Nota Técnica nº 06/2009/DENOR/SGCN/SECOM-PR

Transcrição

Nota Técnica nº 06/2009/DENOR/SGCN/SECOM-PR
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
Secretaria de Comunicação Social
Secretaria de Gestão, Controle e Normas
Departamento de Normas
NOTA TÉCNICA Nº 06/2009/SGCN/SECOM
Brasília, 11 de maio de 2009.
Assunto: Análise do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados (PLC) nº 05/2006 (PL
2472/2000 – Dep. Luíza Erundina), que “Dispõe sobre a obrigatoriedade de mensagem
estimuladora da cidadania na publicidade dos serviços e obras realizados pelos órgãos
públicos federais”.
Senhor Diretor,
Trata-se de mensagem eletrônica enviada pela Subchefia de Análise e
Acompanhamento de Políticas Governamentais (SAG) à Subchefia de Assuntos
Parlamentares (SAP) em que solicita uma análise da Secretaria de Comunicação Social
da Presidência da República (SECOM) sobre o Projeto de Lei da Câmara dos
Deputados (PLC) nº 05/2006 (PL 2472/2000 – Dep. Luíza Erundina) que “Dispõe sobre
a obrigatoriedade de mensagem estimuladora da cidadania na publicidade dos serviços
e obras realizados pelos órgãos públicos federais”, em tramitação no Senado Federal.
Nos termos do art. 13, incisos I e XIV, da Estrutura Regimental da
SECOM, aprovada pelo Decreto nº 6.377/08, compete ao Departamento de Normas da
Secretaria de Gestão, Controle e Normas a elaboração de estudos, pareceres, notas
técnicas sobre projetos de leis referentes a ações de publicidade e de patrocínios e sobre
outros assuntos de interesse da SECOM.
1 – Breve relato e considerações gerais
Em 30 de abril de 2009, a SAG encaminhou à SECOM, mensagem
eletrônica que trata da necessidade de um parecer sobre o PLC nº 05/2006, em
tramitação no Senado Federal, oriundo do PL 2472/2000, de autoria da Deputada Luíza
Erundina. Foram anexados à referida mensagem os seguintes arquivos: a) tramitação na
Câmara; b) redação final na Câmara; c) tramitação no Senado; d) projeto original
Câmara; e) parecer de aprovação na Comissão de Educação do Senado; e f) pareceres
divergentes de órgãos e entidades da Administração Federal.
Esplanada dos Ministérios, Bloco A – 5º e 6º andar – Brasília – DF.
Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República
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Em 04 de maio de 2009, o Gabinete do Ministro-Chefe da SECOM
enviou a referida mensagem à Secretária de Gestão, Controle e Normas (SGCN), com a
solicitação de providências e prioridade no atendimento.
Na SGCN a mensagem foi encaminhada à sua Secretaria de
Comunicação Integrada (SCI), para análise no tocante aos aspectos técnicos
publicitários do PLC, e ao seu Departamento de Normas (DENOR), para formular
parecer conjunto com a SCI.
No DENOR, a mensagem foi encaminhada a esta Assessoria, para
análise do PLC com prioridade, razão da presente Nota Técnica.
Registre-se que o PLC Nº 05/2006, em tramitação no Senado Federal,
objeto desta análise, apresenta-se, atualmente, com o seguinte teor, verbis:
“Dispõe sobre a obrigatoriedade de mensagem estimuladora
do exercício da cidadania na publicidade dos serviços e obras
realizados pelos órgãos públicos federais”
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º A publicidade dos serviços e obras realizados pelos órgãos
públicos federais, por meio da afixação de placas e da veiculação de anúncios
nos meios de comunicação, além do caráter educativo, informativo ou de
orientação social, de acordo com o § 1º do art. 37 da Constituição Federal,
deverá também conter mensagem que estimule o exercício da cidadania.
Art. 2º Considera-se mensagem que estimule o exercício da cidadania,
para os efeitos desta Lei, a reprodução de dispositivos constitucionais e legais
que versem sobre os direitos humanos, assim como aqueles que proíbam
qualquer forma de violência, preconceito ou discriminação de raça, origem,
religião, estado civil, sexo, orientação sexual, idade ou condição social.
Art. 3º A publicidade conterá, nos meios de comunicação e em função
de suas características, reprodução escrita ou falada de um dos dispositivos
constitucionais ou legais referidos no art. 2º desta Lei, precedido da afirmação
“exerça sua cidadania”.
Art. 4º A mensagem a ser inserida na publicidade em painéis, cartazes,
placas luminosas, jornais, revistas ou qualquer outra forma de mídia impressa
deverá ser escrita com letras em cores e tamanho que assegure sua plena
visibilidade.
Art. 5º A mensagem em publicidade por meio do rádio será efetuada
mediante a leitura de texto com locução diferenciada e perfeitamente audível.
Art. 6º A mensagem em publicidade via televisão será realizada pela
exibição do texto escrito com tipo de letra que propicie a perfeita legibilidade e
visibilidade, havendo simultaneamente a locução diferenciada e perfeitamente
audível do aludido texto, que deverá permanecer em exibição por todo o tempo
necessário a essa locução.
Art. 7º A mensagem em publicidade veiculada pela rede mundial de
computadores internet será realizada também pela exibição do texto escrito com
tipo de letra que propicie a perfeita legibilidade e visibilidade.
Art. 8º A execução desta Lei correrá por conta de dotações
orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.
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Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Para os efeitos desta Nota Técnica, a definição de “mensagem que
estimule o exercício da cidadania”, posta no art. 2º do PLC em apreço, abrangendo
dispositivos legais “que versam sobre direitos humanos, assim como aqueles que
proíbam qualquer forma de violência, preconceito ou discriminação de raça, origem,
religião, estado civil, sexo, orientação sexual, idade ou condição social”, será tratada
como princípios e direitos fundamentais.
Ainda para os efeitos desta Nota Técnica, a publicidade prevista no § 1º
do art. 37 da Constituição Federal será denominada de publicidade institucional, que se
destina a divulgar atos, ações, programas, obras, serviços, campanhas, metas e
resultados dos órgãos e entidades do Poder Executivo Federal, com o objetivo de
atender ao princípio da publicidade, de valorizar e fortalecer as instituições públicas, de
estimular a participação da sociedade no debate, no controle e na formulação de
políticas públicas e de promover o Brasil no exterior.
2. Pareceres de alguns órgãos do Poder Executivo Federal
O PL nº 2472/2000 e o PLC nº 5/2006 em análise obtiveram parecer
favorável do Ministério das Comunicações (MC) e pareceres contrários do Ministério
da Fazenda - Caixa Econômica Federal (MF/CEF), do Ministério da Justiça - Secretaria
de Estado dos Direitos Humanos (MJ/SEDH) e da Secretaria de Comunicação Integrada
da SECOM, com os fundamentos a seguir demonstrados.
2.1. Parecer favorável do MC
O MC, por meio da Nota CONJUR de 27/07/2007, manifestou-se
favorável ao PLC em apreço, sob o ponto de vista formal e constitucional, ao entender
que: “iniciativas que estimulem o exercício da cidadania valorização da dignidade da
pessoa humana devem merecer atenção especial”.
2.2. Parecer contrário da CEF
O MF/CEF, por meio da Justificativa de 08/12/2005, posicionou-se
contra a aprovação do Projeto, por entender que, “a despeito do fato do exercício da
cidadania ser condição precípua para o fortalecimento da sociedade, a inserção do
conceito em peças de publicidade tem suas limitações”.
Essas limitações restaram esclarecidas na Justificativa, nos seguintes
termos:
“É preciso, em primeiro lugar, definir o que é ‘publicidade dos
serviços e obras realizados pelos órgãos públicos’, isso porque, em muitos
casos, dependendo da peça publicitária, a mensagem a ser inserida, conforma
art. 4º do projeto em questão, pode comprometer o conteúdo, sob pena de
misturar, em uma única peça, conceitos distintos”.
(...)
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“Em muitos casos não é possível fazer uma ligação entre o conceito e
o serviço que está sendo divulgado, fazendo com que a peça saia do ‘tom’
inicial, previamente definido, principalmente porque as letras e tamanhos
devem ser diferenciados para assegurar a plena visibilidade”.
“Outra questão a ser abordada é o que está previsto no art. 6º, que
pede a locução, em mídia televisiva, seja feita simultaneamente, com locução
diferenciada, à locução normal da mensagem. Tecnicamente, há o
comprometimento da divulgação do produto, além de, dependendo do público
alvo a que se destina a mensagem, produzir efeito contrário, confundindo a
percepção das pessoas no tocante ao que se quer divulgar”.
Nesse mesmo tom, o MF/CEF posiciona-se contra o PLC, na Justificativa
de 23/03/2006, ao acrescentar que “a divulgação deste tipo de informação, na forma
proposta, poderá ocasionar perda de eficácia da mensagem, uma vez que a duplicidade
de objetivos e de assuntos abrangidos numa mesma peça de comunicação poderá gerar
confusão de entendimentos por parte do cidadão”.
2.3. Parecer contrário do MJ/SEDH
O MJ/SEDH opinou pela rejeição do PL, em Nota de 31/05/00, ao aduzir
que, “com a medida projetada, de certa forma, o art. 37, § 1º da Carta Magna, estará
sendo regulamentado, o que, a nosso ver, não será de bom alvitre, por se tratar de
dispositivo auto-aplicável”.
Em seguida o MJ/SEDH considera impróprio o fundamento do PL, ao
confundir as finalidades da publicidade institucional dos órgãos do Poder Executivo
Federal com a propaganda comercial de derivados do fumo e outras similares, nos
seguintes termos:
“Além disso, não nos parece próprio que o projeto sob análise adote
como parâmetro o texto da Lei nº 9.294, de1996, uma vez que este diploma
legal teve por finalidade disciplinar as restrições à propaganda de fumígenos,
bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, conforme
previu a Carta Magna, no art. 220, § 4º, o que não foi o caso da norma
projetada”.
2.4. Parecer contrário da SCI/SECOM
A Secretaria de Comunicação Integrada da SECOM, em Parecer de 11 de
maio, assevera que:
“A inserção do comando ‘exerça sua cidadania’, bem como outras
mensagens correlatas apresentadas no PLC, tem limitações de eficácia sob o
ponto de vista publicitário, tendo em vista que:
a)
há possibilidade de confusão entre os conceitos presentes nas duas
mensagens (principal + estímulo ao exercício da cidadania), podendo
comprometer o entendimento do conteúdo, ou criar relacionamentos
inadequados entre elas;
b) no caso das peças publicitárias audiovisuais, veiculadas em rádio e TV, a
limitação de tempo é fator determinante para o processo de criação.
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Geralmente essas peças têm duração de 30 ou 60 segundos. Com essa
característica, a existência de duas mensagens (principal + estímulo ao
exercício da cidadania) levaria inevitavelmente à supressão de
informações relevantes em uma delas ou em ambas;
c)
ainda no tocante às peças audiovisuais, a diferenciação de legendas e
locução proposta no PLC impacta diretamente a concepção criativa da
peça, comprometendo a assimilação da mensagem pelos cidadãos;
d) as peças impressas, habitualmente, tem maior quantidade de informações
(quantitativas e qualitativas) sobre a ação que está sendo comunicada.
Mesmo assim, a síntese é fator determinante para a assimilação da
mensagem. Aqui, novamente a existência de duas mensagens pode gerar
confusão de entendimento por parte do cidadão;
e)
sob o enfoque de otimização de recursos, a concorrência de duas
mensagens em uma mesma peça publicitária, reduz a efetividade do
investimento feito, principalmente nos veículos de comunicação de massa,
sendo necessários mais investimentos para garantir que a frequência de
veiculação possibilite assimilação eficiente da(s) mensagem(s);
f)
nas situações apresentadas no Projeto de Lei – cigarros e bebidas
alcoólicas - e utilizadas como modelo de aplicação, é preciso ressaltar que
as mensagem (as implicações para a saúde do hábito de fumar; se beber
não dirija ou aprecie com moderação...) têm vinculação direta com o
conteúdo publicitário. Isso dá sentido à coexistência das mensagens. Não
há conflito entre elas. Na proposta do PLC não há essa garantia de
vinculação, o que tende a gerar as confusões de comandos, já comentadas
acima.
Considerando que a operação das redes de rádio e TV são concessões
públicas, a iniciativa do PLC teria mais efetividade se propusesse a destinação
de espaço para estímulo ao exercício da cidadania na programação das
emissoras, em vez de utilizar o espaço publicitário - comprado pelo Governo
Federal - para tal finalidade. Esse ponto em particular denota que, se aprovado o
PLC, não haverá ganho real para promoção do exercício da cidadania, pois
estar-se-á utilizando, em geral, pequenos espaços publicitários (30 ou 60
segundos), em detrimento de programas específicos das redes de rádio e TV que
poderiam abordar o assunto de forma mais abrangente e flexível.
Cabe ressaltar que os órgãos e entidades integrantes do Poder Executivo
Federal já adotam como diretriz contemplar em suas ações publicitárias
diversos aspectos de cidadania, a saber:
éticas;
•
•
atingido;
promover diversidade étnica e cultural, igualdade de gênero e atitudes
ressaltar benefícios para a sociedade e para o público diretamente
•
reforçar atitudes que promovam o desenvolvimento humano;
•
adequar mensagem ao universo cultural dos segmentos de público;
•
contribuir para a compreensão das políticas públicas adotadas pelo
Governo Federal;
•
reforçar autoestima do brasileiro;
•
promover acessibilidade de comunicação;
•
estimular a sociedade a participar do debate e da definição de políticas
públicas essenciais para o desenvolvimento do país;
•
realizar ampla difusão dos direitos do cidadão e dos serviços colocados à
sua disposição.
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Diante dessas considerações de caráter técnico-publicitário, cabe uma
análise sob o ponto de vista jurídico, tendo em vista que o PLC se destina a institui
novas exigências e restrições ao princípio da publicidade, não previstas no § 1º do art.
37 da Constituição Federal, sob o foco do direito à informação, que também constitui
direito fundamental inerente ao exercício da cidadania, já implícito na publicidade
institucional, a seguir demonstrado.
3. Fundamentação Jurídica
A ampliação das exigências previstas no § 1º do art. 37 da Constituição
Federal, para acrescentar na publicidade institucional uma “mensagem que estimule o
exercício da cidadania”, conforme propõe o PLC em apreço, deve ser analisada sob o
aspecto do processo legislativo em que uma lei não assume a posição de uma emenda à
Constituição; à luz do princípio da publicidade “inerente à boa administração pública1”
e que corrobora o direito à informação; com base no princípio da eficiência, que impõe
a singularidade e a unidade de tema para cada ação publicitária, sob pena de ineficácia
da mensagem; e em sintonia com os princípios: federativo, da economicidade e da
razoabilidade.
Com certeza, verifica-se que a ampliação das exigências previstas no § 1º
do art. 37 da Constituição, proposta no art. 1º do PLC em foco, afigura-se
inconstitucional, por se tratar de disposição exaustiva e autoaplicável, que não pode ser
objeto de ampliação por meio de medida legislativa infraconstitucional, já que uma lei
não tem e não pode ter a natureza jurídica de emenda constitucional, sob pena de se
inverter a ordem constitucional do devido processo legislativo previsto no art. 59 da Lei
Magna, verbis:
Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:
I - emendas à Constituição;
II - leis complementares;
III - leis ordinárias;
IV - leis delegadas;
V - medidas provisórias;
VI - decretos legislativos;
VII - resoluções.
Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação,
alteração e consolidação das leis.
Assim, o acréscimo produzido no § 1º do art. 37 da Lei Magna, para
incluir exigência de que o dispositivo “deverá também conter mensagem que estimule o
exercício da cidadania”, somente pode ser efetivado por emenda à Constituição, sendo
inconstitucional o PLC 05/2006, por contrariar o devido processo legislativo.
Ademais, revela-se inconstitucional regulamentar o disposto no § 1º do
art. 37, da Lei Magna, por se tratar de dispositivo autoaplicável, uma vez que nesse
dispositivo não constam os dizeres: “na forma da lei”, “de acordo com a lei”, etc. Isso
demonstra que não pode ser objeto de regulamentação aquilo que a Constituição
satisfez-se na sua inteireza prática. Prevalece o silêncio eloqüente do dispositivo
constitucional, em homenagem ao princípio da publicidade e aos direitos fundamentais,
que não podem sofrer restrições não previstas na Lei Maior.
1
JOSÉ AFONSO DA SILVA, Comentário Contextual da Constituição, Malheiros, 2ª edição, 2006, p. 346
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Saliente-se que a Constituição Federal não deixou margem para a lei
regulamentar o princípio da publicidade, motivo pelo qual, qualquer regulamentação no
caso teria a força jurídica de restringir a aplicação prática desse princípio, reduzindo a
sua eficácia e a sua efetividade, conforme parece ser o desiderato do PLC nº 05/2006
em análise, já que ele busca ampliar as exigências posta no § 1º do art. 37 da Lei Maior.
Com isso, não se nega a importância e o significado especial dos
princípios e direitos fundamentais tratados do PLC nº 5/2006, quando manda incluir
“mensagem que estimule o exercício da cidadania” na publicidade institucional. Ao
contrário, no presente caso, procura-se preservar a eficácia e a efetividade do princípio
da publicidade e dos princípios e direitos fundamentais, já que, no âmbito publicitário,
eles devem ser tratados separadamente, de forma que um não prejudique a eficácia do
outro, ou seja, pode-se fazer uma campanha publicitária que estimule o exercício da
cidadania, mas não se podem misturar as mensagens da publicidade institucional com as
que estimulam o exercício da cidadania, conforme propõe o PLC em apreço, sob pena
de ineficácia da comunicação, prejudicial para todos os valores e princípios
constitucionais, por contrariar o próprio direito à informação.
Apesar da importância e do significado ímpar dos princípios e dos
direitos fundamentais, o art. 37 caput da Constituição atribui ênfase ao princípio da
publicidade, razão por que as mensagens publicitárias devem ser tratadas separadamente
para cada tema, por serem singulares, para obter clareza e precisão e, com isso, evitar
restrições ao princípio da publicidade, que deve ser interpretado de forma ampla, sem
qualquer limitação, uma vez que a Lei Magna não autoriza que a lei ordinária restrinja a
aplicação desse princípio, salvo quando, no caso concreto, ele colidir com o princípio da
impessoalidade, conforme previsto no § 1º do referido dispositivo constitucional, ou
quando o sigilo for imprescindível à segurança da sociedade e do Estado ou ainda
quando a defesa da intimidade ou interesse social o exigirem (CF, art. 5º, XXXIII e
LX), o que não ocorre no PLC em análise.
Nesse contexto, é importante salientar que a publicidade institucional
prevista no § 1º do art. 37 da Constituição Federal não é diferente da publicidade
prevista no caput do referido artigo, porque ambas têm a mesma importância no Estado
Democrático de Direito, de forma que não há motivo para a restrição da publicidade
institucional, conforme proposto no PLC 05/2006, tendo em vista que a Lei Magna não
prevê uma publicidade-virtude e outra publicidade-vício no seu caput e respectivo § 1º
do art. 37, conforme ensina JOSÉ AFONSO DA SILVA, nos seguintes termos:
“A publicidade do § 1º não é essencialmente diversa da publicidade do
caput do artigo. Não há uma publicidade-vício e uma publicidade-virtude das
atuações administrativas, pois o princípio da publicidade, inerente à técnica da
boa administração pública (caput), manifesta-se também na publicidade
governamental (§ 1º). Por isso, com razão, Cretella Jr. reconhece, como se viu
acima, que ela não é apenas uma possibilidade, mas um dever dos órgãos
públicos. Por esse motivo também é que não se pode aceitar a radical distinção
que o ilustre Jurista faz entre as duas modalidades de publicidade. O que existe
são duas modalidades de realização do mesmo princípio: uma que é necessária à
eficácia do ato administrativo, e se satisfaz pela publicação oficial (caput);
outra que é a propiciação de conhecimento, aos administrados, de atuações dos
órgãos da Administração (§ 1º). Mas o dever de publicidade tem outro
fundamento da mais alta importância: o de ser contrapartida do direito à
informação, do direito de ser informado, que a Constituição reconhece a todos
no art. 5º XIV e XXXIII”.2
2
Comentário Contextual da Constituição, Malheiros Editores, 2ª edição, 2006, p. 346.
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Registre-se que, com o advento da Constituição de 1988, facilitou-se o
processo legislativo de iniciativa de projetos de leis, o que justifica as inúmeras
propostas relativas aos serviços de publicidade que buscam restringir ou até mesmo
impedir o processo de comunicação do Governo com a sociedade.
Isso se revela juridicamente preocupante, porquanto parece que o PLC
faz emergir um preconceito em face da publicidade institucional prevista no § 1º do art.
37 da Lei Magna que induz o Poder Legislativo ao equívoco de investir contra o próprio
princípio da publicidade, de índole constitucional, quando busca limitar o seu alcance,
conforme se observa no PLC nº 05/2006 em apreço. Por isso, no Estado Democrático de
Direito, as restrições ao princípio da publicidade que não estejam expressamente
previstas na Constituição Federal devem ser reputadas como inconstitucionais, porque a
lei não pode ampliar aquilo que a Constituição restringiu.
No presente caso, esse preconceito, restritivo ao princípio da publicidade,
está visível na própria justificativa do PL originário, em que a Deputada subscritora
compara a publicidade institucional com a propaganda comercial de produtos derivados
do fumo e de bebidas alcoólicas, quando assevera que:
“Vale lembrar que, similarmente ao projeto ora apresentado, vigora
em nosso ordenamento jurídico a Lei nº 9.294, de 15 de junho de 1996, que
restringe a propaganda de produtos fumígeros e de bebidas alcoólicas, através
de veiculação de advertências sobre seus malefícios”.
Com isso, fica demonstrada a inconstitucionalidade do PLC nº 05/2006
em apreço, por contrariar o princípio da publicidade, já que ele procura restringir a
publicidade institucional, mediante o pretexto de se inserir na sua mensagem outra
mensagem que “estimule o exercício da cidadania”, como advertência para “amenizar
os malefícios” dessa publicidade, o que se afigura contrário ao Estado Democrático de
Direito e prejudicial ao próprio exercício da cidadania, inerente ao direito à informação.
Nesse contexto, não se pode olvidar que o princípio da publicidade se
realiza no direito à informação, que está qualificado como direito fundamental na Carta
Magna de 1988, quando assegura a todos o acesso à informação e garante que todos têm
direito de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de
interesse coletivo ou geral, razão por que não se pode alimentar qualquer preconceito ou
excesso de moralismo na interpretação e aplicação do princípio da publicidade, de
forma a reduzir ou limitar o alcance desse princípio, conforme ensina, mais uma vez, o
Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA, verbis (grifamos):
“O § 1º do art. 37 gira em torno do problema da publicidade
governamental: sua possibilidade, seus limites e o modo de sua realização. A
questão não é simples, pois não basta um mero exame preconceituoso do texto,
como, não raro, o excesso de moralismo preconcebido faz. É imprescindível
uma análise sistemática desse texto com o princípio da publicidade e com os
dispositivos constitucionais sobre o direito de todos à informação, o direito de
ser informado, para verificar que a publicidade da atuação de órgãos públicos
não é simples promoção de determinada gestão administrativa”.
“O dispositivo contém duas regras. Uma a principal, admite a
publicidade governamental. Não se trata apenas de saber se o administrador tem
o direito de dar publicidade aos atos, programas, obras, serviços e campanhas
dos órgãos públicos. A Constituição, em realidade, não confere apenas uma
faculdade, mas também um dever, que é a contrapartida do direito de todos à
informação, conexo com o princípio da publicidade, que é inerente à técnica do
direito público”.
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“O direito de ser informado, consagrado em nossa Constituição como
direito fundamental, revela-se como importante dimensão da visibilidade do
poder, tendo em vista todos os desvirtuamentos da função informativa da
imprensa-instituição e de sua característica de remédio ao qual as democracias
podem e devem recorrer para dificultar a manipulação de informações, e, pois,
de correção da distorção ou sonegação destas pela mídia, pelo quê a mera
publicidade dos atos governamentais não mais basta para garantir o
fornecimento de informações fiéis aos governados seja por si só idôneo para
permitir que estes formulem de modo independente as suas opiniões sobre os
assuntos do Estado”.3
Dessa forma, verifica-se que a publicidade institucional é inerente ao
direito fundamental à informação, razão por que, em toda mensagem dessa publicidade
já está implícito um estímulo ao exercício da cidadania, conforme prevê o PLC nº
05/2006, uma vez que ela se destina a divulgar atos, ações, programas, obras, serviços,
campanhas, metas e resultados dos órgãos e entidades da Administração Pública, com o
objetivo de atender ao princípio da publicidade, de valorizar e fortalecer as instituições
públicas, de estimular a participação da sociedade no debate, no controle e na
formulação de políticas públicas e de promover o Brasil no exterior.
Isso demonstra a redundância do PLC 5/2006 em apreço, ao impor nas
mensagens da publicidade institucional, a necessidade de se inserir outra mensagem de
estímulo à cidadania já subjacente ao princípio da publicidade, tornando-a prolixa e
imprecisa, pela duplicidade de informação na mesma peça publicitária, o que pode
causar confusão no receptor da mensagem e retirar a sua eficácia e efetividade,
prejudicial ao próprio princípio da eficiência.
Portanto, o PLC 5/2006 afigura-se inconstitucional também por
contrariar o princípio da eficiência, previsto no caput do art. 37 da Lei Magna.
Ademais, verifica-se que esse PLC nº revela-se inconstitucional,
enquanto tem como objetivo restringir o princípio constitucional da publicidade
somente na esfera da União, criando preferência entre os entes da Federação Brasileira,
porquanto é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e os Municípios criar
preferência entre si, nos termos do art. 19, III, da Constituição Federal.
A vedação prevista no art. 19, III, da Constituição Federal é decorrente
do princípio federativo, uma vez que a lei não pode estabelecer distinção entre a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, até por que não pode ser objeto de
deliberação a proposta de projeto de lei tendente a abolir a forma federativa de Estado,
aplicando-se no caso, a cláusula pétrea prevista no art. 60, § 4º, da Constituição Federal.
Além disso, a aplicação prática do PLC em apreço contraria os princípios
da economicidade e da razoabilidade, uma vez que incluir em toda a veiculação da
publicidade institucional as informações exigidas na proposta significa aumentar as
despesas com publicidade e diminuir a eficiência da comunicação, visto que os formatos
das peças publicitárias obedecem a um padrão predeterminado pelo mercado, e a
inclusão obrigatória das informações citadas no PLC demandaria aumento dos formatos,
ocasionando aumento dos custos de produção e veiculação das peças.
3
JOSÉ AFONSO DA SILVA, Comentário Contextual à Constituição, Malheiros Editores, 2ª edição, 2006, p.
346/347.
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De qualquer forma, não se revela razoável o confronto entre a mensagem
obrigatória e a mensagem divulgada pela peça publicitária, por dificultar a apreensão do
seu conteúdo e compreensão da mensagem pelo público, o que restringe o princípio da
publicidade por inviabilizar a eficiência e a efetividade da mensagem publicitária.
Cabe ressaltar que, em meios como o rádio, por exemplo, tecnicamente é
bastante complicada a inserção de informações além da mensagem principal, uma vez
que o único recurso disponível é a locução, o que restringe a eficácia da própria
publicidade.
Nos outros meios (impressos e tv) ainda se tem a opção de inserir um
lettering com as informações, mas nas peças de áudio a inclusão de outra informação
seria complicada, para não dizer impossível, tendo em vista a necessidade de atender
aos princípios da publicidade, da eficiência, da economicidade e da razoabilidade
inerentes aos poderes da Administração Pública. Nesse sentido, o Supremo Tribunal
Federal julgou como inconstitucional dispositivo semelhante ao PLC em análise,
consoante se transcreve:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. LEI
11.601, DE 11 DE ABRIL DE 2001, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.
PUBLICIDADE DOS ATOS E OBRAS REALIZADOS PELO PODER EXECUTIVO.
INICIATIVA PARLAMENTAR. CAUTELAR DEFERIDA EM PARTE. 1. Lei
disciplinadora de atos de publicidade do Estado, que independem de reserva de
iniciativa do Chefe do Poder Executivo estadual (...) 4. Cláusula que determina
que conste nos comunicados oficiais o custo da publicidade veiculada.
Exigência desproporcional e desarrazoada, tendo-se em vista o exagero dos
objetivos visados. Ofensa ao princípio da economicidade (CF, artigo 37,
caput).4.
Nesse contexto, a inclusão de “mensagem que estimule o exercício da
cidadania” na publicidade institucional, conforme impõe o PLC 05/2006, revela-se
juridicamente inviável, por ser inconstitucional e por se tratar de ato contraproducente,
já que ele reduz a eficiência, a eficácia e a efetividade das ações publicitárias, aumenta
as despesas com publicidade e ao mesmo tempo pode ser objeto de banalização dos
princípios e direitos fundamentais, quando inseridos em contexto publicitário diverso e
sem pertinência temática com os seus objetivos.
4. Conclusão
Ante o exposto, o PLC nº 05/2006 (nº 2.472/00, na Casa de origem), de
autoria da Deputada LUIZA ERUNDINA, revela-se inconstitucional e contrário ao
interesse público, por restringir a aplicação prática do princípio da publicidade e, em
decorrência disso, contrariar os princípios do devido processo legislativo constitucional,
da eficiência, da economicidade e da razoabilidade.
Ademais, o PL afronta também o princípio federativo, por estabelecer
restrições apenas às ações publicitárias realizadas pela União e, com isso, criar
preferência entre os entes da federação, vedado pelo inciso III do art. 19, da
Constituição Federal, impossível de ser apreciado por se tratar de proposta de PL
tendente a abolir a forma federativa de Estado, nos termos do art. 60, § 4º, da Lei Maior,
conforme ficou demonstrado acima.
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ADI-2472, publicada no DOU de 22.11.2004.
Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República
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Sugere-se que, se aprovada, a presente Nota Técnica seja encaminhada
ao Chefe de Gabinete da SECOM, como subsídio para resposta à solicitação da
Subchefia de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais (SAG), enviada
por meio eletrônico pela Subchefia de Assuntos Parlamentares (SAP) da Secretaria de
Relações Institucionais da Presidência da República (SRI).
Salvo Melhor Juízo. À consideração Superior.
EDGAR FERREIRA DOS SANTOS
Assessor/SECOM
De acordo.
Brasília, 11 de maio 2009.
JOSÉ RICARDO DE ANTONI
Diretor do Departamento de Normas da SGCN/SECOM

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