Aquisição e análise preliminar dos assobios dos - LaPSI

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Aquisição e análise preliminar dos assobios dos - LaPSI
Aquisição e análise preliminar dos assobios dos golfinhos
Tursiops truncatus na Barra de Tramandaí
BOHRER, M., HOFFMANN, L. S., & , SCHUCK JR., A.
[email protected]
Abstract
The initial records for the “ signature whistle” determination were made in Tramandaí
lagoon, RS, where a small resident photo-identified group (n=10) of dolphins (Tursiops
truncatus) can be individually recorded, providing previous analysis. To analyse the whistles, it
was used the function spectrogram, looking for the fundamental frequency contour generated.
Three dolphins have their whistles individually analysed and showed to have distinctive patterns
on the fundamental frequency contour whistle. This may indicate an individualisation for this
studied group.
Resumo
As gravações iniciais para a determinação dos “assobios personalizados” foi realizada
na desembocadura da Laguna de Tramandaí, RS, onde um pequeno grupo residente (n=10) e já
foto-identificado de golfinhos, “Tursiops truncatus”, possibilita gravações individuais,
facilitando as análises preliminares. Para a análise dos assobios foi utilizado o contorno da
freqüência fundamental em espectrogramas. Três golfinhos tiveram seus assobios analisados
individualmente e mostraram ter um padrão distinguível e característico no contorno da
freqüência fundamental do assobio, indicando uma provável individualização no repertório
sonoro, já relatado para outros grupos desta espécie mas ainda pouco estudado para
populações selvagens.
Palavras-chave: golfinhos, assobios personalizados, hidrofone, espectrogramas.
1) Introdução e Motivação
Os botos, golfinhos e baleias são mamíferos exclusivamente aquáticos, possuindo para isto
diversas adaptações morfo-estruturais e fisiológicas. Neste contexto, a audição desenvolveu-se mais,
aproveitando a vantagem de que na água o som é transmitido mais rapidamente e a maiores distâncias, e
por viverem num meio onde, muitas vezes, as condições de visibilidade são limitadas.
Os sons produzidos por eles podem ter duas funções. Na ecolocação (ou biossonar), pulsos
sonoros de freqüência ultra-sônica lhes permitem localizar e analisar objetos. Na comunicação, emitem
sons na faixa audível que servem para transmitir informações variadas a respeito da presença de perigo e
comida e sobre sua própria posição, identidade, territorialidade e condição reprodutiva [1]. A estrutura
destes sons vem sendo estudada principalmente com animais em cativeiro, onde a espécie de golfinho
mais utilizada em oceanários é Tursiops truncatus. Estes golfinhos produzem um grande repertório de
complexas vocalizações [2], dentre as quais o “assobio”, um som de freqüência modulada de banda
estreita, geralmente é o foco das pesquisas devido à sua facilidade de aquisição e análise. A freqüência do
assobio pode variar de 4 a 20 kHz [3, 4], embora freqüências como 1 ou 2 kHz também já tenham sido
registradas [5, 6]. A partir de estudos em cativeiro, formulou-se a hipótese do “assobio personalizado”
(signature-whistle), que estabelece uma tendência definida em direção a um assobio estereotipado
individual, importante para o reconhecimento e coesão do grupo [7, 8, 9]. O assobio pode variar em
duração, freqüência e número de voltas, enquanto mantêm um padrão no contorno da freqüência
fundamental altamente distintivo e cada golfinho parece ter seu próprio padrão de assobio [5].
Este projeto visa a aquisição dos sons sub-aquáticos emitidos pelos golfinhos T. truncatus
presentes na região da Barra da Laguna de Tramandaí, RS (29°58’S 50°07’W), para determinação da
existência e caracterização dos assobios personalizados. As condições locais oferecem as vantagens de
um estudo em cativeiro, como o reconhecimento individual e proximidade dos golfinhos, ao mesmo
tempo que possibilita a aquisição destes sons num contexto natural. O estudo das emissões acústicas,
principalmente os aspectos referentes à comunicação, é de grande importância na complementação dos
estudos pré-existentes, tanto pela deficiência destes estudos em indivíduos livres quanto pelo fato de ser
inédito ao grupo estudado.
2) Materiais e Métodos
O registro acústico dos golfinhos foi realizado através de um hidrofone, confeccionado para este
projeto através de esquema obtido na página da Loughborough University no departamento de
Engenharia Elétrica e Eletrônica, grupo de pesquisa de acústica sub-aquática (http://sonarfs.lboro.ac.uk/uag/products/products_hydrophone.html). Não foi possível a utilização de um hidrofone
comercial, devido ao alto custo e a falta de auxílio para comprá-lo. Para nossos objetivos (faixa de
freqüência audível), o hidrofone montado serviu de forma bastante eficaz. O seu princípio é bem simples,
sendo constituído basicamente por um cristal piezo-elétrico (como os utilizados em cartões musicais)
colocado entre duas placas de acrílico ( e colado em uma delas), isolado do meio aquático por meio de
uma vedação. A face de acrílico na qual o transdutor está colado serve também de acoplamento das
impedâncias acústicas do cristal piezo-elétrico e da água. As ondas sonoras emitidas pelos golfinhos são
captadas pelo transdutor, que geras um sinal elétrico proporcional à potência acústica que chega no
transdutor. O sinal elétrico é então levado ao condicionador de sinais por meio de um cabo coaxial.
Figura 1. Esquema do hidrofone
O condicionador de sinais usado foi desenvolvido pelo Prof. Adalberto Schuck Jr. O seu esquema
encontra-se na figura 2.
Figura 2. Esquema do pré-amplificador
As gravações foram obtidas com um gravador portátil comum, em fita cassete. O conteúdo destas
fitas foi passado para um computador do laboratório de processamento de sinais e imagens (LaPSI-
DELET-UFRGS) e as partes relevantes(trechos com assobios) foram gravadas como arquivos .wav. Para
tanto foram utilizados os programas “gravador de som”, para gravação das fitas, e “Cooledit”, para
seleção dos melhores trechos obtidos. Utilizamos o programa “Matlab”, versão 5.1.0.421, para ler os
arquivos de som e fazer a análise dos mesmos através de seus espectrogramas. Um dos meios utilizados
para a verificação da teoria da assinatura vocal dos golfinhos é a observação do formato da freqüência
fundamental e suas harmônicas do assobio no espectrograma, para várias amostras gravadas de um
mesmo indivíduo. Alguns dos espectrogramas obtidos se encontram na sessão seguinte.
Mais de sete horas de gravação foram obtidas em viagens mensais (janeiro - setembro de 1999),
selecionando-se os trechos sem falhas no equipamento ou ruído intenso, e fazendo-se a distinção entre os
sons de golfinhos solitários ou não. A ênfase foi dada nos assobios, embora mais dois tipos de sons
também tenham sido registrados: cliques e “gritos” ou “rangidos”.
3) Resultados
A duração média dos assobios foi igual à 0,37±0,16 seg, a freqüência média inicial igual à
4,17±1,75 kHz, final igual à 5,72±1,39 kHz, mínima igual à 3,86±1,22 kHz e máxima igual à 8,54±2,13
kHz, e onze tipos básicos foram identificados. Ocorreram assobios simples e múltiplos, alguns com a
presença de cliques simultâneos. Cinco golfinhos tiveram seus assobios analisados individualmente, mas
somente três tiveram amostras suficientes e mostraram ter um padrão distinguível e característico no
contorno do assobio, indicando uma provável individualização no repertório sonoro, já relatado para
outros grupos desta espécie.
Figura 3. Espectrogramas dos assobios do indivíduo “Coquinho”, mostrando contorno da freqüência
fundamental
Figura 4. Espectrogramas do indivíduo “Lobisomem”, com o segundo gráfico mostrando assobios
múltiplos
4) Conclusão
Até agora foram obtidos resultados positivos em direção a uma provável individualização da
assinatura vocal dos golfinhos. A análise do contorno geral dos espectrogramas dos assobios, obtidos de
um mesmo indivíduo, mostraram ter uma certa similaridade entre si. Entretanto, ainda não é possível terse alguma conclusão mais sólida devido à baixa amostragem e ao pequeno número de assobios obtidos
para cada um dos indivíduos. É necessário um estudo mais aprofundado para confirmar-mos que os
golfinhos Tursiops truncatus livres da Barra de Tramandaí possuem uma assinatura vocal assim como os
que são criados em cativeiro. Isto será feito na tese de doutorado da aluna Lilian S. Hoffmann, em fase
inicial.
5) Agradecimentos
Gostaríamos de agradecer ao Eng. Carlos Mitidieri, ao Dr. Thales R. Freitas e à bolsista Karina
Vogel, ambos do Instituto de Biologia. Finalmente, ao CNPq e PROPESQ pelo auxílio financeiro.
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