Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia
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Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia
Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração REVISTA ANGRAD Volume 10 Número 1 Rio de Janeiro Jan/Fev/Mar 2009 arte_angrad.pmd 1 16/08/2009, 11:27 A Revista ANGRAD é um periódico trimestral da ANGRAD (Associação Nacional dos cursos de Graduação em Administração), que tem como missão difundir o estado da arte do ensino e pesquisa em administração. Revista ANGRAD/Associação Nacional dos cursos de Graduação em Administração. – v.10, n.1, (Jan./Fev./Mar. 2009) - Rio de Janeiro: ANGRAD, 2009 – trimestral 1. Administração - Periódico ISSN – 1515 -5532 Projeto Gráfico e Editoração: Milla Santana Revisão Editorial: Milla Santana Tiragem: Impressão: Gráfica Vanesul Data de Impressão: 15 março de 2009 As opiniões emitidas nos textos publicados são de total responsabilidade dos seus respectivos autores. Todos os direitos de reprodução, tradução e adaptação estão reservados. A Revista ANGRAD, completa um volume a cada ano e é distribuída gratuitamente aos seus associados. As Associações podem ser feitas através do Portal www.angrad.org.br e os números anteriores estarão disponíveis, enquanto durarem os estoques. arte_angrad.pmd 2 16/08/2009, 11:27 Conselho Editorial da Revista ANGRAD Prof. Antônio de Araújo Freitas Júnior EBAPE – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas - Fundação Getúlio Vargas Profa. Eda Castro Lucas de Souza UNB – Universidade Nacional de Brasília Prof.Hudson Fernandes Amaral UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais Prof. João Becker UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul Profa. Manolita Correia de Lima ESPM – Escola Superior de Publicidade e Marketing Profa. Maria da Graça Pitiá Barreto UFBA – Universidade Federal da Bahia Profa. Maria Tereza Fleury USP – Universidade de São Paulo Prof. Mário César Barreto Moraes UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina Prof. Omar Acktuff HEC – École des Hautes Études Commerciales de la Universidad de Montreal - Canadá Prof. Pedro Lincoln UFPE – Universidade Federal de Pernambuco Prof. Roberto Costa Fachin PUC Minas – Pontifícia Universidade Católica Prof. Roberto Moreno PUC – Pontifica Universidade Católica –Rio de Janeiro Profa. Silvia Roesch London School of Economics - Inglaterra Profa. Silvia Vergara FGV – Fundação Getúlio Vargas Profa. Sônia Dahab UNL – Universidade Nova de Lisboa - Portugal Profa. Tânia Fischer UFBA – Universidade Federal da Bahia Prof. Walter Fernando Araújo de Moraes Faculdade Boa Viagem - Recife/Pernambuco arte_angrad.pmd 3 16/08/2009, 11:27 Diretoria da ANGRAD 2007-2009 Conselho Diretor Presidente Nacional: Prof. Antonio de Araujo Freitas Júnior Vice-Presidente Nacional: Prof. Míria Miranda Freitas Oleto Vice-Presidente de Administração e Finanças: Prof. Agamêmnom Rocha Souza Vice-Presidente de Ensino: Prof. Mário Cesar Barreto Moraes Vice-Presidente Científico: Profa. Maria da Graça Pitiá Barreto Vice-Presidente de Relações Institucionais: Prof. Joaquim Celso Freire da Silva Vice-Presidente de Marketing: Prof. Hamil Adum Filho Conselho Fiscal Evandro Luiz Echeverria UNIC – Universidade de Cuiabá / MT Fernando de Souza Meirelles EAESP – Escola de Administração de Empresas / FGV – Fundação Getúlio Vargas Nádia Kassouf Pizzinatto UNINOVE – Universidade Nove de Julho / São Paulo Sérgio Giovanetti Lazzarini IBMEC SÃO PAULO Conselho Consultivo Alexander Berndt Mauro Kreuz Rui Otávio Bernardes de Andrade Equipe ANGRAD Luiz Carlos da Silva – Superintendente Executivo Jorge Augusto Baraúna – Assessor de Comunicação Helena Gabriela Almeida – Assessora de Eventos Gleverson Bruno Gomes Soares – Assistente Administrativo Elis Alves – Assistente Administrativo arte_angrad.pmd 4 16/08/2009, 11:27 Editorial Caro leitor, A Revista ANGRAD desde o início de 2009 está sendo coordenada por mim, como editora científica e pelos colegas Antonio Carlos Coelho, Marcelo Gattermann Perin, Martinho Isnar R. de Almeida, Tomás de Aquino Guimarães, Piotr Trzesniak, Sônia Maria Rodrigues Callado Dias e Carlos Osmar Bertero, como editores associados. Assumo este papel com grande humildade e ciente do valor do trabalho de minha antecessora Professora Maria da Graça Barreto, a quem eu agradeço o apoio ao longo destes meses. O novo “time” tentará manter o que foi conquistado pela Revista ANGRAD até agora e construir sobre esta base sólida. Gostaria de agradecer também à Diretoria da ANGRAD pelo crédito e suporte ao novo grupo. Declaro meu apreço aos Editores Associados pelo trabalho realizado e aos colegas revisores que gentilmente dedicaram seus esforços para o processo de seleção e melhoria dos artigos submetidos à Revista e, igualmente, pelas palavras de encorajamento aos novos Editores. Como resultado deste processo até agora apresento a seguir o número um do volume 10 da Revista ANGRAD, que conta com a produção de colegas de vários estados do país, sendo os artigos relacionados ao ensino em Administração, que é o foco principal do periódico e também aos temas diversos dentro da área de administração. Abrimos o número com o trabalho de Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza, que trata do tema risco e os modelos em finanças. Eles pretenderam com o artigo avaliar quais modelos de desempenho são mais relevantes para explicar o comportamento das ações, incluindo modelos que utilizam variância e os que utilizam semivariância. Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães são os autores do segundo artigo, que trata da implantação do Balanced Scorecard na gestão pública, mais propriamente de municípios. Os autores entendem como importante o uso do Balanced Scorecard “devido à carência de medidas para a avaliação governamental”. O estudo desenvolvido apresenta as etapas necessárias à implantação do BSC na gestão de um município brasileiro de pequeno porte. No terceiro André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia avaliam o conhecimento e a utilização pelos micro e pequenos empreendedores das ferramentas de gestão estratégica. Os autores, com base em dados de pesquisa, afirmam existir desconhecimento das ferramentas, impactando, portanto, sua utilização. Eles também testando a preferência dos gestores pelas ferramentas. arte_angrad.pmd 5 16/08/2009, 11:27 O quarto artigo, que tem autoria de Débora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira, analisa como os cursos de administração têm trabalhado a perspectiva interdisciplinar em seus currículos, em sua formação docente e nos processos de avaliação governamentais. O artigo seguinte também está relacionado ao tema ensino em administração e nele os autores Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior trabalham textos do escritor português Fernando Pessoa como forma de ilustrar aspectos relacionados às disciplinas de Marketing,TGA e TO. Os autores buscam com isso as “Interlocuções entre Administração e Literatura como estratégia de ensino e aprendizagem”. O sexto artigo trata da interface entre gestão estratégia e finanças e preconiza a importância da escolha de um enfoque transversal para melhor compreender as decisões da empresa. Antônio Dias Pereira Filho, autor do trabalho, apresenta um rico e variado conjunto de autores como referência. Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos são os autores do sétimo artigo. Este trata das premissas e práticas do professor de Administração em sala de aula e a pesquisa deles revela interessantes aspectos sobre a maneira como os professores entrevistados pensam sobre ensino e de aprendizagem em administração Sérgio Fred Ribeiro Andrade e o autor do oitavo artigo, que discute o uso de informação como apoio a decisão e apresenta “a metodologia, o roteiro e os passos necessários para a proposição de uma ontologia de compras públicas”. O número, portanto, é interessante para os alunos, estudiosos de administração e os gestores de empresas públicas e privadas. Desejo uma boa leitura a todos. Eliane P. Zamith Brito Editora Científica arte_angrad.pmd 6 16/08/2009, 11:27 Sumário 9 Análise Comparativa Análise Comparativa da utilização dados utilização Modelos dosdaModelos Variância daeVariância da e da SemivariânciaSemivariância na determinação na determinação do Desempenho do Desempenho de Ativos de Ativos Comparative Analysis Comparative of the use Analysis of Variance of the and use Semivariance of Variance and Models Semivariance in the Models in the Determination ofDetermination the Performance of the of Assets Performance of Assets Rejane AlmeidaRejane Silva Almeida Silva Igor Vasconcelos Igor Nogueira Vasconcelos Nogueira Fernanda CíntiaFernanda de SouzaCíntia de Souza 33 As EtapasAs deEtapas Implantação de Implantação do Balanced do Balanced ScorecardScorecard (BSC) na (BSC) na Gestão Gestão Pública Pública de Município de Município Brasileiro Brasileiro de Pequeno de Pequeno Porte: Porte: o Caso o Caso de de Ipiranga (PR) Ipiranga (PR) The Balanced Scorecard The Balanced Implementation Scorecard Implementation Procedures in theProcedures Public Sector: in thethe Public CaseSector: of the Case of the Ipiranga Town theinIpiranga Brazil Town in Brazil Ana Cristina deAna Faria Cristina de Faria Francisco Carlos Francisco Fernandes Carlos Fernandes Valdinei Machado Valdinei Guimarães Machado (in memorian) Guimarães (in memorian) 53 Ferramentas Ferramentas de GestãodeEstratégica Gestão Estratégica e seu emprego e seu emprego por Micropor Micro e e Pequenos Empreendedores Pequenos Empreendedores Strategic Management Strategic Tools Management and their application Tools and their to Micro application and Small to Micro Entrepreneurs and Small Entrepreneurs André Rosenfeld André Rosas Rosenfeld Rosas Felipe Mendes Felipe BoriniMendes Borini Edison Fernandes Edison PoloFernandes Polo Antonio CarlosAntonio Aidar Sauaia Carlos Aidar Sauaia 73 Interdisciplinaridade Interdisciplinaridade e a Graduação e a Graduação em Administração: em Administração: complexificarcomplexificar para melhorar para melhorar The Interdisciplinarity The Interdisciplinarity in Business Management in Business Graduation Management Courses: Graduation complexity Courses: complexity leading to qualityleading improvement to quality improvement Debora Nayar Debora Hoff Nayar Hoff Erlaine BinottoErlaine Binotto Elisabete Stradiotto Elisabete Siqueira Stradiotto Siqueira arte_angrad.pmd 7 16/08/2009, 11:27 89 Interlocuções Interlocuções entre Administração entre Administração e Literatura e Literatura como como Estratégia Estratégia Didática: Didática: aplicação aplicação das das obras obras emem Prosa Prosa dede Fernando Fernando Pessoa em Pessoa em Sala SaladedeAula Aula Dialogues between Dialogues Management between and Management Literature asand Didactic Literature Strategy: as Didactic Application Strategy: of Application of Fernando PessoaFernando Prose Texts Pessoa into Prose Class Texts into Class Magnus Luiz Emmendoerfer Magnus Luiz Emmendoerfer Ana Marcelina Ana de Oliveira Marcelina de Oliveira Eugênia Maria Eugênia da Silva Moraes Maria dadeSilva Queiroz Moraes de Queiroz Djalma Adão Barbosa DjalmaJúnior Adão Barbosa Júnior 103 La Finance La Finance et le Management et le Management Stratégique: Stratégique: un Regard un sur Regard leurssur leurs principales Interfaces. principales Interfaces. Antônio Dias Pereira AntônioFilho Dias Pereira Filho 123 Premissas Premissas e Práticas e Práticas de Ensino de do Ensino Professor do Professor de de Administração Administração dentro dentro dede Sala Sala dede Aula Aula Assumptions andAssumptions Practices of and Management Practices of Teachers Management in the Classroom Teachers in the Classroom Luiz Eduardo da Luiz Silva Eduardo Amaroda Silva Amaro Ilsa Solka de Lemos Ilsa Solka de Lemos 137 Uma abordagem Uma abordagem de Datade Warehousing Data Warehousing para Compras para Compras Públicas Públicas usando usando Ontologia Ontologia A Data Warehousing A Data approach Warehousing to Public approach Purchases to Public using Purchases Ontology using Ontology Sérgio Fred Ribeiro SérgioAndrade Fred Ribeiro Andrade arte_angrad.pmd 8 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Comparative Analysis of the use of Variance and Semivariance Models in the Determination of the Performance of Assets Rejane Almeida Silva [email protected] Igor Vasconcelos Nogueira Fernanda Cíntia de Souza Faculdade de Ciências Econômicas / UFMG Resumo Em um contexto onde o investidor tem por foco itens como retorno e risco, tornam-se relevante os estudos atualizados que possam contribuir para os modelos propostos inicialmente por Markowitz. Este artigo teve como objetivo avaliar quais modelos de desempenho são mais relevantes para explicar o comportamento das ações: os que utilizam variância ou os que utilizam semivariância. Para a pesquisa foram utilizados quatro grupos de empresas, dois do Brasil e dois dos Estados Unidos, sendo 20 ações da Bovespa e 20 ações da NYSE, com cotações diárias entre o período de 2003 a 2007. O presente estudo calculou os valores das variâncias e semivariâncias e os aplicou em índices de Sharpe, Sortino e Treynor, como forma de mensurar o desempenho (risco em função do retorno apresentado pelos ativos). Embora vários estudos tenham apontado a semivariância como uma medida mais adequada para a mensuração de risco, especialmente no mercado brasileiro, os testes empíricos realizados nesta pesquisa não favorecem o emprego da semivariância com relação ao emprego da variância. Por fim, a análise de correlação realizada entre os índices de Sharpe, Sortino e Treynor corroborou os resultados obtidos neste estudo, não comprovando a superioridade da semivariância em comparação com a variância para o período estudado. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 9 9 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza Abstract In a context where the investor is takes items as return and risk as a focus, it becomes relevant up-to-date studies that may contribute to the models originally proposed by Markowitz. This paper pointed valuated which models of performance are more relevant to explain the behavior of stocks: those using the variance or those using semivariance. For the research were used groups of four companies, two from Brazil and two from the United States, being 20 stocks of the Bovespa and 20 stocks of the NYSE, with daily prices from the period 2003 to 2007.The present study calculated the values of the variances and semivariances and applied them in rates of Sharpe, Sortino and Treynor, as a way to measure the performance (risk in function of the assets return). Although several studies have pointed the semivariance as a measure more appropriate for measuring risk, especially in the Brazilian market, the empirical tests conducted in this study do not favor the use of semivariance regarding the employment of the variance. Finally, the correlation analysis performed between the rates of Sharpe, Sortino and Treynor corroborated with results obtained previously, do not providing evidence of semivariance superiority, in comparison with the semivariance, for the studied period. 1. Introdução Todo investidor tem por foco dois itens básicos: retorno e risco. O retorno é o ganho ou a perda decorrente de um investimento para um determinado intervalo de tempo; e o risco é a incerteza do resultado. Conforme Elton et al. (2004), a existência do risco torna necessário o estudo de medidas de distribuição de retornos, analisando o retorno esperado para a ação, bem como a medida de dispersão em torno da média, o desvio padrão. Na teoria de finanças, o desvio padrão dos retornos é quase universalmente reconhecido como medida de risco. (BOND; SATCHELL, 2002). Markowitz (1959), em sua teoria de portfólios, analisa esses desvios utilizando a variância e a semivariância, medidas de risco, como forma de tentar reduzir o risco em investimentos. O autor constatou que o investidor prefere assegurar o montante principal e receber um retorno mínimo aceitável, e que por isso irá escolher investimentos com a menor probabilidade de ter retornos abaixo deste mínimo. Isso justifica o uso da semivariância, que analisa exatamente os desvios abaixo do esperado, o risco no consenso do investidor. Apesar das justificativas para o uso da semivariância, Nawrocki (1999) destaca que, por muitos anos, Markowitz utilizou a medida da variância por ser computacionalmente mais simples, considerando os recursos existentes àquela época, pois os modelos usando a semivariância necessitam do dobro de dados do que a variância. O modelo não teve considerável significância até a década de 1980, quando houve o surgimento do computador. 10 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 10 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Mais recentemente, Matsumoto e Pinheiro (2006) afirmam que a semivariância é uma medida apropriada quando o investidor percebe o risco como uma possibilidade de resultados adversos mais do que a dispersão dos retornos. A utilização da semivariância se justifica porque os investidores em geral apresentam aversão a retornos abaixo de um valor médio, e estão mais preocupados com esse fato do que com retornos acima do esperado. Segundo Bond e Satchell (2002), apesar da longa história de pesquisa nessa área, pouco tem sido dito sobre a estimativa da semivariância usando dados. Eles acreditam ser necessário identificar as situações onde a semivariância deve ser preferida à variância. Este trabalho se justifica pela importância de avaliar quais modelos de desempenho são mais relevantes para explicar o comportamento das ações: os que utilizam variância ou os que utilizam semivariância. A relevância da presente pesquisa também consiste na incipiência de estudos acadêmicos sobre risco de investimentos comparando a utilização da variância e da semivariância com foco na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) e na New York Stock Exchange (NYSE). Além disso o trabalho contribui para a escolha de ferramentas que incorporam modelos de variância ou semivariância na tomada de decisão dos investidores, ao trabalhar com ativos cotados no mercado brasileiro, considerado emergente se comparado ao mercado americano, o que contribui com o fortalecimento do próprio mercado de capitais. 2. Revisão da Literatura Segundo Gitman (2004), o risco pode ser definido como a possibilidade de prejuízo financeiro ou a incerteza, ao se tratar da variabilidade de retornos associada a determinado ativo. O autor relata que a relação risco e retorno desempenha papel preponderante na determinação do destino dado ao capital privado, onde um dos principais atrativos para o investimento é uma relação coerente entre essas duas variáveis. Markowitz (1952) já havia relatado que o objetivo maior dos investidores é a maximização da relação risco e retorno. Assim, para um determinado nível de risco, o investidor terá o interesse em obter o máximo de retorno, e de forma análoga, para um determinado retorno, o investidor buscará minimizar seu risco. Sharpe et al. (1995) descreveram que o risco total de um ativo ou de um portfólio é o resultado da combinação do risco não-diversificável ou sistemático com o risco diversificável ou não-sistemático. O risco não-sistemático, também chamado de diversificável, está relacionado desempenho do investimento devido à possibilidade de sua diluição na formação do portfólio. O risco sistemático ou não-diversificável é um risco que não pode ser diluído na formação de portfólios. É o risco relacionado ao desempenho da economia do país e das expectativas dos agentes econômicos, ou seja, fora do controle do investidor individual. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 11 11 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza 2.1 Média variância O modelo da média variância foi desenvolvido por Markowitz (1952), que propõe uma forma de classificação das ações avaliando não só o retorno, mas também o risco. Ele mede o retorno esperado e o risco esperado utilizando a média e o desvio padrão dos retornos passados. A variância, segundo Estrada (2002), é uma medida questionável porque necessita de uma distribuição simétrica para os retornos. Para Reyna et al. (1999), os mercados emergentes possuem habitualmente deficiências em suas séries de retornos financeiros, como, por exemplo, valores extremos que afetariam os resultados dos modelos de média variância. 2.2 Semivariância A semivariância foi proposta por Markowitz (1959), que afirmou a importância do fato de o investidor estar interessado principalmente em reduzir os riscos de perda. Para ele o uso da semivariância (identificada por S) como uma medida de risco parece ser mais plausível do que a variância, desde que a preocupação seja com os resultados adversos. Assim, a semivariância é estabelecida por S=E(Min(0,R-c)2), sendo c uma constante, independente da escolha do portfólio, e R o retorno do ativo. Além disso, o autor propõe duas formas para mensurar o risco de perda: a semivariância calculada pelos retornos abaixo da média (SVm) e semivariância dos retornos abaixo do alvo (target) (SVt). Apesar dessas proposições, Markowitz continua a utilizar a medida da variância por ser computacionalmente mais simples, considerando os recursos existentes àquela época, dado que os modelos usando a semivariância necessitariam do dobro de dados do que a variância. Por esse motivo, o modelo não teve considerável significância até a década de 1980, quando houve o surgimento do computador. Mas as pesquisas sobre a semivariância continuaram. Podemos citar como exemplo Quirk e Saposnik (1962), que demonstraram a superioridade da semivariância se comparada à variância. Outro fator que atrasou a pesquisa da semivariância foi a existência dos dois modelos, que acabaram causando confusão. A SVm foi assumida por muitos pesquisadores como a única forma da semivariância, e isso atrasou os estudos sobre a SVt (NAWROCKI, 1999). Sharpe (1964), com o modelo CAPM, usou apenas o critério da média variância para calcular o retorno das carteiras e maximizar a função utilidade que define o portfólio ideal. Já Fishburn (1977) analisou a escolha entre modelos baseados nas médias, variâncias, semivariâncias, probabilidades de perda, entre outros, reafirmando que, em geral, investidores acreditam que tomaram decisões erradas quando o resultado é abaixo do esperado, o que justifica a utilização de modelos de semivariância. Testes com grandes quantidades de dados foram realizados por Ang e Chua (1979) que comparam as semivariâncias e encontram resultados fortes que comprovam a superioridade da SVt sobre a SVm. 12 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 12 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Como o desvio padrão e, conseqüentemente, a variância não separam retornos positivos de negativos ao levar em conta a média, Badarinathi e Kochman (1982) consideram como apenas uma medida de incerteza. Ao ignorar retornos positivos, a semivariância apresentaria ao investidor a chance de perda – sendo a definição consensual de risco. Roy (1999) constatou que o investidor prefere assegurar o montante principal e receber um retorno mínimo aceitável, reduzindo a probabilidade de ter retornos abaixo deste mínimo. A forma mais comum de usar medidas para reduzir o risco é a semivariância (NAWROCKI, 1999) especialmente a SVt, onde o ponto de referência pode ser definido para calcular os desvios. Este ponto de referência, definido por Mínimo Retorno Aceitável (MRA), é utilizado para distinguir risco de volatilidade. Desse modo, os rendimentos acima do ponto de referência indicam que os objetivos foram alcançados e, por isso, são considerados como “boa volatilidade”. Já os rendimentos abaixo do ponto de referência são considerados como risco.A superioridade do uso da semivariância também é comprovada por Kochman (2000), que não encontrou justificativas para o uso exclusivo do desvio padrão. Bond e Satchell (2002) comparam semivariância com variância e tentam identificar situações nas quais a semivariância deve ser preferida. Os autores concluem que para distribuições simétricas de retornos a variância é mais eficiente. Para retornos assimétricos não foi provada uma relação constante entre o valor esperado e os índices avaliados. O que se pode observar é que a variância é uma medida de risco mais volátil do que a semivariância. Isso também havia sido observado por Markowitz (1959), que publicou que o uso da variância não era apropriado para vários casos práticos, em particular quando os ativos que compunham as carteiras tinham retornos assimétricos, sendo o modelo da semivariância proposto como solução. Duarte Júnior (2005) analisa os modelos do ponto de vista da modelagem e indica que os modelos de semivariância são mais convenientes do que os modelos de variância para a estruturação de carteiras ótimas de ativos com retornos assimétricos. Matsumoto e Pinheiro (2006), em um artigo sobre composição de carteiras, encontram resultados superiores para as carteiras montadas com base em matrizes de semivariância, se comparados aos resultados de carteiras utilizando a variância. 2.3 Beta e downside beta O beta, segundo Bodie, Kane e Marcus (2000), é a sensibilidade dos retornos de um título ao fator sistemático ou de mercado, ou seja, mede a extensão na qual os retornos sobre as ações reagem aos retornos da carteira de mercado. O beta mede o risco sistemático ou o risco não diversificável de um ativo em relação ao mercado. De acordo com Póvoa (2004), o beta tem a função única e exclusivamente de explicar a variação de determinado ativo em função da variação de outro ativo. Para explicitar o seu cálculo, toma-se como base uma empresa qualquer e o mercado em que está inserida. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 13 13 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza Para Weston e Brigham (2000), o beta reflete a tendência de uma ação se correlacionar com o mercado. Desta forma, o beta é a medida da sensibilidade relativa da taxa de retorno i às variações da taxa de retorno da carteira de mercado. Os autores Sanvicente e Mellagi Filho (1996) relatam que se um ativo apresenta um â < 0, esse ativo possui um comportamento dito como defensivo; e quando â > 0, o ativo este possui um comportamento agressivo. Gitman (2004) ainda destaca que o beta de uma empresa poder mudar ao longo do tempo, como resultado das mudanças nos ativos da empresa, no mix financeiro, ou em fatores externos que fujam do controle da administração. O beta constitui-se, portanto, uma maneira de medir o risco não diversificável de um ativo, diferenciando o risco de diferentes empresas. Um dos questionamentos mais usuais é se o beta é apropriado para mensurar o risco. Segundo Estrada (2002), a discussão deve girar em torno da base de sustentação do beta. O beta apóia-se num modelo de equilíbrio que permite que investidores balizem sua conduta pelo modelo média variância, ou seja, os investidores procuram maximizar sua função de utilidade, que, por sua vez, depende da média e da variância dos retornos de seu portfólio. Ou seja, a utilização da variância como medida de risco é passível de ser questionada, principalmente em mercados emergentes, em razão da assimetria dos retornos das ações. Ainda de acordo com Estrada (2000), utilizar uma medida de downside risk para a composição do downside beta pode trazer um maior poder de explicação dos retornos dos ativos em mercados emergentes que o beta tradicional. Segundo Elton et al. (2004), o downside beta centra seu foco unicamente no risco não desejado, ou seja, analisa apenas os retornos que estão abaixo do retorno esperado (desvio negativo), pois, de acordo com Estrada (2000), os investidores se preocupam apenas com a parte negativa do risco, uma vez que esta é indesejável para os investidores. Galagedera (2005), em seu artigo, discorre sobre as relações entre o beta e o downside beta, analisando que há fortes indícios de que a média variância do beta não é a melhor medida para o desempenho, sendo o conceito de downside risk uma alternativa. 2.4 Índices de desempenho Para avaliar o desempenho de um investimento, ou seja, o retorno obtido pelo ativo comparado ao risco incorrido, serão utilizados os índices de Sharpe, Sortino e Treynor. O Índice de Sharpe (SHARPE, 1966) é uma medida que, baseada no modelo de média variância de Markowitz (1952), relaciona o prêmio de risco da carteira com o seu desvio padrão. Esse índice é baseado numa distribuição normal dos retornos e no fato do investidor ter preferência por uma função em termos de média variância. O Índice de Sortino (SORTINO;VAN DER MEER, 1991; SORTINO; PRICE, 1994) é baseado em medida de downside risk, ou seja, uma medida de risco alternativa baseada em 14 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 14 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos um semidesvio padrão em relação a um ponto de referência. Esse ponto é chamado de Mínimo Retorno Aceitável (MRA) e é utilizado para distinguir risco de volatilidade. De acordo com Sortino e Van der Meer (1991), definir um ponto de referência implica que os retornos encontrados significam que o objetivo foi alcançado. O Índice de Treynor pode ser definido como o prêmio de risco obtido por unidade de risco sistêmico, medido em termos de beta ou downside beta, que se mostra útil para a ordenação de fundos de investimento com perfis de risco diferentes. Esse índice é o prêmio de risco ganho por unidade de risco assumido, em que o risco é medido em termos do beta, ou seja, o risco sistemático ou de mercado, que não é passível de diversificação. Duarte Júnior (2005) ressalta que os Índices de Sharpe e Treynor baseados nos modelos da média variância em geral apresentam ordenações bastante similares se aplicados aos mesmo conjunto de ativos. Mas, segundo o autor, isso não é válido para o Índice de Sortino, pois as medidas de downside risk podem produzir ordenações bem diferentes. Portanto, o objetivo principal deste trabalho é avaliar quais modelos de desempenho são mais relevantes para explicar o comportamento das ações: os que utilizam variância ou os que utilizam semivariância. Têm-se como objetivos específicos: realizar a aplicação empírica de modelos de desempenho (Índices de Sharpe, Sortino e Treynor) utilizando as medidas de variância e semivariância para analisar se há diferença entre os resultados; comparar esses modelos indicando qual deles deve ser preferido pelo investidor; e verificar a correlação entre os índices de desempenho. 3. Métodos da Pesquisa A pesquisa tem caráter exploratório e a amostra selecionada reúne dados de 40 ativos cotados na Bovespa e na NYSE, coletados nos sites das bolsas de valores e no programa Economática. Foram obtidas as cotações diárias dos ativos no período de 1º de janeiro 2003 a 31 de dezembro de 2007. Também foram obtidas as cotações diárias do índice Bovespa (Ibovespa), do índice Standard & Poor’s 500 (S&P 500), do Certificado de Depósito Interbancário (CDI, para 30 dias), da poupança e doTreasury Bond (T-BOND, para 30 anos). Dos 40 ativos coletados, 20 são ações cotadas na Bovespa e 20 são ações cotadas na NYSE. As ações foram organizadas em quatro grupos (Tabela 1): • Grupo 1: 10 ações com maior participação percentual no Ibovespa (IBOV); • Grupo 2: 10 ações da Bovespa sem participação no IBOV, com o maior volume de negócios (em reais); • Grupo 3: 10 ações com maior participação percentual no índice S&P 500; • Grupo 4: 10 ações da NYSE sem participação no índice S&P 500, com o maior volume de negócios (em dólar). Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 15 15 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza Os grupos foram assim distribuídos com o propósito de avaliar o emprego da variância e da semivariância em ativos de menor volatilidade (Grupos 1 e 3) e de maior volatilidade (Grupos 2 e 4). Além disso, os ativos dos Grupos 1 e 2 são cotados no mercado brasileiro (Bovespa), considerado emergente se comparado ao mercado americano (NYSE), onde são cotados os ativos dos Grupos 3 e 4. Para os Grupos 1 e 2, foi utilizada a variação da poupança como ativo livre de risco, e para os Grupos 3 e 4, a variação dos T-BONDS de 30 anos. Como MRA definido pelo investidor, para cálculos utilizando a semivariância, foram usados a média de retorno do ativo, o valor zero e a variação diária do CDI. Dado que o Mínimo Retorno Aceitável é definido como o ponto de referência para que o investidor alcance sua meta, nesta pesquisa optou-se por utilizar a variação do CDI como MRA também para o grupo de ações norte-americanas, uma vez que o investimento é decidido sob a ótica de um investidor brasileiro. 3.1 Cálculo da média Com os dados em retornos percentuais diários, foi calculada a média dos retornos amostrais, somando-se todos os retornos e dividindo pelo número de elementos da amostra (GRINBLATT; TITMAN, 2001). 3.2 Cálculo da variância e do desvio padrão A variância dos retornos, segundo Grimblatt e Titman (2001), é definida por: sendo R o retorno percentual do ativo, e m o tamanho da amostra. O desvio padrão é calculado pela raiz quadrada da variância. 16 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 16 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Tabela 1: Dados da amostra GRUPO 1 GRUPO 2 Código Empresa Classe Partic. Índice % * Volume Milhões ** PETR4 Petrobrás PN 16,54 404873 VALE5 Vale PNA 11,73 283512 BBDC4 Bradesco PN 3,47 101868 GGBR4 Gerdau PN 3,27 59792 PETR3 Petrobrás ON 3,15 80610 USIM5 Usiminas PNA 3,05 101640 VALE3 Vale ON 3,01 76913 ITAU4 Itaubanco PN 2,87 83603 CSNA3 Sid. Nacional ON 2,78 78416 UBBR11 Unibanco UnN1 2,41 47882 EBTP4 Embratel Part PN 0,00 16219 SUZB5 Suzano Papel PNA 0,00 9934 TBLE3 Tractebel ON 0,00 7497 ACES4 Am Inox Br PN 0,00 6707 PTIP4 Ipiranga Pet PN 0,00 5295 BBDC3 Bradesco ON 0,00 5025 FFTL4 Fosfertil PN 0,00 4396 CNFB4 Confab PN 0,00 3764 UNIP6 Unipar PNB 0,00 3457 EBTP3 Eletropaulo PNA 0,00 3438 XOM Exxon Mobil Com 3,89 1618693 GE General Electric Com 2,51 1248020 T AT&T Com 1,97 657644 CVX Chevron Texaco Com 1,69 722297 Com 1,67 647534 Com 1,55 701401 PG GRUPO 3 JNJ IMB Procter & Gamble Johnson & Johnson Intl Bus Machines Com 1,47 785445 BAC BankAmerica Com 1,24 977769 JPM JP Morgan Chase Com 1,20 789863 COP ConocoPhillips Com 1,19 719424 Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 17 17 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza GRUPO 4 Código Empresa Classe Partic. Índice % * Volume Milhões ** POT Potash / Saskatchew Com 0,00 344499 PBR Petrobrás ON 0,00 342239 RIO Vale ON 0,00 341856 DNA Genentech Com 0,00 338341 DO Diamond Offshore Dr Com 0,00 198954 GSF-old Global Santa Fé Com 0,00 163239 MOS Mosaic Com 0,00 153587 AMR AMR Corporation Com 0,00 150020 PBRA Petrobrás PN 0,00 149540 HET-old Harrah's Entertainment Com 0,00 138697 * Referente ao índice Bovespa para os grupos 1 e 2 e o índice S&P 500 para os grupos 3 e 4 ** Referente a valores em Reais (R$) para os grupos 1 e 2 e em Dólar (US$) para os grupos 3 e 4 Fonte: Os autores 3.3 Cálculo da semivariância abaixo da média Este primeiro modelo alternativo à variância mensura a variação dos retornos abaixo da média. Segundo Markowitz (1959), a semivariância é calculada por: 3.4 Cálculo da semivariância abaixo de zero A semivariância que mensura as probabilidades de se ter retornos negativos é uma variação da semivariância abaixo do alvo (SVt), de acordo com Markowitz (1959), é dada por: sendo o zero o Mínimo Retorno Aceitável (MRA). 18 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 18 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos 3.5 Cálculo da semivariância abaixo do CDI A semivariância que mensura as probabilidades de não se atingir o retorno dado pelo CDI é uma variação da semivariância abaixo do alvo (SVt), como já foi definida por Markowitz (1959), é dada por: sendo a variação do retorno do CDI o Mínimo Retorno Aceitável (MRA). 3.6 Cálculo das covariâncias O valor das covariâncias dos ativos com o retorno do mercado (Ibovespa/S&P 500) é necessário para o cálculo posterior do beta dos ativos. De acordo com Grinblatt e Titman (2001), a covariância é dada por: sendo Ri o retorno do ativo e Rm o retorno do mercado. 3.7 Cálculo do beta O beta de um ativo mede a sensibilidade de seus retornos aos retornos do mercado. Pode ser definido como sendo a razão entre a covariância do retorno do ativo com o retorno do mercado, e a variância do retorno do mercado, conforme Grinblatt e Titman (2001) tem-se: 3.8 Cálculo do downside beta Conforme Estrada (2000), o downside beta é calculado pela razão entre o semi-desvio dos retornos do ativo e o semi-desvio dos retornos do mercado, ou seja, pela cosemivariância Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 19 19 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza dividida pela semivariância dos retornos do mercado. O autor ressalta que essa medida possui um poder maior de explicação dos retornos dos ativos em mercados emergentes. 3.9 Cálculo da co-semivariância e da semivariância Estrada (2000) define a co-semivariância como: e a semivariância abaixo da média definida por: 3.10 Cálculo do Índice de Sharpe Sharpe (1964) verifica e tenta prever o retorno das carteiras de ativos desenvolvendo o modelo CAPM. Dois anos depois desenvolve o Índice de Sharpe (SHARPE, 1966), definido pela razão entre o prêmio de risco e o seu desvio padrão, representado pela equação prêmio de risco dividido por risco total, sendo o prêmio de risco dado pela diferença entre o retorno da ação e o retorno livre de risco e o risco total dado pelo desvio padrão dos retornos da ação. O Índice de Sharpe é uma medida apoiada no critério da média variância e, similar a esta teoria, pressupõe condições como: os retornos são distribuídos normalmente; e o investidor tem uma função preferencial para média variância. 3.11 Cálculo do índice de Sortino O Índice de Sortino (SORTINO;VAN DER MEER, 1991; SORTINO; PRICE, 1994) é dado por:prêmio de risco dividido por downside risk, sendo para este trabalho, a semivariância definida como medida de downside risk. 20 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 20 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos O Índice de Sortino, por utilizar uma medida de downside risk, permite a escolha de um Mínimo Retorno Aceitável (MRA), sendo este um ponto de referência para os retornos esperados. Rendimentos abaixo desse ponto são considerados como má volatilidade ou risco. 3.12 Cálculo do Índice de Treynor O Índice de Treynor (1965) é dado por:prêmio de risco dividido pelo risco sistêmico, sendo risco sistêmico: beta da ação em relação a um índice escolhido para representar a carteira de todos os ativos. 3.13 Cálculo das correlações O coeficiente de correlação de Pearson (r) dá-se conforme Grinblatt e Titman (2001) em que xi e yi são os valores medidos de ambas as variáveis. Para além disso, tem-se que as médias aritméticas de ambas as variáveis são A análise correlacional indica a relação entre duas variáveis lineares e os valores sempre serão entre +1 e -1. O sinal indica se a correlação é positiva ou negativa, e o tamanho da variável indica a força da correlação. Tem-se que para um valor, positivo ou negativo, 0,70 indica forte correlação; 0,30 a 0,70 correlação moderada, e 0,00 a 0,30 fraca correlação. 3.13 Variaveis/Dimensões da Pesquisa As variações percentuais entre os cotações das ações representam a variável a ser estudada. Essas variações serão aplicadas nos modelos anteriormente descritos, individualmente para cada ativo, destacando resultados de 1. Variância; 2. Semivariância abaixo da média; Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 21 21 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza 3. Semivariância abaixo do Mínimo Retorno Aceitável (zero); 4. Semivariância abaixo do Mínimo Retorno Aceitável (CDI). 4. Resultados e Discussão O estudo foi realizado com base nos dados diários de 20 empresas brasileiras e 20 empresas norte-americanas, obtidos por meio do software Economática. Com o intuito de simplificar as tabelas de resultados, que serão apresentadas a seguir, foi necessário fazer uma abreviação dos índices (Tabela 2). Tabela 2: Abreviação dos índices Índices Abreviações Média Med. Variância Var. Desvio padrão D.P Covariância do ativo com o mercado (Ri,Rm) Cov. β Beta (β) Semivariância abaixo da média SvarM Semivariância abaixo de zero Svar0 Semivariância abaixo do CDI SvarCDI Co-semivariância abaixo da média do ativo com o mercado (Ri, Rm) CsvM Co-semivariância abaixo de zero do ativo com o mercado (Ri, 0) Csv0 Co-semivariância abaixo do CDI do ativo com o mercado (Ri, cdi) CsvCDI Downside Beta (dβ) da semivariância abaixo da média dβM Downside Beta (dβ) da semivariância abaixo de zero dβ0 Downside Beta (dβ) da semivariância abaixo do CDI dβCDI Índice de Sharpe Sh Índice de Sortino da semivariância abaixo da média StM Índice de Sortino da semivariância abaixo de zero St0 Índice de Sortino da semivariância abaixo do CDI StCDI Índice de Treynor utilizando o Beta (β) Trβ Índice de Treynor da semivariância abaixo da média TrM Índice de Treynor da semivariância abaixo de zero Tr0 Índice de Treynor da semivariância abaixo do CDI TrCDI Fonte: Os autores 22 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 22 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos As tabelas a seguir apresentam os resultados mais relevantes encontrados para cada grupo de pesquisa. As informações completas desses resultados encontram-se no Apêndice. 4.1 Grupo 1 Como a variância é uma medida de dispersão estatística, e mensura a volatilidade das retornos no período, pode ser analisada inicialmente como medida de risco. Dessa forma, para o período analisado, o ativo de maior risco é USIM5 (0,00081), e o de menor é PETR4 (0,00039). O ativo USIM5 destaca-se também pela maior média diária de retorno, 0,30%. As médias dos retornos diários das ações deste grupo variam de 0,17% a 0,30%. Analisando e comparando as medidas de variância e semivariância do grupo, os ativos apresentam a mesma classificação de risco para todas as medidas de semivariância. Ao comparar com a variância, os quatro ativos de menor risco têm pequenas variações na classificação, sendo que o ITAU4 e o PETR4 os ativos de menor risco das semivariâncias. Analisando todos os betas, os ativos apresentaram valores entre 0 e 1 para o período, o que significa que os retornos dos ativos variam menos do que os retornos do IBOV, tanto em situações de aumento quando no caso da redução dos ganhos. Com exceção do ativo VALE3, que altera da posição de menor risco do beta para a terceira posição de menor risco dos downside betas, outras ações se alteraram em, no máximo, uma posição. Os ativos PETR4 e ITAU4 apresentaram os valores mais próximos ao do IBOV. Em seguida, pode-se observar os resultados dos índices de Sharpe, Sortino e Treynor. Esses índices classificam os ativos de forma que o investidor possa mensurar a compensação do risco pelo retorno para escolher qual o melhor investimento. São medidas ajustadas ao risco, baseadas na variância, semivariância e beta, considerando também os retornos dos ativos. Quanto maior o resultado desses índices, melhor o retorno pelo risco incorrido. Ao ordenar esses índices, todos os resultados de Sortino apresentaram a mesma ordem. Entretanto, ao comparar com os resultados de Sharpe, apenas PETR3 (0,09094) e PETR4 (0,09146) trocaram de posição. Analisando os resultados de Treynor, que mensura o risco sistemático ao utilizar o beta e o downside beta para os cálculos, todos os ativos apresentam a mesma classificação na ordem dos resultados, independente do tipo de beta utilizado. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 23 23 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza Tabela 3: Grupo 1 Índices PETR4 VALE5 BBDC4 GGBR4 PETR3 USIM5 VALE3 ITAU4 Med. 0,00203 Var. 0,00039 SvarM CSNA3 UBBR11 0,00184 0,00189 0,00227 0,00208 0,00300 0,00194 0,00169 0,00280 0,00043 0,00042 0,00055 0,00041 0,00081 0,00047 0,00041 0,00062 0,00051 0,00019 0,00021 0,00019 0,00027 0,00020 0,00040 0,00023 0,00019 0,00031 0,00025 0,00191 Svar0 0,00016 0,00018 0,00017 0,00023 0,00017 0,00033 0,00020 0,00016 0,00026 0,00021 SvarCDI 0,00017 0,00019 0,00017 0,00024 0,00018 0,00035 0,00021 0,00017 0,00027 0,00022 Sh 0,09146 0,07715 0,08109 0,08672 0,09094 0,09757 0,07872 0,07185 0,10266 0,07396 StM 0,12949 0,11019 0,11930 0,12291 0,13055 0,13912 0,11336 0,10599 0,14598 0,10698 St0 0,14023 0,11832 0,12913 0,13274 0,14166 0,15148 0,12200 0,11379 0,15990 0,11465 StCDI 0,13680 0,11549 0,12575 0,12992 0,13815 0,14877 0,11916 0,11080 0,15661 0,11200 Trβ 0,00253 0,00277 0,00241 0,00330 0,00287 0,00531 0,00329 0,00204 0,00475 0,00300 TrM 0,00214 0,00219 0,00200 0,00281 0,00237 0,00452 0,00252 0,00172 0,00395 0,00245 Tr0 0,00216 0,00225 0,00203 0,00283 0,00241 0,00451 0,00258 0,00175 0,00396 0,00252 TrCDI 0,00216 0,00224 0,00202 0,00282 0,00240 0,00449 0,00257 0,00175 0,00394 0,00251 Fonte: Os autores 4.2 Grupo 2 Analisando o Grupo 2, a maior variância foi apresentada pelo EBTP3 (0,00105), mensurando a volatilidade das retornos no período. O menor risco foi encontrado em FFTL4 (0,00023). Além do maior risco, o ativo EBTP3 apresentou também a segunda pior média de retorno diário 0,109%, sendo superado apenas pelo ativo EBTP4 0,104%. O ativo ACES4 apresentou a melhor média de retorno diário, que é de 0,232%. Os ativos apresentam praticamente a mesma classificação de risco para todas as medidas de semivariância, com exceção dos ativos SUZB5 e UNIP6 que alteram de posição entre si. Ao comparar com a variância, o ativo EBTP4 (0,00094), que ocupava a terceira posição de maior risco, passa a ocupar a primeira nas medidas de semivariância. O ativo FFTL4 se mantém como de menor risco em todos os resultados. 24 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 24 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Tabela 4: Grupo 2 Índices EBTP4 SUZB5 TBLE3 ACES4 PTIP4 BBDC3 Med. 0,00104 Var. 0,00094 SvarM 0,00045 0,00021 FFTL4 CNFB4 0,00177 0,00229 0,00232 0,00208 0,00044 0,00104 0,00051 0,00061 0,00041 0,00023 0,00030 UNIP6 EBTP3 0,00202 0,00204 0,00043 0,00023 0,00170 0,00133 0,00109 0,00053 0,00046 0,00019 0,00010 0,00105 0,00025 0,00021 0,00044 Svar0 0,00043 0,00018 0,00036 0,00020 0,00026 0,00016 0,00008 0,00023 0,00019 0,00042 SvarCDI 0,00044 0,00019 0,00038 0,00021 0,00027 0,00017 0,00009 0,00024 0,00020 0,00044 Sh 0,02624 0,07321 0,06395 0,09196 0,07424 0,08636 0,11944 0,06350 0,05102 0,02639 StM 0,03793 0,10587 0,10162 0,13680 0,10686 0,12815 0,17840 0,09213 0,07589 0,04065 St0 0,03887 0,11324 0,10804 0,14852 0,11427 0,13896 0,19881 0,09757 0,07985 0,04157 StCDI 0,03826 0,11055 0,10622 0,14507 0,11193 0,13545 0,19231 0,09550 0,07796 0,04099 Trβ 0,00235 0,00397 0,00918 0,00398 0,00390 0,00299 0,00429 0,00379 0,00243 0,00475 TrM 0,00180 0,00252 0,00481 0,00296 0,00296 0,00231 0,00238 0,00250 0,00154 0,00283 Tr0 0,00193 0,00261 0,00505 0,00300 0,00303 0,00236 0,00248 0,00262 0,00161 0,00313 TrCDI 0,00190 0,00259 0,00497 0,00299 0,00301 0,00235 0,00245 0,00260 0,00160 0,00303 Fonte: Os autores Os resultados do beta estão, para todas as empresas, com valores de 0 a 1 para o período, o que significa que os retornos dos ativos variam menos do que os retornos do IBOV, tanto nas situações de aumento quando nas de redução dos ganhos. Ao comparar o beta com os downside betas, verifica-se melhora no risco de FFTL4 e piora em ACES4, PTIP4 e UNIP6. O ativo BBDC3 apresentou os valores mais próximos ao do IBOV. Assim, com os resultados de Sharpe, Sortino e Treynor pode-se assinalar que quanto maior o resultado desses índices, melhor o retorno do investidor pelo risco incorrido. Ao ordenar esses índices, todos os resultados de Sortino apresentaram a mesma ordem dos resultados de Sharpe. Analisando os resultados dos índices de Treynor, que mensuram o risco sistemático ao utilizar o beta e o downside beta para os cálculos, observase que, ao comparar o Treynor do beta com os Treynor dos downside betas, nesta ordem, houve melhora na recomendação de PTIP4 e piora na de FFTL4. 4.3 Grupo 3 Analisando resultados do grupo 3, a maior variância foi a do ativo COP (0,00023), e a menor a do ativo PG (0,00008). O ativo COP também apresenta a média mais alta de retorno diário, de 0,123%. O ativo JNJ apresenta a menor média de retorno diário, de 0,028%. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 25 25 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza Ao comparar as medidas de variância e semivariância do grupo, observa-se que os ativos apresentam a mesma classificação de risco para todas as medidas de semivariância. Ao comparar com a variância, há alteração de posição entre CVX e XOM, e entre GE e BAC. De acordo com os resultados dos betas, todos os ativos apresentaram valores de 0 a 1 para o período, o que significa que os retornos dos ativos variam menos do que os retornos do S&P 500, tanto no caso de aumento quanto na redução dos ganhos. Tabela 5: Grupo 3 Índices XOM GE T CVX PG JNJ IMB BAC JPM COP Med. 0,00094 0,00047 0,00055 0,00101 0,00052 0,00028 0,00034 0,00034 0,00066 0,00123 Var. 0,00016 0,00012 0,00019 0,00016 0,00008 0,00009 0,00013 0,00011 0,00019 0,00023 SvarM 0,00009 0,00006 0,00009 0,00008 0,00004 0,00004 0,00007 0,00006 0,00009 0,00013 Svar0 0,00008 0,00005 0,00009 0,00008 0,00004 0,00004 0,00007 0,00006 0,00008 0,00011 SvarCDI 0,00008 0,00006 0,00010 0,00008 0,00004 0,00004 0,00007 0,00006 0,00009 0,00012 Sh 0,06383 0,03065 0,03007 0,06925 0,04433 0,01542 0,01821 0,01953 0,03841 0,07172 StM 0,08684 0,04470 0,04323 0,09573 0,06322 0,02250 0,02537 0,02637 0,05557 0,09785 St0 0,09162 0,04626 0,04452 0,10174 0,06616 0,02302 0,02590 0,02692 0,05760 0,10375 StCDI 0,08838 0,04415 0,04299 0,09800 0,06264 0,02180 0,02491 0,02592 0,05566 0,10072 Trβ 0,00194 0,00060 0,00125 0,00237 0,00079 0,00035 0,00047 0,00036 0,00110 0,00419 TrM 0,00177 0,00053 0,00104 0,00202 0,00067 0,00026 0,00043 0,00037 0,00101 0,00353 Tr0 0,00176 0,00053 0,00106 0,00200 0,00068 0,00027 0,00044 0,00037 0,00102 0,00356 TrCDI 0,00171 0,00052 0,00102 0,00194 0,00066 0,00026 0,00043 0,00036 0,00099 0,00339 Fonte: Os autores O ativo GE apresentou os valores mais próximos ao mercado para os downside betas, enquanto o ativo BAC apresentou o maior valor para o beta tradicional, passando o GE para o segundo lugar. O resultado dos downside betas foi próximo, mostrando apenas uma troca de posição para os ativos BAC e JNJ ao considerar o CDI. Deste modo, ao considerar a mudança do beta para os downside betas, as maiores variações foram encontradas em BAC e JNJ. Em seguida, pode-se observar os resultados dos índices de Sharpe e Sortino. Ao ordenar esses índices, os resultados dos ativos foram os mesmos para todos os índices. Os índices de Treynor também apresentaram a mesma classificação dos ativos para todos os resultados, e vale ressaltar que o resultados do Treynor também foram bem próximo dos resultados de Sharpe e Sortino, considerando a ordenação dos ativos. 26 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 26 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos 4.4 Grupo 4 A maior variância, que pode ser interpretada inicialmente como maior risco, foi a do ativo AMR (0,00220). Analisando dessa forma, para o período estudado, o ativo de menor risco é o HET-old (0,00022). Este ativo também apresenta a média mais baixa de retorno diário, que é de 0,081%. O ativo PBR apresenta a melhor média de retorno diário, de 0,262%. Analisando e comparando as demais medidas de variância e semivariância do grupo, observa-se que os ativos apresentam classificações muito próximas para todas as medidas: o ativo DNA diminuiu o risco em três posições para a semivariância, e o ativo GSF-old aumentou em uma ou duas posições seu risco. Já para os betas todos os ativos apresentaram valores de 0 a 1 para o período, o que significa que os retornos dos ativos variam menos do que os retornos do S&P 500, tanto em situações de aumento quanto em redução dos ganhos. Os ativos HET-old e POT apresentaram os valores mais próximos ao mercado para todos os betas. O ativo AMR apresentou o menor risco para os downside betas, e o segundo menor para o beta, sendo superado pelo DNA. Os ativos DNA e MOS foram os que apresentaram a maior variação nas classificações dos resultados. Em seguida, pode-se observar os resultados dos índices de Sharpe e de Sortino. Ao ordenar esses índices, os resultados dos ativos foi bem próximo, com mudanças de apenas uma posição para os ativos DO, MOS, GSF-old e DNA. Considerando os resultados dos índices de Treynor, observa-se que o melhor ativo é o AMR, e o pior é o HET-old. As maiores variações ocorreram em DNA, que caiu seis posições nas medidas de downside risk, e POT e MOS, que subiram duas posições. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 27 27 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza Tabela 6: Grupo 4 Índices POT PBR RIO DNA DO GSF-old MOS AMR PBRA HET-old Med. 0,00231 0,00262 0,00246 0,00135 0,00180 0,00123 0,00204 0,00166 0,00255 0,00081 Var. 0,00041 0,00061 0,00060 0,00056 0,00046 0,00040 0,00062 0,00220 0,00064 0,00022 SvarM 0,00020 0,00029 0,00030 0,00016 0,00022 0,00019 0,00029 0,00091 0,00031 0,00010 Svar0 0,00017 0,00024 0,00025 0,00014 0,00020 0,00017 0,00026 0,00086 0,00026 0,00009 SvarCDI 0,00017 0,00025 0,00026 0,00015 0,00020 0,00018 0,00027 0,00088 0,00027 0,00010 Sh 0,10750 0,10107 0,09498 0,05137 0,07787 0,05492 0,07647 0,03261 0,09542 0,04581 StM 0,15425 0,14734 0,13534 0,09702 0,11140 0,07920 0,11182 0,05077 0,13811 0,06815 0,07097 St0 0,16832 0,16019 0,14657 0,10289 0,11932 0,08333 0,11927 0,05218 0,14936 StCDI 0,16452 0,15704 0,14371 0,10010 0,11643 0,08115 0,11690 0,05162 0,14654 0,06864 Tr? 0,01160 0,01431 0,01325 0,01744 0,01322 0,00849 0,01273 0,02159 0,01405 0,00257 TrM 0,00877 0,01086 0,01040 0,00525 0,00798 0,00507 0,00928 0,01410 0,01077 0,00198 Tr0 0,00867 0,01057 0,01013 0,00538 0,00796 0,00514 0,00927 0,01458 0,01050 0,00203 TrCDI 0,00823 0,01012 0,00969 0,00503 0,00755 0,00486 0,00881 0,01362 0,01006 0,00192 Fonte: Os autores 4.5 Análise de correlação Nos quatro grupos, pode-se verificar uma forte correlação entre o Índice Sharpe e os Índices de Sortino da semivariância, tanto abaixo da média, como abaixo de zero e abaixo do CDI. Esse resultado corrobora com a análise dos grupos realizada anteriormente, na qual não foi possível verificar uma diferença expressiva entre os índices que utilizam a variância e as medidas que utilizam a semivariância. Um fato a ser observado foi a correlação entre os Índices de Sharpe e os de Treynor, assim como os Índices de Sortino e os de Treynor, que apresentaram uma forte correlação nos Grupos 1 e 3 e uma fraca correlação nos Grupos 2 e 4. Dado que o Índice Sharpe e os Índices de Sortino utilizam o risco não-sistêmico, enquanto os Índices de Treynor utilizam o risco sistêmico, podemos inferir que os ativos dos Grupo 1 e do Grupo 3 não apresentam uma grande diferença em relação ao seus riscos sistêmico e não-sistêmico, lembrando que tais ativos compõem os índices Ibovespa e S&P 500, respectivamente. Já em relação ao Grupo 2 e o Grupo 4, há uma diferença em relação aos riscos sistêmico e não-sistêmico desses ativos, sendo que estes não compõem os principais índices de negócios de suas bolsas de valores. 28 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 28 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Tabela 7 : Correlação Sh Grupo 1 Sh 1,00000 StM StM St0 StCDI Trβ TrM Tr0 0,99577 0,99468 0,99523 0,73941 0,76453 0,75657 1,00000 0,99989 0,99977 0,73078 0,75756 0,74890 0,74961 1,00000 0,99982 0,73116 0,75771 0,74902 0,74974 1,00000 0,74308 0,76937 0,76084 0,76155 1,00000 0,99504 0,99641 0,99637 1,00000 0,99979 0,99982 1,00000 1,00000 0,07879 St0 StCDI Trβ TrM Tr0 TrCDI Grupo 2 Sh 0,99777 0,99727 1,00000 0,99962 1,00000 1,00000 St0 StCDI 0,99734 0,08019 0,11986 0,06274 0,99981 0,13196 0,16346 0,10777 0,12335 0,99995 0,12437 0,15215 0,09755 0,11270 0,12964 0,15927 0,10433 0,11961 1,00000 0,95655 0,96529 0,96351 1,00000 0,99688 0,99853 1,00000 0,99967 0,88525 0,88115 0,88489 Trβ TrM Tr0 TrCDI Sh 1,00000 1,00000 StM 0,99898 0,99922 1,00000 0,99994 0,99982 0,86553 0,87616 0,87206 0,87592 1,00000 0,99989 0,86693 0,87738 0,87325 0,87709 1,00000 0,87260 0,88314 0,87906 0,88287 1,00000 0,99877 0,99897 0,99872 1,00000 0,99994 0,99999 1,00000 0,99995 0,24579 0,26859 St0 StCDI 0,99941 Trβ 0,87410 TrM Tr0 TrCDI Grupo 4 Sh StM St0 0,75726 1,00000 1,00000 StM Grupo 3 TrCDI 1,00000 1,00000 0,98276 0,98346 0,98397 1,00000 0,99993 0,99982 0,01942 0,27002 0,21232 0,23431 1,00000 0,99993 0,02152 0,27489 0,21732 0,23924 1,00000 0,02903 0,28530 0,22781 0,24972 1,00000 0,76849 0,78818 0,77926 1,00000 0,99783 0,99921 1,00000 0,99964 StCDI Trβ TrM Tr0 (0,05038) 0,30426 TrCDI 1,00000 Fonte: Os autores Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 29 29 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza 5. Considerações Finais As medidas de desempenho ajustadas ao risco são utilizadas para classificar as ações, de forma que o investidor possa saber qual é a mais adequada para o seu nível desejado de risco e retorno. Essas medidas são usadas porque supõe-se que os investidores são avessos ao risco, e que tendem a requerer mais retorno se expostos a um nível maior de risco. De forma geral, essas medidas tentam equilibrar o retorno médio pelo risco incorrido. Este artigo avalia, ao fazer um estudo empírico de ativos cotados na Bovespa e na NYSE, quais modelos de desempenho são mais relevantes para explicar o comportamento das ações: os que utilizam variância ou os que utilizam semivariância. Cada modelo estudado pode ser associado a um nível diferente de aversão ao risco. A semivariância, por ser mais flexível, tende a ser preferida por investidores com aversão maior a perdas, ou seja, à idéia consensual de risco. Já os modelos com a variância tendem a ser mais bem aceitos por investidores com menor aversão ao risco. Os resultados apresentados pelos ativos analisados não indicam diferença significativa entre as medidas que utilizam a variância e as que utilizam a semivariância. Apesar de haver variações, que tendem a ser maiores nos Grupos 2 e 4, essas não justificam o investimento em uma medida de risco mais complexa, e que exige mais dados, que é o caso da semivariância. A análise de correlação entre os índices de Sharpe, Sortino e Treynor corrobora com os resultados apresentados e evidencia uma diferença em relação ao risco sistêmico e nãosistêmico dos ativos que não compõem os principais índices de negócios de suas bolsas de valores, ativos pertencentes aos Grupos 2 e 4. Como limitação da pesquisa, tem-se que os resultados obtidos podem sofrer alterações conforme a amostra e o período analisados. Como recomendação para pesquisas futuras sugere-se a utilização de novos períodos, bem como diferentes tamanhos de amostra. Também seria interessante pesquisar os motivos da alteração no desempenho dos ativos ao longo dos anos, incluindo testes de assimetria dos retornos. 6. Referências ANG, J. S.; CHUA, J. H. Composite measures for the evaluation of investment performance. Journal of Financial and Quantitative Analysis, v. 14, p. 361-384, 1979. BADARINATHI, R.; KOCHMAN, L. Is time to reconsider the semivariance? Atlantic Economic Journal, Sep. 1982. BODIE, Z.; KANE, A.; MARCUS, A. J. Fundamentos de investimentos. Porto Alegre, Bookman, 2000. BOND, S. A; SATCHELL, S. E. Statistical properties of the sample of semi-variance. 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Devido à carência de medidas para a avaliação governamental, o monitoramento do desempenho por meio do Balanced Scorecard (BSC) visa superar a desarmonia existente na avaliação da eficiência e eficácia nessa atividade. O estudo de caso desenvolvido percorre as etapas necessárias à implantação do BSC na gestão de um município brasileiro de pequeno porte, o que pode contribuir para o fortalecimento da Gestão Pública no nível municipal, produzindo um rol de informação que priorize a gestão eficiente e eficaz dos recursos públicos. O estudo evidencia que o monitoramento do desempenho por meio deste instrumento auxilia no controle do uso dos recursos, facilitando a tomada de decisão dos gestores públicos e melhorando a visão organizacional da entidade, que é a principal interessada nos aspectos relacionados ao bem estar dos cidadãos, aos recursos financeiros, aos processos internos e à capacidade de aprendizado e crescimento dos funcionários públicos. Abstract Due to the lack of measures possible to be applied in the evaluation of the public sector administration the Balanced Scorecard (BSC) methodology could be adapted to this use. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 33 33 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães The use of this methodology can generate timely information to improve the quality of public management and consequently increase efficiency and effectiveness in the use of public resources.This study aim was to identify the phases in the process of implementation of the Balanced Scorecard (BSC) methodology in the management of small towns in Brazil. A case study was conducted in a town located in the south region of Brazil in order to test this idea. All phases prescribed to the implementation of the BSC methodology were executed.The results show that the methodology helps to control the use of resources and also the decision making process in the case studied, contributing to the vision improvement in the organizational which is supposedly the main interested the well being of citizens and in the learning capabilities and development of civil servants. 1. Introdução O ambiente da gestão pública brasileira convive com a limitação e a escassez de recursos, além de outros fatores conhecidos, tais como: crescimento dos gastos do setor público, necessidade da população dispor de melhor qualidade dos serviços públicos, desequilíbrios sociais e econômicos e perda de confiança da sociedade em relação às realizações da administração pública. Todo esse contexto de atuação constitui desafios que direcionam os gestores à busca de eficiência e eficácia nas atividades que executam, a fim de promover maiores benefícios à sociedade. Assim, o Setor Público caracteriza-se por ser um segmento tomado por complexidades e por executar atividades diferenciadas; cujos resultados, em última análise, são medidos na satisfação do bem-estar da população. Dessa forma, a gestão pública necessita de instrumentos que possibilitem a avaliação desses resultados, oferecendo suporte ao gestor público quanto a administração das finanças públicas municipais. O levantamento e a mensuração dos resultados são partes integrantes do controle de gestão, e atuam para melhoria de diversos aspectos que contribuem para o acompanhamento, avaliação e aperfeiçoamento da gestão pública. Assim, reportam-se à utilização de instrumentos focados na avaliação e monitoramento de desempenhos na gestão pública, como o Balanced Scorecard - BSC que é o sistema de monitoramento de desempenho que proporciona um referencial de análise da estratégia empregada para a criação de valor (KAPLAN; NORTON, 2000). A contribuição do presente estudo está na apresentação de um caso desenvolvido na prefeitura de um município brasileiro de pequeno porte. A literatura brasileira sobre a utilização do BSC na gestão pública municipal é escassa, e permite constatar que o tema deva ser estudado, visto a importância do setor público, principalmente das Prefeituras Municipais, como célula de organização dos municípios. 34 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 34 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) Diante desse contexto, a questão de pesquisa que norteia este estudo busca saber: quais as etapas a serem adotadas no processo de implantação do BSC na gestão de um município brasileiro de pequeno porte? No intuito de responder a esta questão, tem-se como objetivo deste estudo identificar as etapas a serem adotadas no processo de implantação do BSC na gestão de um município brasileiro de pequeno porte. Para atingir a este objetivo, além da fundamentação teórica sobre Gestão Pública e Balanced Scorecard, foi desenvolvido um estudo de caso na Prefeitura Municipal de Ipiranga (PR), que será abordado posteriormente. 2. Fundamentação Teórica Neste tópico, tratar-se-á de aspectos relevantes da Gestão Pública e do sistema de monitoramento de desempenho Balanced Scorecard – BSC. 2.1 Gestão Pública O Setor Público, devido à sua complexidade, tem a necessidade de buscar meios que venham atender a seus objetivos de gestão, ou buscar modelos que ofereçam condições para a mensuração dos benefícios criados à população, ao cumprimento do papel do gestor ofertar o bem comum à sociedade e proporcionar serviços que visam a facilitar a existência do indivíduo na sociedade (KOHAMA, 2006, p.34). Grateron (1999, p. 3) comenta que a gestão pública precisa ser avaliada para que sejam conhecidos seus resultados e seja fornecida uma resposta ao cidadão, de acordo com grau de adequação e coerência existentes entre as decisões dos gestores e a eficiência e eficácia com que foram administrados os recursos disponíveis. Nesse processo de modernização, a preocupação recai sobre a gestão com enfoque em resultados, que procura administrar os recursos públicos com o objetivo de cumprimento das ações estratégicas definidas pelo Governo, para um período determinado. Makón (2000) explica que esta forma permite ao gestor avaliar as ações das organizações do Estado, em relação às políticas públicas definidas para o atendimento à demanda da sociedade. Para amenizar a situação, o autor comenta sobre a importância da ordenação e focalização das prioridades da instituição pública, identificando e hierarquizando processos, produtos e beneficiários. Em sua linha de raciocínio é enaltecida a figura do planejamento estratégico, que serve de base para o modelo de gestão por resultados. A gestão por resultados, a transparência na gestão e a inclusão de novos instrumentos gerenciais influenciaram a mudança no relacionamento entre o Governo e suas entidades, contribuindo para o atendimento dos interesses da sociedade. A tentativa de reduzir custos, aumentar a qualidade do serviço prestado ao cidadão, vindo a ocasionar a aplicação Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 35 35 16/08/2009, 11:27 Rejane Almeida Silva, Igor Vasconcelos Nogueira e Fernanda Cíntia de Souza de atributos de eficiência, também contribuiu para o redesenho da gestão pública (GARCES; SILVEIRA, 2002). A dúvida que se suscita é se esse redesenho, essa mudança, tratada como Nova Gestão Pública (New Public Management – NPM), é algo realmente novo, em que vários segmentos da sociedade buscam chegar a um consenso do que significa o paradigma da Nova Gestão Pública, que sofre variadas mutações e atua de acordo com as realidades de cada país. Apesar desse conceito ser simplista, voltado para a eficiência, a NPM atuou em reformas gerenciais na Nova Zelândia, Dinamarca e Reino Unido (ORMOND; LÖFFLER, 1999). O documento chamado Governance in Transition produzido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE (1995, p.28), divulga semelhanças entre alguns de seus países membros em termos de implantação de reformas orientadas para resultados. A utilização das práticas da Nova Gestão Pública poderá levar a uma nova experiência na gestão pública transparente, em que os Governos contam com várias ferramentas e alternativas para a tomada de decisão (SLOMSKI et. al, 2008). A Federation of Canadian Municipalities (2003, p. 1) no evento denominado, International Experience In Municipal Performance Measurement – discutiu “que a medida de desempenho está relacionada a uma cultura institucional que valoriza o planejamento, a responsabilidade e o uso de informações no gerenciamento das organizações públicas e privadas”. Quando existe um processo de planejamento que estabeleça um cronograma definindo cada um dos eventos orçamentários, e que padronize ou estabeleça uma relação entre a ação desenvolvida e o produto auferido, normalmente, encontram-se os elementos para a elaboração do: a) planejamento estratégico, cujo documento resultante é o plano plurianual; b) planejamento tático – em que o documento resultante são as diretrizes orçamentárias, e c) planejamento operacional - cujo documento resultante é o orçamento anual. No Brasil, a figura do sistema político empreendedor é relatada por Catelli e Santos (2004) como sendo aquele que trata o cidadão como cliente, atuando eficiente e eficazmente na gestão por resultados, orientado por processo de avaliação contínua e autenticado pela sociedade. Neste país, a gestão pública dispõe do instrumento de planejamento estratégico, o Plano Plurianual - PPA, que, ao definir determinados índices-objetivo, assume características do Balanced Scorecard - BSC. Outros instrumentos de planejamento utilizados na gestão pública brasileira são a Lei de Diretrizes Orçamentárias-LDO e a Lei dos Orçamentos Anuais-LOA, que em conjunto com o PPA, compõem o tripé estratégico da administração pública do País. Na sequência, tratar-se-á sobre o Balanced Scorecard – BSC. 2.2 Balanced Scorecard - BSC Neste tópico, será contemplada a lógica deste instrumento de monitoramento do desempenho e sua viabilidade na gestão pública. 36 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 36 16/08/2009, 11:27 Análise Comparativa da utilização dos Modelos da Variância e da Semivariância na determinação do Desempenho de Ativos Kaplan e Norton (2000, p.34) sustentam que este sistema proporciona um referencial de análise da estratégia empregada para a criação de valor. Para o alcance de melhora acentuada no desempenho, o BSC exige que cada unidade de negócio ou órgão da entidade, tenha uma estratégia que especifique o que deve ser feito para gerar um ótimo desempenho. A produção de resultados satisfatórios por este instrumento está relacionada à plena sintonia com os objetivos estratégicos da organização. O conjunto de perspectivas devidamente compensadas provém desse modelo, ocasionando a conceituação do BSC como um sistema equilibrado de gestão estratégica. Posteriormente ao estabelecimento das metas da Responsabilidade Financeira e da dimensão do Cliente, identificam-se os objetivos, metas e indicadores para as outras perspectivas do BSC: Processos Internos e Aprendizado e Crescimento. Essa fase visa a construir um sistema que esclareça os objetivos estratégicos e os vetores críticos que determinam esses objetivos (OLVE; ROY; WETTER, 2001). A percepção do BSC como uma ferramenta de estrutura balanceada está relacionada ao processo de elaboração dos indicadores para cada uma das quatro perspectivas. Na opinião de Campos (1998), se os quatro conjuntos de indicadores estiverem “balanceados”, ou seja, aplicados com graus de importância relativa, porém, de maneira equitativa, visando a possibilitar um desenvolvimento equilibrado, a organização estará na rota de seu sucesso. Os indicadores balanceados convertem a estratégia em um sistema integrado, que demonstra a relação de causa-efeito, definida sob as quatro perspectivas de negócio. Após a etapa do planejamento, o estabelecimento de metas e o alinhamento das iniciativas estratégicas induzem à mudança organizacional. Os gestores estabelecem metas para os objetivos do BSC com antecedência e essas metas, se forem alcançadas, transformarão a empresa. Depois das metas estabelecidas, os executivos estarão em condições de alinhar as iniciativas estratégicas, que derivam de medidas do BSC, como a redução do tempo de atendimento dos serviços e aumento da qualificação dos funcionários. Por meio de uma série de relações de causa e efeito incorporadas ao BSC, o aumento das capacidades acaba sendo, transformado em um bom desempenho orçamentário e de resultados satisfatórios. Esse processo cria mecanismos para o aprendizado organizacional. O BSC permite não só o monitoramento e o ajuste da implantação da estratégia, mas também permite efetuar mudanças que se façam necessárias (WOODS; GRUBNIC, 2008). O processo do aprendizado estratégico inicia-se com o esclarecimento da visão compartilhada que todos os envolvidos na empresa desejam alcançar. Neste processo, o uso de indicadores, ajuda na tradução de conceitos complexos e facilita o consenso entre os executivos. Optou-se neste trabalho por não tratar sobre a construção de Mapas Estratégicos. Cada indicador do BSC converte-se em parte integrante de uma cadeia lógica de causa e efeito que conecta os resultados almejados da estratégia com os vetores que induzirão a essas consequências. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 37 37 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães A implantação do BSC no setor público é salientada por Kaplan e Norton (2000), Ho e Chan (2002) e Kasperskaya (2008), entre outros pesquisadores, que consideram que as entidades governamentais devem incluir um objetivo abrangente no alto da estrutura do BSC como sendo seu propósito de longo prazo. Segundo esses autores, o objetivo escolhido deve voltar-se para o cumprimento de sua missão, o que de alguma maneira vai implicar em gerar valor ao cidadão, a um custo mínimo, promovendo o apoio e o comprometimento contínuo de sua fonte de financiamento. A criação de valor relaciona-se às especificidades dos benefícios gerados pelo órgão ao cidadão. Na opinião de Slomski (2005), o cidadão é um sócio, que muitas vezes têm dificuldades em entender o que é apresentado; ocasionando o que é considerado por esse autor como uma inegável “assimetria informacional”. Kaplan e Norton (2000) e Greatbanks e Tapp (2007), por sua vez, tratam o cidadão como cliente; tal como citado anteriormente por Catelli e Santos (2004), na definição de estratégias, pois é quem paga e recebe os serviços municipais. No objetivo da legitimação, o órgão público deve visar a satisfazer seus financiadores, os cidadãos e o Poder Legislativo. Após a definição de seus objetivos, a entidade deve definir metas para os seus processos internos e para a perspectiva do aprendizado e crescimento, com o propósito de capacitar-se, buscando o alcance dos seus objetivos nestas duas perspectivas (LANG, 2004). Percebe-se que há uma perfeita adaptação do BSC à gestão pública, principalmente em termos de desenvolvimento de estratégias que venham a atender aos anseios dos cidadãos, colaborando para o cumprimento da missão de cada ente público. Um dos grandes problemas na efetiva implantação do BSC na gestão pública está relacionado à dificuldade da definição de indicadores que monitorem claramente o desempenho da entidade (PEDRO, 2005). 2.3 Exemplos de implantação do Balanced Scorecard na Gestão Pública Originalmente, o BSC teve sua aplicação voltada para o setor privado, em que a perspectiva financeira é o foco principal, diferenciando-se da gestão pública, que prioriza o cliente cidadão. Vários pesquisadores, tais como Barkdoll (2000), Ho e Chan (2002) e Galas e Forte (2004) afirmam que esta é uma oportunidade única de comprovar a flexibilidade desse instrumento, demonstrando sua adaptação ao setor público. Kaplan e Norton (1997, p. 189) acreditam que, “no caso das empresas públicas e instituições sem fins lucrativos, o sucesso deve ser medido pelo grau de eficácia e eficiência com que essas organizações atendem às necessidades de seus participantes”. Algumas experiências internacionais são destacadas por Kaplan e Norton (2000) e Chan (2004) na implantação do BSC: a Cidade de Charlotte (EUA); o Estado de Washington (EUA) e a cidade de Calgary (CAN). A cidade de Charlotte foi a primeira cidade norte-americana a adotar o modelo do BSC. O desenvolvimento dos scorecards deu-se em 38 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 38 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) quatro unidades-piloto que passaram a integrar o BSC corporativo da cidade. Durante o período de pouco mais de um ano, as outras treze unidades de serviço estavam elaborando suas medidas de desempenho e seus BSC’s, a partir do BSC corporativo. Podem ser citadas, também as experiências européias descritas por McAdam e Walker (2003), Woods e Grubnic (2008) e Kasperskaya (2008), em cidades da Espanha e da Inglaterra, que têm sido consideradas eficazes. Com esse instrumento gerencial, a cidade de Charlotte conseguiu resultados expressivos como: a) a mais alta classificação na condução das finanças públicas; b) as taxas mais baixas de água e esgoto do sudeste dos EUA; c) redução dos impostos sobre propriedade em 10%; d) redução da taxa de homicídios em 29,8%; f) o tempo de reparo de vazamentos caiu de oito semanas para sete dias; g) revitalização do comércio em áreas que estavam degradadas; h) novo campus da Johnson & Wales University (4.000) alunos; e i) aumento de 36,7% do número de novos empreendimentos (CHARLOTTE, 2006). Além do município de Charlotte, também o Estado de Washington (USA) e a cidade de Calgary (Canadá) estabeleceram modelos BSC com algumas diferenças em relação ao modelo original (KAPLAN; NORTON, 2000; CHAN, 2004). Um dos projetos mais conhecidos de implantação do Balanced Scorecard na Gestão Pública brasileira é o da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA - vinculada ao Ministério da Agricultura. Nessa empresa, os esforços de adaptação e implantação do BSC, ocorreram em 1996, na unidade do Rio de Janeiro (ARAÚJO, 2000). Há informações, também de que a Secretaria do Estado da Fazenda de São Paulo, a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo – POLI/USP e as Prefeituras Municipais de Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), já desenvolveram seu BSC (LIMA et al., 2003). Outro exemplo a ser citado é o do Departamento Municipal de Água e Esgotos/DMAE - autarquia da Prefeitura Municipal de Porto Alegre e o da cidade de Barra do Ribeiro (ZAGO, 2006). Pode-se observar que o Balanced Scorecard, como ferramenta de monitoramento de resultados e desempenho, auxilia a gestão estratégica dos diversos órgãos de uma entidade visando ao atendimento dos objetivos e metas. Dados os exemplos apresentados, a estrutura do BSC pode ser modificada para atender às particularidades das organizações públicas, adequando-se aos focos estratégicos da organização. Antes de comentar-se sobre a pesquisa realizada na gestão pública de um município brasileiro de pequeno porte, tratarse-á sobre os aspectos metodológicos deste trabalho. 3. Aspectos Metodológicos Martins (2006, p.11) afirma que o estudo de caso, como estratégia de pesquisa, orienta na “busca de explicações e interpretações convincentes para situações que envolvam fenômenos sociais complexos, e a construção de uma teoria explicativa do caso, que Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 39 39 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães possibilite condições para se fazerem inferências analíticas sobre proposições constatadas no estudo e outros conhecimentos encontrados”. Como a aplicação do BSC na área pública é relativamente recente e ainda está em fase de estruturação e sistematização do conhecimento, optou-se em analisar apenas um caso. Entendeu-se que um estudo minucioso e aprofundado, identificando as etapas necessárias ao processo de implantação do Balanced Scorecard na gestão pública de um município brasileiro de pequeno porte seria mais adequado para atender ao objetivo deste estudo. Desta forma, um estudo de caso foi desenvolvido em uma Prefeitura no interior do Paraná A escolha do município ocorreu de maneira intencional, em função da possibilidade de acesso às informações necessárias ao desenvolvimento da pesquisa. Yin (2005, p.32) observa que para justificar a escolha de um estudo de caso único existem alguns fundamentos básicos, e este método é viável, já que esta pesquisa gera revelações de ordem científica, com pouca literatura existente sobre a implantação do Balanced Scorecard na gestão pública municipal brasileira. A coleta de dados foi iniciada no final do mês de outubro de 2005 e durou até meados de julho de 2006. Nesse período foram feitas entrevistas estruturadas com os gestores da prefeitura analisada, bem como pesquisas e análises documentais, contemplando informações contábil-gerenciais, análise do PPA e Orçamento Público, entre outros documentos disponibilizados pelos gestores públicos da prefeitura pesquisada. Como limitação da pesquisa, pode-se considerar que o estudo de caso único desenvolvido neste trabalho, apesar da profundidade do estudo, pode impossibilitar a generalização dos resultados (YIN, 2005), pois o estudo não reflete o que ocorre em todas as prefeituras do país, nem em outros órgãos da administração pública municipal, estadual ou federal, mas pode cooperar para estruturar ou sistematizar conhecimentos sobre as etapas necessárias ao processo de implantação do Balanced Scorecard na gestão pública de um município brasileiro de pequeno porte. 4. Análise da Implantação do BSC no Município de Ipiranga (PR) Neste tópico são descritas algumas informações básicas sobre o município de Ipiranga, informações gerenciais existentes, algumas características do Plano Plurianual (PPA) 2006/ 2009 do município e os procedimentos necessários à efetiva implantação do BSC. 4.1 Informações Gerenciais no Município de Ipiranga O município de Ipiranga, que foi elevado a essa categoria em 1894, está localizado na região sul do Estado do Paraná. Sua população em 2007 era de 13.993 habitantes, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2009). Com 70% da 40 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 40 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) população localizada na zona rural, o município tem em sua economia a agropecuária como o setor mais produtivo, seguido do setor de serviços e da indústria. Em 2006, a Prefeitura Municipal de Ipiranga (PR) atuou com as receitas oriundas de 34 fontes de recursos. A complexidade do processo que envolve as rotinas e os procedimentos relativos à gestão das receitas e despesas públicas, procura não obstar a supremacia da qualidade e a estabilidade das informações prestadas à sociedade, e dessa forma tornase possível a participação dos cidadãos no processo de fiscalização da arrecadação, permitindo o controle social sobre as contas das três esferas de Governos. Optou-se por não detalhar as informações das fontes das receitas, uso de recursos e geração de custos/despesas e resultados, por considerar que não fazem parte do foco deste estudo. Essas informações não explicam os benefícios criados para a população, e se caso ocorreu criação de valor, isso não é explicitado. O direcionamento dos recursos públicos auferidos para atender às necessidades da população pode ser entendido como uma das metas mais importantes na condução da gestão pública. A população vê a administração pública por meio da qualidade dos serviços que presta. Assim, para a satisfação das necessidades da população, o alcance dos objetivos traçados, controle e a busca por resultados, podem ser atingidos, aplicando os modelos concebidos pelo setor privado, de forma a exercer o monitoramento do desempenho operacional, econômico e financeiro da entidade. A partir das explicitações realizadas em termos da situação atual da prefeitura, no tópico seguinte são feitos alguns destaques do Plano Plurianual-PPA Municipal, para o quadriênio 2006/2009. O plano infere-se na figura da presença do planejamento estratégico na administração pública. 4.2 Algumas características do PPA 2006/2009 O município de Ipiranga, por meio de seu governo, dispõe como instrumento de divulgação do seu planejamento o Plano Plurianual-PPA. O plano em questão estende-se para o quadriênio 2006/2009, além de atender ao disposto do Artigo 165, da Constituição Federal, o plano estabelece para o período, os programas com seus respectivos objetivos, indicadores e montantes de recursos a serem aplicados em despesa de capital e outras delas decorrentes e nas despesas de duração continuada. Apesar de o PPA 2006/2009 adotar status de planejamento estratégico, não transcende à forma sistematizada dos seus sistemas de estratégias, ou seja, as estratégias adotadas não são claras, tal como é destacado no Balanced Scorecard. A elaboração de um BSC Corporativo (alinhado aos objetivos da organização em questão), caracterizaria um elemento do fomento ao êxito do planejamento. O PPA 2006/2009 prevê durante a sua vigência a possibilidade de realizar-se a avaliação, permitindo a exclusão, alteração de programas, a inclusão de novos e as alterações das ações e metas, sempre orientadas para o alcance dos melhores resultados para a gestão. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 41 41 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães O controle de resultado está relacionado à constante busca pelas organizações. O BSC, devido a sua capacidade de colocar-se como um processo gerencial preparado para estimular uma gama de informações ao gestor, devido a sua capacidade de alinhar a estratégia a indicadores de desempenho, habilita-se como ferramenta primorosa na busca por bons resultados e pelo sucesso da gestão pública. As especificações dos elementos que fazem parte do PPA municipal quanto ä sua avaliação; o Departamento de Administração e Planejamento, juntamente com o Departamento de Finanças, são responsáveis pelo controle e monitoramento do desempenho da prefeitura, mas não contam com ferramentas para a realização de tal tarefa, prejudicando a análise da eficiência e eficácia e a criação de valor; o que pode levar a administração a incorrer no não acompanhamento dos rumos tomados pela decisão do gestor; e levados pela simplicidade, resumindo sua atuação no cumprimento das formalidades legais. Percebeu-se neste instante, a necessidade de monitoramento do desempenho, que pode ser suprida com a implantação do Balanced Scorecard na gestão deste município. 4.3 Etapas para a implantação do BSC em Ipiranga (PR) Inicialmente, a implantação do Balanced Scorecard estava alicerçada no desejo comum de todos os gestores (Prefeitos, Chefes de Divisão, Assessores etc.) em atuar orientados para a estratégia da organização. Kaplan e Norton (2000), apontam para a dificuldade que as organizações governamentais e sem fins lucrativos têm em definir suas estratégias; mencionando que, por meio de documentos, apenas relacionam uma lista de programas e metas sem definir os resultados a serem alcançados e a forma de serem mensurados. Normalmente, estas organizações visam à eficiência, atuando na redução de custos, incorrendo em menos falhas e atuando com mais rapidez. O que representa que estas estão preocupadas somente com a melhoria dos processos internos. Então, indaga-se: com essa forma de atuação as instituições estão realizando sua missão, que é a satisfação do bem-estar dos cidadãos? Na estrutura do BSC do setor público, o cliente (cidadão) sobe ao topo da estrutura, que deixa de ser a perspectiva financeira; ou seja, é necessário que sejam adotadas estratégias baseadas nos cidadãos. Na ordenação do PPA 2006/2009 do município de Ipiranga ao modelo Balanced Scorecard, essa é condição imprescindível na organização de tal modelo, de modo a garantir a sustentabilidade do bem-estar de seus cidadãos. Uma das proposições à adaptação ao modelo BSC, desenhou-se na adoção de uma estratégia baseada no cidadão Ipiranguense, e este é requisito de primeira importância no processo. Analisada a situação geral do município, foram organizados e selecionados, com base no sistema educacional, dados sobre sua infra-estrutura, aspectos econômicos e sociais, aspectos internos de gerenciamento e perfil epidemiológico, identificando-se um conjunto de objetivos para um período de quatro anos que foram organizados em quatro focos de atuação. 42 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 42 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) O primeiro foco de atuação denomina-se “Desenvolvimento da comunidade”, e surgiu da preocupação do governo municipal em elevar o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH de seus cidadãos. Segundo dados do Censo de 2000 do IBGR, o IDH do município concentra nos itens: Renda (0,627); Longevidade (0,748) e Educação (0,809). No ranking Brasil, o município ocupa a posição 2.474 em um conjunto de 5.535 municípios; no ranking do Estado do Paraná, sua posição é a de número 246 de 399 municípios (PNUD, 2009). O Governo Municipal acredita que a evolução deste índice irá representar sensível melhora na qualidade de vida dos cidadãos Ipiranguenses. O segundo foco selecionado “Governo Eficiente e Eficaz”, além de atender aos objetivos referenciados por Kaplan e Norton (2000), procura melhorar o processo de arrecadação de impostos municipais, buscar novas fontes de financiamento para investimentos, reduzir custos e ampliar a efetividade das ações. O terceiro foco estratégico, “Desenvolvimento Econômico e Social”, reflete a idéia do governo municipal com as questões econômicas e sociais. Maiores investimentos na capacitação profissional e na promoção do cidadão são pontos importantes no plano de ação do governo. Uma das alternativas para a geração de emprego e renda implica, na ótica do gestor, na diversificação da agropecuária e melhoria da malha viária do município, que é ponto crucial no processo de escoamento e transportes em geral. O impacto deste foco atingirá os setores de Educação, equacionando a evasão escolar, e com a criação de novos ambientes de aprendizagem, ofertando à comunidade melhor e maior estrutura educacional. No aspecto da Saúde e Assistência social, as questões prioritárias são a redução da mortalidade infantil e a prevenção de patologias. Quadro 1: Focos Estratégicos do Município de Ipiranga (PR) Focos Estratégicos Objetivo Desenvolvimento da Comunidade Desenvolvimento de ações para melhorar a qualidade ambiental, garantir condições necessárias para a evolução do IDH, satisfazendo às necessidades da população. Governo Eficiente e Eficaz Melhoria do processo de arrecadação, com desenvolvimento de novas formas de financiamento e otimização das atuais e redução de custos. Desenvolvimento Econômico e Social Promoção do crescimento da economia do município de modo sustentável, gerando aos seus habitantes mais empregos, avançando na prestação de serviços de saúde e educação e melhorando a qualidade de vida aos seus cidadãos. Desenvolvimento dos Servidores Públicos Planejamento de uma ampla reforma, de modo a avaliar habilidades, conscientizar e capacitar o servidor, garantindo qualidade na prestação de serviços à comunidade. Fonte: Dados da pesquisa (2006) Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 43 43 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães Por fim, no quarto foco estratégico, a preocupação em qualificar a prestação de serviços aos cidadãos consolida-se com o “Desenvolvimento dos Servidores Públicos”. O sucesso dos cidadãos e a realização da missão dentro dos limites financeiros são influenciados por funcionários motivados com competências adequadas, devidamente capacitados para propiciar maior qualidade e produtividade nos serviços prestados. O Quadro 1 evidencia os focos estratégicos selecionados pelo Governo municipal, tendo como base o PPA municipal 2006/2009. A partir da definição dos focos estratégicos, a implantação destes, com eficácia, implica em sua tradução nos objetivos estratégicos, associados aos programas desenvolvidos pela gestão pública municipal e, posterior definição dos indicadores para cada um dos referidos objetivos, em cada uma das quatro perspectivas do BSC do município. Não foi discutida a pertinência dos indicadores definidos, pois este não é o foco deste estudo. Na Perspectiva do Cliente (cidadão), os objetivos, programas e indicadores definidos são evidenciados no Quadro 2. Quadro 2: Objetivos corporativos - Perspectiva do Cliente (Cidadão) PERSPECTIVA DO CLIENTE (CIDADÃO) Objetivos Programas Relacionados Indicadores 1) Satisfação com os serviços públicos prestados Apoio Administrativo Alcançar a taxa de "excelente" ou "bom" na prestação dos serviços públicos de, no mínimo, 75% dos cidadãos 2) Oportunidade e responsabilidade solidária Ipiranga Oportunidade % da população atendida 3) Priorização da infra-estrutura urbana Plano Comunitário Municipal de Obras e Melhoramentos % da população atendida 4) Preservação e Conservação Ambiental Desenvolvimento de Ações de Controle Ambiental % da mata ciliar conservada 5) Referência de qualidade de vida Conviver Taxa de crianças atendidas 6) Promoção do cidadão Ação Social Taxa de pessoas assistidas em relação as necessitadas 7) Estilo de vida saudável Viva Saudável % da população assistida 8) Investimentos na melhoria malha viária municipal Conservação e Manutenção Viária Caminhos da Produção Taxa de estradas conserva-das, em relação à malha viária de estradas vicinais 9) Promoção social, inserção na sociedade e consolidar a cidadania Promoção do Esporte de Rendimento, Comunitário e Lazer Taxa de praticantes em relação à população do município Fonte: Dados da pesquisa (2006) 44 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 44 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) A perspectiva do Cliente (cidadão) posiciona-se no topo da estrutura do BSC da gestão pública, já que atender às necessidades do cidadão é o foco da referida gestão. Foram estabelecidos nove objetivos, extraídos do PPA 2006/2009. Estes objetivos estão relacionados com os programas desenvolvidos pelo Governo Municipal. Os objetivos representam os principais serviços que o município presta, visando a proporcionar melhores condições de vida aos cidadãos. Para a perspectiva da Responsabilidade Financeira foram estabelecidos dois objetivos que colaboram para que sejam atingidos os objetivos para os cidadãos, evidenciados no Quadro 3. Quadro 3: Objetivos corporativos - Perspectiva de Responsabilidade Financeira RESPONSABILIDADE FINANCEIRA Objetivos Programas Relacionados Indicador 1) Gestão eficiente/eficaz dos recursos Apoio Administrativo Controle de custos, % do orçado versus realizado 2) Geração de novas fontes de financiamento Apoio Administrativo % dos recursos externos ao município para investimentos Fonte: Dados da pesquisa (2006) Deve-se atuar gerindo os recursos públicos de forma eficiente e eficaz, ampliando sua arrecadação, reduzindo seus custos e despesas e buscando gerar novas fontes de financiamento. A perspectiva dos processos internos, por sua vez, contemplou doze objetivos (ver Quadro 4). Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 45 45 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães Quadro 4: Objetivos corporativos - Perspectiva de Processos Internos PROCESSOS INTERNOS Objetivos Programas Relacionados Indicador 1) Desenvolvimento de políticas públicas Gestão de Políticas Públicas % de Planos executados 2) Planejamento urbano, controle, Ações e Planejamento fiscalização da ocupação e uso do solo e de Gestão Urbana % de domicílios atendidos pelos serviços. 3) Promover a urbanização Nosso Bairro % de domicílios atendidos 4) Gestão de resíduos sólidos e a proteção de recursos hídricos Nosso Ambiente % de domicílios atendidos 5) Promover o acesso às condições de cidadania Assistência à Infância e Adolescência Taxa de menor e adolescente assistido em relação ao percentual necessitado 6) Controle e prevenção de patologias Prevenção de Doenças Expectativa de vida. Taxa de mortalidade infantil 7) Assistência a saúde da população da melhor idade Atendimento Geral de Saúde % da população beneficiada/atendida 8) Garantir a operacionalização da rede municipal de ensino Ensino Fundamental Taxa de evasão escolar. Taxa de repetência escolar. % de crianças na faixa etária de 07 a 14 anos fora da escola 9) Desenvolvimento das crianças de até 06 anos de idade Educação Infantil Taxa de crianças de até 06 anos atendidas 10) Criar novos ambientes reais e virtuais de aprendizagem Programa Ipiranga Sabe Tudo % da população atendida 11) Apoio à atividades artísticas-culturais Programa de Difusão e Incentivo à Cultura Número de ações executadas 12) Melhoria do padrão nutricional e diversificação da produção Programa de Agricultura, Abastecimento e Pecuária % de produtores rurais atendidos Fonte: Dados da pesquisa (2006) Estes processos internos determinam o funcionamento da organização e caminham para a satisfação dos clientes (cidadãos). Os objetivos estratégicos dos processos internos levam o município a identificar quais os processos direcionam valor para o cidadão, permitindo identificar oportunidades de melhorias na prestação dos diversos serviços públicos, e suportando o desenvolvimento de políticas públicas que atendam à real necessidade da população. Quadro 5: Objetivos corporativos - Perspectiva de Aprendizagem e Crescimento APRENDIZAGEM E CRESCIMENTO Objetivo Programa relacionado Indicador Oportunizar o desenvolvimento e o aperfeiçoamento dos servidores municipais Desenvolvimento de Recursos Humanos Taxa de servidores assistidos Fonte: Dados da pesquisa (2006) 46 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 46 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) A aprendizagem e crescimento dos servidores oferece as bases para que as outras perspectivas do BSC tenham êxito. A perspectiva da aprendizagem e crescimento compreende um objetivo que busca oportunizar o desenvolvimento e o aperfeiçoamento dos servidores municipais, promover treinamentos e desenvolver habilidades que assegurarem a melhoria contínua na prestação de serviços (ver Quadro 5). A definição da estratégia para realizar a missão e a visão da organização, os objetivos de alto nível, focos estratégicos e os objetivos estratégicos, juntamente com seus indicadores, são elementos que tendem a nortear, no caso deste trabalho, a ordenação do atual instrumento de Planejamento PPA 2006/2009, para um modelo de gestão para monitoramento do desempenho da gestão pública, o Balanced Scorecard. A avaliação do Plano Plurianual-PPA constitui-se um processo ininterrupto pela administração pública e dos seus resultados provém o atendimento ou não das necessidades da população. Essa etapa do ciclo da gestão governamental visa a melhorar o desempenho dos programas de governo, além de prestar contas à população. Buscou-se com este estudo de caso, identificar as etapas a serem adotadas no processo de implantação do BSC na gestão de um município brasileiro de pequeno porte, que são: a) delinear os focos estratégicos da gestão municipal: isto foi feito a partir dos programas do Governo Municipal para o quadriênio 2006/2009; b) identificar os objetivos estratégicos e enquadrá-los nas perspectivas do BSC, e c) definir os indicadores para monitoramento do desempenho governamental em cada um dos objetivos estratégicos identificados. O aparato legal disponível para qualquer município brasileiro (Lei de Diretrizes Orçamentárias-LDO, Lei dos Orçamentos Anuais-LOA e o Plano Pluri-Anual-PPA) permite a obtenção de uma visão bastante adequada para a implantação do BSC. Adicionalmente, os programas de Governo dos ocupantes dos cargos da esfera executiva municipal constituirão material importante para a confirmação final do modelo. 5. Conclusões e Recomendações O monitoramento do desempenho no processo de gestão pública atua desde o planejamento dos programas de governo até a execução e o controle com base nos instrumentos legais, assegurando a avaliação, de forma clara e objetiva, pela população, das ações da gestão pública municipal. A população deseja que seus interesses sejam atendidos, e, para tanto, precisa saber onde e como foram gastos os recursos oriundos de suas contribuições. A pesquisa bibliográfica sobre Gestão Pública reflete a mudança de comportamento dos gestores públicos em nível mundial, buscando focalizar sua gestão na apuração de resultados. Devido à carência de medidas para a avaliação governamental, o monitoramento do desempenho por meio do Balanced Scorecard contribui para que seja superada a desarmonia existente na avaliação da eficiência e eficácia da atividade governamental. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 47 47 16/08/2009, 11:27 Ana Cristina de Faria, Francisco Carlos Fernandes e Valdinei Machado Guimarães O estudo de caso desenvolvido demonstrou que há boas condições para a implantação do modelo BSC na gestão pública municipal. Os instrumentos legais brasileiros continuam exercendo o seu papel informativo e de prestação de contas, e podem contribuir positivamente para o processo de desenvolvimento de novos padrões de avaliação de desempenho da gestão, uma vez que são orientados pela finalidade de viabilizar a transparência da gestão. Constatou-se que o BSC tem bom potencial para contribuir para o fortalecimento da Gestão Pública no ambiente municipal, produzindo um rol de informações que visam a auxiliar a tomada de decisão e que priorizem a gestão eficiente e eficaz dos recursos. O desenvolvimento de um sistema de monitoramento de desempenho BSC para uma gestão pública voltada para os resultados, e sua adoção como instrumento gerencial são revestidos de caráter positivo, já que favorecem a abordagem da Nova Gestão Pública, como criadora e agregadora de valor ao cidadão e à comunidade em geral. No intuito de responder à questão de pesquisa proposta na Introdução deste trabalho, buscou-se com o estudo de caso desenvolvido, identificar as etapas a serem adotadas no processo de implantação do BSC na gestão de um município brasileiro de pequeno porte. O objetivo foi atendido e as etapas identificadas foram: a) delinear os focos estratégicos da gestão municipal: sendo que isto foi feito a partir dos programas do Governo Municipal para o quadriênio 2006/2009; b) identificar os objetivos estratégicos e enquadrálos nas quatro perspectivas do BSC; e c) definir os indicadores para monitoramento do desempenho governamental em cada um dos objetivos estratégicos identificados. A contribuição do presente estudo está na apresentação de um caso desenvolvido na prefeitura de um município brasileiro de pequeno porte; sem levar em consideração se as etapas identificadas foram ou não adequadas para outras situações distintas das verificadas no exame. Acredita-se que a lógica de implantação do BSC seja semelhante em empresas privadas ou na gestão pública. O uso do Balanced Scorecard facilita a elaboração do modelo de monitoramento de desempenho, o qual deve ser construído de forma racional, em termos econômicos e sociais, sempre orientado pela característica do ambiente da gestão pública que é voltada ao atendimento das carências da sociedade. O monitoramento do desempenho por meio da utilização de indicadores financeiros e não-financeiros, auxilia no controle do uso dos recursos, e torna mais fácil a tomada de decisão dos gestores públicos. Finalmente, a aplicação do BSC na gestão pública acena para a melhoria da visão organizacional, preocupada com os aspectos relacionados, além dos clientes (cidadãos), aos recursos financeiros, aos processos internos e à capacidade de aprendizado e crescimento dos funcionários públicos. Uma questão que merece destaque e motiva outras pesquisas é a apuração das mudanças no comportamento dos gestores a partir da utilização do BSC na gestão pública brasileira, bem como a investigação dos elementos conceituais existentes neste instrumento, de modo a orientar a elaboração, avaliação e o controle do Plano Plurianual, da Lei 48 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 48 16/08/2009, 11:27 As Etapas de Implantação do Balanced Scorecard (BSC) na Gestão Pública de Município Brasileiro de Pequeno Porte: o Caso de Ipiranga (PR) de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual. Outra recomendação para pesquisa é a discussão da pertinência dos indicadores selecionados para a gestão pública municipal e a aplicabilidade destes em outros municípios. O tema pesquisado é desafiador, os instrumentos pesquisados são recentes na gestão pública e o desenvolvimento de ferramentas desse novo modelo de gestão pública favorecem o processo de investigação científica, demonstrando um vasto campo na pesquisa. Espera-se que com esta iniciativa, outras pesquisas em entidades públicas sejam desenvolvidas para atender às particularidades e complexidades desse segmento. 6. Referências ARAÚJO, M. Resultados do Projeto de Modelo de Gestão Estratégica da Embrapa, Baseado no Método Balanced Scorecard. Anais... IN: V Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública. Santo Domingo, República Dominicana, 24-27 Oct. 2000. BARKDOLL, J. Balanced Scorecards in the Federal Government. Public Manager. v. 29, n. 3, 2000. CAMPOS, J. A. Cenário Balanceado: painel de indicadores para a gestão estratégica dos negócios. São Paulo: Aquariana, 1998. CATELLI, A.; SANTOS, E. S. Mensurando a Criação de Valor na Gestão Pública. 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Ana Cristina de Faria Professora e Pesquisadora do Programa de Mestrado em Administração da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (IMES/USCS) Coordenadora dos MBA’s em Controladoria e Contabilidade Estratégica e Gestão Tributária na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (IMES/USCS) Professora Responsável pelos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu em Gestão Integrada da Logística e Empreendedorismo e Gestão de Pequenos Negócios na Universidade São Judas Tadeu Doutora e Mestre em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP [email protected] Francisco Carlos Fernandes Professor do Programa de Doutorado em Ciências Contábeis e Administração – PDCCA/FURB Professor do Programa de Mestrado em Ciências Contábeis – PPGCC/FURB Doutor e Mestre em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP Valdinei Machado Guimarães (In memorian) Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 51 51 16/08/2009, 11:27 arte_angrad.pmd 52 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Strategic Management Tools and their application to Micro and Small Entrepreneurs André Rosenfeld Rosas [email protected] Felipe Mendes Borini Edison Fernandes Polo Antonio Carlos Aidar Sauaia FEA/USP Resumo O presente artigo discute a compreensão e utilização das ferramentas de gestão estratégica na prática administrativa de micro e pequenos empreendedores. Eles as evitam por desconhecê-las ou por descrerem de sua utilidade? Haveria mudança na ordem de preferência, caso elas fossem previamente conhecidas? Os resultados, a partir de entrevista com empreendedores de base tecnológica, mostram primeiro que parece existir desconhecimento das ferramentas, o que acaba refutando a premissa dos estudos quantitativos de que os empreendedores as conhecem. Este fato que pode justificar a baixa utilização e alta demanda dessas ferramentas pelos entrevistados. Depois, quando estes são instruídos sobre o funcionamento das ferramentas, ocorre uma mudança na sua ordem de preferência. Isso mostra que a ideologia dominante no discurso acadêmico e nas grandes empresas nem sempre influencia positivamente os micro e pequenos empreendedores, visto terem eles pouco conhecimento das ferramentas do campo da estratégia formal. Abstract This article discusses the understanding and use of strategic management tools in the administrative practice of micro and small entrepreneurs. Do they avoid using tools because Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 53 53 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia they do not know them or because of disbelieve of their utility? Would there be a change in the order of preference for tolls if they were previously presented to the administrators? The results, through interviews with micro and small, technology-based, entrepreneurs, show that they do not know the tools, which may justify the high demand and low use of these tools by the interviewees. When they are taught about the tools, there is a change in the order of preference.This shows that the dominant ideology in academic discourse and in large companies do not positively influence the entrepreneurs, because of their ignorance on the use of formal strategy tools. 1. Introdução Tomando-se como base que: os negócios familiares, ao serem criados, tendem a se caracterizar como micro ou pequenas empresas (MPEs); que estas representam 99% da população de empresas formais no setor privado urbano brasileiro; geram 57% do número total de empregos (SEBRAE, 2005); e que a taxa de mortalidade chega a 60% em 4 anos (SEBRAE, 2004), o estudo da estratégia em empreendedorismo apresenta-se como um tema oportuno e altamente relevante para a condução de uma investigação. Há duas formas básicas de tratar a estratégia sob a perspectiva do empreendedorismo: a prescritiva e a descritiva. Na primeira, são prescritos modelos processuais de planejamento estratégico para MPEs (ALMEIDA, 2001), enquanto, na segunda, mapeia-se a utilização de ferramentas estratégicas por pequenas empresas e por empreendedores independentes (FROST, 2003; WOODS; JOYCE, 2003). Quanto à perspectiva descritiva, adotada neste estudo, cabe tecer alguns comentários. Se por um lado, no mapeamento das ferramentas utilizadas por empreendedores, as pesquisas quantitativas contribuem positivamente para o avanço da área, por permitirem investigar um grande número de empresas, testar hipóteses e avaliar a evolução do uso de ferramentas no tempo, por outro lado, outros aspectos têm-se mostrado de difícil verificação, exigindo definições de premissas que podem introduzir vieses de interpretação. A terminologia corporativa, em especial na área de estratégia, pode não ser comum aos empreendedores entrevistados e, portanto, induzir erros de respostas, prejudicando a correta captura da intensidade de utilização das ferramentas. Por exemplo, o microempresário empreendedor pode executar uma análise de oportunidades e ameaças, pontos fortes e fracos, mesmo sem denominá-la análise SWOT (LEARNED et al., 1965), ou pode realizála sem compreender seu propósito. Então, por não utilizar a terminologia e perpetuar o simbolismo das ferramentas estratégicas, nem usá-las ao modo padrão institucionalizado no campo, o micro ou o pequeno empreendedor não seria considerado um bom estrategista, ou, o contrário, seria um bom estrategista por adaptar os conceitos às contingências. Pesquisas quantitativas e de 54 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 54 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores resposta direta, do tipo “emprega aquela ou outra ferramenta”, levam muitas vezes aos vieses disseminados na sociedade: quem tem estratégia é grande empresa, pequena empresa sobrevive. Como se sobreviver já não fosse estratégia (MINTZBERG et al., 2000). Contra esse pensamento, dominado pelo simbolismo das ferramentas institucionalizadas no campo organizacional, o presente artigo discute a compreensão e utilização das ferramentas estratégicas na prática administrativa dos micro e pequenos empreendedores. Eles evitam determinadas ferramentas por desconhecimento ou por descrerem de sua utilidade? Haveria mudança na ordem de preferência caso as ferramentas fossem conhecidas previamente à investigação, ou seja, se fossem antes apresentadas pelo entrevistador? Revendo 17 pesquisas com MPEs, Gibcus e Kemp (2003) sugerem a existência de uma relação entre estratégia adotada e desempenho, em que o uso das ferramentas pertinentes pode melhorar a identificação, seleção e implantação de estratégias. Não foram identificadas estratégias predominantes ao se compararem as pesquisas. Neste estudo, entendeu-se não haver uma relação predeterminada entre desempenho e uma estratégia específica, mas a capacidade de o gestor adotar o melhor caminho, diante das circunstâncias envolvidas. O foco deste estudo não está em todas as MPEs, visto que nem todo micro e pequeno empresário é um empreendedor. O empreendedor é o agente econômico que identifica e persegue oportunidades (KIRZNER, 1979) por meio de inovações (SCHUMPETER, 1934), tendo que atuar em um ambiente com altos riscos e incertezas (KNIGHT, 1921). Embora o interesse recente no tema tenha surgido num contexto de recessão econômica, o empreendedorismo tratado em escolas internacionais de administração tem como força motriz a busca de oportunidades de negócios com alto potencial de crescimento e lucros (TIMMONS e SPINELLI, 2006). Desse modo, o foco escolhido foram empreendedores, gestores de empresas de base tecnológica. Cabe distinguir o empreendedorismo tradicional (GARTNER, 1988) do empreendedorismo corporativo (PINCHOT, 1985). O primeiro, focalizado neste estudo, centra-se na criação de novas organizações para perseguir oportunidades, enquanto o segundo discute o lançamento de novos produtos no mercado, advindos de projetos internos de uma corporação consolidada. Essa distinção é relevante porque negócios independentes geralmente apresentam maior fragilidade e menor disponibilidade de recursos, havendo menos margens para erros na adoção de estratégias. Os empreendedores independentes são os responsáveis pelo processo estratégico das organizações que gerenciam e, por não possuírem uma equipe de especialistas na empresa para fornecer-lhes suporte para tais decisões, passam a necessitar com mais intensidade de ferramentas de apoio à gestão. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 55 55 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia Figura 1: Ciclo de vida das organizações e escopo da pesquisa (sombreado) Fonte: Adaptada de Hanks e Chandler (1995). Outro aspecto que delimita o estudo é o conceito de ciclo de vida das organizações, conforme mostrado na Figura 1. Hanks e Chandler (1995) revisaram diversas pesquisas sobre o tema e concluíram que três estágios são comuns a todas elas: criação, crescimento e maturidade. Este estudo centra-se em empresas no estágio de criação, que já iniciaram a comercialização do produto ou serviço e necessitam da formulação de estratégias para direcionar o estágio de crescimento. 2. Referencial Teórico O planejamento estratégico, cuja aparição histórica na literatura data da década de 50, consiste da formulação da estratégia pela equipe de gestão. Com as rápidas mudanças ambientais ocorridas ao final da década de 70, especialmente tecnológicas e sócio-políticas, e com o surgimento da abordagem de gestão de mudanças descontínuas que considerou a necessidade de sobrepujar a resistência à implantação das estratégias, o conceito inicial foi expandido para administração estratégica. Passou a tratar-se, portanto, de um processo sistemático de gestão de mudanças, que envolve posicionamento da empresa, por meio do planejamento estratégico e de recursos, reação estratégica em tempo real e gestão sistemática de resistência à implantação estratégica (ANSOFF, 1984). 56 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 56 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Quadro 1: Ferramentas de administração estratégica1 na literatura2 Seleção de oportunidades Swot (Learned et al., 1965) Opportunity Screening (Timmons et al., 2006) 5 Forças (Porter, 1985) BCG (Henderson, 1979) Matriz GE-McKinsey Matriz da carteira de negócios (Hofer e Schendel, 1978) Matriz de política direcional da Shell (Robinson et al., 1978) Ciclo de Vida do Produto (Levitt, 1965) Capacidades Dinâmicas (Teece et al., 1997) Capacidades Distintivas (Kay, 1993) Competências Essenciais (Hamel e Prahalad, 1990) Arquitetura de Competência (Mills et al., 2003) Capability Maturity Model (Persee, 2001) Propensão a risco e utilidade esperada (Von Neumann e Morgenstern, 1947) Fatores Limitantes: disponibilidade de capital, recursos físicos e pessoas (Learned et al., 1965) Definição de Missão Formulação Implantação Controle Cenários (Wack, 1985) Matriz Produto-Mercado (Ansoff, 1977) Vantagem Competitiva (Porter, 1985) PIMS Profit Impact of Marketing Strategies (Weitz e Wensley, 1984) Modelo Lorange e Vencil (1976) Matriz Booz Allen (Galioto et al., 2006) Modelo de Abell (1980) Matriz de Posicionamento (Levy 1986) ADL Perfil de Negócio (Arthur D. Little Consulting) Estratégias Genéricas (Porter, 1985) Disciplinas de Valor (Treacy e Wiersema, 1995) Delta Model (Hax e Wilde II, 1999) Estratégias Cooperativas (Brandenburger e Nalebuff, 1996) Estratégias Funcionais Táticas competitivas (geografia e timing) Modelo GUT (Gravidades Urgência e Tendência) (Kepner e Tregoe, 1978) QI estratégico (Tregoe e Zimmerman, 1988) Cinco pontos da implantação (Hobbs e Heanny, 1977) Administração por Objetivos (Drucker, 1954) Plano de ações McKinsey 7S (Peters e Waterman, 1982) Seis Sigma Captação de Recursos Estrutura e Configuração Organizacional (Mintzberg, 1980) Comunicação (missão / visão / objetivos) Orçamentos Indicadores Financeiros Benchmarking Gestão pela Qualidade (Juran, 1988) BSC (Kaplan et al., 1996) Programas de Incentivos e Recompensas A separação mais tênue entre oportunidade e formulação e entre implantação e controle está indicada por linhas pontilhadas As ferramentas sem menção não possuem uma referência central, para tais considerar Wheelen e Hunger (1998). 1 2 Modelo em quatro etapas proposto pelos autores. Geralmente focada em grandes empresas. Fonte: Organizado pelos autores. O modelo de Wheelen e Hunger (1998), composto por rastreamento do ambiente, formulação, implantação, avaliação e controle da estratégia, é fonte de referência para a classificação das ferramentas estratégicas amplamente disseminadas na literatura em quatro etapas (ver Quadro 1). Alterou-se aqui a substituição de rastreamento do ambiente por um termo mais bem ajustado ao empreendedorismo: a seleção de oportunidades. Algumas pesquisas de campo que identificaram as ferramentas estratégicas utilizadas por empreendedores ou por pequenas empresas foram levantadas na literatura internacional. Em seguida, tais resultados foram categorizados conforme o modelo de quatro etapas. As etapas de implantação e controle foram agrupadas, visto que não foram tratadas separada- Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 57 57 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia mente em nenhuma das pesquisas quantitativas. Pelham e Clayson (1988) estudaram 156 empresas norte-americanas de manufatura cujos setores não foram especificados, possuindo entre 50 e 300 funcionários.As ferramentas avaliadas pelos pesquisados como as mais importantes foram: análise Swot e missão e objetivos de longo prazo na determinação de oportunidades; análises de investimento (ROI, breakeven e DCF) e análise da indústria e competidores para a fase de formulação; e índices financeiros na fase de implantação e controle. Quadro 2: Ferramentas de gestão mais utilizadas na Inglaterra Seleção de oportunidades Formulação Implantação/Controle - SWOT - Competências essenciais - Análise dos recursos humanos - Análises financeiras - Análise dos competidores - Benchmarking Fonte: Stonehouse e Pemberton (2002). Decorridos quase quinze anos, Stonehouse e Pemberton (2002) pesquisaram 150 empresas inglesas (93 de serviços e 57 de manufatura), algumas das quais com mais de 200 empregados, sendo 60% com menos que 50. Os resultados estão apresentados no Quadro 2. Quadro 3: Ferramentas mais utilizadas em diversos países Seleção de oportunidades Formulação Implantação/Controle SWOT - Cenários - Análise dos clientes (focus group e pesquisa de satisfação) - Fatores críticos de sucesso - Análise custo x benefício - Definição de objetivos (focus group) - Orçamentos - Índices financeiros - Benchmarking Fonte: Frost (2003). Frost (2003) investigou 331 empresas de produção e montagem de diversos setores em quatro países (Austrália, Cingapura, Malásia e Hong Kong), com um total de 20 a 100 funcionários; as ferramentas mais utilizadas estão apresentadas no Quadro 3. 58 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 58 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Quadro 4: Ferramentas mais utilizadas em empresas inglesas Seleção de oportunidades Formulação - SWOT - Competências essenciais - Análise de recursos - Análise dos concorrentes - Cenários - Análise de risco - Estratégia do oceano azul Implantação/Controle -- Fonte: Woods e Joyce (2003). O último estudo quantitativo selecionado foi o de Woods e Joyce (2003). Apesar de a amostra conter 513 pequenas e médias empresas de Londres, o número de respostas dos sócios-gerentes entrevistados variou em cada ferramenta, pois havia alternativas desconhecidas ou não aplicáveis. O resumo de utilização das ferramentas elaborado pelos autores estudou empresas com um total de um a cinco funcionários, conforme o Quadro 4. 3. Método de pesquisa e coleta de dados Conforme discutido na Introdução, devido à terminologia e institucionalização dos termos do campo de atuação, existem aspectos que os estudos quantitativos têm dificuldade em levantar. Visando a complementá-los e a reunir evidências que levassem em consideração a compreensão e o uso das ferramentas, os empreendedores pesquisados foram questionados inicialmente em pergunta aberta sobre o uso de ferramentas. Em seguida, foram apresentadas as oito ferramentas envolvidas neste estudo (ver Quadro 5) para avaliação pelos empreendedores pesquisados. Foram entrevistados cinco empreendedores brasileiros que atuam em setores de alta tecnologia, lidando com mercados complexos que requerem monitoramento ambiental, planejamento de ações estratégicas e análise das incertezas. A amostra foi selecionada dentre as 120 empresas incubadas no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), da Universidade de São Paulo, dentre as quais 31, por já possuírem o produto desenvolvido, eram potenciais fontes de dados para este estudo. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 59 59 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia Quadro 5: Base para a pesquisa de campo Etapas da administração estratégica Ferramentas avaliadas pelos empreendedores Seleção de oportunidades Oportunidades de mercado Vocação, competências e forças da empresa Formulação da estratégia Principais figurantes Cenários Implantação da estratégia Plano de ações Captação de recursos e definição de responsabilidades Controle da estratégia Indicadores, metas e realizado Recompensas para resultados positivos Fonte: Os autores. Dois grupos de dados foram levantados com os empreendedores, sócios das empresas, em entrevistas semi estruturadas, com duração de aproximadamente uma hora. Durante os 10 minutos iniciais, além da apresentação do objetivo da pesquisa, foram identificadas as ferramentas utilizadas pelas empresas em uma pergunta aberta, verificando-se não somente se as empresas afirmam usá-las, mas também como e o porquê. Em seguida, usando-se em média cinco minutos para cada uma, foram apresentadas oito ferramentas estratégicas, duas para cada etapa do modelo de administração adotado neste estudo (seleção de oportunidades, formulação, implantação e controle). Todas as ferramentas híbridas baseadas na literatura de estratégia foram sintetizadas em termos dos resultados das pesquisas apresentadas. Apesar de comporem um modelo integrado, cada ferramenta foi tratada de modo independente, havendo inclusive pequenas sobreposições. Isso permitia que o respondente empreendedor escolhesse aquelas que melhor apoiassem suas decisões estratégicas, possibilitando a exclusão de algumas delas do modelo final. Pediu-se a cada administrador que exprimisse sua avaliação da utilidade da ferramenta usando uma escala do tipo Likert de 10 pontos. O Quadro 6 descreve as características das empresas consultadas, as quais se encontravam todas no início da comercialização, sinalizando a fase de crescimento (Figura 1). Dentre as características distintivas e importantes, notam-se: forte dependência do principal cliente (empresas 1 e 2), dependência de um único sócio (empresa 4), dependência exclusiva de capital próprio (empresas 3 e 4) e inexistência de concorrente direto (empresas 1, 4 e 5). 60 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 60 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Quadro 6: Caracterização da amostra pesquisada Empresa 1 Empresa 2 Educacional com softwares Energia (células combustíveis) Data de criação Outubro 2004 2000 Setembro 2002 Outubro 1999 Julho 2005 Início da comercialização Maio 2005 Não disponível Setembro 2004 Abril 2000 Novembro 2006 Número de clientes 110 6 regulares (150 potenciais) 8 400 (em todo o histórico) 8 Porte dos principais clientes Médio/Grande Variado (institutos de pesquisa) Grande Pequeno (médico) Médio/Grande Porte da empresa* Pequena Pequena Pequena Micro Micro 90% 80% 50% Mínima 20% Porte dos concorrentes* Sem concorrente direto Pequeno (2 empresas) Médio/Grande Sem concorrente direto Sem concorrente direto Nº de principais fornecedores Poucos (com baixo poder) Muitos (número não definido) 2 (insumo) 1 (equipamento) 10 Muitos (número não definido) Porte principais fornecedores* Grande Variado (fácil substituição) Grande Grande Todos 10 18 6 0 3 (bolsistas) 4 ensino superior (1 especialista) 4 ensino superior (4 especialistas) 2 ensino superior (2 especialistas) 1 ensino superior (1 especialista) 2 ensino superior (2 especialistas) Próprio e angels Próprio e governo Próprio Próprio Próprio e governo Setor de atuação % do principal cliente na receita Nº de funcionários em tempo integral Formação dos sócios Fonte de capital Empresa 3 Empresa 4 Produção de fármaco Equipamento médico químicos hospitalar Empresa 5 Equipamento médicohospitalar *Classificadas pelo faturamento, conforme legislação do Simples (BRASIL, 2006): micro, até R$ 240 mil; pequena, até R$ 2,4 milhões; média, até R$ 60 milhões. Fonte: Os autores. 4. Proposição do modelo A ferramenta I centra-se na identificação, avaliação e seleção de oportunidades de mercado a perseguir. Privilegiaram-se, nela, os aspectos (identificados na literatura) relacionados à etapa de seleção de oportunidades que destacam o ambiente externo (ver Quadro 7). Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 61 61 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia Quadro 7: Ferramenta I - Oportunidades de mercado Obs.: O número de respostas positivas tende a indicar a maior atratividade da oportunidade. Fonte: Os autores. As perguntas apresentadas no Quadro 7 foram elaboradas visando a um mesmo critério de resposta: afirmativa quando positiva para a empresa e vice-versa. Quanto maior o número de respostas sim, maior a probabilidade de a perseguição da oportunidade ser viável. A expectativa é que o empreendedor consiga responder ao maior número de questões, respeitando-se que a relevância de cada item depende do tipo do negócio a ser analisado. Quadro 8: Ferramenta II - Vocação, competências e forças da empresa Indique se a empresa possui os seguintes aspectos e identifique sua importância para a empresa Avaliação (sim/não) Aspectos internos Importância (alta/média/baixa) Os sócios têm vocação/competências para atuarem no mercado-alvo? Os sócios têm vocação/competências que permitem à empresa atuar em outros mercados? A empresa tem os recursos financeiros para fazer o negócio funcionar? A empresa tem ativos físicos para fazer o negócio funcionar? A empresa tem pessoas para fazer o negócio funcionar? A empresa (os sócios) possui considerável reputação no mercado para gerar vendas sem altos gastos em comunicação de marketing? Os sócios possuem contatos pessoais ou de negócios que podem fornecer consultorias ou estimular as vendas? A empresa (os sócios) tem domínio tecnológico para desenvolver o produto ou serviço? Se não, consegue obtê-lo externamente por um preço baixo? A empresa (os sócios) tem domínio do processo de produção e distribuição? A empresa conseguirá ter um preço igual ao dos pequenos concorrentes? A empresa conseguirá ter um preço igual ao dos grandes concorrentes? A empresa possui tecnologia ou recursos exclusivos? Atuar principalmente nos aspectos de alta importância em que a empresa não possui domínio completo. Fonte: Os autores. 62 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 62 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Já a Ferramenta II busca responder ao seguinte questionamento: que vocação, competências e forças a empresa tem à disposição? Assim sendo, está eminentemente focada nos fatores internos à organização (ver Quadro 8). Dessa forma, as ferramentas da seleção de oportunidades contemplam separadamente a dimensão externa e a interna, permitindo aos empreendedores enfatizar uma, outra ou ambas. Esta ferramenta combina a visão baseada em recursos (LEARNED et al., 1965) e a visão baseada em competências (HAMEL; PRAHALAD, 1990), reunindo-as no tema vocação, competências e recursos, incluindo os financeiros, os ativos físicos e as pessoas. Os itens críticos são os de importâncias alta ou média que a empresa não possui. Quadro 9: Ferramenta III: Principais figurantes Fonte: Os autores. A Ferramenta III (Quadro 9) exibe os principais figurantes ou atores do mercado e contempla questões críticas que podem revelar como a empresa atua ou deverá atuar em suas relações com eles. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 63 63 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia Quadro 10: Ferramenta IV- Cenários Fonte: Os autores. Também relacionada à segunda etapa do processo de administração estratégica (a formulação), está a Ferramenta IV (Quadro 10). Enquanto na anterior busca-se compreender quais ações serão tomadas em face dos demais atores do mercado, nesta o foco é analisar os possíveis resultados estratégicos e financeiros dessas ações com base em dois cenários: o melhor e o pior resultado previsto. 64 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 64 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Quadro 11: Ferramenta V - Plano de ações Fonte: Os autores Às etapas de seleção de oportunidades e formulação de estratégias, segue-se a de implantação da estratégia. Uma das formas de realizá-la é por meio de um plano de ações, conforme a Ferramenta V (Quadro 11). As ações estratégicas podem advir das análises anteriores, como a dos principais figurantes do mercado, ou de dois grupos de fontes de ações. O primeiro sugere levantá-las a partir da avaliação das atividades ou funções existentes na empresa e o segundo, basear-se nas perspectivas do balanced scorecard. Não há, porém, fonte de ações predominante, senão a preferência do empreendedor. Outros aspectos importantes são a definição de responsáveis (especialmente se há mais de um sócio na empresa), as metas esperadas e o grau de importância e urgência da ação. Por fim, cabe verificar se o orçamento permite as ações e se o seu número não está excessivo, dificultando sua implantação. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 65 65 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia Quadro 12: Ferramenta VI - Captação de recursos e definição de responsabilidades Fonte: Os autores. A Ferramenta VI (Quadro 12) sobrepõe algumas ações que podem surgir da anterior, porém busca simplificar a análise, propondo questões específicas sobre as funções, a captação de recursos, a disseminação de objetivos e metas, bem como sobre o compartilhamento de missão, valores e procedimentos. As duas últimas ferramentas compõem a etapa final do modelo de administração estratégica, que visa a avaliar se ela funcionou. A Ferramenta VII (Quadro 13) reúne indicadores de desempenho, metas, resultados reais, algum benchmarking ou padrão externo de comparação, além de ações corretivas para realimentar o sistema. Dão-se ainda explicações para facilitar a compreensão e a utilização da ferramenta pelo empreendedor. 66 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 66 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Quadro 13: Ferramenta VII - Indicadores, metas e realizado Fonte: Os autores. A Ferramenta VIII (Quadro 14), a última proposta, também apresenta uma pequena sobreposição, ao questionar as metas. A intenção disso (que está presente nas duas etapas, implantação e controle) é oferecer alternativas, permitindo que o empreendedor escolha entre análises simplificadas ou mais complexas. Porém, na última ferramenta há um fator importante não tratado em outras: a recompensa para as pessoas que mais colaboraram para o alcance das metas. Quadro 14: Ferramenta VIII - Recompensas para resultados positivos Fonte: Os autores. 4. Evidências empíricas O Quadro 15 reúne as ferramentas utilizadas pelos empreendedores entrevistados com a nota de importância percebida, de zero a 10, entre parênteses. A primeira questão levantada foi a efetiva utilização de ferramentas estratégicas pelos empreendedores pesquisados, sendo que dois dos cinco apontaram nunca o terem feito. A análise Swot (força, fraqueza, oportunidades e ameaças) também foi identificada em outras empresas, Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 67 67 16/08/2009, 11:27 André Rosenfeld Rosas, Felipe Mendes Borini, Edison Fernandes Polo e Antonio Carlos Aidar Sauaia porém em nenhum caso foi utilizada como uma ferramenta gerencial e sim como um prérequisito para elaborar o plano de negócios para atuar na incubadora. Quadro 15: Ferramentas utilizadas pelos empreendedores pesquisados Seleção de oportunidades Formulação Implantação Controle - Desenvolvimento de produtos (6) - Missão e valores* (10) - Fluxo de caixa (9) - Planos de crescimento (5) - Definição de metas (6) - Controle de custos de insumos e de produção (8) - Balanced Scorecard* (10) - Gestão pela qualidade* (9) (*) Relacionam-se diretamente àquelas difundidas na literatura (ver Quadro 1). Fonte: Os autores. Quanto ao questionamento se os empreendedores evitam determinadas ferramentas estratégicas por desconhecimento ou por avaliá-las como de menor utilidade, nota-se tanto uma baixa utilização das ferramentas difundidas na literatura como um baixo conhecimento delas pelos entrevistados. Tal fato reforça a crítica, descrita no início deste trabalho, quanto à validade, em estudos quantitativos, da premissa de conhecimento das ferramentas pelos empreendedores. No Quadro 16, aponta-se a avaliação, de zero a 10, das ferramentas adaptadas neste estudo para micro e pequenas empresas. Quadro 16: Ferramentas preferidas pelos empreendedores pesquisados, segundo o critério de utilidade percebida Seleção de oportunidades Formulação Implantação Controle - Oportunidades de mercado (9) - Vocação, competências e forças da empresa (9) - Principais figurantes (9) - Cenários (9) - Plano de ações (8) - Captação de recursos e definição de responsabilidades (6) - Indicadores, metas e realizado (8) - Recompensas para resultados positivos (8) Fonte: Os autores. Observando-se os quadros 15 e 16, nota-se um conflito. Percebe-se que as ferramentas não seguem necessariamente uma ordem lógica quando comparadas aos quadros de referencial teórico. Ao contrário da literatura geral de estratégia e dos levantamentos quantitativos com empreendedores, que concentram as ferramentas em seleção de oportunidades e formulação de estratégia, os empreendedores entrevistados neste estudo preferem, dentre as ferramentas que utilizam no presente momento, aquelas que os apoiam no controle da estratégia. Como se trata de micro e pequenas empresas, controles funcionais, como de custos de produção, são compreendidos como estratégicos. 68 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 68 16/08/2009, 11:27 Ferramentas de Gestão Estratégica e seu emprego por Micro e Pequenos Empreendedores Sendo visível, nas entrevistas, um desconhecimento de várias das ferramentas estratégicas, o que poderia enviesar a resposta pela moda do discurso empresarial, coube verificar o segundo questionamento central deste estudo: Haveria mudança na ordem de preferência caso as ferramentas fossem conhecidas pelo empreendedor previamente à investigação (ou seja, apresentadas pelo entrevistador)? Tal como pensado, após se apresentarem as ferramentas de modo detalhado, como descrito neste artigo, a opinião dos micro e pequenos empreendedores foi modificada. Parece existir um desconhecimento das ferramentas e, portanto, uma atribuição de relevância mais ditada pela moda e pela institucionalização delas do que propriamente pela sua utilidade. No entanto, uma vez que as ferramentas e suas finalidades se tornem conhecidas integralmente, existe uma mudança na ordem de preferência. Isso mostra que a ideologia dominante no discurso acadêmico e nas grandes empresas nem sempre influencia positivamente os pequenos e médios empreendedores, visto seu desconhecimento da utilização das ferramentas no campo da estratégia. 6. Referências ABELL, D. Defining the Business:The Starting Point of Strategic Planning. Englewood Cliffs, NJ, USA: Prentice-Hall, 1980. ALMEIDA, M. Manual de planejamento estratégico: desenvolvimento de um plano estratégico com a utilização de planilhas Excel. São Paulo: Atlas, 2001. ANSOFF, I. Estratégia empresarial. São Paulo: Mcgraw-Hill do Brasil, 1977. _________. Implanting strategic management. 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Leciona a disciplina ‘Jogo de Empresas’ no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da FEA/USP/SP, além de Laboratório de Gestão na Graduação e PósGraduação Lato Sensu. Livre-docente em Política de Negócios – FEA/USP Doutorado em Administração e Mestrado em Controladoria e Contabilidade – FEA/USP 72 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 72 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar The Interdisciplinarity in Business Management Graduation Courses: complexity leading to quality improvement Debora Nayar Hoff [email protected] Universidade Federal do Pampa - UNIPAMPA Erlaine Binotto Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD Elisabete Stradiotto Siqueira Universidade Federal do Semi-Árido - UFERSA Resumo Este artigo objetiva analisar como os cursos de administração têm materializado a perspectiva interdisciplinar em seus currículos, em sua formação docente e nos processos de avaliação governamentais. A pesquisa caracterizou-se por um estudo descritivo de caráter qualitativo, complementado por dados quantitativos. Foi desenvolvida pela comparação de dois estudos de caso. A base de informações foi o banco de dados do INEP/MEC. No âmbito dos cursos foi analisado: formação e a publicação dos docentes; avaliações governamentais; perfil do egresso; estrutura curricular; planos de ensino; planejamento estratégico; e projeto político-pedagógico. Os resultados indicam limitações: estruturas curriculares são ainda concebidas linearmente; diálogo mínimo entre os saberes; e muita sobreposição, apesar da diversidade de conteúdos das ementas. Esse aspecto não permite integrar conhecimento e tampouco superar as limitações existentes entre as várias disciplinas. É possível que a diferença qualitativa se origine das atividades de pesquisa, presentes no Caso B e ausentes no Caso A, e não de atividades interdisciplinares, indicando a necessidade de maior debate sobre a questão. Abstract The goal of this article is to analyze how administration courses have materialized the interdisciplinary perspective in their curriculums, professor training and in the processes Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 73 73 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira of governmental evaluation. The research was characterized by a descriptive study of qualitative nature, complemented by quantitative data. It was developed through the comparison of two case studies.The information base used was the databank of the INEP/ MEC. In the internal ambit of the courses, the formation and publication of professors, governmental evaluations, alumni profile, curricular structure, education plans, strategic planning and pedagogical political project were all analyzed.The results indicate limitations of the curricular structures, still conceived in a linear manner.There are a minimum dialogue between knowledge, and also superposition, in spite of the diversity of contents of record books. This aspect does not allow the integration of knowledge and neither the overcoming of the existent limitations between the several disciplines. It is possible that the qualitative difference is originated from the research activities, present in Case B and absent in Case A, and not due to the interdisciplinary activities, indicating the need of a greater debate concerning the issue. 1. Introdução A produção do conhecimento, neste século, tem tido, como característica fundamental, um contexto de crise relacionado à excessiva especialização e divisão do conhecimento que apresenta limites na análise de objetos mais complexos.Tal questão se constitui tanto em um problema a ser superado como em oportunidade de avanço da própria produção científica. Esse contexto desafia a racionalidade tomada somente em sua dimensão instrumental e passa a exigir da formação do profissional maior complexidade na forma de articulação dos saberes e na sua capacidade de interpretação da realidade. Os limites entre organização e sociedade tornam-se cada vez mais tênues, pois a produtividade organizacional não pode ser mais entendida somente como responsabilidade do administrador, passando a ser dividida com a sociedade, e os objetivos das organizações passam a ser múltiplos e a incluir aspectos econômicos, sociais e ambientais. Tornou-se fundamental o desenvolvimento da capacidade dos administradores de tratar com multiplicidade fatores determinados simultaneamente por consumidores, concorrentes, aliados e pelo próprio corpo funcional da organização. O novo administrador precisa ter um perfil mais criativo e inovador e ser capaz de lidar com questões que extrapolam o limite de sua área do conhecimento, pois a produção e o consumo ultrapassaram as barreiras geográficas dos países, concorrência e parceria confundem-se nos arranjos organizacionais, biotecnologia e tecnologia de produção começam a complementar-se, entre outras tantas questões que tornam mais complexo o ambiente de inserção das empresas. O Ministério da Educação e Cultura (MEC) observa esse contexto, ao tentar traduzir tais desafios na proposta das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Administração. Imprimiu uma dimensão mais flexível e redirecionou um perfil, historicamente tecnicista, 74 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 74 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar para uma formação com maior amplitude e conhecimento fronteiriços com outras áreas do saber, além de enfrentar a dicotomia global–local, incentivando os cursos a constituírem uma identidade contextualizada nas características regionais. Nesse sentido, as estruturas curriculares precisam contemplar outras áreas de conhecimento além daquela central dos cursos, de forma que estas dialoguem entre si, gerando o conhecimento interdisciplinar. O quadro docente, em tal contexto, teria que ser formado por uma lógica de construção do pensamento complexa ampliando o intercambio de conhecimento nas atividades de ensino para que este seja interdisciplinar e não apenas uma junção de disciplinas e docentes de várias áreas do conhecimento. Pode-se dizer que os cursos de graduação em Administração sofrem uma pressão dupla e antagônica, ou seja, tanto a estrutura curricular como a formação docente privilegia o conhecimento específico de Administração em detrimento de outros, impossibilitando o diálogo.Tal questão é agravada pelas exigências dos Conselhos de Categorias Profissionais, que exigem formação específica na área da Administração. O objetivo deste texto é analisar como os cursos de Administração têm materializado a perspectiva interdisciplinar em seus currículos, formação docente e processos de avaliação governamental. Espera-se que o estudo sirva como uma informação adicional para que os cursos que estão em fase de reestruturação curricular possam problematizar sua qualificação. 2. Referencial Teórico As fronteiras contemporâneas com que a ciência se depara indicam que o conhecimento específico isoladamente não é mais suficiente para entender a complexidade dos fenômenos estudados. Autores, como Morin (1990), têm apontado que a crise das ciências está relacionada a um esgotamento da fragmentação do conhecimento produzida no final do século XIX, que tenta eliminar o individual e o singular em prol da produção de leis gerais, capazes de explicar o mundo como se este fosse uma máquina mecânica perfeita; segundo o autor, um pensamento simplista calcado na redução e na disjunção. Souza Santos (1994) caracteriza o problema principal da estagnação, proporcionado pela modernidade na produção das ciências, como uma limitação do conhecimento a um padrão considerado válido. Tal limitação reduziu a produção científica a uma finalidade de aplicação imediata, ou seja, regida pelo princípio da utilidade, presa, principalmente, ao processo produtivo e perdendo seu caráter investigativo de criar alternativas e apontar possibilidades futuras. Santaella (1992, p. 109) desenvolve a crítica à aplicabilidade imediata da ciência usando uma comparação de Peirce: “usar as mentes dos cientistas em tais problemas seria como tocar uma máquina a vapor com a queima de diamantes”. Morin (1990) busca uma alternativa para a limitação da ciência discutindo e aprimorando a idéia de complexidade. Para o autor (1990, p. 157), o termo ‘complexidade’ está Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 75 75 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira relacionado à dificuldade em explicar alguma coisa, derivada principalmente pelos processos simultâneos que produzem uma ação e, por outro lado, por fenômenos aleatórios produtores da incerteza. Nesse sentido, a essência da complexidade é a impossibilidade de sua homogeneização, ainda segundo o autor: A complexidade é correlativamente o processo da ordem, da desordem e da organização. Digo também que a complexidade é a mudança de qualidades da ordem e a mudança das qualidades de desordem. Na complexidade muito alta, a desordem torna-se liberdade e a ordem é muito mais regulação do que imposição. Nesse aspecto modifiquei meu ponto de vista e mais uma vez modifiquei, complexificando. (MORIN, 1990). Para Bianchi (1999, p. 125), “o método do pensamento complexo [...] não rejeita os resultados da ciência reducionista, mas descobre a possibilidade de recusar suas limitações, no que concerne, pelo menos, à modelagem dos problemas propostos”. Aos adeptos desta concepção o grande mérito do pensar complexo seria a possibilidade de observar qualquer objeto ou contexto de forma a apreender o máximo possível de seu funcionamento, características ou detalhes. Sobre essa questão, Simon (1972) desenvolveu o conceito de racionalidade limitada, que acompanha o pesquisador e que lhe impede de entender a completude de seus objetos, a complexidade o aproximaria mais do real, do que os métodos reducionistas tradicionalmente utilizados. Outro autor enfatiza a complexidade como uma alternativa ao entendimento das coisas. Para Le Moigne (2000, p. 11), o que ele chama de “inteligência da complexidade”, seria uma nova forma de entendimento que exige de si mesma a atenção à percepção e à descrição dos contextos relacionados aos objetos ou ações observados, superando as limitações do prescrever e do descrever e buscando entender no conjunto de todos os elementos que compõem uma determinada realidade. Neste sentido, análises sistêmicas tendem a se aproximar mais do entendimento de realidades complexas do que aquelas que não o são. 2.1 Interdisciplinaridade Quando transposto o conceito de complexidade para o ambiente da construção do conhecimento, encontra-se a necessidade de extrapolar-se a divisão e especialização criada também neste processo, através das disciplinas. De acordo com Bianchi (1999), trata-se de abrir as disciplinas umas às outras para enriquecê-las com os pontos de vista provenientes de outros horizontes. Este processo gera a possibilidade de associar conhecimento como alternativa para a superação dos limites que a própria ciência criou no entendimento especializado de seus objetos. Busca-se então a interdisciplinaridade. Coerente com esta afirmativa, Hornby (2003) indica que a interdisciplinaridade significa o envolvimento de diferentes áreas do conhecimento, pesquisas e abordagens multidisciplinares. Klein e Newell (1998) definem estudos interdisciplinares como o pro- 76 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 76 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar cesso de responder questões, resolver problemas ou direcionar tópicos tão amplos ou complexos que a abordagem disciplinar não é suficiente para a compreensão ou solução. Percebe-se a existência de contradições no estabelecimento do conceito de interdisciplinaridade, principalmente confundindo-o com outras idéias como multidisciplinaridade e transdisciplinaridade. Os autores que tratam desta questão, como Andrade, (2004), Nicolescu, (1999), Oliveira e Neves, (2004), Soares, (1999), Miranda, Souza e Barbosa, (2002), Demo, (1997) e Weil et al., (1993) estabelecem diferenciações importantes entre estes termos. O conceito de multidisciplinaridade, relativamente homogêneo entre os autores, é considerado como a justaposição de diferentes disciplinas sem necessariamente produzir mudanças internas na concepção de cada uma delas. Já entre a definição de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade são encontradas algumas contradições principalmente no que tange ao nível de permeância entre as disciplinas dentro de cada uma. Ora a primeira aparece como o grau mais avançado de interdependência, beirando a unicidade do conhecimento, ora a segunda é que atinge este nível. Segundo Nicolescu (1999), a interdisciplinaridade está relacionada a uma transposição de métodos entre disciplinas, e ele a classifica em três graus de transferência: grau de aplicação, grau epistemológico e um grau de criação de novas disciplinas. Andrade (2004) ratifica essa idéia, considerando que a interdisciplinaridade está relacionada à interdependência e à comunicação entre vários ramos do conhecimento, ou seja, ver o todo não pela simples somatória das partes, mas com a percepção de que tudo sempre está em tudo. Weil et al. (1993, p. 31) consideram que a interdisciplinaridade se constituiria em um momento de relação e reciprocidade, contudo não possibilitaria a transposição de fronteiras entre os saberes, papel que caberia à transdisciplinaridade, recorrendo a um estudo de Erich Hantsch, Weil define que a transdisciplinaridade é o “reconhecimento da interdependência de todos os aspectos da realidade. A transdisciplinaridade é a conseqüência normal da síntese dialética provocada pela interdisciplinaridade, quando esta for bem-sucedida”. Demo (1997) indica que a produção do conhecimento interdisciplinar estaria vinculada, necessariamente, a constituição de equipes formadas por várias áreas do saber, preferencialmente, aquelas opostas. O diálogo e a contraposição de conhecimento seriam responsáveis por gerar, ao mesmo tempo, abrangência e profundidade. “O que faz, na verdade, a interdisciplinaridade, não é a justaposição de textos, mas o esforço reconstrutivo de tecê-los em um todo só.” (DEMO, 1997, p. 119). Para esse autor a transdisciplinaridade, ao contrário de Weil, seria um intercâmbio disciplinar e não a possibilidade de construir um conhecimento permeado pela lógica das várias disciplinas, ao mesmo tempo. Como suporte para o entendimento de interdisciplinaridade usado por Weil et al. (1993), pode-se buscar a argumentação de Brewer (1999), o qual aponta que a Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 77 77 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira interdisciplinaridade geralmente refere-se à apropriada combinação de conhecimento de várias especialidades diferentes, de forma a dar novos enfoques a um problema real. Essa combinação de disciplinas adiciona valor ao processo, sendo possível perceber que o resultado obtido pelo estudo conjunto é mais interessante do que a soma das contribuições individuais das partes. Para Klein (1990), as rotas do conceito de interdisciplinaridade têm ressonância no discurso moderno, traduzido na concepção da ciência unificada e da integração do conhecimento. Estas idéias são corroboradas por Wilson (1999) ao tratar da unificação do conhecimento por meio da consiliência que seria uma busca do entendimento mais completo dos objetos da ciência, a partir da conjunção de esforços das diversas áreas do conhecimento, onde as áreas específicas combinadas permitem uma compreensão maior e melhor do que a permitida pela soma dos entendimentos específicos, isoladamente. Ainda nesse sentido, Payne (1999) afirma que a chave interdisciplinar está em compreender como diversos insights, oriundos de várias fontes disciplinares, são locados, selecionados, delimitados e aplicados, e como um número de teóricos vindos de diferentes bases disciplinares tem contribuído ao longo das duas últimas décadas na exploração desses insights. Para tratar desse tema, refere-se à concepção de Klein (1990) de que a interdisciplinaridade é um processo de aquisição e síntese integrada. Ainda que os autores citados enfatizem a necessidade da produção do conhecimento interdisciplinar Levy-Leblond (2004, p. 23), chamam a atenção os cuidados que devem ser tomados para tal empreitada, dada a especificidade metodológica da produção da ciência.Tal processo faz com que sua validade esteja restrita a contextos muito específicos; dessa forma, sua transposição deve reconhecer tal limitação. “Trata-se de convocar a ciência, no processo intelectual, não mais como o especialista que venha a fornecer confortáveis argumentos de autoridade, mas como o contra-especialista que testemunha a fragilidade das conclusões, por mais razoáveis que elas sejam.” Esses argumentos sugerem que o conhecimento é sempre transitório e inacabado, a novidade está apoiada em conceitos de outras áreas da ciência, nesse sentido, o exercício do pensar permanente é inerente a esse contexto. Neste estudo, será tomado o conceito de interdisciplinaridade concebido por Wilson, Klein e Demo por considerar que tratam a temática de forma suficientemente aberta possibilitando uma concepção complexa do conhecimento. 3. Métodos da Pesquisa A pesquisa caracterizou-se por um estudo descritivo de caráter qualitativo, complementado por dados quantitativos (VERGARA, 2004). Foi desenvolvida pela comparação de duas instituições de ensino, uma pautada em uma Universidade Pública de Direito Privado (Caso A) e outro em uma Universidade Pública (Caso B), ambas situadas 78 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 78 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar no mesmo estado da Federação. Os nomes foram omitidos visando proteger os cursos e a imagem das instituições. No âmbito interno dos cursos, foi analisada uma amostra dos planos de ensino, definidos a partir de uma disciplina de cada área profissional (marketing, finanças, recursos humanos, produção e área geral), da titulação e da produção bibliográfica dos docentes, do projeto político-pedagógico (PPP) e do perfil dos egressos. Nesses casos, a análise foi orientada pela materialização de perspectivas interdisciplinares, ou seja, “esforço reconstrutivo de tecê-los em um todo só”. (DEMO, 1997, p. 119). No âmbito externo foram consideradas informações do banco de dados do INEP/MEC, para os resultados da Avaliação do MEC (Provão) e do Enade (de 2000 a 2004). As categorias de análise constituíram-se de: a) formação dos docentes: foi avaliada a formação na graduação, especialização, mestrado e doutorado, a fim de verificar a procedência de docentes (que ministraram aulas em 2007/01) nas áreas de conhecimento; b) publicação dos docentes: foi analisada a produção individual de cada docente que ministrou aula no curso em 2007/01, verificando-se o docente está envolvido com produção e divulgação de conhecimento; c) avaliações governamentais: conceitos obtidos pelos cursos; d) perfil do egresso: o foco de análise foi se havia indícios de aspectos interdisciplinares. e) estrutura curricular: analisaram-se quais áreas as disciplinas se originavam; f) planos de ensino: foram selecionados um de cada área profissionalizante em cada instituição. Considerou-se o conteúdo programático (ementa, objetivos, conteúdo e bibliografia) a fim de verificar a existência de diálogo entre Administração e outras áreas do conhecimento; e g) planejamento estratégico e projeto político-pedagógico: análise da missão, visão, objetivos propostos nos planos. 4. Apresentação e análise dos dados 4.1 Histórico dos cursos Caso A: O Curso A foi autorizado pelo Decreto nº 73.650, do CFE, e reconhecido pelo Decreto nº 81.100/77, do CFE, de 21 de dezembro de 1977. De 1973 a 1998, portanto ao longo de mais de duas décadas em que o curso é oferecido, 827 profissionais colaram grau. Atualmente o curso conta com 427 alunos, localizados, em sua grande maioria, no campus central da universidade. Caso B: O Curso B foi criado pelo Decreto nº 20.158, de 30 de junho de 1931, como Curso Técnico, sendo autorizado pela Divisão de Ensino Comercial, em dezembro de 1942. O início de suas atividades ocorreu em 10 de março de 1943. Em 16 de maio de 1944, obteve o seu reconhecimento, de acordo com o Decreto nº 15.581/44, publicado no Diário Oficial da União de 31 de maio do mesmo ano (SITE Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 79 79 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira DO CURSO, 2007). Possui em torno de 900 alunos e oferece 90 vagas por semestre, sendo 45 no turno da manhã e 45 à noite. 4.2 Formação docente Partindo-se do pressuposto de que a formação dos docentes interfere na forma como eles metodologicamente abordam o processo de ensino, considerou-se relevante avaliar se existe no curso uma diversidade de formação capaz de produzir o diálogo entre diferentes áreas de conhecimento. Pode-se dizer que há certa similaridade entre os dois cursos quando observada a distribuição da formação dos professores nas várias áreas do conhecimento: há uma concentração de professores formados na área das Ciências Sociais Aplicadas, coerente com a característica das associações corporativas dos profissionais dessa área, contudo contraditória com a orientação do Conselho Estadual de Educação de SC, que estabelece, nas normas para o funcionamento da educação superior, artigo 64, parágrafo I – a titulação mínima para o exercício do magistério em cursos de graduação é a de ser o docente graduado na área da disciplina ou afim e comprovar experiência profissional ou produção intelectual, técnica ou científica relacionadas com a disciplina (CEE/SC, 2007). Exigência que é complementada pelos requisitos nacionais para a formação do quadro docente de universidades, que precisa ser, ao menos na sua terça parte, composta por mestres e doutores. Decorrente dessa exigência, e do fato de a instituição que oferece o curso B ser universidade há mais tempo que a instituição que oferece o curso A, há que se diferenciar a formação, no nível de pós-graduação, dos dois grupos. Enquanto o curso A conta com apenas 6 doutores, metade deles incorporado ao quadro do curso há menos de 1 ano, o curso B conta com 19 doutores, já com alguns anos de atividade dentro do curso em análise. Essa característica marca sobremaneira a produção científica e a publicação dos docentes, como se percebe nas próximas análises. 80 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 80 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar Quadro 1: Formação dos docentes Graduação Áreas A B Especial A Mestrado B A B Doutorado Total % A B A B A B 2 2 18 5 16 4 1 8 7 7 6 Humanas 6 1 5 2 5 Exatas 3 4 2 2 3 27 14 13 23 3 73 75 66 66 4 1 2 12 3 21 2 19 1 1 1 4 1 4 Sociais aplicadas 30 35 Engenharias 2 3 Saúde 0 1 Agrárias 2 Ling. letras e artes 3 1 1 3 1 1 3 2 38 1 23 22 26 6 19 2 7 1 6 1 113 113 100 100 Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do Currículo Lattes dos docentes que compõem o quadro de cada um dos cursos analisados. 4.3 Publicação dos professores Curso A: Dos 43 professores do curso que atuaram em 2007/01, oito possuem algum tipo de produção (artigos em periódicos, livros ou capítulos, trabalhos em anais e orientação de projetos de iniciação científica), 18 não possuem produção científica e 13 não possuem Currículo Lattes. Não se mostrou relevante apresentar dados dessa produção, uma vez que ela é muito concentrada nos professores que atuam no mestrado na instituição. A ausência de pesquisa e sua conseqüente socialização em periódicos e eventos podem significar uma deficiência no processo de atualização e produção de novos conhecimento. Nesse caso, a dimensão da interdisciplinaridade pode ficar comprometida, uma vez que tais docentes teriam como tendência reproduzir os padrões tradicionais do conhecimento administrativo, não incorporando a este as novas tendências de diálogo que vêm sendo elaboradas por outros profissionais da área. Curso B: Dos 46 professores do curso que atuaram em 2007/01, 22 possuem algum tipo de produção (artigos em periódicos, livros ou capítulos, trabalhos em anais e orientação de projetos de iniciação científica, 11 não possuem produção científica e 13 não possuem Currículo Lattes. No conjunto de professores observados, somam-se 141 artigos publicados em periódico, 39 livros, 67 capítulos de livro, 325 trabalhos completos publicados em anais de eventos e 10 projetos de iniciação científica orientados pelos professores. Estes dados são indicativos fortes da atividade de pesquisa por uma parcela dos professores, contudo também demonstram uma relativa concentração entre aqueles que estão envolvidos com alguma produção, visto Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 81 81 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira que o número de docentes não varia muito entre as instituições, o que tende a se refletir na qualidade de ensino. O envolvimento de vários professores e alunos em atividades de pesquisa complementares ou congruentes materializa-se na existência de 6 núcleos de pesquisa estabelecidos dentro do CAD, na participação de professores do colegiado de graduação no do programa de pós-graduação stricto sensu em Administração da instituição. 4.4 Avaliações governamentais No que se refere ao resultado do provão, o curso A obteve os seguintes conceitos: 2000 – D; 2001 a 2003 – C. Na prova do Enade em 2006, ano em que o curso de Administração foi incluído, o curso obteve conceito 3 (três). Já o curso B obteve: 2000 – A; 2001 – A, 2002 – B e 2003 – A. Na prova do Enade em 2006 o curso obteve conceito 5 (cinco). Vários fatores podem influenciar no tipo de avaliação que é realizada. O número de discentes que concorrem a uma vaga no vestibular seleciona de forma desigual o corpo discente e também suas possibilidades de desempenho nessas avaliações; além disso, o perfil do discente do curso A está concentrado naqueles que têm dedicação parcial a atividades acadêmicas, visto que em grande parte dos casos trabalha para financiar os estudos. 4.5 Perfil do egresso Curso A: “Identificar oportunidades de negócios, necessidades atuais, tendências, tomar decisões estratégicas na solução de problemas organizacionais; gerenciar contingências; enfrentar desafios; desenvolver a criatividade e o espírito empreendedor; ser responsável e manter ética profissional”. Curso B: “O aluno de Administração [...] é preparado para ser um profissional criativo, com capacidade empreendedora, capaz de se integrar facilmente aos objetivos de uma organização e coordenar, em qualquer ramo de atividade, as mais importantes estratégias operacionais” (SITE DO CURSO, 2007). Em nenhum dos dois perfis percebe-se claramente a intenção de formação de um profissional habilitado para trabalhar de maneira interdisciplinar. 4.6 Estrutura curricular Curso A: Analisando-se a estrutura curricular, pode-se observar que 19% dela é composta por disciplinas oriundas de áreas do conhecimento diferentes daquela específica do curso. As disciplinas originam-se de áreas como as Ciências Humanas (filosofia, psicologia e metodologia) e as Ciências Exatas (matemática e estatística), cumprindo requisitos mínimos definidos nas diretrizes do MEC ou nos currículos 82 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 82 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar mínimos estabelecidos por esse mesmo órgão. Estão presentes também disciplinas que tangenciam áreas como o Direito Administrativo, representando 7% do currículo. Também nesse caso o curso restringe-se ao estabelecido legalmente. Apesar de a estrutura curricular do curso A não prever disciplinas eletivas, é possível, ao aluno, cursar qualquer disciplina ofertada por outros cursos de graduação em funcionamento na universidade, porém essa não é uma prática comum entre os discentes deste curso. Curso B: Analisando-se a estrutura curricular, pode-se observar que 20% dela é composta por disciplinas oriundas de áreas do conhecimento diferentes daquela específica do curso. Como no outro curso analisado, as disciplinas originam-se de áreas como as Ciências Humanas (filosofia, psicologia e metodologia) e as Ciências Exatas (matemática e estatística), cumprindo requisitos mínimos definidos nas diretrizes do MEC ou nos currículos mínimos estabelecidos por esse mesmo órgão. São também observadas disciplinas tangenciais, que chegam a 11% da estrutura total do curso. Também nesse caso o curso restringe-se ao estabelecido legalmente, sendo intensa a presença de disciplinas da área jurídica. A estrutura curricular do curso B prevê a obrigatoriedade de complementação da sua carga horária por meio de disciplinas eletivas, que podem ser escolhidas entre aquelas oferecidas pelo próprio curso ou entre um rol selecionado entre os cursos da instituição. Porém, as elencadas na fonte de informação têm forte relação com a área específica do curso, não caracterizando uma intenção interdisciplinar. 4.6 Planos de ensino Caso A: No que concerne à análise dos sete planos de ensino, quatro ementas indicam possibilidade de interdisciplinaridade quando explicitam alguma necessidade de articulação da disciplina com as outras áreas de conhecimento da Administração ou com o contexto social. Nenhum dos objetivos presentes nos planos abre espaços para interdisciplinaridade. Quanto aos conteúdos, um plano faz uma indicação sobre a interdisciplinaridade. Nas bibliografias, dois planos incluem referências bibliográficas de áreas não específicas do conteúdo programático. Caso B: Nas ementas de sete planos analisados, duas indicam intenção de interdisciplinaridade quando explicitam alguma necessidade de articulação da disciplina com as outras áreas de conhecimento da Administração ou com o contexto social. Em nenhum plano de ensino os objetivos trazem relação interdisciplinar. Em apenas um plano é feita indicação sobre a possibilidade de avanço interdisciplinar. Por fim, as bibliografias de dois planos incluem referências bibliográficas de áreas não específicas do conteúdo programático. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 83 83 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira 4.7 Planejamento estratégico e projeto político-pedagógico (PPP) Caso A: A universidade que oferta este curso fez um esforço para coadunar o projeto político-pedagógico dos cursos e o planejamento estratégico institucional. Uma das formas usadas foi tomar por base elementos do planejamento estratégico como orientadores dos PPPs dos cursos, o que vale para a missão, os valores, a visão e os eixos estratégicos institucionais. As palavras ‘muldisciplinaridade’ e ‘interdisciplinaridade’ são elementos presentes no planejamento estratégico institucional, principalmente nos pontos que deveriam influenciar os PPPs dos cursos. Porém, nem na visão do curso, “ser um curso reconhecido por formar profissionais comprometidos com o desenvolvimento das organizações”, nem na missão definida, “gerar conhecimento para desenvolver talentos que, através da prática profissional agreguem valores qualitativos no desenvolvimento dos processos sócio, econômico, político e cultural, permitindo a melhoria contínua da qualidade de vida da sociedade” (PPP, 2000, p. 11), fica evidente uma intenção de formação de um profissional interdisciplinar. Apesar dessa constatação, quando estruturada a proposta curricular, é demonstrada, no PPP (2000), a preocupação em não somente atender às demandas do mercado de trabalho, mas promover novas relações produtivas e sociais, integrando conhecimento parciais, de forma orgânica e lógica visando criar novos conhecimento e formas de ação. Caso B: Nas referências analisadas, há especial destaque para o Plano Estratégico do Departamento de Ciências da Administração 2006-2008 (SITE DO CURSO, 2007), que se configura como um esforço para a implementação de um processo de planejamento e controle contínuo, sustentado na necessidade premente de se adaptar o CAD aos novos tempos, tendo por base o princípio da participação de professores, funcionários técnico-administrativos e do corpo discente, por meio de seus representantes. De acordo com o plano estratégico, a missão do CAD é “construir e socializar o saber amplo sobre as organizações e sua gestão, por meio da valorização dos potenciais humanos e da otimização dos recursos ambientais e institucionais, em benefício da sociedade” (SITE DO CURSO, 2007). Entre os princípios orientadores estão: a) sociedade em primeiro lugar; b) integração; c) qualidade; d) inovação; e e) respeito à pluralidade. Dentre eles, destaca-se a integração, que, para o CAD, [...] significa que, no cumprimento de sua missão e na tomada de decisões, o departamento assume o compromisso permanente com o exercício da parceria e com o fortalecimento das inter-relações: universidade e comunidade; ensino, pesquisa e extensão; graduação e pós-graduação; professores, alunos e funcionários; áreas de conhecimento [...] (SITE DO CURSO, 2007) e o respeito à pluralidade, o qual “significa a convivência construtiva entre as diferentes concepções da Ciências da Administração, professados e praticadas no departamento (SITE DO CURSO, 2007). 84 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 84 16/08/2009, 11:27 Interdisciplinaridade e a Graduação em Administração: complexificar para melhorar Pode-se afirmar que nesses dois princípios orientadores está presente o germe da interdisciplinaridade, pela possibilidade de emergência das múltiplas visões (pluralidade) e pelo exercício das “inter-relações” (integração), que vão gerar, ao longo do tempo, a permeância entre as diversas áreas do conhecimento, pela conversa entre as diversas disciplinas que compõem a estrutura curricular do curso (SITE DO CURSO, 2007). A partir desse contexto, o CAD quer formar perfil do seu egresso, já mencionado anteriormente. Assim, nas análises realizadas de aspectos e instrumentos utilizados no desenvolvimento do que é proposto nesses planos, surge um gap entre intenção e prática. 5. Considerações Finais Este artigo objetivou analisar como os cursos de Administração têm materializado a perspectiva interdisciplinar. Os dados indicam que essa perspectiva está mais no plano estratégico, enquanto promessa de futuro, do que nos instrumentos e ações que atualmente orientam o processo pedagógico. Considera-se que o desafio para essa transformação é a superação das posturas corporativas dos docentes, principalmente nessa área do conhecimento, bem como a resistência em assumir um modo de pensar que aceite a complexidade dos fenômenos estudados e a necessidade do uso da interdisciplinaridade para entendê-los. A complexidade diz respeito a uma forma de pensar, de entender as relações de mundo que irá se refletir na forma como o conhecimento é construído. Nesse sentido, a interdisciplinaridade está relacionada com a construção do conhecimento complexo. Percebem-se limitações nas estruturas curriculares, que ainda são concebidas de forma linear, e, ainda que as disciplinas abordem conteúdos diferenciados, a análise do ementário revela que há diálogo mínimo entre os saberes e muita sobreposição. Esse aspecto não permite integrar conhecimento e tampouco superar as limitações existentes entre as várias disciplinas. Contudo, essa questão poderia ser minimizada se o curso conseguisse ampliar os horizontes e perspectivas de produção de conhecimento dos discentes. O Caso B, no entanto, têm, em seu plano estratégico, indícios de que pretendem incrementar a proposta pedagógica através da interdisciplinaridade. Percebe-se que existe uma diferença fundamental na qualidade dos casos estudados, presente no desempenho dos cursos nas avaliações do MEC. É possível que esta diferença qualitativa origine-se das atividades de pesquisa, mais presentes no Caso B e bastante ausentes no Caso A. Pode-se especular que, dentro ou por meio da pesquisa e das atividades dela oriundas, exista a possibilidade de um trabalho um pouco mais interdisciplinar, o que torna o aprendizado mais efetivo e abre a possibilidade de construção do conhecimento. A superação da reprodução de conteúdos parece ser uma questão fundamental para que se tenha qualidade no processo de ensino-aprendizagem, mas também para que a complexidade seja incorporada ao processo. Isso desenca- Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 85 85 16/08/2009, 11:27 Debora Nayar Hoff, Erlaine Binotto e Elisabete Stradiotto Siqueira dearia atividades interdisciplinares, uma vez que a pesquisa é o espaço privilegiado de construção, concepção de problemas e articulação de conhecimento de várias áreas. Sugere-se que novos estudos sejam desenvolvidos, com esse enfoque e com uma visão mais complexa, a fim de superar as limitações existentes neste, principalmente pelos elementos escolhidos para dar base à análise. 6. Referências ANDRADE, R.C. Interdisciplinaridade – um novo paradigma curricular. Disponível em http://www.suigeneris.pro.br/interdisciplin1.htm, acesso em 05 abr. 2004. BIANCHI, F. O caminho do método. In: PENA-VEIGA, A .; NASCIMENTO, E. P. (Orgs.) O pensar complexo: Edgar Morin e a crise da modernidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Garamond, 1999. BREWER, G. D. The challenges of interdisciplinarity. Policy Sciences. 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Sabe-se que escritores, poetas e artistas como o lusitano Fernando Pessoa têm feito referências às diversas relações comerciais e organizacionais, induzindo-nos à reflexão a respeito da dinâmica das organizações na atualidade. Eis a proposta deste artigo. Nesse contexto, o seu objetivo é apresentar a aplicação da literatura sobre a teoria e prática do comércio tratada por Fernando Pessoa no ensino das disciplinas de TGA, TO e Marketing. Serão apontados métodos e estratégias didáticas para expor e discutir o tema, no intuito de contribuir para a compreensão do assunto em questão e para o desenvolvimento, por parte dos alunos, de uma análise mais crítica dos conteúdos apresentados em sala de aula, bem como estimular a aplicação dessa estratégia didática pelos docentes. Abstract It is believed that the theme “Dialogues between Administration and Literature as a strategy to teaching and learning” can have important relationships, supplying significant knowledge Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 89 89 16/08/2009, 11:27 Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior for application and development of organizational studies in class. It is known that writers, poets and artists, as the Portuguese Fernando Pessoa, have been making references to the several relations about commerce and organizations, inducing us to the reflection regarding the organizations dynamics at the present time.That is the aim of this paper. In this context, its objective is to present the application of literature on the theory and practice of the commerce treated by Fernando Pessoa in teaching of TGA,TO, and Marketing disciplines. Methods and didactic strategies will be pointed out in order to expose and discuss the theme, in an attempt to contribute for the understanding of the subject in evidence and for the development, by the students, of a more critical analysis on the contents presented in class, as well as to stimulate the application of this didactic strategy by the teachers. 1. Panorama Inicial Este trabalho, voltado ao ensino-aprendizagem em sala de aula, surgiu a partir da experiência com a disciplina de Teoria Geral de Administração (TGA) em cursos de graduação em uma Instituição Federal de Ensino Superior (IFES). A necessidade de fontes de dados que pudessem enriquecer e facilitar a aprendizagem de determinados conteúdos programáticos, de modo a provocar o pensamento reflexivo e crítico nos discentes, instigou o professor da disciplina a buscar novos caminhos. O caminho identificado no segundo semestre de 2006 foi a Literatura Luso-Brasileira, em especial, as obras em prosa do poeta lusitano Fernando Pessoa. Acredita-se que o tema “Interlocuções entre Administração e Literatura como estratégia de ensino e aprendizagem” pode ter relações relevantes, fornecendo conhecimentos significativos para a aplicação e o desenvolvimento de estudos organizacionais em sala de aula. Sabe-se que escritores, poetas e artistas como Fernando Pessoa têm feito referências às diversas relações comerciais e organizacionais, induzindo-nos à reflexão a respeito da dinâmica das organizações na atualidade. Em 1926, Fernando Pessoa, fazendo uso de sua experiência profissional acumulada no comércio de Lisboa, Portugal, resolveu contribuir para a teoria administrativa com a redação de artigos, publicados na Revista de Comércio e Contabilidade, lançada no mesmo ano, a terceira revista de negócios mais antiga na nação lusitana. Tal conjunto de artigos de Pessoa (1926a; 1926b; 1926c; 1926d; 1986) compôs uma parte de sua obra em prosa, chamada Teoria e prática do comércio: preceitos práticos, que explicita o ponto de vista desse escritor, assim como a aplicação de conhecimentos relativos à Administração. Portanto, procurou-se organizar, entre 2006/2007, um grupo de estudos (formado pelo professor, alunos da disciplina e interessados no assunto) sobre as potenciais contribuições de Fernando Pessoa, com base em suas discussões sobre a teoria e prática do comércio, para a área de Administração. Como uma das referências para o debate do grupo, Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 90 arte_angrad.pmd 90 16/08/2009, 11:27 Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia Didática: aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa em Sala de Aula resgatou-se o conteúdo de sala de aula tratado na disciplina de TGA, que serviu como ponto de partida. Notou-se, durante os estudos e debates, que as discussões apresentadas por Fernando Pessoa trazem insights para o entendimento de determinados temas ligados à própria TGA, a Teoria das Organizações (TO) e ao Marketing. Dessa forma, nota-se que a pluridisciplinaridade (SANTOMÉ, 1998; ZABALA, 2002), ou seja, a existência de relações complementares entre as disciplinas de Administração e outras áreas de conhecimentos afins, como a Literatura (e as obras de Fernando Pessoa), podem ter relações surpreendentes, fornecendo conhecimentos significativos para a compreensão de certos temas. Nesse contexto, o objetivo deste artigo é apresentar a aplicação da literatura sobre a teoria e prática do comércio tratadas por Fernando Pessoa no ensino das disciplinas de TGA, TO e Marketing. Serão apontados métodos e estratégias didáticas (objeto em estudo) para expor e discutir o tema, tentando-se, dessa forma, contribuir para a compreensão do assunto em questão e para o desenvolvimento, por parte dos alunos, de uma análise mais crítica sobre os conteúdos apresentados em sala de aula, bem como estimular a aplicação desse instrumento pelos docentes. O desenvolvimento deste artigo foi construído voltado para a ação-reflexão do ensino e da aprendizagem na Administração. Sua elaboração foi auxiliada por procedimentos metodológicos de cunho bibliográfico, que possuem respaldo no meio acadêmico-científico acerca de TGA,TO e Marketing nas organizações.Vale mencionar que foram consideradas na sua construção as observações e percepções dos membros (professor e alunos) do grupo de estudos sobre Fernando Pessoa, obtidas ao longo da formação docente e discente, em disciplinas na IFES e nas experiências em sala de aula. Sendo assim, este artigo foi organizado em termos de concatenação de idéias, primeiramente, com a descrição dos eixos temáticos resultantes das interlocuções entre as discussões de Fernando Pessoas sobre teoria e prática do comércio e os conteúdos programáticos de disciplinas como TGA,TO e Marketing. Num segundo momento, é apresentada a aplicação desses eixos temáticos por meio de estratégias didáticas interativas, bem como fatores críticos que possam vir a interferir no processo de ensino e aprendizagem do alunado. Por fim, foram apontadas as considerações sobre essa estratégia didática para a formação profissional dos agentes envolvidos (docente e discentes). 2. Aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa no ensino da Administração Ao realizar a leitura da obra em prosa Teoria e prática do comércio: preceitos práticos de Fernando Pessoa, notou-se a possibilidade de aplicação de seu conteúdo, como forma não convencional de estimular a leitura pelo alunado, bem como propiciar o entendimento de Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 91 91 16/08/2009, 11:27 Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior determinados eixos temáticos comumente presentes em disciplinas como TGA, TO e Marketing. Vale destacar que neste trabalho optou-se em demonstrar as interlocuções entre Administração e Literatura aplicada às disciplinas de TGA e de TO de modo integrado, num só bloco de discussão.Tal opção vem da observação dos autores deste trabalho de que a disciplina de TO possui temas comuns a TGA, e em certos casos não está presente na matriz curricular de cursos de graduação em Administração nas IES no Brasil. Os eixos temáticos a serem abordados nas próximas seções são: estrutura e relações de poder nas disciplinas de TGA/TO; planejamento (estratégico) de marketing e composto mercadológico na disciplina de Administração Mercadológica ou de Marketing. Vale destacar que a exposição a ser realizada sobre os eixos temáticos contará com proposições vividas pelos autores deste trabalho, que podem servir como aplicação e apoio aos professores interessados nesta estratégia didática em sala de aula. 2.1 Interlocuções entre TGA/TO e Fernando Pessoa Da obra Teoria e prática do comércio, de Fernando Pessoa, podem-se retirar valiosas contribuições para o ensino de disciplinas do curso de Administração, principalmente em relação aos conteúdos estrutura e relações de poder nas organizações. 2.2 Estrutura organizacional No que se refere ao tema “estrutura organizacional”, algumas contribuições de Fernando Pessoa: Ora toda a gente que serve deve, parece-nos, buscar agradar a quem serve. Para isso é preciso estudar a quem se serve – mas estudá-lo sem preconceitos nem antecipações; partindo, não do princípio de que os outros pensam como nós, ou devem pensar como nós – porque em geral não pensam como nós –, mas do princípio de que, se queremos servir os outros (para lucrar com isso ou não), nós é que devemos pensar como eles: o que temos que ver é como é que eles efetivamente pen-sam, e não como é que nos seria agradável ou conveniente que eles pensassem (PESSOA, 1986, p. 622, grifo nosso). Esse trecho da obra de Fernando Pessoa pode ser facilmente relacionado com a intercessão existente entre mercado e estrutura organizacional. Jaworski e Kohli (1991) enfatizam que é interessante observar que não há motivos para crer que a estrutura organizacional não possa afetar a maneira como a organização chega ao consumidor, como estímulo à mudança e inovação. Fernando Pessoa também aponta que as relações entre mercado e estrutura organizacional podem ser expressas pela maneira de fabricar, de apresentar, de distribuir e de reclamar um artigo, a qual varia conforme a índole geral dos indivíduos que compõem Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 92 arte_angrad.pmd 92 16/08/2009, 11:27 Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia Didática: aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa em Sala de Aula o mercado onde se pretende vendê-lo (PESSOA, 1986). Nesse momento, o professor pode ilustrar este interlocução entre a literatura de Fernando Pessoa e Administração, com casos de organizações locais ou de renome nacional/internacional que atuam no comércio varejista. Desta forma, uma organização no contexto do varejo pode possuir variações na sua estrutura como: tamanho, tipos de mercadorias comercializadas, serviços prestados, preferência e desejo dos executivos (DUNCAN e PHILLIPS, 1963). Para Levy e Weitz (2000) a natureza da empresa varejista vai depender dos elementos utilizados pelo varejo para satisfazer as necessidades de um segmento específico de consumidores. Assim, quatro elementos são particularmente úteis para classificar os varejistas: (1) O tipo de mercadoria vendida; (2) A variedade e sortimento da mercadoria vendida; (3) O nível de atendimento ao cliente; (4) O preço da mercadoria. Pessoa (1986) revela que a evolução do comércio apresenta três tipos de comerciantes ou estruturas organizacionais voltadas ao varejo (mas não somente restritas a ele) que se manifestaram em diferentes momentos históricos, mas que coexistem na contemporaneidade. Os três tipos ou fases do comerciante consideradas por Fernando Pessoa (1986), que podem ser consideradas estruturas organizacionais na atualidade, são: • Primeira fase – o comerciante mercador. Neste período, o comércio tinha caráter totalmente empírico, em que prevalece o conceito de que ele (o comércio) se forma em si mesmo, sem qualquer elemento de organização; criado muito mais por questão de status do que por razões econômicas propriamente ditas. Não há evidências de aplicação metodológica na sua coordenação, a prática do comércio era marcada por impulsividade e iniciativa para lidar com as dificuldades situacionais que se apresentavam no cotidiano; • Segunda fase – o comerciante negociante. Diante da concorrência local e regional, que começa a emergir de modo quantitativo, as características que demarcam esta fase da evolução do comércio e de suas organizações é a prática sistematizada, embora instintiva, de processos como planejamento, organização e controle (contabilidade). Não havia ainda a preocupação de integrar tais processos num esforço único de coordenação; • Terceira fase – o comerciante industrial. Gerada a partir da intensificação do individualismo e do aparecimento nítido da concorrência nacional, fatos que obrigaram o comerciante a estudar tecnicamente e a utilizar os processos planejamento, organização e controle, dando assim ao seu comércio uma organização e coordenação parecidas com as presentes na indústria. As técnicas de marketing mais “agressivas” começam a ser empregadas para o desenvolvimento massificado do comércio. Neste sentido, conhecer o consumidor tem levado, durante anos, as organizações a adaptarem suas estruturas (como já visto na evolução dos tipos de comerciante exposto Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 93 93 16/08/2009, 11:27 Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior por Fernando Pessoa), de modo a atender da melhor maneira possível as necessidades do mercado e aumentar seu comércio. Tal exposição pode ser também aplicada na discussão de marketing, a ser retomada mais adiante neste trabalho. 2.3 Relações de poder A apresentação do tema “poder” para alunos de graduação pode ser facilmente relacionada com as contribuições de Fernando Pessoa para o tema. Esses textos podem servir como base para discussão, ajudando a assimilação do tema, e despertando a capacidade de análise dos alunos. Parte-se do pressuposto de que a essência do conceito de poder se dá pela proposição de que uma pessoa/organização, “A”, tem poder sobre outra, “B”, na medida em que pode levar “B” a fazer algo que não teria feito sem a intervenção de “A” (DAHL apud CROZIER, 1981). Tal relação pode ser observada na teoria do comércio revisitada em Fernando Pessoa ao mencionar que o “[...]) comerciante não tem personalidade, tem comércio; a sua persona-lidade deve estar subordinada, como comerciante, ao seu comércio; o seu comércio está fatalmente subordinado ao seu mercado, isto é, ao público que o fará comércio e não brincadeira de crianças com escritório e escrita” (PESSOA, 1986, p. 624). Para Max Weber (1965), o poder é um processo e uma capacidade relacional, distribuída de forma desigual, com o destino de criar e manter estruturas completas de interdependência e coordenação social. Já na visão de Karl Marx (1983), esse poder nasce de interesses oriundos das relações de produção, envolvendo a propriedade e o controle dos meios de produção. Michel Foucault (1979) afirma que o poder só existe na forma de ação e acima de tudo é uma relação de força. Esses conceitos clássicos na discussão de poder são úteis para enriquecer a questão da relação de poder e de subordinação do comerciante colocadas por Fernando Pessoa. Uma vez descrita a relação de poder entre o comerciante e seu mercado, é possível ainda exemplificar, utilizando as contribuições de Fernando Pessoa para o ensino das relações de poder, a maneira como essa subordinação se forma, na medida em que o comerciante tenta compreender o consumidor e atender suas necessidades. Pessoa (1986) afirma que essas informações obtidas diretamente com os seus consumidores situam-se em três níveis, e podem ser aplicáveis à área de marketing também (como será visto mais adiante neste trabalho). São eles, segundo Pessoa (1986), o econômico, o psicológico e o social. No nível econômico, o autor coloca que é preciso saber as expectativas de valor do cliente, levando em consideração a concorrência. Já no psicológico, ressalta-se a importância do conhecimento das especificidades (necessidades e aplicações) do consumidor. E no social, deve-se saber quais as condições sociais e políticas que estimulam os desejos de seus consumidores. Nesse momento, o professor pode ilustrar e facilitar o entendimento desta exposição com exemplos de produtos utilizados no cotidiano, como forma de ilustrar esses três níveis. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 94 arte_angrad.pmd 94 16/08/2009, 11:27 Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia Didática: aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa em Sala de Aula Nesse sentido, com base em Pessoa (1986), para as organizações terem êxito em suas atividades, é fundamental que conheçam o seu cliente para suprir suas vontades e seus desejos. Dessa forma, como visto em Fernando Pessoa (1986, p. 622): “Se queremos servir os outros (para lucrar com isso ou não), nós é que devemos pensar como eles [...], e não como é que nos seria agradável ou conveniente que eles pensassem”. Pressupõe-se que isso acaba por especializar esse interesse a tal ponto que ultrapassa o limite de seus consumidores, fazendo com que seus próprios funcionários entrem nessa lógica. Dessa forma, o seu funcionário também é seu cliente (o termo ‘cliente interno’ se faz presente nas organizações contemporâneas). O aspecto importante a se abordar é que, com essa lógica, a própria organização tende a ser vítima de sua ação (GOMES, EMMENDOERFER, QUEIROZ, SOUZA, 2007). Eis uma oportunidade para o professor inserir e revisitar a discussão de alienação tratada por Marx (1983) considerando a realidade das organizações contemporâneas. Assim, Karl Marx, que, elaborando uma crítica de seu tempo e opinando acerca da verdadeira essência do homem, considera que sua liberdade e independência, “a atividade livre e consciente”, não se podem fazer valer. Em sua opinião, por toda parte o homem é tirado a si mesmo, perdendo as autênticas possibilidades humanas de existência. Esse é o sentido daquilo que Marx (1983) chama de “auto-alienação” do homem. Mas como o conceito de alienação de Marx (1983) pode dar suporte ao argumento de Pessoa (1986)? Ora, Pessoa (1986) diz que o comerciante não tem personalidade, mas sim mercado. Dessa forma, ele (o comerciante) deveria se alienar enquanto pessoa independente, para pensar exclusivamente como criar/manter seu “mercado”. Além disso, Pessoa (1986), na discussão sobre as “algemas”, menciona as regras, colocadas pelo Estado, às quais o mercado e as estruturas organizacionais estão submetidas e que de certa forma impactam a restrição ou ampliação das relações de poder entre esses agentes. Observa-se a exposição de subtemas, relacionados ao poder do Estado, que podem ser explorados, sendo eles: subsídios e protecionismo (FRANCO, 2007). Na situação exposta, o professor pode solicitar aos alunos a busca de informações sobre o Estado e o governo brasileiro na atualidade, obtidas em jornais e revistas (impressos ou eletrônicos). Essas informações podem ser potencialmente relacionadas com as organizações locais, de acesso ou conhecimento do alunado, e demonstram a relação de poder entre o Estado e as organizações, bem como suas implicações econômicas, psicológicas, sociais e políticas. O professor também, ao discutir a situação anterior, pode provocar o debate em forma de júri simulado, onde a sala de aula é dividida em dois grupos de alunos, um lado agindo como defesa e o outro como acusador do assunto em questão. O foco do processo seria no fato de a relação comercial não ser espontânea, visto que a “ordem social não decorre da busca egoísta de seu interesse por parte de cada indivíduo isolado. [...] que as condições dessa cooperação sejam estabelecidas para toda a duração de suas relações”, e isto será feito por regras formais (jurídicas) e/ou informais (tradição, normas) (DURKHEIM, 1999, p. 200). Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 95 95 16/08/2009, 11:27 Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior Não menos importante, e como uma discussão contemporânea, podem-se especular interlocuções sobre a responsabilidade das organizações, cabendo ressaltar que Fernando Pessoa aponta sinais na sua discussão sobre a teoria e prática do comércio de uma preocupação com o desenvolvimento comunitário. Estando ele na vanguarda desta discussão social, mesmo que o tema “responsabilidade social” somente tenha ganhado importância pública nos últimos anos. Esse autor destaca que este seria um dos principais motivos de sua análise comercial: “[...] antes de mais nada, a mostrar claramente a importância social do comércio, e a mostrá-la àqueles mesmos que freqüentemente a esquecem ou a negam” (PESSOA, 1986, p. 626). 2.4 Interlocuções entre marketing e Fernando Pessoa Da mesma forma como visto em relação ao tema TGA/TO, Fernando Pessoa também apresenta aproximações com os temas “planejamento (estratégico) de marketing” e “composto mercadológico”, possibilitando a contextualização entre esses temas e estratégias de ensino. Embora Pessoa (1986) não exponha em sua prosa o termo “marketing”, mas sim comércio, entende-se neste artigo que a correlação entre esses dois termos seja válida e adequada enquanto estratégica didática, uma vez que Pessoa (1926a, p. 8) menciona algo semelhante à premissa do marketing e das estratégias organizacionais: “um comerciante, qualquer que seja, não é mais que um servidor do público. [...] Ora toda a gente que serve deve agradar a quem serve”. 2.5 Planejamento (estratégico) de marketing Em seu artigo “A essência do comércio”, Pessoa (1986) cita o exemplo do país que perdeu o mercado pelo grave erro de desconsiderar um importante fator crítico para formação do plano de marketing: não levou em conta as características ambientais e culturais do outro país para a fabricação e comercialização dos produtos, ou seja, não considerou as necessidades do mercado-alvo e não procurou conhecê-lo, mantendo-se no tradicionalismo de suas estratégias de marketing em vez de ter informações e flexibilidade diante do mercado. O professor, diante dessa exposição, pode buscar situações semelhantes, de conhecimento dos alunos, para contextualizar essa discussão na área de marketing, bem como inserir o subtema presente na contemporaneidade, que é a noção de “foco no cliente” (FRANCO, 2007). Por meio dessa ilustração, Pessoa (1986, p. 621) coloca “um comerciante, qualquer que seja, não é mais que um servidor do público, ou de um público; e recebe uma paga, a que chama seu ‘lucro’, pela prestação desse serviço. Ora, toda gente que serve deve, parece-nos, buscar agradar a quem serve. Para isso é preciso estudar a quem se serve”. Assim, o comerciante que agradar e estudar a quem serve poderá oferecer um produto ou serviço Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 96 arte_angrad.pmd 96 16/08/2009, 11:27 Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia Didática: aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa em Sala de Aula de acordo com os valores simbólicos e culturais que representam para o consumidor. Do contrário, o comerciante fecha os ouvidos, focando-se apenas em si mesmo e na obtenção de lucro, oferecendo, por exemplo, o produto a um preço sem tomar conhecimento do mercado. Eis um espaço para se pensar em articular as discussões de pesquisa de mercado com tal situação exposta na literatura de Fernando Pessoa. Assim, Pessoa (1986) critica aqueles que não fazem uma análise do mercado e não elaboram um planejamento estratégico de marketing, argumentando que são superficiais e imediatas, sem visão holística e de futuro. Apenas se aventuram na arte de comercializar, que se torna semelhante ao comércio primitivo, do tipo “comerciante mercador”, como na época do Renascimento. Pessoa (1986) destaca que esses comerciantes não pensam que, em vez de lucrar somente com cotações elevadas, poderiam conquistar uma grande quantidade de clientes a longo prazo, pelo conhecimento de seus anseios e conveniências de consumo. Esquecese que o mercado é inconstante, que sofre transformações a todo instante, necessitando de um planejamento de marketing para adequação e conhecimento satisfatório do mercado. Nesse momento, o professor poderia colocar em discussão essa própria colocação de Fernando Pessoa, e executá-la em forma de júri simulado também. Pessoa (1986) expõe três níveis pelos quais se deve fazer uma pesquisa de mercado. São eles o econômico, o psicológico e o social. No nível econômico, o autor coloca que é preciso saber as expectativas de preço do cliente, segundo a concorrência. Já no psicológico, ressalta a importância do conhecimento das especificidades do comprador. E no social, diz que se deve saber quais as condições sociais e políticas que estimulam os desejos de consumo dos compradores. Contudo, para cada país, região e individuo, o composto de marketing é distinto segundo as características do mercado consumidor, sendo que cada cliente possui a sua própria maneira de pensar e agir, mesmo sendo a humanidade, em essência, muito semelhante em diversos aspectos. É necessário dar atenção às opiniões do cliente para levantar as tendências de consumo, as expectativas de preços, o que ele espera do produto, os hábitos e desejos que determinam o composto de marketing, já que o cliente é um ator cultural complexo, que considera aspectos tangíveis e intangíveis dos produtos. Como já visto anteriormente, Pessoa (1986) destaca que o melhor caminho a seguir é analisar o que o cliente deseja, e satisfazê-lo, adaptando-se às necessidades do consumidor e da empresa, assim o lucro será obtido. E para isso o empresário não deve impor especificações, mas ouvir o cliente. Já que são os consumidores que criam a demanda por determinado produto ou serviço, conseqüentemente são eles vitais para o sucesso ou declínio da empresa. Por isso, o empresário deve estar disposto a servir, mas servir no sentido além do de “vender”. É preciso conquistar os clientes tornando-os fiéis às organizações. Pode-se aqui provocar nos alunos a busca de informações na biblioteca e fontes de Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 97 97 16/08/2009, 11:27 Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior dados (como periódicos na área de marketing) que diferenciem e aproximem o processo de marketing do processo de venda nas organizações. Levitt (1975) aponta as diferenças entre marketing e venda, afirmando que a venda se concentra nas necessidades do vendedor e o marketing, nas necessidades do comprador. A venda se preocupa com a necessidade do vendedor de converter seu produto em dinheiro; o marketing trabalha com a satisfação das necessidades do cliente por meio do produto e de todo o conjunto de coisas ligadas à sua fabricação, à sua entrega e, finalmente, ao seu consumo. Resgatemos o relato de Pessoa (1986) sobre o caso dos fabricantes ingleses que exportavam taças para as colônias inglesas na Índia encaixarem seus ovos quentes para comer, mas que elas não estavam adaptadas adequadamente ao tamanho dos ovos das galinhas indianas. Os fabricantes alemães, por sua vez, perceberam o fato e fizeram taças maiores, ideais para comportar os ovos indianos, já que estes eram maiores que os ovos das galinhas inglesas. Dessa forma, não precisaram alterar a qualidade do produto, nem mesmo diminuir o preço, e as conseqüências, sem dúvida, não foram as melhores para os fabricantes ingleses. Notou-se que as empresas alemãs foram habilidosas em transformar as necessidades da sociedade em uma oportunidade lucrativa, adaptando-se às reais necessidades do mercado. Percebe-se, a partir disso, a visão estratégica de marketing, trabalhado de forma a antecipar acontecimentos e a impulsionar o administrador à investigação do mercado potencial, à sua análise e observação das diferenças regionais, culturais, religiosas e sociais que determinam o sucesso das empresas no mercado. Levitt (1975) também coloca que a razão pela qual o desenvolvimento empresarial é ameaçado, retardado ou detido não é porque o mercado está saturado, mas porque houve uma falha administrativa. Reafirma-se com isso a importância da estratégia de marketing de forma a conquistar cada vez mais mercados e viabilizar a fidelização dos clientes. Continuando com a análise dos textos de Pessoa (1986) – que coloca que os fabricantes ingleses dominavam o mercado sem deixar espaço para a opinião dos consumidores, até o momento em que os alemães identificaram esse ponto fraco e conseguiram seu espaço, –, notamos mais uma vez o caráter estratégico do marketing. Nesse sentido, podese inferir que a dedicação ao cliente é a chave para a lucratividade. Kotler (2000a, 2003) diz que uma empresa pode perder dinheiro em uma transação específica, mas continuará se beneficiando, e muito, de um relacionamento duradouro. Essa é uma das grandes questões estratégicas para o crescimento e desenvolvimento das organizações. Nesse momento, é possível o professor provocar uma discussão sobre o uso do termo “estratégico” no planejamento de marketing, questionando a adequação de seu uso (até mesmo redundante), uma vez que as suas ações deliberadas impactam a administração estratégica das organizações. É importante salientar que empenhar-se na análise mercadológica é tarefa árdua para as organizações, pois há uma série de restrições advindas do meio externo. Em “As algemas”, Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 98 arte_angrad.pmd 98 16/08/2009, 11:27 Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia Didática: aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa em Sala de Aula Pessoa (1926b; 1986) afirma que se recomeçou a restringir, social e economicamente, a liberdade do indivíduo tolhendo-lhe, social e economicamente, a vida do comerciante. Além disso, Pessoa (1986) fala da legislação restritiva a da interferência do governo no comércio, discutindo até que ponto tal comportamento é benéfico ou prejudicial às empresas e à sociedade. Sabe-se que as decisões empresariais são afetadas pela política, e é por isso que as empresas têm que estar atentas, pois as leis sofrem variações, e algo que é permitido hoje pode não o ser no próximo ano. Daí a importância do planejamento (estratégico) de marketing e de sua contínua reavaliação. 2.6 Composto mercadológico Por meio dos textos em prosa de Pessoa (1926), é possível também estabelecer uma relação entre o composto mercadológico (mix de marketing) e o comércio. Quando ele se refere “a maneira de fabricar, de apresentar, de distribuir e de reclamar um artigo varia conforme a índole geral dos indivíduos que compõem o mercado onde se pretende vendê-lo”. Dessa forma, Richers (2000) apresenta, como uma possível opção de inter-relação ao tema tratado por Fernando Pessoa, sua abordagem dos “4 As”, que consistem num conjunto de tarefas ou funções que precisam ser coordenadas para que se possam realizar as tarefas operacionais de maneira seqüencial e a custos controláveis. Os quatro As do marketing são responsáveis pelo processo de lançamento de um determinado produto no mercado até sua entrega ao consumidor final. Os quatro As significam Análise, Adaptação, Ativação e Avaliação. O primeiro visa compreender as forças vigentes no mercado em que a empresa opera ou pode operar no futuro. O segundo visa ajustar a oferta da empresa as suas linhas de produtos e/ou serviços às forcas externas detectadas pela análise. A ativação é um conjunto de medidas destinadas a fazer com que o produto atinja mercados predefinidos e seja adquirido pelos compradores nas quantidades e com a freqüência desejadas. E, por último, a avaliação propõe exercer controles regulares e esporádicos sobre os processos de comercialização e interpretar seus resultados para realimentar o sistema com dados atualizados, a fim de permitir um ajuste nos futuros processos de marketing. Outro ponto importante neste estudo, e que também pode ser relacionado com a obra de Fernando Pessoa, é a estratégia de segmentação. A análise do mercado precisa ser cautelosamente preparada e dirigida, pois as funções de adaptação e ativação necessitam de um instrumental diferenciado. Pessoa (1986, p. 623) coloca que “a humanidade, sem dúvida, é a mesma em toda a parte. Sucede, porém, que em toda a parte é diferente”. Daí a importância da segmentação adequada dos diversos tipos de clientes, como forma de trabalho para o planejamento estratégico de marketing. Da mesma forma, quando uma empresa usa a difusão como estratégia, o executivo de marketing procura colocar seus produtos em qualquer ponto-de-venda e oferecê-los a qualquer pessoa independentemente da origem, idade ou manei- Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 99 99 16/08/2009, 11:27 Magnus Luiz Emmendoerfer, Ana Marcelina de Oliveira, Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz e Djalma Adão Barbosa Júnior ra de ser. O inverso ocorre quando ele utiliza a estratégia de segmentação, pois procura atingir determinadas faixas de mercado predefinidas e específicas. Portanto, o mix pode ser diferente para cada um desses casos, não apenas com referência a um ou outro instrumento, mas para todos. Nota-se assim a inter-relação entre os aspectos literários abordados por Fernando Pessoa e o ensino de marketing, a qual serve de exemplo a ser abordado em sala, considerando fatores como o mix de marketing e o público-alvo a ser atendido. 3. Para não concluir... A tentativa deste trabalho em expor as “Interlocuções entre Administração e Literatura como estratégia de ensino e aprendizagem” por meio da teoria e prática do comércio tratadas por Fernando Pessoa no ensino das disciplinas TGA, TO e Marketing não foi somente procurar na literatura luso-brasileira clássica “temas” pedagógicos tratados de forma romanesca. Esta literatura descreve os pontos de vista dos escritores sobre o seu tempo, as (des)venturas da experiência profissional dos autores, a denúncia do tradicionalismo, do autoritarismo e da doutrinação dos sistemas organizacionais de certa época a partir da produção literária. Trata-se, principalmente, de uma produção pedagógica que procura nos textos literários os instrumentos de reflexão que possam ou ajudar na formação dos futuros administradores, ou,como menciona Brayner (2005, p. 1), “estabelecer uma forma de diálogo silencioso capaz de proporcionar uma espécie de autoconstrução de si (perdão pelo pleonasmo). O dialogo ocorre a partir de diferentes perspectivas permitidas pela substância literária”. Isto é, proporcionar singularidade no interior de um mundo plural, uma capacidade de escolha, de julgamento e de decisão a partir de um ponto de vista descentrado que a literatura de Fernando Pessoa pôde fornecer. Neste sentido, compartilha-se da colocação de Russeff (2005, p. 251) “a ausência de um maior número de estudos acadêmicos que explorem a relação entre Literatura e Educação constitui uma das motivações propositivas deste texto; isto porque, afora as metodologias de ensino da literatura, não se tem muita coisa aproximando pedagogos e literatos”, bem como administradores e professores da área gerencial. Todavia, Pessoa (1986) demonstra que, “se o poeta é um fingidor”, ele apenas fingia ser pouco conhecedor de considerações importantes à discussão de temas relacionados a TGA, TO e Marketing, que sem dúvida demonstram contribuir para o debate e a realização de atividades interativas em sala de aula, convidando a uma reflexão crítica das contribuições artísticas e literárias de sua obra para a gestão na contemporaneidade. Sintetizando, como disse Lewin (1935) “nada é tão prático como uma boa teoria”. Por fim, atendendo, pois, à unidade indissociável da teoria e da prática, qualquer estudo sobre administração deve ser ensinado em conexão com a prática (mesmo que esta seja histórica ou literária não ficcional), mas sempre no quadro de uma dialética, nem prática sem teoria, nem teoria sem prática (DÓRIA, 1986). Eis a justificativa para o título desta seção: Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 100 arte_angrad.pmd 100 16/08/2009, 11:27 Interlocuções entre Administração e Literatura como Estratégia Didática: aplicação das obras em Prosa de Fernando Pessoa em Sala de Aula “para não concluir...”, a oportunidade de realizar mais pesquisas no futuro próximo envolvendo outros autores literários e ações interdisciplinares. Recentemente, notam-se tais esforços interdisciplinares entre ciências sociais aplicadas e literatura, como o trabalho de Franco (2007), envolvendo debates acerca de Fernando Pessoa e economia. Assim, não se pode negar o avanço e a beleza da tentativa de integrar outras áreas do conhecimento pela pluridisciplinaridade mencionada, como estratégia didática para formar profissionais de Administração mais reflexivos em relação às suas técnicas e práticas na sociedade. 4. Referências BRAYNER, F.H. A. Como salvar a educação (e o sujeito) pela literatura: sobre Philippe Meirieu e Jorge Larrosa, Revista Brasileira de Educação, n. 29, p. 63-72,maio/ago 2005. DÓRIA, A. Á. Fernando Pessoa: teórico da gestão comercial. Revista de Contabilidade e Comércio, n.193/196, v. XLIV, p. 59-72, junho. 1986. DUNCAN, D.; PHILLIPS, C. Retailing. 6. ed. Homewood: R. D. Irwin, 1963. DURKHEIM, É. Da divisão do trabalho social. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979. FRANCO, G. H. B. Economia em Pessoa. Rio de Janeiro: Reler, 2007. GOMES, L. de O. M.; EMMENDOERFER, M.L.; QUEIROZ, E.M. da S. M.; SOUZA, L.A. 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Magnus Luiz Emmendoerfer Professor e Pesquisador no Departamento de Administração da UFV Doutorando em Ciências Humanas: Sociologia e Política – UFMG Mestre em Administração CAD/CPGA/UFSC [email protected] Ana Marcelina de Oliveira Servidora pública federal, ocupa o cargo de Assistente de Administração na PróReitoria de Gestão de Pessoas da Universidade Federal de Viçosa (UFV). Tutora de sala do curso de Processos Gerenciais da Unopar - pólo de Viçosa (MG) Eugênia Maria da Silva Moraes de Queiroz Graduada em Ciências Contábeis/UFV e Trainee da Ernst & Young Auditores Independentes Djalma Adão Barbosa Júnior Graduando em Engenharia de Alimentos/UFV e Pesquisador da área de Gestão Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 102 arte_angrad.pmd 102 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces Antônio Dias Pereira Filho [email protected] Universidade Federal de Minas Gerais Résumé Cet article met en relief les principales interfaces entre la finance et le management stratégique et préconise l’importance du choix d’une approche transversale pour mieux comprendre certaines décisions de l’entreprise. En effet, on y cherche à repérer et analyser les divergences et convergences qui marquent les rapports entre ces deux matières. Le texte comprend trois parties. La première porte sur les écarts les plus frappants entre finance et stratégie, c’est-à-dire le paradigme sous-jacent, la saisie de l’environnement économique et le traitement de l’information. La deuxième est consacrée au repérage de leurs convergences, notamment celle qui concerne le lien stratégie - structure de financement. Dans la troisième partie on présente les considérations finales. Le message principal c’est que, malgré leurs différences, la finance et le management stratégique peuvent s’engager de façon assez profitable dans des projets communs pour traiter de sujets comme l’analyse des investissements, le lien stratégie - structure du capital, l’analyse financière et l’évaluation des entreprises. 1. Introduction Incontestablement, la finance et le management stratégique représentent deux champs d’études extrêmement riches et productifs en matière de recherches et de pratiques de gestion. Leurs interfaces sont également assez importantes. En effet, malgré l’existence de certaines divergences parfois considérées comme infranchissables, il est possible de repérer néanmoins certains sujets où le choix d’une démarche commune peut procurer des résultats très intéressants pour l’une et l’autre matière. Il s’agit, par exemple, des analyses menées dans le cadre des décisions d’investissements, ainsi que des recherches qui abordent le choix des moyens pour financer la mise en œuvre des stratégies des entreprises. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 103 103 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho On en voit que la finance et le management stratégique peuvent bénéficier d’un partenariat assez opportun. Cela s’avère particulièrement important dans le cadre du paysage concurrentiel contemporain, où la création et le soutien d’un avantage compétitif deviennent le mot d’ordre. L’objectif de ce papier est donc de mettre en relief les principales interfaces entre la finance et le management stratégique et de préconiser l’importance d’une approche transversale pour mieux comprendre certains phénomènes de la vie des entreprises. Plus précisément, on y cherche à identifier et à analyser les divergences et les convergences qui marquent souvent les rapports entre ces deux importantes matières dans le cadre de la gestion des entreprises, mettant l’accent, plus particulièrement, sur les considérations autour de la politique de financement de leurs stratégies. Le papier est organisé en trois temps. Dans un premier temps, nous présentons et discutons les divergences les plus importantes entre la finance et le management stratégique, c’est-à-dire le paradigme sous-jacent, la saisie de l’environnement économique et le traitement dispensé à l’information. Dans un deuxième temps, nous nous penchons sur le repérage de leurs principales convergences, mettant l’accent sur les rapports entre le choix stratégique et la structure de financement. Finalement, nous énonçons nos considérations finales. 2. Deux matières traditionnellement indépendantes et éloignées Bien que leurs racines se trouvent conjointement dans la microéconomie appliquée, la finance et le management stratégique ont pris des caps assez indépendants. En effet, chacune à son tour a centré ses problématiques sur les différents aspects qui entourent et intéressent les entreprises. Ainsi, on peut dire que la finance se penche, depuis les années 50, sur l’étude des mécanismes de plus en plus complexes des marchés financiers, sur l’analyse des affaires relatives aux décisions d’investissement, de financement et de partage du résultat aussi bien que sur les rapports engagés entre les différents agents économiques. Compte tenu de la façon dont ces sujets sont traités, la théorie financière se révèle une théorie plutôt normative et tournée vers la maximisation de la richesse et de l’utilité des actionnaires. L’article de Miller (1999) et l’ouvrage dirigé par Albouy (2003) permettent d’avoir un aperçu sur l’évolution de la pensée financière à travers l’analyse des apports de ses principaux auteurs. Par ailleurs, on dirait que depuis les années 60, le management stratégique centre ses efforts sur l’étude et l’analyse du lien entre l’organisation et l’environnement, de même que ses effets sur le processus de formulation stratégique de l’entreprise, s’avérant être une théorie essentiellement normative et prescriptive. 104 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 104 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. Les conséquences de cette dichotomie sont particulièrement visibles dans les énoncés de ces théories à l’égard des affaires qui touchent les organisations et qui font objet de leurs analyses. En d’autres termes, selon Lane, Cannella et Lubatkin (1999), la finance et le management stratégique mènent souvent à des croyances particulières par rapport à l’entreprise ainsi qu’à des normes et à des interprétations singulières concernant les résultats empiriques. Il ne faut toutefois pas oublier les inévitables comparaisons entre certaines de leurs prédictions et les recommandations qui en découlent (Gintrac et Labourdette, 1999). En ce qui concerne d’abord les principaux désaccords présents dans la littérature, nous retenons ici les trois plus remarquables, c’est-à-dire (i) le paradigme de référence, (ii) la prise en compte des influences de l’environnement économique sur les entreprises et (iii) le traitement souvent accordé aux informations (Bettis, 1983 ; Bromiley, 1990 ; Gintrac et Labourdette, 1999 ; Batsch, 2004). L’analyse de ceux-ci corrobore nettement la dichotomie entre la finance et le management stratégique car ils révèlent en effet les dissentiments au niveau des bases sur lesquelles sont analysés des sujets importants pour les entreprises. 3. Les paradigmes qui sous-tendent leurs analyses Voici la principale dissension entre la finance et le management stratégique. Plus particulièrement, parce qu’en fin de compte ce sont les paradigmes qui délimitent les contours des analyses effectuées dans le cadre de chaque domaine, définissant donc la perspective par laquelle sont menées les études et les recherches. En réalité, leur discordance provient essentiellement du fait que les modèles pris en compte reposent sur des objectifs différents par rapport à l’organisation et à ses membres. En d’autres termes, tandis que la finance cherche à contenter plus particulièrement les actionnaires, lesquels sont pris pour créanciers résiduels, le management stratégique centre ses préoccupations plutôt sur les attentes de l’ensemble des parties prenantes. Ainsi, au regard de la finance, l’entreprise est traditionnellement tenue pour une entité qui s’oriente vers la satisfaction des intérêts de ses propriétaires ou actionnaires, c’est-à-dire les apporteurs du capital financier. Par conséquent, la maximisation de leur richesse par le biais de la valorisation du prix de marché des actions, prend une importance capitale et devient même le but recherché au niveau du processus décisionnel de l’entreprise. Dans ce cadre, une gestion performante du niveau d’exposition aux risques devient également essentielle. En outre, autant qu’une branche de la microéconomie et fondant sur des principes de l’économie néoclassique, la théorie financière part du principe selon lequel les agents économiques sont rationnels et les informations sont parfaites. On y parle de l’hypothèse d’efficience des marchés financiers soutenue par Fama (1970). Cependant, il est évident que ces présuppositions ne correspondent pas tout à fait à la Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 105 105 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho réalité, étant donné que bien des imperfections sont toujours présentes dans les marchés (asymétrie d’information, coûts d’agence et de transaction etc.) et même chez les dirigeants (limitations cognitives, valeurs morales, croyances, émotions, comportements et raisonnements etc.). Ce que l’on trouve en effet, ce sont des marchés à efficience faible, rarement semi-forte, mais jamais forte. Plus récemment, on a vu se développer et se consolider deux nouvelles variantes d’analyse en finance, qui peuvent être considérées comme de vrais élargissements du paradigme financier traditionnel. Il s’agit de la finance comportementale (1) et de la finance éthique (2). La première approche s’appuie principalement sur la prise en compte des problèmes liés au comportement humain et leur analyse respective au regard d’une grille de nature plutôt psychologique. Le recours à la psychologie vise en effet à expliquer au mieux les comportements des agents et des marchés financiers, complétant donc les interprétations issues des analyses conventionnelles. D’après Aktas (2004), les apports de la finance comportementale pour la compréhension du fonctionnement réel des marchés financiers sont indéniables. À son tour, la finance éthique met l’accent particulièrement sur le concept de rationalité mixte, c’est-à-dire celle où les décideurs cherchent à intégrer des principes financiers à des préoccupations d’ordre éthique avec une propension à faire un certain sacrifice financier (le coût d’une position éthique) pour voir satisfait leur altruisme (Dupré et alii, 2005). À l’aide de l’analyse d’un échantillon de 425 entreprises européennes, ces auteurs concluent que la note éthique joue actuellement un rôle très significatif sur l’équilibre rentabilité - risque. Il est important de signaler encore que la prise en compte d’une vision éthique invite effectivement les agents économiques à envisager la satisfaction d’autres attentes au moment de leurs décisions. En ce qui concerne le paradigme dominant en management stratégique, on peut dire que celui-ci reconnaît l’organisation en tant qu’entité à mille facettes et constituée de plusieurs membres (les parties prenantes), à savoir les dirigeants, les actionnaires, les obligataires, les consommateurs, les fournisseurs, la communauté et le gouvernement. En vue d’analyser et de comprendre les rapports engagés entre ces acteurs, le management stratégique fait appel aux apports de bien d’autres théories comme la sociologie, la psychologie, la politique etc., ce qui procure une vision davantage réelle et large à l’égard des enjeux organisationnels. En faisant cohabiter plusieurs objectifs complètement disparates, l’organisation stratégique envisage la performance comme un concept plus ample, plus souple et plus adaptable. En réalité, il y est possible d’admettre la non-maximisation de la fonction utilité de toutes les parties prenantes ainsi que la non-réalisation de l’intégralité des objectifs fixés. Du coup, au lieu de centrer les actions sur une politique de résultats, le plus important est d’assurer la survie et la continuité de l’entreprise à long terme, en tenant compte du fait que les managers jouissent d’une rationalité limitée au sens de Simon (1960) pour recueillir, traiter et utiliser les informations dans le cadre du processus décisionnel. 106 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 106 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. Noe (2000) et Simerly et Li (2000) expriment bien l’esprit de l’organisation au regard du management stratégique, notamment en ce qui concerne les décisions de politique financière. Selon le premier, celle-ci peut être tenue pour le produit des choix délibérés dans un contexte stratégique et marqué par la présence de plusieurs agents avec leurs propres intérêts et attentes, ce qui renforce la nature compétitive de l’entreprise. Pour les derniers, le choix de la structure du capital y est plutôt la recherche d’options dans un milieu de plus en plus dynamique et incertain mais pas une affaire d’alternatives prédéfinies selon les règles d’une rationalité parfaite. C’est pourquoi la mise en place d’une structure de gouvernance adéquate devient une condition indispensable pour que l’entreprise réussisse dans la tâche de lever les ressources nécessaires au déploiement de ses activités, surtout quand les asymétries informationnelles sont assez importantes tel que dans les environnements dynamiques. 4. La prise en compte des influences de l’environnement économique sur les entreprises La finance et le management stratégique tiennent l’environnement économique pour une source importante d’influences sur les décisions de l’entreprise. Leur but commun est celui de chercher à saisir les opportunités et à réduire les menaces qui en découlent. La différence réside en fait dans le moyen par lequel l’un et l’autre essayent de l’appréhender et de l’intégrer aux analyses. Du point de vue du management stratégique, les influences du milieu où l’entreprise opère sont plutôt envisagées sous la perspective de l’incertitude (probabilités inconnues) dont les dimensions le plus souvent employées sont le dynamisme, la complexité et la munificence (Emery et Trist, 1965 ; Child, 1972 ; Lawrence et Lorsch, 1967 ; Duncan, 1972 ; Aldrich, 1979 ; Dess et Beard, 1984). Il est prévu que par le moyen de ces dimensions, le manager puisse saisir judicieusement les conditions environnementales et tenter de gérer au mieux les rapports entre l’organisation et son milieu en vue d’en tirer profit. À cet effet, il lui faudra choisir ou créer des stratégies pertinentes afin de bâtir un avantage compétitif pour surmonter la concurrence. Autrement dit, ce que le management stratégique propose c’est fondamentalement d’introduire les influences de l’environnement dans le processus de formulation stratégique de l’entreprise, y compris ses trois niveaux majeurs, c’est-à-dire la stratégie d’ensemble, la stratégie d’activités et la stratégie opérationnelle (Magakian, 2002). En gros, la stratégie dite d’ensemble est celle qui cherche à définir l’identité même de l’entreprise, les buts à poursuivre ainsi que les moyens pour ajouter de la valeur à ses différentes activités. Il s’agit d’une stratégie qui découle du niveau le plus élevé de la planification. Puis, compte tenu du cap déjà établi, la stratégie d’activités, par exemple celle de l’innovation, se penche sur la sélection des facteurs clés de succès Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 107 107 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho autant que des outils par lesquels l’entreprise fait face à ses rivaux dans l’arène concurrentielle. Finalement, il appartient aux stratégies opérationnelles de mettre en œuvre une démarche clairement destinée à combiner les ressources et les capacités de l’entreprise pour mener à bonne fin les stratégies choisies. Du point de vue de la finance, les impacts de l’environnement économique sur les décisions de l’entreprise sont plutôt analysés par le concept de risque (la probabilisation des aléas) dont les types principaux et plus couramment utilisés sont le risque de marché, le risque d’exploitation et le risque financier (Brealey et Myers, 2006). Il y en a encore d’autres comme les risques écologiques, juridiques, géopolitiques et stratégiques qui sont aussi importants. Chacun à son tour doit être mesuré et géré selon ses caractéristiques inhérentes, surtout parce que le monde contemporain est un monde de risques. Le recours à ces variables vise essentiellement à mesurer le plus objectivement possible le potentiel d’influence du milieu sur le processus décisionnel de l’entreprise, plus particulièrement dans le cadre de sa politique d’investissement et de financement. Une telle démarche est spécialement envisagée dans le cadre des définitions vis-à-vis de la stratégie d’ensemble et de la structure du capital de l’entreprise. En bref, le rôle de la gestion financière par rapport aux conditions du milieu concurrentiel de l’entreprise consiste à identifier, à quantifier et à gérer le risque auxquels l’entreprise est soumise dans le but de sauvegarder et d’augmenter sa valeur de marché. La rémunération du risque représente, elle aussi, un point de dissension entre la finance et le management stratégique, ce qui est bien souligné par Bettis (1983) et Gintrac et Labourdette (1999). À cet égard, la théorie financière ne prévoit que la rémunération du risque systématique ou de marché, celui qui est exprimé par le coefficient ßi ou coefficient de volatilité d’un titre individuel aux mouvements du marché (Sharpe, 1964). En d’autres termes, en finance on ne rémunère que le risque auquel toutes les entreprises sont assujetties et que l’on ne peut pas éliminer à l’aide d’une diversification optimale du portefeuille d’investissements. Ce genre de risque est donc considéré comme le seul à justifier un prix pour les efforts engagés en vue de mieux le gérer. En revanche, le management stratégique centre ses études et ses analyses précisément sur la recherche des moyens capables d’assurer une gestion performante des influences du risque non systématique ou spécifique (le secteur d’activité, par exemple), c’est-à-dire celui qui est particulièrement associé aux opérations de l’entreprise et dont la gestion ne doit pas être rémunérée vu qu’il est diversifiable. De ce fait, le travail des stratèges est parfois mis en question car, en se consacrant à la gestion du risque spécifique, ils ne s’engageraient pas à ce qui intéresse vraiment les investisseurs en matière de management des risques. Pour nous, ce genre de divergence ne représente qu’une conséquence naturelle des objectifs de recherche définis dans le cadre de la finance et du management stratégique. En réalité, les stratèges et les financiers ne font plus que leur travail conformément aux fondements de leurs domaines. 108 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 108 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. 5. Le traitement souvent accordé aux informations L’information joue manifestement un rôle très important dans le cadre des systèmes économiques. La finance et le management stratégique en savent. Toutefois, leur accord à cet égard ne va pas plus loin. Cela parce que ces théories divergent quant aux avantages que procure à l’entreprise la communication avec les marchés sur ses décisions ou ses projets. Plus précisément, leur désaccord repose sur les arguments autour du bénéficiaire final de l’information annoncée autant que des conséquences de celle-ci sur la valeur de l’entreprise. D’une part, pour le management stratégique, une gestion visant à restreindre la diffusion d’informations est envisagée comme une condition indispensable pour que l’entreprise puisse bénéficier au mieux de ses innovations et, par contrecoup, surmonter sa concurrence. On peut dire que l’information est tenue ici pour une espèce de « secret d’État », et donc quelque chose qui doit être protégé en permanence. Derrière cette position, on trouve l’idée selon laquelle la diffusion de l’information n’intéresse que les rivaux de l’entreprise dans le marché (Bettis, 1983). Sa divulgation représente ainsi une vraie incitation pour que les concurrents puissent essayer de porter tort aux actions de l’entreprise en vue de construire et de soutenir son avantage compétitif. Il s’ensuit donc une corrélation négative entre l’information rendue publique par l’entreprise et sa capacité à créer de la valeur à l’aide de ses innovations. Tableau 1: Principales divergences entre finance et management stratégique. Divergences Finance Management Stratégique Le paradigme sous-jacent Envisage l'entreprise comme une entité qui s'oriente vers la satisfaction des intérêts de ses propriétaires ou actionnaires. Reconnaît l'organisation en tant qu'entité à mille facettes et constituée de plusieurs membres (les parties prenantes). La prise en compte des influences de l'environnement Les impacts de l'environnement économique sur les décisions de l'entreprise sont plutôt analysés par le concept de risque (la probabilisation des aléas) dont les types principaux sont les risques de marché, d'exploitation et financier. Les influences du milieu où l'entreprise opère sont plutôt envisagées sous la perspective de l'incertitude (probabilités inconnues) dont les dimensions le plus souvent employées sont le dynamisme, la complexité et la munificence. Le traitement de l'information Soutient l'idée selon laquelle l'entreprise partage avec le marché les avantages d'un transfert indirect d'information. L'information n'intéresse que les rivaux de l'entreprise dans le marché, pouvant même les permettre de porter tort à ses actions. D’autre part, on trouve dans la théorie financière l’idée selon laquelle les informations données au marché, notamment par le moyen des signaux (Leland et Pyle, 1977 ; Ross, 1977) au lieu de la forme directe, jouent un rôle très important afin d’améliorer la qualité de ses prévisions et de ses évaluations à l’égard de l’entreprise et de son avenir. Dans ce Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 109 109 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho cas, les décisions en matière de structure du capital et de politique de dividendes représentent les moyens les plus efficaces pour faire parvenir au marché les informations concernant la qualité financière d’une entreprise (Bhattacharya, 1979 ; Myers et Majluf, 1984 ; Klein, O’Brien et Peters, 2002). À cet égard, le recours à l’endettement, tout comme une annonce de dividendes, est considéré comme un signal positif. Ainsi, grâce à une interprétation adéquate des signaux émis par l’entreprise, le marché financier devient capable d’anticiper au mieux le profil de ses flux de trésorerie et de ce fait d’ajuster la prime de risque requise. On s’attend à ce que cette prime soit plus faible du fait de la réduction de l’asymétrie d’information, menant à une baisse du coût du financement. En conséquence, l’entreprise peut bénéficier d’une meilleure appréciation de sa valeur de marché. Bref, on pourrait dire que la finance soutient que l’entreprise partage avec le marché les avantages d’un transfert indirect d’information. Le Tableau-1 ci-dessous synthétise les trois divergences que nous venons d’analyser. 6. Serait-il possible de les envisager dans un projet commun? Conformément à ce que nous avons vu précédemment, la finance et le management stratégique révèlent des positions assez différentes par rapport à certains aspects de la vie économique des organisations. Bien évidemment, chacune à sa façon, s’efforce d’offrir la meilleure interprétation des soucis qui en découlent. Selon les paradigmes de référence, leur principale dissension semble porter sur le bénéficiaire majeur du résultat des décisions et actions de l’entreprise : les actionnaires du côté de la finance et l’ensemble des parties prenantes selon le point de vue du management stratégique. Dans ce cadre, la question qui se pose maintenant est de savoir s’il serait possible d’envisager quand même ces deux théories travaillant ensemble. Bien des auteurs, tels que Bettis (1983), Oviatt (1984), Barton et Gordon (1987), Bromiley (1990), Kochhar (1997), Gintrac et Labourdette (1999), Simerly et Li (2000), O’Brien (2003), Pereira Filho et Louvet (2008) et Schwenker et Spremann (2009) soutiennent l’idée selon laquelle cela est parfaitement envisageable. Pour Bettis (1983), par exemple, le rapprochement entre la finance et le management stratégique peut être même considéré comme fondamental pour leurs propres évolutions en tant que domaines d’étude et de recherche en sciences de gestion. En effet, selon lui, elles doivent s’efforcer de tenir compte de leurs apports mutuels. Dans cette même ligne de pensée, Bromiley (1990) et O’Brien (2003) proposent l’adoption d’une vision plutôt stratégique dans le but de détailler et d’analyser les affaires qui sont au centre de leurs préoccupations communes, tel que le choix de la structure du capital de l’entreprise. 110 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 110 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. Au-delà des apports de la finance au management stratégique en matière de mesures de rentabilité et performance (Batsch, 2004), trois grands sujets se prêtent à une approche conjointe et efficace bâtie sur leurs contributions réciproques (Gintrac et Labourdette, 1999). Ce sont : (i) la théorie des options réelles appliquée à la finance dans la mesure où la stratégie ne représente qu’un vrai ensemble d’options à la disposition de l’entreprise ; (ii) l’étude des liaisons entre les modes de financement et les choix stratégiques de l’entreprise ; (iii) les rôles joués par les différents acteurs (les parties prenantes) dans le cadre des décisions à long terme des entreprises. Indubitablement, ces trois sujets représentent pour la finance et le management stratégique de véritables boulevards en termes d’études et de recherches. Cela devient encore plus évident quand on les envisage à la lumière du contexte hyperconcurrentiel vécu par les entreprises surtout depuis la deuxième partie de la décennie 90. Autrement dit, plongées dans des conditions environnementales de plus en plus dynamiques et incertaines, les organisations sont souvent obligées de développer et d’obtenir des nouveaux moyens capables de les doter de capacités nécessaires pour rivaliser efficacement et assurer leur continuité. Dans un tel cadre, les apports particulièrement issus du management stratégique et de la finance prennent une importance fondamentale. Ainsi, pendant que les stratèges se penchent sur la formulation et la sélection de stratégies visant à faire face autant qu’à tirer profit des conditions du milieu, c’est aux financiers de choisir la structure de financement la plus pertinente pour les parfaire. Dans cette perspective, deux avancées récentes se dégagent. Du côté du management stratégique, il s’agit de la théorie fondée sur les ressources et les capacités de l’entreprise. Du côté de la théorie financière, ce sont les progrès au niveau de l’approche des options réelles (3) qui méritent d’être retenus. Selon Mahoney (2005), ces théories sont en train de permettre une évolution considérable en matière de recherche et de pratique dans les domaines du management stratégique, de la finance ainsi que de la théorie organisationnelle. Il ajoute encore qu’elles peuvent même être considérées comme l’embryon d’un nouveau paradigme en sciences de gestion. 7. La rencontre au niveau d’analyse des investissements On peut tenir compte ici de deux aspects de rapprochement entre la finance et le management stratégique. Le premier est relatif aux évolutions au niveau de l’identification, de la sélection et de l’analyse des opportunités d’investissements grâce au recours à l’approche des options réelles. Le deuxième se rapporte aux propositions de Charreaux (2002) en vue de bâtir une nouvelle théorie d’évaluation au moyen d’un examen détaillé du processus de création de telles opportunités. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 111 111 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho Actuellement, les méthodes d’analyse habituelles comme le budget d’investissement et le flux de trésorerie actualisé, ne semblent plus adéquates pour évaluer la viabilité économique des opportunités d’investissements des entreprises à forte croissance qui sont assez présentes sur le marché. En effet, les entreprises étant plongées dans un milieu hyperconcurrentiel où le dynamisme et l’incertitude sont les traits marquants, ces opportunités deviennent multiples, le débit d’information est immense et changeant, donc il leur faut disposer de beaucoup de souplesse afin de s’adapter aux événements imprévisibles au départ et en tirer profit (Trigeorgis, 1993). Un rôle plutôt actif est ainsi envisagé pour leur évaluation. Il s’agit alors d’une perspective d’analyse pour laquelle les méthodes traditionnelles révèlent des limites importantes qui les empêchent de l’accomplir avec efficacité. À vrai dire, leur utilisation est davantage performante lorsque les flux de trésorerie des projets sont suffisamment prévisibles, ce qui ne correspond pas toujours à la réalité. Ainsi, en représentant un progrès considérable par rapport aux outils traditionnels d’analyse, la théorie des options réelles permet effectivement de faire le pont entre la finance et le management stratégique dans la mesure où elle met à disposition une démarche davantage pertinente pour évaluer les opportunités d’investissements. Grâce au recours à cette approche, il est possible d’introduire à la fois des critères d’évaluation du marché financier dans la pensée stratégique aussi bien que la réalité stratégique des entreprises dans le cadre des analyses financières (Reuer et Tong, 2005). On peut donc dire que les échanges entre ces deux domaines y trouvent un terrain extrêmement fertile. Le recours au raisonnement des options réelles contribue considérablement à l’analyse des décisions d’obtention et d’affectation des ressources dans les entreprises. En effet, elle offre les conditions techniques nécessaires pour un traitement plus complet et plus efficace de l’incertitude, car elle permet un élargissement significatif de l’ensemble des informations importantes pour l’évaluation d’un projet. C’est la raison pour laquelle cette approche est de plus en plus utilisée pour évaluer les stratégies de l’entreprise qui visent surtout à la création ou au maintien d’un avantage compétitif soutenu, tel que les projets en recherchedéveloppement. Dans ces cas, l’incertitude inhérente à la création d’actifs stratégiques ou spécifiques est très importante. La flexibilité est une caractéristique marquante des options réelles. Celle-ci peut être identifiée tant au moment de décider la réalisation d’un investissement qu’après sa mise en route. En d’autres termes, les démarches qui se réfèrent aux options réelles prévoient essentiellement la possibilité de choisir le moment le plus opportun pour entreprendre un projet, de le différer, voire de le transférer ou de l’abandonner. En permettant de déterminer la valeur de chacune de ces alternatives, les options réelles aident également à découvrir d’autres opportunités éventuellement cachées. De ce fait, les décideurs arrivent à jouir d’une marge de manœuvre considérable qui permet d’ajuster leurs actions futures aux conditions de marché qui n’ont pas été prévues au départ ou 112 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 112 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. d’une nouvelle réaction concurrentielle, cela rendant plus élevée la valeur d’une opportunité d’investissement (Trigeorgis, 1996 ; Mahoney, 2005). Selon ce dernier auteur, il convient encore de noter les apports de la théorie des options réelles aux outils de la théorie des jeux favorisant considérablement son développement, spécialement quant aux réactions stratégiques. D’après lui, c’est un domaine de recherche qui promet beaucoup. Plus récemment, une nouvelle perspective d’intégration de la finance et du management stratégique se dégage des propositions de Charreaux (2002) en vue de construire une théorie d’évaluation plus complète et capable même de dévoiler la génération des flux de trésoreries dans les entreprises.À son avis, cela peut être vu comme un paradigme alternatif pour la finance. En effet, il s’agit d’une grille d’analyse qui envisage le recours aux apports de la théorie de l’investissement ainsi qu’à ceux de la théorie des ressources et capacités de l’entreprise, s’appuyant sur une conception de firme plutôt cognitive. Ce concept est particulièrement discuté chez Zingales (2000) et Charreaux (2002). À l’origine de ses analyses, Charreaux (2002) identifie surtout l’inaptitude des démarches traditionnelles d’évaluation à bien comprendre la génération des flux de trésorerie dans les entreprises contemporaines. Celles-ci sont moins intégrées verticalement et de plus en plus sujettes à une concurrence intense et importante où l’innovation joue un rôle inéluctable. En outre, elles sont davantage tributaires du capital humain pour la création des rentes. Ainsi, plutôt que de saisir et d’analyser les opportunités d’investissements, l’objectif des évaluations consiste désormais à étudier et à comprendre comment ces opportunités sont effectivement construites par l’entreprise à l’aide de son capital humain et, par contrecoup, la manière dont les flux de trésorerie se sont effectivement faits. Il s’avère que ce raisonnement donne lieu à une voie de recherche assez riche et importante en finance, mais qui requiert quand même bien des réflexions surtout en ce qui concerne les démarches méthodologiques. 8. Les choix stratégiques et les modes de financement Conformément à ce que l’on peut constater dans la littérature, c’est dans le cadre des recherches dont l’accent est mis sur l’étude des liens entre les modes de financement et les choix stratégiques que la finance et le management stratégique trouvent les plus grandes possibilités de travailler ensemble avec efficacité. De nombreux auteurs attirent l’attention sur le besoin d’une adéquation entre la stratégie choisie par l’entreprise et sa politique de financement. Citons, entre autres, les apports de Barton et Gordon (1987 et 1988), Allen (1993), Kochhar (1997), Kochhar et Hitt (1998), Vicente-Lorente (2001), Abad (2002), Li et Simerly (2002), O’Brien (2003) et David, O’Brien etYoshikawa (2008). Cette orientation devient encore plus importante lorsqu’on envisage les enjeux autour des politiques stratégiques et financières de l’entreprise. Dans ce cas, parvenir à un Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 113 113 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho dénominateur commun qui convienne le mieux aux acteurs engagés devient une tâche essentielle pour la réussite d’une stratégie. 9. Les contraintes imposées aux politiques stratégiques et financières D’après Johnson, Scholes et Fréry (2002), la relation entre les ressources financières et la stratégie de l’entreprise s’inscrit dans un contexte très large où le manager doit faire preuve de souplesse et d’expertise. En effet, au dire de ces auteurs, toute organisation est forcément confrontée à trois niveaux de contraintes dans le cadre de sa politique stratégique et financière, soit (i) la création de valeur actionnariale, (ii) les techniques de financement et (iii) les attentes financières des parties prenantes. Donc, pour mener à bien son plan stratégique, l’entreprise doit les prendre effectivement en compte de même qu’elle doit chercher à établir un alignement judicieux entre la stratégie choisie et les nombreuses attentes d’ordre financier. Pour ce qui est de la création de valeur actionnariale, Hirigoyen (1993) affirme que celle-ci peut être envisagée comme le cœur même du renouvellement des modèles d’analyse liant le management stratégique et la finance. Engagée dans cette optique, l’entreprise s’efforce toujours d’obtenir et d’utiliser de façon optimale les ressources en vue de satisfaire les attentes des actionnaires, plus particulièrement en matière de rémunération du capital et de maximisation de leur richesse. Pour y arriver, il faut donc une action conjointe du management stratégique et de la finance. Le management stratégique s’engageant essentiellement dans la recherche ou la création de bonnes opportunités d’investissements. La finance, à son tour, se penchant sur la réduction du coût du capital et, par contrecoup, sur la maximisation de la rentabilité des investissements. On dirait que ces engagements définissent en fait les contours des actions managériales dans le cadre de la création de valeur. De surcroît, on y voit le versant financier jouant l’un de ses rôles majeurs à la lumière de son paradigme dominant. De même, les considérations à l’égard des techniques de financement prennent une place plutôt importante dans le cadre du processus global de génération de valeur. Plus précisément, il leur appartient de trouver l’équilibre nécessaire entre les risques stratégiques et les risques financiers afin que l’entreprise puisse mettre en œuvre ses stratégies au moyen d’un soutien financier le plus congruent possible. Il y a aussi la multiplicité des attentes financières issues des parties prenantes auxquelles une organisation est plus ou moins sensible suivant l’importance de chacun de ses membres. Afin de parfaire ses objectifs, il ne lui reste qu’à trouver les moyens capables de les satisfaire. Évidemment, ces attentes sont loin d’être homogènes et requièrent de l’entreprise un effort considérable pour éviter qu’elles nuisent au choix et à la mise en œuvre des stratégies 114 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 114 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. visées. Il s’avère que le succès d’une stratégie à long terme passe forcément par la satisfaction des attentes de tous ceux qui sont directement ou indirectement concernés. La prise en compte de ces trois contraintes permet donc de souligner que le recours à une analyse par moyen d’une application conjointe des apports de la finance et du management stratégique peut beaucoup aider à comprendre certaines des principales questions qui touchent les organisations, particulièrement en ce qui concerne les décisions de financement de leurs stratégies. Il convient de dire également que cela prépare le terrain aux chercheurs qui ont de l’intérêt sur ce sujet. À cet égard, Oviatt (1984) et Kochhar (1996) considèrent les théories de l’agence (Jensen et Meckling, 1976) et des coûts de transaction (Williamson, 1975, 1985) comme les ponts les plus solides pour approcher ces deux disciplines vis-à-vis des motivations managériales au sein des entreprises. 10. Un mariage envisageable entre la stratégie et les moyens de financement Les analyses précédentes suggèrent que les théories financières et stratégiques peuvent constituer un partenariat suffisamment profitable pour analyser les questions concernant le financement des stratégies choisies par les entreprises. D’ailleurs, c’est au niveau des politiques d’obtention et d’affectation de ressources que les interactions entre ces deux théories se manifestent le plus souvent. En effet, toute stratégie implique forcément, d’une façon directe ou indirecte, l’acquisition, le développement ou du moins la mise au niveau de certains types d’actifs (tangibles ou intangibles) de telle sorte qu’elle puisse effectivement être matérialisée. Cet enchaînement peut être constaté, par exemple, dans le cas d’une stratégie d’innovation dont la mise en œuvre implique inévitablement la création d’actifs spécifiques ou stratégiques qui rend l’entreprise davantage hétérogène et compétitive par rapport à ses concurrents sur le marché. En effet, c’est dans un tel cadre qu’une entreprise se lance dans la dure tâche de lever les moyens financiers les plus pertinents pour financer les investissements nécessaires à la mise en route de ses stratégies. La théorie stratégique suggère une position nette pour régler cette affaire. Plus précisément, elle propose un ajustement judicieux ou un coalignement entre les conditions environnementales saisies, la stratégie choisie et la structure de financement. C’est l’une des conditions les plus essentielles pour qu’une entreprise puisse parvenir à son objectif de créer et de soutenir un avantage compétitif et, par contrecoup, d’assurer sa survie. Ainsi, au-delà de bien sélectionner la stratégie la plus pertinente pour affronter les conditions environnementales sur place, il est indispensable que l’entreprise choisisse également la structure du capital la plus adéquate à son financement. C’est pourquoi on peut dire – dans une variation de l’adage de Chandler Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 115 115 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho (1962) – que la structure du capital suit la stratégie de l’entreprise. Si cet ajustement a lieu, des impacts positifs sur la performance économique de l’entreprise sont attendus. Les travaux de Barton et Gordon (1987 et 1988) peuvent être considérés comme les premiers à suggérer le recours à une approche stratégique pour envisager le mécanisme du choix de la structure du capital. En effet, ils envisagent même la possibilité selon laquelle les apports du management stratégique peuvent compléter les théories financières en matière de décisions de structure du capital. Cela parce que jusqu’à présent aucune théorie financière a tout à fait été capable d’expliquer quels sont effectivement les déterminants des décisions de financement des entreprises. Dès lors ce sujet attire de plus en plus l’attention des chercheurs en stratégie. Ainsi, le message majeur qui se dégage des principales études réalisées c’est que la stratégie d’ensemble influence le choix de la structure du capital de l’entreprise, notamment à travers les impacts sur la performance et sur le risque (Barton et Gordon, 1988 ; Kochhar et Hitt, 1998). De même, les stratégies dites compétitives (d’activités) – c’est-à-dire celles qui reposent sur la recherche d’un positionnement de l’entreprise dans le marché (la différenciation, la domination par les coûts ou l’innovation) – influencent les décisions de structure du capital (Balakrishnan et Fox, 1993 ; Jordan, Lowe et Taylor, 1998 ; VicenteLorente, 2001 ; Abad, 2002 ; O’Brien, 2003 ; David, O’Brien et Yoshikawa, 2008). Plus précisément, ces stratégies se concentrent sur les spécificités de l’entreprise et sa valeur globale en vue de construire et défendre un avantage concurrentiel, ce qui implique forcément le développement d’actifs stratégiques. Williamson (1988) fait appel à la caractéristique de spécificité de ce genre d’actif pour proposer, dans le cadre d’une application de la théorie des coûts de transaction, une optique davantage stratégique concernant le choix de la structure du capital des entreprises. En corroborant cette optique, Kochhar (1997) évoque l’importance de la capacité de gestion financière de l’entreprise, plus particulièrement dans les limites d’une stratégie compétitive fondée sur la possession d’actifs stratégiques. En effet, c’est à cette capacité préconisée de lever les moyens financiers nécessaires pour le déploiement de la stratégie choisie. L’auteur suggère que l’entreprise doit chercher à mettre sur pied une structure de financement et de gouvernance qui soit capable de créer les conditions nécessaires à l’accomplissement de ses visées face au milieu concurrentiel et, par conséquent, à toucher des rentes de ses actifs stratégiques. Donc, l’harmonie entre la politique financière et la stratégie compétitive choisie est tenue pour une condition fondamentale pour parvenir à cette fin. Il ne faut pas oublier quand même qu’en cas de désajustement entre ces dimensions, l’entreprise est normalement pénalisée en matière de performance (Simerly et Li, 2000 ; O’Brien, 2003). Il convient de souligner ici que l’intérêt sur le lien structure du capital - stratégie compétitive est devenu encore plus important dès que Porter (1992) a attiré l’attention 116 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 116 16/08/2009, 11:27 La Finance et le Management Stratégique: un Regard sur leurs principales Interfaces. sur les pertes de compétitivité globale des entreprises étatsuniennes. D’après lui, cela serait une conséquence du système financier en vigueur aux États-Unis, lequel privilégie surtout la recherche de rentabilité à court terme. Ce modèle, ajoute-t-il, amène les managers à préférer le plus souvent les opportunités d’investissements dont la période de remboursement est plus courte, empêchant donc la sélection des projets à caractère stratégique qui sont par nature à long terme. Cependant, l’auteur ne tient pas compte des avantages procurés par ce système, principalement en ce qui concerne le degré d’ouverture et le débit de l’information. Finalement, et à l’instar de Kochhar (1997), Abad (2002) considère la politique financière de l’entreprise comme une vraie source d’avantage compétitif elle-même. Selon lui, à la suite de la sélection de la stratégie la plus pertinente pour atténuer les menaces et saisir les opportunités du milieu concurrentiel, il appartient à la structure du capital d’assurer effectivement sa mise en œuvre en lui procurant les ressources nécessaires. En outre, l’auteur suggère qu’une orchestration parfaite au niveau de la structure de financement puisse compenser ou du moins mitiger les effets négatifs issus de l’environnement dans lequel l’entreprise opère. Dans le Tableau-2 ci-dessous nous présentons les principales convergences entre la finance et le management stratégique. Tableau 2: Principales convergences entre finance et management stratégique. Convergences Finance et management stratégique - L'analyse d'investissements - L'analyse financièreL'évaluation des entreprises - Le lien stratégie - structure du capital - L'analyse du rôle des parties prenantes dans le cadre des politiques à long terme Dans ces cas on peut dire que la construction et la mise en œuvre d'une grille d'analyse fondée sur les apports mutuels de ces deux matières peuvent procurer des résultats plus robustes pour l'une et l'autre. 11. Considérations finales Les repères présentés au cours de cet article permettent de constater que, malgré leurs nuances, la finance et le management stratégique peuvent effectivement s’engager de façon assez profitable dans des projets communs en vue de traiter certains sujets qui touchent les organisations. Selon la littérature, tel est le cas de l’analyse des opportunités d’investissements et, principalement, des décisions concernant le choix de la structure de financement des stratégies.Au-delà de ces sujets, on peut ajouter également l’analyse financière et l’évaluation des entreprises comme des thèmes où une approche transversale s’avère être extrêmement pertinente, aidant même à produire des résultats plus robustes et efficaces. Finalement, et selon les évidences évoquées tout le long de ce travail, il nous faut dire que la construction des grilles d’analyse ancrées sur des apports réciproques de la Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 117 117 16/08/2009, 11:27 Antônio Dias Pereira Filho finance et du management stratégique permet une compréhension plus profonde et entière des phénomènes organisationnels. Au bout du compte, cela peut même rendre plus complètes les analyses réalisées individuellement par chacune de ces matières. 12. Bibliographie ABAD, J. V. La relación entre la estructura financiera y la estrategia competitiva de la empresa desde el punto de vista del control del riesgo : una mención especial a la estrategia de diferenciación. Revista Galega de Economía, v. 11, n. 1, p. 209-232, 2002. AKTAS, N. La finance comportementale : un état des lieux. Reflets et Perspectives de la Vie Économique, v. XLIII, n. 2, p. 19-33, 2004. ALBOUY, M. (Dir.). 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Inefficient markets : an introduction to behavioral finance. London : Oxford University Press, 2000 et Broihanne Marie-Hélène, Merli Maxime et Roger Patrick. Finance comportementale. Paris : Economica, 2004. (2) Voir Dobson John. Finance ethics : the rationality of virtue. Lanham : Rowman & Littlefield Publishers, 1997 afin de mieux exploiter le sujet. (3) Afin d’en avoir une étude plus détaillée : Schwartz Eduardo S. et Trigeorgis Lenos. Real options and investment under incertainty : classical readings and recent contributions. Cambridge MA : MIT Press, 2004. (1) Antônio Dias Pereira Filho Professor da Universidade Federal de Minas Gerais Doutor pela em Sciences de Gestion pela Université Pierre Mendès France, Grenoble 2. [email protected] Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 121 121 16/08/2009, 11:27 arte_angrad.pmd 122 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula Assumptions and Practices of Management Teachers in the Classroom Luiz Eduardo da Silva Amaro [email protected] Ilsa Solka de Lemos Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS Resumo O mundo contemporâneo vem exigindo, dos administradores responsáveis pela gestão das organizações, competências para interpretar e agir sobre as circunstâncias, adaptandose, quando necessário, à sua dinâmica. Para isso, a formação desses profissionais, a cargo dos cursos de Administração, deve-se basear em aspectos tanto teóricos quanto práticos, além de desenvolver, nos futuros gestores, a capacidade de aprender a aprender. Este artigo especula sobre as premissas e práticas do professor de Administração em sala de aula, locus típico do processo de ensino-aprendizagem. Foram entrevistados 57 professores de 13 cursos da grande Porto Alegre, nos quais foi aplicado um questionário estruturado, versando sobre dois dos quatro pilares do conhecimento – o saber conhecer e o saber fazer. Os resultados permitem supor que ainda há uma parcela pequena, mas importante, dos professores de Administração para os quais os processos de ensino e de aprendizagem devem se dar basicamente em sala de aula, de maneira rotineira, visando formar especialistas que, na opinião da amostra, já sabem como aprender. Tais hipóteses deverão ser testadas em estudos mais conclusivos. Abstract The world nowadays has demanding, from the managers, competences to interpret and act on the circumstances, adapting its dynamics, when necessary. In order to accomplish it, the education of these professionals by the Management programs must be based on both theoretical and practical aspects, besides the development, in the managers-to-be, the capacity of learn how to learn, that is to say, the deuterolearning. This article focuses Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 123 123 16/08/2009, 11:27 Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos on the assumptions and practices of Management teachers in the classroom, typical locus of teaching-and-learning processes. 57 professors from 13 courses in the metropolitan area of Porto Alegre answered an structured form, a survey on two off four cornerstones of knowledge, namely “know-how to know” – or learn – and “know-how to do”. The results allow the supposition that a small but still important part of Management teachers, those to whom the processes of teaching and learning must take place in classroom, in an routine way, shaping specialists that, in the sample’s opinion, already know how to learn. Such hypothesis should be tested through more conclusive studies. 1. Introdução Diante de um mundo dinâmico, instável e, até mesmo, imprevisível, as organizações vêm exigindo recursos humanos cada vez mais qualificados. No entanto, elas têm reclamado da dificuldade de encontrar profissionais com os requisitos necessários para os cargos disponíveis. No meio desse problema, estão as instituições de ensino superior (IES) e seus cursos de Administração, responsáveis por formar os gestores de que as organizações necessitam. Completando o quadro, têm-se os professores, cujas atuações dentro de sala de aula podem ser decisivas para a superação desse problema. Se há poucas décadas um diploma universitário era o passaporte para a ascensão social, hoje ele se tornou uma exigência para o mundo profissional (VASCONCELLOS, 1995). Além disso, a ascensão social, na opinião do autor, é determinada por critérios definidos pelo mercado, envolvendo um conjunto de competências que o candidato deve apresentar. Mais ou menos definidas pelo mercado, o fato é que muitas dessas competências deverão ser desenvolvidas pelas IES. Mais especificamente, pelo professor universitário em sala de aula. Percebe-se certo consenso quanto aos requisitos mínimos para uma boa docência universitária. Pimenta e Anastasiou (2002, p185) trazem duas dimensões: primeiro, a sensibilidade da experiência e, segundo, a indagação teórica. Com isso, o professor estará apto a fazer frente a “situações únicas, ambíguas, incertas e conflituosas nas aulas”. Já Tardif (2002) afirma que os saberes docentes provêm de quatro fontes: da formação escolar, da formação profissional, da experiência prática e dos programas e livros didáticos.Vasconcellos (2003), por sua vez, ressalta a importância da educação informal do docente (experiência profissional ou social) para exercer funções que antes eram satisfeitas apenas com a educação formal em certa área. Em resumo, a boa docência universitária é resultado não somente do domínio teórico, mas também da experiência prática. Para a Administração – uma ciência social aplicada destinada a formar gestores organizacionais – esse equilíbrio entre teoria e prática é fundamental para a boa docência, desafiada constantemente, segundo Bendassolli (2001, p. 42), por uma pergunta: “Como 124 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 124 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula fazer da educação um caminho de oportunidades?”. Tal questionamento transcende o conhecimento técnico, evidenciando o desafio de conciliar a cultura humanista e a cultura científica para “ajudar os cidadãos a viverem seus destinos” (MORIN, 2000, p. 82), missão transecular da universidade, na opinião desse autor. Portanto, cabe questionar, nos cursos de Administração, para que finalidades o trabalho docente deve estar orientado, ou seja, o quanto de teoria, prática, técnica e emoção deve haver na atividade dos seus professores. 2. Referencial Teórico No mundo organizacional, ter uma “visão estratégica” (MINTZBERG, 2001, p. 233) significa saber onde se está, aonde se quer ir, quando se quer chegar e quais os recursos necessários para a jornada. Esse quadro do futuro com data para acontecer precisa encontrar eco nas maneiras como os docentes de Administração realizam suas atividades dentro de sala de aula. Isso pode ocorrer pelo que se espera deles a partir das ementas, dos conteúdos e das horas-aula de suas disciplinas, ou pelo fato de serem peças chave na complexa máquina organizacional em que se transformaram as IES. Quanto mais nítido esse quadro do futuro e quanto mais preciso o momento em que deverá se tornar realidade, a partir das circunstâncias que o rodeiam, mais estratégico o trabalho do docente. No entanto, esse é um exercício difícil, devido à “era de descontinuidade” (DRUCKER, 1974, p. III) em que vive o mundo, caracterizada por mudanças drásticas e repentinas, cujo desafio reside, principalmente, na sua interpretação e no seu manejo, dada a falta de precedentes (MINTZBERG, 2001, p. 121). Segundo este autor, quanto mais imprevisível o ambiente, menos deliberada e formal deverá ser a estratégia e mais empreendedoras as iniciativas para se construir, conforme Morin (2000), um caminho de oportunidades. Ou seja, o que está em jogo é o próprio conceito de competência, no que se refere ao conhecimento (o que) e à habilidade (como) para se atingir qualquer objetivo, seja ele educar pessoas ou gerenciar organizações. Ressalte-se, ainda, que, para o desenvolvimento de competências diante de um ambiente instável, são necessárias atitudes favoráveis à iniciativa e ao risco calculado, características típicas do espírito empreendedor (DORNELAS, 2005; DOLABELA, 2006).Tais atitudes empreendedoras, na opinião de Mintzberg (2001, p.363), dão sentido à trajetória das organizações para um “onde”, ou seja, à concretização da visão estratégica, e, por conseguinte, ao “que” os gestores precisam saber, a fim de levar a cabo tal tarefa. Dito de outra forma, o professor de Administração precisa ter uma visão estratégica da sua atuação em sala de aula, se quiser que seus alunos ajam estrategicamente no mundo que os aguarda. É pertinente pensar na construção de uma visão convergente e transdisciplinar, não só como força mobilizadora para a ação docente, mas para qualquer intento humano, já que essa referência – um quadro do futuro bem contextualizado – reduz riscos e incertezas, além de proporcionar menor uso de recursos para se atingirem os mesmos objetivos. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 125 125 16/08/2009, 11:27 Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos Na esfera da educação, cujo locus principal é a sala de aula, o relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI (DELORS, 2001) apresenta sua visão e, também, diretrizes para que ela seja transformada em realidade ao longo do século. No decorrer desse período, o relatório propõe dois grandes e desafiadores objetivos, conforme seu coordenador: 1) Organizar a educação em torno de quatro aprendizagens ou “pilares do conhecimento” (p. 90): aprender conhecer; aprender a fazer; aprender a conviver; e aprender a ser. 2) Ampliar a concepção de educação, para que, ao longo da vida, cada um possa “descobrir, reanimar e fortalecer o seu potencial criativo” (p. 90). Para o documento, a educação é vista como “um trunfo indispensável à humanidade na sua construção dos ideais da paz, da liberdade e da justiça social” (DELORS, 2001, p. 11), o que vai ao encontro da definição de universidade, ao longo da história, conforme Souza Filho (2006, p. 174): “o lugar da formação de pesquisadores, pensadores independentes, produtores de conhecimento e de técnicas socialmente necessárias ao desenvolvimento do bem-estar humano”. Esse ambiente socialmente crítico é estendido por Gimeno Sacristán (2002, p. 220) a todo tipo de instituição escolar, que, neste início de século, “mais do que nunca […] deve cumprir […] uma clara função de contraste, de interrogação [...], provocar a reflexão e facilitar os processos individuais e grupais de reconstrução racional da experiência e do pensamento”. Tais processos grupais, entretanto, podem encontrar resistências conscientes ou inconscientes na atuação dos professores, já que cada um guia seu trabalho com certa subjetividade, que poderá não estar suficientemente sistematizada, por seus meios de produção, para que se alcancem os resultados coerentes com as idéias colocadas por Delors (2001), Gimeno Sacristán (2002) e Souza Filho (2006). Daí as quatro aprendizagens ou pilares do conhecimento em torno dos quais a educação deverá ser construída (DELORS, 2001) e que podem servir de diretrizes para os docentes desenvolverem seu trabalho em sala de aula: 1) Aprender a conhecer envolve o campo de conhecimento de cada área, supondo uma ênfase maior para a capacidade de aprender a aprender, o que favorece a educação ao longo da vida. O aumento de saberes “desperta a curiosidade intelectual, estimula o sentido crítico e permite compreender o real, mediante a aquisição de autonomia da capacidade de discernir” (DELORS, 2001, p. 91). Esse pilar sugere uma solução para a dicotomia generalista versus especialista, ao propor a combinação entre “uma cultura geral, suficientemente vasta, com a possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias” (p. 101). Morin (2005) destaca, ainda, o papel da emoção nos processos relacionados ao conhecer, ao afirmar que, quando se trata de transmitir conhecimento, a educação deve aceitar que há estreita relação entre inteligência e afetividade, com a faculdade de raciocinar podendo ser diminuída ou até mesmo destruída pelo déficit de emoção. 126 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 126 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula 2) Aprender a fazer relaciona-se diretamente à questão de ensinar o aluno a pôr em prática o seu conhecimento. Portanto, refere-se a saber aplicar, de forma contextualizada e significativa, os conhecimento e tornar-se um sujeito apto a enfrentar situações diversas. O ritmo das inovações tecnológicas e a consequente abreviação dos ciclos estratégicos nas organizações tornam rapidamente obsoletas as qualificações profissionais, dandose maior importância à competência, mas não àquela “material” (DELORS, 2001, p. 94) e sim a “uma espécie de coquetel individual”, ou seja, competências que, de uma maneira mais ampla, combinem a formação técnica, o comportamento social, a aptidão para o trabalho em equipe, a capacidade para a iniciativa e o gosto pelo risco. Para Morin (2005, p.18), “é preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza”. Ou seja, o educador deveria ensinar princípios de estratégia que permitissem enfrentar os imprevistos e modificar o desenvolvimento da ação, a partir das informações adquiridas ao longo do tempo. Na conceituação estratégica proposta por Mintzberg (2001), essa prescrição de Morin (2005) significaria enfatizar menos as estratégias concebidas formalmente, pelo modo “planejador” (MINTZBERG, 2001, p. 28), dando preferência àquelas “adaptativas”. 3) Aprender a conviver, ou viver com os outros, representa “um dos maiores desafios da educação” (DELORS, 2001, p. 96), já que os seres humanos “têm tendência a supervalorizar as suas qualidades e as do grupo a que pertencem, e a alimentar preconceitos desfavoráveis em relação aos outros” (p. 97). Assim, neste pilar, a educação tem dupla missão: transmitir conhecimento sobre a diversidade humana e levar as pessoas a identificar as semelhanças e a interdependência entre todos os seres humanos do planeta, por meio da troca de argumentação e do diálogo. Para Morin (2005), a compreensão mútua entre os seres humanos “é vital para que as relações humanas saiam do seu estado bárbaro de incompreensão” (p. 17), cujas raízes, modalidades e efeitos devem ser estudados, caso se queira, realmente, “um mundo onde caibam todos” (JOHANN, 2006). Contudo, ao analisar o convívio na sala de aula, Boarini (1998) alega que o educador, muitas vezes, parece não ter claro, por exemplo, o significado da disciplina para um ambiente de argumentação, diálogo e crescimento pessoal. O autor constata, ainda, que, no ambiente familiar, alguns pais minimizam ou têm dificuldade para estabelecer limites, receosos das consequências psicológicas para seus filhos. Para Delors (2001), a participação de professores e alunos em projetos comuns parece ser um método eficaz para a resolução de conflitos, o reconhecimento do espaço do outro e o engrandecimento do espaço de todos, a partir das atividades acadêmicas. 4) Aprender a ser busca, com a contribuição da educação, integrar os três primeiros pilares, a fim de preparar o jovem “para elaborar pensamentos autônomos e críticos e Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 127 127 16/08/2009, 11:27 Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos para formular os seus próprios juízos de valor, de modo a poder decidir, por si mesmo, como agir nas diferentes circunstâncias da vida” (DELORS, 2001, p. 99). Entretanto, ressalta Vasconcellos, C. (1995), o jovem é influenciado mais pelos meios de comunicação, pelas marcas e grifes e menos pelos pais e professores. Para o autor, o jovem reflete a sociedade contemporânea: “imatura pelo alto consumismo, levando à busca da satisfação imediata do prazer, diminuindo a capacidade de tolerância à frustração e aumentando a agressividade” (p. 24). Para Vasconcellos (1995), é papel essencial da educação conferir aos indivíduos liberdade para sentir, pensar, discernir, gostar de si e de criar, desenvolvendo, assim, seus talentos. O relatório (DELORS, 2001) encerra o capítulo sobre os quatro pilares da educação afirmando que eles devem inspirar e orientar tanto a elaboração de programas quanto a definição de novas políticas pedagógicas. Tal recomendação parece ter sido seguida na definição do perfil desejado do formando dos cursos de Administração, a quem compete, segundo o Conselho Nacional de Educação (2005, p. 28-29): [...] compreender as questões científicas, técnicas, sociais e econômicas da produção e de seu gerenciamento [...] apresentando flexibilidade intelectual e adaptabilidade contextualizada no trato de situações diversas, presentes ou emergentes, nos vários segmentos do campo de atuação do administrador. Importa saber se as práticas dos professores de Administração em sala de aula estão em sintonia com esse perfil desejado. 3. Metodologia Este artigo, de cunho exploratório, levanta hipóteses sobre as premissas e as práticas do professor de Administração em sala de aula, tomando, como referência, dois dos quatro pilares concebidos por Delors (2001) para a educação do século XXI: o saber conhecer e o saber fazer. Adotando uma “amostragem não probabilística por conveniência” (MALHOTRA, 2006, p. 326), os autores coletaram 57 questionários preenchidos por professores de 13 cursos de Administração da região metropolitana de Porto Alegre. O instrumento utiliza a escala Likert (MALHOTRA, 2006, p. 266) clássica de 5 graus, que vai de 1 (discordo totalmente) a 5 (concordo totalmente), composta por 12 itens. Também foram incluídas dez variáveis para a caracterização da amostra. Os dados foram tratados estatisticamente, obtendo-se distribuições de frequência e medidas centrais, sendo também testadas associações entre as variáveis. 128 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 128 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula 3.1 Análise dos dados Antes de serem formuladas hipóteses sobre as premissas dos professores de Administração em sala de aula, caracteriza-se a amostra que respondeu ao instrumento de coleta de dados. Primeiramente, a Tabela 1 traz o curso em que o respondente graduou-se, notando-se que há graduações em várias áreas, embora todos sejam professores de Administração. Tabela 1: Graduações dos professores de Administração Curso Frequência % Administração 35 61 Economia 7 12 Ciências Contábeis 3 5 Matemática 3 5 Sociologia 2 3 Engenharia 1 2 Filosofia 1 2 Letras 1 2 Direito 1 2 Psicologia 1 2 Comércio Exterior 1 2 Em branco (missing) 1 2 57 100 Total Fonte: dados coletados pelos autores (2008) Os respondentes apresentaram, ainda, as seguintes características: • Principalmente do sexo masculino (39 casos ou 68%). • 39 mestres, um doutor e 17 especialistas. • Com poucas horas em sala de aula (54% têm até 12 horas por semana). • 46% com pouco ou nenhum tempo disponível fora de sala de aula. • 27% nunca ou às vezes preparando suas aulas, sendo a preparação de aula, conforme informado no instrumento de coleta de dados, uma atividade exclusiva, separada de outros afazeres profissionais, com duração de, pelo menos, 30 minutos. • Desconhecendo bastante a atuação dos demais professores em sala de aula (19% desconhecendo totalmente e 30% desconhecendo em parte). • 60% muito motivados para a docência (9 ou 10 em uma escala de dez pontos) e 9% pouco motivados (5 ou 6). • 49% muito satisfeitos com sua atuação como professores (assinalaram 9 ou 10 em uma escala de dez pontos). Por outro lado, 9% pouco satisfeitos com sua atuação (5 ou 6). Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 129 129 16/08/2009, 11:27 Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos Antes de serem analisados os itens da escala Likert, testou-se a sua confiabilidade, por meio do alpha de Cronbach (MALHOTRA, 2006, p. 277), obtendo-se um índice de 0,788, aceitável para os propósitos deste trabalho. A Tabela 2 traz a média, o desvio padrão e o coeficiente de dispersão de Pearson de cada item que versou sobre as premissas e práticas da amostra em sala de aula, a partir do primeiro pilar de Delors (2001, p. 90) “saber conhecer”. Pela Tabela 2, constata-se que, nos itens 4, 5 e 7, a amostra revelou-se heterogênea. Ou seja, o coeficiente de dispersão de Pearson (razão entre o desvio padrão e a média) foi maior ou igual a 0,4, conforme Malhotra (2006). Também houve tendência para a heterogeneidade no item 2 (coeficiente de dispersão igual a 0,37). Dado o objetivo do artigo de especular sobre premissas e práticas de ensino dos professores de Administração em sala de aula, são esses itens com altos desvios padrões, ou seja, nos quais a amostra se mostrou não consensual, que são analisados a seguir, gerando-se hipóteses a serem testadas em estudos mais conclusivos. Tabela 2: O saber conhecer dos professores de Administração Média (de 1 a 5) Desvio padrão Dispersão 1. Minhas aulas têm enfatizado a transmissão de conhecimento, entendidos estes como um conjunto de saberes relacionados ao QUE fazer. 3,79 1,18 0,31 2. Ao transmitir os conteúdos para os alunos, considero que estes já saibam como aprendê-los. 2,63 0,99 0,37 3. Minhas aulas exigem do aluno tanto atenção quanto memória e capacidade de pensamento. 4,23 0,93 0,22 4. Dadas as peculiaridades dos conteúdos que ensino, é difícil, para mim, inovar minhas aulas. 2,05 1,22 0,59 5. Mais do que generalistas, creio que cabe a um curso de Administração formar especialistas. 2,74 1,18 0,43 6. Independentemente do que se ensine, sempre parto do princípio de que os alunos já trazem consigo conhecimento prévios válidos. 3,53 1,16 0,33 7. Acredito que, no meu curso de Adm, prevaleça a transmissão de práticas mais ou menos rotineiras. 2,94 1,18 0,40 Item Fonte: Dados coletados pelos autores (2008). No item 4, especificamente, que apresentou o maior coeficiente de dispersão (0,59), a amostra discorda em parte quanto à dificuldade em inovar suas aulas (média 2,05). Entretanto, 11 dos 56 respondentes (20%) concordam em parte ou totalmente com o que é afirmado, o que resultou no alto desvio padrão (1,22). Isso permite supor que um em cada cinco professores entrevistados vem dando suas aulas da mesma maneira, não importando o perfil dos alunos nem as condições do ambiente para o qual estejam sendo preparados. 130 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 130 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula Dos 11 que acham, em algum grau, difícil inovar suas aulas, nove são administradores, um é economista e um é sociólogo. Ou seja, todos são oriundos das ciências sociais aplicadas, área do conhecimento que reflete, sobremaneira, a dinâmica do contexto atual e para a qual não deveriam faltar elementos novos a serem trazidos para dentro de uma IES, fazendo da sala de aula um ambiente desafiador e rico em experiências sobre o mundo real. Outro dado importante observado é que, dos 11 professores menos inovadores, sete (63%) têm ressalvas quanto a sua própria atuação em sala de aula. Deduz-se, ainda, pelo item 2 da escala, que o ensinar a aprender faz parte das práticas de parte dos professores, devendo, entretanto, ser enfatizada perante a maioria deles (52%) que: ou (1) carecem de elementos pedagógicos para levá-la adiante, ou (2) não têm consciência de que lhes cabe essa importante incumbência da educação contemporânea (DELORS, 2001; MORIN, 2005). Ainda heterogênea (coeficiente de dispersão igual a 0,40) mostrou-se a amostra no item 7, com 19 professores dos 54 que responderam à questão, ou seja, 35% concordando, em algum grau, com a prevalência de práticas mais ou menos rotineiras no seu curso de Administração. Foi testada a associação desse item com o item 4, através de correlação linear, mas não houve significância (p>0,2), permitindo especular que os professores que reconhecem práticas rotineiras em seus cursos não são aqueles que acham difícil inovar em sala de aula. Outro item com média relativamente baixa (2,74) e respostas heterogêneas foi o de número 5. Dos respondentes, 45% discordam, em algum grau, de que estejam em sala de aula para formar especialistas, mas 16 dos 57 respondentes (28%) concordam em algum grau. Destes, nove são administradores, mas aparecem, também, economistas, advogados, contadores, sociólogos e matemáticos. Isso permite supor que a idéia de que o ensino superior deva formar especialista ainda está arraigada entre professores de Administração, devendo-se aprofundar a discussão, entre eles, sobre a importância da cultura geral (DELORS, 2001) e da afetividade (MORIN, 2005) na formação dos futuros administradores. Em suma, da análise dos itens referentes ao saber conhecer, primeiro pilar de Delors (2001), é possível especular que, dentre os professores entrevistados, uma parcela importante acha que está em sala de aula para, inovando pouco, transmitir conhecimento mais ou menos rotineiros, a fim de formar especialistas. Esse pequeno grupo de professores, porém expressivo na possibilidade de impactar a qualidade de ensino, parece, também, não achar que seja sua incumbência entender como os alunos aprendem. Muito menos ensiná-los a aprender. Além disso, alguns deles demonstraram ressalvas com relação as suas próprias atuações em sala de aula. A Tabela 3 traz a média, o desvio padrão e o coeficiente de dispersão de Pearson de cada item que versou sobre as premissas e práticas da amostra em sala de aula, a partir do segundo pilar de Delors (2001, p. 93) - “saber fazer”. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 131 131 16/08/2009, 11:27 Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos Tabela 3: O saber fazer dos professores de Administração Média (de 1 a 5) Desvio padrão Dispersão 8. Mais do que ensinar os alunos a aprender, creio que me cabe ensinar a eles conteúdos práticos. 3,96 1,14 0,29 9. Meu processo de ensino não estará concluído até que o aluno o enriqueça fora da sala de aula. 4,07 1,14 0,28 10. Para o aluno aprender o COMO FAZER, creio que a sala de aula não seja o lugar ideal. 2,47 1,24 0,50 11. Aluno que demonstra saber O QUE fazer, certamente sabe COMO fazê-lo. 2,82 1,14 0,40 12. Uma das minhas dificuldades como professor de Adm. tem sido encontrar formas e ferramentas adequadas à rápida evolução do mundo organizacional. 2,66 1,29 0,48 Item Fonte: dados coletados pelos autores (2008) Pela Tabela 3, constata-se que, nos itens 10, 11 e 12, a amostra foi heterogênea (coeficientes de dispersão de Pearson maiores ou igual a 0,4), conforme Malhotra (2006). O raciocínio para se analisar os itens desta tabela é o mesmo adotado para a análise da Tabela 2. O item 10, especificamente, com a menor média (2,47), permite supor que os respondentes tendem a acreditar que a sala de aula seja um bom lugar para o aluno aprender o como fazer. Entretanto, nesse item, a amostra se mostrou bastante heterogênea, com o maior coeficiente de dispersão desse bloco: 0,50. Ou seja, 56% (32 respondentes) acham que a sala de aula é, em algum grau, o lugar ideal para o aluno aprender a pôr em prática o aprendido. Desses, 15 (26% da amostra), inclusive, discordam totalmente da afirmação que sugere o contrário. Contrariamente, 22% (13 respondentes) parecem acreditar que haja lugar melhor para o aluno aprender o como fazer. Outros 12 (21% da amostra) parecem indecisos. Se, por um lado, os professores entrevistados consideram a sala de aula um bom lugar para o aluno aprender o como fazer, por outro, conforme o item 9, tendem a concordar (média = 4,07) com a afirmação que diz que o processo de aprendizagem não estará completo até que o aluno o enriqueça fora da sala de aula. Foi testada a associação entre os itens 9 e 10, sendo o resultado quase significativo (sig = 0,066), mas com uma correlação linear fraca (R de Pearson = 0,202). Assim, fica apenas indicada a relação entre (1) a importância do mundo real para o enriquecimento do processo de ensino-aprendizagem e (2) a sala de aula como lugar não ideal para o aluno aprender o como fazer, associação esta que se esperava fosse mais direta. A exemplo da associação entre os itens 9 e 10, quando testada estatisticamente, a associação entre os itens 5 (formação de especialistas) e 8 (conteúdos práticos) se mostrou 132 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 132 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula fraca (sig = 0,087 e R de Pearson = 0,229). Fica, entretanto, indicada a hipótese de associação, chamando-se a atenção para o fato de que 44% da amostra concordam totalmente com o item 8, que afirma que cabe a um professor de Administração ensinar conteúdos práticos. Outro item divergente foi o de número 11 – Aluno que demonstra saber O QUE fazer, certamente sabe COMO fazê-lo. Sua distribuição de frequência indica que uma boa parcela da amostra (32% dos professores) ainda confunde conhecimento com habilidade, ao concordar, pelo menos em parte, com essa afirmação (5% concordam totalmente). A confusão entre a aquisição de conhecimento (teorias e conceitos genéricos e específicos de uma área) e sua aplicação prática talvez seja um dos piores erros que um docente possa cometer, em especial em uma ciência social aplicada. Isso se deve, principalmente, porque não permite ao aluno testar essas teorias e conceitos e, também não o prepara para o uso desses em ambientes dinâmicos e complexos, geradores das mais diversas situações, habilidade essa esperada do egresso em Administração (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2005). Ou seja, ao enfatizar a transmissão de conceitos e teorias sem se preocupar com sua aplicabilidade, o professor pode estar formando profissionais incapazes de adotar “estratégias adaptativas” (MINTZBERG, 2001, p. 28), diante de mudanças verificadas no seu ambiente de atuação. Tal hipótese é reforçada por outros 26,8% da amostra que, se não concordam com ela, pelo menos não discordam da afirmação. Tal quadro sugere o que Morin denominou “cegueira do conhecimento” (p. 13-14): É impressionante que a educação que visa transmitir conhecimento seja cega quanto ao que é o conhecimento humano, seus dispositivos, dificuldades, tendências ao erro e à ilusão, e não se preocupe em fazer conhecer o que é conhecer. A possibilidade de tal cegueira estar disseminada por uma razoável parcela dos professores de Administração também é reforçada pelo décimo segundo item testado – Uma das minhas dificuldades como professor de Administração tem sido encontrar formas e ferramentas adequadas à rápida evolução do mundo organizacional. A discordância de 45% da amostra em relação a tal afirmação somada à tendência a crer que a sala de aula seja um bom lugar para o aluno praticar o que aprendeu e à confusão ainda feita entre conhecimento e habilidade justificam a pouca preocupação com o dinamismo do mundo organizacional, já que não é para ele que preparam seus alunos. Assim, a análise dos itens referentes ao saber fazer, segundo pilar de Delors (2001), permite indicar que uma parcela importante da amostra considera a sala de aula o locus ideal para a prática do aprendido, embora também reconheça que tal aprendizado não estará concluído até que seja enriquecido fora desse espaço. Entretanto, as respostas da amostra permitem especular que ela se exime de participar ou de avaliar esse enriqueci- Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 133 133 16/08/2009, 11:27 Luiz Eduardo da Silva Amaro e Ilsa Solka de Lemos mento extraclasse. Além disso, apesar de uma parcela expressiva da amostra achar que está em sala de aula para ensinar conteúdos práticos, parece haver uma prática pedagógica relativamente afastada da realidade em que atuam as IES, provocada possivelmente pela confusão entre o que seja transmitir conhecimento e o que seja desenvolver habilidades. Em conjunto, as análises dos itens referentes aos dois primeiros dos quatro pilares de Delors (2001) permitem a formulação da hipótese principal deste artigo: uma parcela nada desprezível dos professores de Administração não sabe como formar gestores que produzam resultados efetivos no mundo organizacional. Tal hipótese pode, ainda, estar relacionada a alguns aspectos da amostra: (1) tem uma baixa carga horária de aulas (54% têm até 12 horas por semana); (2) tem pouco ou nenhum tempo disponível fora de sala de aula (46% da amostra), o que impede seu aprimoramento pedagógico; e (3) pouco prepara suas aulas (27% da amostra nunca ou às vezes as preparam). 4. Conclusão Este estudo faz parte de uma pesquisa maior, que se encontra na sua fase inicial ou exploratória, e procura por hipóteses a serem testadas, em uma amostra mais representativa, sobre o que pensam os professores de Administração com relação aos quatro pilares da educação propostos para o século XXI, conforme Delors (2001). Se, por um lado, os itens analisados se mostraram pouco associados entre si e com baixas correlações, por outro, os altos coeficientes de dispersão de Pearson permitiram vislumbrar, na heterogeneidade das respostas, que ainda há necessidade de se debater, entre os professores de Administração, o que seja ensinar para um mundo dinâmico e complexo, onde as organizações de todos os tipos e tamanhos desempenham papel preponderante. Morin (2000) ensina que ter uma “cabeça bem-feita” não significa acumular o saber, mas desenvolver a aptidão geral para colocar e tratar problemas e, ao mesmo tempo, ter princípios organizadores para dar significado aos saberes. Parece que esse aspecto da educação, importante para o século XXI, ainda não foi, por razões que cabe pesquisar, suficientemente apreendido pelos professores do ramo das ciências sociais aplicadas, responsável por formar os administradores de amanhã. Ou seja, o professor de Administração ainda precisa ter a cabeça feita para alguns aspectos da sua atuação. Como 49% da amostra deste estudo desconhecem, em parte ou totalmente, a atuação dos demais colegas dentro de sala de aula, o trabalho pedagógico em equipe, se bem orientado, poderia tornar-se uma excelente oportunidade para tal tarefa, na tentativa de superar práticas já anacrônicas para a educação do século XXI. Mas, para isso, o professor terá que mostrar que, de fato, quer aprender e as IES deverão demonstrar que, realmente, desejam ensiná-los. 134 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 134 16/08/2009, 11:27 Premissas e Práticas de Ensino do Professor de Administração dentro de Sala de Aula 5. Referências BENDASSOLLI, P. F. Artesãos da própria performance: indivíduo, trabalho e educação em época de mudanças. Marketing Industrial, v. 17, p. 40-47, 2001. BOARINI, M. L. Indisciplina escolar e dificuldades de aprendizagem escolar: questões em debate. 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Os organismos públicos também estão se preocupando com a qualidade de suas informações e com a eficiência e eficácia do seu processo decisório. São instituições que guardam volumes expressivos de dados de toda ordem, tanto referentes ao aspecto operacional como relativos a assuntos administrativos. As atividades de compras, que compõem a conhecida cadeia de suprimentos e formam o contexto da administração de material, têm papel fundamental na estruturação de recursos para viabilizar políticas públicas e constituem-se em um dos processos indispensáveis nas organizações públicas. Nesse contexto, o presente artigo apresenta a metodologia, o roteiro e os passos necessários para a proposição de uma ontologia de compras públicas, como método empregado para a modelagem conceitual e multidimensional, na definição do esquema estrela de uma arquitetura do processo de data warehousing. Especificamente, trata-se de um modelo baseado na taxonomia de uma ontologia, para abstrair a modelagem conceitual, formar a estrutura da matriz de barramento e definir a modelagem lógica, pela indicação das dimensões e fatos necessários para constituir uma base para data mart de compras públicas. O modelo oferece, desse modo, capacidades de pesquisa, visualização, informação e análise para suporte às decisões organizacionais no setor público que vão além dos padrões dos sistemas de produção e informações usualmente disponíveis. Abstract The information technology area offers models and technological architectures to adequately search information that can support management decision.The public sections arte_angrad.pmd 137 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade are also worried about the quality of information they deal with and with the efficiency and effectiveness of their decision processes. They are organizations which maintain an expressive amount of data on multiple subjects related to operational and administrative aspects. The procurement activities have a special role in the use of public resources as a way to make public policies feasible. This study presents the steps necessaries to the proposition of the ontology for public procurement as a methodology applied in a multidimensional conceptual model and in the definition of a star architecture for data warehousing. Specifically, this model is based on the taxonomy of an ontology, which derives a conceptual model and also creates the structure to the logical model. It indicates the dimensions and facts necessaries to build the basis to a data mart for public buying activities. The model offers search engines, visualization, information and data analysis to support the organizational decisions in the public sector and it is different from the standard production and information systems usually available. 1. Introdução A tecnologia da informação tem oferecido modelos e arquiteturas tecnológicas apropriadas para o mundo organizacional que são relacionadas com a busca de informações para apoiar as decisões corporativas. São tecnologias como data warehouse, data mining e ferramentas Olap (online analytical processing), por exemplo, que oferecem recursos para extração, tratamento, limpeza e integração de dados em evolução histórica. Os organismos públicos também estão se preocupando com a qualidade de suas informações e com a eficiência e eficácia do seu processo decisório. São instituições que guardam expressivos volumes de dados de toda ordem, tanto referentes ao aspecto operacional como relativos a assuntos administrativos. As atividades de compras, que têm papel fundamental na estruturação de recursos para viabilizar políticas públicas, constituem-se em um dos processos indispensáveis nas organizações públicas. São ações comuns em quaisquer órgãos ou esferas da gestão, pois envolvem um enfoque sistêmico e estruturam-se segundo um processo cíclico para aquisição, armazenamento e distribuição de materiais. Essas atividades compõem a conhecida cadeia de suprimentos e formam o contexto da administração de material, um ramo específico da ciência da administração. Pode-se, então, inferir que existe um domínio específico para as atividades de compras, uma especialidade de aceitação geral, com termos técnicos, procedimentos e normas. É possível, portanto, representá-la por uma ontologia de domínio, pois modela parte de um mundo e pode ser descrita segundo taxonomias e axiomas, para propiciar intercâmbio ou interoperabilidade no âmbito da tecnologia da informação. Nesses termos, este artigo apresenta uma proposta de ontologia de compras públicas, a metodologia aplicada, o roteiro e os passos necessários para a sua elaboração, como 138 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 138 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia método empregado para a formação da modelagem conceitual e multidimensional, na definição do esquema estrela de uma arquitetura do processo de data warehousing. Especificamente, trata-se de um modelo baseado na taxonomia de uma ontologia, para abstrair a modelagem conceitual, formar a estrutura da matriz de barramento defendida por Kimbal et al. (1998), e definir a modelagem lógica, pela indicação das dimensões e fatos necessários para constituir uma base para data mart de compras públicas. 2. Metodologia e Roteiro para a Construção da Ontologia de Compras Públicas O conceito de ontologia surgiu da filosofia, onde é definido como uma explicação sistemática da existência. Uma ontologia corresponde a uma descrição clara de objetos, entidades, atributos e conceitos que existem em uma área de interesse definida por meio de axiomas, e de suas relações e restrições. Ontologias servem para a elaboração de terminologias únicas, com o objetivo de que o conhecimento produzido possa ser compartilhado e permita a sua reutilização. Gruber (1993) diz que uma ontologia deve ser considerada como uma especificação formal, explícita e de conceituação compartilhada. De certa forma, esse conceito é um consenso na literatura. O termo formal indica que ontologia pode ser processada por computadores. Tratando-se de um domínio, de uma área de interesse interpretada formalmente, principalmente por sistemas de inteligência artificial, onde objetos, atributos e relacionamentos podem se constituir numa linguagem representativa, é possível expressar ontologias em sistemas de software estruturados, definindo grupos de termos representativos. Aplicações, geralmente originadas da concepção de ontologias, estão presentes em sistemas de: gestão do conhecimento, geração de linguagem natural, modelagem de empresas, modelagem de sistemas de conhecimento, módulos de interoperabilidade entre sistemas, classificações em comércio eletrônico, web semântica, interligação de banco de dados e data warehouse (GRUBER, 1993). Para o desenvolvimento da ontologia de compras públicas, escolhemos a methontology, de Fernández et al. (1997), combinada com o roteiro para construção de ontologias de Noy e McGuinness (2001). As razões dessas opções foram: (i) o bom detalhamento, (ii) a integração conceitual, (iii) o fato de definirem com propriedade as etapas para execução de cada tarefa e técnica utilizadas e os objetos de saída e avaliações, (iv) recomendação de ciclo de vida, e (v) aplicação independente para estratégia de construção. O ciclo de vida para a ontologia apresentada pela methontology é constituído de seis etapas (especificação, conceitualização, formalização, integração, implementação e manutenção), que devem ser executadas durante o processo de construção. O guia de roteiro de Noy e McGuinness (2001) utiliza o software livre Protégé e a linguagem web ontology language (OWL), recomendada pelo W3 Consortium (W3C), para a implementação e a validação da sua ontologia exemplo. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 139 139 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade Os passos necessários para a construção da ontologia proposta são os seguintes: 1o passo: determinar o domínio e o escopo da ontologia O propósito da ontologia de compras públicas é definir o domínio da área de conhecimento das atividades de compras organizacionais na gestão pública, com vocabulário próprio e taxonomia. Para tanto, tomam-se como fontes os especialistas da área do domínio, a legislação pertinente, livros técnicos, dados armazenados, procedimentos e outras ontologias. A obtenção do conhecimento é feita por meio de entrevistas, análises de textos diagnósticos, entre outras. O escopo inclui um conjunto de significados a serem representados num glossário de termos e estrutura de hierarquia de classes, propriedades e restrições, utilizando uma linguagem formal para processamento por computadores. 2º passo: considerar a reutilização de ontologias existentes É conveniente considerar e verificar a existência de outras ontologias nas diversas fontes de consultas, procedimento que permite possível reutilização de ontologias disponíveis. Há diversas bibliotecas de ontologias reusáveis na web que podem ser consultadas. Os exemplos são: Stanford University/Protégé, DAML Ontology, UNSPSC, RosettaNet, DAMOZ, Universal Repository, Ontolingua Server. Para a consecução da ontologia proposta, executou-se uma pesquisa em várias delas: Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), Thesaurus Brasileiro, Thesaurus da Unesco, Eurovoc Thesaurus e Library and Archives Canada, não tendo sido encontrada nenhuma ontologia que contemplasse o domínio de compras públicas, compras empresariais ou similares, no ambiente do Brasil. 3º passo: enumerar termos importantes para a ontologia A partir das diversas fontes, elabora-se uma lista ampla de termos significativos relacionados à área de interesse do domínio (os possíveis termos da nova ontologia) e estabelecem-se as relações entre os conceitos e suas outras propriedades. Embora ainda em nível provisório, procura-se determinar a função de cada termo eleito, já sinalizando se o termo é uma superclasse, uma classe, propriedade ou relação. Essa lista deverá ser ordenada e servirá de base para a constituição da hierarquia da ontologia. O Quadro 1 demonstra os termos iniciais escolhidos para a ontologia aqui proposta. 140 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 140 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia Quadro 1: Lista parcial de termos para ontologia de compras públicas Autorização fornecimento Dispensa de licitação Licitação Fornecedor Inexigibilidade de licitação Concorrência Material/serviço Serviço Material/serviços Compra eletrônica Tomada de preços Material permanente Coleta de preços Empenho Convite Material de consumo Fornecedor Ordinário Pregão Catálogo de material Preço Estimativo Presencial Código material Descrição material/serviço Dotação orçamentária Eletrônico Grupo material Quantidade material/serviço Estoque Fases da licitação Classe material Prazo entrega Entradas Emissão edital Família material Condições de pagamento Recebimento de material Abertura licitação Unidade física Comprador Nota fiscal Julgamento propostas Mapa comparativo preços Nome Inspeção material Homologação licitação Requisição material/serviço Matrícula Saídas Empenho Material/serviço Contrato Distribuição de material Elaboração contrato Quantidade material/serviço Fornecedor Saldos Autorização fornecimento Unidade física Objeto Fornecedor Fases da licitação Aplicação do item Vigência Setor requisitante Emissão edital Setor requisitante Valor Responsável Obrigações contratuais Fonte: O autor 4º passo: definir as classes e a hierarquia das classes O modelo escolhido para a ontologia foi o top-down, em razão da facilidade de identificação dos termos do domínio estudado, que são muito utilizados na literatura técnica de administração de material, na legislação específica de licitação e nos procedimentos operacionais de compras e estoques; além disso, são, em geral, definidos do aspecto mais amplo para o particular. A partir da lista elaborada no passo anterior, procurou-se analisar os termos que representaram os objetos e têm existência independente uns dos outros, os quais têm a possibilidade de se tornarem classes da ontologia e constituem-se em uma das principais referências na hierarquia. Alguns termos da lista também foram descartados, quando não atendiam a generalidade do conceito de objeto e hierarquia sobre outros objetos, ou representavam alguma propriedade de objetos, ou, ainda, eram caracterizados como instâncias de algum objeto. Exemplos são autorização de fornecimento de material/serviço, contrato de fornecimento, mapa de comparação de preços, fases da licitação e compra eletrônica. Alguns termos da lista não foram utilizados na determinação das classes, e foram atribuídos conceitos como atributos dessas classes e chamados de propriedades, relações ou slots. Por exemplo: preço, prazo de entrega, condições de pagamento, dotação orçamentária, aplicação de item, responsável, unidade física, entre outros. Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 141 141 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade Todas as subclasses herdam propriedades e relações de sua classe. Por exemplo, as subclasses pessoa jurídica e pessoa física da classe fornecedor herdam as propriedades desta última. O Diagrama 1 ilustra o resultado da definição das classes da proposta de ontologia de compras públicas. 5º passo: definir as propriedades das classes Essas propriedades referem-se aos termos presentes na primeira lista criada que não foram definidos como classes. Eles podem, porém, corresponder tanto aos atributos da classe como ao relacionamento existente entre esta e outras classes. O Quadro 2 mostra as propriedades resultantes para as classes e subclasses, em ordem alfabética; 6º passo: definição das características das propriedades As propriedades podem ter várias características, dentre as quais destacamos: (i) tipo de valor: é necessário definir os tipos de valores que poderão ser atribuídos a certa propriedade, de acordo com sua natureza. Por exemplo, descrição de material é uma cadeia de caracteres que pode aceitar valores alfanuméricos e outros símbolos, já um valor total admite somente valores numéricos; (ii) cardinalidade: determina a quantidade de elementos que uma propriedade pode ter. Os sistemas podem apresentar cardinalidade única, que permite no máximo um valor, ou cardinalidade múltipla, que admite qualquer quantidade de valores; (iii) domínio e escopo: ocorre quando a definição de uma propriedade é associada a várias classes. Essas classes agregadas são chamadas domínios da propriedade, e caracterizam o conjunto de indivíduos ao qual a propriedade se aplica; 7º passo: criar instâncias O último passo na construção da ontologia consiste em criar instâncias individuais das classes na hierarquia, ou seja, objetos distintos a elas pertencentes, preenchendo os valores das respectivas propriedades. Por exemplo: uma instância individual tomada de preços nº 0100/08 representa um tipo específico de licitação na modalidade de tomada de preços. Essa instância determina, entre outros, os seguintes valores: objeto da licitação, abertura da licitação, exigências para participação (documentação e propostas), dados para contratação e fiscalização do contrato. 142 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 142 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia Diagrama 1: Classes da ontologia de compras públicas Quadro 2: Propriedades (slots) das classes e subclasses AberturaLicitacao Email Historico QuantidadeItem Atividade Empenho_AFM HomologacaoLicitacao Razao_Social Banco Endereco InscricaoEstadual RazaoAditivo CaracterizacaoContratacao Especificacao Item Requisitante Cidade EspecificacaoItem JulgamentoPropostas ResponsavelSetor SaldoAnterior Classe EspecificacaoMaterial Justificativa CNPJ EspecificacaoMaterialServico MatriculaComprador SaldoAtual Codigo Estado NomeComprador Setor CodigoMaterial EstadoFederativo NumeroEmpenho SetorFiscalizador ColetasDePreco Familia NumeroEntrada Telefones ContatoFornecedor Finalidade NumeroRequisicao UnidadeFisica CPF FiscalContrato NumeroSaida ValorCompraDireta DataEmpenho FormalizacaoContrato Objeto ValorEmpenho DataRequisicao FornecedorColeta ObrigacoesContratuais ValorTotalContrato ValorTotalMovimento DotacaoOrcamentaria FornecedorContratado OrcamentoSetor DotacaoOrcamentariaEmpenho FornecedorEmpenho PrazoVigênciaAditivo ValorUnitario Edital Grupo Quantidade Vigencia Fonte: O autor Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 143 143 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade 3. Modelo de Definição Aplicado à Modelagem Multidimensional A proposta da ontologia de compras públicas fornece a base conceitual para a modelagem multidimensional do data mart. Desse contexto, são retiradas as entidades que formam as tabelas de dimensões e de fatos que compõem a arquitetura no processo de data warehousing. A seguir, a notação aplicada e a matriz de barramento para o modelo lógico. 3.1 Formação das dimensões e fatos do esquema estrela A formação das entidades dimensões e fatos da modelagem dimensional tem origem nas superclasses da ontologia, para cuja representação aplicamos o modelo de álgebra de Datta e Thomas (1999). Tal modelo propõe a notação quádrupla F = {D,M,A,ƒ}, onde os quatro elementos indicam as características multidimensionais da arquitetura esquema estrela do data mart. Essas características são: • D = {d1, d2,..., dn}: conjunto de n entidades dimensões, onde cada di é o nome de uma dimensão extraída do domínio Dom [dim(i)]. • M = {m1, m2,..., mk}: conjunto de k entidades fatos, onde cada mi é o nome de um fato extraído do domínio. • O conjunto dos nomes das entidades dimensões e fatos é disjunto; i.e., D )” M = Ö. • A = {a1,a2,..., at}: conjunto de t atributos, onde cada ai é uma propriedade (atributo) extraída do domínio. • Um relacionamento de um-para-muitos é mapeado como ƒ: D ’! A, i.e., para cada entidade dimensão existem muitos atributos. • O conjunto em que cada propriedade corresponde a uma dimensão é disjunto, i.e., ∀ i, j, i j, ƒ(di) )” ƒ(dj) = Æ. Como exemplo ilustrativo da aplicação desse modelo, utilizando o mesmo domínio de compras públicas, considera-se um cubo multidimensional de dados das compras de um período, para determinado item de material originado do esquema estrela do data mart em questão. Esse cubo multidimensional de compras tem as seguintes características: • Imagina-se que os usuários estão interessados nos valores totais de compras e seus quantitativos. Assim, para suporte à decisão pretende-se medir os valores de compras e quantitativos, ou seja, a entidade fatos corresponde a: M = {compras_ totais, quantitativos}. • Os usuários querem analisar as informações sobre compras considerando três dimensões, a saber: data, material e fornecedor. Em outras palavras, eles estão interessados em perguntar: Quais os totais de compras para o material p1 em determinado fornecedor? ou: Quais os totais de compras para o material p1 em determinado 144 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 144 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia fornecedor, durante certo intervalo de tempo? (questão que envolve as três dimensões). • A dimensão data é descrita pelas propriedades dia, mês e ano; a dimensão material tem propriedades nome, especificação, unidade física; e a dimensão fornecedor tem: razão social, endereço, cidade e estado. Assim, construiu-se: A = {dia, mês, ano, nome, especificação, unidade física, razão social, endereço, cidade, estado}. • Cada uma das dimensões é descrita por propriedades específicas e mutuamente disjuntas, respeitando a notação citada. O cubo multidimensional fica, então, assim definido: ƒ(data) = {dia, mês, ano}; ƒ(material) = {nome, especificação,unidade física}; ƒ(fornecedor) = {razão social, endereço, cidade, estado}. O cubo multidimensional (em nosso exemplo, de compras) apresenta uma estrutura abstrata e suas as características satisfazem à definição dada anteriormente. Uma instância dele, definida por meio da 6-tupla F = {D, M, A, ƒ,V, g}, está apresentada na Figura 1. Os elementos D, M, A e ƒ são herdados da ontologia de domínio, enquanto V representa um conjunto de dados que foram usados para alimentar a instância do cubo e g é uma relação referente aos valores que são associados às células específicas da instância do cubo. g: Dom [dim 1] x Dom [dim 1] x ... x Dom [dim n] ’! V Figura 1: Exemplo do cubo de compras com três dimensões Fonte: O autor Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 145 145 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade 3.2 Matriz de barramento e o esquema estrela Os processos de negócio do domínio de compras decorrem do arcabouço teórico do conhecimento consolidado da administração de material, da legislação pertinente de licitação e de seus procedimentos técnicos e práticos, e são os seguintes: gestão de requisição de material e serviços, processamento de licitação, processamento de compra direta, formalização de empenho e contrato, recebimento de material e distribuição logística. Conforme a notação apresentada na seção anterior, as superclasses da ontologia do domínio dão origem às dimensões da matriz de barramento, que, por sua vez, são relacionadas aos processos do negócio, formando uma intersecção de dependência. Por exemplo, como ilustrado no Diagrama 2, para o conhecimento das informações sobre Processamento de Licitação há uma relação de dependência com as seguintes dimensões: Empenho, Licitação, Fornecedor, Requisição de Material, Material/Serviço, Coleta de Preços e Comprador. Assim também acontece com os demais processos do negócio, e, para responder aos questionamentos relacionados a cada um deles, são necessárias informações provenientes das dimensões respectivamente vinculadas. Conhecendo-se as entidades dimensões e os questionamentos sobre dados estatísticos, avaliações, dados numéricos, volumes e totalizações dos valores, pode-se definir a entidade fatos do esquema estrela. Essa entidade se constitui na principal tabela do modelo multidimensional, pois armazena dados de medição com relacionamento direto a todas as dimensões, definindo também a granularidade dos dados. Como conseqüência da obtenção das dimensões e fatos, modela-se fisicamente a arquitetura do data mart proposto para compras públicas, de acordo com estrutura da ontologia definida e a matriz de barramento. Essa estrutura de modelo físico tem: (i) uma tabela de fatos; (ii) dez tabelas de dimensões, originadas da arquitetura do barramento, e (iii) uma tabela de dimensão especifica para data, pois esta última tem por particularidade ser formada por uma conjunção de valores registrados nas diversas dimensões, conforme as ocorrências históricas, o que a diferencia relativamente às demais entidades derivadas da matriz de barramento. O Diagrama 3 ilustra o relacionamento entre a ontologia e o esquema estrela resultante. 146 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 146 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia Diagrama 2: Ontologia e a matriz de barramento do data mart Fonte: O autor Diagrama 3: Ontologia como origem para o modelo do esquema estrela Fonte: O autor 4. Modelo Multidimensional do Data Mart Com base no modelo conceitual, originado da ontologia descrita, o modelo lógico multidimensional do data mart é definido mediante as quatro etapas descritas a seguir. Etapa 1: processo de negócio Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 147 147 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade A matriz de barramento citada anteriormente ilustra os processos de negócio específicos para atividades de compras públicas, que são: gestão de requisição de material e serviços, processamento de licitação, processamento de compra direta, formalização de empenho e contrato, recebimento de material e distribuição logística; Etapa 2: granularidade Define o nível de detalhe dos dados “atomizados” de medições da tabela de fatos, que descrevem um item e não podem ser subdivididos. Nesta proposta, tem-se como dados mais granulares a descrição dos materiais que integram uma requisição (os itens de linha), correspondentes, por sua vez, à menor unidade que pode ser objeto de um processo de compra e movimentação de estoque; Etapa 3: dimensões Foram definidas pelas superclasses da ontologia proposta e irão compor as tabelas que, por meio de seus atributos, especificarão as descrições textuais. Neste modelo multidimensional, por convenção, as tabelas são nomeadas usando-se o prefixo Dim_ para melhor identificação de suas funções. Estas tabelas dimensionais são: Dim_Empenho, Dim_SetorRequisitante, Dim_Licitacao, Dim_Fornecedor, Dim_RequisicaoDeMaterial, Dim_MaterialServico, Dim_ColetaDePrecos, Dim_DispensaInexigibilidade, Dim_Estoque e Dim_Comprador. Como mencionado, existe outra tabela de dimensão, a Dim_Data, que armazena a série de tempo do histórico de registros contidos nos sistemas OLTP (online transaction processing). Seus atributos são especiais e servem também para auxiliar na granularidade do data mart, a qual foi definida como correspondendo a um item de uma requisição de material, documento que envolve uma data de emissão. Cada tabela de dimensão tem como chave primária única (chave substituta) um número inteiro atribuído seqüencialmente, sem significado, para identificação de cada linha. As chaves identificadoras provenientes dos sistemas OLTP não são usadas como chaves. As tabelas de dimensões formam relacionamento de um-para-muitos com a tabela de fatos do esquema estrela (star schema). Etapa 4: fatos Constitui-se na principal tabela do modelo multidimensional, pois representa a definição de granularidade do data mart e tem como objetivo o armazenamento dos dados de medição, dados quantitativos, valorativos e aditivos. Todas as medições em uma tabela de fatos devem estar alinhadas na mesma granularidade. Por convenção desta proposta, a tabela de fatos é nomeada pelo prefixo Fat, para facilitar a identificação no esquema estrela. Sua denominação é Fat_Compras. A chave primária da tabela de fatos é concatenada pelas chaves estrangeiras inclusas nessa mesma tabela e que correspondem às chaves primárias das tabelas de dimensões. Esse conjunto de relacionamento satisfaz a condição de integridade referencial, pois a tabela de fatos é acessada por meio das tabelas de dimensões. 148 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 148 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia O modelo físico está representado pela estrutura das tabelas acima citadas com os seus respectivos atributos, tipos de dados, identificação de chaves primárias e estrangeiras, cardinalidade, integridade referencial, regras de validação e opção para valores nulos ou não. A união das tabelas de fatos e dimensões, por meio da integridade referencial, é denominada esquema de junção em estrela, ou esquema estrela. Esse modelo multidimensional está representado no Diagrama 4. Diagrama 4: Esquema junção estrela – esquema estrela Fonte: O autor Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 149 149 16/08/2009, 11:27 Sérgio Fred Ribeiro Andrade 5. Considerações Finais Este artigo mostra a viabilidade da aplicação da tecnologia da informação e dos sistemas de apoio à decisão no ambiente da gestão pública dos recursos materiais, que, por tradição, armazena cotidianamente um volume de dados de proporção significativa. As análises realizadas mostraram pouca preocupação com o melhor aproveitamento desses dados para a geração de informações de qualidade, com evolução histórica, visando aperfeiçoar o processo decisório da alta gestão, nos organismos públicos. Para trabalhos futuros, abrem-se oportunidades para utilizar a metodologia aplicada neste estudo, em outros domínios do interesse da gestão pública, representando outros processos de negócios para incremento de data mart’s. Esse é um caminho natural para a construção do processo de data warehousing, com a agregação de outras atividades administrativas e operacionais, contemplando também processos de data mining e soluções Olap. 6. Referências DATTA, A.; THOMAS, H. The cube data model: a conceptual model and algebra for online analytical processing in data warehouses. Decision Support Systems, USA, v. 27, p. 289301, 1999. FERNÁNDEZ, M.; GÓMEZ-PÉREZ, A.; JURISTO, N. Methontology: from ontological art towards ontological engineering. AAAI Spring Symposium on Ontological Engineering, p. 33-40, 1997. GRUBER, T. R. A translation approach to portable ontology specifications. Knowledge Acquisition, v. 5, p. 199-220, 1993. KIMBALL, R. et al. 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Knowledge Engeneering Review, v. 11, n. 2, p. 93-155, jun. 1996. 150 arte_angrad.pmd Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 150 16/08/2009, 11:27 Uma abordagem de Data Warehousing para Compras Públicas usando Ontologia Sérgio Fred Ribeiro Andrade Assessor da UESC Professor da Faculdade Madre Thaís Atua na docência da Pós-Graduação da FACSUL/UNIME Mestrado em Sistemas e Computação - UNIFACS [email protected] Revista ANGRAD - V. 10, N. 1, Jan./Fev./Mar. 2009 arte_angrad.pmd 151 151 16/08/2009, 11:27 Política Editorial Foco A Revista Angrad é uma publicação que busca difundir o estado da arte do ensino e da pesquisa em administração, oportunizando a apresentação, em forma de artigos, de teorias, modelos, pesquisas e retrospectivas que abordem o processo de ensino-apredizagem e intensifiquem a prática da educação em disciplinas dos Cursos de Administração. Por voltar-se ao ensino e a pesquisa, a Revista ANGRAD torna-se o ponto de encontro de acadêmicos, docentes e pesquisadores da graduação e da pósgraduação das várias IES nacionais e internacionais. Estilo Os trabalhos enviados a Revista ANGRAD devem ser inéditos e demonstrar uma linguagem clara e objetiva. Recomenda-se uma atenção especial com a estrutura geral do artigo e com o contexto lógico dos argumentos. Ressaltamos que as opiniões emitidas nos textos publicados são de total responsabilidade dos seus respectivos autores. Todos os direitos de reprodução, tradução e adaptação estão reservados. Os artigos encaminhados para a Revista ANGRAD deverão ser apresentados no seguinte formato: Editor de texto: Word for Windows 6.0 ou posterior. Configuração das páginas: • Tamanho do papel: A4 (29,7 x 21 cm) • Margens: - Superior 3 cm; - Inferior 2 cm; - Esquerda 3 cm; - Direita 2 cm. • Fonte do texto: Arial, corpo 12; • Espaçamento: Simples (entre caracteres, palavras e linhas); • Número de páginas: Máximo de 15 (quinze), incluindo ilustrações, bibliografia e notas de final de texto. Observações: • Conteúdo da primeira página: Primeira linha: - Titulo do trabalho em português e inglês, centralizado, com todas as palavras em letras maiúsculas e em negrito; - Identificação do autor: Nome, titulação, cargo que ocupa, endereço comercial e e-mail, alinhado à direita; arte_angrad.pmd 152 16/08/2009, 11:27 Política Editorial - Resumo / Abstract de no mínimo 10 (dez) e no máximo 15 (quinze) linhas, inscrito no mesmo idioma do trabalho, em um único parágrafo, justificado; Seguindo de palavras-chave / key-words. • Conteúdo da segunda página: - Primeira linha: Titulo do trabalho, com todas as palavras em letras maiúsculas e em negrito; - Quarta linha: o Início do corpo do texto • Ilustrações, tabelas e gráficos: - Excel ou Power Point, vinculados ao Word, com fonte Arial - corpo 10. • As referências completas deverão ser apresentadas em ordem alfabética no final do texto, de acordo com as normas da ABNT. • As notas devem ser reduzidas ao mínimo necessário e serem apresentadas no final do texto seqüencialmente antes das referências. Envio do Trabalho Os artigos podem ser enviados em português, espanhol, inglês ou francês e deverão ser encaminhados atrás da home-page da ANGRAD (www.angrad.org.br). Processo de Avaliação Os artigos enviados para publicação na Revista ANGRAD são submetidos a um processo de avaliação, objetivando divulgar as melhores contribuições recebidas e avaliadas até o momento da editoração do exemplar. O processo de avaliação da Revista ANGRAD se inicia com uma avaliação do(a) editor(a) que irá observar a adequação do artigo à política editorial da revista. O(a) editor(a) encaminhará os artigos para avaliadores seguindo o double blind review, que recebem um relatório com aspectos a serem observados no artigo. Após a análise, destacam pontos importantes que justificam a sua avaliação, contribuindo para a melhoria do trabalho do(a) autor(a). O artigo passa, ainda, por uma revisão ortográfica e estilística profissional. É por tudo isso fortemente recomendado que os autores solicitem a opinião crítica de algum colega antes do envio do artigo. Processo de Escolha Por ser um veículo nacional, a Revista ANGRAD publicará sempre artigos de autores oriundos das diversas unidades da federação. Após a análise e aprovação dos avaliadores, o (a) editor(a) da Revista procurará sempre selecionar para publicação em cada fascículo artigos de autores vinculados as IES das mais diversas localidades do país. A Revista se permite o direito de publicação em cada fascículo de um artigo internacional que, também, passará pelos mesmos critérios de avaliação. arte_angrad.pmd 153 16/08/2009, 11:27 Esta Revista Científica é uma publicação da ANGRAD (Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração) www.angrad.org.br [email protected] arte_angrad.pmd 154 16/08/2009, 11:27