56 - Universidade Federal do Ceará

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56 - Universidade Federal do Ceará
O DIREITO A INFORMAÇÃO EM SAÚDE E O CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR (CDC)
Shandra Carmen Sales de Aguiar1
Sílvia Maria Nóbrega-Therrien2
RESUMO
O presente estudo teve o objetivo de conhecer a percepção dos consumidores internados
em uma unidade hospitalar sobre o direito a informação em saúde e sua interface com o
Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao mesmo tempo em que procurou criar uma
estrutura teórica com subsídios às reflexões sobre o direito a Informação em saúde
como um Instrumento indispensável para o exercício do direito à saúde com base no
Código de Defesa do Consumidor. Essa estrutura de considerações se iniciou com uma
constatação da existência do direito à informação como premissa básica para a obtenção
do direito à saúde, direito esse preconizado em todas as bases legais brasileiras e ainda
nos acordos internacionais onde o Brasil se apresenta como signatário. O direito à
informação adequada, suficiente e verdadeira é um dos pilares do direito do
consumidor. Nas legislações mundiais, voltadas a regular as relações de consumo, a
referência quase uniforme ao direito à informação fortalece as características
universalizantes desse novo direito. Afinal, os problemas e as dificuldades enfrentadas
pelos consumidores, em qualquer parte do mundo, são bem parecidos. Por essas razões,
a Resolução nº 30/248 da Assembléia Geral das Nações Unidas, desde 16.04.1985,
determinou entre suas normas, o desenvolvimento e o incentivo a programas de
informação e educação (norma F), com o objetivo de “fornecer aos consumidores
informações adequadas para capacitá-los a fazerem escolhas acertadas de acordo com as
necessidades e desejos individuais” (item 3, alínea c). O direito a informação está
diretamente ligado ao princípio da transparência (art. 4º, caput, CDC), traduzindo-se na
obrigação do fornecedor de dar ao consumidor a oportunidade prévia de conhecer os
produtos e serviços, gerando, igualmente, no momento de contratação, a ciência plena
de seu conteúdo. Saliente-se que a ausência de informação dos fornecedores não obriga
os consumidores, caso não lhes seja dada a oportunidade de tomarem conhecimento
1
Economista Domestica. Mestre em Saúde Pública. Coordenadora do Núcleo de Educação do
Consumidor e Administração Familiar do Departamento de Economia Domestica da Universidade
Federal do Ceará.
2
Enfermeira. Doutora em Educação. Professora do Mestrado em Saúde Pública da Universidade Estadual
do Ceará.
prévio de seu conteúdo, ou se seus respectivos instrumentos forem redigidos de modo a
dificultar a compreensão de seu sentido e alcance (MARQUES, 2003). A Constituição
Federal incluiu a defesa do consumidor no elenco dos direitos fundamentais (art. 5º,
XXXII) e, por sua destacada importância previu que “é assegurado a todos o acesso à
informação” art. 5º, XIV. De acordo com Marques (2003), o direito de informação pode
ser contemplado de três maneiras: o direito de informar, o direito de se informar e o
direito de ser informado. Ainda para a autora o direito de informar é uma prerrogativa
concedida às pessoas físicas e jurídicas, disposto no caput do art. 220, que dispõe “a
manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer
forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta
Constituição”. Esta norma é complementada pelo art. 5°, IX que expressa “é livre a
expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente
de censura ou de licença”. Mas estes dispositivos não são absolutos, visto que a própria
norma constitucional impõe limites, através do art. 5 °, inciso X: quando diz que “são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o
direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”
(MARQUES, 2003). São invioláveis, diz o texto constitucional. Assim, entendemos que
o direito de informar não pode transpor os limites estabelecidos nessa norma. Não pode
violar a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Já o direito de se
informar é uma prerrogativa da pessoa humana e decorre do fato da existência de uma
informação. Nesse caso o texto constitucional no inciso XIV do art. 5°, assegura esse
direito no que diz respeito à informação em geral, no entanto garante o sigilo da fonte,
quando for necessário ao exercício profissional. Assim, podemos entender que é
possível que se possa exigir a informação de quem a detém, desde que sejam respeitadas
a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Quando se trata de
informação relativa a própria pessoa, a Constituição garante-lhe o “habeas data” (art. 5º,
LXXII) na hipótese de direito líquido e certo de conhecer e/ou retificar a informação
existente em registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter
público. O direito de ser informado nasce, sempre, do dever que alguém tem de
informar. A Constituição trata, basicamente, do dever de informar dos órgãos públicos
(art. 5º XXXIII e art. 37). O direito fundamental à informação se refere à concretização
das possibilidades objetivas de conhecimento e compreensão, por parte do consumidor
típico, destinatário de um produto ou de um serviço. Não se trata de fazer com que o
consumidor conheça e compreenda efetivamente a informação, mas deve ser
desenvolvida uma atividade razoável que o permita e o facilite. É um critério geral de
apreciação das condutas em abstrato, levando-se em conta o comportamento esperado
do consumidor típico em circunstâncias normais. Ao fornecedor incumbe prover os
meios para que a informação seja conhecida e compreendida (art 6º CDC e art
31ºCDC). Na relação profissional de saúde e consumidor, o consumidor se torna ao
mesmo tempo sujeito e objeto de seu próprio conhecimento. Desenvolve-se um saber
sobre o indivíduo como corpo doente exigindo uma intervenção que dê conta de sua
singularidade. Ao mesmo tempo se expande uma medicina do espaço social que adota a
população como objeto de sua atuação, onde a doença assume o status de problema
político e o profissional de saúde a função de autoridade administrativa que dirige,
controla e registra as características dos modos de viver das populações:
institucionalizam-se as informações. A partir daí tornam-se espaços estratégicos de
lutas, de relações de poder e produção de saber. Estrutura-se uma 'rede de olhares' que
coleta, registra e armazena as informações: murmúrios anônimos sobre a vida e a morte
(MARQUES, 2003). Este estudo teve um caráter exploratório de natureza descritiva,
onde foi utilizada predominantemente a análise qualitativa, apesar de envolver também
técnicas quantitativas de coleta, para que os objetivos propostos fossem alcançados. Os
sujeitos da pesquisa foram 125 consumidores internados, acompanhantes e visitantes na
Clínica II A e B de uma unidade hospitalar localizada na cidade de Fortaleza.
Utilizamos para coleta dos dados a entrevista semi-estruturada tanto para os
consumidores internados na clínica II (A e B) como os acompanhantes e visitantes, e
para a análise dos dados a técnica de Análise de Conteúdo de Bardin. Todos foram
esclarecidos sobre os objetivos do trabalho, e àqueles que mostraram interesse e se
dispuseram a participar da pesquisa, deixamos claro que a qualquer momento eles
tinham a liberdade de recusar-se a participar do estudo, bem como, informamos sobre a
disponibilidade de tempo para realização da entrevista e que todos teriam seus nomes
mudados, a fim de resguardar sua privacidade. Assim atribuímos a cada usuário e
usuária um nome bíblico. A cada um deles foi entregue para ser assinado o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, exigido pela Resolução 196/96 do Código de Ética
para pesquisa com seres humanos. Como conclusão do estudo, reforçamos o fato de que
o direito ao exercício da cidadania se apresenta em início de construção, principalmente
na arena das políticas públicas de saúde. E que em todo este contexto de considerações
que elenca as bases legais existentes na legislação, de apoio aos direitos do consumidor
de um serviço de saúde, constatamos a importância da informação e principalmente da
educação, como caminhos para o conhecimento destes direitos e conseqüentemente para
controle e exigência de que os mesmos sejam cumpridos, ou no caso, exercidos.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BRASIL. Assembléia Legislativa. Constituição da República Federativa do Brasil.
Lei de 05 de outubro de 1988. Fortaleza: INESP, 1988.
________. Assembléia Legislativa. Código de Defesa do Consumidor. Lei 8078, de 11
de setembro de 1990 e Decreto nº 2181 de 20 de março de 1997. Fortaleza: INESP,
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MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 3.ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 337/338.
ONU. ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, Declaração Universal dos
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BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão Nacional de
Ética em Pesquisa. Resolução nº 196/96. Brasil 1996. Dispõe sobre pesquisa
envolvendo seres humanos. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília,
DF, v. 132, n. 155, p. 12247, Seção 1, pt. 1.