denúncia - Globo.com

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Exmo. Sr. Juiz Federal da 3ª VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO
Ref. Processo nº 2011.51.01.810153-3 (cautelar n. 2011.51.01.807678-2)
IP nº 0034/2011-11
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por seu Procurador da República signatário, vem à presença de V.
Exa., no uso de suas atribuições legais e constitucionais, oferecer a presente
DENÚNCIA
em face de:
- MÁRCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE, vulgo EMERSON ou SHEIK, portador da carteira
de identidade n.11957159, expedida pela SSP-RJ, inscrito no CPF sob o n.05418063782, residente
na Rua Ourinhos, n.663, Alphaville, Condomínio Tamboré 1, São Paulo-SP;
- RODRIGO OLIVEIRA DE BITTENCOURT, vulgo DIGUINHO, portador da carteira de
identidade n.3062998971, expedida pela SSP-RS, inscrito no CPF sob o n.830372090-20, que
pode ser encontrado no Fluminense Football Club, situado na Rua Álvaro Chaves, número 41,
Laranjeiras, Rio de Janeiro-RJ - CEP: 22231-200;
pelos fatos e fundamentos que ora passa a expor.
A presente denúncia tem lugar no contexto de uma investigação iniciada com a finalidade de apurar a
participação de determinados indivíduos em organização criminosa ligada à máfia dos caça-níqueis no Rio
de Janeiro. Para a melhor compreensão da quadrilha e dos eventos criminosos, faremos um introito a respeito
das diligências que revelaram os fatos aqui narrados.
1. DO HISTÓRICO DAS INVESTIGAÇÕES
As investigações realizadas pela Polícia Federal começaram a partir de um
compartilhamento de informações sigilosas constantes de Inquérito em tramitação na 4ª Vara Criminal da
Justiça do Estado do Rio de Janeiro para investigar a tentativa de homicídio, ocorrida no início de 2010, à
vida do bicheiro ROGÉRIO ANDRADE (IP nº 17/2010, autuado sob o nº 0236731-57.2010.8.19.0001). Por
força de pedido e deferimento de extensão da prova lá produzida, foi realizada interceptação telefônica para
fins de verificar de onde teriam vindo os explosivos utilizados no atentado.
A Polícia desenvolveu seu braço federal da investigação inicialmente voltada ao
monitoramento de YORAM AL AL (YORAM EL AL, EL AL YORAM ou YORAM EL AL). O israelense
YORAM ou YORAM figura na lista de procurados pela INTERPOL, tendo havido ordem de detenção pelos
Estados Unidos (difusão vermelha) contra ele por ter se envolvido na apreensão de 1,4 milhões de
comprimidos de MDMA (ecstasy) na cidade de Los Angeles (vejam-se os Relatórios de Inteligência nº
0610/2010-SIP/DINPO e 356/2010-SIP/RJ, constantes dos autos).
Segundo o Relatório de Inteligência nº 299/2010-SIP/RJ, constante dos autos, o israelense
YORAM EL AL teria sido contratado por CESAR ANDRADE DE LIMA SOUTO e FERNANDO
ANDRADE DE LIMA SOUTO, primos de ROGERIO COSTA DE ANDRADE E SILVA, líder de
organização criminosa voltada para exploração de máquinas caça-níquel no Rio de Janeiro, para realizar o
atentado contra sua vida, ocorrido em abril daquele ano, crime que teria sido praticado por outro israelense,
chamado TAL AMIR. A utilização de artefato explosivo introduzido em território nacional por criminosos
israelenses, além de outras ações ilícitas, poderia demonstrar novas estratégias adotadas na chamada “guerra
das máfias de caça-níquel”.
Ulteriores informações colhidas nas investigações, ao invés de confirmarem disputas entre
os bicheiros, revelaram, em verdade, que YORAM atuava no Rio de Janeiro em parceria com HAYLTON
CARLOS GOMES ESCAFURA, filho de JOSÉ CARUZZO ESCAFURA, conhecido como
“PIRUINHA”,
duas figuras centrais do jogo ilegal através de caça-níqueis (contrabando). Seguiram-se
outros relatórios de inteligência que serviram para instruir os requerimentos investigativos complementares,
e que revelaram o envolvimento de ANDRÉ LÚCIO GOMES, braço direito e responsável pelas
movimentações financeiras de YORAM EL AL.
Peça chave no esquema de lavagem de capitais é também a empresa concessionária de
veículos EURO IMPORTED CARS VEÍCULOS LTDA, CNPJ 10.481.913/0001-20, através da qual está
sendo lavado, dissimulado e ocultado o produto ilícito dos crimes praticados pelo grupo. A empresa, além de
ser o braço econômico da organização, realiza habitualmente importação ilegal de veículos usados
(contrabando).
Verificados delitos federais, houve desmembramento das investigações, ficando a questão
dos explosivos e o homicídio na Justiça Estadual e vindo para esta 3ª Vara Federal Criminal a investigação
acerca do contrabando e dos braços financeiros da organização criminosa.
Ao longo da investigação, foi possível desvelar várias células e núcleos da organização
criminosa articulada pelos grupos de HAYLTON ESCAFURA e YORAM EL AL, tanto com a finalidade de
exploração de caça-níqueis, como na importação ilegal de veículos e outras atividades voltadas à lavagem de
dinheiro.
Ao contrário do que se imaginava inicialmente, ao invés de ter havido uma efetiva
contratação de YORAM EL AL e seus asseclas pela organização criminosa liderada por HAYLTON
ESCAFURA contra organizações rivais, ficou em verdade comprovada uma associação perene para
cometimento de crimes. Os dois grupos (dos ESCAFURA e de YORAM) cooperam para a prática de
contrabando, exploração de jogo e lavagem de dinheiro.
A comprovação destes delitos, como se verá detalhadamente, ficou amplamente
demonstrada pelas provas colhidas na fase inquisitorial. Nos autos da medida cautelar requerida ao
juízo, foi obtida interceptação telefônica de alguns dos investigados para melhor individualização
da conduta de cada membro da organização criminosa. Além disso, foi realizada minuciosa análise
das atividades internacionais da organização, especialmente a importação ilegal de veículos através
da empresa EURO IMPORTED CARS LTDA e introdução de componentes estrangeiros para
exploração de MEPs, assim como a exploração destas MEPs por parte da quadrilha, envolvendo a
corrupção de agentes públicos.
2. DOS DELITOS APURADOS
2.1. CONTRABANDO DE CARROS USADOS ATRAVÉS DA EMPRESA EURO IMPORTED CARS
A par de todas as atividades criminosas realizadas pela organização, que envolviam a exploração ilegal de
jogo, o contrabando de peças de informática para a manutenção de MEPs, que é objeto de outra denúncia
neste juízo, existem provas robustas de constantes crimes sendo realizados através da empresa EURO
IMPORTED CARS LTDA, o braço financeiro da organização criminosa.
De um lado, a empresa pratica diuturnamente contrabando, mediante a importação de carros usados,
vedada no Brasil. Além disso, estes veículos são revendidos posteriormente em dinheiro vivo, muitas vezes
para jogadores de futebol e cantores, de maneira a dificultar o rastreamento da origem ilícita do capital. De
fato, há diálogos em que os criminosos falam de quantias elevadas, que por vezes giram em torno de
milhões de reais, especialmente altas para a compra de um carro. Em várias comunicações interceptadas,
ficou destacada a forma de pagamento utilizada pela organização criminosa na revenda: dinheiro vivo, opção
com o evidente intuito de evitar rastreamento e facilitar a sonegação fiscal e a lavagem de dinheiro. A forma
das negociações, o tipo de pagamento, a ocultação dos bens e a utilização de laranjas, são todas
circunstâncias que, como se verá, tipificam o delito de lavagem de dinheiro.
A utilização da EURO IMPORTED CARS como mecanismo financeiro para a organização criminosa é
cotidiana, e dela se valeram os núcleos principais da organização criminosa. Na concessionária de veículos,
os principais sócios são HAYLTON ESCAFURA e FÁBIO DUTRA DE SOUZA, vulgo FABINHO.
YORAM EL AL, por possuir inúmeros contatos internacionais, tornou-se um importante ponto de conexão
dos ESCAFURA com este mecanismo de importação ilegal de veículos. E esta aproximação de HAYLTON e
YORAM revela-se intensa, e será detalhada a seguir em algumas das transações envolvendo ambos os
investigados e seus associados no crime.
Através da análise dos áudios das interceptações, foi possível detectar fraudes na importação, contrabando e
fortes indícios de crimes tributários e financeiros, especialmente pela interposição de empresas e
transferências diretamente do importador para o cliente, por vezes registrando-se o veículo no nome de
terceiros (laranjas) que não aqueles que efetuaram o pagamento.
As negociações de veículos importados, identificadas ao longo da investigação, permitiram elaboração de
requerimentos que fundamentaram o afastamento do sigilo fiscal referente à cadeia de importação. Com a
quebra de sigilo determinada por este juízo, contemplando o encaminhamento de todos os documentos,
dados, registros e informações pertinentes às pessoas físicas e jurídicas envolvidas no processo de
importação, relacionando-se exportador, importador, faturador, alienante, adquirente e outros integrantes da
cadeia de negociação, o Escritório de Inteligência da Receita Federal – ESPEI prestou informações que
incluem a relação de veículos pela empresa em que tenha sido confirmada irregularidade criminosa na
importação.
Foi possível acesso ao CARFAX, documento fornecido por empresa privada americana, onde ambos os
países registram diversas informações sobre o veículo. Houve também cruzamento de dados com o sistema
DARTTS, base de exportações americanas para o Brasil, bem como análise comparativa da legislação
estrangeira e nacional, trabalho que possibilitou à Receita Federal identificar quais veículos seriam “usados”
e, portanto, quais importações seriam ilegais.
DAS CONDUTAS DOS ACUSADOS MÁRCIO E RODRIGO
Como mencionado anteriormente, as condutas criminosas descritas nesta denúncia dizem respeito à empresa
EURO IMPORTED CARS LTDA, empresa administrada pelos exploradores de jogo ilegal.
Juntamente com FÁBIO DUTRA DE SOUZA e HAYLTON ESCAFURA, bem como
toda a quadrilha que operava a EURO IMPORTED CARS, participaram da negociação dos veículos
importados ilegalmente pelos acusados outros individíuos. YORAM EL AL, MARCO AURÉLIO DOS
SANTOS BORBA, PAULO VIANNA e JOSÉ MAURO KALIFE, todos denunciados no Processo nº
2011.51.01.810153-3, associaram-se à EURO IMPORTED CARS na importação fraudulenta de veículos,
tendo introduzido JEHUDA KAZZAB, vulgo UDI, nos negócios da quadrilha (UDI está denunciado em
outro processo também neste juízo).
Estes indivíduos foram os intermediários para a introdução clandestina no Brasil do
veículo importado pela EURO IMPORTED CARS e adquirido pelo jogador de futebol EMERSON (ou
“Sheik”, cujo nome completo é MARCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE, ora denunciado). Confira-se o
áudio anexo:
PAULO VIANNA e JOSÉ MAURO são sócios da empresa PBMK INTERNATIONAL INC.que figurou
como exportadora de diversos veículos usados, especialmente para a empresa RIO BELLO, incluindo aquele
adquirido pelo jogador de futebol EMERSON (MARCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE). As negociações,
de acordo com os áudios interceptados, eram flagrantemente criminosas, com falsidades escancaradas,
provável corrupção de funcionários da alfândega e atuação de laranjas no Brasil e nos EUA.
No que se refere à primeira importação realizada pelos acusados, esta girou em torno do veículo BMW X6
XDRIVE35I PLACA KYJ 7112 CHASSI 5UXFG2C52BLX06427.
Em relação a este veículo, ficou comprovado que este foi importado por intermédio da Declaração de
Importação – DI 1019910730, na qual figura como importador a empresa RIO BELLO COM IMP E EXP
LTDA, CNPJ 11.008.549/0001-49, e como exportador a empresa estrangeira FUN RIDES, sendo que do
conhecimento de embarque marítimo (Bill of Landing
–
B/L), declarado no SISCARGA, consta como
responsável pelo embarque a empresa estrangeira PBMK INTERNATIONAL INC, empresa de propriedade
dos acusados PAULO VIANNA e JOSÉ MAURO KALIFE. Há informação do sistema DARTTS de que o
veículo é usado, caracterizando importação proibida em função das restrições legais impostas ao comércio
exterior.
As demais pessoas físicas e jurídicas envolvidas na transação foram identificadas a partir do envio da lista de
documentos fornecidos pelo governo americano, extraindo-se a participação de cada um no processo, através
de gráfico temporal:
Seguindo histórico da ocorrência elaborado pelo ESPEI, a concessionária SUNBELT BMW
negocia o veículo com a FUN RIDES, que consta da relação de dealers do Estado da Flórida como um “VI Independent (Used) Motor Vehicles”, ou seja, distribuidor de veículos usados. Porém, efetua venda para a
LIMO DEPOT, possivelmente pelo fato da primeira ser dealer de carros usados e a segunda não.
A FUN RIDES, que tem dentre seus representantes JEHUDA KAZZAB, vulgo UDI, apresentado a
HAYLTON e FABINHO por YORAM, efetua pagamento para SUNBELT BMW e para LIMO DEPOT e
vende o veículo para a EURO IMPORTED CARS, cuja sociedade é composta por HAYLTON ESCAFURA,
FABINHO e outros.
A transferência de fundos efetuada entre agências do Banco do Brasil para a quitação desta operação é
ordenada pelo acusado MARCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE, na época jogador do Fluminense e
atualmente jogador do Corinthians, sendo que o veículo foi registrado no sistema RENAVAM em nome de
ORLA-RIO ASSOCIADOS LTDA, CNPJ 68.644.533/0001-40, cujo quadro societário é composto por:
1.
JOAO BARRETO PEREIRA DA COSTA (administrador) – 93,75%;
2.
JANDYRA LOPES BARRETO DA COSTA – 5%;
3.
DANIELE LOPES BARRETO DA COSTA – 1,25%.
Num dos diálogos interceptados, foi possível identificar que a própria quadrilha debatida a existência de
algum problema na importação de um veículo BMW X-6, quando PAULO VIANNA (da empresa PBMK)
pergunta para FABINHO, que usa o rádio de YORAM, acerca das licenças da loja que vendeu o veículo, a
LIMO DEPOT.
Posteriormente, o mesmo evento foi recorrentemente referido nos diálogos, haja vista que UDI precisava
comprovar alguns dados acerca da compra do veículo junto a órgão do governo norte-americano, e por esta
razão manteve diálogos com YORAM para que conversasse com o acusado PAULO (da empresa PBMK) e
descobrisse o problema.
No mesmo dia 09/02/2011, UDI informa para YORAM o responsável pelo depósito da BMW X6:
“MÁRCIO PACIAS DE ALBAQUIQUE”, que posteriormente foi identificado como MÁRCIO PASSOS DE
ALBUQUERQUE, jogador de futebol conhecido como EMERSON ou SHEIK. Na noite do mesmo dia, UDI
diz para YORAM que não sabe porque perguntaram desse carro, porque ele envia cerca de 50 carros por
mês para ISRAEL e nunca teve problema.
Posteriormente, em 12/02/2011, UDI cita que a empresa que tinha problemas não era a de UDI, mas sim a
LIMO DEPOT com quem UDI negocia, e seguem conversando sobre como vão solucionar esse problema.
(>>>>>>>>>>>>>>>>>>)
Não menos importante frisar que o real comprador do veículo nos Estados Unidos
foi a EURO IMPORTED CARS, como demonstram os documentos obtidos pelo ICE, apesar desta, em
nenhum momento, aparecer na operação nos documentos oficiais. Está comprovada a fraude que
tinha como objetivo ocultar a origem ilícita dos bens.
A segunda importação ilegal realizada pelos acusados diz respeito ao veículo BMW X6
XDRIVE 35i, COR BRANCA, ANO 2010, MODELO 2011, CHASSI: 5UXFG2C52BLX07027. Cabe
destacar que este veículo se encontra declarado na base de dados do Sistema DARTTS como usado.
Em relação a esta transação, verificando-se as NF-e da RIO BELLO, constata-se que
MARCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE havia adquirido, em 29/10/2010, outro veículo importado pela
RIO BELLO: BMW X6 xdrive 35i, cor branca, ano 2010, modelo 2011, CHASSI: 5UXFG2C52BLX07027,
pelo valor de R$ 200.000,00 (R$ 160.000,00 valor bruto + R$ 40.000,00 IPI).
Este veículo foi importado por meio da DI 1019087511, cujo exportador fora a PBMK
INTERNATIONAL INC, empresa de PAULO e JOSÉ MAURO. Sua venda se deu por meio da NF-e 12.
Contudo, consultando-se a mesma fonte, verifica-se que o mesmo automóvel dá entrada,
novamente, na RIO BELLO, em 20/12/2010, pelos mesmos R$ 160.000,00 (aqui, sem haver menção ao IPI),
constando como vendedor MARCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE, citada como devolução, NF-e 30. No
mesmo dia, o veículo é vendido para seu proprietário atual, o acusado RODRIGO OLIVEIRA DE
BITTENCOURT, mais conhecido como “DIGUINHO”, jogador do Fluminense, pelo mesmo valor da
primeira venda (R$ 160.000,00 + R$ 40.000,00 IPI), NF-e 31. Todavia, em 10/01/2011, o veículo dá entrada
como devolução, NF-e 34, e sai novamente como venda para RODRIGO OLIVEIRA BITTENCOURT, NF-e
35.
DENATRAN R E N A V A M 13/07/2011
SERPRO CONSULTA VEICULO POR CHASSI/VIN VEICULO: 01/01
CHASSI/VIN..: 5UXFG2C52BLX07027 UF/PLACA.: RS JCY0888
MUNICIPIO...: CANOAS
PROPRIETARIO: CPF 83037209020 SITUACAO: CIRCULACAO
NUMERO-RENAVAM..: 279549237
MARCA/MODELO....: I/BMW X6 XDRIVE35I COR.............: BRANCA
TIPO-VEICULO....: AUTOMOVEL ESPECIE.........: PAS
COMBUSTIVEL.....: GASOLINA QTD.PASSAGEIROS.: 4
MOTOR...........: 156271 ANO-MODELO......: 2011
CAIXA-CAMBIO....: ANO-FABRICACAO..: 2010
MONTAGEM........: COMPLETA POTENCIA........: 304
TIPO-CARROCERIA.: NãO APLIC CILINDRADAS.....: 2979
NUM-CARROCERIA..: PROCEDENCIA.....: ESTRANGEIRA
TIPO-CHASSI.....: NORMAL ULT-ATUALIZACAO.: 13/01/2011
IDENT-FATURADO..: CNPJ 11008549000149 UF-DEST-FATURADO: RJ
Ou seja, o destinatário real do bem era o acusado Rodrigo Bittencourt, vulgo
DIGUINHO. O carro foi importado, todavia, pelo jogador EMERSON, revendido para DIGUINHO, depois
devolvido para a EURO IMPORTED CARS e recomprado dias depois.
O modus operandi evidencia lavagem de dinheiro, pela criação artificial de uma cadeia de
compra e venda que distancia o destinatário do automóvel da importação ilegal.
TIPIFICAÇÃO DAS CONDUTAS
DA AUTORIA DOS CRIMES DE CONTRABANDO
As importações de veículos usados no Brasil é proibida em função das restrições legais
impostas ao comércio exterior. Em que pese esse cenário jurídico-legal proibitivo, os acusados utilizaram e
mantiveram em depósito, em proveito próprio e alheio, veículos que sabiam ser produto de introdução
clandestina no território nacional, tipificando a conduta do art.334 § 1º, “c” e “d” do CP.
A comprovação de que os veículos eram usados se deu a partir da consulta à base de dados
disponibilizada pelo governo norte-americano, onde foram identificados os números de chassi que se
encontravam marcados como "used vehicles", e através da análise dos diálogos interceptados envolvendo as
transações.
Os acusados realizaram operações de maneira completamente atípica para um comprador de
boa-fé. Qualquer indivíduo que queira comprar um veículo importado legalmente, procederia da seguinte
forma: iria até uma loja, encomenda o carro, pode até pagar um sinal, a loja faz a intermediação, o carro é
exportado para o Brasil, pagam-se os impostos, o carro vai para a loja, o comprador paga o restante do preço
combinado, retira o veículo, emplaca em seu próprio nome e depois declara ao IRPF a aquisição do bem.
Mas não foi este o procedimento dos acusados. O acusado MÁRCIO importou dois veículos
através da empresa EURO IMPORTED CARS.
O primeiro deles foi emplacado no nome de terceiros, tendo havido pagamento diretamente
à empresa exportadora nos EUA, através de transferência bancária feita pelo próprio acusado EMERSON.
Não é crível que o acusado não soubesse da ilegalidade. As provas são contundentes em apontar a conclusão
oposta.
O segundo veículo importado por EMERSON, e posteriormente revendido para
DIGUINHO, jamais foi emplacado no nome do acusado, e foi vendido pela quantia de R$ 315.000,00
(trezentos e quinze mil reais), embora a nota fiscal do automóvel indique preço muito inferior (R$
200.000,00).
Em depoimento prestado na Procuradoria da República, EMERSON tentou atribuir a
responsabilidade pelas importações a um “amigo”, revendedor de carros, chamado Caetano, e disse ainda
que nunca olhou a nota fiscal do veículo, e portanto não sabia da divergência de valor.
Ouvido no MPF, Caetano prestou depoimento em sentido completamente diverso da versão
apresentada pelo acusado, negando que tenha realizado, em sua vida profissional, qualquer transação
internacional envolvendo importação de veículos. No mais, não houve qualquer prova da intermediação de
Caetano. Ao contrário, EMERSON efetuou pagamento diretamente à empresa exportadora. Note-se ainda
que EMERSON já foi proprietário de outro veículo importado, um Camaro, e portanto sabia bem dos
meandros da importação de veículos.
Em suma, a versão do acusado é dissonante de todas as provas testemunhais e orais. Além
disso, houve diversas divergências nos depoimentos dos dois acusados, os quais, ao invés de apresentarem
versões sólidas, apenas tentaram eximir-se da responsabilidade.
O acusado RODRIGO, por sua vez, tinha ciência da origem ilícita do bem. RODRIGO
recebeu veículo com nota fiscal em valor muito menor do que aquele que pagou. O próprio acusado juntou
ao procedimento administrativo da Receita Federal cheques que ele mesmo reconheceu como sendo aqueles
utilizados para o pagamento (em quantia muito maior do que o valor pago). Em depoimento prestado na
Procuradoria da República, o acusado confirmou que comprou o veículo no ano de 2010, mas não o declarou
no IRPF sob o argumento de que, como emplacou em 2011 e terminou de pagar em 2011, pensou que
poderia declarar posteriormente.
Por isso, e por terem ciência do esquema criminoso, os acusados MÁRCIO PASSOS DE
ALBUQUERQUE e RODRIGO OLIVEIRA DE BITTENCOURT devem responder pelo delito de
contrabando, incursos nas penas do art. 334 § 1º, “c” e “d” do CP , o primeiro por 2 (duas vezes), na forma
do art.71 do CP, e o segundo uma vez.
LAVAGEM DE DINHEIRO
A Lei n.9.613/98, que trata dos crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores,
descreve as condutas que se amoldam àquelas praticadas pelos acusados, haja vista que eles ocultaram a
origem ilícita das operações praticadas.
As condutas praticadas pelos acusados foi patente em demonstrar mecanismos para
dissimular e ocultar a origem ilícita dos carros que eram introduzidos ilegalmente no país.
O acusado EMERSON emplacou um veículo em nome de terceiros, para o fim de
ocultar a ilicitude de sua importação.
Os acusados RODRIGO e EMERSON, na negociação em que ambos
participaram, devolveram o carro por duas vezes à loja EURO IMPORTED CARS, de maneira a
afastar a sua propriedade da origem ilícita da importação operada pelo denunciado EMERSON. O
carro foi adquirido em outubro de 2010, e posteriormente deu entrada na loja EURO no dia
20.12.2010 e no mesmo dia vendido a RODRIGO. Posteriormente, houve nova devolução do
veículo no dia 10.01.2011 e nova compra no mesmo dia 10.01.2011. Confiram-se as notas fiscais
juntadas em anexo.
A conduta evidencia a lavagem de dinheiro porque os acusados EMERSON e
RODRIGO atuaram em conluio com os donos da EURO IMPORTED CARS para fazer ocultar a
origem ilícita da importação. Frise-se que são dois momentos distintos e dois crimes diversos. A tão
só introdução dos veículos no país já tipifica o crime de contrabando. Porém, a forma de negociação
e as demais circunstâncias são comprobatórias da lavagem de dinheiro. A lavagem ocorre em
momento posterior.
Os acusados criaram uma cadeia de compra e venda do mesmo veículo artificialmente, de
maneira a distanciar o real comprador e destinatário do veículo da importação ilegal. As notas fiscais foram
fraudadas, adulteradas, com datas fictícias e dissonantes das datas da efetiva compra, tudo para encobrir as
fraudes.
Por todas as condutas fraudulentas anteriormente narradas MÁRCIO PASSOS DE ALBUQUERQUE e
RODRIGO OLIVEIRA DE BITTENCOURT devem responder pelo delito de lavagem de dinheiro,
estando incursos nas penas do art. 1º, VII, e §1º, I e II da Lei 9.613/98, na forma do parágrafo 4º do mesmo
artigo.
Pelo exposto, requer o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL que seja a presente denúncia recebida, com a
citação dos denunciados para apresentarem defesa preliminar e, após processadas e provadas as imputações,
que sejam condenados nas penas da lei.
Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2012.
Indicamos as seguintes testemunhas para prestar depoimento:
JOÃO MARCELLO LOPES BARRETO DA COSTA, portador da carteira de identidade n.085656874,
expedida pelo IFP-RJ, inscrito no CPF sob o n.04534831781, residente na Rua Estrada Sorimã, n.16, casa,
Barra da Tijuca, Rio de Janeiro-RJ, CEP: 22611-030;
MARCELO CAETANO VITAL FERREIRA, portador da carteira de identidade n.077345353, expedida
pelo IFP-RJ, inscrito no CPF sob o n.013653897-58, residente na Rua Mário Covas Jr., n.215, apt.1506,
Barra da Tijuca, Rio de Janeiro-RJ;

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