Sistema_economico_comercial
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Sistema_economico_comercial
UNICURITIBA Curso de Relações Internacionais História Econômica Professor Renato Carneiro TRANSIÇÃO PARA O SISTEMA ECONÔMICO COMERCIAL A expansão econômica entre os séculos XI ao XIII, que incorporou novas técnicas e novas áreas, conheceu uma brusca reversão em finais do XIII, arrastando-se pelos séculos seguintes e mergulhando a Europa numa depressão longa e profunda. Esta depressão acelerou a substituição do Sistema Funcional por outro baseado mais no comércio como gerador de riquezas do que a produção agrícola. Ocorreu que tendo atingido uma fase de consumo agrícola indireto, a expansão que se viu não foi suficiente para sustentar o contínuo crescimento demográfico. A demanda maior que a oferta, que favoreceu a aquisição da liberdade por parte dos camponeses, fez com que rareasse o alimento na mesa das classes menos favorecidas. O crescimento de oferta só foi possível pela incorporação de novas áreas agricultáveis, o que se esgotou a partir da segunda metade do século XIII. A reconquista dos territórios europeus cessou em 1260, permanecendo um Estado árabe no sul da Espanha. Em 1291 forem perdidos os territórios cruzados no oriente e iniciou-se um período de contração da Europa. A propriedade da terra passou por grande desorganização em vista da excessiva fragmentação oriunda do largo arrendamento das parcelas senhoriais, por processo de herança e por conflitos que fizeram com que muitas ou fossem pequenas demais para produzir alimentos em quantidade ou fossem perigosas demais para tal, sujeitas a invasões e ataques. Muitas terras também, que haviam sido recuperadas de pântanos e florestas, achavam-se exaustas e não havia no período técnicas e cuidados especiais para que se mantivessem férteis. Se a suavização do clima ajudou a Europa no século XI, no início do XIV houve uma deterioração tornando-se o norte do continente mais frio e úmido. Com isso, as regiões da Islândia e uma boa parte da Escandinávia deixaram de ser produtoras de cereais, enquanto desapareceram as vinhas na Inglaterra. A redução da oferta só fez agravar os problemas de abastecimento, gerando crises de fome violentas e generalizadas, que interromperam, por fim, o crescimento da população. O século XIV traria ainda duas outras desgraças à Europa: a Guerra dos Cem Anos (1337-1453), envolvendo Inglaterra, França e Flandres – importantes regiões econômicas – e a Peste Negra (1347-1350) que varreu o continente, chegando à Islândia e à Groenlândia. Três foram as crises que provocaram a depressão européia dos séculos XIV e XV: Crise Agrária Além do descompasso entre oferta e demanda, guerras constantes em várias regiões, como Inglaterra, França, Península Ibérica, Escócia, Irlanda, Itália, Alemanha e margens do mar Báltico, causaram grandes destruições no campo, agravadas com secas prolongadas e chuvas torrenciais alternadas, que geravam grandes fomes cíclicas. A primeira dessas fomes aconteceu entre 1315 e 1317, provocada por um verão extremamente chuvoso que impediu o amadurecimento dos cereais e atingiu toda a Europa ao norte dos Alpes e levou o abate generalizado de animais domésticos e, no extremo, à prática do canibalismo, que deflagrou várias epidemias. Outras más colheitas se sucederam em 1338, na França; em 1343, no sul da França e Áustria; em 1347/48, na Inglaterra, norte da Itália, Áustria e Alemanha. A escassez de alimentos fez com que o trigo aumentasse em 300% entre 1315 e 1316. A redução do preço só viria após a redução da demanda em virtude de mortes causadas pela fome e pelas epidemias. Outros episódios de fome aconteceram nas regiões mediterrâneas da Europa nos anos de 1361/62 e 1374/75. A crise agrária se prolongou até o século XV, em virtude desta série de catástrofes, só melhorando após a reconversão agrícola, ou seja, o redimensionamento de propriedades visando aumentar a produtividade, estimulada pela adoção da monocultura regional. Crise Demográfica Desde inícios do XIII, a Europa conhecia reduções nos índices de crescimento da população (menos gente, menos mão-de-obra, menos consumo), mas nada se compararia à devastação causada pela Peste Negra. Esta epidemia atacou o continente entre 1348 e 1350, sob três formas: a bubônica (inchaços nas axilas e virilhas, causando a morte de 70% dos infectados); a septicêmica , quando o bacilo atinge a corrente sanguínea (100% letal) e a pulmonar, típica de períodos mais frios, causando uma espécie de pneumonia, mortífera também em 100% dos casos. Começou na China, em 1333/34. Em 1346 atingiu Cafla (feitoria genovesa no mar Negro), de onde passou pelo contágio de marinheiros no ano seguinte para as ilhas do Mediterrâneo. Em 1348 chegou à Itália, Ibéria, França e Irlanda e, em 1349, à Inglaterra, Alemanha, Áustria e Hungria. No ano seguinte, atingiu a Escócia, Escandinávia, Islândia e Groenlândia. Penetrava em regiões de grande concentração populacional, atingindo mais os ricos que os pobres, mais as cidades que os campos. Foi particularmente mortal em comunidades religiosas. Ao todo a Peste Negra dizimou cerca de 35% da população européia, de forma desigual, pois, se na Lombardia e Alemanha teve baixa incidência, chegou porém, no sul da França, a 70% de mortalidade. Depois dessa pandemia, várias epidemias localizadas repetiram-se: cinco no século XIV e dez no XV e a Europa só se veria livre da peste no século XVIII. É evidente que esta devastação causaria grande desorganização na produção e no consumo, nos preços e salários. Crise Monetária Como já visto, em relação ao Sistema Funcional, a reativação da urbanização, o crescimento demográfico e o alargamento do mercado de consumidores pela adoção do trabalho assalariado exerceram grande pressão para a expansão dos meios de pagamento. Mesmo que as monarquias tentassem disciplinar a cunhagem de moedas e o recurso do crédito se ampliasse com o desenvolvimento bancário, os estoques de metais destinados à moeda eram insuficientes e se tornaram ainda mais raros pelas fomes e epidemias, que forçavam as altas de preços, pela restrição da oferta de bens e diminuição da circulação pela baixa demográfica. Este fenômeno causou ainda a diminuição da demanda de produtos manufaturados, de bens e serviços, o que achatou seus preços, enquanto a diminuição brusca da mão-de-obra elevava os salários. Toda esta situação se agravava ainda mais com a eclosão da guerra entre Inglaterra, França e Flandres que fez com que os reinos aumentassem os impostos destinados a fazer frente às despesas que aumentavam. Não apenas subsídios e captações diretas, mas encargos indiretos como o do monopólio do sal, circulação de mercadorias e direitos alfandegários. Empréstimos tomados a juros a banqueiros italianos tiveram o efeito de endividar ainda mais os reinos e causar várias falências na década de 1340, dada a insolvência de soberanos. Revoltas populares se sucederam em 1358 e 1381, fazendo com que os soberanos usassem um artifício: coletavam moedas com teor metálico nobre razoável e as refundiam, manipulando ligas mais pobres, com que faziam seus pagamentos. A população, percebendo o embuste, tendia a entesourar moedas de maior pureza, fazendo circular apenas as adulteradas, o que limitava o meio circulante e forçava para cima os preços agrícolas ou manufaturados, bem como os da mão-de-obra, além de uma elevação sem precedentes nas despesas dos Estados. Resultados da Depressão Essas três crises, após uma contínua expansão que já durava três séculos, provocaram uma falência geral, causando a desagregação do sistema funcional. Essa grande depressão afetou os fundamentos do sistema, trazendo uma nova realidade que era contra a funcionalidade dos senhores laicos e da Igreja: a crescente intervenção do Estado na economia e o apogeu das sociedades comerciais privadas. A devastadora primeira fase da Guerra dos Cem Anos, que durou de 1337 a 1360 e a pandemia da peste de 1347/1350 marcou a incapacidade das duas categorias de homens livres de cumprirem suas funções específicas, garantindo-lhes a liberdade: nem o cavaleiro conseguia proteger os camponeses dependentes dos inimigos, nem o religioso era capaz de proteger a sociedade da ira divina, que mandava a peste para castigar os pecadores. Os Estados nacionais aproveitavam-se disso em seu combate ao particularismo senhorial e ao universalismo da Igreja. Deram início a medidas de intervenção, suspendendo a cobrança de taxas alfandegárias para importação de trigo; impedindo a exportação de produtos sem a contrapartida da importação de alimentos; proibindo a saída de ouro e prata etc. Intervieram também na formação de preços e salários, através de Estatutos dos Trabalhadores ()na França, em 1349, e na Inglaterra, em 1351, que estabeleciam o teto para preços e salários, reajustando-os em 30% dos valores praticados em 1347. Obrigaram ao trabalho a população até 60 anos, criando punições para os que desobedecessem ao Estatuto. Legislações duras, como esta, foram adotadas por vários outros países europeus para enfrentar a crise, o que levou ao fortalecimento do poder central em relação à nobreza e mesmo à população, que endossava as medidas. Com este apoio, os Estados passam a conceder monopólios comerciais a particulares, como a exportação de lã inglesa em 1347 a Walter Cheriton; exploração de alume aos Médici,da Itália e do mercúrio aos Fugger, da Baviera. As grandes companhias de comércio se espalharam pelo interior da Europa (sul da Alemanha e Lombardia) e pelas costas da Inglaterra e Holanda. Seus lucros, como em uma típica estrutura capitalista antes da época (século XVIII) eram repartidos proporcionalmente aos capitais investidos, com um board diretor mais ou menos perene. Essas companhias reavivaram a economia européia, dentro desse modo sistema comercial, favorecendo a centralização econômica e administrativa e preparando a expansão para a costa atlântica que aconteceria nos séculos seguintes.