Decisão Medida Cautelar na Reclamação 23.656 DF

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Decisão Medida Cautelar na Reclamação 23.656 DF
MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO 23.656 DISTRITO FEDERAL
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ADV.(A/S)
INTDO.(A/S)
PROC.(A/S)(ES)
: MIN. DIAS TOFFOLI
: LUÍS CLÁUDIO LULA DA SILVA
: CRISTIANO ZANIN MARTINS E OUTRO(A/S)
: JUIZ FEDERAL DA 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL
DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL
: SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
: PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
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RELATOR
RECLTE.(S)
ADV.(A/S)
RECLDO.(A/S)
DECISÃO:
Vistos.
Cuida-se de reclamação constitucional ajuizada por Luís Cláudio
Lula da Silva em face do Juiz Federal da 10ª Vara Federal Criminal da
Seção Judiciária do Distrito Federal, cujo ato comissivo teria afrontado a
autoridade do Supremo Tribunal Federal e o que decidido na Súmula
Vinculante nº 14.
Alega a defesa do reclamante na sua inicial, que a autoridade
reclamada, “em relação ao pedido de quebra de sigilo nº 006070993.2015.4.01.3400, vem impossibilitando o acesso ao feito aos defensores
do Reclamante desde 10.12.2015.” (grifos do autor)
Esclarece, ainda, que,
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pre
“após nova provocação (...), o Reclamado deferiu acesso
somente ao teor da promoção do Ministério Público Federal e à
decisão que decretou a quebra proferida em medida cautelar de
afastamento de sigilo bancário, fiscal e telemático (cf. Doc. 07).”
(grifos do autor).
Na sua visão, a autoridade reclamada não poderia “selecionar o
material a que o Reclamante deva ter acesso, como está ocorrendo no
vertente caso, à toda evidência. A defesa do Reclamante deve ter acesso a
todos os atos já formalizados nos autos da referida medida cautelar.”
(grifos do autor)
Por esse contexto entende que “a reiterada decisão do Reclamado,
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de denegar acesso à integra dos documentos já formalizados no pedido
de quebra de sigilo n. 0060709-93.2015.4.01.3400 contraria frontalmente a
Súmula Vinculante n. 14 (...)” (grifos do autor)
Requer o deferimento da liminar para o fim de conceder acesso aos
defensores do Reclamante à integralidade dos autos da Medida Cautelar
n. 0060709-93.2015.4.01.3400 e a todos os feitos correlatos (…)” (grifo do
autor).
No mérito, pede a procedência da ação para, confirmada a liminar
requerida,
“cassar ato do MM. Juiz Federal da 10ª Vara Criminal
Federal que denegou o acesso ao procedimento acima referido,
permitindo que a defesa do Reclamante tenha acesso integral a
todos os atos – passados, presentes e futuros – que estejam
documentados nos autos do pedido de quebra de sigilo nº.
0060709-93.2015.4.01.3400 e feitos correlatos, fazendo prevalecer
a autoridade da Súmula Vinculante n. 14” (grifos do autor).
Im
pre
Determinei a emenda da inicial, por ausência de indicação do valor
da causa, o que foi atendido, bem como, nos termos do art. 157 do RISTF,
solicitei informações à autoridade reclamada, que foram devidamente
prestadas.
É o relatório.
Decido.
Em informações encaminhadas a este Supremo Tribunal, o Juízo da
10ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Distrito Federal, além de
relatar o histórico do processo de investigação em andamento contra o
reclamante, esclareceu que
“[s]empre atento ao que determina a Súmula 14 dessa
Suprema Corte brasileira, ressalto apenas que os autos em
questão ainda estão em fase de processo investigatório, e que
por esta razão existem diligências que ainda não foram
concluídas, razão pela qual há decisões que indeferem
pedidos de vista que podem tumultuar a atrasar a conclusão
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do inquérito policial” (Petição/STF nº 26575/16 – grifei).
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Em juízo cognição de sumária, assento que razão assiste em parte ao
reclamante.
As referidas informações do juízo reclamado demonstram que, aos
defensores do reclamante, devidamente amparados por procuração, foi
negado acesso ao procedimento investigativo no qual foi decretada a
quebra de seus sigilos fiscal, bancário e telemático, ao fundamento de
Im
pre
eventual comprometimento da eficácia das diligências em curso nos autos
daquele procedimento que tramita em caráter sigiloso, bem como pelo
suposto risco de “tumultuar a atrasar a conclusão do inquérito policial”.
Sem razão, contudo.
De início, registro que o caráter inquisitivo do procedimento, que em
princípio mitiga a incidência das garantias do contraditório e da ampla
defesa, postergada para futuro processo penal, não afasta de todo o
arcabouço de direitos fundamentais titularizados pelo investigado,
inclusive aquele que lhe garante o amparo de defensor técnico, nos
termos do art. 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal.
Ademais, esta Suprema Corte já afirmou anteriormente a
essencialidade do acesso por parte do investigado aos elementos
probatórios formalmente documentados no inquérito para o exercício do
direito de defesa, ainda que o feito seja classificado como sigiloso.
A esse respeito, destaco o HC nº 94.387/RS, no qual o Relator,
Ministro Ricardo Lewandowski, destacou que
“o acesso aos autos de ações penais ou inquéritos policiais,
ainda que classificados como sigilosos, por meio de seus
defensores, configura direito dos investigados, bem como ‘a
oponibilidade do sigilo ao defensor constituído tornaria sem
efeito a garantia do indiciado, abrigada no art. 5º, LXIII, da
Constituição Federal, que lhe assegura a assistência técnica do
advogado’ (Primeira Turma, DJe 6/2/09).
Perfilhando esse entendimento:
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“DIREITO
DE
DEFESA
GARANTIA
CONSTITUCIONAL
REGIME
DE
SIGILO
INOPONIBILIDADE A ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO
INDICIADO OU PELO RÉU - ACESSO AOS AUTOS PRERROGATIVA DO PROFISSIONAL DA ADVOCACIA CONSEQÜENTE POSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO
DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS,
PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS
AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL, EXCETUADOS AQUELES
EM CURSO DE EXECUÇÃO. - A pessoa que sofre persecução
penal, em juízo ou fora dele, é sujeito de direitos e dispõe de
garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ
168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não
autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se
acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre,
por parte do Estado, atos de persecução criminal. - O sistema
normativo brasileiro assegura ao Advogado regularmente
constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de
persecução estatal) o direito de pleno acesso aos autos de
persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a
regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se,
no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e
formalmente incorporadas ao procedimento investigatório,
excluídas, consequentemente, as informações e providências
investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo,
não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial.
Precedentes. Doutrina” (HC nº 93.767/DF, Segunda Turma,
Relator o Ministro Celso de Mello, DJe 1º/4/14 – grifei);
“I. Habeas corpus: inviabilidade: incidência da Súmula
691 ('Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de
'habeas corpus' impetrado contra decisão do Relator que, em
'habeas corpus' requerido a Tribunal Superior, indefere a
liminar').
II. Inquérito policial: inoponibilidade ao advogado do
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indiciado do direito de vista dos autos do inquérito policial.
1. Inaplicabilidade da garantia constitucional do
contraditório e da ampla defesa ao inquérito policial, que não é
processo, porque não destinado a decidir litígio algum, ainda
que na esfera administrativa; existência, não obstante, de
direitos fundamentais do indiciado no curso do inquérito, entre
os quais o de fazer-se assistir por advogado, o de não se
incriminar e o de manter-se em silêncio.
2. Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado interessado primário no procedimento administrativo do
inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do
advogado de acesso aos autos respectivos, explicitamente
outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV),
da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas
- não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a
irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da
prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os
interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer
impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade.
3. A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma
garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe
assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto,
a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá
prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre
o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.
4. O direito do indiciado, por seu advogado, tem por
objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito,
não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de
diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações
telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe,
em consequência a autoridade policial de meios legítimos para
obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu
defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à
eficácia do procedimento investigatório.
5. Habeas corpus de ofício deferido, para que aos
advogados constituídos pelo paciente se faculte a consulta aos
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autos do inquérito policial e a obtenção de cópias pertinentes,
com as ressalvas mencionadas” (HC nº 90.232/AM, Primeira
Turma, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 2/3/07 –
grifei).
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Importante destacar que a possibilidade de frustração da
investigação criminal foi levantada nos debates da sessão que aprovou a
Súmula Vinculante nº 14, tanto que se fez constar do enunciado a
limitação do acesso aos elementos já devidamente formalizados nos autos
do procedimento. Ressalto, por oportuno, excerto do voto do Ministro
Cezar Peluso no referido julgamento:
Im
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“(...) duas coisas devem ser distinguidas nos inquéritos
policiais: uma coisa são os elementos de provas já
documentados. Quanto a estes elementos de prova já
documentados, não encontro modo de restringir o direito dos
advogados em defesa dos interesses do cliente envolvido nas
investigações. Outra coisa são todos os demais movimentos,
atos, ações e diligências da autoridade policial que também
compõem o inquérito. A autoridade policial pode, por exemplo,
proferir despacho que determine certas diligências cujo
conhecimento pode frustrá-las; a esses despachos, a essas
diligências, o advogado não tem direito de acesso prévio,
porque seria concorrer com a autoridade policial na
investigação e, evidentemente, inviabilizá-la” (PSV nº 1/DF,
Relator o Ministro Menezes Direito, Tribunal Pleno, DJe
27/3/09).
Nesse contexto, independentemente das circunstâncias expostas pela
autoridade reclamada, é legitimo o direito de o reclamante ter acesso
àqueles elementos de prova devidamente documentados nos autos do
procedimento em que é investigado.
Como bem asseverou o Ministro Celso de Mello, no julgamento do
HC nº 127.483/PR, Tribunal Pleno, de minha relatoria,
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“a prova penal, uma vez regularmente introduzida no
procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas
integra os autos do respectivo inquérito ou processo,
constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos
quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de
persecução penal por parte do Estado.
(...)
É por tal razão que se impõe assegurar ao Advogado, em
nome de seu constituinte, o acesso a toda informação já
produzida e formalmente incorporada aos autos da
investigação penal em causa, mesmo porque o conhecimento do
acervo probatório pode revestir-se de particular relevo para a
própria elaboração da defesa técnica por parte do interessado”
(DJe 4/2/16 – grifei).
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pre
Ante o quadro, presentes os elementos necessários e firme na
jurisprudência da Corte, defiro a liminar para assegurar ao reclamante,
nos autos do Processo nº 0060709-93.2015.4.01.3400, que tramita na 10ª
Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Distrito Federal, o acesso e a
extração de cópias daqueles documentos e informações, objeto de
diligências devidamente cumpridas, que lhe digam respeito e que já
foram formalmente encartados aos autos.
Excluem-se desta determinação aquelas providências investigatórias
ainda em andamento.
Comunique-se, solicitando informações.
Após, abra-se vista a Procuradoria-Geral da República.
Publique-se.
Brasília, 25 de maio de 2016.
Ministro Dias Toffoli
Relator
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