Prepara o bucho - mauricio jacques

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Prepara o bucho - mauricio jacques
Prepara o bucho: O preparo do bucho bovino na gastronomia1
Maurício Jacques Barbosa da Silva2
Centro Universitário Estácio FIC - CE
Resumo
O presente artigo aborda o preparo de pratos que usam o bucho bovino (rumem) como
ingrediente. Receitas de diferentes pratos tais como: Dobradinha, Tripa alla Toscana,
Panelada, Mondongo e Dobradinha a la Lyonnaise, cada qual, habituais em diferentes
regiões (e povos) indicam que se coloque o bucho de molho em água fervente e escaldeo para eliminar odores indesejáveis. De fato, o bucho bovino pode apresentar um odor
indesejável, contudo, o método baseado na fervura do bucho não se mostra eficaz, pois,
tal odor é oriundo do cozimento de partes de gordura contidas na carne do bucho.
Diante disso, o autor sugere que a gordura do bucho seja retirada por meio de cortes.
Acredita-se na contribuição cultural que tal melhoria possa proporcionar, uma vez que,
o possível estranhamento por parte dos comensais com o prato possa ser evitado.
Palavras chave: Gastronomia; Técnicas culinárias; Bucho bovino.
Abstract
This article discusses the preparation of dishes that use beef tripe (rumen) as the main
ingredient. Recipes for different dishes such as: Tripe, Tripe alla Toscana, Panelada,
Mondongo and Tripe a la Lyonnaise, each one, are typical in different regions, indicates
that they place the tripe in boiling water before using it in recipe for eliminating odors.
The method based on boiling the tripe is not efficient, because the odors of cooking
comes from parts of fat contained in beef tripe. The author suggests that the fat is
removed by cutting, as is done with the other meats. This results not only in eliminating
odors, but also on a lighter dish and healthy bovine tripe, since it is rich in collagen.
Once it is believed that the cultural contribution can provide such an improvement,
since the unfamiliarity of diners possible with the dish can be avoided.
Keywords: Culinary, culinary techniques, tripe.
1
Linha de pesquisa: Técnicas e Produtos: Tradições, Inovações e Sustentabilidade.
Mestre em Comunicação e Especialista em Padrões Gastronômicos pela Universidade Anhembi
Morumbi – SP
Professor do Centro Universitário Estácio FIC – CE.
Site: http://lattes.cnpq.br/3222162729415419
e-mail: [email protected]
2
Introdução
A Gastronomia, sobretudo, contempla estudos sobre as práticas e as
representações simbólicas pertinentes à culinária e a comensalidade. Receitas, técnicas e
ingredientes, bem como, o entendimento sobre os hábitos alimentares e as diferentes
manifestações culturais envolvidas na alimentação dos povos são objetos de estudo que
contribuem para o principal objetivo da Gastronomia: tornar os alimentos e a
comensalidade o melhor possível.
Portanto, a literatura sobre o assunto aborda contextos, sociais, históricos e
práticos, dentre outros, numa tentativa de compreender os motivos que orientam o uso
de determinados ingredientes, o desenvolvimento de técnicas e das práticas alimentares.
Este artigo objetivou identificar uma técnica mais apropriada para o preparo do
bucho bovino usado em diferentes receitas culinárias. Para tanto, exemplifica-se o uso
do bucho bovino como ingrediente principal em pratos tradicionais da culinária, tais
como a Dobradinha ou Dobra de Porto de Portugal, a Trippa alla Toscana e Trippa alla
Romana da Itália, ambos inseridos na culinária brasileira, como também, as receitas
regionais, como a panelada, prato popular na região nordeste do Brasil e o mondongo
que é comum no sul do país.
Para alcançar o objetivo deste trabalho, utilizou-se a pesquisa documental,
caracterizada pela identificação das fontes, obtenção do material de pesquisa, tratamento
dos dados para a efetiva redação. Além disso, foi necessário a utilização de pesquisa
experimental tendo como objeto de estudo o ingrediente culinário denominado bucho
bovino. Para tanto, considerou-se as seguintes hipóteses:
H1: O método de preparo do bucho bovino por meio de escaldo ou fervura,
como indicado em determinadas receitas culinárias, é adequado para a eliminação do
odor indesejável.
H2: A retirada dos excessos de gordura do bucho bovino por meio de cortes é o
método adequado para a eliminação de odores indesejáveis.
Os parâmetros utilizados para verificação dos resultados consistem em testes
sensoriais realizados durante o preparo do bucho em uma receita de dobradinha, bem
2
como, na degustação do prato pelo próprio autor, considerando o sabor, a textura, e
principalmente o odor do alimento.
Cabe ressaltar as contribuições de Ricardo Maranhão (comunicação oral, 2010),
que por sua vez despertaram ainda mais o interesse e a cusiosidade do autor pelo
assunto. Em determinada aula o mesmo aconselhou os alunos a buscar entender melhor
a culinária e seus motivos de existência e de apreciação, eliminando o preconceito de
acharmos que todos estão equivocados em apreciar um prato que por ventura
reprovamos por uma questão de gosto ou de desprezo. Diante disso, acredita-se que os
hábitos alimentares são sustentados, dentre outros motivos, por questões simbólicas e
culturais de cada povo.
Considera-se ainda, que por vezes uma receita culinária possa parecer simples,
corriqueira e, portanto, sem muita importância histórica ou social. Tal situação ocorre
porque muitas vezes sua relevância prática é provada no cotidiano, entretando, mesmo
os pratos e ingredientes considerados simples e triviais em nossa culinária são oriundos
de seleção e experiências vividas pelo povo e, portanto, de contextualizações
antropológicas como explica Dória (2009):
(...) não é possivel pensar qualquer ingrediente como algo desprovido
de história, um pedaço da natureza “em estado puro”. O trabalho
humano, que conforma a natureza para o consumo alimentar, principia
na identificação do que é útil. Espécies vegetais são nocivas ou
benéficas, saborosas ou não, segundo uma experiência que antes de
ser individual, é grupal – às vezes tributária de milênios de
experiências.
Tentar então, entender melhor um prato considerado típico não se limita apenas
às questões relacionadas à sua elaboração, mas também sobre o povo que se alimenta
deste. Diante desse desafio, escolheu-se como objeto deste estudo, o bucho bovino
utilizado em receitas tradicionais como as já mencionadas.
Carnes, consumo e limitações
Algumas carnes embora, utilizadas com tradição e frequência na alimentação de
determinados povos, apresentam fatores limitantes quanto ao seu consumo para certas
pessoas. Isto ocorre, entretanto, com as vísceras ou miúdos bovinos, como no caso do
bucho (rumem bovino) que embora, seja o ingrediente principal de pratos tradicionais
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como a Dobradinha ou Tripa alla Toscana, representa rejeição e até aversão para certas
pessoas. Até mesmo especialistas nas culinárias que usam o bucho admitem não
apreciarem o mesmo, Davis (1998) deixa isso evidente quando diz “Eu, pessoalmente,
não aprecio muito a dobradinha, mas não se pode negar que os italianos a preparam das
maneiras mais deliciosas.”. Tal limitação deve-se a fatores sensoriais, como sabor,
aroma e textura ou ainda, por motivos de estranhamento, ou seja, pelo desconhecimento
sobre o alimento, inclusive cultural, uma vez que nem todos tem o hábito de consumir
tal alimento.
Cultura, oferta e demanda.
Compreender melhor nossa alimentação é de certa forma, compreender melhor
quem nós somos, pois dentre os elementos culturais que identificam e diferenciam os
povos está a alimentação. Tal entendimento, por meio dos hábitos alimentares, pode
também desvendar informações sobre a história, a geografia, incluindo o clima e a
vegetação, as crenças e as religiões, a política e a economia, pois juntamente com o uso
de determinados ingredientes e com a elaboração de produtos culinários pelos povos,
como neste caso, podemos encontrar ricas informações sobre a sociedade. Entretanto, o
desconhecimento sobre um prato, sua história, bem como, sobre seus fatores sensoriais,
limitam não só seu consumo, mas consequentemente a cultura das pessoas acerca do
mesmo. Desta forma, a dificuldade de se encontrar o bucho bovino no mercado, afeta a
demanda, que por sua vez, passa a ter além das restrições de consumo já mencionadas,
restrições quanto a disponibilidade do produto, tanto do ingrediente para a produção de
pratos, como da sua oferta em restaurantes. Diante disso, considera-se, portanto, o risco
dos pratos a base de bucho bovino serem esquecidos ou ainda, nem mesmo, conhecidos
(experimentados) pelas próximas gerações. Estas considerações são ilustradas a seguir:
Limitações de
Oferta reduzida do
consumo
produto
Desinteresse e
desconhecimento
Ilustração 1: Ciclo oferta x demanda
Fonte: o autor
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Como é comum ocorrer no mercado, a relação oferta e demanda, neste caso: a
baixa demanda pelo consumo de bucho, favorece a oferta reduzida do produto
(dificuldade de encontrar) e gera efeitos na cultura e nos hábitos de consumo do povo.
O consumo de carne faz parte dos hábitos alimentares dos homens em toda sua
existência e, embora, tal consumo vem apresentando constante crescimento, a rejeição e
subutilização de determinadas carnes, como no caso do bucho bovino, representa um
agravante à sustentabilidade, pois acarreta desperdício e consequentemente o
encarecimento da produção e do produto.
Uma vez que parte da produção passa a ser subutilizada e com menor valor
comercial, a escala produtiva de carne bovina se torna menos eficiente e mais
prejudicial à natureza, os custos da pecuária no que tange ao uso de medicamentos,
pesticidas, ração e o tratamento e descarte de dejetos não se mantêm fixos
independentemente da subutilização ou depreciação do produto. Outrora, a carne bovina
se torna um alimento nem sempre acessível à todos, pois como em qualquer escala
produtiva, os custos fixos são diluídos no custo total da produção e consequentemente
no preço final.
O rumem bovino (bucho)
O rumem bovino, popularmente conhecido como bucho é um órgão interno
específico dos animais ruminantes que, por sua vez, possuem o estômago composto por
quatro partes: rumem, retículo, omaso e abomaso conforme ilustrado na figura abaixo.
Ilustração 2: o sistema digestivo bovino
Fonte: HOFFMAN,( 1993, p.15)
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As três primeiras partes do estômago de um ruminante são conhecidas como préestômago, pois não são responsáveis pela digestão total dos alimentos, apenas a quarta
parte, o abomaso, tem tal função, ou seja, o abomaso equivale à um estômago simples
como dos demais animais. Cabe ainda, ressaltar que o bolo resultante do processo
digestivo é enviado para o intestino somente após ter sido processado (digerido) pelos
quatro compartimentos do estômago do ruminante. Tal explicação cessa a possibilidade
de haver comparações equivocadas entre o bucho e o intestino do animal.
Como os ruminantes engolem grande parte de alimentos fibrosos, o processo de
ruminação dos animais contribui com a digestibilidade dos alimentos que são engolidos,
sendo que neste processo, o bucho serve como uma espécie de depósito dos alimentos
semi-digeridos, que por sua vez, ficam armazenados e são fermentados.
O bucho é composto principalmente de músculo liso e tecido conjuntivo de
colágeno, e representa uma interessante fonte de proteínas para alimentação humana.
Receitas e testes sensoriais
O bucho bovino é utilizado como ingrediente principal de diversos pratos e em
diferentes países. Inúmeros motivos conduzem os povos na escolha dos alimentos e
consequentemente nos hábitos alimentares.
O consumo de vísceras na alimentação humana tem diferentes origens e
diferentes significados para cada povo. Desde questões relacionadas à economia e a
disponibilidade dos ingredientes, às questões sociais e culturais que se desenvolvem nas
tradições, costumes e assim, contribuem com a identidade cultural dos povos.
O bucho, assim como as vísceras e os diferentes tipos de carne, possui
características sensoriais específicas, dessa maneira, espera-se de cada tipo de carne
textura, sabor e aroma característico e diferenciado. Diante disso, uma receita a base de
bucho bovino deverá possuir as características sensoriais típicas do mesmo, no entanto,
uma peça de bucho pode possuir um odor forte e desagradável se seu excesso de
gordura (sebo) não for retirado adequadamente.
O sabor e aroma peculiar que o bucho concede às produções culinárias devem
ser identificáveis e agradáveis para a maioria dos paladares, tais peculiaridades
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correspondem às especificidades da própria composição da carne que, como
mencionado, é formada principalmente por músculo e tecido conjuntivo de colágeno,
some-se a isto, que a função que o rumem bovino exerce no sistema digestivo, bem
como, sua interação com certas substâncias da natureza desse sistema, contribuem com
o desenvolvimento de certos aromas e sabores, também peculiares. Por outro lado,
quando o rumem é retirado do animal abatido, este se encontra com certa quantidade de
bolo alimentar pré-digerido ou fermentado, exigindo, portanto, que o bucho passe por
um eficiente processo de limpeza, que basicamente consiste em lavagem, raspagem,
escaldo e por vezes, branqueamento para que a peça possa ser conservada e
comercializada. De fato, o bucho tratado em processos químicos industriais, é
encontrado comercialmente já limpo e livre de resíduos do bolo, no entanto, tal processo
não elimina os excessos de gordura alojados no tecido do bucho, ou seja, o bucho
comercializado embora em condições de conservação, não necessariamente se encontra
em condições ideais para preparações culinárias. Tal situação exige que o cozinheiro
que vai trabalhar com o bucho, retire as camadas de sebo para que o mesmo não
apresente sabores e aromas indesejáveis resultantes da cocção de sebo.
Muitas receitas não descrevem tal necessidade ou não explicam adequadamente,
o que por sua vez, contribui para que as produções resultem em produtos estranhos para
o paladar de muitas pessoas. Algumas receitas recomendam que se faça uma limpeza no
bucho comercialmente adquirido, por meio de lavagem e escaldo, cabe ressaltar que tal
procedimento reduzirá as partes de sebo e gordura do bucho, porém, o sabor e aroma
indesejável não se eliminarão, pois, o sebo se diluirá pela peça. Embora
conceitualmente a Gastronomia busque melhorar as produções culinárias, na prática há
que se enfrentar costumes e tradições referentes ao preparo dos alimentos, pois muitas
técnicas e receitas são repassadas de geração para geração, por vezes sem
questionamentos ou modificações. Como exemplo, têm-se a seguir algumas receitas de
pratos tradicionais com bucho e que recomendam como método para a limpeza do
bucho a lavagem e o escaldo. Nos testes realizados pelo autor, constatou-se que se as
partes de sebo são as principais responsáveis por um sabor e odor indesejável, logo,
estas precisam ser retiradas antes da cocção e, para tanto, se faz necessário retirar tais
partes arrancando-as com as mãos e cortando-as com uma faca.
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Ilustração 3: Retirada da gordura com as mãos
Fonte: o autor
Ilustração 4: Retirada de gordura por meio de faca
Fonte: o autor
Receitas e métodos de limpeza (eliminação do sebo)
Pode-se perceber que em diferentes receitas ou versões de pratos que usam o
bucho, a questão sobre como retirar o sebo excessivo da peça e consequentemente seu
odor é tratada muitas vezes como um método de limpeza em que a técnica empregada
envolve lavagem e escaldo. A seguir, têm-se como exemplos diferentes receitas de
pratos típicos de diferentes países, tais como França, Itália, Brasil e Portugal nas quais
os diferentes autores indicam uma cocção ou escaldo prévio do bucho para que eliminar
o odor indesejado, no entanto, como mencionado tal técnica mostra-se ineficiente.
Receita por Bocuse (2005):
Dobradinha de boi
A dobradinha de boi compra-se geralmente cozida. Caso contrário,
deixar de molho na água, escovar com cuidado, lavar mais uma vez e
aferventar em bastante água por 25 minutos.
Escorrer, esfriar e raspar com a faca para remover todos os traços de
aderências e de cheiro. Em seguida, cozinhar a dobradinha durante
seis horas em fogo fraco, em água salgada à razão de 10g de sal por
litro; guarnecer o cozimento com 2 cenouras cortadas, 2 cebolas
espetadas com 2 cravos-da-índia, 1 buquê garni com tomilho e louro e
1 cabeça de alho.
Depois desse tempo, tirar do fogo, deixar esfriar no cozimento e
depois escorrer. Fazer um rolo e conservar no frio até a utilização.
Dobradinha a la Lyonnaise
Ingredientes (para 6 pessoas):
700g de dobradinha; 4 cebolas grandes; 30g de manteiga; 4 colheres
de sopa de óleo; 1 colher de café de vinagre; uma boa pitada de salsa
picada.
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Modo de preparar:
1.
Corta-se as cebolas em rodelas finas; esquentar o óleo numa
panela bastante grande para que a dobradinha fique bem estendida.
Quando o óleo estiver fumegante, juntar as cebolas e cozinha-las em
fogo brando, mexendo sempre. No final do cozimento, aumentar o
fogo para obter um bom tostado.
Escorrer as cebolas num prato, deixando o óleo na panela, e juntar a
manteiga.
2.
Cortar a dobradinha em tiras grossas de 5mm a 6mm de
espessura. Esquentar a mistura de óleo e manteiga e aí fritar a
dobradinha. Provar um pedaço para verificar o sal e condimentar de
acordo. Salpicar com um pouco de pimenta moída na hora. Fritar a
dobradinha em fogo forte e deixar tostar ligeiramente. Quando estiver
dourada, juntar a cebola cozida, mexer várias vezes para garantir uma
mistura perfeita e terminar juntando a salsa picada.
3.
Arrumar a dobradinha numa tigela e, em seu lugar, na panela
fervente, despejar o vinagre, regando logo a dobradinha. Mais uma
pitada de salsa fresca e servir em pratos bem quentes.
Receitas de Davis (1998):
Tippa alla fiorentina (Dobradinha à florentina)
500g de dobradinha, 250 ml de molho de tomate fresco (peneirado),
manjericão, queijo parmesão.
Compre a dobradinha semipronta, já aferventada. Ferva por uma hora.
Deixe escorrer e cortre em tirar de uns 5 dm de comprimento por 2 cm
de largura. Cozinhe em fogo baixo por mais 1 hora em molho de
tomate, fortemente temperado com manjerona. Antes de servir espalhe
uma grossa camada de queijo parmesão por cima. Um ponto
importante com relação a dobradinha é que ela deve permanecer
levemente resistente, ao dente, como o macarrão. Se cozida demais,
transforma-se numa massa escorregadia um tanto desagradável.
Trippa alla parmegiana (Dobradinha à parmegiana)
500g de dobradinha, manteiga, queijo parmesão. Cozinhe a
dobradinha como indicado na receita anterior, corte em tiras e aquecea na manteiga. Um pouco antes de servir, acrescente uma boa porção
de queijo parmesão ralado, deixando-o derreter.
Receitas de Benta (2004):
Dobradinha simples
½ kg de dobradinha;
Água;
Limão;
Sal.
1 – Lave a dobradinha, corte-a em pedaços grandes e raspe-a com faca
não afiada.
2 – Lave novamente a dobradinha e esfregue com limão cortado ao
meio.
3 – Lave mais uma vez a dobradinha e deixe-a de molho, em água e
suco de limão, de um dia para o outro ou durante 2 horas no mínimo.
4 – Cozinhe a dobradinha em água e sal até que esteja macia.
5 – Quando estiver macia, elimine a água e corte a dobradinha em
pedaços pequenos.
6 – A dobradinha está pronta para ser usada em qualquer prato.
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Dobradinha com feijão branco

500 g de dobradinha limpa e cozida (receita anterior);

2 xícaras (chá) de feijão-branco;

200g de paio ou linguiça defumada;

60g de toucinho defumado;

1 e ½ litro de agua;

2 folhas de louro;

¼ de xícara (chá) de óleo;

2 cebolas picadas;

1 dente de alho socado;

2 tomates sem pele picados;

1 colher (chá) de sal;

Pitada de pimenta-do-reino;

Pitada de cominho (opcional).
1 - Lave o feijão e deixe-o de molho num litro de água de um dia para
o outro. Escorra, coloque o feijão numa panela grande e cubra-o com
um litro de água. Adicione o paio, o toucinho defumado e as folhas de
louro.
2 – Tampe a panela e deixe cozinhar até o feijão ficar quase macio.
3 – Enquanto isso, refogue as cebolas, o alho e o tomate no óleo.
4 – Acrescente um pouco de água, junte a dobradinha ao refogado e
refogue um pouco mais.
5 – Ponha o refogado com a dobradinha no feijão, que ainda
cozinhando.
6 – Tempere com o sal, a pimenta e o cominho e deixe cozinhar até
que o feijão e as carnes fiquem macios. Se necessário, acrescente mais
água fervente.
7 – Retire o paio ( ou a linguiça) e o bacon para uma tábua e corte-os
em fatias finas, colocando-as no feijão.
8 – Sirva acompanhada de arroz
Demonstração do preparo de uma receita de Dobradinha pelo autor:
Prepara-se a peça de bucho (preferencialmente inteira) retirando os excessos de
gordura (sebo) puxando-as com as mãos e/ou cortando as camadas com excessos de
gordura com uma faca.
Ilustração 5: Peça de bucho
Fonte: o autor
Ilustração 6: Gordura retirada com as mãos
Fonte: o autor
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Para facilitar este processo, divide-se a peça de bucho em pedaços menores
conforme sua anatomia permitir ter-se partes as mais lisas possíveis, assim, ficará mais
fácil manusear cada parte numa prancha de corte e limpar a peça com uma faca.
Ilustração 7: Pedaço de bucho sem a gordura aparente
Fonte: o autor
Ilustração 8: Pedaços do bucho sem a gordura
Fonte: o autor
O resultado esperado por este processo é a máxima separação de sebo da carne.
Tendo-se as partes prontas para serem cortadas em pedaços menores (tiras de bucho)
que serão utilizadas na produção da receita.
Bucho a ser utilizado
Gordura retirada
Ilustração 9: Bucho a ser utilizado X Gordura retirada
Fonte: o autor
Ilustração 10: Corte do bucho em tiras
Fonte: o autor
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Embora, com isto o bucho não apresente mais gordura aparente, ainda se faz
necessário escaldar o mesmo a fim de eliminar possíveis partes de gordura entremeadas
na carne. Vale relembrar que tal cuidado para retirar a gordura da carne serve para
eliminar o odor indesejável da produção que por sua vez, é oriundo da cocção de tal
gordura. Uma vez eliminado os excessos de gordura, o bucho apresentará apenas suas
características peculiares aos pratos e dignas de apreciação gustativa, bem como
resultará em uma carne com baixo teor de gordura (magra) e rica em colágeno, assim
como qualquer peça de músculo bovino.
Ilustração 11: Tiras de bucho sem gordura aparente
Fonte: o autor
Ilustração 12: Branqueamento (escaldo) do bucho
Fonte: o autor
À partir desse resultado, têm-se então, as tiras de bucho isentos de excessos de
gordura, bem como, de odores indesejáveis e pode-se iniciar o processo de preparação e
cocção das mais variadas receitas.
Ilustração 13: Ingredientes
Fonte: o autor
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Neste caso, o autor preparou uma dobradinha ao próprio gosto como ilustram as
imagens abaixo:
Ilustração 14: Cocção
Fonte: o autor
Ilustração 15: Dobradinha pronta
Fonte: o autor
Ou seja, a fervura irá derreter e diluir a gordura na água e com isto o bucho fica
isento da mesma, mas, o odor indesejável se impregna no bucho e até mesmo, na
cozinha durante sua cocção.
Considerações finais
A Gastronomia se propõe, sobretudo, a tornar os alimentos (pratos) o melhor
possível. Isto inclui a agradabilidade dos pratos aos comensais. Diante disso, quando
uma receita apresenta possibilidades de melhorias, ou, quando algum aspecto do prato
não agrada os comensais, tem-se a necessidade de desenvolver novas maneiras de
preparo a fim de aumentar a qualidade do mesmo. Aprimorar ou modificar um prato
requer cuidados não somente com relação às técnicas de cozinha, mas também, com os
aspectos históricos e culturais que permeiam uma receita e os hábitos alimentares.
Acredita-se que com um método mais eficiente para eliminar possíveis odores
indesejáveis do bucho bovino, os pratos que usam tal ingrediente podem ser
interessantes aos comensais. O odor indesejável do bucho bovino, que por sua vez,
desagrada algumas pessoas, é oriundo da cocção da gordura contida no bucho, portanto,
a gordura deve ser eliminada ao máximo. Com isto, consequentemente, tem-se a
eliminação do odor indesejável, como também, um prato saboroso, leve, saudável e rico
em colágeno. Diante disso, os experimentos realizados durante o preparo e cocção do
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bucho bovino, bem como, com a degustação de diferentes versões da dobradinha
preparada pelos dois métodos mencionados nas hipóteses, demonstraram que a hipótese
1 (H1) que afirma que o método de preparo do bucho bovino por meio de escaldo ou
fervura, como indicado em determinadas receitas culinárias, é adequado para a
eliminação do odor indesejável, não é verdadeira, uma vez, que utilizando-se tal método
percebeu-se a diluição de excessos de gordura na água usada para escaldo ou fervura,
contudo, durante tal processo o bucho exalou odores indesejáveis que permearam o
local da cocção (cozinha) e embora houve redução de odores indesejáveis no prato
produzido, os odores indesejáveis permaneceram de maneira insatisfatória. Por outro
lado, a hipótese 2 (H2) que afirma que a retirada dos excessos de gordura do bucho
bovino por meio de cortes é o método adequado para a eliminação de odores
indesejáveis, se mostrou verdadeira, pois nos pratos preparados por esse método
contatou-se a maior eficiência no que tange a eliminação dos odores indesejáveis do
bucho bovino, tanto durante o processo de cocção, bem como no prato produzido, sem
no entanto, prejudicar a textura e o sabor peculiar do prato.
Considera-se que tais melhorias contribuem com a preservação de tradições
alimentares que pertencem a cultura e identidade de um povo, bem como, com o uso
sustentável de insumos, pois o método proposto como adequado garante economia de
água e de fontes de calor.
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Referências
BENTA, Dona. Comer bem. 76ª ed. - São Paulo: Companhia das letras, 2004.
BOCUSE, Paul. A cozinha de Paul Bocuse. 4ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 2005.
DAVIS, Elizabeth. Cozinha italiana – São Paulo: Companhia das letras, 1998.
DÓRIA, Carlos Alberto. A formação da culinária brasileira. São Paulo: Publifolha, 2009.
HOFMANN, R. R. Anatomia del conducto gastro-intestinal. In: CHURCH DC. El ruminante:
fisiologia digestiva y nutrición. Zaragoza: Editorial Acribia S. A., 1993.
MARANHÃO, Ricardo. Notas de aula. Especialização em Padrões Gastronômicos –
Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2010.
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