0
3
13
16
1
Relativamente à motivação dos alunos pelas docentes, mais de metade dos alunos (19
alunos) considerou que as docentes motivaram bastante os alunos. A maioria destes alunos
justificou a sua resposta com base no facto de as docentes estabelecerem uma boa relação com
os alunos e estarem sempre dispostas a ajudar.
“As docentes criaram uma boa relação com os alunos incentivando-os a “estudar” a matéria”(A4)
“Sempre tentaram estabelecer uma boa relação com todos os alunos e estavam sempre dispostas a ajudar” (A3)
“As professoras cativam bastante os alunos, porque nos colocam a trabalhar,… de facto o teatro foi motivador”
(A12)
Nove alunos afirmaram ter sido, apenas, razoavelmente motivados, mas consideram que
isso se devia ao facto de não terem estado presentes em todas as aulas (tabela 6):
“por vezes sentia-me fora do contexto, isto porque não podia assistir às aulas teóricas” (A32)
É de realçar que um dos alunos participantes no estudo mencionou que os alunos estão
pouco receptivos ao recurso a estratégias diferentes daquelas a que estão habituados (ensino
tradicional - centrado no professor) na sala de aula:
“Nem todos os alunos estão abertos a este tipo de aulas, a maior parte dos alunos gosta de trabalho fácil, …que o
professor lhes faculte a informação e que não sejam eles a procurá-la…” (A28)
Relativamente à quantidade de fontes de informação disponibilizadas pelas docentes,
nota-se que a grande maioria dos participantes no estudo, a classificaram de razoavelmente ou
bastante adequada, havendo cinco alunos que a consideraram mesmo muito adequada (tabela 6).
A razão apontada por mais alunos para justificar estas respostas foi que os materiais
disponibilizados eram diversificados e continham informação clara e relevante. Apresentam-se
abaixo alguns extractos de respostas que evidenciam estas opiniões:
“Foram fornecido bastantes elementos de leitura” (A6)
“As professoras disponibilizaram bibliografia diversa, de diversos autores, a partir da qual os alunos podiam
iniciar a sua pesquisa” (A23)
“O material fornecido era esclarecedor”(A29)
1764
A tabela 6 mostra, ainda, que dois terços dos alunos afirmaram que a qualidade das
fontes disponibilizadas pelas docentes era bastante adequada, tendo os restantes mencionado
que era razoavelmente adequada. A maior parte dos alunos justificou esta classificação,
argumentando, novamente, que as fontes de informação eram bastante claras:
“os textos explicavam bastante bem…” (A4)
“as fontes eram bastante ricas e dava para perceber bem” (A6)
No entanto, alguns (seis) alunos explicitaram que o recurso a textos em língua
estrangeira não foi muito adequado, pois eles admitem ter imensas dificuldades em ler e
interpretar textos em espanhol ou em inglês.
“…o que era pior era haver textos em espanhol” (A15)
“Algumas das fontes eram em espanhol, embora se percebesse minimamente, havia partes que não percebia”
(A17)
“O facto de alguns textos serem em espanhol e em inglês dificultou a nossa tarefa, … requereu mais tempo” (A23)
Relativamente às aulas dedicadas ao módulo, verifica-se que dezasseis alunos (cerca de
50% dos participantes no estudo) consideraram bastante adequado e cerca de um terço
consideraram razoavelmente adequado o número de aulas dedicadas ao módulo em causa. O
facto de terem conseguido nessas aulas entender os assuntos e esclarecer dúvidas/problemas
foram as razões principais apontadas por estes alunos:
“as aulas dedicadas foram bastantes porque entendemos a ideia principal” (A1)
“penso que adquirimos os conhecimentos necessários à resolução das questões” (A5)
“debatemos os assuntos abordados,.. e melhoramos todos…“ (A13)
Alguns (oito) alunos argumentaram que gostariam de ter tido mais aulas sobre este
assunto:
“Deveria ter sido dadas mais aulas para analisar mais CA´s…” (A24)
“Podia haver mais aulas, pois não pude assistir a todas” (A32)
Note-se, contudo, que estas razões não têm a ver com a resolução dos problemas
inicialmente formulados, mas antes estão relacionadas com a não participação de alguns alunos
em algumas aulas e poderão também estar associadas ao facto de os alunos sentirem que
possuem lacunas científicas.
6. Conclusões e implicações
Pese embora o facto de alguns participantes no estudo terem explicitado alguns aspectos
relativamente aos quais a abordagem adoptada no módulo “Concepções alternativas e mudança
conceptual” não os satisfez (ex.: existência de textos em língua estrangeira), os resultados do
estudo, tal como seria de esperar com base em investigações previamente realizadas (Chang &
1765
Barufaldi, 1999; Gandra, 2001), indicam que a grande maioria dos participantes se sentiram
mais motivados com esta estratégia de ensino e mais envolvidos no processo de aprendizagem.
O contexto problemático utilizado, aspecto crucial nesta metodologia de ensino (Lambros,
2002; Tan, 2004), parece ter desempenhado bem a sua função suscitadora de problemas e
motivadora para a resolução dos mesmos. Interessante também é o facto de alguns alunos terem
sentido que desenvolveram a sua autonomia como estudantes enquanto outros reconheceram
que a falta dessa autonomia lhes causou dificuldades. Isto pode significar que os participantes
neste estudo, tal como os alunos do ensino básico (Butler, 1999; Gandra, 2001), quando são
envolvidos em contextos de ensino que rompe com os seus hábitos de aprendizagem,
necessitam tempo para se habituarem a “aprender a aprender”, mas que a ABRP pode contribuir
para que desenvolvam competências nesse âmbito. Acresce ainda que um número considerável
de aluno tomou consciência das suas dificuldades e lacunas científicas, o que significa que a
estratégia, como seria de esperar (Barron et al., 1998; Vasconcelos et al., 2004 ), teve efeitos
metacognitivos, e que os alunos consideraram que aprenderam os assuntos a um nível pelo
menos tão profundo como em outros módulos. Não estando em causa neste trabalho a análise
dos resultados de aprendizagem, o facto de terem tido esta sensação poderá predispô-los para
utilizações futuras desta metodologia, que a literatura (Chang & Barufaldi, 1999; Gandra, 2001;
Lambros, 2002), ao contrário do que por vezes se pensa, não coloca a nível inferior a outras, em
termos de promoção de aprendizagens conceptuais. Assim, parece pertinente realizar outras
experiências com esta metodologia de ensino, mais desenvolvidas e aperfeiçoadas, que
permitam estudar o seu efeito na aprendizagem dos futuros professores.
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