Caderno Pedagógico _Língua Portuguesa_4 série
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Caderno Pedagógico _Língua Portuguesa_4 série
CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 1 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – Maceió, julho de 2006 2 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – Governador Luis Abilio de Sousa Neto Secretário Executivo de Educação José Marcio Malta Lessa Secretário Adjunto de Educação Roberto Jorge Vasconcelos dos Santos Coordenador de Educação José Neilton Nunes Alves Gerente do Projeto Avaliação e Estudos Educacionais Maria de Fátima Santos de Lima Representante da UNESCO no Brasil Vicent Defourny Consultores Adna de Almeida Lopes Benedito Carvalho Cleyton Hércules Gontijo Eraldo de Souza Ferraz Eduardo de São Paulo Fátima Lúcia Soares Ribeiro Iracema Campos Cusati Jeanne Amália de Andrade Tavares Julio Jacobo Waiselfisz Maria José de Oliveira Maciel Wellington Rodrigues de Araújo Parceria Secretarias Municipais de Educação 3 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – Equipe técnica do PROAEE Ademir da Silva Oliveira Leni Gladis de Carvalho Brito Franco Maria de Fátima Santos de Lima Equipe de Apoio do PROAEE Irailda Santos Albuquerque Lúcia Maria Rocha Sanches Elaboração Adna de Almeida Lopes Revisores Ademir da Silva Oliveira Leni Gladis de Carvalho Brito Franco Maria de Fátima Santos de Lima Arte Benedito Carvalho Este Caderno foi produzido no contexto da Cooperação UNESCO/SEE, Projeto 914BRA1096. As opiniões expressas são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente, a visão da UNESCO sobre o assunto. 4 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 5 O ASSASSINO ERA O ESCRIBA Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente. Um pleonasmo, o principal predicado da sua vida, regular como um paradigma da 1ª conjugação. Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial, ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito assindético de nos torturar com um aposto. Casou com uma regência. Foi infeliz. Era possessivo como um pronome. E ela era bitransitiva. Tentou ir para os EUA. Não deu. Acharam um artigo indefinido em sua bagagem. A interjeição do bigode declinava partículas expletivas, conectivos e agentes da passiva, o tempo todo. Um dia matei-o com um objeto direto na cabeça. (P. Leminski, Caprichos e relaxos. São Paulo: Brasiliense, 1983.) AULA DE PORTUGUÊS A linguagem na ponta da língua, tão fácil de falar e de entender. A linguagem na superfície estrelada de letras, sabe lá o que ela quer dizer? Professor Carlos Góis, ele é quem sabe, e vai desmatando o amazonas da minha ignorância. Figuras de gramática, esquipáticas, atropelam-me, aturdem-me, seqüestram-me. Já esqueci a língua em que comia, em que pedia para ir lá fora, em que levava e dava pontapé, a língua, breve língua entrecortada do namoro com a prima. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – SUMÁRIO Apresentação ............................................................................................................ 08 Introdução ................................................................................................................ 10 A Avaliação de Língua Portuguesa realizada pelo SAVEAL ................................... 14 A Matriz de Referência de Língua Portuguesa ........................................................ 15 Análise do itens do teste de Língua Portuguesa ..................................................... 17 Texto I: O padrinho de Guilherme, de C. Drummond de Andrade ................... Item 01 – Descritor 03 ........................................................................ Item 02 – Descritor 02 ........................................................................ Item 03 – Descritor 13 ........................................................................ 17 18 19 20 Texto II: Níquel Náusea,tira de Fernando Gonsales ........................................ 21 Item 04 – Descritor 10 ........................................................................ 21 Texto III: O corvo e a raposa, de Hans Gärtner ............................................... Item 05 – Descritor 02 ........................................................................ Item 06 – Descritor 04 ........................................................................ Item 07 – Descritor 09 ........................................................................ 22 24 24 24 Texto IV: Rap da felicidade, de MC Cidinho e MC Doce ................................. 25 Item 08 – Descritor 01 ........................................................................ 25 Item 09 – Descritor 04 ........................................................................ 26 Texto V: O menino maluquinho, tira de Ziraldo ............................................... 27 Item 10 – Descritor 01 ........................................................................ 28 Item 11 – Descritor 03 ........................................................................ 29 Texto VI: Urgente! de Sérgio Caparelli ............................................................ 29 Item 12 – Descritor 03 ........................................................................ 29 Item 13 – Descritor 06 ........................................................................ 30 Texto VII: A costureira das fadas, de Monteiro Lobato .................................... 31 Item 14 – Descritor 08 ........................................................................ 32 Item 15 – Descritor 09 ........................................................................ 33 Texto VIII: Musse de chocolate do apressado, de Márcia Algranti .................. 34 Item 16 – Descritor 14 ........................................................................ 34 Texto IX: Níquel Náusea, tira de Fernando Gonsales ..................................... 35 Item 17 – Descritor 04............................................................................36 6 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – Texto X: Livro é demais, Gazeta de Alagoas ................................................... 37 Item 18 – Descritor 01 ........................................................................ 37 Item 19 – Descritor 09 ........................................................................ 38 Texto XI: Sertão, folclore e cordel, de José Costa Leite .................................. 39 Item 20 – Descritor 16 ........................................................................ 39 Item 21 – Descritor 02 ........................................................................ 40 Texto XII: As cobras, tira de Luiz Fernando Veríssimo .................................... 41 Item 22 – Descritor 06 ........................................................................ 41 Texto XIII: O pastor e seus carneiros, de Esopo ............................................. 42 Item 23 – Descritor 10 ........................................................................ 43 Item 24 – Descritor 14 ........................................................................ 43 Considerações Finais .............................................................................................. 45 Referências Bibliográficas ..........................................................................................48 7 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 8 APRESENTAÇÃO A Secretaria Executiva de Educação de Alagoas, por intermédio de sua Coordenadoria de Educação e do Projeto Avaliação e Estudos Educacionais, decidiu implantar seu sistema de avaliação educacional em 2001. Tal sistema tem como finalidade, entre outras, desenhar o perfil da realidade educacional no Estado, produzindo indicadores básicos de qualidade, capazes de direcionar políticas para o fortalecimento de escolas do sistema educacional como um todo. Uma escola fortalecida é aquela que dá conta de todos os alunos que nela entram, permitindo que esses se apropriem de um saber mais elaborado, de um conhecimento que é produzido pela humanidade e materializado nos currículos escolares. Somente de posse desse bem cultural é que esses alunos poderão utilizálo como ferramenta fundamental para usufruir os bens produzidos na materialidade da prática social. Na tentativa de construir uma escola desse tipo, esta Secretaria vem desenvolvendo algumas ações direcionadas para atingir o foco principal da reprovação e abandono. Partiu-se, inicialmente, para resolver a questão do aluno fora da escola. Foram construídas 17 e reformadas 256 escolas. Com essa medida, houve um avanço significativo no número de matrículas, com destaque para o Ensino Médio, que cresceu 325% nesses oito anos de governo. Outra ação significativa foi a expansão da avaliação do sistema educacional no Estado, com o intuito de conhecer os principais entraves que vêm causando o baixo desempenho dos alunos na educação básica. Para fortalecer essa ação, foram firmadas parcerias com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO e com Secretarias Municipais de Educação, na tentativa de realizar um diagnóstico mais abrangente da realidade educacional no Estado, ou seja, dos sistemas educativos estadual e municipais de ensino. Com base nos resultados diagnosticados, é possível planejar ações governamentais e pedagógicas significativas para a melhoria da qualidade do ensino. Entre outras ações resultantes da pesquisa, há de se destacar o programa de formação continuada de professores, planejado com ênfase nos problemas de ensino e aprendizagem detectados na pesquisa. Esses resultados estão sintetizados em relatórios, contendo a realidade educacional de cada município e região, e cadernos pedagógicos, contendo alguns princípios que orientam a prática docente, de modo que a sua leitura possibilite uma reflexão sobre o processo de desenvolvimento cognitivo dos alunos. Eles vêm sendo utilizados pelos professores e educadores em geral com o objetivo de contribuir para que os alunos evoluam do estágio de conhecimento em que se encontram para um estágio mais elevado de conhecimento. É nesse sentido que se considera de relevante importância o uso dos resultados dessa avaliação, pois não basta constatar ou conhecer a realidade como ela é, mas utilizar esses resultados no redimensionamento de práticas que não estão dando certo para outras ações que produzam os resultados desejados. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 9 Trata-se, portanto, de transformar os resultados dessa avaliação em ações significativas de intervenção para que se possam atingir os objetivos da construção de uma escola fortalecida e com qualidade. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 10 INTRODUÇÃO O marco inicial do Sistema de Avaliação Educacional de Alagoas – Saveal foi em 2001. Numa postura ousada desta Secretaria Executiva de Educação, construímos as Matrizes Curriculares de Referência em Língua Portuguesa e em Matemática. Essas Matrizes são o referencial curricular mínimo a ser avaliado em cada disciplina e série, informando os conhecimentos esperados e as competências e habilidades de cada aluno. Nelas estão contidos os descritores que orientam a elaboração de itens e expressam o desempenho discente. Naquele momento, foram avaliadas as 4ªs séries do Ensino Fundamental das escolas estaduais da capital e da 10ª Coordenadoria Regional de Ensino, compreendendo-se 86 escolas, 6.432 alunos, 209 professores, 80 diretores, 79 coordenadores pedagógicos e 2.232 pais de alunos. Em todo o processo de realização da pesquisa, contou-se com a participação efetiva de professores de todas as Coordenadorias Regionais de Ensino - CRE, desde a elaboração das matrizes e dos itens até a discussão pedagógica dos resultados, demonstrando, assim, a postura democrática que esta Secretaria mantém na execução de suas ações. O Saveal cresceu. Em dezembro de 2003, foi firmado um convênio de cooperação técnica com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, que permitiu otimizar as ações do Saveal, tendo em vista a equipe multidisciplinar de que ela dispõe para atuar na orientação e supervisão da pesquisa. As atividades principais que caracterizam essa cooperação são o apoio técnico-gerencial que responde satisfatoriamente às demandas da pesquisa, agregando-lhe conhecimento e valor com eficiência e agilidade. Em 2004, as Matrizes Curriculares foram ampliadas para a 8ª série do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio, dentro dessa mesma postura democrática de participação docente, garantindo-se a transparência do processo de avaliação do Saveal. Todos os descritores de Língua Portuguesa indicam o nível de desempenho dos alunos no que se refere à leitura. Já os de Matemática dividem-se em quatro tópicos: I – Espaço e Forma; II – Grandezas e Medidas; III – Números e Operações; IV – Tratamento da informação. A partir dessas Matrizes, foram realizadas várias oficinas para elaboração de itens de Língua Portuguesa e Matemática com o objetivo de aproximar o conteúdo e a linguagem dos testes ao cotidiano da sala de aula, contemplando estágios de construção em níveis crescentes de competências e habilidades. Foram construídos 163 itens de Língua Portuguesa, sendo 64 da 4ª e 75 da 8ª série do Ensino Fundamental e 24 do Ensino Médio, e 251 itens de Matemática, sendo 105 da 4ª e 95 da 8ª série do Ensino Fundamental e 51 da 3ª série do Ensino Médio. A fim de garantir a qualidade dos itens elaborados, procedeu-se a uma análise, observando-se a relevância do conteúdo abordado e a adequação dos mesmos aos critérios utilizados na avaliação em larga escala, além da observação de sua compatibilidade com os descritores e de sua qualidade técnica. Para que fosse garantido o sigilo e que os alunos pesquisados não tivessem acesso, esses itens foram pré-testados em 108 turmas, distribuídos em 17 escolas das redes estadual e municipal de Pernambuco, envolvendo 4.278 alunos, cujo objetivo foi a validação dos mesmos. Saliente-se, porém, que os itens da 3ª série do Ensino Médio não foram pré-testados, tendo em vista que não foram produzidos em quantidade suficiente. Os resultados obtidos foram analisados e interpretados à luz de duas teorias: Teoria Clássica do Teste – TCT e Teoria de Resposta ao Item – TRI. Os CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 11 modelos que fundamentam as duas análises se apóiam em modelos estatísticos que buscam analisar o desempenho dos alunos resultante da aplicação dos testes considerando-se os níveis de dificuldade, de discriminação e de acerto ao acaso dos itens. A TCT se apóia nas respostas dadas por todos os alunos aos itens do teste, independentemente da habilidade possuída por cada um para responder a um determinado item. A TRI, considerada uma teoria mais moderna, se apóia também nas respostas dadas pelos alunos, mas considerando que o desempenho do aluno em um teste só pode ser explicado por um conjunto de habilidades possuídas por cada um deles. Esta última permite que seja feita a análise comparativa do desempenho dos alunos entre os anos e entre as séries para se avaliar a evolução do desempenho dos alunos. Observando-se, também, que esta teoria apresenta o poder de discriminação e a dificuldade de cada item. Concluído todo o processo de análise estatística dos itens, passou-se à etapa de organização dos mesmos para implantação do Banco de Itens de Alagoas – BIAL. Em 2005, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – Saeb, do Ministério da Educação - MEC, criou a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar – ANRESC, que avaliou as escolas públicas urbanas de 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental, atendendo o critério de possuir mais de trinta alunos por série. Conseqüentemente, para que fosse atingido o universo das escolas públicas de Alagoas, o SAVEAL realizou uma pesquisa complementar à da ANRESC, avaliando 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental das escolas estaduais urbanas com mais de cinco e menos de trinta alunos por série, assim como em todas as escolas rurais. Ampliou-se essa pesquisa para as escolas de 60 municípios cujos secretários de educação aderiram ao SAVEAL, mediante Termo de Adesão, avaliando as escolas que atendessem aos referidos critérios. Foram confeccionados 08 cadernos de teste para a 4ª série, sendo 04 de Língua Portuguesa e 04 de matemática, e 12 cadernos para a 8ª série, sendo 06 de Língua Portuguesa e 06 de Matemática. Em cada um deles havia 25 itens do Banco de Itens de Alagoas – BIAL e 05 do Banco Nacional de Itens – BNI do SAEB. Concomitante à confecção desses cadernos, foram elaborados itens para questionários socioeducacionais a serem aplicados a alunos, professores, diretores, coordenadores pedagógicos e pais de alunos, destinados a investigar alguns fatores associados ao desempenho dos alunos e às políticas públicas voltadas para a Educação Básica. Para concretização da pesquisa, houve, previamente, treinamento da equipe que trabalharia na aplicação da pesquisa, a fim de que os mesmos operacionalizassem, com eficiência, todos os procedimentos pertinentes à referida pesquisa. Foram criadas as funções de coordenadores estaduais, indicados pelas Coordenadorias Regionais de Ensino – CRE, e coordenadores municipais, indicados pelas Secretarias Municipais de Educação dos municípios participantes da pesquisa, todos sob a supervisão do PROAEE. Esses coordenadores estiveram responsáveis pela seleção e treinamento das pessoas que trabalharam na aplicação da pesquisa, intitulados coordenadores de escola e coordenadores de turma. A avaliação do Sistema Educacional de Alagoas ocorreu no dia 05 de outubro. Foi atingido o quantitativo de 17.237 alunos, sendo 13.896 da 4ª série e 3.341 da 8ª série em 821 escolas. Do total de alunos, 905 são da rede estadual urbana, 1.182 da estadual rural, 1.057 da municipal urbana, 14.093 da municipal rural. Percebe-se, assim, que essa avaliação atingiu, predominantemente, escolas municipais rurais e urbanas de pequeno porte. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 12 Já os questionários foram aplicados a 17.237 alunos, 1.090 professores, 676 coordenadores pedagógicos, 581 diretores e 3.361 pais de alunos. A partir deles, foram observadas questões referentes ao nível socioeconômico, esforço acadêmico, apoio familiar, controle da trajetória escolar do aluno; formação inicial e continuada, experiência e condições de trabalho do professor; estilo de gestão, clima organizacional, disciplinar e acadêmico da escola. Para caracterização do sistema educacional de Alagoas, foram utilizados, além dos resultados dos testes e questionários, dados do censo escolar, como o movimento da matrícula e indicadores de eficiência: taxas de aprovação, reprovação, abandono, evasão, distorção idade/série, fluxo escolar e indicadores de produtividade. Foram elaborados Cadernos Pedagógicos de Língua Portuguesa e Matemática, nos quais estão contidas as análises dos descritores das Matrizes Curriculares de Referência para avaliação e análises de itens das provas aplicadas pelo SAVEAL em 2005, seguidas de sugestões pedagógicas para os professores, subsidiarão as escolas na reflexão sobre o ensino das disciplinas avaliadas. As Coordenadorias Regionais de Ensino – CREs e os municípios que aderiram ao SAVEAL, receberão relatórios sintético e analítico, onde estão contidos: a – os índices de desempenho dos alunos de 1ª a 4ª e de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental; b – índices de eficiência, no que se refere à taxa de aprovação (relacionando-se esses índices de desempenho e eficiência às médias das escolas municipais, estaduais e federais); c – pontuação da escola com sua representação em relação à média estadual; d – percentual de acertos por descritor curricular em Língua Portuguesa e Matemática nas duas séries avaliadas, que servirão de instrumento gerencial aos gestores públicos. Esses instrumentos, resultantes da Avaliação do Sistema Educacional de Alagoas permitem, que os gestores identifiquem as principais dificuldades e desafios para a operacionalização das políticas públicas educacionais com base nos resultados da pesquisa, utilizando-os no planejamento das ações governamentais para a melhoria institucional, como também no planejamento das ações pedagógicas para a melhoria na qualidade do ensino. Todavia, a adoção dessa avaliação por parte desta SEE não significa que haja alguma intenção de julgamento individual de docentes ou discentes. Não são as pessoas que são avaliadas, mas sim as estruturas, as práticas, as relações, os processos, os produtos e os recursos que constituem o saber/fazer da escola, em função dos objetivos desejados. Ela busca, sim, identificar pontos fortes e pontos fracos do sistema de ensino, com vistas respectivamente ao seu aprofundamento ou superação, sempre almejando o incremento da qualidade. Ressalta-se, ainda, que esta avaliação não se reduz ao simples levantamento de dados, sua análise e a produção de um relatório final. Ela é um processo permanente de conhecimento do sistema, a fim de alimentar o planejamento para a melhoria da qualidade. Este processo requer continuidade e regularidade, para que possibilite a comparação de dimensões e indicadores em diferentes momentos e de maneira constante. No entanto, a avaliação de sistema somente se converte em instrumento para o planejamento da melhoria da qualidade, se for desenvolvida com competência técnica, correção ética e fidedignidade dos dados e evidências utilizados. E este é o compromisso desta Secretaria e da Unesco. Espera-se, pois, que este Caderno Pedagógico de Língua Portuguesa para a 4ª série do Ensino Fundamental torne transparentes as ações de avaliação do CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 13 SAVEAL, possibilitando a criação de espaços de diálogo e reflexão sobre o ensino de Língua Portuguesa em nossas escolas. Antes da “Análise dos itens do teste de Língua Portuguesa”, será apresentada uma breve exposição sobre “A avaliação de Língua Portuguesa realizada pelo SAVEAL” e sobre “A Matriz de Referência de Língua Portuguesa”, indicando de forma abrangente seu processo de construção e o seu papel na elaboração dos itens para a avaliação. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 14 1. A AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA REALIZADA PELO SAVEAL O Sistema de Avaliação de Alagoas - SAVEAL, em todas as etapas da avaliação realizada no ano de 2005, isto é, do planejamento, realização e análise do teste de Língua Portuguesa, teve sempre como objetivo identificar o nível de desenvolvimento das competências comunicativas dos alunos, a fim de trazer subsídios para que se possam definir as prioridades do ensino da língua no estado de Alagoas. O SAVEAL pretende, nesse sentido, abranger não apenas a instância da avaliação, mas as questões relativas ao próprio ensino da língua, definindo metas a serem atingidas nos finais de cada fase do ensino fundamental (4ª e 8ª séries). Não deixa, no entanto, de constituir referências tanto para as avaliações realizadas na escola, como para a avaliação das diferentes redes de ensino, sejam dos sistemas públicos ou privados. A avaliação de Língua Portuguesa do SAVEAL contempla as competências e habilidades referentes às estratégias de leitura de diferentes gêneros e ao domínio de recursos lingüístico-discursivos na construção de gêneros textuais. Essas habilidades, entretanto, não estão desvinculadas das práticas de produção textual oral, da produção textual escrita e da reflexão sobre os aspectos formais e discursivos do uso da língua, incluídas nessas práticas de produção. Desse modo, os resultados aqui apresentados informam, indicam e evidenciam o que deve constituir prioridade no ensino de língua. São indicadores fundamentais a serem considerados pela escola, ao organizar as atividades de ensino e avaliação. Esses resultados pretendem, entre outros propósitos: orientar os objetivos da prática pedagógica; orientar a seleção de atividades a serem propostas e evidenciar as concepções de linguagem e de língua subjacentes às atividades de ensino e aprendizagem. Assim, a demonstração dos resultados da avaliação SAVEAL, destina-se a todos aqueles que promovem a educação no nosso Estado. De uma forma mais abrangente, aos gestores de políticas públicas e, mais especificamente, aos professores, aos formadores e às equipes pedagógicas das escolas, das Coordenadorias e das Secretarias Municipais. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 15 2. A MATRIZ DE REFERÊNCIA DE LÍNGUA PORTUGUESA Os testes de Língua Portuguesa foram elaborados e organizados com base numa Matriz de Referência composta por descritores que contemplam critérios ou parâmetros de avaliação, ou seja, aprendizagens imprescindíveis aos alunos da Educação Básica: os da 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e os da 3ª série do Ensino Médio. Os pressupostos teóricos e as recomendações adotadas por essa Matriz são os dos documentos oficiais: Lei de Diretrizes e Bases, Diretrizes Curriculares Nacionais, Parâmetros Curriculares Nacionais e Matrizes Curriculares de Referência do Sistema de Avaliação do Ensino Básico. Os descritores da Matriz de Referência de Língua Portuguesa/SAVEAL foram elaborados em oficinas com a participação de professores da Rede Estadual de Ensino e estão centrados, segundo o próprio documento, em dois eixos de competência: “domínio de estratégias de leitura de diferentes gêneros, e domínio de recursos lingüístico-discursivos na construção de gêneros”, incluindo “competências que permitem ao aluno realizar reflexões sobre distintos fenômenos de linguagem envolvidos no processo da significação da leitura”. Para avaliar essas competências, os itens do teste de Língua Portuguesa foram organizados em torno de uma diversidade de tipos e formatos de textos (narrativos, instrucionais, científicos, publicitários etc.). Para cada texto lido, os alunos deveriam responder uma ou mais questões, cada uma delas, no entanto, correspondente a apenas um descritor, com avaliação apenas de uma única competência. As reflexões presentes neste Caderno Pedagógico tomam como pressuposto as concepções de linguagem, língua e texto apresentadas tanto nos documentos oficiais, (parâmetros curriculares e propostas pedagógicas)1, quanto nas pesquisas atuais sobre os procedimentos didáticos para o ensino da língua materna2. É preciso destacar que os descritores definidos na Matriz de Referência constituem critérios ou parâmetros da avaliação, não podendo, portanto, serem considerados como objetivos de ensino e aprendizagem. Isto é, os conteúdos expressos pelos descritores não podem ser tomados como todas as habilidades necessárias e possíveis de serem trabalhadas com os alunos da série. Eles representam aprendizagens imprescindíveis, mas não podem coincidir com todas as expectativas de aprendizagem. Isto significaria um rebaixamento da oferta de ensino e, conseqüentemente, a não garantia de conquista das aprendizagens consideradas essenciais. A análise dos itens, apresentada a seguir, toma como base, portanto, as habilidades exigidas por cada descritor conforme definidos nessa Matriz de Referência. No entanto, na organização dos itens de Língua Portuguesa apresentamos inicialmente o texto, agrupando a ele todos os itens selecionados para análise, mesmo com descritores diferentes, evitando, assim, a dispersão de itens e/ou a repetição de textos. Cada item está antecedido pelo descritor correspondente e seguido de um quadrinho com o percentual de escolha por alternativa. Em seguida, um comentário sobre o que os resultados indicam, procurando refletir não apenas 1 Cf. Brasil (2001, 2002); Maceió (2004). Todas as referências a autores e instituições apresentadas em notas, na análise dos itens e nas sugestões para a prática pedagógica constam das Referências Bibliográficas no final deste caderno. A nossa intenção, além da questão metodológica, é oferecer sugestões de leitura e pesquisa aos professores, visando ao aprofundamento dos conceitos e procedimentos didáticos aqui adotados. 2 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 16 sobre o produto desejado, a resposta correta (o gabarito), mas também das respostas incorretas (os distratores), buscando identificar por que os alunos teriam dado as respostas que deram às situações que lhes foram propostas. Consideramos isto um ponto importante para as reflexões sobre as mudanças desejáveis nos procedimentos metodológicos relacionados ao ensino da língua. E, no final de cada bloco de itens referentes a cada texto, apresentamos algumas sugestões para uma melhor construção da competência avaliada, confirmando a idéia de que as reflexões sobre os procedimentos pedagógicos relacionados à leitura, escrita e análise lingüística não podem estar separadas quando se tem o texto como unidade básica da língua. Portanto, essa análise tem um objetivo bem definido: promover discussões sobre um diagnóstico, visando contribuir para a melhoria da aprendizagem dos nossos alunos. E as reflexões que daí possam advir só podem ser produtivas se considerarmos a avaliação como “um juízo de qualidade sobre dados relevantes para uma tomada de decisão”3. 3 Cf. Luckesi (2006). Definição dada por Cipriano Carlos Luckesi à revista Nova Escola, abril de 2006. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 17 3. ANÁLISE DE ITENS DO TESTE DE LÍNGUA PORTUGUESA Texto I: O padrinho de Guilherme O padrinho foi ao colégio, na Muda da Tijuca, e tirou Guilherme para passear. Olhos de inveja do irmão, também interno, mas sem direito a sair porque seu comportamento era do tipo que “deixa muito a desejar”. Desejar o quê — ele não sabia. Mas sabia que o irmão ia gozar a vida lá fora, o ar, as ruas, os cinemas, tudo que vale a pena, enquanto ele, Gustavo, continuaria mergulhado no mar-morto do pátio, dos corredores, do nhenhenhém cotidiano. Guilherme tinha planos para a emergência, e todos se resumiam em tirar o máximo possível da liberdade do padrinho. — O senhor me dá um presente de aniversário? — Seu aniversário é daqui a oito meses. — É, mas... — Bem, eu dou. O padrinho propôs-lhe um blusão alinhado, mas ele entendia que roupa é obrigação de pai e mãe — não vale. Livro, também não. Nas férias, aceitaria a coleção de “science-fiction”, mas em pleno ano letivo, para descanso de tanta labuta no campo da ciência e das letras, o que lhe convinha mesmo era um brinquedo bem legal. — Brinquedo? Mas você pode brincar com essas coisas no colégio? — Posso. Talvez não pudesse, mas isso eram outros quinhentos. Foram à loja de brinquedos. O problema era escolher entre o trem elétrico, o foguete cósmico, a caixa de aquarela, o equipamento de Bat Masterson, o cérebro eletrônico e outras infinitas tentações. — Vamos, escolhe — dizia o padrinho, disposto a tudo, menos a esperar. Ele comparava, meditava, decidia, arrependia-se. E como era impossível levar os brinquedos que o atraíam, pois cada qual tinha seu inconveniente, que era não ter as qualidades dos demais, repeliu a todos. — Quero aquela gaitinha. Aquela verde, ali. O padrinho fez-lhe a vontade, sem compreender. Uma bobagem de trezentos cruzeiros!* No Colégio, Gustavo queria saber. E sabendo escarneceu*: — Você é mesmo uma besta. Tanta coisa bacana para escolher, e vem com essa gaitinha mixa. (ANDRADE, Carlos Drummond de. Vozes da Cidade. Rio de Janeiro: Recorde, p. 195.) * cruzeiro: moeda usada antes do real * escarneceu: zombou; fez gozação. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 18 Descritor 03 - Inferir o sentido de uma palavra ou expressão considerando o contexto 01. “... do nhenhenhém cotidiano...”. Qual o sentido dessa expressão usada no texto? (A) (B) (C) (D) Animação do dia-a-dia. Bobagens de estudante. “Chatices” diárias. Estudos semanais. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 41,4 24,5 13,4 17,9 2,7 Espera-se, com esse descritor, que o aluno reconheça, através do levantamento de pistas oferecidas pelo contexto, o sentido de uma palavra ou expressão desconhecida. A habilidade para perceber essas pistas exige do leitor certo conhecimento de mundo que, nesse texto, possivelmente foi dificultado pela complexidade da estrutura com frases longas e pelo vocabulário que certamente não faz parte do universo semântico dos alunos da 4ª série, como por exemplo: “labuta”, “convinha”, “mixa”. O texto de estrutura narrativa é bem conhecido dos alunos das séries iniciais, tanto pela tradição escolar como pela presença no Livro Didático. Mas, a construção desse texto pode ter contribuído para a dificuldade dos alunos pela remessa a referenciais antigos principalmente nas reflexões do narrador. Para o leitor compreender bem o contexto da expressão “nhenhenhém cotidiano”, referida na consigna do item, teria que entender que ela complementa a expressão “no mar-morto” presente na primeira parte (“mergulhado no mar-morto do pátio”) mas ausente na segunda e na terceira (“dos corredores, do nhenhenhém cotidiano”). A posição elíptica dessa expressão constitui, desse modo, o paralelismo da oração e a coesão do texto. Outras pistas, tanto sintáticas (relacionadas à estrutura da oração) como semânticas (relacionadas ao sentido), apresentadas no próprio texto, poderiam favorecer a construção da inferência como, por exemplo, o estabelecimento de uma relação contrária entre a expressão “gozar a vida lá fora” e a rotina de um colégio interno. Como podemos ver, o item apresentou dificuldades à maioria dos alunos. Apenas 13,4% escolheram a alternativa correta “C” demonstrando a habilidade de inferir o significado de uma expressão desconhecida na leitura de um texto mais complexo, acionando o seu conhecimento cultural prévio. Grande parte escolheu a alternativa “A” (41,4%) levados tanto pelo desconhecimento (interpretaram como “animação”) da onomatopéia que representa a imitação de um ruído natural 4, no caso, a imitação de sons de falas conhecidas, cochichos, conversas repetidas diariamente, como pela relação de sinonímia entre os termos: “cotidiano” e “dia-a-dia”. Os 24,5% que responderam à alternativa “B” provavelmente estabeleceram uma relação com a conclusão do padrinho (“Uma bobagem de trezentos cruzeiros”) ou com o escárnio de Gustavo (“Você é mesmo uma besta”). Os 17,9% que escolheram a “D” demonstraram não ter entendido o tema do texto, como também, falta de habilidade na construção de inferências. 4 Cf. Dubois et al (1973). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 19 Descritor 02 - Localizar informações explícitas em um texto 02. “Ele comparava, meditava, decidia, arrependia-se”. Diante do problema, qual foi a solução encontrada por Guilherme? (A) (B) (C) (D) Adquirir um blusão alinhado. Comprar todos os brinquedos. Desistir da compra. Ficar com uma gaita. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 19,6 35,4 13,0 29,1 2,9 A dificuldade dos alunos na leitura do texto estende-se a esse outro item cujo descritor objetiva verificar a capacidade dos alunos de localizar uma ou mais informações presentes na superfície textual. Apenas 29,1% responderam corretamente, localizando a resposta na fala de Guilherme (“Quero aquela gaitinha”), no parágrafo seguinte. É bem provável que a dificuldade na seleção dessa alternativa tenha ocorrido pela apresentação do termo no diminutivo, uma vez que é muito comum questões de localização a que os alunos estão expostos, principalmente nos Livros Didáticos, requeiram apenas a reprodução fiel (atividade mecânica de transcrição) de termos e expressões contidos no texto, exigindo habilidades de localização ou cópia de informações. A noção de compreensão é tida, nesse caso, como a reprodução do que já está dito no texto5. Isso pode apontar para a escolha da alternativa “B” por 35,4% dos alunos que se guiaram provavelmente pela proximidade da expressão “os brinquedos que o atraíam”; da alternativa “A” por 19,6% guiados pela expressão bem marcada “O padrinho propôs-lhe um blusão alinhado”, dita alguns parágrafo atrás; e, em menor percentagem (13,0%), a escolha da alternativa “C”, baseada talvez na expressão “repeliu a todos” presente no final do parágrafo. Esses alunos não dominam, ainda, o processo de leitura de um texto considerado mais difícil. Vale insistir que a dificuldade reside principalmente no entendimento do vocabulário e da estrutura sintática dos enunciados de um texto bem elaborado e de extensão maior do que aqueles que lhes são comumente apresentados em sala de aula. 5 Cf. Marcuschi (2001). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 20 Descritor 13 - Reconhecer o efeito de sentido conseqüente do uso de sinais de pontuação (vírgula, exclamação, interrogação, etc.) e de outras notações lingüísticas (aspas, parênteses, negrito etc.) 03. “— Brinquedo? Mas você pode brincar com essas coisas no colégio?” O uso de interrogação na frase indica (A) (B) (C) (D) curiosidade e alegria. curiosidade e dúvida. dúvida e alegria. susto e felicidade. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 28,8 22,3 19,3 26,7 2,8 Este descritor requer que o leitor perceba efeitos de sentido advindos do uso da pontuação e de outras notações presentes em um texto. No caso do ponto de interrogação, esses efeitos podem se apresentar diferenciados, ultrapassando a idéia de que ele serve apenas para marcar a realização de uma pergunta. A estrutura das alternativas do item, composta de dois termos, relaciona-se, respectivamente, a cada um dos sinais de interrogação presentes no enunciado: o primeiro indica a curiosidade do padrinho diante da escolha de Guilherme, e o segundo, a dúvida sobre a permissão de se levar um brinquedo para um colégio interno. No entanto, como mostra o percentual de escolha, apenas 22,3% dos alunos estabeleceram essa relação pela resposta “B”, demonstrando competência para identificar os efeitos gerados pelo uso do ponto de interrogação que não está relacionado apenas à idéia de pergunta, conforme se apresenta na prática tradicional. Os que escolheram as alternativas “A” (28,8), “D” (26,7) e “C” (19,3%) interpretaram o enunciado, atribuindo outros efeitos (“alegria”, “dúvida”, “susto”) possíveis para o uso do sinal, mas em outros contextos. Revelaram, com isso, a pouca intimidade com a análise da relação dos sinais de pontuação e de outras notações lingüísticas, com os efeitos de sentido dos textos. Sugestões para a prática pedagógica Muitas vezes nós, professores, na seleção de textos para as práticas de leitura em sala de aula, priorizamos aqueles que não apresentam tanta dificuldade aos nossos alunos, aqueles textos “mais fáceis”, desprezando aqueles que eles simplesmente “não alcançam”. Com isso, deixamos de lado uma boa oportunidade de instaurar o desafio no processo de leitura dos nossos alunos, tendo-se em vista que uma boa situação de aprendizagem precisa ser “difícil, porém possível”. Quando se trata de um texto que apresenta dificuldades, precisamos entender os motivos dos diferentes sentidos atribuídos pelos alunos aos textos: o autor pode ter “jogado com as palavras”, o texto é difícil e confuso, o leitor tem pouco conhecimento sobre o assunto e, por isso, compreende mal. E, a partir desse entendimento, organizar o trabalho pedagógico numa perspectiva de melhoria da capacidade de compreensão e expressão (oral e escrita) dos alunos, através da prática de reflexão sobre a língua. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 21 O trabalho com a pontuação, em sala de aula, não pode estar desvinculado das habilidades de leitura e escrita, uma vez que o lugar natural e legítimo da pontuação é o texto6 e não a frase isolada de contexto e significação. A pontuação se caracteriza, desse modo, como um dos ‘recursos gráficos’ para o estabelecimento da coesão e da coerência textual7. Na escola, o ensino da pontuação não pode ser confundido com o ensino dos sinais de pontuação, pelo contrário, ele deve ser feito a partir da exploração (prática de revisão de textos) de ‘situações de pontuação’, tanto em textos impressos bem escritos, como em reflexões sobre os textos dos alunos. O importante é que a pontuação seja transformada em algo que se possa observar, através do seu funcionamento em textos. Outro ponto a considerar é que só se aprende a pontuar textos sob ‘tutoria’: observando, discutindo, analisando, praticando juntamente com quem sabe8. O papel da interferência didática é, portanto, fundamental. Texto II: (Folha de S. Paulo, 07/12/03) Descritor 10 - Estabelecer relações lógico-discursivas, marcadas por conjunções, advérbios, preposições etc. 04. A expressão “meia-noite” que aparece no texto sugere uma idéia de (A) (B) (C) (D) causa. espaço. número. tempo. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 32,8 18,6 8,9 37,5 2,2 O descritor exige a capacidade de o aluno perceber determinadas relações estabelecidas entre as informações, fatos ou argumentos de um texto. Essas relações 6 Cf. Ferreiro (1996). Cf. Silva & Brandão (2002). 8 Cf. Brasil (2001) 7 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 22 podem ser feitas por índices textuais explícitos ou implícitos, verbais ou não-verbais (o caso das histórias em quadrinhos), e tornam-se, algumas vezes, difíceis de serem feitas porque implicam o reconhecimento de uma relação lógico-discursiva estabelecida por uma palavra gramatical (chamada vazia) que só tem função efetiva e real dentro da língua estudada, diferente das lexicais ou plenas, representativas do mundo exterior9. Os 37,5% dos alunos que responderam à alternativa correta “D” demonstraram familiaridade na leitura da história que fornece pistas, em seu contexto, para a marcação do momento da enunciação (do fato ocorrido na história). Muitos alunos escolheram a alternativa “A” (32%) motivados, talvez, pelo conhecimento prévio relacionado ao imaginário popular que estabelece como inerente ao aparecimento do vampiro o fato de ser “à meia-noite”, ou seja, o vampiro só apareceu porque era meianoite, estabelecendo-se aí uma relação de causa. O alunos que escolheram “B” e “C” demonstraram pouca familiaridade com o gênero e com o levantamento dessas pistas textuais para a construção do sentido do texto. Sugestões para a prática pedagógica Para melhor desenvolver a habilidade requerida por esse descritor, qual seja, a de estabelecer relações determinadas por termos gramaticais como conjunções, advérbios e preposições é necessário realizar atividades com a língua em uso, pela conscientização dos mecanismos para um domínio ainda não adquirido pelo aluno. É muito comum encontrar, por exemplo, alunos que memorizam (para responder a uma prova) todas as preposições apresentadas pela gramática normativa, no entanto, não conseguem reconhecer na leitura de textos as relações de sentido provocadas pelas preposições. Para alcançar esse objetivo, o trabalho didático pode ser organizado visando à análise dos sentidos atribuídos a um texto em leituras individuais e em discussões dos elementos do texto que validam ou não as diferentes atribuições de sentido; e a exploração das possibilidades e recursos da linguagem, a partir da observação e análise de textos especialmente bem escritos10, uma situação didática chamada atualmente de “revisão de texto bem escrito”11 e que exige intervenções pedagógicas pontuais e de valor decisivo. Texto III: O corvo e a raposa O Senhor Corvo estava empoleirado num galho de árvore, com um pedaço de queijo no bico. Comadre Raposa aproximou-se, atraída pelo cheiro. E cumprimentou alegremente o Corvo: 9 Cf. Carvalho (1999). Brasil (2001). 11 Brasil (2002). 10 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 23 ― Bom dia, Mestre Corvo! Como você está bonito! Acho que nunca vi ave mais bela. Francamente, se a sua voz é tão formosa como a sua plumagem, você é o rei dos pássaros. Ouvindo esses elogios, o Corvo quase estourou de satisfação. E, querendo mostrar que nem mesmo uma bela voz lhe faltava, abriu o bico para cantar. O queijo caiu e mais do que depressa a raposa apanhou-o. Antes de ir saborear o petisco, disse: ― Caro compadre, aprenda que todo bajulador vive à custa de quem o escuta. Acho que esta lição vale bem um pedaço de queijo. (GÄRTNER, Hans. Fábulas de Esopo. Trad. Fernanda L. de Almeida. São Paulo, Ática, 1995.) Descritor 02 - Localizar informações explícitas em um texto 05. A raposa aproximou-se atraída pelo cheiro (A) (B) (C) (D) da árvore do corvo. das flores. do queijo. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 12,0 16,1 9,3 60,1 2,6 Com este descritor, pretende-se verificar a habilidade de o aluno localizar uma ou mais informações a partir da base textual. Uma informação explícita é encontrada quando se responde a perguntas do tipo: O quê? Quem? Onde? Como? Quando? Qual? Para quê? E a dificuldade varia de acordo com a quantidade de informações a serem localizadas, com familiaridade do leitor com o gênero textual, com o assunto tratado e com o tamanho do texto. As fábulas, por apresentarem uma estrutura narrativa simples e um vocabulário acessível, são bem compreendidas pelos alunos da 4ª série. Isto é comprovado pelo alto índice de acerto, na escolha da alternativa “C” por 60,1% dos alunos que conseguiram perceber na expressão “atraída pelo cheiro” uma característica relacionada ao termo “queijo”, referente imediatamente mais próximo. Os que responderam a alternativa “B” (16,1%) e a “A” (12,0%) podem ter sido atraídos pelos outros referentes presentes no período inicial do texto, respectivamente “Corvo” e “árvore”. Tanto esses alunos como os que fizeram a opção pela alternativa “C” (9,3%) não dominam, ainda, o processo de leitura de textos simples. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 24 Descritor 04 - Extrair informações inferenciais possíveis de um texto 06. A Raposa elogiou o Corvo para ele (A) (B) (C) (D) abrir o bico e soltar o queijo. dar-lhe um pedaço do queijo. saber que era admirado por ela. querer ser amigo dela. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 52,6 15,1 10,0 19,7 2,6 As informações inferenciais podem ser construídas pelo leitor, a partir de índices presentes na superfície textual. É essa habilidade que o descritor exigiu dos alunos. Como se pode observar, mais da metade deles (52,6%) demonstraram competência leitora e aproximação com o texto quando compreenderem o motivo dos falsos elogios da raposa. Os que responderam às alternativas “D” (19,7%), “B”(15,1%) e “C” (10,0%) não conseguiram ler nas entrelinhas a verdadeira “intenção” da raposa e foram levados, provavelmente, pelo tom amigável do diálogo. Descritor 09 - Identificar os elementos que constituem a estrutura da narrativa (narrador, personagem, espaço, tempo, conflito gerador, solução do conflito etc.) 07. Quem conta a história é (A) (B) (C) (D) o Corvo. a Comadre. a Raposa. o narrador. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 25,4 12,5 24,4 34,7 3,0 A identificação de elementos que compõem a estrutura de uma narrativa como personagem, fatos, foco narrativo e ambiente exige do leitor tanto uma familiaridade com o tema e o contexto, a exposição dos fatos, como também o conhecimento de toda uma terminologia relacionada a esse gênero textual: “leitor”, “autor”, “narrador”. O narrador é uma figura criada pelo autor para apresentar os fatos que constituem o relato, é a voz que conta o que está acontecendo12. E esta voz pode ser de diferentes pessoas, pode adotar diferentes posições, diferentes pontos de vista. Pode até parecer óbvio ou redundante solicitar ao aluno a identificação de “Quem conta a história” quando se espera como resposta “o narrador”. No entanto, esse “saber metalingüístico” integra os aspectos avaliados pelo descritor, uma vez que constituem conteúdos passíveis de serem sistematizados em 12 Kaufman & Rodriguez (1995). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 25 sala de aula, pela habilidade de leitura do texto narrativo. Os 34,7% de alunos que selecionaram a alternativa correta “D” demonstraram familiaridade com alguns elementos da narrativa. Os que assinalaram as alternativas “A”, “C” e “B” foram atraídos pelas referências às personagens no título e nos diálogos ou por outros índices presentes na superfície textual, demonstrando dificuldades de leitura e de identificação da articulação dos elementos da estrutura esquemática da narrativa. Sugestões para a prática pedagógica Para a formação de um leitor competente é necessário que se tenha como propósito formar alguém que compreenda o que lê; que aprenda a ler também o que não está escrito e que consiga validar a sua leitura a partir da localização de elementos lógico-discursivos. Esse leitor só pode constituir-se através de uma prática constante de leitura de textos reais, de diferentes gêneros, que circulam socialmente13. Trabalhar com a diversidade textual requer diferentes formas de leitura. Não se lê uma narrativa do mesmo modo que se lê uma instrução ou um aviso. Há textos que lemos para buscar informações relevantes, outros para buscar o significado implícito nas entrelinhas ou para buscar dados para a solução de um problema. Uma forma de garantir a leitura de diferentes gêneros textuais (fábulas, poemas, propagandas, notícias etc) é elaborar uma rotina semanal de atividades de Língua Portuguesa, com uma seleção e distribuição de textos e de atividades lingüísticas a eles relacionadas. Uma rotina semanal que seja referência para o planejamento das demais. É importante observar, no entanto, que o propósito de garantir a presença de vários gêneros de textos na sala de aula não implica subestimar o papel do professor: só o contato com os textos não garante a aprendizagem necessária, pois nada tem efeito mais profícuo que a interferência pedagógica eficaz14. Texto IV: Rap da Felicidade Eu só quero é ser feliz Andar tranqüilamente na favela Onde eu nasci E poder me orgulhar E ter a consciência de que o pobre tem seu lugar (Rap da Felicidade. MC Cidinho e MC Doce. Programa Um. Som Livre.) 13 14 Cf. Brasil (2001). Cf. Brasil (2000). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 26 Descritor 01 - Identificar a idéia central de um texto 08. O texto fala de pessoas (A) (B) (C) (D) ricas que vivem felizes na cidade. pobres que querem ser felizes no centro da cidade. pobres que querem ser felizes na favela onde nasceram. pobres e ricas que vivem felizes em qualquer lugar. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 17,9 14,1 46,4 19,4 2,1 O objetivo desse descritor é verificar a capacidade de o aluno construir, a partir dos recursos lingüísticos utilizados pelo autor, a idéia ou o tema central do texto. Para perceber o tema o leitor deve responder à questão: do que trata o texto? Ou, qual o assunto tratado no texto? A familiaridade com o tema, revelado na simplicidade da letra de uma música conhecida, levou, com certeza, os 46,4% dos alunos a escolherem a alternativa “C”. Eles demonstraram a habilidade de abstrair a idéia central de um texto, a partir de índices textuais (“pobre”, “favela”, “feliz”), retomados nas opções dadas pelas alternativas. Os que migraram para as outras alternativas não souberam apreender a idéia central do texto, revelando a dificuldade de ler textos poéticos considerados fáceis e de temática conhecida. Descritor 04 - Extrair informações inferenciais possíveis de um texto 09. O texto (A) (B) (C) (D) expressa um desejo. dá uma explicação. faz um comentário. faz uma pergunta. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 35,3 18,9 16,7 26,6 2,6 Igualmente ao descritor do item 06, esperou-se que os alunos demonstrassem a habilidade de construir inferências, levando em conta as marcas expressas na superfície textual. No texto em questão, essa marca está presente logo no primeiro verso, no desejo do “eu” poético: “Eu só quero é ser feliz”, levando 35,3% dos alunos a responderem à alternativa correta “A”. Pelo percentual de acerto, podemos considerar o item como de dificuldade mediana, uma vez que a maioria dos alunos buscaram outras alternativas. Para os que responderam “D” (26,6%) pode-se levantar a hipótese de terem considerado interrogativa a expressão “Onde eu nasci”, iniciada pelo advérbio interrogativo “onde”. Procedimento similar, o de buscar apoio em outras marcas textuais, foi o dos alunos que responderam às alternativas “B” (18,9%) e “C” (16,7%). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 27 Sugestões para a prática pedagógica O gênero textual que serviu de base para os comentários acima pode levar para, no mínimo, dois aspectos relacionados aos procedimentos didáticos que visem à melhoria das habilidades requeridas pelos descritores: a) o trabalho com gêneros ligados ao repertório oral da comunidade, como poemas, canções, quadrinhas, parlendas, adivinhas, trava-línguas, piadas; e, em decorrência, b) a consideração do conhecimento de mundo dos alunos para ajudá-los a compreender e a construir o sentido dos textos trabalhados em sala. Garantir um espaço para o trabalho com textos cuja temática já é do conhecimento desses alunos tornam significativas as atividades de escuta, leitura e escrita de textos, por exemplo: analisar a letra da música que vai ser ensaiada para cantarem juntos numa apresentação; ler os textos para formular suposições sobre o tema central ou para propor alternativas possíveis de interpretação. Texto V: Descritor 01 - Identificar a idéia central de um texto 10. De acordo com o texto, a panela utilizada pelo menino maluquinho indica que ele (A) (B) (C) (D) está preparando uma receita culinária. gosta de assistir às aulas de culinária quis fantasiar-se de cozinheiro. demonstra ações relativas à palavra culinária. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 24,5 26,7 27,6 18,7 2,5 Como foi dito anteriormente, a percepção do tema de um texto ocorre quando o leitor identifica alguns recursos utilizados pelo autor, entre eles, as figuras de linguagem e as exemplificações. Há, nos quadrinhos, a apresentação de palavras do CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 28 campo semântico da cozinha, destacadas em negrito em cada balão. Tanto essa marcação, como o fato de tratar-se de uma história em quadrinhos com um personagem conhecido e divulgado nos gibis, no cinema e na TV, poderia supor uma tarefa sem muita dificuldade. No entanto, pelo desempenho observado, não foi isso o que ocorreu. Apenas 18,7% dos alunos responderam à alternativa correta “D”, relacionando o termo “culinário” aos outros destacados. Os que optaram pelas demais alternativas, com percentuais aproximados, se detiveram apenas nos índices não-verbais: o visual e as expressões facial e corporal do personagem. Descritor 03 - Inferir o sentido de uma palavra ou expressão considerando o contexto 11. A expressão “eu sou fogo” indica que o menino (A) (B) (C) (D) está sempre ativo. gosta de cozinhar. provoca incêndio. queima pessoas e coisas. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 40,4 36,1 12,7 7,8 3,1 A habilidade requerida por esse descritor, diferentemente do item anterior, levou 40,4% dos alunos a escolherem a alternativa correta “A” , demonstrando que acionaram o conhecimento de mundo que possuem, uma vez que a expressão referida é de uso comum, e os índices presentes no co-texto para delimitar o sentido da expressão solicitada através da relação estabelecida entre um menino “ativo” e um menino que é “fogo”. A alternativa “B” (36,1%) foi atraente, provavelmente pela associação com as outras marcas textuais, verbais e não-verbais, relacionadas ao ato de cozinhar. Os que fizeram a opção pelas alternativas “C” e “D” não chegaram a entender o sentido figurado da expressão. Sugestões para a prática pedagógica Pelos comentários dos itens acima podemos chegar a mais uma confirmação de que a leitura de um texto não se dá apenas pelo reconhecimento de palavras ou expressões contidas na superfície textual. Os sentidos de um texto são encontrados também em níveis que transcendem a materialidade do texto15. O leitor aciona o seu repertório de saber prévio para realizar inferências, interpretando o que não está materialmente explícito, a fim de compreender o texto. Há textos que são construídos com o propósito de ‘mexer’ com esse saber prévio do leitor. As próprias histórias em quadrinhos ou títulos de notícias de revistas e jornais são exemplos de utilização desse recurso. Chamar a atenção, pesquisar e 15 Antunes (2003). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 29 analisar os tipos de enunciados cuja interpretação requeira o levantamento desse saber constitui-se em bons exercícios nas aulas de português. Texto VI: Urgente! Uma gota de orvalho caiu hoje, às 8h, do dedo anular direito, do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro Seus restos não foram encontrados A polícia não acredita em acidente. Suspeito: o Vento. Os meteorologistas, os poetas e os passarinhos choram inconsoláveis. Testemunha presenciou a queda: “Horrível! Ela se evaporou na metade do caminho!” (CAPARELLI, Sérgio. Tigres no quintal. Porto Alegre, Kuarup, 1989.) Descritor 03 - Inferir o sentido de uma palavra ou expressão considerando o contexto 12. O trecho “Ela se evaporou na metade do caminho” informa que a gota de orvalho (A) (B) (C) (D) caiu na escadaria. escorreu no Cristo. desapareceu no ar. rolou na estrada. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 22,3 37,8 18,1 20,0 1,8 O item avalia a capacidade de atribuição de sentido a uma expressão, a partir do contexto e/ou do universo temático de um poema, gênero textual que requer o uso CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 30 de procedimentos específicos tendo em vista as particularidades lingüísticas e semânticas da linguagem poética. A compreensão do jogo antropomórfico, na relação estabelecida entre gota de orvalho/ser humano, além da necessidade de conhecimentos relacionados ao processo de evaporação pode ter trazido dificuldades aos alunos, como podemos ver pelos percentuais das respostas quando apenas 18,1% acertaram ao responder a alternativa “C”. Os restantes: 37,8% que optaram pela “B” e os 22,3% que escolheram a “A”, limitaram-se a recuperar elementos literais ou explícitos (“Cristo Redentor”, “cair na escadaria”); e os 20,0% que optaram pela “D” recorreram, provavelmente, a outro tipo de relação (“metade do caminho”). Descritor 06 - Interpretar textos não-verbais ou mistos (verbais e nãoverbais) e/ou com auxílio de recursos gráficos 13. Uma parte da informação do texto é complementada pelo seu formato que é a imagem (A) (B) (C) (D) de uma gota de orvalho. de um policial. do Cristo Redentor. de um passarinho. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 31,3 16,6 35,7 14,3 2,1 O descritor requer a habilidade de atentar para os recursos gráficos apresentados em um texto a fim de levantar-lhe os sentidos. Para responder corretamente o item, os alunos teriam que observar a imagem resultante da disposição do poema na folha, um recurso muito usado pelos poetas concretistas. O índice de acertos pode ser considerado mediano, uma vez que 35,7% dos alunos responderam “C” comprovando a habilidade de leitura desse recurso no texto poético. Os que responderam “A” (31,3%) se apegaram a um índice superficial do tema do texto (“gota de orvalho”) e, igualmente aos que optaram pelas alternativas “B” e “D”, tiveram dificuldades de interpretar índices não-verbais para interagir com o texto poético. Sugestões para a prática pedagógica Demonstrar maturidade de leitor competente que apreende o contexto, fazendo inferências a partir da linguagem figurativa de um texto constitui uma habilidade a ser aprendida tanto pelo processo de imersão em textos poéticos, como por um trabalho didático mais sistematizado envolvendo o modo de funcionamento, ou seja, as particularidades lingüísticas e semânticas desses textos, como as imagens, o jogo de palavras, a musicalidade, os sentidos mobilizados. Um dos objetivos essenciais de um trabalho com esse gênero é fazer a poesia entrar na sala de aula de modo intenso, constante e significativo 16. Ela não pode ser tomada de modo simplificado apenas como pretexto para o ensino de categorias e 16 Calil (2001). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 31 conceitos gramaticais. Também não podemos fazer uma separação entre poesia “para criança” e “para adulto”. Outros objetivos podem ser sugeridos para dar sentido às propostas de leitura e produção do texto poético na sala de aula: • Resgatar a experiência dos alunos no reconhecimento das diversas formas de expressão da poesia no cotidiano • Pesquisar poemas conhecidos pelas pessoas da comunidade • Conhecer poemas consagrados da língua portuguesa • Refletir sobre as características da poesia, definindo e diferenciando conceitos como poesia, poemas, rimas, versos, estrofes • Ampliar o repertório dos alunos • Identificar o uso de recursos poéticos: rima, repetição de versos17 Texto VII: A Costureira das Fadas Depois do jantar, o príncipe levou Narizinho à casa da melhor costureira do reino. Era uma aranha de Paris, que sabia fazer vestidos lindos, lindos até não poder mais! Ela mesma tecia a fazenda, ela mesma inventava as modas. — Dona Aranha — disse o príncipe — quero que faça para esta ilustre dama o vestido mais bonito do mundo. Vou dar uma grande festa em sua honra e quero vê-la deslumbrar a corte. Disse e retirou-se. Dona Aranha tomou da fita métrica e ajudada por seis aranhinhas muito espertas, principiou a tomar as medidas. Depois teceu depressa, depressa, uma fazenda cor-de-rosa com estrelinhas douradas, a coisa mais linda que se possa imaginar. Teceu também peças de fita e peças de renda e de entremeio — até carretéis de linha de seda fabricou. — Que beleza! — ia exclamando a menina, cada vez mais admirada dos prodígios da costureira. Conheço muitas aranhas em casa de vovó, mas todas só sabem fazer teias de pegar moscas, nenhuma é capaz de fazer nem um paninho de avental... — É que tenho mil anos de idade — explicou Dona Aranha — e sou a costureira mais velha do mundo. Aprendi a fazer todas as coisas. Já trabalhei durante muito tempo no reino das fadas; fui quem fez o vestido de baile de Cinderela e quase todos os vestidos de casamento de quase todas as meninas que se casaram com príncipes encantados. (MONTEIRO LOBATO, José Bento. Reinações de Narizinho. São Paulo: Brasiliense, 1973 17 Altenfelder (2004). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 32 Descritor 08 - Estabelecer relações entre partes de um texto por meio dos principais fatores de coesão (referência, substituição, elipse, conjunção e coesão lexical) 14. A expressão que substitui o nome Narizinho é (A) (B) (C) (D) “a coisa mais linda.” “esta ilustre dama.” “uma aranha de Paris.” “a costureira das fadas.” Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 34,4 16,7 19,2 27,4 2,4 O descritor pretende verificar a capacidade de o aluno relacionar uma informação dada com outra informação nova18, através da substituição lexical, um dos recursos da língua que promove a ligação entre dois ou mais segmentos textuais, ou seja, o uso de uma palavra ou expressão no lugar de outra que lhe seja ‘textualmente equivalente’19. O número e a distância dos antecedentes no texto, como também o conhecimento do assunto e do gênero textual podem elevar o grau de dificuldade desse descritor. Esses fatores podem ter contribuído para o baixo índice de acertos quando apenas 16,7% dos alunos optaram pela alternativa “B”, relacionando o termo “Narizinho” (primeira linha do primeiro parágrafo) à expressão nominal “esta ilustre dama” (primeira linha do segundo parágrafo). As alternativas incorretas “A” (34,4%) e “D” (27,4%) apesar de apresentarem informações verdadeiras, retiradas do título e do terceiro parágrafo do texto, respectivamente, não retomam o referente em questão. A alternativa “C” (19,2%) pode ter sido escolhida pela proximidade com o referente, numa leitura apenas superficial do texto. Os alunos que escolheram essas alternativas não desenvolveram, ainda, habilidades de leitura que envolvam o domínio dos elementos de coesão presentes em todo o texto. 18 Koch (1997). Antunes (2005) subdivide o recurso coesivo da substituição em: a) substituição gramatical, realizada por pronomes ou advérbios; e b) substituição lexical, realizada por outra palavra ou expressão que lhe seja semântica ou textualmente equivalente. 19 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 33 Descritor 09 - Identificar os elementos que constituem a estrutura da narrativa (narrador, personagem, espaço, tempo, conflito gerador, solução do conflito etc.) 15. A personagem que se destaca no texto "A costureira das fadas" é (A) (B) (C) (D) o príncipe. Narizinho. Cinderela. Dona Aranha. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 15,9 21,3 15,5 45,0 2,2 O descritor avalia a capacidade de o leitor identificar, numa narrativa, elementos que compõem a sua estrutura. Os alunos desta série, geralmente, identificam com maior facilidade personagem e espaço. Isto pode ser comprovado pelo considerável índice de acertos: 45,0% dos alunos responderam à alternativa “D” numa demonstração de que são capazes de identificar personagens principais pela familiaridade com elementos da narrativa. Os alunos que selecionaram a alternativa “B” (21,3%) foram atraídos, provavelmente, ou pelo primeiro nome próprio que aparece no texto (logo na primeira linha) ou tiveram dificuldades em entender que a personagem “Dona Aranha” possui características de um ser humano e, por isto, relacionaram “costureira” à personagem “Narizinho”. Os alunos que fizeram opção pelas alternativas “A” (15,9%) e “C” (15,5%) podem ter relacionado o termo “personagem” a seres canônicos do gênero contos de fadas, mais conhecidos por eles: “príncipe” e “Cinderela” ou podem, também, não terem identificado o sentido da nomenclatura “personagem” no enunciado da questão. Sugestões para a prática pedagógica Pelo trabalho com o texto literário em sala de aula oferecemos uma rica oportunidade aos alunos de observarem o “espaço de liberdade” da linguagem, sem as restrições das normas20. É um texto que nos permite ler “para não fazer nada depois da leitura”. Mas, também, permite-nos analisar os recursos empregados pelo autor para tornar o texto bonito e agradável de ler: as imagens, a musicalidade, os jogos de palavras e símbolos que estruturam a mensagem. Uma forma produtiva de trabalho com o texto literário é através da organização didática por Projetos de Trabalho que mobilizam situações reais de leitura, escuta de leitura, produção de textos orais, estudo, pesquisa ou outras atividades que envolvam textos de um mesmo gênero. Pode-se ter como produto final, por exemplo, uma coletânea envolvendo um dos tipos de narrativas: contos de assombração ou de fadas, causos, lendas, crônicas, fábulas, etc. Os projetos favorecem o compromisso do aluno com a própria aprendizagem pelo envolvimento nas tarefas, uma vez que o objetivo é compartilhado com outros alunos. Outro ponto favorecido pelo desenvolvimento de projetos é a devida contextualização de determinadas práticas como a cópia, o ditado, a leitura em voz alta, a produção e revisão coletiva de textos. 20 Kaufman e Rodriguez (1995). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 34 A leitura literária envolve um exercício de reconhecimento das singularidades e das “propriedades compositivas que matizam um tipo particular de escrita”21. Com esses procedimentos podemos afastar certos equívocos presentes na tradição escolar, com relação ao texto literário, como os de utilizá-lo de forma descontextualizada, como pretexto para o ensino de boas maneiras, de deveres do cidadão ou de tópicos gramaticais. Os nossos alunos podem, como leitores capazes, reconhecer as sutilezas, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias. Texto VIII: Musse de chocolate do apressado Ingredientes: 1 lata de creme de leite, a mesma lata cheia de achocolatado em pó e 1 pacote pequeno de chocolate granulado. Modo de fazer: Bata no liquidificador o creme de leite com o achocolatado em pó só para misturar. Derrame a mistura em taças e polvilhe com o chocolate granulado. Leve à geladeira depois de ficar uns minutos no congelador para endurecer. Rendimento: 5 taças. (ALGRANTI, Márcia. O jogo da comida. Cozinha para adolescentes. Rio de Janeiro: Imago, 1995.) Descritor 14 - Identificar diferentes gêneros textuais (carta, poesia, notícia, propaganda etc.) 16. A finalidade do texto é (A) (B) (C) (D) anunciar um produto. contar um fato. dar uma instrução. fazer um convite. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 35,3 12,4 25,1 25,3 1,9 Para identificar um gênero textual o leitor precisa levar em conta tanto a macroestrutura (a forma, o modelo, o esquema geral), como a microestrutura (o conteúdo, o assunto, a organização interna). Para avaliar a competência leitora de textos instrucionais, que vão de receitas e manuais até regulamentos, estatutos e contratos, o item apresenta uma receita simples, de formato bem conhecido e, portanto, acessível aos alunos de 4ª série. No entanto, o desempenho não foi o esperado: apenas 25,1% dos alunos souberam identificar a finalidade da receita, respondendo a alternativa correta “C”. A maioria das respostas (35,3%) foram direcionadas à alternativa “A”, provavelmente 21 Brasil (2001). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 35 pela identificação, no texto, de termos (“creme de leite”, “achocolatado em pó”) relacionados a produtos que estão presentes também em anúncios publicitários. Os que escolheram as alternativas “D” e “B” demonstraram: a) dificuldade de identificar a função e os objetivos de um gênero de circulação social; e b) falta de familiaridade com o tipo de texto, uma vez a habilidade requerida incide diretamente em nossa atividade concreta. Sugestões para a prática pedagógica Nos últimos anos, as práticas de leitura e escrita têm se movimentado em torno da diversidade textual, orientadas tanto pelo desenvolvimento das pesquisas no campo da Lingüística Textual, que consideram o texto como o objeto de estudo das aulas de Língua Portuguesa, quanto pelo atendimento a uma demanda social que exige do cidadão a habilidade de utilizar diferentes textos, para objetivos diferentes, em diferentes situações. Uma constatação dessas mudanças pode ser vista pela diversidade textual apresentada nos livros didáticos. No entanto, para um trabalho didático que tenha a função de incorporar a criança à cultura escrita22 do grupo em que ela vive não basta a mera exposição a diferentes textos e portadores. Mesmo que o professor tente diversificar os gêneros que lê diariamente para os alunos, por exemplo, eles podem não perceber as características próprias de cada um. É preciso ter critérios e objetivos bem estabelecidos na escolha dos textos a serem trabalhados e garantir, no plano de trabalho anual, um aprofundamento em dois ou três gêneros textuais. Mas, para isso, o professor, além de ser um bom leitor, precisa dominar bem a estrutura, características, tramas e funções23 dos diferentes textos socialmente estabelecidos. Texto IX: (Folha de S. Paulo, 07/12/03) 22 Cf. Weisz (2006). Termo utilizado atualmente por pesquisadores e educadores visando evitar as divisões entre alfabetização e letramento. 23 Cf. Kaufman & Rodriguez (1995) que classificam os textos pela função (informativa, expressiva, literária, apelativa) e pela trama (descritiva, argumentativa, narrativa, conversacional). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 36 Descritor 04 - Extrair informações inferenciais possíveis de um texto 17. De acordo com o texto, é possível afirmar que (A) (B) (C) (D) o estômago do monstro roncava de fome. o abacate não satisfez a fome do monstro. o monstro estava com dor no estômago. o liquidificador foi comido junto com o abacate. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 37,5 15,6 13,9 30,2 2,9 Pretende-se, com esse descritor, que o aluno faça as inferências necessárias à construção de significados importantes no texto, descobrindo os pressupostos e subentendidos. Fazer inferências é ler o que está por trás das linhas de um texto, ou seja, por trás de determinados termos ou expressões nele presentes. Apesar de as histórias em quadrinhos serem familiares aos alunos da série, o item apresentou dificuldades à maioria deles. O índice textual para a inferência (a expressão “mas ele estava num liquidificador”) aparece como uma informação nova, no terceiro quadrinho, trazendo além de um efeito de humor, a necessidade de se levantar o pressuposto (“o monstro engoliu, também, o liquidificador”). Os alunos que optaram pelas alternativas “A” (37,5%), “B” (15,6%) e “C” (13,9%) foram atraídos pelos índices verbais e não-verbais apenas dos dois primeiros quadrinhos. Já os que escolheram a alternativa correta “D” (30,2%) demonstraram maturidade de leitor competente que, a partir do contexto, levanta as informações por meio da realização de inferências. Sugestões para a prática pedagógica Os comentários e sugestões enfatizados nos itens 06 e 09 que têm como base as habilidades de levantar informações inferenciais em um texto podem ser aqui retomados: para a formação de um leitor competente é necessário que se tenha como propósito formar alguém que compreenda o que lê; que aprenda a ler também o que não está escrito e que consiga validar a sua leitura a partir da localização de elementos lógico-discursivos. Para a compreensão satisfatória de um texto, não basta que se entenda o sentido das palavras que lá aparecem. O recurso ao contexto de uso dos enunciados é fundamental para que se chegue, além do sentido, à interpretação da intenção pretendida24. E a escola parece ter se descuidado dessa interpretação das “intenções”, ficando apenas no sentido, como se o que dizemos não carregue, além do sentido, uma intenção, uma finalidade. 24 Cf. Antunes (2003). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 37 Texto X: Livro é demais O Pedro Elias Lins aniversariou no último dia 12. Como é um sujeito legal, a turma da firma onde trabalho resolveu fazer-lhe uma surpresa, naturalmente com o apoio do patrão José Ailton Torres. Aí, salta dona Elúsia, secretária do chefão: ― O que é que a gente dá de presente pra ele? Zé Vicente, o contínuo, sugeriu: ― Dá um livro! Na hora, Zé Aílton rebateu: - Livro, não! Ele já tem um! (Gazeta de Alagoas, Maceió, 14/4/98.) Descritor 01 - Identificar a idéia central de um texto 18. O assunto do texto é (A) (B) (C) (D) a compra do presente. a festa da firma. o aniversário do chefe. o presente do contínuo. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 32,1 21,4 32,5 11,5 2,4 Espera-se, com esse descritor, verificar a capacidade de o aluno construir o tema do texto, a partir da interpretação que faz dos recursos utilizados pelo autor. Para esse procedimento, o texto deve ser considerado como um todo. O item apresenta um pequeno relato, com vocabulário de fácil compreensão para os alunos da série. Isso pode ter facilitado as respostas dos alunos que fizeram a opção pela alternativa “A” (32,1%) uma vez que interpretaram, corretamente, os recursos textuais para levantar o tema do texto. Os que escolheram a alternativa “C”, com percentual semelhante (32,5%), talvez tenham se apegado a uma possível referenciação presente na primeira fala do diálogo, numa ligação do pronome “ele” com o termo anterior “chefão”. Estes, assim como os que escolheram as alternativas “B” e “D” apresentaram dificuldades em sintetizar textos a fim de identificar a idéia central. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 38 Descritor 09 - Identificar os elementos que constituem a estrutura da narrativa (narrador, personagem, espaço, tempo, conflito gerador, solução do conflito etc.) 19. A fala “─ Dá um livro!” é dita por (A) (B) (C) (D) Dona Elúsia. Pedro Elias. Zé Ailton. Zé Vicente. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 22,4 23,4 20,0 31,1 3,1 A identificação dos elementos que compõem a estrutura de uma narrativa exige do leitor, como foi dito anteriormente (nos itens 07 e 15) tanto uma familiaridade com o tema, o contexto, a exposição dos fatos, como também o conhecimento da terminologia (“autor”, “narrador”, “fala das personagens”, etc.) relacionada à trama narrativa. Os textos nos quais predomina essa trama apresentam ações, em uma seqüência temporal ou causal, realizadas pelas personagens. E um dos recursos de uso freqüente é a introdução do diálogo entre essas personagens, apresentado com as indicações dos ‘verbos de dizer’ e dos sinais gráficos (travessão, aspas, dois pontos). Como podemos observar pelos percentuais de escolha, 31,1% dos alunos souberam identificar bem esses recursos da narrativa, quando escolheram a alternativa “D”. Já os que responderam pelas alternativas “B”, “A” e “C”, com 21,0% em média, seguiram as pistas falsas dos nomes das outras personagens do relato, demonstrando pouca familiaridade com a análise de textos narrativos. Sugestões para a prática pedagógica A leitura é uma atividade de interação entre sujeitos e vai muito além do que a simples decodificação dos sinais gráficos. O leitor, ao participar ativamente na construção dos sentidos do texto, busca recuperar, interpretar e compreender o conteúdo e as intenções pretendidas pelo autor, seguindo as “instruções” presentes na superfície textual, como determinadas expressões ou enunciados, sinais e notações. Para um trabalho didático eficiente com o texto narrativo, nós, professores, não podemos deixar de considerar pelo menos três aspectos25: • 25 Uma leitura de textos autênticos – textos com autor, com data de publicação, inseridos em um portador. Os diferentes portadores (jornais, livros, revistas, enciclopédias, dicionários, atlas, cartazes, etc.) precisam estar presentes na sala de aula, uma vez que neles se encontram socialmente os gêneros escritos. Cf. Antunes (2003) que aponta doze aspectos das implicações pedagógicas que envolvem a leitura de textos. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 39 • Uma leitura do todo – da dimensão global do texto, desenvolvendo habilidades que levem o aluno a identificar o ‘eixo’ que dá sustentação ao texto, a identificar a idéia central, a finalidade, a orientação ideológica. • Uma leitura apoiada no texto – com atenção dada às pistas que o texto apresenta, isto é, aos recursos de textualização (repetições, substituições) que estabelecem os nexos coesivos entre termos, enunciados e parágrafos, fundamentando as interpretações. A leitura de um texto deve sempre está apoiada nessas pistas, mesmo que elas estejam apenas sugeridas. Texto XI: Sertão, folclore e cordel O sertão é terra boa Se o ano é bom de inverno Tudo fica mais contente Mais bonito e mais moderno Porém quando o ano é seco O sertão vira um inferno. Cordel é folheto em versos Como Manuel Riachão, Zezinho e o Dragão, Os aventureiros da Sorte, José de Souza Leão. Folclore quer dizer um Conjunto de tradições Crença popular que cita Provérbios, contos, canções E se espalha no mundo Por diversas regiões. No sertão vê-se o folclore No cheiro do cumaru Na sombra do juazeiro Na cachaça com caju No “chiar” do carro de boi E no pé de mandacaru. (LEITE, José Costa. Sertão, folclore e cordel. Recife, Condado, 1991.) Descritor 16 - Reconhecer o efeito de sentido de recursos decorrentes da exploração de recursos prosódicos (onomatopéia, rimas ou outros recursos expressivos) 20. As palavras “inverno”, “moderno” e “inferno”, presentes na primeira estrofe, são usadas para marcar (A) (B) (C) (D) as estrofes. as rimas. o tema. os versos. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 22,2 26,3 16,1 33,2 2,2 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 40 O descritor exige dos alunos uma leitura voltada para o reconhecimento dos recursos prosódicos e dos efeitos gerados por eles na construção dos sentidos do texto poético, o que implica o acesso a toda uma nomenclatura: rimas, versos, estrofes, quadras, etc. Espera-se que os alunos, na 4ª série, já tenham adquirido essa habilidade pela imersão no gênero e pela participação em atividades didáticas desde a 1ª série. O percentual de escolha mostra, no entanto, que a maioria dos alunos, os que escolheram as alternativas “D” (33,2%), “A” (22,2%) e “C” (16,1%), não conseguem diferenciar a estrutura desses recursos, denunciando a pouca intimidade com a análise dos efeitos de sentido por eles gerados. Os alunos que acertaram a resposta requerida, pela escolha da alternativa “B” (26,3%), demonstram que são capazes de reconhecer os efeitos desses recursos no texto poético. Descritor 02 - Localizar informações explícitas em um texto 21. De acordo com o texto, os elementos citados pela crença popular são (A) (B) (C) (D) carro de boi e mandacaru. cumaru, juazeiro e caju. os aventureiros da Sorte. provérbios, contos e canções. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 39,8 19,0 16,8 22,1 2,4 Esse descritor pretende verificar, conforme discutido também nos itens 02 e 05, a habilidade de o aluno localizar uma ou mais informações a partir da base textual. A dificuldade dessa tarefa pode variar de acordo com a quantidade de informações a serem localizadas, da familiaridade do leitor com o gênero textual, com o assunto tratado e com o tamanho do texto. Para localizar a informação solicitada, os alunos, após uma leitura geral do poema e da questão proposta onde está localizada a pista “crença popular”, deveriam retornar ao ponto em que se encontra o contexto frasal (versos 3 e 4, da 2ª estrofe). Esse processo foi realizado pelos alunos que escolheram a alternativa “D”, 22,1%, numa demonstração de que souberam encontrar informações de fácil localização no texto. Os alunos que optaram pelas alternativas “A” (39,8%, “B” (19,0%) e “C” (16,8%) não conseguiram seguir a pista apresentada na consigna, atendo-se a outras informações presentes na base textual. Sugestões para a prática pedagógica As sugestões para o trabalho com o tratamento da informação presente em textos de diferentes gêneros foram discutidas nos itens 02 e 05. Por isso nos deteremos, aqui, na apresentação de alguns procedimentos para um trabalho produtivo com o texto poético, já experienciados em sala de aula. Para tornar o texto poético agradável, bonito e emotivo, os poetas se utilizam de diferentes recursos como, por exemplo, rimas, aliterações, metáforas, jogos de CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 41 palavras, estruturação visual. Observar e conhecer esses recursos levam os alunos a valorizarem a criatividade e a originalidade, desligando-se de temas, palavras e versos estereotipados, repetidos e banalizados. Convém ressaltar que as atividades devem estar inseridas num contexto de intenso contato com o texto poético, através de diferentes procedimentos de leitura: individual, coletiva, do professor para os alunos, dos alunos para os colegas e para a escola. Assim, para sensibilizar os alunos na identificação e no uso dos recursos poéticos, o professor pode realizar atividades de: • observação da organização das rimas em diferentes tipos de poemas; • observação de repetições, sonoridade e sinestesia em poemas; • complementação de rimas e de estruturas de poemas conhecidos (decalques, paráfrases); • produção de quadras e acrósticos; • reconhecimento de diferentes formas de poemas, como quadras, cordel, soneto. Texto XII: Descritor 06 - Interpretar textos não-verbais ou mistos (verbais e nãoverbais) e/ou com auxílio de recursos gráficos 22. Analisando o terceiro quadrinho, podemos afirmar que a cobrinha (A) (B) (C) (D) estava pensando contra o quê protestar. desconhecia como protestar contra os pais. questiona se vale a pena protestar. tinha certeza contra o que protestar. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 39,0 22,0 12,6 23,6 2,8 CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 42 O item permite avaliar se o aluno é capaz de construir os significados de um texto, relacionando e complementando informações de fontes verbais e não-verbais. O texto em foco é uma historieta (uma tira), geralmente apresentada em jornais e utilizada com muita freqüência nos livros didáticos. Os alunos, de uma forma geral, demonstram familiaridade com essas histórias, pela combinação texto escrito/ilustração. É o que podemos constatar pelos índices apresentados: 39,0% dos alunos escolheram a alternativa correta “A” demonstrando que souberam interpretar tanto o que está dito (o discurso direto das personagens, nos balões) quanto o não-dito (a ausência de balões, no terceiro quadrinho). Os que assinalaram as alternativas “D” (23,6%) e “B” (22,0%) interpretaram o vazio de texto verbal no quadrinho como atitudes de certeza ou desconhecimento da personagem, desconsiderando o contexto. Também os que optaram pela alternativa “C” (12,6%) provavelmente não dominam as estratégias de leitura das histórias em quadrinhos. Sugestões para a prática pedagógica As histórias em quadrinhos, pela combinação da imagem plana com o texto escrito, e os elementos verbais e icônicos, auxiliam no trabalho didático com leitores ainda não proficientes. Isto exige, no entanto, a sistematização do conhecimento de uma série de recursos próprios do gênero como o uso de símbolos icônicos convencionais (corações para o amor, estrelinhas para os efeitos de um soco, raios, cobras e lagartos para insultos) para expressar a ironia, a zombaria, o duplo sentido, o enfoque humorístico26. A leitura desses textos em sala de aula, através do acionamento de estratégias de leitura para a construção das idéias pretendidas pelo autor, e a análise dos recursos utilizados por ele, contribuirão, com certeza, para a melhoria das habilidades de interpretação de textos com o auxílio de elementos gráfico-visuais. Texto XIII: O pastor e seus carneiros Um pastor levou seus carneiros para uma floresta de carvalhos. Sob uma enorme árvore cheia de frutos, ele estendeu seu casaco. Depois subiu para sacudi-la e assim os frutos cairiam. Mas os carneiros comeram indistintamente as bolotas e o casaco. Quando desceu, vendo o que tinha acontecido, o pastor exclamou: ― Suas bestas, aos outros vocês dão sua lã para abrigá-los, a mim que lhes dou o sustento, vocês destroem até o casaco! Muita gente, sem se dar conta, serve a desconhecidos e faz mal aos que lhes são próximos. (ESOPO 550 a.C. Fabulas de Esopo.Trad. Antonio Carlos Vianna. Porto Alegre: L&PM, 1997. p.157.) 26 Cf. Kaufman & Rodriguez (1995). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 43 Descritor 10 - Estabelecer relações lógico-discursivas, marcadas por conjunções, advérbios, preposições etc. 23. No trecho “Depois subiu para sacudi-la e assim os frutos cairiam.” A palavra destacada dá idéia de (A) (B) (C) (D) causa lugar modo tempo Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 35,9 24,1 13,9 23,9 2,2 Com esse descritor pretende-se avaliar a capacidade de o aluno perceber determinadas relações estabelecidas entre as informações, fatos ou argumentos de um texto. Essas relações, no entanto, não podem ser feitas simplesmente pelo conhecimento lexical isolado (a classe gramatical do termo), mas pelo reconhecimento de uma relação lógico-discursiva, a partir dos índices textuais explícitos ou implícitos no texto. O gênero textual (fábula) apresentado no item possui uma macroestrutura já conhecida pelos alunos da série e, além disso, está muito presente nos livros didáticos. Os alunos que escolheram as alternativas “A” (35,9%), “B” (24,1%) e “C” (13,9%) podem ter sentido dificuldades pelo desconhecimento de parte do léxico ou pela sintaxe um tanto rebuscada. Apenas 23,9% responderam à alternativa correta “D”, demonstrando compreender a relação temporal estabelecida pelo advérbio, na leitura de um pequeno texto narrativo. Descritor 14 - Identificar diferentes gêneros textuais (carta, poesia, notícia, propaganda etc.) 24. O texto “O pastor e seus carneiros” é (A) (B) (C) (D) uma carta contando o que os carneiros fizeram com o casaco. uma fábula que ensina uma lição de moral a partir de um fato. uma notícia de um fato que ocorreu com o pastor. um poema sobre a vida do pastor e seus carneiros. Percentual de escolha por alternativa (%) A B C D Em branco 27,0 18,9 15,5 35,7 2,9 O descritor pretende avaliar a competência leitora de um gênero textual específico, no caso, uma fábula. Para demonstrar essa competência, os alunos precisam reconhecer tantos aspectos gerais da narrativa, como características mais específicas da narrativa fabular. Como outros textos narrativos, a fábula apresenta três momentos diferenciados: começa apresentando um estado inicial de equilíbrio; segue com o CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 44 aparecimento do conflito; encerra com uma reflexão sobre o episódio, no caso, a ‘moral da história’. No entanto, possui aspectos peculiares como o pequeno tamanho do texto, a inclusão de animais como personagens, o objetivo de dar um ensinamento. Os alunos tiveram dificuldades no reconhecimento desses aspectos. O maior percentual (35%) foi o da alternativa incorreta “D”, provavelmente porque relacionaram o enunciado da alternativa com o título do texto (“O pastor e seus carneiros”). Do mesmo modo, os 27,0% que escolheram a alternativa “A” podem ter se equivocado pela identificação do termo “contando” (contar algum fato, narrar) presente no enunciado da alternativa e os que escolheram a “C” (15,5%) também podem ter se apegado ao enunciado da alternativa. Apenas 18,9% dos alunos escolheram a alternativa correta “B”, demonstrando a habilidade de reconhecer as características de uma fábula. Sugestões para a prática pedagógica O gênero textual fábula, pela sua estrutura narrativa ‘condensada’ com poucas personagens e rápido encaminhamento dos fatos, tem o seu uso já firmemente estabelecido nas práticas de escuta, leitura e escrita de projetos escolares e livros didáticos. Gostaríamos de enfatizar, aqui, no entanto, as possibilidades de um trabalho sistemático, de observação e análise dos fatos lingüísticos que tanto enriquecem essas pequenas histórias, em atividades já experienciadas por professores27. Entre essas possibilidades, destacam-se os procedimentos de a) seleção do fato lingüístico a ser estudado e b) transgressão desse fato, no texto, a fim de evidenciá-lo para as atividades de exploração. Ou seja, o pequeno texto sofre uma determinada alteração na sua estrutura formal ou sintático-semântica, por exemplo: retirada dos sinais gráficos de acentuação ou pontuação, desordenamento dos parágrafos, grafia incorreta de alguns termos. As atividades são, então, discutidas em pequenos grupos ou coletivamente, mas sempre com as intervenções precisas do professor. Essas atividades tomam como base conceitos e procedimentos adotados por pesquisadores28 que enfatizam a necessidade de os fatos da língua serem tratados como objetos do conhecimento e que o ensino das categorias gramaticais só ganham sentido quando contextualizados pelo texto, lugar por excelência do encontro dos alunos com os aspectos formais da língua escrita. 27 28 Cf. Lopes (2004). Cf. Morais (1998); Bagno (1998); Calil (1999); Lopes (2005). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 45 CONSIDERAÇÕES FINAIS Queremos retomar aqui alguns pontos destacados no início deste Caderno Pedagógico e perpassados, de alguma forma, em todas as sugestões apresentadas após os comentários dos itens de cada texto selecionado do teste de Língua Portuguesa. Esses pontos estão relacionados ao trabalho com a diversidade, a seleção e a utilização de textos na sala de aula. A recomendação dos Parâmetros Curriculares Nacionais29 para o trabalho com a diversidade de textos é justificada pela análise do papel da escola na promoção do desenvolvimento das capacidades dos alunos de: utilizar diferentes linguagens como meio para expressar e comunicar suas idéias, interpretar e usufruir das produções da cultura; e utilizar a língua portuguesa para compreender e produzir mensagens orais e escritas, em contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicação. Esses objetivos amplos determinam os conteúdos que devem ser trabalhados. Se, na escola, o aluno deve aprender a utilizar linguagens variadas em distintos contextos, é preciso desenvolver um intenso trabalho com os diferentes gêneros, tanto para a compreensão como para a produção de textos. Isso implica levar em conta determinados critérios, ao selecionar os conteúdos: para desenvolver a capacidade de uso eficaz da linguagem, é preciso trabalhar com todas as atividades lingüísticas – escutar, ler, falar e escrever. Portanto, os conteúdos básicos são escuta, leitura, escrita, e revisão de textos, comentados a seguir: a) Práticas de escuta de texto – que podem ser feitas tanto pelo professor (tido como modelo de leitor para os alunos), por outros adultos escolarizados (pai, mãe, vizinhos, irmãos) e, também, pelos alunos, em leituras orientadas e com finalidades específicas, evitando-se, assim, a leitura “em voz alta” sem nenhuma função, como tradicionalmente é vista. b) Práticas de leitura de textos – sejam de diferentes gêneros (narrativo, poético, teatral) e de diferentes formas (silenciosa, compartilhada) para diferentes propósitos (para diversão, para guardar na memória, para contar a outros etc.). Contanto que a função de ler, tradicionalmente atribuída apenas aos alunos, em sala de aula, seja também prática constante do professor, modelo de leitor que lê junto com os alunos, em determinadas atividades; lê para os alunos, em outras, mostrando-se, em todas as situações, um leitor compulsivo e ávido para formar outros leitores. c) Práticas de escrita de textos – nas chamadas práticas de escrita estão contempladas diferentes categorias didáticas de produção textual (BRASIL, 1998) dentre elas: a transcrição (copiar um poema ou um conto), a reprodução (reescrever uma fábula), ambas adotadas como formas de conservação de textos de diferentes autores e tipos, com a finalidade, por exemplo, de organização de uma coletânea. Estão inseridos, aqui, os propósitos 29 Cf. Brasil (1998). CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 46 de: copiar para guardar, para não esquecer, para ler depois, para mostrar a alguém, entre outros objetivos de um leitor; no decalque (fazer um requerimento ou parodiar uma letra de música) as questões formais já estão em parte definidas uma vez que preservam boa parte da estrutura formal do texto modelo, permitindo a concentração apenas no que se tem a dizer; e na autoria (inventar uma história ou criar um poema) está envolvida a complexa tarefa de criação em que o sujeito precisa articular os planos do conteúdo (o que dizer) e os planos da expressão (como dizer). d) Práticas de revisão de textos – a articulação das práticas de leitura, produção escrita e reflexão sobre a linguagem (e mesmo de comparação entre linguagem oral e escrita) pode ser feita pelas atividades de revisão de texto, um conjunto de procedimentos por meio dos quais um texto é trabalhado até que se considere, para o momento, suficientemente bem escrito. Revisar um texto pressupõe a existência de rascunhos sobre os quais se trabalha, produzindo alterações que afetam tanto o conteúdo como a forma. O procedimento de revisão é aprendido por meio da participação do aluno em situações coletivas de revisão do texto escrito, bem como em atividades realizadas em parceria, e sob a orientação do professor, que permitem e exigem uma reflexão sobre a organização das idéias, os procedimentos de coesão utilizados, a ortografia, a pontuação etc. A revisão de texto, como situação didática, exige que o professor selecione em quais aspectos pretende que os alunos se concentrem de cada vez, pois não é possível tratar de todos ao mesmo tempo. Ou bem se foca a atenção na coerência da apresentação do conteúdo, nos aspectos coesivos e pontuação, ou na ortografia30. Trabalhar com a diversidade de textos em todas as séries escolares não significa deixar de definir os objetivos e as prioridades do ensino em cada série. Como se costuma dizer, muitas vezes o tudo é o nada: tentar trabalhar com tudo pode significar não garantir nada muito significativo em termos de aprendizagem. Por outro lado, o propósito de garantir a presença de vários gêneros de texto na sala de aula não implica subestimar o papel do professor: só o contato com os textos não garante a aprendizagem necessária, pois nada tem efeito mais profícuo que uma intervenção pedagógica eficaz. E isso não é possível sem um planejamento cuidadoso do trabalho. É fundamental que a equipe de educadores da escola, principalmente por ocasião do planejamento anual, defina coletivamente os objetivos e os conteúdos específicos de cada série. Quanto à seleção para o uso dos textos em sala de aula podemos considerar 31 que : nas situações em que o professor faz a leitura, praticamente todo texto é adequado, pois o professor atua como mediador entre o texto e os alunos. Mas se o texto se destinar à leitura feita pelos próprios alunos, é preciso considerar a capacidade deles de compreender o texto de forma autônoma, condição para qualquer pessoa se dispor a ler um texto inteiro. Já se a situação for de produção do texto, então as possibilidades se restringem um pouco mais, pois não se pode produzir bem textos com os quais não se tenha familiaridade. E ficam um pouco mais restritas quando se trata de produzir 30 31 Cf. Brasil (2001). Orientações dadas por Rosaura Soligo, publicadas em “Cadernos da TV Escola” MEC/1999. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 47 textos por escrito, isto é, escrever textos; isso requer a coordenação de procedimentos complexos relacionados tanto com o planejamento do que se pretende expressar quanto com a própria escrita. É importante observar, também, a distinção entre produzir textos e produzir textos por escrito, pois são dois processos diferentes. É possível produzir um texto oralmente, mesmo sem saber ainda escrevêlo de próprio punho. Garantir a diversidade de textos não significa propor aos alunos que desenvolvam todos os tipos de atividade com todos os tipos de texto. É preciso ter critérios de seleção considerando, por exemplo: a complexidade do gênero; o nível de dificuldade da atividade em relação ao gênero; a familiaridade dos alunos com o gênero; a adequação do conteúdo do texto à faixa etária; a importância do gênero em função de determinados projetos de trabalho. Nesse sentido, não se pode definir a priori uma seqüência completa de textos e atividades: em cada escola, a discussão coletiva da equipe de educadores indicará os critérios mais adequados de seleção e as maneiras de organizar e seqüenciar o trabalho com diferentes tipos de texto. Esperamos, portanto, que os dados e as reflexões presentes neste Caderno auxiliem esse trabalho coletivo. CADERNO PEDAGÓGICO – LÍNGUA PORTUGUESA – 4ª SÉRIE – 48 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTENFELDER, Anna Helena, (2004). Poetas da escola. Coordenação técnica Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. São Paulo: Petrópolis. ANTUNES, Irandé, (2003). Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola Editoria, (Série Aula; 1). _____, (2005) Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial, – (Na ponta da língua; v. 13) BAGNO, Marcos, (1998). Pesquisa na escola: o que é como se faz. São Paulo: Loyola. BRASIL, (2000). Programa de desenvolvimento profissional continuado: alfabetização. Brasília: SEF/MEC. BRASIL, (2001). Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portuguesa. Brasília: SEF/MEC. BRASIL, (2001). Guia de orientações metodológicas gerais – Programa de Formação de professores Alfabetizadores. Brasília: SEF/MEC. BRASIL, (2002). Relatório do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica/Saeb 2001: Língua Portuguesa. 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