Brigada Cinotécnica
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Brigada Cinotécnica
brigada cinotécnica reportagem Eficácia a toda a prova À margem das séries televisivas, mas sem personagens de ficção, os «agentes caninos» da Brigada Cinotécnica da Polícia de Segurança Pública (PSP) do Porto pertencem a uma subunidade especializada no treino de cães capazes de intervir com eficácia no trabalho operacional. Embora também sejam protagonistas de grandes feitos, estes são «agentes» bem reais. Texto: Marta Almeida Carvalho Fotos: Virgínia Ferreira Em Abril, o Corpo de Intervenção (CI) da PSP celebra o 31º aniversário. No âmbito desta unidade - que constitui umaAlmeida força de reserva para intervir Texto: Marta Carvalho Fotos: Ferreirae reposição da ordem em acções deVirgínia manutenção pública e no combate a situações de violência - foi 16 criado o Grupo Operacional Cinotécnico (GOC) em Lisboa. Posteriormente, sem ligação directa ao CI, surgiu a Brigada Cinotécnica (BC) no Porto. Os primeiros passos relativamente ao treino de cãespolícia foram dados na década de 80. “Inicialmente o cão era usado sobretudo pela capacidade de morder e funcionar como elemento dissuasor na manutenção e reposição da ordem pública”, refere José Vieira, comandante do destacamento do CI no Porto. No entanto, a possibilidade de utilização dos cães nas diversas áreas do trabalho policial começou, desde logo, a ser equacionada. “Descobriu-se que os cães tinham muito mais potencialidades e que poderiam ser uma ajuda valiosa, nomeadamente na busca e detecção de estupefacientes, explo17 brigada cinotécnica reportagem sivos, busca e salvamento ou intervenção em sequestros”, acrescenta. Considerada como uma «filial» do GOC, de quem depende a nível de formação e de logística, a BC foi criada a partir de elementos lá formados mas que, há excepção de dois, não faziam parte do Corpo de Intervenção. “Nos vários distritos, excepto Lisboa, as cinotécnicas são constituídas por elementos do comando local ou que peçam o ingresso nas brigadas”, explica, salientando que no caso da do Porto, a génese está no facto de haver na cidade um destacamento do CI. “A brigada está sob dependência operacional e administrativa do destacamento” sendo que o seu raio de acção incide predominantemente na manutenção e reposição da ordem pública. “O apoio técnico, treino e formação dos elementos são feitos no GOC. Cá, gerimos a sua actuação, enquadrando-a no trabalho policial”, refere o comandante. Mas se o patrulhamento e a ordem pública são as actividades mais absorventes, o apoio dado às diversas unidades de polícia é constante e sofre uma articulação cuidada, sendo que os binómios (dupla homem/cão) participam em diversas acções com as equipas de Inactivação de Explosivos, Busca e Salvamento, Divisão de Investigação Criminal e Polícia Judiciária. Segundo Vítor Vasconcelos, chefe da cinotécnica, é o CI que mais solicita esses serviços. “Trabalhamos no mesmo local, a chefia é a mesma, daí a proximidade”, salienta. sonagem da saga “Star Wars”. Sting (labrador) e Bin (rotweiller) são dois elementos da equipa, o primeiro especialista na busca e detecção de estupefacientes, Bin com dupla especialidade - droga e ordem pública. Para além de Bin há, na brigada, mais dois canídeos com esta característica - Dik, um pastor alemão que forma binómio com Jorge Guedes, e Dan cujo tratador é Fernando Alves. E como é treinar um animal com dupla especialidade? “Independentemente das ordens, há uma série de indicações que o fazem perceber em que cenário vai trabalhar. Se colocar uma coleira de couro no meu cão ele vai saber, de imediato, que vai fazer trabalho de busca, se optar pelo estrangulador é sinal para ordem pública”, exemplifica Márcio Silva, salientando que um cão com dupla especialidade tem de ser equilibrado e ter grande motivação. Celino Santos é um dos agentes da cinotécnica que, para além de treinar e trabalhar com dois cães - Gamin (pastor belga malinois) e Baro (pastor alemão), o primeiro de ordem pública, o segundo de explosivos - tem ainda o curso de figurante, “o homem que ensina os cães a morder”. Segundo o agente, qualquer animal não treinado morde «a direito», enquanto que, ensinado, fá-lo “com eficiência”. Vítor Vasconcelos tem o mesmo curso, comum ainda a mais dois agentes – Márcio Silva e António Martins. “O figurante está na base do treino do cão de ordem pública. Trabalha a parte de agressividade, ordens de ataque, ataques interrompidos, como e onde morder e até a parar a mordida”, explica o chefe da equipa. Os cães podem vir de Lisboa (comprados ou pertencendo à criação do GOC) ou chegar por doação directa. As raças destes «agentes» variam entre pastor alemão, rotweiller, pastor belga malinois e labrador. E são estas as que dão melhores garantias? “Não tem muito a ver com raças mas com o próprio animal. Podíamos treinar um rafeiro e dar um grande cão”, refere Celino Santos, alertando para os perigos da conotação das raças. “Não se pode falar em raças potencialmente perigosas, é uma ideia falsa. Existem cães potencialmente perigosos”, assegura, sublinhando, no entanto, que algumas raças “tiveram mais tem- po para evoluir”. Duas características fundamentais que um cão-polícia necessita é ter coragem e um bom faro, sendo este o factor determinante para que sejam bons «pisteiros». Já “um animal com carácter e corajoso é excelente para ordem pública”, defende o agente. Animais e tratadores passam muito tempo juntos. A socialização baseia-se numa grande afinidade que resulta de horas de treino e muita brincadeira, os alicerces da confiança entre ambos. “O treino é feito à base da brincadeira e o brinquedo do cão é o estímulo, o prémio por executar bem”, refere, salientando que é necessário conhecer o animal para saber as suas preferências relativamente à recompensa. “Temos de ver o estímulo a que o cão reage melhor. Há cães que não gostam do brinquedo e preferem comida”, diz. Os cães da formação são todos machos, não por descriminação relativamente ao sexo feminino mas pela falta de espaço. “Era necessário fazer uma separação. No entanto, a presença de uma única fêmea iria destabilizar todos os cães”, admite o agente. «Agentes caninos» À primeira vista, os nomes até podem soar a celebridades da música pop, terroristas islâmicos, jogadores de futebol ou um qualquer excêntrico per18 19 reportagem Duplas «infalíveis» As ordens são transmitidas por uma série de comandos, geralmente de uma só palavra, em línguas diversas, cujos sons são facilmente identificáveis pelos animais. Os cães são treinados para o desempenho de missões em diversas áreas do trabalho policial e cada um tem a sua especialidade. Para além da ordem pública, que engloba o maior número de animais e que todos os agentes têm de trabalhar, há também os peritos em busca e salvamento, busca e detecção de estupefacientes e de explosivos. Kingo e Gabo, pastores checo e alemão, são versados em encontrar pessoas desaparecidas em situações diversas. Sob o olhar atento 20 dos tratadores, respondem com eficiência ao que lhes é pedido – encontrar alguém debaixo de escombros. Kim e Baro, pastores alemães, são especialistas na busca de explosivos e, por definição, muito tranquilos. Kim, o primeiro a avançar, detecta o engenho num carro armadilhado, Baro confirma. Depois de uma ronda ao veículo, senta-se, imóvel, dando o sinal ao tratador. Na busca de explosivos o cão não pode, como é óbvio, tocar nos engenhos. Segundo José Manuel Oliveira, o animal “irá aperceber-se da sua presença, num raio de cerca de 1,5 metros, devido às partículas lançadas pelo explosivo”. Dan participa com o tratador numa busca de droga. O desafio é facilmente ultrapassado e o seu sinal é o de raspar no objecto «escolhi- 21 reportagem Sob os comandos do tratador, Carr demonstrou versatilidade em diversos cenários – retirou um «indivíduo armado» de dentro de um carro e não hesitou em atravessar um espaço em chamas para neutralizar uma «ameaça». Trasto, reactivo ao som de tiros, concentra-se nas indicações do tratador e imobiliza um «assaltante» com reféns. Para além destas situações, a ordem pública compreende, ainda, a actuação dos binómios em manifestações ou eventos que comportem multidões. Recorde-se que, a par dos de busca e detecção de explosivos, os animais de ordem pública são os que sofrem maior desgaste, os primeiros porque “têm de ter muita tranquilidade”, de acordo com Celino Santos, os segundos porque estão sujeitos a grande stresse, como refere Márcio Silva. “Estar durante cerca de noventa minutos em frente a claques de futebol ruidosas, que lançam petardos, não é uma situação fácil para o cão”. Por norma, a vida profissional de um cão-polícia começa após um ano de idade e termina ao fim de uma década de trabalho. Após esse período, e segundo José Vieira, o animal é “abatido ao efectivo” da Companhia e pode ser cedido a terceiros ou ficar com o tratador, o que é frequente. Q Brigada cinotécnica A equipa cinotécnica do Porto é composta por 15 elementos e 19 cães (o que corresponde a 19 binómios) • Álvaro Silva + Goran (OP) e Gabo (BS) • António Costa + Paco (OP) • António Mar tins + Red (OP) • Ar tur Paciência + Kingo (BS) • Celino Santos + Gamin (OP) e Baro (BEx) • Fernando Alves + Dan (OP+BEs) • Hélio Farelo + Reno (OP) • Jorge Guedes + Dik (OP+BEs) • José Manuel Oliveira + Rex (OP) e Kim (BEx) • Manuel Costa + Faruch (OP) • Manuel Simão + Freddy (OP) e Max (OP) • Márcio Silva + Bin (OP+BEs) e Sting (BEs) • Michel Grabulho + Trasto (OP) • Rui Sousa + Carr (OP) • Vitor Vasconcelos – chefe da BC do». Um agente confirma a detecção. Os cães de ordem pública, têm de ser reactivos e facilmente alteráveis para reagir a situações mais violentas. 22 OP – Ordem pública; BS – Busca e Salvamento; BEx – Busca e detecção de explosivos BEs – Busca e detecção de estupefacientes 23