Monografia AI - IVE - Imagens e Vozes de Esperança

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Monografia AI - IVE - Imagens e Vozes de Esperança
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO
COMUNICAÇÃO SOCIAL – PUBLICIDADE
A EFICIÊNCIA DO APPRECIATIVE INQUIRY
NA TRANSFORMAÇÃO ORGANIZACIONAL
Augusto César da Costa Zimbres
Monografia apresentada ao Curso de
Comunicação
Social,
com
especificação em Publicidade e
Propaganda
da
Pontifícia
Universidade Católica do Rio de
Janeiro, como requisito parcial para a
obtenção do título de Bacharel em
Comunicação
Social,
sob
a
orientação do Prof. Augusto Sampaio
e o auxílio do Prof. Bernardo
Monteiro.
Rio de Janeiro
Junho / Julho 2003
“Estamos num momento muito importante,
quando uma velha idade de 400 anos está
morrendo e uma outra está batalhando para
nascer; uma mudança de cultura, da ciência, da
sociedade e das instituições; algo o mais
grandioso já experimentado pela humanidade.
À frente, a possibilidade de regeneração dos
relacionamentos, liberdade, comunidade e ética
como o mundo nunca conheceu antes;
harmonia com a natureza, uns com os outros e
com uma inteligência divina, como o mundo
nunca sonhou.”
Dee Hock,
Fundador da Visa International
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RESUMO
Uma mudança está se processando em todos os campos da atividade humana. No mundo
empresarial, os velhos mas comumente métodos e sistemas utilizados pela grande maioria
dos departamentos de recursos humanos das empresas, focando-se em aspectos técnicos,
materiais e financeiros, relegam a segundo plano os sentimentos, emoções e expectativas
das pessoas, que são, na realidade, a essência de qualquer organização.
Criado pelo PhD em comportamento organizacional, Dr. David Cooperrider, o método
Appreciative Inquiry (inquirição apreciativa) busca essencialmente o positivo nas pessoas e
em suas organizações. Através de perguntas apreciativas é possível despertar o cerne de
transformação positiva de uma empresa, o que lhe dá vida. As capacidades e potenciais de
seus membros podem alcançar seus máximos ao lembrarem-se de momentos passados de
sucesso, vitórias, força, transformação, despertar positivo. A partir disso, é possível criar
uma visão poderosa para o futuro. Uma solução que parte de dentro da própria instituição,
que precisa apenas aprender a focar-se no que é positivo e vital para ela.
Cases de sucesso comprovam a eficiência do Appreciative Inquiry, como a Nutrimental,
que teve sua estrutura completamente transformada pelo método. Nos EUA, também é
possível darmos muitos exemplos, dos quais destacamos os do McDonald’s e da NASA.
PALAVRAS-CHAVE:
-
positivo
-
apreciativo
-
essência
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ÍNDICE
1 – O contexto da mudança
 Porque o modo como vemos o mundo é caótico!
 O convite a uma “Revolução Positiva”
 Mudando a mentalidade organizacional
 Apreciando o essencial
 Liderança é ter virtudes
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2 – Promovendo a mudança nas organizações
 Indo até as raízes da transformação
 Descoberta Intuitiva
 Escolha de Tópico Afirmativo
 O processo apreciativo (os 4 Ds)
- Descoberta
- Sonho
- Design
- Destino
 Princípios Básicos do Appreciative Inquiry
- Princípio Construtivista
- Princípio da Simultaneidade
- Princípio Poético
- Princípio Antecipatório
- Princípio Positivo
 Origem filosófica
 O que é mais importante: Inquirição ou Apreciação?
 Diferenças entre o método de “solução de problemas” e a inquirição apreciativa
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3 – Cases de sucesso
 Perfis diversos – resultados semelhantes
 Nutrimental
- Um marco na história da empresa
- Impactos no cotidiano
- Responsabilidade Social
- Lições e resultados
 McDonald’s (EUA)
 NASA
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4 – Minha experiência com o Appreciative Inquiry
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1 – O CONTEXTO DA MUDANÇA
O mundo está mudando! É uma mudança que aparece de uma forma sutil e que
somente algumas poucas pessoas com uma sensibilidade mais aguçada podem perceber em
meio ao caos que se alastra pelo mundo. Elas são poucas, mas estão espalhadas pelas
diversas áreas do conhecimento humano. E como diz a sabedoria popular “Depois da
tempestade, vem a bonança”. O trem da história está passando e cada um de nós tem que
estar pronto para o que virá depois da tempestade.
O porquê da mudança é muito simples. É apenas uma questão de mudarmos um
pequeno detalhe desse mesmo ditado, que está implícito em seu significado: “Por causa da
tempestade é que tem que vir a bonança”. Mas por quê a mudança?
Porque o modo como vemos o mundo é caótico!
As organizações são criações humanas e, desse modo, reproduzem o que está nas
mentes de seus criadores. Se o homem perdeu o controle sobre sua criação, é porquê ele
perdeu o controle sobre sua própria mente. O homem perdeu a consciência do que é
realmente essencial. E o que é essencial para uma organização?
As pessoas são a essência de uma organização.
Talvez essa afirmativa já esteja um pouco batida, repetitiva. Mas será que foi
assimilada?
Talvez a maioria das pessoas não aceite pensar que os seus modos de ver o mundo
são caóticos. No entanto, por mais que se fale em mudar o mundo, as pessoas simplesmente
não querem ser mudadas.
Qualquer tentativa de resolução de problemas tem que levar em conta a essência do
problema. O modo como vemos o mundo é a essência do problema! Qualquer problema,
em qualquer área de atuação humana. Nós criamos o mundo em que vivemos, então todos
os problemas não podem ter sido criados por mais nada a não ser por nós próprios. Pessoas
criaram e continuam constantemente criando as organizações. Continuamos criando o
mundo em que vivemos através de cada pensamento, cada palavra, cada ato.
De acordo com a nossa visão, é o nosso mundo. Se ele encontra-se em situação tão
negativa, certamente é porque isso reflete a nossa visão e a nossa atitude diante dele. E isso
é tudo que podemos fazer. Já que não podemos mudá-lo, podemos ao menos mudar a nossa
atitude diante dele.
Mas como fazer isso se nos concentramos em tarefas, atribuições, cargos, papéis e
dizemos que não temos para pensarmos em outras coisas? Como, por exemplo, no que é
realmente essencial para nossas vidas... Quantos de nós paramos para pensar: Por quê eu
estou fazendo isso tudo? Trabalhar, ganhar dinheiro, me divertir e me sustentar com isso,
mas e daí? Quantos no mundo têm a clareza de qual é seu propósito de vida? Ou será que é
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meramente trabalhar? Onde vamos chegar com tudo isso? Pense bem: quando você estiver
prestes a morrer, o que diria? Você diria que “Eu me tornei o melhor do mundo na minha
área de atuação, me diverti e ganhei muito dinheiro”?! Mas e daí, o que você vai levar disso
tudo? Então, qual é a importância verdadeira disso tudo?
Essa também não é uma discussão nova, mas certamente essa reflexão é o ponto de
partida para estarmos prontos para a mudança que está acontecendo.
O convite a uma “Revolução Positiva”
A globalização vem criando um sistema integrado mundial, num contexto global de
democratização. Na mesma extensão em que isso torna mais visíveis para o mundo todo as
contradições e problemas do sistema internacional, também torna mais visíveis as
demonstrações de evolução do espírito humano, da conscientização de muitos sobre a
mudança que está transformando essa realidade. Algo que ilustra isso e que está bem
próxima da realidade do mundo empresarial é o rápido crescimento do 3º setor, para o qual
as empresas procuram adaptar-se através de responsabilidade social. No início chamava-se
“marketing social”, termo que já se tornou ultrapassado, mostrando a evolução das
empresas nesse aspecto.
O Fórum Social Mundial reúne anualmente milhares de pessoas que acreditam,
como diz o slogan, que “um mundo novo é possível”. Aqueles que percebem a mudança
fazem o seu movimento. Mas será que mesmo o 3º setor está ciente de que mudança é essa?
“Queremos Paz!”, dizem todos. Certa vez fui a um evento de jovens lideranças e, na ficha
de inscrição, perguntava quais temas eu gostaria que fossem abordados naquele tipo de
encontro. Respondi que queria discutir sobre “a paz do ponto de vista da paz”. Todos
querem paz, todos pedem por paz, mas falam de guerra. Na recente ocasião do ataque
norte-americano ao Iraque, todos pediam por paz, mas xingavam o presidente americano.
Para protestar contra a raiva dos americanos, o mundo todo também fica com raiva deles,
mas pede por paz.
Isso mostra duas coisas importantes. Em primeiro lugar, que qualquer um que sinta
que há um processo de mudança no ar cria seu próprio movimento. Mas são poucos os que
entendem o processo, que entendem a mudança. Em segundo lugar:
“Nenhum problema pode ser resolvido no mesmo nível de consciência que o criou.
Precisamos aprender a ver o mundo como novo”.
Albert Einstein
Então, por quê continuarmos engajados em consertar o mundo velho se podemos
criar um mundo novo?
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Mudando a mentalidade organizacional
Passei mais de quatro anos na universidade ouvindo sobre a importância de
desenvolver o tal senso crítico. De fato, todos são excelentes críticos. Na hora de falar mal
dos outros, aparece um monte de gente à disposição: “Porque fulano blá blá blá. Beltrano
blé blé blé...” Mas a maioria sente-se ofendido se alguém vem e pergunta: “E quanto a
você?”
Como é possível mudar algo para o bem, se vivemos com o foco no mal? Sabemos
criticar muito bem as coisas e pessoas, mas será que sabemos apreciar?
Por quê o especialista em artes precisa chamar-se crítico de artes?
Por quê será que ele não pode chamar-se apreciador de artes?
A etimologia da palavra transformação (trans-formação) nos mostra o significado
real da palavra: ir além da forma. O que está além da forma é a essência positiva. Antes de
falarmos ou agirmos, necessariamente pensamos antes. Por ser o pensamento o primeiro e
mais profundo nível da nossa ação, para se promover uma mudança efetiva, é necessário
primeiro ter uma atitude mental positiva. Tudo sairá de acordo com isso. Não é possível um
mundo novo se as pessoas forem as mesmas. Um mundo renovado requer gente renovada.
É nesse nível que a mudança ocorre, na mudança individual.
No mundo organizacional, é exatamente o mesmo princípio: a qualidade individual
é a base da qualidade total. O velho método de “solução dos problemas” está ultrapassado,
por causa do foco no negativo. “Nós temos um problema”. E é para ele que vai o foco na
grande maioria dos casos, ao invés de ir para a solução.
O que torna uma organização num problema é a própria visão limitada e
problemática de seus próprios membros. O que esses criam internamente será transposto
para a organização, e o que ela cria internamente é transposto para o mercado. O clima de
competição do mercado, por exemplo, é criado internamente nas próprias empresas, onde
seus funcionários começam competindo com os próprios colegas. Antes do clima de disputa
com as outras empresas, vem a disputa interna que alimenta a ocupação dos cargos
hierárquicos. Porque alguém é incapaz de vencer a si mesmo, precisa vencer os outros em
algo para se auto-afirmar. A competição detonou conceitos importantes e básicos como o de
que para se atender uma demanda, é preciso servir à sociedade.
Uma pessoa efetivamente positiva não vê problemas, só oportunidades. Mesmo o
que os outros considerariam um grande problema, alguém positivo consideraria, no
mínimo, uma chance de aprendizado. Diz a sabedoria popular que não há uma situação da
qual não se possa tirar algum benefício. Uma pessoa negativa foca-se mais nos problemas
que nas oportunidades e, com isso, torna coisas pequenas em grandes. A eficácia em
resolver as dificuldades externas é resultado direto da capacidade de resolver as
dificuldades internas.
Desfocar o negativo e levar o foco para o positivo de qualquer coisa, pessoa ou
situação é a condição básica para entender e viver a mudança.
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Apreciando o essencial
Nas organizações, logicamente isso não é diferente. Em primeiro lugar, temos que
aceitar o fato de o termo Recursos Humanos ser extremamente negativo. Esse termo nivela
os seres humanos, que são o essencial de uma empresa com os recursos financeiros, os
recursos tecnológicos. É como se os recursos internos das pessoas tivessem o mesmo valor
que os recursos materiais. Como se as pessoas fossem números ou máquinas.
Entretanto o que dá vida a uma organização? São as pessoas. E o que dá vida às
pessoas? O espírito que se manifesta através de valores.
A prática comum do RH é a de comprar modelos e conceitos prontos, trazendo
conceituações de fora sem adaptá-las às características próprias da empresa, de sua gente.
Soluções vindas de fora raramente promovem resultados efetivos, porque quando há um
desalinhamento entre o treinamento e os valores do indivíduo, o aproveitamento é
naturalmente baixo. Os métodos tradicionais focam-se na técnica e na força. No entanto,
vale lembrar que mesmo os grandes mestres das artes marciais só tornaram-se mestres em
função do trabalho de auto-conhecimento que fizeram. A técnica e a força vêm com isso.
Em uma empresa, pode-se ensinar técnica a um funcionário, mas se ele não é íntegro, muito
pouco se pode fazer.
De onde vem, então, a capacidade, a inteligência e o poder de um vencedor, de um
empreendedor bem sucedido? Seria simplesmente do desenvolvimento de técnica e força?
Ou é algo mais sutil e profundo? O que sustenta um campeão, antes de tudo, é uma
fantástica força interior. O espírito que o anima é o seu diferencial.
Como diz o presidente da Nutrimental e coordenador do Elos, Rodrigo Loures, “Na
aprendizagem organizacional sabemos que, em geral, os programas de treinamento
consistem em passar informação, desenvolver habilidades e adquirir know-how. No
entanto, este modelo está mais para ‘adestramento’ do que para aprendizagem propriamente
dita. Mas quando esse processo é apoiado respectivamente pela experiência, valores e
sabedoria, o aprendizado é muito mais efetivo. Aprendizagem implica em mudanças de
atitude, que decorrem de experiências reais e afetam o desenvolvimento de valores e
princípios, levando as pessoas a alcançarem a sabedoria”. Vale a lembrança, também, de
que a palavra educar vem do latim educare: tirar de dentro. Uma aprendizagem verdadeira
não insere nada de fora, mas tira de dentro.
As organizações são como icebergs: 90% está submerso. Porém as empresas tendem
a produzir seu planejamento estratégico levando em conta apenas a parte visível da
organização (sistemas, produtos, tecnologia), ao passo que há toda uma parte invisível
(sentimentos, emoções, medos, crenças, valores, vontade) que condiciona o comportamento
das pessoas e possui um peso muito maior. O que faz uma organização são as pessoas. O
que faz as pessoas são seus recursos internos. O importante, então, é elevar esses recursos,
capacidades e potenciais ao máximo. Como dizia Saint-Exupéry, em seu clássico “Pequeno
Príncipe”, o essencial é invisível aos olhos.
Numa pós-graduação em gestão de negócios, muito pouco vai se aprender sobre os
90% que movem o iceberg: desenvolvimento de valores e princípios, espírito de equipe,
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alinhamento das vontades coletivas e individuais. Mas muito vai se aprender sobre os 10%
acima da superfície: planejamento, gerência de produto, administração do conhecimento.
Liderança é ter virtudes
Pessoas virtuosas são comprovadamente líderes mais competentes. Liderança
refere-se basicamente à prática virtuosa de alguém. A capacidade de liderar outros depende
fundamentalmente da habilidade de liderar a si próprio, de administrar, organizar e conduzir
sua própria vida. Um líder é alguém que consegue tirar dos outros o que eles têm de
melhor, porque consegue fazer o mesmo de si mesmo.
Nos últimos anos, as mulheres têm assumido cargos gerenciais com mais
freqüência. O segredo disso resume-se a uma palavra que, para mim, é a mais importante
característica de um líder: doçura! Não é aquela doçura falsa melosa. Mas na verdade, a
doçura é uma síntese de todas as outras virtudes que uma pessoa possa ter. Doçura
verdadeira sabe exatamente quando ser flexível e quando ser firme. É como o equilíbrio
entre o amor da mãe e a lei do pai. Com esse equilíbrio, com uma sensibilidade muito mais
aguçada e, principalmente, um entusiasmo que inspira os outros, as mulheres vêm tomando
com grande mérito lugares de destaque nas grandes organizações.
Para ilustrar, vou citar um exemplo do primeiro evento que fiz, o “Jovens pela Paz”,
quando tentava uma parceria com o AfroReggae. Pessoas da Unesco, do Viva Rio e do Viva
Favela me disseram que eu deveria falar com a Márcia Florência, coordenadora de projetos
sociais do AfroReggae. No final eu fui descobrir porquê todos a colocavam como
referência: além da doçura, um amor pelo que faz entusiasmante e uma dedicação
inspiradora. De fato, uma líder verdadeira! Alguém que acredita tão firmemente no trabalho
que faz, que deixa transbordar ânimo e entusiasmo sobre os garotos que optam pelo
AfroReggae no lugar do tráfico de drogas. Hoje em dia no mundo organizacional, a
tendência tem sido: os melhores chefes são homens e os melhores líderes estão passando a
ser as mulheres.
Certa vez, trabalhei na produção de um evento de grande porte, que durava mais de
dois dias e que traria referências importantes do 3º setor e do governo federal ao Rio. Para
isso é necessário um grande talento e, de fato, a produtora do evento possuía um currículo
invejável, sendo até professora de eventos em pós-graduação. No entanto, a frieza tornava
alguém que tinha um grande potencial para ser líder em uma chefa, o que fazia com que
seus subordinados não se sentissem motivados. O desejo de boicotá-la era forte. Confesso
que até mesmo da minha parte. Isso prova que o profissional mais competente, por mais
que faça seu trabalho com muita qualidade, depende do trabalho de outros e, por isso é
necessário tornar os outros participativos e fazê-los sentirem-se úteis e valorizados. O
verdadeiro sentido da palavra delegar é inspirar outros.
Liderança está intimamente conectada com a inteligência espiritual. Um chefe é
alguém que possui um conhecimento técnico específico, um determinado know-how.
Conhecimento sem experiência gera arrogância. Inteligência Espiritual não segue a lógica
humana ordinária. Além de transcendê-la, possui uma vontade que vai além da capacidade
material. Auto gestão verdadeira é saber gerenciar a inteligência espiritual, usando
freqüentemente os valores internos e constantemente fazendo esforço para potencializar
essa capacidade.
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2 – PROMOVENDO A MUDANÇA NAS ORGANIZAÇÕES
Dentro de pouco tempo, a mudança será tão visível em todos os campos de atuação
humana, que as organizações que não se adaptarem a ela morrerão, independente da
posição no mercado. Não importa que seja um líder de segmento, uma das marcas mais
fortes do mundo ou um negócio com a melhor oportunidade do mundo. Todas que ainda
não atentaram para a mudança e que não despertarem a tempo serão esmagadas.
Indo até as raízes da transformação
Conta uma história da mitologia grega que os deuses queriam esconder dos
humanos o segredo da vida, o que os diferenciava dos humanos. Um deles sugeriu que ele
fosse escondido no mais profundo oceano, aonde nenhum peixe sequer chegou perto e onde
nenhuma alga jamais viveu. Mas alguém refutou: “Não! Os seres humanos dariam um jeito
de chegar até lá”. Outro, então, sugeriu que fosse escondido no planeta mais distante da
galáxia mais longínqua, um lugar tão longe onde os homens, mesmo depois de milhares de
anos de evolução científica, nunca imaginariam que pudesse existir. Mas alguém discordou:
“Não. Lá eles também chegariam de algum modo”. Então o deus mais sábio deu a idéia
final: “Vamos colocar no coração do próprio homem”.
A mudança é algo que não pode ser medido pela ciência, não pode ser tocado pelas
mãos, não pode ser alcançado em uma exploração milionária. Não podemos ver a mudança
no tronco de uma árvore, mas em seu cerne. Temos que penetrar profundamente na árvore
para alcançarmos a mudança. Para transformarmos a árvore velha, temos que ir ao que dá
vida a ela. Explorá-la até encontrarmos sua essência.
O despertar da essência positiva de uma organização, a exploração e a descoberta de
seu cerne de transformação positivo é o ponto a que precisamos chegar. As organizações
são organismos vivos. Então temos que alcançar o que dá vida a elas, o que as movem.
Podemos responder de forma simplória que o que as move são as pessoas, mas então o que
move as pessoas?
A sabedoria popular dá a isso o nome de “presença de espírito”. O espírito, a alma
que move as pessoas é o mesmo que move as empresas. Para nos inserirmos na mudança,
temos que despertar, animar, alimentar, dar força a isso que nos dá vida, a isso que nos leva
adiante.
Descoberta Intuitiva
A grande maioria dos consultores não está atenta à mudança. Prova disso é que
praticamente nenhum deles penetra no território do sensível. Ficam olhando para os 10% do
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iceberg acima da superfície e não mergulham no âmbito das empresas. Os poucos que o
fazem vão muito além.
David Cooperrider, PhD em Comportamento Organizacional pela Case Western
Reserve University, em Cleveland, começou a observar a maneira como sua esposa,
pintora, trabalhava e daí iniciou uma reflexão sobre o que é intuição. Desse modo, começou
a aventurar-se pelo espaço do sensível, aquilo a que Platão se refere como o Mundo das
Idéias, e que vem antes do Mundo Físico. Daí mergulhou em perguntas como “Por que o
ser humano faz as coisas da forma como faz?”
Um homem que despertou para a mudança, como outros, e que começou a se
engajar no foco da mudança: olhar para o positivo! Você também quer participar ativamente
da mudança? É muito simples: olhe para o positivo. Esqueça-se de seus defeitos, dos
defeitos do outros, dos defeitos da sua empresa e olhe apenas para o positivo, para o que dá
vida, para a essência positiva.
Um sinal da mudança surgiu com o Appreciative Inquiry (inquirição apreciativa).
Em sua definição, pelo próprio Dr. David:
“O Appreciative Inquiry trata da busca co-evolutiva pelo melhor nas pessoas, suas
organizações e o mundo relevante ao redor delas. Em seu foco mais amplo, ela envolve
uma descoberta sistemática do que dá ‘vida’ a um sistema vivo quando ele está mais vivo,
mais efetivo e mais construtivamente capaz em termos econômicos, ecológicos e humanos.
Envolve, de uma maneira central, a arte e prática de fazer perguntas que fortalecem a
capacidade de um sistema de apreender, antecipar e intensificar seu potencial positivo. Ela
centralmente envolve a mobilização de inquirição através da elaboração da “pergunta
positiva incondicional” freqüentemente envolvendo centenas ou às vezes milhares de
pessoas. Na inquirição apreciativa a árdua tarefa da intervenção dá lugar à velocidade da
imaginação e inovação; em vez de negação, criticismo e diagnóstico em espiral, há
descoberta, sonho e design. Busca, fundamentalmente, efetivar uma união construtiva entre
pessoas integrais e a totalidade massiva do que elas mencionam como capacidades
passadas e presentes: conquistas, recursos, potenciais inexplorados, inovações, pontos
fortes, pensamentos elevados, oportunidades, marcas de nível, pontos altos, valores vividos,
tradições, competências estratégicas, histórias, expressões de sabedoria, insights mais
profundos sobre o espírito incorporado ou alma; e visões de futuros valorizados ou
possíveis. Considerando todos estes juntos como uma gestalt, o Appreciative Inquiry
deliberadamente, em tudo o que faz, busca trabalhar a partir de relatos deste “cerne da
transformação positiva”! E ela pressupõe que cada sistema vivo tem muitos relatos ricos e
inspiradores não penetrados do positivo. Ligue a energia deste cerne diretamente à agenda
de transformação e transformações nunca pensadas como possíveis são súbita e
democraticamente mobilizadas”.
Repare o poder das palavras:
APRECIAR – 1. valorizar; o ato de reconhecer o melhor nas pessoas ou no mundo ao nosso
redor; afirmar pontos fortes, sucessos e potenciais passados e presentes; perceber aquelas
coisas que dão vida (saúde, vitalidade, excelência) a sistemas vivos 2 . Aumentar em
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valor, por exemplo, a economia apreciou em valor. Sinônimos: valorizar, premiar, estimar,
honrar.
INQUIRIR – 1. O ato de exploração e descoberta 2 – Fazer perguntas; estar aberto para
ver novos potenciais e possibilidades. Sinônimos: descoberta, busca, exploração
sistemática, estudo.
O método já foi definido como um “new yoga of inquiry”, considerando a origem
da palavra yoga, que vem do radical yug: conexão, lembrança. As pessoas conectam-se com
suas próprias forças e com as forças à sua volta, através da lembrança de um passado
vencedor e bem sucedido. Essa lembrança dá poder àquela experiência. Assim como a
prática de yoga (meditação) é nada além do que ensinar a mente a pensar de forma positiva
e elevada, a prática de explorar o potencial interno de forma apreciativa cria o hábito de se
pensar positivamente e olhar tudo à sua volta com esse foco.
Várias empresas e ONGs de grande representatividade e diversidade em vários
países do mundo já se transformaram através do poder das perguntas positivas, como
veremos mais adiante. E é muito fácil fazer isso: basta pensar positivo!
Escolha de Tópico Afirmativo
A parte mais importante de qualquer inquirição apreciativa é a escolha de tópico
afirmativo. Ele é a semente da árvore!
O tópico pode ser qualquer coisa que dê vida ao sistema. É isso que vai tornar os
sistemas da organização efetivos. De nada adianta conhecermos teorias sobre processos
sistêmicos se estes não são adequados àqueles que movem o sistema. Os “pacotes prontos”
do RH estão com seus dias contados. Os sistemas precisam estar baseados no que lhes dá
vida, pois uma organização é um organismo vivo.
Tópicos transformacionais são possíveis em qualquer situação, em qualquer área de
atuação, em qualquer campo de atuação humana. A grande evolução que podemos
promover é a mudança de percepção, a criação de uma nova perspectiva para o futuro.
Problemas facilmente se resolvem quando um novo cenário para a vida surge, mas não ao
refletir sobre eles.
Podemos usar os tópicos desde processos técnicos até projeções do futuro de
cidades, desde eficiências financeiras até trabalhos religiosos. A premissa fundamental é
que os sistemas humanos crescem na direção das suas perguntas mais freqüentes e mais
profundas.
É nesse momento que surge a “pergunta incondicionalmente positiva”. É ela que
move a inquirição. É ela que inicia a viagem à mudança.
O processo apreciativo (os 4 Ds)
Depois da escolha de tópico, vamos para os 4 Ds, o método aplicado:
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Descoberta (Discovery)
Vejamos um excelente exemplo de escolha de tópico afirmativo: um trabalho feito
pelo Dr. David Cooperrider em conjunto com o Dalai Lama:
A Surpresa da Amizade!
Poderíamos dizer que um objetivo-chave na vida é descobrir e definir o nosso propósito
de vida, e então fazer o melhor possível para concretizá-lo.
A – Você poderia compartilhar a história de um momento, ou de um período de tempo, no
qual o propósito de sua vida apareceu e ficou claro para você? Um momento no qual
o seu chamado aconteceu, onde houve um importante despertar ou aprendizado, onde
houve uma experiência ou evento especial, ou no qual você recebeu uma visão muito
inspiradora.
B – Agora, para além desta história… Qual a sensação que você tem em relação ao que
tem a fazer antes que sua vida, esta vida, termine?
Um título atraente, um texto introdutório curto com afirmações indiscutíveis e as
perguntas: a primeira sobre uma experiência do passado e a segunda para levar além. Isso é
tudo! A mudança já está sendo despertada...
O propósito da descoberta é mobilizar um sistema de inquirição completa para o
cerne de transformação positiva. O processo de entrevistas apreciativas, que é o coração do
método, gera a curiosidade necessária para criar um espírito de investigação. À medida que
as pessoas que participam das entrevistas se conectam para estudar as qualidades, exemplos
e analisar a essência positiva, a esperança cresce e o senso de comunidade se expande.
Nesta fase, as pessoas compartilham histórias de sucesso, percebendo a história
organizacional como uma possibilidade positiva.
Sonho (Dream)
Vejamos como foi conduzido o sonho do maior case brasileiro: Nutrimental, em
1997 (aprofundaremos esse assunto mais adiante):
O que o mundo está nos chamando para nos tornarmos? Quais são as coisas sobre nós que
não importa o quanto mudemos, nós queremos continuar no nosso futuro novo e
diferente? Suponhamos que hoje à noite, enquanto estávamos todos dormindo, um
milagre aconteceu e a Nutrimental tornou-se exatamente como gostaríamos que ela fosse
– todas as suas melhores qualidades estão magnificadas, expandidas, multiplicadas do
modo como nós gostaríamos de ver... de fato nós acordamos e agora é 2005... quando
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vocês entram na Nutrimental hoje o que vocês vêm que é diferente, e como vocês sabem
disso?
O papel do sonho é criar uma visão clara orientada para resultados em relação ao
potencial descoberto e em relação a questões de propósito superior, em função do que o
mundo quer que nos tornemos, desafiando assim o status quo. O sonho é o foco estratégico,
muito comumente consistindo de uma visão de um mundo melhor, um propósito poderoso e
uma declaração convincente de intenção estratégica.
A possibilidade de usar as artes nessa fase pode aumentar em muito a capacidade de
mobilização das perguntas.
Planejamento (Design)
Em um trabalho com uma organização parceira do Save the Children, um sonho
simples e poderoso foi projetado: “Cada pessoa no Zimbábue deve ter acesso à água limpa
em cinco anos”. A mudança de design exigida era crítica e foi essa:
Uma nova forma de organização baseada em uma rede de parcerias, não a hierarquia auto
suficiente da burocracia.
O princípio do design é criar proposições de possibilidades da organização ideal, um
design de organização que as pessoas sintam ser capazes de ampliar para articular o sonho.
A idéia é começar a sustentar o sonho com proposições viáveis para encaminhar a
organização para as ações práticas. As imagens do futuro emergem através dos exemplos
baseados na realidade do passado positivo da organização, que veio à tona na descoberta.
Histórias de reportagens positivas são usadas para criar proposições que liguem o melhor
do que existe com a aspiração coletiva do que pode vir a ser. Essa é a hora de planejar a
arquitetura social e tecnológica da organização.
Destino (Destiny)
Um exemplo do sustento criado na última fase do Appreciative Inquiry, feito pela
empresa americana GTE:
Você alguma vez fez grupos de foco com o cliente 100% satisfeito? Que tal mudar
medidas de call center? O que aconteceria se nós substituíssemos as medições de déficit
por medidas do positivo igualmente poderosas? Como nós podemos revitalizar os grupos
TQM, desmoralizados por uma análise espinha de peixe após a outra? O que aconteceria
se nós aumentássemos a análise de variação com os estudos de profundidade que ajudam
as pessoas a sonharem e definirem as próprias visões dos padrões de qualidade? Que tal
um programa de histórias de estrela para gerar um ambiente narrativo rico, onde os
clientes são solicitados a partilhar histórias de encontros com empregados excepcionais?
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Que tal uma reunião com executivos seniors para que possamos celebrar nossa
aprendizagem com eles, partilhar com eles sobre como ver o positivo mudou nosso
trabalho e vidas de família e mesmo recrutá-los para unirem-se ao RTP?
“De todas as criaturas da Terra, apenas os seres humanos podem mudar o seu padrão.
Apenas o homem é o arquiteto do seu destino”.
William James
O processo de trabalho é mais importante que o resultado. Este naturalmente sai
com a inquirição e os diálogos. O destino é o momento de sustentar as imagens de futuro. A
idéia é fortalecer a capacidade afirmativa de um sistema inteiro, capacitando-o a construir
esperança e impulso ao redor de um propósito profundo e criando processos para
aprendizagem, ajustamento e improvisação.
As pessoas assumem as ações necessárias para realizar o sonho. Isso funciona
melhor quando as pessoas assumem a implementação das idéias que deram. O melhor que
os facilitadores têm a fazer é afastar-se e deixar que a subversão positiva siga o seu
caminho, que é virtualmente impossível de ser bloqueado.
15
Princípios Básicos do
Appreciative Inquiry
Antes de falar sobre os cinco princípios que são centrais na teoria do Appreciative
Inquiry, vamos citar dois exemplos para ilustrá-los.
Muitos estudos cuidadosamente controlados indicam que placebos (medicamentos
inertes, sem efeito, usados em muitas pesquisas médicas) podem provocar resultados
efetivos. Em uma ocasião, os médicos ofereceram a uma paciente sem resultados até então
“uma poderosa nova droga”, que segundo eles inquestionavelmente aliviaria a sua náusea.
O efeito placebo associado com a sugestão de que a droga aliviava as náuseas foi o
suficientemente poderoso para agir na direção contrária do efeito farmacológico da droga
em si.
A peça Pigmalião, de Bernard Shaw, também transformada em filme, conta a
história do Professor Higgins, que insiste que pode pegar uma florista humilde de Londres
e, com um treinamento, fazê-la passar por uma duquesa. E ele tem sucesso. A nossa
expectativa influencia a performance dos outros.
Princípio Construtivista
Há uma ligação direta entre o conhecimento humano e o destino organizacional. Um
líder efetivo, um agente de mudança precisa ser capaz de assimilar o valor de que
organizações são um organismo vivo. Se conhecer organizações é imprescindível para
qualquer transformação, o modo como a conhecemos é decisivo. O modo como
conhecemos a mudança é primordial para nos moldarmos a ela e nos inserirmos nela.
O construcionismo é uma abordagem à ciência humana e à prática, que substitui o
indivíduo pelo relacionamento como o local do conhecimento. Desta maneira o
conhecimento é construído ao redor de uma forte apreciação do poder da linguagem e do
discurso de todos os tipos (de palavras para metáforas, para formas narrativas etc.).
O discurso determinista está completamente fora de qualquer abordagem aqui, bem
como os discursos etnocentristas, pois entendemos que construímos nossas realidades
baseadas em nossas experiências prévias, e não na simples teoria, coisa que é muito comum
entre os teóricos: quem tem conhecimento e não tem experiência torna-se arrogante).
Princípio da Simultaneidade
Inquirição e apreciação não são momentos separados, mas simultâneos. O despertar
para a mudança começa no momento em que se faz a primeira pergunta. Inquirição é
intervenção. Quando é feita uma pergunta positiva a alguém, a pessoa que recebe a
pergunta sofre, desde já, uma alteração de comportamento, pois esse tipo de abordagem
favorece a auto-estima de outra pessoa. As perguntas que fazemos são parte do processo de
mudança.
Aquilo que as pessoas pensam e falam a respeito, o que elas descobrem e aprendem
e as coisas que fornecem informações para o diálogo e inspiram imagens do futuro, tudo
16
isso está implícito na exata primeira pergunta que fazemos. As questões que perguntamos
preparam o palco para o que nós “encontramos” e o que “descobrimos” (os dados) torna-se
material lingüístico (as histórias), a partir das quais o futuro é concebido, conversado e
construído.
Princípio Poético
Ao contrário do comportamento habitual do RH, as pessoas e organizações não são
como máquinas, mas sim como um livro aberto em que as pessoas são co-autoras, da
mesma forma como uma obra de arte pode ter inúmeras interpretações.
Os passados, presentes e futuros são fontes intermináveis de aprendizagem, inspiração ou
interpretação. Precisamente como, por exemplo, as possibilidades sem fim de uma boa
obra artística.
Não há um único tópico que não possa tornar-se afirmativo. Não há um único
assunto que não possa ser focado para o lado positivo. Podemos estudar virtualmente
qualquer tópico relacionado à experiência humana em qualquer organização ou sistema
humano.
Wittgenstein dizia que palavras movem mundos. As histórias criadas a partir da
inquirição apreciativa movem mundos de capacidades e potenciais adormecidos nas
pessoas.
Princípio Antecipatório
Nossas imagens positivas do futuro conduzem às nossas ações positivas: essa é a
base crescentemente energizante e pressuposição básica da Appreciative Inquiry. A imagem
do futuro é o que guia o comportamento real de qualquer organização. A imagem daquilo a
que a mudança nos impele a nos tornarmos, desde o momento em que atentamos para ela.
O recurso humano infinito que possuímos para a geração de mudança
organizacional construtiva é a nossa imaginação e os discursos coletivos sobre o futuro.
Nosso futuro está sempre sendo projetado em nosso presente. Investigar possíveis
caminhos que remodelam a realidade antecipatória, especialmente a criação com arte, da
imagem positiva numa base coletiva, pode ser a coisa mais prolífica que qualquer
investigação pode fazer.
“Uma imaginação vívida compele todo o corpo a obedecê-la”.
Aristóteles
Princípio Positivo
Quanto mais positiva a pergunta que fazemos, mais bem sucedido é o esforço de
mudança. A palavra esforço, em hindi, significa aquilo que é bom para o eu: puroshati. A
abordagem positiva tem o poder de agregar, de realimentar.
Não tem qualquer valor começarmos nossas investigações considerando o mundo
como um problema a ser solucionado. Não estamos mais engajados em “consertar” o
mundo velho, mas sim em criar um mundo novo. Este é o chamado do tempo!
17
Origem filosófica
“Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro.
A verdadeira tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz”.
Platão
Todas as obras de Platão se dão através de diálogos apreciativos, quase sempre
protagonizados por seu mestre Sócrates, considerado o maior herói da civilização ocidental
ao lado de Cristo. A máxima que domina toda sua filosofia é “Conhece-te a ti mesmo”, uma
frase mais que imortalizada. Tão simples e, ao mesmo tempo, tão complexa. É muito por
causa da influência da filosofia socrática sobre todo pensamento ocidental que a Grécia
Antiga tornou-se o berço da civilização moderna ocidental.
Em vez de estudar o mundo físico, como os filósofos naturalistas que o precederam,
Sócrates dedicou-se ao estudo moral do homem e “fez descer a filosofia do céu à terra”. O
método utilizado pela filosofia socrática é chamado maiêutica. É a arte de provocar as
idéias, isto é de fazer com que o interlocutor descubra as verdades que nele já existiam,
através de perguntas. Elas têm por fim fazer surgir na mente do interlocutor noções ou
idéias novas, formadas à custa de outras já existentes, ou levar o discípulo ao conhecimento
do próprio erro, para seguidamente o conduzir ao descobrimento da verdade.
O processo parte das perguntas, nunca de definições. Nesse processo a resposta
definitiva não vem, mas sim uma investigação que busca cada vez mais profundidade,
sempre através de perguntas (e da oralidade). É um sistema de pesquisa, de exploração do
conhecimento filosófico. O objetivo final é a revelação da verdade que cada alma traz em
si.
Vejamos os 5 princípios básicos do Appreciative Inquiry de acordo com a maiêutica:
Princípio Construtivo – O conhecimento humano está diretamente ligado ao seu
destino. A forma como Sócrates conhece é decisiva no processo de revelação da verdade.
Princípio da Simultaneidade – As perguntas de Sócrates já traziam em si a verdade.
A inquirição filosófica e o despertar da sabedoria, da verdade são momentos simultâneos.
Ao perguntar, Sócrates já estava revelando a essência do objeto estudado.
Princípio Poético – Não há um único assunto sobre o qual a filosofia não possa
inquirir. As afirmações filosóficas são fontes de possibilidades de interpretações variadas.
Princípio Antecipatório – A revelação da verdade, através do conhecimento
filosófico, antecipa o futuro virtuoso do homem. O filosofar remodela a realidade
antecipatória, através da verdade.
Princípio Positivo – Quanto mais verdadeira uma afirmação de Sócrates, mais
efetiva é a assimilação de virtudes. As perguntas filosóficas com poder para revelar a
verdade são necessariamente “perguntas incondicionalmente positivas”.
18
O que é mais importante:
Inquirição ou Apreciação?
Dr. Rodrigo Loures, presidente da Nutrimental, diz que o forte não é a inquirição
nem a apreciação, mas o foco no positivo. Para o Dr. David, também, essa é a essência do
método, mas entre aqueles dois, diz que a inquirição é mais importante, pois se não houver
indagação, não pode haver apreciação. Na pergunta, já está a semente da transformação. O
método todo é movido pelas perguntas, mas o que move as perguntas é a atitude
apreciativa. Muitas perguntas de diversos tipos diferentes nos são feitas, mas por quê estas
perguntas têm poder especial de transformar? Porque são positivas, porque possuem uma
pré-disposição de valorizar as experiências e as capacidades do ser humano.
As questões são estritamente necessárias para a aplicação do método, porque nelas
está o despertar do cerne da transformação positiva. Não seria possível mobilizar as pessoas
com afirmações, mesmo que fossem apreciativas. Pessoas de baixa auto-estima dificilmente
acreditam em afirmações positivas sobre si próprias. As perguntas são a chave para tirar das
pessoas o que elas têm de melhor, porque em geral, elas não sabem de suas capacidades. O
ser humano não conhece seu próprio poder. É somente através de questionamentos
positivos que isso é possível. As perguntas movem o aprendizado, fazem com que o
intelecto seja exercitado. Esse movimento interno de busca só pode ser provocado através
de perguntas preenchidas de poder que obriguem as pessoas a responderem de forma
apreciativa, de um modo que elas percebam o que lhes dá vida.
Mas qual dos dois gera a transformação de fato? Se o despertar do cerne está nas
perguntas, na exploração, o cerne em si está na apreciação, na valorização. Ele surge nas
perguntas, mas isso só é possível porque antes mesmo da ação de perguntar, há um
pensamento positivo e um sentimento de levar benefício, valorizando as experiências e as
capacidades das pessoas. Isso cria uma intenção apreciativa que é transposta para as
perguntas. A descoberta apreciativa que acontece com as perguntas é o que proporciona o
alcance do cerne, da essência positiva. Então a mudança organizacional ocorre na extensão
em que se foca no positivo, na extensão em que as perguntas são positivas. Ou seja, ambos
se complementam, mas o espírito é a apreciação. O que dá vida e poder às perguntas é a
atitude apreciativa e esse é o essencial do Appreciative Inquiry. Vejamos o poder da
palavra:
ATITUDE – norma de proceder; reação ou tendência determinada de comportamento em
relação a qualquer estímulo ou situação; maneira de significar um propósito.
O nosso propósito é nos adequarmos e estarmos prontos para a mudança. E é a
apreciação que nos proporciona a estar aptos para a mudança. As perguntas são a forma de
criar essa atitude apreciativa, que é o que fica depois que o método é aplicado. O que
possibilita as pessoas, e conseqüentemente, a empresa a estarem preparados para a mudança
é o foco no positivo, na solução e não nos problemas.
19
A apreciação é o espírito que move a inquirição!
Diferenças entre o método de “solução de problemas”
e a inquirição apreciativa
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E O APPRECIATIVE INQUIRY
Resolução de Problemas
Identificação do Problema

Análise das Causas

Planejamento das Ações

Premissa básica:
A Organização é um
problema a ser resolvido
Appreciative Inquiry
Apreciação e Valorização do
melhor, do que dá vida: “O que é”.

Visão de “O que pode ser”

Diálogo sobre “O que deveria ser”

Premissa básica:
A organização é um mistério a
ser abraçado.
20
3 – CASES DE SUCESSO
Conhecemos as conseqüências do foco no problema: lamentação sobre o passado,
falta de imagens positivas para o futuro, enfraquecimento dos relacionamentos... As
palavras são batalha, risco, reavaliação de performance, crítico...
Qualquer sistema organizacional que dê certo, é porque certamente tem o homem no
seu coração. No atual processo de mudança em meio a um cenário de crise que não afeta
apenas o Brasil, somente as empresas que se focarem no ser humano como seu elemento
primordial, não como um mero recurso nivelado a qualquer outro (como sugere o termo
“Recursos Humanos”), conseguirão estar no olho do furacão. O modelo de empresa focada
meramente no mercado e nas oportunidades de negócios está mais que ultrapassado. Certa
vez assistia a um seminário promovido pela Coca-cola na PUC e um dos gerentes do
departamento de responsabilidade social, ao ouvir de um aluno o termo “marketing social”,
interviu dizendo: “Esse termo não é bom. A empresa tem que fazer o bem”. Um tempo
depois, também na PUC, ouvi da gerente de responsabilidade social da Shell, ao final de
uma excelente palestra, responder uma pergunta de um aluno, dizendo: “O objetivo final é
o lucro”. A teoria mais básica do marketing nos diz que para se atender uma demanda, é
preciso servir a sociedade. No entanto a feroz competição do mercado fez com que se
tentasse o lucro por outros meios, outras vias que não o benefício à sociedade.
Trabalhei durante um tempo na área de marketing em uma empresa onde as pessoas
tinham realmente um grande amor por ela, gostavam de fazer aquilo e faziam muito bem.
Hoje ela é considerada uma das cinco melhores empresas do Brasil em sua categoria e os
ex-membros, que àquela época iniciavam carreira, estão espalhados por empresas como
Accenture, Shell e Young & Rubicam. Durante o tempo em que estive lá, ainda imaturo e
sem experiência, quase arrumava brigas com os colegas porque não olhavam para o lado
humano da empresa. O RH preocupava-se quase que exclusivamente com processos de
seleção para a empresa e clientes. Um tempo depois de sair de lá, fiz um evento e tentei a
parceria deles. Desisti no momento em que o presidente me disse: “É, vamos ver a
visibilidade de marca que nós vamos ter”. Felizmente ainda não tinha conseguido as
grandes parcerias do Viva Rio e do AfroReggae que dariam a tal visibilidade de marca que
ele queria. Mas o fato é que eu estava fazendo um evento que tinha como foco o jovem
como agente de transformação do mundo, e logicamente que jovens fazendo marketing
social para suas empresas não se encaixavam no espírito do encontro.
A mudança que se processa hoje em todos os campos da atuação humana não
permitirá que empresas com esse perfil de lucro pelo lucro sobrevivam.
Que será que vale mais a pena? Trabalhar em uma empresa líder de mercado com
altos níveis de stress e dificuldades de relacionamentos ou trabalhar em uma empresa
considerada pelo mercado como sendo menos significativa, mas onde exista uma cultura
apreciativa e relacionamentos positivos, onde o funcionário sinta-se valorizado e possua
níveis de stress mais baixos que gerem uma maior qualidade de vida? Acho interessante
21
quando alguém vem e enche a boca para dizer: “Eu trabalho em tal empresa”. No entanto,
quando você pergunta algo simples do tipo de “Como você vai?”, então a pessoa sempre
responde: “Ah, muito cansado, muito sem tempo”! Esse conceito moderno de que temos
milhares de coisas para fazer e que por isso os executivos são muito ocupados e não têm
tempo é uma grande ilusão: de horas e mais horas de trabalho, o que será que se produziu
de fato? Trabalha-se muito e produz-se pouco. Dee Hock, fundador da Visa International,
diz que os empresários gastam mais da metade de seus tempos com suas próprias
burocracias internas.
Isso acontece porque as pessoas não conhecem a si próprias, não têm noção de suas
qualidades pois se preocupam exclusivamente com adquirir conhecimento, informação e
know-how, e quando alguém lhe pergunta, por exemplo “Você não pensa em participar de
um programa sobre qualidade de vida?”, a pessoa responde “Eu preciso muito, mas não
tenho tempo”. Porque além de seu trabalho, que já é cansativo e estressante, se envolve em
uma série de cursos para adquirir mais conhecimento pois pensam que aquilo é essencial
para manter-se competitivo no mercado. Agora pergunte a uma pessoa assim:
- Qual é a sua maior qualidade?
- Ah, nunca pensei nisso?
- Por falta de tempo?
- Não. Porque... sei lá.
É claro que assimilar conhecimento sobre as coisas que vêm de fora é importante,
mas conhecer a si próprio é que é essencial. Conhecendo a si próprio é possível assimilar as
coisas de fora com mais clareza e discernimento. Retomando o exemplo dos grandes
mestres de artes marciais, a técnica e a força que assimilavam era fruto de um grande
trabalho de auto-conhecimento. Quando vi frases de Bruce Lee em uma revista de kung fu,
fiquei impressionado com sua sabedoria. Sua força vinha de dentro. Se uma empresa não
obtém resultados ou mesmo os obtém, mas reclama de stress e cansaço mental, é porque
está se focando em processos, técnica e sistemas, e não no ser humano. Stress é fruto de a
pessoa estar centrada no que está fora ao invés de estar centrada em si mesma. Cansaço
mental é fruto de pensamentos inúteis, não de esforço físico. O esforço mental é mais
efetivo quando a pessoa é centrada em si, e não fora.
O Appreciative Inquiry já fez várias organizações de grande relevância em diversos
lugares do mundo mudarem seu foco e realmente transformarem-se através do despertar do
cerne positivo, da essência positiva de seus membros e, conseqüentemente de toda empresa.
A tomada de consciência do que é realmente vital para a vida organizacional é algo central
nesse processo e é despertado através das perguntas apreciativas.
Além do método velho e ultrapassado da “resolução de problemas” que se foca nos
problemas (ao invés de se focar na solução), outro aspecto que torna fracassada a maioria
das tentativas de se transformar o ambiente organizacional para aumentar a produtividade é
o fato de se procurar adequar “pacotes prontos” sem considerar as características das
pessoas que compõem a organização.
A inquirição apreciativa é uma solução endógena, pois é a mudança positiva dos
próprios funcionários que gera uma mudança positiva na atuação geral da empresa. Eles
próprios, através do despertar de seus potenciais e especialidades, é que sustentarão os
22
pilares da empresa, pois isso proporciona a cada um maior capacidade de liderança e auto
gestão, o que proporciona maior qualidade de vida aos ambientes de trabalho e,
naturalmente, maior produtividade.
Perfis diversos
Resultados semelhantes
É interessante observarmos a diversidade existente entre as organizações que
obtiveram sucesso com a aplicação do Appreciative Inquiry. Vai desde grandes empresas
norte-americanas até ONGs internacionais que trabalham com a religião e a espiritualidade.
Vejo dois fatores em particular que explicam esse fato. Recorrendo ao Princípio Poético,
lembramos que qualquer tópico do conhecimento ou da experiência humana pode ser foco
de um trabalho de inquirição apreciativa, pois é possível tornar qualquer tópico afirmativo,
focando-se em seus aspectos positivos. O outro aspecto é o fato de o método possuir uma
forte veia espiritual. Ao definir o método, Dr. David fala em atingir as capacidades
massivas dos potenciais passados e presentes, através de insights mais profundos sobre o
espírito incorporado ou alma. Esse é um tópico que vem sendo muito valorizado pelas
empresas nos últimos anos, que vêm assimilando termos como “inteligência espiritual” e
criando salas de meditação para seus funcionários. Ao mesmo tempo a possibilidade de
tornar o foco de qualquer coisa positivo é extremamente atraente para qualquer tipo de
pessoa que busque qualidade de vida em todos os seus níveis.
Nos EUA, empresas como Shell, British Airways, PriceWaterhouseCoopers, BP
América, GTE, Omni Hotels, Myrada, Syntegra, DTE Energy Services, Star Island
Corporation, Hunter Douglas Window Fashions Division, McDonald’s e até a NASA são
exemplos de sucesso do Appreciative Inquiry. Aprofundaremos os cases destes dois últimos
a seguir.
Na América Latina, há experiências bem sucedidas como o recente trabalho para o
governo do México, bem como para a Avon do mesmo país. Na Argentina, a Techint e no
Brasil, a primeira empresa a utilizar o método foi a Nutrimental, case que aprofundaremos
logo a seguir. Além dela, a Votorantim Metais, Alstom Brasil, SHN, Autopeças ROLES,
Farma & Cia, Birello Calçados, CIMCORP, Fundação CESP e o Suzano e Bahia Sul
Celulose. Além disso, institutos como o Ethos e o Elos utilizam freqüentemente o método
para seus eventos focados, respectivamente, em responsabilidade social e liderança com
espiritualidade.
ONGs norte-americanas como Nature Conservancy, Imagine Chicago, Imagine
Dallas, American Hospital Association, Group Health Cooperative e The Mountain Forum
também experimentaram excelentes resultados. Organizações internacionais como a
Universidade Espiritual Mundial Brahma Kumaris e a United Religions International
também utilizam as entrevistas apreciativas. Esta última desde sua criação, em 1998.
23
Nutrimental
Eu já conhecia previamente por alto sobre o sucesso do uso do Appreciative Inquiry
na Nutrimental. Obtive o contato com o Dr. Rodrigo Loures e ele me passou à pessoa
correta para me passar as informações. No primeiro e-mail que recebi dela, a despedida
vinha do seguinte modo:
Apreciativamente,
Bruna Pachelli
Gestão de Pessoas
Nutrimental sa
De cara, dois aspectos me chamando a atenção: “Apreciativamente” no lugar de
“Atenciosamente” ou “Cordialmente” e “Gestão de Pessoas” no lugar de “Recursos
Humanos”. Sobre o primeiro, pensei: Será que o método apreciativo foi tão bom assim para
a empresa? Sobre o segundo pensei: Até que enfim um nome adequado! O que vim a saber
depois é que o nome deve-se à junção da parte de departamento pessoal com a de
desenvolvimento de pessoas.
Um marco na história da empresa
O primeiro contato da Nutrimental com o Appreciative Inquiry foi através de seu
diretor, Dr. Rodrigo Loures, que participou de um seminário sobre a metodologia, em maio
de 1997, no Taos Institute. Ele não sabia do que se tratava. Pensava que tinha alguma
relação com o Taoísmo. Quando soube o que era o método, achou que era exatamente o que
sua empresa precisava. A empresa trabalhava com merenda escolar e ia muito bem, até que
o governo mudou a forma de compra de merenda, fazendo com que seus clientes
quebrassem.
Sendo assim, em junho do mesmo ano, a empresa organizou um projeto piloto, com
70 pessoas da Nutrimental e empresas coligadas para conhecer a metodologia. Em
setembro, foi realizada uma Conferência de “Appreciative Inquiry e Future Search”
(Investigação Apreciativa e Busca do Futuro), com o tema “Vamos Pensar Positivo”,
facilitada pelo Dr. David Cooperrider. No primeiro dia de conferência, contou com a
participação de todos os 700 funcionários da organização para a aplicação da descoberta e
do sonho. Nesta fase, as perguntas apreciativas inspiraram todos a pensar sobre o que o
mundo está os chamando para tornarem-se e como seria a Nutrimental ideal em 2005, com
todas as potencialidades descobertas na primeira fase potencializadas.
No segundo dia, o design e o destino tiveram a presença de um grande grupo de
planejamento (aproximadamente 200 pessoas). Além de elaborar uma visão de futuro,
projetos de ação foram assumidos por grupos voluntários. Desses trabalhos resultou o
“Plano Estratégico 2001” em que a empresa criava uma nova missão, valores e visão de
futuro.
24
A atual coordenadora da Gestão de Pessoas, Bruna Pachelli, entrou na Nutrimental
em setembro e relata o ambiente da empresa àquela época: “Quando participei da
integração dos novos estagiários, todos comentavam que a empresa estava em um processo
de mudança e, com orgulho, atribuíam aquilo ao evento de setembro. Diziam que muitos
haviam se emocionado. Eles falavam que ‘o apreciative é muito importante’ ”. Todos
estavam muito empolgados e contentes. Todos só comentavam aquilo e a motivação era
muito grande”.
Foi um momento muito especial e um ponto de virada na história da Nutrimental. A
partir daquele momento, o diálogo interno da empresa mudou, tornando-se mais positivo,
com impactos em todos os setores, dos resultados financeiros à vida pessoal dos
funcionários. Em 1998, outra conferência foi realizada, desta vez com o tema “Do Sonho e
Valores para os Princípios da Ação Organizacional”, também envolvendo todos os
funcionários. Nesse evento foram avaliados e reafirmados os valores definidos
anteriormente, partindo-se para definir o que os funcionários consideravam fundamental
para realizar a missão da empresa e viver de fato os valores escolhidos. Com as idéias
levantadas, uma comissão voluntária redigiu onze princípios de ação, que foram depois
referendados pelos colaboradores.
Em 1999, o tema da Conferência foi “Reconceitualização” e tratou de aspectos
estratégicos para o futuro da empresa, culminando com a definição de cinco áreas
prioritárias para o desenvolvimento de conhecimentos e habilidades, que foram assumidas
por cinco grupos de trabalhos, com a missão de desenvolver e disseminar as competências
necessárias para o sucesso. Durante 2000 e 2001, a estrutura da empresa começou a ser
reformulada e os processos apreciativos diários foram consolidados.
Em 2001, um novo sistema de governo começou a ser aplicado, baseado em uma
atuação democrática (diferente de democracia participativa), com os princípios de um fluxo
auto-organizado que acontece naturalmente no universo de possibilidades, novas formas
para a distribuição do poder e autoridades orgânicas na natureza. Os principais benefícios
experimentados foram a reorganização acelerada, abrangente e de grande
comprometimento.
Propósito
1997
Sistema de
Governo
2001
1997
Princípios
1998/99
2001
Estrutura
2000/01
Pessoas
1998/99
Conceitos
1999
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Impactos no cotidiano
A primeira empresa brasileira a adotar o Appreciative Inquiry passara a adotá-lo em
todos os setores da organização, sendo desenvolvido e acompanhado por um grupo
formado por colaboradores de todos os níveis operacionais da Nutrimental.
O método tornou-se a linha-mestra de todos os processos, que passaram a ser
alinhados a partir dele. O relacionamento com os clientes foi aprimorado através de vários
eventos apreciativos com grandes grupos. A área de marketing realiza periodicamente
eventos apreciativos, trazendo grupos de clientes à empresa para ouvir o que eles mais
valorizam nos produtos da Nutrimental e como eles vêem o futuro.
O ex-Recursos Humanos, além de ganhar um nome adequado, promove eventos
para toda empresa ao menos uma vez por ano. Em processos seletivos, além de procurar
fazer com que ninguém se passe por ridículo, as entrevistas são em estilo apreciativo, para
ver se a pessoa possui os mesmos valores da empresa, pois não adianta ser um bom técnico
se não tem valores. Os entrevistadores falam sobre sucesso e é comum que os candidatos
se assustem. O processo de integração também foi totalmente revisto. Ao invés dos
tradicionais “Não podem..., não devem...”, o programa foi reformulado focando o positivo:
como a empresa deseja que o bom colaborador se comporte. As avaliações dos participantes
e dos instrutores costumam superar 80% de excelente e muito bom.
Responsabilidade Social
A Responsabilidade Social da Nutrimental ocorre em função do trabalho de
responsabilidade comportamental que a empresa produz internamente. De fato, uma
empresa que faz um grande trabalho de responsabilidade social (algumas chegam a criar
fundações que se tornam referências no 3º setor) e não cuida internamente da qualidade de
vida e dos relacionamentos de seus funcionários, cria um ambiente de aprendizado contínuo
mas focado apenas em know-how e não estimula todos se desenvolverem como pessoas faz
um trabalho meramente pró-forma.
A Nutrimental realmente põe em prática seus princípios e valores como
horizontalidade, inovação e integridade. Horizontalidade é mais efetiva quando há uma
hierarquia mais horizontal ou mesmo quando os líderes de uma hierarquia mais vertical são
extremamente conscientes de seu papel de liderança, estimulando seus subordinados
através de fazê-los sentirem-se valiosos. Inovação é naturalmente obtido em um ambiente
apreciativo, pois estimula a criatividade de todos. Quanto à integridade, perguntei à Bruna o
que ela acha ser mais importante e em que extensão: técnica ou valores. Ela me respondeu:
“A parte mais importante são os valores. A parte técnica nós ensinamos, mas integridade
nós não podemos ensinar. Entre uma pessoa tecnicamente boa e outra com o perfil da
empresa, que tem uma predisposição a pensar positivamente, certamente escolhemos essa
última. A empresa tem muito essa preocupação. O nosso ambiente é de colaboração. Uma
pessoa competitiva não se encaixa aqui”.
A Gestão de Pessoas (não mais Recursos Humanos) mudou o processo de
integração, acabando com o velho método de apresentar a empresa para novos membros
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com as tradicionais proibições. Isso foi reformulado, sendo desenvolvido um treinamento
com os instrutores, incluindo dinâmicas de grupo para que os novos membros se
conhecessem e se sentissem mais à vontade. Mesmo quando a pessoa se desliga da
empresa, há um processo de entrevista de desligamento apreciativo enfocando os sucessos
que ela teve na empresa.
Outros trabalhos internos que são desenvolvidos são o jornal “O Apreciativo”, que
enfoca sempre tudo de positivo que a empresa e os funcionários produzem. Há um projeto
de estudo chamado “Projeto Crescer”, em que colaboradores e voluntários dão aula de 5 a a
8a série, o que mostra a aplicação daquele que talvez seja o valor principal da organização
que é o aprendizado contínuo. Este se torna extremamente efetivo, quando trabalha em
cima da origem e do sentido verdadeiro da palavra educar, que é tirar de dentro. Ao invés
de encher os funcionários de teorias e know-how, a Nutrimental estimula um ambiente
apreciativo, que proporciona motivação verdadeira aos funcionários, a partir de dar um
sentido real ao trabalho deles.
A base disso tudo foi o despertar apreciativo proporcionado pelo Appreciative
Inquiry.
Em uma apresentação feita ao Instituto Ethos sobre o trabalho de responsabilidade
social da empresa, o presidente da Nutrimental, Dr. Rodrigo Loures, colocava uma visão
geral sobre o processo de lidar com a totalidade.
Por quê lidar com a totalidade?
Visão sistêmica;
Criatividade – o melhor das pessoas emerge quando o sistema todo está envolvido;
Prontidão para a mudança – coisas extraordinárias acontecem e o entusiasmo que
anima as pessoas é indescritível;
Conexão com espírito, afeto e aprendizagem;
Valorização da liberdade, responsabilidade, auto-organização e, em última análise,
felicidade das pessoas...
O próprio Dr. Rodrigo diz que o Appreciative Inquiry libera a “vida” na organização
e a torna forte através da liderança positiva em todas as partes do negócio. Agora, então,
entendemos o porquê de a Gestão de Pessoas (não RH) da Nutrimental dar tanta
importância aos valores humanos de seus membros.
Lições e resultados
Vejamos os tópicos destacados pelo presidente da Nutrimental na apresentação feita
para a Conferência Nacional do Instituto Ethos de 2001 sobre as lições e os resultados que a
empresa obteve nesses anos de prática do Appreciative Inquiry:
27
Lições
1 – O nosso negócio deve ser baseado em inclusão e não em exclusão;
2 – Interesse pelo conhecimento é inato no ser humano...
3 – É preciso:
- Rever as atitudes e procedimentos de gestão;
- Liberdade para favorecer uma nova ordem baseada no compartilhamento de poder;
- Ter a coragem de nos reinventarmos sempre;
- Estar preparado para lidar com a ansiedade natural das pessoas;
- Paciência e compreensão para deixar as resistências se esvaziarem sem recorrer ao uso
do poder;
- Ter fé e bons argumentos para sustentá-la...
Resultados
- Organização baseada em valores;
- Nova e mais clara visão das possibilidades e caminhos disponíveis para a empresa;
- “Energização” dos indivíduos e “sentimento de propriedade”;
- Espírito de colaboração;
- Melhoria contínua de produtividade e lucratividade;
- Institucionalização da aprendizagem organizacional...
- Prontidão para a mudança;
- Alinhamento de todas as atividades – PADAs e Self Management Leadership;
- As pessoas aplicando os conceitos aprendizados nos planos pessoal, familiar e
comunitário;
- Clientes e fornecedores engajando-se no processo...
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McDonald’s
(EUA)
Para estar pronto para os desafios do século XXI, o McDonald’s começou a
trabalhar em cima do slogan “People First”, cujo foco é atrair, educar e manter os melhores
empregados, tornando-se um modelo para as práticas e oportunidades progressivas de
empregabilidade e um membro admirado da comunidade global e de cada comunidade
local onde atua. Sua meta é “Ser o melhor empregador em cada comunidade, ao redor do
mundo”.
Desse modo, o tópico da exploração apreciativa feita na empresa foi “Tornando-se o
melhor em cada comunidade ao redor do mundo”. Em 1999, Jack Greenberg, CEO,
chamou os profissionais de RH para substituir o tradicional “salário, compensação e
benefícios” por uma estratégica parceria de negócios. Seu objetivo era construir o capital
intelectual e social da organização e de suas pessoas, para preparar o McDonald’s para o
futuro, entrando em parcerias catalíticas com proprietários / operadores de restaurantes ao
redor do mundo para melhorar sua imagem e expandir o serviço de excelência. Esta
substituição foi a maior e mais crucial mudança de cultura para a organização.
Um evento apreciativo foi feito com o nome de “Tornando-se o melhor parceiro de
negócios para o novo milênio”. A inquirição começou com os gerentes do RH do Grupo do
McDonald’s do Meio Oeste entrevistando os mais importantes stakeholders (gerentes de
restaurantes, gerentes operacionais, gerentes regionais, proprietários / operadores, gerentes
de ponto de venda), com essas três perguntas centrais:
1.
2.
3.
O que nos faz mais cheios de sucesso quando nós estamos em nosso melhor
como parceiro estratégico de negócios (princípios para preservar)?
Imagine o McDonald’s daqui há 3 anos como o melhor empregador em cada
comunidade ao redor do mundo no setor de fast food. Como seria? O que nós
estamos fazendo a mais e a menos de completamente novo (imagem para o
futuro)?
Se você pudesse desenvolver ou transformar a função do RH de qualquer modo
para avançar completamente a agenda do “People First”, quais três desejos, em
ordem de prioridade, você faria para contribuir para essa excelência
(crescimento de oportunidades)?
Na segunda fase, os gerentes de todas as divisões dos Recursos Humanos,
supervisores, recrutadores, assistentes, coordenadores, além de alguns stakeholders foram
reunidos no Encontro anual de negócios dos Recursos Humanos da divisão Meio Oeste. O
29
propósito era identificar “princípios para preservar”, explorando exemplos de performances
de pico no passado. Princípios para preservar são valores, práticas, estratégias, estruturas e
meios de fazer coisas com que o time tenha um valor tão forte que aquilo precise ser
sustentado e nutrido, independente das mudanças que possam acontecer na organização
para o futuro.
Os princípios identificados pelo grupo incluíam:
- integridade
- confiança
- valorizar a diversidade
- confidencialidade
- colaboração
- experteza
Na terceira fase, trabalharam juntos para desenvolver um guia positivo de seu
futuro, identificando os desejos e expectativas mais importantes que eles tinham para o
futuro, através da criação de um “mapa de oportunidades” das iniciativas estratégicas chave
que eles queriam coletivamente perseguir nos três a cinco próximos anos.
Ao final, os participantes criaram uma série de “design initiatives” com a intenção
de traduzir aquelas oportunidades em ação. Eles formaram times ao redor de diferentes
iniciativas e criaram planos para implementação, e então compartilharam-nos para um
grupo maior a fim de obter patrocínios e compromissos para recursos. As iniciativas
específicas incluíam:
- Construindo as habilidades e conhecimento de negócios do time do RH
- Treinamento em desenvolvimento organizacional para o time do RH
- Reestruturando o Departamento de RH em um Departamento de
Desenvolvimento
- Iniciando um Appreciative Inquiry Global com o quadro de pessoal e
recrutamento
- Influenciando a organização para ganhar market share
- Identificando e desenvolvendo estratégias para gerar o maior retorno por
investimento
O processo de Appreciative Inquiry continua no McDonald’s. Além das iniciativas
acima, o departamento de Recursos Humanos do Meio Oeste responsabilizou-se pr
organizar um simpósio global sobre tornar-se o melhor empregador em cada comunidade
ao redor do mundo em fast food. O método foi usado para coletar e compartilhar as
melhores práticas e para emergir inovações em recrutamento e manutenção de funcionários
ao redor do mundo. No Brasil, por exemplo, o McDonald’s é uma das empresas que mais
emprega. É incrível ver, por exemplo, que possui mais funcionários que os correios, mesmo
não estando em todas as capitais do país.
30
Para a equipe do RH do Meio Oeste, o Appreciative Inquiry teve um impacto
especial por dois motivos. Primeiro, porque elevou a energia positiva para mudança quando
o time descobriu novamente as aspirações comuns de cada colega e de cada stakeholder.
Segundo, porque inovação, na medida em que todos os stakeholders-chave visualizaram,
planejaram e implementaram a mudança de uma forma apreciativa “em um único quarto”.
Na maioria das organizações, a distribuição da informação é largamente feita para as
pessoas mais importantes, enquanto que aqueles mais próximos ao cliente (que serão a
amostra da empresa) geralmente têm as informações mais críticas. Um impacto muito
positivo relaciona-se à mudança dessa consciência dentro do Departamento de Recursos
Humanos do McDonald’s do Meio Oeste dos EUA.
31
NASA
Em 1996, a NASA criou suas “Estratégias para o Século XXI”, que seria levado
para os centros individuais e então para os vários escritórios a fim de criar planos
estratégicos que se alinhassem com a visão de toda organização. O Escritório de Recursos
Humanos (OHR) possuía 75 pessoas que sustentavam os mais de 2000 membros do
Goddard Space Flight Center of NASA.
Em abril de 1998, o trabalho com o Appreciative Inquiry começou como uma
orientação primordial em guiar um plano estratégico de processos para o OHR. Além disso,
o OHR havia sofrido há pouco uma significante diminuição de seu número de funcionários,
o que tornou a rotina de muitos membros extremamente repleta, fazendo com que o humor
de grande parte deles estivesse sitiado e cético. Uma recente mudança na liderança e,
principalmente no estilo dela, havia sido experimentada causando um impacto negativo à
instituição.
As metas do trabalho com o Appreciative Inquiry eram criar um plano estratégico
que fosse alinhado com a visão e valores da NASA como um todo, além de trabalhar para
construir uma cultura organizacional mais inclusiva e participativa. Consta que nunca havia
acontecido um evento que incluísse todo quadro de pessoal.
O foco da inquirição apreciativa foi “Planejamento estratégico, mudança cultural”.
Ao longo de um período de nove meses foi feito o trabalho com o ciclo dos 4 Ds,
começando com entrevistas em pares em um retiro de dois dias com o time gerencial,
composto por quatorze membros. Então um encontro com todo OHR foi feito em um
evento de um dia inteiro.
O uso de proposições provocativas causou um impacto estratégico que conduziu as
metas no plano estratégico. Times de ação foram organizados para trabalhar através de
como aquelas proposições poderiam ser implementadas. Os planos foram compartilhados
em um segundo dia de evento e seu sustento, em um encontro três meses depois, onde os
times foram altamente energéticos e criativos.
A fase final do projeto envolveu grupos de ação integrando com o feedback desse
encontro e trabalhando para criar um novo plano de operações que foi compartilhado e
editado com toda equipe gerencial. O plano escrito foi compartilhado no encontro final três
meses depois com todo OHR e muito bem sustentado. A partir de então, a organização
começou a trabalhar com o projeto “Race for Change” que foi autogerenciado, sem a
presença de consultores, durante um período maior que um ano.
Dentre os benefícios descritos pelos membros do OHR, um senso mais forte de
unidade e maior familiaridade e confiança. Eles demonstraram uma nova capacidade de
entendimento mútuo e criatividade, aumentando a confiança e confidência com a nova
liderança organizacional. Como comunidade, eles eram capazes de trabalhar através de suas
reais prioridades.
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A cultura organizacional experimentou grandes transformações, tornando-se mais
aberta, honesta, inclusiva, além de um maior ambiente de aprendizado. O OHR também
desenvolveu mais o foco no cliente, respondendo ao feedback da comunidade gerencial
com dois compromissos: todas as ligações telefônicas seriam retornadas em até um dia e
todos os compromissos criados pelo OHR seriam conhecidos por toda organização.
Três áreas de prioridade emergiram: os processos internos, planejamento da força de
trabalho e identificação das necessidades de treinamento. Finalmente a equipe de liderança
foi reestruturada, passando a ter a metade de membros, sete, adotando um foco maior na
continuação do processo de mudança com uma maior cooperação nas tomadas de decisões.
Eles também articularam um convite aberto para maior iniciativa e empreendedorismo na
NASA.
33
4 – MINHA EXPERIÊNCIA COM O APPRECIATIVE INQUIRY
-
Qual a sua visão de um mundo melhor?
Quais as virtudes que embasam este mundo melhor?
Crie uma ação prática para este mundo.
Estas foram as três perguntas que serviram de base para o projeto mundial Global
Cooperation for a Better World, conduzido pela Universidade Espiritual Mundial Brahma
Kumaris em 1986. Ao ter contato com um material desse trabalho, Dr. David Cooperrider,
viu a semelhança com o método criado por ele e procurou a Brahma Kumaris em Londres
para oferecer uma parceria.
Foi por causa disso que tive contato com o Appreciative Inquiry. Para uma
organização que trabalha basicamente com os valores humanos intrínsecos de cada um, o
método tinha diversos pontos em comum com o nosso trabalho. O foco no positivo, a
capacidade de apreciar e mesmo a habilidade de fazer perguntas para extrair o melhor do
ser humano sempre foram coisas recorrentes na Brahma Kumaris.
Sendo assim o primeiro contato que tive com o método foi através do projeto
Imagens e Vozes de Esperança, focado nos valores para a mídia, e que envolve até hoje
alguns dos comunicadores mais importantes do Brasil engajados em transformar a mídia
em um agente de benefício para o mundo. Depois o grupo de jovens de São Paulo começou
a usá-lo também, o que me inspirou a começar a estudá-lo, pois era a época em que eu
estava começando a assumir os projetos de jovens no Rio.
Antes mesmo de conhecer profundamente os 4 Ds, comecei a utilizar as entrevistas
apreciativas no primeiro workshop que criei para jovens, trabalhando a espiritualidade na
saga de Guerra nas Estrelas. Desde a primeira vez em que o conduzi, na Assembléia Global
da United Religions Internacional, pude experimentar o poder da inquirição e da apreciação
nos olhos dos jovens. Além de contarem uma história de transformação em suas vidas, eles
falavam sobre as principais virtudes do outro. Um dos participantes contou sua experiência
largando as drogas. Aquela experiência foi tão positiva, que então pensei que se era
possível obter um resultado como aquele na aplicação de um trecho da descoberta em
menos de uma hora, imagine o método inteiro ao longo de dois dias inteiros. Em outra
ocasião, tinha meia hora para fazer uma inquirição apreciativa em uma instituição religiosa.
Ainda foi possível fazer uma mini-descoberta e um relaxamento conduzindo visões para o
futuro da instituição. Ali vi o poder incrível da descoberta, fase que é geralmente usada
quando se aplica parte do método. Outro exemplo interessante foi em um colégio do
interior do Rio com o mesmo workshop do Guerra nas Estrelas para adolescentes de 15 e
16 anos, que não paravam um só segundo. A possibilidade de extrair as verdades internas
de pessoas mais novas é muito interessante. Como diz o Dr. David, a criança é o melhor
agente de inquirição que pode existir.
34
Continuo usando o método em vários workshops e sempre que crio um novo, a
possibilidade de usá-lo é sempre uma garantia de resultados. É interessante que pelo fato de
os jovens terem menos abertura a diálogos, isso gera um forte envolvimento à medida que
quebra o gelo e não os coloca em situação de ridículo, como em muitas dinâmicas de grupo
(assim como faz o RH).
Quando foi a vez de conduzir um evento maior junto de outras três jovens mais
experientes que eu àquela época, tínhamos apenas três horas. Jovens lideranças de 35
organizações diferentes haviam se reunido ali para os 4 Ds, o que não foi possível pelo
tempo. As ações práticas do Jovens pela Paz ficariam para reuniões de trabalho meses
depois. De qualquer forma, a descoberta de suas virtudes e o sonho do mundo ideal os
encheu de esperança, entusiasmo e felicidade. A conexão entre pessoas tão diferentes, desde
jovens das comunidades de baixa renda do Rio até senhoras mais velhas oriundas da classe
média, foi tão poderosa que a única linguagem que eles falavam era a linguagem da
transformação positiva do mundo. As pessoas com quem converso até hoje se mostram
muito tocadas, cobrando mais e mais desdobramentos, mesmo quem eu havia tido a
impressão de não ter ficado satisfeito: “Eu?! Que isso? Foi só impressão sua”!
A continuação de um evento é um aspecto que merece certa reflexão, pois o alcance
de metas em qualquer organização depende do sustento das idéias oriundas dos primeiros
eventos, mesmo que o facilitador não tenha controle sobre o processo desde que sai de
cena. Os 4 Ds giram em vários ciclos em várias fases do processo de mudança da empresa.
Trocando experiências com outros facilitadores do Appreciative Inquiry, vemos o
quanto a abordagem em cima do positivo abre maiores possibilidades e permite a
exploração de terrenos que não se pensariam em alcançar se simplesmente pensássemos:
“Isso é um problema”! Entretanto, por mais que o método em si seja muito simples, aplicálo e conduzir um evento apreciativo não é tanto. Como com tudo na vida, há uma diferença
entre a teoria e a prática, entre o conhecimento e a experiência.
Nas empresas, o que vemos é que os métodos do RH são tão naturalmente
assimilados pelas empresas que parecem que estão corretos, sem problemas, que todo
aquele “adestramento” de dar mais e mais informações faz parte do processo necessário. O
ser humano é a parte menos importante do processo e poucos percebem isso. É como se as
informações vindas de fora é que fossem essenciais, como se a empresa fosse a marca, as
informações, os processos e, por último, vêm as pessoas. O market share torna-se mais
importante que a qualidade de vida dos funcionários, suas satisfações e insatisfações. O
stress tem tornado-se uma “coisa moderna”. O estressado está na moda hoje em dia. “Eu
preciso de alguém estressado”, me disse uma vez um gerente de marketing de uma grande
empresa que me entrevistava.
E o que dizer das dinâmicas de grupo? O que será que eles buscam nelas? Os mais
espertos?! E os critérios de avaliação? É como se escolhessem produtos em uma loja...
Tanta inversão de valores fará com que empresas consideradas mais fortes fiquem
para trás. Quem não der atenção à mudança e não mudar de acordo, talvez nem saiba
porquê ficou para trás. A mudança está progredindo lenta e incognitamente, sem avisar que
é ela. Mas quando muitos ficarem pelo caminho, não poderão dizer que ela não avisou.
35
Empresas em boa situação são bem menos abertas a novidades. Tão preenchidas
com seus próprios sucessos, tão cheias de si próprias que não conseguem enxergar além.
Outras só percebem-se da necessidade de se reciclarem quando estão quase quebrando. Mas
a mudança nos obriga e inspira a repensarmos nossas práticas, nossas atitudes, processos,
seu modo de ver a nós mesmos, a nossa organização e ao mundo.
A oportunidade que o Appreciative Inquiry dá de pensar sobre si próprio de um
modo positivo é algo tão simples e, ao mesmo tempo, tão forte. Poder verdadeiro é
despertado, não aquele poder que os chefes pensam que têm por causa do cargo. Felicidade
de pensar que eu tenho qualidades e um potencial fantástico que pode ser usado para meu
próprio benefício e do mundo. Amor pelo que fazemos, entusiasmo e motivação para irmos
além.
Já vi algumas vidas sendo transformadas, pessoas saindo do imobilismo para ações
positivas com um despertar de esperança e força. Vi pessoas importantes e influentes
engajadas em mudanças que nunca haviam imaginado ser possíveis. Gente tocada e
recarregada para mudar de fato seu ambiente interno e seu ambiente de trabalho. Estou
certo de que isso tudo não é nada comparado ao que estou por ver e ouvir no futuro.
A mudança não dará trégua enquanto não se consolidar. Ela está na nossa frente e
quem não aprender a pensar e agir positivamente perderá o trem da história. E acredite: isso
será em muito menos tempo do que se pensa! E mesmo que você não concorde com isso, é
melhor não arriscar.
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Images and Voices of Hope
Imagens e Vozes de Esperança Jovens Rio – Jovens pela Paz (TV PUC, Revista do
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