Revista Desafios do Desenvolvimento, #76
Transcrição
Revista Desafios do Desenvolvimento, #76
2013 • Ano 10 • nº 78 www.desafios.ipea.gov.br Exemplar do Assinante A articulação dos emergentes Brasil sedia Cúpula dos BRICS em 2014 na busca de sintonia e de um banco em comum. Em março, o Ipea reúne o Conselho de Think Tanks e o Foro Acadêmico do grupo para trocar dados e experiências em políticas socioeconômicas, urbanas e ambientais O desafio de ampliar a produtividade Entrevista Abhijit Banerjee Cidades para todos irem e virem Os primeiros traços do mapa de políticas públicas setoriais para o desenvolvimento por meio de ganhos em produtividade Contrapartidas e crédito ajudam pouco, mas ideias e ativos vencem a pobreza Propostas técnicas para a mobilidade urbana oferecem resposta viável à demanda das ruas engarrafadas Entrevista Abhijit Vinayak Banerjee “Ativos e treinamento deixam os pobres mais ricos, produtivos, felizes e saudáveis” J o a n a C o s t a , M a r c o s H e c k s h e r, Miguel Foguel e Carlos Henrique Corseuil* (*) Joana Costa, Marcos Hecksher, Miguel Foguel e Carlos Henrique Corseuil são economistas do Ipea 14 Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 Leah Horgan Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 15 A pobreza extrema pode, sim, quase sumir do mapa-múndi até 2030, mas só se os ventos da economia soprarem a favor. A melhor ação internacional para ajudar é disseminar conhe- “Quando você ensina no nível da criança, o resultado é melhor. Em muitos países, o ensino está fora do ponto” monitoramento e avaliação são coisas distintas. Um sistema de monitoramento é muito útil porque, com frequência, você pensa estar fazendo algo com uma política, cimento sobre o que realmente funciona para está certo de que ocorre o que deveria, vencer a miséria. Mas o que funciona? Em mas, na verdade, nada está acontecendo. vez de cumprir currículos escolares rígidos e de ações contra a pobreza. O método Tudo pode acontecer. Monitoramento é ambiciosos, os resultados melhoram quando lembra as pesquisas com novos remédios. saber se estou fazendo o que penso estar. se concentra o ensino em habilidades básicas Cada iniciativa é aplicada a um grupo de Já avaliação é saber se faz sentido o que que cada grupo de alunos consiga de fato beneficiários sorteado ao acaso e o efeito estou tentando fazer. “Meu plano está aprender. Transferir recursos para os mais do programa é medido pela comparação correto? Tenho a ideia certa sobre isso?” pobres também funciona, mesmo que incon- com um grupo de controle não sorteado Para ser honesto, nem sempre sabemos dicionalmente, pois exigir contrapartidas da mesma população. o suficiente. Pode parecer extremo, mas tem mais efeitos na opinião pública do que Na entrevista a seguir, Banerjee observa sabemos sempre muito pouco sobre algo. concretos frente aos montantes aplicados. um consenso político no Brasil para superar Pensamos saber como fazer programas Microcrédito ajuda a comprar bens duráveis, seu padrão histórico de “pressões populistas”, sociais efetivos e, na maioria das vezes, mas não costuma tirar da pobreza. Estimular comenta a queda da pobreza no país, o aumento conhecemos bem o problema, mas nem a poupança dos pobres é desejável e viável, no nível de aprendizagem dos estudantes e sempre isso é muito útil. Todos concor- embora seja difícil os bancos lucrarem ao avalia positivamente a gestão macroeconômica damos que educação é algo bom, mas manterem suas contas. brasileira. Os estudos que já viu sobre o Bolsa o que fazer para melhorá-la? Sabemos Essas respostas estão todas na ponta Família lhe pareceram “plausíveis”, mas não muito pouco. Se olharmos as evidências, da língua do economista indiano Abhijit receberam muita atenção sua por não serem as políticas sugeridas por especialistas Vinayak Banerjee, professor e pesquisador experimentos aleatórios. O economista cita muitas vezes não são bem-sucedidas. do Massachusetts Institute of Technology medidas anticorrupção via transparência que Avaliar é descobrir se sabemos ou não o (MIT), onde, junto com Esther Duflo, fundou funcionaram no Brasil e vê oportunidades que realmente deve ser feito. e dirige desde 2003 o Abdul Latif Jammel para os BRICS aprimorarem suas políticas Poverty Action Lab (J-PAL). Em 2011, com intercâmbios de ideias. Já a famosa Desenvolvimento – Você é um especialista em experi- os dois lançaram o livro Poor Economics, recomendação de “dar o peixe e ensinar a mentos aleatórios controlados para avaliar políticas. Quais traduzido em Portugal como A Economia pescar” ganha, curiosamente, a imagem de são as vantagens e as limitações desse método? dos Pobres: repensar de modo radical a outro animal em um bem-sucedido experi- Banerjee – O benefício é que experimentos luta contra a pobreza global. A obra narra mento com pobres de vários países. O relato aleatórios são bastante exatos. Como saber histórias de pessoas vivendo em condições de Banerjee sugere outro jeito sustentável de o efeito de um programa? Você pode extremas que eles conheceram em dezenas gerar prosperidade e felicidade: dar uma vaca simplesmente pegar um lugar onde o de países e associa seus casos particulares aos e ensinar a ordenhar, literalmente. programa está acontecendo e compará-lo achados gerais das avaliações que o J-PAL 16 Banerjee – São duas questões separadas: com outro onde o programa não acontece realizou. O reconhecido laboratório é uma Desenvolvimento – Os países em desenvolvimento ainda, o que seria uma alternativa a um rede de pesquisadores afiliados, com um geralmente não possuem bons sistemas de monitoramento experimento. O problema nisso é que escritório em cada continente, especializada e avaliação de políticas públicas. Quais são os benefícios os programas não costumam ser locali- em experimentos aleatórios controlados desses sistemas? zados aleatoriamente. Em geral, quando Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 David Baron alguém escolhe um lugar para fazer um novo programa, é porque lá existe algum problema. Assim, se você verifica que as pessoas ainda estão pobres onde há uma ação contra a pobreza, não é devido ao programa, já que ele foi introduzido lá justamente por ser onde havia um problema. Os experimentos evitam isso porque, neles, para fins de estudo, os programas são oferecidos localmente de forma aleatória, o que permite comparar os lugares. A principal restrição dos experimentos é que leva tempo para termos os resultados de cada avaliação. Em educação, os mais rápidos levam de um e meio a dois anos. Formuladores de política nem sempre querem esperar tanto, querem algo agora, mas saber o que melhora a educação exige tempo, paciência e recursos. Se eu usar os dados já disponíveis, posso dar uma resposta em duas semanas. Se quiser iniciar um experimento aleatório agora, vou precisar esperar o programa ser posto em prática Esse é um caso bem replicado. São seis até obter alguma resposta. diferentes organizações, em lugares muito diferentes, com o mesmo padrão Desenvolvimento – É possível levar os resultados de resultados. A princípio, poderia haver de uma avaliação aleatória realizada em um país para a resultados diferentes em outros lugares? realidade de outro país? Claro. Nesse caso, teríamos que realizar “Há que se escolher se o objetivo é transferir renda para reduzir a pobreza ou mudar comportamentos” Banerjee – Um exemplo consistente é o mais experimentos para compreender ideia básica de que, com boa regulação, microcrédito. Experimentos aleatórios os motivos. microcrédito é uma ferramenta útil para bem feitos tiveram exatamente o mesmo os pobres. Como um cartão de crédito. padrão de resultados em seis países muito Desenvolvimento – Mas você não é contra micro- diferentes: México, Índia, Bósnia, Mongólia, crédito, certo? Desenvolvimento – Pode dar um exemplo de um Marrocos e Etiópia. Não vemos mudança Banerjee – Não, de modo algum. Pense alguma na pobreza. Acesso a microcrédito nisso como um banco para os pobres. Banerjee – Sim, só que exige mais explicação, não muda a pobreza. O que muda, então? O que faço com um cartão de crédito? porque envolve a forma de executar uma Mudam os padrões de consumo. As pessoas Quero comprar uma TV e não tenho o ideia. Um problema comum na educação adquirem mais bens duráveis. Consertam dinheiro agora, então pago no cartão. é a tirania do currículo. As escolas são suas casas, compram uma vaca, uma TV, É o que as pessoas pobres fazem, elas comprometidas a cumpri-lo, mas as uma bicicleta, telhado, uma moto, mas compram coisas. Não entendo por que crianças podem não estar aprendendo não vemos mudanças reais nas rendas. não deveríamos permitir que realizem o currículo. Então, há duas visões de Sistematicamente, vemos mudanças seus projetos de consumo. Se ficarão mais prioridade distintas: uma, no fim do ano, em padrões de ocupação, em como as felizes em comprar uma TV ou reparar deve-se ter cumprido todo o currículo; a pessoas passam seu tempo, mudanças sua casa, devem ser capazes, o que o outra, no fim do ano, cada criança deve ter de comportamento, mas não na meta microcrédito permite. Não vejo nada desenvolvido certas habilidades básicas, fundamental de redução da pobreza. errado nisso. Sou totalmente a favor da mesmo que não se complete o currículo. programa que funcione bem em todo lugar? Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 17 Há um programa chamado “Ensinando no Nível Certo” que prioriza o aprendizado básico em múltiplas localidades da Índia PERFIL e de Gana, onde achamos exatamente Indiano, 52 anos, Abhijit Vinayak conforme conta no livro Poor Economics, os mesmos resultados, com ganhos Banerjee é professor e pesquisador do que procura derrubar mitos sobre o muito grandes de desempenho em testes Massachusetts Institute of Technology comportamento dos pobres diante das padronizados. Muitas vezes uma criança (MIT), onde dirige o Abdul Latif Jammel várias ações que tentam transformar suas está num nível e o currículo a espera em Poverty Action Lab (J-PAL) junto com vidas. Banerjee é um dos nomes mais outro. Quando você ensina no nível da a economista francesa Esther Duflo (na notórios da economia do desenvolvimento criança, o resultado é melhor. Quando foto, ao lado dele). Já lecionou também e da econometria, com destaque por sua ensina certos conceitos de física, mas a em Princeton e em Harvard, onde obteve liderança em pesquisas de campo com criança ainda não dominou a matemática o título de Ph.D em Economia, mesma experimentos aleatórios controlados básica, é claro que não aprenderá muito área de sua graduação pela Universidade em dezenas de países, onde já prestou da física. Grande parte do problema em de Calcutá e de seu mestrado pela assessoria a diversas organizações muitos países em desenvolvimento é que Jawaharlal Nehru, de Nova Déli. Na públicas e privadas, inclusive ao governo o ensino está inteiramente fora do ponto. infância, as pessoas pobres que conhecia da Índia e ao Banco Mundial. Em 2013, eram meninos que moravam perto de sua foi convidado pelas Nações Unidas a Desenvolvimento – Expandir a escala de um programa casa em Calcutá. Eles podiam vencê-lo integrar o painel de especialistas que pode gerar resultados diferentes dos avaliados localmente em qualquer esporte e ganhavam suas discutirá a redefinição dos Objetivos de em um piloto? Uma ONG avaliada, por exemplo, pode ter bolas de gude em todas as disputas, Desenvolvimento do Milênio após 2015. eu poderia chegar a uma visão diferente Desenvolvimento – Qual sua opinião sobre programas Banerjee – Sim, só que muitos dos experi- no final. Apenas me pareceram plausíveis de transferência de renda em geral para reduzir a pobreza e mentos que citei já são feitos por governos, do jeito que foram feitos. qual o papel das condicionalidades exigidas dos beneficiários? pessoas muito motivadas na execução de um experimento, o que talvez não se repita quando um governo o adota em uma política pública de larga escala. Há exemplos de expansões que funcionem? Banerjee – Está claro que parte da razão não por ONGs. Na educação, tipicamente, 18 ONGs fornecem treinamento, insumos, Desenvolvimento – Outros métodos de avaliação para existirem condicionalidades é política. mas os programas são executados pelos devem ser considerados quando experimentos aleatórios Apesar de não haver evidência empírica, governos. Em microfinanças, vários não são possíveis? há uma ideia política de que não se deva programas são feitos por organizações do Banerjee – Algumas das avaliações mais apenas dar dinheiro para as pessoas não setor privado que são muito motivadas. críveis não são experimentos. A questão ficarem preguiçosas. A evidência empírica Motivação não parece dar garantia de é sempre a qualidade dos dados dispo- existente é de que transferências condi- resultados. níveis. Se há dados de vários anos sobre cionadas apresentam resultados melhores um indicador de resultado e, no período que as incondicionais. Um experimento Desenvolvimento – O Brasil tem um grande programa anterior à introdução do programa, ele aleatório no Malawi mostrou que a de transferência de renda condicionada, o Bolsa Família, crescia à mesma velocidade nas regiões presença da condicionalidade aumenta o que não foi aleatorizado como o mexicano Progresa, mas onde o programa foi aplicado e onde efeito sobre educação. A condicionalidade teve muitas avaliações. Quanto você conhece do programa, não foi, evoluindo em paralelo, então é ajuda. Uma questão não óbvia é se o custo dessas avaliações e quão críveis as considera? possível comparar e checar se as veloci- de acompanhar as condicionalidades Banerjee – Vi alguns artigos com avalia- dades começam a divergir no período vale a pena, uma vez que as transferên- ções que me pareceram críveis, mas não posterior. É o que as pessoas geralmente cias de renda incondicionais também os estudei cuidadosamente nem diria fazem e é bastante crível. Só requer um afetam positivamente a educação. Mas a que empenhei muitas horas. Por não ser grande número de informações críveis questão mais interessante é se perguntar experimento aleatório, não dediquei tanta sobre o passado anterior ao programa, se programas de transferências de renda atenção e talvez não deva falar a respeito. com evoluções paralelas, para que os devem ser desenhados para prioritaria- Se me pedissem para ler e avaliar os artigos, novos dados sejam comparáveis. mente mudar o comportamento social Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 L. Barry Hetherington com os incentivos a políticas populistas e as pessoas ficaram mais orientadas para o longo prazo, o que é muito bom. As escolhas das políticas serão mais flexíveis a meu ver. Todo país quer crescimento de produtividade. Só que não é algo que consigamos controlar muito, não está em nossas mãos. Você deve melhorar a educação e o ambiente para investimentos, mas e aí? O Brasil tem feito muito. O nível de aprendizado do país subiu muito nos testes do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa/OCDE). Você vê melhorias, mas o que fazer mais para a produtividade crescer? Ninguém sabe muito bem como acontece. Desenvolvimento – Entre “pequenas” e “grandes” questões a serem tratadas, qual o peso das políticas macroeconômicas? Banerjee – O Brasil tem uma política macroeconômica muito boa. Compaou para principalmente dar dinheiro às pessoas pobres. Se o objetivo deles for mudar o comportamento social, então eles são muito caros. O Progresa mudou a educação no México, mas a um custo “Os pobres pouparem deve ser um objetivo e é possível. Eles movimentam dinheiro por celular” muito alto. Se o objetivo do Progresa rando com os Estados Unidos, o déficit brasileiro é menor. Provavelmente, a América Latina é o lugar com políticas macroeconômicas mais conservadoras e clássicas em todo o mundo. As moedas não são supervalorizadas, o déficit não é alto, estão fazendo tudo o que podem. era dar dinheiro a pessoas pobres, o que Desenvolvimento – O Brasil tem experimentado importa é que elas receberam. Mas se reduções de pobreza e desigualdade sem muito crescimento Desenvolvimento – Talvez uma “pequena grande” questão o objetivo for mudar comportamento, econômico. É um caminho sustentável ou é preciso buscar seja pouparmos pouco. Encorajar os pobres a economizar então é necessário um melhor desenho crescimento de produtividade? é um objetivo possível e desejável? Como? do programa. Por exemplo, um experi- Banerjee – Quem iria dizer para não buscar Banerjee – Sim, deve ser um objetivo e é mento na Colômbia apresentou ganhos na crescimento de produtividade? Quando se possível. Pessoas pobres de México, Índia educação similares aos do Progresa, mas vê o histórico brasileiro, há muita redução e Quênia, ao terem acesso a instrumentos a um custo menor. No caso colombiano, na pobreza e crescente consenso político para poupar, aumentaram seu bem-estar a entrega do dinheiro é adiada e a família a favor de políticas menos populistas, o e sua renda. Todas as evidências apontam só recebe o dinheiro quando a criança que deve ter consequências de longo prazo para o fato de economizar ser algo bom. termina o ensino médio. Obviamente, este para o crescimento. Tendo a pensar: “faça É caro para se fazer e os bancos pensam: programa não reduz a pobreza, mas seu o que pode ser feito”. Vamos consertar “por que eu darei uma conta a alguém desenho é melhor se o objetivo principal os problemas que podemos. O Brasil que vai colocar dois dólares nela?”. Mas for mudar comportamento. Em suma, há tem feito um bom trabalho de consertar há indícios de que ficará mais barato, que se escolher se o objetivo principal é alguns problemas, o que é bom no longo pois há muita inovação nesse campo. As transferir renda para reduzir a pobreza ou prazo. É um país que sempre sofreu pessoas, mesmo nas classes mais baixas, incentivar mudanças de comportamento. muitas pressões populistas, estou errado? estão movimentando seu dinheiro por Os dois são legítimos. A pobreza e a desigualdade caíram junto celulares. Foi assim que fizeram no Quênia. Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 19 Desenvolvimento – Existe a chamada armadilha da pobreza? É muito difícil as famílias pobres alcançarem níveis básicos de vida sem ajuda externa? TRANSPARÊNCIA Banerjee – Para um conjunto de pessoas, Ao ressaltar a importância da Ipea. Uma versão posterior do estudo sim. O que não sei e gostaria de saber é informação no combate à corrupção venceu, em 2012, o prêmio Haralambos o tamanho desse grupo, mas são pessoas no Brasil, Banerjee faz referência ao Simeonidis da Associação Nacional que têm problemas demais para superar trabalho de dois pesquisadores afiliados dos Centros de Pós-Graduação em ao mesmo tempo. Vivem em lugares onde ao J-PAL, Claudio Ferraz e Frederico Economia (Anpec). A dupla mostra as escolas são ruins, não têm educação Finan. Os primeiros resultados da que auditorias da Controladoria-Geral formal, não têm renda suficiente, não pesquisa foram abordados em uma da União (CGU) em municípios sorte- têm tempo para focar no bem-estar das matéria e um artigo da Desafios do ados afetaram os resultados eleitorais, crianças, o ambiente não é bom. Acho Desenvolvimento n. 12, de julho de especialmente onde havia rádios locais que a pobreza replica a si mesma. Meu 2005, quando Ferraz trabalhava no para divulgar as irregularidades. palpite é esse, só não posso provar. Na verdade, temos um experimento, que é outro bem-sucedido caso de replicação com os mais pobres dos pobres, os 5% de ajuda. Outra coisa é produzir informação. tão pouca informação sobre as políticas, baixo, em diferentes países: Bangladesh, Muita coisa boa é documentada, mas a o passado dos candidatos, se alguém é Índia, Peru, Gana, Paquistão, Costa Rica mídia só procura más notícias, quando corrupto. Como posso punir quem é e outros. Você dá um ativo uma única vez deveria mostrar as boas e as más. Há corrupto se não sei quem é? e treina as pessoas para usá-lo. Por ativo muito a fazer para tornar a democracia entenda-se uma vaca ou, dependendo do mais efetiva. Democracia é muitas vezes Desenvolvimento – Em março, o Ipea vai organizar lugar, porcos, cabras ou mesmo porqui- uma ferramenta cega. Não fazemos muito no Rio o fórum acadêmico dos BRICS para discutir o nhos-da-índia no caso do Peru, onde são porque não sabemos muito. Estou em intercâmbio de tecnologias em políticas para promover criados para consumo da carne. Quatro Boston, onde alguém ganhou a eleição desenvolvimento urbano, ambiental e socioeconômico. Como anos depois, essas pessoas ainda estão para prefeito e não sei nada sobre ele, nem as políticas sociais dos diferentes países do grupo podem 10-15% mais ricas, mais produtivas, mais sobre o cara que competiu com ele. Há complementar umas às outras? felizes, mais saudáveis, tudo. Isso indica uma armadilha da pobreza, pois elas não chegariam lá sozinhas, como mostra o grupo de controle. Elas não vendem a vaca imediatamente. Criam bezerros, vendem leite e ficam substancialmente melhor. Desenvolvimento – Sem negar a importância de grandes instituições, como direitos de propriedade e democracia, seu livro propõe mudanças em pequenas instituições. O que os países em desenvolvimento podem mudar para reduzir a corrupção? Banerjee – Há o exemplo de um estudo muito bom do Brasil. Quando você publica os resultados de auditorias municipais, o prefeito que era corrupto perde a eleição. É um padrão encontrado em muitos estudos. Eleitores não têm informação suficiente, não sabem quem é mau e pensam que todos são corruptos. Prover informação 20 Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 CONTROVÉRSIA Banerjee é conhecido como um dos condições e características individuais pioneiros na difusão de experimentos difíceis de observar e descontar na aleatórios controlados para avaliar análise. Em um debate de alto nível com ações públicas e privadas de combate vídeo na internet, o economista Angus à pobreza. Com o sorteio de beneficiá- Deaton, professor de Princeton, lista rios, a técnica busca isolar os efeitos de desvantagens comuns em experimentos uma intervenção ao comparar grupos aleatórios e relativiza alguns resultados de pessoas incialmente em situações apresentados por Banerjee, assim como praticamente “iguais”, selecionadas a suposição de que o método experi- ou não por mero acaso. Isso evita a mental seja sempre mais confiável do comparação direta entre grupos de que análises mais tradicionais, como pessoas possivelmente muito “diferentes” as que buscam “isolar” as diferenças que usam ou não um serviço (escola, iniciais entre as pessoas com métodos hospital, crédito etc.) em parte devido a econométricos. Leah Horgan enormes possibilidades de aprendizado, desde que se concentre o foco no nível certo, discutindo programas específicos. Desenvolvimento – O Banco Mundial propõe a meta de reduzir a extrema pobreza a menos de 3% da população mundial até 2030. É possível? Banerjee – Certamente. Se decidirmos que é prioridade, vai depender da continuação do crescimento econômico. Há uma série de fragilidades, especialmente nos países ricos. Os Estados Unidos parecem estar em um profundo problema político, uma confusão. Não se sabe quão boas serão as políticas, dada a pobre gestão política atual. Vai depender muito da Europa. Se a economia mundial entrar em crise, nada vai acontecer, porque a China depende dos Estados Unidos. Meu medo é porque as maiores vulnerabilidades estão na Europa, seguida dos Estados Unidos. Se agirem juntos e elevarem sua demanda por produtos, a pobreza cai rapidamente. Como nos últimos 20 anos, não só na China, mas também no Brasil, em Bangladesh, na Índia, na Indonésia, em vários países grandes. Desenvolvimento – Para além desses resultados da economia, há alguma ação global contra a pobreza que possa ajudar, como grandes transferências de dinheiro, Banerjee – Cada um desses países fez coisas interessantes e bem-sucedidas. O Brasil criou programas sociais com grande sucesso, atingiu muitas pessoas e vemos efeitos em redução da pobreza. “Cada um dos BRICS fez coisas interessantes e bem-sucedidas. Há enormes possibilidades de aprendizado” As ideias são muito poderosas. Quando por exemplo? Banerjee – A maior coisa a ser feita é uma transferência de pensamento. Dinheiro é pequeno perto do pensamento. A maioria dos pobres vive em países grandes. Seus governos gastam a maior focamos em grandes panoramas, apren- uma conversa útil para ajudá-los. Útil parte do dinheiro contra a pobreza, demos pouco. O Brasil é uma demo- é identificar sucessos e mostrar: «foi que não vem de fora, mas dos próprios cracia e a China, não, mas, em certo assim que fizemos». Assim como os países. O que pode haver é um suporte sentido, a China tem democracias fracassos: «tentamos isso e falhamos para aprender a inovar e desenhar boas locais muito efetivas, pois, nas vilas, miseravelmente». A Índia está bem à políticas. É onde a ajuda pode ser mais eles têm muita competição política. Se frente em microcrédito e sua experiência importante. Se considerarmos todo o você fizer perguntas no nível em que é útil para o Brasil. Os erros indianos na volume mundial de ajuda externa e cada política pode ser mudada, tanto regulação do microcrédito também são multilateral, é uma pequena fração do melhor. Eu concordo que precisam de úteis. Há muitas histórias de inovação que os países pobres e em desenvolvi- democracia, mas não acho que esta seja e como as sociedades reagiram, com mento gastam em políticas sociais. Desenvolvimento • 2013 • Ano 10 • nº 78 21