Resumode políticas

Transcrição

Resumode políticas
Resumo de políticas
Parceria
África Canadá
Junho 2008
Este resumo de políticas
é baseado num estudo
realizado em 2008 por
Estelle Agnes Levin com
Ansumana Babar Turay,
comissionado pela
Parceria África Canadá.
O estudo completo está
disponível no site:
www.ddiglobal.org e
www.pacweb.org.
Cooperativas Artesanais de
Diamantes na Serra Leoa:
Sucesso ou Fracasso?
De Setembro de 1999 a Dezembro de 2007,
a Management Systems International (MSI)
foi contratada pela USAID para gerir o seu
programa IDMP (“Integrated Diamond
Management Programme” - Programa de
Gestão de Diamantes Integrado) de 6,5 milhões de dólares americanos, e a sua aliança
PDA (“Peace Diamond Alliance” - Aliança
Diamantes da Paz) na Serra Leoa. O projecto tinha como objectivo formalizar e
racionalizar o sector artesanal, e aumentar
o benefício para as comunidades locais.
Na Serra Leoa, a mineração artesanal de
diamantes é tradicionalmente feita pelos
proprietários das terras ou pelos arrendatários, empregando “escavadores”
sazonais ou ocasionais. No sistema mais
comum de produção, os “escavadores” trabalham em troca de auxílio (refeições, acomodação, tratamentos básicos de saúde e
outros “benefícios”), com direito a uma
porção dos “lucros” quando são encontrados diamantes.
manutenção da paz e para o desenvolvimento do país;
• Contornar do apoio aos “intermediários”, que se acredita serem
responsáveis pelo contínuo contrabando
e pelas ligações a organizações criminosas e terroristas;
• Capacitação dos “escavadores” de diamantes para se tornarem economicamente independentes e capazes de diversificar os seus meios de subsistência;
• Condensação da cadeia de fornecimento
para que uma porção maior do valor
internacional dos diamantes alcance o
nível do produtor;
• Encorajamento do auto-policiamento,
que pode prevenir o roubo, diminuir o
contrabando, aumentar os lucros do governo, para além de trazer uma maior
organização para o sector.
O projecto incluía um plano de compra, um
plano de financiamento, e um plano para o
diamante em bruto desde a mina até à
As cooperativas de diamantes foram o
veículo responsável pelas tentativas
de alcançar mudanças
no mercado, legislação
Trinta e cinco cooperativas foram registadas
e autonomia dos
junto da PDA no Distrito Kono, mas apenas
mineiros através de:
cinco puderam ser financiadas. A recuperação
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• Racionalização da
total no final da temporada de 2005 foi de
produção artesanal
320 pedras pesando 60,37 quilates, com um
(menos
unidades
valor total de 4.390 dólares americanos.
com uma melhor
fororganização;
mação para uma mineração responsável,
exportação. O plano era o de operar por
métodos e tecnologias eficientes);
dois períodos sazonais de mineração com
uma visão orientada para que as cooperati• Criação de oportunidades para os jovens,
vas se tornassem auto-sustentáveis nesse
extremamente importantes para a
período.
Cada cooperativa teria entre 50 e 70 pessoas, predominantemente jovens, com um
quadro de membros ampliado, incluindo
alguns importantes intervenientes comunitários como, por exemplo, “chefes” e
pelo menos dois mineiros experientes. No
plano de compra, as cooperativas venderiam directamente a compradores internacionais respeitáveis, contornando os tradicionais “intermediários” e permitindo que
uma maior porção do valor internacional
seja paga ao nível do produtor.
O mecanismo de financiamento seria
baseado num fundo de empréstimo rotativo. A USAID tinha colocado de parte
522.000 dólares americanos para este
propósito, mas foi exigida uma avaliação
ambiental (AA). Foram necessários catorze
meses para que a AA fosse organizada,
sujeita a concurso e realizada, altura em
que o período sazonal de mineração já
estava em curso. A AA concluiu que o
plano de crédito era impraticável, assim a
USAID abandonou o fundo de empréstimo
rotativo. Ciente da demora e preocupada
com o facto de que o atraso das cooperativas por um ano levaria a uma desilusão e a
uma perda de ímpeto, a MSI procurou
financiamento privado para as cooperativas. Um empresário norte-americano
investiu 55.000 dólares americanos e um
outro investiu 20.000 dólares americanos
no plano.
Trinta e cinco cooperativas foram registadas junto da PDA no Distrito Kono, mas
apenas cinco puderam ser financiadas. A
recuperação total no final da temporada de
2005 foi de 320 pedras pesando 60,37
quilates, com um valor total de 4.390
dólares americanos. A qualidade dos diamantes foi baixa, numa média de 72,74
dólares americanos por quilate em comparação com a média nacional de 200
dólares americanos. Os dois investidores
recuperaram um total de apenas 4.400
dólares americanos.
O projecto teve várias consequências socioeconómicas positivas para os escavadores:
acesso a emprego; acesso a tratamento
médico adequado; estatuto social melhorado e um sentimento de dignidade entre os
mineiros; geração de rendimento para mulheres no âmbito do fornecimento de
serviços de apoio; e aumento no rendimento familiar, permitindo que os mineiros
atendessem às necessidades educativas dos
seus filhos, e à reforma e construção de
casas. Estes benefícios para os membros
devem ser vistos, contudo, em relação às
metas do projecto, e aos baixíssimos lucros
dos investidores, facto que conduziu ao
cancelamento do projecto.
Olhando em retrospectiva, houve muitos
problemas.
Problemas de concepção
• Premissa errada: que os patrocinadores e
os intermediários são o problema e que
devem ser erradicados. Alguns escavadores demonstraram a sua relutância
em abandonar os seus vínculos com os
patrocinadores que forneciam assistência política e financeira extremamente
importante, de forma ocasional, em
épocas de dificuldade. Tentar erradicar o
sistema de apoio sem alternativas foi
ingénuo e provavelmente fútil.
• Apenas mais um plano de apoio? A retirada dos fundos da USAID significou que
o plano de financiamento era, na verdade, muito semelhante a um sistema de
apoio financeiro tradicional. A maior
semelhança foi a obrigação de reembolsar o investidor com diamantes em vez
de reembolsá-lo com dinheiro. Isto significava que as cooperativas eram obrigadas a vender a uma pessoa, em vez de
vender a quem quisessem. O plano apenas transferiu as obrigações dos
mineiros de um financiador conhecido
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DE POLÍTICAS
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para um que estes não conheciam.
• Complexidade. O projecto era demasiado
complexo, com tantas políticas e procedimentos que alguns tiveram que ser
ignorados para que o plano fosse viável.
• A rigidez do orçamento significava que
as cooperativas não poderiam usar os
fundos de forma flexível para enfrentar
os desafios à medida que estes surgiam.
• Local errado? As cooperativas poderiam
ter tido mais sucesso no “Tongo Field”,
onde o sistema de posse de terra é diferente daquele do Distrito Kono, onde a
PDA tinha assegurado acesso a 10 acres
de terra virgem, e onde havia demonstrado resultados na recuperação ambiental e na redução do trabalho infantil.
• Financiamento inadequado. Os orçamentos da cooperativa, destinados a
actividades artesanais sem qualquer
mecanização, eram ridiculamente
baixos, e não apresentavam qualquer
margem para contingências.
• Critérios de selecção inadequados. A
exigência de que as cooperativas
tivessem pelo menos 50 membros não
tinha muito sentido. Os critérios de
selecção foram desenvolvidos unilateralmente pelo primeiro Coordenador do
Projecto e as cooperativas não tiveram a
capacidade de os interpretar ou a oportunidade de os alterar.
Factores de implementação
• Terra inviável. As cooperativas reclamaram que lhes foram distribuídas terras
economicamente inviáveis.
• Falta de experiência em mineração. Não
foram utilizados geólogos ou engenheiros em mineração para guiar a implementação ou prospecção.
• A corrupção de alguns oficiais do governo, oficiais do IDMP/PDA e de membros
da cooperativa levou à manipulação e
uso indevido dos fundos.
• Monitorização inadequada.
• Um pobre fluxo de informações entre as
cooperativas e a PDA/IDMP comprometeu a confiança e resultou em que alguns
assuntos não tenham sido resolvidos de
forma rápida.
Momento
• Atrasos na contratação para a AA, formação, avaliação do projecto global, e as
extensões a curto prazo da USAID (seis
ou nove meses de cada vez) limitaram o
planeamento e implementação eficazes
e afectaram o moral.
• A retirada do financiamento por parte da
USAID para o fundo de empréstimo rotativo significou que meios alternativos de
financiamento tiveram de ser encontrados rapidamente, minando a viabilidade
do programa e as suas hipóteses de
sucesso.
• Início tardio, chuva precoce. O financiamento chegou três meses após o início
do período de mineração com duração
facto que aumentou os custos.
• Prazo curto. Teria sido impossível que o
plano alcançasse os seus objectivos em
dois anos, quanto mais em um ano,
tempo que em última instância lhe foi
dado para a sua realização.
Factores internos
• Cooperativas fracas. As cooperativas não
foram democráticas; os membros executivos foram seleccionados de acordo com
o estatuto social e não por mérito; havia
pouco entendimento e as relações entre
os membros eram desiguais e injustas. A
produção era semelhante a sistemas
tradicionais, com os grupos de trabalhadores mais jovens, liderados por membros mais velhos e mais poderosos da
comunidade.
• Expectativas irreais. De ambos os lados.
• Uma mentalidade paternalista. As cooperativas propuseram como objectivo ajudar os membros a sair da dependência
em rumo à independência. Em vez disso,
o esforço global não foi mais do que um
projecto de ajuda de pequeno porte.
• Poucas capacidades. Algumas cooperativas tiveram muita dificuldade em organizar orçamentos e em
registar informações
sobre os diamantes
É vital que as agências implementadoras
encontrados. Os memreconheçam o compromisso a longo
bros da cooperativa
prazo necessário para se obterem
não entendiam os procooperativas harmoniosas e
cedimentos básicos das
produtivas assim como
cooperativas, como os
sistemas sólidos de
empréstimos seriam
monitorização.
reembolsados ou como
os ganhos seriam
repartidos.
de 6 a 8 meses. As chuvas também
• Pobreza? Muitos membros apresentaram
começaram antes do previsto, forçando
relutância ou incapacidade de contribuir
algumas cooperativas a alugar bombas,
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financeiramente para a cooperativa; o
que quer dizer que não havia uma posse
partilhada.
• Roubo. O roubo não deveria ter sido
encarado com surpresa num local onde a
confiança, um sentimento de dever e de
potencial futuro não tiveram tempo para
se desenvolver, e onde alguns trabalhadores não eram pagos.
Conclusões
O projecto cooperativo da PDA atraiu muita
atenção por parte das organizações e
empresas interessadas no conceito de diamantes e jóias “éticas”. Uma pioneira entre
esses, a PDA foi a primeira a tentar modificar a estrutura da mineração artesanal de
diamantes.
As suas principais falhas foram que as
cooperativas encontraram pouquíssimos
diamantes, perderam dinheiro e sofreram
devido à corrupção. As principais razões
estavam relacionadas com uma preparação
sócio-cultural inadequada, pontos fracos
no âmbito da implementação e da concepção, prospecção e exploração inadequadas, atrasos dos contribuidores e a retirada de apoio para o fundo de empréstimo
rotativo num momento crítico do desenvolvimento do projecto.
A experiência da PDA, contudo, não
demonstra que o modelo cooperativo é
inviável. As cooperativas podem vir a
provar serem apropriadas para mineração
artesanal de diamantes, mas têm de ser
introduzidas com a devida atenção à sua
concepção, ritmo, posse, formação, gestão,
orçamento e avaliação. É vital que as agências implementadoras reconheçam o compromisso a longo prazo necessário para se
obterem cooperativas harmoniosas e produtivas assim como sistemas sólidos de
monitorização.
Recomendações
importantes
• Desenhar o projecto de forma a ser mais
simples possível, preferivelemente com
base na formalização de práticas existentes. Procurar orientação junto das
organizações com sólida experiência
cooperativa.
• Reforçar a capacidade nos domínios de
organização democrática, de responsabilidade, de responsabilização, de direitos e de gestão.
• Garantir que as linhas directrizes e procedimentos adequados estejam implementados e que sejam entendidos em
todos os níveis.
• Capacitar membros da cooperativa para
gerirem as suas próprias actividades e
finanças; garantir que mecanismos disciplinares e de resolução de conflitos
claros estejam implementados por forma
a assegurar a responsabilização.
• Fornecer assistência e formação no
âmbito de técnicas de mineração responsáveis e produtivas.
• Fornecer financiamento adequado e em
tempo útil, e um orçamento de contingência, para além de outras contribuições financeiras e materiais por
parte dos membros.
• Estar apto a mecanizar a produção, se os
depósitos de diamantes assim o exigirem, e a mecanizar a lavagem, caso
isto possa minimizar o roubo.
• Escolher terras para mineração com bom
potencial. Explorar cientificamente.
• Garantir um sistema de monitorização
sólido. Monitorizar o sistema de monitorização.
• Gerir as expectativas através da comunicação, do escutar e da re-comunicação.
Garantir que a informação chega até aos
níveis mais baixos.
• Encorajar e permitir a busca de meios
alternativos e suplementares de subsistência para auxiliar quando os preços
diminuem ou quando não são encontrados diamantes.
• Fazer perguntas vitais: Quem é o dono?
Quem decide? Quem controla? Os mem-
bros são compatíveis? Os objectivos dos
membros são compatíveis com os objectivos dos gestores do projecto? Como
serão evitadas as dependências externas? Como se pode evitar que os interesses de pessoas poderosas mine a cooperativa?
Dadas as circunstâncias nas quais se
realizaram as tentativas das cooperativas
da PDA, talvez não seja surpreendente que
o projecto não tenha tido êxito. Pessoas de
fora, quer seja doadores, empreendimentos
comerciais ou governamentais têm de apresentar novas iniciativas de forma responsável, com base em experiência do que se
realizou anteriormente, tendo cuidando
para não convencer pessoas que enfrentam
circunstâncias difíceis e frágeis a aderir a
esforços pobremente concebidos que
podem afectar os seus meios de vida. Neste
sentido, a experiência da PDA tem muitas
lições a oferecer.
Para mais informações sobre a chave para
cooperativas de sucesso, consulte
www.dgrvsa.co.za,
www.ica.co-op,
www.yebocoop.co.za e
www.ilo.org
Sobre a DDI Internacional
A DDI é uma organização internacional sem fins lucrativos que tem por objectivo reunir todas as partes interessadas num processo que irá abordar, de um modo abrangente, os desafios políticos, sociais e económicos enfrentados pelo sector de mineração artesanal de diamantes, com vista a
optimizar o impacto do desenvolvimento benéfico da mineração artesanal de diamantes para os mineiros e para as suas comunidades, no seio dos
países onde ocorre a extracção dos diamantes.
Um dos principais objectivos é atrair organizações e investimentos sólidos de desenvolvimento para as áreas de mineração artesanal de diamantes,
por forma a encontrar formas de tornar o programa de desenvolvimento mais eficaz, e auxiliar a levar o sector informal de mineração de diamantes
para a economia formal.
Mais informações sobre a DDI Internacional podem ser encontradas na Internet em www.ddiglobal.org, e podemos ser contactados através do email: [email protected].
Sobre a Parceira África Canadá
A Parceria África Canadá (PAC) realiza iniciativas de diálogo de investigação e de política que visam combater problemas relacionados com direitos humanos, segurança humana e desenvolvimento sustentável que afectam África. O programa mais importante da PAC lida com a extracção de
recursos naturais e com a segurança humana. A PAC participa no trabalho do Processo Kimberley, é membro de vários dos seus comités e ajuda a
coordenar a participação da sociedade civil neste. Outros programas incluem auxílio à participação da sociedade civil no Mecanismo de Revisão por
Pares Africano - um programa para fortalecer a governação em África - e apoio a programas de sociedade civil para prevenir a violência contra mulheres na República Democrática do Congo e a promover a biodiversidade no Oeste da África.
Mais informações sobre a PAC podem ser encontradas na Internet em: www.pacweb.org ou escrevendo um e-mail para [email protected]
Publicado pela A iniciativa diamante e desenvolvimento e Pa rceria África Canadá, 600 – 331 Cooper St., Ottawa, Ontario, K2P 0G5, Canadá
DDI RESUMO
DE POLÍTICAS
• Junho 2008
ISSN 1918-1337