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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
Centro de Estudos e Investigação Científica
RELATÓRIO
SOCIAL
DE ANGOLA
2013
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
Centro de Estudos e Investigação Científica
RELATÓRIO
SOCIAL
DE ANGOLA
2013
CENTRO DE ESTUDOS E INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA
DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA (CEIC / UCAN)
DIRECTOR
– Alves da Rocha
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
COORDENAÇÃO – Nelson Pestana
EQUIPA DE REDACÇÃO
Alves da Rocha
Eduardo Sassa
Francisco Paulo
Gilson Lázaro
Guilherme Santos
Jorge Trula
Nelson Pestana
Osvaldo Silva
Sérgio Calundungo
RECOLHA DE INFORMAÇÃO E PRODUÇÃO DE GRÁFICOS
Cláudio Fortuna
Paxote Gunza
José Lumango
INVESTIGADORES PERMANENTES
Alves da Rocha
Carlos Vaz
Cláudio Fortuna
Francisco Paulo
Nelson Pestana
Osvaldo Silva
Paxote Gunza
Precioso Domingos
Regina Santos
Vissolela Gomes
Wilson Silva
INVESTIGADORES COLABORADORES
Albertina Delgado
Carlos Pinto
Eduardo Sassa
Fernando Pacheco
Gilson Lázaro
Luís Bonfim
Margareth Nanga
Milton Reis
Salim Valimamade
ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS
Margarida Teixeira
Lúcia Couto
Evadia Kuyota
Afonso Romão
Leonardo Monteiro
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ..................................................................................................
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1. Participação dos cidadãos na gestão e controlo das políticas públicas ....... 9
1.1 Introdução ................................................................................................ 9
1.2 O desempenho das instituições do Estado na viabilização da participação
dos cidadãos nos processos de gestão das políticas públicas .................. 12
1.3 Desempenho das Organizações da Sociedade Civil nos processos
de gestão e controlo das políticas públicas .............................................. 16
2. População, condições de vida e pobreza.......................................................
2.1 População.................................................................................................
2.2 Condições de vida e Índice de Desenvolvimento Humano ......................
2.3 Pobreza e poder de compra dos salários .................................................
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3. Compromisso com a saúde............................................................................
3.1 Quadro epidemiológico............................................................................
3.1.1 Malária ............................................................................................
3.1.1.1 Prevalência e letalidade ......................................................
3.1.1.2 Formas de combate e tratamento .......................................
3.1.2 Doenças respiratórias agudas .........................................................
3.1.3 Doenças diarreicas agudas ..............................................................
3.1.4 Disenteria ........................................................................................
3.1.5 Febre tifóide ....................................................................................
3.1.6 Tuberculose .....................................................................................
3.1.7 Doença do sarampo ........................................................................
3.1.8 Doenças sexualmente transmissíveis ..............................................
3.2 Indicadores-chave da saúde .....................................................................
3.2.1 A mortalidade materna ...................................................................
3.2.2 A mortalidade neonatal ..................................................................
3.2.3 A mortalidade infantil .....................................................................
3.2.4 VIH/SIDA..........................................................................................
3.3 Saúde preventiva......................................................................................
3.3.1 Programa de cobertura vacinal .......................................................
3.3.1.1 Vacina Pentavalente 3 .........................................................
3.3.1.2 Vacina contra o sarampo ....................................................
3.3.1.3 Vacina contra a poliomielite ...............................................
3.3.1.4 Situação vacinal em geral ....................................................
3.4 Saúde curativa ..........................................................................................
3.5 Despesas com a saúde .............................................................................
3.5.1 Na perspectiva do orçamento .........................................................
3.5.1.1 Despesas per capita ............................................................
3.5.1.2 Despesas públicas/Despesas privadas com a saúde ...........
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3.5.1.3 Distribuição das despesas dentro do sector........................ 67
3.5.1.4 Despesas por programas ..................................................... 68
4. Compromisso com a educação ......................................................................
4.1 Introdução ................................................................................................
4.2 Ensino pré-primário (Iniciação) ................................................................
4.3 Ensino primário ........................................................................................
4.3.1 Cobertura escolar ............................................................................
4.3.2 Rendimento escolar ........................................................................
4.3.3 Abandono escolar ...........................................................................
4.3.4 Evolução do corpo docente .............................................................
4.3.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares ...............
4.4 Ensino secundário ....................................................................................
4.4.1 Cobertura escolar ............................................................................
4.4.2 Rendimento escolar ........................................................................
4.4.3 Abandono escolar ...........................................................................
4.4.4 Evolução do corpo docente .............................................................
4.4.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares ...............
4.5 Educação para adultos .............................................................................
4.6 Ensino especial .........................................................................................
4.7 Manuais e merenda escolar .....................................................................
4.8 Ensino superior ........................................................................................
4.8.1 O crescimento e suas implicações...................................................
4.8.1.1 O crescimento do número de estudantes ...........................
4.8.1.2 O crescimento do número de docentes ..............................
4.9 Despesas com a educação .......................................................................
4.9.1 Peso da despesa com a educação no OGE ......................................
4.9.2 Repartição da despesa com a educação nos diferentes níveis
de ensino .........................................................................................
4.9.3 Estimativa da despesa per capita com a educação .........................
4.9.4 Despesa per capita nos ensinos primário e secundário ..................
4.9.5 Despesa per capita global ...............................................................
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5. A situação da família e da criança (realidade, compromissos e desafios) ...
5.1 Introdução ................................................................................................
5.2 Realidade socioeconómica da família em Angola ....................................
5.2.1 Estrutura demográfica.....................................................................
5.2.2 Estado civil e relações conjugais .....................................................
5.2.3 Tamanho e estrutura do agregado familiar .....................................
5.2.4 Habitação e meio ambiente ............................................................
5.3 Água e saneamento .................................................................................
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5.4 Bem-estar e conforto (mobilidade, acesso a informação e novas
tecnologias) ..............................................................................................
5.5 Impacto da pobreza sobre a família e a criança .......................................
5.6 Os 11 compromissos com a criança e o Orçamento Geral do Estado ......
5.7 Despesas com a família e infância............................................................
6. Segurança alimentar e nutricional (dos conceitos às realidades) ................
6.1 Introdução ...............................................................................................
6.2 Antecedentes do termo segurança alimentar ..........................................
6.3 Identidade conceitual sobre segurança alimentar ...................................
6.4 Conceitos relacionados à segurança alimentar e nutricional ...................
6.5 Política pública da segurança alimentar e nutricional..............................
6.6 Potencial para promover segurança alimentar e nutricional ..................
6.7 Segurança alimentar e nutricional na dimensão da disponibilidade .......
6.8 Casos locais de disponibilidade e acesso na segurança alimentar ...........
6.9 Segurança alimentar e nutricional na dimensão do acesso ....................
6.10 Conhecimento sobre a situação da segurança alimentar
e nutricional.......................................................................................
7. Actores não-estatais na acção do desenvolvimento e da solidariedade......
7.1 Introdução ................................................................................................
7.2 Hospital Divina Providência......................................................................
7.2.1 Estrutura física do HDP, sua capacidade e funcionamento .............
7.2.2 Áreas de atendimento .....................................................................
7.2.3 Consultas externas ..........................................................................
7.2.4 Centro de tratamento de tuberculose ............................................
7.2.5 Consultas pré-natais ........................................................................
7.2.6 VIH/SIDA .........................................................................................
7.2.7 Consultas especializadas .................................................................
7.2.8 Laboratório de análises e radiologia ...............................................
7.2.9 Centro Nutricional Terapêutico/Seguimento e Vigilância
Nutricional.......................................................................................
7.2.10 Transfusões/Crianças Vacinadas/Vacinas ......................................
7.2.11 Situação epidemiológica ...............................................................
7.2.12 Recursos humanos e sustentabilidade do hospital .......................
7.2.13 Relações externas..........................................................................
7.2.14 Dimensão holística ........................................................................
7.3 MOSAIKO – Instituto para a Cidadania .....................................................
7.3.1 Introdução ......................................................................................
7.3.2 Acções desenvolvidas em 2013 .......................................................
7.3.2.1 Aconselhamento jurídico e seminários ...............................
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7.3.2.2 Conferências e debates .......................................................
7.3.2.3 Publicações .........................................................................
7.4 Monitoria social e boa governação – o caso do CICA .............................
7.4.1 Resenha Histórica ............................................................................
7.4.2 Monitoria social e boa governação .................................................
7.4.2.1 Área e âmbito de implementação do Projecto ...................
7.4.2.2 Acções desenvolvidas em 2012 e constatações feitas.........
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8. Monografia sobre a situação social no Município do Negage ......................
8.1 Introdução ................................................................................................
8.2 Caracterização geográfica ........................................................................
8.3 Caracterização administrativa e demográfica ..........................................
8.3.1 Comuna do Quisseque ....................................................................
8.3.2 Comuna do Dimuca .........................................................................
8.4 Caracterização política e social ................................................................
8.5 Igrejas .......................................................................................................
8.6 Educação ..................................................................................................
8.7 Saúde .......................................................................................................
8.8 Agricultura e pecuária ..............................................................................
8.9 Viação e trânsito ......................................................................................
8.10 Comércio e hotelaria ..............................................................................
8.11 Conclusão ...............................................................................................
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CONCLUSÃO ..................................................................................................... 183
APÊNDICE ........................................................................................................ 185
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................. 190
INTRODUÇÃO
O Relatório Social de Angola procura, todos os anos, fornecer às pessoas uma
visão panorâmica sobre a situação social do país. O CEIC recorre a indicadores estatísticos, a dados sistémicos e à análise conjuntural, para dar a conhecer as condições
de vida e as percepções dos cidadãos sobre o desenvolvimento do país, nos mais
diversos domínios.
A perspectiva multidimensional adoptada associa várias maneiras de abordar
a questão do desenvolvimento, levando em consideração quer a relação renda/
consumo, quer a perspectiva da privação da qualidade de vida do IDH, do PNUD,
quer ainda outras dimensões ligadas à liberdade política, à segurança das pessoas
e à participação na vida da comunidade.
Este relatório apresenta uma estrutura idêntica aos demais com uma novidade
em relação à inserção, pela primeira vez, de um capítulo dedicado a uma monografia
de um município, no caso vertente, o município do Negage. Consagra-se também
um capítulo ao problema da segurança alimentar, repetindo os demais capítulos
dedicados ao compromisso com a saúde, a educação, a família e a criança, bem
como sobre o papel dos actores não estatais no desenvolvimento e solidariedade.
O primeiro capítulo está, este ano, menos virado para a “configuração política” e
mais para “a participação dos cidadãos na gestão e controlo das políticas públicas”.
Há também um apêndice final com a cronologia dos factos político-sociais do ano.
A coordenação
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
1. PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS NA GESTÃO E CONTROLO DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS
1.1 Introdução
A preocupação do presente relatório, neste capítulo, prende-se com a forma
como decorreu a gestão das políticas públicas no país, durante o ano de 2013, tendo
em conta o desempenho das instituições do poder, o funcionamento do espaço
público, os modos de participação dos cidadãos, a qualidade das suas intervenções, a existência e o funcionamento das instituições representativas, bem como,
a interacção entre os cidadãos e os governantes ao nível nacional, provincial e
local. Pretende-se analisar aspectos concretos do modo de funcionamento da configuração política e da participação dos cidadãos, quer como indivíduo, quer em
grupos ou organizações sociais, dando lugar também às percepções que os diversos
actores sociais têm do espaço político nacional. Por isto, este relatório procura dar
a conhecer a configuração política nacional, não meramente formal, mas aquela
que as dinâmicas do processo político determinam, através das acções e reacções
dos diversos actores envolvidos, dando importância não apenas à acção do poder
mas também à participação dos cidadãos no espaço público e à sua percepção
sobre o exercício do poder.
O contexto político e social de Angola, em 2013, foi marcado por uma série de
dinâmicas que exigem uma profunda reflexão em relação ao papel desempenhado
pelas instituições do Estado, com realce para a garantia dos direitos dos cidadãos
e a gestão democrática das políticas públicas. Este ano político foi marcado por
muitos factos que podem ser arrumados em três grandes temas: a relação entre
o poder e os direitos dos cidadãos, a sucessão do Presidente da República, e o
processo de implementação das autarquias, como expressão da institucionalização
de espaços de decisão democrática, de uma aproximação do poder dos cidadãos
e da sua partilha por diversos actores. O interesse primordial destes temas, que
estão necessariamente interrelacionados, é ainda maior quando alguns analistas
consideram que estes podem ser tendentes a emprestar certa imprevisibilidade,
no futuro desenvolvimento político nacional.
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CEIC / UCAN
O relatório presta particular atenção à maneira como as instituições do Estado
lidaram com as reivindicações e exigências dos cidadãos ligadas ao direito à manifestação (Artigo 47.o, CRA), à governação e ao exercício do poder local, às liberdades
de expressão e a outros aspectos relacionados com a gestão participativa e descentralizada das políticas públicas.
Apesar da Constituição da República garantir e estimular a participação dos
cidadãos (Artigo 52.o, CRA), quer ao nível individual, quer através de organizações
representativas dos seus interesses, nos processos de formulação das políticas públicas
e na monitoria e controlo das formas como estas são implementadas, de uma forma
geral, constatou-se que em 2013 as iniciativas de participação das instituições da
sociedade civil, com o propósito de acompanhar a gestão das políticas públicas e o
controlo das acções do governo, foram escassas, salvo raras excepções como foi o
caso do projecto de monitória social implementado pelo CICA, e o acompanhamento
da actuação governamental face às situações de abuso dos direitos humanos, feita
por algumas organizações da sociedade civil, ligadas à problemática dos Direitos
Humanos.
O que foi marcante foram as diferentes tentativas de manifestação e protestos
promovidas por cidadãos maioritariamente jovens ligados a um movimento denominado “Movimento Revolucionário”, mas que encontraram da parte das autoridades
impedimentos, tendo muitas das vezes resultado em actos de violência e detenção
de manifestantes.
Para muitos dos cidadãos os desafios e os constrangimentos, que limitaram a
participação dos cidadãos na vida pública, não estão directamente relacionados com
a aprovação de novas leis (com excepção da lei sobre as autarquias locais), mas sim
com a interpretação que as instituições do Estado fazem dos preceitos constitucionais
e com a maneira como estas lidam com as pressões que determinados segmentos
da sociedade civil e política fazem para viabilizar a participação dos cidadãos, ao
nível da gestão descentralizada das políticas públicas ou mesmo com os actos de
mobilização que visam a realização de manifestações públicas contra o Executivo.
Portanto, a percepção generalizada dos cidadãos é a de que em 2013 os constrangimentos verificados no exercício de participação cívica dos cidadãos resultam
sobretudo da falta de vontade política e não tanto da ausência de mecanismos
jurídicos e legais para a viabilização das mesmas.
Apesar das limitações que representam para a participação dos cidadãos o facto
de não estarem em funcionamento as autarquias locais, conforme previsto na Constituição, pensamos que o formato institucional existente dispõe de uma série de
espaços de interacção, auscultação, consulta e diálogo entre as instituições públicas
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do Estado e os cidadãos, através dos seus representantes mas que na maior parte dos
casos não funcionaram, e os poucos que celebraram eventos, o fizeram de maneira
pouco inclusiva, numa metodologia que impediu a auscultação e a concertação entre
os governantes e os governados e que apresentava certos questionamentos em
relação à legitimidade dos indivíduos indicados para representar diversos segmentos da sociedade civil com a qual se pretendia dialogar. Como exemplo, podemos
citar o caso do processo de diálogo juvenil, o caso dos Conselhos de Auscultação e
Concertação Social (CACS), ao nível dos municípios, e outros espaços de interacção
entre os cidadãos e os governantes que não funcionaram, facto reconhecido pelo
próprio Presidente da República e chefe do executivo, embora na sua qualidade de
presidente do partido no poder, aquando do seu discurso de abertura da reunião
do Comité Central do MPLA celebrada a 7 de Janeiro deste ano.
Portanto, há a percepção generalizada de que apesar de existirem por lei uma
série de espaços institucionais vocacionados para facilitar a actuação efectiva dos
cidadãos em processos de interacção com as instituições do Estado, no âmbito da
gestão das políticas públicas, na maior parte dos casos, estes espaços não funcionaram segundo as expectativas e os propósitos que estiveram na base da sua criação.
O modelo de gestão que procura incorporar nas suas estruturas orgânicas
espaços de interacção com vários segmentos da sociedade, tendo como propósito
o de incorporar a visão e a percepção dos cidadãos e, desta forma, democratizar
a gestão das políticas públicas, revelou-se pouco eficaz em 2013. Os cidadãos, à
semelhança do que tem acontecido em outros anos, tiveram poucas oportunidades de interagir com as instituições do Estado em processos de deliberação,
gestão e controlo de políticas públicas, nas mais diversas áreas sociais, ainda que
em muitas destas políticas estivesse previsto a sua participação activa como é o
caso da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza, a
Estratégia Nacional de Segurança Alimentar, o Fórum Nacional de Educação para
Todos e outros.
Perante estas evidências e constatações, colocam-se algumas questões que surgem da necessidade de discussão sobre a gestão participativa em Angola, e sobre o
aprofundamento das questões relacionadas com os mecanismos e formas de gestão
das políticas públicas como resultado dos encontros e desencontros na relação entre
as instituições do Estado e os cidadãos em Angola. As questões são as seguintes:
ͻ A configuração política do país permite consolidar um formato de gestão das
políticas públicas que tenha como eixo basilar a democratização e a participação dos cidadãos na implementação das políticas públicas? Em que medida o
contexto social e político de 2013 possibilitou a consolidação de um modelo
de gestão pública participativo?
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ͻ As diversas dinâmicas e exigências de participação da sociedade civil em Angola estão a influenciar o delinear de novas tendências na gestão das políticas
públicas?
1.2 O desempenho das instituições do Estado na viabilização da participação
dos cidadãos nos processos de gestão das políticas públicas
A realidade angolana tem sido marcada, nos últimos 10 anos, por mudanças
sociais, políticas e institucionais que procuram acompanhar as tendências globais
em relação aos processos de democratização da gestão das políticas públicas,
como ocorre em quase todo o mundo. Neste sentido, temos notado em 2013
que continuam a existir reivindicações da parte dos cidadãos, principalmente
dos mais destacados actores da sociedade civil, segundo as quais as diferentes
instituições do Estado continuam a levantar barreiras que obstaculizam a efectiva
participação dos cidadãos nos processos de tomada de decisão, gestão e controle
das políticas públicas. Embora previstos na lei, nos regulamentos e em outros
mecanismos institucionais formais e informais, na maior parte dos casos, as diferentes instâncias do poder do Estado não conseguiram fazer funcionar, de forma
efectiva e regular, iniciativas e espaços de consulta, diálogo, concertação e outros
mecanismos que visam assegurar o envolvimento e a participação dos cidadãos,
em casos como acções de demolição e realojamento dos cidadãos, Conselhos de
Auscultação e Concertação Social, ao nível de todos os municípios, aldeias, comunas e províncias, bem como outros processos que requeriam o envolvimento dos
cidadãos ou de instituições da sociedade civil, em sua representação.
Esta dificuldade que as instituições do Estado apresentam para viabilizar a
participação e o envolvimento dos cidadãos tem feito com que seja muito reduzido o segmento da sociedade civil que se mobiliza de maneira regular e com
base na lei, em prol da conquista de melhores condições de vida, salvaguarda dos
seus direitos e democratização das formas de gestão das políticas públicas. Ante
inúmeras barreiras e constrangimentos, as mobilizações dos cidadãos tendem a
ocorrer de maneira esporádica, pontual e, às vezes, fazendo recurso a estratégias
pouco consentâneas com a lei, a ordem e a ética para poder fazer ouvir a sua voz
ou assegurar os seus direitos.
Apesar da abertura política e do processo de descentralização, o facto de que
não tenha ainda ocorrido a ruptura com as atitudes, comportamentos e práticas paternalistas, proteccionistas, autoritárias e centralizadoras, no exercício do
poder (em certos casos tende, inclusive, a intensificar-se) faz com que os sectores mais privilegiados da nossa sociedade desenvolvam formas e mecanismos
capazes de influenciar as diferentes instituições que administram as políticas
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públicas em nome do interesse próprio e fora dos espaços e mecanismos formais
existentes para o efeito, o que facilita a existência de tráfico de influência e casos
de corrupção. Embora, do ponto de vista formal, se tenham realizado encontros
de auscultação e concertação social, quer ao nível local, quer ao nível central,
com destaque para os Conselhos de Auscultação e Concertação Social, aos níveis
municipais e provinciais, o Conselho da República (Artigo 135.o, CRA) não reúne
há vários anos e o Conselho Nacional de Concertação Social (CNCS), tendo reunido, foi presidido pelo Vice-Presidente da República.
Perante a pressão da rua, foram realizadas, a nível nacional, várias sessões
de diálogo com a juventude cujo ponto mais alto foi o encontro dos jovens, em
representação de todas as províncias e vários segmentos da nossa sociedade,
com o Presidente da República, mas tais encontros ainda estão muito longe de
assegurar a participação da população, por meio de organizações representativas,
dos mais variados segmentos da população no processo de formulação, controle
e gestão das políticas públicas ao nível municipal, provincial e nacional, mesmo
porque os promotores das manifestações de jovens e os segmentos que representam foram ostensivamente deixados de fora destes fóruns.
A Constituição apresenta também uma configuração que prevê a interacção
entre os cidadãos e outras instituições do Estado, através de mecanismos oficiais
tais como as comissões de trabalho da Assembleia Nacional e o Provedor de Justiça, porém, apesar da sua relevância, do ponto de vista das oportunidades de
participação que representam para os cidadãos, estes mecanismos não foram
eficazes nem se considera que tenham tido alguma contribuição relevante para
a participação dos cidadãos em matéria de responsabilização do Executivo, em
relação às políticas públicas que implementou e ao atendimento eficiente e eficaz
das demandas dos cidadãos ou mesmo da abertura aos cidadãos para discussão
de assuntos do seu interesse, aqui exceptuando o caso de algumas comissões da
Assembleia Nacional, que promoveram eventos que contaram com a participação
de actores da sociedade civil, com destaque para a 1.a Comissão que auscultou os
parceiros sociais do governo antes da aprovação, na especialidade, do Orçamento
Geral do Estado, depois deste ter sido aprovado na generalidade, o que se traduziu na irrelevância das muitas propostas recenseadas.
Olhando para o desempenho das instituições vocacionadas para a gestão das
políticas públicas, em diversas áreas sociais, tais como a saúde, a educação, a
assistência social, etc., os níveis de participação e inserção da sociedade civil na
formulação e controlo de tais políticas também foram escassos. Embora tenham
sido realizados uma série de eventos, tais como os conselhos consultivos, comissões de trabalho que contaram com a participação da sociedade civil, em alguns
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ministérios, não foram criados novos mecanismos, nem sequer foram utilizados
de maneira eficiente os tais espaços de participação das organizações da sociedade civil, na definição e implementação e, muito menos ainda, de avaliação das
políticas públicas, em 2013. Ao nível dos municípios, aldeias, comunas e bairros,
existem, em muitas delas, comissões de moradores, e outras formas de articulação que os moradores e utentes de determinados serviços públicos estabelecem
de maneira permanente ou pontual. No entanto, foram muito poucas as oportunidades para que estas pessoas pudessem participar na formulação, controlo e
gestão de políticas públicas, ao nível local, limitando-se a sua participação à volta
de questões muito pontuais, à medida que surgem necessidades que só podem
ser resolvidas com a contribuição da população local.
O processo de descentralização administrativa e política ainda não atingiu
a fase de institucionalização das autarquias, como está prescrito na Constituição da República (Artigos 213.o a 222.o, CRA) mas foram introduzidas reformas
institucionais que visaram dotar os municípios de alguma autonomia que lhes
conferem uma certa margem de poder para a tomada de decisão, ao nível local, e
tal autonomia tem permitido que, em alguns casos, as administrações locais estabeleçam relações de parceria com organizações não-governamentais, permitindo
a estas uma certa capacidade de influência sobre a gestão, quase nunca sobre
a formulação e o controlo de algumas políticas públicas ao nível local. Embora
estas experiências ocorram em muito poucos municípios e as suas possibilidades
de sucesso sejam muito dependentes do carácter, da personalidade e da vontade de quem está à frente de uma dada administração, convém destacar que as
limitações deste formato são impostas pelos baixos níveis de descentralização e
autonomia efectiva que possuem as administrações locais e pela capacidade dos
actores da sociedade civil para se envolverem com as autoridades locais à volta
de políticas públicas concretas. A agenda da reforma da administração local que
previa a democratização dos processos de tomada de decisão e o envolvimento
dos cidadãos na gestão e controlo das políticas públicas esteve muito longe de
se concretizar, em 2013. De forma geral, não se conseguiu superar as características autoritárias e paternalistas muito presentes nas formas de governação e
nos mecanismos de interacção entre as instituições do Estado e a sociedade civil.
Ao nível nacional, a execução das políticas públicas continuaram a caracterizar-se pela excessiva centralização do poder financeiro e de tomada de decisão no
aparato do Estado, cabendo aos níveis municipais e às organizações da sociedade
civil, quando envolvidos na gestão de políticas públicas específicas, um papel
mais de meros executantes de políticas públicas definidas ao nível central, a
quem coube, mais uma vez, mais de 80% das verbas previstas no OGE para programas e projectos, em 2013.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Como consequência desta tendência centralizadora e do fraco nível de envolvimento da sociedade civil, à medida que as políticas são implementadas e os
recursos, sobretudo os financeiros, são controlados apenas pelo nível central,
verifica-se, em muitos casos, relações de interacção entre as autoridades locais
e as organizações da sociedade civil, e até do sector privado, que tendem a ser
informais, baseadas nas relações de amizade existentes entre os intervenientes
e com fortes riscos de desencadear actos de corrupção e clientelismo, sem muita margem para que as instituições da administração local possam estabelecer
compromissos no sentido de identificar, implementar e até monitorar projectos e
programas com apoio dos seus parceiros locais da sociedade civil. Por esta razão,
salvo raras excepções, podemos dizer que a característica central da gestão das
políticas públicas, em 2013, foi a de exclusão da sociedade civil, ao longo de todo
o processo de formulação, implementação e controlo das mesmas. Na maior
parte dos casos, os processos de tomada de decisão em relação a muitas políticas
públicas não envolveram os parceiros sociais do governo, com fortes riscos de
se tornarem processos imbuídos de fortes laivos de clientelismo, corporativismo
e burocracias desnecessárias. Outro elemento que afectou o desempenho das
instituições do Estado na garantia e viabilização do direito de participação dos
cidadãos na vida pública teve a ver com a desarticulação e, até certo ponto, fragmentação institucional que ocorreu nos diferentes níveis do governo. Um caso
que pode elucidar este facto é o do Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza (PMIDRCP) que passou a ser liderado, em
todas as componentes, pelo Ministério do Comércio, embora a sua execução
seja feita pelas administrações municipais, sem uma grande margem de poder
para tomada de decisões ao nível local. Tal desenho institucional dificultou a
coordenação entre os diferentes sectores ministeriais, bem como retirou em
muitos casos o poder de decisão das administrações locais, tendo como principais
implicações a falta de eficiência e efectividade dos Conselhos de Auscultação e
Concertação Social (CACS), que em princípio ao nível municipal seriam o espaço
onde as administrações locais e os representantes da sociedade civil deveriam
identificar os problemas, escolher as prioridades e acompanhar a execução do
programa, ao nível de cada município. Podemos então concluir que, ao contrário
do que se ambicionava, o processo de descentralização política e administrativa,
tal como decorreu em 2013, não permitiu um maior nível de municipalização
das políticas públicas, o que de certa forma limitou o desempenho das administrações municipais em matéria de articulação e envolvimento dos actores da
sociedade civil, ao nível local, primando pela rigidez e hierarquização excessiva
dos processos decisórios e ausência de participação cívica na gestão e controlo da
acção governamental.
| 15
CEIC / UCAN
1.3 Desempenho das Organizações da Sociedade Civil nos processos
de gestão e controlo das políticas públicas
Desde início dos anos 1990 que os diferentes actores da sociedade civil em
Angola vêm falando da necessidade de participação dos cidadãos nos assuntos
que são do seu interesse e na vida pública. Em 2013, foram muitas as iniciativas
dos diversos actores da sociedade civil no sentido de reivindicar a participação
social e o envolvimento dos cidadãos nos processos de identificação, formulação, implementação e controlo da execução das mais diversas políticas públicas.
Influenciadas por uma conjuntura global que exige das instituições do Estado um
maior aprofundamento da democracia, através da criação de mecanismos que
possibilitam o surgimento de espaços de diálogo, concertação e auscultação dos
governados pelos governantes, tende a aumentar o número de organizações da
sociedade civil angolana que se assumem disponíveis para participar activamente ao longo de todos os processos de gestão e controlo das políticas públicas.
Porém, a participação democrática e o controlo social das políticas públicas não
é entendido da mesma maneira pelos diferentes actores de uma sociedade civil
que é diversa, complexa e muito pouco articulada à volta de causas comuns.
Para algumas instituições, a participação democrática no processo de tomada
de decisão e acções públicas resume-se a uma presença nos espaços em que são
convidados pelas instituições do Estado, a realizações de actividades de carácter
cultural, cívico, desportivo ou filantrópico, actuando como instituições cujas actividades são complementares às acções do governo. Entretanto, é cada vez mais
notória a emergência de iniciativas protagonizadas por uma série de actores da
sociedade civil que, contrariamente aos seus confrades que defendem a postura
anteriormente descrita, assumem publicamente que a participação democrática
nas decisões e acções públicas é um direito que deve ser conquistado. Nesta
perspectiva, tais actores realizaram diversas acções com vista à mobilização dos
cidadãos à volta de questões como o direito à manifestação, contra as demolições
de residências, em favor de uma maior abertura dos governantes ao diálogo e
à negociação, em função de situações concretas que tiverem de enfrentar. Em
2013, as acções de mobilização e as tentativas de manifestação intensificaram-se
e ganharam maior visibilidade, sobretudo porque aglutinaram a maior parte dos
partidos políticos que protestaram contra o assassinato de dois activistas que
haviam desaparecido, aquando das manifestações dos ex-militares, em 2012.
Ao nível das comunidades, embora com menos visibilidade, proliferam uma
série de organizações comunitárias de base, quer sejam associações de camponeses, grupos de moradores, fóruns de discussão, que com o apoio de algumas
ONG, ou por iniciativa e necessidade próprias, têm procurado dialogar com as
autoridades sobretudo ao nível local.
16 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Da questão do direito de manifestação resultam outros temas, nomeadamente o da sucessão de José Eduardo dos Santos, do diálogo com a juventude e o da
figura emblemática de Manuel Nito Alves, que pela sua mediatização e importância marcaram igualmente o ano de 2013. Manuel Nito Alves, jovem menor,
integrante do Movimento Revolucionário, foi preso por ter mandado imprimir
umas camisolas com a inscrição “quando a guerra se torna urgente e necessária”, glosando o título de um livro publicado por Domingos da Cruz que também
teve problemas com os órgãos de polícia e que foi posteriormente absolvido em
tribunal. O jovem permaneceu na cadeia, sem culpa formada, mais de 50 dias,
e foi objecto de várias manifestações de solidariedade, não somente na rua e
nas redes sociais, mas também, facto inédito, em pleno parlamento, quando o
Presidente da República, na abertura do ano legislativo, se preparava para fazer a
sua alocução sobre “o estado da Nação”, os deputados da oposição empunharam
cartazes a pedir a libertação do jovem activista.
Na verdade, continuou a ser destaque o movimento de jovens que se autodenomina “Movimento Revolucionário” que desde 7 de Março de 2011 tem vindo a
protagonizar várias tentativas ou manifestações e protestos públicos nas ruas da
cidade de Luanda (e também em Benguela) cuja postura se caracteriza pela recusa em estabelecer relações de subordinação, tutela ou cooptação por parte do
Estado, partidos políticos ou outras instituições da sociedade civil. Estes elementos, na sua maioria jovens, constituem um grupo pequeno mas persistente de
pessoas que se mobilizam em torno da conquista, garantia e ampliação do direito
de manifestação e outros direitos, sobretudo os civis e políticos. Comenta-se que
das suas insistentes reivindicações surgiu a necessidade das instituições do Estado responderem com o lançamento do processo de diálogo juvenil que envolveu
centenas de jovens em todas as províncias do país e culminou com a Conferência
Nacional da Juventude, um evento no qual os jovens apresentaram uma série
de preocupações ao Presidente da República que o presidiu, bem como a criação ou recuperação pelo Executivo de programas destinados exclusivamente à
juventude. Ao nível dos espaços de concertação e consulta mereceu destaque o
envolvimento de algumas organizações da sociedade civil, sobretudo ONG, nos
mecanismos de consulta que diversas instituições do Estado criaram à volta da
definição de políticas públicas como foi o caso da proposta de Lei sobre as Cooperativas Agrícolas, da Lei sobre Assistência Social, do desenho de alguns perfis
e planos de desenvolvimento municipais, da discussão da nova pauta aduaneira,
etc. Embora tais espaços sejam vistos, muitas das vezes, como pouco funcionais
e servindo, às vezes, os interesses das instituições do Estado que os utilizam
para legitimar medidas que pretendem implementar, ainda que sem a anuência
dos seus parceiros sociais, a participação contribui, de certa forma, para a intensificação das relações entre o Estado e os cidadãos e pode abrir caminho para
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CEIC / UCAN
aumentar, num futuro breve, o conhecimento e cimentar as relações de cooperação entre as partes. Do ponto de vista dos resultados concretos destes espaços,
pouco há a assinalar, até porque na maior parte dos casos estes espaços não são
deliberativos, quanto muito são propositivos, e deixam muito poucas possibilidades para que os actores da sociedade civil possam dar seguimento à forma como
as suas propostas são incorporadas pelas autoridades responsáveis pela gestão
destes processos.
De uma forma geral, pode-se concluir dizendo que embora tenha aumentado
a pré-disposição e a vontade dos actores da sociedade civil em participarem activamente nos processos de gestão e controlo das políticas públicas, a realidade
aponta mais para níveis de participação cujos resultados estão condicionados à
vontade política das instituições do Estado e à capacidade de mobilização social e
influência política das organizações da sociedade civil.
Por isto também, como expressão da sua completa desilusão com o Estado,
o Movimento Revolucionário, que denuncia “a corrupção, o excesso de poder e
de tempo no poder” do Presidente da República, insiste na mobilização do descontentamento dos jovens descamisados para se manifestarem na rua, transferindo para a política institucional a sua influência. Consta que o tema da sucessão
entrou, mais recentemente, no espaço público por impulso das manifestações
mas tornou-se ainda mais pertinente e objecto de maior circulação na opinião
pública, nomeadamente em várias reflexões surgidas no espaço público, pelo
facto do Presidente da República ter reconhecido a longevidade da sua permanência no poder (35 anos) e ter admitido, em entrevista televisiva, a necessidade (e “vontade”, nas suas próprias palavras) de o abandonar para se dedicar
ao desporto (sua vocação primeira, segundo ele próprio). Ao ser acometido de
doença repentina que o levou a sair do país e o obrigou a permanecer ausente do
país, cerca de 40 dias, avolumaram as inquietações e as especulações sobre essa
necessidade de sucessão do PR. A doença do PR não foi admitida oficialmente,
apesar do facto inusitado da sua longa ausência. Da mesma maneira que não foi
formalmente substituído pelo Vice-Presidente da República, como indica a Constituição (Artigo 132.o, 3, CRA), embora este, na prática, tenha assumido “a gestão
corrente do Estado”, enquanto a comunicação social pública procurava criar, na
opinião pública, a impressão de que o Presidente da República estava no país e
em pleno uso das suas capacidades (físicas e mentais) pois a cada obra inaugurada pelo ministro A ou B, era associada à iniciativa iluminada de “Sua Excelência”1.
1
A questão da saúde do Presidente da República deve ou não ser considerada uma
questão de interesse público, tendo, por isto, a opinião pública direito a ser informada
sobre ela, no limite do respeito da intimidade da pessoa que exerce o cargo?
18 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Adrede à questão do estado de saúde do Presidente da República surgem
rumores de ter havido acções tendentes a um golpe de Estado, rumores que
ganharam consistência retórica ao ser a questão aflorada, nos órgãos de comunicação social, pelo 2.o Comandante da Polícia Nacional, o Comissário Paulo de
Almeida, aos microfones da Rádio Eclésia2, depois da fuga de informação do
interior dos Serviços de Informação e Segurança (SINSE/ex-SINFO) sobre a morte
macabra de dois activistas da oposição, Isaías Kassule e Alves Kamulingue, ter
sido apresentada, por alguma imprensa, como resultante de uma “guerra” interna de poder que teve, por um lado, como consequência mediática a exoneração
do director do SINSE (Sebastião Martins) e, por outro, o controlo efectivo dessa
estrutura de contra-inteligência interna pela Casa de Segurança da Presidência
da República, como no passado, a imputação, não provada em tribunal, de uma
mesma intenção de “golpe de Estado” por parte do então chefe do Serviço de
Informação Externa (SIE), Fernando Miala, teve como resultado o controlo desta
instituição. Medidas estas que são vistas como uma forma de garantir uma sucessão controlada pelo próprio PR, sem grandes constrangimentos, nem excessivos
anticorpos no seio da sociedade e do partido de poder e não como uma mudança
substancial do poder perante as violações de direitos e, nomeadamente, do direito à vida, negado repetidas vezes por execuções sumárias, extrajudiciais, atribuídas a forças de segurança e de polícia.
Este ano de 2013 foi também marcado pelo facto do Estado angolano ter
sido objecto de uma queixa contra si, apresentada pela organização autonomista, “Protectorado da Lunda-Tchokwé”, junto da procuradoria do Tribunal
Penal Internacional (TPI), pela violação de direitos humanos nas províncias
das Lundas. Na verdade, houve também, ao longo do ano, várias denúncias de
violação de direitos humanos, da liberdade de imprensa e de exclusão socioeconómica, em consonância com o reconhecimento do Presidente da República, na
sua mensagem ao país sobre “o estado da Nação”, de haver um “crescimento a
diferentes velocidades de vários segmentos sociais”, o que por si só é contrário
à Constituição. Mas que este desenvolvimento separado, não se deve, nas palavras do mais-alto magistrado da Nação, a “uma política deliberada para perpetuar a injustiça social”, mas, tão-somente, é inerente ao “período de transição
para o Estado social e a economia de mercado que será uma sociedade inclusiva
e próspera”.
2
Consta também que o CEMG-adjunto para a Educação Patriótica, o General Egídio de
Sousa Santos “Disciplina”, foi falar da questão numa reunião do BP do MPLA.
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CEIC / UCAN
2. POPULAÇÃO, CONDIÇÕES DE VIDA E POBREZA
2.1 População
As informações demográficas sobre Angola continuam a ser lacunares e contraditórias. Mesmo entre as fontes internacionais notam-se, de ano para ano,
discrepâncias entre as cifras sobre o número de habitantes em Angola. Daí a
relevância do Recenseamento Geral da População a realizar-se durante o mês de
Maio de 2014.
O Instituto Nacional de Estatística apresenta uma série sobre a população desde
2003, dispersa por alguns documentos e estudos de sua autoria, mas em especial
o Anuário de Estatísticas Sociais 2010, onde se divulga uma projecção até 2015.
Cotejando estas informações com as de algumas instituições internacionais
como o FNUAP e o Banco Mundial (World Development Report 2013) verificam-se
diferenças significativas para as estimativas da população.
POPULAÇÃO
INE
2003
15507
2004
15957
2005
16420
2006
16896
2007
17386
2008
17890
2009
16889
2010
17430
2011
17992
2012
18577
2013
19184
WDR 2013
FNUAP
16500
19100
19400
21500
De acordo com o FNUAP (The State of World Population 2013), a população
de Angola em 2013 foi de 21,5 milhões de habitantes, uma diferença de cerca de
20 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
2,3 milhões de habitantes a mais, comparativamente às estimativas do INE. Qualquer uma das cifras da tabela anterior é baseada em estimativas e, portanto, as
diferenças só podem derivar de diferentes modelos de previsão usados. O Recenseamento Eleitoral de 2008, ajustado pelo de 2012, pode ajudar a compreender a
redução do quantitativo de população de 2008 para 2009.
Mas as diferenças projectam-se igualmente noutras variáveis demográficas
relevantes:
ͻ A taxa média anual de crescimento demográfico é de 3,2% para o INE e de
3,1% para o FNUAP e 2,9% para o Banco Mundial.
ͻ A esperança de vida à nascença – importante indicador para o cálculo do Índice
de Desenvolvimento Humano – é de 48,9 anos para o INE e de 51,5 anos para
o FNUAP em 2013.
ͻ A taxa de fertilidade total é de 5,66 crianças por mulher em idade de procriação e de 5,9 para o FNUAP (talvez justificando a diferença para mais nas suas
estimativas para a população).
ͻ A proporção de população jovem, entre 10 e 19 anos, é de 21%.
Em 2013, a África Subsariana apresentou o seguinte retrato demográfico resumido:
ͻ A população total dos seus 48 países foi estimada em 888 milhões de habitantes, cerca de 18% da população total mundial.
ͻ A taxa média anual de crescimento natural da população tem sido de 2,6%,
uma diminuição de 0,3 ponto percentual em relação à média verificada entre
2000/2010.
ͻ A esperança de vida à nascença está calculada em 56 anos em termos médios.
ͻ A taxa geral de fertilidade é de 5,2 crianças por mulher em idade de reprodução.
ͻ A população com idades entre 10 e 19 anos representa 23% do total.
Como se sabe, existe uma polémica sobre se a taxa de crescimento demográfico em Angola é ou não ajustada, ou seja, demasiado baixa ou excessivamente
elevada? No Relatório Social de 2012 esta matéria era polemizada nos termos
seguintes: “O crescimento demográfico em África tem sido considerado como um
dos obstáculos ao desenvolvimento económico, justamente porque o continente
africano é o último espaço regional no mundo a viver a fase aguda da crise da
transição dum regime demográfico arcaico para um regime demográfico moderno, no sentido dado anteriormente. As consequências de crescimentos demográficos incontroláveis são desastrosas: diminuição da subsistência alimentar, a
despeito duma percentagem elevada da população se dedicar à agricultura, em
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CEIC / UCAN
particular nos casos em que a taxa de crescimento demográfico supera a da produção agrícola, feita em solos degradados e gastos; êxodo rural maciço (a média
da população urbana em África passou de 8% para 45% em menos de 30 anos);
deterioração das condições gerais de vida, muito em especial nos centros urbanos e crescimento das economias informais”.
Para além das posições das diferentes igrejas sobre a necessidade de se garantir uma reprodução alargada da população – baseada em princípios de doutrina
religiosa – existem outras de natureza mais económica e política que radicam na
necessidade de se ocupar um espaço territorial tão vasto e que em determinadas
áreas está a ser preenchido por estrangeiros oriundos dos países fronteiriços de
Angola (e não só), de acelerar o crescimento económico com base na máxima
criação de emprego (modelos de desenvolvimento baseados na intensidade de
força de trabalho) e de tornar mais equilibrada a distribuição regional da população. No entanto, reflexões sobre eventuais efeitos perniciosos decorrentes dum
excessivo crescimento demográfico também abundam, como as de Jeffrey Sachs,
que entende que “o número de habitantes no planeta continua a crescer em
grande escala e, sobretudo, nas regiões que menos condições apresentam para
garantir saúde, educação, estabilidade e prosperidade aos cidadãos”3. Os receios
deste economista americano residem na escassez de recursos, na pressão do
crescimento populacional sobre ecossistemas cada vez mais frágeis (em particular nas regiões mais pobres do planeta), no aumento da pobreza e na ameaça da
estabilidade política global.
A distribuição espacial da população em Angola apresenta-se desequilibrada, essencialmente explicada pelos movimentos migratórios provocados pela
instabilidade militar que durante 27 anos abalou a vida dos cidadãos e também
pela prolongada crise económica que sacudiu o país durante a guerra civil, com a
falência quase completa da agricultura e actividades conexas e mesmo da indústria transformadora, apesar de se localizar totalmente nas cidades.
Desde então Luanda e algumas províncias do litoral do país são as de maior
concentração da população, cujo índice chegou a mais de 50% em anos anteriores. Depois de 2002 esperava-se que a paz, a reconciliação nacional e a livre
circulação de pessoas e bens pudessem contribuir, juntamente com a deslocalização dos investimentos (públicos e privados) e uma maior aposta do Orçamento Geral do Estado no combate contra as assimetrias regionais, para se levar o
crescimento económico ao interior do território nacional. Porém assim ainda não
aconteceu. Quanto mais nos afastamos do litoral maiores são as manchas de subdesenvolvimento económico e de desertificação humana.
3 Jeffrey Sachs – Common Wealth, Casa das Letras, Lisboa, 2008.
22 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Os gráficos seguintes, construídos na base das informações do INE4, traduzem
a realidade actual da dispersão da localização populacional em Angola.
REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2009
2%
2%
10%
2%
2%
3%
6%
2%
2%
5%
3%
29%
8%
2%
6%
10%
4%
4%
FONTE: INE.
REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2013
2%
2%
10%
2%
2%
3%
6%
2%
2%
5%
3%
28%
8%
2%
7%
9%
4%
4%
Cabinda
Kwanza Sul
Bié
Cunene
Zaire
Malanje
Moxico
Lunda Sul
Uíge
Lunda Norte
Cuando Cubango
Bengo
Luanda
Benguela
Namibe
Kwanza Norte
Huambo
Huíla
FONTE: INE.
4 INE – Projecção da População 2009-2015, Fevereiro de 2012 e Anuário de Estatísticas
Sociais – Dados de 2010, 2012.
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CEIC / UCAN
Algumas observações:
ͻ Em 4 anos, Luanda continuou a ser a parcela do território nacional de maior
concentração populacional e a perda de um ponto percentual entre 2009 e 2013
não significa que tenha diminuído a sua capacidade de atracção de população.
ͻ Kwanza Sul e Huambo são duas províncias claramente “ganhadoras” em população, ao aumentarem as respectivas participações relativas entre 2009 e 2013: de
6,4% para 7,6%, para a primeira, e de 7,6% para 8,3%, para a segunda província.
ͻ Os ganhos demográficos do Huambo, embora sem significado ainda definido,
podem, no entanto, ser sinais de alguma recomposição do tecido económico
e produtivo do país, no sentido da capacidade de atracção de pessoas.
Todavia, 4 anos é pouco tempo para se assistir a movimentos estruturais de
recomposição demográfica, ao que se acrescem as eventuais dúvidas sobre as
informações estatísticas do INE baseadas em estimativas que, conforme se afirmou mais atrás, em termos globais diferem bastante dos números avançados por
algumas instituições internacionais credíveis.
E não será o Recenseamento Geral da População e Habitação que dissipará
estas dúvidas, sendo necessário esperar-se mais 10 anos para se terem termos e
padrões de comparação.
Por grandes regiões, o panorama da repartição geográfica da população continua a ser de excessiva concentração – apesar dos ganhos económicos que pode
propiciar, os prejuízos sociais arriscam-se a serem maiores, em termos de qualidade dos equipamentos sociais e de acesso a serviços básicos de educação, saúde
e habitação – com Luanda, Kwanza Sul e Benguela a serem as mais representativas neste item.
REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2009
26%
Luanda, Kwanza Sul, Benguela
44%
10%
Centro Norte
Leste
Corredor do Lobito
20%
FONTE: INE.
NOTAS: Leste: Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico e Cuando Cubango. Centro-Norte: Cabinda, Zaire, Uíge,
Kwanza Norte, Malanje e Bié. Corredor do Lobito: Benguela, Huambo, Bié e Moxico.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2013
26%
Luanda, Kwanza Sul, Benguela
43%
11%
Centro Norte
Leste
Corredor do Lobito
20%
Fonte: INE.
NOTAS: Leste: Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico e Cuando Cubango. Centro-Norte: Cabinda, Zaire, Uíge,
Kwanza Norte, Malanje e Bié. Corredor do Lobito: Benguela, Huambo, Bié e Moxico.
Algumas notas:
ͻ O litoral centro do país (Luanda, Kwanza Sul e Benguela) concentra quase 50%
da população total de Angola, a que corresponde uma densidade de actividade económica de quase 90% (PIB, negócios, comércio, banca e seguros). Esta
circunstância reflecte-se no emprego, sendo estas três províncias as de maior
localização e preferência de mão-de-obra. Luanda pode mesmo ser a província
com a menor taxa de desemprego5, dada a importância do seu mercado informal de trabalho, a quase perfeita réplica de um mercado tipicamente liberal,
onde as entradas e saídas se processam a grande velocidade de adaptação e
sem grandes custos de contexto.
ͻ Não são visíveis movimentos migratórios significativos entre as províncias ou
espaços agregados, permanecendo as zonas Centro-Norte e Leste com a mesma
importância relativa entre 2009 e 2013. Dir-se-á que o essencial das migrações
internas ocorreu durante a guerra civil e que a paz e a estabilidade política,
depois de 2002, não têm sido factores suficientes para que as províncias mais
distanciadas dos centros políticos, económicos e administrativos recuperem
a exuberância demográfica dos tempos coloniais ou mesmo seguintes à independência.
5
Apesar da relevância do tema, o INE, no seu Inquérito ao Emprego em Angola 2009,
2010 e 2011, desvalorizou (ou não quis publicar) o desemprego e as respectivas taxas por províncias, preferindo relevar outras variáveis, marginais e secundárias face ao
problema das assimetrias regionais no país. No estudo “Desequilíbrios e Assimetrias
Regionais” (Alves da Rocha, 2.a edição, editado pelo CEIC/UCAN em 2011) estimou-se
uma taxa de desemprego para a região Luanda/Bengo de 17,7% em 2007 (página 87).
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CEIC / UCAN
ͻ O corredor do Lobito (Benguela, Huambo, Bié e Moxico), uma das grandes
esperanças para a difusão do crescimento económico do litoral para o interior, em quatro anos não demonstrou capacidade de atracção significativa
de população, apesar das extraordinárias potencialidades económicas que
apresenta.
As dinâmicas de crescimento demográfico estão expressas na tabela seguinte.
DINÂMICAS DE CRESCIMENTO POPULACIONAL REGIONAL
Cabinda
2009/2011
2011/2013
2009/2013
3,3
3,4
3,3
Zaire
4,4
4,3
4,4
Uíge
2,4
2,5
2,5
Luanda
2,2
2,3
2,2
Kwanza Norte
4,5
4,4
4,5
Kwanza Sul
5,0
4,8
4,9
Malanje
3,3
3,3
3,3
Lunda Norte
3,7
3,7
3,7
Benguela
2,6
2,7
2,7
Huambo
5,0
4,8
4,9
Bié
3,7
3,7
3,7
Moxico
3,7
3,7
3,7
Cuando Cubango
4,3
4,2
4,3
Namibe
3,8
3,8
3,8
Huíla
2,7
2,8
2,7
Cunene
4,0
3,9
4,0
Lunda Sul
4,3
4,2
4,3
Bengo
4,5
4,4
4,5
ANGOLA
3,2
3,3
3,2
Os destaques vão para as províncias do Zaire, Kwanza Norte, Kwanza Sul e
Huambo (as duas com as mais elevadas taxas de incremento demográfico), Cuando Cubango, Lunda Sul, Bengo e Cunene. Se as províncias do Huambo e do Kwanza
Sul mantiverem o seu ritmo de variação, a sua população de 2013 poderá ser
duplicada em 14 anos.
Apenas 4 províncias apresentaram taxas médias anuais de crescimento demográfico 2009/2013, abaixo da média nacional.
26 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
TAXAS MÉDIAS DE CRESCIMENTO 2009/2013 (%)
Acima da média
4,9
4,9
4,4 4,5
4,3
3,7
3,3
Abaixo da média
3,7 3,7
3,8
3,3
4,0
4,3
4,5
3,2
2,7 2,7
2,2
Ca
bi
nd
Kw
a
an Za
za ire
Kw No
an rte
za
M Sul
Lu al
nd an
a je
No
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am
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Cu
B
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Cu ico
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n
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Cu ibe
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nd e
a
S
Be ul
n
AN go
GO
LA
Uí
Lu ge
a
Be nd
ng a
ue
la
Hu
íla
2,5
FONTE: INE.
2.2 Condições de vida e Índice de Desenvolvimento Humano
São variados os indicadores que medem as condições de vida da população,
sendo os mais utilizados o PIB por habitante – ou, segundo as organizações
internacionais, o rendimento nacional bruto por habitante em paridade do
poder de compra – o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o consumo
de electricidade pelas famílias. O IDH é um excelente medidor da evolução das
condições de vida dos agregados familiares, ao sintetizar indicadores de rendimento, de educação e de saúde, afinal os três eixos fundamentais da vida das
pessoas em sociedade.
O indicador de rendimento é o de maior relevância para Angola, agora país
de rendimento médio elevado de acordo com a classificação do Banco Mundial6,
mas nos restantes as deficiências ainda são evidentes. De resto, as diferenças
entre os “ranking” do rendimento por habitante e do próprio IDH continuam a
permitir concluir que o crescimento económico não se tem transformado em
oportunidades de desenvolvimento social.
Muitos países do Human Development Index das Nações Unidas apresentam
um rendimento por habitante inferior ou igual ao de Angola, mas o valor do IDH
é superior, equivalendo afirmar que esses países, através de políticas públicas
adequadas, conseguiram transformar o crescimento em melhorias das condições
gerais de vida da maioria dos cidadãos.
6 World Bank – World Development Report 2014.
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CEIC / UCAN
Segundo evidências empíricas de outros países, a questão central está no
modo como se processa a distribuição do rendimento, pelos factores de produção (repartição funcional ou primária) e pelos cidadãos (repartição secundária ou
pessoal, com a influência do sistema fiscal e das transferências para a economia).
O Programa de Governo do MPLA para 2013-2017 destaca, em matéria de distribuição do rendimento, “continuar a desenvolver e consolidar as acções que visam
uma melhor repartição do rendimento nacional”, acreditando-se ser suficiente a
implementação de “programas municipais de desenvolvimento integrado e combate
à pobreza”, “programas de rendimento mínimo e outras formas de protecção social”
e de “fomento habitacional numa perspectiva de integração económica e social”. Aparentemente deixa-se incólume o essencial do actual modelo de reprodução alargada
de desigualdade e injustiça. Aliás, o emblema “crescer mais para distribuir melhor”, se
inscrito com efectiva vontade política de aplicá-lo, significa precisamente actuar sobre
os actuais mecanismos de acesso ao rendimento nacional, tornando-os mais democráticos, transparentes e justos, o que se afigura muito complicado dado o enquistamento das actuais fortunas; distribuir melhor é retirar a quem tem para transferir
para quem não tem, impossível no actual estado de organização política do país.
O Índice de Desenvolvimento Humano é hoje o indicador mais relevante para
a análise das condições de vida da população e para o cálculo duma medida
que permita compreender quanto de crescimento económico se transforma em
desenvolvimento.
Seguramente que a situação social é hoje bem melhor que em 2002, sendo a
evolução do IDH uma boa aproximação à medida destas transformações.
EVOLUÇÃO DO IDH EM ANGOLA
0,500
0,400
0,300
0,200
0,100
20
12
20
10
20
08
20
06
20
04
20
02
20
00
19
98
19
96
19
94
19
92
19
90
0,000
FONTE: PNUD, Human Development Index; Paulo de Carvalho – Exclusão Social em Angola, p. 110, 1990/94.
Ainda não está disponível o Relatório sobre o Desenvolvimento Humano do
PNUD 2014, pelo que se transcrevem as observações feitas no Relatório Social de
2012 sobre o comportamento deste indicador:
28 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
ͻ “Baixo valor do IDH entre 1990 e 1999, em média na vizinhança de 0,37. São dos
piores anos da guerra civil, durante os quais as despesas orçamentais tiveram
uma prioridade quase absoluta em favor da defesa e segurança. A urgência
da guerra determinou uma subalternização dos sectores sociais e o IDH só
não foi mais baixo pelo facto de o PIB por habitante – uma componente que
vale um terço no compósito do desenvolvimento humano – foi aumentando
graças à produção de petróleo. Mas mesmo assim, 1998 foi o de mais baixo
preço do barril de petróleo.
ͻ Um curto período de transição entre 1999 e 2002 em que se pressentia a
resolução do conflito militar interno e as condições para o crescimento da
economia se estruturavam.
ͻ Finalmente, o período de maiores conquistas no desenvolvimento humano
em Angola: 2002/2012. É patente o declive positivo da recta representativa do
comportamento temporal do IDH, não só devido ao crescimento do PIB e do
PIB por habitante, mas igualmente por causa das melhorias nas componentes
sociais do índice (esperança de vida e taxa de escolaridade). No entanto, o valor
do IDH ainda não ultrapassou a fasquia de 0,5 fundamental para o país deixar
o grupo dos países de desenvolvimento humano baixo. Questões relacionadas
com a pobreza e a distribuição do rendimento ajudam a compreender a razão
pela qual os aumentos marginais do IDH (taxas de crescimento anual) tenham
sido muito pouco expressivos”.
Com efeito, o ritmo médio anual de variação do IDH tem sido muito inferior
ao do PIB e do PIB por habitante, em paridade do poder de compra. Na verdade,
entre 1995 e 2012, as taxas médias anuais de variação foram de, pela ordem
apresentada, 2,4%, 8,2% e 5,7%.
2.3 Pobreza e poder de compra dos salários
A questão da remuneração da força de trabalho em Angola é uma das mais
relevantes para a melhoria das condições de vida dos habitantes e, por essa via,
para corrigir alguns dos mecanismos existentes de repartição do rendimento
nacional.
De acordo com as Contas Nacionais do INE7, o salário médio mensal nacional,
em 2010, era de 26.117 Kwanzas, um pouco mais de 260 dólares (ou 8,7 dólares por dia). Comparado com o salário médio mensal da Função Pública (cerca
de 42.337 Kwanzas, em 2010), a diferença é de mais de 16.200 Kwanzas, para
menos.
7 INE – Contas Nacionais 2002-2010.
| 29
CEIC / UCAN
Relativamente aos salários da Função Pública constata-se que entre 2003 e
2013 o salário real médio mensal variou cerca de –8,9%. No entanto, e graças ao
controlo da inflação (que se reduziu a partir de 2010 de forma sustentada para se
situar em 7,7%, em 2013), entre 2010 e 2013, registou-se uma melhoria no poder
de compra do salário real, cujo incremento foi de praticamente 4%.
EVOLUÇÃO DO SALÁRIO NOMINAL E REAL EM KWANZAS,
COM INFLAÇÃO ACUMULADA DESDE 2003
60.000,0
50.000,0
40.000,0
30.000,0
20.000,0
10.000,0
0,0
2003
2005
2004
Sálario real
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Salário nominal
FONTE: CEIC, Ficheiro O poder de compra dos salários.
O gráfico anterior permite justamente ver de que modo o salário real e o salário nominal se comportaram, entre 2003 e 2013, tomando como referência de
desvalorização a inflação acumulada entre esses dois anos extremos do período.
Se a correcção do salário nominal for feita tendo por referência apenas a inflação
registada em cada ano do mesmo período de tempo, então verifica-se, também
devido aos ganhos da redução da inflação, corrigidos pelos aumentos mesmo
que não proporcionais dos salários da Função Pública, um ganho médio anual nos
salários reais de 21,5%.
COMPARAÇÃO ENTRE SALÁRIO NOMINAL E REAL EM KWANZAS,
COM INFLAÇÃO ANUAL
60.000,0
50.000,0
40.000,0
30.000,0
20.000,0
10.000,0
0,0
2003
2004
2005
Sálario real
2006
2007
Salário nominal
FONTE: CEIC, Ficheiro O poder de compra dos salários.
30 |
2008
2009
2010
2011
2012
2013
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Em termos de ganhos e perdas de poder de compra dos salários médios da
Função Pública, a tabela e o gráfico seguintes expressam, em números, o seu
comportamento entre 2003 e 2013.
Poder de compra
Perda acumulada
2003
–4,4
–4,4
2004
–7,2
–11,2
2005
–0,3
–11,5
2006
–1,5
–12,8
2007
1,1
–11,9
2008
0,2
–11,7
2009
–0,9
–12,5
2010
–4,3
–16,2
2011
–2,7
–18,5
2012
–2,7
–16,3
2013
4,0
–12,9
São claras algumas tendências:
ͻ Uma diminuição na perda anual do poder de compra dos salários, entre 2010
e 2013.
ͻ Um ganho de poder de compra, em 2012 e 2013, resultado conjugado do controlo
da inflação e dos ajustamentos salariais pela inflação e pela produtividade.
EVOLUÇÃO DO PODER DE COMPRA DOS SALÁRIOS
5,0
0,0
-5.0
-10,0
-15,0
-20,0
2003
2004
2005
Perda acumulada
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Poder de compra
FONTE: CEIC, Ficheiro O poder de compra dos salários.
A pobreza é um tema polémico, porque ninguém gosta de ser considerado pobre – ainda que o seja do ponto de vista de critérios internacionalmente
definidos – e também devido ao facto de os governos se sentirem mal com a
| 31
CEIC / UCAN
prevalência deste fenómeno, pois corresponde afinal à falência das suas políticas
sociais e de distribuição do rendimento.
Também em Angola esta exclusão social, material e imaterial, é tema de muita
controvérsia, preocupando as autoridades e a sociedade civil, mas não havendo
convergência quanto ao efectivo valor do índice que a mede.
Um medidor aproximado da taxa de pobreza é dado pelo PIB por habitante:
quanto mais baixo for o seu valor, maior a probabilidade de a taxa de pobreza
ser elevada. Normalmente, e de acordo com muitas evidências empíricas, é nos
países onde este rácio é mais baixo que as desigualdades na distribuição do rendimento são mais expressivas. Por isso, costuma-se aceitar que um dos caminhos
para se alterar a taxa de pobreza é o do crescimento económico. E isto mesmo
tem-se verificado em Angola, embora o efeito de contágio sobre os rendimentos
da população pobre esteja inquinado pelos mecanismos de “rent seeking” de distribuição da renda petrolífera. O PIB por habitante (sem a correcção pela paridade do poder de compra, o parâmetro internacional de ajustamento das grandezas
económicas de modo a torná-las comparáveis) passou de 826 dólares, em 2002,
para 5.762,50 dólares, em 2013, uma progressão média anual de 19,3%, em termos nominais. Por isso é que se pode admitir ter havido uma melhoria dos níveis
de vida dos diferentes estratos populacionais, ainda que com diferenças assinaláveis entre as classes sociais de maiores posses e rendimentos.
EVOLUÇÃO DO PIB POR HABITANTE (DÓLARES CORRENTES)
60.000,0
50.000,0
40.000,0
30.000,0
20.000,0
10.000,0
0,0
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
PIB por habitante
FONTE: CEIC, Ficheiro Quadro Macroeconómico Comparativo.
Mas permanecem situações de pobreza significativa em Angola, aliás identificadas no IBEP que representa o primeiro grande estudo sobre as condições
de vida da população. De acordo com os seus resultados, a taxa de pobreza em
2009 era de 36,6% e quase 60% dos cidadãos nacionais tentavam sobreviver com
menos de 2 dólares por dia.
32 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O World Development Report 2014 do Banco Mundial apresenta uma tabela
onde uma das variáveis de caracterização dos países é a “poverty headcount
ratio”, cujo valor para Angola é de 77,1%, em 2010, para uma linha de pobreza
de 2,5 dólares por dia, em paridade do poder de compra8. Ou seja, se o mínimo para se considerar uma pessoa ou um agregado familiar pobre for de 2,5
dólares por dia, então em Angola existiam mais de 77% de pessoas nessas condições, o que não deixa de ser relativamente consistente com os dados do IBEP,
para 2009.
Outro dado do maior interesse é o valor da taxa de pobreza, se o rendimento
limite fosse de 10 dólares, por dia, também em paridade do poder de compra9.
A tabela seguinte fornece informações para alguns países.
POVERTY HEADCOUNT RATIO (% da população) (dados para 2010)
Países
$2,5/por dia (PPC)
$10/por dia (PPC)
Angola
77,1
98,9
Brasil
15,1
64,4
Camarões
42,9
95,2
RDC
97,0
100,0
Congo
81,8
98,7
Malásia
6,2
55,1
Quénia
76,6
98,4
Moçambique
84,4
99,5
Nigéria
86,3
99,8
África do Sul
39,5
79,5
Os países de maior concentração de rendimento, em 2010, eram Angola, a
RDC, os Camarões, a República do Congo, o Quénia, Moçambique e a Nigéria,
onde o limiar de 10 dólares, por dia, transformaria, virtualmente, toda a população em pobres.
Como nas versões anteriores do Relatório Social se tem dito, o CEIC tem uma
metodologia que lhe permite, em cada ano, e face a um leque de informações
económicas e sociais, estimar a taxa de pobreza no país. O exercício foi ajustado
pelas novas taxas de crescimento do PIB10 e da população, que segundo o INE é
8 Banco Mundial, World Development Report 2014, p. 301.
9 Este exercício já foi apresentado no Relatório Social de 2011, para uma linha de pobre-
za de 10 euros, por dia.
10
Cálculos feitos segundo indicadores do Executivo angolano e do Fundo Monetário
Internacional.
| 33
CEIC / UCAN
de 3,2% ao ano (o que, evidentemente, prejudica o valor e a dinâmica de evolução do PIB por habitante, uma das variáveis-chave do nosso modelo11).
Os resultados constam da tabela seguinte.
Taxa crescimento
do pib
Taxa crescimento
população
Taxa crescimento
PIB per capita
Taxa de
pobreza
2009
2,1
3,2
–1,0
40,8
2010
3,6
3,2
0,3
40,6
2011
3,4
3,2
0,2
40,5
2012
5,3
3,2
2,0
39,7
2013
4,1
3,2
0,9
39,3
2014
5,3
3,2
2,0
38,4
2015
5,5
3,2
2,2
37,5
2016
5,9
3,2
2,6
36,5
2017
3,3
3,2
0,1
36,4
O Governo estabeleceu como meta para 2017 reduzir a taxa de pobreza de
36,6% para 28%12. Para isso, tornar-se-á necessário que:
ͻ a taxa média de crescimento do PIB, entre 2014 e 2017, seja de 11% ao ano;
ͻ se melhorem os canais de redistribuição do rendimento, através dos impostos
e das prestações sociais, a que poderá corresponder uma elasticidade rendimento/pobreza de –1,85;
ͻ a taxa de crescimento demográfico se mantenha em 3,2%. Uma diminuição
deste valor pode poupar tempo na obtenção desta meta ou diminuir a exigência na melhoria do padrão de distribuição do rendimento nacional no país.
Uma elasticidade rendimento-pobreza de –1,85 pressupõe canais de transmissão dos efeitos do crescimento económico abertos e politicamente desbloqueados. O processo de acumulação primitiva de capital teria de cessar nos contornos
injustos, desequilibrados, desestruturantes e assimétricos que o caracterizam
actualmente e ser substituído por um modelo de distribuição do rendimento
mais centrado no emprego, nas remunerações do trabalho e no incremento da
produtividade. O crescimento do PIB é um factor essencial para a redução da
pobreza, mas é-o também a alteração do modelo de concentração do rendimento
e da riqueza vigente.
11
A outra é a “elasticidade rendimento-pobreza” uma “proxy” do efeito contágio do
crescimento económico sobre os rendimentos da população.
12 Vide Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, p. 40.
34 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
3. COMPROMISSO COM A SAÚDE
3.1 Quadro epidemiológico
O quadro epidemiológico do país mostra tendências divergentes relativamente às cinco doenças mais notificadas (Malária, Doenças Respiratórias Agudas
(DRA), Doenças Diarreicas Agudas (DDA), Disenteria e Febre Tifóide), ao longo dos
últimos anos. Tal como nos anos anteriores e como se pode observar no gráfico
abaixo, a malária (56%) continua a liderar as doenças mais notificadas, em 2013,
seguida das DRA (21%) e das DDA (9%). Porém, assinala-se uma inversão na terceira e quarta posições que passaram a ser ocupadas pela febre tifóide (5%) e
pela disenteria (4%), respectivamente. Mas, diante da progressão, quer da febre
tifóide, quer das DRA, ambas em cerca de dois pontos percentuais, regista-se a
manutenção das DDA e da disenteria e a descida da malária, em seis pontos percentuais. Para além de se registar agora a presença da tuberculose convencional
(1%). As outras doenças notificadas (4%), no seu conjunto, excluindo a tuberculose, permanecem em idêntico nível, em relação ao actual total de 4,4 milhões de
notificações, este ano (2013). Há pois uma variação decrescente de notificações,
em relação ao ano anterior, de 22,9%, significando uma redução de mais de um
milhão de registos.
QUADRO EPIDEMIOLÓGICO 2013
4%
1%
56%
5%
4%
9%
21%
Malária
Disenteria
Tuberculose Conv.
D. Resp. Agudas
Febre Tifóide
Outras
D. Diarr. Agudas
| 35
CEIC / UCAN
Este cenário, não sendo muito diferente do dos anos anteriores, indica uma
dupla realidade: por um lado, uma acção mais eficaz no combate ao vector de
transmissão da malária, que resultou na redução considerável de casos notificados e, por outro, o agravamento da qualidade de vida em relação ao meio
ambiente, nomeadamente quanto à poluição do ar, ao saneamento e à qualidade
da água consumida.
O número de óbitos para todas as doenças registadas cifrou-se, este ano, em
11.904 mortes, o que se traduz num índice de mortalidade de 0,27%, superior
ao do ano transacto que foi de 0,23%. O quadro de óbitos, no seu conjunto, tem
apresentado uma tendência decrescente em relação aos cinco últimos anos,
como se pode verificar pelo gráfico abaixo.
QUADRO DE ÓBITOS COMPARATIVO
20.000
18.000
16.000
14.000
12.000
10.000
8000
6000
4000
2000
0
7.000.000
6.000.000
5.000.000
4.000.000
3.000.000
2.000.000
1.000.000
0
2009
2010
EŽƟĮĐĂĕões
2011
2012
2013
Óbitos
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
Desde 2009 que se verifica uma queda de óbitos, cuja taxa acumulada é de
–31,59% e uma taxa média anual de –6,32% devido à variação (negativa) sucessiva de –8,79% (2009/2010); –0,43% (2010/2011); –20,49% (2011/2012); –5,25%
(2011/2012) e de –5,5% (2012/2013).
No entanto, ao olharmos para o quadro de óbitos provocados pelas doenças
notificadas, parece haver uma evolução do quadro epidemiológico nacional no
sentido de uma redução constante das doenças transmissíveis e de uma maior
presença das doenças sistémicas, psicossomáticas e traumatológicas, como já se
havia assinalado no relatório anterior. Pois, se é verdade que a malária (56%), em
relação aos óbitos, em 2013, como sempre, predomina, a ordem das doenças que
mais matam tem vindo a alterar-se, num duplo movimento, em que se regista
uma redução de óbitos em relação às doenças habitualmente mais notificadas
36 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
(malária, DRA, DDA, disenterias e febre tifóide) e um aumento significativo dos
óbitos por outras doenças como a tuberculose (9%), a malnutrição (7%) e o VIH/
SIDA (5%), o que resulta num novo quadro de óbitos, como se pode constatar no
gráfico abaixo.
ÓBITOS
12%
5%
7%
56%
9%
Malária
D. Resp. Agudas
Tuberculose Conv.
Malnutrição Aguda
Sida
Outras doenças
11%
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
É importante mencionar que a ordem de doenças que mais matam tem vindo
a alterar-se desde há alguns anos. Em 2013, a malnutrição ganha espaço, com
um valor relativo de óbitos de 7,2%, embora tenha apenas 0,5% de notificações,
colocando-se entre as quatro doenças mais mortíferas do ano. Devem ainda ser
alvo de atenção a tuberculose que tem registado em média 8,6% de óbitos, nos
últimos quatro anos e a Sida que vem na quinta posição, registando 4,9% dos óbitos do ano.
DOENÇAS MAIS MORTÍFERAS EM ANGOLA
60
50
40
30
20
10
0
2010
Malária
Tuberculose
2011
D. Resp. Agudas
Mal nutrição Aguda
2012
2013
D. Diarr. Agudas
Sida
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
| 37
CEIC / UCAN
3.1.1 Malária
3.1.1.1 Prevalência e letalidade
A malária, em 2013, registou cerca de 2,5 milhões de casos clínicos, o que se
traduz numa prevalência de 11,84%. Em relação ao ano anterior, apresenta uma
variação de –17,95% de casos notificados. O Serviço Nacional de Saúde procura a
redução da prevalência da doença, mas a notificação dos casos tem ficado sempre acima do programado.
MALÁRIA
3,7
3,7
3,4
3,2
3,5
3,0
2,5
2003
2004
2,7
2,3
2,3
2005
2006
2007
2,5
2008
2009
2010
2011
2012
2013
ĂƐŽƐŶŽƟĮĐĂĚŽƐ;ŵŝůŚões)
Em relação aos óbitos foram registados 6518 óbitos, o que corresponde a uma
taxa de mortalidade de 0,26 e representa, em relação a 2012, uma variação positiva de 13,6% de óbitos.
A análise do gráfico seguinte pode dar-nos uma ideia das flutuações registadas, nos últimos dez anos (2003-2013). Este gráfico mostra concomitantemente
uma grande redução da taxa de mortalidade (numa variação de 1,20 para 0,30) e
uma regressão e aumento de casos notificados, depois de se ter observado uma
brusca redução dos mesmos, entre 2003 e 2006. A evolução de casos notificados
traduz, no entanto, uma certa estabilidade dos casos registados, e uma redução
da taxa de prevalência, pois há a considerar um aumento constante da população
do país, o que resulta num rácio para menos. Se considerarmos apenas os dois
últimos anos, há a constatar uma redução de casos notificados e um contraditório
aumento de mortes, o que pode significar, por um lado, a tradução positiva das
políticas de combate ao vector de transmissão e de profilaxia e, por outro, uma
maior incapacidade dos centros médico-sanitários em dar resposta aos casos
notificados e/ou um agravamento nas condições dos doentes, quando recorrem
38 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
a esses centros médico-sanitários. Também não é de excluir, tal como já se verificou no passado, a possibilidade do surgimento de novas estirpes (ou de outras
doenças próximas, como a Dengue e a Xicungunha) e menor eficácia do fármaco
utilizado no tratamento.
MALÁRIA
3,7
3,7
3,5
3,4
3,2
3,0
2,5
2,7
2,3
2,3
2,5
1,2
0,5
2003
2004
0,6
2005
0,4
2006
0,3
0,3
0,3
0,2
2007
2008
2009
2010
ĂƐŽƐŶŽƟĮĐĂĚŽƐ;ŵŝůŚões)
0,4
2011
0,3
2012
0,3
2013
Taxa de mortalidade (/1000)
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
Nesta projecção (2003-2013), em relação aos casos notificados, depois de se
ter registado cerca de 3,2 milhões de notificações (2003), observa-se uma curva
descendente até ao ponto mais baixo de 2,3 milhões de casos (2005 e 2006),
seguida de uma retomada ascendente até ao ponto mais elevado, de 3,7 milhões
de notificações (2009 e 2010). Estes valores decrescem de forma sustentada, nos
anos seguintes, para se fixarem em 2,5 milhões de casos, em 2013, o que corresponde a uma variação negativa de meio milhão de casos (16,7%), em relação ao
ano anterior e um nível homogéneo a 2004, numa propagação média de 3,1%,
por ano.
Em relação à taxa de mortalidade, os números têm mostrado, no período,
uma certa estabilidade. Podemos estabelecer uma fraca ou negativa correlação,
entre os casos notificados e a taxa de mortalidade, porque observa-se, embora
de forma descontínua, desvios de tendência. Por exemplo: para as notificações,
entre 2003 e 2006, verificam-se quedas, enquanto, entre 2006 e 2010, há crescimento e, entre 2010 e 2013, novamente um decréscimo. No entanto, em relação
à taxa de mortalidade há uma queda constante da mortalidade, entre 2003 e
2010. No ano seguinte dá-se uma subida de dois pontos percentuais, para depois
se tornar a pronunciar uma queda que se mantém nos dois anos seguintes. Entre
2003 e 2013, a taxa de mortalidade por malária cai, em média, 0,09 pontos percentuais ao ano.
| 39
CEIC / UCAN
Os grupos mais vulneráveis à doença, e em maior risco, são as mulheres
grávidas e as crianças (de menos de 5 anos de idade). A malária é causa de
internamento hospitalar em cerca de 10% de mulheres grávidas e cerca de 60%
em crianças, com menos de 5 anos de idade, sendo causa de morte de 51,1%
destas.
3.1.1.2 Formas de combate e tratamento
Em relação às formas de combate, são utilizados como métodos preventivos o
mosquiteiro e a desinfestação com pulverização e fumigação de DTT. O tratamento é feito por Coartem e antipiréticos.
CASOS NOTIFICADOS E TRATADOS
3,0
2,5
1,6
1,3
ĂƐŽƐĐŽŶĮƌŵĂĚŽƐ
ƉŽƌůĂďŽƌĂƚſƌŝŽ
1,4
1,2
ĂƐŽƐƚƌĂƚĂĚŽƐ
2012
EŽƟĮĐĂĕões
2013
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
Em 2013, dos 2,5 milhões de casos notificados, 52% foram confirmados por
laboratório e 48% foram confirmados e tratados com ACT, cifras inferiores às do
ano anterior (2012), em que 53,3%, dos 3 milhões de casos notificados, foram
confirmados por laboratório e 46,7% tratados.
As medidas implementadas pelo sector com o objectivo de inverter o quadro da malária, devem-se por um lado à distribuição de mosquiteiros tratados a
60,8 mil grávidas e a 340,8 mil crianças, menores de 5 anos de idade, bem como
à administração de duas doses completas de Sulfadoxina Pirimentamina, para o
TIP, a 653,1 mil grávidas, para além de terem sido confirmados laboratorialmente
e tratados cerca de 1,3 milhões de casos, o que contribuiu seguramente para a
redução de casos de malária e para a estabilidade do número de óbitos.
40 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
INDICADORES DO PROGRAMA DA MALÁRIA (MIL)
1314,7
653,1
340,8
60,8
0,3
Taxa de
Mulheres grávidas
Crianças
N.o de mulheres
mortalidade
que receberam
menores
grávidas
atribuída
mosquiteiros
de 5 anos
que fizeram
à malária
impregnados
que receberam 2 doses completas
(todas as idades)
mosquiteiros
da Sulfadoxina
tratados
Pirimentamina
para o TIP
N.o de casos
de malária
confirmada
tratada
com ACT
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
Outro factor que contribuiu para a redução dos casos de malária é seguramente a mudança de atitude positiva das famílias em relação à doença.
CASOS TESTADOS (MO E TDR)
100
55,6
44,4
Casos testados (MO e TDR)
WŽƐŝƟǀŽƐ
EĞŐĂƟǀŽƐ
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
O gráfico acima indica os casos diagnosticados por testes rápidos (TRD) e por
microscopia óptica (MO), comummente designada “gota espessa”, que perfazem
um total de 4,1 milhões de prescrições médicas, sendo 2,5 milhões de casos positivos, que representam 55,6% do total. Os casos diagnosticados com resultados
negativos são cerca de 1,6 milhões, que perfazem 44,4%.
| 41
CEIC / UCAN
3.1.2 Doenças respiratórias agudas
As doenças respiratórias agudas são, a nível nacional, as doenças mais notificadas, depois da malária, como já se deixou dito. Este ano (2013) foram notificados 906.000 casos, de que resultaram 1324 óbitos, numa taxa de letalidade de
0,1%, confirmando uma tendência decrescente anterior, a partir de um pico de
1.317.864 casos, em 2011, depois de uma tendência de progressão de casos notificados, desde 2008, como se pode observar no gráfico abaixo.
DRA
2598
1896
1643
1621
1578
1317,9
968,7
794,8
2009
2008
1324
1232,7
987,4
2010
906
2011
2012
2013
EŽƟĮĐĂĕões (mil)
Óbitos
Há uma trajectória coincidente de casos e de óbitos, sendo o ponto mais alto
em 2011 e o mais baixo em 2013, que regista um considerável decréscimo de
óbitos em relação a 2012, ano em que se deu um acentuado agravamento dos
óbitos, quando se vinha verificando uma sustentada redução dos casos de morte,
nos anos anteriores, como se pode ver no gráfico abaixo.
ÓBITOS POR DRA
37,6
21
2008
18,3
18
16,8
14,6
2009
2010
2011
2012
2013
Variação de casos de óbitos (%)
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
A geografia da doença mostra que as províncias mais afectadas continuam a
ser Huambo (25,8%) e Luanda (20%), tendo-se, entretanto, verificado uma maior
incidência nas províncias do Huambo (14,7 mil), Bié (8,7 mil) e Lunda Sul (8,5 mil).
42 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Zaire
Namibe
Malanje
Lunda Sul
Lunda Norte
Luanda
Kwanza Sul
Kwanza Norte
Huíla
Huambo
Cunene
Bié
Óbitos
Cuando Cubango
Casos
Benguela
Bengo
Moxico
Cabinda
Uíge
DRA POR PROVÍNCIA
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
Luanda é a província que mais mortes regista, facto a que não é alheio a grande concentração populacional, o meio ambiente poluído, o fraco saneamento
básico e o tipo de actividades aí desenvolvidas.
Os grupos etários mais afectados pelas DRA são os bebés (1 a 12 meses de
idade) e as crianças (com 1 a 4 anos de idade), que representam, no conjunto,
405,7 mil novos casos. Os bebés (até 1 mês) são os mais resistentes à doença mas
são também os que mais morrem sempre que a contraem.
DOENÇAS RESPIRATÓRIAS AGUDAS POR FAIXA ETÁRIA
226.500
180.000
172.200
107.500
104.600
90.200
65.100
24.800
300
260
1 Mês
1 a 12
Meses
Casos
Óbitos
290
1a4
Anos
121
5a9
Anos
82
10 a 14
Anos
71
15 a 24
Anos
113
25 a 49
Anos
87
50 ou mais
Anos
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
| 43
CEIC / UCAN
3.1.3 Doenças diarreicas agudas
As doenças diarreicas agudas são as terceiras mais notificadas, registando
390.800 casos, resultando em 500 óbitos, traduzindo-se numa regressão de casos
em relação aos 495.500 casos, do ano anterior, e um mesmo número de 500
óbitos, parando a tendência de diminuição de óbitos e aumentando a taxa de
letalidade da doença, já que em 2011 foram notificados 598,5 mil casos de que
resultaram 900 óbitos e, em 2010, haviam sido registados 540,6 mil casos, para
2000 óbitos.
600.000
2000
400.000
1000
200.000
0
0
Casos
2010
Óbitos
2011
2013
2012
Esta doença assinala, em 2013, uma taxa de regressão de –21,13%, o que
representa uma taxa de mortalidade global de 2,6/100.000 habitantes e uma taxa
de incidência de 2037/100.000 habitantes.
As províncias de Luanda (97.000), Huambo (55.300) e Bié (49.000) destacam-se como as províncias que mais casos registaram. Os maiores níveis de óbitos
foram registados nas províncias de Luanda (100), Benguela (80) e Bié (90).
DDA POR PROVÍNCIA
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
Casos
Óbitos
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
44 |
Zaire
Namibe
Malanje
Lunda Sul
Lunda Norte
Luanda
Kwanza Sul
Cuando Cubango
Kwanza Norte
Huíla
Huambo
Cunene
Bié
Benguela
Bengo
Moxico
Cabinda
Uíge
0
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
3.1.4 Disenteria
A disenteria registou, em 2013, 177.500 notificações, das quais resultaram
100 mortes, o que representa um aumento do número de notificações em 35,5%,
e um aumento do número de óbitos em 31,8%. A disenteria é assim responsável por 4% do total de casos notificados e 0,9% dos óbitos. No ano anterior, em
2012, registaram-se 131.000 casos, dos quais resultaram 85 em óbitos, o que
não demonstra um aumento de eficácia da resposta médico-sanitária aos surtos
registados ou um melhor conhecimento das populações sobre os procedimentos
a observar para evitar os óbitos.
3.1.5 Febre tifóide
A febre tifóide registou, em 2013, 207.000 casos, a que corresponderam 175
óbitos, mais 40 óbitos que no ano anterior (2012), em que foram notificados
207.400 casos e registados 135 óbitos, o que quer dizer que esta doença decresceu em –0,16%, em termos de notificações, mas progrediu em óbitos a uma
razão de 29,6%.
3.1.6 Tuberculose
A tuberculose pulmonar está associada a carência alimentar e ao VIH/SIDA e
é uma doença cuja acção incapacitante é grande, atingindo particularmente as
pessoas entre os 15 e os 45 anos, ou seja, a mão-de-obra activa do país. Em 2013,
foram reportados 39.200 casos e 1000 óbitos, que representam uma queda de
casos notificados em –16,4% e igualmente de –16,4% de óbitos, isto sem contar
com os casos que não chegam ao sistema de saúde nacional.
As taxas de incidência e de letalidade da tuberculose, reportadas pela Direcção Nacional de Saúde Pública (DNSP), em 2013, são de 204,4/100.000 habitantes e de 2,6%, respectivamente, registando-se também uma incidência de 39,2
mil novos casos, dos quais 1,0 mil óbitos.
Porém, o Banco Mundial reporta uma taxa de incidência da doença, em
2012, de 316/100.000 habitantes. Segundo esta fonte, a taxa de incidência tem
vindo a crescer de forma sustentada, desde 2002 a 2012, a uma taxa média de
287,2/100.000 habitantes, como se pode observar no gráfico seguinte.
| 45
CEIC / UCAN
INCIDÊNCIA DA TUBERCULOSE (por 100.000 pessoas)
265
260
2002
2003
281
276
270
2004
2005
2006
287
2007
292
2008
304
298
2009
2010
316
310
2011
2012
Incidência da tuberculose (por 100.000 pessoas)
FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.
A distribuição da doença, por província, mostra uma realidade bastante assimétrica, quer a nível de cuidados e de infra-estruturas afins, quer de redes de
serviços.
NOTIFICAÇÃO DE TB POR PROVÍNCIA
Províncias
Casos novos
BK(+)
Casos novos
BK(–)
Extra
pulmonar
Fracos
tratamentos
Tratados
Bengo
357
185
15
26
0
Benguela
3502
2013
767
1063
141
Bié
634
311
313
127
83
Cabinda
52
675
24
26
68
Cunene
654
230
48
199
31
Huíla
1130
1880
109
217
226
Huambo
525
738
695
51
58
Kwanza Sul
568
413
65
36
0
Kwanza Norte
450
244
18
30
9
Cuando Cubango
268
76
32
46
5
Luanda
5427
8158
1069
806
349
Lunda Sul
247
79
74
41
27
Lunda Norte
321
265
31
97
36
Malanje
333
129
7
48
4
Moxico
405
431
357
132
66
Namibe
626
2504
82
838
220
Uíge
395
376
43
50
33
Zaire
521
333
21
85
11
FONTE: DNSP/Programa de tuberculose, 2013.
46 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Há no país cinco hospitais sanatórios (HS) que são unidades especializadas
para atendimento diferenciado e gestão de casos complicados da doença, nas
províncias de Luanda, Huambo, Benguela, Huíla e Cabinda. Como há também
cinco Dispensários Anti-Tuberculose (DAT), nas províncias de Cabinda, Luanda,
Benguela, Lunda Sul e Cuando Cubango.
REDE DE SERVIÇO DE TB E LABORATÓRIOS DE BK
Municípios
Redes de serviços TB
Províncias
N.o
com PNCT
Bengo
8
Benguela
9
DOTS
UT
Lab. BK
4
4
1
1
8
17
2
17
Bié
9
8
8
Cabinda
4
4
4
5
4
8
Cunene
6
5
5
3
4
Huambo
14
7
7
2
7
Huíla
11
13
13
7
13
Cuando Cubango
12
1
1
1
Kwanza Norte
10
4
4
4
Kwanza Sul
9
2
2
8
2
Luanda
9
9
9
20
5
Lunda Norte
4
4
4
4
Lunda Sul
9
3
3
1
Malanje
14
2
2
Moxico
9
8
8
2
4
8
Namibe
5
2
2
5
2
Uíge
16
12
12
5
7
Zaire
6
6
6
1
5
FONTE: DNSP/Programa de tuberculose, 2013.
3.1.7 Doença do sarampo
O sarampo é uma doença que se pode prevenir, no entanto, ainda regista, em
2013, 285 óbitos, para 13.103 notificações, correspondendo a 2,18% de taxa de
letalidade. A taxa de incidência situa-se em 68,3/100.000 habitantes e a taxa de
mortalidade em 1,5/100.000 habitantes. As províncias que registaram as taxas de
mortalidade mais elevadas foram Bié (7,4/100.000) e Lunda Sul (16,4/100.000)
como se pode constar no gráfico seguinte.
| 47
CEIC / UCAN
SARAMPO
92
2
Namibe
Malanje
736
1
226
61
Lunda Sul
Lunda Norte
Luanda
Kwanza Sul
Cuando Cubango
960
1
372
2
245
23
739
Kwanza Norte
Huíla
Huambo
Cunene
Bié
1160
20
122
12
1145
14
711
13
577
80
2295
Benguela
Bengo
Moxico
Cabinda
Uíge
313
5
13
705
5
43
2695
Casos
Óbitos
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
As faixas etárias mais afectadas foram as compreendidas entre o primeiro mês
e os nove anos de idade, como se pode ver no gráfico abaixo.
SARAMPO POR FAIXA ETÁRIA
50 ou mais Anos
25 a 49 Anos
15 a 24 Anos
10 a 14 Anos
5 a 9 Anos
0
0
0
266
2
535
26
1 a 4 Anos
130
1 a 12 Meses
118
1 Mês
994
26
5755
3366
0
0
Casos
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
48 |
2187
Óbitos
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
3.1.8 Doenças sexualmente transmissíveis
Para além do VIH, as doenças sexualmente transmissíveis continuam a suscitar preocupação, não só pelo facto de algumas delas não terem cura, mas também pela sua tendência progressiva.
DOENÇAS DE TRANSMISSÃO SEXUAL
106.283
92.127
81.732
79.856
61.440
24
9
16
6
2008
2009
2010
2011
EŽƟĮĐĂĕƁĞƐ
MďŝƚŽƐ
6
2012
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
As doenças sexualmente transmissíveis representam 2% do total de doenças
notificadas, em 2013, e registam, neste ano, 86.287 casos, o que corresponde a
um decréscimo de –9,2%, já que em 2012 registou 94.983 casos; depois de ter
registado 104.239 e 79.856 casos, em 2011 e em 2010, respectivamente. Por seu
lado, os óbitos passaram de 16 mortes (2010) para 3 mortes (2013), assinalando
uma redução em 81% de óbitos.
Segundo o gráfico abaixo, em 2013, foram notificados 399 casos de HBC
(Hepatite B), 2897 casos de HCV (Hepatite C) e 1166 casos de Sífilis.
IDENTIFICAÇÃO POSITIVA DE DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS
2897
1166
399
HBS
HCV
SÍFILIS
Observação Microscópica
FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.
| 49
CEIC / UCAN
3.2 Indicadores-chave da saúde
Os indicadores-chave da saúde que mais interessam neste relatório são a mortalidade materna, a mortalidade neonatal, a mortalidade infantil e a prevalência do
VIH que são aqueles que mais influenciam a posição do país no Índice de Desenvolvimento Humano.
3.2.1 A mortalidade materna
A taxa de mortalidade materna é determinada pelo número de mulheres que
morrem durante a gravidez ou o parto, por 100.000 nascidos vivos. Os dados sobre
a mortalidade materna são pouco consistentes, ou pouco abrangentes, já que se
baseiam, essencialmente, em registos institucionais, não havendo muita informação
sobre as instituições de saúde privadas, militares e policiais, ou sobre os nascimentos
fora do sistema de saúde formal.
TAXA DE MORTALIDADE MATERNA
890
650
450
2010
2005
2000
Estimativas obtidas a partir da consolidação de dados provenientes de centros de
prestação de serviços de saúde materno-infantil públicos, em várias províncias, apontam para uma taxa de mortalidade materna de 450 óbitos, por 100.000 nados vivos,
quando o ODM respectivo prevê a meta de 350 mortes por 100.000 nados vivos.
Isto considerando uma taxa de fertilidade elevada, embora com uma tendência decrescente, como se pode ver no gráfico abaixo.
TAXA DE FERTILIDADE, TOTAL (NASCIMENTOS POR MULHER)
20
0
20 0
0
20 1
0
20 2
0
20 3
0
20 4
0
20 5
0
20 6
0
20 7
0
20 8
0
20 9
1
20 0
11
7
6,8
6,6
6,4
6,2
6
5,8
5,6
dĂdžĂĚĞĨĞƌƟůŝĚĂĚĞ͕ƚŽƚĂů;ŶĂƐĐŝŵĞŶƚŽƐƉŽƌŵƵůŚĞƌͿ
50 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
É evidente que a gravidez é um estado que ainda comporta riscos para as
mulheres angolanas, sobretudo porque, como se pode ver no gráfico abaixo,
apenas cerca de um terço das mulheres grávidas do país (1.092.000) frequenta
os serviços de saúde materno-infantis (fez, pelo menos, uma consulta pré-natal)
e porque somente cerca de 47% (2013) destas tem parto assistido por pessoal de
saúde qualificado, o que é superior ao da África Subsariana que apresenta uma
média de 41%, que é baixa.
SAÚDE MATERNA (2013)
1.092.000
368.748
171.884
109.802
38.162
Planeamento
Familiar
Consulta
Pré-natal
Partos
/ŶƐƟƚƵĐŝŽŶĂŝƐ
Realizados
Consulta
Pós-parto
Grávidas
Mais de três quartos da mortalidade materna devem-se a causas directas, ou
seja, decorrentes da própria gravidez (como abortos espontâneos, hemorragias e
infecções), enquanto as restantes mortes resultam de doenças como a malária ou
a hepatite.
MORTALIDADE MATERNA EM 2013
76%
24%
Causas Directas
Causas Indirectas
Foram notificadas 550 mortes maternas institucionais públicas, tendo como
principais causas directas a hemorragia (141), a pré-eclampsia (69), a infecção
puerperal (37), a ruptura uterina (27), o aborto (30) e, como causas indirectas, a
malária (79) e a hepatite (15).
| 51
CEIC / UCAN
Existe um Plano Estratégico Nacional de Saúde Reprodutiva, onde as Políticas e Programas estabelecem a assistência aos cuidados obstétricos a partir do
acompanhamento antes, durante e depois do parto. Também aumentou o apoio
do FNUAP e da UNICEF, em matéria de saúde reprodutiva, nomeadamente, em
formação técnica, fornecimento de kits de parto seguro e apoio técnico na elaboração das normas terapêuticas.
3.2.2 A mortalidade neonatal
A mortalidade neonatal é o número de óbitos registados nas quatro primeiras
semanas de vida, isto é, entre 0 e 28 dias incompletos após o nascimento, por 1000
nados vivos. Como se pode ver no gráfico abaixo, desde 2000 que há uma tendência
decrescente sustentada, embora seja cada vez menor.
TAXA DE MORTALIDADE NEONATAL (por 1000 nados vivos)
120,9
2000
119,8
2001
118,9
2002
117,8
2003
117,1
2004
115,9
2005
114,3
2006
112,1
2007
109,7
2008
107,1
2009
104,6
102,2
99,5
2010
2011
2012
FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.
A média da queda da taxa de mortalidade neonatal é de 112,3/1000. Esta
redução foi possível devido aos cuidados associados à saúde materna e reprodutiva, acompanhamento da gravidez, consulta pré-natal, melhor nutrição (tendo
a taxa de crianças subnutridas baixado de 31% para 16%), cuidados preventivos,
cobertura vacinal, melhores cuidados de higiene e maior acesso à água potável.
Por outro lado, o aumento da escolaridade e da escolarização da população permite um maior nível de acesso à informação sobre as formas de prevenção.
3.2.3 A mortalidade infantil
A mortalidade infantil, nos termos da definição dos indicadores da UNICEF, é
“a probabilidade de morrer entre o nascimento e os cinco anos de idade, por mil
nascidos vivos”. A sua taxa é um dos indicadores que espelha o nível de desenvolvimento humano de um país. Este indicador coloca Angola nas piores posições do
IDH. Apesar do fim da guerra, de novos investimentos sociais e programas dirigidos, o país continua no grupo de países com uma das piores taxas de mortalidade
infantil do mundo (164/1000 (2012)).
52 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
TAXA DE MORTALIDADE, COM MENOS DE 5 (por 1000 nados vivos)
203,4
201,3
197,6
199,6
196,4 194,2
191,1
187,1
182,6
177,9
173,1
168,5
163,5
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
A elevada taxa de mortalidade infantil e infanto-juvenil, em Angola, está ligada
a constrangimentos fundamentais que são: o deficiente fornecimento de serviços
e atendimento por profissionais da saúde, o baixo acesso a água potável, a redes
sanitárias, ao saneamento básico, a má nutrição crónica e a carência de serviços
urbanos adequados, bem como ao estado degradado das vias do interior que
ligam as comunas rurais entre si e, sobretudo, à capital do seu município, onde há
normalmente melhores infra-estruturas e serviços.
3.2.4 VIH/SIDA
O VIH/SIDA permanece uma grande preocupação, quer de saúde mundial,
quer de saúde nacional. Até finais de 2013 registaram-se um total de 15.300
casos de VIH/SIDA, correspondendo a 0,3% do total de infecções registadas no
país, numa população estimada em 21 milhões de habitantes.
Os gráficos seguintes mostram a situação do VIH, por idade, e indicam uma
realidade pouco abonatória, quer para os homens, quer para as mulheres.
TESTE DE VIH, EM 2013, POR IDADES, HOMENS
59.914
48.131
38.973
17.437
9935
886
5 a 14
11.699
3820
743
15 a 19
Testes realizados
20 a 29
3048
30 a 39
2448
40 a 49
1093
50 a 59
6433
402
60 ou mais
ZĞƐƵůƚĂĚŽƐƉŽƐŝƟǀŽƐ
FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013.
| 53
CEIC / UCAN
Os homens, entre os 20 e os 49 anos, foram os que mais testes realizaram,
perfazendo um total de 147.000 testes, dos quais 9300 com resultado positivo,
o que representa 74,9% do conjunto de testes positivos. A faixa etária dos 20 aos
29 representa 30,7% de testes positivos, a seguir vem a faixa etária dos 30 aos 39
anos, com 24,7% de testes positivos. Como se pode observar, é evidente que é a
população activa a mais afectada, numa grandeza de 80,9% de infecções confirmadas laboratorialmente.
TESTE DE VIH, EM 2013, POR IDADES, MULHERES
297.680
161.593
74.729
54.045
12.223
1095
5 a 14
11.756
2132
15 a 19
Testes realizados
20 a 29
6306
30 a 39
2833
40 a 49
27.998
1048
8253 302
50 a 59
60 ou mais
ZĞƐƵůƚĂĚŽƐƉŽƐŝƟǀŽƐ
FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013.
Há uma forte concentração de infecções nas mulheres em idade fértil. A
estrutura etária de infecções relevantes tem início aos 15 anos de idade, sendo
contínua a sua progressão. A faixa etária que mais realiza testes e que é a mais
afectada vai dos 15 aos 49 anos de idade, com um acumulado de 588.000 testes
realizados, destes 23.000 testes positivos que representam 90,4% do conjunto de
resultados positivos. O grupo mais afectado foi o de 20 a 29 anos, com 46% de
testes positivos, seguido do 30 a 39 anos, com 25% de testes positivos.
Os dois cenários apresentam uma idêntica estrutura etária, sendo que o das
mulheres é mais alargado. O cenário masculino parece mais moderado, pois
tem um número inferior de diagnósticos positivos (12.400 testes positivos), isto
é, 32,8% dos diagnósticos positivos, muito distante da realidade feminina que
representa 67,2% dos diagnósticos positivos. No entanto, não é evidente que as
mulheres são as mais infectadas, pois os homens apenas representam 23,2% dos
testes realizados com uma taxa de seropositivos de 6,5%, ao passo que as mulheres representam 76,8% dos testes efectuados, com uma taxa de 4% de testes
positivos.
54 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O número de crianças (entre os 0 e os 14 anos de idade) com VIH, segundo
o Banco Mundial, tem vindo a aumentar a uma média anual de 7,8%, conforme
ilustra o gráfico abaixo.
CRIANÇAS COM VIH
21
19
2002
2003
25
23
2004
2005
27
28
2006
2007
30
31
32
2008
2009
2010
34
2011
Crianças (0-14 anos) com VIH (mil)
FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.
Este facto coloca algumas interrogações sobre a eficácia dos programas de
corte vertical, pois muitas destas infecções são contraídas pela via vertical. O programa de prevenção contra a transmissão vertical tem os seguintes resultados:
das 436.100 mulheres grávidas testadas, 9854 foram diagnosticadas positivo e
destas 4875 entraram em tratamento PTV.
PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL DO VIH
9854
4875
436,1
Grávidas testadas (mil)
Grávidas positivas
Grávidas em PTV
FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013.
As grávidas dos grupos etários dos 20 a 29 e dos 30 a 39 anos foram as que
mais procuraram fazer o teste de VIH, sendo igualmente os grupos mais afectados.
| 55
CEIC / UCAN
TESTE DE SIDA, MULHERES GRÁVIDAS, POR IDADES
228.700
112.600
50.600
38.100
5200
900
20 a 29
15 a 19
2500
30 a 39
1100
5400 100
40 a 49
50 a 59
ZĞƐƵůƚĂĚŽƐƉŽƐŝƟǀŽƐ
Testes realizados
FONTE: CEIC de dados do INSL, 2013.
As grávidas representam 68,4% do conjunto das mulheres que realizaram o
teste, o que pronuncia que muitas mulheres realizam o teste, por força do acompanhamento do estado gestante. O índice de seropositividade é de 38,5%, no
conjunto das mulheres.
O acompanhamento e o tratamento médico para muitos doentes a nível
nacional ainda continua a ser um problema.
O gráfico abaixo ilustra essa situação.
INÍCIO DE TARV EM ADULTOS E CRIANÇAS
21.506
10.616
2125
959
Doentes com
acompanhamento
médico
Adultos
Crianças
FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013
56 |
Doentes com
acompanhamento
e TARV
707 168
Óbitos de doentes
em acompanhamento
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
3.3 Saúde preventiva
A saúde preventiva tem vários programas como são os de cobertura vacinal
(nomeadamente contra o sarampo, a poliomielite, a tuberculose, bem como o de
suprimento de vitamina A), o Programa de Luta contra o VIH/SIDA, o Programa de
Cesta Básica, o Programa contra a Malária, o Programa de Combate às Grandes
Endemias, e outros. Há também campanhas de sensibilização para as chamadas
“boas práticas” como são as campanhas da lavagem das mãos e de higiene bocal
oral, de prevenção da gripe H1N1, informação e educação sobre puericultura, nomeadamente sobre a alimentação da criança dos 6 meses aos 5 anos e informação
sobre a Raiva e o Tétano.
3.3.1 Programa de cobertura vacinal
O calendário nacional de vacinação engloba uma série de vacinas, desde a primeira infância, com a Pentavalente 3 e outras como as vacinas contra o sarampo, a
tuberculose, a poliomielite, o tétano e a febre-amarela. A cobertura vacinal nacional é estimada em 91%, sendo desigual no território, registando uma cobertura de:
ͻ superior ou igual a 100%, para cinco províncias (Cabinda, Uíge, Lunda Sul,
Lunda Norte e Kwanza Sul);
ͻ 80 a 99%, para dez outras (Huambo, Huíla, Zaire, Benguela, Malanje, Cunene,
Moxico, Bié, Bengo e Luanda);
ͻ 62 a 74%, para as restantes três (Kwanza Norte, Cuando Cubango e Namibe).
A província do Namibe apresenta a taxa de cobertura mais baixa, situando-se
em 62%.
COBERTURA VACINAL DE ROTINA
97
87
98
91
88
91
84
83
76
65
2013
2012
BCG
Pólio 3
Sarampo
Penta 3
TT2 + grávidas
FONTE: CEIC de dados do PAV.
| 57
CEIC / UCAN
A taxa de cobertura média das vacinas, em 2013, foi de 86,4%, com um fosso
a cobrir de 13,6%. O gráfico anterior mostra o bom desempenho dos programas
de vacinação de rotina, embora haja uma preocupante baixa de 12 pontos percentuais na cobertura da pólio que poderá ser explicada pelo facto de não haver
registo de casos de pólio nos últimos anos. Mas, a verdade é que o país está
exposto à influência negativa dos fluxos migratórios dos países vizinhos que poderão ser os vectores da reintrodução da doença, como já aconteceu no passado.
3.3.1.1 Vacina Pentavalente 3
A vacina Pentavalente 3 é administrada às crianças e a sua cobertura nacional
é de 91%, nos dois últimos anos (2012-2013), o que corresponde a uma superação
em 18% em relação a 2011, cuja cobertura estava em 73%.
3.3.1.2 Vacina contra o sarampo
Embora haja um maior número de crianças imunizadas contra o sarampo e uma
correlata diminuição de casos, essa progressão é relativamente fraca, levando em
consideração também os ODM que neste caso visam atingir 90% (em 2015), pois
passou-se de uma cobertura de 53,4% (em 2001) para 93% (em 2010), correspondendo a um forte desequilíbrio entre o meio urbano (74,3%) e o meio rural (38,4%)
e a uma ligeira diferença de género.
IMUNIZAÇÃO, SARAMPO (% DE CRIANÇAS COM IDADE ENTRE 12-23 MESES)
97
88
91
88
2010
2011
79
74
62
77
64
45
48
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2012
Imunização, sarampo (% de crianças com idade entre 12-23 meses)
FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.
De acordo com o Banco Mundial, a cobertura de crianças com idade compreendida entre os 12 e os 23 meses, no ano de 2012, foi de 97%.
58 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
3.3.1.3 Vacina contra a poliomielite
A cobertura vacinal contra a poliomielite apresenta um cenário mais positivo, embora não seja totalmente satisfatório, porque desde o ano 2000 que os
esforços para a erradicação da doença não têm atingido o seu alvo, em parte,
devido à vulnerabilidade do Sistema Nacional de Saúde e aos fluxos migratórios
de populações dos países vizinhos, havendo ressurgências de estirpes selvagens
do vírus que atingem não somente as crianças, mas também os adultos, como
aconteceu recentemente em Cabinda, onde as autoridades sanitárias decidiram
vacinar toda a população.
Para além das campanhas de rotina (jornadas de vacinação), tendo em conta
os casos que se notificaram em cada província, em 2013 foram realizadas duas
jornadas nacionais de vacinação com o lema: “chuta a pólio para fora de Angola
(África)”.
U
Ca íge
bi
n
M da
ox
ic
Be o
Be ngo
ng
ue
la
Bi
Cu é
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Hu ene
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m
ib
e
Za
ire
JORNADA NACIONAL DE VACINAÇÃO 2013
População alvo (mil)
1.a&ĂƐĞǀĂĐŝŶĂĚŽƐ;ŵŝůͿ
2.a&ĂƐĞǀĂĐŝŶĂĚŽƐ;ŵŝůͿ
FONTE: CEIC de dados do PAV, 2013.
Nas duas jornadas de vacinação foram administrados pólio + Vitamina A +
Albernd, tendo sido vacinadas um total de 13,7 milhões de crianças contra a pólio
e o sarampo.
As quatro províncias mais populosas (Luanda, Benguela, Huíla e Uíge) vacinaram, na segunda fase, uma população de 3,1 milhões de crianças dos 0 aos 5
anos de idade, uma taxa média de execução de 96%, e somente Uíge teve uma
taxa de execução de 100%.
As províncias do Bengo, Cabinda, Kwanza Norte e Sul, Malanje, Lunda Norte,
Moxico, Namibe, Uíge, Zaire e Cuando Cubango tiveram uma taxa de execução
| 59
CEIC / UCAN
superior a 100%, com uma média, por província, de 105,8% e de 2,3 milhões de
crianças, dos 0 aos 5 anos de idade.
3.3.1.4 Situação vacinal em geral
A cobertura vacinal em relação à BCG é de 84%, ao Sarampo é de 97% e ao
Tétano é de 95%.
Relativamente a todas as doenças infantis, os resultados ainda estão muito longe
do desejável, embora se possa verificar uma progressão positiva na cobertura vacinal
total das principais vacinas contra doenças evitáveis.
JORNADA NACIONAL DE VACINAÇÃO 2013 (taxa de execução)
Angola
Zaire
103,0
101,1
Namibe
112,0
Malanje
105,0
Lunda Sul
103,6
Lunda Norte
Luanda
112,2
97,1
Kwanza Sul
118,8
Cuando Cubango
106,4
Kwanza Norte
105,7
Huíla
102,9
Huambo
102,4
Cunene
Bié
Bengela
Bengo
Moxico
99,6
97,2
98,7
107,9
112,1
Cabinda
Uíge
121,3
107,1
FONTE: CEIC de dados do PAV, 2013.
Do total de crianças previstas para tomarem parte das campanhas de vacinação, 6,7 milhões de crianças, em 2013, foram vacinadas, prescrevendo uma eficiência de 103,0% da actividade.
60 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
A análise comparativa dos resultados da cobertura vacinal, entre 2009 e 2013,
apresenta um aumento da cobertura em cerca de 41,1%.
3.4 Saúde curativa
O sistema público de saúde curativa é organizado a três níveis: o primeiro constituído pelos hospitais municipais, centros e postos de saúde; o segundo pelos hospitais
provinciais e o terceiro pelos hospitais nacionais especializados. Pela sua natureza,
todas as unidades médico-sanitárias de proximidade desenvolvem também acções
preventivas, nomeadamente no que tange à administração de vacinas, de desparasitantes e aportes vitamínicos, sendo a sua primeira vocação a oferta do pacote
essencial de cuidados e serviços materno-infantis e o controlo e combate às doenças
transmissíveis e não transmissíveis.
A rede de saúde do Serviço Nacional de Saúde é constituída por 1721
unidades médico-sanitárias, das quais 8 hospitais nacionais (centrais), 32 provinciais, 228 municipais e centros médicos e 1453 postos de saúde, para além
do sector privado de saúde que tem crescido muito em Angola, desde o início
da sua legalização, em 1992, e só na província de Luanda, em 2005, havia 628
clínicas privadas legalizadas, representando 88% da totalidade de clínicas da
capital.
No plano da saúde curativa intervêm também unidades médico-sanitárias
do sector privado, de empresas, de organizações da sociedade civil e de igrejas
que constituem uma larga malha de hospitais, clínicas e de postos médicos, não
somente no plano curativo, mas também a nível de diagnóstico e de intervenção
que preenche um espaço de procura que o sistema público não está capaz de
satisfazer, nomeadamente da crescente classe média que raramente frequenta as
unidades médico-sanitárias públicas.
O Sistema Nacional de Saúde, em termos de recursos humanos para a prestação de serviços neste sector, em 2013, conta com 3940 médicos (dos quais 1668
angolanos e 2272 estrangeiros), o que significa 0,0002 por 1000 habitantes.
Já em relação a enfermeiros, o número é de 28,7 mil, representando 0,002
por cada 1000 habitantes. Cifras que melhoram ao juntarmos profissionais de
saúde que trabalham nos hospitais, clínicas, centros e postos médicos do sector
não-estatal. Constata-se um grande peso do pessoal administrativo, a despeito do
pessoal técnico e de diagnóstico.
| 61
CEIC / UCAN
PESSOAL DE SAÚDE POR PROVÍNCIA E POR ESPECIALIDADE
Províncias
Médicos
Enfermeiros
TDT
ĚŵŝŶŝƐƚƌĂƟǀŽƐ
Auxiliares
Bengo
89
819
122
249
201
Benguela
234
3214
692
1135
664
Bié
55
1937
31
250
395
Cabinda
52
1273
377
280
461
Cunene
59
1099
61
337
327
Huambo
109
3499
416
340
690
Huíla
49
1668
436
647
764
Cuando Cubango
15
853
28
407
291
Kwanza Norte
72
900
47
637
32
Kwanza Sul
141
1668
143
512
380
Luanda
325
4717
1473
819
2030
Lunda Norte
63
669
53
180
364
Lunda Sul
39
555
40
190
65
Malanje
94
885
39
395
1025
Moxico
56
1013
98
654
Namibe
47
1632
172
398
121
Uíge
101
1440
121
300
675
Zaire
68
824
104
153
188
FONTE: CEIC de dados da DNRH, 2013.
Para além do pessoal médico-sanitário nacional, há ainda a contar com os
médicos, enfermeiros e técnicos de diagnóstico expatriados.
MÉDICOS EXPATRIADOS
Total
2272
Cubanos
1559
Russos
341
Vietnamitas
196
Coreanos
176
FONTE: CEIC de dados do DARH/SFT,2013
62 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
3.5 Despesas com a saúde
Sendo a saúde um factor importantíssimo para o aumento das condições de
vida e do bem-estar dos cidadãos, é também condição necessária para o aumento
da produtividade nacional, pois um país com saúde é um país com uma acrescida
disposição e disponibilidade para o trabalho, o que concorre mutuamente para o
crescimento económico e para o aumento do índice de felicidade dos cidadãos.
Uma das responsabilidades primárias de qualquer Estado moderno é garantir o
bem-estar dos seus cidadãos, e a saúde é uma delas. Por isto, os Estados têm
gasto somas avultadas de dinheiro para o melhoramento do sistema de saúde dos
respectivos países.
Como fizemos referência no Relatório Social 2012, “na situação em que ainda
se encontra o sistema nacional de saúde, compete ao Estado, através do seu
Orçamento Geral, garantir a máxima qualidade na prestação de cuidados primários e não primários de saúde”, sobretudo porque as populações não dispõem de
rendimentos que lhes possibilitem recorrer aos serviços privados de saúde.
3.5.1 Na perspectiva do orçamento
Angola precisa ainda de fazer investimentos significativos e de qualidade na
saúde quer curativa, quer preventiva para poder alcançar melhores níveis nos
indicadores de saúde, que por sua vez são uma condição necessária para que os
cidadãos exerçam cabalmente as suas funções, contribuindo assim tanto para a
realização social como para a realização pessoal.
O gráfico abaixo espelha o nível das despesas públicas financiadas pelo OGE.
DESPESAS COM A SAÚDE (MIL MILHÕES DE KWANZAS)
351,31
266,2
231,31
209,43
155,27
169,92
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Despesas com a saúde (mil milhões de Kwanzas)
FONTE: RS 2012 e OGE 2013.
| 63
CEIC / UCAN
Nos últimos anos tem-se vindo a constatar que as dotações das despesas
orçamentais com a saúde têm registado um progressivo aumento em termos
nominais. De um montante global de 266,2 mil milhões de dólares, em 2009, passou-se para um valor total de 351,31 mil milhões em 2013, o que representa um
incremento nominal de 31,97%. A taxa média anual de variação nominal durante
o período 2009-2013 é de 6,39%, que tem um menor impacto na recuperação do
atraso acumulado, se considerarmos que a população cresce a um ritmo de 3,2%
ao ano. Para além de que não podemos deixar de referir que o montante das despesas alocadas não é necessariamente o montante realizado ou efectivamente
gasto. Por exemplo, de acordo com o Relatório de Execução do OGE 2012, referente ao terceiro trimestre, somente 67,7% das despesas com o sector da saúde
foram realizadas até ao 3.o trimestre daquele ano13. O nível de execução das despesas públicas em Angola é ainda baixo, o que dificulta ainda mais a melhoria das
condições de vida das populações.
Olhando para o peso das despesas públicas com o sector da saúde, no total
do OGE, vimos que não tem havido, desde 2000, um crescimento significativo. De
2000 a 2013, o peso médio anual do sector da saúde no OGE é de 4,85%, o que
é baixo em comparação com os outros países da região da SADC e com os países
desenvolvidos, como veremos adiante.
Entre 2012 e 2013, o peso relativo do sector da saúde, no conjunto das despesas totais do Estado, teve um minúsculo crescimento de 0,15%, ou seja, não se
alterou muito a escala de prioridades públicas no que concerne às necessidades
sociais.
DESPESA COM A SAÚDE NO OGE (2000-2013) (%)
6,7
5,9
6,3
5,3
4,1
4,3
4,1
3,4
5,02
4,6
4
5,14
5,29
3,7
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
FONTE: CEIC a partir de RS 2012 e OGE 2013.
13 O Relatório de Execução do OGE 2012 referente ao 4.o Trimestre e o Relatório de Execução do OGE 2013 não estavam disponíveis no site do Ministério das Finanças até ao
momento da compilação do RS 2013.
64 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Medindo o peso das despesas com a saúde, no Produto Interno Bruto (PIB),
vê-se que Angola, em comparação com outros países, está com um índice muito
baixo.
De acordo com o Banco Mundial, o peso médio das despesas com a saúde,
no PIB em Angola, é cerca de 3,97%, muito abaixo do de outros países africanos,
como o Congo Democrático, a Namíbia, Moçambique e outros, como podemos
ver no gráfico abaixo.
Esta percentagem é ainda mais baixa quando procedemos a um exercício de
comparação com países como Brasil, Noruega, Cuba e África do Sul.
Como podemos ver no gráfico abaixo, Angola, em termos médios, é o país que
menos investiu em saúde, relativamente ao total dos gastos públicos.
DESPESAS TOTAIS COM A SAÚDE (% do PIB)
12,00
10,00
8,00
6,00
4,00
2,00
2007
2009
2010
Na
m
íb
ia
Ni
gé
ri
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ru
Áf
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2008
bi
Cu
bo
Ve
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e
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a
Ch
an
il
Bo
ts
w
as
Br
An
go
la
0,00
2011
FONTE: Base de dados do Banco Mundial (2014).
3.5.1.1 Despesas per capita
Em termos per capita, ou seja, despesas por habitante, os dados do Banco
Mundial dão conta de que Angola, em termos médios, de 2007 a 2011, gastou em
saúde, por habitante, cerca de 173 dólares-americanos, melhor do que a Nigéria,
mas pior do que Botswana, Namíbia e África do Sul que apresentam maiores despesas per capita.
| 65
CEIC / UCAN
DESPESAS PER CAPITA COM A SAÚDE (USD)
2007
2009
a
l
.C
on
go
bi
Zâ
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p.
De
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ric
a
do
Su
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Ve
rd
2008
M
na
Ca
bo
Ch
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Bo
ts
An
go
la
w
an
a
700,00
600,00
500,00
400,00
300,00
200,00
100,00
0,00
2010
2011
FONTE: Banco Mundial, 2014.
Usando dados do OGE 2013, o CEIC estima que os gastos, por habitante, em
2013, foram de 176,18 dólares-americanos14.
3.5.1.2 Despesas públicas/Despesas privadas com a saúde
Na maior parte dos países, o Estado não financia a totalidade dos gastos com a
saúde dos cidadãos, são os próprios que pagam uma parte (ou mesmo a totalidade)
das despesas com os seus próprios rendimentos ou por meio de seguros privados
de saúde.
Dados do Banco Mundial dão conta que em Angola, em 2007, 65,44% das despesas com a saúde foram suportadas pelo Estado, enquanto os privados suportaram dos seus bolsos 34,56% dos gastos com a saúde.
PESO DAS DESPESAS PÚBLICAS NAS DESPESAS TOTAIS COM A SAÚDE EM ANGOLA
76,70
70,65
65,44
61,53
60,97
39,03
34,56
38,47
29,35
23,30
2007
2008
Despesas públicas com a saúde
2009
2010
2011
Despesas dos privados com a saúde
FONTE: Banco Mundial e cálculos do CEIC.
14 Tendo em conta uma população de 19,94 milhões de habitantes e uma taxa de câmbio
de 100 Kwanzas por Dólar.
66 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Em 2009, a crise financeira afectou de tal maneira o rendimento dos cidadãos que nesse ano só suportaram 23,30%, cabendo 76,70% ao Estado. Em 2010
e 201115, a contribuição do Estado nos gastos com a saúde foi cerca de 60%,
enquanto os privados suportaram quase 40%.
O aumento das clínicas ou hospitais privados e da oferta dos serviços de seguros de saúde por parte das seguradoras no país podem ser uma das razões que
fez com que houvesse uma maior participação dos cidadãos nos gastos com a
saúde.
Ou ainda, podemos dizer que a degradação dos serviços de saúde pública
levaram os cidadãos a gastarem mais dos seus bolsos, indo para os hospitais privados16.
3.5.1.3 Distribuição das despesas dentro do sector
A análise da evolução da distribuição das despesas com a saúde, no interior
do sector, nos últimos seis anos, como se pode ver no gráfico seguinte, evidencia
a tendência da manutenção da importância dos Serviços Hospitalares Gerais (que
teve uma dotação orçamental de cerca de 145 mil milhões de Kwanzas, em 2013,
o que representa um aumento nominal de 67,16%, em relação a 2012), enquanto
os Serviços de Saúde Ambulatórios e os Serviços de Saúde Não Especificados são
substituídos, em termos de importância, pelos Serviços de Centros Médicos e de
Maternidade e pelos Serviços de Saúde Pública.
15 Dados de 2012 e 2013 não estavam disponíveis no site do Banco quando estávamos
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16 ‘†‡‘•ƒϐ‹”ƒ”“—‡‘•‰ƒ•–‘•‘ϐ‹…‹ƒ‹•“—‡‘•…‹†ƒ† ‘•ˆƒœ‡…‘ƒ•ƒï†‡†‘••‡—•
próprios rendimentos vão para os hospitais privados já que os serviços de saúde públicos são geralmente gratuitos, embora haja grande dispêndio das famílias que frequentam os serviços de saúde públicos, pois são muitas vezes obrigados a comprar os medicamentos ou a pagar o pessoal médico-sanitário para garantir a assistência conveniente
aos seus familiares internados.
| 67
CEIC / UCAN
DISTRIBUIÇÃO DAS DESPESAS COM A SAÚDE (MIL MILHÕES DE KWANZAS)
160
140
120
100
80
60
40
20
0
2008
2009
2010
2011
Serviços Hospitalares Gerais
Serviços Hospitalares Especializados
Serviços de Centro Médico e Maternidade
Serviço de Saúde Pública
2012
2013
Produtos, Aparelhos e Equipamentos Médicos
Serviço de Saúde Ambulatório
Serviço de Saúde Não Específicado
FONTE: RS 2012 e OGE 2013.
Estas tendências podem ser interpretadas como o esforço das autoridades sanitárias para melhorar a capacidade dos serviços de saúde preventiva e aproximar os
serviços hospitalares das comunidades. A dotação dos Serviços Ambulatórios de
Saúde teve um ligeiro aumento, de 4 mil milhões de Kwanzas, nas verbas alocadas
em 2013, em relação a 2012, que denota uma maior atenção em relação ao tipo de
enfermidades que são determinantes no melhoramento dos indicadores de saúde.
3.5.1.4 Despesas por programas
No Relatório Social 2012 afirmamos que os programas de saúde pública têm assinalado, nos últimos anos, quedas no nível de financiamento público. Por exemplo, a
dotação do Programa de Luta Contra as Grandes Endemias diminuiu de 7,43 mil milhões,
em 2010, para 4 mil milhões de Kwanzas, em 2012. Mas, em 2013, esta mesma dotação
orçamental aumentou cerca de 27%, passando para 6,25 mil milhões de Kwanzas.
DESPESAS POR PROGRAMAS (MIL MILHÕES DE KWANZAS)
7,43
5,63
6,25
5,38
5,19
4,92
2,21 2,2
1,54 1,6 1,82
0,67
Prog. de combate
às grandes
endemias
2010
Prog. de luta
contra
o SIDA/VIH
2011
FONTE: RS 2012 e OGE 2013.
68 |
2012
Prog. de melhoria
da saúde
ŵĂƚĞƌŶŽͲŝŶĨĂŶƟů
2013
0,07
0,13
0,75 0,75
Prog. Nacional Prog. de combate
à cólera
de doenças
mentais e
toxicodependência
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O Programa de Luta Contra o VIH/SIDA também assinalou um aumento significativo de financiamento público, passando de 1,82 mil milhões, no ano anterior,
para 5,19 mil milhões, este ano, o que pode representar um maior compromisso
do Estado em relação aos encargos de financiamento do Programa Nacional de
Luta Contra o VIH/SIDA.
O Programa de Melhoria da Saúde Materno-Infantil, em comparação com as
dotações dos anos anteriores, beneficiou também de uma maior dotação orçamental, em 2013, 5,38 mil milhões de Kwanzas. Este incremento, continuando
Angola a ser um país com uma das maiores taxas de mortalidade infantil no mundo, pode traduzir-se num melhoramento da saúde materno-infantil, sendo por
isto de grande importância para a redução da taxa de mortalidade infantil, desde
que as verbas cabimentadas tenham sido integralmente executadas.
| 69
CEIC / UCAN
4. COMPROMISSO COM A EDUCAÇÃO
4.1 Introdução
A educação continua a ser uma questão estratégica para o crescimento
económico-social do país e um factor determinante do progresso social. Na verdade e em rigor, quanto maior oportunidade de educação for dada aos cidadãos,
maior possibilidade haverá destes participarem na vida pública, económica, social
e cultural do país e, por conseguinte, no seu desenvolvimento, tendo em conta
as habilidades de cada cidadão. Portanto, a garantia do direito à educação para
todos os cidadãos pressupõe garantir a construção de uma sociedade constituída por elementos cuja ética e moral está voltada para a promoção da dignidade
humana. Os países que queiram melhorar as suas capacidades em termos de
mão-de-obra para responder à demanda do desenvolvimento, constantes dos
processos produtivos, de organização e gestão e de prestação de serviços de qualidade, de maneira a proporcionar um cada vez maior bem-estar às populações,
têm que melhorar os seus investimentos na educação. Não apenas na educação
básica, mas em todo o sistema de educação e formação profissional a todos os
níveis.
Não é possível promover o desenvolvimento do país, assegurar a promoção
social dos angolanos e integrar a globalização do desenvolvimento, tirando deste
o melhor proveito, sem um forte investimento na aquisição inicial e contínua de
conhecimentos, capacidades técnicas e habilidades cognitivas dos cidadãos.
Nunca foi tão justamente lógico afirmar que “o futuro começa agora”. Mas,
que futuro? Um futuro de angolanos não empregados, por não serem portadores
do perfil técnico-profissional que os mercados exigem para o preenchimento dos
empregos criados, mas também um futuro em que os angolanos, não somente
são desempregados, mas também perderam a capacidade cognitiva ou têm grandes dificuldades na aquisição da formação necessária.
Apesar de se insistir num fraco investimento neste sector e na distorção da
sua estrutura de despesa, havendo gastos administrativos superiores às áreas
de formação académica, a educação, para além de ser factor incontornável na
70 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
preparação da mão-de-obra nacional e da sua crescente qualidade, é também um
indicador importante do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Angola, apesar do considerável crescimento do seu RNB, tem progredido
pouco no IDH, precisamente devido ao baixo índice de escolaridade média que
se situou em 4,9, em 2013. A economia de Angola, em termos das suas necessidades de RH, não tem condições internas de crescimento pois o sistema de educação nacional não produz o número de técnicos necessários a esse crescimento.
O país tem carência de engenheiros, químicos, biólogos, administrativos, contabilistas, informáticos e de outros técnicos. Uma das razões pela qual a Noruega está
em primeiro lugar no IDH é o facto de ter uma alta escolaridade média, resultado
de fortes investimentos na educação, o que lhe permitiu passar do 7.o lugar, em
1985, para o 4.o lugar, em 1995, e para o 1.o lugar, a partir de 2002, com disponibilização sustentada de uma média de 7,1% do PIB, ao longo destes anos. Sendo
certo que sempre que um país não coloca as suas prioridades, em termos de despesa pública, na educação e saúde, está a adiar o seu próprio desenvolvimento
sustentado, sendo pois a educação um dos pilares da soberania nacional.
Consagrada na Constituição da República como direito fundamental17, o
direito à educação faz parte dos Direitos Humanos e é basilar para o desenvolvimento da pessoa e consequentemente do meio social que a rodeia, pois, por via
do direito à educação, os cidadãos alcançam outros direitos fundamentais nos
domínios político, económico, social, ambiental e cultural18. A educação é assim
um desafio permanente e um compromisso de todos os actores sociais (o Estado,
as igrejas, as empresas, os actores comunitários, a sociedade civil e as personalidades), embora pese uma grande responsabilidade sobre o Estado que é quem
determina e conduz a política da educação, no país. Nesse sentido, a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, ao consagrar o direito à educação, lembra aos
Estados-Membros da ONU que todo o ser humano tem direito à instrução, que
deve ser gratuita e obrigatória, pelo menos nos graus elementares e fundamentais, e estar orientada para o desenvolvimento da personalidade humana e para o
17
Angola tem consagrado na sua Constituição, desde sempre, o direito à educação, estando o Estado angolano obrigado a promover “o acesso de todos à alfabetização, ao
ensino, à cultura e ao desporto, estimulando a participação dos diversos agentes particulares na sua efectivação, nos termos da lei” (CRA, Artigo 79.o).
18 Uma leitura comparada da Declaração Universal dos Direitos Humanos (Artigo 27.o)
e da Constituição da República de Angola (Artigo 79.o) revelam seguramente uma coerência do ponto de vista do papel da educação para a vida humana e consequentemente
para o progresso das Nações. Do ponto de vista legal (teórico), os dois instrumentos
promovem, defendem e protegem o direito à educação no quadro dos princípios de
participação, democracia e exclusividade, mas, na prática, será que todos os cidadãos
angolanos gozam do direito à educação pública, gratuita e de qualidade?
| 71
CEIC / UCAN
fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais, com vista a promover a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas
as Nações (DUDH, Artigo 26.o).
Os Estados-Membros da ONU, em particular Angola, reconheceram a importância estratégica de garantir o acesso a uma educação pública e gratuita a todos
os seus cidadãos, como sendo um recurso fundamental para a promoção da paz,
da justiça social e da dignidade humana. No entanto, a tendência geral da cobertura escolar, em 2013, é de decréscimo em termos de cobertura bruta para os
níveis iniciais, ensinos pré-primário (–8,3%) e primário (–1,5%), e de crescimento
para os níveis posteriores, ensinos secundário (+0,5%) e universitário (+3,34%).
Esse considerável decréscimo nas matrículas a nível da iniciação (–8,3%) e do
primário (–1,5%) representam não somente crianças fora do sistema de ensino,
sobretudo para as mais novas, mas também traduz uma fraca recuperação do
atraso escolar e da integração tardia. Em relação à iniciação, há uma diferença
negativa, entre matriculados e população de correspondência etária, de mais de
188.087 crianças.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) considera que a população do país
atingiu cerca de 21 milhões de habitantes, em 2013. A população escolar situa-se entre os 5 e os 23 anos de idade. Tomando como referência os indicadores do
IBEP, corresponde a 35,4% dos habitantes do país, isto é, um total de 7.434.000
pessoas. Neste ano, houve 6.745.888 matrículas para o ensino não-universitário
(incluindo iniciação, ensinos primário e secundário), e 218.678 para o ensino universitário, perfazendo 6.964.564 matrículas a que se juntam mais 584.050 matrículas do ensino de adultos (Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar). O
país regista, assim, no ano lectivo de 2013, em termos de matrículas, uma progressão de cerca de 260.319 novas matrículas, correspondendo a uma progressão
de +3,88%, já que no ano transacto houve um total de 6.704.245 matrículas.
POPULAÇÃO E COBERTURA ESCOLAR 2013
Iniciação
(5 anos)
(3,6%)
Primário
(de 6 a 11 anos)
(17,7%)
Secundário
(de 12 a 17 anos)
(14,1%)
Universitário
(de 18 a 22 anos)
(9,9%)
População
756.000
3.717.000
2.961.000
2.079.000
Matriculados
567.113
5.162.879
1.015.896
218.678
75,0%
139,0%
34,3%
10,5%
68,0%
30,7%
Cobertura
Níveis e
indicadores
Bruta
Líquida
FONTE: CEIC, estimativas com base nos indicadores do GEPE – Ministério da Educação, 2013.
72 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O sistema de educação nacional está estruturado em quatro grandes níveis:
iniciação escolar (ensino pré-primário), de um ano; ensino primário, de seis anos,
obrigatório e gratuito; ensino secundário, dividido em dois ciclos: primeiro ciclo (7.a,
8.a e 9.a) e segundo ciclo (10.a, 11.a, 12.a e 13.a), a que se junta o Ensino de Adultos.
O estado actual do Sistema Nacional de Educação, em termos de disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e adaptabilidade, tidos pelas Nações Unidas
como referenciais mínimos, vai ser dado a conhecer através da análise da situação das infra-estruturas, da formação, do recrutamento e qualidade dos professores, dos meios de ensino, do material didáctico e das habilitações e competências
adquiridas, nos diversos níveis do sistema nacional de educação, levando também em consideração os meios de acesso e transição de níveis ou os aspectos de
descriminação, de liberdade de escolha e da qualidade dos curricula e do material didáctico-pedagógico.
A nossa abordagem é feita através de cada um dos subsistemas de ensino:
iniciação, primário, secundário e universitário, procurando analisar as questões
concernentes, nomeadamente, à população escolar, à taxa líquida de frequência,
à evolução da cobertura escolar, do corpo docente, das infra-estruturas e equipamentos escolares e do correspondente rendimento escolar, com vista a diferenciar os indicadores por género, região, província e nos meios urbanos e rural.
4.2 Ensino pré-primário (Iniciação)
No processo de aquisição de saber e de habilidades cognitivas, joga papel fundamental o primeiro período de desenvolvimento cognitivo das crianças, nos seus
primeiros seis anos de vida. Pelo que é preciso investir de forma precoce no ensino
e na transmissão de saber às crianças angolanas.
Acontece que o país, neste capítulo, da educação na primeira infância, tem
um percurso divergente, indo no sentido contrário, o que é absolutamente preocupante, não somente pelo presente de ausência de sistema de ensino para a primeira infância, mas sobretudo pelo penhorado futuro que se anuncia como certo,
pois a ausência de desenvolvimento cognitivo adequado, na primeira infância,
produz efeitos irreversíveis na capacidade de aprendizagem das futuras gerações,
limitando-as na sua formação cívica integral e nas suas possibilidades de integração nos processos produtivos e de serviços.
A iniciação escolar começa, no país, aos cinco anos de idade, numa altura do
desenvolvimento da criança em que algumas das suas potencialidades já não
foram aproveitadas. A iniciação escolar deveria, pois, ser um ciclo de três anos
que começaria aos três anos de idade.
| 73
CEIC / UCAN
Não obstante esse atraso, a iniciação escolar não é devidamente considerada
e tem estranhamente registado, a nível nacional, para o ensino público, um retrocesso no número de matrículas, em relação aos anos imediatamente anteriores
em que se situou sucessivamente em 587.710 crianças (2011), 570.079 crianças
(2012) e em 567.113 crianças (2013), para uma população, referente ao nível 5
anos de idade, de 705.600, em 2011, de 726.062, em 2012 e de 756.049 crianças,
este ano. Regista-se uma diferença sucessiva de menos 17.631 e de 2966 que correspondem a um decréscimo de 3% e de 0,52%, respectivamente. Já em relação
à população escolar regista-se um deficit sucessivo de 155.983 crianças (2012) e
de 58.936 crianças (2013). E, como já se dizia no relatório anterior, esta tendência
vem desde 2008, quando a iniciação registou 711.025 matrículas.
Não é possível, por falta de informação, determinar quantas crianças com
mais de cinco anos estão inscritas na iniciação, pelo que não é possível identificar
a frequência líquida neste ano inicial do ensino no país.
INICIAÇÃO ESCOLAR
Matrículas
2011
Local
MF
Público
587.710
2012
F
MF
570.079
2013
F
MF
F
567.113
Angola
Privado
Público
39.353
Luanda
Privado
Público
60.358
68.482
34.971
702
363
Benguela
Privado
Público
33.965
Cuando Cubango
Privado
4.3 Ensino primário
O ensino primário, agora da 1.a à 6.a classes, em regime de monodocência, continua a ser considerado, em teoria, a prioridade da educação nacional, embora o
Orçamento Geral do Estado não reflicta isso, sem que no entanto este subsistema
tenha deixado de ser a base de toda a cadeia de educação e formação profissional
e de aquisição do conhecimento e de uma política sustentada de promoção da
qualidade do ensino nacional, como é propósito declarado do Executivo. Na verdade, a escola primária, obrigatória, gratuita e de qualidade, é uma necessidade
não somente social mas também política, económica e cultural, pelo que o Estado
não pode deixar de garantir o acesso universal ao ensino primário (e até mesmo
ao ensino geral), sem diferenças sociais, descriminação de género, nem assimetrias
74 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
territoriais. Este é um compromisso nacional e internacional, sendo inclusive um dos
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e, particularmente, do Fórum
Mundial de Educação para Todos (2000).
A oferta a este nível é ainda insuficiente para que o país tenha uma educação
universal, mesmo ao nível do subsistema primário, pois muitas crianças continuam,
em todas as províncias, fora do sistema de ensino, impedindo a realização deste
direito fundamental que é a educação para todos, devido a insuficiência de professores e de salas de aula, de fornecimento irregular e insuficiente de livros e de
outros materiais didácticos. Continua a haver insuficiência de professores, um grande absentismo dos novos professores, nomeadamente aqueles que são colocados
longe do seu habitat habitual, a qualidade e o profissionalismo destes deixa muito a
desejar, sem que haja políticas adequadas para reverter a situação. Não há ainda um
recurso sistemático às novas tecnologias para homogeneizar as capacidades e competências do corpo docente e da matriz didáctico-pedagógica da educação nacional.
No entanto, o ensino primário é o subsistema mais demandado pelas famílias
que cada vez mais investem na educação e entendem que as suas crianças não
podem deixar de frequentar a escola. Porém, continua a haver um elevado número de crianças, em todas as províncias, fora do sistema de ensino ou que estudam
em condições precárias, dependendo o curso normal das aulas dos caprichos da
natureza, do absentismo dos professores, do desinteresse das administrações.
O estado do ensino primário, no país, é ilustrado, neste capítulo, através da
evolução da cobertura escolar, do corpo docente, das infra-estruturas e dos equipamentos escolares e do correspondente rendimento escolar, procurando diferenciar
os indicadores por género, região, província e segundo o meio: urbano ou rural.
4.3.1 Cobertura escolar
A cobertura escolar, ao nível do ensino primário, é feita sobretudo pelo ensino
público, embora seja desigual geográfica e socialmente porque está mal distribuída pelo território e porque as famílias não dispõem dos mesmos recursos para a
educação dos filhos. A presença do ensino comparticipado e do ensino privado é
cada vez mais significativa mas sobretudo na capital, onde o ensino público corresponde a 59% e o ensino não público a 41%, sendo 30% para o ensino comparticipado e 11% para o ensino privado.
Esta presença é bem modesta (ou mesmo inexistente) nas províncias do
interior. Mesmo em províncias como Benguela, que é litoral e onde há um maior
crescimento económico, a presença do ensino primário privado não chega a
1% (na verdade, são apenas 0,84%). O que quer dizer que os agentes privados
não são suficientemente estimulados para aparecerem em outras províncias,
| 75
CEIC / UCAN
oferecendo serviços à classe média que os pode pagar e permitindo a libertação
de infra-estruturas e recursos humanos para proporcionar um maior acesso das
classes baixas às escolas públicas, pois, quando assim não acontece, são os mais
pobres, que mais necessitam da escola pública, que menos a frequentam, sendo
os mais ricos e influentes, os que a ela têm maior acesso.
Em 2013, o ensino primário registou, a nível nacional, 5.162.879 matrículas,
das quais 22% em Luanda e 11% em Benguela. Há uma desproporção evidente
entre os números do país e os das províncias.
A província de Luanda, a capital do país, onde se encontra cerca de um terço da
população total de Angola, tem uma população escolar, para o ensino primário, de
1.150.500 e registou 1.125.648 matrículas (das quais 666.472 para o ensino público, 124.173 para o ensino privado e 337.003 para o ensino comparticipado), o que
resulta numa cobertura bruta de 98%, muito abaixo da cobertura bruta do país que
atinge os 139%. Levando em consideração um atraso escolar, no ensino primário
de 59% (IBEP), a cobertura escolar líquida, no ensino primário, situa-se em 48%,
o que é também muito pobre, em relação a uma taxa líquida de escolarização, no
país, segundo o Ministério da Educação, de 86%19 ou, mesmo segundo os nossos
cálculos, de 68%. É bem provável que esta taxa líquida de cobertura escolar, em
Luanda, não corresponda à realidade, pois tudo leva a crer que o atraso escolar em
Luanda seja inferior ao do país (59%), pela superior qualidade da oferta, nesta província, mas para o qual nem o Ministério da Educação, nem a Direcção Provincial da
Educação de Luanda, forneceram informação. Certo é que Luanda apresenta uma
fraca disseminação da escola pública, que tem apenas 734 instituições escolares,
enquanto a escola privada regista 548 e a escola comparticipada 1252 instituições.
A Direcção Provincial da Educação de Luanda considera que há, nesta província, 41.302 crianças fora do sistema de ensino, distribuídas pelos seguintes municípios, segundo a tabela abaixo.
CRIANÇAS FORA DO SISTEMA DE ENSINO NA PROVÍNCIA DE LUANDA
Municípios
Luanda
Belas
Números
19.432
2011
Cazenga Cacuaco
2194
5904
Viana
8113
Icolo e Bengo Quiçama
3465
183
Total
41.302
No entanto, este número não leva em consideração as crianças cujos pais não
as matricularam, neste ano, em que há uma diferença negativa de 24.852 crianças,
entre a população escolar do ensino primário e o número de matrículas efectuadas (1.125.648).
19
A taxa líquida de escolarização prevista para 2013, pelo Ministério da Educação, era
de 79,8%; no entanto, foi alcançada, segundo a mesma fonte, uma taxa de 86%.
76 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
A província de Benguela registou 474.512 matrículas (das quais 234.595 meninas) no ensino primário público, e 3906 (das quais 1969 meninas) no ensino privado, o que corresponde a uma cobertura escolar de 130,2% (bruta) e de 63,83%
(líquida), para uma população correspondente ao nível de 364.260 crianças.
Indicador
2011
2012
MED
2013
155
Bruta
CEIC
Taxa de escolaridade
(%)
140,5
140,7
139
57,6
57,7
68
MED
Líquida
CEIC
FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério da Educação.
A taxa bruta do ensino primário, depois de uma constante progressão que
reflectia a entrada das muitas crianças que estavam fora do sistema de ensino,
começa agora a assinalar um relativo decréscimo, enquanto a taxa líquida progride
cerca de 10 pontos percentuais, o que assinala uma regressão correlata ao nível do
atraso escolar que não é possível determinar com exactidão, pois não dispomos de
dados sobre as faixas etárias dos matriculados. O Ministério da Educação assinala
agora em 14% a taxa de crianças fora do sistema de ensino e regista uma situação grave de elevada taxa de atraso escolar, para a educação geral, na ordem dos
69,4%, superior à sua previsão que pretendia situá-la em pouco menos (68,8%).
No entanto, a tendência geral é de uma melhoria nos seus indicadores, mesmo
em relação às suas próprias previsões, para o ano em análise, em relação à educação geral pública. A relação entre a taxa bruta e a taxa líquida de escolaridade é
o que mais deverá interessar na análise do sistema e para os decisores públicos e,
particularmente, os altos níveis de atraso escolar. Não nos é permitido, por falta
de informação, calcular “taxas de sobrevivência”, isto é, a percentagem de alunos
que, começando num determinado nível/ano, acabarão por atingir um outro mais
avançado, previamente especificado.
4.3.2 Rendimento escolar
O rendimento escolar, no subsistema primário, pode ser medido pela diferença
do número de alunos de um nível escolar para o imediatamente seguinte. A nível
nacional, o Ministério da Educação apresenta uma taxa de aprovação de 77%, de
reprovação de 11,4% e de abandono escolar de 11,6%, o que corresponde a uma
redução, desses indicadores negativos, de cerca de metade, pois o sistema depois
da reforma apresentava índices de reprovação de 22% e de abandono escolar de
24%, respectivamente, sendo as percas do sistema, à época, de 46%, quando agora se situa em 23%.
| 77
CEIC / UCAN
Mas, esta realidade não é a mesma em todas as províncias, continuando a haver
grandes disparidades entre elas. Por exemplo, a província de Benguela tem uma
taxa de aprovação de 77,46% (sendo 74,41% no ensino público e 80,5% no ensino privado), ligeiramente superior em 0,45 pontos percentuais ao índice nacional,
mas apresenta percas do sistema de 23%, sendo a taxa de reprovação de 15,24%
(sendo 12,36% no público e 18,12% no privado) e o abandono escolar de 8,58%
(12,17% no público e 5% no privado) igualmente superiores às cifras nacionais.
Não deixa de ser interessante verificar que o ensino primário, nessa província, apresenta níveis de aprovação decrescentes consoante se avança nas classes,
indo de 87%, para a 1.a classe, a 63%, para a 6.a classe, traduzido num rendimento
médio, para o ensino primário público, de 74,6%, como ficou dito. Já o ensino primário privado regista níveis mais altos, em quase todas as classes, com excepção
da 5.a classe, onde se dá um verdadeiro desastre que se traduz num rendimento
negativo de 43%, quando as demais classes registam todas níveis iguais ou superiores a 84% (como é o caso da 4.a classe). Maior ainda é a estranheza em relação
aos resultados da 5.a classe, no ensino privado, quando a mesma classe, no ensino
público, regista um dos seus melhores níveis, com 85% de aprovação.
Angola
Matriculados
Luanda
Aprovação
Reprovação
58.681
62.723
474.512
1.125.648
598.894
588.568
5.162.879
3.975.417
RENDIMENTO ESCOLAR
Benguela
Cuando Cubango
Abandono
FONTE: CEIC-UCAN a partir de dados do Ministério da Educação e Direcções Provinciais da Educação.
4.3.3 Abandono escolar
A taxa de abandono escolar, segundo a avaliação feita em algumas províncias,
depois da reforma escolar, tem registado valores estacionários devido a factores
exógenos ao sistema educativo, mas que influenciam fortemente o comportamento
78 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
das crianças e a sua permanência na escola. No entanto, em 2013, parece haver
algum progresso pois o Ministério da Educação assinala, para todo o sistema de
educação geral (isto é, primário e secundário) níveis de abandono escolar de 11,6%
e de repetência de 23%, a nível nacional, quando em 2010 se assinalava 24%.
Continua actual a necessidade de investir mais nas áreas como o transporte
escolar, o reforço da merenda escolar, a saúde escolar, o desporto e as actividades
de tempos livres para tornar a escola mais atractiva para as crianças e para as famílias, invertendo deste modo o quadro actual.
4.3.4 Evolução do corpo docente
O corpo docente, em 2013, para o ensino primário, regista 152.657 professores, que corresponde a um acréscimo de 13.498 e a um crescimento relativo de
9,7% em relação ao ano anterior. Não há ainda informação suficiente para avaliar
o impacto do Plano Mestre de Formação de Professores (PMFP), estabelecido em
consequência da reforma educativa (2002-2012), cujo objectivo é melhorar a capacidade pedagógica, metodológica e académica dos professores, supervisores e formadores. O que se tem como certo é que apesar do recrutamento constante, a
capacitação e a valorização de professores, demonstrado pela taxa média de crescimento de docentes, estes são ainda insuficientes, mesmo porque muitos deles
são de baixa qualidade académica e pedagógica e outros têm dificuldades na sua
colocação e sedentarização, nomeadamente nas áreas rurais e periurbanas. Para
além do facto de haver descontinuidades na contratação, integração e requalificação de professores.
sK>hKKKZWKKEdKE^/EKWZ/DZ/KΈϮϬϬϮͳϮϬϭϯΉ
Ano
ĨĞĐƟǀŽƐ
Novos docentes
Taxa de crescimento
2002
83.601
7472
9,81%
2003
112.785
29.184
34,91%
2004
113.785
1000
0,89%
2005
130.128
16.343
14,36%
2006
150.758
20.630
15,85%
2007
167.989
17.231
11,43%
2008
106.940
9079
8,49%
2009
121.206
14.266
13,34%
2010
125.290
4084
3,36%
2011
133.469
8179
6,5%
2012
139.159
5690
4,26%
2013
152.657
13.498
9,7%
FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério da Educação (Evolução da Educação e Ensino em Angola).
| 79
CEIC / UCAN
Depois de uma regressão de cerca de 2,5 pontos percentuais, no ano anterior,
este ano (2013) o corpo docente, do ensino primário, registou uma progressão de
9,7%, correspondendo a 13.498 novos professores recrutados, quer dos que saíram das escolas de formação de professores, quer de outras formações.
4.3.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares
O ensino primário, juntamente com a iniciação, registaram uma evolução em
infra-estruturas que se cifrou num total de 56.252 salas de aulas. Apesar de terem
sido construídas mais 3379 novas salas de aulas, correspondendo a uma progressão de cerca de 6,3%, em relação ao ano anterior, a relação de 120 alunos por sala
continua a ser preocupante.
EVOLUÇÃO DAS INFRA-ESTRUTURAS
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
Salas de aulas
2009
2010
2011
Novas Salas
2012
Progressão%
2013
4.4 Ensino secundário
Os indicadores nacionais da educação mostram o quanto o sistema de ensino
sofre de um estrangulamento na passagem do ensino primário para este nível subsequente. O ensino secundário está repartido por um 1.o Ciclo (com uma duração
de 3 anos: 7.a, 8.a e 9.a classes), um 2.o Ciclo normal (com uma duração de 3 anos:
10.a, 11.a e 12.a classes)20 ou ainda 2.o Ciclo técnico ou de formação de professores (ambos com uma duração de 4 anos: 10.a, 11.a, 12.a e 13.a classes). O ensino
secundário está concentrado nas zonas urbanas e tem uma fraca frequência nas
zonas rurais.
20 Lei de Bases do Sistema de Educação (Lei 13/01), Artigos 19.o e 33.o, 1 e 2.
80 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
4.4.1 Cobertura escolar
A cobertura escolar, ao nível do ensino secundário, é feita quase exclusivamente pelo ensino público. A presença de agentes privados é quase insignificante na
maior parte do território e concentra-se sobretudo na capital e faixa litoral. Os
demais agentes são as escolas secundárias das igrejas, nomeadamente da Igreja
Católica, que não somente tem um sistema de ensino próprio como assume a gestão de muitos estabelecimentos do Estado.
Em 2013, foram matriculados, no ensino secundário, 1.015.896 estudantes
(sendo 685.265 do 1.o Ciclo e 330.631 do 2.o Ciclo), para uma população correspondente ao nível de 2.961.000, o que equivale a uma cobertura bruta de 34,3%
e líquida de 30,7%, considerando um atraso escolar de 10,4%, já que o Ministério da Educação considera um atraso escolar geral (ensino primário e secundário)
de 69,4% e o IBEP assinalou um atraso escolar de 59% para o ensino primário. Se considerarmos uma população correspondente ao nível de 2.717.790 que
é a considerada pelo Ministério da Educação (sendo de 1.451.505 do 1.o Ciclo
e de 1.266.285 do 2.o Ciclo), teremos uma cobertura bruta de 37,4% e líquida
de 33,5%.
Meta para 2013
ĨĞĐƟǀŽƐϮϬϭϯ
1.o Ciclo
706.791
685.265,00
2.o
407.251
330.631,00
Ensino Secundário, 1.o Ciclo
86.101
83.605,00
Ensino Secundário, 2.o Ciclo
35.692
42.044,00
4808
4686,00
3332
2924,00
48,70%
47,20%
32,20%
26,10%
Escolas a construir no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos)
19
19,00
Escolas a reabilitar no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos)
5
3,00
Indicadores nacionais do ensino secundário
Matrículas
Ciclo
N.o de professores por níveis de ensino
Número de sala de aulas
Ensino secundário, 1.o Ciclo
Ensino secundário,
2.o
Ciclo
Taxa Bruta de Escolaridade
Ensino Secundário, 1.o Ciclo
Ensino Secundário,
2.o
Ciclo
Infra-estruturas e equipamentos escolares
As matrículas no ensino secundário são uma consequência particular do atraso
escolar e do fraco rendimento no subsistema anterior. Estas matrículas são desiguais nas diversas províncias e concentram-se sobretudo no litoral, nas duas principais províncias: Luanda e Benguela, como se pode ver no gráfico seguinte.
| 81
CEIC / UCAN
MATRÍCULAS NO ENSINO SECUNDÁRIO
700.000
600.000
500.000
400.000
300.000
200.000
100.000
0
Angola
1.o Ciclo
Luanda
2.o Ciclo
Benguela
Cuando Cubango
Médio/Técnico
Luanda concentra cerca de um terço dos estudantes do 1.o Ciclo e mais de
metade dos estudantes do 2.o Ciclo do secundário. O gráfico acima mostra também que o ensino secundário apresenta uma taxa de escolarização muito baixa,
quer no 1.o Ciclo (47,2%), quer no 2.o Ciclo (26,1%).
4.4.2 Rendimento escolar
O rendimento escolar no secundário, a nível nacional, não é determinável por
falta de informação, sendo que o Ministério da Educação considera uma taxa de
aproveitamento, no ensino geral, de 77% e uma taxa de reprovação de 11,4%. No
entanto, tomando a província de Benguela como exemplo, podemos dizer que
os níveis de aproveitamento se situam em 65%, sendo, para o 1.o Ciclo, 64,1% e,
para o 2.o Ciclo, 67,7%. Os níveis de reprovação são de 23%, sendo de 24,4%, para
o 1.o Ciclo e de 19,32%, para o 2.o Ciclo. Quer uma taxa, quer outra, são inferiores às respectivas taxas para o ensino geral. A taxa de aprovação desce um pouco
quando se considera apenas o sexo feminino, pois que de um conjunto de 75.872
matrículas, 48.370 obtêm aprovação, o que corresponde a uma taxa de aprovação de 63,8%, sendo 62,8% para o 1.o Ciclo e 66,34% para o 2.o Ciclo. O ensino
público (55,70%) apresenta níveis de aprovação mais baixos que o ensino privado
(71,23%).
82 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
ENSINO SECUNDÁRIO EM BENGUELA
Matrículas
Nível
Aprovados
Reprovados
Regime
MF
F
MF
ĞƐŝƐƟĚŽƐ
F
MF
F
MF
F
Público
1.o
Privado
Ciclo
Total
109.477
53.855
69.877
33.529
26.927
13.669
12.673
6657
2985
1501
2218
1136
468
208
299
157
112.462
55.365
72.095
34.765
27.395
13.877
12.972
6814
Público
35.057
16.300
23.576
10.629
6787
3348
3325
1402
2.o
Privado
Ciclo
Total
6959
4207
4866
2976
1129
787
964
444
42.016
20.507
28.442
13.605
8116
4135
4289
1846
TOTAL
154.478
75.872
100.537
48.370
35.511
18.012
17.261
8660
Neste exemplo, podemos observar uma queda constante nos níveis de aproveitamento que regista 64% para o 1.o Ciclo do secundário público (no privado são
74%) e 48% para o 2.o Ciclo do secundário público (no privado são 70%).
RENDIMENTO ESCOLAR
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
0
MF
F
MATRÍCULAS
1.o Ciclo Público
1.o Ciclo Privado
MF
F
APROVADOS
1.o Ciclo Total
2.o Ciclo Público
MF
F
REPROVADOS
2.o Ciclo Privado
2.o Ciclo Total
4.4.3 Abandono escolar
O sistema de educação nacional, às perdas da reprovação, junta a desistência que atinge, nos dois níveis, 11,17%, sendo 11,53%, no 1.o Ciclo e 10,21% no
2.o Ciclo. O ensino privado apresenta um maior índice de abandono (12,7%) que
o ensino público (11%). Na relação de género, o sexo feminino (50,17%) tem um
nível de abandono ligeiramente maior.
| 83
CEIC / UCAN
ABANDONO ESCOLAR
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
0
Público
Privado
Total
Público
1.o Ciclo
DĂƚƌşĐƵůĂƐD&
Privado
Total
2.o Ciclo
DĂƚƌşĐƵůĂƐ&
ĞƐŝƐƟĚŽƐD&
ĞƐŝƐƟĚŽƐ&
4.4.4 Evolução do corpo docente
Em relação ao corpo docente do ensino secundário, em 2013, há a assinalar
um total de 125.649 professores (sendo 83.605 para o 1.° Ciclo e 42.044 para o
2.° Ciclo).
DOCENTES DO ENSINO SECUNDÁRIO
90.000
80.000
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
2008
2009
Efectivos 1.o Ciclo
84 |
2010
2011
2012
2013
Novos docentes
Ano
ĨĞĐƟǀŽƐϭ͘o Ciclo
Novos docentes
Taxa de crescimento
2008
52.077
2067
3,97
2009
59.024
6947
13,34
2010
60.689
1665
2,8
2011
67.086
6397
10,54
2012
71.415
4329
6,45
2013
83.605
12.190
17
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
4.4.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares
Em relação às infra-estruturas, foram construídos mais 19 edifícios escolares,
havendo agora um total de 7610 salas de aulas (sendo 4686 para o 1.o Ciclo e 2924
para o 2.o Ciclo).
REABILITAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE ESCOLAS
19,00
3,00
III
19,00
3,00
II
19,00
3,00
I
19,00
3,00
Met 2013
17,00
5,00
Trimestre
IV
Escolas a construir no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos)
Escolas a reabilitar no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos)
4.5 Educação para adultos
No quadro do desenvolvimento das políticas educativas, em 2013, foi formulado e implementado o Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar (PAAE),
bem como criada a Comissão Nacional de Alfabetização, como um mecanismo de
articulação entre os diferentes departamentos ministeriais e a sociedade civil para
tratar da questão da alfabetização.
A taxa de analfabetismo, no país, está calculada em cerca de 30% da população
angolana, que se estima em 21 milhões de habitantes segundo as projecções do
INE, o que quer dizer cerca 6,3 milhões de adultos.
Segundo o Ministério da Educação21, em 2013, resultado da acção conjugada
do Estado e de parceiros sociais, para lá da sua própria previsão de 584.050, foram
matriculados na alfabetização 636.387 adultos22. O que se traduz numa progressão bruta de 58.120 efectivos no programa de alfabetização, nos três módulos e no
programa “Sim Eu Posso”, como se pode ver na tabela seguinte.
21 Comissão para a Política Social do Conselho de Ministros, “Mapa de Monitoria e Ava-
liação dos Indicadores do Sector Social”.
22
Não sei por que razão foi referido pela Direcção Nacional de Educação de Adultos,
durante o Conselho Consultivo do Ministério da Educação (Saurimo, 19 a 21 de Março
de 2014) que, em 2013, foram alfabetizados, em todo o território nacional, 990.203
jovens e adultos, por um corpo de alfabetizadores estimado em 15.600.
| 85
CEIC / UCAN
EVOLUÇÃO DOS EFECTIVOS DA ALFABETIZAÇÃO
(2009-2013)
2009
2010
2011
2012
2013
532.491
532.943
561.424
578.267
636.387
-
(+0,08%)
(+5,3%)
(+3%)
(+10%)
FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério da Educação.
Em Luanda, que conta com 3228 alfabetizadores e 2386 alfabetizadoras, foram
alfabetizados 260.550 adultos (sendo 64.312 homens e 196.238 mulheres).
Angola
Matrículas MF
Luanda
Benguela
636.387
133.691
Matrículas F
85.141
Aprovados MF
260.550
103.838
Aprovados F
196.238
66.892
Reprovados MF
14.695
Reprovados F
8818
Abandono MF
15.158
Abandono F
9431
ůĨĂďĞƟnjĂĚŽƌĞƐ
5614
Já em províncias como Benguela, foram matriculados na alfabetização 133.691
adultos, tendo sido alfabetizados 103.838 adultos (dos quais 66.892 mulheres).
A tabela abaixo mostra claramente uma forte implicação das mulheres neste programa, embora aparentemente sejam também as mulheres as que mais o abandonam.
ALFABETIZAÇÃO EM BENGUELA EM 2013
Matrículas
Aprovação
Reprovação
Abandono
MF
F
MF
F
MF
F
MF
F
SIM EU POSSO
43.710
30.328
34.607
24.559
5281
3160
3822
2609
MÓDULO 1
37.330
26.584
26.228
19.056
4367
3146
6735
4380
MÓDULO 2
18.143
10.080
13.942
7842
2223
1213
1978
1025
MÓDULO 3
34.508
18.149
29.061
15.435
2824
1297
2623
1417
TOTAL
133.691
85.141
103.838
66.892
14.695
8818
15.158
9431
Em termos de rendimento da alfabetização pode-se notar uma prevalência das
mulheres, como está expresso no gráfico seguinte.
86 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
TAXA DE APROVAÇÃO NO PROGRAMA DE ALFABETIZAÇÃO
E ACELERAÇÃO ESCOLAR
85
83
Módulo 3
78
76
Módulo 2
72
Módulo 1
67
81
Sim eu posso
75
&ĞŵŝŶŝŶŽ
Masculino
4.6 Ensino especial
O ensino especial registou 26.651 matrículas, em 2013. Há pouca informação
sobre o ensino especial no país todo. No entanto, o caso de Benguela pode ser ilustrativo, como se vê no gráfico abaixo.
NÚMERO DE ALUNOS MATRICULADOS NO ENSINO ESPECIAL
149
116
112
95
67
64
50
44
In
ici
aç
ão
1. a
Cl
as
se
2. a
Cl
as
se
3. a
Cl
as
se
4. a
Cl
as
se
5. a
Cl
as
se
6. a
Cl
as
se
7. a
Cl
as
se
8. a
Cl
as
se
9. a
Cl
as
se
48
98
4.7 Manuais e merenda escolar
É sabido que os níveis de aproveitamento e de desistência estão também associados ao facto de os alunos disporem de boas condições de estudo contando
nomeadamente com manuais para estudar, quer no acompanhamento das aulas,
quer no estudo complementar em casa. No entanto, como se pode ver no gráfico
seguinte, os manuais não foram todos produzidos (previa-se editar 48.305.387) e
dos que o foram (46.790.200), apenas 93,6% foram distribuídos (43.790.200), no
4.o trimestre do ano, pois no 1.o trimestre do ano, altura em que se devia fazer a
distribuição de todos os manuais, apenas foram distribuídos 9.706.743 manuais
dos então 40.025.892 produzidos, por falta de transporte.
| 87
CEIC / UCAN
MANUAIS EM 2013
43.790.200,00
46.787.387,00
Trimestre
IV
42.770.380,00
45.777.387,00
III
37.000.025,00
42.523.067,00
II
9.706.743,00
I
40.025.892,00
42.523.067,00
48.305.387,00
Met 2013
Manuais distribuídos
Produção dos manuais
Outro factor que contribui para o bom desempenho escolar das crianças é a
merenda escolar, no entanto, apesar deste programa ser de âmbito nacional e ter
como propósito combater o insucesso escolar, proporcionando às crianças escolarizadas condições nutricionais melhoradas, o mesmo não tem merecido a melhor
atenção das autoridades públicas (agora sob gestão das administrações municipais, segundo DP 138/13, de 24 de Setembro) e continua a registar números irrisórios para o conjunto da população estudantil.
4.8 Ensino superior
O ensino superior continua a ser, manifestamente, uma das apostas do Executivo angolano e, ao mesmo tempo, um dos centros das preocupações da sociedade, das famílias, dos partidos políticos, das igrejas e da mídia. Essa dupla condição
reflecte, de modo fiel, o paradoxo que paira sobre esse subsistema de ensino. Se,
por um lado, é inegável o seu processo de franca evolução, visível sobretudo no
que toca à expansão da rede de Instituições de Ensino Superior (IES) por todo o
país23, por outro, é cada vez mais perceptível que tal crescimento se vem fazendo,
sob diversos aspectos, em prejuízo da devida atenção a ser conferida à qualidade
de ensino e, com efeito, à dimensão estratégica da qualificação superior para a
23
Actualmente, o país conta, no activo, com 17 universidades (10 das quais privadas),
19 institutos superiores autónomos (sendo 12 privados) e 3 escolas superiores autónomas (todas públicas). O que corresponde a 43,6% de instituições públicas e 56,4%
de instituições privadas. Contudo, é preciso referir que a distribuição dessas institui­Ù‡•’‡Žƒ‰‡‘‰”ƒϐ‹ƒƒ…‹‘ƒŽƒ‹†ƒ•‡ƒ’”‡•‡–ƒ ‘•‡—…Žƒ”‘†‡•‡“—‹ŽÀ„”‹‘ǡŒž“—‡
só Luanda concentra 62,5% das universidades e cerca de 30, 76% dos institutos autónomos.
88 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
economia, a cidadania e cultura nacionais24. Quanto mais se dilata a oferta pública
e privada, mais parecem tornar-se óbvias as distorções no que concerne ao atendimento dos padrões médios de exigência académica e científica.
Não é difícil de notar e reconhecer, como aliás vem sendo assinalado por diferentes autores25, que grande parte do insucesso que se regista no ensino superior
advém dos subsistemas anteriores, responsáveis que são pela formação deficitária dos jovens ingressantes. Pois, a qualidade de um nível de ensino depende da
qualidade anterior do nível abaixo dele e com o qual tem uma ligação umbilical.
No entanto, existem e persistem insuficiências inerentes ao próprio subsistema de
ensino superior, quer ao nível da legislação e da implementação de políticas e programas, quer do funcionamento interno das IES, as quais, em alguns casos, funcionam de modo ilegal26 ou não revelam idoneidade suficientemente para o exercício
da missão a que se propõem, embora lhes seja mantido o reconhecimento legal
(ou oficioso, em alguns casos) sem sequer terem sido alvos de inspecção e avaliação por parte do órgão de tutela, no caso o Ministério do Ensino Superior27.
Aliás, a questão da qualidade de ensino, um dos principais problemas do subsistema do ensino superior angolano hoje, é a área na qual o Ministério do Ensino
Superior encontra as suas maiores dificuldades, no quadro das políticas de desenvolvimento e reforma do ensino superior. Até então, ao que se constata, esse subsistema não dispõe de indicadores gerais claros com os quais se possa mesurar a
24 Ao referir-se ao ensino superior, um relatório sobre o sector privado em Angola chega
à seguinte conclusão: “Apesar do acesso à educação ter melhorado nos últimos anos, a
qualidade permanece uma preocupação” (Estefanía Jover, et. al., Angola – Private Sector
‘—–”›”‘ϔ‹Ž‡, Dezembro de 2012). Para uma abordagem crítica sobre o assunto, Cf.
Paulo de Carvalho, “Evolução e crescimento do ensino superior em Angola”, in Revista
Angolana de Sociologia, n.o 9, Mangalde: Edições Pegado, pp. 21-59, 2012.
25ˆǤǡ‡–”‡‘—–”‘•ǡŽ‹œƒ„‡–Š‡‹–ƒ‡”ƒ”—œǡDz•†‡•ƒϐ‹‘•†‘‡•‹‘•—’‡”‹‘”‡‰‘ŽƒǤ
O lugar e o papel das ciências sociais na construção do país e do futuro dos angolanos”,
in Revista Angolana de Sociologia, n.o 1, Mangalde: Edições Pegado, pp. 85-92, 2008.
26
Excepção digna de nota é a do caso da denominada Universidade Deolinda Rodrigues, no Bié, que chegou mesmo a ser encerrada em 2012 pelo governo da província. Cf.
ANGOP. Disponível em: http://www.portalangop.co.ao. Acessado em Outubro de 2013.
27
A este propósito, uma das questões mais suscitadas é a do carácter meramente
comercial de algumas instituições privadas, revelado, por exemplo, quer na cobrança
†‡’”‘’‹ƒ•ƒ…‹ƒ†‘•˜ƒŽ‘”‡•’”‡˜‹ƒ‡–‡ϐ‹šƒ†‘•ƒ”‡•’‡…–‹˜ƒ’”‘’‘•–ƒ†‡ƒ…”‡†‹–ƒção, quer na abertura de novos cursos, com o consequente aumento da oferta de vagas e
turmas, sem a devida autorização do órgão de tutela. Cf. Alfredo Buza e Jitenga Alberto,
“Políticas públicas de desenvolvimento e de reforma do ensino superior no contexto da
República de Angola”, comunicação apresentada na 2.a Conferência do FORGES – Fórum
da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa – 6, 7 e 8 de
Novembro de 2012, Macau, p. 12.
| 89
CEIC / UCAN
qualidade do ensino oferecido pelos diversos cursos das IES. Não sabemos, portanto, qual a variabilidade – ritmo de crescimento e queda – dos índices da qualidade
do ensino superior até à data presente. Na verdade, a rigor, não se pode sequer
falar em qualidade no ensino superior, posto que a ausência de um Sistema de
Avaliação do Ensino Superior28 não permite haver dados objectivos, quer sobre o
desempenho dos estudantes, quer sobre o desempenho das IES.
Neste sentido, 2013 foi um ano marcante, na medida em que veio não só revelar uma tendência de crescimento quantitativo acima das metas preconizadas, mas
também alertar para a ingente necessidade de uma maior aposta nas infra-estruturas académicas, na pesquisa científica, na avaliação interna e externa do desempenho dos estudantes e das instituições, na qualificação pedagógica e científica do
quadro docente, na democratização dos processos de gestão e decisão académica,
dentre outros muitos aspectos que concorrem para a melhoria da qualidade de
ensino e da eficiência do subsistema29. O desenvolvimento sustentado do ensino
superior depende do investimento equilibrado na expansão da cobertura da rede
e na qualidade do ensino, da pesquisa científica e da extensão, contrariamente à
visão política oficial que tende a encarar o crescimento qualitativo como uma realidade subsequente e não paralela ao crescimento quantitativo.
4.8.1 O crescimento e suas implicações
Em 2013, o subsistema do ensino superior foi uma das áreas do sector social
que mais cresceu, fruto do significativo alargamento, que já mostra consolidar-se
a partir de 2009, da oferta pública e privada pelas 18 províncias do país. O crescimento operou-se não só com o aumento do orçamento alocado às universidades
públicas (de 11.758.988.134,00 Kz em 2012 para 20.582.665.112,00 Kz em 2013),
do número de empregos directos (de 12.761 em 2012 para 13.825 em 2013), de
pessoal não docente (de 143 em 2012 para 1116 em 2013), de vagas disponíveis
(de 31.000 em 2012 para 32.240 em 2013), de bolsas de estudo internas e externas
(6000/800 em 2012 para 6464/1200 em 2013) e de graduados30. Ele deu-se também,
28
Espera-se, no entanto, que os empecilhos que até então emperravam a entrada em
funcionamento do Instituto Nacional de Avaliação e Acreditação (INAA) estejam já
superados.
29
Esse imperativo chegou a ser reconhecido pelo próprio Presidente da República, ao
mencionar a “melhoria clara da qualidade do ensino” como a principal prioridade do
executivo angolano para o ensino superior. José Eduardo dos Santos, Mensagem sobre
o Estado da Nação, Proferida na Abertura da II Sessão Legislativa da III Legislatura da
Assembleia Nacional, Luanda 15 de Outubro de 2013, p. 6.
30•†ƒ†‘•‘ϐ‹…‹ƒ‹•ƒ’‘–ƒ’ƒ”ƒͺ͵͵Ͳ‘ï‡”‘†‡’‘••À˜‡‹•‰”ƒ†—ƒ†‘•‡ʹͲͳ͵ǡ—
total de 90 cursos ministrados em todo o país. No entanto, esses dados são relativos a apenas
52,77% das IES que remeteram a informação solicitada pelo Ministério do Ensino Superior.
90 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
e com maior visibilidade e impacto, com o aumento exponencial do número de
matrículas registadas e com o aumento considerável do número de docentes.
A grandeza desse crescimento será mais bem mensurada, certamente, se se levar
em consideração, antes de mais, as metas previstas para 2013 no Plano Nacional de
Desenvolvimento 2013-2017 (PND)31, documento que resulta do programa de governo do partido no poder sufragado nas últimas eleições de 2012. Deve ainda ser tido
em conta, por conseguinte, as dinâmicas do crescimento demográfico e socioeconómico, as quais, não raro, exigem a revisão das referidas estimativas em função das
pressões que exercem sobre toda a cadeia do sistema de ensino, incluindo o seu topo.
4.8.1.1 O crescimento do número de estudantes
Em termos globais, o número de matrículas efectuadas situou-se em 218.678, ou
seja, 16,7 pontos percentuais acima do estimado (182.250)32. A taxa de crescimento
anual foi de 31,4%. Houve, assim, um crescimento em mais de um terço de estudantes matriculados em IES em relação ao ano de 2012, que contou com 150.000 matrículas, o que se traduz em apenas 7,1% a mais do alcançado no ano anterior.
EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE MATRÍCULAS NO ENSINO SUPERIOR
2009-201333
2009
N.o
2010
%
N.o
2011
%
98.777 +12,3 107.039 +8,4
N.o
2012
%
N.o
2013
%
N.o
%
140.016 +30,8 150.000 +7,1 218.678 +31,4
Média de
Crescimento
Global
FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e no MPDT, 2012-2013.
18%
33
Trata-se, como bem ilustra o gráfico seguinte, do maior aumento nos cinco últimos anos, fixando-se perto da meta estabelecida para 2014, que é de 221.43434.
E a manter-se tal ritmo ascendente, tudo indica que, em menos de três anos, serão
atingidas as metas previstas para os próximos quatro anos35 em termos de crescimento global de matrículas, o que, por si só, entretanto, não deve constituir motivo de plena satisfação. Para que se torne sustentável, esse crescimento deve ser
31
Ministério da Administração do Território, Plano Nacional de Desenvolvimento
2013-2017, Luanda: Dezembro de 2012.
32 Id. Ibid., p. 119.
33 Os dados referentes a 2009, 2010 e 2011 incluem as IES privadas que estavam a fun-
…‹‘ƒ”‹Ž‡‰ƒŽ‡–‡Ǥ‡•‘•‡˜‡”‹ϐ‹…ƒƒ•–ƒ„‡Žƒ••‡‰—‹–‡•Ǥ
34 Id. Ibid., p. 119.
35 Ou seja, até 2007, ano limite de execução do Plano Nacional de Desenvolvimento.
| 91
CEIC / UCAN
acompanhado do correspondente incremento de recursos humanos (sobretudo
docentes), salas de aula, equipamentos (laboratórios, bibliotecas, oficinas, etc.)
e outros meios, implicando, desse modo, a recontextualização da planificação do
crescimento de todo o subsistema.
CRESCIMENTO REAL E ESTIMADO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS NO ENSINO SUPERIOR
2009-2014
250.000
200.000
150.000
100.000
50.000
0
2009
2010
2011
2012
2013
2014
ƌĞƐĐŝŵĞŶƚŽĞƐƟŵĂĚŽ
Crescimento real
FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e no MPDT, 2012-2013.
No que respeita à relação entre público e privado, verifica-se que 60,2% do
total de matrículas em 2013 corresponde à população discente do ensino superior privado, ao passo que 39,8% aos estudantes da rede pública. Esse crescimento
desigual vem acentuando-se desde 2010, ano em que as IES privadas já contavam
com quase 55% do número de estudantes do ensino superior, quando em relação
às instituições públicas se verificou um decréscimo da média anual de crescimento.
EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE MATRÍCULAS NA REDE PÚBLICA
E NA REDE PRIVADA DE ENSINO SUPERIOR 2009-2013
2009
Rede Pública
Média Anual de
Crescimento
Rede Privada
Média Anual de
Crescimento
2010
N.o
%
48.380
49
–2,5%
50.397
31,4%
N.o
N.o
%
48.242 45,1 67.183
–0,3%
51
201236
2011
48
-
39,3%
58.797 54,9 72.833
16,7%
FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e no MPDT, 2012-2013.
%
N.o
23,9%
%
%
-
86.918
39,8%
52
-
-
-
2013
N.o
131.760 60,2%
-
36
36 A ausência, em diferentes tabelas, de dados relativos ao número de estudantes no ano
de 2012 constitui uma lacuna relevante. Contudo, como se pode perceber ao longo da
‡š’‘•‹­ ‘ǡ‡••‡ˆƒ…–‘ǡ“—‡”‡•—Ž–ƒ†ƒ‹†‹•’‘‹„‹Ž‹†ƒ†‡†‡†ƒ†‘•‘ϐ‹…‹ƒ‹•ǡ ‘†‡•‡”‡…‡
a perspectiva conjuntural da análise.
92 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Com efeito, no ensino superior público, o crescimento do acesso, que, a despeito
das estimativas oficiais, se anunciava muito mais elevado em função, principalmente, do surgimento das novas 6 universidades públicas37, para além da Universidade
Agostinho Neto, dos institutos38 e das escolas39 superiores autónomas no âmbito da
criação das 7 regiões académicas40 que configuram o actual mapa académico angolano, revelou taxas relativamente modestas. Acredita-se que o mesmo se deva, dentre
outras razões, ao facto de, até à data da sua existência legal, muitas dessas instituições
(institutos e unidades orgânicas) não terem ainda instalações disponíveis, ficando a
sua entrada em funcionamento adiada até aqui. Assim são os casos de seis (37,5%)
dos 16 institutos autónomos públicos criados, que são: Instituto Nacional de Petróleos (no Kwanza Sul), do Instituto Superior Politécnico, do Instituto Superior Pedagógico
e do Instituto Superior de Tecnologia Agro-Alimentar (em Malanje), do Instituto Superior de Pescas (no Namibe) e do Instituto Superior de Ciências da Saúde (no Uíge).
Também aguardam por infra-estruturas cinco (9,8%) das 51 unidades orgânicas das
7 universidades públicas existentes, nomeadamente: Escola Superior de Hotelaria e
Turismo e Instituto Superior Politécnico (ambos da Universidade Agostinho Neto),
Faculdade de Agronomia e Faculdade de Medicina Veterinária (ambas da Universidade Lueji-a-Nkonda) e Faculdade de Economia (da Universidade Kimpa Vita).
Na tabela que se segue, observa-se que a Universidade Agostinho Neto apresenta uma diminuição de 15,4% no total de estudantes matriculados no ensino
37
Universidade 11 de Novembro, Universidade José Eduardo dos Santos, Universidade
Katyavala Buila, Universidade Kimpa Vita, Universidade Lueji-a-Nkonda e Universidade
Mandume ya Ndemofayo.
38 Em funcionamento são: Instituto Superior de Ciências de Educação da Huíla, Instituto
Superior de Ciências de Educação de Luanda, Instituto Superior de Ciências de Educação do Huambo, Instituto Superior de Serviço Social, Instituto Superior de Tecnologia de Informação e Comunicação, Instituto Superior Politécnico de Malanje e Instituto
Superior Politécnico do Kwanza Sul.
39 As três escolas criadas estão no activo neste momento, designadamente: Escola Supe-
rior Pedagógica do Kwanza Norte, Escola Superior Pedagógica do Bengo e Escola Superior Pedagógica do Bié.
40
Cada região académica compreende uma delimitação territorial que compreende de
duas a quatro províncias: região académica I (Luanda e Bengo), região académica II
(Benguela e Kwanza Sul), região académica III (Cabinda e Zaire), região académica IV
(Lunda Norte, Lunda Sul e Malanje), região académica V (Huambo, Bié e Moxico), região
académica VI (Huíla, Namibe, Cuando Cubango e Cunene) e região académica VII (Uíge
e Kwanza Norte). Ver Decreto n.o 5/09, de 7 de Abril de 2009, publicado no Diário da
República I Série, N.o 64 – Estabelece a criação das regiões académicas que delimitam o
âmbito territorial de actuação e expansão das instituições de ensino superior. Nota-se
que este Decreto surge, como de resto alude o seu preâmbulo, em conformidade com
o previsto na Resolução n.o 4/07, de 2 de Fevereiro, publicado no Diário da República,
I Série, N.o 15 – Aprova as Linhas Mestras para a Melhoria da Gestão do Subsistema do
Ensino Superior (particularmente o previsto na Linha Mestra K).
| 93
CEIC / UCAN
público, alcançando somente 26% em 2013, dos 51,1% em 2009. Ainda assim, dentre todas (públicas e privadas), é a instituição que mais cresceu ao longo dos cinco
anos, e o seu decréscimo foi como que compensado no interior da rede pública
pelo aumento de matrículas nas novas universidades: Universidade Mandume ya
Ndemofayo (de 3,1% em 2009 a 9,6% em 2013), Universidade José Eduardo dos
Santos (de 5,0% em 2009 para 9,3% em 2013), Universidade 11 de Novembro (de
6,6% em 2009 para 8,6% em 2013), da Universidade Lueji-a-Nkonda (de 4,0% em
2009 para 8,1% em 2013), Universidade Katyavala Buila (de 4,6% em 2009 para
8,0% em 2013) e Universidade Kimpa Vita (de 2,7% em 2011 para 5,2% em 2013).
EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS EM INSTITUIÇÕES PÚBLICAS DE ENSINO
SUPERIOR 2009-2013
/ŶƐƟƚƵŝĕĆŽ
Ano
2009
2010
2011
2012
2013
Escola Superior Pedagógica do Kwanza Norte
944
1544
2129
-
Escola Superior Pedagógica do Bengo
392
793
1093
-
899
Escola Superior Pedagógica do Bié
663
683
1052
-
1581
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌĚĞŝġŶĐŝĂƐĚĞĚƵĐĂĕĆŽĚĂ,ƵşůĂ
3594
3922
4656
-
5901
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌĚĞŝġŶĐŝĂƐĚĞĚƵĐĂĕĆŽĚĞ>ƵĂŶĚĂ
2356
2864
2619
-
2046
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌĚĞŝġŶĐŝĂƐĚĞĚƵĐĂĕĆŽĚŽ,ƵĂŵďŽ
2203
1819
2532
-
2615
265
705
-
1321
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌĚĞ^ĞƌǀŝĕŽ^ŽĐŝĂů
3292
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌĚĞdĞĐŶŽůŽŐŝĂĚĞ/ŶĨŽƌŵĂĕĆŽĞ
Comunicação
-
-
-
-
537
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĞDĂůĂŶũĞ
-
-
-
-
1671
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚŽ<ǁĂŶnjĂ^Ƶů
Universidade 11 de Novembro
hŶŝǀĞƌƐŝĚĂĚĞŐŽƐƟŶŚŽEĞƚŽ
329
465
954
-
1746
3074
2943
4207
-
7497
24.712 19.585 20.536
- 22.660
Universidade José Eduardo dos Santos
2308
3203
4771
-
8120
Universidade Katyavala Buila
2160
2772
6063
-
6978
Universidade Kimpa Vita
Universidade Lueji-a-Nkonda41
Universidade Mandume ya Ndemofayo
Total
-
-
1769
-
4588
1864
2566
6020
-
7105
1468
2191
5380
-
46.067 45.617 64.486
8361
86.918
FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e do MESCT, 2012-2013.41
Já na próxima tabela, é possível notar que a Universidade Jean Piaget, uma das
instituições privadas mais antigas do país42, mantém, desde 2009, o maior número
41 Agregados os números de matrículas da Escola Superior Pedagógica da Lunda Norte
e da Escola Superior Politécnica da Lunda Sul.
42
Criada em 2001, 9 anos após a criação da primeira instituição privada em Angola, a
Universidade Católica de Angola.
94 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
de matrículas: actualmente possui 10,6% dos estudantes da rede privada e 6,3%
do total dos estudantes do ensino superior. A seguir, apresentam ainda um crescimento considerável no quadro da rede privada as seguintes instituições: Universidade Técnica de Angola (com 7,5%), Universidade Metodista de Angola (com
6,4%), Universidade Independente de Angola (com 6,2%), Universidade Gregório
Semedo (com 5,1%) e Instituto Superior Politécnico Metropolitano (com 4,6%). Por
seu turno – e contrariamente à tendência geral –, outras instituições registam uma
diminuição no número de estudantes durante o quinquénio, como são os casos da
Universidade Privada de Angola (de 4871 em 2009 para 3003 em 2013), do Instituto Superior de Ciências Sociais e Relações Internacionais (de 3316 em 2010 para
3111 em 2013) e da Universidade Lusíada de Angola (de 5089 em 2009 para 5065
em 2013). Mas, à semelhança do que se verificou em relação ao ensino público,
essa queda foi compensada pelo crescimento das instituições mais recentes43.
43
Entre 2009 e 2013, foram criadas as seguintes instituições autónomas privadas:
Instituto Superior Politécnico de Benguela (2011), Instituto Superior Politécnico do
Cazenga (2011), Instituto Superior Politécnico Gregório Semedo da Huíla (2011), Instituto Superior Politécnico de Humanidades e Tecnologias “Ekuikui II” (2011), Instituto
Superior Politécnico Independente (2011), Instituto Superior Politécnico Kangonjo
(2011), Instituto Superior Politécnico Pangeia (2011), Instituto Superior Politécnico
de Tecnologias (2011), Instituto Superior Politécnico da Tundavala (2011), Instituto
Superior Politécnico Metropolitano de Angola-IMETRO (2012), Instituto Superior Politécnico de Cabinda (2012), Instituto Superior Politécnico Lusíada de Benguela (2012),
Instituto Superior Politécnico Lusíada de Cabinda (2012), Instituto Superior Politécnico Jean Piaget de Benguela (2012), Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela (2012), Instituto Superior Politécnico de Ciências e Tecnologia-INSUTEC (2012),
Instituto Superior Politécnico Katangoji (2012), Instituto Superior Politécnico Atlântida
(2012), Instituto Superior Politécnico Alvorecer da Juventude-ISPAJ (2012), Instituto
Superior Politécnico Internacional de Angola (2012), Instituto Superior de Ciências de
Administração e Humanas (2012), Instituto Superior Politécnico Kalandula de Angola
(2012), Instituto Superior de Angola (2012), Instituto Superior Politécnico Maravilha
(2012), Instituto Superior Politécnico Sol Nascente (2012), Instituto Superior de Tecnologia e Ciências-ISTEC (2012), Instituto Superior Politécnico do Zango-ISPOZANGO
(2012), Instituto Superior Politécnico de Porto Amboim (2012), Instituto Superior
Politécnico Ulemba (2012), Instituto Superior Politécnico Lusíada do Huambo (2012),
Instituto Superior Politécnico Lusíada da Lunda Sul (2012), Instituto Superior Politécnico Deolinda Rodrigues (2012), Escola Superior Politécnica de Benguela (2012), Instituto Superior Politécnico Maravilha (2013), Instituto Superior Politécnico de Porto
Amboim (2013). Ver Decreto Presidencial N.o 168/12, de 24 de Julho de 2012, publicado no Diário da República, I Série, N.o 141 – Autoriza a criação de várias instituições
de ensino superior privado. Muitos desses institutos resultaram do desmembramento
daquelas universidades cujos pólos estavam disseminados pelas províncias, como
se pode deduzir das designações adoptadas. Todavia, vale frisar que algumas delas
…‘‡­ƒ”ƒƒˆ—…‹‘ƒ”ƒ–‡•‡•‘†ƒ•—ƒ…”‹ƒ­ ‘‘ϐ‹…‹ƒŽ’‡Ž‘‘•‡ŽŠ‘†‡‹‹•–”‘•ǡ
como mostram os dados constantes na tabela seguinte.
| 95
CEIC / UCAN
EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS EM INSTITUIÇÕES PRIVADAS
DE ENSINO SUPERIOR 2009-2013
/ŶƐƟƚƵŝĕĆŽ
2009
7323
4005
5842
1710
5089
3845
3083
3691
2786
1390
2010
8597
5908
5489
2496
5586
4033
3936
3697
2737
3680
Ano
2011 2012
8495
7044
6561
2109
5722
5722
4942
4524
4414
5873
-
2013
13.993
9925
8180
8508
5065
6795
4883
4425
3899
4469
-
3111
-
3003
-
6079
320
1363
1209
1972
1555
-
2839
-
1554
1096
Universidade Jean Piaget
Universidade Técnica de Angola
Universidade Independente de Angola
Universidade Metodista de Angola
Universidade Lusíada de Angola
Universidade Gregório Semedo
Universidade Óscar Ribas
Universidade Católica de Angola
Universidade de Belas
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌdĠĐŶŝĐŽĚĞŶŐŽůĂ
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌĚĞŝġŶĐŝĂƐ^ŽĐŝĂŝƐĞZĞůĂĕƁĞƐ
2448 3316 3583
Internacionais-CIS
hŶŝǀĞƌƐŝĚĂĚĞWƌŝǀĂĚĂĚĞŶŐŽůĂ;ĂŶƟŐŽ/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌ
4871 3889 3222
Privado de Angola)
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽDĞƚƌŽƉŽůŝƚĂŶŽ
1390 2227 3080
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽ<ĂŶŐŽũŽ
- 1658
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽ<ĂƚĂŶŐŽũŝ
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĂdƵŶĚĂǀĂůĂ
872 1078 1505
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĞĞŶŐƵĞůĂ
934
987 1081
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚŽĂnjĞŶŐĂ
1118 1141 1047
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽ'ƌĞŐſƌŝŽ^ĞŵĞĚŽĚĂ,ƵşůĂ
991
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĞ,ƵŵĂŶŝĚĂĚĞƐĞ
750
Tecnologias “Ekuikui II”
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽ/ŶĚĞƉĞŶĚĞŶƚĞ
510
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĞdĞĐŶŽůŽŐŝĂƐĞŝġŶĐŝĂƐ
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽWĂŶŐĞŝĂ
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĞWŽƌƚŽŵďŽŝŵ
/ŶƐƟƚƵƚŽ^ƵƉĞƌŝŽƌWŽůŝƚĠĐŶŝĐŽĚĞƚůąŶƟĚĂ
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Total
50.397 58.797 72.833
FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e do MESCT, 2012-2013.
96 |
-
641
940
2603
258
1900
1419
611
931
688
6915
4530
1825
1825
1069
1226
785
5613
1.129
131.760
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
É interessante constatar, por outro lado, que, do total de matriculados em
2013, 120.564 são estudantes do sexo feminino, contra 98.114 do sexo masculino. A mesma preponderância verifica-se quer no ensino superior privado
(com 48,9% de população masculina e 51,1% de população feminina), quer no
ensino superior público (com 38,7% de população masculina e 61,2% de população feminina). Esse dado representa um progresso significativo, se comparado aos dados dos anos anteriores, à luz dos quais a desigualdade de género nas
instituições de ensino superior angolanas, em particular, e africanas, em geral,
com a absoluta vantagem para os homens, era considerado um problema central do subsistema e um dos motivos da sua crise de legitimidade44. É também
um sinal de que os constrangimentos socioeconómicos, culturais e ideológicos
que antes bloqueavam o protagonismo social e intelectual das mulheres vêm
tornando-se cada vez mais uma realidade do passado, em função da democratização da sociedade. O papel da mulher na vida social tem crescido a cada dia,
e o ensino superior vem demonstrar ser um dos canais privilegiados para essa
emancipação45.
PERCENTAGEM DE HOMENS E MULHERES
NO ENSINO SUPERIOR - 2013
44,8%
55,2%
Homens
Mulheres
FONTE: CEIC, com base no GEPE do MES, 2013.
44
Na medida em que as IES passaram a ser vistas como instituições antidemocráticas,
no sentido em que reproduziam e endossavam a lógica sexista e patriarcalista das relações sociais. Cf. Víctor Kajibanga, “Ensino superior e dimensão cultural do desenvolvimento”, comunicação apresentada na Semana Social: Educação para a Cultura de Paz,
Luanda, 1999.
45
Angola segue, assim, uma tendência geral na África Austral, onde a taxa geral de
matrículas de mulheres no ensino superior vem crescendo desde 2011, com um percentual de 49,9. Cf. SADC: Monitor do Género, Harare: SARD, 2013.
| 97
CEIC / UCAN
RELAÇÃO ENTRE HOMENS E MULHERES NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO E PRIVADO - 2013
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
Ensino Superior Público
Homens
Ensino Superior Privado
Mulheres
FONTE: CEIC com base no GEPE do MES, 2013.
O exame da evolução do número de matrículas, no entanto, só estaria completo se fosse possível desagregar os números na base de outras operações. Por
exemplo, comparar com, certa precisão, as taxas bruta e líquida de matrículas,
bem como identificar a distinção de matrículas por cursos e segundo as taxas de
renda familiar, o que a indisponibilidade de dados estatísticos oficiais não permite46. É necessário saber, em concreto:
ͻ o número total de matrículas de estudantes com idade prevista para cursar o
nível superior (de 18 a 22 anos);
ͻ o número de matrículas por idade e ano curricular;
ͻ o número de matrículas em cada curso;
ͻ o número de matrículas de acordo com as taxas de renda familiar.
Sem essa verificação, não se pode conhecer a real natureza do crescimento, isto
é, aferir em que medida a evolução do número de matrículas reflecte, de facto: 1)
o aumento da capacidade potencial de atendimento e de inclusão do subsistema;
2) a diversificação do ensino superior em função da crescente heterogeneidade
dos ingressos do ensino secundário em termos de competência académica, interesses e vocações; 3) o nível de adequação da formação superior às necessidades
46
Lamentavelmente, os dados necessários não constam da informação estatística
cedida pelo Gabinete de Estudos, Planeamento e Estatística (GEPE) do Ministério do
Ensino Superior, muito embora tenham sido solicitados expressamente.
98 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
efectivas do país, de acordo com o previsto no Plano Nacional de Formação de
Quadros (PNFQ)47. Ou ainda, não é possível saber até que ponto o ensino superior
se afirma, assim, como um factor de mobilidade social de um número cada vez
maior de angolanos, uma vez que o crescimento das matrículas, em geral, beneficia primordialmente as camadas mais pobres.
Em todo o caso, sendo apenas possível fazer um cálculo estimativo da evolução da taxa bruta com base no crescimento real de matrículas48, e considerando
a dinâmica de progressão do número de matrículas e a previsão de crescimento
do número de ingressos do 2.o Ciclo do ensino secundário, é provável que a evolução actual represente os primeiros passos de um processo de universalização
do ensino superior, e não o resultado da eficiência do subsistema em termos de
acesso. Como aponta a tabela seguinte, não obstante o crescimento constante
da taxa bruta de matrículas de 2009 a 2013, com ênfase para este último ano
(com 10,5%) – bem acima das expectativas (7%)49 –, a resposta à demanda por
vagas na faixa etária de 18 a 22 anos situa-se ainda bastante aquém do desejado. É possível deduzir, assim, que a taxa líquida se situaria em percentuais
muito mais baixos, apontando para um aceleramento do número de matrículas de estudantes com idade acima dos 22 anos50 em prejuízo do alargamento
do percentual da população estudantil na faixa etária correspondente ao nível
superior.
47
Essa, aliás, a par da qualidade de ensino, foi anunciada por José Eduardo dos Santos
como uma das medidas prioritárias do Executivo angolano no que ao ensino superior
diz respeito. Cf. José Eduardo dos Santos, Mensagem sobre o Estado da Nação, Proferida
na Abertura da II Sessão Legislativa da III Legislatura da Assembleia Nacional, Luanda,
15 de Outubro de 2013, p. 6.
48 Na verdade, consideramos, de acordo com a tabelaƒ•‡‰—‹”ǡ“—‡ƒ•‡–ƒ•ϐ‹šƒ†ƒ•’ƒ”ƒ
a taxa bruta deverão ser revistas com base no crescimento real do número de matrículas e no crescimento da população estudantil com idade correspondente para frequentar o ensino superior. Ver Ministério da Administração do Território, Plano Nacional de
Desenvolvimento 2013-2017, Luanda: Dezembro de 2012, p. 118.
49‘–ƒǦ•‡“—‡ǡ†‡‘†‘‰‡”ƒŽǡƒ•’”‘Œ‡…­Ù‡•‘ϐ‹…‹ƒ‹•• ‘ǡ‡–”‡–ƒ–‘ǡ„ƒ•–ƒ–‡‘†‡•–ƒ•ǡ
prevendo uma média anual de crescimento da taxa bruta de 1% até 2017, exceptuando
2015. Seguramente tal previsão se tenha baseado, por sua vez, em projecções igualmente modestas do crescimento da população.
50 Como se sabe, a inclusão de estudantes com idade abaixo dos 18 anos é caso raro.
| 99
CEIC / UCAN
EVOLUÇÃO DA TAXA BRUTA DE MATRÍCULAS NO ENSINO SUPERIOR 2009-2013
N.o de
Matrículas
População
(de 18 a 22 anos)51
Taxa Bruta
2009
98.777
1.392.638
7,09%
2010
107.039
1431.283
7,47%
2011
140.016
1.471.176
9,51%
2012
150.000
1.512.600
9,91%52
2013
218.678
2.079.000
10,5%
Ano
FONTE: CEIC com base no GEPE do MPDT e do MES,
Média de
Crescimento Global
8,90%
2012-2013.5152
Isso quer dizer, por conseguinte, que não estamos diante de um crescimento regular ou de um fluxo estável, mas sim de um crescimento compensatório
de atrasos acumulados ao longo dos anos de instabilidade causada pela guerra civil que, como se sabe, impossibilitou a expansão da cobertura do ensino
superior por todo o território nacional, o que, neste momento, se vai tornando
possível. De modo que ocorre, agora, a inclusão daqueles que foram ficando de
fora do subsistema em virtude da escassez e da falta de diversidade da oferta
no passado53.
De resto, é previsível que essa compensação continue a ditar o crescimento do número de estudantes para além das próximas quatro décadas, a julgar
pela lógica do próprio processo de universalização, que, como todo o processo na área da educação, se dá a longo prazo e é cumulativo. Assim, ao mesmo
tempo em que vai absorvendo, o subsistema exclui aqueles que, no futuro, talvez venham a ser incluidos em detrimento de um número cada vez menor de
excluídos, até que a cobertura escolar seja capaz de atender a totalidade da
demanda. Mas, para que assim aconteça, outros factores devem ser ponderados no sentido de se evitar distorções, nomeadamente: 1) a melhoria do fluxo
por meio da criação de mecanismos de recuperação e aceleração; 2) o fomento
de bolsas de estudo internas, visando sobretudo garantir a dedicação exclusiva e impedir a desistência daqueles estudantes com bom rendimento e mais
51‡•–‹ƒ–‹˜ƒˆ‘‹ˆ‡‹–ƒ…‘„ƒ•‡—ƒ–ƒšƒƒ—ƒŽ±†‹ƒ†‡…”‡•…‹‡–‘†‡‘‰”žϐ‹…‘
de 2,7% para 2009, 2010, 2011 e 2012, e de 2,9% para 2013.
52 Para 2012, a taxa bruta inclui a população de 19 a 22 anos.
53 Não se ignora os anos acumulados por repetência de alunos nos níveis anteriores ao
ensino superior. Porém, considera-se esse acúmulo menos expressivo do que o atraso
gerado pela baixa cobertura da rede de instituições.
100 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
carenciados54; 3) a diversificação dos curricula dada a crescente heterogeneidade dos egressos do ensino médio, em matéria de competência académica,
interesse e vocações
4.8.1.2 O crescimento do número de docentes
Outra evolução que se pode constatar, como ficou dito, é quanto ao número total
de docentes no ensino superior, que passou de 3222, em 2009, para 6900, em 2013,
resultando numa média de crescimento global de 53,4%. Essa evolução indica o esforço empreendido no recrutamento de novos docentes para o quadro da carreira docente – sob critérios variáveis de instituição para instituição e muitos dos quais academica
e cientificamente questionáveis55 –, a par do ingresso dos estagiários. Uma vez que os
dados disponíveis não fazem a necessária diferenciação de categorias (entre titulares,
associados, auxiliares e assistentes) nem de classes (entre professores e assistentes) e
muito menos das áreas de formação dos docentes, é impossível identificar o peso de
cada uma dessas componentes, o que muito contribuiria para determinar um dos indicadores internacionalmente consagrados da qualidade do ensino.
EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE DOCENTES NO ENSINO SUPERIOR
2009-2013
2009
2010
2011
2012
2013
N.o
%
N.o
%
N.o
%
N.o
%
N.o
%
3741
+16,1
4652
+24,4
5499
+18,2
6350
+13,5
6900
+8
Média de
Crescimento Global
53,4%
FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.
É notório, no entanto, que, ao contrário do crescimento do número de estudantes, o crescimento do número de docentes em 2013 deu-se de acordo com a respectiva meta fixada56. Acresce que, no quadro do quinquénio, 2013 foi o ano com
54
O aumento das taxas bruta e líquida de matrículas depende, em grande medida,
da ausência de distorções no subsistema. Tomando como exemplo um estudante de
22 anos que, em virtude de sucessivas reprovações, frequenta o 2.o ano do curso de
História na instituição “X”, pode-se notar que ele se encontra no nível de ensino correspondente, mas não no ano, pelo que virá a frequentar o 3.o ano já fora das taxas bruta e
líquida de matrículas do respectivo ano lectivo. Deste modo, o processo exige medidas
que integrem os diferentes subsistemas, para que não haja distorções nos níveis anteriores que venha a anular as melhorias alcançadas no ensino superior.
55 Sabe-se que o Ministério do Ensino Superior prepara, neste momento, o dossier concernente
aos critérios de acesso à carreira docente, cujo objectivo será uniformizar o processo de ingresso
de novos docentes e a ascensão na carreira, atribuindo assim o rigor necessário ao processo.
56
Ver Ministério da Administração do Território, Plano Nacional de Desenvolvimento
2013-2017, Luanda: Dezembro de 2012, p. 119.
| 101
CEIC / UCAN
menor crescimento, de apenas 8%, evidência de uma tendência de quebra de ritmo que tem o seu início, na verdade, em 2011, depois de em 2010 se ter registado
um crescimento absoluto de 24,4% em relação a 2009. O decréscimo é ainda mais
nítido e preocupante quando confrontados os dados relativos ao ensino público e
ao ensino privado, como se dá a ver na tabela abaixo.
EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE DOCENTES NA REDE PÚBLICA
E NA REDE PRIVADA DE ENSINO SUPERIOR
2009-2013
2009
Rede Pública
Média Anual de
Crescimento
2011
2012
2013
%
N.o
%
N.o
%
N.o
%
N.o
%
1752
46,8
2031
43,7
2768
50,3
4181
-
4306
-
Média Anual de
Crescimento
Rede Privada
2010
N.o
5,2%
1989
15,9%
53,2
27,7%
2621
56,3
31,8%
36,3%
2731
49,7
2169
4,2%
-
-
2594
-
FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.
Pode-se concluir que o crescimento do número de professores universitários
não só não tem acompanhado o crescimento do número de estudantes, como era
de se esperar, mas também vem ocorrendo de maneira invertida, tendo em conta
que o desequilíbrio se dá em favor do ensino superior público, e não do privado,
cujo crescimento da população estudantil sempre foi maior dentro dos limites de
2009-2013.
Isso reflecte-se, negativamente, como é óbvio, no rácio estudante/docente, ou
seja, no número médio de estudantes por cada docente no ensino superior, em
geral, e nas redes pública e privada, em particular.
RÁCIO ESTUDANTE/DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR 2009-2013
Rácio
2009
2010
2011
2012
2013
26,403
23,009
25,462
23,622
31,692
FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.
RÁCIO ESTUDANTE/DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR 2009-2013
Rácio na Rede
Pública
Rácio na Rede
Privada
2009
2010
2011
2012
2013
27,614
23,752
24,271
-
20,185
25,337
22,433
26,668
-
50,794
FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.
102 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Neste momento, como se pode ver nas tabelas acima, há um rácio global de
31,692 estudantes por um docente, ao passo que no ensino público a cifra é de
20,185 e no ensino privado atinge os 50,794 (mais 30,609). Embora não haja
dados disponíveis que permitam aferir a distribuição dos respectivos rácios pelas
instituições públicas e privadas, pode-se assegurar, com base naqueles dados,
que estas últimas – e em particular mais recentes – estejam em pior situação
no que diz respeito ao rácio minimamente aceitável (20 estudantes por cada
docente).
Ademais, a maior parte dos docentes das instituições privadas lecciona em
regime de colaboração, sendo docentes com vinculação efectiva nas instituições
públicas de ensino superior. Já no caso das instituições públicas, sabe-se que a
escassez de docentes efectivos é mitigada pela contratação de um número considerável de docentes expatriados com dedicação exclusiva, ao abrigo de protocolos
de cooperação entre o Estado angolano e outros Estados, como ocorre em algumas das novas universidades públicas no caso dos docentes cubanos, a quem, em
geral, se confiam disciplinas do ramo das ciências exactas e biomédicas. Daí também ser necessário haver dados relativos ao regime de vinculação dos docentes
por instituição.
Resta ainda notar que os dados disponíveis não estão diferenciados por cursos
e por ano curricular, dois factores necessários para aferir a variabilidade dos rácios.
4.9 Despesas com a educação
Sendo a educação – como se deixou dito – a chave para o desenvolvimento de
qualquer sociedade, nação ou país, o seu financiamento público é fundamental e
obrigatoriamente progressivo, de maneira a que se possa ter cidadãos mais qualificados e dotados de conhecimentos técnicos e científicos que lhes possiblilite
trabalhar em prol do desenvolvimento sustentável e equitativo da sociedade e do
país. Para se ter uma educação suficiente e de qualidade é preciso investimento,
quer público, quer privado que permita a construção de infra-estruturas escolares,
aquisição de material técnico e bibliográfico, formação inicial e contínua, contratação de professores e pessoal administrativo capazes e dotar-lhes com a devida
capacitação.
O financiamento público do sector da educação pode ser avaliado através da
análise das respectivas dotaçãos orçamentais no Orçamento Geral do Estado. O
gráfico seguinte ilustra as verbas que o Estado tem vindo a alocar ao sector da educação, nos últimos quatro anos (2010-2013).
| 103
CEIC / UCAN
DESPESAS PÚBLICAS COM A EDUCAÇÃO
(MIL MILHÕES DE KWANZAS)
536,93
376,76
341,17
263,50
2010
2011
2012
2013
FONTE: OGE (2010-2013).
Através deste gráfico vê-se claramente que neste período, a dotação orçamental para o sector da educação, em termos nominais, tem vindo a aumentar significativamente: em 2010 foi alocada uma verba de 263,5 mil milhões de Kwanzas
que passou, em 2011, para 341,17 mil milhões (um aumento nominal de 29,5%)
e, em 2012, subiu para 376,76 mil milhões de Kwanzas, para se fixar, em 2013, nos
536,93 mil milhões de Kwanzas. O que permite ver que as despesas orçamentais
com a educação, entre 2010 e 2013, duplicaram, passando de 263,5, em 2010,
para 536,93 mil milhões de Kwanzas, em 2013, correspondendo a um aumento
nominal de 103,8%, o que equivale a um crescimento médio anual de cerca de
25,9%.
O aumento das verbas para este sector é de facto importante e necessário tendo em conta o baixo nível de qualificação que, em geral, Angola regista. Mas, é
importante realçar que estas observações referem-se à dotação orçamental e que
os números suprareferidos correspondem somente a despesas programadas e não
às que efectivamente foram realizadas.
O Executivo tem, ao longo de anos, vindo a registar níveis de execução de despesas públicas muito baixos. Por exemplo, o Relatório de Execução Orçamental
referente ao 3.o trimestre de 2012 dava conta de que até àquele período haviam
sido executadas 67,2% das despesas com a educação, ou seja, 253,31 mil milhões
de Kwanzas dos 376,76 mil milhões orçamentados57. É obvio que a não realização
efectiva das despesas afecta a qualidade do ensino e frusta o cumprimento de
metas pré-estabelecidas.
57
Os dados concernentes à execução orçamental do 4.o trimestre de 2012 e do ano de
2013 até ao momento da compilação deste relatório ainda não estavam disponíveis no
site do Ministério das Finanças.
104 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
4.9.1 Peso da despesa com a educação no OGE
Analisando a percentagem ou peso relativo da despesa com a educação, no
total das despesas públicas do Estado, vê-se que se tem verificado, desde 2010,
uma ligeira diminuição, passando de 8,52% para 8,09%, em 2013. No entanto,
os valores monetários absolutos, apresentados no gráfico anterior, traduzem um
aumento signaficativo das verbas nominais que passam de 263,5 mil milhões, em
2010, para 536,93 mil milhões, em 2013.
PESO DAS DESPESAS COM A EDUCAÇÃO NO OGE
8,52%
8,37%
8,18%
8,09%
2010
2011
2012
2013
FONTE: OGE (2010-2013).
Parace haver uma contradição, visto que as despesas em valores monetários
estão a aumentar mas o peso relativo da educação, no total das despesas do OGE,
apresenta uma ligeira diminuição. Mas, não há nenhuma contradição, o que ocorre é que as despesas totais do Estado, de ano para ano, aumentam, em função das
necessidades do próprio Estado e as despesas com a educação não aumentam na
mesma proporção, sendo que 8,52% de 3 bilhões é menor que 8,09% de 6 bilhões
de Kwanzas.
4.9.2 Repartição da despesa com a educação nos diferentes níveis de ensino
A atribuição das verbas orçamentais aos diferentes níveis de ensino é feita de
acordo com a importância estratégica atribuída pelo Executivo a cada nível e em
função das suas necessidades. O gráfico seguinte apresenta a dotação do OGE para
a educação, distribuída pelos diferentes níveis de ensino existentes no país.
| 105
CEIC / UCAN
DESPESAS COM A EDUCAÇÃO EM DIFERENTES NÍVEIS DE ENSINO
(MIL MILHÕES DE KWANZAS)
900,00
800,00
700,00
600,00
500,00
400,00
300,00
200,00
100,00
0,00
Educação
Pré-escolar
2010
Ensino
Primário
2011
Ensino
Secundário
2012
Ensino
Superior
Ensino
Serviços
Outros
Tecnico- Subsidiários Serviços
ͲƉƌŽĮƐƐŝŽŶĂů à Educação Educação
2013
FONTE: OGE (2010-2013).
Antes de se analisar a estrutura da despesa da educação, pretende-se chamar
a atenção para o ensino técnico-profissional que figura com uma verba de 23,53
mil milhões de Kwanzas. Dos OGE consultados, somente no de 2013 aparece esta
categoria de ensino com uma dotação orçamental explicita. É de saudar essa iniciativa pois o país precisa de investir seriamente no ensino técnico-profissional, pois
este ensino tem a vantagem de capacitar mais rapidamente os estudantes para o
mercado de trabalho.
A estrutura da despesa do sector da educação denota uma prioridade atribuída ao ensino primário, o qual tem reiteradamente a maior fatia da dotação orçamental da educação. O ensino secundário vem a seguir e o ensino superior é o que
recebe menos verbas, em termos absolutos.
4.9.3 Estimativa da despesa per capita com a educação
Duma análise mais detalhada, isto é, do cálculo da despesa per capita de cada
nível de ensino nota-se que os níveis do ensino primário (5.162.879 alunos) e
secundário (1.015.896 alunos), por albergarem o maior número dos alunos matriculados, são os que apresentam um menor nível de despesa per capita (despesa
por aluno).
106 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
DESPESAS PER CAPITA COM A EDUCAÇÃO (EM KWANZAS)
1.400.000,00
373.382,26
1.200.000,00
1.000.000,00
800.000,00
600.000,00
400.000,00
200.000,00
70.393, 07
53.251,70
83.017,13
Despesas
Per Capita
Ensino Primário
Despesas
Per Capita
Ensino Secundário
0,00
2010
2011
2012
Despesas
Per Capita
Ensino Superior
Despesas
Per Capita
Geral
2013
FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RS 2012 e do OGE.
Como podemos observar no gráfico abaixo, o ensino superior (218.676 estudantes) é o que apresenta a maior dotação orçamental per capita, de todos os
níveis de ensino, pois é o ensino com menor número de estudantes matriculados,
comparados com o ensino primário e secundário.
DESPESAS PER CAPITA ENSINO SUPERIOR (EM KWANZAS)
373.382,26
280.421,15
275.214,60
249.917,06
2010
2011
2012
2013
FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RS 2012 e do OGE.
Claramente vê-se que o ensino superior, em termos per capita, é o subsistema
de ensino ao qual mais verbas são alocadas. De acordo com as estimativas do CEIC,
baseadas em dados oficiais do Ministério da Educação, em 2010 estavam matriculados no ensino superior perto de 107 mil estudantes e as verbas orçamentais
atribuídas naquele ano foram de 30,76 mil milhões de Kwanzas, o que nos dá, em
termos per capita, uma despesa de 280.421,15 Kwanzas, ou seja, cerca de 2800
dólares-americanos por estudante.
| 107
CEIC / UCAN
A mesma análise pode ser feita para 2011, em que havia cerca de 140 mil estudantes universitários matriculados e neste ano a dotação orçamental foi de 39,08
mil milhões de Kwanzas, o que nos dá uma despesa per capita de 275.214,6 Kwanzas (cerca de 2750 USD por estudante). A diminuição deve-se a um maior aumento
dos números de estudantes matriculados em 2011, em comparação com o aumento das verbas.
Já em 2012 e 2013 estiveram matriculados no ensino superior cerca de 150.000
e 218.676 estudantes, respectivamente, e nesses anos as verbas foram de 38,04,
em 2012, e 82,21 mil milhões de Kwanzas, em 2013, o que nos leva a uma despesa
per capita de 249.917,06, em 2012, e de 375.944,32 Kwanzas, em 2013.
4.9.4 Despesa per capita nos ensinos primário e secundário
DESPESAS PER CAPITA DO ENSINO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO (EM KWANZAS)
83.017,13
44.889,31
47.817,23
50.765,59
50.700,26
53.251,70
42.250,02
33.824,88
2010
2011
Despesas per capita do Ensino Primário
2012
2013
Despesas per capita do Ensino Secundário
FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RS 2012 e do OGE.
Quanto ao ensino primário, em 2010, estima-se que estavam matriculados
neste subsistema de ensino cerca de 4,7 milhões de alunos e as verbas alocadas
naquele ano foram de 160,12 mil milhões de Kwanzas, o que nos leva a concluir
que a despesa per capita do ensino primário, em 2010, foi de 33.824,88 Kwanzas
(cerca de 330 USD por estudante).
Em 2011, estavam matriculados 4,8 milhões de alunos e o subsistema beneficiou de uma dotação orçamental de 233,15 mil milhões de Kwanzas, o que nos dá
uma despesa média por aluno de 47.817,23 Kwanzas (ou seja, 478 USD por estudante). Já em 2012, a despesa per capita foi de 50.700,26 Kwanzas já que 5,02
milhões de alunos estavam matriculados e 254,62 mil milhões de Kwanzas foram
atribuídos a este subsistema de ensino. Em 2013, a despesa per capita estimada foi
de 53.251,70 Kwanzas (cerca de 532 USD por estudante).
108 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O ensino secundário é frequentado por 1.015.896 de alunos, o que representa
cerca de 19,68% do total de alunos matriculados no ensino primário. Mas, o orçamento alocado para o ensino secundário é quatro vezes inferior ao que é alocado
para o ensino primário, pois o número de alunos matriculados nesse nível é um
quinto dos alunos matriculados no ensino primário, fazendo com que a despesa
per capita do ensino secundário seja inferior à despesa per capita do ensino primário.
4.9.5 Despesa per capita global
Tendo em conta o número total dos alunos matriculados nos ensinos primário,
secundário e superior, calcula-se uma despesa per capita do sector da educação
conforme o gráfico abaixo.
DESPESAS PER CAPITA GERAL (EM KWANZAS)
70.393,07
57.338,59
52.145,31
45.842,66
2010
2011
2012
2013
FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RSA 2012 e do OGE.
Como se pode ver, em 2010, a despesa per capita com a educação, tendo em
conta o número total de alunos matriculados, foi de 33.029,53 Kwanzas (cerca de
330 USD por estudante), 41.370,17 Kwanzas, em 2011, 44.325,31 Kwanzas, em
2012, e 70.393 Kwanzas (cerca de 703 USD por estudante), em 2013.
Em termos gerais, a despesa per capita dos ensinos primário e secundário que
Angola apresenta é extremamente baixa (muito abaixo dos 9% do PIB per capita)
comparada com os outros países da região, como, por exemplo, a África do Sul,
que apresenta uma despesa per capita de cerca de 17% do seu PIB per capita.
| 109
CEIC / UCAN
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5.1 Introdução
A situação social das famílias e da criança em Angola, como temos vindo a
fazer referência nas edições anteriores do relatório social, registou, nos últimos
anos, algumas melhorias. Estas melhorias estão em grande medida relacionadas
ao “boom económico” que o país tem registado, principalmente na exploração do
petróleo, o que tem criado um ambiente macroeconómico bastante favorável para
a implementação de políticas e programas públicos que permitam melhorar progressivamente o nível de vida das famílias e crianças, e promover o desenvolvimento socioeconómico sustentável.
O progresso registado nos últimos anos é visível e mensurável. De acordo com
os últimos dados do Inquérito Integrado sobre o Bem-Estar da População – IBEP
(2008-2009), a proporção de pessoas com renda inferior a 1 USD por dia era de
68%, em 2001. Mas, em 2009, a taxa de incidência da pobreza foi estimada em
36,6%58, a taxa de mortalidade infanto-juvenil passou de 250 crianças por mil
nados vivos, em 2001, para 164 por mil nados vivos, em 201259, a esperança de
vida ao nascer era de 45 anos, em 2000, e passou a 52 anos, em 201260.
Durante os últimos anos foram e estão a ser implementadas políticas e programas que têm contribuído fortemente para o progresso registado nos indicadores
socioeconómicos. No domínio da Família e da Criança, destacamos os 11 Compromissos em prol da Criança Angolana, a Lei sobre a Protecção e o Desenvolvimento Integral da Criança (Lei n.o 25/12, de 22 de Agosto), o Programa Integrado
de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza e recentemente o Programa da
Mulher Rural (sendo ainda muito novo).
58
De acordo com a linha de pobreza absoluta estabelecida no IBEP 2008, cifrada em
aproximadamente 52$ mensais por pessoa ou adulto equivalente.
59 Estimativas das Nações Unidas, em 2013.
60 Relatório de Desenvolvimento Humano, UNDP 2012.
110 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Todavia, apesar dos resultados alcançados nos últimos anos, a situação das
famílias e da criança ainda é bastante preocupante. Segundo as estatísticas, Angola
ainda faz parte dos cinco países com as piores taxas de mortalidade infantil no
mundo. De acordo com o QUIBB 2011, aproximadamente metade dos partos ocorreram em casa (48%), no meio rural, a situação é ainda mais preocupante, pois
73% dos partos ocorrem em casa e, na maior parte destes, sem a assistência de
pessoal qualificado, 65% da população não tem acesso a água potável, 58% não
tem acesso a saneamento básico apropriado, e apenas 31% das crianças menores
de 5 anos possui o registo de nascimento (IBEP 2010).
Neste capítulo, pretende-se analisar os principais indicadores referentes à
condição socioeconómica das famílias e das crianças, com base nos dados do
Inquérito Integrado sobre o Bem-Estar da População (IBEP, 2009) e do Inquérito de Indicadores Básicos de Bem-Estar (QUIBB, 2011). Far-se-á uma caracterização da situação da família e da criança em relação a alguns dos indicadores
socioeconómicos julgados pertinentes para esta análise, entre eles a estrutura
demográfica, o estado civil e as relações conjugais, o tamanho e a estrutura dos
agregados familiares, as condições de habitação, o meio ambiente e a posse
de bens, e os principais indicadores de pobreza monetária e não-monetária61.
Os dados recolhidos permitiram reavaliar as metas e compromissos assumidos
pelo Executivo em relação à família e à criança e dimensionar os esforços ainda
necessários para a promoção do verdadeiro bem-estar das famílias e das populações.
5.2 Realidade socioeconómica da família em Angola
5.2.1 Estrutura demográfica
A situação da família é fortemente influenciada por três grandes factores, ligados directamente à estrutura demográfica do país: elevada taxa de fecundidade,
elevada taxa de crescimento da população (3,2%) e elevado índice de dependência total.
O primeiro factor está relacionado com a elevada taxa de fecundidade, estimada em 6,4 nascimentos (QUIBB, 2011), num país com uma alta taxa de mortalidade
(191%), a esperança de vida é muito reduzida (estimada em 52 anos), quando a
esperança de vida média na África Subsariana é de 52 anos.
61
Neste subcapítulo, destacamos na nossa análise os domínios da Habitação, Água,
Saneamento e Inclusão. Os domínios da Educação e Saúde não são analisados (serão
analisados futuramente em relatório próprio).
| 111
CEIC / UCAN
O segundo problema está relacionado com a elevada taxa de crescimento da
população, estando o nível de crescimento natural estimado em 3,23%, por ano
(QUIBB, 2011). Como já referido na análise passada, este crescimento da população é desproporcional ao crescimento e desenvolvimento de estruturas que permitam melhor acomodação da família e a realização dos seus direitos, agravando
a condição das crianças, das mulheres e das famílias em geral. A disposição da
população, por sexo, aponta para uma população composta por 48% de homens e
52% de mulheres, o que se traduz num índice de masculinidade de 0,94, ou seja,
94 homens para 100 mulheres. A população urbana, segundo o QUIBB, é estimada
em 55% (em 1995 era de 31% como indicava o MICS) e a tendência é de uma cada
vez maior concentração urbana, desertificando cada vez mais as zonas rurais, onde
vive agora, cerca de 45% da população.
Em terceiro lugar, referimos a elevada taxa de dependência total, estimada em
101 (QUIBB, 2011). Isso significa que, para cada 100 pessoas, em idade activa, existem 101 pessoas, em idade não-activa. Isso ocorre porque a taxa de dependência
total é composta pelo índice de dependência das crianças e o índice de dependência dos idosos, uma vez que a população angolana é maioritariamente jovem, com
uma média de 20 anos de idade, os níveis de dependência são maiores.
Neste quadro, urge a necessidade de um Estado-Providência, principalmente
como promotor e gerador de meios para a subsistência dessa população jovem e
pouco auto-suficiente. As políticas sociais deverão estar viradas para esta população dependente e vulnerável.
5.2.2 Estado civil e relações conjugais
A distribuição da família em relação ao estado civil pode explicar um conjunto
de tendências e factos, em relação ao comportamento e a práticas que favorecem
(ou não) o bem-estar da mulher e da família em geral. Segundo o IBEP 2010, quase metade da população angolana, maior de 12 anos, tem uma relação conjugal (é
casada ou vive em união de facto), numa proporção de 52% homens e 47% mulheres. A união de facto é a forma mais comum de relação marital, no país. Este facto
é reforçado pelo QUIBB 2011, que indica a maternidade como precoce, indicando
que 17% das mulheres, com idade entre os 12 e os 19 anos, já tiveram o seu primeiro filho. Estas raparigas sofrem impactos negativos muito sérios devido à sua
estrutura física, ainda em desenvolvimento, sendo forçadas a assumir responsabilidades para as quais ainda não estão preparadas e são impedidas de perseguirem
as oportunidades de educação, formação e emprego.
O facto mais preocupante em relação à situação da família é que 63% dos
casais não possui nenhum nível de escolaridade, traduzindo-se esta situação em
112 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
pobreza na família, graves problemas de abandono e negligência na educação e
acompanhamento dos filhos, violência, para além de baixos rendimentos para a
satisfação das necessidades das crianças.
A população solteira é grande (IBEP, 2008/2009), estimada em 41%, sendo
0,4% da população divorciada e 4% separada. Estas baixas cifras poderão reflectir
os estigmas sociais e culturais, associados ao casamento e à família, na qual há um
grau acentuado de submissão da mulher, um aparente equilíbrio familiar assente
na manutenção do casamento (ou dos relacionamentos) mesmo na presença de
altos índices de violência doméstica, de pobreza ou mesmo de intolerância mútua.
Nestes casos, a preservação do relacionamento é muitas vezes entendida como
uma obrigação social, cultural, religiosa ou um suposto sinónimo de bem-estar.
Esta situação levanta, com certeza, questões sérias acerca da condição da mulher
na família, a discriminação e as disparidades sociais e do género.
ESTADO CIVIL E RELAÇÕES CONJUGAIS
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Solteiro
Casado
União de facto
Divorciado
Separado
5.2.3 Tamanho e estrutura do agregado familiar
Outro indicador importante que utilizamos aqui para avaliar a condição da
família é o tamanho e estrutura do agregado familiar. De acordo com os resultados
do QUIBB 2011, o número médio de pessoas por agregado é de 5,3 pessoas, sendo comparativamente mais elevado que em 2001, que foi estimado em 4,3 (MICS,
2001). Esta tendência de crescimento é inversamente proporcional às tendências
de desenvolvimento das sociedades, em que o acesso à informação, educação e
bens tende a contribuir para a redução do número de filhos e, consequentemente,
para um mais elevado nível de estabilidade familiar.
De acordo com o QUIBB 2011, cerca de 79% dos agregados familiares são chefiados por homens e 21% por mulheres. Para os agregados chefiados por mulheres
| 113
CEIC / UCAN
60% situam-se na área urbana e 38% na área rural. Em relação ao nível de escolaridade do chefe do agregado, segundo o QUIBB 2011, 52% não tem nenhum nível
de escolaridade (sendo 47% para os homens e 70% para as mulheres), 24% possui
apenas o ensino primário (sendo 26% para os homens e 15% para as mulheres),
25% possui o ensino secundário ou mais (sendo 28% para os homens e 14% para as
mulheres). Estes dados são contraditórios em relação aos dados do IBEP 2008/2009,
no qual 20% dos chefes de família não tinha nenhuma escolaridade, 45% possuía
o ensino primário, 29% possuía o ensino secundário e 3% tinha o ensino superior.
TAMANHO E ESTRUTURA DO AGREGADO FAMILIAR
60
50
40
30
20
10
0
QUIBB
Sem instrução
Secundário
IBEP
Primário
Universitário
Independentemente de qual estudo possa estar correcto, podemos inferir
uma série de questões em relação à qualidade e tipo de relações familiares que
se podem estabelecer nas condições em que cerca de 77% das famílias não possui
nenhuma escolaridade ou possui apenas o ensino primário. Os altos níveis de violência doméstica e a alta taxa de atraso e de abandono escolar talvez estejam associados também à baixa escolaridade dos chefes dos agregados familiares.
5.2.4 Habitação e meio ambiente
O direito à habitação está consagrado universalmente e a forma como este
direito é exercido têm reflexos no nível de vida das famílias e nos níveis de desenvolvimento do país. De acordo com o QUIBB 2011, 3 em cada 4 agregados familiares, ou seja, 74% da população vive em casa própria, 16% em casa arrendada, 8%
em casa de familiares ou de amigos e 1% em casa ocupada. Notam-se disparidades
acentuadas, segundo a área de residência, sendo que nas áreas rurais, 9 agregados, em cada 10, vivem em habitações próprias, o que reflecte um maior acesso à
terra comparativamente com as áreas urbanas.
Segundo o QUIBB 2011, a população angolana vive em sobrelotação, com uma
média de 3,1 pessoas por quarto de dormir, quando a média nacional de quartos
114 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
de dormir por habitação é de apenas 1,7 quartos. De acordo com o mesmo QUIBB
2011, apesar dos investimentos no sector da construção nos últimos anos (promessa de construção de um milhão de casas62), tanto o QUIBB 2011 como o IBEP
2008-2009 mostram que cerca de 43% dos agregados familiares, residentes na
área urbana, vivem em habitações sobrelotadas.
Finalmente, 63% dos agregados familiares vivem em habitações com tecto de zinco, 49% em habitações com paredes de adobe e 49% em habitações com o soalho de
terra batida. Por outro lado, 72% da população, na zona urbana, vive em habitações
construídas com material não apropriado, ou seja, mesmo as famílias da suposta
classe média, com rendimentos médios, ainda vivem em habitações inapropriadas.
A situação continua crítica em relação ao acesso à electricidade. De acordo
com o QUIBB 2011, apenas 36% da população tem acesso à electricidade, sendo
as disparidades entre zona urbana e rural gritantes, pois 60% da população na zona
urbana beneficia de electricidade, mas apenas 4% na zona rural. Também há aqui
uma divergência considerável entre o QUIBB e o IBEP 2008/2009 que assinala um
acesso à electricidade em 40%. Todavia fica claro e evidente que os desafios necessários neste domínio são grandes.
Em relação ao combustível utilizado para cozinhar, mais de 55% da população utiliza combustível sólido: lenha (37%), carvão (18%), palha, cartão ou papelão (0,1%).
O gás é utilizado para cozinhar por 43% dos agregados familiares (74% para a
zona urbana e 5% para a área rural), como se pode ver na figura abaixo. A utilização
de combustíveis sólidos para cozinhar coloca a população exposta ao fumo, justificando, assim, a grande proporção de doenças respiratórias existentes no país que
representam a segunda doença com maior ocorrência, no país, como já ficou dito.
COMBUSTÍVEL UTILIZADO PELAS FAMÍLIAS PARA COZINHAR
18%
1%
1%
Lenha
Gás
37%
Carvão
Petróleo
43%
Electricidade
FONTE: CEIC, a partir do QUIBB 2011.
62
Promessa do Sr. Presidente da República, no início da campanha eleitoral para as
legislativas de 2008.
| 115
CEIC / UCAN
5.3 Água e saneamento
A proporção da população com acesso à água e saneamento apropriados é
outro indicador que merece especial atenção porque define, no caso de Angola,
um problema social bastante preocupante. Segundo o QUIBB 2011, apenas 15% da
população dispõe de água canalizada (o IBEP referia cerca de 8%), cobrindo apenas 26% da população urbana e 38% da população mais rica. As principais fontes
de abastecimento de água potável são, nas áreas urbanas, os tanques (29%) e, nas
áreas rurais, os rios, riachos ou lagoas (47,6%), o que reflecte o nível de vida da
população, independentemente do seu nível de receita.
Por outro lado, segundo o QUIBB 2011, mais de metade da população (62,1%)
bebe água sem qualquer tipo de tratamento, com grandes níveis de disparidade
quanto à área de residência. A população que reside na área rural tem uma probabilidade duas vezes inferior de beber água tratada comparativamente à área urbana (44,4%, na área rural, contra 84,1%, na área urbana). E quanto menor for o nível
de escolaridade do chefe do agregado familiar, menor são as hipóteses dos agregados efectuarem qualquer tipo de tratamento da água para beber.
Em relação ao saneamento básico, segundo o QUIBB 2011, apenas 18% possui
um sistema de esgotos com uma pia ou sanita, 24% possui uma fossa séptica ou
um poço roto, 23% possui uma latrina seca e 25% utiliza o capim, mato ou o ar livre
para fazer as suas necessidades. O nível de saneamento básico tende a ser menor
quanto mais baixo for o nível de escolaridade do chefe do agregado (por exemplo:
60% das pessoas que fazem as suas defecações ao ar livre ou no capim pertencem
a famílias cujos chefes do agregado não têm nenhum nível de escolaridade ou têm
apenas o nível primário).
No domínio do saneamento básico, no que diz respeito à recolha do lixo, segundo o QUIBB 2011, apenas 23% dos agregados familiares depositam o lixo nos locais
apropriados (carros de recolha ou contentores). Um factor intrigante é saber que
36% dos agregados familiares, na zona urbana, deposita o lixo nas lixeiras, contra
28% que o deposita nos contentores. Na zona rural, 69% dos agregados familiares
deposita o lixo ao ar livre e apenas 18% queima-o ou enterra-o.
5.4 Bem-estar e conforto (mobilidade, acesso a informação e novas
tecnologias)
Olhando para os principais indicadores de bem-estar e de conforto, pretende-se analisar os indicadores de bem-estar que influenciam a qualidade de vida
dos angolanos. Para tal seleccionamos a mobilidade, o acesso à informação e
comunicação e o acesso às novas tecnologias.
116 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O acesso à informação e comunicação faz parte dos pré-requisitos de afirmação de um Estado Democrático e de Direito. Actualmente registamos uma revolução tecnológica global neste domínio e Angola procura a sua integração nesta
nova era da comunicação e, segundo o QUIBB 2001, 84% dos agregados familiares
possuem um rádio cassete, 57% possuem um telefone celular (sendo 83% para a
área urbana e 24% para a área rural), 47% possuem um televisor, 29% possuem
um radio cassete com CD. Como a nível global observa-se o desuso do telefone
da rede fixa, apenas 2% dos agregados têm acesso ao telefone da rede fixa (sendo
3% para a área urbana e 0,5% para a área rural) e 4% da população angolana tem
acesso à internet.
No domínio da mobilidade dispõe-se de informação limitada, todavia cruzando alguns indicadores podemos ter uma ideia geral neste campo. No que concerne a posse de meios de transportes, 16% dos agregados familiares possui uma
motorizada, 11% possui um automóvel, 7% possui uma charrua, 7% possui uma
bicicleta, 1% possui uma carroça, 0,6% possui um cavalo ou burro, e apenas 0,3%
possui um tractor. Podemos constatar que há aproximadamente 74% da população que tem necessidade de usar serviços de transportes públicos que são muito
ineficientes.
Embora desprovidos de dados para uma análise mais detalhada, na capital
do país (Luanda) a circulação rodoviária é bastante caótica, muitas vezes de tal
modo capaz de enfurecer o mais pacífico dos homens. Famílias dos agregados
residentes nas zonas circundantes e afastadas do centro da cidade, como Zango, Viana, Cacuaco, Benfica, Ramiros e Kilamba, gastam diariamente várias horas
para fazer o percurso de casa para o centro da cidade e vice-versa, com sérios
impactos na sua qualidade de vida e nos seus níveis de produtividade laboral.
Estudos recentes indicam que cada três (3) horas diárias gastas no trânsito de
casa para o trabalho e vice-versa têm um impacto no nível de produtividade da
pessoa proporcional a uma queda de 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Para o
caso de Angola, onde as pessoas gastam este número de horas somente para um
percurso, podemos imaginar qual é o impacto que o actual estado de circulação
rodoviária tem no nosso PIB.
5.5 Impacto da pobreza sobre a família e a criança
Apesar de não haver nenhum outro estudo relevante sobre a pobreza, não
deixamos de abordar alguns aspectos importantes do bem-estar das famílias. O
IBEP considera que 36,6% da população angolana vive abaixo da linha de pobreza (pobreza absoluta) nacional. Apesar de se notar uma substancial redução dos
índices de pobreza em comparação com o ano 2001, em que se estimava em
| 117
CEIC / UCAN
68% a incidência de pobreza (relativa). De acordo com os dados disponíveis,
podemos afirmar que houve uma redução na taxa de pobreza, mas atendendo
às diferenças na metodologia usada, nas duas análises, é difícil mensurar o nível
real da redução da taxa de incidência da pobreza em Angola. Embora se possa
verificar uma tendência de redução da pobreza, ainda persistem grandes desafios no combate à pobreza e à exclusão social e nas privações sociais (pobreza
não-monetária).
INCIDÊNCIA, INTENSIDADE E SEVERIDADE DA POBREZA EM ANGOLA, IBEP 2008
58%
37%
22%
19%
13%
11%
5%
Incidência
Total
Urbano
Profundidade
6%
2%
Severidade
Rural
FONTE: IBEP, 2008.
Pelos dados do IBEP, a pobreza é mais acentuada na zona rural, havendo 58%
da população a viver abaixo da linha de pobreza, estimada em $1,763. Cerca de 62%
dos mais pobres não têm qualquer nível de escolaridade. O impacto da pobreza é
maior nos agregados familiares com mais de 7 pessoas, onde 44% destes vivem
abaixo da linha de pobreza.
Segundo o QUIBB 2011, 61% dos agregados familiares faz apenas uma ou duas
refeições por dia, embora a nível internacional se recomende uma dieta alimentar
com três refeições por dia, no mínimo. As disparidades são grandes quando analisadas por área de residência, sendo 52% para a área urbana, e apenas 24% fazem
três ou mais refeições por dia. A pobreza abate mais as famílias em que o chefe do
agregado familiar trabalha por conta própria ou no sector agrícola. Isto exige a reestruturação dos planos e políticas públicas para o reforço do empreendedorismo,
63 Rácio diário por cada adulto equivalente, IBEP 2008.
118 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
de programas de geração de rendimento e formação, de modo a melhorar os rendimentos para o sustento das suas famílias.
INCIDÊNCIA DA POBREZA POR REGIÃO DE ANGOLA
Norte
Capital
Centro
Norte
Centro
Leste
Sul
8,6%
51,0%
34,2%
52,6%
39,5%
54,8%
FONTE: IBEP, 2008.
As taxas de incidência da pobreza, segundo o IBEP, variam significativamente
do meio rural para o urbano e entre as diferentes regiões do país. Na região centro (Benguela, Bié, Huambo), a taxa de incidência é de, aproximadamente, 55%;
nas regiões do centro-norte de 53%; nas regiões leste e sul, situa-se no intervalo
de 40 a 50; a região norte de 34% e a capital (Luanda) tem uma taxa de incidência
muito inferior, quando comparada ao resto do país, apenas de 9% contra a média
nacional de 36,6%. Deste modo, indagamos os critérios de atribuição de recursos,
no âmbito do Programa Integrado de Combate à Pobreza e Desenvolvimento Rural,
cuja alocação por região é bastante questionada.
| 119
CEIC / UCAN
DISTRIBUIÇÃO DAS RECEITAS POR QUINTIS DE RENDIMENTO
59% 59%
55%
19% 19% 20%
3% 3% 4%
Mais pobre
7% 7% 8%
Segundo
Angola
12% 12% 13%
Médio
Urbano
Quarto
Mais rico
Rural
FONTE: IBEP, 2008.
Há desigualdade na distribuição de receitas. O quinto quintil (ou seja, os 20%
da população mais rica) detém 59% de todas as receitas do país, enquanto o primeiro quintil (ou seja, os 20% da população mais pobre) detém apenas 3% das
receitas do país. Por outras palavras, a receita média de uma pessoa no quintil mais
rico é 18 vezes mais alta do que a receita média de uma pessoa no quintil mais
pobre. Estes dados justificam a necessidade de programas e intervenções cada vez
mais sérias que visem aplicar o slogan “Angola crescer mais e distribuir melhor”,
como premissa básica para a equidade social.
A Constituição da República de Angola consagra um conjunto de “direitos
económicos, sociais e culturais” e estabelece a responsabilidade do Estado como
agente promotor do desenvolvimento social, nomeadamente por meio da “adopção de critérios de redistribuição da riqueza que privilegiem os cidadãos e, em
particular, os extractos sociais mais vulneráveis e carentes da sociedade” (Artigo
90.o, CRA).
5.6 Os 11 compromissos com a criança e o Orçamento Geral do Estado
Durante anos a fio o Estado proclamou o slogan “à criança tudo que ela merece”, sem que este chavão tivesse, no entanto, uma tradução prática nas políticas
e acções públicas ou simplesmente na organização dos órgãos executivos. A Constituição de 2010 veio reafirmar que “as crianças constituem absoluta prioridade,
pelo que gozam de especial protecção da Família, do Estado e da Sociedade com
vista ao seu desenvolvimento integral” (Artigo 30.o, CRA).
Os 11 compromissos com a criança angolana constituem um marco referencial
de política e acção a favor da criança e assumiram a forma de lei através da Lei
120 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Em 2007, durante o III Fórum Nacional
sobre a Criança, foram estabelecidos
11 compromissos para com a criança, a serem assumidos pelo Estado,
pela sociedade e pelas famílias. Estes
11 compromissos para com a criança
foram actualizados, no V Fórum, em
Junho de 2011.
Os 11 compromissos abrangem as seguintes áreas:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
A esperança de vida.
Segurança alimentar nutricional.
Registo de nascimento.
Educação da primeira infância.
Educação primária.
Justiça juvenil.
Prevenção e educação do impacto
do VIH/SIDA nas famílias e nas
crianças.
8. Prevenção e mitigação da violência contra a criança.
9. Competências familiares.
10. Criança e comunicação social.
11. A Criança no Orçamento Geral do
Estado.
sobre a Protecção e o Desenvolvimento Integral da Criança (Lei 25/12, de 22 de Agosto).
Mas, malgrado a existência deste dispositivo legal, do estabelecimento de políticas pró
criança e da criação de várias estruturas do
Estado, da sociedade civil e das igrejas para
a protecção da criança, os 11 compromissos
são pouco conhecidos e não têm encontrado uma concretização prática extraordinária
como era de se esperar perante a situação
real da criança angolana.
Por esta razão, achamos interessante
analisar como este compromisso nacional
é enquadrado no Orçamento Geral do Estado que é o principal documento de execução das políticas e programas públicos e que
exerce uma forte influência no desempenho
dos demais actores sociais.
5.7 Despesas com a família e infância
As crianças garantem a continuidade das gerações e são o futuro duma sociedade, por isso a forma como elas são cuidadas, tratadas e educadas dita o tipo de
pessoas adultas que serão no futuro. Mas, para que as crianças se desenvolvam
de uma forma sadia precisam de todo o apoio, quer das famílias, quer do Estado.
O gráfico abaixo mostra as dotações orçamentais que explicitamente são destinadas às crianças e às suas famílias.
DESPESAS PÚBLICAS COM A FAMÍLIA E INFÂNCIA (MIL MILHÕES DE KWANZAS)
158,03
117,72
115,26
76,99
11,75
2010
12,99
2011
&ĂŵşůŝĂĞ/ŶĨąŶĐŝĂ
7,17
2012
9,79
2013
Velhice
FONTE: OGE (2010-2013).
| 121
CEIC / UCAN
Como podemos ver em 2010 foram alocados 11,75 mil milhões de Kwanzas à
família e à infância; em 2011, verificou-se um pequeno acréscimo, mas em 2012
houve uma queda significativa e, em 2013, aumentou-se as verbas moderadamente mas não chegou a atingir os níveis de 2010 e 2011.
Nota-se claramente que não há uma consistência em termos de dotações que
são alocadas à família e à infância e que são verbas muito baixas, comparadas
com os valores que são alocados para os idosos64, embora os idosos sejam muito
menos e muitos deles tenham segurança social, garantida pelos anos de trabalho
e de desconto.
É importante realçar também que em termos de execução orçamental, as despesas com a protecção social (de que faz parte a despesa com a família e a infância)
são as que tiveram a menor taxa de execução em 2012, na ordem de 27,4% das
despesas, até o terceiro trimestre daquele ano.
642‘„˜‹‘“—‡‡••ƒ…‘’ƒ”ƒ­ ‘ ‘†‡˜‡•‡”Ž‡˜ƒ†ƒƒ‘‡š–”‡‘ǡ’‘‹•‘…ƒ•‘‡•’‡…Àϐ‹…‘
de Angola percebe-se que muito idosos vivem com as suas famílias e as dotações orçamentais que eventualmente venham a receber as gastam junto com as famílias de que
as crianças também são parte.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
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6.1 Introdução
A acepção sobre segurança alimentar tem evoluído ao longo do tempo, deslocando-se da compreensão produtivista a uma visão mais abrangente e integradora, incluindo as dimensões de disponibilidade, acesso, utilização, estabilidade
e outras. A segurança alimentar é multissectorial, é uma política pública, no país,
desde 2009, e tem uma dimensão internacional pelas convenções ratificadas pelo
Estado angolano. O país possui imensas potencialidades agrárias e pesqueiras para
a promoção da auto-suficiência alimentar. Depois do fim do conflito armado, a produção agrícola e pecuária tem aumentado, mas a disponibilidade geral de alimentos produzidos internamente é deficitária, o acesso é um problema e a qualidade
é fraca. Há riscos e choques à segurança alimentar, seja de natureza económica,
agrícola e de calamidades naturais, tal como a seca e a irregularidade das chuvas que ainda afectam a segurança alimentar de centenas de milhares ou milhões
de pessoas. Existem variações de situações de segurança alimentar e nutricional
no país, pela diversidade ambiental e de recursos disponíveis, e estudos indicam
haver mais insegurança alimentar grave do que de outros níveis.
A segurança alimentar e nutricional é um tema presente no dia-a-dia dos cidadãos, seja pelo sabor do que se come, das informações de preços dos alimentos,
sejam as decisões de políticas que afectam os alimentos e outras variáveis.
Os cidadãos obtêm os seus alimentos pela produção própria, por compra a
dinheiro ou permuta, e por doacções, transferências ou remessas. Dos nossos rendimentos, a coisa mais importante é a satisfação das necessidades fisiológicas básicas que incluem a alimentação.
A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) estima que no mundo existem cerca de 600 milhões de pessoas que passam fome.
Em Angola, os dados do IBEP referem que os níveis de pobreza65 são de 58,3 % no
meio rural e 18,7 % nas zonas urbanas66.
65 Dados do IBEP, INE, Luanda, 2011.
66
Este índice de pobreza considera como limiar de pobreza uma renda de 1,25 USD/
dia/per capita.
| 123
CEIC / UCAN
O debate sobre segurança alimentar tem evoluído, embora de forma lenta. As
organizações da sociedade civil, através das ONG, foram as primeiras a trazer esta
dimensão, no trabalho concreto em projectos de desenvolvimento comunitário,
nos workshops e nos estudos e pesquisas. Nos últimos anos, com o surgimento do
Gabinete de Segurança Alimentar, os estudos sobre este tema aumentaram sobremaneira. Em 2009, o Governo de Angola aprovou a Estratégia Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional vinculada às Convenções Internacionais, Regionais e
outras Organizações Internacionais.
Neste capítulo pretende-se contribuir para o debate sobre segurança alimentar
e nutricional, seguindo um plano de exposição que tem uma parte introdutória,
seguido da sua conceptualização e depois de considerações sobre segurança alimentar e nutricional, enquanto política pública do Estado, sua dimensão internacional, seguido de uma parte sobre o potencial de Angola para a produção agrícola
e pecuária para mais adiante trazer relatos, casos e fragmentos de situações relacionadas com a segurança alimentar e nutricional nas suas dimensões de disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade, na tentativa de ligar a teoria à prática.
Para fechar o capítulo, há um subcapítulo com o resumo de alguns resultados de
pesquisas e estudos sobre segurança alimentar e nutricional.
6.2 Antecedentes do termo segurança alimentar
O termo segurança alimentar tem origem militar, e surge pela primeira vez
depois da 1.a Guerra Mundial. Compreendia-se que um país poderia dominar o
outro se tivesse controlo sobre o seu fornecimento de alimentos, sendo assim uma
arma poderosa para dominar um país militarmente fraco no plano militar e incapaz de produzir com suficiência os seus alimentos. Neste sentido, a importância
de cada país ter reservas alimentares era uma questão de segurança nacional. Esta
concepção vinculava a questão da alimentação exclusivamente à capacidade de
produção, portanto, tinha um condão produtivista que se manteve até à década
de 1970. Durante a realização da 1.a Conferência Internacional de Segurança Alimentar, promovida pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e
a Alimentação), em 1974, esta corrente que relacionava estritamente a segurança alimentar à produção agrícola prevalecia. Ademais, era um momento em que
os stocks de alimentos, eram bastantes escassos, com quebras de produção em
importantes países produtores. Esta situação veio fortalecer o discurso e o apelo
à necessidade de uma Revolução Verde a nível mundial, pelos interesses da indústria química que achava que o flagelo da fome e da malnutrição só poderiam ser
superados com o aumento da produção agrícola, com recurso à utilização massiva
de insumos químicos – fertilizantes e agro-tóxicos. Como resultado da Revolução
Verde, a produção aumentou, não como era suposto. Entretanto, os problemas
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
da fome e da malnutrição persistiam e persistem em várias partes do mundo. Só
mais tarde é que a evolução do conceito de segurança alimentar incorporou outras
dimensões (MENEZES, 2012).
6.3 Identidade conceitual sobre segurança alimentar
A Estratégia Nacional de Segurança Alimentar (ENSAN) adoptou a definição
aprovada na Cimeira Mundial da Alimentação (CMA), realizada em Roma, em
Novembro de 1996, que consagra uma visão holística e integradora, segundo a
qual “existe segurança alimentar quando as pessoas têm, de forma permanente,
acesso físico e económico a alimentos seguros, nutritivos e suficientes para satisfazer as suas necessidades dietéticas e preferências alimentares, a fim de levarem
uma vida activa e saudável”. Esta concepção aponta para a existência de várias
dimensões que precisam de estar presentes em simultâneo, como a disponibilidade dos alimentos, o acesso aos alimentos, o consumo e a utilização dos alimentos
e a estabilidade dos alimentos.
A literatura apresenta diferentes conceitos e definições. Um deles refere-se
ao acesso permanente, físico e económico, de todas as pessoas a uma alimentação suficiente e de qualidade, com vista a garantir uma vida activa e saudável. Outros autores enfatizam que a análise da segurança alimentar e nutricional
consiste no acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais.
Outros ainda destacam o acesso aos alimentos, e defendem que a segurança
alimentar e nutricional engloba não apenas comer regularmente, mas também
comer alimentos de qualidade e adequados aos hábitos culturais, com base em
práticas saudáveis e que preservem o prazer ligado à alimentação (CPDA/UFRJ,
2007, citado por ADRA, 2012). São vários enfoques conceptuais, quer centrados
no acesso, na qualidade orientado pela oferta e outro pelo lado da procura. O
conceito adoptado na ENSAN é teoricamente satisfatório e complexo de efectivar na prática.
A insegurança alimentar e nutricional é a condição em que as pessoas estão
incapacitadas de adquirir alimentos suficientes em qualquer momento. A insegurança alimentar pode ser leve, moderada e grave. Ela é grave quando há falta persistente de acesso aos alimentos causada por factores históricos como pobreza,
baixa fertilidade do solo, baixa educação nutricional e persistência de doenças crónicas. Também pode considerar-se insegurança alimentar transitória ou corrente,
a falta temporária de acesso aos alimentos que é frequentemente causada pela
ocorrência inesperada de um choque, como por exemplo, a seca, as cheias, a baixa brusca da produção de alimentos, a subida precipitada e a alta de preços dos
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CEIC / UCAN
alimentos. Algumas evidências são as cheias no Cunene antes de 2010 e as irregularidades na precipitação e seca há três anos, cujo impacto ainda se sente hoje.
6.4 Conceitos relacionados à segurança alimentar e nutricional
Como foi referido, existem outros conceitos relacionados à segurança alimentar e nutricional. A disponibilidade de alimentos refere-se à quantidade de alimentos que pode provir da produção própria, importações, reservas, ajuda alimentar
ou remessas. O acesso aos alimentos tem a ver com a capacidade das pessoas de
adquirirem alimentos por compra ou troca. A utilização que diz respeito ao processo (escolha, processamento, confecção e distribuição dos alimentos pelos membros da família) de consumo dos alimentos numa dieta adequada. A estabilidade
tem uma relação ao acesso permanente, assim como à qualidade dos alimentos.
Na segurança alimentar e nutricional, os riscos são os factores de pressão a que
os agregados familiares estão sujeitos que opõem a manutenção da sua segurança alimentar. Os choques referem-se aos riscos ocorridos, que provocam o rompimento nos mecanismos de acesso a alimentos, tornando os agregados familiares
vulneráveis.
A vulnerabilidade à insegurança alimentar são os riscos a que os indivíduos,
famílias e/ou comunidades estão expostos, pondo em causa o acesso e a disponibilidade dos alimentos. Isso ocorre nos agregados familiares que não satisfazem
as suas necessidades alimentares (2,100 kcal/dia/pessoa) num dado período de
tempo. As manifestações de Insegurança Alimentar são a fome e a malnutrição. O
subsistema de promoção da segurança alimentar e nutricional consiste nos espaços institucionais onde os marcos de regulação e participação de todo o sistema
agro-alimentar, bem como as políticas sociais que intervêm no funcionamento dos
sistemas, ou seja, o quadro político-institucional de referência: o sector público, a
sociedade civil, o sector privado e os espaços políticos de concertação.
Os meios de sustento são o sistema alimentar que compreende um nível adequado de reservas e um fluxo de alimentos e dinheiro gerados por um conjunto
de recursos como humanos, sociais, naturais, físicos e financeiros. Este conjunto
de recursos geradores de alimentos e rendimentos constituem os meios de sustento de uma família ou comunidade. O acesso, o uso e a interacção destes recursos servem como base dos meios de sustento também conhecidas como zonas
de economia agro-alimentar. Na mesma zona de sustento as pessoas têm as mesmas oportunidades de gerar renda pois estão influenciadas pelo mesmo ambiente,
pelos mesmos hábitos culturais, e têm em princípio acesso às mesmas infra-estruturas sociais e económicas. As zonas de sustento nem sempre coincidem com as
divisões administrativas convencionais (GSA, 2009).
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
6.5 Política pública da segurança alimentar e nutricional
O marco legal sobre Segurança Alimentar e Nutricional é o de 2009, quando o
Governo aprovou, em forma de Lei, depois de um processo de consulta pública, a
Estratégia Nacional de Segurança Alimentar e Nutrição (ENSAN) e o respectivo Plano Nacional de Segurança Alimentar (PASAN), que descreve as acções e o quadro
institucional de orientação dos diferentes sectores na implementação da ENSAN. A
ENSAN prevê a institucionalização do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (CONSAN), órgão de governação de natureza consultiva que teria correspondentes ao nível provincial e municipal com participação do sector público,
sector privado e sociedade civil, assim como um sistema de financiamento e monitorização do PASAN. Na prática, a ENSAN não está a ser implementada tal como foi
concebida e aprovada (ENSAN, 2009).
O Fórum do Sector Público sobre Agricultura Familiar na Perspectiva da Segurança Alimentar, realizado em Dezembro de 2013, recomendou a retomada da
ENSAN na sua concepção inicial, sobretudo em termos de Órgãos de Governação. O 1.o Fórum Nacional da Sociedade Civil sobre Segurança Alimentar realizado
em Setembro do mesmo ano também se pronunciou no mesmo sentido de retomar a ENSAN. Ainda há esperança que este importante instrumento de política
pública seja realmente o que poderia conformar e dar consistência e coerência
programática, monitorização e melhoria da articulação e coordenação intersectorial e interinstitucional na implementação das políticas públicas que concorrem à
ENSAN, seja no domínio da comercialização rural, das terras, do crédito agrícola,
das sementes, da nutrição, da água, do combate à pobreza, das pescas, dos recursos biológicos aquáticos, da defesa do consumidor, da agro-indústria e de outras.
A ENSAN possui uma dimensão internacional por via das convenções que Angola subscreveu e ratificou, seja das Nações Unidas, por exemplo, a Declaração de
Roma resultante da Cimeira Mundial da Alimentação (CMA), realizada em Roma,
em Novembro de 1996, e os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM)
aprovados na Cimeira do Milénio, realizada pelas Nações Unidas, no ano de 2000.
Também existem instrumentos ao nível da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD), da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral
(SADC) e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) (ENSAN, 2009).
6.6 Potencial para promover segurança alimentar e nutricional
Angola possui um potencial de produção agrária: adequada precipitação pluviométrica e abundantes recursos marinhos; milhões de terras aráveis e agricultáveis; solos em quantidade e qualidade; recursos hídricos subterrâneos; recursos
hídricos superficiais com 7 bacias hidrográficas e 18 principais com riqueza e
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CEIC / UCAN
variadíssimas lagoas ricas em biodiversidade e peixe; recursos fitogenéticos, diversidade com 5 zonas agro-ecológicas e cerca de 34 zonas agrícolas. Mais de 1/3 da
população depende da agricultura itinerante e de sequeiro na época chuvosa que
corresponde aos meses de Setembro a Abril. A agricultura familiar é responsável
por cerca de 95% da produção total de cereais e leguminosas. Cerca de 98% das
explorações agrícolas é detida pela agricultura familiar que possui vários níveis, e
há estudos que apontam pelo menos cinco níveis de desenvolvimento, em termos
de características sociais, recursos disponíveis – terra em quantidade, qualidade e
segurança, mão-de-obra, capital e culturas agrícolas praticadas. A agricultura familiar assegura a produção e comercialização da maioria das culturas alimentares.
De acordo com os dados do Ministério da Agricultura67, existem em Angola 1,6
milhões de produtores familiares agrupados em associações, em cooperativas e de
forma individual em empresas agrícolas familiares. Existem centenas de produtores intermédios. Ainda existem algumas dezenas de empresários de maior dimensão, e está a nascer um sector do agro-negócio, que inclui os pólos agro-industriais
de capital financeiro estrangeiro ou misto com capital financeiro público68.
As principais culturas alimentares são os cereais (milho, massambala, massango e arroz), as leguminosas (feijão e amendoim), as raízes e os tubérculos (mandioca, batata-doce, batata comum e tubérculos em geral), as hortícolas e as fruteiras.
Dados do Ministério da Agricultura69 dizem que o efectivo de gado bovino é de
4.586.570 cabeças e o sector tradicional ou familiar detém a maioria do gado, com
76%, concentrado nas províncias do Cunene, Huíla e Namibe, em que as populações rurais detêm uma economia de autoconsumo com o leite, o que levou a
designar-se esta vasta área por região do “complexo de ordenha” (Correia & Santos, 1996).
6.7 Segurança alimentar e nutricional na dimensão da disponibilidade
A disponibilidade de alimentos é alcançada quando a produção interna dos sectores de agricultura, pecuária, pescas, a importação e o aprovisionamento dos alimentos, asseguram, em quantidade e qualidade sanitária, nutricional e biológica,
o normal e regular abastecimento dos mercados.
De acordo com dados da FAO, a segurança alimentar é uma questão crucial
para Angola, assim como para grande parte dos países africanos. Num ranking de
67
Citado in Relatório Económico de Angola 2012, Centro de Estudos e Investigação
‹‡–Àϐ‹…ƒ†ƒ‹˜‡”•‹†ƒ†‡Católica de Angola, Luanda, Junho de 2013, p. 65.
68 Ibidem, Relatório Económico de Angola 2012, p. 66.
69 Ibidem, Relatório Económico de Angola 2012, p. 68.
128 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
105 países, Angola ocupa a 101.a posição em consumo de calorias por dia por pessoa. Um grande desafio para o país é conseguir que o sector agrícola recupere a
posição que ocupava antes da guerra civil, encerrada em 2002, e do período anterior à independência, ocorrida em 1975.
De acordo com os dados do sistema da ONU em Angola, citando fontes do
MINAGRI, a necessidade de cereais para Angola se tornar auto-suficiente é de 2,43
milhões de toneladas e o país produz somente 1 milhão de toneladas por ano de
cereais.
As alterações climáticas que se reflectem nos prolongados períodos de estiagem que variam, de região para região, estão a provocar a redução da produção
agrícola. O ano agrícola 2011-2012 foi muito prejudicado, em termos de produção,
devido aos efeitos de uma significativa irregularidade pluviométrica, traduzida por
prolongado período de estiagem, variáveis de umas regiões para outras, sendo
que dos 5,6 milhões de hectares semeados, o MINADER, citado pelo CEIC (2012),
estima tenham sido colhidas apenas 3,1 milhões, o que dá uma ideia dos prejuízos
causados. Dados do MINAGRI, citados pelo CEIC (2012), referem uma produção
de cereais, em 2009/2010, de 1.177.948 toneladas, tendo aumentado 11,9%, no
ano de 2010/2011, e 19,6%, no ano agrícola de 2011/2012, e baixado para menos
64%. As leguminosas/oleaginosas aumentaram 2%, em 2009/2010, e aumentaram
27,2%, em 2010/2011, e desceram 63,7%, em 2011/2012. As raízes e as hortícolas
também baixaram, enquanto as frutícolas aumentaram.
As áreas cultivadas sem qualquer recurso mecânico foram de 5,1 milhões de
hectares, o que equivale a mais de 97%, e as restantes áreas foram trabalhadas
com tractor, cerca de 2%, e com tracção animal, menos de 0,5%. Existe um baixo
nível tecnológico na agricultura (CEIC, 2012).
6.8 Casos locais de disponibilidade e acesso na segurança alimentar
Os conceitos e quadros de referência são importantes à compreensão da segurança alimentar e nutricional. Porém, se se adicionar o conhecimento local sobre a
complexidade destes conceitos na vida real ajuda à compreensão de outra maneira mais concreta e operacional de segurança alimentar e nutricional e afins. Nesta
secção apresentam-se três casos de municípios em regiões agro-ecológicas e zonas
agrícolas diferenciadas70, apesar de serem representativos de todo o país.
70•‹ˆ‘”ƒ­Ù‡•…‹–ƒ†ƒ•‡•–‡•…ƒ•‘•• ‘†‘•‡”ϐ‹•—‹…‹’ƒ‹•†‘•”‡•’‡…–‹˜‘•—‹-
cípios, cujos documentos públicos eram ainda rascunhos.
| 129
CEIC / UCAN
Caso do Município do Puri no Uíge
No município do Puri no Uíge há disponibilidade de terra, solos de qualidade e
chove o suficiente para a agricultura. A agricultura é praticada por 844071 camponeses organizados em associações e cooperativas agrícolas e a área média por família é
de 2 a 4 hectares; existem 28 pequenos e médios agricultores com extensão de terra
até 100 hectares; a preparação da terra é feita manualmente e usam tracção animal.
As principais culturas são a mandioca que é cultivada durante todo o ano –
uma cultura de segurança alimentar a longo prazo, possibilitando às famílias irem
de encontro às necessidades do consumo alimentar e outras necessidades financeiras com a venda da fuba de bombó, amendoim, milho consumido fresco, feijão,
batata-doce e rena, banana e café em poucas quantidades dada a sua pouca procura. Existem também árvores de fruto: citrinos, abacateiros, mangas, maracujá,
cana-de-açúcar. Produz algumas hortícolas nas margens dos rios, faz-se cultura de
regadio que são as nacas. As sementes utilizadas são principalmente reservas dos
anos anteriores, ou adquiridas nos mercados locais.
A produção são os bovinos, caprinos, ovinos, suínos e aves que funcionam como
reserva económica e segurança social – doenças, óbitos – e na educação na compra
de material escolar para os filhos, pagar matrículas e propinas. O consumo desses
animais pela família é muito baixo e só acontece em ocasiões especiais. Há pessoas a
dedicarem-se à criação de gado bovino, que se observa ao longo das estradas principais e nas margens dos rios. Os principais problemas enfrentados com a criação dos
animais são os conflitos entre vizinhos ou parentes quando os animais destroem as
plantações, ataques por doenças e animais selvagens, e constantes roubos dos animais. Não existem fármacos nem veterinários no município.
Há caça praticada enquanto actividade económica e mais praticada no tempo
seco e feita por homens jovens e idosos e diz-se que os animais estão a escassear.
A carne é consumida e vendida fresca e seca. A pesca é artesanal com anzol, armadilhas, cestos e redes. As capturas estão a diminuir devido à utilização de produtos
químicos (veneno) para pescar.
A sul do município existem áreas com escassez alimentar e os agregados familiares fazem só uma refeição por dia e não foram reportados casos de malnutrição.
O comércio informal é predominante, mas relativamente fraco, com três mercados informais na Sede. Nos mercados informais é autorizada a venda mediante
a passagem de um cartão e o pagamento de uma taxa diária.
FONTE: Perfil da Administração Municipal do Puri na província do Uíge.71
71ƒ†‘•†‘ƒ‘ʹͲͳͳǡˆ‘–‡†‘‡”ϐ‹Ž—‹…‹’ƒŽǤ
130 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Município de Kambundi Katembo em Malanje
O município de Kambundi Katembo em Malanje com clima bom para a agricultura, solos em quatidade e qualidade. Existem 48 Associações de Camponeses e 3
Cooperativas, sendo 6378 famílias, 3 das associações e 3 são de pesca artesanal.
A agricultura é a principal actividade económica da população do município.
Há disponibilidade de terras para todos e o acesso, uso e usufruto da terra rege-se
pelo direito costumeiro e não há terras legalizados pela lei formal; média das áreas
cultivadas pelo sector camponês é de 1 a 2 hectares, a terra é trabalhada de forma
manual; os poucos agricultores com fazendas é que preparam as suas terras com
máquinas (tractores).
As principais culturas praticadas são a mandioca, o arroz, a banana, o feijão e
a ginguba, o inhame, o milho e a batata-doce e rena. O girassol no passado (era
colonial) foi uma das grandes produções agrícolas ao lado do arroz.
A actividade pecuária no município é pouco expressiva à excepção das aves e
caprinos. A pesca é considerada segunda actividade geradora de rendimento no
município e é feita nas lagoas e nos rios que são ricos em peixe72. A pesca é realizada com redes e canoas ou manualmente pelas mulheres usando o “muzua” – cesto
de pesca artesanal. O peixe é consumido quase todos os dias, seja fresco, seco ou
fumado.
A caça é outra actividade geradora de rendimento e é ainda furtiva e pouco
regulada. Os principais compradores de carne de caça são os comerciantes ambulantes que vêm de Malanje ou de Luanda.
Pratica-se a apicultura, principalmente na zona Leste do município.
A alimentação básica das famílias está assegurada e os níveis de produção permitem a reserva de alimentos para as épocas de crise, principalmente a mandioca. As famílias fazem normalmente 3 refeições por dia. A dieta alimentar também
se considera equilibrada, pois há grande disponibilidade de peixe e carne de caça,
para além das verduras que garantem a variabilidade e o equilíbrio da dieta.
A rede comercial formal não existe mas apenas pequenas cantinas, resultantes
de iniciativas individuais.
O comércio informal existe e é assegurado por pequenas praças que garantem
o abastecimento de bens de primeira necessidade, embora a maioria das mercadorias seja de bebidas alcoólicas.
FONTE: Perfil da Administração Municipal de Kambundi Katembo na Província de Malanje.72
72 O bagre e o cacusso.
| 131
CEIC / UCAN
Caso do município de Cuvelai no Cunene
No município de Cuvelai, na província do Cunene, produz-se milho, massango, massambala, amendoim, mandioca, batata-doce e rena, feijão comum e feijão
macunde.
A produção familiar é feita em 4 hectares em média e o sistema de produção dos
cereais faz-se nas parcelas designadas: Omalunda – lugares onde o gado pernoita
por mais de dois meses (antigos currais); Onohenda – lugares recém-desmatados
para nova produção; e Onaka – lugares à beira dos rios, riachos ou acumulações de
água; Ovivundo – lugar usado na produção de mandioca e batata-doce e é, geralmente, cercado por espinheiros.
A produção é feita maioritariamente com tracção animal. O processo de sachas
– amanhas culturais – varia, tanto pode ser manual como por tracção animal.
A colheita é manual com recurso a pequenos recipientes (Ovimbala) e a debulha
é, igualmente, manual. Existe o costume de entreajuda designado de Ondjambi na
lavoura, na colheita ou mesmo na debulha.
A massambala nas comunas da Mupa e Kalonga. Milho na parte Leste e Norte da comuna do Mukolongondyo e na comuna do Cubati Jinguba, batata-doce e
mandioca nas comunas de Mukolongondyo e Cubati.
Da produção agrícola, uma parte é seleccionada para semente e outra para
reserva alimentar. A outra destina-se para fins comerciais – venda directa ou troca
directa. Há ainda outra parte da produção para apoiar festas, óbitos, solidariedade
com os vizinhos ou entre os membros da mesma família.
A produção do massango e da massambala nesta zona tem a facilidade da conservação se manter por muitos anos.
A massambala resiste à seca e às inundações que são frequentes.
A pecuária é o gado bovino, caprino, suíno e galináceo. Existe gado bovino que
assume um papel de capital acumulado do património familiar, usado em casos de
crises de fome para permuta com alimentação, festas tradicionais, óbitos, casamentos, pagamentos de multas ou para reparar danos, aquisição de insumos agrícolas. O gado produz estrume para fertilizar o solo, tracção animal, leite, pele e
outros. O “proprietário” distribui o gado por vários ehumbos, de maneio baseado
em critérios hidro pastoris e sociais, e faz parte do sistema de redistribuição social
dos recursos. O Cuvelai é uma zona de transumância e está sujeita a pestes bovinas
que ciclicamente resultam em muitas mortes de animais.
A pesca tem importância na economia das populações locais e faz-se com anzol
em águas correntes do rio e outros lugares de permanência temporária das águas.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
A exploração de mel é feita de forma livre e há produtores tradicionais.
A actividade comercial é a segunda mais importante para os habitantes do
município e muito influenciada pela proximidade com a Namíbia. Existe um
único mercado informal e lojas ao longo das estradas principais.
FONTE: Perfil da Administração Municipal de Cuvelai na Província do Cunene.
6.9 Segurança alimentar e nutricional na dimensão do acesso
O acesso aos alimentos refere-se à capacidade dos indivíduos para adquirir
alimentos apropriados a uma dieta nutritiva por meio de recursos adequados.
O acesso aos alimentos pode ser de ordem física – quando os cidadãos têm pleno
acesso aos meios produtivos: terra, água, sementes, fertilizantes, assim como ao
bom funcionamento dos mercados e boas vias de comunicação, permitindo que
os alimentos produzidos internamente ou importados cheguem, de forma ágil e
regular, ao consumidor; ou de ordem económica – quando as famílias têm recursos económicos suficientes para cobrirem as suas necessidades alimentares básicas, sem prejuízo da satisfação de outras necessidades primárias, como sejam a
habitação, a saúde, a educação e a informação. A dimensão do acesso está muito
relacionada com as fontes de rendimentos, que, por sua vez, estão intimamente
ligadas ao acesso à educação e formação, ao emprego e auto-emprego, ao acesso
ao crédito e à dinamização diversificada de actividades geradoras de rendimentos.
O acesso não é sobre o que as pessoas comem, mas como elas conseguem comida. Existem três formas de acesso, a saber, produção própria, compra ou permuta
e doações ou transferência de alimentos.
A primeira forma de acesso aos alimentos é a produção própria de alimentos
da agricultura, da pecuária e da silvicultura. No caso do nosso país, esta produção
faz-se em regiões agro-ecológicas, em zonas agrícolas ou em zonas socioeconómicas dos povos locais.
Dados da avaliação rápida do impacto da estiagem na segurança alimentar
das populações agrícolas em Angola, em 2012, “Estudo de Caso das províncias do
Huambo, Huíla, Malanje e Benguela”, comissionada pela Norwegian Church Aid
(NCA) aponta os seguintes aspectos do Huambo: o feijão é cultura de rendimento
que não rendeu nem na 1.a nem na 2.a época devido à estiagem; as culturas que
sustentam as famílias são o milho e o feijão e foram estas as mais afectadas; a criação de animais é pouca e não pode suprir as carências alimentares e de rendimento
das famílias mais vulneráveis. A próxima campanha agrícola começa em Novembro
e vai durar 5 meses até Março, quando acontecem as colheitas, mas não existem
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CEIC / UCAN
reservas para as famílias camponesas se manterem até lá. Em Junho-Julho, os camponeses já estavam a utilizar as reservas para o seu consumo diário. Espera-se que
em Setembro-Outubro se esteja já a viver uma situação de fome nas comunas mais
afectadas pela estiagem. A estiagem vai provocar a antecipação da transumância,
em Agosto, devido à escassez de pastos, e em Setembro a situação será grave com
a falta também de água para o gado beber.
Como já foi referido, no caso do Cuvelai, para os pastores do Sudeste de Angola, a principal fonte da sua economia é a criação de gado bovino, caprino, ovino,
que conforma o estatuto social, o poder e o status dos proprietários de muito
gado. Existe um sistema complexo de titularidade e propriedade do gado que não
é tão simples de descodificar. O gado pode ser propriedade da linhagem materna
ou matrilinear que é herdado pelos sobrinhos do “proprietário” – filhos da sua
irmã do ventre da mesma mãe. Este gado não se toca para vender, sacrificar de
qualquer maneira, porque está sujeito a um controlo social familiar. O outro gado
pode ser propriedade da linhagem paterna ou patrilinear. Depois há o gado adquirido por meios próprios, por exemplo, prestando serviços. Este gado pode ser vendido, oferecido e trocado sem grandes restrições. Por regra, o “proprietário” com
muitas manadas, redistribui-as por várias famílias que as cuidam e beneficiam do
estrume, da tracção animal, do leite, da pele e de parte da carne quando se mata
um animal. No tempo de cacimbo fazem-se muitas festas e sacrificam-se animais
para consumo com massiva participação de membros da comunidade e outros,
que envolve mitos e rituais de consumo de carne de boi. As cerimónias e festas
sociais têm a ver com a circuncisão dos rapazes, a puberdade das raparigas e a
evocação dos espíritos dos antepassados. O gado é o seu capital e funciona como
poupança, fonte de rendimento e participação no sistema de redistribuição social
que é parte da segurança alimentar.
Em algumas zonas desta região, face aos condicionalismos climáticos, no que
tange à escassez de chuva e à sua irregularidade, a agricultura de sequeiro é uma
actividade quase marginal, limitando-se à exploração de pequenos espaços de
terreno nas vizinhanças das habitações, com base na cultura de cereais, menos
exigentes em humidade, como a massambala (shorgum vulgare) e o massango
(pennisetum). O milho é reservado para as terras mais pesadas. A actividade pastoril subordina-se exclusivamente às condições do meio, com o aproveitamento dos
recursos pascigosos naturais, o que lhes dá grandes vantagens na criação de gado
bovino, fortalecendo assim a segurança alimentar que, naquela região, de vez em
quando é exposta a choques naturais como a seca.
O leite é a alimentação de base com o massango, massambala, milho, carne e
verduras, porém, na zona agrícola do Cuanhama, com chanas, em determinadas
134 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
épocas do ano, as populações dispõem de inundação de quantidades apreciáveis
de peixe que é aproveitada pela população como estratégia de segurança alimentar.
Os pastores e agropastores do sul de Angola, a recolecção de frutos silvestres,
raízes, cogumelos, plantas e insectos jogam um papel importante no sistema social
e nas fontes de sobrevivência. Uma pesquisa sobre o uso diverso de recursos florestais, feita pela ONG, COSPE, no município da Bibala, no Namibe, obteve resultados interessantes que indicam quão é importante para as populações os recursos
que a comunidade extrai da floresta e que há sete sectores de uso de produtos florestais: 1) para uso medicinal, em 84%; 2) para uso alimentar, em 50%; 3) para uso
agro-pastoril, em 49%; 4) para uso veterinário, em 6%; 5) para uso ritual, em 5%;
6) para uso artesanal, em 4%; e 7) para uso cosmético, em 2%. Por este resultado
se observa o papel da recolecção na segurança alimentar e nutricional, seja em termos de disponibilidade, por aumentar a produção e diversificação, mas também
no acesso, por gerar rendimentos financeiros.
É do conhecimento geral que a reabilitação das vias de acesso, depois do fim
do conflito armado, centrou-se nas principais vias de acesso, faltando ainda muitas
estradas secundárias e terciárias que ligam as localidades do interior profundo às
principais estradas dos grandes centros de consumo. Esta realidade não é favorável
ao incentivo do acesso aos alimentos, quer nas cidades onde os preços são cada
vez mais altos, como nas localidades do interior que não conseguem obter os alimentos complementares com facilidade. A mesma análise é válida em relação às
outras infra-estruturas precárias, e ao sistema de comercialização rural que possui
muitas disfunções.
A segunda forma de obter alimentos pelas famílias ou pessoas é a compra da
comida ou troca/permuta através da comercialização, mas isso requer ter fontes
de rendimento. De forma geral, compram-se alimentos nos mercados formais e
informais de diferentes dimensões, nas grandes superfícies, nos supermercados,
nos minimercados, nas lojas, nas cantinas, nos “janela aberta”, nos hotéis, restaurantes e similares. Um exemplo de trocas é referido no “Estudo das Comunidades
Agro-Pastoris dos Gambos, na Huíla73”, e os resultados indicam que 78% do rendimento monetário da comercialização dos produtos agro-pecuários por Ehumbo74
são obtidos por troca, do qual 80% é referido como sendo proveniente da venda
em lojas de comerciantes locais. Os produtos básicos, como o óleo alimentar, o sal,
o sabão e o açúcar são importantes no comércio por permuta, sobretudo em se
73
Morais & Correia, 1993, Estudo das Comunidades Agro-Pastoris dos Gambos, na
Huíla, ACORD-ADRA.
74‹†ƒ†‡”‡•‹†‡…‹ƒŽ’‡”ˆ‡‹–ƒ‡–‡†‡ϐ‹‹†ƒ‡–‡”‘•ϐÀ•‹…‘•“—‡‹…Ž—‹ƒ•”‡•‹†²-
cias e os currais designação e língua local.
| 135
CEIC / UCAN
tratando das pequenas espécies. Prática de permuta entre intermediários e produtores é bastante corrente e conhecido, sobretudo no meio rural.
Em 2012, o impacto da estiagem, no Huambo, já se fazia sentir, ao nível dos
preços, a fuba vendia-se a 100 Kz/kg, um preço nunca visto nesta altura do ano
(época de suposta abundância dado que se trata de época de colheita). Este é um
preço habitual somente em Dezembro/Janeiro/Fevereiro, sendo que no ano passado por altura das colheitas estava a cerca de 50 Kz. A lata de milho na altura das
colheitas, no ano passado, estava a 25-30 Kz, este ano está já a 35-40 Kz, no município sede. Regra geral, os agricultores têm reservas alimentares de Junho a Novembro, mas se o preço do quilo de fuba, já naquela altura estava a 100 Kz, é sinal de
escassez e de diminuição de stocks, deixando antever que não existirão reservas
por muitos meses. O aumento do preço do milho e da fuba – base da alimentação
– gera uma espiral inflacionária, o carvão também já está mais caro, assim como o
óleo alimentar (Norwegian Church Aid, 2012).
A terceira forma de obter os alimentos pelas famílias é a oferta, a assistência
alimentar ou as doações, através de sistemas de direito social previstos por lei ou
obrigações de apoio do governo. As doações também podem ser de organizações
filantrópicas da sociedade civil.
No caso mais recente da seca no sul de Angola foi o Sistema de Protecção Civil.
Os padrões alimentares dos povos da região são à base de cereais, principalmente massango, mas também o milho, e na falta o leite. O cabaz distribuído incluía o
arroz, a fuba de milho, o feijão comum, a conserva de carne, a conserva de peixe,
o óleo alimentar, o sal e o sabão. Regra geral, a conserva de carne não era consumida e, logo, havia uma dificuldade dos alimentos não terem em conta os aspectos relacionados com os padrões alimentares locais e faltou massango no cabaz de
doação.
A redução das chuvas nos últimos 3 anos, ou seja, desde 2010, notada no Sul de
Angola – nas províncias de Benguela, Cunene, Cuando Cubango, Huíla, Namibe e
Kwanza Sul. No sul de Angola causou perda de culturas agrícolas, prejudicou todas
as dimensões da segurança alimentar – disponibilidade, acesso, utilização, estabilidade – aos alimentos que eles próprios produzem e os que compram. As famílias
consumiram as reservas e as sementes, faltou por tempo prolongado e isso provocou insegurança alimentar crónica. Também, por falta de água, o gado bovino
começou a ficar desidratado e sem pastos, enfraqueceu os animais, criou morte e
perda de peso do gado, e faltou o leite, a alimentação de base daquelas populações. Quando o gado começou a morrer, o preço do boi que antes custava 80 mil
Kwanzas passou para 4 mil Kwanzas. Os cereais também subiram de preço mais do
que o dobro nos mercados, prejudicando sobremaneira o acesso aos alimentos
136 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
daquelas famílias. Quanto mais distante dos centros urbanos e das principais vias
de acesso pior.
O consumo e utilização dos alimentos referem-se à ingestão e utilização dos alimentos em quantidade e qualidade, de forma a cobrir as necessidades em micronutrientes (vitaminas e sais minerais) e em macronutrientes (hidratos de carbono,
proteínas e lípidos) para se atingir um estado de bem-estar nutricional, com base
numa absorção correcta dos nutrientes necessários para uma alimentação saudável. Esta dimensão insere-se no âmbito da necessidade de se garantir a distribuição
dos alimentos, com equidade, dentro dos agregados familiares (questão etária e
de género), de se assegurar a inocuidade dos alimentos, o respeito pelas preferências alimentares (factores culturais), a qualidade da água, o saneamento básico, a
higiene e o estado de saúde das populações, assim como a informação e educação
nutricional, para uma correcta dieta alimentar.
Os alimentos vendidos ao ar livre nas ruas e nos mercados informais sem o mínimo de condições sanitárias são uma questão de segurança alimentar e nutricional.
De forma recorrente, os meios de comunicação social noticiam factos reportados
pelas instituições de defesa do consumidor e das autoridades policiais na denúncia
das irregularidades dos comerciantes que vendem bens alimentares fora do prazo
de consumo, sendo um problema de segurança alimentar e nutricional.
Os cortes de energia nos centros urbanos criam dificuldades de conservação de
alimentos e afectam a sua qualidade.
As disfunções nos subsistemas de abastecimento alimentar – transporte,
comunicações e armazenamento, redes de comercialização, mercados de oferta e
demanda de alimentos, distribuição e conservação, e outros, provocam problemas
estruturais na segurança alimentar e nutricional.
A estabilidade refere-se ao acesso permanente a uma alimentação adequada.
Normalmente existem períodos de insegurança alimentar de carácter transitório ou cíclicos associados a determinados momentos das campanhas agrícolas ou
empregos sazonais para os quais se torna necessário a existência de mecanismos
que garantam a disponibilidade e o acesso aos alimentos durante esses períodos
(diversificação das actividades económicas, diversificação da produção agrícola e
existência de silos ou armazéns).
6.10 Conhecimento sobre a situação da segurança alimentar e nutricional
Dada a diversidade e complexidade da realidade angolana em vários aspectos,
o conhecimento sobre segurança alimentar não é tarefa fácil. O Gabinete de Segurança Alimentar (GSA) tem-se destacado nos estudos localizados em determinados
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CEIC / UCAN
espaços geográficos sobre segurança alimentar e nutricional, não podendo ser
generalizados noutras realidades. O estudo sobre segurança alimentar feito pela
Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), em 2012, em 12 municípios das províncias de Benguela, Huambo, Huíla e Malanje, revela situações de
insegurança alimentar, por causa do défice no acesso aos alimentos em quantidade e qualidade.
No Huambo, dos inquiridos: 7,5% com segurança alimentar, 21,25% com insegurança alimentar leve, 23,75% com insegurança alimentar moderada e 47,5%
com insegurança alimentar grave, isto é, a maioria da população vive com insegurança alimentar grave que se manifesta através de uma significativa restrição
quantitativa de alimentos, levando-os à fome com alguma frequência entre adultos e crianças.
Na Huíla, o estudo mostra que há insegurança alimentar nos seguintes termos:
dos inquiridos, 2,5% com segurança alimentar, 25,83% com insegurança alimentar
leve, 20% com insegurança alimentar moderada e 51,25% com insegurança alimentar grave (ADRA, 2012).
Em Malanje há um número considerável de agregados familiares a viverem em
situação de insegurança alimentar leve que representam 15,83% dos indivíduos
inquiridos. A outra franja da amostra é constituída por 29,17% que vivem uma situação de insegurança alimentar moderada. O grupo de agregados familiares a viverem em situação de insegurança alimentar grave, enquanto uma condição em que
há restrição da quantidade de alimentos que leva à situação de fome com alguma
frequência, entre adultos e crianças é a maioria representada por 43,75% do total
de inquéritos realizados a 240 domicílios dos municípios do Quela, Kiwaba Nzoji e
Kalandula (ADRA, 2012).
Em 2009, o Gabinete de Segurança Alimentar (GSA) do MINAGRI fez um estudo,
comissionado pela UNICEF, sobre a Vulnerabilidade, a Insegurança Alimentar no
Contexto da Alta de Preços, Análise dos Meios de Sustento e Economia Alimentar
dos Agregados Familiares, nas províncias de Luanda, Bié e Cunene.
A síntese dos principais resultados deste estudo indica que, quanto à segurança alimentar e pobreza, na província de Luanda, 13% dos agregados entrevistados têm consumo alimentar adequado e estima-se que 37% têm consumo regular.
A insegurança alimentar incide mais fortemente sobre 49% dos agregados que têm
um nível de consumo alimentar considerado precário. A dieta destes agregados é
essencialmente básica e o número de refeições nunca é superior a duas por dia.
Estes agregados apresentam muitas dificuldades de acesso a alimentos e, consequentemente, fraca capacidade de diversificar a fonte de energia e proteínas.
138 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
O consumo nestes agregados situa-se muito abaixo de 2,100 kcal, por pessoa, por
dia, que consiste essencialmente no consumo de cereais ou tubérculos, feijão,
vegetais e óleo, numa base diária.
No Bié também 13% dos agregados entrevistados têm consumo alimentar adequado e 32% têm consumo regular. Os agregados com nível de consumo precário
são de 52%. Todavia, metade dos agregados nesta última categoria tem acesso a
cereais (milho, em particular) todos os dias da semana.
Na província do Cunene, apenas 10% dos agregados entrevistados consegue
manter um nível de consumo adequado e 25% está no nível regular. Esta província
tem uma percentagem elevada de agregados com consumo alimentar precário –
60%. O milho consumido no Cunene é adquirido maioritariamente no mercado, o
que limita o acesso adequado a este produto. Aliás, a população do Cunene e as
condições do solo e clima não favorecem a cultura do milho e, por isso, eles cultivam massango e massambala. No Cunene, apenas 21% dos agregados com regime
alimentar precário faz uma refeição de milho todos os dias da semana. O acesso ao
massango, produzido localmente, é relativamente melhor, 69% dos agregados faz
uma refeição diária todos os dias da semana.
Na província do Bié, a inflação alimentar é o risco de natureza económica que
mais ameaça o consumo alimentar dos agregados, com uma incidência estimada em 70%. A seguir vem o ataque de pragas, as doenças nas culturas e a falta de
sementes, os riscos de natureza agrícola, com níveis de incidência de 88% e 58%,
respectivamente.
A província do Cunene tem a pior interacção de ocorrência de riscos: inflação
alimentar (com 83% de incidência), cheias (86%), pragas e doenças (63%) e redução das áreas de pasto (48%) incidem fortemente sobre os agregados. Contudo, o
impacto da ocorrência de riscos e choques sobre os agregados depende da capacidade destes de gerir ou atenuar esse impacto.
Neste estudo, a vulnerabilidade à insegurança alimentar, os agregados foram
agrupados em quatro níveis de vulnerabilidade: Extrema, Elevada, Moderada e
Baixa, em função da sua exposição aos riscos e à capacidade de os gerir. Neste
sentido, estima-se que 17% dos agregados em Luanda estão numa situação de vulnerabilidade à insegurança alimentar extrema e 27% em vulnerabilidade elevada.
Na província do Bié, a população em situação de vulnerabilidade extrema à
insegurança alimentar é estimada em 21% e 29% em vulnerabilidade elevada.
Na província do Cunene, 32% dos agregados estão em situação de vulnerabilidade extrema à insegurança alimentar e 28% em vulnerabilidade elevada. Cerca
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CEIC / UCAN
de 85% dos agregados pobres estão no nível de vulnerabilidade extrema e 15% no
nível elevado, sendo as cifras mais altas entre as três províncias.
Os dados desta pesquisa indicam que no Cunene, a propriedade de gado parece não resolver situações de vulnerabilidade à insegurança alimentar no curto prazo ou para evitar que a situação se degrade para níveis extremos. As decisões sobre
a gestão do gado têm a ver também com razões culturais que prevalecem sobre as
razões de ordem económica.
O nível de ocorrência de riscos e choques cria sérios constrangimentos à segurança alimentar, mas deve servir de oportunidade para analisar a consistência e
coerência das políticas económicas e sociais.
70
60
50
40
30
20
10
0
Bié
Cuando
Cubango
Cunene
Segurança
Insegurança moderada
Luanda
Huíla
Malanje
Insegurança leve
Insegurança grave
Há constatações que podem ser feitas de imediato sobre a questão da segurança alimentar no país que são as seguintes:
ͻ A identidade conceptual sobre segurança alimentar e nutricional tem evoluído no
mundo e em Angola, sendo multidimensional com diferentes aspectos conexos.
ͻ A ENSAN adoptou a definição das Nações Unidas sobre segurança alimentar
e nutricional, mas ainda há pouco conhecimento sobre o assunto.
ͻ O sistema de segurança alimentar no nosso país não funciona de forma adequada.
ͻ A ENSAN tem uma dimensão internacional através das Convenções que o
governo de Angola subscreveu e ratificou.
ͻ Angola possui um potencial de promoção da auto-suficiência alimentar. Desde
o fim do conflito armado tem havido substancial aumento da produção agrícola e pecuária.
140 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
ͻ Pelos dados em referência, há um défice de produção agrícola e pecuária
interna, que mostra que o país não possui disponibilidade suficiente para
alimentar a sua população, tendo em conta o seu potencial.
ͻ Mais do que a disponibilidade de alimentos, a capacidade de acesso aos alimentos pelos angolanos é a questão fundamental.
ͻ A segurança alimentar e nutricional em Angola está exposta a riscos e choques
de ordem económica, por exemplo, preços altos, agrícolas, pragas e doenças
e calamidades naturais que nos últimos anos agrícolas reduziram a produção
alimentar.
ͻ Existem casos que revelam haver um potencial agrário para promoção de
segurança alimentar.
ͻ As famílias produtoras da actividade agrícola e pecuária desenvolveram ao longo
dos anos conhecimentos e experiência de estratégias de segurança alimentar,
apesar do atraso tecnológico do sector agrário.
ͻ A situação de segurança alimentar é bastante variável em função da diversidade
e complexidade do país75.
ͻ Há insegurança alimentar no país, seja nas áreas rurais, como em meios urbanos.
75
De recursos, de zonas agro-ecológicas, de zonas agrícolas, de zonas de consumo, do
tipo de culturas e sistemas de produção, do tipo de sócio economia, do uso de tecnologias, da quantidade, qualidade e segurança da terras e do conhecimento incluindo os
locais das populações.
| 141
CEIC / UCAN
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E DA SOLIDARIEDADE
7.1 Introdução
O desenvolvimento de qualquer país é visto numa perspectiva multidimensional, fundamento em factores de ordem económica, social, política e ambiental,
visando assegurar a sua sustentabilidade (UNESCO, 2010). Esta multidimensionalidade torna o conceito com desenvolvimento aberto ao concurso de vários actores
sociais.
No caso particular de Angola, o Estado é um actor com grande peso na equação desenvolvimentista devido ao modelo económico que o país segue, no âmbito
do qual ele (o Estado) aparece como o principal empregador da força de trabalho,
para além de deter as empresas com maior expressão no tecido produtivo. Ainda
assim, resta espaço para outros actores, com particular realce para as Organizações da Sociedade Civil e Igrejas para continuarem a dar o seu contributo em prol
do desenvolvimento social do país, à luz do princípio da subsidiariedade.
No presente capítulo, a análise incidiu sobre o contributo socioeconómico e
político de três instituições: 1) Hospital Divina Providência, pertencente à Igreja
Católica. Trazemos um retrato completo sobre as acções que o Hospital desenvolveu ao longo de 2013, que culminaram com o atendimento de um universo de
410.700 pacientes nas suas diversas áreas de intervenção; 2) MOSAIKO – Instituto para a Cidadania. É uma instituição pertencente à Igreja Católica e desenvolve uma acção especializada na promoção dos direitos humanos. A nossa análise
recaiu sobre as acções que marcaram o quadro interventivo do MOSAIKO, 2013
nos domínios do aconselhamento jurídico, promoção de seminários e ciclo de
palestras, produção, exibição e debate à volta de filmes e das publicações feitas;
3) CICA. Sendo uma organização ecuménica, desenvolve a sua acção numa perspectiva holística, abarcando a dimensão espiritual e social. Esta última contempla
uma diversidade de projectos no domínio social, porém a nossa atenção restringiu-se ao projecto de monitoria social e boa governação, tendo abarcado os dados
mais recentes do trabalho feito em 2012, à volta dos 22 projectos implementados
nos Municípios de Cubal (Benguela), Cele (Kwanza Sul) e Negage (Uíge).
142 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
7.2 Hospital Divina Providência
A unidade hospitalar Divina Providência pertencente à Igreja Católica, nome
que deriva da Congregação Pobres Servos da Divina Providência, instituição pioneira da iniciativa em função da sua dedicação à caridade e ao amor ao próximo.
O hospital surgiu em 1994 para responder às necessidades de saúde das
populações do Golfe 1, tendo para o efeito erguido instalações pré-fabricadas
de 2000 m², compostas por 5 salas para internamento, gabinetes da administração, e as restantes para consultas externas, de especialidade e diversos exames
laboratoriais. Em 2002, o hospital estabeleceu um acordo de cooperação com o
MINSA, que veio a desempenhar um papel para a Instituição (Rúbio, 2013:18) e
actualmente o HDP é um órgão que depende da Direcção Provincial da Saúde de
Luanda.
7.2.1 Estrutura física do HDP, sua capacidade e funcionamento
Com o apoio do Governo, foi possível a construção de instalação auxiliar, o
HDP, que é utilizado para o internamento dos pacientes. No quadro geral, esta
nova unidade é composta por 7 áreas (Serviços Administrativos, Laboratório,
Consultas Externas, Internamentos de Pediatria e Medicina, Tratamento Ambulatório de TB, Atendimento às Pessoas Vivendo com VIH/SIDA e Hemoterapia),
com uma capacidade geral de 109 camas, sendo 55 para adultos e 54 para as
crianças (Ibid.).
Para além desta unidade central, a unidade hospitalar Divina Providência conta ainda com subunidades de apoio complementares que são as seguintes: “Nossa Senhora da Paz” no Golfe 2; “São João Calábria” no bairro Malanjino; “Santa
Teresinha” nas imediações de Avô Kumbi – Golfe 1.o posto médico e “Santa Catarina”, prestando serviços nas áreas de consultas pré-natais, curativos, consultas de
pediatria e de medicina. Os serviços de auxílios que são prestados por essas subunidades ajudam a desafogar a unidade central Divina Providência que se encarrega
dos casos dos pacientes com complicações mais graves e que necessitem de maiores cuidados (Ibid., p. 20).
A rede de apoio da unidade hospitalar Divina Providência foi alargada com a
entrada em funcionamento do Centro Nutricional Terapêutico, concluído em Janeiro
de 2011, com o suporte da ENI FOUNDATION, mas ainda em estado de inoperacionalidade por escassez de recursos humanos. Para além disso, em Dezembro de
2013, foram concluídas as obras do centro médico “São Marcos”, cuja estrutura
inclui uma maternidade destinada a servir as populações do bairro Sapú e arredores (Hospital Divina Providência, 2013:3).
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CEIC / UCAN
7.2.2 Áreas de atendimento
O Hospital Divina Providência funciona de segunda a sexta-feira das 7h30 às
16h00, principalmente para atender os utentes externos provenientes dos vários
bairros de Luanda, sobretudo do Dangereux, Fubú, Golf 1 e 2, Sapú, Camama,
Capolos 1 e 2. Os doentes antes de chegarem ao hospital passam por uma triagem nas subunidades de saúde. Todavia, no caso dos doentes internados, a unidade central funciona a tempo integral quanto ao atendimento (Rúbio, 2013:18-19).
Até Setembro de 2013, em média, o hospital atendia diariamente cerca de 200
pacientes externos atraídos pela assistência médica condigna. Comparativamente
ao ano de 2012, a média de atendimento foi de 430.616 pacientes, registando uma
redução de 4,63%, em relação a 2013.
7.2.3 Consultas externas
A área de consultas externas registou uma subida na ordem de 6,40%, sendo
que de 156.748 do ano anterior, passaram para um total de 166.790 em 2013, nos
sectores de pediatria e medicina. O sector de pediatria atendeu 80.325 pacientes, destes 19.211 ao nível da unidade central, enquanto 61.114 nas subunidades.
Quanto à área da medicina foram consultados 86.465 pacientes, dos quais 35.518
ao nível central, isto é, na unidade principal, ao passo que 50.947 foram atendidos
nos Postos (HDP, 2013:2).
7.2.4 Centro de tratamento de tuberculose
O hospital atendeu um total de 1244 pacientes, destes 698 representam casos
novos, contrariamente a 91 casos de reincidência. No ano anterior, foram atendidos 1370 pacientes, o que representa uma diminuição de casos em 2013, na
ordem de 9,20%.
7.2.5 Consultas pré-natais
Nesta área registou-se uma diminuição de 15,2% da procura dos serviços em
2013, ano em que foram atendidas 17.009 mulheres contra 20.078 do ano anterior.
7.2.6 VIH/SIDA
O hospital começou a prestar serviço nesta área em Setembro de 2003, registando um total de 5431 pacientes. Entre os pacientes em seguimento no ano 2013,
2184 estão em tratamento anti-retroviral (ARVs), contra 2315 pacientes que não
fizeram o tratamento, 605 pacientes faleceram, 299 foram transferidos de outros
hospitais para o Divina Providência e 28 abandonaram o tratamento.
144 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
A escassez dos recursos humanos dificulta a acção do CATV nesta unidade,
fazendo com que o teste voluntário e aconselhamento pré e pós-teste voluntário
sejam feitos unicamente aos familiares das pessoas em seguimento no centro do
hospital.
7.2.7 Consultas especializadas
Nesta área foram consultados 15.916 pacientes nas especialidades de ecografia, ortopedia, cardiologia, reumatologia, estomatologia, pneumologia e optometria. Os serviços de estomatologia foram os mais procurados (61,15%), seguido do
de optometria (24,37%).
7.2.8 Laboratório de análises e radiologia
Foram realizados um total de 218.461 exames, 82,35% destes no Divina Providência e 17,38% nos Postos. Este universo constitui uma diminuição na ordem de
10,82% em relação ao ano 2012.
Contrariamente aos exames laboratoriais, a radiologia registou um acréscimo
em 2013 na ordem de 1,82% ao examinar 10.533 pacientes contra 10.345 no ano
2012. Este serviço está digitalizado. De maneira que partindo do computador central, as 10.533 imagens radiológicas foram enviadas aos cinco terminais instalados
nas várias secções do hospital, de onde foram visualizadas pelos médicos de forma
mais rápida e eficaz.
7.2.9 Centro Nutricional Terapêutico/Seguimento e Vigilância Nutricional
Com uma ligeira subida na ordem de 0,62%, em 2013, o Centro Nutricional
Terapêutico registou a entrada de 490 pacientes, dos quais 378 encontraram cura,
84 faleceram, 9 abandonaram e 15 vieram transferidos de outras unidades.
O Centro Nutricional de Seguimento registou um aumento do número de
pacientes na ordem de 68,60% em 2013, tendo atingido 1777 contra 1054 que
deu seguimento em 2012. O cenário foi diferente na área de Vigilância Nutricional,
onde se registou um decréscimo de 16,24% em comparação com o ano 2012, ou
seja, em 2013 foram atendidos 35.781 pacientes, enquanto, no ano anterior, foram
atendidos 42.719 pacientes.
7.2.10 Transfusões/Crianças Vacinadas/Vacinas
O Centro realizou um total de 1166 transfusões sanguíneas em 2013, contra
1077 realizadas no ano anterior, cujo aumento está na ordem de 8,26%. O grupo
0+ liderou as transfusões (48,11%), seguido dos grupos A+ (25,21%) e B+ (21,61%).
| 145
CEIC / UCAN
Quanto às vacinas, das 57.565 de que o Centro dispôs em 2013, 27.782 foram
administradas às crianças, assinalando um progresso de 16,93% em comparação
com o ano anterior.
7.2.11 Situação epidemiológica
A malária, as doenças respiratórias agudas (DRA), a malnutrição e a tuberculose destacaram-se como sendo as principais patologias que afectaram os pacientes
que foram atendidos no Divina Providência no ano de 2013, sendo a tuberculose
e a malnutrição as mais letais, seguidas das DRA e anemia (Ibid., 2). No caso particular da malnutrição, manteve-se no topo como sendo a principal causa de morte
das crianças do 0-5 anos (20,69%).
7.2.12 Recursos humanos e sustentabilidade do hospital
O hospital conta com 360 funcionários, dentre os quais 260 estão integrados na
função pública, enquanto 100 trabalham em regime de contrato privado. A tabela
abaixo apresenta os recursos humanos do hospital nas suas variadas categorias e
desagregados por género.
QUADRO ORGÂNICO DOS RHS DO HDP
Quantos são?
Categoria
Total
Homens
Mulheres
Médicos
10
19
29
Enfermeiros
41
74
115
Técnicos de Laboratório
8
21
29
Técnicos de Imagiologia
3
-
3
Catalogadores
1
2
3
^ĞƌǀŝĕŽĚŵŝŶŝƐƚƌĂƟǀŽ
25
13
38
Serviço Complementar
58
85
143
FONTE: CEIC, com base nos dados recolhidos no HDP.
O quadro dos recursos humanos que o hospital detém revelou-se insuficiente
em 2013, para fazer face às necessidades de saúde dos utentes. O mais agravante é
a fuga de funcionários de saúde para postos de emprego com remunerações mais
atraentes, devido a razões salariais e excessiva lentidão na actualização das categorias daqueles que atingiram formações superiores.
A sustentabilidade financeira do HDP, no ano de 2013, fundamentou-se nas
quatro fontes de arrecadação das suas receitas conforme o gráfico seguinte ilustra.
146 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
ARRECADAÇÃO DE RECEITAS - 2013
3,86%
0,55%
16,71%
OGE
Serviços Hospitalares
Doações/Projectos
Entradas diversas
78,87%
FONTE: Relatório de Actividades do Hospital Divina Providência, exercício 2013, p. 8.
As receitas arrecadadas, em 2013, totalizaram AKz 747.018.842,00, das quais
destacam-se 78,78% que resultaram da cabimentação orçamental do Governo e
16,71% que resultaram da comparticipação dos utentes. A receita proveniente da
comparticipação dos utentes é ainda necessária pelo papel importante que tem
jogado na engenharia financeira do hospital, pois ela tem sido revertida para a
remuneração dos funcionários que não fazem parte da função pública, pelo que
2013 não foi uma excepção neste aspecto.
A verba do hospital em 2013 foi utilizada principalmente para a cobertura dos
salários com o pessoal, despesa que representou 73,22% de todas as outras efectuadas pela unidade.
7.2.13 Relações externas
No âmbito externo, o Hospital Divina Providência estabeleceu acordos de cooperação com uma companhia petrolífera e algumas Organizações Internacionais,
das quais beneficiou de uma linha de crédito que financiou projectos específicos
implementados no ano de 2013 no valor de USD 242.532,57. Veja o quadro global
desta linha de crédito na tabela abaixo.
QUADRO GLOBAL DA LINHA DE CRÉDITO BENEFICIADA PELO HDP
N.o
Financiador
Valor global
Áreas contempladas
1
Fundação Cariverona
€ 180.000,00
Tuberculose e laboratório
2
Fundação das Nações Unidas
para a População
AKz 8.377.426,00
^ĂƷĚĞƐĞdžƵĂůĞƌĞƉƌŽĚƵƟǀĂ
3
BP Angola
USD 510.000,00
Atenção básica à saúde, melhoria
dos serviços sanitários e malnutrição
ŝŶĨĂŶƟůĞŶƵƚƌŝĕĆŽ
FONTE: Relatório de Actividades do Hospital Divina Providência, exercício 2013, pp. 12-13.
| 147
CEIC / UCAN
Por outro lado, o hospital tem mantido relações de intercâmbio científico e
cooperação com instituições internacionais , nomeadamente: Hospital Universitário “Burlo Garofalo” de Trieste (Itália), Hospital Microcitécnico de Cagliari, Hospital
S. Cuore de Negrar (Itália), Hospital Divina Providência de Marituba (Brasil) e Instituto de Medicina Integral de Pernambuco (Brasil). Do pacote das 12 acções formativas promovidas pelo Divina Providência em 2013 para a capacitação dos seus
recursos humanos, 6 tiveram lugar no Brasil, Itália e no próprio hospital, envolvendo formadores nacionais e estrangeiros.
7.2.14 Dimensão holística
O Hospital Divina Providência, para além da sua vocação enquanto unidade de
saúde, desenvolve igualmente acções de âmbito espiritual. Para tal conta com o
seminário que se encarrega de realizar missas às Quartas-feiras, aos Sábados e aos
Domingos, sempre no período nocturno, a partir das 18 horas 30 minutos.
Os seminaristas fazem visitas aos doentes internados, juntando-se a isso os
actos de administração da unção e confissão levados a cabo pelo Padre Fernando
Alves Tchilunda na condição de Sacerdote, para além de fazer parte do corpo directivo do hospital.
Enquanto propriedade da Igreja Católica, o hospital está aberto a outras denominações religiosas, e regista-se um número considerado de pessoas singulares ou
grupos religiosos organizados que têm efectuado visitas aos pacientes internados,
e prestado apoio espiritual.
7.3 MOSAIKO – Instituto para a Cidadania
7.3.1 Introdução
O MOSAIKO – Instituto para a Cidadania é uma instituição angolana fundada
em 1997 pelos Missionários Dominicanos da Igreja Católica, sem fins lucrativos.
Foi a primeira instituição a assumir explicitamente como missão a promoção dos
Direitos Humanos em Angola, guiada pelo compromisso social, visando o respeito
pela dignidade humana e o desenvolvimento da sociedade angolana a partir do
contributo de todos.
No centro da actuação, o MOSAIKO – Instituto para a Cidadania – tem o objectivo de contribuir para uma Angola melhor, uma Angola que se constrói com um
pouco de todos os cidadãos e cidadãs.
148 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
7.3.2 Acções desenvolvidas em 2013
7.3.2.1 Aconselhamento jurídico e seminários
O MOSAIKO fez acompanhamento de 14 casos oriundos de 4 províncias, dos
quais 50% foram encerrados com sucesso e os outros 50% estão em curso. A tabela
abaixo oferece mais detalhes.
CASOS ACOMPANHADOS PELO MOSAIKO EM 2013
N.o
Proveniência
Natureza jurídica do caso
şǀĞů;ĐŽŶŇŝƚŽĐŽŶƚƌĂƚƵĂůĚĞ
arrendamento)
Situação do caso
1
Luanda
(Ingombota)
2
Luanda
(Cazenga)
3
Luanda
(Viana)
4
Luanda
(Cazenga)
5
Luanda
(Rangel)
6
Cubal
(Benguela)
7
Luanda
(Cazenga)
8
Luanda
(Cazenga)
9
Luanda (Viana
&ĂŵŝůŝĂƌ;ǀŝŽůġŶĐŝĂĚŽŵĠƐƟĐĂͿ
– CAOP)
dĞŶƚĂƟǀĂĚĞĐŽŶĐŝůŝĂĕĆŽĞŵĐƵƌƐŽ
10
Luanda
(Cazenga)
dĞŶƚĂƟǀĂĚĞĐŽŶĐŝůŝĂĕĆŽĞŵĐƵƌƐŽ
Encerrado
şǀĞů;ĐŽŶƐƟƚƵŝĕĆŽĚĞ
Encerrado (resolvido depois de um
ƐƵďƟƚƵůĂƌŝĚĂĚĞĚĂĐŽŶƚĂďĂŶĐĄƌŝĂ recurso dirigido junto à área jurídica do
ƉŽƌŵŽƟǀŽĚĂŵŽƌƚĞĚŽĞƐƉŽƐŽͿ
BFA-Angola)
Encerrado (feito um pedido de habeas
Penal (detenção ilegal e prisão
corpus junto ao Ministério Público de
arbitrária)
Luanda, com recurso ao Provedor de
:ƵƐƟĕĂͿ
ŶĐĞƌƌĂĚŽ;ƉŽƌƚĞŶƚĂƟǀĂĚĞĨƵŐĂă
Cível (reconhecimento da união
paternidade, mas o esposo com a
de facto)
conciliação retomou à família)
Encerrado (o caso foi encaminhado para
Laboral (despedimento sem justa
a sala de trabalho e o requerente foi
causa)
indemnizado)
Encerrado (caso dos professores que
estavam sem receber o salário e o caso
ĚŵŝŶŝƐƚƌĂƟǀŽͲůĂďŽƌĂů
foi encaminhado à Direcção da Educação
ĞĂŽWƌŽǀĞĚŽƌĚĞ:ƵƐƟĕĂ͕ĂƐŝƚƵĂĕĆŽĨŽŝ
regularizada)
Encerrado (o caso foi encaminhado para
ĚŵŝŶŝƐƚƌĂƟǀŽ;ƐĂŶĞĂŵĞŶƚŽĚŽ
a sala de trabalho e o requerente foi
hospital)
indemnizado)
ĚŵŝŶŝƐƚƌĂƟǀŽͲĞdžƉƌŽƉƌŝĂĕĆŽĚŽ
Bairro Kalawenda
Familiar (fuga à paternidade)
Em curso (encaminhado ao Ministério das
KďƌĂƐWƷďůŝĐĂƐĞĂŽWƌŽǀĞĚŽƌĚĞ:ƵƐƟĕĂͿ
FONTE: MOSAIKO – Instituto para a Cidadania, Relatório de Actividades, 2013.
No capítulo de formação, o MOSAIKO realizou 16 seminários sobre temáticas
de Direitos Humanos, correspondendo a 45 dias de formação, com 774 participantes, sendo 43% do sexo feminino e 57% do sexo masculino. Os seminários decorreram em 10 localidades das províncias de Huíla, Cuando Cubango, Kwanza Norte,
Kwanza Sul, Luanda, Lunda Norte e Malanje.
| 149
CEIC / UCAN
7.3.2.2 Conferências e debates
Foi apresentado o filme “ser humano” produzido pelo MOSAIKO, acompanhado de debates na Refriango com 20 participantes (55% femininos e 45% masculinos) e duas vezes na Universidade Católica de Angola, com 93 participantes na
primeira (37% femininos e 63% masculinos) e 87 participantes na segunda (41%
femininos e 59% masculinos).
Outrossim, o MOSAIKO realizou um ciclo de palestras sobre “Direitos Humanos
das Mulheres”, “Direitos à Nacionalidade”, “Nacionalidade e Cidadania”, no Cazenga, com 50 participantes (92% femininos e 8% masculinos), na Paróquia da Boa
Nova sobre “Direitos Humanos e Cidadania“, com 50 participantes (40% femininos
e 60% masculinos).
7.3.2.3 Publicações
O ano de 2013 foi fértil em termos de publicações, cujos títulos são: Relatório
Social sobre o Acesso à Justiça fora dos Grandes Centros Urbanos (31.01.2013); as
Actas da IV Semana Nacional sobre “Democracia e Participação” (02.12.2013); Calendário 2014 “Liberdades Fundamentais”; 4 edições – “Direito à Habitação”, “Direito à
Terra”, “Processo de legalização de terrenos para fins agrícolas” e “Processo de legalização de terrenos urbanos” – do boletim trimestral MosaikoInform (2500 exemplares
cada edição) e 2 folhetos sobre Constituição da República de Angola, Título I “Princípios Fundamentais“ e Título II “Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais”.
7.4 Monitoria social e boa governação – o caso do CICA
7.4.1 Resenha Histórica
O Conselho das Igrejas Cristãs de Angola é uma Organização ecuménica fundada
por sete (7) Igrejas Angolanas76, aos 24 de Fevereiro de 1977 sob a sigla de CAIE (Conselho Angolano das Igrejas Evangélicas). Ao longo do percurso ecuménico, a Organização passou a designar-se CICA77 e abriu-se à adesão de mais membros, estando hoje
a contar com 21 membros, entre eles 20 Igrejas e uma OBF (Organização Baseada na
Fé). A caminhada ecuménica conjunta destas igrejas traduz-se na sua cooperação em
domínios específicos, com destaque para o social, formação teológica e evangelismo.
CICA é membro do FOCCISA, CITA (Conferência de Igrejas de toda África) e CMI
(Conselho Mundial de Igrejas). Está presente nas 18 províncias do país através das
76
São elas: Igreja Metodista Unida de Angola, Igreja Congregacional de Angola, Igreja
Evangélica de Angola, Igreja Evangélica Baptista de Angola, Igreja Evangélica Reformada de Angola, Igreja Kimbanguista e Missão Pentecostal de Angola.
77 A partir de Julho de 1992 no âmbito da sua 17.a Assembleia Geral.
150 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
suas CECs (Comissões Ecuménicas de Cooperação) e Igrejas membros, o que faz
dele um actor importante no panorama social e religioso do país. Outrossim, o
CICA segue uma visão holística no desenvolvimento das suas acções, visto que as
mesmas abarcam uma dimensão espiritual e outra social, com vista a corresponder às necessidades plenas da pessoa humana na sua dimensão tricotómica (corpo, alma e espírito). No que se refere à dimensão social, de realçar as acções do
CICA em projectos relacionados com a violência baseada no género, saúde comunitária e VIH/SIDA, comunicação e informação, justiça, paz e reconciliação, mudanças climáticas e monitoria social e boa governação.
7.4.2 Monitoria social e boa governação
Com o financiamento da Ajuda da Igreja Norueguesa (AIN), o Conselho através
do seu Departamento de Assistência e Desenvolvimento (DAD) tem vindo a trabalhar no projecto de Monitoria Social e Boa Governação (MSBG) desde 6 de Maio de
2010, motivada por dois pressupostos: a visão holística que encarna a sua missão
em Angola e o dispositivo legal que consagra o direito dos cidadãos participarem
directa ou indirectamente na vida política do país e de serem informados sobre os
actos do estado e da gestão dos assuntos públicos (CRA, Artigo 52.o). Portanto, o
CICA enquanto voz da Igreja que é sal e luz do mundo e da sociedade Angolana em
particular, serve-se da MSBG como seu instrumento operativo para contribuir no
alcance de uma gestão eficaz e eficiente das receitas públicas, visando a redução
da pobreza e a construção de uma sociedade justa.
7.4.2.1 Área e âmbito de implementação do Projecto
A geografia do projecto compreende 4 províncias: Kwanza Sul (Municípios de
Cassongue e Cela), Benguela (Municípios de Balombo e Cubal), Uíge (Município de
Negage) e Zaire (Município de Mbanza-Kongo), esta última foi introduzida no mapa
do projecto em 2013.
No âmbito deste projecto, as acções de monitoria social incidem sobre o OGE mas
de forma particular sobre o Programa de Investimentos Públicos (PIP) e o Programa
Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza (PMIDRCP).
7.4.2.2 Acções desenvolvidas em 2012 e constatações feitas
Em cada município, existem 5 grupos de monitoria social, compostos por 5 indivíduos denominados por Presidência da República, Assembleia Nacional, Tribunal
de Contas, Ministério das Finanças e Sociedade Civil, respectivamente, por formas
a sentirem-se motivados no cumprimento do seu papel, inspirando-se nos seus
nomes, os quais representam os órgãos que têm a responsabilidade de fiscalizar a
execução do OGE.
| 151
CEIC / UCAN
Os grupos monitoraram 22 projectos em 2012, seleccionados aleatoriamente
nos municípios de Negage, Cele e Cubal, tendo havido um acréscimo de 6 projectos, em comparação com o exercício de 2011. No âmbito da monitoria social, os
grupos visitaram três vezes, cada projecto, totalizando 66 visitas, sendo a primeira
para constatar o arranque da obra, a segunda para constatar a sua evolução e em
Dezembro a terceira e última para constatar a sua conclusão ou não.
No Negage foram monitorados 9 projectos, relacionados com a construção de
2 escolas com 6 salas de aulas cada, nas localidades de Cáua Grande (Sede Municipal) e Aldeia da Missão, 25 casas evolutivas na Sede Comunal de Quisseque, uma
quadra polidesportiva na Sede Municipal e um Centro Materno Infantil na Sede
Municipal; reabilitação de uma escola de 7 salas de aulas no Cácua Central e 3
casas dos médicos na Sede Municipal; reabilitação e ampliação do Centro de Saúde e construção do Centro Materno Infantil e seu apetrechamento na Comuna de
Cangulo e a reabertura de 6 km de picada, seu nivelamento, compactação, abertura de valas de drenagem e colocação de brita em áreas críticas no troço que liga
Cangulo com Cahiri (Sede Municipal).
Os 9 projectos estiveram a cargo da Administração Municipal, no entanto 4
deles não foram concluídos no ano civil 2012, fazendo com que o grau de execução dos projectos ficasse na ordem de 56% (CICA, 2012:16). Os fundos gastos na
execução destas obras não foram revelados à equipa de MSBG, o que coloca interrogações sobre a transparência na gestão dos mesmos por parte da Administração Municipal para além de com esta atitude violar o disposto no Artigo 74.o da
Lei referente ao OGE 15/10 de 14 de Julho que obriga “… a publicação de todos os
documentos que se revelem necessários para assegurar a adequada divulgação e
transparência dos correspondentes orçamentos” (Ibid., p. 17).
No Cubal foram monitorados 6 projectos consubstanciados na construção de
um mercado na Sede Comunal (Yambala), 50 casas evolutivas na Sede Municipal,
3 escolas na Sede Municipal, sendo duas com caracter evolutivo, 3 cantinas escolares e seu apetrechamento (na Sede Municipal) e reabilitação e construção de um
jardim e quadra desportiva (na Sede Municipal). As obras estiveram igualmente a
cargo da Administração Municipal, cujo grau de execução foi de 100%, tendo orçado na ordem de AKz 118.250.000.
No Waku Kungo (Cele) a equipa de MSBG monitorou 7 projectos relacionados
com a construção de 2 sistemas de abastecimento de água na Sede Comunal da
Sanga e na Comuna do Kissanga Kungo, 50 casas evolutivas na localidade de Cassongo Sanga; construção e apetrechamento da escola primária na povoação do
Tengue (Sede Municipal), 1 Posto de Saúde e 1 residência para os enfermeiros no
Canjombe (Comuna do Kissanga Kungo) e 1 residência do enfermeiro no Cassosso
(Comuna do Kissanga Kungo).
152 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
A execução dos 7 projectos que consumiu AKz 151.555.802,60, esteve igualmente sob a responsabilidade da Administração Municipal, dos quais 2 não conheceram a sua conclusão.
A tabela abaixo sintetiza os 22 projectos segundo áreas de intervenção, grau de
execução e grau de transparência.
ÁREAS DE INTERVENÇÃO E GRAUS DE EXECUÇÃO/TRANSPARÊNCIA
Áreas de intervenção
GE
GT
Qt
Educação
Saúde
Desporto
Estradas
C. Informal
(Mercado)
Água
Habitação
–
–
N.o
7
6
2
1
1
2
3
16
13
%
31,81
27,27
9,09
4,54
4,54
9,09
13,63
72,72
59,09
FONTE: CEIC/UCAN com base nos dados recolhidos do CICA, 2012:15-22.
Entre os 22 projectos monitorados, as áreas de educação e saúde são as que
mais intervenções registaram, com uma diferença bastante ligeira entre ambas.
Embora os 22 projectos não constituam uma amostra representativa mas o facto da educação e saúde se destacarem entre os 22 projectos monitorados, é uma
constatação positiva pois são áreas vitais na promoção do desenvolvimento inclusivo e sustentável. Todavia, apesar deste esforço das Administrações Municipais,
ainda é notória a insuficiência de infra-estruturas escolares, considerando a superlotação que se regista em algumas escolas e a existência de crianças que estudam
em lugares impróprios, como nas varandas (CICA, 2012:23).
O grau de execução (GE) dos 22 projectos é positivo, com destaque para o Município de Cubal que atingiu 100%, seguido do Wuko-Kungo que alcançou 71,42%
enquanto o do Negage está na cauda em virtude de ter atingido 56%.
O grau de transparência ainda deixa muito a desejar, isto pelo facto do Município de Negage ter atingido 0%, enquanto os dois restantes municípios alcançaram
100%.
Restringindo a análise aos 22 projectos monitorados, diríamos que o quadro
global dos três municípios revela-se positivo no tocante aos graus de execução dos
projectos concebidos e à transparência na gestão dos fundos. Todavia, no terreno
ainda se regista a falta de envolvimento das comunidades nos processos de identificação e planificação das acções para que as suas necessidades reais sejam as
determinantes principais do tipo de projectos a executar (CICA, 2012:23).
| 153
CEIC / UCAN
8. MONOGRAFIA SOBRE A SITUAÇÃO SOCIAL NO MUNICÍPIO
DO NEGAGE
8.1 Introdução
Este capítulo analisa a situação social no Negage, um dos 16 municípios que
configuram a geografia administrativa da província do Uíge78. Trata-se de um estudo de caso que resulta de uma pesquisa de terreno realizada entre os dias 14 de
Novembro e 7 de Dezembro de 2013. A pesquisa, que combinou os métodos quantitativo e qualitativo, consistiu na recolha de informações através da aplicação de
inquéritos e entrevistas directas e indirectas a um total de 40 famílias residentes em seis regedorias das três comunas do município, informações que foram
complementadas com dados recolhidos a partir da administração municipal e das
respectivas administrações comunais. O objectivo foi, sobretudo, o de captar a
percepção da pobreza por parte das populações, vendo até que ponto as políticas,
os programas e as acções do poder executivo têm respondido adequadamente às
necessidades e aos anseios locais, principalmente no que se refere aos espaços
rurais, cujas carências se afiguram, em geral, gritantes.
Neste contexto, parte-se de uma breve caracterização geográfica, administrativa, demográfica e histórica do município, para, em seguida, se analisar os principais indicadores de desenvolvimento social, nomeadamente na área da educação,
saúde, transporte, agricultura e pecuária. São incluídas, ao longo da exposição, as
falas dos entrevistados, de modo a conferir maior fidelidade à abordagem e a valorizar directamente a percepção dos actores locais.
8.2 Caracterização geográfica
O município do Negage é um dos 16 municípios que compõem a província do
Uíge, região norte de Angola, abrangendo uma superfície de cerca de 2019 km²,
78
Os outros 15 municípios são: Ambuíla, Bembe, Buengas, Bungo, Damba, Alto Cauale,
Maquela do Zombo, Milunga, Mucaba, Puri, Quimbele, Quitexe, Sanza Pombo, Songo e
município sede do Uíge.
154 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
o que equivale a 3,15% do território provincial. Situa-se no extremo sul da província e a 36,6 km² da cidade capital. As suas fronteiras são formadas a norte
pelo município do Bungo, a nordeste pelo do Puri, a noroeste pelo município
sede do Uíge, a sudoeste pelo do Quitexe, a sudeste pelo município do Alto
Cauele e, finalmente, a sul pelo município de Camabatela (província do Kwanza
Norte).
Maquela
do Zombo
Quimbele
Damba
Buengas
Santa Cruz
Bembe
Songo
Mucaba
Sanza
Pombo
Bungo
Ambuíla
Uíje
Quitexe
Puri
Negage
Alto
Cauale
FONTE: Fragmentos do Uíge e da Cultura Kongo, 2013.
Negage faz parte de um sistema montanhoso de 1300 metros de altitude,
coberto por densas manchas florestais e bastante arborizadas e entrecortado
por vales e rios de caudal médio. O mais importante rio é o Cáua, que atravessa
longitudinalmente a sede do município e onde é possível a navegação através de
pequenas embarcações até 20 quilómetros da foz. Devido à extensa vegetação, a
fauna é abundante, podendo encontrar-se animais como elefante, búfalo, javali,
macacos azuis e outras diferentes espécies raras.
Como em toda a região norte do país, o clima é tropical húmido, com uma temperatura média anual de 25 oC. Quanto às estações, apenas se distinguem duas: o
tempo quente e chuvoso, que vai de Setembro a Maio, e o tempo de cacimbo, de
Junho a Agosto. As chuvas são convectivas, ou seja, típicas de regiões com alto grau
de evapotranspiração de superfícies húmidas e aquecidas, com quedas de grande
intensidade.
| 155
CEIC / UCAN
Essa complexa combinação geográfica conforma uma região tropical propícia,
entre outras actividades produtivas:
ͻ Ao cultivo do café, da mandioca, do amendoim, do dendém, da batata-doce,
do sisal e de outros produtos agrícolas em menor escala.
ͻ À extração da madeira e à produção de cestos, cadeiras e alcofas de junco.
ͻ À pesca numa área de cerca de 108.200 m².
ͻ À pecuária, relativamente aos gados bovino, caprino e suíno.
ͻ À avicultura, com a criação de galinhas, patos e peru.
ͻ À caça, nomeadamente de antílopes.
ͻ À extração de minerais localizados na região, tais como o cobre, talco e zinco.
O município do Negage é ainda caracterizado geograficamente pela existência,
no seu território, de zonas turísticas, como a região de Cassadi, onde se encontram
as famosas pedras titânicas e misteriosas de Cabala, por possuírem escrituras de
desenhos que, até então, não foram descodificadas. O local passou a ser um ponto de atracção turística no final da década de 1960, depois de despertar o interesse da administração colonial, chegando o então Governador-Geral da província
de Angola, Rebocho Vaz, mandar fazer uma placa de betão sobre as misteriosas
pedras, para proteger as pinturas rupestres dos ventos e chuvas fortes.
8.3 Caracterização administrativa e demográfica
Do ponto de vista administrativo, Negage –, ou antes, “Ngage” – existe há mais
de meio século. A localidade, antes uma pequena sanzala, foi, no contexto da
administração colonial portuguesa, elevada à categoria de aldeia em 1925 e, mais
tarde, à de Posto do Concelho de Ambaca, Distrito do Kwanza Norte. Em 1955,
passou a pertencer ao Concelho do Bembe, Distrito do Uíge. Já um ano depois,
foi criado o Concelho de Negage, que, em 1958, foi elevado a vila. Finalmente, a
26 de Junho de 1970, por meio da Portaria N.o 19/076, de 15 de Março, publicada
no Boletim Oficial N.o 13/62, Negage passou à categoria de cidade, tendo sido os
seus serviços administrativos instalados no famoso edifício do Tumbuaza, hoje um
património histórico local.
Após a independência de Angola, Negage passou a constituir um dos 16 municípios da província do Uíge, dividido, administrativamente, por três comunas, a
saber: Dimuca com 888 km², Quisseque com 603 km² e Negage (comuna sede)
com 501 km². Estas, por seu turno, são subdivididas por 38 regedorias, conforme
se pode ver na distribuição da tabela seguinte.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
DIVISÃO ADMINISTRATIVA DO MUNICÍPIO DO NEGAGE
Comuna
Negage (comuna sede)
Dimuca
Quisseque
Regedoria
^ƵƉĞƌİĐŝĞdĞƌƌĞƐƚƌĞ
Banza Negage
3 km²
Cabala
3 km²
Bengo
4 km²
Cangundo
5 km²
Terra Nova
6 km²
Cangulo
10 km²
Cazanga
10 km²
Cauenda
15 km²
Quituia
15 km²
Bamba Matamba
18 km²
Quindando
20 km²
Quidinga
27 km²
Quiongua
38 km²
Longe Zeca
40 km²
Tema
40 km²
Dala
15 km²
Vunge
22 km²
Malungo
26 km²
dƵƟ
29 km²
Tuiango
31 km²
Sede da Comuna
32 km²
Luanda
37 km²
Mussungua Ngombe
42 km²
Panzo
42 km²
Yemba
46 km²
Bango
49 km²
Calunga
50 km²
Longe
56 km²
Zanda
56,6 km²
Biri
61 km²
Bula
61 km²
Quisseque
20 km²
Canzundo
30 km²
Pumba
30 km²
Catumbo do Pumba
32 km²
Quixica
32 km²
Alto Dange
35 km²
Gozolo
40 km²
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
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CEIC / UCAN
Tais regedorias – ou “Mbanza”79, como são tratadas em kikongo pela população local – compreendem um total de 82 aldeias. Elas representam a autoridade
do poder tradicional local, que, na prática, exerce a função de auxiliar da administração central do Estado. Neste momento, este poder está composto por 300 autoridades tradicionais, de acordo com a seguinte repartição hierárquica.
AUTORIDADES TRADICIONAIS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Soba grande
Adjunto de Soba grande
Soba
Adjunto de Soba
Sekulu
2780
27
82
82
82
FONTE: Muana Damba, “Breve historial do Município do Negage”,
2013.80
Neste contexto, constata-se que a estrutura do poder político e administrativo
entre o centro do município e as restantes regedorias é manifestamente uma bifurcação, sendo que o administrador municipal se encontra no topo da representação
da autoridade e os diferentes regedores subordinam-se a ele formalmente.
Existem alguns estudos81 sobre o papel desempenhado pelas autoridades ditas
“tradicionais” e a relação quer com o Estado colonial, quer com o Estado independente e as intermitências entre este último e a rebelião armada da UNITA no
controlo e ocupação de certas regiões. O centro dos estudos tem sido o planalto central, provavelmente, com o argumento vigorante segundo o qual o grupo
etno-linguístico Ovimbundu é dos mais importantes e a sua estrutura de poder
político-administrativo mantém-se razoavelmente intacta apesar das transformações ocorridas no último século.
Num estudo mais recente e que envolve a cintura agrícola de Angola, segundo Fernando Pacheco, após o volte-face entre autoridades tradicionais e o Estado
79
“Sede” ou “capital” em português, em referência ao centro do poder político. Esta
designação tanto é empregue em zonas sociolinguísticas predominantes pelo Kikongo
como também em zonas dominadas pela língua Kimbundu. A designação é usada nas
duas línguas e respectivos dialectos, que resultam da fusão entre ambas. Por exemplo,
nas regedorias do Cangundo e Quituia existem duas variantes usadas pela população
como resultado da fusão entre as línguas Kikongo e Kimbundu, para além da sua proximidade lexical e morfológica.
80
Existe uma divergência de informação administrativa entre o número dos regedores
(ou Soba Grande) e o número actual das regedorias repartidas pelas três comunas do
município do Negage.
81
Fernando Pacheco, “Rural communities in Huambo” in Paul Robson (org.), Communities and reconstruction in Angola – the prospects for reconstruction in Angola from the
community perspective, Canada: Development Workshop, 2001, pp. 54-117. Fernando
Florêncio, “No reino da toupeira, autoridades tradicionais do M’balundu e o Estado
angolano” in Vozes do universo rural – reescrevendo o Estado em África, Lisboa: Gespress, 2010, pp. 80-175.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
colonial “a lógica da divisão político-administrativa do Estado colonial acabou por
se impor e o poder das chefias ‘tradicionais’ foi perdendo importância, de forma progressiva, no condicionamento da vida económica e social dos respectivos
povos. Para isso contribuíram vários factores, desde a acção de agentes externos
já referidos (Estado colonial, Estado independente, Igrejas, ONG), mas também a
perda de importância da caça (diminuição das terras comunitárias, proibição do
uso de armas de fogo artesanais), a evolução dos sistemas de propriedade ou de
uso de terra, o aparecimento de pessoas letradas a nível das comunidades (professores, pastores, enfermeiros e catequistas)”82.
Ainda segundo esse autor, com a reforma que se seguiu da luta armada, Portugal incorporou legislativamente através do Decreto N.o 43897, de 6 de Setembro
de 1961, o poder tradicional na estrutura organizativa do próprio Estado, transformando as regedorias em “unidades administrativas chefiadas por um regedor
nomeado pelo governador (de distrito ou de província) ouvindo às populações,
e assessorado por um conselho de sua escolha no exercício das suas funções”83.
As regedorias surgem, pois, como resultado da dupla lógica legalista e cultural. A
primeira baseava-se no facto de que a sua delimitação deveria seguir procedimentos dos usos e costumes, bem como das tradições, das práticas locais, não obstante
ser alvo de imposição de regras de cima para baixo. Ao passo que a segunda assenta
na delimitação geográfica ou nos limites das zonas de residências das populações.
Do ponto de vista hierárquico, as autoridades tradicionais estão estruturadas por regedor (ou soba grande), pelo soba e sekulu. Segundo ainda Fernando
Pacheco, “estas designações têm sido contestadas pelo facto de se impor na terminologia oficial vocábulos de regiões sócio-culturais específicas. Por outro lado,
os regedores (sobas grandes) contestam a generalização da terminologia ‘autoridades tradicionais’ na medida em que isso não deixa transparecer a existência de
níveis hierárquicos, ‘nivelando-se o que não se deve nivelar’, pois um soba grande
não pode fazer parte da mesma reunião que um simples sekulu”84.
No caso vertente das seis Mbanza do Negage pode-se constatar certa horizontalidade ao nível das autoridades, não obstante ser o regedor que aparece como
principal representante hierárquico, não existindo no caso das seis comunidades a
figura de soba grande, como acontece nas regiões do planalto central de Angola.
82
Fernando Pacheco, Autoridades tradicionais e estruturas locais de poder em Angola:
aspectos essenciais a ter em conta na futura administrativa autárquica, Luanda: Fundação Friedrich Ebert/ADRA, 2002, p.3.
83 Id. Ibid., p. 4.
84 Id. Ibid., p. 6.
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CEIC / UCAN
Contudo, dado o peso dos sobas e dos sekulus nas comunidades, os assuntos são
geralmente tratados no âmbito do conselho local. Tanto o regedor como o soba e
os seus respectivos adjuntos e conselheiros fazem parte das reuniões quando o
assunto diz respeito a toda a comunidade.
Por isso, embora à primeira vista a palavra caiba ao regedor que responde
pelos assuntos políticos e administrativos, não está autorizado a tomar decisões
unilateralmente sem ouvir os restantes membros do conselho de mais-velhos da
comunidade, onde além de constar o soba e os adjuntos, compõem, sobretudo, as
autoridades religiosas representadas nas comunidades. O papel de conselheiros
do regedor ou do soba para além dos respectivos adjuntos cabe aos pastores das
distintas igrejas ou mais-velhos influentes, geralmente detentores de conhecimentos ancestrais ou possuidores de bens materiais. Sobre estas representações religiosas trataremos mais adiante num subcapítulo específico.
A regedoria ou sobado atende pela designação, nas línguas locais de Mbanza.
É muito frequente ouvir-se dos representantes das comunidades a designação de
Mbanza, que se refere à malha em que está circunscrita o poder local. Deste ponto
de vista, o poder ancestral encontra-se sob a autoridade dos sobas e sekulus. Estes
estão responsabilizados e são chamados a responder pelas cerimónias fúnebres,
pela ausência das chuvas para a produção agrícola e pelas festividades ou sucesso da produção agrícola, do nascimento de novo membro da comunidade e dos
rituais de passagem, caso ainda haja. Aos sobas e às mulheres mais-velhas estão
reservados o tratamento das doenças ou enfermidades que a medicina convencional não consegue dar resposta. Os conhecimentos de botânica são frequentemente exercidos, quer em relação à cura de doenças graves, quer em substituição
e ausência de medicamentos nas comunidades. Esse aspecto, em particular, será
aflorado mais adiante, no subcapítulo sobre saúde.
Aconteceu que na regedoria do Pumba, por onde se realizou parte da pesquisa
de terreno, foi-nos confidenciado que certo dia após a morte do soba da comunidade, os mais-velhos – regedor e seus colaboradores mais directos, conselheiros
e pastores deslocaram-se para o enterro, só que ao saírem esqueceram-se do cão
de guarda do soba dentro da casa, aí onde é igualmente a sede da regedoria. Inesperadamente foram convocados no cemitério pela população enfurecida, pois na
tentativa de sair da residência do soba, o animal foi forçando a porta e deu a entender à população que o soba ainda estava vivo. O cenário gerou uma enorme polémica, pois o regedor foi acusado de ter simulado a morte do soba. Como forma de
se desculpar, da comunidade lhe foi exigido que convocasse o conselho que iria
destituí-lo do poder. Este para se salvar da fúria da comunidade rompeu a porta da
referida residência e, para seu espanto, o animal saiu aos pulos, dando a perceber
que não se tratava do soba.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
Este exemplo serve para ilustrar a horizontalidade que comporta o poder
local em algumas das Mbanza do município do Negage. É que apesar do regedor
ser o interlocutor directo com o poder do Estado, representado pelo administrador municipal, comunal, ou mesmo pelo governador, os sobas e sekulus desempenham um papel crucial ao nível da hierarquia do poder local, pois podemos
constatar que, em grande parte, os regedores eram relativamente mais-novos
que os sobas e sekulus. À medida que os sobas e sekulus se vão tornando maisvelhos e sem forças físicas, há a necessidade de ter um regedor mais-novo e
com maior força para se encarregar de estabelecer a comunicação com a administração, e percorrer longas distâncias que acabam por ser, muitas das vezes,
o principal obstáculo entre os poderes – do Estado e local. Os sobas e, principalmente, os sekulus são os guardiões da tradição, como os conhecimentos do
cultivo, domínio do tratamento das doenças graves e a arte de adivinhação ou
religiosa.
Sobre esse assunto, foi-nos confidenciado que no período em que a guerra
civil atingiu o município do Negage, especificamente a regedoria do Cangulo, que
se situa a escassos quilómetros do centro da cidade, ao ser invadida por homens
armados que se suponha pertencerem às forças da UNITA, o soba e o sekulu da
regedoria, empoderados pelo poder ancestral, conseguiram tornar invisível a localidade aos olhos dos invasores. Ou seja, os indivíduos das forças da UNITA ao aproximarem-se viam as aldeias de longe, mas postos no local apenas encontravam
matas desérticas, enquanto isso a população permanecia nas suas casas. Cansados
da invisibilidade, os invasores retiraram-se incrédulos e admirados. Outros julgavam-se enfeitiçados e juravam nunca mais voltar àquela localidade.
Pode-se constatar igualmente que existe uma subordinação política muito forte entre os regedores e a administração, pois é desta que os regedores dependem
administrativamente apesar de fazerem parte do conselho de auscultação e serem
muitas vezes chamados a dar pareceres no âmbito dos programas municipais,
como a saúde, a habitação, a educação e a mobilização das populações.
Dado o poder que muitos regedores e sobas têm nas suas comunidades, são
muitas vezes cooptados para estruturas partidárias, com maior relevância para o
partido do governo. Podendo assim pressupor uma maior articulação entre ambos
os poderes, quando muito essa convivência pode influenciar as escolhas dos responsáveis nas localidades. Quanto maior for a capacidade de resposta, dados os
interesses da estrutura partidária, a proximidade a esta, maior é o nível de intervenção da governação na localidade. Ou seja, a resolução de muitos problemas
locais passa, fundamentalmente, pela habilidade do regedor junto das estruturas
partidárias e administrativas.
| 161
CEIC / UCAN
O mecanismo de benesses e farda concedido aos sobas ou autoridades locais
pelo sistema colonial, recuperado pelo Estado independente sob a forma de subsídio – o equivalente a salário mensal – é muitas das vezes a moeda de troca que
influencia o relacionamento entre ambos os poderes, tornando os sobas dóceis
e mais facilmente subordinados. Estes, muitas vezes, respondem a isso com a
estratégia de criação de “sobas aparentes”. São figuras normalmente decorativas
que visam proteger os verdadeiros sobas em face dos contextos de crise, como as
várias fases da guerra em Angola que implicou o alinhamento destas autoridades
com os dois beligerantes, governo e UNITA. Tal estratégia vem demonstrar que as
autoridades tradicionais não são entidades passivas, e põe em causa o argumento
segundo o qual elas são frequentemente manipuladas pelo Estado para atender a
certos interesses. Se é verdade que alguns indivíduos pertencentes às autoridades
locais deixam-se enredar pelos subsídios e benefícios materiais concedidos pelo
Estado, não é menos verdade que estas e as suas comunidades têm estratégias e
interesses próprios que às vezes entram em rota de colisão com os manifestados
pelo Estado.
A visão do Estado sobre as autoridades tradicionais é bastante ambígua, talvez
por isso haja abertura para várias interpretações, pois o Estado na legislação reconhece o seu papel, mas mantém algumas reservas e limitações de carácter legal,
e as autoridades assumem-se geralmente como parceiros do Estado e de outros
organismos com quem se relacionam. Ou seja, as “relações entre o Estado e o
poder tradicional processam-se numa base impositiva, como se se tratasse de um
escalão inferior do poder do Estado. Esta é uma realidade tangível, mesmo que o
discurso oficial tente ser, por vezes, diferente”85.
Quanto à sua composição demográfica, Negage apresenta, como o resto
da província, uma população em crescimento, maioritariamente feminina e
jovem, entre os 18 e os 49 anos de idade, como se pode observar nas tabelas
seguintes.
POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DO NEGAGE POR GÉNERO – 2012
Masculino
Feminino
Total
64.345
81.772
146.117
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
85 Id. Ibid., p. 11.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DO NEGAGE POR GÉNERO E GRUPOS ETÁRIOS – 2012
Grupos
Masculino
Feminino
Total
Crianças – 0 a 5
12.872
14.662
27.534
Crianças – 6 a 11
18.454
23.564
42.018
Adolescentes – 12 a 17
5654
8256
13.910
Adultos – 18 a 49
19.936
25.487
45.423
Adultos – 50 a 64
5216
6731
11.947
Adultos – 65 ou +
2215
3070
5285
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
O movimento migratório que se passou a verificar com o fim da guerra civil,
a produção agrícola e a segurança na região foram alguns dos factores que vêm
determinando o crescimento da população local, embora se constate a existência de elevado número de jovens que abandonaram os espaços rurais, nomeadamente representados pelas comunas do Quisseque e da Dimuca, e procuraram
concentrar-se nos centros urbanos, quer do município (comuna sede do Negage), quer da província (município sede do Uíge), em busca de melhores condições de vida.
Apesar de não haver dados disponíveis sobre a distribuição territorial da população no município do Negage em particular, é possível constatar no terreno que
esse êxodo rural tende a crescer. Como conta Muana Damba, esse facto “provoca
um ainda maior despovoamento das áreas rurais e interiores, aumentando a pressão demográfica e urbanística sobre os grandes centros urbanos, e originando processos de desequilíbrio territorial que devem ser prevenidos e corrigidos, já que,
a médio e longo prazo, esta tendência será uma ameaça à sustentabilidade territorial das grandes cidades, nomeadamente o Uíge, cujos níveis de acessibilidade
melhoraram consideravelmente nos últimos tempos, deixando de funcionar como
elemento dissuasor dos fenómenos de pressão urbana periférica, como se verificava até aqui”86.
Mais adiante, poder-se-á notar como essa realidade está intrinsecamente ligada a factores de ordem social, sobretudo a inexistência de infra-estruturas sociais
básicas nas áreas rurais do município em detrimento da sua sede, onde se tende a
concentrar os investimentos públicos.
86 Muana Damba, “Breve historial do Município do Negage”. Disponível em:
http://www.muanadamba.net/article-breve-historial-do-municipio-do-negage-120058022.
html. Acessado em: Dezembro de 2013.
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CEIC / UCAN
8.3.1 Comuna do Quisseque
A regedoria ou Mbanza do Quisseque dista cerca de 18 km da sede municipal (cidade de Negage) e a 1 km da sede comunal. É resultado da fusão de quatro aldeias situadas num raio de 1,5 km. No passado a comuna do Quisseque foi
considerada como o celeiro da produção agrícola do município de Negage. Passados mais de 20 anos, segundo as autoridades locais, o Quisseque continua com
uma produção notável se comparado a outras regiões da província, embora registe
algumas limitações que tornam difícil a produção com excedente. A regedoria é
constituída por quatro Sobados (Quisseque, Cabula, Howassa, Canzundo), sendo a
aldeia do Canzundo a que se encontra mais distante da aldeia mãe ou principal (a
cerca de 4 km). A população total actual é de 8750 habitantes.
A estrutura do poder tradicional é composta por um regedor e seu adjunto,
quatro sobas e correspondente número de sobas adjuntos e nalguns casos composta também de sekulus. Quer o regedor, quer os sobas, têm, no exercício das
suas funções, o seu séquito composto geralmente por um secretário e conselheiros (anciões da aldeia). Esta estrutura responde cada uma ao seu nível, quer por
assuntos meramente tradicionais, quer por assuntos administrativos do governo.
A estrada que liga a comunidade da sede do Negage em terra batida e estabelece a mesma ligação com a localidade do Quisseque.
Há um fenómeno migratório da camada jovem, principalmente masculina, para
as cidades à procura de emprego e de melhores condições de vida, embora em
alguns casos se registem roubos frequentes de bens da população por parte desses
mesmos jovens internos e externos, sendo os animais de criação as escolhas mais
constantes. No entanto, a percepção que se tem é de que a população da aldeia é
maioritariamente nova, o que se reflecte até certo ponto na mão-de-obra activa
para a produção agrícola.
Existe uma associação de camponeses nas quatro aldeias, não obstante os visados
dizerem estar à espera da legalização. A verdade é que estas associações são ainda
nominais e fortemente dependentes de agentes externos. Em 2012, poucos, dentre
os camponeses, beneficiaram de apoio da EDA, e de uma tentativa de micro-crédito
mal sucedida. As principais dificuldades são as vias de acesso e transportação para o
escoamento dos produtos agrícolas. No ano passado a localidade do Quisseque chegou a vender toneladas de banana em algumas localidades da província de Malanje,
bem como o frequente abastecimento do mercado municipal do Negage.
Dentre os factores de produção referidos na ficha de entrevista, notou-se também a escassez de pesticidas para fazer face às pragas e doenças dominantes, principalmente para a broca da mandioca e as doenças típicas do café.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
As autoridades locais referiram-se à não existência de posto de saúde, pois o
posto foi colocado na sede comunal que dista a 1 km da aldeia principal. Foi referido igualmente pelos participantes que o nível de abastecimento de medicamentos
é bastante irregular.
Esta localidade possui quatro escolas do 1. e 2.o Ciclos, sendo uma para cada
aldeia e outra situa-se na sede comunal, em mau estado de conservação. Grosso
modo, as escolas leccionam até à 6.a classe, embora haja carência de professores.
Quisseque carece do fornecimento de água potável, embora exista um projecto para a construção de fontes. Existe um impasse entre a comunidade e a empresa encarregue da obra. O empreiteiro pretende colocar a fonte de água em local
impróprio segundo as autoridades locais. O acesso à energia eléctrica é outro dos
problemas registados, embora a linha de transportação de alta tensão passe pela
localidade.
Do ponto de vista da motivação das pessoas, o nível de participação, receptividade, foi bastante satisfatório e houve certa abertura na abordagem das questões
mais delicadas.
Em geral, a percepção que se teve, para além dos aspectos específicos acima
salientados, é de que as comunidades rurais situadas na periferia dos centros urbanos, como esta tendem a ter grande influência das dinâmicas urbanas e têm maiores oportunidades de benefícios das acções do governo local, em relação às mais
isoladas. Um estudo mais aprofundado permitirá confirmar noutras comunidades
das trinta e oito existentes.
8.3.2 Comuna do Dimuca
A regedoria ou a Mbanza do Vunge situa-se a 12 km da sede do Dimuca a que
pertence e a 25 km da sede municipal no sentido Este. Trata-se de uma das aldeias
dentre outras que se situam ao longo da via que liga a sede do município com a
comuna do Dimuca. É constituída por apenas um sobado, com uma população
total de 1503 habitantes.
A estrutura do poder tradicional é composta por um regedor e seu adjunto
(no topo da pirâmide), um soba e seu adjunto, e um sekulu, para além dos conselheiros (anciões da aldeia). Em geral, o regedor responde quer por assuntos
meramente tradicionais, quer por assuntos administrativos do governo. O soba e
o sekulu aparentemente funcionam mais como figuras decorativas para preencher
a estrutura do poder tradicional na sua hierarquia. Na ausência do regedor, o soba
em coordenação com o regedor adjunto resolvem os problemas e representam o
poder na regedoria.
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CEIC / UCAN
As localidades do Vunge tal como a comuna do Dimuca ficam a uma distância considerável da sede municipal, facto que tem limitado, em certa medida, o
seu rápido desenvolvimento local. Os representantes locais apontam como principais problemas o fornecimento da água, apesar das fontes que ficam próximas da
aldeia, o acesso à energia elétrica e a escassez da produção agrícola. Neste particular, pode-se constatar que a densidade populacional está maioritariamente acima dos 30 anos, o que pode estar na base da pouca produção alimentar e para o
comércio. Apesar disso, há produção mais limitada à alimentação e ao comércio,
que também é outro problema, pois o mercado fica muito distante daí e as vias de
acesso são de difícil transição. A mobilidade é feita por meio de viaturas ligeiras e
motorizadas que transportam quase tudo, desde produtos alimentares a electrodomésticos. Constata-se a existência de obras de terraplanagem sobre a via devido
à fazenda que se estende nos limites da localidade e é a única área para a transição
rodoviária.
A regedoria do Vunge possui duas escolas do 1.o Ciclo, sendo uma em construção definitiva (três salas de aulas, um sanitário para professores e alunos e o anexo
que alberga a direcção com apenas dois gabinetes) e a outra de abobes (com apenas duas salas de aulas) construída pelos missionários jesuítas que por ali passaram, nos anos 1960. Esta escola ainda resistiu até ao surgimento da mais recente,
altura em que foi desactivada pela repartição municipal da educação após inauguração da outra.
Verifica-se, porém, a ausência de um posto de saúde na localidade do Vunge, o
que tem obrigado a população a deslocar-se para o hospital municipal ou a recorrer à medicina tradicional.
8.4 Caracterização política e social
A situação social e económica no município do Negage manifesta preocupação
tal como se pode observar junto das localidades que foram alvo do estudo, auxiliada pelas tabelas da administração e outras elaboradas a partir dos dados recolhidos localmente. Esta é de tal ordem que ultrapassa a simples observação directa,
pois implica um olhar mais aprofundado sobre os problemas que são transversais
às próprias necessidades do país de uma forma mais geral. Porém, olhando para as
comunidades rurais e o centro da cidade, Negage está distante do benefício social
que se regista em outras partes do país. O funcionamento da administração do
Estado vive de inúmeras limitações, pois a rede de serviços sociais é bastante limitada, outras vezes não funcional. Apesar disso, verifica-se um comércio formal em
lojas de conveniência, posto de combustível e comércio informal, razoavelmente
instalado que contribui para mascarar as principais carências aí existentes.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
A vida social funciona em torno do sector económico com a presença de algumas repartições bancárias (ver tabelas do comércio), numa cidade cujas vias principais, secundárias e terciárias carecem de recuperação, e onde o comércio informal
nos mercados de proximidade dominam as atenções da população local entre o
centro da cidade e o meio rural, e dos visitantes que por lá se deslocam.
Os sectores sociais como os da educação e da saúde são os maiores desafios
que o município enfrenta perante uma população quase envelhecida, pelo menos
no nível das comunidades visitadas. Sobre os sectores da educação e da saúde,
abordaremos em seguida.
Ao nível meramente económico, apesar das potencialidades e de certa produção que ainda serve para alimentação e comércio na cidade e nas zonas rurais,
Negage vive actualmente da nostalgia dos tempos áureos do café, de que cuja
cidade foi seu produto directo.
Quanto ao aspecto político, segundo os representantes das comunidades, há um
perfil que é dominado pelo partido do governo, que exerce bastante influência nas
localidades cuja mobilização se verificou in loco. Pode-se constatar à vista desarmada
a existência de bandeiras do MPLA, lado a lado, com as da República. Houve casos
em que se poderia observar a existência, em partes opostas, das bandeiras do MPLA
e da UNITA ou em pontos diferentes, mas visíveis logo à entrada. Para muitos destes
mais-velhos é o partido do governo que maior expressão exerce nas comunidades,
havendo esporadicamente actividades bastante precárias da UNITA, e uma ausência
flagrante de outros partidos como a FNLA que, em alguns casos, é apenas nominal.
Em raras excepções, verificava-se a existência da bandeira do MPLA e, paradoxalmente, nota-se a ausência da bandeira da República, o que imediatamente faz
conjurar que a primeira fosse significar a substituição da segunda. Outras vezes,
alguns regedores ou sobas apresentavam-se trajados com as camisolas do MPLA,
talvez como sinal de alinhamento político ou como se quisessem passar determinada mensagem ao grupo. Pois, apesar dos constantes esclarecimentos, a equipa
foi muitas vezes tomada como representante da administração do Estado, saída de
Luanda, com vista a resolver os seus problemas sociais.
8.5 Igrejas
Importa referir que no município do Negage se regista a presença de várias
denominações religiosas, tais como a Igreja Católica cujo antigo edifício se situa
no centro da cidade em paralelo às instalações da administração, ao passo que as
restantes protestantes estão disseminadas pelas artérias da cidade, sobretudo em
zonas periféricas.
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Nas comunidades, ao contrário do centro, regista-se a predominância das igrejas protestantes, das quais a IERA (Igreja Evangélica Reformada de Angola) e a
Igreja Baptista são dominantes, seguindo-se as Igrejas do Bom Deus, Adventista,
Tocoista e com expressão limitada das Igrejas Católica, Anglicana e Metodista.
As igrejas protestantes do Negage estão representadas no CICA (Conselho das
Igrejas Cristãs de Angola), sendo os pastores da IERA e da Igreja Anglicana os seus
representantes locais.
Em grande parte regista-se a presença dos templos da IERA, alguns em bom
estado de conservação, outros nem tanto, havendo também uma flagrante carência de espaços para o culto das pessoas que professam outras religiões. Nas seis
localidades não há nenhum templo católico, o único são ruínas de um templo antigo situado na regedoria do Cangulo.
Dado o papel que a IERA vem desenvolvendo na região, trabalhando lado a
lado com as administrações e parceiros externos nos projectos de monitoria social,
esta leva vantagem sobre as outras. A sua influência está enraizada nas comunidades rurais e observa-se a autoridade que muitos pastores representantes desta
igreja exercem sobre as populações locais.
Contudo, a convivência entre elas, pelo menos ao nível local, parece harmoniosa, dado o facto de estarem representadas nos diversos conselhos comunitários.
IGREJAS CRISTÃS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
IERA
BAPTISTA CATÓLICA
METODISTA BOM DEUS ADVENTISTA
TOCOISTA
ANGLICANA
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
8.6 Educação
O sector da educação, segundo o responsável da repartição, está em permanente crescimento. O paradoxo é que este franco crescimento visto atentamente
resume-se apenas no número de ingressos das crianças no sistema de ensino entre
o 1.o e o 2.o Ciclos. Apesar do optimismo do nosso interlocutor quanto à melhoria
das condições futuramente, a verdade é que se constata a degradação do próprio
edifício que alberga a Repartição Municipal da Educação. Visivelmente uma instalação antiga, as escolas de proximidade estão igualmente a necessitar de reabilitação pelo facto do município do Negage receber anualmente imensa chuva. Este
factor, do nosso ponto de vista, contribuiu em grande medida para o desabamento
das obras mal feitas.
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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
NÚMERO DE ESCOLAS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Nível de ensino
Escolas
Primário
54
ŽŶƐƚƌƵĕĆŽĚĞĮŶŝƟǀĂ
Estado
1.o Ciclo
6
Regular
2.o Ciclo
2
Degradado
dĠĐŶŝĐŽͲƉƌŽĮƐƐŝŽŶĂů
2
Regular
Total
64
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
A educação nas seis comunidades acentua este paradoxo que nos referimos
acima, na medida em que nas regedorias que se situam mais próximas do centro da cidade, as suas instalações escolares do 1.o Ciclo estão mais bem equipadas com o fornecimento do material escolar e beneficiam esporadicamente da
merenda escolar. Ao passo que as regedorias que se situam mais distantes do
centro, maiores dificuldades enfrentam, chegando a merenda escolar a ser uma
forma de manter as crianças na escola, devido ao facto da dieta alimentar ser
escassa ou não variável em muitas famílias. Tal fornecimento da merenda escolar
verificou-se no ano de 2011 em quase todas as escolas do 1.o Ciclo das trinta e
oito regedorias.
Por exemplo, as escolas do Vunge e Pumba, que se situam fora da cidade,
apresentam menores condições de trabalho. Ora o problema são as obras com
o empreiteiro que não honra os compromissos, ora é do equipamento como as
carteiras ou da insuficiência de professores e material escolar (apenas os manuais
porque os cadernos são adquiridos nos mercados).
Há, porém, o problema das desistências ou abandono escolar, motivado pela
prática da agricultura no horário das aulas, com excepção do Cangundo, pela
indisciplina por parte dos rapazes, e pela gravidez precoce que tem afectado as
jovens raparigas, sobretudo nas regedorias do Quisseque, Cangulo e Pumba, onde
o índice de matriculados relativo às raparigas é inferior ao dos rapazes. Muitas
dessas jovens acabaram criando as crianças sozinhas ou com a ajuda dos pais,
pois os parceiros frequentemente as abandonam quando tomam conhecimento
da gravidez.
Para além da inspecção carecer de meios de transporte para o exercício de fiscalização, sobretudo devido às distâncias que separam o centro e as regedorias,
estas comunidades vivem o drama da ausência de escolas do 2.o Ciclo ensino meio-profissional. Como mencionado acima, a maior parte das quais são do 1.o Ciclo
cujas classes vão da 1.a à 6a, ao passo que a 9.a classe e as restantes do 2.o Ciclo,
maioritariamente é feita fora das localidades, enfrentando novamente o desafio
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CEIC / UCAN
de percorrer longas distâncias a pé ou pagando pelo transporte de passageiros ao
preço de 100 Kwanzas por pessoa.
NÚMERO DE ALUNOS MATRICULADOS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Nível de ensino
Estudantes
Iniciação
5168
Primário
6360
1.o Ciclo
5692
2.o Ciclo
3321
Total
40.541
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
Contudo, o responsável pela repartição da educação manifestou satisfação pelo
facto de o sector ter registado algumas melhorias, tais como a bancarização dos
salários dos professores, a contratação de mais profissionais formados no ISCED
(Instituto Superior de Educação) do Uíge, para integrarem o sector administrativo
do qual ele próprio faz parte deste grupo.
De qualquer modo, corroborou o cepticismo dos professores e dos profissionais e encarregados de educação das seis comunidades quanto à reforma educativa no que concerne ao 1.o Ciclo. Para este professor e os responsáveis da educação,
o principal constrangimento do sector prende-se com a monodocência que subcarrega os docentes e tem afectado cerca de 30% do ensino, pois retirou-se dos
conteúdos programáticos: o alfabeto e a tabuada, e a ausência desses dois importantes instrumentos tem criado enormes dificuldades na aprendizagem da Língua
Portuguesa e da Matemática, disciplinas chaves para o exercício da profissão e do
sucesso escolar das crianças.
NÚMERO DE PROFESSORES NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Nível de ensino
Professores
Professores em falta
Primário
767
14
1.o
Ciclo
356
1
2.o
Ciclo
Total
109
1
1232
16
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
No caso em particular da comuna do Quisseque, o sector da educação apesar
de registar um número considerável de professores para as duas escolas, apresenta algumas caraterísticas salientes que podem reflectir a realidade em outras localidades no município em estudo.
170 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
De facto, o quadro docente do Quisseque é composto por 55 indivíduos, a
maior parte dos quais se encontra na faixa etária acima dos 40 anos de idade. Em
média quase metade desses docentes exerce esta profissão há mais de 30 anos,
sendo que três deles têm 35 anos de serviço e ocupam cargos de director ou adjunto do director. O professor mais-velho tem 60 anos de idade e 35 anos de serviço,
ocupando a posição de director com a 9.a classe como nível de escolaridade. Ao
passo que o docente mais-novo é uma senhora de 21 anos de idade, 2 anos de serviço e a 12.a classe como nível de escolaridade.
Com efeito, o nível de escolaridade dos docentes do Quisseque varia da 4.a ao
3o ano do ISCED, sendo que maior parte dos que possui mais tempo de serviço têm
entre a 4.a e a 9.a, e os que menos tempo de serviço possuem situam-se entre o
12.o e o 3.o ano do ensino superior para professores.
Em suma, dos 55 docentes do Quisseque, 50 são homens e somente 5 mulheres integram o sector da educação da comuna. Das cinco senhoras, a mais-velha
tem 53 anos de idade e 30 anos de serviço, ao passo que a segunda tem 43 anos
de idade e 26 anos de serviço, possui a 9.a classe e é professora do 2.o escalão. As
duas mais-novas, uma tem 25 anos de idade, 2 anos de serviço e frequenta o 3.o
ano do Instituto Superior de Educação do Uíge, e o 6.o escalão do ensino. A segunda mais-nova tem 21 anos de idade, 2 anos de serviço e está igualmente no 6.o
escalão de ensino.
8.7 Saúde
A situação do sector da saúde no município do Negage não obstante se constatar algum investimento público acusa preocupação em larga escala a começar pelo
próprio hospital municipal cujas instalações foram construídas no período colonial. Actualmente o edifício reclama por recuperação das instalações desde a faixa principal até à zona que lhe dá acesso. Geralmente é para o hospital municipal
onde os habitantes ocorrem para verem as suas preocupações de saúde tratadas.
Contudo, a rede de saúde, ao nível das comunas pesquisadas, manifesta melhores
condições em instalações, abastecimento permanente em medicamentos e uma
maior cobertura em pessoal técnico. Nas seis regedorias pesquisadas, as preocupações com a saúde dominaram as conversas que mantivemos, quer com o grupo
de representantes das comunidades, quer com o das mulheres que são o segmento da população que mais recorre aos postos médicos, e quando não encontram
aí tratamento, são imediatamente transferidos para o hospital principal, ou para
a capital da província, usando os seus próprios meios de transporte ou pagando
para o efeito.
| 171
CEIC / UCAN
INFRA-ESTRUTURAS E EQUIPAMENTOS DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Comunas
Tipo de infra-estrutura
Total
Negage (sede)
Quisseque
Dimuca
Hospital municipal
1
-
-
1
Centro ortopédico
1
-
-
1
Centro de tratamento da doença
do sono
1
-
-
1
Centros de saúde
9
2
1
12
Postos de saúde
7
2
2
11
Total
19
4
3
26
As principais insuficiências constatadas prendem-se, em grande medida, com
as instalações limitadas para um número crescente de habitantes, além do abastecimento precário em medicamentos, facto que tem obrigado a maior intervenção das parteiras locais. Paralelamente a isso, constata-se igualmente um défice
do pessoal técnico médico e de enfermagem, sendo que poucos são aqueles que
aceitam trabalhar nas localidades distantes do centro da cidade, devido, em parte,
ao estado precário das vias de acesso.
Curiosamente em nenhuma comunidade, segundo os representantes, existe
um médico. Apenas enfermeiros e auxiliares de enfermagem trabalham nas comunidades, a exemplo da Regedoria do Vunge. A maioria dos enfermeiros que prestam serviços de saúde e assistência às comunidades são moradores locais, com
idades acima dos 35 anos.
Recentemente, com a cooperação estabelecida com Cuba, verifica-se a presença de médicos e técnicos superiores de saúde cubanos em serviço no município,
sobretudo nas áreas de especialidade, onde é maior a carência em técnicos nacionais, sendo o número de médicos e técnicos de saúde cubanos superior ao dos
quadros nacionais.
Como se poderá verificar na tabela que se segue, o hospital municipal apresenta um quadro de pessoal que varia entre os técnicos de especialidade, médicos e
funcionários administrativos num total de 245 pessoas. Dentre este número temos
a referir que constam dez médicos, sendo que sete são de origem cubana, um
coreano, um vietnamita e apenas um médico nacional. O mesmo acontece com os
técnicos superiores de enfermagem, sendo cinco cubanos e quatro nacionais. Dos
licenciados, apenas um nacional preenche este quadro. Como mencionado, além
do pessoal administrativo em cerca de oitenta e duas pessoas, o pessoal técnico
superior é maioritariamente de expatriados.
172 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
PESSOAL TÉCNICO E ADMINISTRATIVO DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
ĚŵŝŶŝƐƚƌĂƟǀŽ
Médico
TDT87
ENS88
TSE89
Licenciado
Total
82
10
15
128
9
1
245
FONTE: Administração Municipal do Negage,
2012.878889
Para além deste pessoal técnico-administrativo dos serviços de saúde do município, há também terapeutas e parteiras tradicionais90 que não fazendo parte do
quadro técnico médico-sanitário, prestam assistência nas comunidades. As parteiras tradicionais, em alguns casos, são integradas nas unidades sanitárias para prestarem os seus serviços, mas contratadas como empregadas de limpeza. O controlo
destes terapeutas e parteiras tradicionais é feito pela Associação dos Terapeutas
Tradicionais que regista 29 terapeutas, 243 parteiras, das quais 85 contratadas, e
78 agentes comunitários, dos quais 28 oficiais, denominados “promotores de saúde”, como se pode verificar na tabela abaixo.
TERAPEUTAS TRADICIONAIS E AGENTES COMUNITÁRIOS NO MUNICÍPIO
DO NEGAGE – 2012
Terapeutas locais
Parteiras locais
Contratadas
Agentes comunitários
29
243
85
78
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
As três tabelas que se seguem referem-se às campanhas de vacinação levadas a
cabo pelas Unidades Sanitárias do Sector da Saúde do Negage, bem como ao Programa Municipal de Reabilitação Física.
PROGRAMA DE VACINAÇÃO NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Vacina
N.o de pessoas vacinadas
Campanhas
Sarampo
10.041
Nacional
Febre-amarela
5041
Nacional
Poliomielite
203.854 + 58.449
EĂĐŝŽŶĂůĞĚĞƌŽƟŶĂ
Tétano
14.366
Nacional
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
87 Técnico de Diagnóstico Terapêutico.
88 Técnico de Diagnóstico Terapêutico.
89 Técnico Superior de Enfermagem.
90
Durante os trabalhos houve por parte dos representantes das comunidades certas
”‡•‡”˜ƒ•‡ˆƒŽƒ”‡‹†‡–‹ϐ‹…ƒ”ƒ„‡”–ƒ‡–‡“—‡‡”ƒǡƒ˜‡”†ƒ†‡ǡ‘•–‡”ƒ’‡—–ƒ•‡ƒ•
parteiras tradicionais. Foi um assunto tratado com alguma cautela e receio implícito
dada a sua natureza e as possíveis associações com práticas de feitiçaria.
| 173
CEIC / UCAN
DIAGNÓSTICO DA DOENÇA DO SONO NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
N.o de casos
Homens
Mulheres
4764
1592
3172
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
PROGRAMA DE REABILITAÇÃO FÍSICA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Utentes
Homens
Mulheres
Crianças
1499
709
222
568
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
No Negage, o VIH tem níveis de transmissão tidos como preocupantes, registando uma seroprevalência de cerca de 2,26% dos casos testados. O município
conta apenas com um Centro de Aconselhamento e Testagem Voluntária (CATV),
localizado na sede e onde são realizados todos os testes de VIH/SIDA. Em 2012,
foram atendidos aí 2491 pacientes, dos quais 2436 passaram pelo processo de acolhimento. Dos pacientes atendidos, 55 casos foram diagnosticados como positivos,
dos quais 8 homens e 47 mulheres (destas, 7 grávidas).
TRANSMISSÃO DE VIH NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Casos
2491
Acolhimento
2436
WŽƐŝƟǀŽƐ
55
Mulheres
Homens
Não Grávidas
Grávidas
47
7
8
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
O responsável da saúde afirmou que, comparativamente às mulheres, os
homens são mais renitentes ao teste de VIH, principalmente por razões de estigma. Por isto, o ATV (aconselhamento e testagem voluntária) passou a ser feito nas
consultas pré-natal, onde alguns parceiros aparecem como acompanhantes das
gestantes.
Para além das acções de aconselhamento realizadas no CATV e durante as consultas pré-natal, há esporadicamente campanhas de prevenção e distribuição de
preservativos, no âmbito das deslocações feitas pelas equipas e técnicos de saúde
locais. O município do Negage possui igualmente uma clínica móvel que devido a
uma avaria se encontra desactivada.
A aplicação do Programa Municipalizado dos Serviços de Saúde teve como
efeito imediato a descentralização, passando do nível provincial para o municipal. A nível do município, a gestão das verbas para estes serviços encontra-se
174 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
centralizada pelo Administrador(a), pois os valores vêm no pacote do PMIDRCP
– Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza.
É a administração que define e disponibiliza as verbas para a aquisição de medicamentos e consumíveis. Neste processo, nem sempre as quantidades compradas
satisfazem as necessidades das unidades sanitárias do município, quer em termos
de cobertura, quer em termos da oferta para os diferentes utentes. “Já assistimos
à compra de medicamentos no valor de 8 milhões de Kwanzas, que, em termos
de quantidade, só cabiam na carroçaria de uma Hilux Cabine dupla. O que vamos
fazer?”91.
Esse excerto é do responsável para a saúde, e evidencia a razão de fundo para
irregularidades no abastecimento de medicamentos e consumíveis às Unidades
Sanitárias do Município.
Justificando a ausência de técnicos de saúde nas comunidades, o Chefe de
Repartição de Saúde revelou que periodicamente deslocam-se equipas médicas
para as diferentes Unidades Sanitárias, compostas pelos médicos e responsáveis
desses Programas dos Serviços de Saúde, quer para realizar consultas médicas,
quer para avaliar o desenvolvimento e aplicação dos respectivos programas da sua
área de actuação. Todavia, não foi estipulado nenhum calendário fixo para cada
unidade, dependendo da disponibilidade de transporte.
8.8 Agricultura e pecuária
Embora baseada na agricultura, actualmente é visível a diversificação das fontes de rendimento, dada a vulnerabilidade da economia baseada simplesmente na produção agrícola. As actividades complementares passam a ter também
um papel preponderante na economia local, com realce para o facto de que há
pouco estímulo para uma produção agrícola voltada para o mercado, não só pela
desestruturação das redes comerciais, mas também pelas rupturas das diferentes
cadeias de valor dos principais produtos económicos, como é o caso do café, que
em termos de importância económica para os camponeses passou da primeira
posição para a terceira ou quarta, em relação à banana, ao feijão e ao amendoim
(ginguba).
91 Responsável para o sector da saúde do Negage.
| 175
CEIC / UCAN
PRODUÇÃO E RENDIMENTOS POR HECTARE NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Cultura
ƌĞĂĐƵůƟǀĂĚĂ
Produção/Hectare
Produção/Tonelada
Mandioca
7086
10,0
70.860,00
Amendoim
2126
0,3
637,80
Milho
229
0,2
45,80
Feijão
2667
0,3
800,20
Feijão macunde
167
0,3
50,00
Batata-doce
709
0,4
283,60
Batata rena
263
4,0
1132,00
Banana
567
10,0
5670,00
Abacaxis
283
10,0
2830,00
,ŽƌơĐŽůĂƐ
500
0,6
300,00
Total
14.617
36,1
82.609,40
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
Nesse segmento produtivo, constata-se que as trocas comerciais baseadas em
espécies são quase nulas ao nível das redes de comércio formal, implicando por
isso que os camponeses tenham necessariamente de vender os seus produtos
a dinheiro para a obtenção de outros de primeira necessidade, o que influencia
sobremaneira o seu poder de compra. Expressões como, “o dinheiro não aparece”,
comuns no seio das comunidades, são disso ilustrativas.
Tal como a cadeia produtiva, foi igualmente difícil perceber quais são os critérios usados para se considerar uma família rica ou pobre. Observou-se, porém, a
existência de posições antagónicas: umas baseadas em aspectos físico-materiais,
como as condições habitacionais (das moradias) no acesso aos meios de transporte, como motorizadas, etc., e outras baseadas em aspectos sociais e organizacionais, como status social, o nível de escolaridade, dentre outras. Procurou-se um
aprofundamento desses critérios, comparando a outras comunidades.
O sector agrário do Negage possui uma instituição de ensino médio para a formação dos profissionais da área, que tem permitido apoiar actividades produtivas
e dotar a administração de conhecimento do terreno para integrá-los nos seus planos e orientação. O potencial alvo deste apoio são as cooperativas de camponeses
do município, que são maioritariamente constituídas por mulheres, como ilustra a
tabela seguinte.
176 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE CAMPONESES NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Comuna
N.o de Associados
N.o Associações Camponeses
Homens
Mulheres
Total
Sede
24
3388
3657
7045
Quisseque
8
908
870
1778
Dimuca
18
1503
2027
3530
Total
50
5799
6554
12.353
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
No entanto, como se pôde testemunhar durante a pesquisa de terreno, as
comunidades queixam-se da insuficiência da actividade pecuária devido, sobretudo, aos roubos dos animais que têm sido alvo. Dizem já ter manifestado inúmeras vezes tais práticas junto das autoridades, mas de nada tem valido a pena. Os
roubos são constantes e têm estado na base, inclusive, de sérios conflitos no seio
das comunidades, como ilustra o caso relatado na regedoria do Pumba, situada
a 30 km do centro da cidade, onde, logo à chegada, a equipa de pesquisadores
foi confrontada com a notícia de um óbito. Não obstante, os representantes das
famílias decidiram reunir-se com a equipa, e contaram que um jovem havia posto
fim à sua própria vida, amarrando uma corda ao pescoço, após ter sido acusado
de fazer parte de um grupo de ladrões de gado, o mesmo grupo apontado por um
dos conselheiros e pastor da Igreja Bom Deus como o autor do roubo recente de
parte da sua criação, tendo-a transportado numa viatura ligeira de marca Toyota. Em consequência, a família do falecido, enfurecida, procurou responsabilizar
o pastor pela morte do rapaz, gerando assim um clima de instabilidade na comunidade.
Outro episódio ocorreu de igual modo na regedoria ou Mbanza do Cangundo,
zona nordeste, com um dos sobas das 4 aldeias que era detentor de mais de 60
cabeças de cabrito. Fruto do roubo que quase lhe levou a vida, acabou com pouco
mais de seis cabeças, não obstante ter reservado um espaço equivalente a “um
quarto e sala” para criação de cabritos, suínos, patos e galinhas. Segundo o soba,
os roubos são maioritariamente realizados na calada da noite, onde os assaltantes
usam viaturas ligeiras para transportá-los e os animais são vendidos no mercado municipal do Negage; outros devido à procura, vendem-nos nos mercados da
capital da província. As preferências dos assaltantes são geralmente os cabritos,
pelo seu valor no mercado, os patos e as galinhas, por serem mais fáceis de transportar, sem se dar por eles. O soba confirmou ainda a existência de encomendas
que são feitas por comerciantes do centro da cidade do Negage aos assaltantes
de gado.
| 177
CEIC / UCAN
Portanto, de acordo com os representantes das seis comunidades, a prática da
pecuária apenas se verifica nas fazendas que se despontam no município, a eles
nada podem fazer devido ao roubo da criação, sobretudo do gado caprino que
maior interesse tem despertado no mercado e é de fácil transporte se comparado
com o suíno. Registase, porém, a existência do gado suíno nas seis comunidades
alvo da pesquisa e nas redondezas da cidade.
A caminho da comuna da Dimuca pode-se verificar o surgimento de enormes
fazendas, com a presença notória de criação, em grande escala, de gado bovino
proveniente da sul-africana e namibiana, mas também de produção de cereais,
carne, ovos e frangos. A população local, muitas vezes, devido à impossibilidade
de cultivar as suas próprias terras, por falta de meios, é obrigada a prestar serviços
nestas fazendas, como recurso.
ACTIVIDADE PECUÁRIA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Espécies
Exploração familiar
Exploração empresarial
Total
Bovinos
1760
691
2451
Suínos
27.259
-
27.259
Caprinos
15.808
-
15.808
Ovinos
7191
-
7191
Bicos
40.930
8862
49.792
Outras
10.040
-
10.040
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
Em 2012, um responsável do Instituto Nacional do Café (INCA) veio a público
dizer que está em recuperação um total de 1875 fazendas, com vista a melhorar
a produção local. Tendo em conta a realidade e a produção agrícola que se pôde
verificar nos mercados do Negage, essa informação merece pouca credibilidade.
É certo que existem algumas fazendas com uma produção agro-pecuária inicial, e
dependendo do investimento feito, provavelmente, no espaço de um ou dois anos
poderão potenciar o mercado local diversificando os produtos.
8.9 Viação e trânsito
O sector de viação e trânsito depende da administração municipal, faz a monitorização das vias e da actividade de condução em colaboração com a Polícia Nacional.
A qualidade das vias rodoviárias é fundamental para a mobilidade no interior
do município e deste para as restantes partes da província, bem como para a ligação com outras províncias fronteiriças, como são as do Kwanza Norte e Malanje.
A concentração de pessoas e a actividade produtiva e comercial, no município, tem
178 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
obrigado à construção e reparação das principais vias de acesso, como parte da
recuperação das infra-estruturas rodoviárias.
Em certa medida, a população do município do Negage concentra-se ao longo
do eixo rodoviário da EN 220 – EN 140, num deslocamento do Norte a Sul do município. Grosso modo, a actividade de comércio rural, a prestação de serviços de restaurantes e combustíveis e a venda de equipamentos são feitos ao longo dos eixos
principais, provocando um fluxo crescente da população. O centro administrativo
do Negage funciona como pólo de atracção e zona de intersecção para outros destinos, oferecendo assim maior mobilidade até à cidade. Não obstante, as vias terciárias da pequena cidade encontram-se, na maior parte, em estado avançado de
degradação sem qualquer perspectiva de recuperação futuramente.
Segundo a Administração Municipal, a reabilitação da estrada Negage – Lucala, da variante EN220 até Quimbele e da estrada Negage – Bungo – Damba são
indicadores de uma maior mobilidade na região, de mais actividades socioeconómicas e de maior concentração populacional. Da mesma maneira que a reabilitação da estrada de Negage – 31 de Janeiro que quatro quilómetros após a
cidade continua em direcção a Norte e desemboca na Damba, após 117 quilómetros (na Estrada Nacional EN 140). Todas estas obras, bem como a construção de
uma nova ponte (65 metros) e o prolongamento de outra (17 metros) foram realizadas por uma empresa chinesa, a China Road and Bridge Corporation – CRBC
e fiscalizada pela francesa, GAUFF Engineering, ambas contratadas pelo Instituto Nacional de Estradas de Angola, sem qualquer intervenção da administração
municipal, que revela a existência de um hiato entre os planos estratégicos do
governo para a recuperação das vias de acesso e a realidade que se pode constatar in loco. A curtíssima malha urbana da cidade do Negage confirma esse hiato, pois as vias secundárias e terciárias que interligam as ruas e as avenidas da
cidade estão em avançado estado de degradação, dificultando a mobilidade das
pessoas no próprio centro, para não falar das vias de acesso entre o centro e as
regedorias.
A estrada do município do Negage à sede da província do Uíge está em razoáveis condições bem como a do Negage à Camabatela, altura em que se entra na
província do Kwanza Norte, em direcção ao Lucala, bifurcação para Malanje (à
esquerda) e Ndalatando (à direita).
8.10 Comércio e hotelaria
O sector do comércio e indústria do Negage tem merecido alguma atenção
nos últimos anos. Com a presença de pelo menos cinco dependências bancárias, o
comércio ganhou maior impulso na medida em que houve pequenos projectos nos
| 179
CEIC / UCAN
ramos que beneficiaram de financiamentos, como forma de incentivo à produção
local. Com efeito, nem todos os projectos financiados lograram resultados satisfatórios, o que implicou uma redução dos beneficiários.
Quer no centro da pequena cidade, quer nas zonas rurais, verificam-se estabelecimentos de pequenos comerciantes. O grosso de estabelecimentos encontram-se mesmo no centro do Negage.
ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Sede
Dimuca
Quisseque
Cangundo
Quindinga
Quindando
Armazém sede
119
17
37
5
3
3
18
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
Como a tabela que se segue ilustra, o sector hoteleiro no Negage é precário e
carece de investimentos pujantes para lhe conferir melhores condições de serviço
e atendimento, além da diversidade da oferta. Actualmente, apenas uma hospedaria funciona razoavelmente bem, mas com algumas limitações quanto à qualidade
dos serviços, desde a alimentação à própria acomodação. Esta hospedaria situa-se
a 3 km fora do centro, numa paisagem que permite observar a cidade de longe
entre relevos e montanhas.
Segundo o representante do sector, o hotel do Negage encontra-se em fase de
conclusão dos trabalhos e, após a sua inauguração, a oferta será melhor quanto às
condições de serviço e de acomodação.
REDE HOTELEIRA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Hotéis Hotéis em
(5)
construção
(3)
Hospedarias em
construção
(1)
Centros
de lazer
(2)
Centros
Bares e
ƚƵƌşƐƟĐŽƐ restaurantes
(7)
(14)
Boates
Clube
(1)
ĚĞƐƉŽƌƟǀŽ
(1)
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
REDE BANCÁRIA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
Bancos Comerciais
BPC (2)
BCI (1)
BFA (1)
Sol (1)
Millennium Angola (1)
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
Com excepção do Banco de Poupança e Crédito (BPC) que possui duas agências
na cidade, sendo uma central e outra para o atendimento dos idosos, as restantes
dependências bancárias possuem uma agência cada no centro da cidade do Negage.
Constata-se que as receitas fiscais que são arrecadadas pela repartição municipal dos serviços de notário estão domiciliadas entre os bancos privado Sol e público
comercial BPC, que disputam concorrência na mesma avenida principal, a escassos
metros da administração. As duas restantes ruas que registam uma movimentação
180 |
RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013
constante de pessoas devido à presença de mercados informais, estão servidas
cada uma pelos bancos de Fomento Angola (BFA) e Milllennium Angola.
POSTOS DE COMBUSTÍVEL PÚBLICO E PRIVADO NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012
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(24/24)
FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.
8.11 Conclusão
A presente monografia procurou, através da análise de dados e de conjuntura, situar a problemática da pobreza, entre o meio urbano e rural, numa distinção
necessária que não aparece claramente nos documentos oficiais, nomeadamente
no Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza
(PMIDRCP), enfatizando, no essencial, os eixos do desenvolvimento económico e
social das comunidades, no espaço temporal de 2007/2017.
Uma conclusão preliminar é a de que o município do Negage, apesar de vários
constrangimentos sociais, está em fase de renovação da sua população e de crescimento da economia, num misto de formal e informal. No que concerne à Educação, há a assinalar um aumento de crianças e de jovens no sistema de ensino, quer
do Estado, quer das Igrejas Católica e IERA, mas persistem problemas recorrentes
como o da insuficiência de infra-estruturas, de meios e equipamentos, de quase inexistência de inspecção escolar, da fraca qualidade e insuficiência do corpo
docente e dos desajustes criados pela reforma educativa ao aplicar a monodocência e ao retirar instrumentos pedagógicos habituais (o alfabeto e a tabuada) que
aparentemente estão a dificultar o ensino e a aprendizagem. O sector da saúde
apresenta grandes dificuldades em infra-estruturas, quer no município, quer nas
regedorias. Tal como permanece o problema da insuficiência (e qualidade) do pessoal médico, técnico e sanitário e do reabastecimento regular em medicamentos,
nomeadamente das regedorias ou mbanzas mais distantes da capital municipal,
onde não há sequer farmácias privadas que praticam sempre preços inalcançáveis
pela população.
Há maior incremento do comércio e da produção agrícola (café, cereais e
outros) e pecuária (avícola, bovina e suína) que têm estimulado ainda mais o
comércio. Este dinamismo da produção e do comércio não encontra equivalente
na melhoria da rede de estradas que permitiriam o escoamento desses produtos
do campo para o mercado (formal e informal), urbano e rural. Embora as campanhas agrícolas estimulem a produção, os produtores carecem de incentivos e apoio
em técnicas, instrumentos de trabalho, sementes e créditos agrícolas.
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No entanto, a produção familiar ainda é predominante sobretudo no cultivo
de frutas, leguminosas, oleoginosas, tubérculos e outros, quer para o mercado,
quer para o autosustento das famílias, sendo assim um dos principais esteios da
segurança alimentar do município que não regista problemas graves de fome ou
ausência de alimentos. Porém, há o desafio da diversificação da dieta alimentar,
principalmente das crianças que quase se resume ao milho, ao arroz, à mandioca,
à batata, ao feijão, à ginguba e às frutas (banana e abacaxi). O espírito comunitário ajuda a ultrapassar as dificuldades e as carências alimentares que provocam a
subnutrição.
Grande dificuldade das comunidades é o acesso à água potável que tem como
consequência elevados índices de doenças hídricas, sobretudo diarreias agudas.
Enquanto isso, os programas municipais integrados do Executivo não passam o
nível formal mas continuam a alimentar o optimismo das autoridades locais que
contrastam com a realidade eonómica e social das comunidades, embora haja
a registar algumas realizações pontuais conseguidas e muitas reprovadas pelas
populações, devido à má qualidade das obras.
Por fim, a mobilidade das populações e a tendência para a horizontalidade dos
padrões de consumo, aconselham uma postura crítica em relação a análises sociológicas assentes em oposições rotineiras entre urbano/rural, agro/industrial e tradicional/moderno, e estimulam o pragmatismo metodológico com vista à criação
de conceitos explicativos a partir do terreno empírico.
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CONCLUSÃO
A Constituição da República, no seu catálogo de direitos fundamentais, assegura que “é garantido a todos os cidadãos a liberdade de reunião e de manifestação
pacífica e sem armas, sem necessidade de autorização e nos termos da lei (Artigo
47.o, 1, CRA), embora acrescente que “as reuniões e manifestações, em lugares
públicos, carecem de prévia comunicação à autoridade competente, nos termos e
para os efeitos estabelecidos na lei (Artigo 47.o, 2, CRA). No entanto, o poder político continua a manifestar relutância em cumprir este preceito constitucional e em
assegurar a realização de direitos por parte dos cidadãos, pois ao longo do ano de
2013, todas as manifestações convocadas foram motivo de tensão e conflito, entre
as autoridades e os manifestantes, resultando algumas delas em agressões físicas
e em detenções arbitrárias, ao ponto de autoridades de polícia associarem publicamente as manifestações a tentativa de golpe de Estado”.
Angola continua a ser considerada, pelas Nações Unidas, um “país de baixo desenvolvimento”, ocupando o 148.o lugar (em 187 países), embora o Banco Mundial, como
resultado do crescimento económico sustentado que o levou a atingir USD 6.092,00,
em PPC, per capita, tenha passado a considerá-lo “país de rendimento médio superior”. Esta nova classificação tem sido motivo de orgulho para o Executivo, no entanto, não basta uma sensível melhoria no PNB, sendo poucos os sinais de progressão
nos indicadores de desenvolvimento social que fazem os critérios de classificação,
nomeadamente para o Índice de Vulnerabilidade Económica (EVI) (inclui indicadores
da população, isolamento, concentração das exportações, percentagem da agricultura no PIB e outros) ou para o Índice de Capital Humano (HAI) (inclui a subnutrição, a
mortalidade infantil, a frequência do ensino secundário e o analfabetismo).
Os níveis de reprodução social permanecem baixos pois insiste-se numa política
de baixos salários e numa distribuição da renda extremamente desigual que não é
compensada por um sistema de redistribuição, através do Estado social que é quase
inexistente ou grandemente ineficaz. A evolução do salário real é quase estacionária
e o poder de compra dos assalariados continua a ser erodido pela inflação acumulada, embora os seus níveis tenham caído ao nível de um dígito já há algum tempo.
O Serviço Nacional de Saúde que apresenta níveis satisfatórios, no plano da
prevenção de doenças através da vacinação, continua a não dar resposta suficiente no plano da saúde materno-infantil e no combate às endemias. Assim, como os
hospitais, os centros e os postos médicos revelam uma incapacidade quase total
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de dar resposta satisfatória ao grande número de doentes, muitas vezes devido à
má qualidade da água consumida e à falta de saneamento do meio.
O país ainda não debelou o fenómeno das crianças fora do sistema de ensino
e muitos jovens e adultos continuam a não ter oportunidade de acesso à escola e
alguns não a concluem. E, apesar de transcorridos 13 anos, o país não progrediu suficientemente no sector da educação e ainda não atingiu plenamente nenhum dos seis
objectivos estabelecidos pelo Fórum Mundial de Educação para Todos (26 a 28 de
Abril de 2000). No quadro do chamado “Marco de Acção de Dakar”, os governos de
todo o mundo comprometeram-se a garantir para todos os cidadãos dos seus países,
até 2015, “protecção integral da primeira infância, especialmente, para as crianças
mais desfavorecidas”, “acesso a todas as crianças, especialmente, as meninas, e conclusão da escolaridade primária gratuita, obrigatória e de boa qualidade”, bem como
“acesso equitativo a programas de aprendizagem e de desenvolvimento de capacidades para a vida, para todos os jovens e pessoas adultas e melhor educação para conseguir resultados de aprendizagem reconhecidos e mensuráveis”. Porém, o país não
consegue melhorar a qualidade da sua educação e tem investido pouco na formação
profissional e profissionalizante e não tem ainda uma ligação segura entre os sistemas
de ensino e de aquisição de conhecimento e competências e o mercado de trabalho.
O país foi atingido, nos últimos três anos, por uma prolongada estiagem (menos
60% de precipitação), cujos efeitos afectaram directamente 10, das suas 18 províncias, provocando uma acentuada descida da produção agrícola (menos de 400
toneladas de produtos agrícolas) que atingiu cerca de 350.000 famílias e cerca de
um milhão de crianças, com menos de cinco anos de idade. No fim do primeiro
semestre do ano (2013), o Executivo divulgou dois planos de combate à fome, com
uma cabimentação anunciada de 100 milhões de USD que foram disponibilizados
tão-somente em 10%, tendo as Nações Unidas intervindo, através da FAO, UNICEF
e da OMS, distribuindo sementes, utensílios de trabalho e capacitando as populações em nutrição, o que mostra que havendo carências alimentares no país, quer
nas áreas rurais, quer urbanas, o sistema de segurança alimentar não funciona de
forma adequada e que há ainda muitas situações de emergência que continuam a
ser deixadas à sorte da intervenção das Organizações Internacionais.
O Estado é o principal actor na acção de desenvolvimento, devido ao modelo
económico do país, em que aparece como principal empregador da força de trabalho, para além de deter as empresas com maior expressão no tecido produtivo. No
entanto, outros actores não-estatais (organizações da sociedade civil e igrejas) dão
o seu contributo no desenvolvimento social e na solidariedade, à luz do princípio
da subsidiariedade, o que resulta numa acção de grande dimensão e importância
que nem sempre tem visibilidade.
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APÊNDICE
Resumo dos factos políticos e sociais de 2013
O ano de 2013 foi marcado por diversos factos político-sociais, dos quais se
destacam os seguintes.
Janeiro
ͻ A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) convocou uma vigília denominada
o “dia do fim”, prometendo milagres em massa, compareceram ao Estádio
da Cidadela pelo menos 120 mil crentes, o que ultrapassou largamente a
capacidade do recinto (setenta mil pessoas) e levou à perda de controlo da
massa de crentes, resultando numa tragédia inesperada, em que pereceram
pelo menos 14 pessoas.
Fevereiro
ͻ Mais de 700 professores saíram à rua, na cidade do Lubango, para exigir melhores
condições laborais e o pagamento de subsídios em atraso.
ͻ O Ministério Público Português arquiva o processo-crime contra o activista e
jornalista Rafael Marques em que alguns generais angolanos se queixavam de
difamação contra o jornalista e activista cívico, devido a afirmações do seu
livro “Diamantes de Sangue”.
Março
ͻ O autodenominado Movimento Revolucionário de jovens angolanos convoca uma manifestação para o dia 30 do mesmo mês com o objectivo de exigir
informações sobre o paradeiro de Alves Kamulingue e Isaías Cassule. Um dia
antes da realização da manifestação, a Polícia de Investigação Criminal prende,
no mercado de Asa Branca, Alberto Santos, a testemunha do rapto de Isaías
Cassule, que veio a ser libertado 120 dias depois.
Já no dia da manifestação a polícia reprime os manifestantes e prende vários
activistas.
Maio
ͻ Emiliano Catumbela, um dos activistas do Movimento Revolucionário, é detido na noite do dia 27, quando, em companhia de colegas do grupo, pretendia realizar uma vigília no largo da Independência para recordar Cassule e
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Kamulingue e os milhares de pessoas executadas, na sequência da repressão
do falhado golpe de Estado, de 27 de Maio de 1977. Emiliano Catumbela é
então acusado de tentativa de assassinato contra o comandante da Maianga, Eduardo António Nunes Diogo. Detido, viria a ser liberto um mês depois.
Agentes da Polícia Nacional dispersaram à bastonada os manifestantes que
participavam na vigília convocada para esta tarde, em Luanda, pelo Movimento Revolucionário, em protesto pelo desaparecimento, há um ano atrás,
de Isaías Cassule e Alves Kamulingue. Na sequência, dois manifestantes são
presos: Raúl Lindo “Mandela”, de 27 anos, foi brutalmente espancado, e Emiliano Catumbela, que é então acusado de tentativa de assassinato contra o
comandante da Polícia Nacional, do Distrito da Maianga (Luanda). Detido e
torturado, viria a ser libertado um mês depois.
Junho
ͻ O Presidente José Eduardo dos Santos concede, após 22 anos, uma entrevista
exclusiva à SIC, onde chamou de frustrados os mais de 300 jovens manifestantes
e falou da sua sucessão.
ͻ Mais de 15 mil pessoas saíram à rua em protesto contra a onda de homicídios
de camponesas, na localidade diamantífera de Cafunfo, município do Cuango,
província da Lunda Norte.
Julho
ͻ O ex-comandante provincial de Luanda, da Polícia Nacional, comissário Joaquim
Ribeiro, é condenado, em Luanda, pelo Supremo Tribunal Militar, a uma pena
de 15 anos de prisão maior e 12 meses de multa (40 Kwanzas/dia), por terem
sido dados como provados dois crimes de violência contra inferior hierárquico que resultaram em morte, abuso de confiança e conduta indecorosa. Vinte
outros réus são também condenados, com penas diversas, neste processo.
Agosto
ͻ Começa no Tribunal Provincial de Luanda o julgamento da segunda vaga dos
implicados no desvio de mais de 100 milhões de dólares-americanos da tesouraria
do Banco Nacional de Angola. Mais tarde, todos são libertos.
Setembro
ͻ Manuel Chivonde Baptista (Nito Alves), de 17 anos de idade, detido por mandar imprimir t-shirts com slogan contra José Eduardo dos Santos, é solto com
termo de identidade e residência, pelo Tribunal Municipal de Viana, onde os
seus advogados, Odeth Fernandes e Zola Ferreira, da associação cívica “Mãos
Livres”, foram informados de que era acusado de crime de injúrias contra titular
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dos órgãos de soberania, com base no Código Penal e na Lei de Crimes Contra Segurança do Estado (Lei 7/78).
ͻ Cerca de 5 mil professores aderiram a uma marcha de protesto no Lubango,
província da Huíla. A marcha foi convocada pelo Sindicato Nacional de Professores
(SINPROF), reivindicando melhores condições de emprego.
ͻ Uma manifestação de protesto contra as injustiças sociais em Angola, organizada pelo Movimento Revolucionário, foi mais uma vez violentamente reprimida pela Polícia Nacional, em Luanda. Foram detidos 23 manifestantes, dentre
os quais vários declararam ter sido agredidos por agentes da Polícia. Um dirigente do Bloco Democrático, e Vice-Presidente do Sindicato Nacional dos Professores (SINPROF), Manuel de Vitória Pereira, que se encontrava a distribuir
boletins informativos do seu partido, na sua área de residência, também foi
detido como manifestante.
Acobertura noticiosa da manifestação também foi fortemente reprimida pela
polícia que ordenou aos jornalistas que abandonassem o local, sob ameaça
de serem também presos. Coque Mukuta, jornalista da Voz da América, foi
brevemente detido por agentes da Polícia, quando tentava apurar o nome de
um manifestante detido junto ao cemitério de Santana.
ͻ Menos de meia hora depois de terem sido libertados, pelo Tribunal de Polícia de Luanda, sob termo de identidade e residência, a Polícia de Intervenção
Rápida (PIR) tornou a prender sete membros do autodenominado Movimento
Revolucionário, que organizara uma manifestação anti-governamental, reprimida pela polícia, no dia anterior. Adolfo António, Adolfo Campos, Amândio
Canhanga “Sita Valle”, Joel Francisco, Quintuango Mabiala “Dimas Roussef”,
Pedro Teka “Pedrowski”, Roberto Gamba “Pastor”, concediam entrevistas aos
jornalistas Alexandre Solombe, Coque Mukuta e Rafael Marques quando foram
detidos, juntamente com os jornalistas. Estes foram violentamente agredidos e os seus materiais de reportagem foram apreendidos e destruídos pelos
agentes da PIR. Depois de várias horas, os jornalistas foram libertados, mas os
manifestantes permaneceram detidos. Dias depois foram libertados sob caução, fixada em 1.520.000 Kwanzas (cerca de USD 15.400).
Outubro
ͻ A Procuradoria de São Paulo (Brasil) indicia Bento Kangamba como líder de
uma quadrilha de tráfico internacional de mulheres para prostituição, do Brasil
para Angola, com ramificações em Portugal, África do Sul e Áustria. A polícia
brasileira emite um mandado de captura que é divulgado em todo o mundo
através da Interpol. O caso vai a julgamento em breve no Brasil, mas Kangamba não será extraditado.
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ͻ Na sequência da conclusão dos trabalhos de uma comissão de inquérito
Ad-Hoc, a direcção da UNITA suspende, por dois anos, o seu antigo Secretário-Geral da Juventude, Mfuka Muzemba, acusado de ter sido corrompido
pelo regime de José Eduardo dos Santos, através de subornos de Bento dos
Santos (Kangamba).
Novembro
ͻ Na Comarca de Luanda, uma rixa entre os detidos causa 14 feridos, três dos
quais em estado grave, e leva à exoneração do director e dos seus colaboradores directos, o caso é encaminhado para a PGR, para dar seguimento ao
inquérito mandado instaurar. O facto chamou a atenção da sociedade, depois
de denúncias nas redes sociais terem mostrado agentes dos serviços prisionais
a espancarem desumanamente detidos daquele estabelecimento prisional.
ͻ Reagindo às notícias que davam conhecimento da bárbara execução dos activistas Cassule e Kamulingue, por forças ligadas ao SINSE, a UNITA, maior partido da oposição, convoca uma manifestação para o dia 23, em nome da “defesa
da vida”, que é imediatamente proibida pela Polícia Nacional, em declarações
aos órgãos de imprensa.
Na sequência, o MPLA, partido no poder, acusa a UNITA de querer “criar o
caos” no país, ao querer promover manifestações de “arruaça” e de perturbação da ordem pública. Apela então aos seus apoiantes a não participar e aos
órgãos competentes do Estado a “agir no estrito respeito pela lei e, se necessário, pela reposição da ordem e tranquilidade pública”.
ͻ Na madrugada de 23, elementos da Unidade de Guarda Presidencial (UGP)atingem mortalmente, pelas costas, um dirigente da organização juvenil da Convergência Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE), Manuel Hilberto Ganga,
depois de ter sido detido por estar a afixar cartazes com as fotografias dos
activistas executados, Cassule e Kamulingue.
ͻ Um militante da CASA-CE, Manuel de Carvalho Hilberto Ganga, foi morto a
tiro nas primeiras horas da madrugada por um agente da Unidade de Segurança Presidencial (USP). O malogrado foi detido enquanto colava cartazes
nas paredes do Estádio dos Coqueiros, levado para a unidade da USP, junto à
presidência, onde foi morto com um tiro nas costas.
A manifestação convocada pela UNITA, em protesto pelas notícias dando
conta da execução dos activistas Isaías Cassule e Alves Kamulingue, agora
com o apoio de todos os partidos da oposição, é violentamente reprimida
com disparos sobre os manifestantes, canhões de água quente e granadas de
gás lacrimogéneo. São feitos vários feridos, incluindo o presidente da UNITA.
Quase três centenas de pessoas foram detidas em todo o país.
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ͻ O cortejo fúnebre do militante da CASA-CE, assassinado por operativos da
USP, é impedido manu militari de prosseguir na Avenida Deolinda Rodrigues,
nas imediações do Jumbo, em direcção ao Cemitério de Santana. O cortejo
que juntou centenas de pessoas, muitas envergando camisolas com slogans
como “Exigimos Justiça”, foi bloqueado por um forte dispositivo policial, que
incluiu o uso de helicópteros, Polícia de Intervenção Rápida, Polícia Montada, viaturas com canhões de água e gás lacrimogéneo. O funeral prosseguiu
depois de mais de uma hora de impedimento92.
Dezembro
ͻ Registaram-se novos confrontos entre presos na Comarca Central de Luanda
que deixaram 9 mortos e 22 feridos.
92 Resumo dos acontecimentos de 2013 pelo portal Maka Angola e da VOA.
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