fatores relacionados ao refazimento das
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fatores relacionados ao refazimento das
XXIV ENANGRAD EGC - Empreendedorismo e Governança Corporativa FATORES RELACIONADOS AO REFAZIMENTO DAS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS DAS COMPANHIAS BRASILERAS DE CAPITAL ABERTO Silvio Aparecido Teixeira Leandro Politelo Roberto Carlos Klann Florianópolis, 2013 ÁREA TEMÁTICA: EMPREENDEDORISMO E GOVERNANÇA CORPORATIVA - EGC FATORES RELACIONADOS AO REFAZIMENTO DAS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS DAS COMPANHIAS BRASILERAS DE CAPITAL ABERTO RESUMO A informação contábil constitui um dos elementos utilizados pelo mercado de capitais para análise de investimentos, razão pela qual se prima pela qualidade destas informações. Esta pesquisa objetiva identificar os motivos relacionados ao refazimento das demonstrações contábeis das companhias brasileiras de capital aberto. A pesquisa descritiva é realizada com base na análise de conteúdo de 39 deliberações da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre refazimento de demonstrações contábeis. A análise dos motivos de refazimento compreende o período de 1995 a 2012. Os resultados da pesquisa indicam que o setor de consumo não cíclico possui o maior número de casos de refazimento. Os anos de 2006 e 2008 apresentaram maior incidência de refazimento. No caso de 2008, tal fato pode estar relacionado à introdução das normas internacionais de contabilidade no Brasil. Os resultados indicam ainda que boa parte das demonstrações analisadas que foram objeto de refazimento tiveram parecer ou relatório da auditoria independente sem ressalva ou parágrafo de ênfase. Conclui-se que a adoção das normas contábeis internacionais impactaram no aumento de casos de refazimento no período de 2008 a 2012. Além disso, é necessária uma atuação mais ativa das empresas de auditoria independente para alertar o mercado de incoerências presentes nas demonstrações contábeis por meio de seus relatórios de auditoria. Palavras-chave: Refazimento. Auditoria. Demonstrações contábeis. ABSTRACT The accounting information is a key element used by the capital market for investment analysis, reason that press for the quality of this information. This research aims to identify the reasons related to the restatement of financial statements of publicly traded Brazilian companies. Descriptive research is conducted based on content analysis of 39 resolutions of the Brazilian Securities Commission (CVM) on restatement of financial statements. The analysis of the reasons for redoing covers the period 1995-2012. The survey results indicate that the consumer staples sector has the largest number of cases remake. The years 2006 and 2008 had a higher incidence of remake. In the case of 2008, this fact can be related to the introduction of international accounting standards in Brazil. The results also indicate that most of the statements that were analyzed object remake had opinion or report of the independent auditors was unqualified or emphasis of matter paragraph. It is concluded that the adoption of international accounting standards impacted the increasing cases of remake in the period 2008-2012. Moreover, it is necessary a more active of the independent auditors to alert the market inconsistencies present in the financial statements through its audit reports. Keywords: Remake. Audit. Financial statements. 1 INTRODUÇÃO A evidenciação de informações contábeis das empresas encontra-se no cerne dos objetivos da contabilidade. A finalidade da contabilidade encontra-se em fornecer informações de forma sistemática aos seus diversos usuários, que inclui gestores, investidores, clientes, fornecedores, governo, a sociedade em geral, entre outros, como financiadores e colaboradores (DANTAS et al., 2005; PEREZ JUNIOR, 2007; HOSS et al., 2008). A importância da contabilidade pode ser verificada em sua evolução, que se deu de acordo com as necessidades que seus usuários detinham em relação às informações relativas aos seus bens, assim, foi-se identificando que tipo de informação deveria ser passada a cada pessoa. Em decorrência disto, pode-se entender que o objetivo da contabilidade é gerar informações que sejam úteis e relevantes para seus usuários (HOSS et al., 2008). A diversidade de usuários das informações contábeis demonstra a importância de sua evidenciação. Isto posto, pode-se entender que “através desse meio de comunicação, a contabilidade consegue atingir seu objetivo principal” (MALACRIDA; YAMAMOTO, 2006, p. 2). Dessa forma, todos os eventos que afetem, ou que possam vir a afetar a situação patrimonial, econômica e financeira de uma dada entidade, devem ser evidenciados. A importância da evidenciação contábil é clara, visto que concerne na finalidade da contabilidade. Porém, diversas pesquisas, como Murcia e Santos (2009), Tonetto Filho e Fregonesi (2010) e Krüger e Borba (2011) demonstram um baixo nível de evidenciação contábil pelas empresas brasileiras, corroborando com as conclusões de Dantas et al. (2005), de que há diversos estudos que destacam os benefícios do disclosure contábil para as empresas, e, em contraponto, há uma relutância das empresas em aumentar o nível de disclosure. Há situações em que as organizações enviesam ou omitem suas informações, prejudicando, desta forma, os seus usuários (MURCIA; BORBA, 2005). Neste ponto, destaca-se a importância da presença da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como órgão regulador e fiscalizador que possui, dentre suas atribuições, o poder de exigir a republicação e o refazimento de demonstrações contábeis (DANTAS et al., 2011). Neste contexto, apresenta-se a questão problema deste estudo: quais os fatores relacionados ao refazimento das demonstrações contábeis das companhias brasileiras de capital aberto? Assim, o objetivo desta pesquisa é identificar os fatores relacionados ao refazimento das demonstrações contábeis das companhias brasileiras de capital aberto. Este estudo se justifica pelo fato das demonstrações contábeis, conforme Dantas et al. (2011), fornecer aos diversos usuários informações sobre a situação patrimonial e financeira, bem como o fluxo financeiro das empresas, servindo de apoio em suas decisões. Assim, a determinação de refazimento e republicação das demonstrações contábeis deveria ser evitada, de modo a manter a sua integridade. Segundo Schipper (2003), a utilidade da informação financeira no processo decisório é vista apenas se atender a determinados requisitos, como a relevância, apresentação adequada, verificável, neutra, não enviesada, comparável e confiável. Este último requisito relaciona-se intrinsecamente com as republicações e refazimentos das demonstrações contábeis. A relevância desta pesquisa encontra-se no fato de que os temas refazimento e republicação são poucos estudados no contexto brasileiro (MURCIA; BORBA, 2005; NETTO; PEREIRA, 2010), apesar de ser abordado de forma mais concisa no âmbito internacional, como nas pesquisas de Richardson, Tuna e Wu (2002), Palmrose, Richardson e Scholz (2004) e Plumlee e Yohn (2010). 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Discute-se no referencial teórico o contexto em que surge a importância da evidenciação contábil e sua atual relevância perante o mercado de capitais, por conseguinte, as republicações e o refazimento das demonstrações contábeis. Abordam-se ainda os poderes atrelados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e os impactos destas práticas (refazimento e republicação) às empresas, além dos resultados de pesquisas relacionadas ao tema deste estudo. 2.1 Evidenciação contábil A informação apresenta-se como um instrumento de grande relevância em qualquer área do conhecimento, inclusive no campo dos negócios, em que se destacam as de natureza contábil, de modo que aqueles que as possuem e as utilizam de forma adequada obtém um diferencial competitivo (DANTAS et al., 2011). Conforme Hoss et al. (2008), a importância da contabilidade se deu em virtude do controle que realizava das riquezas da humanidade. A contabilidade foi evoluindo de acordo com as necessidades de cada pessoa, aos poucos foi identificando que tipo de informação deveria ser passada para cada indivíduo. Em decorrência disto, entende-se que o objetivo da contabilidade é gerar informações que sejam úteis e relevantes para as organizações. Tratando-se do papel desempenhado pela evidenciação ou disclosure, pode-se afirmar sua relação direta com os objetivos da contabilidade (DANTAS et al., 2005; HOSS et al., 2008), ou mesmo entendê-la como seu principal objetivo (MALACRIDA; YAMAMOTO, 2006). Entretanto, para que as demonstrações contábeis sejam consideradas úteis para tomada de decisões por parte de seus usuários (objetivo da contabilidade), devem conter informações necessárias para uma adequada análise e interpretação da situação econômico-financeira da organização (DANTAS et al., 2011). Na visão de Schipper (2003), para que a informação financeira possa ser considerada útil para fins decisórios, deve ser relevante, ou seja, influenciar significativamente na decisão deve ser confiável, fornecer dados adequados e representar adequadamente a condição econômico-financeira da empresa; ser verificável e neutra; não deve ser enviesada, a fim de não comprometer a análise e; deve ser comparável, permitindo uma análise ampla da organização. Dantas et al. (2005) entendem que, para que se atinja a divulgação apropriada, que é o objetivo a que se propõe a evidenciação, é preciso que se responda as questões do tipo: a) “para quem evidenciar”, em que se deve atentar qual o público que fará uso das informações; b) “o que evidenciar”, ou seja, com base nos usuários, apresentar apenas informações que sejam úteis; c) “quanto evidenciar”, atrelada à quantidade de informações, que dependerá de fatores como a sofisticação do leitor, complexidade das informações, entre outros; d) “quando evidenciar”, relacionada ao conceito de oportunidade de comunicação, ou seja, em que momento a informação se faz necessária e; e) “como evidenciar”, atrelado ao método de evidenciação que proporcione um entendimento claro das informações. Apesar de serem questões aparentemente simples, suas respostas não são encontradas com tamanha facilidade. Iudícibus (2009) afirma que cada tipo de usuário tem uma forma de interpretar, ou seja, não se pode identificar exatamente que tipo de informação cada um quer extrair ou avaliar. O autor destaca ainda que a decisão sobre o que é útil ou não para a tomada de decisões é muito difícil de ser avaliada na prática, pois exige um estudo profundo dos modelos decisório de cada tipo de tomador de decisão. Para Hendriksen e Van Breda (2007), a divulgação das demonstrações financeiras está ligada ao grau de interesse econômico das empresas. À medida que sua dependência por capital de terceiros aumenta, há uma tendência a uma divulgação financeira condizente com o mercado financeiro no qual a empresa pretende captar recursos. Neste aspecto, com o objetivo de atender a necessidade dos usuários externos, a Lei 6.404/76, que trata das Sociedades por Ações, determina um conjunto de informações que devem ser fornecidas pelas empresas de capital aberto. Sendo assim, a contabilidade financeira é responsável por fornecer as demonstrações contábeis que deverão exprimir com clareza a situação do patrimônio da companhia e as mutações ocorridas no exercício – balanço patrimonial, demonstrações dos lucros ou prejuízos acumulados, demonstrações do resultado do exercício, demonstrações do fluxo de caixa, demonstrações do valor adicionado e informações suplementares por meio do relatório da administração e das notas explicativas. Verifica-se também a importância de um órgão regulador, no que se refere à divulgação de informações pelas empresas. Os órgãos reguladores assumem papel importante para garantir uma evidenciação justa e apropriada, ao disciplinarem o processo de divulgação, especificando o que, como e quando divulgar. No Brasil, esse papel regulador é desempenhado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) (DANTAS et al., 2011). Ainda assim, com a presença de órgãos reguladores e leis regulamentando a divulgação das informações contábeis, nem todos os interessados nas informações de uma determinada organização possuem a mesma quantidade de informações a despeito desta empresa. Nestes casos, quando há disparidade quanto às informações detidas pelas partes envolvidas com uma empresa, ocorre a assimetria informacional, que pode ser utilizada por uma das partes em seu beneficio e em prejuízo da outra parte. Sendo assim, para garantir a qualidade e integridade da informação contábil da empresa, a auditoria das demonstrações contábeis tem um papel importante de proteger e dar credibilidade ao investidor (NIYAMA; SILVA, 2009). Perez Junior (2007, p. 24) declara que “a auditoria independente de demonstrações contábeis tem por objetivo certificar a adequação das informações lá constantes, em face dos princípios fundamentais de contabilidade e das práticas contábeis em vigor no Brasil”, indo além da simples verificação de contas, estando também ligada a parte interna da empresa, onde orienta, interpreta e prevê fatos. A auditoria independente atinge maior relevância ao apresentar seu relatório, em que expressa sua opinião a despeito das demonstrações contábeis que examinou (ATTIE, 2010). Assim, pode-se afirmar que a função do auditor é atestar a situação patrimonial e financeira espelhada nas demonstrações contábeis de uma entidade. Para Attie (2010, p.74) “a emissão dos pareceres (atualmente denominados relatórios) reflete o entendimento do auditor acerca dos dados em exame, de uma forma padrão e resumida que dê aos leitores, em geral, uma noção exata dos trabalhos que realizou e o que concluiu”. Assim, entende-se que o parecer de auditoria tem influência em relação aos seus usuários, pois proporciona segurança de que as demonstrações estão isentas de erros, que poderiam comprometer futuras decisões. Destaca-se também, conforme Murcia e Borba (2005), que apesar da atuação da auditoria independente e da fiscalização exercida pela CVM nas empresas que compõem o mercado de capitais brasileiro, há empresas que omitem ou divulgam informações de forma enviesadas de modo que a intervenção da CVM faz-se necessária, exigindo, em determinados casos, o refazimento e republicação das demonstrações contábeis. 2.2 Refazimento das demonstrações contábeis O desenvolvimento das atividades executadas pelos auditores é crucial para a emissão de uma opinião profissional sobre a qualidade das informações contábeis fornecidas aos interessados na realidade econômica e financeira de uma organização. Mesmo sujeito a aspectos subjetivos, notadamente a visão de um usuário da informação é a de que a opinião da auditoria independente expressa confiança da realidade econômica e financeira da empresa auditada (DAMASCENA; FIRMINO; PAULO, 2011). Ainda assim, mesmo com a atuação da auditoria independente, a atuação da CVM, quanto ao seu atributo como órgão regulador e fiscalizador, tem sido intensa. Murcia e Borba (2005) destacam que a CVM possui, dentre suas atribuições, a de fiscalizar a publicação dos relatórios trimestrais, anuais e o formulário de Informações Anuais (IAN) (substituído pelo Formulário de Referência), com competência para exigir republicação (refazimento) dessas demonstrações. Quando uma empresa de capital aberto enviesa ou omite informações relativas a sua posição patrimonial, a CVM intervém a fim de garantir confiabilidade aos relatórios publicados pelas companhias (MURCIA; BORBA, 2005). Assim, ocorrendo uma eventual deficiência informativa nos demonstrativos financeiros, esta é imediatamente comunicada pela CMV, mediante oficio de notificação à empresa, com a determinação de elaborar as correções necessárias de erros ou inconsistências e fazer a devida republicação do documento correspondente (DANTAS et al., 2011). o. Destaca-se que a Lei n 6.385/76 já dava poderes à CVM para ordenar a republicação das demonstrações contábeis quando julgasse necessário. Contudo, a Deliberação CVM nº. 388/2001 foi o dispositivo legal que permitiu à autarquia divulgar as informações dos ofícios para todo o mercado, de modo a viabilizar aos investidores e ao público em geral, conhecer os motivos relacionados à determinação do refazimento/republicação das demonstrações financeiras dessas empresas. Atualmente, estas informações são divulgadas em inteiro teor pela CVM, em seu sitio eletrônico (DANTAS et al., 2011). Neste ponto cabe diferenciar a republicação/redivulgação do refazimento das demonstrações contábeis. Ao passo que a republicação/redivulgação está atrelada a informações enviesadas, confusas ou incompletas, o refazimento inclui registros contábeis não realizados, como provisões, erros em estimativas contábeis, classificação incoerente de contas patrimoniais, cujas alterações modificam a situação patrimonial da empresa. Por tanto, a republicação/redivulgação apenas corrige informações, sem afetar a situação patrimonial evidenciada, enquanto o refazimento das demonstrações contábeis contempla correções que alteram a situação patrimonial. Este geralmente ocorre em virtude de exigências da CVM e é acompanhado da republicação das informações. No cenário estadunidense, Dechow et al. (2011) afirmam que desde 1982 a Security and Exchange Commission (SEC) tem emitido releases por meio da Accounting and Auditing Enforcement Releases (AAERs), a partir de trabalhos de investigação de auditoria ou escritório que indiquem máconduta contábil. Estes releases apresentam detalhamento variado quanto à natureza da máconduta, a entidades e aos indivíduos envolvidas e o efeito sobre as demonstrações contábeis. Os autores destacam que a SEC toma ações de execução contra as empresas, os executivos, auditores e outras partes que estejam envolvidas nas violações das regras vigentes. Ao órgão regulador norteamericano é concedido também o poder de requerer da empresa a troca do método contábil, a republicação das demonstrações financeiras e o pagamento de indenizações. Bischoff, Finley e LeBlanc (2008) apontam que os principais motivos para republicação e refazimento das demonstrações contábeis incluem o reconhecimento indevido de receitas e despesas; erros de capital, atrelados principalmente ao reconhecimento da remuneração baseada em ações; erros de classificação de contas contábeis e; o fato das empresas evitarem a divulgação de reformulações das demonstrações contábeis. Os impactos trazidos pelo refazimento das demonstrações contábeis são ambíguos. Por um lado está relacionado com a redução do valor da empresa (ANDERSON; YOHN, 2002), diminuição na perspectiva de lucros futuros (HRIBAR; JENKINS, 2004), redução do preço das ações, mas também podem contribuir para menor incerteza quanto ao futuro da empresa (BISCHOFF; FINLEY; LeBLANC, 2008). Bischoff, Finley e LeBlanc (2008) afirmam que o refazimento das demonstrações contábeis apresenta reflexos negativos, principalmente por afetar negativamente a confiança dos investidores. Neste aspecto, destaca-se a importância da participação de um órgão fiscalizador, proporcionando um ambiente regulatório, cuja responsabilidade, na ocasião, dava-se a SEC (BISCHOFF; FINLEY; LeBLANC, 2008). Burks (2010) comprova empiricamente tal importância ao destacar que após a promulgação da Lei Sarbanes Oxley (SOX) e uma atuação mais contundente da SEC, houve uma redução no número de republicações nos Estados Unidos. Cao, Myers e Omer (2012) consideram as republicações como uma das formas mais visíveis em que a qualidade da informação financeira é prejudicada. Empresas com melhor reputação no mercado de capitais estão menos propensas à republicação das demonstrações contábeis e mais dispostas a dispender recursos para honorários de auditoria, entendendo que esta pode afetar positivamente a qualidade da informação contábil (CAO; MYERS; OMER, 2012). A exigência de refazimento das demonstrações contábeis denota a ineficácia dos controles internos da organização, já que, dentre as funções dos controles internos, está a de garantir aos investidores que distorções relevantes nas demonstrações contábeis são improváveis (WANG, 2012). De modo geral, o refazimento e a republicação das demonstrações contábeis podem ser decorrentes de erros involuntários das empresas, mas também devido à manipulação intencional das informações (BARTON, 2010; PLUMLEE; YOHN, 2010). Independentemente dos motivos, torna-se válida a atuação fiscalizadora da CVM quanto ao atendimento das empresas às normas vigentes no Brasil, de modo que sejam preservados os direitos de acesso a informações públicas concisas das empresas componentes do mercado de capitais brasileiro. 2.3 Estudos correlatos Neste tópico são apresentadas pesquisas de ordem nacional e internacional que tratam de assuntos relacionados ao tema abordado neste estudo. Destaca-se de antemão que o assunto de refazimento das demonstrações contábeis é abordado de modo mais significado no âmbito internacional, se comparado ao cenário da pesquisa brasileira. Richardson, Tuna e Wu (2002) analisaram 225 empresas sujeitas a regulamentação da SEC que republicaram suas demonstrações contábeis nos anos de 1971 a 2000. Como resultado identificaram que estas empresas obtiveram uma reação negativa do mercado. Além disso, apresentavam tendência de maior crescimento do fluxo de caixa e possuíam endividamento mais elevado. Encontraram ainda, como motivação inicial para as empresas gerenciarem seus resultados, a busca por menores custos de financiamento. Por fim, os autores concluem que os resultados encontrados são consistentes com as pressões do mercado de capitais, atuando como um fator que motiva as empresas a adotar políticas contábeis agressivas. Palmrose, Richardson e Scholz (2004) pesquisaram a reação do mercado após o anúncio de republicação das informações contábeis das empresas nos anos de 1994 a 2004. A partir de uma amostra de 403 anúncios de republicação, os autores identificaram uma reação negativa do mercado. Retornos negativos estavam associados a republicações que envolviam fraudes, que afetavam um maior número de contas, que reduziam a receita e atribuídos a auditores ou à administração. A partir dos resultados, os autores argumentam que os investidores reavaliam suas expectativas sobre o desempenho futuro das empresas que republicam suas demonstrações contábeis, questionando a credibilidade desta e de seus gestores. Com o objetivo de verificar o efeito do refazimento das demonstrações contábeis sobre o custo de capital das empresas, Hribar e Jenkins (2004) analisaram uma amostra de 292 refazimentos no período de 1997 a 2001. Como resultado, identificaram que tal prática implica numa diminuição dos lucros futuros esperados das empresas e num aumento no custo do capital. Os autores afirmam que o refazimento das demonstrações contábeis implica numa redução da qualidade da previsão dos ganhos esperados da empresa e, consequentemente, aumentam as taxas de retorno exigidas pelos investidores. Srinivasan (2005) usou uma amostra de 409 companhias que reapresentaram seus lucros de 1997 a 2001, para examinar as penalidades que os comitês de auditoria sofreram, quando suas empresas tiveram que republicar os balanços. Os resultados apontam que as ações judiciais e as penalidades da SEC foram limitadas, porém, as penalidades de mercado foram significativas. Srinivasan (2005) identificou que o mercado penalizou de forma mais contundente os diretores de empresas que apresentaram políticas mais agressivas de lucros, particularmente os diretores pertencentes ao comitê de auditoria, de modo que afeta significativamente de forma negativa a reputação destes diretores perante o mercado de trabalho. A United States Government Accountability Office (GAO) (2006) divulgou que no período de 2002 a 2005 houve um aumento de republicações de demonstrações contábeis de 67% das empresas norte americanas. Dentre os resultados da pesquisa, uma das razões mais importante dessas republicações foi o reconhecimento inadequado de receitas, representando 20% de todas as republicações. No ano de 2005, o principal motivo atrelado à republicação das demonstrações foi a correção de registros contábeis relacionados ao reconhecimento de arrendamentos mercantis. Na Austrália, Ahmed e Goodwin (2007) analisaram as 500 maiores empresas do país, a fim de identificar quantas republicaram seus lucros. Encontraram 195 republicações, nas quais houve uma diminuição no lucro de 49%. Os autores destacaram três grupos de razões para a republicação dos lucros: mudança nas políticas contábeis (49%), revisão de estimativas (40%) e erros “não identificados” (11%). Identificam também que a republicação dos resultados está negativamente relacionada ao valor da empresa. Plumlee e Yohn (2010) analisaram 3.744 republicações apresentadas durante o período 2003 e 2006 com o objetivo de identificar as causas subjacentes às republicações. Os autores encontraram que as razões atreladas às republicações foram os erros internos da empresa, a manipulação intencional, a complexidade da transação ou característica do padrão contábil. Os erros internos da empresa foram o principal motivo (57%) que as levou a republicarem suas demonstrações contábeis. A partir dos resultados, Plumlee e Yohn (2010) sugerem que o uso das republicações como proxy de qualquer constructo de pesquisa deve ser precedida de uma análise dos pedidos de refazimento realizados pelo órgão responsável (por exemplo, a SEC nos EUA e a CVM no Brasil), de modo que os fatores que levaram à republicação sejam identificados. Wang (2012) analisou a associação entre a gravidade das correções das demonstrações contábeis e o nível da qualidade dos controles internos, além da relação entre a qualidade dos controles internos e o risco de crédito. A partir de uma amostra de 506 empresas, Wang (2012) identificou que a probabilidade de refazimento das demonstrações contábeis aumenta ao passo que a deficiência dos controles internos aumenta. Para o risco de crédito, tal relação também foi encontrada, ou seja, menor qualidade nos controles internos infere em maiores riscos de crédito. De modo geral, os estudos relacionados ao tema proposto para esta pesquisa indicam que as republicações e refazimento das demonstrações contábeis impactam negativamente as organizações, aumentando o custo de captação de recursos, o custo de capital próprio, o risco de mercado e reduz a confiabilidade da informação perante o mercado de capitais. Neste aspecto, destaca-se a importância da atuação de um órgão regulador e da prestação de informações coerentes, claras e concisas ao público. 3 METODOLOGIA Com o propósito de apresentar sistematicamente os casos de refazimento das demonstrações contábeis determinados pela CVM, classifica-se a pesquisa como descritiva que, conforme Vergara (2000), busca apresentar as características de uma determinada população. Em relação ao procedimento, trata-se de uma pesquisa documental, por utilizar-se dos ofícios publicados no sítio da CVM referentes às exigências de refazimento das demonstrações contábeis e das demonstrações contábeis disponíveis no sítio da BM&FBovespa, para identificar dados referente ao parecer ou relatório dos auditores independentes, além do formulário de referência para fins de verificação dos dados das empresas de auditoria. 3.1 Empresas selecionadas para o estudo Esta pesquisa abrange todas as empresas cujas demonstrações foram objeto de exigência de refazimento pela CVM no período de 2001 a novembro de 2012. O período inicial da análise compreende o ano de 2001 devido ao fato de que apenas a partir daquele ano, com a publicação da Deliberação CVM nº 388/2001, os ofícios com as causas de determinação de refazimento das demonstrações contábeis passaram a ser divulgados publicamente. Diante do exposto, a pesquisa configura-se como uma pesquisa censitária, pois compreende toda a população com a característica estudada. O estudo contempla 37 empresas cujas demonstrações foram objeto de refazimento no período analisado. Destas empresas, houve aquelas com reincidência de exigência de refazimentos, totalizando 45 casos que estudados. 3.2 Coleta e análise dos dados Para consecução do objetivo os dados foram coletados junto ao sítio da CVM e da BM&FBovespa. As informações julgadas necessárias e coletadas para esta pesquisa, bem como a fonte de tais informações, são apresentadas no Quadro 1. Quadro 1 – Dados utilizados na pesquisa e fonte de obtenção Dados Setor de atuação da empresa Erros detectados Período da demonstração contábil a que se refere a exigência Tipo de documento cujo refazimento e republicação foram exigidos Empresa de auditoria independente Sinalização da auditoria independente Delay de publicação da demonstração contábil Fonte: Dados da pesquisa. Fonte Sítio da BM&FBovespa Ofícios da CVM Ofícios da CVM Ofícios da CVM Demonstrações contábeis Demonstrações contábeis Demonstrações contábeis Quanto aos dados a serem utilizados, o tipo de documento citado no Quadro 1 refere-se a qual documento a CVM exigiu ser refeito como, por exemplo, Balanço Patrimonial, Demonstração do Resultado do Exercício, Notas explicativas. A sinalização da auditoria independente compete ao tipo de parecer/relatório emitido pela empresa de auditoria independente em relação ao documento questionado, se com ressalva, sem ressalva, com ênfase, etc. O delay de publicação da demonstração contábil refere-se ao tempo que a empresa demanda para publicar suas demonstrações contábeis após o fim de um período contábil. 4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS As exigências pela CVM para que as empresas efetuem correções em suas demonstrações contábeis e procedam com a republicação das mesmas são publicadas no sítio da CVM e disponíveis desde o ano de 2001. A distribuição das exigências de refazimento por setor é apresentada na Tabela 1. Tabela 1 – Distribuição dos casos de refazimento por setor Setor Quantidade Construção e transporte 4 Bens industriais 3 Consumo cíclico 5 Consumo não cíclico 10 Financeiro e outros 2 Materiais básicos 7 Tecnologia da informação 2 Utilidade pública 6 Total 39 Fonte: Elaborado pelos autores. Frequência relativa (%) 10,26% 7,69% 12,82% 25,64% 5,13% 17,95% 5,13% 15,38% 100,00% Conforme verificado na Tabela 1, apenas os setores de Telecomunicações e Petróleo, Gás e Biocombustível não tiveram empresas com exigências por parte da CVM no que tange ao refazimento das demonstrações contábeis. O setor com maior quantidade e exigência de refazimento é o de consumo não cíclico, que envolve as empresas agropecuárias, de alimentos processados, bebidas, fumo, saúde, produtos de uso pessoal e limpeza e comércio e distribuição. Na Tabela 2 os casos de refazimento são dispostos por período a que se referem os demonstrativos. Tabela 2 – Distribuição dos casos de refazimento por período Estatística Quantidade Frequência relativa (%) 1995 1 1999 1 2000 4 2001 6 2002 4 2004 1 Anos 2005 2006 8 16 2007 9 2008 16 2009 7 2010 7 2011 7 2012 7 Total 94 1,06 1,06 4,26 6,38 4,26 1,06 8,51 9,57 17,02 7,45 7,45 7,45 7,45 100 17,02 Fonte: Elaborado pelos autores. Como observado na Tabela 2, um total de 94 documentos foram objeto de refazimento no período de 1995 a 2012. Do período de 1996 a 1998 não houve demonstrações cujo refazimento se fez necessário. Destaca-se que das demonstrações do ano de 1995, a solicitação de refazimento, pela CVM, se deu em virtude de sentença judicial apontando para o refazimento das demonstrações contábeis. Os anos com maior concentração de exigências pela CVM foram os anos de 2006 e de 2008. O ano de 2008 coincide com o início da adoção das normas internacionais de contabilidade (IFRS) e o. mudanças trazidas pela Lei n 11.638/07. Possivelmente, as alterações nas práticas contábeis advinda com as mudanças nas normas tenham impactado na qualidade das demonstrações contábeis publicadas, sendo necessária maior intervenção da CVM em prol da qualidade das informações contábeis. Os problemas nas demonstrações contábeis se estenderam nos anos de 2009 a 2012, indicando prováveis dificuldades das empresas em se adequarem às novas normas contábeis. Quanto ao exercício de 2006, não se identificou prováveis motivos que possam estar relacionados ao problema levantado por esta pesquisa. Tomando por base os estudos de Schipper (2003) e Myers e Omer (2012), entende-se que os casos de refazimentos podem influenciar significativamente na decisão de investidores. Ademais, conforme Richardson, Tuna e Wu (2002), Palmrose, Richardson e Scholz (2004) e Cao, Myers e Omer (2012), o refazimento impacta negativamente na reputação da companhia perante o mercado de capitais. Na Tabela 3, os casos de refazimento são segregados por tipo de documento, a saber, Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFP), Informações Trimestrais (ITR) e Informações Anuais (IAN). Tabela 3 – Distribuição dos casos de refazimento por tipo de documento Documento DFP ITR IAN Total 95 1 0 0 1 99 1 0 0 1 00 4 0 0 4 01 3 2 1 6 02 1 3 0 4 Anos (1995-2012) 04 05 06 07 1 4 2 1 0 3 13 7 0 1 1 1 1 8 16 9 08 1 15 0 16 09 4 3 0 7 10 2 5 0 7 11 5 2 0 7 12 1 6 0 7 Total 31 58 4 94 Freq. Relativa 32,98% 62,77% 4,26% 100,00% Fonte: Elaborado pelos autores. As Informações Trimestrais (ITR´s) são os documentos com maior incidência de refazimento, conforme a Tabela 3, correspondendo a aproximadamente 63% dos casos. Percebe-se também que em 2008 houve maior quantidade de ITR’s com exigência de refazimento, sendo ainda significativas nos anos seguintes. Destaque é dado para o ano de 2008, em que a CVM exigiu o refazimento das ITR’s em virtude do não atendimento a normas contábeis relacionadas a evidenciação de instrumentos financeiros trazidas com a introdução dos Pronunciamentos do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Estes resultados apontam para possíveis deficiências de controles internos das companhias analisadas e, consequentemente, para necessidade de melhoria destes (WANG, 2012). Para melhor compreensão dos casos de refazimento das demonstrações contábeis, com base em Plumlee e Yohn (2010) e Wang (2012), no que tange à importância de se identificar os tipos de erros relacionados aos refazimentos e republicações dos informativos contábeis, os motivos que impulsionaram a CVM em emitir suas deliberações foram agrupados no Quadro 2, de acordo com sua similaridade. Quadro 2 – Motivos para deliberações da CVM em favor do refazimento e republicação das demonstrações Agrupamento Motivos detalhados, conforme notificação expedida pela CVM Depreciação efetuada com base em contratos, em que a vida útil dos bens superava os prazos dos contratos; juros que não transitaram pela conta de resultados; condição adotada de distribuição de lucros incorretamente; falta de provisões no passivo; critério de mensuração utilizado erroneamente; reavaliação de ativos intangíveis que não deveria ter sido realizada; valores com informação de lançamentos em Improbidades no contas do ativo, onde constavam valores zerados; lançamento/reconhecime inadequação nos lançamentos de incorporações (ágio, créditos e nto/mensuração do ativo, impostos); falta de lançamentos de multas e outros tributos determinados passivo e contas de por órgãos públicos; ausência de constituição de perdas; erro no resultados. reconhecimento de despesas; falta de reavaliação dos ativos imobilizados; utilização de alíquota de imposto incorreta; falta de depreciação de alguns imobilizados; valor a ser retirado do ativo diferido; falta de aprovação de retenção de lucros na assembleia. Contas passivas sujeitas a variação cambial classificadas incorretamente no patrimônio líquido; debêntures emitidas registradas incorretamente no patrimônio líquido. Adiantamento considerado como patrimônio líquido, sendo que este Improbidade no deveria ser lançado no passivo; apropriação de ganhos contingenciais, lançamento de valores sem que o processo tenha transitado em julgado em todas as instâncias no patrimônio líquido. judiciais devidas. Irregularidades nas informações sobre impostos creditados no ativo; falta Deficiência/irregularidade de informações em ressalvas apresentadas; ausência de informações s/ausência de sobre critérios contábeis adotados, como proteção de créditos e informações em notas benefícios auferidos; falta de transparência ao usuário externo explicativas e ressalvas (investidor). Atraso na entrega de DVA apresentada com atraso aos auditores independentes; atraso na relatórios contábeis e entrega de documentos referente ao imobilizado, para conclusão do documentos aos trabalho do auditor independente. auditores Falta de padronização nas demonstrações Demonstrações apresentadas fora das normas requeridas. contábeis Relatório de administração fora dos padrões exigidos; demonstrações consolidadas não satisfatórias; resultado de operações com partes Problemas gerais relacionadas não anulado na consolidação das demonstrações contábeis. Fonte: Elaborado pelos autores. Na Tabela 4 é apresentada a frequência relacionada aos motivos de refazimento das demonstrações contábeis. A frequência total é superior ao número de casos de refazimento em virtude de uma mesma deliberação da CVM conter diferentes motivos que embasam a exigência do órgão regulador. Na Tabela 4 faz-se também um comparativo entre o período anterior e o posterior à introdução das novas práticas contábeis. Tabela 4 – Frequência relacionada aos motivos de refazimento das demonstrações contábeis Até Após Frequência Agrupamento Total 2007 2007 relativa (%) Improbidades no lançamento, reconhecimento ou 36 28 64 53,78% mensuração do ativo, passivo e contas de resultados. Improbidade em lançamento de valores no patrimônio 2 4 6 5,04% líquido. Deficiência, irregularidades ou ausência de informações 19 16 35 29,41% em notas explicativas e ressalvas. Atraso na entrega de relatórios contábeis e documentos 2 4 6 5,04% aos auditores. Falta de padronização nas demonstrações. Problemas gerais. Total Fonte: Elaborado pelos autores. 1 6 66 1 0 53 2 6 119 1,68% 5,04% 100,00% Conforme a Tabela 4, os motivos de maior relevância estão atrelados a improbidades no reconhecimento, lançamento e/ou mensuração de contas patrimoniais e de resultado. Estes resultados corroboram com os achados de Bischoff, Funley e LeBlanc (2008) e Plumlee e Yohn (2010). As deficiências, irregularidades e/ou ausência de informações em notas explicativas e ressalvas também se apresenta como motivos significativos quando das exigências de refazimento das demonstrações contábeis pela CVM. Quanto a este fato, verifica-se a importância dada pela CVM à qualidade da informação contábil, apresentada no referencial teórico (DANTAS et al., 2005; HOSS, 2008; IUDÍCIBUS, 2010) como um de seus principais objetivos. o. Comparando-se os anos anteriores à introdução da Lei n 11.638/07 com os anos posteriores, não se percebe alterações significativas nos motivos de refazimento. Entretanto, o período anterior a 2007 compreende nove anos e o período posterior, 5 anos. A média de refazimentos aumentou de 7 (antes de 2007) para 11 (após 2007). Acrescenta-se a esta evidência que, dos 16 casos de deficiência, irregularidades e/ou ausência de informações em notas explicativas e ressalvas, 10 se referem a demonstrações do ano de 2008 e, nos anos anteriores a 2008, os motivos estão distribuídos de forma mais uniforme. Isso posto, pode-se afirmar que as alterações nas normas contábeis, em destaque a maior exigência quanto à transparência das companhias abertas, impactaram nas exigências de refazimento das demonstrações contábeis. Conforme Perez Junior (2007), Attie (2010) e Dantas et al. (2011), a auditoria independente deve prezar, quando da execução de seu trabalho, pela integridade e coerência das informações contábeis geradas pela empresa, em todos os seus aspectos relevantes. Diante da importância da auditoria independente, na Tabela 5 são relacionadas as empresas de auditoria cujas demonstrações por elas auditadas foram objeto de refazimento. Tabela 5 – Refazimento das demonstrações contábeis agrupadas por empresa de auditoria independente Empresa de auditoria Deloitte Touche Tohmatsu Auditoria Independente KPMG Auditores Independentes Pricewaterhousecoopers Auditoria Independente S/C Arthur Andersen Martinelli Auditores BDO Directa Auditores BDO Trevisan Auditores Independentes BDO RCS Auditores Independentes Audimar Auditores Independentes ETAE Auditores Independentes IMER Puerari e Cia Auditores INA Instituto Nacional de Auditores Terco Grant Thornton Auditores Independentes S/C BC Control Auditores Independentes Lopes Machado Auditores UHY Moreira – Auditores Não identificada (caso da Acesita) Total Fonte: Elaborado pelos autores. Quantidade 9 8 5 3 2 2 2 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 41 Frequência relativa (%) 21,95% 19,51% 12,20% 7,32% 4,88% 4,88% 4,88% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 2,44% 100,00% Para a empresa Acesita não foi possível identificar a empresa de auditoria responsável pelo parecer de auditoria quanto as suas demonstrações no exercício de 2001. Vale esclarecer também que o número de empresas de auditoria é superior ao número de empresas apresentadas na Tabela 1. Tal fato se deve em função de que duas empresas cujas demonstrações contábeis de diferentes exercícios foram objeto de refazimento tiveram suas demonstrações de cada exercício auditadas por diferentes empresas de auditoria. Conforme a Tabela 5, 16 diferentes empresas de auditoria estão relacionadas a demonstrações com exigências de refazimento e republicação. Destaca-se que as empresas de auditoria Deloitte Touche Tohmatsu Auditoria Independente e KPMG Auditores Independentes são as empresas de auditoria mais representativas em relação ao problema de refazimento das demonstrações contábeis. Uuntas, correspondem a aproximadamente 42% dos casos. No entanto, deve-se considerar nesse resultado que essas duas empresas, por fazerem parte do grupo das big four, auditaram um número maior de demonstrações contábeis em relação a outras empresas de auditoria menores. A partir da Tabela 5, pode-se verificar também que aproximadamente 54% das demonstrações contábeis sujeitas ao refazimento e republicação foram auditadas por empresas de auditoria independente consideradas big four (Deloitte Touche Tohmatsu Auditoria Independente, KPMG Auditores Independentes e Pricewaterhousecoopers Auditoria Independente S/C), reforçando o argumento de que, devido a maior participação das empresas de auditoria big four no mercado de auditoria independente das empresas listadas na bolsa de valores brasileira, a probabilidade de as demonstrações por elas auditadas serem submetidas ao refazimento é maior. Entendendo que a responsabilidade pela elaboração das demonstrações contábeis é da administração da companhia, enquanto que à auditoria independente cabe apresentar sua opinião quanto às demonstrações contábeis auditadas, apresenta-se a Tabela 6 com as sinalizações dos auditores independentes sobre as demonstrações objeto de refazimento. Tabela 6 – Sinalização dos auditores independentes sobre os demonstrativos objetos de refazimento DFP ITR IAN Tipos de relatório/parecer Freq. Freq. Freq. Freq. Freq. Freq. Absoluta Relativa Absoluta Relativa Absoluta Relativa Parecer/relatório com ressalva 16 51,61% 15 25,42% 0 0,00% Parecer/relatório sem ressalva 13 41,94% 29 49,15% 0 0,00% Relatório com ênfase 2 6,45% 0 0,00% 0 0,00% Parecer/relatório adverso 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% Parecer/relatório com 0 0,00% 0 0,00% 0 0,00% abstenção de opinião Sem parecer/relatório 0 0,00% 15 25,42% 4 100,00% Total 31 100,00% 59 100,00% 4 100,00% Fonte: Elaborado pelos autores. As Informações Anuais (atuais formulários de referência) não integram o conjunto de informações a ser auditado, motivo pelo qual foram consideradas como sem parecer ou relatório. Das demonstrações financeiras padronizadas, a maior parte foi sinalizada pelos auditores como tendo informações que não refletiam corretamente a situação patrimonial, resultado e/ou fluxo de caixa da companhia ou com ênfase em questões que poderiam impactar nos saldos contábeis. Entretanto, uma parte significativa das demonstrações (aproximadamente 42%) não foi sinalizada pelas empresas de auditoria independente, o que aponta para a importância de uma atuação mais significativa da auditoria em prol dos usuários externos das informações contábeis. Quando analisadas as sinalizações dos auditores quanto às ITR’s, a maioria não foi ressalvada pela auditoria independente. Ao se desconsiderar as ITR’s sem parecer/relatório, denotase que aproximadamente 66% dessas demonstrações obtiveram parecer/relatório sem ressalva, o que indica a necessidade de uma atuação mais ativa dos auditores independentes em relação à análise de adequação das demonstrações às normas contábeis e transparência das companhias brasileiras de capital aberto. A fim de analisar a possível relação entre o delay de publicação das demonstrações contábeis e os casos de refazimento, apresenta-se a tabela 7. Tabela 7 – Delay de publicação dos demonstrativos contábeis DFP ITR Ano Quantidade Delay médio Quantidade 2001 3 67 2002 1 52 3 2004 1 77 - Delay médio 50 - 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Total/Média Fonte: Elaborado pelos autores. 4 2 1 1 4 2 5 1 25 78 116 77 79 105 90 73 27 76 3 13 15 3 2 6 45 47 54 35 46 34 47 45 Destaca-se que o delay das IAN’s não foi considerado pelo fato de estarem publicados, no sítio da CVM, apenas os documentos refeitos. Deste modo, não foi possível analisar o tempo para publicação dos documentos originais. Situação semelhante ocorreu com as ITR’s dos exercícios de 2001, 2007 e 2010. Conforme a Tabela 7, não se pode estabelecer uma relação entre o tempo para publicação das demonstrações e os casos de refazimento, quando analisadas os demonstrativos individualmente. Entretanto, quando comparadas as DFP’s com as ITR’s, verifica-se que estas são publicadas de forma mais tempestiva que as DFP’s, para as quais há menos casos de refazimentos se comparadas àquelas (ITR’s). Diante destes resultados, pode-se inferir que um menor tempo de avaliação das demonstrações pelos auditores independentes pode implicar em maior possibilidade de exigência de refazimento das demonstrações contábeis pela CVM às companhias. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa objetivou identificar os fatores relacionados ao refazimento das demonstrações contábeis das companhias brasileiras de capital aberto. Para a consecução do objetivo realizou-se uma pesquisa descritiva por meio da análise de conteúdo de 39 deliberações de refazimento e republicação emitidas pela CVM. Os achados desta pesquisa indicam que as empresas do setor de consumo não cíclico da BM&FBovespa são as que apresentam maior número de casos de exigência de refazimento das demonstrações contábeis. Os períodos com maior incidência de refazimento foram os exercícios de 2006 e 2008. Quanto ao exercício de 2008, pôde-se relacionar o aumento dos casos de refazimento à adoção das normas internacionais de contabilidade, principalmente em relação à divulgação, em notas explicativas, de informações relacionadas a instrumentos financeiros. Em relação aos motivos do refazimento, verificou-se que os principais motivos de refazimento incluem as improbidades no reconhecimento, lançamento e/ou mensuração de contas patrimoniais e de resultado e as deficiências, irregularidades e/ou ausência de informações em notas explicativas e ressalvas. Os resultados apontaram que a adoção das normas internacionais de contabilidade contribuiu para o aumento dos casos de refazimento das demonstrações contábeis. Assim, conclui-se que a maior exigência das IFRS quanto à qualidade das informações reportadas, além de possíveis problemas de adaptação dos profissionais contábeis brasileiros a essas novas normas, tenham contribuído para o aumento dos casos de refazimento. Quanto às empresas de auditoria independente, os resultados apontam que a empresa Deloitte Touche Tohmatsu Auditoria Independente está relacionada a um maior número de casos de refazimento de demonstrações contábeis. Além disso, em quase a metade dos casos de refazimento, a empresa de auditoria independente responsável era uma big four. Apesar destes resultados, não se pode afirmar que empresas de auditoria consideradas big four estão relacionadas a uma maior probabilidade de exigência de refazimento das demonstrações contábeis, pelo fato de atuarem de forma mais abrangente na auditoria de companhias brasileiras de capital aberto. Entretanto, os resultados apontam que para aproximadamente 66% das ITR’s sujeitas ao refazimento, a empresa de auditoria independente emitiu parecer ou relatório sem ressalva ou parágrafo de ênfase. Para das demonstrações financeiras padronizadas, esta condição se confirmou em aproximadamente 42% dos casos de refazimento. Estes resultados fragilizam a reputação da auditoria independente enfatizada pela literatura (ATTIE, 2010; DANTAS et al., 2011) e apontam para a necessidade de uma atuação mais ativa dessas empresas, principalmente em relação à análise da elaboração desses relatórios. Os resultados não permitem concluir que o tempo para publicação das demonstrações contábeis é decisivo na implicação de seu refazimento, entretanto, evidenciou-se que as ITR’s, com menor delay de publicação possuem maior quantidade de refazimento se comparadas as Demonstrações Anuais (DFP). Assim, entende-se que, apesar de não ser decisivo, um menor tempo disponível aos auditores para avaliação das demonstrações contábeis aumenta o risco dessas demonstrações serem objeto exigência de refazimento pela CVM. Conclui-se também, diante do número reduzido de demonstrações sujeitas ao refazimento que foram ressalvadas pela auditoria independente, que se faz necessária uma atuação mais ativa das empresas de auditoria externa, alertando ao mercado de possíveis incoerências nas informações publicadas pelas companhias. REFERÊNCIAS AHMED, Kamran; GOODWIN, John. An empirical investigation of earnings restatements by Australian firms. Accounting and Finance. v. 47, n. 1, p. 1-22, mar. 2007. ANDERSON, Kirsten, L.; YOHN, Teri Lombardi. The effect of 10-K restatements on firm value, information asymmetries, and inventors’ reliance on earnings. Social Science Research Network. 2002. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=332380>. Acesso em: 18 out. 2012. ATTIE, William. Auditoria: conceitos e aplicações. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010. BARTON, Jan. Discussion of how do restatements begin? Evidence of earnings management preceding restated financial reports. 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